O bêbado e a equilibrista
por Bruh Fernandes


Challenge #15

Nota: 9,0

Colocação:







Depois de tantos combates
o anjo bom matou o anjo mau
e jogou seu corpo no rio.
As água ficaram tintas
de um sangue que não descorava
e os peixes todos morreram.
Mas uma luz que ninguém soube
dizer de onde tinha vindo
apareceu para clarear o mundo,
e outro anjo pensou a ferida
do anjo batalhador.

Carlos Drummond de Andrade






Destino. Existe?
Felicidade. Real?
Vida. Passagem?
Sexo. Carnal?


11 de março de 2014



- Mãe, é uma péssima ideia... – confidenciou , entregando a ela a batedeira que a pouco pedira.
- Não seja boba - exclamou a mulher, abanando as mãos cobertas de massa de torta de limão - Você herdou meu talento, tenho certeza.
- Seu talento? - a garota se apoiou na bancada da cozinha, achando graça das palavras da mãe. Subitamente, um pensamento lhe atingiu os neurônios - Mãe, não me diga que se inscreveu no The Voice novamente...
Desde que se conhecia por gente, tinha a mesma ideia da mãe. A dona de casa que usava roupas extravagantes, gastava o dinheiro da herança dos pais e sonhava em cantar profissionalmente. Extremamente boa cozinheira, mas definitivamente uma cantora ruim.
A mais velha finalmente olhou para a filha, somente para esboçar uma careta, e deu de ombros, voltando à preparação da torta.
- Mas é claro que eu fiz! Dessa vez, eles vão reparar na minha linda voz. – riu.
- Incrível como nas outras treze vezes eles não perceberam o seu dom... - a garota retrucou, irônica, vendo um olhar reprovador da sua mãe.
- , não me enrole... – ela parou o trabalho com as mãos e virou-se para a filha, colocando os pulsos na cintura, já que as mãos estavam meladas. - Estávamos discutindo sobre sua participação no musical e decidimos que você será um dos personagens secundários. Meg Giry, talvez? Um mezzo-soprano é perfeitamente possível...
- Eu não vou participar! – a garota gritou, irritada pela iniciativa da mãe.
A mulher sorriu maleficamente.
- Ah, . Você vai.

-*-


29 de março de 2014



- Você pode me explicar de novo quais são suas aspirações ao participar do elenco, por favor?
estava sentado na cadeira de diretor - privilégio recebido por ser filho da real diretora-, numa luta eterna entre usar suas mãos para segurar as dezenas de folhas bagunçadas em seu colo ou para segurar os óculos que insistiam em cair.
- Só espero que acabe logo.
Ele pigarreou, desconfortável pela resposta não usual da mulher. Tentava manter seu posto, tratando a todos igualmente, mas daquele jeito era simplesmente impossível.
- - chamou-a pelo primeiro nome, vendo a careta no rosto dela se formar em reação - Preciso saber que personagem deseja fazer.
- Que tal a árvore? - inquiriu retoricamente. - , você sabe que estou aqui obrigada pela professora de teatro – bufou irritada - Aliás, ela é a sua mãe. Ela e a minha mãe orquestraram essa armadilha para mim.
- Não se faça de vítima. Você aprontou. E, dessa vez, você se superou. - o garoto falou, sem esconder seu tom reprovador.
A garota rolou os olhos.
- Ah, mas é claro que minha mãe contou pra sua e Dona saiu correndo para tagarelar para o filhinho querido.
Sua voz saía tão irritante que, com um pouco de esforço, podia-se ver o veneno escorrendo da boca de . odiava aquela garota.
As mães deles eram bastante próximas, amigas desde a adolescência. Engravidaram na mesma época e eles praticamente cresceram juntos. Até os nove anos, dividiam brinquedos e esperanças. Depois, no entanto, foram descobrindo o quanto tinham personalidades diferentes e se afastaram. Para desespero das mães, que sonhavam com o namoro e o futuro casamento dos dois. Não, eles não eram destinados um ao outro. Definitivamente não. Naquele instante, pensou, nem mesmo se fosse a última pessoa da face da terra.
- Você foi parar na prisão! - ele argumentou, deixando ecoar sua surpresa.
- Foi um contratempo. – ela pôs as mãos na cintura, na defensiva - Eu estava lutando pelo direito a liberdade. Não aprendeu naquele seu último livro estranho o quanto isso é importante?
- Mangá. O livro estranho se chama mangá. – ela deu de ombros, mostrando desinteresse. Ele continuou, voltando a discussão principal. - Precisava tirar a blusa pra lutar por liberdade? - sorriu.
- Você queria estar lá pra ver, não? - ela riu, observando o rosto dele enrubescer de vergonha. Satisfeita, se afastou. Antes de desaparecer da vista de , porém, ela gritou - Reserve o papel de árvore pra mim, ! - e saiu.


-*-



30 de março de 2014



- Você é muito cruel com ela... - murmurou Claire, no dia seguinte, logo depois de comentar sobre o encontro com . Eles mexiam nos armários à procura dos livros de matemática, a próxima aula.
- Está brincando, não? - ele respondeu, interrompendo a procura e olhando descrente para a mulher - Você sempre diz que ela é irritante.
- E não retiro minha afirmação. - Ela deu de ombros, encontrando o livro e apoiando-o no braço - Cada vez que ela começa o discurso de que é uma lutadora, que defende as minorias, que sofre para conseguir direitos... Bler. – ela pôs a língua para fora, evidenciando sua opinião - Metida demais. Mas, ainda sim, acho a iniciativa boa. Além do fato de demonstrar uma paixão tão grande pelas lutas que chega a contagiar.
finalmente achou o livro e eles fecharam os armários, seguindo para a sala e escutando o sinal bater.
- Ah, quer dizer que você ficou inspirada a tirar a blusa também? - perguntou, rindo. Ela sorriu para ele.
- Não tenho essa coragem. – ela revelou, tímida.
- Que pena, eu adoraria estar de plateia. – brincou , também sorrindo.
Claire corou. Seu coração bateu mais forte. Subitamente nervosa, ela não falou.


-*-



8 de abril de 2014



Assim que o fim da aula foi anunciado, pode ouvir as gritarias. No começo, murmúrios abafados. Andando pelo corredor em direção ao refeitório, no entanto, notou que as vozes se tornavam mais nítidas. Logo reconheceu a voz de entre elas e teve certeza que era mais um de seus desnecessários protestos.
Ele não era contra manifestações, longe disso, mas era maçante ter todo dia meia dúzia de pessoas gritando em seus ouvidos, durante o almoço, sobre a importância da preservação do sapo ou da substituição da gasolina por etanol.
Assim que adentrou ao local, caminhou até a mesa que Claire e ele dividiam desde sempre. Ela já estava lá, o caderno de química abandonado e o aborrecimento estampado no rosto.
- Qual é a de hoje? - inquiriu ele, jogando-se na cadeira mais próxima.
- A falta de lixeiras na cidade. – Claire respondeu, com um tédio assumido - Algo como ter somente uma lixeira para todo o quarteirão e como isso afeta a poluição e a constância de enchentes. - ela mostrou o papel de reivindicações do grupo e vendo a cara de interrogação do melhor amigo, explicou - Esqueci meus fones de ouvido.
Ele assentiu, sorrindo. Era esse o motivo de todo o conhecimento dela sobre o tema da vez.
- Por sorte, eu trouxe. - ele exclamou sorridente, retirando o salvador de suas vidas da mochila.
- Você não vai colocar esses fones – a voz dela interrompeu a troca de sorrisos entre os dois melhores amigos. não pode reprimir um bufo. Ignorando-o, ela continuou: - Estamos lutando por uma melhoria na qualidade da sua vida e você nem ao menos demonstra respeito? O que diria...
Ele interrompeu o discurso apelativo de :
- Quero ver quem vai me impedir! – desafiou - Você?
- Sim, eu mesma. – ela assentiu com um sorriso sonso, a raiva tomando-lhe todos os poros – Arranco-os do seu ouvido e, se não for suficiente, destruo cada maldita antena de rádio da cidade! Mas você não vai ignorar minha causa... – ela negou com a cabeça e a imagem daquela o fez ter medo. Aquela era a metonímia de bruxa.
- Ei, tudo bem. – ergueu as mãos, um tanto assustado com a reação exagerada. – Eu não ignoro o seu trabalho, você não ignora o meu. – sugeriu ele – Não falte ao ensaio hoje!
Ela bufou, mas deixou a vergonha e a surpresa avermelharem suas bochechas. Por pouco tempo, porém.


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Ainda 8 de abril de 2014



Não era tão simples para comparecer ao teatro. Eram muitas as variáveis. Claro, ela nunca gostara de peças e simplesmente odiava o fato de musicais não terem sentido algum. Estava cansada depois de uma noite mal dormida e tinha várias manifestações para organizar também. Mas era muito mais do que essas desculpas.
O teatro alugado distanciava-se da escola por vinte minutos e ela não tinha ninguém para oferecer uma carona a ela. Momentos como esse quase a faziam se arrepender de sua opção de não ter um carro próprio, mesmo com inúmeras propostas de sua mãe. Todavia, a cena do carro capotado vinha a sua cabeça e ela voltava a ficar convicta de sua decisão.
Um pouco mais de seis anos atrás, fora acordada por uma mãe chorosa e desesperada. Elas saíram de casa correndo, com a recém-adolescente confusa e ainda de pijamas. Chegaram a um local repleto de carros de polícia e ambulâncias. E viram entre eles uma lataria revirada, o Mercedes, sonho de consumo de seu irmão, completamente reduzido a aços amassados.
Ela não era próxima ao irmão: tinham doze anos de diferença, moravam à uma hora de distância um do outro e não compartilhavam do mesmo pai. Ela mal se lembrava dele, não mais que algumas curiosidades: a dupla covinha que ele tinha, a mania de colecionar moedas antigas e suas intermináveis crises de rinite toda vez que cruzavam com o gato da velha vizinha.
Mas, quando o carro dele foi atingido por um caminhão e capotou, o coração dela igualmente capotou. nunca fora capaz de esquecer aquela cena de destruição. E cada vez que ela simplesmente cogitava a ideia de segurar no volante, os piores minutos de sua vida voltavam com tudo, fazendo um remoinho em sua cabeça.
De alguma maneira, ela se viu em um protesto pelo cumprimento das leis ambientais dois anos depois da morte do irmão. Vitimado por um motorista bêbado no exercício do trabalho, tomou a responsabilidade para si e convenceu-se de que precisava lutar contra as injustiças. Era uma causa nobre, afinal, e ela tinha um mártir.
Suspirando, ela resolveu andar. Tentara voltar para casa e solenemente ignorar o ensaio, mas uma ligação de sua mãe foi suficiente para que desistisse da ideia e enfrentasse o grupo de teatro do qual, segundo a matriarca, agora fazia parte. Estava um dia ameno de primavera, as tulipas amarelas dando uma nova beleza a cidade. Embora tivesse que andar muito, ela podia traçar uma rota alternativa pela região do Inner Harbour e se alegrar ao ver os históricos navios da Marinha Americana ali aportados.
Fez tudo aquilo enquanto recebia o tranquilo vento perfumado. Instantaneamente, melhorou seu humor. Um passeio por sua cidade natal, a acolhedora Baltimore, sempre fora o melhor dos remédios para ela.


-*-


11 de abril de 2014



Cento e trinta e cinco segundos. Esse fora o tempo que ela conseguiu passar despercebida, escondida atrás da cortina do palco. Estava atrasada pela segunda vez naquela semana e não tinha boas lembranças do dia anterior, quando uma sorridente adentrou ao espaço duas horas mais tarde do que o combinado. Os artistas estavam ensaiando as marcações enquanto se alternavam em aquecer a voz, acompanhados pelos sons de piano da professora de teatro. Mas, no instante em que a viram, todos, sem exceção, pararam o que estavam fazendo e começaram a dar broncas na garota. Desde e sua mãe, até um ser estranho com cinco cores no cabelo. escutou tanto que até dor de cabeça sentiu. A substância tranquilizante que o caminho liberara teve, assim, seu efeito cortado drasticamente.
Agora, lá estava ela, atrás da grande cortina preta, à espera do momento ideal para tornar-se vista, de modo a parecer que sempre estivera por lá, somente oculta entre as várias pessoas do grupo. Era um plano muito bom. Eles estavam produzindo o cenário e os figurinos, dando pitacos ocasionalmente e cantarolando a música principal do musical. podia facilmente andar até o cabide de roupas mais perto e fingir estar à procura de um tecido qualquer e, pronto, estaria lá desde as duas da tarde, o horário no qual ela nunca conseguia chegar.
Observando as cabeças abaixadas e as mentes concentradas, ela decidiu ser aquele o segundo perfeito para avançar no plano. Na ponta dos pés, finalmente pisou no palco, decidida a ir até um vestido vermelho. Não dera mais de dois passos, porém, antes de ter seu braço direito agarrado por uma mão forte. Sem controle algum, já que não tinha força em comparação aquele sujeito, deixou-se ser empurrada de volta às cortinas.
, não satisfeito, prendeu entre a parede e o corpo dele, mantendo-a encurralada. Somente então falou:
- Você sabe as regras: dois atrasos e você está fora.
A mulher arregalou os olhos. A simples possibilidade de sair do grupo de teatro a assustava mais do que cantar para 500 pessoas. Nunca sua mãe estivera tão feliz por aplicar um castigo. Todo dia perguntava a filha sobre as novidades e era nítida a ansiedade em seus olhos. Era impossível prever o que a pseudo cantora faria ao receber a notícia de que a filha perdera a chance de mostrar seu "talento" vocal, mas, com toda certeza, a decorrente ação seria bem pior comparada a algumas tardes perdidas no ensaio do musical.
- , fala sério! – ela fez uma careta e colocou as mãos na cintura, deixando os cotovelos baterem no braço do rapaz de propósito.
- Pode começar o discurso dramático, . Eu não tenho a facilidade burguesa de ter um carro, assim como a maioria das pessoas, dependo do transporte público ou dos meus pés. – ele imitava a voz da mulher e o fazia tão bem que a deixou irritada.
-Merda, ! - ela xingou. Logo depois, suspirou. Ter ou não carro não era uma questão de renda, não pra ela - Você sabe que não é isso!
- Não? - ele inquiriu retoricamente e então elevou sua voz, visivelmente tão irritado quanto ela - Tudo com você é assim. Qualquer coisa é desigual, injusta e você, a porra da salvadora do mundo, precisa falar mal, contestar, protestar. Nada é bom o suficiente para a miss Perfeita!
Ele não estava falando do atraso. Há muito o tema da discussão havia se tornado mais profundo, fruto de anos de pensamentos íntimos, discussões mentais e fúria interna. Eles se conheciam desde a primeira hora de vida de , o mais novo deles. Eles não gostavam um do outro há anos. Mas , falava e xingava e protestava. Ela exteriorizava seus sentimentos, principalmente os ruins. , tímido, não. Encolhia-se e, escondido, escrevia. Guardara os rancores por anos e anos, até aquele surto. Aquele momento no teatro alugado, atrás daquelas cortinas, tão perto um do outro, suas peles se tocando, suas raivas tornando-se palpáveis.
Ele sabia que o desabafo não era sobre o incomodo atraso, não ligava. Ela também sabia e seu coração apertava por isso. Como uma pessoa como podia nutrir tanto ódio? Ódio por ela?
Ela queria mandá-lo para a puta que pariu. Todavia, controlou-se:
- Qual o seu problema? – ela, ainda sim, não pode deixar de aumentar a voz – Você sabe o motivo de eu não dirigir. – ela justificou-se, voltando ao assunto do segundo atraso. Ao menos tentando.
- Eu sei, . – ele respirou fundo antes de continuar – Sei que seu irmão morreu e você sabe que eu sinto muito por isso. Sinto muito por você e pela minha tia, obviamente, mas por mim também. Eu adorava o Joshua. – não pode deixar de sorrir ao pensamento – Ele me ensinou tudo que eu sei de basquete e se estou na equipe da escola hoje, é porque ele perdeu suas tardes de adolescência me ensinando fundamentos. Um garoto de cinco anos de idade – ele suspirou, fechando os olhos – Deve ter sido uma chateação para ele, mas foi importantíssimo na minha vida. E eu nunca o agradeci por isso – esboçou um sorriso triste.
Ela sorriu. Não pode deixar de fazê-lo. O garoto a odiava, como tinha admitido à beira do nervosismo segundos antes, mas estava declarando sua admiração ao irmão dela. E Joshua era seu ponto fraco.
- Fico feliz em ouvir isso. – respondeu sinceramente.
Ele sorriu e finalmente tirou suas mãos da parede, deixando-a livre. Não que ela fosse a algum lugar.
- Você não entende o quanto essa situação – ele sinalizou para o palco e os artistas compenetrados nas tarefas – é igual a mim e seu irmão, anos atrás? – vendo o silêncio dela, continuou – Você é Joshua, uma vida ocupada e milhares de coisas interessantes para se gastar o tempo. O grupo de teatro sou eu, o garoto dependente e ansioso por cada tarde para evoluir mais e mais.
Ele a viu assentir, a mente processando a analogia. Então mordeu o lábio inferior, entendendo que talvez estivesse certo, afinal. Ele suspirou:
- Você sabe da falta de interesse dos estudantes, as vagas que sobram e a verba que falta... , o grupo de teatro precisa de você.
- Eu... – vendo que a garota ia contra argumentar, emendou:
- Eu já ouvi você cantando e, prometo, você é melhor que a sua mãe!
- Isso não me tranquiliza nem um pouco. Treze vezes, , treze vezes rejeitada no The Voice. – eles riram.
- Seja o que for, dê no que dê, o mais importante é que estaremos todos juntos.
Nessa áurea amistosa, sorriram e cruzaram os dedos das mãos.



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20 de maio de 2014



Nas últimas cinco semanas antes das férias, participou de todos os ensaios, chegando sempre minutos adiantada e disposta a ajudar. Depois da discussão, seguida de reconciliação, com , com as palavras dele ainda martelando em sua cabeça, não podia ter qualquer outra reação. E, seguindo os compromissos, por Joshua e por , surpreendentemente não se sentiu mal, entediada, desperdiçando tempo de sua vida. Não. Ela se sentia feliz em compartilhar as tardes com aqueles aspirantes a atores e cantores, que pouco a pouco foi conhecendo e admirando.
Mas as férias de verão saudaram a todos rapidamente. A apresentação do musical seria só em agosto, uma semana antes do novo ano letivo, e os ensaios de férias foram marcados para três vezes na semana.
tentara mostrar-se chateada pelo impedimento de viajar, enquanto o amigo de infância era gentil em lhe levar para casa. , todavia, sabia que era só pose. Notara a mudança da garota, o sorriso que se fixara em seu rosto. Ela estava participativa, alegre e, principalmente, protestando a cada momento, a maior marca de interesse quando se trata de . Além disso, a mãe dele lhe contara, depois de fofocar com a mãe da , que a garota chegava em casa entusiasmada, expondo as novidades e a ansiedade do espetáculo.
- Corta essa, . Eu sei que você está adorando.
- Talvez - ela deu de ombros - Mas nunca admitirei.
Ela soltou uma risada curta, tão natural que o rapaz tivera que desviar o olhar do trânsito tranquilo de Baltimore por um instante para observá-la.
Aquele gesto reavivou pensamentos esquecidos. Durante toda a infância ele fora fascinado pelos cabelos de . As cascatas que caiam pelos ombros dela, o ínfimo voo dos fios toda vez que um vento flutuava no ambiente. Era bastante gay, se deu conta, mas com seis, sete, oito anos era uma das imagens mais lindas para ele.
Ele fora acostumado a isso. Todo dia com a companhia dela e, depois, quando ela ia embora, sua mãe falando em seu ouvido o quanto era bonita, gentil e meiga - por mais estranho que pareça anos depois, ela era meiga naquela época. - e como eles formavam um lindo casal. Então, eles se casariam logo depois da formatura, ele ascenderia como jogador da NBA e a mulher como uma famosa cantora.
Ilusões. As mães dos dois sonhavam alto. envergonhava-se cada vez que tinha que cantar no espetáculo e , apesar de gostar de jogar basquete e se divertir nas viagens das competições inter-regionais, sempre tivera o sonho de ser escritor. Publicar livros de aventuras, explorar o mundo mitológico, seus deuses e fadas.
Fadas. lhe pareceu como uma fada durante algum tempo, mas esse pensamento puro não sobrevivera ao longo dos anos. Ao contrário, começara a imaginá-la como uma bruxa. Não como uma bruxa horrorosa, repleta de verrugas, a personificação da maldade. Não. Era uma bruxa poderosa e sedutora, tão bonita quanto má.
Claro que ela não era realmente má, como pudera confirmar nas últimas semanas, mas colocá-la nesse posto facilitava sua cabeça e coração.
era linda. O rosto, com as bochechas rosadas e os cílios longos; o corpo, com suas curvas perfeitamente distribuídas; o sorriso; tudo sempre lhe encantara. Porém, nos últimos dias, o que mais chamara atenção de , curiosamente, foi o vinco na testa e as caretas quando reclamava.
Era loucura, mas o rapaz ansiava em lhe ver brava, revoltada. Por isso, a incitou:
- Sinto muito pelos pinguins do Ártico. Estão morrendo pela falta de suas manifestações. - declarou irônico.
Por conta dos ensaios e do empenho em sua personagem do musical, não tivera tempo para organizar tantos protestos e se sentia mal por isso. , é claro, sabia.
- Você é ridículo. - xingou ela, cruzando os braços e emburrando a cara.
Exatamente como ele queria. não pode deixar de sorrir.



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01 de julho de 2014




dissera para mãe que não ia fazer aquilo. Não havia sentido algum: ele estava de férias e não era babá! Mas a mãe lhe encheu os ouvidos, derramando lágrimas no meio do discurso.
- Você sabe que ela é como uma filha para mim – ela exclamou.
E lá estava ele, uma hora depois, dirigindo até a casa de . Ainda estava raivoso, entretanto, principalmente por ser encaixado na história contra sua vontade, sem nem saber de toda ela.
Sabia somente que estava novamente em um castigo, recebido mais ou menos duas semanas depois do início das férias. Na ocasião, ainda estava cumprindo seu castigo anterior, por ser presa, e aprontara outra. Dessa vez, no entanto, a senhora se recusara a contar a ele o porquê. Ela desviava os olhos, fingia-se de ignorante sobre o assunto, mas sabia de tudo, só não queria contar ao filho.
Ainda sim, ela fez questão de pedir ajuda a ele. Segundo ela, não podia sair com os amigos ou fazer protestos. Na verdade, só estava autorizada a ir aos ensaios – com sua mãe levando-a – e a sair com , o que, obviamente, nunca ocorreu. Ela e ele mutuamente ignoraram essa opção absurda.
Mas então, na última segunda-feira, não compareceu ao ensaio. A mãe dela tentou, ameaçou retirar todos os privilégios, gritou, mas ela simplesmente continuou deitada na cama, de calcinha e sutiã somente, recusando-se a ir.
Sobrara para , o elo mais fraco, a vã tentativa de convencer a cabeça oca de que, independente de qualquer merda que ela aprontara, a qual ele estava completamente louco para saber, ela tinha se comprometido com o musical e o elenco.
chegou à casa de antes que seus pensamentos - e sua raiva - se aprofundassem. As casas deles eram bem próximas, como se pode imaginar pela amizade compartilhada entre as mães, e pouco mais de dez minutos eram suficientes.
Assim que o rapaz tocou a campainha, a porta foi aberta e ele recebeu um abraço caloroso da mãe de .
- Meu príncipe! - ela sorriu para o garoto e ele retribuiu. Ela sempre o chamava de príncipe e se justificava dizendo que o apelido fazia jus a : gentil, inteligente, bonito. E quem era ele para discutir a esses elogios?
-Oi, tia, tudo bem?
- Tudo mal, meu querido - ela fez uma careta - me desobedeceu de novo... Mas tenho certeza de que uma amizade com você irá colocá-la nos trilhos.
era encarado como um anjo pelas mães. Não que ele fosse totalmente inocente, mas ele tirava notas boas e deixava suas ações ilegais bem escondidas. Aí, em comparação com , a ativista reclamamona e rebelde, ele realmente se tornava uma pessoa extremamente boa.
- Vou lá encarar a fera... - o rapaz exclamou, apontando para as escadas. A mulher mais velha concordou com a cabeça e deu-lhe tapinhas nas costas para motivá-lo.
Enfrentar em seu ambiente de dominação não era fácil, mas fora escalado para forca e não tinha maneira de se salvar. Sabia que era inútil bater a porta, era típico de ignorar. Então deu a si próprio a liberdade de mexer na maçaneta e adentrar ao quarto. A mulher, entretanto, não estava lá, como pode observar depois de uma minuciosa busca. Só restava um lugar.
e podiam não ser próximos há anos. Não trocarem segredos e desejos. Mas suas mães faziam por eles. E sabia de tudo e qualquer coisa da mulher.
Sabia o quanto ela adorava The killers e torta de limão, como odiava futebol e churrasco. Sabia que sofrera muito com a morte de Joshua e sabia que muito do que ela era hoje - sua personalidade, sua aparência, sua força - era pelo irmão. Sabia que ela estaria no quarto dele.
Abrindo a porta desse, confirmou seu pensamento. Ela estava lá, na porta do banheiro, o rosto inchado e vermelho de chorar. Nas mãos, uma tesoura que tremia. No chão, tufos de cabelo.
A mente de ligou os fatos rapidamente e esse, entendendo a situação, não perdeu um segundo antes de avançar para cima da mulher. Ela, então, o notou e seus olhares se cruzaram. Ele segurou seus pulsos, impedindo-a de continuar.
- Que merda você está fazendo? - ele gritou.
Tivera que gritar. Ela estava cortando os cabelos! Aqueles lindos cabelos que ele adorava desde que se notara como gente. Os fios com o qual sonhava e suspirava. E ela estava simplesmente os destruindo!
- Essa pergunta é minha! - ela retribuiu o grito - O que você está fazendo aqui?
- Por que você está cortando seu cabelo? - ele a respondeu com outra pergunta.
- Não te interessa!
- É claro que me interessa!
Ele puxou a tesoura da mão de com força, escutando seus gritos de dor. Então, a empurrou até a cama e a deitou lá. A prendeu entre suas pernas e segurou seus pulsos em cima de sua cabeça.
Não sabia por que fizera aquilo, nem notou o quanto aquela posição em que se encontravam era sexual. Quer dizer, não no começo. Só necessitava de um pouco de controle, uma breve ilusão de que ele tinha algum poder ou influência sobre a mulher.
Mas olhando-a, com seus olhos arregalados de surpresa, e sentindo o corpo dela subir e descer pela respiração rápida, ele mesmo perdeu o controle.
Terminou com a terrível distância entre suas bocas e eles sentiram pela primeira vez o gosto um do outro. A confusão do momento diluiu na mistura de salivas. As bocas se debatiam, mostrando que o desejo era maior que as turbulências do coração.
mordeu os lábios da mulher, sedento por respirar, ansioso para voltar com sua língua e retomar aquelas maravilhosas sensações. gemeu baixo, o suficiente para fazer o rapaz grudar as bocas dos dois novamente num rompante.
As mãos dela foram para as costas do garoto, avançando por baixo do pano da blusa de . Reagindo ao toque, ele suspirou e apertou seu corpo ao dela.
Eles não pensavam no que estavam fazendo. No fato de se odiarem ou do fado, criado pelas mães, que carregavam. Sobretudo, não pensavam em coisa alguma... Só cediam aos sentidos, as reações involuntárias dos corpos, ao desejo que mal sabiam estar reprimido. Aproveitavam... A sensação de um corpo grudado ao outro, dos beijos trocados, dos suspiros...
- Oh! - Uma voz exclamou, fazendo o recente casal pular de susto e se afastar.
- Mãe! - a garota falou, enquanto ambos tentavam controlar os batimentos do coração.
- Desculpem, meus queridos. - a mulher pediu - Continuem! Continuem o que vocês estavam fazendo! - animou-se ela - É maravilhoso, maravilhoso! Preciso ligar pra sua mãe, , contar as ótimas novidades...
- MÃE! - dessa vez gritou e permitiu a ver uma coisa rara: seu rosto se avermelhando de vergonha.
- Não se preocupe, filha. – ela abanou as mãos e sorriu - Adorei saber sobre o relacionamento de vocês, apesar das circunstâncias. Nós sempre falamos que vocês se casariam um dia! - ela confidenciou, referindo-se a ela e sua melhor amiga. - Aliás, me deixa tirar um foto, porque ela não vai acreditar quando eu contar! Esperem só um momentinho...
E saiu a procura de um celular ou máquina fotográfica. , obviamente, desrespeitou a mãe e saiu da cama no instante em que a mais velha sumiu das vistas. Foi até a porta e a trancou. Então, virou para , que ainda estava meio atônito, e ordenou:
- Nós temos que sair daqui.


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Ainda 01 de julho de 2014, duas horas depois



Se contassem a que ao fim da tarde daquela segunda-feira, ele estaria na praia batendo papo com , ele riria e, obviamente, negaria. Também chamaria o vidente de maluco quando esse falasse sobre os beijos trocados e a fuga pela janela.
- Meu irmão tinha um esquema para nunca faltar às festas. - exclamou no momento em questão, antes de descobrir que Joshua era um cara muito esperto.
Por estarem no segundo andar, havia ajudas para a descida. Galhos de árvores, lençóis rasgados, tudo bastante discreto e confiável, já que mesmo depois de anos sem serem usados, não sucumbiram ao peso de .
Com medo de serem descobertos, resolveram sair de lá sem carro e simplesmente correram. Pela adrenalina tomando suas veias e a glicose voltada não para o pensar, mas para os músculos, eles se viram dando as mãos e sorrindo um para o outro.
As pessoas os olhavam, estranhando a atitude dos dois, e eles simplesmente não ligavam. Correram até se sentirem cansados. Então, pegaram um táxi e fizeram o motorista rodar por alguns quarteirões, pois não sabiam para onde ir.
- O aquário? – o taxista sugeriu, um pouco incomodado pela indecisão dos adolescentes.
- Não. Turistas demais – estavam nas férias de verão, afinal. Provavelmente metade das crianças da cidade estaria no local.
- A praia? Deve sair um lindo pôr-do-sol hoje – ele apontou para além do vidro, aonde o Sol brilhava. – É bastante romântico...
esbugalhou os olhos pela confusão do motorista. Não podia culpá-lo, todavia. Eles estavam de mãos dadas até segundos antes, compartilhando sorrisos. Ele abriu a boca para explicar ao motorista o engano. No entanto, falou:
- É uma ótima ideia. – exclamou somente.
E pelos mais de vinte minutos seguintes, eles eram um casal.

Eles saltaram do táxi e retirou os tênis rapidamente, ansiosa para tocar seus pés na areia. repetiu os passos da mulher, porém mais devagar. Praia não era um de seus lugares preferidos e a culpa era da areia, esses grãozinhos minúsculos que, de alguma maneira sobrenatural, entram até mesmo dentro de bermudas e cuecas.
- Não curto muito praia – ele contou a mulher, assim que se aproximou novamente dela.
- Eu sei. – ela olhava para o horizonte, mas desviou para observar o rapaz – Foi um dos motivos pelo qual eu aceitei a sugestão do taxista. – e sorriu presunçosa.
- Irritante! – soltou ele, subitamente raivoso. Mesmo depois de todos os acontecimentos da tarde, ela ainda adorava irritá-lo, não?
Ela bufou.
- Pode me xingar, . De verdade. - colocou a mão no ombro dele, como se o apoiando em um momento difícil. Completamente cínica. – Me chame de filha da puta, vai!
- Minha tia não tem absolutamente nada a ver com sua atitude. – ele respondeu, rejeitando a mão dela em seu corpo de pura birra.
não reprimiu um novo bufo.
- Me chame de puta, então.
Ela virou seu corpo para ele, diminuindo lentamente a distância entre os dois. Colocou, então, os dois braços na cintura dele e, ousada, passou o peito do pé na panturrilha do rapaz. Ele a encarou, respirando mais rapidamente. Embora odiasse areia, o atrito entre as peles dos dois, intensificado por ela, tornou o toque ainda melhor.
- Eu adoraria. – ela continuou, mas estava tão absorto nas sensações que não entendera o que a mulher adoraria. – Que você me chamasse de puta. – ela diminuiu o tom, falando-lhe em seu ouvido.
Era loucura ele estar arrepiado? Ou aquela voz sedutora era justificativa para o crescente desejo, pelo esquentar da sua pele, pela aceleração das batidas do coração? Ele não sabia. Só conseguia pensar em e ele... Se beijando, se tocando, se amando.
- Puta é uma deusa romana. Ela... – começou a explicar, mas não queria ouvir.
Avançou sua boca contra a dela, mais desesperado que da última vez, e a apertou contra seu corpo. Não tinha noção do quanto sentira falta do contato deles antes que finalmente ele se fizesse presente novamente. Mas agora... agora recordava-se o quanto era bom!
Surpreendente, era a única coisa que podia pensar. Tudo bem, ela incentivou o rapaz. Falou lentamente, aproximou seu corpo do dele, fez crescer pensamentos e sensações impuras, mas não imaginou que tivesse coragem para de fato agir. A agarrar. Não depois de já ter feito aquilo uma vez naquele mesmo dia. Ela imaginou a mente dele o castigando pela ação no quarto de Joshua, não que a mesma o encorajasse a fazer de novo.
Surpreendente também porque, além disso, era bom. nunca pensou que fosse realmente bom beijar . Criara uma imagem meio repugnante, pelas inúmeras propostas das mães deles. E não era absolutamente o que pensara. Ao contrário. Era intenso, gostoso... sentia seu corpo em chamas e não era o Sol o causador desse calor.

Demorou alguns instantes para que eles percebessem que o mundo continuava para além dos dois. A praia, vazia, não ajudava nessa questão, mas o som do celular fez-se presente para quebrar a bolha deles e se mostrou bastante eficiente depois de algumas tentativas.
- Merda. – xingou, afastando-se relutante de .
Merda? A palavra ecoou na cabeça da mulher, enquanto seu corpo era separado do corpo do rapaz. xingara! Ela mal conseguia acreditar. O que alguns beijos e a elevação local da temperatura podiam fazer a um homem, não?
- Alô – ele atendeu a chamada rapidamente, sem nem ao menos olhar o telefone. Tinha a pequena impressão de que não era a primeira vez que o celular tocava.
- Oi, lindinho da mamãe. está aí com você, né? Use camisinha, meu amor! – a senhora começou e somente de escutar as palavras da mãe ficou com o rosto corado. Essas mães eram realmente piradas.
- MÃE! – Ele gritou desesperado para que sua mãe parasse, embora não pudesse ouvir qualquer coisa. – Só pare, ok?
- , não tenha vergonha do amor! – ela o bronqueou – Nós estamos extremamente animadas com a notícia! – e um “sim!” animado de confirmação foi ouvido pelo garoto, mostrando que a mãe de estava junta com a dele. Logo, ela esclareceu: - Nós estamos comemorando o acontecimento do século!
Ele rolou os olhos. Aquelas mulheres transformavam um simples beijo trocado em uma declaração de amor e um futuro casamento! Também, o acontecimento reacendera a esperança que elas nunca haviam perdido. Ver os dois, que cantavam para todo o mundo o quanto se odiavam, em uma troca de carinhos fomentou em seus corações aspirações e desejos de e como um casal. E, a partir daí, elas pulavam de sonho em sonho.
Escutando sem paciência a mãe, olhou para . Ela estava emburrada, os braços cruzados abaixo do peito. Isso instantaneamente chamou atenção do rapaz. Com a regata justa que vestia, aquele gesto evidenciava seus seios e , diante da conversa entediante que tinha pelo celular, desviou toda a atenção para lá.
Ela percebeu rapidamente. E engana-se quem pensou que ela retiraria os braços dali e olharia para qualquer lugar diferente do rosto de , extremamente envergonhada pela situação. Não. Ela não era comum. Ela era a .
Despretensiosa, realmente retirou os braços dali, mas somente para usá-los como auxílio para retirar a blusa que cobria seu corpo. E, então, nem sabia mais o que sua mãe berrava em seus ouvidos, esquecera até mesmo que estava em uma ligação. Só olhou.
A pele descoberta da mulher fez seu corpo tremer. Somente o sutiã rosa claro o separava da visão direta dos seios dela. Ele fez menção de se aproximar, ansioso para tocar nela novamente, daquela vez mais feroz, ousado, disposto a retirar aquela maldita peça que o afastava do paraíso.
Mas ela não deixou. Sorrindo para ele, começou a andar em direção ao mar, embora de frente para , somente para provocá-lo um pouco mais. Ele tirou as duas peças de roupa que o incomodavam tão rapidamente que mal se dera conta. Mas o pensamento nada puro estava presente e ele sabia que quanto menos tecido para atrapalhar, melhor.
Correu atrás dela. A resistência adquirida nos treinos de basquete garantiu uma rápida chegada à garota. Segurou o seu pulso e simplesmente a puxou para ele, seus corpos batendo pelo impacto. Ela arfou, um pouco surpresa pelo movimento, mas virou o rosto quando ele tentou beijá-la.
- Não, .
- Não? - ele ignorou, tentando beijá-la novamente.
Ela estava sem blusa, ele estava somente de cueca, os dois em uma praia deserta. sabia que daquela vez não seria somente beijos. Então, resolveu parar, antes que fosse extremamente difícil fazê-lo.
- Não. - ela confirmou.
- Você... – ele a olhou, confuso e frustrado - Você provocou! Você tirou a blusa e agora está recuando?
Sim, ela tinha o provocado. Novamente. Ele estava falando no telefone e ela retirou a blusa com intuito de chamar atenção. Sim, era um jogo. Mas os personagens não podiam evoluir até o ponto que queria.
- Foi estúpido. - ela deu de ombros. Então, começou a afastar-se do mar, intencionada a pegar sua blusa e colocá-la de volta.
a fitou por alguns minutos, somente respirando e absorvendo o fora. Por fim, assentiu com a cabeça, achando a atitude de sensata. Alguns beijos, tudo bem. Sexo? Sexo é íntimo. E, pensando bem, se envolver com daquele jeito não era a melhor das opções. Quer dizer, estava sendo um baita dia, mas e depois? Eles tinham que conviver minimamente, pelo menos até o fim do musical, e drama era tudo que ele não queria.
O que era aquele dia, afinal? se perguntou enquanto via adentrar ao mar. Qual fora o momento que eles decidiram avançar de duas pessoas que não se dão bem para dois amigos coloridos? Ou eles ainda eram essas duas pessoas que não se davam bem, mas que decidiram se pegar ainda sim?
Mal percebeu, mergulhada em seus pensamentos, que sentara ao seu lado. Só se deu conta quando ele começou a falar:
- Por que você estava cortando o cabelo? - dessa vez, a pergunta saiu mansa.
- É... - ela suspirou profundamente - é uma longa história.
- Então é bom você a começar de uma vez. - retrucou ele.
Ela virou pra ele com um sorriso e jogou seu corpo para trás, deitando-se de barriga pra cima. Desse jeito, o sol batia diretamente em seu rosto e para se proteger ela teria que fechar os olhos. O que era uma perfeita desculpa para não olhar para .
- Recebi uma carta umas semanas atrás. Era uma locação de uma loja de conveniência. Passado do meu pai para mim.
- Seu pai? - se assustou a menção. Durante toda a sua vida, as poucas menções ao pai da não terminavam bem. A mãe dela chorava, então a mãe dele brigava com os dois pela curiosidade. nunca soube quem era seu pai e tão pouco teve a ambição de procurá-lo. Sua mãe sempre lhe dizia que ele as abandonou e que não merecia uma filha preocupada. Então ela não se tornava esse tipo de filha. Pelo bem da mãe, por respeito a ela, pelos anos que as duas compartilharam sozinhas - bem, com e a senhora .
- Sim. - fez uma careta. - Você sabe que, bem, eu não sei quem ele é. - ele assentiu.
- Então ele morreu e te deixou uma herança, é isso?
- Não. - suspirou - Eu não cheguei a falar com ele, mas o banco responsável pela transação disse que ele tinha interesse em me apoiar. Financeiramente, é claro. Nunca se quer me procurou.
- Então você foi procurá-lo. - ele completou a fala dela. Era tão típico de aquela atitude que ele tinha certeza que ela tinha feito exatamente isso.
- Sim. Contei umas mentiras para o banco, procurei um pouco na internet e achei onde ele morava. Fui até lá, mas desisti no meio do caminho até a porta. Ele tem uma família daquelas de propaganda de margarina. Uma mulher, três lindos e sorridentes filhos. Todos felizes, companheiros, na mesa do jantar. Eu simplesmente não podia... - ela fungou.
Ele afagou seu joelho em sinal de consolo. Aquele era um assunto complicado. Família sempre é. perdera o pai aos 15 anos e toda vez que via algum sortudo ao lado do pai, sentia seus olhos arderem.
- Ele tem um filho da nossa idade. - ela confidenciou depois de um momento de silêncio.
- Você está dizendo que ele traiu sua mãe? - inquiriu, já se sentindo puto com esse tal cara.
Ela sorriu forçado e sentou-se de novo, virando seus ombros para ele.
- Eu também pensei isso na hora. Mas então eu fui falar com a minha mãe. Eu estava irada e de repente tudo começava a se encaixar na minha cabeça: a raiva da minha mãe, o fato de que ela não queria que eu o conhecesse... Tudo de repente fazia sentido.
Ele assentiu, mostrando-se concordante com aqueles pensamentos.
- Mas minha premissa estava errada. Ele não traiu minha mãe. Ele traiu a mulher dele com minha mãe.
- Ah. - exclamou somente, um pouco surpreso.
- E ela sabia. Minha mãe, quero dizer. Sabia que era a outra. - ela desviou o olhar, a areia se tornando de repente a melhor das companhias - Na verdade, ela disse que ele a prometeu um CD e muito sucesso. Ele é empresário nesse ramo ou algo do tipo.
- Não julgue a sua mãe, . - ele pediu, fazendo carinho em suas costas. - Ela é uma pessoa maravilhosa.
- Eu sei, eu sei. Não estou julgando-a por isso. É o sonho dela e ela faria de tudo para consegui-lo, independente dos meios. Como Maquiavel. E a admiro por ser essa lutadora. - Ela sorriu - Mas a odeio por ter escondido isso de mim por tanto tempo! Por ter me afastado de meu pai, não ter me dado escolha.
- Ela queria te proteger. - argumentou o rapaz.
- Mas às vezes a gente tem que cair, sabe? Levar umas rasteiras para crescer. É assim que experiências são adquiridas.
Ele concordou. A mulher não deixava de estar certa. Mas mãe é mãe: faz mil besteiras pra proteger seu amado filho.
- E o que o cabelo tem exatamente a ver com isso? - ele retomou a pergunta inicial.
- Ah, sim. - ela riu - Minha mãe me colocou de castigo por procurar meu pai e esconder toda a história da loja de conveniência. Você sabe os termos do castigo, você sempre sabe - ele assentiu, rindo - Eu fiquei puta e decidi estragar meu cabelo. Desse jeito - ela apontou para o cabelo, esse bem curto e com um corte totalmente torto.
Eles riram.
-Não ficou tão ruim. Eu posso ajeitar pra você, se quiser.
- Desde quando você é cabelereiro?
- , eu faço teatro. – deu de ombros - No ramo do teatro, você tem que ser um pouco de tudo.
- Até stripper? – ela inquiriu brincalhona.
- Se o elenco precisar, claro!
Eles riram. Um silêncio amigável se instalou, até cortá-lo:
- Eu sempre tive vontade de saber que tipo de garota você é... – ela o encarou, tentando interpretar aquela pergunta. Ele continuou – Você sabe, para além da garota revoltada e debochada... Na cama. – ela arregalou os olhos, surpresa, e quase parou. Mas, como dissera, aquela dúvida o corroía, ao menos depois dos beijos e quase sexo. E o estrago já estava feito, não? – Você é clássica ou gosta de inovar?
- O quê? – ela falou somente, sem reação pela tamanha ousadia, essa que não era comum ao garoto.
- Você curte papai e mamãe ou prefere usar algema e chicote?
Se achava que a direção da conversa não poderia ficar mais escandalosa e indiscreta, a mulher se enganou. Definitivamente, ela estava envergonhada, a vermelhidão tomando conta de seu rosto pela segunda vez naquele dia. E nas duas ocasiões, vira. Vira rosar-se, como quase nunca o fazia, como poucos tinham visto até então.
Respirando fundo, ela resolveu contar-lhe a verdade. Para que, afinal, enrolar os dois em mentiras que dramatizariam suas vidas, tal como nos filmes? Não. A verdade era boa o suficiente:
- Sou virgem, . – ela sussurrou baixinho, olhando para os pés cobertos de areia.
- Ah, isso explica sua reação... alguns minutos antes. – Ela concordou. Ele tratou de ridiculizar o assunto e, de alguma maneira, aliviar o pesado cargo de uma confissão. – Percebeu a loucura que nós fizemos? Podíamos ter sido presos pelas faltas de roupa!
- , eu já fui presa exatamente por isso, lembra-se? – ela rebateu, não acatando o que deveria ser uma brincadeira para relaxar o momento.
notou, afinal, que era tempo para confidências e decidiu se abrir com a garota:
- Eu fumo. Cachimbo.
- ! – ela brandeou. Seu tom de voz subitamente mudou. – Você sabe que uma árvore é sacrificada para cada 300 cigarros? Você está acabando com o ambiente! Aumentando o aquecimento global, mudando climas ao redor do mundo!
- Ei, estava demorando, você e suas revoltas! – ele riu desdenhoso – É engraçado. Você está super preocupada com o meio-ambiente, mas foda-se a minha saúde, né?
- O meio ambiente não tem culpa por suas ações estúpidas. Você, ao contrário, é completamente culpado e maior agente delas. Você é bem instruído e sabe que faz mal, então por raios começa?
- Cale a boca, sim? – ele pediu, rancoroso - Pela merda de um instante na sua vida, pense realmente nos outros. Não nos pobres da África, mas na porra da pessoa que sempre esteve do seu lado!
- Você tem comida, educação, saúde e lazer e está reclamando porque clamo para que todos tenham o mesmo? – ela gritou, irada, levantando-se abruptamente. – Eu não posso ficar mais um minuto perto de você.
Ela fez menção de se afastar, mas a segurou pelo pulso e a forçou a ficar e a virar-se para ele:
- Eu realmente sinto muito pela África: pela falta de alimento, pelas situações precárias, pelas doenças que matam milhares. E fico abismado ao ver o quanto o resto do mundo ignora o continente, como consideram esse descartável. – ele suspirou e soltou seu braço, confiando que ela não sairia correndo dali - Eu admiro o que você faz. Acho sensacional o fato de você lutar pelas causas que acredita, por empenhar-se tanto para acabar com as mazelas do mundo, por agir. Mas é demais. – respirou fundo. – É demais, . É por vezes exagerado, extremista e te afasta das pessoas que estão do seu lado.
Ele riu, somente para não começar a chorar. Girou o corpo 180º graus, vendo um único coqueiro ali, solitário. E continuou:
- Você é como aquele coqueiro. – ele apontou - Ajuda outros seres: plantas com abrigo, animais com alimentos. Mas está lá, sozinho, sem ninguém que seja realmente parecido com ele. – voltou-se para olhar para – Eu sei tudo de você. Dos seus castigos, dos seus protestos. Sei por que minha mãe me conta, mas também sei por que eu te conheço. Querendo ou não, nós convivemos durante toda a vida e eu simplesmente sei quem você é. Sei o que você vai fazer na situação x ou y.
Suspirou antes de continuar:
- Mas momentos como esse me mostram que essa identificação, esse sentimento, não é recíproco. Você não me conhece, você não sabe nada de mim. Você é tão focada em defender tudo e todos que você não sabe nada além disso. Você não se importa. – ela mordeu os lábios, segurando-se para não deixar as lágrimas cair. – Se isso fosse diferente, você saberia que meu pai fumou cachimbo por 32 anos. Que as maiores lembranças que eu tenho dele: da pescaria do mês, das viagens à montanha; sempre estão voltadas a uma mesma imagem: ele, sorridente, fumando cachimbo. Era seu símbolo. É especial para mim.
Agora, ela chorava. Debulhava-se em lágrimas de raiva e tristeza. Porque era uma completa idiota, porque tudo que falara tinha um fundo de razão. Ela era o que sempre mais lutou contra: egoísta. E sentia-se tão mal por isso. Desde a morte de Joshua, ela tinha as manifestações como seu ponto de equilíbrio. Se sentir melhor consigo mesma transferindo a culpa para todos os outros. Era tão sórdido... e ao mesmo tempo tão necessário.
- Eu sinto muito. – ela soluçou as palavras, tentando olhar para , mas tendo sua visão atrapalhada pelas lágrimas – Me perdoe, por favor. Pelo cachimbo, pelo Senhor e pelo meu egoísmo. Eu... Joshua... – mas ela não podia continuar, não quando chorava mais e mais.
- Está tudo bem, . – ele a trouxe para junto de seu corpo, abraçando-lhe acolhedor. – Você não precisa se desculpar, você não fez nada de errado. – ele afagou suas costas. – Eu entendo.
Ela ficou em seus braços por minutos, somente despejando lágrimas e se sentindo culpada. Então, a colocou na areia e secou o rosto molhado dela por diversas vezes.
- Você é tão fofo que machuca, . – ele riu com suas palavras e finalmente sentou-se no seu lado.
A natureza ocupou-se da função de melhorar o clima, afagar os sentimentos. A brisa mansa refrescava, o som das ondas do mar calmava os ânimos. O sol desaparecia pouco a pouco no horizonte e a noite lhes dava boas-vindas.
- Então, o que vai fazer com a locação? – perguntou o rapaz, do nada, quebrando o silêncio e voltando ao assunto pai desconhecido e loja de conveniência.
- Eu acho que você sabe a resposta disso. – ela lhe deu um mini sorriso. Ele retribuiu.
É, ele sabia. Ela iria vender e doar o dinheiro para ONGs. Ele tinha certeza, ele a conhecia.
De repente, encostou seus lábios no dele. Sem pensar muito, somente no impulso do momento. E se afastou. Ele sorriu e segurou seu queixo, a puxando levemente de volta.
Antes de fecharem os olhos, entretanto, sentiram algo incômodo em suas vistas, mas a confusão mal teve tempo de amontoar a cabeça deles. Logo, um grito foi ouvido e eles viraram para o som. Era Claire correndo pela areia com os chinelos em uma mão e uma lanterna laser na outra mão apontando diretamente para o rosto do casal.
E tão rápido quanto o clima se fez, ele se quebrou.


-*-



02 de julho de 2014



Algumas vezes decisões erradas são tomadas. O calor do momento, seja ele moldado por alegria ou raiva, limita os pensamentos. Não se pensa duas vezes e, então, age-se. Se soubesse que o simples fato de abrir o celular durante a corrida de táxi e mandar uma mensagem de não mais que cinco palavras para a melhor amiga teria como consequência o fim abrupto do dia passado com , ele não teria feito. E eles teriam se beijado inúmeras e inúmeras vezes mais.
Mas ele fez. Avisou a Claire que estava sendo arrastado para a praia e praticamente suplicou que o resgatasse. No momento em questão, ele estava feliz, mas confuso. Beijara e não sabia o que pensar sobre. Ter horas ao lado dela, sozinho, não parecia uma boa coisa. E ele odiava praia. Parecia uma boa ideia pedir ajuda à amiga.
Todavia, ela não respondeu a mensagem. Ele conferiu ainda no automóvel e notou que havia sido ignorado. Claire podia estar estudando, ou estar com a família, ou até em um encontro. Depois, ele simplesmente esqueceu. Com toda a turbulência dos beijos e das peças de roupa jogadas na areia, além do papo amigável com a mulher, ele realmente não se lembrou de que havia, horas antes, escrito para Claire uma mensagem de socorro.
Consequentemente, era o único culpado pela quebra do clima e o fim do dia especial. E se sentia extremamente raivoso consigo mesmo, mas também com a amiga. Afinal, o que foi aquela cena dela? E ainda muito tempo depois do pedido!
Por isso, ele a chamou para tomar um sorvete e conversar um pouco. Dessa vez, ela respondeu prontamente a mensagem e eles se encontraram minutos depois em uma galeria. Serviram-se de sorvete, misturando os sabores de suas preferências, e sentaram para comer.
- Estou esperando seu agradecimento, hein! – Claire falou sorridente.
- Como? – ele inquiriu, confuso. – Por quê?
- Pelo salvamento ontem, óbvio. – ela o encarou, mostrando-se estarrecida – Você quase beijou ! Te salvei da maior burrada de sua vida. De nada! – e sorriu.
- Menos, Claire. Era só um beijo.
- Só um beijo? – ela riu, irritada – Você já esqueceu que a odeia, é?
- Eu não a odeio. – ele suspirou – Nós tivemos alguns desentendimentos, sim, mas ela é uma pessoa legal.
Claire bufou.
- Quantas peças de roupa ela tirou para te fazer mudar de ideia? – lançou a mulher, maldosa.
- Claire! – ele gritou, a repreendendo - Qual o seu problema?
- Quem está com problemas aqui é você, . - Ela bufou.
A mulher remexeu no sorvete, tentando distrair sua mente. Estava confusa. Tudo estava bem entre ela e até ontem. Então, de repente, a mensagem, a visualização dessa somente horas depois e a ida a praia. A cena que vislumbrou lá a assustou. Definitivamente não esperava aquilo.
e tão pertos um do outro, dividindo carícias, exalando desejo... Somente a lembrança a fazia tremer. Sua reação, entretanto, fora extrema e imediata. Agora se arrependia da histeria que não lhe era comum, mas na hora pareceu-lhe uma ótima ideia jogar o laser na cara dos dois.
Eles iam se beijar. Iam se beijar! E ela simplesmente não parava de pensar nisso. Gostava de e o sentimento parecia ter crescido exponencialmente desde o acontecimento. Ela devia contar a ele.
- Vocês se beijaram ontem? - a frase que saiu da boca da mulher não era exatamente o que tinha em mente. Iria lhe contar, sim, sobre a paixão, mas precisava saber disso antes.
encarou Claire e deu de ombros na tentativa de se manter indiferente. Na verdade, queria gritar para o mundo que sim e rir consigo mesmo, mas era um exagero que ele não ia cometer.
- Algumas vezes.
Ela respondeu com um suspiro:
- Então de nada ajudou minha chegada?
- Só quebrou o clima - ele abriu um sorriso forçado - Olha, desculpa, eu sei que é minha culpa. Eu pedi sua ajuda e você, como grande amiga que é, foi me socorrer. Obrigada por isso. Eu só... Só mudei de ideia ao longo da tarde.
Ela assentiu e eles se silenciaram, deixando suas mentes trabalharem a todo o vapor. Claire sabia que tinha que contar. Afastaria a vergonha e timidez. Com , a perda de se tornava real e ela precisava ao menos tentar ter o rapaz para si.
- Você perguntou qual era o meu problema. Bem, eu tenho muitos... - ela começou.
- Eu não quis dizer realmente aquilo, Claire. - interrompeu .
Ela assentiu, mostrando que sabia disso.
- Eu sei. Só me deixe terminar e facilite as coisas para mim. - ele concordou, embora tivesse entendido muito pouco do que ela queria dizer. - Você é um dos problemas.
– ela bateu suas unhas na mesa, nervosa. – Na verdade, o fato de eu gostar de você pra caralho.
- Não acho que entendi muito bem... – murmurou, ficando subitamente nervoso.
- Ah, você entendeu. – ela o encarou e suspirou – Eu sou apaixonada por você desde que entrei na escola, dois anos atrás. – desabafou, recorrendo ao lábio inferior como apoio e o mordendo por isso – Nunca tive coragem de contar, mas eu tinha que tentar agora. Você sabe, antes de você se envolver por completo com . – ela deu de ombros – Ver se eu tenho uma chance.
Isso o chocou. Claire gostava dele? Ele nunca tinha pensado nela desse jeito. Ele a achava bonita e gostava do sorriso e da companhia dela, mas ela nunca chamara atenção dele daquele jeito. A amizade era infinitamente melhor para eles, pensava.
- Você é minha melhor amiga, Claire – ele confidenciou a ela.
- Mas... – ela falou, sentindo que viria uma frase adversativa logo depois.
- Eu não sinto isso por você. – ele disse cautelosamente, tentando aliviar o peso do fora. Ele já havia levado alguns desses e sabia que a sensação não era nada boa.
Ela assentiu lentamente com a cabeça. Ela tinha esperanças de ficar com , de ter seu sentimento compartilhado. No fundo, entretanto, sabia que nunca tivera chance. Ela contra era uma competição desigual, afinal.
- Você é completamente louco por ela, sabe? – ela comentou, forçando um sorriso.
Aquilo era inegável. O olhar do rapaz brilhava depois do dia anterior. Ele sorria bobamente, sem motivo aparente. Estava feliz. E era por causa de .
- Estou começando a descobrir isso.


-*-



12 de julho de 2014




- Mãe, você não tem salão, né? - inquiriu, de repente entendendo que a mais velha somente dera uma desculpa para levá-la ao ensaio.
Depois de passar o dia com na praia, alguns dias antes, a mãe a liberara do castigo e ela voltou a ir aos ensaios. Dessa vez, sozinha. O que, aliás, era ótimo, porque sem a mãe dela como apoio, a senhora era somente a profissional professora de teatro. Com a amiga, entretanto, elas se transformavam em duas entusiasmadas e passionais mulheres. Perigoso o bastante para e .
Essa última, entretanto, na pressa de chegar no horário, aceitara a carona da mãe, que teoricamente iria para o salão de beleza ali por perto. Só que, obviamente, tinha sido somente uma desculpa para ir ao teatro sem escutar reclamações da filha.
- Ah, querida! Eu sabia que você iria protestar caso eu falasse a verdade... – a garota bufou em resposta.
- Provavelmente porque tenho a impressão de que você me matará de vergonha.
- Nada disso, filha! – a mãe exclamou, um tanto chocada pelo pensamento da mais nova.


-*-



Ainda 12 de julho de 2014 – Alguns minutos depois



- Meu príncipe! – a mãe de falou, abraçando . - Vocês formam um casal tão lindo! - ela suspirou, segurando as mãos dos dois e as cruzando. - Nós sempre dissemos né, amiga?
- Certamente, amiga! - a senhora respondeu sorridente.
Uma nunca chamava a outra pelo o nome, somente usavam a palavra amiga. Segundo elas, era porque eram jovens e antenadas. Somente para elas mesmo. As duas falavam tão alto que não demorou para que as outras pessoas presentes começassem a sussurrar:
- Vocês estão namorando?
- Que incrível, parabéns pombinhos!
- Eu sempre achei que vocês tinham fogo um pelo outro!
Os adolescentes do elenco falavam e o teatro virou uma confusão de murmúrios. O tal casal ficou parado, somente absorvendo as informações. Todo mundo da escola saberia da falsa notícia em breve. Atores não eram exatamente os mais discretos.
Eles queriam desmentir, mas mutuamente e também silenciosamente decidiram que não. Sabiam que assim que negassem, as mães retrucariam sorridentes sobre o caliente beijo no quarto de Joshua e uma tarde fora e então as novidades se tornariam mais apimentadas e polêmicas. Acredite, poderia ficar pior.
Pouco a pouco, as pessoas se acalmaram. A primeira exaltação de surpresa passou e o ensaio ocorreu sem problemas. Algumas vezes as mães se excediam e suspiravam pelo casal, mas nada extremamente vergonhoso. Não mais do que eles estavam acostumados.
Duas horas depois, a senhora dispensou os alunos e , morta de fome, foi até a mãe:
- Podemos ir a uma lanchonete? A gente almoça alguma besteira por lá.
- Oh, , não vai dar. - Ela deu um rápido abraço na filha. - Eu e a vamos sair, compraremos as roupas para o casament...
- Amiga! - a outra chamou, interrompendo-a. - Assim você vai assustá-los... Não liguem para isso, meus queridos, só vamos aproveitar as promoções de verão. Não queremos apressar nada...
- Vou ignorá-las. – exclamou, obtendo apoio da , que concordou com a cabeça.
- Bom menino! – a mãe exclamou, jogando a bolsa no ombro – Agora vá levar para comer alguma coisa e depois para casa, sim?
Ele assentiu obediente.
- Se comportem! – a mãe da menina adicionou com um sorriso malicioso no rosto.


-*-



- Meu próximo protesto vai ser sobre isso. – a garota confidenciou a , mostrando-se indignada.
O rapaz levantou o olhar do celular, ignorando momentaneamente a preocupação com a falta de respostas de Claire para entender do que reclamava daquela vez. Eram tantas reclamações sobre absolutamente tudo que às vezes se perdia.
Ela apontou para o hambúrguer em sua mão, mas não entendeu.
- Está ruim, é isso? – tentou ele – Posso pedir para trocar.
- Não! – ela rolou os olhos e deixou o hambúrguer na bandeja. – Propaganda enganosa, . Esse hambúrguer é totalmente diferente do apresentado no anúncio.
- E daí? – ele deu de ombros – Nunca foi igual.
Dessa vez, ela bufou. Então, retirou o celular da mão dele, considerando esse uma distração para o garoto. Colocou no bolso de trás do short jeans e olhou para de novo, vendo-o com uma cara arrasada.
- Você é engraçado, . – ela começou – Diz que eu sou exagerada em meus protestos e não presto atenção em você.
- Em ninguém, você quer dizer. – ele retificou, ela exibiu a língua para ele em resposta.
- Que seja. Talvez você esteja certo. – ela revelou.
- Mas você nunca admitiria. – acrescentou ele.
- Exato. – eles sorriram um para o outro. – Mas agora eu tenho duas reclamações sobre você.
- Tudo bem, vá em frente. – ele se posicionou na cadeira, pronto para escutar.
- Primeiro: você reclamou que eu exagero em meus protestos. Bom, você, e boa parte das pessoas, não protestam nem um pouco. Só aceitam tudo que lhes é imposto. Um aumento na conta de energia? “Ah, que pena!” E paga. Ficam sabendo da destruição da Amazônia e pensam “do que adianta só eu fazer alguma coisa?” – ela soltou uma risada de revolta – Vocês estão acostumados a se conformar. “Se conforme com o hambúrguer, eles nos enganaram sempre mesmo!” E quem disse que não podemos mudar?
- Você tem razão. – ele concordou.
E ela realmente tinha. fez uma simples análise da sociedade, delatou indivíduos egoístas, incapazes e conformistas. E quem era para criticá-la, então, já que ele fazia parte desse grupo? Ao menos ela tentava.
- Eu sei. Segundo ponto: você disse que, como consequência do meu empenho nas manifestações, eu acabei por negligenciar minha atenção a você. Estou disposta a mudar isso! Estou em uma rede de fast-food, algo totalmente contra os meus princípios, sentada na sua frente e disposta a conversar amigavelmente! E você só fica mexendo nessa droga de celular.
- Essa máquina de alienação! – ele exclamou, brincando com ela. – Desculpe, você está certa. De novo.
Ela sorriu.
- Quer me contar o que tanto te incomoda?
- Não aqui.


-*-



- A vista daqui é linda. - exclamou, maravilhada.
a levou a uma pequena montanha onde se podia ver toda a cidade. O sol não estava tão forte aquele dia, tão pouco estava ventando. O tempo estava perfeito para o passeio e foi um dos motivos que fez escolher aquele lugar.
- Eu adoro esse lugar. Foi meu bisavô que descobriu. Meu pai me trazia aqui sempre. - sorriu pelas lembranças.
- Me fale sobre eles. - pediu.
Ele andou até , enroscou seus dedos no dela e caminhou até uma pedra. Era uma pedra conhecida por ele e todos seus familiares. Toda vez que algum deles ia lá, escreviam seus nomes e a data na pedra.
- Olhe. - ele apontou para o local e ela sorriu antes de se agachar. Pelas mãos unidas, o levou junto para o chão. Passou a mão livre pela superfície da pedra, sentido a textura danificada.
e Jenny. 8 de outubro de 2013.” Leu mentalmente a mulher. Então, o encarou:
- Quem é Jenny?
a fitou, vendo o vinco na testa dela. E adorou. Adorou o fato de vê-la ressentida e curiosa.
- Foi uma garota que eu me envolvi, ficamos juntos algumas vezes - ele mentiu, disposto a ver a reação de .
- Você trouxe outra mulher aqui? - inquiriu ela, mostrando-se surpreendentemente ciumenta.
- Hum... Sim. - ele respondeu somente, deixando a anedota rolar. Estava ansioso por saber até onde aquela história iria.
- Ah. - ela suspirou, notavelmente decepcionada, e parou de mexer na pedra.
tocou em um dos seus joelhos, chamando atenção dela e fazendo com que ela desviasse o olhar para ele. Um olhar chateado e tímido. Ela estava prestes a corar, ele percebeu. Ousado, subiu a sua mão, deslizando-a sobre sua coxa.
- . - ele sussurrou o nome dela lentamente - Jenny é minha prima de seis anos. Lembra que ela veio me visitar ano passado?
Ela sorriu. Tentou encobrir sua feição de felicidade ao saber aquilo, porque era um ciúme bobo, infantil e totalmente injustificável. Ainda sim, seu coração murchara ao saber da tal Jenny e o fato de ter trazido outra pessoa que não ela ali. Era um lugar especial para ele e para a família dele e queria ser especial também por ser levada até aquela montanha. Por isso, não pode deixar de sorrir a revelação sobre quem era Jenny.
- Não lembro, na verdade. - deu uma risada
- Você ficou com ciúmes... - ele proferiu lentamente, sua mão tocando a pele da mulher, avançando por dentro do tecido da blusa.
Uau. pensava. Ela se esquecera de que só parecia tímido, mas era na real bastante ousado. Seu rosto corava, ela tinha certeza. E não era só pelo fato de estar envergonhada, embora fosse uma parcela importante do por que. Ela também estava se sentindo quente. Cada ponto de seu corpo que era tocado por esquentava e os outros esquecidos gritavam silenciosamente para receberem atenção também.
- Talvez - ela finalmente respondeu, em um quase gemido.
deu um breve riso. Então, puxou a mulher pela cintura, a trazendo para mais perto de si. Os seios dela se chocaram com o tórax dele. O rosto ela mesmo tratou de aproximar. Antes do esperado beijo, ele ainda exclamou:
- Mas você nunca admitiria.


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Ainda 12 de julho de 2014 – Algumas roupas a menos




Ao levantar aquela manhã, fitou o dia nublado pela janela. Algumas nuvens, a fumaça das indústrias ao fundo poluindo o ar. Não havia nada de especial. Era mais um dia, como qualquer outro.
Algumas horas depois, entretanto, não parecia mais qualquer dia. Não depois da subida à montanha ou da vista. Não na companhia de . Não com sua blusa sendo arrancada de seu corpo com voracidade. Definitivamente não.
De repente, entretanto, não lhe importava mais o dia ou sua excepcionalidade. Tudo que ela conseguia pensar era em . Em seus toques em seu corpo e a reação produzida por isso. Nos beijos molhados e desesperados trocados entre eles.
Se já fazia calor em Baltimore, ali, desafiando as regras quanto à altitude, a temperatura era ainda maior. Os corpos de ambos pegavam fogo e quando se encostavam entravam em combustão.
De alguma maneira que não conseguia se recordar, a levantou do chão e a apoiou na porta do carro. As pernas da mulher foram parar na cintura dele e as unhas dela trabalhavam em marcar suas costas.
Ei, onde fora mesmo parar a camisa dele?
Ele atacou o pescoço dela e ela gemeu. Ele apertou seus peitos e ela gemeu. Ele roçou seu membro excitado perto da vagina dela e ela gemeu.
Nunca pensou que sua primeira vez fosse ocorrer daquele jeito. No banco traseiro de um carro, num fim de tarde, sem nenhuma programação, com . Mas ela estava lá, a relação entre eles evoluindo e simplesmente queria ir até o fim.
Ela foi jogada no carro e colou seu corpo com o dela. Todas as roupas já estavam perdidas pelo lugar. Eram só os dois: ardentes de desejo, de paixão, de vontade. Os minutos seguintes foram a concretização de todos os anseios.


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21 de julho de 2014




A campainha soou estridente pela casa. A mãe gritou para atender e ele correu até a porta, abrindo-a de supetão. Lá estavam e sua mãe. Essa, sorridente, tratou logo de abraçar o garoto e chamá-lo pelo apelido.
- Eu trouxe torta de limão, sua favorita! – ela exclamou para ele e esse agradeceu.
Então, ela entrou na casa, avançando pelo corredor em direção à sala e sumindo à vista dos dois adolescentes. chamou para dentro com um gesto e fechou a porta.
- Não sabia que torta de limão também era a sua preferida. – a garota exclamou, surpresa.
Era a melhor para ela e durante a discussão na praia ele havia contado a ela que sabia disso. , no entanto, não sabia das preferências dele e tampouco se interessou em perguntar. Ela realmente não sabia quase nada sobre ele.
Ele deu de ombros, encerrando o assunto. Pegou, então, a bandeja com a torta das mãos da mulher e seguiu para a cozinha. parou por dois segundos, meio indecisa sobre o que fazer. Ir a cozinha e ajudá-lo? Ir para sala e escutar as mães histéricas? A primeira opção parecia menos pior para ela, embora ainda fosse terrivelmente assustadora.
Ela perdeu a virgindade com . Aproximadamente dez dias atrás ela se entregara de corpo e alma para ele. Eles transaram uma, duas, três vezes aquele dia. Ofegaram, suaram, sorriram. Cansaram, conversaram, dormiram.
Mas no dia seguinte, e nos dias que se passaram até ali, nada mais acontecera. Tiveram alguns ensaios e eles se encontraram e cumprimentaram um ao outro algumas vezes, todavia, não rolou mais beijos ou algo a mais. Não houve sorrisos confidenciais trocados ou bilhetes românticos. Era como se nada tivesse acontecido.
E para , aparentemente, nada havia de fato acontecido. Nada mais do que um sexo casual.
O silêncio constrangedor invadiu o local e tirando alguns pedidos de talheres e pratos, nada mas foi dito. Alguns minutos depois, eles tinham quatro pratos com deliciosas tortas de limão. Foram para sala e entregaram um pedaço para cada mãe.
Na hora de sentarem para comer, viram-se lado a lado, já que o único assento disponível era um sofá de dois lugares. Provavelmente friamente calculado pelas mães para que o casal pudesse ficar junto.
A senhora limpou a garganta, desconfortável, e aprumou os ouvidos. Do que elas estavam falando, afinal? Repetiu a pergunta que ecoou na sua mente em voz alta.
- Ah, querido, queríamos que fosse surpresa. – a mãe confidenciou, chateada. Subitamente, entretanto, seu humor se inverteu e ela completou animada: - Nós vamos dar um almoço em comemoração ao namoro de vocês!
- Isso, amiga! – a outra confirmou e elas fizeram um high-five.
- Desculpem... o quê? – inquiriu, meio confusa. Ela estava concentrada comendo o saboroso e pequeno pedaço que cortou para ela quando palavras desconexas entraram em seu ouvido e a assustaram. Comemoração? Namoro?
- Sim, é isso mesmo, filha! – a mãe dela exclamou – Vou preparar comidas deliciosas e, é claro, a minha famosa torta de limão, um dos gostos que vocês dois compartilham...
- Vamos comprar balões de festa, muitas balas e confete para o bolo. Contrataremos um DJ, talvez aquele seu primo mesmo, e faremos discursos. – a outra acrescentou.
A boca dos adolescentes se abriam de surpresa e desespero a cada palavra falada pelas mães. Uma festa para algo que nem existia de fato? Sabiam, sim, que suas mães eram exageradas, mas envolver todos nisso? Elas criaram asas, eles deixaram. Elas começaram a voar alto e eles nada fizeram para impedir. E agora? Agora a situação estava fora do controle!
- Mãe, tia, por favor, nada de festas. Temos o musical, lembram? Muitos ensaios, muito cansaço. – tentou.
- Nada disso! Nós vamos dar um jeito, né amiga? – elas assentiram uma para outra – Fiquem tranquilos, vai dar tudo certo! E é bom, aí treinamos para a organização do casamento. Tratem de se casar logo!
deixou o prato de lado e cobriu o rosto com as mãos. Mas que merda eles haviam feito? Ressuscitando uma esperança, brincando com sonhos. Ela suspirou. , entretanto, não se lamentou. Não somente. Decidiu agir. Antes tarde do que nunca.
- Eu sinto muito... Nós sentimos muito, mesmo. Mas vocês precisam saber. – ele respirou fundo – Nós não estamos juntos. Não somos um casal. E não vamos ser. – revelou ele, exagerando nas negações e observando os olhos das mais velhas se arregalarem em reação.
- Não? – ele escutou proferir baixinho. Ela deixou a palavra sair de sua boca instintivamente.
Os olhares deles se cruzaram. Tão confusos, tão perdidos. Você gosta de mim? Você quer ficar comigo? Eles brilhavam em perguntas.
Mas então o som de choro desviou a atenção dos dois. Eles levantaram prontamente, cada um tentando acalmar sua mãe desestruturada. Embora elas parecessem, pelas lágrimas, as mais devastadas com a revelação de segundos anteriores, era o casal que sofria mais. E, pior, em silêncio.



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Ainda 21 de julho de 2014




Depois de um copo d'água, as mães se calmaram e pediram desculpas pela reação exagerada.
- Está tudo bem. - exclamou, usando as duas mãos para confortar as mulheres.
- Nós - a senhora começou, limpando o rosto molhado. - Nós assustamos vocês, né?
- Um pouco. - exclamou. - A gente se beijou uma vez e vocês planejaram o casamento! – desabafou.
- É. – a mãe de suspirou - Nós nos animamos. Sempre imaginamos vocês juntos e quando aconteceu, bem, nós perdemos o controle. - explicou.
- Mas entendemos o recado. E sabemos que erramos, certo amiga?
- Sim, amiga. - confirmou. - Não importa se vocês ficarão ou não juntos. Ficaríamos felizes se sim, é claro.
- Mas são vocês que têm que ser felizes – completou a outra - É isso que toda mãe quer para o seu filho. É a única coisa que nos importa.
Os adolescentes sorriram. Sim, eles tinham duas mães malucas e exageradas, mas também extremamente amorosas e especiais. E eles as amavam. Do jeitinho que elas eram. Assim como tinham certeza que aquele sentimento era recíproco.
- Não precisamos ficar juntos para formar uma família. – esclareceu, sorrindo em seguida - Nós quatro já somos uma.


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23 de julho de 2014




- Repita exatamente a merda que você fez. - a garota pediu, vendo o rapaz fazer uma careta de irritação.
- Claire! - brandeou. - Eu te procurei para me dar apoio.
Sim, era estranho conversar com Claire sobre . Tinha descoberto a pouco, afinal, que a amiga nutria sentimentos por ele. Ainda sim, precisava falar com alguém e ela ainda era sua melhor amiga. Surpreendentemente, ela aceitou muito bem o assunto.
- Eu sou sua amiga, não sua psicóloga.
Ele fingiu rir.
- Sempre tão engraçada. - ela revirou os olhos.
- Vamos aos fatos, . Você transou com . - ele assentiu - Você tirou a virgindade de - ele novamente concordou. Ela continuou: - Você não a procurou depois.
- Não. - meneou com a cabeça.
- O que você tem no lugar do cérebro? - ela exclamou exaltada. - Você a usou!
- Não! - ele retrucou - Só fiquei receoso de procurá-la depois. – deu de ombros - Virgindade é algo importante, né? Estava inseguro quanto a como ela se sentiu, como foi para ela.
- Você estava inseguro? - ela riu sarcástica e o encarou perversa - Você, , que já transou com metade de Baltimore?
- Ei! Isso é difamação. Quem dera...
- ! Foi a primeira vez da garota, você não acha que ela se sentiu insegura? Se perguntando como foi pra você...
- O quê? Foi bom para mim. - ele sorriu maldoso, as imagens voltando em sua mente. - Porra, foi foda!
- Literalmente - a garota completou e eles riram. - Por que não a procurou?
- Sei lá. - ele deu de ombros, bufando - Ela é tão cheia de si e... Reclamona.
- Reclamona?
- Sim. Protesta sobre tudo...
- Não acredito que você está com medo disso! - ela riu. Em seguida, deu-lhe um tapa no braço - Vá atrás dela e, dessa vez, faça as coisas do jeito certo.





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26 de julho de 2014



Era loucura. Ele tinha absoluta certeza disso. Mas ainda sim, estava disposto a continuar seu plano inicial. Seu carro estava lotado de tintas, faixas e cartazes e ele estava chegando ao teatro três horas antes do horário marcado.
Pouco a pouco, ele foi concretizando suas ideias e, ao fim, tudo estava pronto. Quando os primeiros atores começaram a chegar, se assustaram. Depois, riram. Então, adoravam.
Mas não ligava para os outros. Suas pernas tremiam, mas se recusava a sentar. Suava, nervoso, ansiando os minutos para vê-la adentrar ao recinto.
- Ela está vindo! - uma garota loira gritou.
Então ele pegou um dos cartazes, estendeu acima de sua cabeça e respirou fundo. Seu coração parecia que a qualquer momento iria parar, mas ele se forçou a esquecer de tudo e manter na cabeça. Assim, ele recordava que tudo aquilo valeria a pena.
Ao primeiro passo dela, ele começou a gritar estridente, com sua voz de indignação:
- Pelos nossos beijos, pelas nossas conversas, namore comigo! Namore comigo! Namore comigo!
Ele fez um pequeno canto ritmado e se sentiu extremamente ridículo. Tudo aquilo era, além de loucura, ridículo. A mulher riu, embora seus olhos arregalados demonstrassem a surpresa. Ele continuou:
- Namore comigo! Namore comigo!
E ela desviou o olhar para o resto do teatro, vendo todas as faixas e cartazes. Declarações pra ela:
Cada novidade sobre você me faz adorá-la ainda mais!
Cada momento com você é especial!
Quero você em minha vida!
E no cartaz em suas mãos: Namore comigo
Tudo aquilo, ela pensou, parecia com os protestos que ela fazia. As faixas e cartazes, o grito ecoado. Ela riu novamente. era completamente maluco.
Finalmente ele parou e sentiu que era a sua vez de falar. Só que não era tão simples. Sim, ele fizera um lindo protesto-declaração para ela, mas ele também a ignorara por dias. A fez se sentir mal e disse que eles nunca ficariam juntos para as mães. Por que mudara tão abruptamente? Ele estava brincando com ela?
- Não. - ela respondeu.
Os atores viraram plateia e soltaram murmúrios de descontentamento. Mas ela encarou e viu que no rosto dele não havia surpresa ou decepção. Não. Ele estava sorrindo. Como se nada tivesse acontecido, como se ela não tivesse dado o fora nele.
Ele caminhou lentamente até ela. Então, exclamou:
- Eu sabia que você ia responder isso!- ele soltou uma risada - Pela milésima vez, , eu te conheço.
Ela sorriu.
- Você me magoou, sabe? – comentou a garota.
- Eu fiquei assustado. Estava esperando você me procurar.
Ela riu.
- Você é uma menininha. – ele sorriu em resposta. Ela respirou fundo logo antes de voltar a falar - O que aconteceu entre nós foi... Importante para mim.
- Pra mim também.
- Não pareceu - ela rebateu, chateada.
- Me desculpe por aquilo.
Ela assentiu lentamente, absorvendo as palavras. Estava confusa. Um misto de irritação e alegria atacava seu coração. Gostava de , apesar de, segundo ele, pouco conhecê-lo. Divertia-se ao lado dele. Sentia-se protegida, amada, desejada. Os beijos e os toques entre eles a levavam para outro mundo.
Mas ele a deixara de lado por algum tempo, comportara-se como se nada tivesse acontecido. Como se ela fosse qualquer uma.
A questão era: o que pesava mais? Erros passados ou o sentimento futuro?
- Duplo ok. – decidida, falou.
- Duplo ok? – repetiu , nitidamente confuso.
Ela assentiu. Em seguida, acabou com a distância ainda existente entre os dois e apoiou suas mãos na cintura do rapaz. Fitou-o profundamente, observando as feições de seu rosto, sentiu sua respiração acelerada, tocou sua pele do quadril.
Simplesmente sabia que fazia o certo.
- Ok, você está perdoado. E, ok, eu namoro você.
Ela sorriu.
Sorriu porque odiava adorar aquele cara.
Ele sorriu.
Sorriu porque adorava odiar aquela mulher.



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7 de agosto de 2014 – O dia D




Cinco meses atrás, tudo era diferente.
dedicava 14 horas de seu dia em protestos, odiava musicais, era virgem e solteira.
tinha uma amiga mulher, nenhuma namorada, alguns sonhos de infância guardados.
Agora, eles são diferentes.
dedica somente 6 horas de seu dia em protestos, mas almeja a rápida chegada das horas livres para ficar com o namorado. Havia ensaiado durante meses um espetáculo, cantando e dançando e, surpresa, se divertindo.
tinha duas amigas mulheres, uma namorada e alguns sonhos de adulto para realizar.
Nem tudo era diferente.
As mães corujas ainda estavam lá, sorridentes, envergonhando os filhos ao gritarem seus nomes. E babavam pelo recente casal.
Mas eles estavam diferentes.
E a peça também.
Uma adaptação moderna de O fantasma da Ópera, com alguns ritmos tipicamente americanos e falas mais usuais. Sem deixar de ser maravilhoso.
Eles receberam aplausos e agradeceram. Depois de muito empenho, o musical chegara ao final, lindo e completo. Era o fim.
Mas, e daí?
Tudo na vida tem fim. Você começa e, daqui a pouco, fim. O sorvete, fim. O namoro, fim. Mas sempre há um novo sorvete, um novo namoro, um novo começo e um novo fim.
Aquele dia marcava o começo do fim. O começo do ano letivo, essencialmente alguns dias depois, que era o fim do ensino médio para eles. O fim daquela peça e o começo de outra.
O namoro? Esse estava no começo. Teria um fim? Certamente. Voltaria a um começo? Esperemos.
Eles não estavam preocupados com isso. Não.
Há pobres na África, diria.
Ela ainda não me conhece, rebateria.
E algum dia essa discussão teria fim?

FIM


NOTA DA AUTORA:
Sinceramente, eu espero que nunca.
E olá! Eu tenho tantas coisas para falar por aqui que simplesmente não sei por onde começar! Do começo, talvez, Bruna? É uma boa ideia. Nunca me imaginei participando de um challenge, ainda mais sobre musicais (coisa que eu odeio :O ), mas eu simplesmente gosto de desafios. E saiu isso! Tem alguns aspectos bem reais da minha vida na fic e algumas das características dos personagens são minhas – como reclamar de absolutamente tudo ;) – então acabou por facilitar a escrita.
Sei lá mais o que eu tinha que escrever aqui. Preciso mandar essa fic na próxima hora, então vou simplesmente agradecer a duas lindas pessoas: Primeiro, Thaís, que basicamente me escutou falar disso pelas últimas três semanas, em absolutamente todas as aulas – sem contar as conversas no WhatsApp – e lia no instante em que eu ia escrevendo! E a Nair, uma fofa que sempre estava alegre para ler e me deixava boba de elogios. Vocês têm lugar no céu, cats <3
Alguém aí quer lugar no céu em troca de comentários? Brincadeira! (risos)
Enfim, obrigada por lerem até aqui. Sei que vou me arrepender imensamente por finalizar essa nota sem dizer nem um quinto do que eu queria, mas sou rebelde e estou fechando-a mesmo assim.
Beijo, beijo! Comentem ;)


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