- PORRA, ! ANDA LOGO! – null gritou, começando a ficar impaciente.
Um segundo depois, viu o amigo se atirando para fora do prédio. null bateu o portão com força, correu até o conversível, atirou a mochila para dentro e pulou atrás dela, ignorando a porta. Os dois se entreolharam e sorriram, ambos igualmente animados.
- Vegas, baby! – null exclamou, dando partida – Bebidas, pôquer e mulheres. A vida não fica muito melhor que isso, null...
Dia 19 de junho. null e null estavam saindo de Oakland a caminho de Las Vegas. Tinham acabado de assinar contrato com uma gravadora interessada em sua banda. Como comemoração, nada mais justo que uma viagem a Vegas, agora que o mais novo da banda já tinha completado 21 anos. null já estava lá e null teria de ir depois, tinha prometido passar o Dia dos Pais em casa.
Por falar em Dia dos Pais, null tinha o mesmo combinado com sua família, o que era bem conveniente, já que a viagem de Oakland à cidade do pecado durava mais de 9 horas, e Bakersfield, sua cidade natal, ficava no caminho de Vegas. Portanto, para desespero de null, parariam em Bakersfield, passariam a noite lá e partiriam no dia seguinte.
- Hey, null... – null finalmente falou, depois de 20 minutos tentando reunir forças – Você tem certeza de que... que a gente precisa parar na casa do seu pai? – continuou, tentando soar indiferente – Quero dizer, quanto menos paradas, mais cedo a gente vai chegar em Vegas, e...
- null. - null o cortou – Olha, sim, minha irmã vai tá lá, mas, cara, pelo amor de Deus, faz dois anos, vocês dois precisam superar essa história! – continuou, meio impaciente. Não gostava de mencionar o fato de seu melhor amigo já ter tido um rolo com sua irmã.
Não tinha sido um rolo, exatamente. Para falar a verdade, null e null se odiavam. Até que um belo dia, numa mistura de namoros recém terminados, uma quantidade exagerada de vodka e strip pôquer, os dois dormiram juntos. A partir da manhã seguinte, a aversão se multiplicou de ambas partes.
O problema, no entanto, não era a noite que haviam passado juntos mais de dois anos atrás. O problema era a noite que haviam passado juntos alguns meses antes, que ainda não havia chegado aos ouvidos de null.
- Mas, null... – insistiu null, esforçando-se para achar outro argumento – Não é isso, cara, é... o seu pai... O seu pai! O seu pai simplesmente não vai com a minha cara, você sabe disso!
- "Simplesmente não vai com a sua cara"? – repetiu null, rindo – Ele te achava uma má influência pra mim... – gargalhou – E eu devo dizer que você não melhorou muito a sua imagem quando ele entrou no quarto da minha irmã pra dar bom dia e te encontrou pelado na cama dela. – null acrescentou, ficando sério de novo.
- Tá, que seja. O fato é que ele não gosta de mim e provavelmente não me quer lá.
- Verdade. – disse null distraidamente, enquanto endireitava o retrovisor – Mas ele nunca gostou, e isso não te impediu de passar dois terços da sua vida dentro da minha casa.
- Mas é que eu quero chegar logo em Vegas! – exclamou com a voz estridente. Era seu último recurso.
- null! Seriam mais de nove horas de viagem! Você quer dirigir durante a metade do tempo, por acaso? – ralhou null.
- Pode ser!
- Nem fodendo. Você dirige mal pra caralho. – disse simplesmente, ligando o rádio em seguida.
- Acorda, null. – null deu uma cotovelada no amigo – Tamo quase chegando.
null abriu os olhos e pôde reconhecer o bairro. As inúmeras casas com cara-de-família-feliz espalhadas pelas ruas de um típico subúrbio americano. Reconheceu a rua assim que null fez a curva, e sentiu seu estômago afundar quando o carro parou em frente à casa que conheciam tão bem.
- null, talvez a gente devesse ir pra um... – começou, numa última tentativa desesperada.
- Entra, null.
Derrotado, pendurou a mochila nas costas, saiu do carro e correu até a porta, onde null já abraçava a mãe.
- ...você não tem comido direito, tem, filho?! Olha só como você tá magro! Sabia que essa história de deixar vocês morarem sozinhos não ia dar certo... E que cabelo é esse?! – a mãe de null tagarelava incrivelmente rápido. Ela falava demais para uma mulher tão pequena.
- Oi, Sra. null. – null cumprimentou logo em seguida, recebendo um abraço carinhoso.
- null! Que bom que você veio também! – exclamou, puxando-o carinhosamente para dentro e fechando a porta atrás de si – Olha, você fique à vontade, já sabe onde é o quarto, né? – a Sra. null deu uma risadinha simpática – Então vocês dois podem ir tomando um banho enquanto eu...
- O QUE ESSE OTÁRIO TÁ FAZENDO AQUI? – uma voz aguda veio do alto da escada.
- Hey, null, legal ver você também. – null ironizou. Não podia ser escroto demais dentro da casa dos pais dela.
- null! Por que você tinha que trazer esse mentecapto?! – null continuou, indignada, até chegar ao último degrau.
- Oi, null! Ele tá aqui porque a gente tá indo pra Vegas amanhã. Mas também é muito bom te ver depois de quatro meses, exatamente a recepção que eu esperava. – disse null indiferentemente, tirando o casaco e jogando-o dentro do armário ao lado da porta.
- Aw, null, desculpa! – pôde ouvir sua irmã rindo e sentiu seus braços envolverem seu pescoço num abraço apertado – É bom te ver também!
Ela deu um beijo estalado na bochecha do irmão mais velho e seguiu em direção à cozinha.
- Viu? Não foi tão ruim assim! – null riu enquanto subia a escada a passos largos.
- É. – resmungou null, seguindo o amigo.
Chegou ao andar de cima a tempo de ver a porta do quarto de null se fechando. Foi até o quarto de hóspedes e entrou. Ainda estava tudo como se lembrava. Jogou sua mochila na cama de casal coberta com a colcha florida no meio do quarto. Despiu-se rapidamente, pegou uma toalha na segunda gaveta e entrou no banheiro.
Pendurou a toalha e se enfiou dentro do box, ligando o chuveiro. Tentou relaxar sob a água quente. E conseguiu, até que, enquanto espalhava o shampoo pelos cabelos, o chuveiro desligou. null tentou ligá-lo de novo. Um jato intenso de água gelada saiu violentamente. Dois segundos depois, a água parou. null tentou mais uma vez. O chuveiro esguichou mais um jato e parou novamente. Suspirou, impaciente, e tentou pela terceira vez. Três míseras gotas caíram sobre sua cabeça. Olhou para cima, analisando o chuveiro, perguntando-se como consertá-lo. Um segundo depois, após um estouro ensurdecedor, o chuveiro despencou.
- PORRA! – null saiu do box a tempo, enrolou-se na toalha e saiu do banheiro.
Analisou o quarto por um segundo, como se aquilo fosse ajudar. Caminhou até a porta, abriu-a e olhou furtivamente para os lados, torcendo para que ninguém o visse. Atravessou o corredor, entrou no quarto de null e bateu na porta do banheiro.
- null! – sussurrou batendo freneticamente na porta – null! null!
- Quê?! – null colocou a cabeça para fora. Também estava enrolado em uma toalha e olhou o amigo dos pés à cabeça, franzindo o cenho – null, por que você tá pelado no meu quarto?
- O chuveiro estragou!
- Hum. – null pensou por um instante – Termina do banheiro da minha irmã.
- Quê?! NÃO! – gritou null imediatamente.
- Ok, então se vira.
- Não, não, null, tem shampoo no meu cabelo, tô falando sério!
- Eu também! Deixa de ser estúpido, null, toma banho no quarto da minha irmã. Ela tá lá embaixo. – disse null antes de fechar a porta na cara do amigo.
Ele respirou fundo e voltou para o corredor. Era sua única opção. Abriu a porta e entrou, observando as paredes cor-de-rosa do quarto que também já conhecia.
null’s POV
Eu me dirigi até o banheiro. Respirei fundo. Tinha cheiro de banheiro de menina mesmo. Um perfume adocicado impregnava o ar. A pia estava repleta de diversos cremes e produtos de beleza. Agora que eu estava lá, não podia perder a oportunidade...
Abri a primeira gaveta. Quatro escovas de cabelo diferentes. Qual é explicação para uma mesma pessoa ter quatro escovas?! Abri a segunda gaveta. Dois pacotes de absorvente e uma cartelinha de remédios. Peguei a cartela, ingenuamente imaginando qual tipo de remédios a null tomava. Anticoncepcionais, percebi. E posava de santa. Ri sozinho. Fechei a gaveta de novo e olhei em volta. Pelo espelho pude ver uma cômoda atrás de mim, no quarto. Caminhei até lá. A essa altura eu nem me lembrava mais do banho.
Abri a primeira gaveta. Era a gaveta de pijamas dela. Nada de muito interessante. Abri a segunda. WOW, gaveta de lingerie! Digamos que a null tem uma coleção de roupas íntimas um tanto quanto... provocantes. Estava quase fechando a gaveta quando algo me chamou a atenção. Uma tira vermelha – sim, não era mais que uma tira – apareceu no meio das outras e eu a puxei. Era uma cinta-liga vermelha, cara! Era tão pouco pano que eu não sei nem como aquilo cabia na null... Reprimi uma risada, até que me lembrei de que estava sozinho e podia rir à vontade. Gargalhei, pensando em como era injusto que ela nunca tivesse usado aquela cinta-liga comigo.
Finalmente me passou pela cabeça que a null pudesse entrar no quarto a qualquer momento, já que o quarto era dela. Voltei para o banheiro, pendurei a toalha e pude, finalmente, terminar o banho. Tentei não demorar, sabia o quanto a null encheria meu saco se me visse ali.
Saí do box e, enquanto me secava, parei subitamente. Uma coisa chamou minha atenção de novo, e dessa vez a culpa não foi minha, eu estava inocentemente saindo do meu banho, não estava fuçando em nada. Era um objeto pequeno e cumprido, branco, com a pontinha roxa. Estava no lixo, em cima de todo o resto. Gelei por um segundo. Era um teste de gravidez. Respirei fundo, tentando me convencer de que eu não tinha por que me preocupar, enquanto esticava a mão até a lixeira.
Puxei o bastão e olhei para o quadradinho no meio. Demorou um pouco até que eu conseguisse identificar o que estava vendo, minha visão estava meio embaçada. Tinha um pauzinho azul e um pauzinho rosa. Que merda significava isso?! Olhei para o lixo de novo, procurando a caixa daquele negócio. Estava lá. Desesperado, peguei a caixinha e virei para ler as instruções. Sabe quando você não consegue se concentrar direito, lê a mesma linha três vezes e, ainda assim, não sabe dizer nada do que tava escrito? Pois é. Suspeito de que eu devo ter demorado alguns minutos para entender como funcionava aquela porra. Finalmente assimilei uma informação: um pauzinho era negativo, dois pauzinhos era positivo. Caralho. Eu sabia quantos pauzinhos tinha, mas, na infantil esperança de um deles ter sumido, eu chequei de novo. E os dois pauzinhos continuavam lá.
- Puta que pariu! – eu tive de gritar. Estava reprimindo aquilo desde que vi a merda na lixeira. Respirei fundo. Eu tinha torcido para dar negativo, mas já que tinha dado positivo, só me restava torcer para não ser meu. Para a merda ser só da null. Desculpa o egoísmo, mas ela que se virasse.
Corri de volta ao quarto de hóspedes e me vesti incrivelmente rápido. Desci, ainda correndo, não sei bem por quê. Devia ser a adrenalina, eu ainda estava agindo sob influência do susto, eu não tinha exatamente um compromisso urgente. Só precisava descobrir se tinha engravidado uma garota... Só isso. null’s POV Off
Quando null entrou na cozinha, os quatro estavam lá. A Sra. null cuidava da comida, null e null estavam sentados na bancada e o Sr. null estava com a cabeça enfiada dentro da geladeira e um charuto na boca.
- Quem quer uma cerveja? – ele perguntou.
- Eu! – exclamaram null e null juntos.
O pai apanhou três garrafas e entregou uma para cada um deles, abrindo a de null para ela antes. null, até então parado na porta, acordou do seu transe e entrou na cozinha, correndo até null. Tirou a garrafa da mão da menina quando esta estava prestes a levá-la à boca.
- NÃO! – ele gritou. A família inteira se virou para ele.
- O que tem de errado com esse garoto? – resmungou o Sr. null.
- Er, oi, Sr. null. Tudo bem? – perguntou educadamente enquanto se esforçava para pensar numa desculpa para ter puxado a cerveja da mão dela.
- Com licença... – null disse pausadamente, parecendo confusa, puxando a cerveja de volta e fuzilando-o com os olhos.
- NÃO! – null repetiu por impulso, segurando a garrafa com mais força.
- Qual é, afinal, o seu problema, null?! – null perguntou, franzindo o cenho.
- É que... Eu acho, talvez, que ela... É melhor.... – o garoto se concentrou e pigarreou – Acho que a null não devia beber... isso.
- E por que não? – null perguntou com uma cara confusa.
- Porque... ela ainda não tem 21 anos, ué! – null exclamou, como se fosse óbvio, e todos o encararam.
Sem dizer uma palavra, null pegou a garrafa de volta e a levou à boca, tomando um gole generoso. null reprimiu um gemido.
- Ah, é... Hey, pai. – ela chamou – Preciso te falar uma coisa. Eu...
- NÃO! – gritou null pela terceira vez.
- VOCÊ TÁ DE BRINCADEIRA COMIGO? – urrou null.
- Qual é o problema com ele?! – o Sr. null repetiu a pergunta olhando para o filho. null deu de ombros.
- Você tem certeza de que quer contar isso agora? – perguntou null desesperado, segurando a mão da menina com força – Talvez a gente devesse discutir isso primeiro e...
- Do que é que você tá falando? – ela puxou a mão de volta violentamente, com cara de quem não estava entendendo absolutamente nada. null se virou para o pai de novo – Então, como eu ia falando, pai... O pacote que você mandou pro tio Mitchell voltou. - ela terminou de falar e olhou para null, esperando uma explicação que não veio.
- Eu sei. – disse o pai, dando um gole na cerveja – Ele me ligou outro dia.
- Er, null, a gente pode... conversar? – perguntou null hesitante.
- Fala. – ela respondeu indiferente.
- Hm, em particular? – a garota riu abafado e pulou da bancada, dirigindo-se à porta que levava à sala.
- Fala. – repetiu seca, jogando-se no sofá.
- É que eu... – null se sentou ao seu lado e decidiu ser direto – Eu sei que você tá grávida.
A garota levantou num pulo, engasgou e cuspiu no tapete metade da cerveja que tinha na boca.
- DE QUE PORRA VOCÊ TÁ FALANDO? – exclamou, ainda tossindo.
- Eu sei que tá, null, sério, só me fala se é meu.
Ela se sentou de novo e respirou fundo. Abaixou a cabeça, para não ter de encará-lo, e, ignorando o nó em sua garganta, murmurou, com a voz falhada:
- É.
- É... meu? – ele se certificou, e ela apenas confirmou com a cabeça antes de olhar para cima a fim de ver sua reação. Ele levou as mãos aos cabelos, puxando-os, frustrado – Porra... – murmurou – Certeza? – ela apenas sacudiu a cabeça novamente – Er... Desculpa, mas... Como? – ele perguntou hesitante, e ela apenas fez silêncio – Fala alguma coisa, null, pelo amor de Deus!
- Não teve mais ninguém depois de você.
- Ah... – não soube responder nada além disso, e seu cérebro tentava trabalhar rápido – E você vai...? Você pretende...?
- Eu não vou tirar, null.
- Ok! – ele suspirou – Não que eu fosse te pedir pra fazer isso, mas eu entenderia se... – pensou por um segundo e achou melhor parar de falar.
- Mas eu também não sei se vou ficar com ele.
- Hm... Seus pais já sabem?
- Não.
- E você não vai...
- Vou. – ela o interrompeu – Eu tava planejando contar hoje, já que o null tá em casa e tal, pra não precisar falar mais de uma vez. – ela fez uma careta – Mas eu posso contar outro dia, se você quiser. Esperar você ir embora...
- Não, tudo bem. - soltou o ar com força pela boca - É melhor acabar com isso logo, né? – null sorriu fraco e encarou a garota.
- Eu tenho uma consulta no médico amanhã, no centro. – ela acrescentou – Então de qualquer maneira eles iam ficar sabendo...
- Ok. – null não sabia o que falar. Não sabia se deveria ter se oferecido para ir com ela. Também não teve muito tempo para pensar nisso, porque a porta da cozinha se abriu e null enfiou a cara para fora.
- Hey, vocês dois. – ele chamou – Sala de jantar. A comida tá pronta.
Os três se dirigiram à sala, onde o Sr. e a Sra. null já estavam sentados à mesa, esperando.
- A carne precisa de mais uns minutinhos, mas podem ir se sentando que eu vou servindo as bebidas. Quem quer vinho? – exclamou a Sra. null com a voz animada, levantando-se da mesa.
- Não, mãe. É até bom. Eu tenho uma coisa pra contar pra vocês. – null respirou fundo e olhou para null – E talvez você devesse sentar de novo. – ela acrescentou. Todos ficaram em silêncio por um segundo.
- Não vai gritar nada dessa vez, null? – perguntou o Sr. null rindo. null apenas sorriu nervoso. Pela primeira vez ele parou para analisar qual era a probabilidade do Sr. null de fato matá-lo.
- Pai, mãe... – a menina continuou, séria – Quero que vocês fiquem calmos. Isso não foi planejado, mas acidentes acontecem, e...
- null, você tá me preocupando. – disse a mãe dela.
- Anda, null! – disse null impaciente.
- Eu tô grávida. – ela disse rápido. Todos ficaram em silêncio de novo, mas dessa vez ele se prolongou.
- Você tá... o quê? – perguntou seu pai depois de um bom tempo, parecendo em choque.
- Grávida. – ela repetiu, dessa vez com a voz mais firme.
- De quem? – perguntou a Sra. null com a voz fraca. null e null se entreolharam.
- De... - ela pigarreou - Hm, não é ninguém que vocês...
Eles se olharam mais uma vez, e, provavelmente percebendo a falta de cor no rosto do rapaz, ela lhe lançou um olhar cúmplice, e null percebeu que ela não ia contar. Ela não queria entregá-lo e ia assumir aquilo só para si. Mas isso não estava certo. Respirou fundo, tomando toda a coragem que tinha, e disse baixinhi:
- De mim. – e automaticamente se encolheu, preparado para o que viria a seguir.
- Quê?! – gritou null com a voz esganiçada – Como assim? Não tem jeito, faz mais de dois... – ele parou para pensar por um segundo e a ficha caiu – Cara, você comeu minha irmã de novo?! – null gemeu, fazendo uma careta de nojo.
- null! – ralhou null com o irmão, que apenas afundou o rosto nas mãos.
- Engravidou a minha filha, huh? – o Sr. null finalmente se pronunciou, num tom tão seco, tão duro e tão sério que fez null estremecer – E o casamento?
- PAI! – gritou null, levantando-se da cadeira abruptamente – Pelo amor de Deus, pai!
- O que foi?!
- Presta atenção no que você tá falando, pai, eles não vão casar... – null rolou os olhos e o Sr. null pensou por um tempo.
- Tem razão. – ele fez uma pausa – Não sei o que é pior: uma filha mãe solteira ou uma filha casada com isso daí. – ele resmungou, apontando para null com a cabeça – Sinceramente... Qual é o problema com esse infeliz? Por que ele não pode simplesmente...
- Eu vou checar a carne. – interrompeu a Sra. null, que ainda não havia falado nada, com o olhar vago, parecendo em transe – Você gosta de pato, null? – ela se virou para ele, ainda olhando para o nada.
- Gosto, Sra. null. – ele pigarreou – Obrigado.
- QUE DIFERENÇA FAZ SE ESSE TRASTE GOSTA DE PATO? – gritou o Sr. null antes que a esposa sumisse pela cozinha – Você. – ele apontou para null de novo – É bom você se comportar agora, rapaz.
- Pai... – chamou null – Se acalma. Não tem ninguém morrendo.
O comentário da menina calou a todos. E enquanto esperavam que a Sra. null voltasse com a comida, ninguém disse absolutamente nada. Quando ela voltou, parecia recuperada do choque, animada como sempre e já disposta a agradar novamente. Ela entrou na sala com a travessa de carne nas mãos e um panfleto no avental.
- Sabe o que eu estava pensando? Você deveria visitar essa clínica! - ela colocou a carne na mesa e puxou o panfleto, que dizia em grandes letras amarelo-berrante: "DEZ AULAS DE COMO TER UM BEBÊ".
- Mãe... – gemeu null.
- É sério! Quando a mais velha dos Wilkinsons, a Linda, engravidou, ela fez esse curso, a mãe dela me contou. Ela também entrou na ioga, foi uma maravilha! Faz super bem pra gravidez, tanto pra mãe quanto pro bebê. – ela continuou tagarelando – A Sue me contou que ajudou bastante, e olha como a Linda tá bem hoje!
- Ela tá divorciada, pesando mais de 100 quilos, com um filho hiperativo! – respondeu null, horrorizada.
- Isso é verdade. – concordou a mãe pensativa – Mas ela já foi mais gorda, então merece algum crédito! – disse, soltando uma risadinha – Além disso, ela fez parto humanizado, você deveria fazer também, sabe?
- Mãe, - null a interrompeu – A gente pode deixar pra falar disso depois?
- Claro, meu amor, você que sabe... Se bem que a cesariana também tem seus pontos positivos. – continuou, ignorando o pedido da filha – Mas o natural, apesar do sofrimento, tem sua beleza... – ela piscou, encantada, e null gargalhou.
- Deve doer pra caralho! – ele comentou, ainda rindo escandalosamente.
- A gente pode parar de discutir como eu vou parir, fazendo o favor?! – queixou-se null – Já tô perdendo o apetite! – e depois disso fez-se silêncio novamente.
- Quem quer pato? – a Sra. null mudou de assunto bruscamente.
null bateu de leve na porta. Ela gritou alguma coisa que ele não entendeu, então entrou, torcendo para que tivesse sido um "entra".
A garota estava sentada no chão, com as costas encostadas na cama, ouvindo Beatles. Ele se dirigiu até lá e se sentou no chão.
- "The world is treating you bad" – ele cantarolou, sorrindo docemente.
- "Misery..." - ela respondeu rindo também.
- Nada melhor que Beatles num dia de fossa.
- Horas em que só John Lennon salva... – ela completou, rindo de novo sem humor. Ficaram em silêncio por um tempo.
- Hey, null... – ele se aproximou mais dela – Eu não sei se eu deixei isso claro, mas... Eu tô aqui. – ele fez uma pausa e ela olhou para o rosto dele – Quero dizer, eu não vou... Pode contar comigo pro que você precisar, eu não vou te deixar na mão agora.
Ela sorriu e ele passou o braço em volta dela. A música acabou e “I Want to Hold Your Hand” começou a tocar. null se virou, ficando sentada de frente para ele.
- Obrigada, null. Mesmo. Mas nós dois sabemos que nossa relação nunca foi das melhores. – ela riu – E vocês vão sair em turnê no fim do ano. Pensa no quanto vocês lutaram pela banda, no quanto você quer isso! Tipo, eu agradeço muito o seu apoio, de verdade. Só tô falando que eu não quero que você se sinta preso a mim por causa disso.
null fez silêncio de novo, não sabia o que responder.
- Eu não tô me sentindo preso. – gaguejou – Eu tô te falando isso porque é verdade. Eu sei que nada disso foi planejado, mas a responsabilidade é tanto minha quanto sua. Eu sei que a gente nunca morreu de amores um pelo outro, mas, cara, também não é como se você fosse qualquer uma! – null disse rápido e ela olhou para ele de novo. Eles se encararam por um momento. null pigarreou e olhou para baixo.
- Você também não é qualquer um. – murmurou. Ele passou os braços em volta dela de novo, aproximando-a de si. Ela estava sentada entre as pernas dele e afundou o rosto no peito de null.
- Oh, please, say to me you’ll let me be your man... - ele cantou com a música, baixinho, no ouvido dela - And please say to me you’ll let me hold your hand...
- null?
- Hm?
- Amanhã, no médico... Você vai comigo? – ela perguntou, cautelosa, olhando para ele.
- Claro que vou. - ela suspirou aliviada e ele a abraçou com mais força - A gente vai ficar bem. – tranquilizou-a, depositando um beijo na testa dela.
- A gente vai ficar bem. – ela repetiu.
- Puta merda, null! Por que a demora? – perguntou null, colocando a xícara vazia de café dentro da pia.
- Pára de me apressar, eu conto por dois agora. – ela apontou para a barriga, entrando na cozinha – E a culpa é sua. – resmungou, abrindo a geladeira e puxando um potinho de iogurte. null apenas suspirou. null sempre tivera um humor horrível pela manhã.
Os dois caminharam em silêncio até a garagem, onde entraram no carro de null, depois de null ter roubado a chave de seu quarto.
- E os seus pais? – ela perguntou depois de entrar no carro.
- Eu vou contar. – ele soltou o ar com força, ligando o carro – Pensei em ir depois do médico. – ele olhou para ela, que assentiu com a cabeça.
- null. – ela chamou – Se não fosse por isso, você não ia ver seus pais? Mesmo estando na cidade?
- Não. – ele respondeu sinceramente.
- Ah... Por quê? – perguntou curiosa. Ele apenas sacudiu a cabeça para os lados.
- Não somos tão próximos. – disse depois de um tempo.
- Quer ir antes do médico? – a garota consultou o relógio – Dá tempo.
- Nah... – null murmurou, fazendo uma careta.
- Não é melhor acabar com isso logo também? – ela sorriu, encorajando-o – Vamos, eu vou com você.
null olhou para ela, pensando. Parou o carro na rua deserta. Depois de um segundo, fez a curva que levaria à casa de seus pais. Começou a dirigir mais devagar, na esperança de adiar aquilo ao máximo. Mas depois de dois minutos incrivelmente rápidos, teve de parar o carro ao lado da casa branca de seus pais. Estacionou, saiu do carro, analisou a casa e, antes que desse o primeiro passo, null já estava ao seu lado, segurando sua mão.
- Pára de enrolar, null. – ela riu e o puxou. Andaram até a porta e ele tocou a campainha. Enquanto esperavam, null torceu infantilmente para que ninguém abrisse e ele tivesse de ligar mais tarde e falar por telefone mesmo. Mas abriram. Viu o rosto de sua mãe aparecer e se iluminar de surpresa.
- null! – ela quase gritou – null! Eu não acredito que você tá em casa! – ela disse, emocionada, puxando o filho para um abraço apertado, que ele retribuiu.
- Oi, mãe. – ele disse baixinho. Depois de se soltar gentilmente dos braços dela, apresentou: - Essa é a null. A irmã do null. Você se lembra dela?
- Claro que lembro! Você cresceu tanto! E tá linda! – suspirou – Eu devo estar soando muito velha com esses comentários... – ela riu e abraçou a menina, dando espaço para que os dois entrassem em seguida.
- Obrigada, Sra. null. – null disse educadamente.
- Quem tá aí? – a voz do Sr. null veio da sala.
- É o null! – respondeu a esposa, visivelmente feliz pela presença do filho. O Sr. null apareceu à porta e encostou-se a ela.
- E não é que é verdade? – ele resmungou – Bom dia, null. O que te traz aqui? – continuou, sem esperar resposta nenhuma – O dia dos pais que não é! – ele riu sarcástico – Precisa de dinheiro?
- Stephen... – a Sra. null murmurou, desconfortável – Por que vocês não se sentam? Eu vou trazer um cafezinho!
- Tudo bem, mãe, não precisa. – null se apressou em dizer.
- Eu faço questão, meu amor! – a mulher insistiu, sumindo pela porta da cozinha.
null e null se sentaram, de frente para o Sr. null, que ainda analisava o filho, desconfiado.
- Tá mexendo com drogas? – ele arriscou.
- Não. – null respondeu seco.
- É sua namorada? – ele apontou com a cabeça para null.
- Não. – null repetiu no mesmo tom.
- Imaginei. – ele soltou uma risadinha – Você nunca conseguiria uma garota dessas.
null respirou fundo, tentando se controlar. null olhou para baixo, sentindo-se completamente deslocada e apertou a mão do garoto com mais força, tentando lhe passar confiança.
- Precisa de um rim? – o homem tentou de novo, recebendo apenas um olhar fuzilante do filho – Merda, tá difícil, dessa vez...
- Pai, pára! – pediu null, impaciente.
- O que é então? Você matou alguém? – o Sr. null perguntou rindo – Porque meus palpites tão acabando, null, dá pra...
- Eu engravidei uma garota. – null cuspiu as palavras – É isso. Eu não sei o que passou pela minha cabeça quando eu decidi vir pra cá e muito menos quando eu pensei que fosse receber qualquer tipo de apoio aqui. – ele se levantou bruscamente, puxando null junto, e passou o braço pela cintura dela firmemente, empurrando-a à sua frente para guiá-la até a porta. Seu pai se levantou, seguindo-os.
- Quem é a garota?
- null. – null respondeu irritado, já abrindo a porta e empurrando a garota para fora com firmeza.
- Então no fim das contas você conseguiu uma garota dessas! – admirou-se o Sr. null, rindo debochado. null apenas o ignorou – Como?
- Também não sei, pai. Quando eu descobrir, volto aqui e te conto! – gritou com desprezo. Pôde ouvir sua mãe perguntar o que estava acontecendo antes de fechar a porta e se dirigir com pressa até o carro. Continuou com o braço em volta de null, parecendo extremamente perturbado, e ela não se atreveu a dizer ou fazer nada. Ele abriu a porta do carro, empurrou a garota para dentro, deu a volta e entrou também. Sua respiração estava acelerada e ele apoiou a cabeça no volante.
- null... – null murmurou, colocando a mão sobre a perna dele – Desculpa ter feito você vir. – ela continuou, com peso na consciência.
- Tudo bem. Eu teria que fazer isso alguma hora mesmo. – ele soltou o ar pesadamente antes de ligar o carro – É melhor a gente ir, antes que você se atrase pra consulta.
Foram até o centro em silêncio completo, até null falar:
- Pára aqui. É difícil estacionar perto da clínica, a gente vai a pé. É pertinho.
Ele obedeceu, sem dizer uma palavra. Saíram do carro e foram andando, ainda em silêncio. Depois de um tempo, null percebeu que não sabia onde era a clínica.
- Hey, null, onde... – ele olhou para o lado e ela não estava lá – null?
null olhou para trás e pôde ver a menina parada alguns metros atrás, encarando uma vitrine. Ele caminhou até lá e se aproximou dela. Era uma loja de artigos para crianças. null continuou encarando a vitrine, e null pôde perceber que seus olhos estavam cheios de lágrimas.
- null? – ele chamou com a voz macia – O que foi?
Ela o ignorou completamente e entrou na loja. Ele respirou fundo e a seguiu. Ela andava por entre as prateleiras, observando os objetos. A prateleira da esquerda era de coisas para meninos, e a da direita, para meninas. Ele a seguiu, até alcançá-la e puxar seu braço, fazendo com que parasse. Ela olhou para cima, evitando encará-lo, tentando segurar as lágrimas.
- null... O que foi? – perguntou de novo, alisou o cabelo dela e apertou sua cintura – Fala comigo! Qual é o problema? – ela finalmente o encarou.
- Tudo, null! Olha pra gente! Olha como foi com seus pais, como você ficou! – e as lágrimas começaram a cair – Olha pra gente! A gente não consegue fazer isso, null! Cuidar de uma criança! E a banda? E a turnê? E tudo? Sua vida, minha vida?
- Ei, ei ei! Pára! – null apertou o corpo de null contra o seu – O que é isso agora? A gente vai ficar bem, lembra? Pensa pelo lado positivo! Eu sei que vai ser difícil pra caralho, mas... Imagina! – ele puxou uma mamadeira da estante do lado esquerdo – Imagina quando ele tiver nos seus braços? – ele pegou uma camiseta minúscula e a estendeu na frente dela – Imagina a gente escolhendo a roupa dele! – ela esboçou um sorriso e ele continuou, pegando uma mini-bola de futebol de um cesto – E me imagina ensinando a ele como jogar bola, ou ensinando o garoto a pegar num violão? – ele riu e ela o acompanhou – Imagina, null... – repetiu. Ela sorriu, secando as lágrimas com as costas das mãos.
- Você quer que seja menino, né?
- Muito. – sorriu sapeca e ela gargalhou.
- Aposto 20 dólares que não é! – ela brincou e ele abriu a boca em falsa indignação – Se não for, quebra seu esquema, né? Quero dizer, o seu discurso foi todo sobre "ele"...
- Não é verdade! – ele exclamou – Tudo bem se for uma menina!
- Ah é? – ela arqueou as sobrancelhas e riu.
- É! Se for uma menina a gente põe ela no balé, e dá coisas tipo... – ele puxou a primeira coisa que alcançou da prateleira da direita – Isso! – era um DVD de músicas infnatis baratas. Ela gargalhou.
- Geez, null! – null pegou o DVD da mão dele e o atirou de volta na prateleira – O mínimo de bom gosto, por favor!
Ele riu e a puxou para si de novo, abraçando-a por trás. null depositou um beijo em seu pescoço e mordeu sua orelha de leve.
- A gente vai ficar bem. – ele disse mais uma vez. null se virou de frente, sem se soltar do abraço dele.
- Vai. – confirmou.
Seis meses depois...
- Esse negócio enche o raio do saco. – null cutucou a própria barriga, enquanto tentava se abaixar para pegar o garfo que havia deixado cair.
- Eu pego pra você! – null correu até ela e se abaixou também.
- Porra, null, eu também não tô aleijada! Posso muito bem pegar um... – ela parou de falar e ambos se encararam assustados.
- null...
- É.
- Não precisa entrar em pânico. – ela disse com a voz macia, vendo a expressão do garoto – Ou o bebê apertou minha bexiga demais e eu fiz xixi nas calças...
- Ou...?
- Ou ele vai nascer.
- Porra! – null se levantou num pulo, correu até a sala e pegou as chaves do carro, sendo seguido por null.
- Ei, ei, o que tá acontecendo? – perguntou o Sr. null, vendo a pressa dos dois.
- O bebê vai nascer! – respondeu null desesperado.
- O QUÊ? Vem cá, filha, eu te levo! – ele pegou suas chaves e correu até a porta. null e a Sra. null apareceram.
- O que tá acontecendo? Vai nascer? – perguntou null, mas ninguém o respondeu.
- Ah, meu Deus! – gritou a Sra. null.
- Tudo bem, pai, eu vou com o null... – disse null, a única ainda calma.
- Não! Você não vai com esse delinquente dirigindo! – gritou o Sr. null.
- Vai sim! – gritou null, correndo em direção ao carro – Entra no meu carro, null!
- null, ENTRA NA CAMINHONETE! – ordenou o Sr. null.
- EU NÃO VOU NUMA PORRA DUM AUTOMÓVEL UTILITÁRIO! – explodiu null, olhando feio para o pai e puxando a chave das mãos de null – E quem vai dirigir sou eu! – ela perdeu a paciência e foi andando desengonçada até o carro. null riu, correu até ela e passou o braço pela sua cintura, guiando-a até seu carro.
- Pode ser eu? – ele perguntou doce, rindo do desespero da irmã.
null assentiu com a cabeça, parecendo nervosa pela primeira, e se deixou guiar pelo irmão até se sentar no banco do passageiro. null, o Sr. e a Sra. null se enfiaram no banco de trás, resmungando. Chegaram à maternidade em alguns minutos e null foi saindo, sem esperar ajuda de ninguém.
- Ai, que farofa... – reclamou null, olhando para os quatro em volta de si.
Ela estava deitada em uma maca - apesar de ter insistido em continuar em pé – no corredor, esperando a enfermeira, que tinha dito que já voltava. Ela tentava acalmar null e sua mãe, convencendo-os de que estava tudo bem. O Sr. null e null estavam esparramados no sofá da sala de espera, assistindo algum programa bobo na TV. Outra enfermeira passou, puxando delicadamente uma menininha que chorava, com um corte enorme no braço.
- Sangue! – gemeu null, levando a mão aos olhos – Sangue, cara, eca, porra, sangue...
- O que foi agora, imbecil? – resmungou o Sr. null.
- Sangue, eu não posso ver sangue, eu tô... – null fez uma pausa e respirou fundo – Tudo bem, eu tô bem, eu tô bem.
O Sr. null olhou para ele, rolou os olhos, virou-se para null e murmurou:
- Jura, filha? Esse cara aí?
Ela riu.
- Foi mal, pai...
- Tudo bem, gente, ele desmaia toda hora. – disse null indiferente.
- Ei! Eu não desmaio toda hora! – ofendeu-se null.
- AI! – urrou null – Desgraça de contração da porra!
- Calma, meu amor, vai ficar tudo bem! Respira assim, ó! – e a Sra. null começou a mostrar à filha como fazer.
null's POV
Eu, null e o Sr. null ficamos do lado de fora depois que null entrou no quarto. Ela entrou com a mãe. No começo os dois não estavam muito preocupados, mas depois de um pouco mais de uma hora, eles também estavam meio tensos.
Eu ouvia null gritar às vezes. Foi um alívio enorme quando uma médica saiu e perguntou com a voz tranquila e um sorrisinho sonso:
- Quem é o papai? – eu levantei a mão discretamente – Já pode entrar.
Eu respirei fundo e me levantei. Minhas mãos tremiam levemente. Eu estava morrendo de curiosidade para saber se era menino ou menina. Eu e a null tínhamos decidido deixar ser surpresa. Caminhei lentamente até a porta e parei. Soltei todo o ar pela boca, tomei coragem e entrei.
Ela estava sentada na cama, com o bebê, embrulhado em cobertas, no colo. Os cabelos dela estavam presos num rabo de cavalo frouxo e ela ainda estava um pouco suada. Fui até ela e me sentei ao seu lado, na beirada da cama.
- Menino ou menina? – eu perguntei sorrindo.
- Chuta! – ela apertou o bebê contra o peito, escondendo-o de mim.
- Aposto 20 dólares que é homem! – eu cruzei os dedos e ela sorriu maliciosa.
- Então você me deve 20 dólares, baby... – ela sorriu e estendeu o pacotinho de cobertas de novo, mostrando a menina. Mostrando a nossa filha. Foi um momento surreal. Ela era linda, delicada e pequena pra porra. Meu coração acelerou por um segundo e senti a ponta dos meus dedos formigarem. Eu estava transbordando alegria. Eu me inclinei sobre elas e depositei um beijo na testa da menina. Ainda não tínhamos escolhido o nome.
Virei o rosto para a null e nossos olhares se encontraram. A gente se encarou por um segundo e riu, compartilhando aquele momento. Ela parecia tão feliz quanto eu. E então eu fiz o que eu estava querendo fazer há muito tempo. Aproximei mais ainda meu rosto do dela, encostei meus lábios nos dela e a beijei.
E no fim a gente ficou bem.