Ser a única lobisomem fêmea não é nada fácil, ainda mais depois que quase todos que você ama já morreram. Meu pai morreu de coração, e minha mãe em um incêndio. Para variar, ela estava com o Charlie, pai daquela sanguessuga nojenta. Da minha família agora só restavam eu e meu irmão, Seth. No bando infelizmente também tivemos uma perda: Sam. Ele decidiu envelhecer ao lado de sua alma gêmea porque sabia que quando morresse a dor da perda seria violenta. Os dois, com setenta anos, tomaram venenos porque queriam morrer juntos e não queriam deixar um sofrer pelo outro. Nesse meio tempo, antes de tomarem o veneno, ninguém deixou de visitá-los; e quando eu falo ninguém, estou me incluindo. Com o tempo, meu amor por Sam foi morrendo e eu fui compreendendo que ele não me deixou por simplesmente me deixar, mas por algo mais forte que ele. Os setenta anos que se passaram me deram uma perspectiva bem diferente sobre a vida do que a que eu tinha no início dessa vida transitória.
Agora eu iria cursar a faculdade que nunca tive chance por falta de tempo. Até pouco tempo, vampiros ainda rondavam por essa área. Nunca chegaram a entrar em La Push ou Forks, porém tínhamos que ficar atentos. Bella disse a Jacob que voltaria para cá entre e setenta e oitenta anos, então não iria demorar para que mais jovens na sociedade quileute se transformassem em um de nós. Tinha que aproveitar meu bom humor enquanto tinha tempo e aproveitar um pouco a vida, algo que nunca fiz antes. Meu primeiro dia na faculdade estava se aproximando e eu já havia decidido que quando estivesse lá seria a hora de aproveitar. Decidi parar de pensar sobre minha complicada vida e ir dormir, afinal, o dia seguinte era o primeiro que eu iria aproveitar 100%.
Acordei com o despertador piando freneticamente ao meu lado, mas, pela primeira vez nessa longa vida, não me estressei com o barulho agudo. O céu ainda estava clareando quando entrei no banho e lavei cada parte do meu corpo minuciosamente. Eu ainda me incomodava com o fato de estar na menopausa, mas não tanto quanto naquela época de descobertas. Me vesti rapidamente para poder finalmente arrumar minhas malas para viajar para a Califórnia, onde seria minha nova casa, temporária, mas seria. Seth estava com a sua namorada, Luna, na sala quando passei pelo vão da porta. Ela tinha dormido aqui.
- Irmão, tenho que ir agora, ou perderei o vôo.
Ele nada me respondeu, apenas levantou do sofá, soltou a mão de Luna e me abraçou como nunca havia feito antes. Fiquei sem reação, até que, finalmente, depois de nos abraçarmos mutuamente, ele disse:
- Sentirei muito sua falta. Sei que é temporário, mas eu nunca fiquei longe de você assim tanto tempo. Você sempre cuidou de mim, não importava a nossa situação. Gostaria muito que um dia eu pudesse retribuir o favor que você fez por mim todos esses anos.
- Seth, eu entendo isso, mas acho que não fiz nada que mereça algum tipo devoção sua. É claro que aprecio tudo que você disse e fico muito feliz que você pense assim de mim. Se cuida tá, irmãozinho? Voltarei no fim do ano. Ligarei sempre para ver se está fazendo tudo certinho.
- Tudo bem. Ligarei também. Até mais!
- Tchau, te amo! – e acrescentei: – Tchau, Luna, não o deixe se meter em nenhuma encrenca!
Saí de casa muito feliz por Seth finalmente ter mostrado para mim que não importavam as nossas brigas e discussões constantes - ou coisas parecidas -, ele realmente gostava de mim e iria sentir minha falta. Embry ia me dar uma carona para o aeroporto, então, eu subi na garupa da moto que já esperava por mim na frente de casa e deixei que o vento de La Push acariciasse meu rosto pela última vez em um bom tempo. Ao chegar no aeroporto, me virei para Embry, o abracei e o agradeci pelo favor.
Embarquei no avião. Muita gente estava com casacos e olhavam para mim achando estranho eu estar de blusa sem manga e estar super confortável. Bom, se eles soubessem que eu tinha uma mutação genética, tenho certeza que a reação ia ser bem pior. Duas velhinhas a mais ou menos quatro fileiras atrás de mim cochichavam freneticamente sobre mim. Elas não sabiam que eu estava ouvindo, afinal, não são todos os humanos - pesavam assim elas sobre mim, uma mera humana - que têm super audição.
- Aquela mulher é bem alta, não é mesmo, Charlotte?
- Realmente, Magda! A cada geração as crianças ficam maiores. Também reparei que ela é bem masculina. As moças de antigamente eram delicadas, essa parece mais com um homem musculoso. O cabelo não ajuda em nada, praticamente raspado!
- Coitada, não deve arranjar um namorado desse jeito.
Eu tive problemas a minha vida toda com minha aparência. Eu era musculosa por conta do exercício proporcionado pelas rondas do bando. Além disso, eu gostava de correr e apesar de querer ter um corpo mais feminino, esse era um desejo que eu não conseguia controlar. Preferi manter meu bom humor de quando acordei, então, coloquei os fones de ouvido. A viagem era curta, apenas quatro horas. Dormi a maior parte do tempo que passei no avião e quando acordei, estavam servindo o almoço. Comi sem ter que me importar com as velhinhas fuxiqueiras, elas finalmente tinham dormido. O avião pousou.
Agora eu estava em uma cidade nova, onde não sabia me movimentar. A sorte foi ter um belo rapaz me esperando com uma plaquinha escrito “Leah Clearwater”. É claro que fui em direção a ele, sem hesitar. Queria me ver livre daquelas tagarelas.
- Olá, eu sou a Leah, e você é? - Ele me olhou de cima a baixo sem ter o mínimo senso do ridículo. – E você é?- repeti com um pouco de raiva na minha voz. Será possível que eu nunca me livraria de pessoas analisando meu físico estranho?
- Meu nome é Óberon, mas você pode me chamar de “caminho para o paraíso”.
- Desculpe, mas não vim aqui para ficar ouvindo isso. Pode me dizer onde é que fica a república, não é mesmo? Você deve ser o taxista.
- Posso sim. Vamos, por aqui.
- Obrigada.
Óberon me guiou pelo aeroporto estranho até um carro que visivelmente não era um táxi. Fiquei um pouco confusa, mas presumi que era algum tipo de motorista particular. A cidade era muito ensolarada, o clima muito diferente de La Push e Forks. Senti falta dos variados tons de verde de Forks e das rochas coloridas das praias de La Push. Quando me dei conta, estávamos parados em frente a um motel.
- Chegamos, Li, vou te chamar assim agora, tudo bem?
- Não, não está nada bem. Para que diabos você me trouxe para um motel? Você realmente pensa que eu vou ter algum tipo de relação com você, seu porco, animal, grosso?
- Não precisa ser grosseira, mas você pode ter certeza que vai acabar se apaixonando por mim. Sou capaz de apostar.
- Pois eu aposto – falei com raiva. – E agora me leve para a república e pare de ser engraçadinho!
- Tudo bem, madame!
Passamos o caminho todo sem dar mais uma palavra com o outro. Quando chegamos, algumas meninas saíram correndo da grande casa para me cumprimentar e se apresentarem. Muitas foram bem gentis e até consegui me lembrar dos nomes. Valentina foi a que me pareceu mais amigável e mais receptiva, apesar de calada. Eu podia me sentir confortável ao seu lado. Óberon não entrou na casa, mas foi para a sua república, infelizmente, logo ao lado. As repúblicas eram coordenadas pela mesma pessoa, a quem chamavam de Kida. Depois de ser apresentada a todas as meninas, fui, finalmente, ver o meu quarto. Eu o dividia com mais duas meninas: Dora e . As duas tinham cara de serem bem legais, mas não conversei muito e fui logo tomar um banho. Quando saí, Dora e estavam conversando sobre os meninos da casa ao lado. Quando me olharam, começaram a falar de um tal de nota dez. Não entendi e por isso perguntei:
- Quem é esse tal de nota dez? E por que o chamam assim?
- Ah, sim, você não o conhece por esse nome, esqueci. É o Óberon, Leah. E você já deve ter percebido porque essa denominação. – Respondeu Dora, se abanando, gesto que fazem quando acham alguém muito bonito.
- OH, não tinha reparado tanto assim nele. Mas, para falar a verdade, o achei muito grosseiro. Sinceramente não gostei dele. – E pensei comigo mesma: bem que elas tinham razão em ser nota 10.
- Como assim?! Ele é o cara mais desejado da faculdade inteira e você não gostou dele? Ninguém nunca falou mal de Óberon antes.
Dei de ombros, não queria ter uma discussão, mesmo que besta, quando tinha acabado de chegar. Resolvi comer alguma coisa, afinal, um pequeno almoço de avião não sustenta uma lobisomem. Comi alguns ovos com bacon. Meus dotes culinários não eram muito desenvolvidos e eu resolvi não arriscar. Depois de lavar a louça, fui para o gramado da frente da casa relaxar um pouco.
Estava olhando para o céu quando um jato de água foi bem no meu rosto. Levantei num pulo, vibrando feito um celular tocando. Se não me acalmasse rápido, acabaria me transformando ali mesmo. Fechei os olhos e respirei fundo algumas vezes. Quando estava mais calma, abri meus olhos, porém me arrependi imediatamente. Óberon estava na minha frente, me encarando, com uma mangueira na mão. Só fiquei com mais raiva e por pouco não me transformei. Fuzilei o palhaço segurando a mangueira com meus olhos, dando um aviso, mas pareceu surtir o efeito contrário. Óberon mirou a mangueira na minha já quase transparente blusa branca e a encharcou, deixando-a, assim, totalmente transparente. Eu corei levemente por meu sutiã vermelho de renda estar totalmente desenhado, esquecendo-me por um segundo do seu olhar malicioso sobre o meu corpo. Preferi nem olhar nos seus olhos e corri – resmungando, é claro - para dentro fazendo com que mais ninguém visse meu corpo, alvo de tantas criticas.
Tomei outro banho, porque, como eu estava no gramado, o chão ficou como lama melando minhas costas todas. Resolvi não correr o risco de encontrar aquele menino novamente, ficando assim na república. Lembrei de que ainda não tinha ligado para Seth desde que cheguei para avisá-lo de que estava tudo bem e o fiz dois segundos depois.
- Alô?
- Seth!
- Leah! Que bom que você ligou, já estava ficando preocupado!
- Não precisa disso, você sabe. Só ligue para dizer que está tudo – interrompi a frase pensando em Óberon, e depois continuei com uma pitada de raiva e ironia na voz – tudo ótimo!
- Ih, o que aconteceu, mana? Pode contar!
- Nada de mais, só um garoto irritante - fui para o banheiro para continuar a falar –, quase me transformei de tanta raiva dele!
- Leah! Você está maluca?! Isso nunca poderá acontecer enquanto estiver aí! Mas o que foi que aconteceu?
- Já disse, Seth, nada demais. – Na verdade era constrangedor falar sobre essas coisas com meu irmão, por isso contei uma meia verdade. – Não fui com a cara dele desde que saí do avião e que nos apresentamos. Simplesmente não consigo ouvir a voz dele sem me irritar.
- Leah, deixe de ser dura com as pessoas, pensei que você só era assim com Sam por causa da coisa de lobo, o que antes você não entendia, mas ficar desse jeito com o pobre menino do nada? Tente fazer amizades e não rejeitá-las, ok?
- Você está realmente me dando conselhos? Você? Meu irmão mais novo? Seth, deixe que eu me cuido sozinha, tá bom? Cuida de você para não me deixar preocupada. Está fazendo as tarefas de casa?
- Você sabe que sim.
- Sei? – dei uma pequena risada. - Se você diz... Mas não deixe nenhuma sem fazer. Tenho que desligar, vou jantar. Beijos e se cuida.
- Tudo bem. Vou buscar Luna agora e fazer o mesmo. Tchau!
Bati o telefone e fui jantar. A comida era boa, diferente da que Seth fazia, mas boa também. Claro, ele também aprendeu com aqueles sanguessugas perfeitinhos e nojentos. Depois do jantar, fui dormir, afinal o dia seguinte era o primeiro dia de aula, e eu não poderia perdê-lo.
Capítulo 2 – P.O.V – Leah
Acordei mais uma vez com o despertador piando freneticamente e me arrumei para meu primeiro dia de aula. Estava fingindo fazer o primeiro ano da faculdade, apesar de parecer, fisicamente pelo menos, estar no terceiro ano. Eu resolvi fazer medicina, porque poder ajudar a salvar vidas e ter como fazer isso com mais sucesso que os humanos era bem interessante. E simplesmente conseguir ter uma vida normal depois de terminar de cursar era muito excitante. Lembrei que minhas aulas de ioga também iriam começar, e fiquei imediatamente mais animada, se é que era possível. Aprender a controlar meus sentimentos para não estourar em uma loba peluda era essencial para manter o segredo.
Vesti uma das roupas que tinha comprado para essa viagem porque queria estar o mais feminina possível para não atrair tantos olhares assim. Quando me olhei no espelho vi uma mulher com alma e experiências de uma idosa, porém com aparência de vinte e três anos apenas. Realmente estava mais feminina com aquela blusa com detalhes rosa e saia jeans um pouco mais curta do que as que eu costumava usar. Eu estava pronta.
Desci e encontrei as meninas já sentadas à mesa. Todas olharam para mim e eu sabia o que elas pensaram no momento em que me olharam de cima abaixo, porque eu vi um traço de inveja nos olhos de cada uma. A única de me olhou amigavelmente foi Valentina, sorrindo para mim e me elogiando. Era o primeiro elogio que eu ganhava sobre minha aparência. Comecei a ficar mais autoconfiante, apesar de perceber que, para a maioria das outras meninas no cômodo, agora eu era uma rival.
Comi cereal com leite ao lado de Valentina e resolvi não ligar para as outras meninas ainda de cara feia. Escovei meus dentes e fui para a aula com o carro da república, afinal, ainda não tinha comprado nada para a minha locomoção. Teria que providenciar hoje ainda.
Valentina foi me guiando pelas ruas cercadas por um belo amanhecer dourado e cintilante. Era tudo muito bonito aqui, apesar de quente. Chegamos à faculdade e me direcionei à secretaria, onde deveria pegar meu horário.
Minha primeira aula era anatomia, assim como a segunda. Quando estava em La Push, minha matéria favorita era biologia e apesar de ser jovem na época, fiz um curso avançado da mesma, por isso gostava muito de medicina. Entrei na sala de meu novo professor, o Sr. Masterson. A faculdade era diferente do colégio, não faziam com que você se apresentasse quando fosse seu primeiro ano e não te prendiam quando você quisesse ir ao banheiro. Porém, nessa aula iríamos dissecar sapos e teríamos que ter parceiros. Como cheguei um pouco atrasada na sala por ter que passar na secretaria e me orientar no novo ambiente, fiquei sozinha.
Tudo estava muito bom para ser verdade. Três segundos depois de me acomodar na mesa, um rosto familiar entra na sala. A minha mesa era a única com espaço livre e tudo que eu desejava era morrer naquele momento. O rosto agora vinha em minha direção com um sorriso maroto brincando nos lábios tão vermelhos e carnudos. Os pensamentos em minha cabeça ficaram uma loucura quando resolvi descer um pouquinho o meu olhar. Realmente, nesse sentido pelo menos, ele era nota dez.
Óberon não me poupou de seu comentários embaraçosos:
- Li, como você está bonita! E ainda guardou um lugar para mim na sua mesa?! Brilhante!
- Você não para de me perseguir, não é mesmo? E não, não guardei um lugar para você. Preferiria morrer a algum dia esperar por você.
Meu olhar sem querer percorreu seus braços perfeitamente desenhados e morenos. Ele pareceu perceber isso e ficou contente consigo mesmo. Mais nenhuma palavra conseguiu sair da minha boca, ou pelo menos uma que desse para entender. Ele sentou-se tão perto de mim que nossas peles chegavam a roçar uma na outra. Eu fiquei com cara feia para mostrar que eu não gostava dele e de seu comportamento, mas a mensagem meio que foi anulada com os olhares que eu lançava para seu físico, passando assim outro tipo de mensagem.
A aula acabou e ainda não tínhamos acabado a atividade, mas como não valia nenhum ponto, fiz uma lembrete mental para pedir para Valentina me explicar o resto da prática.
Saí da mesa sem olhar nos seus olhos de um perfeito tom de verde. Óberon me segurou pelo braço e me puxou para ele. Ficamos por quase vinte segundos nos encarando de muito mais de perto do que ousamos chegar antes. Eu não conseguia desviar os olhos de seu olhar penetrante e foi aí que, pela primeira vez, baixei a guarda. Percebendo isso, e vendo que na sala só restávamos nós dois, Óberon passou seus dedos levemente no meu braço provocando-me arrepios. Fechei os meus olhos com a sensação e quando me dei conta ele estava beijando meu pescoço e cada vez subindo mais. Ficou a um milímetro da minha boca, quando deu uma risadinha fraca. Abri meus olhos e o vi com um sorriso largo estampado no rosto.
- Li, Li. Assim não dá. Sou um porco, um animal, um grosso. Você fala, fala, mas acaba me dando mole... deixando até eu te beijar. Está vendo? Não é coerente!
Só após muito tempo foi que absorvi as palavras de Óberon e me dei conta de que tinha me agarrado à sua cintura. Ele ainda sorria para mim e acrescentou:
- Seu biquinho também estava formidável, sabia? Sabe do que você me lembra? De um peixinho dourado que eu tinha quando era criança. Fica aí, de boca aberta, sem ar... Igualzinho a ele quando escorregava para fora da pia na hora de trocar a água do aquário...
- Você é realmente um merda!
Saí furiosa da sala e batendo o pé. Como aquele menino me irritava! E o pior é que eu quase o beijei, mostrei que tinha algo que eu sentia por ele, mesmo que só atração física. Parei em frente à sala de minha próxima aula e encostei na parede, respirando um pouco e me acalmando. Valentina tinha essa aula comigo e ao me ver encostada na parede, veio me perguntar se eu estava bem. Respondi que estava bem e que depois contava o que havia ocorrido.
Não prestei atenção na aula, na verdade nem lembrava o nome do professor e nem qual era a aula. Essa também teve a duração de duas e agora era o intervalo. O refeitório era muito grande e eu me perdi da mesa quando tentava voltar para ela. Sentei com Valentina e algumas meninas da república, dente elas, minhas colegas de quarto.
O resto do dia passou muito rápido e depois daquele quase beijo, não consegui me concentrar em mais nada. Infelizmente, aquele menino deixava minha cabeça fora de ordem. Ele era um grosso, um estúpido, mas mesmo assim ainda tinhas os olhos e o sorriso mais bonitos que eu já tinha visto, sem contar com as covinhas. Resolvi enterrar esses pensamentos e saí da faculdade para uma loja de automóveis. Comprei uma vespa amarela muito bonita. Coloquei a pequena vespa no porta malas e fui para a república.
Assim que passei pela porta, Valentina veio em minha direção para dizer que a aula de ioga foi cancelada e que dali a dois dias, quando iria acontecer a segunda aula, a professora iria repor. Depois dessa notícia, percebi que tinha a tarde inteira livre. Fui para o meu quarto e encontrei lá. Nós conversamos um pouco e eu acabei percebendo que ela era uma boa pessoa, talvez pudéssemos nos tornar muito amigas. não era como Valentina, quietinha, calada, ela era meio louquinha para falar a verdade. Parecia agir como uma menina de 14 anos e não uma de 20.
Já era noite quando bateram na porta do nosso quarto para nos chamarem para jantar. Levantamos de nossas camas e antes de descermos, perguntou:
- Leah, você quer ir hoje para a cinturada comigo?
- Cintu o quê?
- Cinturada. É uma corrida com cintos duplos. Você só entenderá vendo. Vamos, por favor!
- Tudo bem, depois de jantar nós podemos ir.
sorriu e nós descemos as escadas para a cozinha. O jantar foi uma deliciosa lasanha de molho branco. Depois de jantar, tomei um banho e me arrumei para sair com . Dessa vez vesti um shortinho com uma blusa branca. e eu descemos as escadas nas pontas dos pés porque tínhamos toque de recolher, mas na verdade ninguém obedecia. Saímos de casa sem que ninguém percebesse.
Ao chegarmos à estufa, a primeira corrida ainda estava sendo preparada. correu para Pollo, seu namorado, e o beijou. Pollo iria competir e estava tentando convencê-la a ser uma cinturada. Eu vi Óberon de longe e o encarei por alguns segundos. Pollo seguiu meu olhar e o chamou. Ele estava com uma jaqueta em cima da blusa que delineava seu abdômen definido com perfeição. Ao aproximar-se e perceber que quem estava ali era a sua Li, falou:
- Olha só quem está aqui! Resolveu deixar de bancar a difícil e veio me ver?
Ele se aproximou de mim deixando um espaço mínimo entre os nossos rostos. Eu me distanciei e fiquei muito vermelha.
- Nem sabia que você estaria aqui.
- Sabia, sabia sim. Seu rosto está vermelho como um pimentão. Viu? Não pode mentir para mim...
Fiquei com muita raiva da minha vermelhidão e de meu coração acelerado e desobediente. Queria ter um buraco para enfiar a cabeça naquele momento. Ele acrescentou:
- Não sei por que fica tão preocupada... Tem medo de quê?
- Não tenho medo de nada, tenho nojo de você, isso sim!
- Não é o que parece, seu coração fica um pouco acelerado demais quando você me vê, posso perceber isso por sua respiração acelerada. Você gosta de mim...
E então ele saiu com sua moto, lançando um sorriso provocante em minha direção. Foi procurar uma menina disposta a ser a sua cinturada. Madalena apareceu antes que ele se distanciasse muito, na verdade, dois segundos depois de ele começar a acelerar a procura de alguém. Ela falou:
- Me leva com você, Óberon?
- Claro, garota, encaixa aí o cinto.
Madalena cumprimentou , mas lançou um olhar gélido em minha direção. Neste momento ficou claro que ela gostava de Óberon. Ele se posicionou na linha de partida com Madalena na sua garupa, porém de costas. No momento que o apito soou, as motos que competiam empinaram e as cinturadas ficaram de cara para o asfalto. As motos empinadas iam a toda velocidade e algumas meninas gritavam da garupa pedindo para que seu companheiro de corrida parasse. Muitos pararam, e assim Óberon ganhou.
Muita gente aplaudia e a segunda corrida estava sendo organizada quando Madalena parou em minha frente e me ouviu resmungar “foi só sorte” e falou:
- Não foi só sorte. É principalmente coragem, estômago forte. Mas, afinal, o que é que duas mimadinhas como vocês estão fazendo aqui?
não agüentou a provocação e retribuiu:
- Escute aqui, sua retardada, você tem alguma coisa contra a gente? Se está remoendo alguma coisa, diga logo e não obrigue a gente a perder tanto tempo.
- Acontece que você está usando o cinto duplo e isso não é permitido.
- Quem disse?
- Eu estou dizendo. Por que não participou, então?
- Porque o meu homem não correu. Eu só corro com Pollo. Para sua informação, eu estou com Pollo.
- E essa? -Madalena apontou para mim. -O que ela está fazendo aqui? Nem está usando o cinto. Ninguém lhe contou que esse lugar é reservado para as cinturadas? Ou corre, ou se manda.
Eu me virei para , com a raiva clara nos meus olhos e falei:
- Só quero saber agora quem vai ser a idiota.
- O que foi que disse? -Madalena fechou a cara.
- Eu disse que estou esperando a minha vez. -Eu sorri. Madalena permaneceu impassível. Talvez não tenha ouvido direito. Abri o casaco de e continuei: - Vamos, me dê o cinto.
- O quê? Você só pode estar brincando! – Respondeu .
- Sério, entregue logo para mim. Se é realmente tão emocionante, quero experimentar.
me deu o sinto com um olhar de aviso, mas eu o ignorei. Um brutamonte com uma aparência assustadora freou bem diante de mim.
- Vamos lá, cinturada, suba. Aqui atrás!
- Está falando comigo? – perguntei.
- Com quem mais poderia estar falando? Mexa-se, a corrida já vai começar.
Madalena sorriu diabolicamente para mim quando sentei na garupa e afivelei meu cinto ao do meu parceiro de corrida. Óberon tinha voltado para o meu campo de visão após ter pego seu prêmio e Pollo apontou para mim, falando com ele. Na mesma hora, o apito tocou e as motos empinaram. Fechei meus olhos porque o asfalto corria muito perto do meu nariz e ficar vendo não era nada prazeroso. Um dos adversários acabou se acidentando e eu entrei em pânico apesar de saber que provavelmente não morreria com uma queda de moto, mas isso pareceria estranho para os humanos presentes.
Finalmente tinha acabado. O brutamonte que foi meu parceiro ganhou a corrida. De repente o apito soou de novo, mas dessa fez em uma freqüência e em um tom diferente, mas o que isso significava? Todos começaram a correr de um lado para o outro, todos desesperados. Tentei achar , mas a tentativa foi frustrada. Resolvi procurar minha vespa quando alguém puxou meu cabelo com uma estrema violência. Era um policial. Óberon surgiu do nada e acertou o policial com um soco no rosto. O guarda tentou reagir, mas Óberon deu-lhe um pontapé e me puxou para cima de sua garupa.
Flashes vinham de todas as direções enquanto fugíamos do caos. A polícia tentava nos seguir e eu estava preocupada. Óberon falou:
- Cubra a placa com o pé.
- O quê?
- Cubra o último número da placa com o pé. - Estiquei a perna direita tentando ocultar a placa, mas escorreguei duas vezes.
-Não consigo.
- Deixa para lá. Será possível que você não saiba fazer nada?
- Acontece que nunca precisei fugir numa moto. E, com certeza, teria preferido evitar dessa vez também.
- Queria que eu te deixasse nas mãos daquele guarda? O cara ia acabar com você.
Óberon reduziu a velocidade e virou à direita. A roda traseira derrapou de leve no asfalto. Me apertei nele e gritei.
- Freia!
- Está brincando? Se eu parar agora eles nos pegam e levam minha moto!
- Por favor, não quero morrer. – Essa foi uma boa frase de humana. - Por favor!
Viramos em uma esquina deserta e depois paramos em frente a um matagal. Óberon disse que eu deveria descer, mas que ele voltava para me pegar. Concordei, era melhor que ficar nessa perseguição. Encolhi-me perto de uma cerca. A polícia passou, mas não conseguiram me ver.
Desencostei do portão, porém, nesse exato momento, um cachorro grande e feroz vinha em minha direção latindo loucamente. Eu não podia me transformar e quando Óberon chegasse eu estaria sem roupa.
Corri até o portão de novo e o pulei. O cachorro tentava inutilmente me morder, o portão não deixava que ele conseguisse chegar perto de mim. Caí em cima de alguma coisa mole e morna. Lama. Uma gosma que escoava devagar sobre a blusa e o short. Pelas minhas mãos. Tentei me mexer, mas minhas pernas afundaram até os joelhos. O cão continuava correndo do outro lado da cerca. Ouvia o animal latir cada vez mais raivoso por não poder alcançar-me. Bom, melhor a lama do que as mordidas. Então, de repente, senti um cheiro acre, talvez com um toque um tanto adocicado. Levei uma das mãos até o rosto para cheirar. De súbito, o campo pareceu envolver-me por completo. Minha nossa, estrume! A troca agora já não parecia mais tão conveniente.
Depois de alguns minutos, foi possível ver o farol da moto de Óberon chegando cada vez mais perto. Ele olhou em volta, mas não me viu, então gritou por meu nome.
- Estou aqui!
- Onde?
- Aqui! – Levantei uma mão.
- Então saia daí, vamos logo.
- Não posso, estou com medo.
- Com medo de que?
- Tem um cachorro enorme aqui. – Essa foi uma boa desculpa, não queria que ele me visse do jeito que eu estava.
- Não estou vendo nenhum cão, deve ter ido embora. Venha, vamos logo, ele não está mais aqui.
- Mesmo assim não posso sair, estou com vergonha. Esqueça. Não lhe contarei.
- O que é isso, menina? Ficou maluca? Bom, para mim já chega. Vou ligar o motor e dar o fora.
Óberon ligou a moto e eu bati nas tábuas da cerca com as mãos.
- Não, espere! Vou sair, mas promete que não vai rir de mim? Promete?
- Prometo, não vou rir.
- Olha lá, você prometeu...
- Anda logo, garota, pode confiar.
Pulei a cerca e virei para ele. Óberon me iluminou com o farol e indagou:
- Mas o que aconteceu com você?
- Para fugir do cachorro tive que pular essa cerca e caí.
- Caiu numa poça de lama?
- Quem me dera, é estrume
Óberon estava gargalhando descontroladamente enquanto eu corava. Eu o lembrei que ele tinha prometido não rir, mas ele disse que não podia evitar. Fiquei de cara feia para ele. Eu tentei subir na garupa de sua moto, mas ele a afastava.
- Pera aí, mas o que você está fazendo? Você não acha que vai subir na minha moto assim, acha?
- Mas é óbvio!
- Nem pensar, você não sobe suja desse jeito aqui nunca!
- E você quer que eu faça o quê? Tire a roupa?
- Isso ai já é com você, mas ninguém vai emporcalhar minha moto, ainda mais com estrume!
Óberon continuou a gargalhar, mas olhei para ele de cara amarrada e exausta. Perguntei se ele estava brincando, mas ele disse que não, e que se eu quisesse, ele me emprestava o casaco. Eu estava furiosa e bufei perto dele. Ele me provocou tapando o nariz e falando “que fedor!”.
- É o seguinte - eu comecei –, eu juro que se você virar a cabeça enquanto eu estiver trocando de roupa eu vou pular em cima de você com roupa de estrume!
- Tudo bem, avise quando quiser o casaco.
Tentei me assegurar de que ele não se mexeu e só então tirei lentamente a blusa, com todo o cuidado para não me sujar. Eu não tinha quase nada por baixo. Lástima que, devido à pressa, não tinha vestido uma camiseta. Olhei de novo para Óberon.
- Não se vire! – eu disse.
- Sou uma estátua!
Tirei meus sapatos e não percebi quando ele virou o retrovisor em minha direção. Dei mais uma olhada para ver se ele tinha mantido a palavra e, como havia dito, estava uma estátua. Agora eu estava com um sutiã de renda e a calcinha apenas. Ele sorriu pelo retrovisor, e eu ainda nada tinha percebido.
- Falta muito? – ele perguntou.
- Estou acabando, não se vire!
- Pode deixar, mas vê se não demora!
Terminei de limpar o pouco de minha pele que ainda estava com estrume e me livrei das roupas. Nesse momento, Óberon falou:
- Bela bunda!
Eu me virei e o vi me encarando pelo retrovisor. Comecei a vibrar, a ponto de me transformar. Que garoto mais atrevido! Ele continuou:
- Não me virei. Mantive a palavra.
- Seu porco, seu cretino...!
Sentei atrás dele o mais rápido possível para esconder meu corpo. Eu estava furiosa. Sorridente, ele me deu o casaco e eu tentei me cobrir o máximo possível, mas o casaco nem chegava a cobrir a bainha da minha calcinha.
Óberon guiava a moto com muita facilidade e com muita rapidez. Num instante chegamos na república. Desci da moto e tentei me cobrir o máximo possível.
- Obrigada por tudo. Jogarei o casaco pela janela, tudo bem?
- Quem sabe a gente se vê por aí, um dia desses. Estou vendo que você tem argumentos bastante interessantes.
- Acho que já te disse que você é um porco, não é?
- Creio que sim... Mas e então? Passo para te buscar amanhã à noite, está bem?
- Esquece. Não agüentaria mais uma noite como essa.
- Por quê? Não se divertiu?
- Muito! Eu dou uma de cinturada todos os dias. Sempre sou perseguida pela polícia, pulo de motos em movimento bem no meio do nada, fujo de cães raivosos e, como o toque final, mergulho no estrume e fico um tempinho aproveitando o banho de beleza, e depois volto para casa de calcinha e sutiã.
- Com a minha jaqueta por cima.
- Ah, claro... Já ia esquecendo.
- E, principalmente, esqueceu-se de dizer uma coisa...
- O quê?
- Que fez isso tudo por mim.
Olhei para ele. Que figura! Tem um sorriso lindo. Pena que seja todo errado. Quer dizer, no caráter. Quanto ao físico, não há do que reclamar. Muito pelo contrário. Decidi sorrir. Não precisei fazer muito esforço.
- Isso mesmo, você está certo. Bom, então, tchau.
Ele me segurou e me levou para perto. Ensaiei resistir, mas acabei relaxando. Ele colocou a mão por dentro da jaqueta. Me assustei um pouco. Sua mão subiu por minhas costas alcançando o feixe do meu sutiã. Segurei a sua mão e o impedi.
- Acho que você realmente gosta de mim, não e mesmo?
Eu balancei a cabeça negativamente. Ele começou a beijar o meu pescoço delicadamente várias vezes. Não resistir ao impulso de fechar os olhos. Ele subiu para o meu queixo e continuou até a minha orelha. Eu estava começando a ofegar e ficar meio lerda. Ele aproximou seus lábios do meu. Eu suspirei, trêmula, e abri a boca para receber o beijo. Ele se afastou, mas eu estava muito envolvida para notar imediatamente. Fiquei um tempo assim, de boca aberta, esperando, sonhando. Resolvi abrir os olhos e dou de cara com Óberon de braços cruzados, olhando para mim, balançando a cabeça e sorrindo.
- Mais uma vez, Li? Dando uma de peixinho de novo? Assim terei que te levar para meu aquário!
Fiquei com tanta raiva que comecei a distribuir tapas por todo seu corpo. Um tapa o atingiu no em cheio no rosto. Ele parou e falou:
- Olha aqui, vou querer a minha jaqueta agora mesmo. Esse tapa realmente doeu!
Eu o fuzilei com os olhos, tirei a jaqueta e o entreguei. Óberon me encarava enquanto eu procurava a chave certa. Ele estava realmente satisfeito. Resolveu se aproximar de mim e sussurrou no meu ouvido:
- E, então, peixinho, não vai dar um beijo de despedida?
Nessa hora achei a chave e entrei na república. Antes de fechar a porta, mandei-o tomar no santo lugar. Subi as escadas fazendo o maior silêncio possível. Ao entrar no quarto, estava me esperando e pulou em mim. Ela estava muito preocupada, e eu expliquei todo o ocorrido. E, então, dormimos.
Capítulo 3 – P.O.V – Óberon
Pulei por cima do portão e atravessei o jardim sem fazer barulho. Aproximei-me da janela. A veneziana estava levantada. Talvez ela ainda não tivesse chegado. Bati com a ponta dos dedos no vidro. A cortina clara se abriu e o rosto sorridente de Madalena apareceu na penumbra. Madá soltou a cortina e abriu logo a janela para que pudesse falar comigo.
— Oi, o que houve com você?
— Fui perseguido pela polícia.
— Está tudo bem?
— Tudo. Só espero que não tenham anotado a placa.
— Apagou os faróis?
— Claro.
Madalena recuou e eu escalei o peitoril com agilidade e entrei no seu quarto.
— Não faça barulho. Os meus pais acabaram de voltar. - Madalena trancou a porta, depois pulou na cama. Com um arrepio, enfiou-se embaixo dos lençóis.
- Brrr... que frio! — A menina sorriu para mim.
Seu sorriso era de um branco perfeito. Madá tirou a camisola e a deixou cair no chão. A pálida luz do luar acariciou seus pequenos seios perfeitos. Tirei meu casaco. Por um momento, parecia ter sentido o cheiro do campo, um cheiro estranho. Parecia estar misturado com algum perfume vago. O pensamento logo desapareceu da minha mente, afinal, faria algo mais importante no momento. Tirei toda minha roupa e me juntei a Madalena, embaixo do lençol. A pequena menina de cabelos loiros ao meu lado pegou um controle e ligou o som.
- Pronto, assim meus pais não virão me procurar.
Não falei mais uma palavra, mas a beijei com vontade, a acariciei. Continuamos com essa dança ritmada por mais algumas horas. Madalena deveria ser a mulher certa para mim, eu tinha certeza. Porém, de repente, lembrei do estranho perfume que exalava de minha jaqueta e de quem o pertencia. Por um momento, no escuro daquele quarto, eu já não tinha tanta certeza.
Capítulo 4 – P.O.V – Leah
Meu Deus, como fui perder o horário?! Todos já tinham saído da república e eu era a única que ainda não tinha ido para a escola. Já estávamos na segunda semana de aula e eu ainda tinha problemas para acordar. disse que tentava me acordar, mas que meu sono era de pedra e que eu reclamava tanto que era difícil de até mesmo se comunicar comigo. Nem Kida estava na casa, eu estava completamente sozinha.
Desci as escadas para preparar alguma coisa para comer, mas acabei comendo apenas uma maçã. Quando me virei para a geladeira, tinha um bilhete pregado e endereçado a mim. Abri o pequeno envelope e comecei a ler o que tinha escrito:
Não consegui me mexer por um minuto inteiro. Não sei como as meninas sabiam do meu debate interno de querer ficar com Óberon e de não poder por causa de meu orgulho. É claro que eu queria muito e iria aproveitar cada momento que eu tivesse com ele. Resolvi tomar meu banho logo, antes que fosse tarde demais. Óberon não poderia chegar aqui enquanto eu ainda estivesse suja. Eu estava saindo do banho quando a campainha tocou. Meu coração batia freneticamente enquanto descia as escadas, porém me lembrei de um detalhe antes de abrir a porta: não podia ser ele, ele ainda não tinha ligado.
Eu ainda estava de toalha e não me importei de abrir a porta assim, na verdade fiquei meio escondida atrás dela. Ao começar a ver o que tinha do outro lado, fiquei branca. Óberon estava parado, encostado na parede, com seu cabelo desgrenhado. Ele olhou para mim e sorriu. Eu não pude resistir a tanta doçura e sorri de volta.
- Não vai me deixar entrar? – Perguntou ele.
Nossa, como eu podia ser tão tonta? Fiquei vermelha instantaneamente. Tentei me desculpar, mas minha voz simplesmente não saía. Eu ainda estava impressionada com a sua beleza. Ele sorriu novamente e falou:
- Tudo bem, se você não me convida, eu mesmo faço isso. O que foi que aconteceu com você? Por que não está me xingando de porco, grosso, idiota? Pensei que ficaria louca de raiva ao me ver, afinal, você é uma peixinha bem rebelde.
Ele deu uma risada encantadora e eu acabei não conseguindo ficar com raiva dele. Ele entrou e eu falei:
- Espera um minuto, tenho que me vestir, não estava te esperando.
Parecia que ele ainda não tinha percebido que eu estava de toalha, mas assim que eu terminei de falar ele me olhou de cima a baixo. Levantou-se do sofá, que tinha se sentado à apenas dois segundos, e veio em minha direção com um olhar calmo, mas decidido. Nossos corpos se encontraram apenas separados por uma fina camiseta e uma toalha branca. Ele apertou meu contra o dele puxando-me pela cintura. Beijou minha orelha, minha mandíbula, meu pescoço, minha clavícula. Finalmente beijou meus lábios, dessa vez não me deixando como uma peixinha. Nossos lábios se movimentavam freneticamente. Tínhamos sede um do outro.
Acabamos no sofá, ainda nos beijando. Ele estava em cima de mim e arriscou abrir a parte da toalha que cobria meus seios. Eu me deixei levar pelo momento. Ele acariciava meus seios enquanto eu o beijava e agora descia para a minha barriga. Parei sua mão ali.
- Não.
- Não o quê?
- Aquilo... — sorri para ele.
- E por quê? — Ele estava longe de sorrir.
- Porque não!
- Como assim?
- Porque não, só isso! – Nos olhamos por um segundo e eu finalmente continuei: – Espere um minuto, tenho que me trocar.
Ele parecia estar um pouco desapontado, mas era a primeira vez que acontecia algo conosco. Se ele realmente me quisesse teria que esperar.
Subi as escadas me perguntando se não deveria ter feito aquilo, se deveria deixar. Afinal, eu o queria muito e se isso fizesse com que ele desistisse de mim seria péssimo. Me vesti com uma saia branca e uma blusa azul. Desci as escadas novamente e ele estava lá, me esperando. Sorri em sua direção. Ele sorriu de volta quando me viu. Sentei-me no sofá ao lado dele e dei-lhe um beijo. Ele me beijou, mas separou-se muito cedo para falar algo:
- Que tal se nós sairmos? Você quer dar uma voltinha comigo? – Por essa eu não esperava.
- Claro! E para onde vamos?
- Isso é surpresa. Acho que vamos precisar de vendas para você. Você tem algo que sirva?
- Tenho sim, um minuto, vou pegar.
Peguei uma faixa de cabelo da Valentina, espero que ela não dê falta. Agradecerei a ela depois. Voltei para perto de Óberon e ele me conduziu até a porta. Peguei a chave e saímos da república.
- Vamos almoçar antes de ir para o lugar certo, está bem? – perguntou ele.
- Tudo bem, estava mesmo com fome – Sorri.
Subi na garupa de sua moto e me apertei contra o seu corpo. O vento da Califórnia acariciava meu rosto enquanto eu me perdia em pensamentos. Não vi a hora em que chegamos e Óberon teve que fazer um pouco de esforço para desprender meus braços de sua cintura. Foi até um pouco engraçado.
Almoçamos lagosta num restaurante chamado Red Lobster. A comida era realmente muito boa. Nem comemos sobremesa, afinal, queríamos aproveitar esse dia a dois, apenas. Subi novamente em sua garupa, mas dessa vez ele colocou a venda em mim. Voamos mais uma vez pelas ruas até chegarmos em um lugar com cheiro bem concentrado de sal. Demoramos em torno de uma hora para chegarmos e já eram uma 3 horas da tarde. Ele tirou minha venda. Estávamos numa praia deserta.
Desci da moto e ele segurou minha mão. Sorrimos nos olhando por um minuto. Tirei meus sapatos e ele os dele. Caminhamos pela areia, conversando, por mais de uma hora. Finalmente deitamos juntos, sem nenhuma preocupação. Estávamos felizes demais para lembrarmos de que teríamos que voltar brevemente. O crepúsculo tinha chegado e nós o observávamos atentamente. Depois do sol se por, rolávamos na areia, curtindo nossos últimos minutos.
Era hora de voltar para casa. Subi na moto. Ao olhar a paisagem que logo deixaríamos, avistei uma casa, uma mansão. Era na beira da praia, devia ter uma vista e tanto. Óberon percebeu que eu a estive olhando.
- No que está pensando?
- Sabia que iria perguntar. – Sorri. – Está vendo aquela casa bem na beira da praia?
- Sim, estou vendo.
- É o meu sonho! Você nem pode imaginar como eu gostaria de morar naquela casa. Já pensou que vista deve ter? Uma janela sobre o mar. Uma sala onde poderíamos ficar abraçados vendo o pôr-do-sol.
Neste momento, Óberon soube como conquistar-me. Sorriu consigo mesmo. Montou na garupa e estávamos mais uma vez na estrada.
Capítulo 5 – P.O.V – Leah
- Obrigada, Valentina, obrigada . Aquele dia foi o melhor da minha vida!
- De nada, você merecia. – Disse Valentina.
- É, realmente! E eu estou muito feliz de alguém ter conseguido amarrar o Óberon. Isso é uma façanha!
Eu sorri timidamente. Óberon, antes, era do tipo galinha. Pegava todas. Agora ele está namorando comigo. Sua primeira namorada. Eu gostava disso. O único problema é que de umas semanas para cá, ele tem aparecido com vários machucados. Percebi que ele é agressivo. As meninas me falaram que sempre foi assim, mas nunca ninguém tinha ligado para isso além de mim. Pode até ser meio hipócrita da minha parte, mas eu realmente não gosto de violência. Como uma lobisomem, eu lutava apenas para proteger os humanos dos vampiros. Era uma obrigação. Mas Óberon briga com os outros muitas vezes sem um motivo muito grande.
Eu sempre brigava com ele quando ele vinha todo machucado. Se ele estava machucado, eu nem queria imaginar as pessoas que se meteram com ele. Os rumores na faculdade eram de que sempre Óberon ganhava. Brigamos muitas vezes feio e eu já estava cansada disso. Uma vez nós tivemos uma discussão terrível, quando ele me levou a um restaurante com seus amigos e simplesmente nos levantamos da mesa e saímos sem pagar. Depois, no caminho para casa, ele apostou com os amigos quem ficava mais tempo empinando a moto e eu estava na garupa.
- Chega de pinotes, de brigas, de perseguições, não agüento mais, estou sendo clara? Quero uma vida normal, tranqüila. Com pessoas que andam de moto como todo o mundo. Não quero fugir dos restaurantes, prefiro pagar como todos. Não quero mais brigas. Não quero nem saber que um dos seus amigos botou uma faca no meio das pernas de alguém só porque o coitado ligou para a antiga namoradinha dele e não gostaria de saber nem mesmo se eu fosse a amiga dele! Eu odeio a violência, odeio os machões, odeio os prepotentes, odeio quem não sabe viver, não sabe falar, quem não sabe discutir, quem não tem o menor respeito pelos outros. Está me entendendo? Odeio!
Ficamos um momento calados, sendo ninados pela velocidade constante da moto, pelo vento que pouco a pouco parecia me acalmar. Alguns momentos mais tarde, Óberon deu uma gargalhada.
- Qual a graça? – Eu quis saber. – Hein?
- Sabe o que eu odeio de verdade?
- O quê?
- Perder 50 dólares.
E, além dessa discussão, muitas outras vieram. Ele realmente estava melhorando, mas, mesmo assim, os machucados apareciam constantemente. Nosso namoro estava esquentando, mas, ainda, eu não o deixava ter o que queria. Ele não sabia que eu era virgem, mas devia suspeitar. Quando eu namorava Sam, era muito nova. Não pensava muito nessas coisas. Quando Sam me trocou por Emily, eu não conseguia parar de pensar nele, conseqüentemente, não estando com outros. Nessas décadas que se passaram, eu não estive com ninguém porque nunca se interessavam por mim. Mas Óberon mostrou interesse, e eu só negava o que ele queria por nervoso e por ser muito agressivo. Além disso, queria que fosse algo especial.
Óberon me faria outra surpresa hoje. Eu mal podia esperar para encontrá-lo de novo. Ainda era hora da aula de ioga. Fiz a aula muito ansiosa. A professora notou que eu não estava no mesmo plano que ela, mas não me chamou atenção, me deixou sonhar.
Fui para a república o mais rápido que pude. Tomei banho, me arrumei e estava o esperando. Ele chegou e, mais uma vez, pediu por uma venda. Eu subi e peguei.
Já estava vendada na garupa de sua moto, agarrada a sua cintura. Estávamos na estrada a mais ou menos uma hora. O vento fresco acariciou meus cabelos e o cheiro das flores encheu o ar com uma pitada de sal. Para onde Óberon estava me levando?
— Falta muito? – Perguntei.
— Estamos quase chegando. Continua de olhos vendados?
— Continuo.
Eu sorri e apoiei-me mais uma vez nas costas de Óberon, apertando-o com força. Apaixonada. Ele reduziu suavemente a marcha e virou para a direita. Começou a subir uma ladeira.
— Chegamos. É aqui. Não, não tire a venda. Espere por mim, eu já volto.
Tentei imaginar para onde ele me levou. A tarde já estava no fim. Ouvi um barulho distante, abafado e repetitivo, mas não consegui entender do que se tratava. De repente percebi um ruído mais forte, como se alguém tivesse quebrado alguma coisa.
— Voltei. — Óberon falou e segurou a minha mão.
— O que houve?
— Nada. Siga-me.
Um tanto receosa, deixei-me levar. O vento estava mais brando, o ar parecia ter ficado mais frio, mais úmido até. A minha perna bateu em alguma coisa.
- Ai.
- Não foi nada.
— Como nada? A perna é minha, ora essa.
Ele deu uma risada e falou:
— Você só sabe reclamar. Espere aqui. — Ele se afastou por um momento.
A minha mão ficou sozinha, suspensa no vazio. Sussurei:
— Não me deixe...
— Estou bem do seu lado.
Ouvi um barulho contínuo, mecânico. Lembrava pedaços de madeira batendo uns nos outros. Uma veneziana que se levanta. Óberon tirou carinhosamente a venda que cobria meus olhos e, de repente, eu pude ver tudo. Estava numa casa. Saí para a varanda na entrada. Olhando para baixo eu podia ver o mar, a praia que um dia foi o cenário de uma noite romântica. Olhei ao redor emocionada. A minha casa, a casa dos meus sonhos. E eu estava lá, com ele, e não estava sonhando. Óberon me abraçou.
— Feliz?
Acenei com a cabeça que sim, antes de abrir os olhos, molhados e brilhantes de pequenas lágrimas transparentes, reluzentes de amor. Óberon me olhou, confuso.
- Alguma coisa errada?
- Estou com medo.
- Medo de quê?
- De nunca mais me sentir tão feliz assim na minha vida.
Eu o beijei muito naquele momento. Estava transbordando de felicidade. Rondamos a casa, abrindo cada quarto e inventando histórias. Óberon me deixou por um momento e voltou com uma caixa de isopor. Ele me guiou para um quarto. Abri a porta e encontrei uma cama com lençóis novos e pétalas de rosa em cima. Tudo estava decorado.
- Surpresa! – sussurrou ele no meu ouvido.
Ele ligou o som numa rádio que agora tocava uma música doce, calma. Voltou para mim, e me carregou até a cama. O momento era perfeito, com o toque de especial que eu tanto queria. Esqueci de tudo, dos meus propósitos, dos medos, dos escrúpulos. Deixei que ele vagarosamente tirasse a minha roupa, despindo-o ao mesmo tempo. Acabei ficando inteiramente nua nos braços de Óberon, pela primeira vez, enquanto uma luz de uma vela iluminava nossos corpos. A noite estava sem lua, era de lua nova, mas, mesmo assim, era muito bonita. Uma jovem estrela curiosa brilhava no céu. Então, entre ondas de carícias, com os sussurros do mar ao longe, o grito de uma alegre gaivota, o perfume das flores, aconteceu.
Óberon deslizou delicadamente sobre mim. Abri os meus olhos ternamente dominada. Ele olhou para mim e fechei os olhos segurando a respiração, repentinamente entregue àquela incrível emoção, àquela dor do amor, aquele tornar-se dele para sempre. Levantei o rosto para o céu, suspirando, agarrando-me aos ombros dele, abraçando-o com força. Finalmente, relaxei, delicadamente, mais tranqüila. Eu era sua. Abri os olhos. Ele estava ali, dentro de mim. Sorri e o abracei, fitando-o nos olhos. Em seguida, lhe dei um beijo suave, novo, apaixonado. Meu primeiro beijo de mulher.
— Não fui grande coisa, não é?
— Foi maravilhosa.
— Não, não tenho jeito. Precisa me ensinar.
— Foi perfeita. Venha. — Óberon pegou a minha mão.
Mais uma vez abraçados, estávamos na banheira. Bebíamos champanhe e conversávamos alegres. Inebriados de paixão, logo nos amamos novamente. Dessa vez, sem medo, com mais arrebatamento, mais desejo.
- Isso é maravilhoso. – Falei.
— Finalmente essa casa é sua.
— Você está louco?
— Completamente!
— Estou feliz. Nunca me senti tão bem na minha vida. E você?
— Eu? — Ele me abraçou com força. — Melhor do que nunca.
— A ponto de poder alcançar o céu?
— Estou quase nas estrelas.
Capítulo 6 – P.O.V – Leah
Mais semanas se passaram e Óberon e eu estávamos muito felizes. Tudo estava dando certo, menos a parte da violência. Continuávamos a brigar constantemente. Além das brigas constantes, nós também tínhamos uma vida sexual bastante turbulenta. Quando não estávamos conversando ou com os amigos, estávamos juntos. Muita gente dizia para eu sair dessa e eu realmente estava meio cansada de ter que brigar com ele quando estava todo machucado. Tudo era muito difícil.
Nada que eu fizesse adiantava. Ele não mudava, mesmo sabendo que eu era a pessoa certa para ele, ou talvez não, já que eu era uma aberração. Tive que colocar um fim nisso. Óberon foi o primeiro que se atreveu a chegar perto de mim, os outros tinham medo por minha estrutura física monstruosa. Tudo bem que essa coisa de minha aparência foi morrendo com o tempo, mas, mesmo assim... me amar? Isso foi um choque para mim, afinal, já tinham se passado 7 décadas da última vez que alguém tinha me amado. Naquela época onde não existiam complicações, sem personagens do mundo místico. Sam e eu éramos felizes até demais, mas eu não podia me lembrar mais de Sam, afinal, ele estava morto.
Eu não tinha oficialmente acabado com Óberon, mas comecei a sair com Ricco, um dos meus colegas da classe de bioquímica. Ele soube disso, mas não fez nada a respeito. Eu continuava a amá-lo, mas era muito difícil admitir que eu estava errada, que ele tinha melhorado. Se ele não tivesse melhorado ele provavelmente bateria em Ricco.
Não acreditei que fiquei com essa desculpa na minha cabeça e não fui procurá-lo. Agora era tarde.
Capítulo 7 – P.O.V – Óberon
Quantas vezes eu ficava feliz de ficar observando o relógio ou os brincos que ela esquecia aqui no meu quarto, só de saber que ela estava comigo? Esses meses foram como sonhos. Eu realmente a amava. Todas as vezes em que ficamos aqui, abraçados, apaixonados, desejando um ao outro nessa cama. Sorri comigo mesmo. Lembrei dos pés quentes dela, os pequenos dedos ferventes que ela apoiava em minhas pernas mais frias, rindo. Depois de fazer amor, quando ficávamos ali conversando, admirando a lua pela janela, a chuva ou as estrelas, igualmente felizes qualquer que fosse o tempo lá fora.
Lembro-me do telefonema que lhe dei naquele dia:
— Alô?
— Oi.
Fiquei um momento em silêncio, sem saber o que dizer, deixando o coração correr a mil. Já não batia tão apressado assim há mais de dois meses. Acabei soltando a mais idiotas das perguntas.
— Como vai?
Por que liguei? E, no momento seguinte, soube:
— Óberon... estou com outro.
Fiquei em silêncio, sentindo o golpe como nenhum outro que já recebera, ferido mais do que por mil socos, mil cabeçadas na cara, mil pontapés no estômago. Mais machucado do que por mordidas, arranhões e facadas. Então, com imenso esforço corri atrás da minha própria voz, e controlada ela saiu:
— Desejo que você seja feliz.
Mais nada. Silêncio. Aquele telefone mudo. Não podia ser. Era um pesadelo. Queria voltar no tempo e parar ali, logo antes de saber, sem mais viver, sem mais seguir em frente. Parar num mágico, instável e terrível equilíbrio. Imaginei-a nos braços de outro. O rosto dela perto do de alguém imaginário, mas, infelizmente, real. E então vê-la sorrir. Como deve ter acontecido no primeiro encontro, no primeiro beijo. Imaginei-a em casa, arrumando-se nervosa antes de sair, experimentando roupas, combinando cores, cheia de entusiasmo, de novidades. Não consegui mais pensar nisso.
Fui para frente do portão de sua república e fiquei lá, sentado, esperando por algo que não iria mais vir. Era como um eclipse, meu sol foi tampado por uma lua e agora não tinha mais razão na minha vida. No anoitecer, um carro caro parou em frente ao portão. Esperava alguém. Logo o segredo foi revelado. Minha Li estava vindo em sua direção. Agora eu estava no café do outro lado da rua, espionando. Eles saíram.
Fiquei esperando por sua volta, no meio da rua com minha moto. Um carro preto que de imediato reconheci parou no sinal. Era ela. Acelerei a moto e fui para o lado do carro. Olhei para ela. Ela olhou para mim. Fiquei com muita vontade de socar, de dar um pontapé, de matar o sujeito ao seu lado. Então lembrei-me do que ela disse certa vez:
- Chega de pinotes, de brigas, de perseguições, não agüento mais, estou sendo clara? Quero uma vida normal, tranqüila. Com pessoas que andam de moto como todo o mundo. Não quero fugir dos restaurantes, prefiro pagar como todos. Não quero mais brigas. Não quero nem saber que um dos seus amigos botou uma faca no meio das pernas de alguém só porque o coitado ligou para a antiga namoradinha dele e não gostaria de saber nem mesmo se eu fosse a amiga dele! Eu odeio a violência, odeio os machões, odeio os prepotentes, odeio quem não sabe viver, não sabe falar, quem não sabe discutir, quem não tem o menor respeito pelos outros. Está me entendendo? Odeio!
E, então, mentalmente, olhando para aquela linda mulher atrás do vidro elétrico de um carro, sussurrei: