Autora: Sabrina Pires | Beta: Thais


Um certo dia logo pela manhã, o leiteiro passou, deixando o leite na porta como todos os dias. Mas essa era uma manhã diferente, algo estava diferente, é como se uma sensação de abandono tomasse conta de mim, um aperto no peito. Levantei-me com meu pijama de flanela gasto, calcei o chinelo de pano passando pelo banheiro fazendo minha higiene matinal e logo em seguida, caminhei até a porta, peguei o leite, ao lado havia algo estranho, um saco de mais ou menos 30 centímetros e, do saco, podia se ouvir barulhos, parecia choro de criança. Não poderia ser.
Larguei o leite no chão novamente, abrindo o saco, percebi que dentro dele havia uma linda criança, quando vi, meus olhos encheram-se de lágrimas, trouxe-lhe para próximo de meu coração que batia descompassado. Não conseguia entender, por minha mente passava apenas o seguinte pensamento: "Como pode uma mãe abandonar uma criança?". No momento em que eu a abracei forte, as lágrimas que estavam em seu rostinho deram lugar a um sorriso no rosto daquele pequeno anjo.
Foi nesse dia que a vida dela mudou, transformando a minha completamente. Um novo sentido, um novo sorriso surgia involuntariamente todos os dias. Sempre tive o sonho de ser mãe, a maternidade sempre esteve presente em tudo o que eu mais desejava. Sempre imaginei como seria cuidar de uma criança. Sabia que não era fácil e com certeza não seria. Mas meu maior prazer era cuidar e brincar com aquela menininha. Foi uma grande luta até poder dizer que ela era minha filha, foram noites passadas em claro, e em grande parte dela, o medo tomava conta de mim. Eu não queria perdê-la, não conseguia sequer imaginar ela longe de mim. Mas a justiça não era fácil, várias e várias vezes a assistente social do juizado de menores veio em minha casa. Pois existe uma lista de espera para adoção de crianças, minhas chances eram mínimas, pois eu era solteira, e era preferência de casais para a adoção. Houveram diversas audiências até que finalmente, após uma ano de luta, o juiz proferiu a sentença: fui declarada mãe da . Foram meses difíceis do quais sempre cuidei dela com a incerteza de que ela se tornaria minha filha. Mas ao fim, valeu cada dia de espera. Ela completa um ano dali duas semanas.
Pude preparar uma festa linda, como minha pequena merecia. Minha mãe estava super contente, pois ela esteve ao eu lado durante todo o processo de adoção, esteve presente em todos os momentos que eu ameacei desabar, me deu forças quando não mais conseguia lutar. E posso dizer, ela é a avó mais coruja.
Os dias, os meses, os anos foram passando, e minha alegria só aumentava. Confesso que não foi fácil, muitos problemas surgiram. Meu maior desejo era poder ouvi-la dizer. Eu amo você, mamãe.
Mas por consequência do dia em que ela surgiu em minha vida, ela não falava, já havia feito de tudo pra que isso acontecesse, busquei ajuda dos melhores especialistas, fiz os melhores tratamentos, mas nada adiantou, não consegui que ela falasse.
Quando a completou dez anos, descobri que tinha uma doença grave, os médicos me deram pouquíssimo tempo de vida. Dias, semanas, no máximo alguns meses. Fiquei desesperada, como Deus pode fazer isso comigo? Foi uma luta tão difícil para conseguir ter meu pequeno anjo, minha filha de coração, ao meu lado. Não fui eu que a escolhi como filha, mas sim ela, que me escolheu como mãe. Depois de dois meses que descobri minha doença, eu piorei, não tinha mais forças para me manter em pé, minha não saia do meu lado. Estou cada dia mais fraca, mais debilitada não sei quanto tempo ainda me resta de vida. Mas não perdi a esperança de ouvi-la falar.
Três semanas se passaram comigo no hospital, e ela sempre ao meu lado, ia para a escola e sempre voltava pra cá. Por mais que eu pedisse para minha mãe levá-la para casa, se recusava, ela queria ficar ao lado. Pude ver muitas vezes ela chorando, ela tentava disfarçar, mas não conseguia, sempre vi quando as lágrimas surgiam em seu rosto e isso doía em meu coração, queria poder pega-la em meu colo e colocá-la junto ao meu peito. Mas já não encontro mais forças pra isso. Um dia eu pedi para que ela fosse descansar na casa da sua avó ou fosse para a casa de uma amiguinha. Mas ela se negava.
Eu estava de olhos fechados, minha pequena havia chegado da escola fazia algum tempo, ela olhava fixamente pela janela para o horizonte. Hoje estou mais fraca que qualquer outro dia, sinto que meus dias estão acabando, eu não quero deixar minha pequena sozinha. Sinto-a tocar meu braço, acariciar minha mão, forcei meus olhos a se abrirem, e sorri ao vê-la olhando pra mim. É tão bom poder ver ela, mas ao mesmo tempo, meu coração aperta só em pensar que nunca mais poderei vê-la. Não sei quanto tempo passou, se foram horas ou dias, eu já passava a maior parte do tempo dormindo, a fraqueza cada vez maior, meus olhos já quase não se abriam.
"Mamãe, eu amo você". Foram as últimas palavras que eu ouvi, senti uma lágrima correr pelo meu rosto, apesar das lágrimas o sorriso surgiu em meu rosto, meu maior sonho, pode ser realizado, por mais doloroso que pareça, nesse momento eu já poderia descansar em paz. Meus olhos foram se fechando, eu queria mantê-los abertos, mas não havia força pra isso, não havia mais forças em meu corpo, minha respiração cada vez mais fraca. E de repente meus olhos se fecharam de vez, pra sempre.

N/a: Gente, eu amo essa história, apesar de ser um enredo triste, ela me encanta! Créditos da capa: Anelisse Stengel - All Time Fics

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