De uma coisa eu tenho muita certeza: eu nunca apanhei tanto em toda a minha vida.
Bellatrix Lestrange acabou comigo. Machucou-me mais que os irmãos Carrow e Snape, todos juntos. Deixou hematomas, cortes feios, costelas e ossos quebrados, arranhões e muitas dores. Além, é claro, de um trauma emocional que eu carregaria pelo resto de minha vida. Eu achava que já havia sofrido de agonia antes.
Achava. Eu não sabia o que era agonizar. Não até aquele momento, ao menos. Porque ali, Lestrange fazia um ótimo trabalho de tortura. Ela estava acabando comigo lentamente e estava em deleite com isso. Foram horas a fio de tortura. Sem pausa, sem descanso. Para que parar? Afinal, Lestrange estava adorando a situação, e na certa queria aproveitar ao máximo. Houve uma única interrupção; chegaram alguns comensais, e Lestrange foi obrigada a me deixar de lado um instante para atendê-los. Parecia urgente. Tão urgente que ela me deixou de lado e partiu, furiosa, sem mencionar aonde ia ou o que faria para qualquer pessoa ali. Eu podia chorar de gratidão por qualquer que fosse o motivo que a tirou de perto de mim. Foi só o que eu tive tempo de ver e, então, minha visão se tornou cada vez mais turva e, eventualmente, perdi os sentidos.
— Outro Ponto de Vista —
Brasil, julho de 2012
O rapaz de cabelos lisos e escuros caminhava lentamente pela rua. Fazia frio, mas o tédio o fez enfrentar o mau tempo e procurar na rua alguma distração. Sentia falta de uma pessoa que foi muito importante em sua vida e que o deixou sem uma explicação, sem um adeus. Sem nada. Nem um bilhete. Nada. Já fazia mais de um ano, e até ali, nada. Absolutamente nada.
A dor do abandono consegue ser imensuravelmente pior que qualquer dor. Mas será que fora abandonado? O jovem não sabia. Não fazia a menor ideia. Afinal, quando sumiu, foi sem motivo. Não sabia nem o que acontecera a ela. E, quando tentava falar com os pais da garota, eles simplesmente não atendiam à porta. Não diziam nada. Se ele ligasse, desligavam o telefone. Chegou a ficar horas a fio escondido do lado de fora da casa da garota, não uma nem duas vezes, mas várias, e nem sinal dela. E os seus outros amigos não sabiam nada. A situação era igual para todos: sumiu. Ponto final.
Mas, espere aí. Como assim, sumiu? Eu nem sequer disse a ela o que eu sinto...
Esse pensamento não saía da mente de Eric. Mesmo um ano depois, esse pensamento lhe ocorria, quase todo santo dia. Os demais amigos já nem se lembravam dela com tanta frequência. É, de fato, o que acontece quando alguém se ausenta por muito tempo. Deixa de ser “tão” importante. As pessoas seguem em frente, e aquele que se foi se torna mera lembrança que ocasionalmente volta à tona – se acaso voltar. Mas, para Eric, não era dessa forma, pois o garoto, durante muito tempo, nutriu um sentimento muito forte pela melhor amiga, . Sempre se lembrava dela. Sempre questionava o que diabos poderia ter acontecido.
Um ano após o inexplicável sumiço da garota, uma tragédia ocorreu à família dela. Eric, não por coincidência, estava nas redondezas e viu quando tudo aconteceu. Chegou a flagrar o absurdo momento em que uma cena digna de telas de cinema se passava bem diante de seus olhos, em seu pacato bairro. Não conseguiu acreditar quando viu sua amiga no meio daquela loucura. E aquelas outras pessoas? A princípio chegou a pensar que era uma convenção de Harry Potter, ou algum
cosplay, ou coisa assim, já que era aficionada pela série literária. Só quando pessoas começaram a morrer, coisas absurdas como fogo criar formas de animais e engolir a casa, foi que notou que a coisa era séria ali. E então achou que finalmente havia enlouquecido de tanto pensar na garota, e já estava fantasiando sobre ela e coisas a ela relacionadas.
Antes fosse. Mais tarde, ao assistir ao noticiário, constatou que era procurada no país todo, e que era acusada de muitos crimes. Num instante, todos os amigos voltaram a falar dela, e falavam das coisas mais absurdas possíveis. Quanto a Eric, só aumentou seu desespero. Que diabos aconteceu à garota, afinal?
— Fim do outro Ponto de Vista —
Quando recuperei meus sentidos, podia jurar que havia morrido, e ido para um lugar semelhante ao que Harry foi (ou melhor, ao lugar aonde ele vai, uma vez que, para nós, o fato ainda não ocorreu) quando deixou que Voldemort o abatesse com o Feitiço da Morte. A cena não fazia sentido, portanto achei de fato que estava morta.
Narcisa Malfoy estava com as mangas de suas vestes arregaçadas, de pé ao lado de onde eu jazia deitada e reclinava-se sobre mim, fazendo alguma coisa. Havia uma claridade terrível para meus olhos, uma forte luz branco-azulada que machucava a retina para valer. Daí, imaginei que estivesse morta
mesmo. Mas após piscar algumas vezes, constatei que meus olhos apenas estavam sensíveis, e que a luz nem era tão forte assim. Era um feixe de luz produzido pelo feitiço
Lumus Maxima – como disse, não tão forte assim. Conforme fui recuperando de fato os sentidos, notei que ela estava tratando de meus ferimentos.
Narcisa Malfoy tratando ferimentos da pessoa que mais era detestada pelos partidários das trevas depois de Harry Potter. Cadê o sentido nisso?!
Tentei me levantar e me defender, – convenhamos, mesmo com o fato dela mais para frente mentir para o Lorde das Trevas sobre Harry estar vivo ou morto, eu não entregaria minha vida nas mãos dela. Confiança é algo muito frágil, algo complicado de se ceder ultimamente – mas foi uma tentativa digna de pena, pois não saí do lugar. Só me debati de leve e resmunguei.
— Shhh – Fez Narcisa, baixinho. – Fique quietinha, não quero que ninguém nos veja aqui.
— Por... por... – Falar era surpreendentemente mais difícil do que aparentava. – Por quê? Por... que... Por que me... ajuda...?
— Por que estou te ajudando? – Perguntou ela, bem baixinho, tentando entender exatamente o que eu queria falar a ela. Fiz que sim com um leve aceno de cabeça, e ela suspirou. – Olhe, vou contar, mas você finge que de nada sabe. Promete? – Tornei a fazer que sim com a cabeça, imediatamente ansiosíssima por saber o que se passava na mente de Narcisa Malfoy. – Draco é o motivo. Eu sei o quanto ele... – Ela parou de falar, tentando localizar a palavra que melhor descrevesse o que queria dizer. Neste breve intervalo, lavou a toalhinha encharcada de sangue. Não pude vê-la lavar, só escutei o som da água sendo despejada e remexida. – o quanto tem afeto por você... Talvez mais que isso... – Ela parou de novo, nervosa. Depois baixou o tom de voz para um mero sussurro. – Ele não fala muito, certamente não fala a ninguém o que sente, mas uma vez, apenas numa única ocasião, ele acabou tendo um... um momento de desabafo comigo. – Ela percorria meu braço com a toalha, removendo de leve o sangue já seco. Era doloroso, mas aguentei firme para não fazer barulho. – Eu sei o quanto você é importante para ele, e como foi doloroso te deixar para trás. No começo não aprovava. Sempre quis que ele namorasse e futuramente desposasse Astoria Greengrass, com quem se dá muito bem, que seria o par ideal para ele...
Eu franzi a sobrancelha, nem sequer incomodada com o fato de que estava claramente enciumada. Astoria era a futura esposa de Draco. Daqui pouco mais de 19 anos, ele estaria levando o pequeno Scorpio para pegar o Expresso de Hogwarts na Plataforma 9 ¾. Argh.
Argh.
Narcisa deu um pequeno sorriso ao notar minha expressão.
— Mas percebi que Draco não é feliz do jeito que está, que o rumo que sua vida está levando não é o melhor para ele, e quando se trata de você, tudo só piora. Ele sofre muito com tudo o que fez...
Suspirei. Quase havia me esquecido de Astoria. Bom, na verdade, me forcei a esquecer.
— Então... Isso quer dizer que você não me repudia por ser nascida trouxa?
Narcisa demorou para responder.
— Mestiça, não? – Disse, por fim. – Você não é neta de Dumbledore?
Ops. Que grande vacilo!
— É, é sim – Dei uma risada nervosa. – Minha mente está tão ruim que me atrapalho com certas coisas.
— Tanto é que uma mentira quase passa a ser sua realidade – Comentou. Imaginei que no fundo ela suspeitasse que não era verdade essa história de neta de Dumbledore, mas deveria ser mais fácil aceitar que seu filho se apaixonara por uma mestiça do que por uma sangue-ruim.
— É tudo muito complicado – Meu comentário foi evasivo.
— Imagino – Disse ela, cuidando de um ferimento, que ardeu ao contato com a toalha.
— Ai! – Protestei e me encolhi, involuntariamente.
— Desculpe. – Narcisa se encolheu também.
— Há uma coisa que não consigo tirar da mente – Eu disse a ela.
— O quê? – Narcisa parecia sumamente interessada.
— Você está cuidando de mim... mas o que acontecerá quando Bellatrix retornar?
— Francamente, não sei – Disse, num tom melancólico. – Bella é muito difícil de lidar; nem eu consigo influir em seu comportamento. Estou pensando em ajudar você a fugir, e depois dizer que não faço ideia do que aconteceu. Para tanto, você precisa se recuperar, mas está difícil. Ela fez um enorme estrago em você, e está sendo difícil fazer você voltar ao normal.
Eu estava francamente assustada com o retorno de Bellatrix, mas não podia desistir agora. Eu tinha que cumprir o que me levara até ali. Não podia de forma alguma dar para trás agora.
— Eu ainda não posso ir – Confidenciei, embora tivesse medo do que Narcisa poderia fazer posteriormente. – Cheguei aqui por um motivo... eu... eu precisava vir até aqui.
Ela parou durante um longo momento de cuidar dos ferimentos. Ficou só a me encarar. Depois, deliberadamente, voltou ao que fazia.
— Imaginei que não fosse puro acaso – Disse. – Tem a ver com Draco?
Deliberei durante um momento.
Que seja, pensei.
Vou contar de uma vez, pelo menos até onde puder contar.
— Na verdade, não, não tem a ver com Draco – Comecei, com o coração apertado pelo medo. – Desisti dele há muito tempo. Desisti dele no dia em que ele entregou a vida de minha família nas mãos de sua irmã. Ele me fez perder tudo. – Narcisa me olhou subitamente, o olhar contido, sôfrego e cheio de piedade. – Não, o que me trouxe aqui é algo maior, Narcisa. Algo que vai... além... de uma paixão adolescente. Algo que vai além da minha compreensão.
— Olhe, eu lamento muito o que aconteceu... – Começou, mas eu não deixei que continuasse.
— Não, Narcisa. Já foi. Não há o que falar – Falei, com a voz embargada e cheia de amargura.
— Não é algo que simplesmente se vai, , eu sei disso – Acrescentou. – Não é o momento, mas sei que um dia você verá as coisas como elas são. Não gosto do que o modo como vivemos fez com meu filho. Não gosto da pessoa em quem ele vai acabar se tornando. Eu o quero longe disso. Bella nos infernizou, chegou a agredir-nos para conseguir chegar até você. Quando Draco a levou até você, já estávamos sem conseguir suportar... Sei que não justifica, e é por isso que eu vou fazer o que puder para te ajudar. O que te aconteceu foi extremamente injusto, e você não mereceu... não vou permitir que mais injustiças aconteçam, eu prometo.
Ficamos a nos encarar. Meus olhos marejavam. Quando pisquei, algumas lágrimas caíram. Narcisa secou-as, afagou meu cabelo delicadamente e se levantou. Murmurou alguns encantamentos e aos poucos senti o alívio domar meu corpo. Estava, enfim, melhorando.
— Volto logo – Disse, e saiu, me deixando sozinha na penumbra.
—x—
Uma vez sozinha e sem ter absolutamente nada que me ocupasse a mente dos medos de sempre, não pude conter os maus pensamentos. Ou bons, não sei. Creio que posso definir como uma mistura de ambos. Eu não pude deixar de pensar em Draco e tudo o que havia ocorrido entre nós. Isso era um mau pensamento. Ou será que era bom?
Não, definitivamente. Draco me fez mal. Draco
é um mal.
Mas e se ele fosse um mal do qual não consigo e jamais conseguiria, tampouco, me ver livre? Não podia, afinal, ignorar o que meu coração gritava tão incessantemente para mim toda vez que pensava nele. Não conseguia deixar de amá-lo – até por que não é assim que funciona.
E ainda havia mais. Ainda tinha o que Narcisa disse. Ela tinha razão; nada do que fosse dito jamais poderia justificar o que aconteceu. Porém, no fundo, era bom ter a visão do ocorrido desse ponto de vista – ou eu sou uma completa idiota. Afinal, não era um erro qualquer. Foram vidas tiradas bruscamente, cedo demais. Foi a minha família que foi destruída, não era pouca coisa. Não era nada passível de perdão.
Foi assim, ao chegar a essa conclusão, que a culpa me dominou. Que burrice! Ora, como eu podia estar aceitando esse tipo de absurdo?! Fiquei inconformada com minha atitude. Sabia que Narcisa foi a causadora disso. Suas boas ações me amoleceram, assim como suas palavras. Lá no fundo, eu queria acreditar nela e passar uma borracha no passado tortuoso. E, ainda lá no fundo, eu sabia que quando era Draco em cena, a página que compunha nossa história não fora escrita a lápis, de modo que não se pode apagar completamente. O corretivo vai deixar sua marca sobressalente no papel, um constante e visível lembrete de que alguém errou. Draco estragou tudo. Por mais que fosse capaz de “apagar o erro”, eu ainda poderia vê-lo. Ele permaneceria onde já está, apenas oculto por uma camada fina e delicada.
Eu não sabia se dava para viver assim. Não sabia
se queria viver isso, me submeter a tanto risco. Será que valia a pena? Haveria algo de bom nisso para mim?
—x—
A minha paz não reinou por muito tempo. Obviamente, Lestrange retornou tão ou mais enfurecida do que estava quando partiu. E eu tomei uma decisão desesperada: esconder-me dela. É. Como uma perfeita covarde. Enfiei o rabinho entre as pernas e dei no pé. Narcisa compartilhava do mesmo medo, de modo que, quando ela soube que a irmã estava de volta, entrou correndo – literalmente – no quarto onde me escondera e me arrastou de lá pelo braço. Eu estava bem melhor, mas não havia me recuperado por completo. Não conseguia correr. Então, fui o mais rápido que pude, respeitando minhas limitações físicas. Narcisa me guiava para fora de casa, e logo nos embrenhamos na alta vegetação que circundava a sombria mansão. Foi um milagre não sermos vistas. Um milagre e tanto! Ali era, afinal, onde os Comensais e o próprio Voldemort passavam grande parte de seu tempo, onde se reuniam, onde discutiam e praticavam seus terríveis feitos.
— Fique aqui – Sussurrou Narcisa, entregando-me uma varinha, que logo reconheci. Era a minha. – Por Merlin, , não se mexa. Não respire, se puder evitar. Faça feitiços de proteção e não saia daqui. Me escute e me obedeça, certo? Se fizer qualquer coisa diferente do que estou falando, você será uma mulher morta antes do que imagina.
Narcisa olhou para os lados e depois voltou para dentro de casa com a postura completamente diferente da que adotada há pouco. Assumiu a elegância e arrogância usual; ninguém jamais acreditaria se dissesse que era a mesma que há pouco corria como se a vida dependesse disso. Eu, enquanto isso, a obedeci, palavra por palavra. E demorou demais para o tempo passar. Depois de longos minutos, alguns Comensais passavam de quando em quando procurando por mim. Meus feitiços de proteção me ocultavam e os afastava, e isso foi o que me salvou. A própria Bellatrix passou por mim sem me ver, parecendo um feroz
Rabo-Córneo Húngaro* – até pude visualizá-la cuspindo fogo para todos os lados. Ao vê-la dar as costas e se afastar de mim, esbravejando xingamentos aos quatro ventos, senti um calorzinho no peito. Parecia até que havia tomado uma dose de
Felix Felicis*.
– Outro ponto de vista –
— Onde está? Onde está? – Lestrange olhava diretamente para sua irmã, expressão insana. – DIGA-ME, NARCISA! – Esbravejou, esbofeteando a face da irmã, que imediatamente assumiu um tom avermelhado no local atingido. Ela já colecionava alguns cortes dos pedaços das louças e demais coisas que Lestrange andara arremessando para todos os lados, em todas as pessoas. A Sra. Malfoy arfou, estupefata, e encarou de volta a irmã, devolvendo o tapa com a mesma veemência.
— Me respeite! OUVIU?! ME RESPEITE! Não ouse JAMAIS levantar um dedo para mim dentro de minha casa novamente!
Lestrange rugiu como um monstro, voltando a encarar sua irmã, brandindo a varinha, pronta para o ataque. Narcisa já esperava isso de sua irmã, portanto, antes de ser atacada, ela desarmou Lestrange.
— NÃO FIQUE EM MEU CAMINHO, NARCISA! VOU PASSAR POR CIMA DE VOCÊ SE PRECISO FOR PARA PÔR MINHAS MÃOS NAQUELA MALDITA VACA DOS INFERNOS!
— VAI ABAIXAR O TOM SE QUISER CONTINUAR SOB MEU TETO, SUA ARROGANTEZINHA DE MERDA. – Narcisa estava completamente alterada. – JÁ ESTOU FARTA DE TANTO DESAFORO DENTRO DE MINHA PRÓPRIA CASA! A GAROTA SE FOI, E EU ESTOU POUCO LIGANDO PARA VOCÊ E SUAS IDIOTICES! AGORA SUMA DAQUI! JÁ!
Lestrange baixou a guarda, mas somente por se convencer que sua prisioneira se fora de fato. Fora de si como estava, Sra. Malfoy não seria coerente o bastante para mentir, disso Lestrange tinha certeza. Pegou sua varinha e saiu, revoltada, atacando coisas pelos ares. Narcisa somente olhou ao seu redor, para as coisas quebradas, os Comensais ensanguentados e, o pior, Draco com um profundo corte na testa. Correu para o lado do rapaz. A expressão era de angústia.
— Filho... meu menino... – Dizia ela, sem saber o que fazer.
— Estou bem, mamãe – Disse ele, afastando a mão que ela estendeu para o ferimento em sua testa. – O que ela fez com a senhora...
— Isso não interessa, filho – Suspirou Sra. Malfoy. – Oh, eu já estou cansada disso. Não vejo a hora desse circo finalmente chegar ao fim.
Uma lágrima lhe escapou e Draco a acolheu em seu peito. Suspirou. Ele compartilhava do mesmo desejo, e com a mesma intensidade. Talvez até mais.
– Fim do outro ponto de vista –
Um bom tempo depois do ocorrido, Narcisa veio me resgatar. Ela obviamente não podia me ver por conta dos feitiços de proteção, mas me chamou quando se aproximou de onde havia me deixado. Rapidamente removi a proteção para que ela me visse e ouvisse.
— Vamos – Sussurrou, apenas. Deu as costas e se encaminhou para dentro da mansão. Eu a segui de perto.
Felizmente, não encontramos nenhum empecilho, e logo nos vimos no quarto onde eu estivera escondida. Só então ela se virou para me encarar, e eu notei; era impossível não notar, de qualquer forma.
— Mas o que aconteceu ao seu rosto?! – Meus olhos se arregalaram com o choque. – Narcisa...
— Não tem importância – Respondeu, expressão ambígua, superficialmente demonstrando altivez, ao passo que por dentro a vergonha era evidente em seu olhar. – O pior passou. Ao menos por ora, estamos seguras.
Gostei do jeito como ela se igualou a mim. “Estamos seguras”. Isso me alegrou muito, por um lado. A outra parte jazia preocupada com
o que havia acontecido com o rosto dela. Havia uma mancha muito rocha que tomava uma boa parte de sua face, ao redor do olho direito, e também alguns cortes.
Eu a abracei. Agi sem pensar, sem ao menos considerar o que eu estava fazendo. Ela pareceu chocada, mas retribuiu, sem jeito. Não dissemos nada. Ela pela surpresa, e eu pela vergonha. Mas de nada adiantava, né? Eu sabia que teria que dizer alguma coisa depois de voar nela desse jeito. O mico já foi, não tinha volta.
— Desculpe – Comecei. – Me deixei levar. Acho que fiquei emocionada por você se colocar... no mesmo lugar que eu, “estamos” seguras... Enfim. – Corei.
Ela sorriu em resposta.
— Draco me fez gostar de você – Disse. Eu arregalei meus olhos para ela. – É contagiante o que ele sente por você... Ele nem precisa falar. Está escrito no olhar dele.
Se antes eu estive corada, agora eu já era um tomate de tão vermelha. Mal consegui assimilar o que ela disse. Creio que foi meio que um instinto de bloquear automaticamente qualquer possibilidade de tornar Draco uma boa pessoa aos meus olhos. Eu estava na defensiva.
A culpa ameaçou voltar, por isso, mudei de assunto.
— Preciso fazer uma coisa, aqui, em sua casa. É seguro circular por aí? Isto é, para mim?
— Mais ou menos. Bella saiu, mas ainda não é seguro.
Ponderei por um instante e então dei de ombros.
— Ok, isso já serve.
— Você precisa ter cuidado – O tom dela era de preocupação.
— Está tudo bem, Narcisa. – Sorri para ela. – Vou ter cuidado. E já estou melhor, graças a você. Quase nem dói mais.
Foi a vez dela de sorrir.
— Fico feliz.
O silêncio reinou por um tempo e eu olhei para os lados, sem jeito.
— Não pretende partir após... o que quer que você pretende fazer... né? – Narcisa quebrou o silêncio.
— Na verdade, pretendo, sim – Respondi, mordendo o lábio.
— Não – Pediu ela, meio manhosa, até. – Não vá ainda. Fique pelo menos até amanhecer.
Olhei pela janela, tentando calcular mais ou menos quanto tempo faltava até o amanhecer. Concluí que demoraria consideravelmente. Contudo, eu vasculharia a casa
toda. Poderia demorar.
— Combinado. Até porque... bom, eu vou demorar.
— Perfeito – Disse ela.
Ficamos de novo em silêncio, observando-nos e, para meu choque, foi ela quem me abraçou, e a situação foi exatamente como a anterior, só que com papéis trocados.
— Queria que tudo fosse diferente – Confessou. – Queria que Draco tivesse concordado com você e aceitado sua ajuda. Acho que estaríamos bem melhores.
Retribuí o abraço, emocionada.
— Significa muito saber disso, Narcisa – Foi minha vez de confessar. – Também queria que fosse tudo diferente. Queria mesmo. Olhe, no momento estou tão ou mais ferrada que você, mas não importa. Quando você precisar, pode me procurar. Eu farei tudo o que puder por você. Tudo mesmo.
— Espero que você e Draco acabem dando certo – Disse. – Você faz muito bem a ele.
Tal informação me tirou o ar, o chão e tudo mais. Ela afagou minha bochecha e saiu sem dizer mais nada. E eu nada pude fazer além de ficar paralisada feito uma idiota.
—x—
Procurei em cada cantinho escuro daquela mansão – e puta merda, que lugar grande e chapado de coisas. Tinha de tudo ali – de bom a asqueroso. Prefiro não comentar as coisas onde enfiei a mão. Eca. O fato é que foi tudo em vão porque, caramba, não achei nada. Foram muitas horas de busca minuciosa, ora me escondendo de Comensais, ora me escondendo de Draco, para no fim constatar que foi tudo à toa.
Tanta pancada para nada. Ai, ai.
Nada me restou a fazer senão aproveitar para ter algum descanso para depois partir. Exausta, tomei um banho e escovei meus dentes e logo me enfiei na cama quentinha que Narcisa preparara para mim. Dormi pesadamente por algumas horas. Estava muito cansada.
Eu ouvi as suaves batidas na porta, mas fingi estar desacordada. Quem quer que fosse me acordou de primeira, mas eu não revelaria isso, pois não queria companhia. No entanto, quem estava do lado de fora me ignorou completamente e adentrou o aposento. Não houve um ruído sequer, mas um feixe de luz que varreu brevemente o piso denunciou o invasor. Permaneci imóvel, na esperança de quem quer que fosse desistisse e me deixasse em paz. Contudo, isso não aconteceu. A porta foi fechada, novamente sem qualquer som, e passos suaves denunciaram a aproximação. O invasor então me descobriu suavemente, removendo o cobertor até meus quadris. Logo senti o toque suave e quente de sua carícia em meu braço, seguido por um beijo em minha testa. Eu já estava desconfiada, mas a certeza me dominou. Eu sabia muito bem que era Draco Malfoy. E, eu querendo ou não, meu coração acelerou freneticamente por essa razão.
E se não fosse ele? Era de se esperar que me apavorasse, uma vez que havia pouco tempo que sofri nas mãos de uma mulher insana dentro desta mesma residência. Porém, meu coração de imediato assumiu uma absoluta certeza. Sem pensar, confiei. Acabei me rendendo e desisti de fingir que estava dormindo. Virei e o encarei, e logo meu coração acelerou em um ritmo frenético, soando alto em meus ouvidos, parecendo até que queria saltar do peito. O ar sumiu por um instante ao me perder naquela imensidão cinza dos olhos dele. A luz que vinha do corredor me dava detalhes precários de sua beleza, porém, eram preciosos. Ele mordeu o lábio, me fitando, claramente querendo falar mil coisas, mas sem saber como ou por onde começar.
Nem parecia que, há menos de um ano, ele levara a tia homicida até minha casa para me matar.
Nem parecia que eu perdi tudo por culpa dele.
Tampouco parecia que eu o odiava.
Eu não sei o que deu em mim, pois fui
eu quem puxou assunto.
— Como você veio parar aqui?
— Eu te segui o dia todo – Disse ele, sem hesitação alguma. Sua voz rouca e baixa me deixou completamente arrepiada, de uma forma gostosa e calorosa. – Vi quando você se enfiou aqui e vi minha mãe entrar logo depois. Também ouvi a conversa, e depois fiz com que ela me contasse o que estava acontecendo.
Limitei-me apenas a olhá-lo, sem dizer nada. Ele estendeu a mão e carinhosamente afagou minha bochecha.
— Fico feliz que esteja melhor. Estava preocupado – Disse.
Não sei ao certo o que foi. Se foi amor, se foi saudade, ou carência. Não sei se foi paixão, ou puro êxtase; só o que sei é que um certo calor aos poucos tomou cada célula de meu corpo. Uma vontade inexplicável, algo que eu jamais senti. Algo que nem sei como começar a descrever. Só o que sei dizer é: não havia
absolutamente mais nada no mundo que me importasse – exceto, é claro, Draco e o que eu sentia naquele momento. E foi assim, nessa explosão de desejo e tesão que eu o agarrei. Sim, “agarrei” é a palavra certa para expressar precisamente o que fiz. Logo seu corpo preenchia o espaço que nos separava, fazendo minha pele formigar de uma forma deliciosa onde entrava em contato com a dele. Meus lábios buscaram os dele furiosamente, e a resposta obtida foi sensacional. Nada importava. Nem sequer o ato de respirar.
Eu o queria. Eu
precisava dele.
E eu o tinha exatamente onde queria.
* Rabo-Córneo Húngaro: Dragão com a fama de ser o mais perigoso, o Rabo-Córneo Húngaro tem escamas pretas e aparência de lagarto. Seus olhos são amarelos e os chifres cor de bronze e tende a alcançar 15 metros com suas labaredas. (Fonte: Harry Potter Wiki).
* Felix Felicis: poção da sorte.
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