Quando acordei, surpreendi-me por estar sozinha e no escuro. Perguntei-me como ainda estava viva. Por um instante ou dois até acreditei que havia de fato morrido, mas logo descartei a hipótese. Minha última lembrança era de ser enfeitiçada e então acordei ali. Obviamente, alguém me capturara para Lestrange. Claro que era outra pessoa, pois se fosse ela, eu já estaria morta ou pelo menos estaria pendurada em algum lugar, sangrando, chorando e implorando pela morte. Balancei a cabeça para me livrar de tantas bobagens. O gesto pareceu colocar meu juízo no lugar, pois logo decidi que tinha que sair daquele lugar.
A iluminação era precária e, por essa razão, tudo o que pude distinguir entre o breu foram as pilastras que firmavam o alicerce da construção. Tentei apurar a visão, sem êxito. Todavia, havia familiaridade. Eu já vira aquele lugar antes, só não conseguia me lembrar da ocasião. Tateei, buscando uma saída. Tentei ser tão silenciosa quanto fosse possível, a fim de não me denunciar. Precisava ser cuidadosa até saber com o que estava lidando. Porém, era uma procura infundada que não me trouxe resultado algum. Era muito difícil enxergar, mas não deixei isso me impedir de tentar. Fui tropeçando e esbarrando, ora na parede, ora numa pilastra. Havia uma porta, a qual eu abriria de qualquer jeito assim que a encontrasse. Pensei em produzir um pouco de luz com um feitiço, mas não sabia com o que estava lidando, por isso achei melhor não me arriscar. Cuidadosamente, prossegui, mesmo às segas. Bem, isso até eu me enroscar em algo e cair de cara no chão. Arfei, mas não fui a única – e nesse momento senti um frio no estômago. Além de não estar sozinha, enrosquei-me nas pernas de meu companheiro – por isso caí.
- Senhor Olívaras? – questionou a voz feminina e muito doce, que logo reconheci.
- Luna? – murmurei.
- Quem é? – perguntou.
Imediatamente liguei os pontos e decifrei o enigma. Já sabia onde estava. Eu tinha deixado aquele lugar havia pouquíssimo tempo. Não cheguei a adentrar o cômodo onde estava no momento, mas... Estava de volta à mansão dos Malfoy. Estava no porão deles, o que fazia sentido. Realmente me capturaram para Lestrange... exatamente como imaginei.
Eu estava em sérios problemas, mas no momento o que importava era que reencontrara uma amiga muito querida. Estava sem varinha, mas mesmo assim consegui produzir luz para vê-la. Deu um pouco mais de trabalho do que pensei, mas funcionou. Logo pude enxergar com clareza e ver Luna e o Sr. Olívaras. Estavam muito maltratados e abatidos. Abracei Luna.
- Oh, é tão bom te ver. – murmurei. – Mesmo sabendo que estamos todos ferrados, é ótimo ver você.
Luna pareceu muito surpresa em me ver.
- ! – exclamou. – Lamento ver que foi capturada e estou surpresa. Não pensei que pudessem te pegar.
Dei um sorrido triste.
- Eu fui descuidada. – disse. – E agora Lestrange provavelmente vai me matar.
- Você parece bem tranquila, mesmo diante disso. – afirmou.
- Ah... me desesperar só tornará tudo pior. – comentei. Ela acenou com a cabeça em concordância e me deu um sorriso amistoso.
O Sr. Olívaras estava dormindo num canto, então Luna e eu nos sentamos um pouco afastadas para não o perturbar e conversamos bastante sobre diversos assuntos. Fui ouvinte na maior parte do tempo e ouvi com muito interesse todas as curiosidades que ela tinha para contar e também as histórias. Luna era muito inteligente e perspicaz, e era fascinante escutar tudo o que ela tinha a dizer.
Sem varinha ou pertences, não tinha como saber há quanto tempo eu estava ali. Podia presumir que fazia um bom tempo, já que Luna e eu conversamos muito. E enquanto ela me contava uma das aventuras que viveu com seu pai, a porta no topo da escada se abriu e instantaneamente eu fiz desaparecer a luz que criara. Involuntariamente, fiquei assustada, tanto que cheguei a tremer um pouco.
- Lumus. – reconheci imediatamente aquela voz. Era Draco, eu tinha certeza. Meu coração acelerou de maneira inexplicável, mas agora não era de medo. Ele não demorou a descer, logo confirmando que eu acertara. Realmente era Draco. Estava um pouco longe, pois eu estava com Luna do outro lado do porão sujo, mas ele logo chegou até nós. – , você ficou louca?!
Levantei do chão imundo num rompante e avancei contra ele sem aviso, abraçando-o fortemente. Ele chegou a vacilar e cambalear com o impacto, mas me segurou e me apertou firmemente contra o peito.
- Acho que ainda não. – eu disse baixinho no ouvido dele. – Tem certeza de que é apropriado vir me ver aqui, Draco? Isso não é perigoso?
- Claro que é, mas quem se importa? – retrucou ele. – Precisava saber o que te trouxe até aqui. É o mesmo motivo que da última vez?
- Não. – afastei-me e o olhei nos olhos. No entanto, ele não quis se afastar por completo e por isso segurou minha mão com a que estava livre. Eu sorri levemente com isso. – Eu fiz besteira e dessa vez me pegaram para valer. Não foi proposital.
Ele praguejou baixinho.
- O que faremos agora, ? – perguntou-me.
Não pude evitar meu derretimento, tão fácil quanto manteiga numa frigideira em fogo alto. Era simplesmente muito gentil da parte dele se preocupar comigo daquela maneira. Talvez as coisas realmente estivessem mudando.
- Não sei. – disse. – Não esperava que isso acontecesse e certamente não planejei isso. – balancei a cabeça, inconformada com tamanha estupidez. – Mas não se preocupe, e não faça besteiras. Se percebem que podem usar você contra mim, estaremos encrencados.
Draco bufou, exasperado.
- Eu não sei se aguento mais. – confidenciou.
- Aguente, Draco. – incentivei. – Vai dar tudo certo. Se puder convencer sua tia a me matar mais lentamente ou talvez convencê-la de que Você-Sabe-Quem pode querer que eu continue viva... Se convencê-la de que me matar é um problema e se ela só me torturar, penso em algo para sair dessa.
Por um momento, não falamos nada. Só nos olhávamos. Eu podia ver sua angústia e isso me fazia mal, mas não havia nada que pudesse fazer a respeito.
- Seja forte, Draco. – eu disse, fazendo leve pressão em sua mão. – Você vai conseguir suportar, sei disso. E não se preocupe comigo.
- Ela vai matar você. – disse ele, exasperado. – Não entende? Minha tia está furiosa, . Ela vai destruir você. E acha que eu vou conseguir assistir calado?
Certamente aquela era uma coisa que Draco normalmente faria, mas não quis dizer nada e destruir os sonhos do rapaz. Afinal, ali estava ele, arriscando-se quando eu jamais poderia imaginar em minha vida ver Draco arriscar-se por algo ou alguém. Logo, eu não podia julgar.
- Eu te entendo. – eu disse. – E já que é assim, você terá que me perdoar, mas vou ter de fingir a fim de proteger esse nosso segredo.
- Fingir? – ele pareceu não entender onde eu queria chegar.
- Sim. – respondi. – Perdoe-me, mas não posso deixar que saibam, Draco. – ele parecia um pouco ofendido. – Vão te usar contra mim, entende? Vão te usar para me atingir. Ou vão ameaçar fazer algo comigo para conseguir algo de você. Isso já aconteceu, então você com certeza vai entender que farei apenas o que for necessário.
- ... – Draco parecia um pouco inseguro. Acredito que ele temia pelo que eu pretendia fazer e ele estava certo. Jamais daria a eles a oportunidade de terem vantagem sobre mim. Ou melhor, mais vantagens do que já tinham, porque, convenhamos, estava trancada e desarmada e isso definitivamente contava como vantagem.
- Você confia em mim? – perguntei.
Draco não hesitou.
- Plenamente.
- Ótimo. – sorri-lhe. – Então, não se esqueça de que tudo o que eu fizer e disser na frente deles com relação a você não é verdadeiro, okay?
Ele levou um tempo para ponderar.
- Não gosto nada disso. – admitiu.
- Nem eu. – confessei. – Não me sinto confortável, mas é a saída. Lestrange já tem vantagem suficiente sobre mim e tenho absoluta certeza de que ela vai querer usar você para me atingir, só devido ao passado. Se ela notar qualquer coisa nova, então... Será desastroso.
- É... – ele balançou a cabeça de um lado para o outro, inconformado. – Não posso e nem vou discordar. Tudo bem, . Confio em você e sei que tudo vai dar certo. – ele beijou meus lábios brevemente e me abraçou. Fiquei um pouco sem jeito, preciso admitir. Nós não estabelecemos como ficaria a relação entre nós, pois tínhamos um acordo, que era a de não definir nada ainda. Era complicado saber como reagir depois... Bem, depois de tudo. Escondi meu rosto no peito dele e corei violentamente. – Vou fazer o que você me disse. É melhor eu ir agora... Minha tia chegará a qualquer instante. Prepare-se.
Ele me soltou e já ia sair, mas hesitou. Draco olhou nos meus olhos intensamente e mais uma vez me derreti por completo. Então, à mercê de sua vontade, ele me tomou em seus braços e eu era como massa de modelar em suas mãos. Ele me beijou e não ofereci nenhuma resistência – pelo contrário.
- Sua varinha estará na sala, escondida atrás da estante de livros – informou-me. – Você é poderosa, então imagino que conseguirá recuperá-la dali, certo?
Eu estava sem ar e tudo o que consegui fazer para respondê-lo foi acenar com a cabeça. Ele sorriu, notando o efeito que causara em mim (e pareceu muito satisfeito com o que viu). Ele olhou para Luna, cuja existência não fora assimilada por mim desde o momento em que pus meus olhos em Draco (até me assustei ao notar que ela vira e ouvira tudo). Então, ele ergueu a varinha em direção a ela.
- Obliviate.
—x—
Luna não tinha qualquer lembrança de ver Draco no porão, o que significava que o feitiço dele fora eficaz. Depois que Draco saiu, só consegui pensar em como eu estava entregue aos encantos dele. Tentei tirar aquilo da mente, mas sem sucesso. Era um caminho tortuoso esse que eu percorria com Draco. Não tinha certeza de onde ele iria me levar ou de como terminaria. Só sabia que precisava ser cuidadosa – bem mais do que precariamente fora momentos atrás. Eu teria que ter certeza de que era terra firma antes de pôr meu pé, para não correr o risco de afundar numa areia movediça.
Afugentei os pensamentos relacionados a Draco e me concentrei em Bellatrix e em como eu possivelmente me livraria de ser brutalmente assassinada dali a pouco. Não podia negar que estava com medo, pois estaria mentindo. Pensar nela me deixava apavorada – e cheia de ódio. Imaginei que talvez fosse hoje o grande momento de “tudo ou nada”, onde eu vingaria meus pais e destruiria aquela maldita gárgula. Ou seria o momento em que aquela bruxa que fedia a trasgo triunfaria ao acabar de vez comigo.
Independentemente de qual fosse o resultado, eu não tinha nenhuma escolha. Ou ia com tudo para duelar contra aquela criatura ou corria o grande risco de ser morta – oh, e isso eu me recusava a permitir. No que dependesse de mim, aquela maldita jamais machucaria outro inocente em sua vida medíocre.
Como que atraída por meus pensamentos, Bellatrix Lestrange chegou como um furacão, ameaçadora e destrutiva. Gritava, provocava, quebrava coisas e ria. Completamente maluca.
- , u-hu! – cantarolou Lestrange, como uma cantiga infantil. – Saia, saia! Pare de se esconder e venha brincar! – ela deu aquela risada insana dela, que causava pesadelos até no mais corajoso dos homens. - , u-hu! – repetiu. – Venha já aqui, sua trouxa imunda, escória nojenta!
A porta se abriu num rompante, mas ninguém passou por ela. Era óbvio que ela queria brincar. Era evidente que não perderia nem sequer a mais mínima das chances de me humilhar até a morte. Eu, farta como estava de tanta palhaçada, levantei sem hesitar e fui até ela, dizendo para mim mesma que não devia temê-la, tampouco subestimá-la. Ela era uma oponente sem igual, mas eu não era tão ruim assim. Pelo menos um pouco de trabalho eu daria. Não facilitaria nem por um segundo para aquela megera. Estava na hora de ela sofrer um pouco. Eu devia isso aos meus pais.
Adentrei a sala, alerta, buscando Lestrange com o olhar e não tardei em encontrá-la. Olhava-me com diversão, apreciando o momento. Vaca. Olhou para minhas vestes pretas e arqueou a sobrancelha, mas nada disse. Sendo vaidosa, bem, eu estava muito mais bem vestida do que ela. Narcisa teve muito bom gosto. Eu só tive tempo de pensar aquilo e então o ataque começou.
Eu tinha bem vívida em minha memória a morte de Sirius, então sabia que não podia arriscar ficar na direção de nenhum feitiço que ela lançasse, por isso, mesmo que fizesse barreiras de proteção, esquivava. Quando os feitiços acertavam as paredes, pedras voavam. Ela estava tentando me explodir, literalmente. Então, tão rápido quanto pude, invoquei minha varinha enquanto tentava me defender. Por sorte, consegui pôr minhas mãos nela e não tardei em contra atacar. Lancei um bombarda maxima e explodi grande parte do chão. Nisso, consegui derrubá-la. Ela acertou minha perna com alguma azaração e imediatamente fez um corte. Meu sangue começou a escorrer. Não parecia ser grave, por isso, canalizei toda a minha força e consegui revidar com um sectumsempra que lhe acertou nas costas. Não deve ter acertado em cheio, pois ela não caiu. Ficou ainda mais feroz e eu já estava disposta a explodir tudo. Eu queria vê-la morta e queria já.
De repente, eu não entendia mais o que estava acontecendo. Fui arremessada para trás e caí. Não me permiti ser distraída pela dor, mas quando levantei, pronta para revidar, notei que Lestrange caíra também. E foi então que vi: Draco interferiu. Horrorizada, olhei para ele, gritando com o olhar: “QUE DIABOS VOCÊ ESTÁ FAZENDO?!”
- Chega! Mais um pouco e vocês colocam tudo abaixo!
- Como OUSA interferir, Draco?! – berrou Lestrange.
- Se você quer explodir tudo, faça isso longe de nossa casa! – Draco gritou de volta.
- Admita que você está com medo por sua garotinha. – disse ela com escárnio. – ADMITA que está morrendo de medo de ver o sangue dela em minhas mãos! ADMITA!
- JÁ CHEGA!! – gritou Draco.
- Realmente, já basta. – disse Voldemort, adentrando a sala e se pronunciando.
O silêncio absoluto recaiu sobre a sala enquanto ele avaliava o que acontecia ali. Eu tremia dos pés à cabeça, pois estava apavorada.
- Ora, ora. – disse ele. – Vejam só. Nos encontramos mais uma vez, .
Limitei-me ao silêncio.
- Alguém pode me explicar o que está acontecendo aqui? – perguntou ele. Petulante, levantei a mão. Eu estava morrendo de medo, mas ninguém precisava saber disso, não é? Ele, por sua vez, pareceu interessado no que eu tinha a dizer.
- Bellatrix quer me matar. – eu disse a ele. – E eu não estou interessada em morrer ainda.
Voldemort sorriu.
- Você tem sorte de ser valiosa, senhorita . – disse ele. – Tenho certeza de que minha amiga Lestrange pode mudar de ideia, se a essa altura a senhorita quiser se juntar a nós.
Oh, céus. Quase me esqueci de que quando o vi pela primeira vez ele disse que eu deveria pensar sobre me juntar a eles. A cada instante que passava, a situação piorava e eu me encrencava cada vez mais.
- Não me sinto confortável em formar aliança com vocês. – eu disse, com cautela. – Não seria aceita e certamente não poderia confiar em seus amigos.
Ele semicerrou os olhos para mim.
- Draco. – disse Voldemort. Eu gelei. – O que você acha?
- É, Draco. – falei, em tom de escárnio, tentando manter a impressão de que eu o odiava. – Acha que sou confiável para me juntar a vocês?
Draco engoliu a bile. Estava completamente tenso.
- Milorde. – começou ele. – Bom, a-acho que ela não é confiável. Mas, ela pode nos trazer problemas nas mãos deles. N-não acho confiável dar a ela a liberdade de trabalhar conosco agora, mas ela pode vir a ser útil...
Suspirei. Podia ter sido pior.
- Ele quer que eu seja prisioneira, milorde. Surpreendente! – comentei. – Podia ser pior. Ele podia ter pedido para atear fogo em mim.
Voldemort me olhou feio. Meu coração quis sair pela boca.
- Vou manter você aqui até você servir de alguma coisa para mim. – disse ele sem hesitar. Não parecia interessado em perder ainda mais tempo comigo e certamente estava encerrando a situação. – E se você não servir para nada, certamente serve de jantar para Nagini.
De uma coisa eu agora tinha certeza: Voldemort certamente sabia como fazer você ter pesadelos à noite.
Fui prisioneira durante um longo período. Não consegui escapar do porão, nem mesmo com Narcisa e Draco tentando me ajudar de todas as maneiras possíveis sem levantar suspeitas. Tudo se tornou ainda mais difícil devido ao fato de Draco não poder ficar muito em casa. Ele, afinal de contas, estava estudando regularmente em Hogwarts. Era simplesmente suspeito demais que ele ficasse em casa justamente quando sou prisioneira em seu porão. Somava-se a isso o fato de que Voldemort queria que eu ficasse segura e sob seu comando, de modo que era vigiada de perto por comensais da morte, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. E Narcisa, coitada, não conseguiu me livrar dessa vez. Durante todo esse período, ela tentou incansavelmente me ajudar, mas não foi bem sucedida. E para completar, eu também não consegui fazer nada para me salvar. Acho que apanhar, ser alvo de diversas azarações e tentativas de invasão de pensamentos todos os dias contribuiu severamente com isso. Eu chorava com frequência, pedia a Deus, Jesus, Merlin e qualquer um que pudesse ouvir que por tudo o que fosse mais sagrado, me desse uma luz, uma ajuda ou o que fosse possível oferecer. Desespero não define, tamanhas eram as proporções do que sentia. E nada adiantava. Não importava o quanto tentasse, não conseguia libertar-me.
Voldemort andava muito ocupado (graças a Deus) e raramente sabia-se dele. Seus Comensais continuavam forçando a barra comigo, tentando extrair informações (que me neguei a dar), mas isso não chagava aos ouvidos dele. Faziam o que bem entendessem comigo. Não demorou para que o mesmo começasse a acontecer com Draco. Ele, que se mostrou mais teimoso do que jamais achei ser possível, dava um jeito de tempos em tempos vir me ver. Chegamos a nos ver umas quatro vezes. Nada acontecia entre nós além de uma conversa e uns abraços apertados, nada que indicasse intimidade – mesmo sendo encontros às escondidas. Nada muito diferente do modo como eu reagiria ao ver Harry, por exemplo. Entretanto, não importava. O pouco que tínhamos bastava para acalmar nosso desespero, mesmo que momentaneamente. Não sei dizer ao certo o que aconteceu durante essas breves visitas, mas só pude presumir que, em alguma dessas ocasiões, ele acabou sendo visto por algum comensal. Só posso imaginar isso, pois sei que o boato de que Draco saía furtivamente de Hogwarts para vir me ver chegou aos ouvidos dos comensais, que mais do que depressa obtiveram as respostas para todas as suas dúvidas invadindo a mente de Draco. Pelo que soube, bastou um momento na mente dele e Lestrange conseguiu o que queria (sim, mas é claro que foi ela quem invadiu a mente do garoto). Então, do dia para noite, minha farsa de que o odiava ruiu, como eu já sabia que aconteceria mais cedo ou mais tarde.
Isso, enfim, trouxe Voldemort até mim.
Já havia muito tempo que eu estava presa. Não surpreendentemente, meio que perdi noção de tempo, de modo que não sei exatamente quando isso aconteceu. Àquela altura, estava muito frágil e debilitada, e minha mágica estava muito, muito fraca. Não que adiantasse de alguma coisa... me mantinham cercada por barreiras de proteção e eu não conseguia me defender. E logo depois de ser torturada (mais uma vez), Voldemort mandou me levarem para a sala onde eles tinham suas reuniões. A mesma sala onde eu o conheci, meses antes. Para minha surpresa, assim que os comensais me jogaram no chão, ele mandou todo mundo sair. Eu estava tonta, mas consegui ver Draco relutando silenciosamente. Por sorte, Narcisa o puxou para fora, e então, estávamos sozinhos.
— Meus amigos me contaram algumas coisas muito interessantes a seu respeito, – disse Voldemort, enquanto observava Nagini arrastar-se ao longo da mesa. – Soube que você e Draco Malfoy já não então mais em atrito. Ao que parece, você perdoou a indiscrição de seu amigo. – Pus-me de pé, usando a cadeira como apoio para conseguir. Minhas pernas vacilavam e eu temia não conseguir ficar de pé, mas não podia permitir que ele visse o quanto eu estava debilitada. Voldemort me observava atentamente. – Ainda não confio inteiramente em você, devido ao seu passado, mas acredito que o jovem Malfoy estava certo no que disse a seu respeito no dia em que você chegou aqui. – Agora Nagini se enroscava na cadeira atrás dele e Voldemort acariciava a cabeça da cobra. Estremeci. – Por não poder confiar em você, não vai a lugar algum e espero que entenda que não posso deixá-la em liberdade. Mas te dou minha palavra de que no futuro receberá um tratamento muito melhor. Sei que poderei confiar em você eventualmente. – Eu continuava sem falar nada. Estava tonta e sentia náuseas, resultado de tantas azarações. – Mas agora vamos ao que interessa. Quero saber o que busca – disse ele, num tom sombrio e assustador. – O que a levou a Hogwarts, ao Ministério e, mais recentemente, a esta casa.
Fechei os olhos. Imaginei que esse seria o fim da linha.
Antes que eu pudesse sequer pensar em alguma coisa para dizer a ele, senti algo estranho acontecer. A princípio, era só uma sensação incômoda, irritante e desconfortável, que logo foi agravando-se. Fiquei confusa, desnorteada. Minha mente girava e girava. Tentava fazer a confusão passar, pois tanta tontura me deixava enjoada. E só então percebi o que estava acontecendo. Voldemort invadiu meus pensamentos e me desnorteava para que eu não percebesse nada. Ao constatar tal fato, tentei com todas as minhas forças repelir sua invasão, mas já era tarde demais. Consegui assistir algumas das memórias que ele via. Tentei ainda mais; chegava a sentir dores fortes em minha cabeça por isso, seguidas de fortes pontadas nas têmporas como forma de protesto ao meu esforço. Todavia, por mais que eu fizesse o máximo que podia para detê-lo, não surtia efeito, pois ele era muito poderoso. Eu não conseguia tirar o Lorde das Trevas dali, não conseguia me defender e impedir que visse meus pensamentos. Estava à mercê de sua vontade. Então, quando bem entendeu, ele simplesmente deixou minha mente e me encarou com uma expressão que teria facilmente me feito sujar minhas calças. Porém, reuni o restinho de dignidade que possuía e mantive minha calma e autocontrole. A última coisa que eu poderia querer era Voldemort vendo o quando realmente me apavorava. Entretanto, eu estava fazendo vista grossa ao fato de que ele invadira meus pensamentos. Sentindo-me extremamente burra, (e sabendo que estava completamente ferrada) constatei que àquela altura ele provavelmente sabia de tudo o que eu pensava sobre ele e muito, muito mais.
Eu não sabia o que esperar. Não conseguia imaginar qual seria a reação dele. Mesmo apavorada, não deixei de olhar em seus olhos enquanto esperava por uma atitude, qualquer que fosse. Eu não sabia ao certo o quanto descobrira, mas ele com certeza sabia o suficiente. Qualquer coisa que visse bastaria para destruir tudo o que eu vinha tentando fazer, qualquer descoberta poderia resultar no fim de meus planos e até mesmo no fim de minha vida. Prendi a respiração e encarei aqueles olhos frios e cruéis, aguardando o que estava por vir. Voldemort parecia estar divertindo-se com a situação. Cheguei a tal conclusão após ver o sorriso agourento que ele tinha na face. Percebi, então, que não havia nada ao meu alcance além de esperar pela reação dele com relação ao que acabara de descobrir.
— Eles estavam certos, afinal – disse Voldemort, ainda sorrindo. – Sobre você e Draco. Sobre sua missão. Não é mesmo?
Fechei os olhos durante um longo instante, sem conseguir me controlar por não saber como agir.
— Quero entender os fatos – disse ele. – Algo a levou a Hogwarts, ao Ministério e, mais recentemente, a esta casa. Agora, sei que o “algo” era a missão passada por Dumbledore. O que eu não entendo, minha jovem, é o motivo de Dumbledore não ter explicado exatamente o que você deveria procurar.
Foi quando vi a luz no fim do túnel. Ele acabara de me dar uma chance de escapar daquela situação – eu só precisava ter cuidado com o que diria.
— Ele não me contou tudo, não me deu todas as informações – eu disse. Era a verdade. Entretanto, eu não tinha certeza se continuaria a contar a verdade dali em diante. Precisava mentir, mas temia que Voldemort descobrisse. – Ele me ensinava magia avançada, pois estava me preparando para algo... – Dei uma pausa com a desculpa de uma tosse, mas o fiz mais para organizar as ideias. – Acho que ele não confiava em mim o suficiente. Talvez estivesse achando que teria tempo hábil para me dizer o que eu precisaria fazer, o motivo e como fazer. Mas então, ele foi morto e eu estava completamente no escuro...
— E por que ele achava que não poderia confiar em você? – Voldemort quis saber. Ótimo. Boa pergunta. Por que diabos Dumbledore não confiaria em mim? Por sorte, estava inspirada naquele dia. Logo uma ótima ideia me ocorreu.
— Draco – respondi. – Imagino que ele achou que eu estava me envolvendo demais com o lado inimigo. – Pela expressão dele, parecia estar aceitando o que eu dizia como verdade. – E eu não tinha tantos motivos para seguir seus passos, não é mesmo? Sinto que ele estava me usando. Nunca quis se aproximar como família e só me trouxe agora porque lhe convinha. – As mentiras fluíam facilmente, mas fiz o possível para não pensar nisso como mentira. – No fim, o que foi decisivo para a escolha de qual lado seguir foi o que me convinha. Como eu já lhe disse uma vez, do seu lado eu só tive perdas. A Ordem me acolheu e eles fariam tudo por mim.
— E por isso você foi atrás do que Dumbledore pediu?
— Sim, exato. Mas eu não consegui mais falar com ele, mesmo depois de ter seu retrato em Hogwarts, pois Snape não me deixava nem respirar e acredito que se tivesse tentando invadir seu escritório e ele me pegasse, teria me matado. Então, basicamente, estou tentando fazer por Dumbledore algo que nem sei o que é, nem como conseguir.
Voldemort ficou muito quieto, avaliando tudo o que ouvira de mim. Eu tremia mais do que antes, já que agora estava apavorada diante da possibilidade de ser pega mentindo. Voldemort fez um aceno com a varinha e eu cheguei a me encolher, esperando pela Maldição da Morte, mas ao invés disso, ouvi que a porta abria-se atrás de mim.
— Viver de desavenças passadas é infantilidade. Por enquanto, há um lugar para você ao meu lado, aguardando você ficar pronta para tomá-lo. Mas lembre-se muito bem do que digo, pois a próxima vez em que eu perguntar a você se vai se juntar a nós será a última, e eu serei bem menos misericordioso que o normal, minha jovem.
Assenti, tremendo.
— Como o senhor disse, eu ainda não ofereço confiança o bastante. Talvez na próxima vez em que me perguntar eu demonstre alguma razão para merecê-la – improvisei.
Voldemort assentiu.
— E para seu bem, espero que mereça.
—x—
Depois disso, fui jogada de volta na prisão imunda onde me mantinham com Luna e o Sr. Olívaras. Desde esse dia, não tive mais nenhum encontro do gênero com Voldemort novamente. Passava praticamente todo o tempo pensando em como sair daquela situação e até tentava escapar, mas não fui bem sucedida. Draco e eu continuamos a ser retaliados – os comensais não paravam de tentar a todo custo invadir nossas memórias. Por sorte, Draco aprendeu a se defender melhor e não tivemos mais problemas por parte dele. O que descobriram limitou-se exclusivamente ao nosso momento de intimidade. Tivemos muita sorte que nada sobre a ajuda que mãe e filho me deram escapou sem querer. Comigo, nunca conseguiam nada demais. Talvez um vislumbre ou outro da morte dos meus pais, mas nada que me comprometesse. As pessoas que tentavam invadir minha mente não tinham nem metade do poder que Voldemort tinha, e por isso foi muito mais fácil mantê-los longe dos meus pensamentos.
Certo dia, logo após o incidente com Voldemort, Narcisa mandou Rabicho me buscar no porão e me levar até a sala, para que pudéssemos conversar. Confesso que fiquei muito assustada quando a vi, pois era arriscadíssimo ficarmos a sós. Não podiam jamais desconfiar dela – especialmente devido ao que todos os fãs de Harry Potter sabem que ela fará por Harry. Ok, foi por preocupação com o filho, mas ainda assim, beneficiou Potter. Para quem não se lembra, eu digo: mais para frente na história de Relíquias da Morte, Harry se entrega a Voldemort e deixa que ele desfira a Maldição da Morte em sua direção. Harry é atingido e chega a vivenciar uma experiência de quase morte. Isso tudo, claro, porque uma parte de Voldemort – um pedaço de sua alma – vivia dentro de Harry desde que o Lorde tentara matá-lo pela primeira vez. Essa parte da alma de Voldemort só poderia morrer se o próprio Harry fosse morto, pois Voldemort fez de Harry a horcrux que jamais planejou criar. Quando Harry recupera a consciência, depois de quase ter morrido, Voldemort manda Narcisa verificar se o garoto de fato se foi. Quando ela chega perto de Harry, pergunta a ele sobre Draco e, quando ele responde, Narcisa calmamente mente ao Lorde das Trevas e confirma a morte de Harry. Provavelmente já disse isso, mas não me canso de dizer: se eu adoro Narcisa, é por causa disso. Eu a amo por isso; foi onde ela ganhou meu respeito. Concluindo meu raciocínio, ninguém jamais poderia desconfiar dela, pois seria crucial que ela passasse despercebida para cumprir seu papel e, de certa forma, salvar Harry num futuro assustadoramente próximo.
— – disse Narcisa, num tom frio. – Trouxe você aqui hoje porque o Lorde das Trevas teve uma séria conversa comigo recentemente. – Engoli a seco. Será que ele havia maltratado ela? – Como agora ele já sabe da realidade entre você e meu filho, acredita que essa é a nossa chance de mostrar que você tem seu lugar ao nosso lado. – Havia algo de estranho no modo como ela falava. Parecia um discurso ensaiado (precariamente, mas ainda assim ensaiado) e que ela não tinha a menor vontade de fazer. – E eu acredito também. Você tem muito a ganhar conosco e com o tempo começará a ver isso com mais clareza. Por isso, achamos que demonstrar nosso apoio e nossa vontade de ter você ao nosso lado é importante agora, num momento tão notável para o nosso lado. Estamos ganhando e, mesmo assim, queremos você ao nosso lado. Não vemos você como uma arma, mas sim como uma aliada na defesa de um ideal, por um futuro melhor. E é por isso que eu hoje ofereço uma oferta de paz em forma de presente, e expresso meu desejo de um dia ver você se tornar parte de minha família. – Ela então estendeu uma caixa quadrada e de veludo preto, elegante e discreta. Eu, embora relutante, peguei e abri. Sem entender, encarei a minha pulseira favorita, que foi um presente de Draco há pouco mais de um ano. Pulseira que eu devolvi a ele depois de tantas brigas. Pulseira que representava tudo de bom entre nós dois. – Cientes da importância que essa pulseira tem para você, acreditamos que essa é a melhor das ofertas de paz possível. Draco concorda inteiramente com tudo o que eu disse e, se pudesse estar aqui hoje, diria exatamente o mesmo que eu.
Não preciso nem dizer que não engoli esse discurso, né? Havia algo realmente suspeito com relação a tudo. Mas, era só minha pulseira favorita, inofensiva e da qual eu sentia muita falta, por isso não recusei. Calada, estendi os braços atados por cordas enfeitiçadas. Ela colocou a pulseira em meu pulso esquerdo. Sorri para ela, dizendo com o olhar o que eu pensava. Isso bastava para que ela visse que eu entendi que havia algo errado.
— Obrigada, senhora Malfoy. Esse gesto significa muito para mim.
E isso foi tudo. Rabicho me puxou pelo braço e foi então que eu notei que havia alguns comensais de olho em nós. Pelo que pude ver, eles engoliram a história toda. No fim das contas, era isso o que importava.
—x—
Três meses se passaram. Não, você não entendeu errado, e não, isto não é uma brincadeira. Três meses inteiros se passaram. E eu só soube que se passara tanto tempo quando escutei gritos de Lestrange – tão altos que pude ouvir todas as palavras claramente – sobre a espada e o cofre. Instantaneamente liguei os pontos e me dei conta de que Harry, Rony e Hermione estavam ali. Não demorou muito para que tivesse a confirmação; logo ouvi os gritos de Hermione também e, num dado momento, Harry, Rony, Dino e Grampo (o duende de Gringotes) foram jogados como sacos de lixo no porão, não muito longe de onde eu estava deitada.
A realidade me abateu como um forte soco na jugular quando percebi que o tempo estava passando depressa e que o fim se aproximava. Ver Harry e Rony tinha um significado enorme para mim àquela altura. Fazia tanto tempo desde a última vez em que estive com eles que eu sentia a saudade doer em meu peito, mas não pude disfarçar meu descontentamento e pavor ao vê-los. Exatamente como no livro, Rony gritava de modo desesperado por Hermione enquanto Harry tentava acalmá-lo. Assisti a tudo tentando me recompor e manter a calma.
— ? – Harry ficou extremamente confuso ao me ver.
— Como foi que conseguiram capturar alguém com poderes como os seus? – Rony foi extremamente direto.
Eu fechei os olhos, sentindo-me derrotada. Balancei a cabeça negativamente à guisa de uma resposta. Notei que eles estavam com as atenções divididas, tentando compreender o que me levara àquela situação, porém preocupados com Hermione ao mesmo tempo. Senti a necessidade de intervir e foi exatamente o que fiz.
— Ouçam com atenção – eu lhes disse. – Não percam seu tempo pensando em mim. Vocês têm que se preocupar com Hermione. – Notei que eles pareciam confusos, por isso acrescentei. – Não se preocupem comigo em hipótese alguma, vocês entenderam? Eu não pertenço a essa cena. Se vocês não fizerem o que eu digo, as coisas podem dar muito errado. Vocês entenderam?
Rony engoliu a seco e me deu um sorriso condescendente em compreensão. Harry assentiu com um olhar triste.
Felizmente, eles entenderam o recado e voltaram sua atenção para o que realmente importava. Suspirei, aliviada, repassando mentalmente o que aconteceria a seguir. Ignorei o que vi no filme, pois sabia que estava errado. As coisas aqui seriam diferentes. Não era Dobby, o elfo doméstico, quem nocautearia Rabicho. Não, não. Isso seria, pode-se dizer, mais uma obra do Lorde das Trevas. E, também diferentemente do filme, Rabicho morreria. E foi mera questão de tempo até tudo se desenrolar. Eu só precisava aguardar e agir quando tivesse oportunidade.
Inicialmente, pensei em partir junto com eles, através dos poderes de Dobby, mas tive muito medo. Eu sabia muito bem o desfecho daquela fuga em massa que terminava com uma adaga no coração de Dobby. E se por minha culpa a adaga acabasse em Harry? Em Rony ou Mione? Ou em Luna ou Dino? Ou até mesmo em mim? Eu tinha plena consciência de que todas as minhas ações poderiam afetar direta ou indiretamente, de modo mínimo ou severo, os fatos dos quais eu tinha conhecimento e que, querendo ou não, eram o melhor desfecho possível. Apavorava-me a ideia de me meter no meio e acabar estragando tudo. Essa era uma derrota da qual eu simplesmente não precisava. Todavia, descartar essa rota de fuga me deixava com praticamente nenhuma alternativa. Eu poderia tentar fugir como da outra vez, então, foi o que pensei. Não seria tão fácil quanto antes, mas achei mais apropriado do que pôr em risco a vida de meus amigos.
De decisão tomada, – o plano então era esperar o circo pegar fogo e sumir dali tão logo fosse possível – tudo o que fiz foi assistir ao desenrolar dos fatos. Minha curiosidade me consumiu, de modo que me vi tentado a qualquer custo ver a cena, principalmente porque queria ver Draco, ver sua expressão, entender verdadeiramente o que ele pensara e sentira naquela situação crítica. Precisava ver o momento em que, desde quando Harry Potter era só um personagem num livro mais que perfeito, meu conceito sobre Draco Malfoy mudou drasticamente. E, sem perder tempo, fui assistir ao desenrolar da cena. Ajoelhada nos degraus, subi aos poucos, engatinhando, procurando a melhor visão possível da situação.
— Eu disse, larguem as varinhas! – ouvi a voz de Bellatrix. Embora não pudesse vê-la, tinha a visão em minha mente de uma forma muito clara. Ela, com aquela faca pressionada contra a garganta de Hermione, cortando a pele, ameaçando tirar a vida dela.
— Está bem! – ouvi Harry gritar. Em seguida, ouvi o ruído grotesco da varinha caindo ao chão.
— Ótimo. Draco, apanhe-as! O Lorde das Trevas está vindo, Harry Potter! A sua morte se aproxima!
Ouvi passos apressados e instintivamente soube que era Draco. Com certeza foi ele quem correu, apanhou as varinhas e depois voltou para o lado da tia. Olhei através da porta entreaberta e confirmei minhas suspeitas ao vê-lo voltar. Por um momento, meio que me desliguei de todo o resto enquanto o observava atentamente. O modo como ele segurava as varinhas que recolhera de modo frouxo, o modo como olhava das varinhas para Harry e de Harry para a tia e o modo como parecia desconfortável com a situação. Até culpado, talvez. Só voltei à realidade quando vi Harry saltar o sofá e pegar as varinhas da mão dele. Draco olhou para Harry com certa preocupação e culpa, que cada vez mais se acentuava em sua expressão. Ele sequer relutou. Aos olhos dos outros, era só o velho Draco sendo covarde. Aos meus olhos, depois de tudo o que vivenciei e de tudo o que sei através dos livros, Draco não queria fazer mal a Harry, tampouco queria que algo de ruim lhe acontecesse ali. Não se deu ao trabalho de lutar não por medo, como todos pensariam, mas porque de certa forma torcia para que escapasse. Ele mesmo escaparia, se possível. Era isso o que estava claro em sua expressão. Eu me senti muito bem ao ver aquilo. Era realmente bom ver que ainda havia esperanças para Draco.
Num surto de inspiração, aproveitei-me de todo o caos para me ocultar com um feitiço de invisibilidade e escapar. Como eu sabia que não estava em condições de escapar e lutar, decidi me esconder no quarto de Draco e esperar a poeira baixar. E foi o que eu fiz: ocultei-me com o feitiço e corri. Passei no meio da balburdia e cheguei inclusive a ver o momento em que aparataram. A cena era desesperadora. Tão rápida que um simples piscar de olhos seria o bastante para perder a cena a maior parte da cena. Engoli a seco, dizendo a mim mesma que, por mais que o resultado fosse triste, era assim que deveria ser e não havia nada que eu pudesse fazer a respeito. Todavia, isso não tornava a situação menos entristecedora.
Apressei-me pelas escadas e corredores, tão rápido quando pude sem anunciar minha presença. Pensando no caso de haver mais alguém perambulando por ali, não me arrisquei a fazer ruídos e chamar atenção. Logo estava no quarto de Draco, a salvo e sem mais complicações. Permiti-me até a sentir certo alívio, pois era a primeira coisa boa que me acontecia em semanas. Entretanto, o sentimento foi passageiro. Meu tempo havia acabado. Não imaginei que ficaria presa três meses, impotente, sem conseguir me defender. Eu estudei tanto, preparei-me com tanta vontade... Severus me ajudou muito, e eu tinha certeza de estar preparada para sair das garras de Comensais da Morte. Talvez isso fosse arrogância de minha parte, mas acreditei plenamente nisso. Achei que, contanto que não fosse Lorde Voldemort em pessoa, eu possuía grandes chances de vencer, pois isso acontecera no passado. Ganhei deles, sempre. Claro, sempre tiravam algo (ou alguém) de mim, acontecimento que me deixava devastada sempre, mas mesmo assim, eu era vitoriosa. Certamente não esperava ser prisioneira durante tanto tempo.
A vida é cheia de surpresas, afinal.
Emergi do mar de pensamentos forçadamente quando alguém abriu a porta do quarto num rompante. Quase caí no chão de tão forte que foi o susto que levei. Com a mesma violência com que abriu a porta, tornou a fechá-la, de modo que ele se chocou no batente com um baque muito alto. Com o coração em disparada, encarei-os.
— Draco, trate de se acalmar – pediu Narcisa, num tom de alerta, a voz demonstrando preocupação.
— Como vou me acalmar? Você VIU mãe, você também viu! – Draco estava à beira de perder o controle.
— Shhh – fez Narcisa, por sua vez, num tom ríspido. Imaginando que ela não queria que mais ninguém ouvisse a conversa, tratei de enfeitiçar a porta com o Abbafiato e o confundos, de modo que ninguém ouvisse nada e não se preocupasse com isso, afinal, confuso, nem se lembraria do motivo de querer ouvir atrás da porta. Isso deveria bastar. Feito isso, voltei meu olhar na direção dos dois, para ver a briga e entender do que se tratava. Eles não me viam, o que significava que, apesar dos apesares, minha mágica não estava tão ruim quanto parecia.
— Você viu, mãe – ele insistiu, elevando o tom de voz. Suspirei de alívio por ter protegido a porta. – Você viu que não estava junto deles e ela sumiu! Ela não foi com eles, não está em lugar nenhum e também não pode ter saído sozinha, por causa dos feitiços! Você sabe muito bem, mãe!
— Acalme-se, Draco!
— Como posso ficar calmo?! – ele a cortou. – E se eles fizeram alguma coisa com ela? HEIN?
Por mais lindo que fosse vê-lo se preocupar comigo, não podia continuar assistindo àquela discussão quando eu, sendo o assunto central dela, poderia muito bem encerrá-la. Por isso, removi o feitiço para que pudessem me ver.
— Hey – chamei a atenção dos dois, para que notassem minha presença. Ambos, sobressaltados, arfaram e levaram a mão ao peito. Esbocei um sorriso como forma de pedir desculpas. – Estou bem aqui, já pode parar de se preocupar.
Para minha surpresa, Draco veio rapidamente em minha direção e me tomou em seus braços com fervor. Sem reação, só arregalei os olhos, surpresa. Narcisa, por sua vez, não parecia nem um pouco surpresa com o presenciara, e só esboçou um sorriso aliviado em nossa direção. Passado o choque inicial, retribuí o abraço apertado de Draco e afundei o rosto em seu pescoço, sentindo seu perfume, feliz por estar em seus braços.
— Oh, – murmurou Draco ao meu ouvido. – Pensei... – Ele não parecia capaz de terminar o raciocínio. Sorri ao constatar sua preocupação comigo. Senti um calor no peito que aquecia o coração, totalmente provocado por aquelas três simples palavras. Era fofo demais. O sentimento parecia tão genuíno que, mesmo sob as circunstâncias nas quais me encontrava, consegui encontrar em mim uma fagulha de felicidade.
Contrariando meus desejos pessoais, afastei-o de mim. Olhei em seus olhos por um instante apenas, vendo que aos poucos o desespero dava lugar ao alívio. Sorri um pouco mais amplamente, como quem se desculpa.
— Está tudo bem agora – eu disse, embora soubesse no momento em que deixei as palavras escaparem de meus lábios que estava mentindo. Ainda havia muitas coisas por acontecer antes que eu pudesse sequer pensar que algo estivesse remotamente bem. Relutante, comecei a organizar meus pensamentos, pois precisava agir depressa. Há pouco descobri que perdi três meses, que me fariam muita, muita falta mesmo. Era hora de me apressar e agir antes que fosse tarde demais. Meu olhar encontrou o de Narcisa e consegui identificar contentamento em sua expressão. Isso me alegrou bastante. Sacudi a cabeça para trazer de volta o foco e fazer de uma vez o que era necessário.
— Eu preciso ir – eu disse a eles. – Tenho que correr contra o tempo.
— Não se preocupe – disse Narcisa, aproximando-se e afagando meu braço, direcionando a mim um olhar maternal. Tive que ser muito forte para que meus olhos não marejassem, pois era difícil de encarar qualquer coisa maternal sem me lembrar de minha mãe. Esbocei um sorriso triste para ela. – Vou dar um jeito de te tirar daqui.
Infelizmente, era hora de mais uma despedida. Eu já estava cansada de dizer adeus.
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Deu um pouquinho de trabalho, mas consegui escapar, graças à Draco e Narcisa. Assim que me vi livre, fui diretamente para o chalé das conchas, onde sabia que encontraria os meus amigos. Quando desaparatei, encontrei-os do lado de fora, na praia, exceto por Rony e Hermione, que eu sabia que estavam dentro do chalé. Hermione estava ferida e Rony a levara para lá. Não fazia muito tempo que eles escaparam; devo ter chegado com apenas uns quinze minutos de atraso. Cheguei a tempo de ver o sofrimento de Harry ao constatar que perdera Dobby. No momento em que percebi o que se passava, notei que preferia não ter visto a cena. Já bastava o livro e o filme; essa era uma cena que eu não precisava ver acontecer.
Eles pareceram muito surpresos quando me viram; acho que não pensaram que eu conseguiria um meio de escapar sem Dobby – o que é muito provável que ocorresse caso não tivesse a ajuda de Draco e sua mãe. Harry não me deu atenção nenhuma, mal notara minha presença, mas eu sabia que ele estava em profundo pesar. Os outros, por sua vez, estavam curiosos acerca de muitas coisas, por isso me bombardearam com perguntas. Eu respondi muito evasivamente e me desviei tão cedo quanto foi possível, de maneira um tanto rude. Corri para dentro do chalé e procurei Rony e Hermione. Eu sabia que Harry ficaria um bom tempo dando a Dobby um enterro apropriado. Como essa seria praticamente minha única chance de entrar em contato com eles sem interferir na história, apressei-me ao máximo. Estava muito ansiosa; havia tanto por fazer em tão pouco tempo!
Logo achei Rony e Mione. Ela estava muito, muito pálida mesmo, e a aparência dela era péssima. Lestrange fez dela um trapo.
— Aquela maldita – ralhei, sentando-me na beirada da cama de Hermione, olhando para ela com um aperto no peito. Ela estava desacordada. Logo depois dei uma espiada na expressão de Rony. Ele também olhava para Mione, mas com uma fúria singular no olhar, que eu sabia que era toda direcionada para Lestrange. – Ela melhorou?
— Um pouco – ele respondeu num tom de voz baixo e preocupado.
Hermione se mexeu e logo abriu os olhos. Nossa breve conversa acabou por despertá-la.
— – disse ela, com um sorriso fraco e cansado.
— Oi – eu disse, sorrindo.
— Como se sente? – Rony perguntou a ela.
— Melhor – respondeu. – Só estou um pouco cansada e dolorida. – Rony disparou um turbilhão de xingamentos bem baixinho, dos quais eu entendi muito pouco, mas o suficiente para saber que, naquele momento, tudo o que ele queria era fazer Lestrange pagar pelo que fez. Bem, pensei ironicamente, entre na fila. – Mas isso não é importante agora. , o que houve? Onde estava? Como chegou aqui?
— Você acabou de ser torturada, mas está preocupada comigo? – eu ri levemente.
Ela deu um sorriso fraco.
— Conte-me.
— Eu fui capturada num descuido – expliquei. – Estava desprotegida, pois eu procurava por vocês e com os feitiços de proteção, não daria tempo de falar com vocês no breve instante em que vocês ficam vulneráveis para poder aparatar. Acabou que eles me pegaram antes que eu pudesse me defender... Levaram-me para a mansão dos Malfoy e eu estive presa lá desde então.
Os dois murmuraram, surpresos.
— E como você escapou hoje? – Rony não pôde deixar de perguntar.
— Eu tive ajuda de Draco e sua mãe – respondi com simplicidade.
Ambos pareceram surpresos. Hermione, porém, pareceu mais interessada em outro assunto. Estava curiosa sobre o que havia acontecido entre Draco, Narcisa e eu, mas parecia ter outra prioridade no momento.
— Mas o que levou você a nos procurar? – perguntou. – Por que se arriscou tanto para chegar até nós?
— Porque eu estava perdida e precisava muito de ajuda – respondi. – E esse período de três meses em que fiquei presa era justamente o tempo em que eu podia ficar com vocês, pois não iria interferir tanto no rumo que a história deve tomar.
— Como assim? – Rony questionou.
Ponderei um pouco antes de responder. Não achei que pudesse ser informação demais, de modo que não haveria problema em responder a essa pergunta.
— Há um salto de exatos três meses na história – informei. – Ela termina de narrar uma parte e fala que só três meses depois... – Pensei um pouco antes de responder. Já havia acontecido, então que mal haveria? – Rony finalmente conseguiu sintonizar a rádio. E então, Harry cai no tabu que leva vocês até a mansão dos Malfoy. E foi aí que eu tive a ideia de procurar vocês. Pensei que vocês poderiam me ajudar a achar o que eu estou procurando. Mas aí, como vocês já sabem, tudo deu errado e eu perdi esses três meses que seriam muito, muito valiosos. Não consegui fazer nada; isso porque tentei de tudo para escapar! Mas nada deu certo.
— E por que diabos Malfoy não ajudou você a escapar antes? – perguntou Rony, irritado. – Aquele verme não serve para nada mesmo, impressionante.
— Não é assim, Rony – defendi, mantendo um tom de voz manso. – Não é a primeira vez que eles me ajudam. Lestrange ia me matar e eles me ajudaram a escapar. O problema foi que, dessa vez, havia muito mais comensais, muita desconfiança e muito mais dificuldade.
Não importava o que eu pudesse dizer, Rony não seria facilmente convencido. Hermione, com toda sua perspicácia, logo notou que havia algo a mais na história e pela expressão, ela tentava adivinhar o que era. Eu já deveria saber que ela notaria – e pior, perguntaria a respeito – que havia mais na situação do que eu estava contando. Ela não demorou muito a falar a que conclusão chegara.
— Você o perdoou, não é mesmo? – supôs. Não consegui decifrar a expressão dela.
— Bem... – comecei, sentindo o calor dominar minhas bochechas. Sinal de rubor a caminho. – Não cheguei a uma decisão ainda.
— teria que estar completamente louca antes de poder perdoar aquele asqueroso – comentou Rony, com a maior tranquilidade. Hermione olhou feio para ele, beliscando de leve sua não. – Ai! – protestou.
Olhei para o chão por um breve momento, completamente chateada. Rony estava coberto de razão e eu sabia disso. Ainda assim, não tornava mais fácil ouvir o que ele disse.
Respirei fundo e decidi que era o momento de recuperar o foco. Eu não tinha mais sequer o direito de me dar ao luxo de perder ainda mais tempo.
— Bom, isso não importa agora – eu disse a eles, respirando fundo antes de prosseguir. – Combinei com ele que, após a guerra, eu me decidiria. Muita coisa aconteceu, há muito que vocês não sabem... – Pisquei algumas vezes, como que para afastar as lembranças que insistiram em voltar enquanto eu tocava no assunto. – Muita coisa que eu preciso contar, mas que terá que esperar, pois estou sem tempo. Eu preciso dar um jeito de recuperar todo o tempo que perdi... – Esclareci, para que percebessem a urgência da situação. Pelas expressões, vi que eles pegaram a ideia.
Ambos assentiram, agora ansiosos. Apressei-me em explicar para eles o que eu estive fazendo, sobre as minhas buscas, sobre meus fracassos. Contei sobre a Casa dos Riddle, sobre a casa de Umbridge e o Ministério da Magia, a Mansão dos Malfoy... Mas não falei sobre o último lugar, porque tive medo. Meu medo baseava-se no fato de que eles também irão para Hogwarts. Estaremos lá ao mesmo tempo. Eles já têm o que fazer lá. E se eu contasse que ia procurar lá também e eles acabasse desviando sua atenção do principal? Jamais me arriscaria dessa forma.
Os dois tentaram me ajudar por algum tempo, até mesmo Hermione, que estava muito debilitada. Não conseguimos muitos resultados, tampouco teorias. Logo nos demos conta de que anoitecia, então Dino veio chamar Rony para irem ver como Harry estava. Rony não quis ir para poder continuar conversando comigo, mas eu disse que ele deveria ir, pois era assim que deveria ser. Ele não discutiu e foi. Aproveitei para me despedir de Hermione e do restante das pessoas na casa, o que me levou apenas alguns minutos. Feito isso, corri para me despedir dos três e partir. Encontrei com Rony e Dino voltando para casa e aproveitei para me despedir.
— Você deveria ficar por mais um tempo – interpôs Rony. – Talvez pudéssemos ajudar um pouco mais.
— Não dá – eu disse a ele. – Logo Harry precisará de você e Hermione. É melhor eu partir logo.
Um tanto inconformado, ele se despediu de mim e seguiu Dino para dentro do chalé.
Eu sabia que Harry queria ficar sozinho no momento, mas realmente não haveria outra oportunidade de falar com ele. Por isso, corri para perto dele. Ao me ver, ele se levantou. Eu corri em direção a ele e joguei-me em seus braços.
— Eu lamento a sua perda – eu disse.
— É, eu também – respondeu baixinho.
— Eu só vim me despedir – informei.
— Mas já? – perguntou. – Nós nem conversamos. Nem sequer sei o que aconteceu, o motivo de estar presa na Mansão dos Malfoy...
— Mas não há tempo – cortei-o no meio da sentença. – Eu realmente queria ficar e conversar com você, Ron e Mione; isto foi o que me levou a ser capturada, em primeiro lugar... – Ele arregalou os olhos, um pouco surpreso. – Mas é melhor eu ir logo. Já perdi tempo demais.
— Você já sabe o que precisa encontrar? – questionou.
— Infelizmente, não sei – eu disse, inconformada. – E eu estou apavorada, mas não há absolutamente mais nada que você possa fazer. – Ele assentiu, chateado. Dava para ver que ele desejava profundamente poder fazer alguma coisa. – É melhor eu ir. Cuide-se, Harry.
— Cuide-se você, – retrucou, sorrindo. – Mantenha a calma. Tudo ficará bem. Lembra? Você mesma me disse isso.
Sorri para ele. Era uma lembrança muito triste. Eu dissera isso para ele no dia em que Dumbledore morreu. “Tudo vai ficar bem — disse-lhe. — Só não sei quando.”
— É, eu me lembro – eu disse. – Foi um dia muito triste. Mas o que eu disse é válido. E eu não retiro minhas palavras. – Sem mais, eu o abracei. Ele afagou meus cabelos e eu o apertei com mais força. – Voltaremos a nos ver muito em breve.
— Assim espero – disse ele, dando um beijo em minha bochecha. Sorri para ele, então me afastei e desaparatei. Meu rumo? Dessa vez não foi a caverna. Cansada de me esconder, sem parar sequer para pensar no que faria, desaparatei pensando em Hogsmeade, na porta do bar do Sr. Abefort Dumbledore, irmão do professor Dumbledore. Quando o “miado” começou, delatando minha transgressão, eu respirei fundo, sentindo a adrenalina aumentar. Estava mais do que na hora de eu fazer algo para valer. Não demorou até que o Sr. Dumbledore viesse me resgatar e eu nem pestanejei ao me esgueirar para dentro de seu estabelecimento. Eu estava determinada a concluir minha missão. Estava com muita pressa para concluir esta aventura, que estava muito próxima de terminar.
No instante em que fechou a porta atrás de si, o Sr. Aberforth Dumbledore voltou-se para me lançar um olhar estarrecido. Estava claro que não entendia o que poderia ter me levado a procurar abrigo em seu estabelecimento. Eu obviamente poderia ter tentado adentrar a escola pelo mesmo local por onde saí: a caverna. Todavia, as chances de me deparar com alguma surpresa ao longo do caminho eram enormes, ao passo que pelo Cabeça de Javali eu tinha certeza de que seria menos arriscado.
Sr. Aberforth não parou de me encarar, tampouco falou alguma coisa. Era claro que esperava alguma explicação. Notando que de fato eu lhe devia ao menos um esclarecimento sobre o motivo de estar ali, apressei-me em falar:
- Olá, Sr. Dumbledore – sussurrei. – O senhor não deve me conhecer... Sou . ...
- Dumbledore, não é mesmo? – retrucou, cortando-me. Balbuciei, gaguejei, mas não consegui falar. No meio de tantos acontecimentos, esqueci por completo da mentira que vinha sustentando. E logo com quem? Um membro de uma família da qual eu jurava pertencer. Mal consegui pensar no que dizer a seguir. – Não é isso o que você diz por aí? Que é parte de minha família?
Engoli a seco, desconfortável. Não havia me preparado para uma situação como essa. Nem sequer me ocorreu que isso poderia acontecer!
- Não é como o senhor está pensando – justifiquei. Certamente não era a coisa mais inteligente a ser dita, mas não consegui pensar em nada. – O que...
- Ah, não é? – retrucou. – Então meu irmão te deu uma tarefa fácil e com instruções muito claras, não é mesmo? Sei que isso é coisa dele. – Percebi uma semelhança no discurso; era muito similar ao que ele daria a Harry quando se encontrassem logo mais.
- Poupe suas palavras, Sr. Dumbledore – pedi gentilmente. – Elas são para outra pessoa e o senhor sabe disso. Seu irmão não me deu instruções muito claras, é verdade, mas há uma boa razão. E a ideia de dizer que sou da família foi para me proteger...
- Proteger? – ecoou.
- Sim – concordei com um aceno de cabeça. – Sou nascida trouxa. Sem isso, eu não poderia ter retornado a Hogwarts.
- Talvez não devesse – rebateu.
- Eu precisava – respondi categoricamente. – Assim como preciso retornar agora e é por isso que vim procurá-lo, senhor. – Ele não disse nada; só balançou a cabeça de um lado para o outro, inconformado com o que ouviu. Dava para ver que considerava o maior dos disparates. Essa foi a razão pela qual senti a necessidade de dizer algo mais. – Peço mil desculpas. Imagino que não deve ter gostado nada da mentira envolvendo o nome de sua família. Não foi minha intenção... ser inconveniente. Foi ideia dele, como o senhor sabe e, bem, eu só soube quando já era tarde demais. Ou usava isso a meu favor ou teria que tentar fazer as coisas de outra maneira. De qualquer forma, peço desculpas.
Aberforth resmungou algumas palavras que não consegui entender direito e logo em seguida falou com sua falecida irmã – ou melhor, com o quadro dela. Era o quadro que servia de passagem para Hogwarts. A contragosto ou não, ele estava me ajudando.
Durante um instante, desliguei-me da realidade que me cercava e deixei meus pensamentos soltos, tentando pensar no que fazer a seguir de modo a ganhar tempo. Imaginei qual o cenário com o qual me depararia ao chegar a Hogwarts e tentei direcionar minhas ações. Não consegui pensar a respeito durante muito tempo, pois logo a passagem estava aberta, me convidando a entrar. Notei que era hora de me mexer.
- Aí está – resmungou Sr. Dumbledore. – Como você quer. A passagem está aberta.
- Muito obrigada, Sr. Dumbledore – agradeci de coração. – Muito obrigada mesmo.
- Espero que saiba no que está se metendo, senhorita.
Direcionei a ele um sorriso amarelo.
- É, eu sei – disse. – Há um punhado de coisas que preferiria estar fazendo, mas sei que não tenho opção.
Ele balançou a cabeça de um lado para o outro, inconformado, mas nada disse.
- Boa sorte.
- Obrigada, Sr. Dumbledore – repeti, já caminhando em direção à passagem.
Sem mais, iniciei minha caminhada e o quadro tornou a bloquear a passagem. Respirei fundo, brandindo a varinha e me preparando para a aventura que me esperava à frente. Meu coração estava apertado em meu peito e eu sabia muito bem o motivo, embora tentasse de todas as formas não pensar a respeito. Entretanto, havia uma voz em meu subconsciente, clamando e insistindo, requisitando atenção. Enquanto caminhava a passos rápidos, o único som que ouvia era o ruído causado pelos meus próprios passos. A voz da consciência insistia em tentar ser ouvida, mas eu não queria ouvir, não queria pensar a respeito. Isto porque estava cada vez mais próxima do fim, cada minuto mais próxima dos maiores impasses que eu poderia enfrentar. Os impasses que ignoro desde o momento em que recebi a carta de Hogwarts. Aqueles dilemas que qualquer Potterhead* com certeza conhece muito bem. No começo, tudo foram flores e maravilhas. Eu iria, afinal, estudar magia de verdade junto de pessoas que até então eram apenas personagens de uma história pela qual sou apaixonada desde que era muito nova. Era como o paraíso só de pensar em interagir com algumas das pessoas que mais admiro. Recebi a oportunidade como a chance singular de realizar o que, para muitos trouxas que conheço, era um sonho que nunca se realizaria e nada mais. Não pensei duas vezes antes de largar o meu mundo todo para trás e começar do zero num lugar que sempre vi como... espetacular. Larguei família, amigos, escola e até mesmo muitos de meus gostos para trás. Abismada, tentei me lembrar de como eram aqueles dias, todo aquele calor da emoção. Impressionei-me com o quanto consegui prolongar até finalmente encarar que estava entrando numa guerra, numa grande batalha. Enquanto andava ao longo daquela passagem mal escura, pensava nisso tudo. Constatei que a que caminhava ali, em direção ao que poderia ser a batalha final da grande guerra não era a mesma que costumava sentar com as amigas no intervalo entre uma aula e outra, e rir, conversar, ouvindo McFLY, Green Day e outras bandas, falando sobre o livro e filme favorito (Harry Potter, óbvio) ou sobre outros livros, filmes e séries... Quase não consegui encontrar aquela dentro de mim. Muito pouco restara. Isso me entristeceu e mais uma vez os impasses que estavam por vir tentaram emergir. Relutei o quanto pude, pois não podia me dar ao luxo de me preocupar com isso agora. Não resolveria nada, pois sabia muito bem que não podia interferir na história e mudar o rumo das coisas. Mas será que, mesmo sabendo que eu podia ter mudado a situação, conseguiria assistir aos meus amigos morrerem? Pensei em Dumbledore. Com ele consegui. Eu sabia, mas não fiz nada para interferir. Porém, minha consciência não me deixava mentir, pois sabia muito bem que Dumbledore morreria de qualquer forma dentro de um mês, e que o assassinato dele foi decisivo em muita coisa. Salvou vidas, proveu poderes a Harry, sem os quais ele provavelmente não conseguiria derrotar o Lorde das Trevas. Mas e quanto aos outros? Se eu impedisse, teriam toda uma vida pela frente, uma vez que suas mortes foram casualidades de uma guerra. Será que faria tão mal assim interferir?
Foi inútil tentar não pensar a respeito disso, pois quando me dei conta, já estava me questionando. Suspirei e balancei a cabeça para afastar os pensamentos. Estava muito irritada e impaciente, e isso tudo não me ajudava em absolutamente nada. Tentei voltar meu foco para o que estava fazendo e logo notei que estava perto do fim dessa passagem. Isso serviu para me ajudar a ter foco, e por isso fiquei aliviada.
Alguns passos mais e já não precisava do feitiço para enxergar – por isso murmurei nox. Empurrei o quadro sem hesitar e adentrei a Sala Precisa, que agora servia de abrigo para aqueles que, como eu, sofreram opressão em Hogwarts.
Pouco a pouco as pessoas começaram a notar minha presença. Em um minuto, todo mundo havia percebido que eu estava ali. Consegui ver alguns de meus amigos aqui e ali, e constatei que, um a um, chegavam cada vez mais perto.
- Não creio – disse Córmaco, que foi o primeiro a chegar perto de mim. Ele me ergueu num abraço, e me rodou. Eu tive que rir. – Amy! É tão bom te ver!
- Oh, Corm – murmurei, apertando-o no abraço. – Eu digo o mesmo!
Ouvi muita gente dizer meu nome. Gina, Neville, Luna, Cho, Simas... Muita gente surpresa em me ver. E feliz também, constatei com espanto. Nunca havia imaginado como seria o reencontro. Talvez, pensei amargamente, isso se desse ao fato de que eu simplesmente não via reencontro no futuro. Meio de supetão, algumas lembranças insistiram em emergir, como o episódio com o véu, por exemplo, e também a bronca que levei de Sev logo em seguida. É, eu realmente não pensei muito em voltar a reencontrar meus amigos... Isso explicava muito bem a emoção que sentia no momento, que chegou a transbordar em forma de lágrimas.
Gina reclamou alguma coisa para Corm e ele me soltou, e foi assim que emergi de meus pensamentos. Ela me abraçou e me encheu de perguntas, mas eu estava dispersa. Só dei tempo para que os outros pudessem me abraçar (e fazer as mesmas perguntas) e depois, de maneira até um tanto rude, levantei a mão como forma de chamar a atenção de todos para que fizessem silêncio. Ansiosos por ouvir o que quer que tivesse a declarar, calaram-se.
- Pessoal... – Comecei, meio incerta sobre o que falar. Todos estavam ansiosos por esclarecimentos que não só eu não podia dar, como também não tinha tempo de fazê-lo. Mesmo sabendo disso, era um pouco desconcertante. – Sei que todos vocês esperam relatos ou ao menos respostas que eu tenho, de fato, mas que infelizmente não posso dar a vocês. – Houve um muxoxo geral que me deixou um tanto constrangida. – Não é por não querer, acreditem! Eu realmente gostaria de poder sentar com vocês tranquilamente e conversar, mas realmente não dá. Há muitas coisas que ainda preciso fazer e o tempo está contra mim; vocês não têm nem ideia do quanto. Preciso me apressar.
Os únicos que não haviam desistido de mim e voltado a fazer suas coisas resmungando pelo que disse foram Corm, Gina, Neville, Luna, Cho e Simas. Para eles, somente olhei como quem se desculpa, pois realmente não havia mais nada ao meu alcance.
- Está bem, Amy – disse Gina. – Nossa curiosidade pode aguentar um pouco mais. Podemos te ajudar?
Foi uma oferta tentadora, não posso negar. O “sim” por pouco não escapuliu. Tive que pressionar meus lábios com força e encher meus pulmões de ar para evitar a fala e acabar dizendo bobagens. Respirei fundo e sorri tristemente para ela.
- Está aí outra coisa que me agradaria muito – comentei. – Mas infelizmente é algo que devo fazer sozinha.
- Mas se precisar, Amy... – disse Neville, me dando um sorriso fraco. – Já sabe que estamos aqui para o que der e vier.
Sorri mais amplamente desta vez.
- Oh, acredite, eu sei! – eu disse e o abracei brevemente, despedindo-me. Aos poucos fiz o mesmo com todos os outros. – Realmente preciso ir. E se eu puder pedir ajuda para vocês no futuro, podem acreditar que não hesitarei nem por um segundo sequer! Vocês são demais! Senti muito a falta de todos vocês.
Eu já estava prestes a sair quando puxaram meu pulso, clamando por minha atenção. Era Corm, é claro. Ele não me deixaria escapar tão facilmente, não depois de tudo o que passou. Os outros, condescendentes, nos deixaram para que tivéssemos um pouco de privacidade – tanto quanto possível numa sala lotada de gente.
- Calminha aí, gatinha – disse ele, no velho tom brincalhão. Dei um sorriso genuíno ao perceber que realmente senti falta dele. Antes de me crucificar, deixe-me esclarecer! Não dessa forma. Hoje, depois de tantos acontecimentos, depois de tudo que vivenciei, percebo que o que houve com Córmaco foi uma forma de apartar a dor. Usei-o como meu estepe, como band-aid. Um pouco mais que isso, na realidade. Usei-o como uma poção para remendar os meus pedaços. Nada foi premeditado, mas isso não me inocenta nem um pouco. O que eu fiz foi errado e hoje tenho consciência disso. Era o que eu precisava no momento, mas não era o que deveria ter feito, pois foi algo muito egoísta de se fazer. Envolvi-me emocionalmente com ele, mas a consequência não foi só a melhora que constatei em mim. Houve também uma consequência nele, que nunca levei em consideração. Isso faz de mim uma egocêntrica e no momento em que constatei isso, me senti uma pessoa terrível. Pois ali, olhando no fundo dos olhos dele, podia ver com clareza meu erro, meu egoísmo. – Não pensou que eu deixaria você escapar tão fácil assim, não é mesmo?
É, pensei, foi um bom relacionamento. Sim, tivemos bons momentos juntos e eu nunca fui má de fato com ele. Bom, isso sem considerar que nunca terminei de fato com ele e que simplesmente escapuli, deixando-o cheio de esperanças. E, claro, sem contar o que houve entre Draco e eu.
Engoli a seco, encarando-o com um sorriso amarelo. Draco. O que houve entre Draco e eu.
Ok, eu realmente fui uma cretina com ele.
Como uma perfeita covarde, titubeei, sem saber o que dizer. Gaguejei um pouco aqui, escorreguei ali, enfim, não saiu nada. Ele se aproximou para me beijar e, como um puxão para a realidade, voltei a raciocinar direito e me esquivei.
- Desculpe-me – comecei bem baixinho, com medo de a voz falhar. – Sei que não é justo, mas não posso ficar nem mais um minuto. Eu já perdi tempo demais e não posso me dar ao luxo de perder um minuto sequer. É muito importante.
Juro que pensei que seria muito mais difícil, mas Corm é muito compreensivo e não insistiu mais. Ele me deu um beijo no rosto e se afastou para que eu pudesse ir. Sentindo-me suja e muito, muito baixa, saí de perto dele e corri para longe dali tão rápido quanto foi possível.
Eu estava com a mente muito cheia de acusações direcionadas a mim mesma, de modo que fui um tanto inconsequente na hora de sair. Além disso, estava muito, muito irritada e impaciente. Notei que nos últimos tempos a irritabilidade vinha me acompanhando cada vez mais de perto. Todavia, naquele momento a sorte estava do meu lado, então não havia ninguém no corredor da Sala Precisa. Não quis abusar da sorte e por isso lancei sobre mim o feitiço da desilusão. Mais tranquila, olhei ao meu redor para aquelas paredes de pedra, para o fogo bruxuleante, a amplitude e o vazio do corredor, pensando no quanto senti falta de minha querida Hogwarts. Meu peito se apertou quando lembrei que em pouco tempo aquelas paredes para as quais eu olhava naquele momento talvez não estivessem mais de pé. Ou talvez estivessem, mas o teto, não. Era doloroso saber que tanta destruição e horror estavam por vir e eu, embora estivesse no meio de tudo isso com a vantagem de saber exatamente o que aconteceria, não podia fazer absolutamente nada.
Em algum momento decidi que remoer o assunto não me levaria a lugar algum e que eu tinha era que me mexer e fazer algo útil, para variar. Por isso, comecei minha busca, torcendo, rezando e implorando para que dessa vez o resultado fosse um pouco melhor do que nas outras ocasiões.
—x—
Já havia um bom tempo que eu estava vasculhando Hogwarts, mas sem resultado. Deve ter se passado um dia ou dois, não tinha muita certeza. Buscava incessantemente, e só parava quando era obrigada por qualquer necessidade fisiológica – exceto dormir, pois isso podia esperar. Ou assim pensei, até apagar uma vez na Sala Precisa e outra vez dentro do banheiro da Murta-Que-Geme. Em ambas as ocasiões, fiquei apagada por poucas horas – uma ou duas, segundo me disseram – e, ainda mais irritada que antes, voltava ao trabalho. Nem sinal de Harry, Rony ou Hermione, graças ao bom Deus. Mas eu não estava preocupada em ver exatamente quando eles chegariam. O alarde seria enorme e impossível de não notar, e por via das dúvidas o galeão falso da Armada de Dumbledore estava o tempo todo comigo, no bolso traseiro da calça que usava. Desesperada e furiosa, continuei revirando o castelo, mas nem sinal do maldito objeto.
Já era noite e meu mau humor estava em seu ápice. Completamente fora de mim, corri para a torre onde fica a sala do diretor. Ao chegar lá, mais um pouco de sorte se fez presente, pois a professora Minerva disse a senha para a gárgula que guardava a entrada, subiu e desceu poucos minutos depois. Bufando devido a raiva da qual não conseguia me livrar, subi e lancei sobre as portas os feitiços padrão para que ninguém me incomodasse. Cobri todos os quadros com uma cortina preta com um aceno da varinha e com mais um, certifiquei-me de quem nem eles pudessem me ouvir. A única exceção era o de Dumbledore. Não havia nem sinal de Severus, mas estava tão furiosa que nem me lembrei disso.
- Dumbledore – chamei em voz alta, faltando pouco para ser um grito. – Dumbledore!
Ele acordou sobressaltado e me olhou por cima dos óculos de meia-lua. Eu estava tão brava que estava praticamente rosnando.
- Oh, ! – disse ele, num tom ameno. – Confesso que não esperava te ver.
- Por que, professor? – retruquei, num tom que demonstrava exatamente o que eu sentia. – Pensou que já estaria morta a essa altura?
Um tanto estupefato, ele se inclinou para frente e me analisou com o olhar antes de responder.
- De modo algum, – disse, simplesmente. – Só achei muito cedo para que voltássemos a nos falar, isto é tudo.
Bufei em resposta ao comentário.
- Eu estou farta de tudo isso, farta! – gritei para ele. – Eu já nem sei mais há quanto tempo venho procurando, tentando de todas as maneiras cumprir a missão que me incumbiu...
- ... – começou ele, num tom de alerta.
- Ninguém nos ouvirá – retruquei rispidamente, imaginando que seria a respeito disso que ele falaria. – Eu nem sei o que diabos estou procurando! Só consigo pensar em outra maldita horcrux e mais nada! Só nisso! Os livros que li, tudo o que vi e estudei... nada me parece a altura de tanto horror! E eu já nem sei onde mais procurar! Estou farta!
Dumbledore me estudou brevemente por cima dos óculos de meia-lua e isso só serviu para que eu ficasse ainda mais irritada.
- Como pode ficar só me olhando, professor? – perguntei, estarrecida. – O senhor não vê que estou desesperada?
- Vejo sim, minha cara – disse Dumbledore calmamente. – Sei as dimensões da frustração que a senhorita está sentindo no momento, mas peço encarecidamente que mantenha a calma.
- Não consigo, professor. Não consigo.
Mais uma vez, senti que ele me analisou por sobre os óculos, daquele jeito peculiar tão conhecido. Entretanto, senti um toque de repreensão emanar de seu olhar.
- Algumas barreiras com as quais nos deparamos, , na realidade só existem em nossas mentes. Ocasionalmente, as únicas barreiras existentes são aquelas criadas por nós mesmos. Creio que esta é uma dessas ocasiões.
Dumbledore, sempre sábio. Mas infelizmente, não era o caso.
- Discordo.
Só então ele mudou a postura avaliadora e recostou-se à cadeira, lançando-me um olhar altivo e especulativo. Perguntei-me o que se passaria naquela mente brilhante.
- Precisa ter mais fé em si mesma, . Você deve ser a primeira a reconhecer o seu devido potencial com sabedoria.
Ao que parece, não estávamos em sintonia naquele dia. Nada do que ele dizia parecia aplicável a minha realidade, e isso me angustiava profundamente.
- Professor, fui até meu limite e além, mas sempre sendo realista quanto ao meu potencial. Esse não é o caso. Estou perdida de verdade e preciso de ajuda. E o senhor podia ser mais direto e menos enigmático para variar.
No momento em que as palavras deixaram meus lábios, tive a convicção de que estava sendo rude desnecessariamente, mas não senti culpa por isso, tampouco a necessidade de me desculpar. Impassível, aguardei que ele me desse o que eu queria: algum esclarecimento.
- A missão da qual eu lhe incumbi pode ser vital ou completamente infundada – começou Dumbledore. – Presumi que há uma chance de que o final que conhecemos não seja o correto para a história do mundo mágico. Considerei que trazer a senhorita ao mundo dos bruxos pudesse acarretar numa consequência, e só consigo pensar na ascensão do Lorde das Trevas mais uma vez. É por essa razão que guiei a senhorita numa busca de qualquer indício que comprove minha teoria. Pode ser que a senhorita não tenha achado nada porque de fato não havia nada para achar, como também há a possibilidade de que eu esteja certo e Você-Sabe-Quem consiga uma forma de ressurgir mesmo depois que Harry tenha destruído todas as suas horcruxes e ele mesmo, por fim.
Cruzei os braços em sinal de impaciência e um vinco surgiu entre minhas sobrancelhas.
- Mas o senhor nunca está errado – eu disse. – Suas suspeitas sempre se provam corretas, o que significa que Você-Sabe-Quem desconfia e possivelmente tomou precauções. E não há nada tão horrível em que eu possa pensar além das horcruxes. Nada se compara a esse horror.
- Há muitas formas de se fazer o mal, – disse Dumbledore, com aquele tom sábio e inspirador. – Há sempre uma forma de se fazer o que pessoas boas e puras só podem enxergar como completo horror.
- Então não é uma horcrux? – perguntei rispidamente.
- Não posso afirmar com certeza – disse.
- Isso não me ajuda em nada – retruquei. – Por favor, professor. Eu preciso de ajuda. Não cheguei a lugar algum!
Dumbledore estava prestes a me dizer alguma coisa quando o som da porta se abrindo me alarmou. Era Severus, mas não estava sozinho. Os dois Comensais da Morte que trabalhavam em Hogwarts com ele, os irmãos Carrow, vinham logo atrás dele e não demoraram a me ver.
- Você! – disse Aleto Carrow, com os olhos arregalados em sinal de surpresa. Antes que ela e seu irmão pudessem fazer qualquer coisa, eu os estuporei. Sem chance de revidar, ela caiu desacordada e seu irmão logo se juntou a ela.
Com a sobrancelha arqueada, Severus olhou de mim para eles. Era claro em sua expressão que não estava satisfeito com o resultado de minha imprudência.
- Um pouco descuidado de sua parte, não acha, senhorita ? – perguntou ele, com a expressão bastante suave.
Suspirei, dando-lhe um sorriso amarelo.
- Desculpe.
- Imagino que precise falar comigo, mas infelizmente você terá que partir depressa – disse Severus. – Logo teremos muito mais companhia e será um pouco mais complicado de se livrar.
Assenti.
- Tudo bem – eu disse, encaminhando-me para a porta. – Na realidade vim procurar ajuda do professor Dumbledore, mas não consegui chegar a lugar algum. – Olhei de soslaio para o retrato de Dumbledore, que me olhava de volta tristemente. – Mas foi bom rever você, de qualquer forma. Melhor ir agora...
- Por quanto tempo ficará dessa vez? – quis saber.
Hesitei um pouco dessa vez.
- Não muito – respondi. – Afinal de contas, a grande batalha está prestes a começar.
A expressão de Severus foi de genuína preocupação e isso me causou um incômodo frio na barriga.
- Tenha muito cuidado – disse-me. – Pense bem antes de tomar qualquer iniciativa.
Aquele era um aviso muito astuto e mais pertinente do que ele poderia imaginar.
De todas as ocasiões em que pensei que poderia ter chegado a última vez em que eu o veria, essa parecia ser a mais palpável. Foi por isso que, sem aviso nenhum, eu o abracei vigorosamente. Ele, é claro, não entendia o motivo de tantas demonstrações de sentimento, nem antes e tampouco agora. E, bem, ele não ficaria sabendo, de qualquer forma.
- Pode deixar, Sev – eu disse. – Farei isso.
Sem mais delongas, fui de uma vez em direção à porta. Só quando já estava praticamente do lado de fora virei para olhar a bagunça que deixava para trás. Os quadros bagunçados, os comensais desacordados, um Severus pensativo e um Dumbledore decepcionado. Não me preocupei, pois sabia que Sev arrumaria tudo num instante. Olhei feio para Dumbledore pela última vez e saí de lá.
Sem rumo, não vi mais nada que pudesse fazer. A conversa com Dumbledore não resultou em absolutamente nada além de um estresse desnecessário. Então, decidi voltar para a Sala Precisa e pensar numa solução enquanto estivesse a caminho. Com o rumo em mente, lancei o feitiço da desilusão sobre mim e fui para a Sala Precisa tão rápido quanto foi possível.
—x—
Minha intenção era adentrar a Sala Precisa e só então pensar em meu próximo passo. Isso mudou após o momento em que dei um encontrão em Rony e logo depois em Hermione no caminho para lá.
- Câmara Secreta? – perguntei, referindo-me ao próximo local aonde eles iriam. Nem estranharam o tom de urgência em minha voz, uma vez que eles mesmos encontravam-se na mesma situação.
- Sim – responderam em uníssono. E então, somente Hermione prosseguiu: – E quanto a você?
- Eu ia para a Sala Precisa, mas acho que ao invés disso irei com vocês.
Na realidade, eu nem havia pensado a respeito antes de falar, mas quando o fiz e parei para considerar de fato a ação, me pareceu uma boa ideia. O foco no livro nesse momento é Harry, não Rony e Hermione. Desde que estivesse de fora, não apresentava riscos ao curso natural da história. Bom, ao menos era o que eu pensava – ter certeza já é outra questão.
Nenhum dos dois me questionou, então, seguimos rapidamente para o banheiro feminino de onde era possível adentrar a Câmara, exatamente da mesma forma que os três conseguiram em seu segundo ano em Hogwarts.
Confesso que eu estava desesperada e sem rumo, e só vagava na esperança de trombar com alguma coisa, qualquer que fosse. Frustrada e extremamente irritada com tudo, simplesmente não era capaz de ver alternativas em prol de alcançar o que precisava. Talvez fosse uma completa perca de tempo ir até a Câmara Secreta com eles (a probabilidade era assustadoramente grande), mas em tamanho desespero, não consegui enxergar o óbvio.
Todavia, não consegui nada além de mais uma aventura. A busca não me rendeu nenhuma vantagem além de obter alguns dos dentes do esqueleto do basilisco (imaginei que pudesse ser útil em meu futuro. Como eu mesma dissera a Dumbledore... só consigo pensar que Voldemort criou mais uma horcrux). Mais uma vez, me encontrava de volta à estaca zero.
Fiz o possível para não deixar que isso me apavorasse ainda mais. Como estava sem plano ou estratégia, decidi ficar no encalço de Rony e Hermione. Afinal, eu sabia bem o que estava por vir; li o livro tantas vezes que as cenas ficaram gravadas na memória, impossível de esquecer. E, exatamente como eu me lembrava de ter lido, logo eles se juntaram a Harry na Sala Precisa. Fiquei de fora, obviamente, já que era uma daquelas situações em que eu não deveria me intrometer. Assisti Draco e seus dois amigos entrarem atrás de Harry e sabia que só precisava esperar.
Foi uma loucura. Nada como no filme. Foi assustador ver o fogo consumir tudo dentro da Sala Precisa e as criaturas de fogomaldito, iguais às que destruíram a casa de minha família, tentando matar os meus amigos. Arrepiei-me dos pés à cabeça e tremi. Tinha pavor daquilo. Fiquei congelada no lugar mesmo depois das portas se fecharem, aprisionando lá dentro todo aquele horror.
Demorei um pouco, mas consegui sair do estado de choque. Olhando ao redor, percebi que me recuperei antes de Draco que, ainda atordoado pela perca do amigo, demorou a me ver. Quando notou minha presença, já estava ao lado dele, envolvendo-o num abraço apertado.
- Espero que aprenda dessa vez – ralhei. – Espero que finalmente perceba que você tem muito mais a ver conosco do que imagina. – Eu o afastei e olhei intensamente no fundo dos olhos de cor cinza, que marejavam. – Você não é uma pessoa má, Draco. Entenda isso.
Ao terminar minha sentença, o silêncio pairou entre nós. Só ficamos olhando um nos olhos do outro, ambos perdidos em um mar de pensamentos. Comigo, só durou até eu ouvir Hermione dizer:
- Isto significa que se pudermos apanhar a cobra...
E, finalmente, eu me vi no grande impasse. Aquele que sempre soube que chegaria, cedo ou tarde. Ou um deles, pelo menos. Eu sabia muito, muito bem mesmo o que aconteceria a seguir. Era impossível esquecer! E a certeza só foi pior quando vi Percy e Fred recuando ao duelar com dois comensais. É agora, pensei. Era só o que conseguia pensar. A qualquer momento, bem em frente aos meus olhos, Fred iria...
Céus, eu não conseguia sequer pensar na palavra.
A cada segundo, meu coração ficava mais frenético e minha respiração, mais falha. Em minha mente, apenas o questionamento: e agora? Eu salvo ou não a vida de Fred?
* Potterhead: nome do fandom de Harry Potter. / Fãs de Harry Potter.
N/A: Como prometido, dedico este capítulo à Luciana Santos Moritz. Obrigada pelo carinho! <3
Eu não posso me meter, eu não posso! Meu peito doía e minha cabeça pulsava intensamente com os pensamentos. Eu não posso fazer nada... não posso!
Entretanto, em contrapartida, só o que eu conseguia pensar era: eu não posso deixar Fred morrer. E não podia mesmo. Era quase como ser a responsável por sua morte. Eu sabia que ia acontecer, droga! Como ficar de braços cruzados?! NÃO DAVA!
E então aconteceu. Tudo tão rápido quanto poderia ser. Era uma mera questão de tempo, talvez até uma fração de segundo... e então, injustamente, tudo estaria acabado e Fred jazeria no chão, morto. A qualquer segundo agora...
Quando vi tudo ir pelos ares, meu único instinto foi de protegê-lo; e não deu outra. Quando a confusão acabou, Fred estava a salvo, sem um arranhão sequer. Não sei bem o que fiz, mas todas as pedras viraram pó ao nosso redor. Só eu chorava e ninguém entendia o motivo. Fred sorriu, agradeceu, cumprimentou, mas eu só sabia chorar feito um bebê. E quando os duelos recomeçaram, todos foram lutar, mas eu continuei ajoelhada no chão, chorando, desesperada. Draco envolveu minha mão com a dele e eu deixei que ele me levasse para longe dali.
Eu não fazia ideia de em qual andar me encontrava, nem em qual corredor. Draco me puxou para um canto embaixo de uma escada, onde era mais difícil de sermos vistos. Só então voltou a falar.
— Por que você está chorando? – quis saber. – Não aconteceu nada a nenhum de seus amigos.
— E é esse o motivo – eu disse. – Não me entenda mal... mas Fred deveria estar morto.
Ele demorou um pouco para tornar a falar; imaginei que talvez estivesse tentando assimilar o que eu disse.
— Mas você o salvou e por isso ele está vivo – interpôs. – E isso não é bom?
— É maravilhoso – respondi, fungando.
— Então por que está chorando? – Draco estava extremamente confuso.
— Porque eu não devia ter feito nada – desabei, chorando copiosamente, aos soluços. – Eu sei tudo que vai acontecer, mas não posso me meter, não posso fazer nada! E eu fiz e não sei quais as consequências disso!
Incapaz de falar qualquer coisa, Draco me acolheu num abraço apertado na esperança de me fornecer algum consolo. Eu aceitei de bom grado e me permiti a ter um momento de fragilidade.
— Então o que disseram sobre você ser vidente é real? – Draco questionou após um tempo. Franzi o cenho e me afastei dele, com os olhos ardendo e ainda soluçando.
— Ahn?!
— Muitos diziam isso de você – disse ele, dando de ombros.
Fiquei atônita por um instante, mas logo percebi que não era assim algo tão absurdo. Só parecia ser porque eu sabia da verdade, mas para alguém de fora, não seria estranho que eu fosse uma vidente.
— Não, não é isso – respondi de forma evasiva. – Numa outra oportunidade explicarei tudo com mais calma, mas agora não dá.
Draco não me pressionou para obter detalhes e fiquei grata por isso.
— Não fique assustada, – disse Draco, enquanto afagava meu rosto de forma delicada. – Você é a bruxa mais extraordinária que já conheci, e se tem alguém capaz de lidar com qualquer consequência por uma coisa que não devia ter acontecido, é você. – Ele me beijou docemente e de repente minhas preocupações não pareciam mais tão severas assim. Entretanto, nem a distração de estar nos braços de quem amo me desviou por completo de meus problemas. Eu não podia me dar esse luxo. Por isso, a contragosto, me levantei para me despedir dele. Não dissemos nada, e nem era necessário. O olhar era o suficiente. Acredito que tanto eu como ele sabíamos exatamente o que o outro queria dizer. E isso bastava.
Dei-lhe um beijo e saí correndo. Não disse adeus. Para todos os efeitos, a promessa é de que voltaríamos a nos ver em breve.
—x—
Enfrentei quantos Comensais pude, matei tantas aranhas quanto possível e escapei de mais azarações do que jamais imaginei que conseguiria me livrar até que, por fim, me vi diante de outro grande impasse. Era a hora, eu sabia muito bem. Dali a pouco Severus cairia morto depois de revelar todos os grandes segredos a Harry. Quando chegara a hora de Dumbledore, consegui passar sem interferir. Fred, meu segundo impasse... circulava por aí, são e salvo, porque não consegui ficar de braços cruzados... E quanto a Severus? Essa questão martelava freneticamente em minha mente. Seria eu capaz de assistir sua morte de longe, sem fazer nada? Com Fred foi a mesma coisa e eu não consegui me conter. E mesmo que eu sempre soubesse que um dia me veria diante dessas situações, não tornava nada mais fácil. Quando as coisas realmente estavam acontecendo, tudo mudava. Teoria e prática eram severamente diferentes.
Acabei encontrando Harry, Rony e Hermione novamente. As coisas mudaram drasticamente por eu ter salvado Fred, mas no fim, Harry acabou fazendo o que faria de acordo com a história original. Num dado momento, parou e invadiu os pensamentos do Lorde das Trevas. Assisti a tudo um pouco afastada, dividida entre meu receio das consequências que viria a enfretar e meu desespero ao constatar que estava cada vez mais perto do próximo impasse.
— Ele está na Casa dos Gritos – disse Harry. Meus batimentos cardíacos tornaram-se frenéticos. – A cobra está com ele, tem uma espécie de proteção mágica em volta. E ele acabou de mandar Lúcio Malfoy buscar Snape.
Eu já sabia bem o que viria a seguir e tinha consciência de que não podia ficar muito perto deles. Foi por isso que decidi me adiantar e ir logo até a Casa dos Gritos. Absortos como estavam, nem notaram que saí dali e continuaram sua conversa. Era bem melhor assim, visto que agora, mais do que nunca, tinham um prato cheio de problemas diante de si, e tudo tinha que acabar como estava destinado a ser. Para tanto, eu tinha que ficar o mais longe possível.
Respirando fundo, comecei a caminhar para a saída daquela torre, de modo a poder sair do castelo e chegar até a Casa dos Gritos, que era exatamente o que os três estavam tentando fazer. As batalhas estavam intensas, ocorrendo por todos os lados, de todos os jeitos. Inimigos e aliados gritavam, atiravam coisas e feitiços, caíam e machucavam-se. Havia tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que tornava extremamente difícil a tarefa de sair de lá. Ao longo do trajeto tive que duelar com vários Comensais e aranhas, e procurei me manter atenta e focada, tanto quanto fosse possível; deixei para me preocupar com o que estava para acontecer com Severus quando de fato chegasse até ele. Um encapuzado chegou a me atingir de raspão com algum tipo de azaração cortante, o que me rendeu um rasgo feio no braço. Revoltada com a dor lancinante, lancei contra ele um Bombarda e assisti brevemente enquanto ele voava para longe de mim. Agitada, apertei o passo, torcendo para sair dali sem problemas mais graves. Para minha surpresa, fui bem sucedida. Sofri um arranhão aqui e outro ali, mas nada preocupante demais. Mais cedo do que o esperado, estava do lado de fora, onde o cenário não era lá muito diferente do qual eu deixara para trás – ou assim pensei. Logo mudei de ideia, no instante em que avistei aquela avalanche vindo em minha direção, seguida de um frio pavoroso, que foi trazido por uma horda de dementadores. Ao vivo e a cores. Nunca havia visto um dementador de verdade em minha frente, somente o bicho-papão com o qual treinávamos na segunda ocasião em que foi reunida a Armada de Dumbledore. Confesso que não estava preparada para lidar com uma centena deles de uma só vez, mas fiz o meu melhor para buscar em mim a lembrança feliz necessária para produzir meu patrono. Tentei uma, duas vezes. Meio que travei, pois tudo o que eu buscava me causava dor e pesar. Minha família... os momentos felizes doíam em mim pela saudade. Meus bons momentos no mundo mágico... que doíam por serem os que me levaram a perder meus pais. Eu não conseguia achar nada e eles estavam cada vez mais perto...
Criaturas gigantes de fogomaldito cercavam minha casa e investiam contra mim, querendo me matar. Eram tão grandes que eu não conseguia ver nada além de meras partes de meu lar. Meu pai estava preso em algum lugar lá dentro e eu ali, inútil, incapaz de controlar o fogo e salvá-los. Não sei dizer ao certo como ou quando, mas em algum momento em meio a esse desespero, acabei desmaiando.
Quando abri os olhos, estava confusa. Dementadores ou fogomaldito? Batalha de Hogwarts ou Brasil? O que era real e o que era sonho? Buscando me orientar, observei o local ao meu redor e aos poucos fui me situando. Logo entendi que os dementadores eram reais, e que o fogomaldito muito provavelmente foi porque um deles tentou me dar o beijo que levaria embora minha alma (ou vários deles podem ter tentado). O patrono de Harry provavelmente foi o que me salvou.
Céus! O patrono dele é mesmo muito forte. Eram tantos dementadores que... dá pavor só de lembrar!
— ! – Ouvi dizer enquanto sentia que era puxada para cima. Olhei para ver quem era. Depois de conseguir focar o olhar, vi que era Fred. – Por Merlin, você está bem?
— Estou – respondi. – Fred, o que...
— Pensei que iria te perder! – Bradou enquanto me abraçava forte. Fiquei sem conseguir respirar enquanto ele me apertava. – Havia dezenas de dementadores cercando você e eles estavam lhe dando o beijo! Fiquei apavorado! Meu patrono serviu para afastá-los, mas outros continuavam a vir e tentar levar sua alma. Se não fosse o patrono que espantou todos eles... Aposto que era de Harry...
Respirei fundo, assimilando o que se passara. Que jeito idiota de partir... morrer por não conseguir produzir um patrono. Olhei para Fred, sentindo-me muito fraca. Ele me estendeu um chocolate e aceitei, sem argumentar. Dei uma mordida generosa, sabendo que isso me ajudaria a melhorar, e abracei-o com força, agradecida.
— Obrigada por me salvar – eu disse.
— Era o mínimo que eu podia fazer para retribuir, não é? Ia me machucar feio se não fosse por você – disse ele.
Eu não disse mais nada. Só me afastei e continuei a comer o chocolate, pois precisava melhorar. As circunstâncias me assustavam cada vez mais. Pensei no que teria acontecido se Fred estivesse morto naquele momento, como deveria. Ele morrendo ou não, eu passaria por aquele caminho de qualquer forma. O que significava que, se eu tivesse deixado Fred morrer, estaria morta também.
Não quis pensar na ironia disso tudo.
— Obrigada mais uma vez, Fred – eu disse enquanto me levantava. – Preciso ir.
— Vai ficar bem? – quis saber.
— Sim. Pode ficar tranquilo.
Ele até quis dizer algo mais, pelo que pude perceber, mas algumas aranhas vieram em nossa direção e isso nos dispersou. Ficamos ocupados em combatê-las, e depois fomos cada um para um lado – ele para duelar e eu prossegui para onde ia antes de ser atacada pelos dementadores, rumo à Casa dos Gritos.
Felizmente, cheguei até lá sem mais problemas. Pensei brevemente na sorte que tive por isso, visto que, quando Harry, Rony e Hermione fossem passar por aquele mesmo caminho mais tarde, teriam muito com o que lidar. Não querendo abusar ainda mais de meu momento único de sorte, corri o mais rápido que pude até o salgueiro lutador. Sem diminuir a velocidade de minha corrida, fui apurando minha visão afim de enxergar na árvore o ponto que deveria certar para que ela ficasse paralisada e, assim, não me impedisse de passar. Eu sabia que era um nó único no meio da casca. Vi algo que imaginei que seria esse tal nó, e por isso enfeiticei um galho e o arremessei contra a árvore. Felizmente, minha primeira tentativa deu certo e a árvore ficou quieta, imóvel. Só parei de correr quando estava bem perto da apertada passagem entre os troncos, e rapidamente me espremi por ela. Foi um pouco trabalhoso, pois era realmente muito apertada, mas consegui me forçar a passar por ela. Precisei de um minuto para respirar e recuperar o fôlego. Estava muito debilitada, reflexo ainda de quase ter sido morta pelos dementadores, de modo que uma simples corrida acabou comigo. Enquanto meu pulso frenético desacelerava, sacudi a poeira de minhas vestes, me recompondo para seguir adiante e decidir o que fazer.
Estava prestes a seguir pelo túnel quando uma agitação do lado de fora chamou minha atenção.
— O Salgueiro Lutador! – Reconheci a voz de Harry. – Agora!
Meu pulso voltou a acelerar, mas dessa vez de medo. Estava perigosamente próxima da situação, e estava a apenas alguns minutos de ver Severus ser morto. Comecei a tremer e a suar frio. E agora? O que fazer? Assustada, comecei a me mexer e fui adiante no túnel. Não podia me meter. Esse momento era crucial; Severus precisava ser atacado e Harry precisava conversar com ele e receber suas memórias. Eu não podia interferir em absolutamente nada disso. Esse momento era, afinal, a chave para o que aconteceria a seguir. Era o acidente que levava Severus a dar a Harry o conhecimento que detinha, conhecimento este que levava Harry ao lugar certo, para acabar com a horcrux que Voldemort nunca planejou criar: o próprio Harry. Eu tinha que ficar de fora de tudo, não podia ser vista. Não podia nem estar aqui.
Entretanto, lá estava eu.
A única coisa útil que consegui pensar foi em me ocultar com feitiços e ser tão cautelosa possível para que ninguém me notasse, nem mesmo meus três amigos. E foi só eu fazer isso que os três se espremeram passagem adentro. Mais um segundo e eles teriam me visto. Eu não tive tempo de ir logo para a Casa dos Gritos e me vi sem saída. Teria que deixar eles passarem à frente, torcer muito para que não esbarrassem em mim por acidente e depois segui-los de perto. Então, observei enquanto se aproximavam e me espremi ao máximo contra a parede, prendendo a respiração. Fiquei sem acreditar quando os vi passar por mim sem me notar e cuidadosamente os segui pelo túnel.
Rapidamente chegamos ao caixote que bloqueava a passagem. Lembrei que do outro lado estavam Severus e Voldemort, tendo aquela enfadonha conversa que acabava muito mal. Eu tive que ficar um pouco mais afastada e não conseguia ouvir tão claramente o que diziam, mas não me preocupei muito. Afinal, eu sabia que quando Voldemort deixasse Severus para morrer, Harry se juntaria a ele e... Meus olhos marejaram só de pensar.
Resolvi aproveitar para pensar em alguma coisa, decidir o que fazer de fato. Travei batalhas internas, lembrando de Dumbledore, de Fred... Lembrei de meus medos e inseguranças também. Estava apavorada. E tudo isso só se tornou pior quando escutei um silvo estranho, que certamente era Voldemort falando em língua de cobra. Era a ordem. Mate. Meu coração estava tão frenético que quase saía pela boca. A certeza veio quando ouvi Voldemort dizer que lamenta. Não demorou nada para que Harry removesse o velho caixote e entrasse para ver Severus morrer.
É isso. É agora.
Logo os três estavam lá dentro e eu os segui, já segurando minha bolsa firmemente em uma das mãos e a outra quase quebrando a varinha. Eu não havia pensado em nada. Não sabia o que fazer, nem sequer se faria algo.
— Leve... isso... leve... isso... – ouvi Sev sussurrar, a um fio de deixar essa vida.
Em uma fração de segundo, a cena que eu sempre imaginara ao ler esse trecho do livro se passou em minha cabeça, e eu sabia muito bem que Sev estava a poucos segundos de morrer. Lembrei também de quando Harry salvou Rony de morrer envenenado no sexto ano com um bezoar. E também de como Severus salvou Draco no mesmo ano com o contrafeitiço que fazia os graves ferimentos provocados pela azaração Sectumsempra se curarem.
E, mais uma vez naquela noite, agi por impulso.
A minha bolsa, assim como a de Hermione, tinha de tudo um pouco estocado. Eu sabia que tinha bezoar lá, só por precaução. Só precisei sacudir a varinha para fazer ele saltar da bolsa pra minha mão e, sem me preocupar com as consequências, fui para perto de Severus. Ele ainda segurava Harry pelas vestes, e Harry estava terminando de recolher as memórias.
— Olhe... para... mim...
Não! Eu quis gritar. Mas o grito de pavor ficou sufocado em minha garganta. Harry o olhava nos olhos e eu me meti entre os dois, empurrei o bezoar pela garganta de Severus e já comecei a murmurar o contrafeitiço de forma rápida, desesperada e frenética.
— Vul-vulnera Sanen-t-tur – gaguejei. Tentei me acalmar para poder pronunciar corretamente, pois não funcionaria desse jeito. – Vulnera Sanentur... Vulnera Sanentur...
— Mas que diabos ela está fazendo? – ouvi Rony perguntar, num tom que era um misto de choque e indignação. – Esse filho da mãe só teve o que mereceu...
— Vulnera Sanentur... – continuei, fingindo não ouvir. – Vulnera Sanentur...
Chequei a respiração dele e não havia nada. Vi os cortes profundos deixados pelas presas de Nagini aos poucos se fecharem. Todo o sangue voltava e a ferida, antes horrenda, gradativamente melhorava de aspecto. Entretanto, eu não sabia se o bezoar surtira efeito. Mesmo assim, não parei de repetir o encantamento. Mais uma vez verifiquei a respiração dele e, para meu completo alívio, ela estava lá, apesar de fraca. Logo todo o sangue voltara e os ferimentos estavam fechados, e só o que restava deles eram suaves marcas avermelhadas. Entretanto, Severus jazia desacordado. Um pouco assustada, continuei murmurando o encantamento. Sua finalidade era de cura... então, quem sabe? Talvez fosse de alguma ajuda com o veneno, junto ao bezoar. Pronunciei mais algumas vezes e Severus se mexeu de leve e tossiu. Meus olhos marejaram de emoção ao ver os dele se abrirem um pouco.
— Oh, graças a Deus – falei, aliviada.
Estava tão absorta em salvar Severus que não notei que Voldemort estava fazendo seu pronunciamento.
“Desta vez eu participarei da luta, Harry Potter, e o encontrarei, e castigarei até o último homem, mulher e criança que tentou escondê-lo de mim. Uma hora.”
Observei Hermione e Rony sacudirem suas cabeças, encarando Harry.
— Não dê ouvidos a ele – interpôs Rony.
— Tudo dará certo – acrescentou Hermione. – Vamos voltar para o castelo, se ele foi para a floresta precisaremos pensar em um novo plano...
Eles olharam para Snape e depois pra mim, e eu rapidamente tentei voltar a atenção deles para o que realmente interessava naquele momento: voltar para o castelo.
— Severus deveria estar morto. Para todos os efeitos, vocês sigam adiante como se ele estivesse.
— E merecia de fato estar – acrescentou Rony de forma categórica.
— Isso não importa, não agora, Rony – eu disse a ele. – Vocês três têm muito com o que se preocupar no momento, e estão no caminho que deveriam estar. Não se distraiam comigo. Ok? Confiem em mim, como sempre confiaram. Para todos os efeitos, Snape morreu aqui. Agora vão para o castelo. Já!
Sem hesitar, os três correram de volta para o túnel, deixando-me com Severus. Olhei para ele, preocupada com sua expressão pálida e debilitada. Decidi preparar alguma poção rápida para ajudá-lo a melhorar. Pensei em levá-lo para a enfermaria, mas rapidamente descartei a ideia ao me lembrar que, aos olhos de todos, Severus ainda era o vilão. Enquanto revirei minha bolsa atrás do que era necessário, fui tentando reorganizar meus pensamentos para decidir o que fazer a seguir. Harry a essa altura estaria no castelo, vendo os corpos de Remus e Tonks... Imaginei o quão diferente estaria o cenário com Fred vivo. Isso não mudaria muito o peso da responsabilidade naquilo que Harry sentiria... Ele certamente iria para a sala do diretor para poder ter acesso à penseira de Dumbledore, onde ele enfim descobriria a verdade.
Preparei uma poção rápida, a mais simples que achei no livro, imaginando que ajudaria. Era bem básica, e eu possuía os ingredientes em meu pequeno estoque na bolsinha. Com um pouco de dificuldade, consegui fazer com que Severus tomasse um cálice cheio, e o resultado foi visível; o tom de sua pele ficou bem mais saudável.
— É uma bela pulseira – disse ele, olhando para a o meu pulso. Sua voz estava rouca e falhava.
— Presente de Draco Malfoy no natal passado – eu disse. – Fico feliz em ver que está melhor.
— Por que fez isso, ? – perguntou. – Eu deveria estar morto. Tenho certeza disso.
— Deveria – não neguei. – Mas não pude me conter.
Mesmo fraco, seu olhar reprovador era cortante.
— Você não sabe as consequências disso, .
— Nem você – interpus. – Mas já está feito. Não tem como voltar atrás... felizmente.
Ele balançou a cabeça de forma reprovadora.
— Já conseguiu achar o objeto que Dumbledore lhe pediu?
— Não – respondi, irritada somente pela menção do maldito objeto. – Eu falhei. É pouco provável que eu encontre essa porcaria no pouco tempo que resta.
Ele levou um tempinho para absorver o que eu disse, mas logo voltou a falar:
— Não dê a batalha como perdida ainda – disse. – Enquanto ainda restar tempo, continue lutando.
A contragosto, acenei positivamente com a cabeça, pois sabia que ele estava certo.
— Tem razão – concordei. – Vai ficar bem?
— Não se preocupe comigo.
— Você deveria estar morto. Fique de fora disso tudo. Certo? – Ele não respondeu nada. – Prometa, por favor.
Praticamente revirando os olhos, ele respondeu:
— Tudo bem, . Agora vá.
Guardei tudo rapidamente na bolsa e me levantei, já pensando aonde poderia ir. Estava quase no túnel quando ele me chamou:
— ?
— Sim, Sev?
— Obrigado – disse, um tanto sem graça. – E tenha cuidado.
Sorri para ele.
— Pode deixar.
Sem mais, segui pelo túnel e me espremi pela passagem. O fim estava cada vez mais próximo e eu já não tinha mais esperanças de ser bem sucedida em minha missão. Todavia, Severus estava certo. Eu não podia desistir enquanto ainda tivesse tempo de tentar. Seria o cúmulo da covardia.
Minha frustração foi tanta que acredito que não vale a pena nem descrever tudo o que fiz. Foi tanta perca de tempo quanto qualquer outra tentativa que eu fiz ao longo deste ano. Eu era, indubitavelmente, um enorme fracasso. Talvez eu devesse ter tentado algum ato de desespero, como por exemplo usar a sorte líquida a meu favor – e no minuto em que tive a ideia, perambulando pelo castelo, me xinguei mentalmente por ser tão burra ao ponto de não pensar nisso antes, quando havia tempo hábil de preparar a poção. Entretanto, não consegui de fato fazer nada. Tentei, é verdade, mas não consegui. Durante todo o tempo que Harry levou para ver as lembranças de Severus, depois para ir se entregar para Lorde Voldemort e por fim ser trazido para o castelo nos braços de Hagrid, esforcei-me ao máximo para conseguir algum resultado. Todavia, lá estava o exército de Lorde Voldemort, todo reunido, Harry fingindo-se de morto nos braços de Hagrid, que chorava silenciosamente, e todos os oponentes que pertenciam ao lado da Ordem encarando os inimigos. Eu estava entre eles. Finalmente aceitei o fracasso e desisti. Reconheci que meu ano inteiro foi uma completa perca de tempo e que qualquer coisa que fugisse do que literalmente estava escrito seria inteiramente culpa minha.
Confesso que a cena era ainda mais assustadora do que imaginei. Todos aqueles Comensais, dementadores, gigantes, monstros... isso sem mencionar o pior dos monstros que estava bem à frente, com Nagini em seus ombros. Sim, Lorde Voldemort. E ver Harry fingindo estar morto daquele jeito... Nossa, era horrível. Partiu meu coração ver a professora McGonagall gritar daquele jeito, pior ainda ao ouvir Hermione, Rony e Gina gritarem também. Fiquei quieta e impassível, pois minha reação era o de menos. Ninguém estava prestando atenção. E o discurso de vitória de Lorde Voldemort era ainda pior de se aguentar do que imaginei que seria. Entretanto, até que tudo foi bastante breve, e logo a emoção começou:
— HARRY! – gritou Hagrid, desesperado pelo sumiço do garoto que, sabiamente, já havia desaparecido debaixo da capa de invisibilidade e se afastado. – HARRY... ONDE ESTÁ HARRY?
Foi então que tudo começou a acontecer de uma só vez. Diferentemente das batalhas que ocorreram mais cedo, tudo era mais intenso, caótico e assustador.
Os centauros foram com tudo para cima dos dementadores, e por isso eu me senti muito grata. Eles eram meu ponto fraco recém descoberto. Os gigantes de Lorde Voldemort se ocuparam em esmagar tudo o que estivesse em seu caminho, e esse foi o primeiro desafio que enfrentei: não ser esmagada. Felizmente, os testrálios chegaram para atrapalhá-los, sobrevoando suas cabeças e desviando seu foco e atenção. Vi um hipogrifo entre eles, e logo lembrei que era Bicuço. Juntos, tentavam cegar os gigantes. Apenas um dos gigantes batia nos outros, e logo notei que era Grope, o meio-irmão de Hagrid. Este estava do nosso lado. No meio de tanta balburdia, todo mundo acabou sendo empurrado para dentro do castelo, seja Comensal ou defensor de Hogwarts. Comigo não foi diferente; fui arrastada na multidão. Quando finalmente havia espaço para que eu desse meus próprios passos novamente, finalmente caí nos duelos sangrentos contra os partidários das trevas, e fui com tudo contra eles. Não ficarei aqui me vangloriando de ser fácil porque não foi; cada um com quem duelei me deu muito trabalho, uns mais que outros. Investia com tudo de mais pesado que eu sabia fazer, e fui derrubando um a um, tantos quanto foi possível.
Inevitavelmente, entrei numa batalha com um Comensal que duelava muito bem. Este me rendeu mais alguns machucados feios para os que eu já colecionava, e me deu muito trabalho, mas eles não conseguiu escapar do floreio que dei ao usar a sectumsempra. Com sangue jorrando de sua garganta, ele caiu ao chão e começou a se debater. Não dei atenção a ele e já virei procurando o próximo; porque era assim que estavam as batalhas. Caiu mais um? Lindo, agora olhe ao redor o mais rápido que puder, defenda-se e tente não ser morto. Bem assim. Como nas outras batalhas que venci, assim que virava, me deparava com o próximo oponente. Para meu completo choque, ao me virar dessa vez, deparei-me com Lucius Malfoy, pronto para atacar.
— Mas que diabos...? – comecei a perguntar, mas ele me atacou, e tive que me defender. Não era para ele estar de fora? Que diabos ele fazia ali?
Ele não me deu chance de perguntar e travamos uma batalha intensa. Como se não bastasse, num dado momento vi que um Comensal tinha abatido alguém do meu lado e estava livre, e sem pestanejar virou-se para ajudar Malfoy a acabar comigo. A luta já não estava fácil antes disso, e só se tornou muito, muito pior. Malfoy lançou uma Maldição da Morte da qual escapei por pouco, mas um aluno da Lufa-Lufa não teve a mesma sorte que eu, pois a maldição lançada contra mim acabou por acertá-lo pelas costas. Isso me fez sentir um ódio terrível que parecia queimar por dentro. Furiosa, empenhei todos os meus esforços em acabar com aquele maldito Comensal, e a força que empenhei em minhas azarações e maldições era tanta que eu gritava toda vez que lançava uma. Lucius começou a perder, mas isso não me fez desacelerar. Entretanto, dois de seus amigos encapuzados nojentos vieram para socorrê-lo.
Percebi vagamente que as batalhas iam cessando, e eu já sabia bem o motivo. De soslaio, vi que Lorde Voldemort enfrentava sozinho três bruxos. Eu sabia que era a professora McGonagall, o professor Slughorn e Kingsley. Do outro lado, Bellatrix enfrentava Hermione, Gina e Luna, e a Sra. Weasley não tardaria em intervir. Então, que diabos Lucius fazia ali? Era para ele e Narcisa estarem procurando Draco. Quando o pensamento atravessou minha mente, quase fui derrotada pelo momento de distração; a maldição da morte me errou por pouco.
Travei minha luta com ainda mais intensidade, pois eu queria estar assistindo quando a vaca que matou meus pais fosse morta. Céus, queria ser eu a matá-la, mas... não sabia se conseguiria a oportunidade. Num aceno da varinha somado a um segundo de distração de um dos Comensais, minha azaração o acertou bem no peito, certeiro como uma facada no coração, e ele caiu. Faltavam dois. Por sorte, ambos se distraíram com o amigo caído, e foi assim que eu consegui quebrar o pescoço do segundo. Mais uma vez, éramos só eu e Lucius. Ele, mais uma vez cometeu o erro de se distrair, e foi assim que eu o acertei na perna. O corte ficou muito feio e o paralisou. Eu hesitei um pouco, pois pensei em matar... Mas então lembrei que era pai de Draco e, por essa razão, apenas o estuporei.
— MINHA FILHA NÃO, SUA VACA! – ouvi Sra. Weasley gritar enquanto passava correndo e já se livrando da capa para poder acabar com a Comensal.
Bem a tempo, pensei, sorrindo enquanto observava os dois duelos finais. Fui me aproximando mais e mais, pois queria ver bem de perto a vida deixar aquela maldita. Pouca coisa me animaria mais do que aquela cena no momento. E então, o acontecimento que eu mais esperava finalmente ocorreu: o feitiço que a Sra. Weasley lançou passou direto por baixo do braço esticado de Bellatrix e a acertou direto em seu coração. A multidão começou a gritar em comemoração, e eu fui uma das pessoas a comemorar, obviamente. Gritei, pulei e aplaudi muito. A reação de Lorde Voldemort foi de causar medo, e não foi à toa que o silêncio voltou a reinar. Ao ver Kingsley e os professores McGonagall e Slughorn voando para longe com a intensidade da fúria do Lorde das Trevas e ouvir aquele enfadonho grito de ódio, um arrepio muito intenso me acometeu. Observei ele virar para se vingar de Sra. Weasley e então Harry a protegeu e por fim se revelou.
Assim como toda a multidão, assisti enquanto Harry explicava para Lorde Voldemort todos os motivos pelos quais aquilo tudo era um erro dele. Explicar a teoria das varinhas. Explicar suas falhas e erros. Qual seria sua ruína. E depois, a batalha épica se desenrolou diante de meus olhos. Eu não conseguia respirar direito. Como em algumas ocasiões, meu lado de fã falava mais alto e eu não conseguia fazer outra coisa senão assistir a versão real do que eu assisti no cinema e imaginei ao ler o livro. Como sempre, a realidade era fiel ao livro então, após Expelliarmus e Avada Kedavra proporcionarem um assustador show de luzes ao se unir no espaço entre Lorde Voldemort e Harry, o feitiço finalmente ricocheteou, abatendo de uma vez por todas o Lorde das Trevas.
Precisei de vários segundos para assimilar que estava acabado. Parte de mim não conseguia acreditar que isso pudesse ser verdade. E essa parte falava muito alto, pois fui eu quem falhou em cumprir a missão de Dumbledore. Minha falha poderia comprometer esse final que se desenrolava diante de meus olhos naquele exato momento. Nada mais natural que desacreditar daquilo tudo.
Era apenas bom demais para ser real.
Incapaz de acreditar e querendo muito constatar aquilo com meus próprios olhos, fui pé ante pé, com cautela, cada vez mais próxima do corpo de Lorde Voldemort. Ele jazia imóvel no chão, aparentemente morto. Era fenomenal que pudesse ser verdade; mas eu precisava ver sua face para crer. Ver a luz deixar aqueles olhos medonhos. Ver que o peito não mais se mexia, pois já não havia mais respiração. Precisava da constatação de que o pesadelo acabara. Uma eternidade depois, – meros instantes – meus olhos finalmente encontraram os dele. Não havia mais vida ali. O peito, imóvel. Trêmula, aproximei minha mão do nariz ofídico, tento a certeza de que não havia mesmo respiração alguma. Ainda insatisfeita, levei a mão ao pulso. Não havia sinal. Nada.
Estava morto.
Enquanto dançava aquela valsa mortal com o destino de todos, que dependia do erro naquela suspeita de Dumbledore, muitas coisas aconteciam ao meu redor, mas eu estava indiferente a elas. Não me importava os comensais fugindo. Não me importava com as comemorações. Nada parecia importar além daquele momento fugaz de acabar de vez com a dúvida que me atormentara durante meses.
Voltei a ficar ereta, finalmente me permitindo acreditar. Era verdade, afinal. O Lorde das Trevas caiu. Os tempos de terror chegavam ao fim. E talvez eu nem sequer tivesse falhado! Talvez o maldito objeto misterioso nunca existira...
— . – Era só meu apelido, mas parecia ter um milhão de significados. Era Draco quem me chamava. Estava bem ali ao meu lado, querendo minha atenção. Finalmente desviei o olhar do corpo inanimado do bruxo das trevas e me afastei dele, olhando no fundo dos olhos de Draco. O brilho no fundo daqueles olhos cinzentos me chamava. Implorava por mim. Era como... bem, naquele momento eu não sabia. Lutei para encontrar comparação ao que aquele olhar remetia, mas não achei nada naquele instante. Respondi ao chamado dele apenas com um mero sorriso, que provocou um nele também. Ele abriu os braços, me chamando para aquele abraço reconfortante... e eu não pensei duas vezes! Corri para os braços dele, feliz. Sim, FELIZ! Eu mal conseguia acreditar que voltava a me sentir assim novamente. Enquanto encontrava-me no acalento de seu abraço, notei que eu possuía sim motivos para estar feliz. Deu tudo certo, afinal. Voldemort e Lestrange estavam mortos. MORTOS! E Fred e Snape vivos, sãos e salvos em algum lugar por perto. Eu estava bem, nos braços do homem que amo. Como não sentir felicidade?!
A princípio, num tolo pensamento, pensei que estava tão cheia de felicidade que meu peito doía. Talvez estivesse dificultando minha respiração, também. Era possível, certo? Entretanto, a tontura e o calor que senti nas costas não faziam sentido algum. Principalmente quando o calor foi piorando, começando a arder, como se estivesse em chamas. Mas ao ver a expressão de Draco quando ele se afastou para me olhar, entendi que algo estava muito errado. Muito errado mesmo.
Minhas pernas cederam, mas Draco segurou-me. Se não fosse por isso, teria caído ao chão. Olhei para trás e indistintamente notei Lucius com a varinha erguida em minha direção. Entendi então que o calor era na verdade sangue dos ferimentos que ele fizera com alguma azaração, e a ardência provavelmente vinha dos cortes. Mas depois de perceber o que me acontecera, não pude fazer mais nada, pois simplesmente vi tudo escurecer e desaparecer.
FIM
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Nota da Autora: Oi, amores da minha vida! Como vocês estão?
Acho que nem demorei tanto assim dessa vez, né?! HAHAHHA 3 meses... já foi pior, não é verdade? Os motivos, vocês já conhecem. Trabalho, cada vez pior, e a faculdade, que também não ajuda. Mas enfim consegui soltar um capítulo para vocês, que nada mais nada menos é do que o fim de BLLL 2. MAS CALMA. C-A-L-M-A! Tem a parte 3, na qual já estou trabalhando. Fiquem tranquilas. Logo tem mais BLLL pra vocês <3 Fiquem ligadas na página, ou no grupo, pois sempre que tiver novidades, eu coloco lá pra vocês saberem. Ok?
Eu sempre agradeço e nunca me cansarei de agradecer: obrigada por todo o carinho e toda atenção que vocês me dão. Vocês são as melhores. Sem vocês, eu não seria nada. E BLLL provavelmente estaria esquecida e abandonada. Amo vocês, de verdade.
Feliz natal atrasado! Este é o meu presente para vocês. E já aproveitando, feliz ano novo!
Até logo! Vejo vocês na continuação. Beijos.
xoxo, Amy, 28 de dezembro de 2015.
Outras fics da autora:
McFLY:
It’s Not The End [Finalizadas] | Grown-Up Kids [Finalizadas]
30 Seconds To Mars:
With Arms Wide Open [Finalizadas]
Nota da Beta: Caso encontre algum erro, não use a caixa de comentários, entre em contato comigo pelo twitter ou por e-mail.