Era como se eu estivesse vivendo dentro do poema de Jacques Prévert. Eu ouvia, a cada ação de , os versos soando em minha cabeça. Não deixava minha tristeza transparecer, mas eu sabia que eu desabaria assim que ele fosse embora. Do mesmo jeito que terminava o poema. Do mesmo jeito que eu sempre acabava.

colocou o café na xícara. Os versos já podiam ser ouvidos por mim.

Il a mis le café
(Ele colocou o café)
Dans la tasse
(Na xícara)

Nossos olhares não se cruzavam. Eu queria que ele me olhasse. Queria ter a oportunidade de dar um último beijo, de me despedir de maneira digna. Eu não sabia como fazer aquilo, mas sabia que ir embora doía mais em do que em mim. Ele, então, colocou o leite na xícara e, jogando açúcar lá dentro, mexeu sua bebida.

Il a mis le lait
(Ele colocou o leite)
Dans la tasse de café
(Na xícara de café)
Il a mis le sucre
(Ele colocou o açúcar)
Dans le café au lait
(No café com leite)
Avec le petit cuiller
(Com a colherinha)
Il a tourné
(Ele mexeu)

Lentamente, levou o café até sua boca, bebericando-o, até deixar a xícara completamente vazia. Quando terminou de beber seu café com leite, deixou a xícara sobre a mesa da cozinha. Vi uma lágrima cair de seus olhos, mas ele não ousou falar comigo.

Il a bu le café au lait
(Ele bebeu o café com leite)
Et il a reposé la tasse
(Ele deixou a xícara)
Sans me parler
(Sem falar comigo)

Eu fiquei olhando para os meus pés enquanto escutava buscar, no bolso da sua calça, sua caixa de cigarros. Tirou um e, com o seu isqueiro sempre à mão, o ligou. Tirou o papel da boca e soprou. Uma fumaça preta saiu de sua boca em um formato arredondado. Não pude deixar de sorrir. Naquelas duas semanas, ele havia tentado incansavelmente fazer uma fumaça em formato de coração. Obviamente, fracassou em todas as tentativas.

Daquela vez, no entanto, ele não tentara. Simplesmente bateu no cigarro para que as cinzas caíssem no cinzeiro e não me olhou. Sequer me dirigiu a palavra.

Il a alume
(Ele acendeu)
Une cigarrete
(Um cigarro)
Il a fait des ronds
(Ele fez um círculo)
Avec la fumée
(Com a fumaça)
Il a mis le cendres
(Ele colocou as cinzas)
Dans le cendrier
(No cinzeiro)
Sans me parler
(Sem falar comigo)
Sans me regarder
(Sem me olhar)

se levantou e jogou a capa-de-chuva sobre sua vestimenta. Seus olhos estavam vermelhos e eu percebi que ele não conseguiria ficar sem chorar nem mais um minuto. Ele pegou sua boina e, sem se incomodar com a chuva que caía lá fora, a colocou sobre a cabeça. E, então, ele foi embora. Não me falou nada e não me olhou. Apenas saiu sob a chuva.

Il s'est levé
(Ele se levantou)
Il a mis
(Ele colocou)
Son chapeau sur sa tête
(O chapéu sobre sua cabeça)
Il a mis son manteau de pluie
(E sua capa-de-chuva)
Parce qu'il pleuvait
(Porque chovia)
Et il est parti
(E ele se foi)
Sous la pluie
(Debaixo de chuva)
Sans une parole
(Sem uma palavra)
Sans me regarder
(Sem me olhar)

Me joguei sobre o sofá. Eu sabia que isso aconteceria, mas não imaginara que seria exatamente como no meu poema preferido. Quantas vezes eu já tinha chorado por causa do poema? Inúmeras. E agora meus olhos se enchiam de lágrimas, de alguma forma, por causa desse mesmo poema. A questão era que agora ele se tornara realidade.

Relaxei minhas costas sobre o encosto do sofá e, apoiando minha cabeça na minha mão, deixei que todas as minhas lágrimas rolassem desesperadamente.

Et moi j’ai pris
(E eu peguei)
Ma tête dans ma main
(Minha cabeça na minha mão)
Et j’ai pleuré
(E eu chorei)

Eu não conseguia conter meu choro. Os soluços já eram quase compulsivos. Fiquei de pé para buscar um copo de água para mim. Quando estava na cozinha, escutei o fraco barulho da maçaneta da porta principal girando. Minhas forças se esvaíram e o copo caiu da minha mão. Não me importei com os cacos no chão e nem com a água que eu acabara de derramar. Simplesmente corri para a sala e vi parado na porta, me fitando. Seu rosto estava molhado e seus olhos e seu nariz estavam em um tom encantador de vermelho. Ele era a pessoa mais encantadora do mundo quando chorava.

- Eu pensei que você não viesse. – Sussurrei.
- Mas eu vim. – O choro deixava sua voz rouca.

As lágrimas caíram com mais intensidade, mas eu não me importei. Simplesmente coloquei todos os meus pensamentos de lado e corri para os braços dele, beijando todo o seu rosto.

- Eu te amo. Eu te amo. – Murmurei em seu ouvido. – Não vai embora, por favor. – Sem me importar com a umidade de sua capa de chuva, eu o apertava cada vez mais contra mim.
- Você sabe que eu tenho que ir. – Me afastou com delicadeza e tirou alguns fios do meu cabelo que caíam sobre o meu rosto. – Se tudo der certo, eu vou voltar.
- Mas... E se não der certo? E se você...
- Não fala isso. – colocou seu indicador sobre a minha boca. – Eu te amo, . Se não der certo, você sabe disso. Se não der certo, você vai seguir sua vida e vai conhecer outro cara. Mas a única coisa que eu te peço é que não esqueça que eu te amo. – Afastou seu olhar e comprimiu os lábios, segurando com força em meu antebraço. – Entendeu?

Eu não tinha mais como responder. Se ele tinha dito, estava dito. Ele me amava e, pelo menos por um tempo, isso bastaria. Fazendo certo esforço, me soltou, segurando apenas em meu queixo, aproximou sua boca de minha orelha.

- I don’t want this moment to ever end, when everything is nothing without you. I’d wait here forever just to see your smile, ‘cause it’s true: I’m nothing without you (Eu não quero que esse momento acabe nunca, quanto tudo é nada sem você. Eu esperaria aqui pra sempre só pra te ver sorrir, porque é verdade: eu sou nada sem você). – Recitou as primeiras frases de With Me, do Sum 41.
- Eu não acredito que você está fazendo isso de verdade. – Falei mais para mim do que para ele. Eu sempre amara aquela música e nunca pensara que nós podíamos ter isso em comum.
- This words are my heart and soul. I hold on to this moment, you know. ‘Cause I bleed my heart as it shows that I love you so (Essas palavras são meu coração e minha alma. Eu me seguro a esse momento, você sabe. Porque eu sangro o meu coração enquanto mostro que eu te amo tanto). – Mudou o fim da música para que combinasse mais com a nossa situação e, depositando um rápido selinho nos meus lábios, voltou-se para a porta e, mais uma vez, saiu em baixo de chuva, consciente de que tudo poderia ou não dar certo.

Esperem a parte II...



Nota da Autora: Olá mais uma vez, meninas! Espero que tenham gostado de mais essa short fic. Eu me inspirei na minha aula de francês. O professor por acaso mostrou esse poema e foi algo que veio na hora, sabe? UIASDHAUISDHUIA É o tipo de coisa que, comigo, só acontece uma vez a cada dez anos xP A parte II, eu espero, não vai demorar a chegar. Enquanto isso, por que vocês não aproveitam pra deixar o comentário na caixinha aí de baixo ou pra ler as outras fics, hm?
Beijos, beijos :*

Mesma autora:
22 de Dezembro
4AM Forever
Meu Inferno
Agora...
Cancún Depois Dos 25
Dez Passos Para O Paraíso
My Christmas Gift
Diga Que Me Ama

Nota da Beta: Qualquer erro que você encontrou, mande um e-mail diretamente para mim. Obrigada, Thai.

comments powered by Disqus