Flawless Curse

Escrita por Robins
Betada por Lelen (até o capítulo 6), Brille (a partir do capítulo 7) e That (a partir do capítulo 26)



Capítulo 25 – The End


O castelo de Wallguinton continuava o mesmo, exceto pela presença de corvos muito assustadores, devo ressaltar, por todos os lados em cima do gramado extenso – e agora morto –, que rodeava o castelo. Sem incluir a tempestade que agora estava vindo, deixando todo o céu cinza.
Os capangas de Lucy tinham nos pegado sem nem ao menos nos dar chance para escapar. Eles eram duas vezes mais altos e duas vezes mais fortes, dificultando tudo mais um pouco.
Greta mantinha um sorriso nos lábios à medida que atravessávamos o gramado em direção ao castelo; Lucy estaria nos esperando para finalmente cumprir seu destino e matar sua irmã mosca morta, melhor dizendo, eu.
Se fosse até pouco tempo atrás, eu até concordaria com ela. Eu realmente era uma mosca morta quando se tratava de Lucy, ela me deixava vulnerável e sem defesa, deixando que ela fizesse tudo que bem entendesse. Mas, dessa vez, seria diferente, eu iria ter forças para combatê-la. Lucy não iria machucar as pessoas que eu mais amo apenas para ter uma ao lado de quem ela diz amar, controlando tudo ao seu redor como uma vadia ditadora. Eu a colocaria no lugar dela, iria fazê-la pagar por toda a dor e sofrimento que ela causara quando ela não deveria ter nem ao menos nascido.
Lucy não deveria ter nascido.
Lucy era parte de ruim de mim, a parte ruim que eu deveria matar para manter o equilíbrio.
Qualquer um que ouvisse essa baboseira sobre equilíbrio acharia que era apenas uma desculpa de pais para acabarem com a vida de um filha problemática, mas meu pai e minha mãe nunca quiseram um futuro desses para uma de suas filhas. Muito pelo contrário; eles queriam o melhor para nós e, mesmo com todos os defeitos, eles amavam a mim e Lucy e desejavam que nada acontecesse conosco. Mas o que queremos, às vezes, não podemos sempre ter.
Lucy era má, fria e sem sentimentos; ela sempre tentava me culpar por coisas que ela fazia. Talvez fosse mais do que hora de alguém dar uma lição nela. E, dessa vez, eu não iria recuar, do mesmo jeito que eu fiz quando Lucy roubou minha boneca preferida.
Eu não recuarei, eu irei até o fim. Até que tudo esteja em seu perfeito equilíbrio.
Os portões do castelos se abriram, exalando o mau cheiro que vinha de dentro. Era uma mistura de lenha queimada com mofo e mais alguns cheiros que eu não pude identificar.
O castelo, por dentro, estava caindo ao pedaços. Podia se ver, em cada canto das paredes, teias de aranhas, as madeiras que haviam sido colocados de ponta a ponta para sustentar o telhado, que estava desgastado e caindo aos pedaços. Os móveis – pelo menos aqueles que tinham sobrado – estavam cobertos por lençóis brancos e poeira, juntamente com os espelhos. O imenso corredor nos levaria para o salão de festa, onde os Wallguinton costumavam dar suas festas exageradas, se me lembro bem.
Greta parou em frente à imensa porta, dando um sorriso para mim antes de abri-la.
- Oh, Deus, . – Falei, soltando-me do capanga que segurava meu braço e correndo até ele, que estava amarrado a uma cadeira, desacordado.
- Oh, maninha. – Ela falou com entusiasmo. – Seja bem vinda.
- , acorda. – Continuei a chamá-lo, sentindo minha visão ficar embaçada. – Oh, , não ouse morrer. – Sussurrei e passei a mão por seu rosto, que estava cheio de machucados e roxos, e por seu lábio que estava cortado. – O que você fez com ele?
Procurei Lucy rapidamente e a vi sentada em uma mesa do lado oposto da sala.
- Ah, nada. – Ela respondeu, descendo e caminhando até mim. – Apenas o fiz falar. – Ela cruzou os braços.
- Lucy, você não...
- Muito interessante a história de vocês, parece até um romance adolescente. – Ela me interrompeu. – A irmã boazinha que foi cuidar da mãe depois que a irmã má foi embora... Quão boa você, Gillbard, é. – Ela andou em minha direção e parou à minha frente. – Abandonou sua vida perfeita para viver uma vida que nunca desejou em Londres. Diga-me, , o que te torna tão especial? O que você tem que eu não tenho? Oh, deixe-me responder para você. Você é a que deveria ter nascido! – Ela gritou. – Você é a queridinha de todos... Você é a parte boa, que guarda ternura, compaixão, perdão e todas as coisas boas de um ser humano. Enquanto eu, eu guardo as coisas ruins, o terror, a dor, o sofrimento!
- Quem te disse isso? – Perguntei com a voz rouca.
- Isso é apenas uma história que eu li em um velho livro.
- Você s-sabe? – Gaguejei, olhando para ela.
- Você não é a única com recursos. – Ela deu as costas a mim. – Devo admitir, eu e Greta ficamos perdidas no começo, mas logo depois do seu aniversário, quando lemos o livro, tivemos a certeza do que faríamos. – Ela se virou para mim. – Mas seu namoradinho ajudou muito enquanto nós o torturávamos.
- A gente pode achar um jeito, Lucy. Nós podemos te consertar.
- Oh, quanta compaixão. – Ela ironizou. – Mas tem um pequeno detalhe que você esqueceu. Eu não estou quebrada, ! – Ela gritou apontando para si. – Eu estou melhor do que nunca. Eu me sinto, pela primeira vez, no controle da minha vida.
- Oh, Lucy, o que aconteceu com você? Você nunca se deixou influenciar e, agora, olha o que aconteceu: você se deixou levar pelo papo de uma velha idiota.
- Eu abri os olhos, , isso foi o que aconteceu. Greta não me influenciou, ela me ajudou a enxergar a verdade. A verdade que nossos próprios pais não tiveram coragem de nos falar. Diga-me, , você não se sente nem um pouco traída por eles ter escondido a verdade?
- Eles fizeram o que fizeram para nos proteger.
- Proteger a você, você quer dizer.
- O quê? Do que você está falando? Você é a que iria morrer caso a verdade viesse à tona.
- Você realmente acha que eles iriam querer a filha perfeita deles transformada em uma típica garota da sua idade? Você, ao menos, sabe o que garotas da sua idade fazem? – Ela falou com ar de sarcasmo. – Elas saem, se divertem, namoram, fazem novas amizades, elas têm uma vida. E quanto a você, ? O que você faz? Você se esconde atrás do rei e força um sorriso dentro daqueles vestidos perfeitamente desenhados e arrumados para mostrar o quão perfeita e comportada você é?
- Isso é minha responsabilidade, é a sua responsabilidade também.
- Esse é o ponto, . – Ela apontou para mim. – Essa é a diferença entre nós. Eu não assumo essas estúpidas responsabilidades que tiram toda a diversão dos meus anos como adolescente, você sim. E, por isso, você realmente acha que eles queriam que todas as coisas ruins que eu guardo dentro de mim fossem para você? Para que consertar uma boneca perfeita?
- Eu não sou perfeita.
- Mas é claro que você é. Sempre ficou com os melhores vestidos, sempre teve o carinho dos nossos pais, dos criados do castelo, do povo de Florença e dos garotos. E do principal, do .
- Você sabe que isso não é verdade. Você não foi diferente de mim, sempre teve tudo também.
- Eu tinha as sobras.
- Não, Lucy, você nunca teve as sobras, você teve o que você mereceu. Você colheu o que você plantou quando tratou nossos pais como se fossem um daqueles seus amigos idiotas, que só te influenciavam para fazer idiotices. E quando decepcionou o povo de Florença não aparecendo em nenhuma festa do castelo por preguiça e falta de consideração e quando tratou mal os criados do castelo só para lembrá-los de que você é quem mandava no castelo. E não me diga que eu sou a culpada por não te amar só porque você não teve coragem o suficiente para ser sincera com ele. Não me culpe pelo que acontece de ruim na sua vida porque você sabe que eu não estava por perto. Você sabe que eu desistiria da minha felicidade para você ser feliz. Mas as coisas mudam, Lucy. Eu mudei enquanto você planejava a sua vingança estúpida de pirralha mimada e eu não desistirei da minha felicidade para alguém que nem deveria estar aqui.
- ? – Escutei uma voz rouca se pronunciar atrás de mim. – , é você?
- . – Falei, virando-me para ele. – , graças a Deus. – Abaixei-me, ficando na altura do seu rosto. abriu seus olhos lentamente, piscando algumas vezes para que pudessem se acostumar com a luz. – Você está se sentindo melhor?
- Estou agora. – Ele sorriu. – Você não deveria ter vindo, ela vai...
- Shiu! Eu vou te tirar daqui, eu prometo.
- Sabe, ... – Lucy falou alto o suficiente para todos os presentes escutarem. – Isso realmente não importa agora.
- Nós só precisamos desamarrar...
- , cuidado! – gritou, fazendo com que eu virasse o rosto para trás a tempo de ver Lucy tentar me golpear com a faca.
Automaticamente, movi meu corpo para o lado, desviando-me da lâmina da faca de Lucy. A mesma se recompôs, manuseando a faca em sua mão, e olhou para mim com um sorriso no rosto.
- Você não sabe há quanto tempo estou esperando por isso. – Ela andou até mim, parando em minha frente. – Desde o primeiro dia em que eu soube que teria que te matar, eu venho esperando por isso.
Lucy moveu seu pulso, o que fez a lâmina da faca passar a apenas alguns centímetros da minha barriga por conta do impulso que dei quando vi sua mão vir em minha direção. Lucy moveu seu pulso mais uma vez, mas agora tentando acertar o outro lado. E, antes que ela pudesse voltar à sua posição inicial, movi minha perna, acertando sua mão, o que fez a faca ser jogada para longe.
- Nós não precisamos fazer isso. – Falei, voltando à minha posição inicial, com os braços cruzados.
- É verdade, não precisamos. – Ela respondeu, e eu pude relaxar meu corpo por um segundo. – Mas eu quero. – Lucy moveu sua perna e acertou minha costela, empurrando-me para o lado. – Ah, como quero. – Lucy levantou seu punho, levando até meu rosto e acertando um lado dele. – Quero tanto que deixa cada célula do meu corpo ativa, apenas querendo ver seu sangue pingar.
Outro soco e outro chute na costela. Eu sentia meu lábio latejar e minha costela arder com cada passo que eu dava para me afastar dela.
- Cansada, maninha? Eu ainda nem comecei. – Lucy moveu sua perna mais uma vez, dando um chute em minha barriga, o que fez com que eu caísse no chão. – Isso não deveria ser assim. – Ela falou, colocando uma perna de cada lado do meu quadril e suas mãos fechadas em meu pescoço. – Você deveria estar por cima. – Ela apertou suas mãos mais forte, o que fez com que o ar começasse a faltar em meus pulmões.
Virei meu rosto para o lado na esperança de conseguir que suas mãos afrouxassem na curva de meu pescoço, mas a única coisa que consegui foi um olhar triste vindo de , que tentava ao máximo sair de sua cadeira. Ele estava desesperado, e eu podia ver as suas cordas vocais quase pulando de seu pescoço. Talvez Lucy estivesse certa, talvez eu fosse fraca demais para derrotá-la. Afinal, eu nunca faria mal a ninguém, nem mesmo à minha irmã malvada que, na verdade, não é minha irmã, e sim a parte que deveria estar dentro de mim.
Eu estava sem esperança. Lucy ganharia de vez, e eu já podia ver minha visão turva. Meus olhos estavam quase se fechando quando um brilho me chamou a atenção e não era qualquer brilho. Era o brilho da lâmina da faca e ela estava a alguns metros de mim.
Estiquei meu braço ao máximo, sentindo meus dedos tocarem o cabo da adaga. Estiquei-me mais um pouco e consegui pegá-la entre minhas mãos.
- O mundo é dos mais fortes. – Ela falou com um sorriso no rosto e apertando suas mãos ao redor do meu pescoço com mais força. Puxei a adaga, colocando-a entre minha barriga e a de Lucy e logo senti sua lâmina deslizar para dentro da sua barriga de Lucy.
- Não, Lucy. – Falei, vendo suas feições mudarem de um sorriso para um rosto pálido e surpreso. – O mundo é daqueles que deveriam estar nele. – Completei, vendo seu corpo cair com tudo para cima de mim. Ela não estava morta, pois eu ainda pude escutar sua voz rouca em meu ouvido, sussurrando:
- Boa sorte.
Empurrei o corpo de Lucy para o lado, sentindo o ar em meus pulmões outra vez.
Acabou. Havia acabado, e tudo estava bem. Pelo menos, eu esperava que ficasse bem.
Eu cumpri tudo que a maldição havia me pedido, eu matei minha própria irmã – ou a parte ruim de mim, se assim poderia chamá-la – para o bem de todos e para acabar com uma estúpida maldição que me consumiu quase toda a minha adolescência.
Sentei-me no chão, sentindo todo o meu corpo doer. Minha cabeça parecia prestes a explodir, mas, mesmo assim, eu estava feliz. Acabou. Acabou. Eu podia repetir quantas vezes eu quisesse e gritar para quem quisesse ouvir: eu finalmente estava livre e eu podia aproveitar minha vida a partir de agora.
Dei um impulso para cima, ficando em pé.
- , você está bem? – Lorenzo apareceu ao meu lado, perguntando.
- Estou sim.
E, nesse momento, tudo estava preto.

Boa sorte. Isso me atormentava e se repetia, não uma, mas milhares de vezes em minha cabeça.
A imagem de Lucy com suas mãos em volta de meu pescoço habitava meu sonho, mas, dessa vez, eu não podia sair e acabava... Bem, eu acabava morrendo. Mas não era tudo, o pesadelo ainda continuava mostrando como o reino havia ficado depois que Lucy ganhava: tudo estava abandonado, as pessoas ficavam trancadas em suas casas com medo do novo sistema de ronda para pagar impostos, onde quem estivesse fora de sua casa no horário não permitido pagaria uma quantia absurda de dinheiro. Florença tinha virada uma cidade fantasma e a única feliz com isso era Lucy, a rainha e ditadora, que tinha feito todos aqueles que me ajudaram de seus súditos, incluindo papai e mamãe.
E, depois dessa pequena prévia do que poderia acontecer, eu acordei. Segundo mamãe, que estava ao meu lado, eu havia dormido por dois dias inteiros. Nada mal para alguém que acabara de matar uma irmã e tinha recebido sua parte 'má', pensei, descendo as escadas depois de um longo banho.
Algo estava faltando, entretanto. Eu não sentia nada de diferente comigo, apenas aquela vontade de comer um enorme hambúrguer com um copo enorme de refrigerante que fazia meu estômago roncar mais alto, quando coloquei os pés no piso gelado da sala. Vai ver o “Boa sorte” de Lucy fora apenas uma frase sarcástica usada por ela para me colocar medo, pensando que eu viraria alguém como ela. Lucy sempre gostava de ficar com a palavra final, principalmente quando era para me assustar.
Olhei para o lado, vendo um carro do lado de fora da janela. estava colocando as malas no porta-malas e logo meus pés tocaram o chão gelado até a porta aberta.
- Vocês está partindo? – Perguntei logo que cheguei à porta. parou o que estava fazendo e olhou para mim.
- Eu não tenho mais nada o que fazer aqui.
- Esperar que eu acordasse não significa nada para você? – Perguntei, descendo as escadas. – Você me ama, certo, ?
-
- Você me ama ou não?
-
- Responda! – Gritei, olhando para ele.
- Eu não te reconheço. – Ele respondeu, olhando para mim.
- Como assim você não me reconhece?
- Você matou Lucy.
- Lucy tinha que morrer.
- E você não sente nenhum remorso por isso?
- Ela ia me matar se eu não a matasse. Ela não vai fazer falta a ninguém.
- Está vendo? Lucy era sua irmã, quer você queira ou não. Ela poderia até dever não ter nascido, mas ela era sua irmã, . Eu vi o seu olhar quando matou Lucy, e aquele olhar não era da que eu conheci. Você parecia estar gostando de fazer aquilo.
- Eu deveria matá-la, que olhar você queria que eu estivesse? Se eu não fizesse, ela iria transformar o reino em seu pequeno parque de horrores. – Recuperei o fôlego. – Eu te amo, . – dei um passo em sua direção. – Nada mudou. – passei os braços por seu pescoço.
- Não, , tudo mudou. – Ele tirou meus braços de seu pescoço. – Eu não tenho certeza se eu realmente te amo.
- Mas você disse...
- Eu não tinha certeza antes e agora muito menos. Eu não posso ficar com você, mas nós ainda podemos...
- Não diga. – Interrompi-o e abaixei a cabeça. – Apenas... Vá.
- Mas...
- E não ouse voltar, ou falar comigo outra vez.
- Se é isso que você quer.
- Não, , – levantei a cabeça – é isso que você quer. – Completei, vendo-o entrar no banco do passageiro do carro.
O motorista deu a partida e eu pude ver a traseira do carro se afastando enquanto uma lágrima desceu por meu rosto. Esta seria a última que eu derramaria por ele.
Uma nova nasceria a partir dali.


Capítulo 26 – The Start Of Something New


- Tem certeza de que não prefere ficar em casa? – Alfred perguntou enquanto eu tirava o cinto. – Você acabou de chegar, deve estar cansada.
- me obrigou, e eu não tinha como negar. – Falei, olhando para ele. – Faltam apenas três meses para tudo acabar. Depois disso, eu estarei livre de Londres para sempre.
- Você nunca gostou muito daqui, para falar a verdade.
- Falam que nós, italianos, somos antipáticos antes mesmo de nascer. Bem, quem disse isso nunca conheceu um inglês, principalmente um adolescente. Ou bem pior, um adolescente inglês e, ainda por cima, homem.
- Nem todos somos idiotas. – Ele respirou fundo. – Sei que você está machucada, minha pequena, – ele começou, e eu abaixei minha cabeça – mas vai melhorar. Tudo, um dia, melhora. Você e o vão se acertar.
- Eu não tenho tanta certeza disso, Alfred. – levantei meu rosto, abrindo a porta em seguida. – Acho que minha relação com foi apenas uma coisa passageira, uma paixão adolescente.
- Se fosse passageira, você não estaria usando a blusa que ele lhe deu.
Olhei para a blusa do Aerosmith que estava debaixo do meu casaco. Estava frio, eu sentia isso nos meus ossos que tremiam por debaixo do mesmo.
Londres começava a esfriar quando se aproximava do fim do ano e toda a cidade ficava em clima de amor e perdão. Era quando aqueles que estavam brigados tinham um bom motivo para voltar a se falar, era quando jovens arrumavam um motivo para dar uma festa e quando ex-namorados decidem ficar em paz.
Toda a cidade, exceto por mim.
Eu não tinha falado com ele. Eu não o tinha visto ainda, mas eu ainda podia sentir sua presença em todo o lugar que eu ia; parecia que Londres estava conspirando contra mim. O aquário estava anunciando a visita grátis aos golfinhos, o parque de diversão estava em promoção para namorados, bandas clássicas estavam na cidade para fazer shows e os filmes na TV faziam questão de falar de amor proibido, perdão e bêbados.
Tudo estava conspirando contra mim.
E eu não o culpava. Ele estava seguindo em frente e apenas eu não conseguia enxergar isso.
Tudo isso se dava apenas a um pequeno sentimento: a esperança. Eu tinha esperança que ele batesse em minha porta ou me abordasse no meio da rua dizendo que me amava e que havia se precipitado quando disse que não queria ficar comigo. Eu tinha esperança. Tinha.
- Ele está namorando. – Falei, cruzando os braços, quase como um sussurro.
- Mas não faz nem uma semana.
- Não fazia um mês direito quando Lucy morreu e ele fez a mesma coisa comigo que fez com ela.
- Deve ser algum mal entendido. não faria isso.
- Como você pode dizer uma coisa dessas, Alfred? Você nem o conhece.
- Mas eu sei apenas de observá-lo que ele é um garoto nobre.
- Claro que é, todos são. – Abri a porta do carro, saindo do mesmo. Apoiei-me na janela, colocando a cabeça para dentro do carro. – Obrigada por me trazer e não precisa se preocupar em vir me buscar. Eu vou andando.
- Tem certeza? Você vai andar sozinha até em casa? Ainda mais à noite?
- Não é como se alguém fosse me sequestrar. Ninguém sabe quem eu sou por aqui.
- Mas...
- Tchau, Alfred. – Falei, afastando-me do carro.
- Tchau, .
Alfred deu a partida no carro e, minutos depois, eu o estava vendo virar a esquina quase como uma tartaruga.
Alfred estava cuidando de mim desde que cheguei a Londres, uma semana atrás. Mel e ele fizeram questão de continuarem trabalhando na casa de minha mãe enquanto eu estivesse aqui.
E aí você se pergunta: e sua mãe? Não era ela que deveria estar cuidando de você? Bem, ela deveria, mas a mesma decidiu ficar em Florença, já que ela e papai estavam começando a se entender, e eu não poderia simplesmente exigir que ela viesse comigo. Não quando eu sabia que ela e papai nunca se separaram por falta de amor. Eles tinham amor e isso podia se visto a metros de distância. E não seria eu, a sua filha – agora única – que iria acabar com a felicidade deles.
Virei-me para a entrada do pub e vi o enorme letreiro iluminado quase cegando alguém de tão forte que sua luz era. Andei até a porta aberta e a atravessei.
O lugar estava lotado, mas, ainda assim, pude ver acenando freneticamente de uma mesa. E ela não estava sozinha. Havia dois rapazes na mesa e um deles era um total desconhecido para mim.
- Você veio. – Ela disse, pulando da cadeira e me abraçando forte.
- Você me obrigou, como eu poderia recusar? – Falei, soltando-a.
- Você precisava sair de casa. Alfred disse que você passava o dia se entupindo de chocolate e assistindo a filmes românticos e trágicos. Isso tudo por causa...
- E aí, quem é o novo amigo de vocês? – Perguntei, olhando para o garoto que estava bebendo sua cerveja e quase engasgou quando me dirigi a ele.
- Esse é o Ian, ele é o auxiliar do técnico. – disse, e o garoto sorriu. E não era um sorriso que se via todos os dias.
Os dentes totalmente brancos pareciam se iluminar mesmo com a escuridão do pub e seus olhos – não, eu pude deixar de notar, mesmo no escuro – eram de um azul tão intenso que pareciam ter sido desenhados e, juntos com seus cabelos castanhos, eu poderia afirmar que ele havia sido tirado de um dos romances que eu costumava ler. E, quando ele se levantou para me cumprimentar, pude ver seu porte físico atlético e chegava longe de ser de um garoto qualquer. Seu peito estufado e seus braços fortes, debaixo da jaqueta de couro preta, afirmavam que ele era muito mais do que um simples britânico. Ele tinha algo especial.
- Prazer em conhecê-la, – ele passou o braço por minha cintura, puxando-me para perto e dando um beijo no meu rosto – eu sou Ian.
- . – Respondi, afastando-me dele. – O prazer é todo meu.
- Ian veio substituir o irmão dele.
- O que eu podia fazer? Ou eu vinha, ou teria que aguentar a mulher do John me dando ordens.
- Mas por que ele se mudou? – Perguntei, curiosa. – Digo, ele poderia construir uma vida aqui também, certo?
- Poderia, – ele respondeu, olhando para mim – mas a família de Melody, a mulher do meu irmão, mora toda no Texas. E, como todo panda apaixonado, ele fez o que ela pediu.
- O amor fode com as pessoas mesmo. – Falei, colocando mais uma batata frita na boca. – Especialmente com aquelas que acreditaram que seriam para sempre.
- ! – me repreendeu.
- O que foi?
- Uma moça não deve falar palavrões, principalmente na frente de homens.
- Agora deu, . As pessoas falam palavrões o tempo todo.
- Mas você não. Você não pode falar esse tipo de grosseria, principalmente porque você é... – se interrompeu quando percebeu que, ao lado dela, estava um desconhecido; alguém que não sabia nem de um terço da história e teria a sorte de não ficar sabendo.
Apoiei meus braços cruzados na mesa, olhando para ela.
- Sou o quê?
- Uma desacreditada no amor.
- Acho que eu tenho todo o direito de ser desse jeito.
- Só porque vocês não estão mais juntos não quer dizer que vocês não vão ficar juntos no futuro.
- Mas é claro que sim, que nem nos contos de fadas.
- Por que você está agindo desse jeito?
- Deve ser porque eu vim para cá pra ficar com meus amigos e esquecer o que eu passei em Florença. E você continua me lembrando desse idiota.
- Mas você e o...
- Eu vou buscar uma bebida. – interrompi-a, levantando-me. – Com licença.
- Você nem bebe.
- Nunca é tarde para começar. – Falei, dando uma última olhada nela antes de continuar andando até o bar. – Qual é a coisa mais forte que você tem nesse bar?
- Uísque?
- Uma dose, por favor.
Ele assentiu e colocou um copo na mesa. Pegou a garrafa de uísque e despejou um pouco do líquido no copo.
Respirei fundo e bebi tudo de uma vez, sentindo minha garganta queimar após colocar o copo em cima do balcão.
- Normalmente, pessoas que nunca beberam começam com uma cerveja e, depois, terminam com um uísque.
Olhei para o lado e vi Ian escorado no balcão, olhando para mim com um sorriso em seus lábios.
- E quem te disse que é a primeira vez que eu bebo?
- Sua careta depois de tomar uma pequena dose de uísque meio que te entregou. – Ri pelo nariz e abaixei a cabeça. – O que deu em você para beber desse jeito? É por causa do garoto que a falou?
- Também.
- Não deixe um garoto idiota que quebrou seu coração impedir você de viver como você fazia antes de conhecê-lo. Vamos lá, você é linda e tem uma vida pela frente.
- Bem, eu não me divertia muito. Eu não podia me dar ao luxo de me divertir, não quando outras pessoas poderiam se ferir por causa disso. Mas, mesmo sabendo disso, eu não pude evitar sentir como seria se, um dia, eu desrespeitasse as regras e me divertisse.
- Por quê? Vai me dizer que você vivia trancada em um castelo?
Olhei para ele.
- Acertou.
- Desculpe, eu não quis dizer isso. Espere, você disse que eu estou certo? Você, por acaso, é uma princesa?
- Se meu pai é rei, automaticamente, eu sou uma princesa.
- Não existe esse tipo de coisa.
- A Inglaterra não tem uma rainha?
- É diferente.
- Oh, mas é claro que não.
- Vamos dizer que você é uma princesa, como você diz. De que país você é princesa?
- Florença, Itália. Pode pesquisar, se você quiser.
- Eu não acredito nisso, principalmente porque você está bêbada.
- Mas eu só tomei uma dose.
- Para quem nunca bebeu, isso é muito. – Ele tirou o iPhone do bolso. – Sabia que nenhuma menina nunca veio com essa conversa quando estava bêbada para mim? Normalmente, elas pedem para eu levá-las para minha casa ou pedem para eu carregá-las até o carro ou – ele interrompeu sua fala e arregalou os olhos. – Mas você... – ele olhou para mim. – Como é possível? Digo o que você está fazendo em Londres?
- Meu pai e minha mãe são separados. Eu moro com meu pai em Florença e minha irmã morava com minha mãe, mas minha irmã mais velha faleceu e minha mãe precisava de alguém para cuidar dela, então eu vim.
- E como está sua mãe agora? Ela melhorou?
- Ela melhorou e está em Florença fazendo as pazes com meu pai.
- Então o que você ainda faz aqui?
- Não tem nada pior do que ficar perto de casais apaixonados.
- Ouch! Esse garoto te machucou mesmo.
Abaixei minha cabeça.
- Você não imagina o quanto.
- Levanta. – Ele falou, pulando da cadeira e ficando em pé ao meu lado.
Levantei a cabeça, olhando para ele.
- O quê?
- Levanta logo.
- Para quê?
- Você me disse que não sabe o que é diversão, certo?
- Disse, mas...
- Vamos lá, , você prefere ficar aqui nesse lugar, sofrendo por um idiota que não te merece, ou prefere ir comigo e conhecer a noite londrina? Eu entendo se você estiver com medo. – Ele estendeu a mão em minha direção.
Olhei para a sua mão e depois para ele. Não ia fazer mal, iria? O que podia acontecer de ruim?
- Dê o seu melhor, britânico. – Falei, segurando sua mão.
Ian me arrastou para fora do bar, falando alguma coisa para o bartender sobre pagar depois, e me levou para o seu meio de transporte nada seguro, uma Harley Davidson 883.
- Nós vamos nisso? – Perguntei, apontando para a moto.
- O quê? – Ele perguntou, subindo na moto. – Deu medinho agora, ? – Ele olhou para mim. – Não foi você que disse que queria desrespeitar as regras e saber como diversão é?
- Eu queria, mas eu não pensei que eu iria começar andando numa moto.
- Você tem que começar por um lugar, certo? – Ele estendeu a mão para mim. – Prometo que você não vai se arrepender.
Olhei para ele e segurei sua mão.
- Tudo bem.
Motos não eram o meio de transporte mais seguros e mais confiáveis, mas quando Ian deu um sorriso irresistível para mim e disse que tudo iria ficar bem, eu tive a certeza de que eu poderia confiar nele.
Eu sei, eu só o conheci há meia hora e estava colocando minha confiança nele? Que tipo de pessoa faz isso?
O tipo de pessoa que percebeu que tempo de convivência não é tempo de confiança, pois isso não impediu minha irmã de tentar enfiar uma adaga em meu coração.
Ian me ajudou a subir em sua moto e pegou minhas mãos logo em seguida, colocando-as em volta de sua cintura antes de acelerar com tudo.
Eu podia sentir o vento bater em meus cabelos, além das luzes da cidade passarem rapidamente ao meu lado. E, então, eu me senti finalmente livre de todo o mal que me prendia em casa depois da meia-noite e todo o peso em meus ombros de decepcionar todos aqueles que eu amo desaparecer. Era assim o gostinho de liberdade e, por mais que ainda parecesse errado, nunca pareceu tão certo fazer algo sem pensar.
Eu era livre agora e nada iria me impedir de viver minha vida. Nem mesmo .

E quando eu subi naquela Harley, eu sabia que minha vida iria mudar drasticamente. Eu tinha um pressentimento de que Ian havia chegado para me mostrar uma nova vida cheia de novas sensações, sensações que nem em um milhão de anos eu sonharia que eu podia sentir. Sensações que nem mesmo o amor poderia me trazer.
O amor era algo bom e quando você ama não tem sentimento mais puro e mais sincero, mas, como toda rosa, o amor também tinha seus espinhos. Porém, não simples espinhos que, após apenas dois dias, saravam. Oh, não, o amor machucava mais, matava por dentro e todos aqueles espinhos entravam em seu coração fazendo uma ferida abrir sem nenhuma prévia de sarar.
Ninguém nunca disse que o amor seria fácil. Na verdade, Shakespeare fez questão de mostrar a todos que o amor era uma tragédia, mas como todo ser humano tem uma pequena tendência à estupidez – e eu não era uma exceção –, o amor se tornava uma das coisas mais desejada por cada membro do planeta, o que não incluía a minha pessoa no momento.
Eu podia estar sendo dura demais e até mesmo desacreditada, mas eu havia entregado a única coisa que eu não podia dar a uma pessoa, e ela simplesmente havia jogado ao mar na esperança de crescer. Doía quando alguém partia ser coração, principalmente quando você foi destinada a não ter um.
Abracei Ian mais forte e apoiei minha cabeça em suas costas e, pela primeira vez desde que cheguei aqui em Londres, eu me senti segura pela segunda vez. Senti que, finalmente, eu estava onde eu realmente pertencia.
Ian, ao perceber meu ato, soltou o guidão da moto e passou sua mão levemente em meu braço e depois virou seu rosto para o lado, soltando um: Vai ficar tudo bem. E eu sabia que quando ele estava falando isso não era apenas para me confortar, ou me dar falsas esperanças, e sim porque nada poderia fazer essa noite não dar certo.
Ian desacelerou logo quando viramos à esquerda. Perdition Street. Era como aquela rua costumava ser chamada e ela não tinha esse nome por acaso – ali era onde ficavam todos os bares e boates de Londres e, bem, toda a barra pesada de Londres também. Ali não havia apenas boates e pubs para o entretenimento de seus visitantes. Não, mas é claro que não. Ali havia muito mais do que qualquer pessoa podia imaginar; iam de estabelecimentos para jogadores viciados até traficantes de drogas e prostitutas. Essa era uma Londres que ninguém conhecia, era motivo de vergonha para a própria Rainha. E como eu sabia disso, ela sempre alertava minha mãe e meu pai para que eu não me metesse com a turma 'errada' e acabasse naquele lugar.
Ou como uma bêbada viciada em jogos, ou como uma garota arruinada tendo que vender seu corpo.
Acho que a Rainha ainda pensava que vivíamos no século XVIII.
Os pais de típicos adolescentes britânicos não permitiam que seus filhos andassem por ali. Guias turísticos aconselhavam visitantes a não chegarem perto dali. Mas parecia que não estava adiantando muito, pois como todo adolescente na flor idade, pronto para viver uma vida perigosamente sem pensar nas consequências, havia jovens para todos os lados. E eu podia jurar que muito deles não tinham idade para estar ali, e eu não estava muito longe disso.
- O que a gente veio fazer aqui? – Perguntei quando Ian estacionou do lado de outras motos.
- Não sei, – ele desceu da moto e arrumou sua jaqueta – talvez aquela coisinha que você tanto queria. O que era mesmo? – Ele estendeu a mão para mim. – Ah, diversão.
- Nesse lugar? – Perguntei, segurando a mão de Ian enquanto ele me ajudava a descer da sua moto.
Estávamos parados em frente ao que parecia um pub, mas muito mais barulhento e com um letreiro enorme que dizia: KMAQ. Havia uma fila enorme de pessoas na porta, que estavam todas vestidas para uma grande festa. Garotas em seus vestidos, que eu poderia jurar que pareciam mais uma blusa grande, e garotos em seus estilos despojados, mas mesmo assim elegantes. E, então, eu comecei a me perguntar se minha camisa do Aerosmith e minha jaqueta de couro preta junto com meu All Star velho era uma boa roupa para frequentar esse tipo de lugar.
- Por quê? O que há de errado com esse lugar? – Ele parou à minha frente.
- Eu acho que – abaixei minha cabeça, olhando para o meu All Star – nãoestoubemvestidaparaesselugar.
- O quê? – Ele abaixou a cabeça, impedindo meu campo de visão de visualizar meu All Star. – Vamos, , levanta a cabeça. – Ele voltou a sua posição inicial, e eu finalmente olhei para ele.
- Eu acho que não estou bem vestida para este lugar. Olha para mim, – abri os braços – parece que saí do show de uma banda de metal e me perdi por aqui. Olha para essas garotas, – apontei para as garotas na fila – e olha para mim. – Apontei para mim. – Eu não estou vestida adequadamente. Vamos embora, Ian, amanhã a gente volta.
- Essas garotas são um bando de exibidas.
- Mas, pelo menos, elas estão bonitas.
- Você não precisa disso tudo, você já é linda. – Ele sorriu, e eu pude jurar que meu coração começava a sarar. – E amanhã a gente volta nada, nós vamos agora. – Ele segurou minha mão, arrastando-me para a porta da boate. – Ei, Don, como você está? – Ian falou estendendo a mão para o cara que estava na porta.
- E aí, Ian, como você está, cara? – Ele apertou a mão de Ian e depois olhou para mim. – Da última vez que veio acompanhado, você saiu carregado por policiais e um pai muito furioso atrás. Melody, se não me engano.
- Essas coisas acontecem.
- Espero que, dessa vez, você não esteja em encrencas. – Ele deu um passo para o lado, saindo da frente da porta.
- Você não tem nem ideia. – Ele falou, segurando minha mão, e me arrastou para dentro da boate.
- Ian, e as pessoas na fila? Elas estão esperando há mais tempo que nós. – Falei, apontando para as pessoas que estavam atrás de nós, mas já era um pouco tarde, pois já estávamos dentro da boate, e eu pensei que o Rock In Rio de 85 estava lotado.
A boate não chegava nem um pouco perto do que eu imaginava, ou tinha visto em filmes. Nos filmes, elas geralmente serviam para as pessoas conversarem enquanto outras dançavam, mas, em uma boate da vida real, era tudo muito diferente. As luzes, que piscavam no meio da pista de dança, mostravam que havia mais pessoas do que aquelas que conversavam – de uma forma nada elegante – e davam altas risadas em mesas reservadas nas paredes da boate.
Ian me arrastou entre as pessoas em direção a uma das mesas que havia acabado de ser esvaziada.
- Ei, garçonete. – Ian falou para uma mulher, que segurava uma bandeja nas mãos.
- O que eu posso te servir, bonitão? – Ela apoiou as mãos na mesa.
- Duas tequilas e traga a garrafa, por favor. – Ele retirou o dinheiro do bolso e colocou no avental dela.
- É pra já, bonitão. – Ela sorriu e continuou andando entre as pessoas.
- Elas sempre falam com os clientes assim?
- Elas costumam falar outras coisas quando homens estão desacompanhados.
- O que elas falam? – Perguntei, olhando para ele. Ele riu pelo nariz. – O que é tão engraçado?
- Você é surreal.
- Sério? Por quê?
- Você tem a beleza de uma princesa, mas se veste como um roqueiro dos anos 90. Você está com o coração partido e, mesmo assim, não tem um sinal de que está sofrendo. E, por último, tem a aparência de uma garota experiente e madura, mas tem a inocência de uma garota de doze anos. Como isso é possível?
- Eu não tenho a inocência de uma garota de doze anos. – respondi, olhando para ele. – Para sua informação, eu já tenho dezoito anos e já bebi.
- Uma dose de uísque.
- Mas aquela dose valeu pela vida toda. – Falei, fazendo careta. – Como você conhece o porteiro? Quero dizer, você nem mora por aqui.
- Eu cursei faculdade aqui em Londres e morava com meu irmão. Quando ele conheceu a mulher dele, meus pais me arrumaram um emprego para mim no Texas e, consequentemente, eu fui para lá. Bem, eu não tinha muitas opções.
- E onde Melody entra nisso aí?
- Melody? Mas o quê...? Sua curiosa.
- Quem começou foi o cara da porta. Eu só estou querendo que você termine a história.
- Melody foi uma garota que eu conheci quando estava na faculdade. Eu estava perto de terminar e estava trabalhando em um colégio, Melody estudava lá e sempre dava em cima de mim. Nós começamos a sair escondidos de todos, mas, um dia, o pai dele descobriu que ela não estava dormindo na casa de uma amiga dela e veio atrás dela. Quando ele entrou nessa boate, procurou a filha e a viu aos beijos com um cara bem mais velho, fez uma confusão e todos os envolvidos foram para delegacia. Depois disso, eu fui despedido e fui para o Texas.
- Como você conseguiu um emprego aqui?
- Usei meu outro sobrenome. – rimos os dois.
- Aqui suas bebidas, bonitão. – Ela colocou dois copos minúsculos e uma garrafa em cima da mesa, e eu comecei a me perguntar: Esses copos não deveriam ser maiores? – E meu telefone, caso você queira companhia. Meu expediente acaba às duas da manhã. – Ela deu um sorriso e saiu rebolando – até demais para o meu gosto –, com seu minúsculo short com o emblema feito de strass do nome da boate.
- O que significa aquilo?
- Eu saio às duas? Significa que...
- Não, seu idiota. – Eu o interrompi. – Eu sei quando uma mulher dá em cima de um homem. Eu quero dizer aquele emblema que está gravado na entrada da boate e no short daquela mulher.
- Ah, claro que você estava falando do emblema. Todos falam do emblema. – Ele ficou em silêncio.
- E aí, Ian, não vai me dizer o que significa?
- Ah, significa Kiss My Ass Queen.
- Oh, meu Deus, que barbaridade. Por que alguém faria com a Rainha...? Quero dizer, ela tem seus momentos, mas ela é uma boa senhora.
- A senhora Rainha tentou tirar todos os estabelecimentos que tinham aqui e, quando ela não conseguiu, o dono dessa boate colocou esse nome para que ela soubesse que nada que ela fizesse poderia acabar com eles. – Ele tomou o conteúdo inteiro que havia dentro do copo de uma vez só. – E ela nunca mais tentou fechar nenhuma boate em Londres.
- O que é isso que tem dentro desse copo? – Perguntei, apontando para o pequeno copo que tinha à minha frente.
- Só uma bebidinha de leve, para começar. Vamos, beba.
Peguei o copo entre meus dedos e olhei para Ian, que continuava a me encorajar. Levei o copo aos meus lábios e bebi tudo de uma vez. Senti o líquido descer por minha garganta, queimando como o fogo de uma vela.
- O que... é... isso? – Perguntei, tossindo. – Você está tentando me matar, é isso?
- Mas é claro que não. – Ele respondeu, abrindo a garrafa e colocando mais um pouco em meu copo e depois no dele. – Eu devo ter mentindo em algum ponto ao dizer que essa era uma bebidinha de leve. – Ele riu e tomou mais uma dose.
- Não me diga. – Ironizei, dando um soco em seu braço. Podia jurar que meus dedos nunca tinham tocado em uma estrutura tão dura.
- Ai! Isso doeu. – Ele massageou o braço. – Mas devo admitir que foi divertido vê-la tomar uma dose de tequila como se fizesse isso a vida toda.
- Tequila? O que é tequila? É algum tipo de bebida que as pessoas usam pra matar as outras?
- Não, mas é claro que não. – Ele abaixou a cabeça e riu. – Tequila só é uma das bebidas mais fortes. Depois de duas doses, você já começa a agir de uma forma que você nunca agiu antes.
- Eu desisto. – Falei, encostando-me na cadeira e cruzando os braços. – Isso não é para mim. Eu acho melhor eu ir pra casa.
- Então vá. Eu não estou te prendendo aqui. – Ele falou com frieza.
Mordi o lábio, sentindo-me culpada por meu comportamento infantil. Ian estava ali para me ajudar a superar e, por mais que eu odiasse admitir, ele estava conseguindo. A cada segundo que eu passava perto de Ian, eu me distanciava mais de e isso me assustava e me matava por dentro.
Eu tinha uma ligação forte com e a dor que eu sentia dentro do peito era o que a deixava mais forte. Mesmo sentindo essa dor corroer a única coisa viva dentro de mim, eu não queria largar; eu preferia sofrer por a deixá-lo ir para sempre. Mas quem, em seu perfeito juízo, iria escolher sofrer? Eu sei, o amor tem seus tempos difíceis, tempos que até o coração parece não vai suporta. Porém, como todo tempo difícil, ele passa e leva com ele toda a dor e traz uma coisa boa.
era a dor e o sofrimento.
Ian, a esperança.
Seguir um caminho na solidão seria o caminho para uma vida mais fácil, mas não era o que eu queria. Talvez não fosse o escolhido. Talvez a maldição tenha feito parecer que eu o amava, mas, na verdade, ela estava apenas cumprindo ordens. era uma ilusão, uma coisa passageira, alguém que veio apenas para cumprir a sua parte no trato e foi embora.
Oh, Deus, eu havia sido tão burra, pensei, olhando para o copo à minha frente. A resposta final estava em minha frente: eu levantaria, iria para casa e sofreria pelo resto da minha vida agarrada a uma coisa, nem ao menos perto do real, ou tomaria aquela dose, seguida de mais algumas, e viveria a vida que eu sempre quis. Não a mais fácil, mas aquela que eu sonhava desde os dezesseis anos.
Peguei o copo que estava em cima da mesa e o levei à boca, bebendo o conteúdo de uma só vez. Até que não era tão mal e não queimava tanto da segunda vez. Percebi que Ian me olhou, assustado, e deu um sorriso.
E foi aí que eu soube que minha vida nunca seria a mesma. Ela estava mudando e tragicamente.
E, bem, eu estava gostando disso.


Capítulo 27 – New


- Ei, ! – Escutei uma voz ecoar pelo corredor, fazendo com que eu levantasse a cabeça. Olhei para trás e vi correr entre as pessoas até chegar a mim. A aula tinha acabado de terminar, e eu já estava fazendo meu caminho até a saída. – Quase que eu não te pego, menina. – ela começava a recuperar o fôlego. – Onde você esteve nessa última semana?
- Mas é claro que você não me vê, fica todo o tempo com seu namoradinho . – Falei, fazendo voz de criança.
- Você desaparece na hora do intervalo.
- E você me procura? – Perguntei, olhando para ela.
- Mas é claro que procuro, você é minha melhor amiga. Eu sinto falta da minha melhor amiga. Conversar só com o não é a mesma coisa. – Ela abaixou a cabeça. – Às vezes eu quero ir à sua casa, conversar com você, mas você quase nunca está. Você não está por perto nesses últimos dias.
- Desculpe por desaparecer, . Eu estive meio ocupada aproveitando o que a vida tem de melhor. – Falei, passando um braço pelo ombro dela.
Ian tinha me levado por toda a Londres todas as noites pela última semana em cima da sua Harley. Ele até tinha arriscado deixar que eu pilotasse sua moto porque, segundo ele, a adrenalina está no sangue e cabe a você se vai usá-la ou não. Eu tinha provado dessa adrenalina e tinha gostado.
Ian estava fazendo com que, aos poucos, as rochas de anos presa dentro de um castelo com uma vida conservadora, desmoronassem a cada ato não pensado que eu fazia. E eu admito que pensar demais, às vezes, te impede de fazer coisas que você desejava a vida toda.
Eu havia pensado demais a minha vida toda e, muitas das vezes, eu havia pensado na felicidade dos outros em vez da minha. Como em todas as vezes que eu me privava de ir a uma das festas dos guardas dos palácios, pois no outro dia eu iria ficar falada por estar bebendo e conversando com homens mais velhos do que eu e muito mais fortes. Jovens, por todo o globo, faziam esses tipos de coisas, coisas proibidas, mal vistas pela a sociedade, imaturas, imprudentes e que só levariam a todos eles a desgraça total, mas que, ao mesmo tempo, eram coisas divertidas que causavam arrepios na espinha.
Ian havia me ensinado que não havia nada de errado em correr riscos. Que, na vida, se nós não corrêssemos riscos, não estaríamos vivendo, apenas olhando os outros se divertirem enquanto nossa vida passava em frente aos nossos olhos. Eu estava vendo minha vida passar em frente aos meus olhos enquanto estava em Florença vivendo uma vida que eu, obviamente, fui obrigada a aceitar. Ser princesa nunca foi meu plano principal, eu queria ser uma adolescente normal e passar por todas as experiências que fossem necessárias, mas quando você nasce na realeza, a pressão sobre você aumenta.
Florença era uma prisão para mim, mas Londres, minha doce Londres, era o lugar onde uma nova , aquela que eu sempre quis ser, estava nascendo.
- O que a vida tem de melhor? – Ela perguntou, confusa. – Você vai todos os dias ao cinema assistir filmes dos anos 80?
- Não, . – Falei, rindo – Festas, bares, bebidas, música alta, andar pela cidade à noite. – Ela arregalou os olhos. – Você nunca fez isso? – Olhei para ela. – Você já foi à Perdition Street? Se não foi, não sabe o que está perdendo.
- O quê? – Ela me olhou com os olhos mais arregalados, se isso era possível. – Você perdeu o juízo? Perdition Street é o lugar mais perigoso de toda a cidade. As pessoas dali são as mais odiadas por toda a Londres.
- Lá não é tão mau quanto parece, – olhei para ela – a maioria das coisas que acontecem por lá são rumores. – virei-me para ela. – A Rainha odeia aquele lugar porque deixa a cidade “perfeita” – fiz aspas com os dedos – dela parecer normal, como todas as outras.
- Ontem eu vi no jornal que um cara levou um tiro só porque o outro tinha pegado a mesa dele.
- Não, ele não fez isso por causa de uma mesa.
- Oh, não? E fez por causa do quê, então?
- Eu conheço o cara que atirou. Jason só estava cobrando o que o cara não pagou. Não vejo porque fazer um escândalo sobre isso, ele não estava fazendo nada de errado.
- Nada de errado? – Ela perguntou, incrédula. – Você está escutando a si mesma? É uma vida, , você não pode sair por aí tirando a vida das pessoas só porque está “cobrando” – ela fez aspas com as mãos – alguma coisa.
- Se essa pessoa está destinada, eu não vejo nada de errado.
- E você sabe muito bem disso. – Ela zombou.
E, pela primeira vez, desde que eu tinha voltado a Londres, eu senti uma pequena pontada de culpa tomar conta de mim ao apertar levemente meu coração. estava certa, não era certo sair por aí tirando a vida das pessoas por puro capricho. Uma vida é dada para ser tirada na hora certa; quando a vontade divina permitisse, não quando um “traficante” achasse que era o certo.
Por um momento, tudo que eu passei em Florença, semanas atrás, estava passando por entre minha mente como um filme. Aniversário. Beijo. Maldição. Lucy. . Adaga. Eu. Tudo isso estava passando na frente de meus olhos, fazendo com que eu me lembrasse do que eu tinha feito. Eu tinha matado minha irmã, Lucy, com quem dividíamos um quarto até completarmos idade suficiente para ter nossos próprios quartos, aquela que, mesmo assim, ia todas as noites ia dormir comigo. Aquela que ficou comigo quando eu estava com medo da chuva e contou piadas para mim até que eu dormisse.
Lucy, a minha irmã, estava morta. E não, não tinha sido uma morte qualquer, eu a tinha matado.
Abaixei a cabeça, engolindo o seco.
- Eu não quis. – começou.
- Você está certa. – Interrompi-a, levantando a cabeça e olhando para ela. – Uma vida não pode ser tirada apenas porque parecia o certo. Eu deveria saber disso melhor do que ninguém. Eu matei minha irmã porque uma maldição idiota mandou.
- Nem sempre o que parece o certo é o que devemos fazer. – Ela passou o braço por meus ombros, puxando-me para perto. – O que aconteceu não é sua culpa, você tinha que fazer aquilo com Lucy.
- Era eu ou ela. Eu não me arrependo do que eu fiz. Eu apenas não sei o que eu estou sentindo a respeito.
- .
- Não vamos falar sobre isso, por favor. – Olhei com os olhos cheios de súplica. – Eu quero esquecer tudo que aconteceu no passado.
- Até o...
- Olha, – interrompi-a, apontando para frente – o . Vamos até lá? – Ela olhou para frente.
, que estava conversando com alguém que eu não podia ver o rosto, se desencostou do armário e abriu o maior sorriso para ela. O garoto, que estava de costas para a gente, virou seu rosto, o que fez com que o sorriso em meu rosto desaparecesse. Era que estava com e, muito diferente das outras vezes que eu o olhava, eu não sentia nenhuma palpitação ou embrulhos no estômago. Pela primeira vez, eu tinha olhado nos olhos de e não tinha sentindo nada.
Talvez eu estivesse certa. Talvez tenha sido tudo obra da maldição, pensei ao parar em frente a eles.
- Minha gatinha. – falou, abraçando . Isso fez que eu fosse para o lado e ficasse, consequentemente, ao lado de . – Vejo que você conseguiu encontrar a sua melhor amiga perdida.
- Bom ver você também, . – Falei, cruzando os braços.
- Onde você se meteu durante essa última semana? Eu não te vejo desde a última vez que saímos juntos.
- É, eu ando meio ocupada. Eu estava conhecendo Londres com...
- Amor. – Minha fala foi interrompida por Ashley, que me deu um empurrão e fez com que eu fosse para frente e me segurasse. Meu sangue borbulhou dentro de minhas veias e, quando eu estava em pé outra vez, virei-me para ela cerrando meus punhos.
- Qual é a porra do seu problema, garota? Você não olha para onde anda não? – Perguntei, fuzilando-a. Eu sentia minhas mãos coçarem para descer punhos naquele rosto.
- ! – me repreendeu.
- Não, não. Custava essa vadia retardada pedir licença? – Olhei para ela, apontando para Ashley. – Eu sei que ela é desprovida de cérebro, mas custava ter a porra de educação?
- Você olha como você fala comigo, garota. – Ashley falou, soltando-se de .
- Quando você aprender a olhar pra onde você anda, talvez eu até pense no assunto. – Falei, sarcástica.
- Eu posso acabar com você em um minuto.
- Oh, por favor, tente. – Aproximei-me dela. – Eu quero realmente ver você tentar e também quero que faça o seu melhor, porque eu não entro em um jogo para perder.
Comecei a andar em sua direção, fazendo com que ela fosse para trás, até sentir um braço em minha cintura me puxar. Isso fez com que eu me afastasse de Ashley.
- Hora de ir, gatinha. – Escutei a voz de Ian pronunciar enquanto me arrastava pelo corredor.
- Você já perdeu, Gillbard, do mesmo jeito que a sua irmã perdeu! – Escutei-a gritar. Parei de andar e olhei para ela – é meu!
Minhas mãos começaram a coçar freneticamente enquanto eu sentia todo o meu sangue borbulhar por entre minhas veias. Olhei para Ian, que apenas sorriu sussurrando: Faça o seu melhor.
Sorri. Ele estava pensando no mesmo que eu.
Girei meus calcanhares em direção a Ashley outra vez e andei em sua direção em passos largos. Parei em frente a ela e, antes que ela pudesse soltar uma risada sarcástica, minha mão voou com tudo em direção à cara dela, o que fez com que ela caísse no chão. Naquele tapa estavam guardados meses de angústia que aquela garota havia feito com que eu passasse e, de certo modo, anos que Lucy teve que aguentar tendo uma amiga tão falsa.
- Nunca mais fale da minha família outra, sua vadia. – Falei antes de voltar a andar pelo corredor. Ian me aguardava com um braço estendido e segurava o riso enquanto olhava para Ashley, que chorava. Segurei no braço de Ian e deixei que ele me acompanhasse até a saída do colégio.
- Isso foi a melhor coisa que eu já vi você fazer. – Ian falou enquanto andávamos até sua moto. – Eu não sabia que você tinha tanta força, gatinha. – Ele me entregou o capacete.
- Aquele tapa estava guardado há muito tempo. – Respondi ao colocar o capacete. Abracei Ian pela cintura e encostei minha cabeça em suas costas, vendo sair pelos portões do colégio.
Ele parou assim que me viu em cima da garupa da moto de Ian, e eu pude ver seus punhos cerrados. Logo depois, ele chutou a lata de lixo que estava ao seu lado. Seus lábios se moveram e, antes que eu pudesse ver o que vinha depois do ‘‘Por favor, eu...’’, Ian deu a partida, deixando uma dúvida surgir em minha cabeça: O que viria depois do ‘‘Por favor, eu...’’?
Ian me deixou em casa depois de almoçarmos em uma lanchonete no centro da cidade. Já estava escurecendo e isso significava que tínhamos que ir para casa, pois ele tinha que ajudar o técnico antes que o jogo começasse, e eu tinha que me arrumar para ir ao jogo.
Era inevitável que, toda vez que eu chegasse em casa, não sentisse um vazio ao lembrar que não escutaria a voz de minha mãe gritando para pelos quatro ventos: onde eu estava; com quem eu estava e o que estava fazendo. Senhora Scarlet faz falta nessas horas, pensei ao me jogar no sofá. Ele tinha sido meu bom companheiro na última semana, principalmente depois que eu chegava de uma festa com Ian e estava muito cansada para subir e dormir em meu quarto.
Encostei minha cabeça no sofá e fechei os olhos. Muita coisa havia mudado desde que eu cheguei a Londres, não apenas a cidade havia ficado mais bonita e interessante, mas o colégio havia se tornado um lugar até mais divertido. Eu estava mudando também e eu podia sentir isso correr entre minhas veias todas as vezes que eu entrava no colégio e o primeiro sorriso que eu procurava era de um certo ajudante de técnico em vez de um garoto de colegial que havia quebrado meu coração.
Ian, em apenas uma semana que nos conhecemos, fez minha vida valer a pela. Ele fez com que eu passasse por uma mudança que não estava em meus planos e que eu nunca imaginaria que eu passaria em toda a minha vida. Sonhar? Todos os jovens sonham com sua liberdade, mas tê-la? Oh, tê-la era uma coisa muita mais difícil de se fazer. Eu estava tendo a liberdade que todo jovem sonhava em ter, mas, no fundo, algo me dizia que ainda faltava mais alguma coisa, algo que nem todo o álcool e festas do mundo poderiam preencher.
- .
Meus pensamentos foram interrompidos por alguém chamando meu nome. Virei meu rosto para o lado e vi parada no meio da sala.
- Oi, . – Falei, ajeitando-me no sofá. – O que você faz aqui?
- Eu pensei que poderíamos ir ao jogo juntas, mas se você já tem alguém...
- Não, não. – Interrompi-a. – Tudo bem, eu posso ir com você. – Ela abaixou a cabeça.
- ! ! – Falamos as duas ao mesmo tempo.
- Você fala primeiro. – Falei, olhando para ela.
- O que foi aquilo que aconteceu com a Ashley? Digo, por que você bateu nela?
- Eu já estava com vontade de fazer aquilo há um bom tempo. – Respondi, abaixando a cabeça. – Eu sei que ela está certa, , e sei também que não deveria ter batido nela, mas algo dentro de mim fez com que eu batesse nela. Apenas cresceu dentro de mim uma vontade enorme de dar uma lição nela.
- Acredite, – ela se sentou ao meu lado – você não é a única. – Rimos as duas. – Eu fiquei preocupada.
- Por quê?
- Você é uma princesa, . Que tipo de princesa dá um soco em uma garota?
- O tipo de princesa que precisa saber se defender.
- E que tipo de princesa festeja todo dia com o auxiliar do técnico?
- Não são todos os dias e o Ian... – parei de falar. – Como você sabe?
- me falou hoje, – ela começou – depois que você foi embora na garupa da moto do Ian. Alguém não ficou muito feliz com isso.
- O não precisa me proteger, – levantei-me e fui em direção à escada – eu não sou a namorada dele.
- Eu não falei do . – Virei-me para ela. – ficou furioso quando viu você na garupa de Ian. Ele disse que Ian não era o tipo de cara com que você deveria andar.
- E com quem eu deveria andar? Com ele e a namorada dele sem cérebro? – Recomecei a subir as escadas. – A mesma que ele disse nunca ia conseguir ficar com ele naquele dia do refeitório?
- Você ainda lembra?
- Mas é claro que eu lembro, . – Respondi ao entrar em meu quarto. – Ele me chamou para ir ao parque naquele dia. – Continuei, tirando meus sapatos. – Ele me beijou na roda-gigante e disse coisas lindas que eu nunca imaginaria que alguém pudesse dizer a uma pessoa. – Tirei minha blusa. – E, no dia seguinte, ele descobriu a verdade, toda a verdade sobre mim, e não foi embora. Muito pelo contrário, ele ficou e disse que não me deixaria ir. – Tirei minhas calças e virei-me para ela. – Pode ter sido mentira, uma paixão passageira ou coisa assim do tipo, mas eu acreditei em cada palavra que saiu da boca dele desde que eu o conheci. Eu o amava, , e, por um momento, eu achei que ele me amava também.
- E quem disse que ele ainda não te ama?
- Se ele me amasse, ele não estaria com a Ashley nesse momento.
- Não é porque vocês não estão juntos não quer dizer que não é amor.
- E quem te disse que eu ainda amo ? – Ela arregalou os olhos.
- Mas vocês dois...
- Foi passageiro, . Pode até ter sido obra da maldição.
- Você tem certeza?
- A única certeza que eu tenho é que eu não tenho mais sentimentos por . morreu pra mim. – Falei, respirando fundo. – É melhor eu ir tomar banho, senão vamos chegar atrasadas ao jogo.
- E o Ian não ia gostar nada disso. – Ela zombou.
- Você está zombando de mim?
- Talvez sim, talvez não. Quem sabe? – Ela se sentou na cama e agarrou um travesseiro. – Ian, meu amor. Oh, Ian. – Ela abraçava o travesseiro, fazendo caras e bocas.
- O que você está fazendo?
- Estou imitando você e o Ian. – Ela jogou o travesseiro em mim, e eu o peguei. – Falando em Ian, o que está rolando entre vocês?
- Nada, . Somos só amigos que saem juntos.
- Vocês já se beijaram?
- Não, mas é claro que não. Nós somos amigos, eu já disse.
- Ele que te leva nas festas?
- Ele tem muitos amigos por Londres, muitos amigos que gostam de festa. – Encostei-me à porta do banheiro. – Ele não é tão mau como as pessoas dizem que ele é.
- Espero que você esteja certa. – Ela me olhou, preocupada. – Agora, vai tomar banho, senão seu amado Ian vai vir te buscar na sua moto encantada.
- Idiota! – Joguei o travesseiro nela.

Capítulo 28 – Who Knew


Nós havíamos ganhado. Não que alguém esperasse que nós perdêssemos o jogo da década, mas ainda havia aqueles que tinham suas dúvidas. Havia sido um jogo duro, cheio de emoções e reviravoltas, mas no final o trabalho do treinador e do seu auxiliar havia dado um grande resultado. A escola inteira havia se juntado para assistir a grande partida entre os Lions e Sharks no campo da nossa escola à noite. Seria o jogo que marcaria o desempate entre os dois times rivais desde... Bem, desde que o fogo foi criado.
tinha ficado em minha casa durante toda à tarde onde nós conversamos, brincamos, contamos as novidades uma para outra, coisas que não fazíamos há algum tempo, pois, segundo ela, eu estava muito ocupada caindo nos encantos de Ian. E desde que eu havia chegado a Londres pela segunda vez, eu senti a grande falta que me fazia. Ela era única que eu sentia confiança para contar tudo, desde coisas mais alegres até minhas angústias. Ela era a minha verdadeira confidente para todas as horas e tudo isso me fez pensar em como com Ian isso nunca acontecia. Ou estávamos ocupados apostando quem bebia mais ou estávamos zoando com algum bêbado no meio da rua.
Não que não gostasse de sair com Ian, eu gostava muito, na verdade, mas não era mesma coisa quando eu estava com . E, com certeza, não era a mesma coisa quando eu estava com .
.
. Por que tudo que eu faço nessa droga de vida tem que voltar para ? Ele era como um pequeno carma que me perseguia em cada canto que eu ia. Era esse maldito nome que estavam desde outdoors até nos personagens dos filmes que passavam na televisão.
Não houve um minuto quando estava falando de que eu não me lembrasse dele e sentisse um aperto no meu coração, além de uma enorme vontade de tê-lo perto outra vez. Eu não podia negar que me fazia falta e, de vez em quando, eu dava um sorriso bobo ao me lembrar de todos os momentos que passamos juntos, o que fazia me questionar: Como um amor daquele tamanho poderia acabar de maneira tão banal? Ele teve várias oportunidades de me deixar, e eu até preferia que ele o tivesse feito, mas não. Pelo contrário, ele havia ficado ao meu lado em todas elas, fazendo meu coração criar tantas expectativas e planos mirabolantes para um futuro juntos.
Ele poderia ter fugido no dia em que descobriu sobre a maldição que eu carregava, ou poderia ter ido embora ao dia em que eu perdi a memória. Mas ele não havia feito. E isso só fez com que meu coração inchasse ainda mais pedindo por cada abraço e todos os beijos dele.
Por um breve momento, foi como se Ian nunca tivesse existido e fosse a única companhia que eu pedisse e clamasse pelo resto dos meus dias. Quando ele entrou no campo, liderando o time pelo qual ele dava o seu melhor, eu tive a certeza de que eu poderia ficar ali sentada, observando-o, que melhor visão no mundo eu não teria. Meu coração começou a bater mais rápido dentro do peito, fazendo com que eu jurasse que eu iria desmaiar ali mesmo. Parecia que eu estava vendo pela primeira vez e, mesmo sem conhecê-lo, meu coração sabia que ele seria o escolhido. O que me lembrava de perguntar o que viria depois daquele Por favor, eu....
Por favor, eu te odeio.
Por favor, eu nunca mais quero te ver.
E a última possibilidade, que eu me negava a cogitar: Por favor, eu te amo e preciso de você mais do que nunca.
As borboletas em meu estômago entraram em frenesi quando, em seu último gol pelo time, um sorriso habitou os lábios de , o que me fez lembrar de quantas vezes aquele sorriso já foi meu. Só que aquilo não durou muito, pois, logo, sua namorada – a qual eu gosto de chamar de vadia de sorte – pulou em seu pescoço dando-lhe um beijo. O beijo que deveria ter sido meu.
Após o término do jogo, todos se dirigiram para a famosa festa na casa de Jason. Ian e iam conversando animadamente sobre cada gol e cada passe bem dado dos jogadores da nossa escola. Ian tentava disfarçar, mas eu sabia que ele estava orgulhoso de por ter feito ótimo trabalho ao orientar nosso time da maneira que nem ele e o técnico juntos fariam.
Ian admirava e isso fazia com que minhas mãos suassem enquanto eu segurava uma garrafa de cerveja. Até Ian, aquele que tinha afastado de todos os pensamentos de , me levava de volta para ele, mesmo sem querer.
Eu sabia que Ian evitava conversar comigo sobre o time de futebol do colégio e, principalmente sobre , porém o que ele podia fazer se aquele time era o que dava orgulho para ele nos dias de hoje? Ian estava tendo uma coisa verdadeira pela primeira vez em sua vida, e eu entendia que ele sentia orgulho dela e, por isso, eu não falava nada enquanto ele se gloriava do quanto seu time era bom na cadeira ao meu lado.
Olhei uma última vez para Ian enquanto ele falava animadamente com alguns garotos do time de futebol sobre cada jogada bem feita. Levantei-me da cadeira e saí andando entre as pessoas. Alguns já estavam bêbados, outros conversavam alto por causa da música e outros, como e , estavam aproveitando um tempo para os dois.
Coisa que eu e deveríamos estar fazendo, pensei ao me sentar em um banco no quintal da casa de Jason.
O jardim era amplo e um pouco exagerado. Havia uma piscina do lado direito e um pouco atrás uma fonte e o banco onde eu estava sentada. Eu não estava muito em clima de festas. Na verdade, havia me arrastado para essa festa dando a desculpa de que Ian não podia ficar sozinho em um dia como esses, pois, como ela mesma disse, esse dia marcaria a vida dele e o começo da carreira dele para sempre.
- Não só para ele. – falei, rindo sem humor e tomando um gole da minha cerveja.
- Falando sozinha?
Engasguei com a cerveja ao olhar para frente. estava em pé, parado, com os braços cruzados daquele jeito que só ele sabia fazer. E com um sorriso no rosto, que deixava minhas pernas bambas mesmo estando sentada.
- Antes falar sozinha, do que mal acompanhada.
- Ouch! – ele descruzou os braços e colocou as mãos nos bolsos – Senti a indireta. – ele deu um sorriso antes de virar-se de costas para mim. Soltei o ar pela boca e me levantei.
- , espere. – falei, antes de colocar minha cerveja em cima do banco. Ele parou, ainda de costas para mim, e abaixou a cabeça. Mordi o lábio inferior e fechei os olhos. Burra, mil vezes burra, pensei. – Desculpe.
- Por que todas as vezes que a gente conversa, de alguma forma, você está se desculpando? – ele perguntou ao se virar para mim.
- Deve ser porque eu estou sempre pisando na bola quando o assunto é você. – arregalei os olhos ao perceber o que eu havia falado – Desculpe.
- Não, tudo bem.
- Não, , me desculpe. De verdade.
- E por que você está pedindo desculpas agora?
- Por tudo. – suspirei, soltando o ar de meus pulmões – Por ter entrado na sua vida e atrapalhado tudo que você construiu. Porque, desde que eu entrei na sua vida, tudo virou uma bagunça. Você quase foi expulso do time de futebol, não só uma, mas duas vezes. Por você ter passado tudo aquilo quando foi à Florença, quase ser morto pela louca da minha irmã e pela sua capanga, além de ter sido sequestrado e maltratado. Oh, Deus, eu sou a pior pessoa do mundo por fazer você passar tudo isso. – abaixei a cabeça, mas a levantei novamente em seguida – E eu também quero pedir desculpas por Lucy e tudo que ela fez você passar, principalmente aquela estúpida história de querer te matar e ressuscitar depois para viver com ela. E, por último, por ter atrapalhado seu caminho até a garota que você gosta.
- Do que você está falando?
- De toda a confusão que você armou com a Ashley por minha culpa.
- E por que isso seria sua culpa?
- , seu estúpido, porque a minha maldição fez com que o destino pregasse uma peça em nós dois e te fez pensar que você me amava quando, na verdade, você sempre amou a Ashley.
- Que ideia é essa, ?
- Você não vê, ? Se minha maldição não tivesse me mandado para cá, sua vida seria muito melhor. Admita, , sem a minha presença aqui, sua vida seria muito mais fácil e todos os seus sonhos iriam se realizar.
- Sua maldição pode ter feito muitas coisas, mas o que eu sinto aqui dentro toda vez que eu olho para você não tem nada haver com essa maldição estúpida.
- Do que você está falando?
- Ouça o que eu estou falando. Eu estou falando que eu amo você. – ele respondeu, aproximando-se enquanto eu estava estática em meu lugar. Eu olhava para ele como se ele tivesse falando em outra língua – Sim, minha vida mudou, e eu poderia ter tipo uma vida normal se você nunca tivesse aparecido, mas quem merece uma vida monótona e chata quando se pode lutar contra vadias malvadas que querem acabar com o amor de sua vida? Eu poderia ter feito muitas coisas, fugido, esquecido, te deixado de lado e, até mesmo, te mandado colocar no manicômio, mas eu não o fiz e você sabe por quê? Porque essa maldição pode ter trazido o maior sofrimento e perturbado minha mente, mas, no final, ela me trouxe você e isso é o que realmente importa. Porque mesmo nós estando separados, você é a única que faz bater meu coração rápido como um carro em uma corrida. – ele segurou minha mão e colocou em cima de seu peito – Você sente? Ele só bate assim quando você está por perto, – ele passou um braço pela minha cintura e me puxou mais para perto, ao mesmo tempo em que eu olhava para seus olhos – e você pode até não me amar da maneira que eu te amo, mas nada vai me fazer negar o jeito que você me faz sentir. – ele segurou meu rosto com sua outra mão – Nada vai me fazer negar o quanto eu sinto o falta do seu cheiro. – seu rosto se aproximou do meu, o que fez com que nossos narizes se tocassem, enquanto sua mão descia do meu rosto pelo meu pescoço afastando meu cabelo para o lado. Antes que eu pudesse falar algo, seus lábios estavam beijando lentamente toda a extensão do meu pescoço. – Como eu sinto falta do seu corpo assim, colado no meu. – me puxou pela cintura, colando nossos corpos. Seus olhos continuavam viciantes, mas algo neles naquele momento chamava minha atenção e não era só o brilho que eles já tinham. Oh, não, havia algo de diferente neles, algo que deixava meu corpo mole e formigando da cabeça aos pés. Algo que parecia suplicar, como se eles pedissem para que meu rosto nunca saísse de sua vista, a cada dia que passasse pelo resto da minha vida – E, principalmente, de como eu tenho inveja de um dos meus amigos por poder te ter por perto todos os dias, vinte e quatro horas por dia. – ele sussurrou em meu ouvido antes de tirar o rosto da curva de meu pescoço.
Seus olhos estavam na altura dos meus e a mão que estava em meu pescoço desceu de encontro à outra que estava em minha cintura, segurando-a firme. Seu nariz tocou o meu, e eu pude sentir sua respiração quente bater em meu rosto. Não pude evitar morder meu lábio inferior ao ver sua boca a centímetros da minha, fazendo o desejo de tê-la sobre a mesma aumentasse.
Talvez eu estivesse errada sobre tudo. Talvez tudo que eu tinha vivido desde que voltara à Londres tivesse sido apenas uma ilusão para me afastar do verdadeiro porque Londres era minha cidade favorita desde que eu fui obrigada a vir morar com minha mãe. E, não, não seria por causa do Big Ben ou da amizade da Rainha com meu pai ou das festas que eu havia frequentado por toda a cidade. A minha volta à Londres tinha um motivo muito maior e só agora eu tinha percebido que um certo londrino tinha acendido a chama do amor de uma italiana como nunca alguém tinha feito antes e todas aquelas dúvidas haviam sido uma simples dor de cotovelo e burrice temporária.
Não que eu não gostasse de Ian. Oh, não, Ian é um dos seres humanos mais incríveis que eu conheci em minha vida e tinha feito com que eu me soltasse e aproveitasse um pouco mais a minha juventude como todo adolescente deveria fazer, mas não era por ele que meu coração batia demasiado.
Senti o rosto de aproximar-se mais do meu, o que fez com que sua boca tocasse a minha levemente, provocando-me. Pude ver, então, um sorriso sapeca brotar em seus lábios. Coloquei-me nas pontas dos pés, fazendo com que nossas bocas se juntassem em um selinho, e segurei seu rosto com minhas mãos ao sentir sua língua passar por entre meus lábios pedindo passagem e, sem ao mínimo pensar, eu dei. E eu toquei o paraíso quando sua língua tocou a minha e explorou cada canto da minha boca do mesmo modo que fazia antes.
Havia saudade naquele beijo, aquela que pensei só eu sentia por todo esse tempo, e a mesma que nem eu sabia que ainda existia dentro. Entretanto, com , era sempre assim. Quando eu pensava que estava começando a viver minha vida sem ele, seus lábios vinham me mostrar que era muito pelo contrário. nunca sairia de minha vida e muito menos de dentro do meu coração. Ele corria dentro de minhas veias como um pequeno veneno fazendo com que meu sangue borbulhasse e um calor insuportável habitasse meu corpo. Mesmo que eu negasse, fugisse ou até mesmo sentisse uma pequena atração por alguém, no fim do dia, era ele. No meio da noite, era ele que invadia meus sonhos e me mostrava o quanto eu ainda o amava.
Amá-lo não era uma tarefa fácil, mas quem disse que isso realmente seria amor sem nenhum obstáculo?
Senti suas mãos invadirem minha blusa e tocarem a pele gélida das minhas costas, o que fez os pelos de todo o meu corpo levantarem-se. Suas mesmas mãos deslizaram por minha cintura, fazendo seus braços rodearem minha cintura por debaixo da blusa. Seus lábios se movimentavam com certo desespero sobre os meus explorando cada pedaço deles, enquanto nossas línguas brigavam dentro de nossas bocas e faziam com que eu agarrasse o cabelo de sua nunca. O desejo aumentava dentro de mim e não era qualquer desejo. Oh, não, era um novo desejo, um que fazia que eu quisesse que nossas roupas não tivessem onde estavam, um que fazia com que eu imaginasse suas mãos explorando por todo o meu corpo. Era um fogo que eu que subia e descia na velocidade em que meus batimentos cardíacos batiam dentro do meu peito. Oh, aquele desejo que uma garota sentia quando sabia que estava preparada para entregar-se a alguém por inteiro, mesmo quando havia prometido que nunca o faria.
despertava esse desejo em mim, mesmo que eu não quisesse.
Antes que eu pudesse perder a minha total insanidade, uma pequena voz ecoou na minha cabeça, e eu podia jurar que era a voz da minha consciência. Mas, outra vez, a voz ecoou. Pude perceber que aquela voz era muito fina e irritante para ser a da minha consciência.
Era Ashley, e ela estava gritando por .
pareceu perceber o mesmo que eu e como havia começado terminou.
- Esconda-se atrás da arvore. – ele disse, segurando meus ombros e me olhando apreensivo.
- Eu não vou fazer isso. – falei, olhando para ele e negando com a cabeça.
- Por favor, , vai logo. – ele começou a me empurrar em direção à árvore que ficava ao lado da fonte.
- ! – falei, andando em direção à árvore e parei ao lado da mesma – Tudo bem, – falei, soltando-me dele – eu fico aqui atrás.
- Obrigado. – ele falou, sorrindo. Seu rosto se aproximou dos meus e seus lábios tocaram levemente nos meus.
Sorri boba ao vê-lo se afastar e me escondi atrás da árvore vendo Ashley se jogar em seus braços e beijá-lo da mesma maneira que eu havia feito antes. Senti a raiva tomar contar de meu corpo e uma vontade enorme de arrancá-la do lugar que era meu por direito. No entanto, eu percebi o quanto eu não poderia ficar chateada, nem mesmo por um segundo, pois ele não era meu namorando.
Oh, não, desde que eu havia voltado a Londres, havia me ignorado. Muitas vezes ele passava pelos corredores com Ashley ao seu lado, e eu podia perceber que a volta que o braço dele dava em sua cintura apertava um pouco mais. E foi quando eu olhei para frente e vi aquelas palavrinhas, aquelas mágicas palavrinhas que acalmavam o coração aflito de qualquer garota, saírem da sua boca e elas não eram ditas para mim. Eu te amo também, Ashley . Essas seguintes palavras atravessaram meu coração levemente à medida que eram ditas por sua boca.
No fim das contas, Ian não estava errado. Ele havia me dito que não passava apenas de mais um capitão do time de futebol que brincava com a novata para mostrar seu poder enquanto pegava a garota mais popular do colégio. Foi aí que ficha caiu, e eu percebi que o que aconteceu entre e eu havia terminado. Simples assim. Porque, mesmo que eu não quisesse admitir, ele havia dito para ela as mesmas palavras que disse a mim minutos antes.
Senti uma lágrima descer por meu rosto, e eu tratei logo de limpá-la com a mão. Eu não iria chorar por alguém que não valia a pena e não se importava comigo. Então, aquele fiapo de esperança, que dizia que tudo na vida não era mentira, apareceu junto com a voz de Ian chamando meu nome alguns metros de onde o “Casal 20” estava parado. Ele segurava duas cervejas e estava com o rosto aflito. Pude ver seus lábios se moverem dizendo: , sua anta, cadê você? Um sorriso habitou meu rosto e, antes que eu pudesse perceber, eu estava jogando meus braços em volta do seu pescoço, fazendo as cervejas caíssem no chão, e meus lábios estavam sobre os dele em um selinho demorado.
- Pensei que você tivesse dito que éramos apenas amigos. – ele falou depois de um tempo segurando levemente minha cintura.
- Desculpe. – sussurrei, tirando os braços de seu pescoço. Ele apertou mais os que estavam em minha cintura.
- Eu não disse que eu não gostei. – ele me deu um selinho mais demorado – Vamos sair daqui?
- Vamos! – respondi. Segurei sua mão e me deixei ser levada por ele.


Capítulo 29 – Wrong


E antes que eu pudesse pensar em agir, eu estava na maior enrascada da minha vida e nem ao menos sabia disso.
Ian havia me arrastado por toda a festa até chegarmos à rua onde seus amigos estavam – dentro de um carro estacionado no meio da pista. Olhei para ele e vi o que seus olhos diziam. Eles diziam para que eu fosse com ele, para algum lugar ao qual eu só saberia o destino na hora em que o carro parasse e todos saíssem gritando e rindo como se fosse uma grande piada. Mesmo sabendo que esse lugar poderia me trazer grandes problemas, eu fui sem nem ao menos olhar para trás. Ou melhor, olhando para trás e vendo a última imagem que eu gostaria de ver.
Lá estava ele. Nos braços dela. Encostado em alguma coluna enquanto ela conversava com uma amiga patricinha sem cérebro sobre algum assunto avulso e sem importância. Pude ver que, no exato momento em que Ian pegou em minha mão e me arrastou para o carro, seu olhar se encontrou com o meu. A dor era transmitida através deles e fez com que meu coração apertasse dentro do peito.
Ian me pegou pela cintura e me colocou no banco de trás do conversível junto com as namoradas dos amigos dele e logo se pôs ao meu lado. Nós dirigimos pela cidade por quase meia hora. O som estava alto e a vodca que Carl, amigo de Ian, tinha trazido já estava acabando quando ele avisou que já estávamos chegando ao nosso destino. Ian e nem as meninas que estavam ao meu lado me respondiam sobre onde estávamos indo, eles apenas riam e Ian soltava: “É uma surpresa, você vai gostar” e me beijava ardentemente. Um sentimento dentro de mim dizia para que eu pegasse o primeiro táxi que visse na rua e fosse embora sem nem ao menos olhar para trás. Mas meu coração dizia e repetia inúmeras vezes que Ian nunca deixaria que nada de mal acontecesse comigo porque, afinal de contas, estávamos juntos. Certo?
Paramos em uma rua totalmente escura e desconhecida para mim. Os amigos de Ian desceram do carro e começaram a correr no meio da rua, até que um deles chutou uma lata de lixo, fazendo o mesmo se espalhar. Arregalei os olhos, assustada, e Ian segurou em minha mão murmurando um “Vai ficar tudo bem” enquanto saía do carro e estendia a mão para que eu descesse também. Ele me levou pela rua vazia até que todos pararam em frente a uma loja e olhou para seus amigos. Antes que eu pudesse pensar, escutei um estalo alto e a porta da frente se abrir. Um a um, os amigos de Ian entraram, mas quando Ian me puxou em direção à loja, eu o puxei de volta. Eles iam fazer isso mesmo que estava pensando?
- Ian, o que você está fazendo? O que vocês estão fazendo? – perguntei, apontando para a loja.
- O que parece que estamos fazendo? – ele perguntou, olhando para mim e abrindo os braços.
- Roubando uma loja.
- Pensei que você ia dizer fazendo comprar na madrugada. – ele tomou mais um gole da garrafa de vodca que ele tinha na mão.
- Você não acha que isso é errado?
- Relaxa, gata, essa loja é da mãe de uma das meninas e a gente sempre faz isso.
- Vocês saem por aí roubando lojas? – perguntei pasma.
- Roubando não, pegando emprestado e nunca devolvendo.
- Isso é errado, Ian. Vamos para casa. – eu o puxei em direção à rua – Eu te levo para casa.
- Não vou para casa até o dia amanhecer. E nem você. – ele me pegou no colo e me levou para dentro da loja. Era um grande departamento de roupas femininas e masculinas. Sua extensão era tão grande que eu não conseguia nem ver o final da loja, só o que era iluminado por pequenos flashes se luzes que vinham da vitrine. As meninas experimentavam roupas enquanto alguns rapazes faziam guerra com tacos de sinuca.
- Ian, me coloca no chão. – falei, olhando para ele.
- Não, lindinha, você pode escapar de mim e nenhum de nós quer que isso aconteça. – ele olhou para mim – Eu pensei que você estava disposta a se divertir e experimentar coisas novas.
- Estava. Quero dizer, estou, mas isso é totalmente ilegal.
- Claro que não. – ele me colocou em cima de um balcão onde algumas joias estavam espalhadas – Nós não roubamos coisas, . – ele começou se colocar entre minhas pernas.
- Não, – cruzei os braços e olhei para ele – então me diga o que vocês fazem.
- Nós apenas a provamos e colocamos de volta. Depois de tirar algumas fotos, é claro. – ele pegou um colar em cima do balcão e colocou em meu pescoço.
- Isso é errado, Ian.
- Claro que não. – ele falou, passando os braços por minha cintura – Só somos amigos querendo se divertir.
- Às custas dos outros, não é? – falei, olhando para ele.
- Pimenta nos olhos dos outros, para mim, é refresco. – ele falou, fazendo-me rir.
Ian me puxou mais para perto. Ele aproximou o rosto do meu, o que fez com que nossos narizes se tocassem. Sorri antes de sentir seus lábios capturarem os meus e dar início a um beijo. Sua língua brincou com a minha enquanto suas mãos apertavam a minha cintura, e eu cruzei minhas pernas em sua cintura, puxando-o mais para perto.
Passei meus dedos sobre seus cabelos e os puxei de leve ao mesmo tempo em que as mãos de Ian apertavam minhas coxas de leve. Meu corpo todo estava queimando, e eu achava isso o mais errado dos pecados, não porque eu estava sentindo desejo, mas porque não era em Ian que eu estava pensando, e sim em .
Cada milímetro do meu corpo queria que fosse no lugar de Ian. Minha mente, por um momento, pregou uma peça em mim porque cheguei a abrir os olhos e ver a imagem de , o que fez com que eu empurrasse Ian para longe.
- Desculpe, Ian, eu... – e antes que eu pudesse terminar de falar, Ian veio com tudo para cima de mim.
Ele calou minha boca com um beijo fervoroso que praticamente machucaram meus lábios com tanta intensidade. Suas mãos apertaram forte minhas coxas antes de subirem por dentro da minha blusa. Eu estava sem palavras e sem ação. Tudo havia acontecido tão rápido que, quando percebi, as mãos de Ian já estavam em meu sutiã e meu corpo sendo inclinado por cima do balcão.
- Ian. – falei quando seus lábios desceram por meu pescoço – Ian, por favor, para. – falei, tentando empurrá-lo para longe.
- Calma, linda, prometa que não vou te machucar. – senti seus lábios morderem de leve meu pescoço.
- Ian, para. Eu não quero.
- Muitas não querem no começo. – ele disse, como se não fosse nada de mais. Arregalei os olhos e juntei todas as forças que eu não tinha para empurrá-lo para longe. Para a minha má sorte, deixou uma marca de dentes em meu pescoço.
Desci do balcão e, quando Ian tentou se aproximar mais uma vez de mim, meu punho voou automaticamente em seu rosto, fazendo com que ele caísse no meio de algumas roupas. Corri para fora da loja e tive a pior surpresa da minha vida.
Oh, não. Eu estava muito encrencada.
- Senhorita, você tem o direito de ficar calada e tudo que você fizer ou falar pode ser usado contra você.
Para piorar aquele dia, aqui estava eu, sentada em uma sala de interrogação esperando que Alfred viesse me buscar, apenas imaginando que o caminho para casa seria longo. Meus ouvidos, provavelmente, iriam sangrar de tanto que Alfred iria falar. A frase preferida que ele diria até o fim da minha vida seria: “Eu te disse.”
Eu nunca acreditei de verdade nessa história de maldição. Só quando eu a vi se realizar na frente dos meus olhos quando eu ainda era uma adolescente meio irracional que não acreditava numa história em que os pais contavam para os filhos quando temiam que eles escapassem de casa à noite. Mas, no meu aniversário de quinze anos, o conde de Liberting me convidou para o lago fora do castelo para que nós pudéssemos finalmente dar o nosso primeiro beijo à meia noite. No instante em que a décima segunda balada soou, eu vi a história se concretizar diante de meus olhos. E eu me lembro que eu nunca corri tanto em minha vida.
O conde Liberting saiu apenas com um arranhão em uma das coxas, mas eu saí com o meu primeiro coração partido. O conde não gostava de mim de verdade e, quando escutou a história sobre a minha vida contada pelo meu pai junto com o apelo que ele ficasse calado ou sairia de seu posto, ele apenas acenou e disse que não gostava assim de mim. Eu nunca tinha chorado tanto na minha vida, mas mesmo assim, no fim, ainda tive um final feliz, pois duas horas depois John já estava me fazendo rir enquanto dançávamos ao som de (I've Had) The Time of My Life e ele se declarava para mim. Um dos piores dias da minha vida tinha sido um dos mais divertidos e emocionantes.
Mesmo sem acreditar, havia sido isso que eu acreditava que iam acontecer. Eu iria achar alguém que curasse meu coração como John fez, como eu achava que Ian estava fazendo. Mas eu não esperava era que o príncipe moderno, que vinha acompanhado de uma Harley, iria se transformar em uma sapo, como Lucy sempre dizia que Liberting iria fazer.
Lucy fazia falta, agora mais do que nunca. Se ela estivesse aqui, teria me ajudado a não cair nas garras de um cara como Ian. Lucy era a única pessoa que sentia o faro de gente falsa, antes mesmo que ela lhe dirigisse a palavra. Tantas foram as vezes em que ela tinha me salvado de tantas enrascadas com garotas da corte que queriam casar-se com papai. Lucy foi a melhor a irmã que já tive, mesmo quando ela havia virado uma vadia sem coração. Uma voz dentro de mim dizia que ela ainda estava comigo, não como um espírito que iria me perseguir até o meu túmulo, mas dentro do meu coração, como ela sempre esteve. Essa mesma voz me lembrava que Lucy tinha morrido para que eu sobrevivesse, para que eu pudesse ter a vida normal que sempre sonhei quando assistia àqueles filmes americanos. E a única coisa que eu estava fazendo era jogando isso fora e começado a me tornar uma vadia pior que Lucy.
- Oh, não, o que fiz com minha vida? – falei, abaixando a cabeça.
- Não sei o que você fez, menina, – o policial que estava me interrogando entrou na sala, fazendo com que eu pulasse da cadeira – mas sei que você tem amigos muito poderosos. Você pode ir.
- Sério? – perguntei, surpresa – Digo, não tenho que passar a noite aqui porque roubei esse colar?
- Então você está admitindo que roubou esse colar esse colar?
- Não foi o senhor que disse que tudo estava contra mim? Eu estou com o colar, estava no lugar do crime e fui pega em flagrante. – comecei a contar nos dedos.
- É, mas, à as vezes, mesmo na polícia, muitas coisas não são como parecem. – ele falou, sentando-se na cadeira à minha frente – Tem certeza de que não quer falar o nome dos garotos que estavam com você?
- Já lhe disse que não sei o nome de nenhum. Eu tinha acabado de conhecê-los e também, de onde venho, as pessoas não costumam ser dedos duros.
- Sei que você não é a má pessoa, menina. Você apenas se meteu com as pessoas erradas. – ele apoiou suas mãos na mesa e se levantou. Finalmente pude ver o nome em seu crachá: “Agente Smith”.
- Eu sei disso agora. – falei, levantando-me também – Eu apenas me deixei levar por aquela curiosidade que todo adolescente tem.
- A curiosidade que todo jovem tem por aquilo que, para ele, foi contado como perigoso. – ele falou, abrindo a porta.
- Como o senhor sabe? – perguntei, andando até a mesma.
- Eu já fui jovem e já quis provar do desconhecido também. – vi-o sorrir, fazendo com que eu sorrisse também.
- Desculpe. – falei quando passei pela porta e me virei para ele.
- Pelo quê? – ele perguntou surpreso, fechando a porta.
- Por ter causado tanto transtorno. Se não for incômodo, o senhor poderia dizer à dona da loja que sinto muito e que tentarei recompensá-la de alguma forma?
- Avisarei, princesa. – ele disse, fazendo reverência.
- O que o senhor disse? – perguntei, virando-me para ele com os olhos arregalados.
- A Rainha manda lembranças ao seu pai.
- Mas...
- ! – fui interrompida pelos braços de Mel me esmagando em um abraço – Fiquei tão preocupada com você!
- Mel, o que você está fazendo aqui? – falei, abraçando-a de volta – Você deveria estar de folga!
- Eu sei, mas me ligou e disse que você estava na cadeia. Tive que vir correndo te resgatar. – Mel me soltou e me segurou pelos ombros – O que você estava pensando? Você não acha que seu pai não tem dinheiro para comprar milhões de colares para você?
- Desculpe, Mel, eu não sabia o que estava fazendo.
- Com certeza não, mas Ian sabia.
Levantei meu olhar e vi em pé ao lado de Alfred, com os braços cruzados. O ar faltou em meus pulmões, e eu prendi minha respiração ao ver que, a alguns metros de mim, ele estava com a mesma roupa da noite interior. O que me lembrava o momento em que seus braços estavam ao redor de mim, fazendo com que eu desfalecesse aos poucos. Mas, logo em seguida, veio a imagem dele e sua namorada, além das palavras – que deveriam ser ditas para mim –saindo de sua boca, o que fez com que a raiva borbulhassem em minhas veias.
- O que você está fazendo aqui? – perguntei ao me afastar de Mel e andar em sua direção – Você não tem outro lugar para estar? Tipo, a casa da sua namorada? – perguntei, cruzando os braços.
- Só vim ter certeza de que você não iria fazer mais nenhuma besteira. ficou preocupada, mas não pôde vir.
- Então você veio no lugar dela, porque você é um ótimo amigo. – disse, sarcástica.
- Eu me preocupo com meus amigos.
- Que bom saber disso. – debochei – Então, já que você se importa tanto assim, que tal levar Alfred e Mel para casa?
- Com todo prazer.
- Ótimo, então. – falei, descruzando os braços. Desviei dele e comecei a andar em direção à saída.
- Ei, aonde você pensa que você vai? – ele falou, segurando em meu braço, o que me fez virar para ele. Olhei para sua mão e senti um arrepio subir por minha espinha e o lugar em que sua mão estava queimar levemente.
- Tenho que resolver uma coisa.
- Você vai se encontrar com Ian, não é? – ele falou, com um olhar indignado.
- O que eu faço da minha vida não é do seu interesse. – respondi com os dentes trincados.
- O cara te coloca na cadeia e você vai atrás dele? Que tipo de idiota é você?
- Do tipo que resolve os próprios problemas.
- Você vai fazer o quê? – ele soltou meu braço de uma vez – Bater nele que nem fez com a Ashley?
- O que eu faço ou deixo de fazer não é da sua conta, .
- Creio que tenho que lhe decepcionar dessa vez. O que você faz sempre foi e sempre será da minha conta. – ele me pegou pela cintura e, em um movimento rápido, estava me carregando para fora da delegacia comigo em seus braços.
- , me larga. – falei, batendo em seu peito. Nunca um lugar pareceu tão certo e tão reconfortante como nos braços de . E eu não me lembrava porque eu estava mandando que ele me soltasse, pois, provavelmente, aquilo era a última coisa que eu queria fazer – , por favor. – supliquei, sentindo o seu perfume invadir minhas narinas.
- Não, , eu não me sacrifiquei tanto para você estragar sua vida. – ele falou enquanto empurrava a porta com as costas para que ele passasse comigo.
- , cuidado com ela. – Mel disse ao passar em nossa frente e correndo em direção ao carro – Ela é muito frágil.
- Frágil como uma rosa, – ele olhou para mim – e perigosa também.
Olhei para ele e não pude segurar o sorriso em meu rosto. Logo depois, um habitou o seu também. Escondi meu rosto na curva de seu pescoço sentindo o seu cheiro, aquela mistura de perfume masculino com um shampoo de lavanda que, provavelmente, tinha sido comprado por sua mãe. Abracei-o mais, fazendo com que meu rosto levantasse um pouco e meus lábios roçarem no seu pescoço, o que fez com que ele se arrepiasse. Não sei ao certo como aconteceu, mas percebi que minha boca abriu-se automaticamente e meus dentes perderam um pedaço de seu pescoço. Senti sua mão em minha cintura apertar-se mais um pouco, e, antes que eu pudesse continuar explorando aquele pescoço tão chamativo, me colocou dentro do carro e fechou a porta na minha cara. Mel e Alfred já estavam no carro e Alfred deu a partida enquanto Mel falava:
- Quando seu pai souber, ele vai ficar tão decepcionado e sua mãe... E sua mãe, ? – ela perguntou, olhando para mim – O que ela vai fazer quando descobrir que a filha dela estava roubando? O que você estava pensando, menina?
- Desculpe-me, Mel.
- Só isso que você tem a dizer?
- E o que você quer que eu fale? Me leve de volta para Florença e me apedreje em praça pública? O que eu fiz não foi nada diferente que muitos jovens fazem. Curiosidade é algo que todos temos, principalmente quando se tem dezoito anos e viveu sua vida toda trancada em um castelo porque uma maldição idiota impedia de sair de casa. E você sabe que eu tenho todo o direito de aproveitar minha vida e Deus sabe o quanto eu sonhei com isso. Não estou dizendo que o que fiz foi certo, mas, pelo menos, eu aproveitei e cresci com isso. Lucy queria que eu fizesse isso. Lucy sempre sonhou que eu me libertasse, que aproveitasse um pouco a vida. Sei que não deveria ter sido desse jeito, mas quebrar a cara faz parte da vida e me desculpe se pareço um pouco irresponsável, mas, se perguntassem, eu faria tudo de novo.
- Até a parte de ser presa? – Alfred perguntou.
- Tudo, Alfred, tudo. – falei, encostando-me no banco.
- Eu também já fui preso, se serve de consolo. – Alfred disse ao parar em um sinal.
- Alfred! – Mel deu um tapa em seu ombro – Que belo exemplo você esta dando para nossa menina.
- O que foi? Todo jovem já quis queimar sua vida de uma vez em uma chama sem fim. Curiosidade não mata, só te leva para cadeia. – Alfred falou, soltando uma gargalhada e dando língua para Mel – Mas, sério, o que a fez não foi nada demais. E além do mais, ela não roubou o colar.
- Ah, não? Então o colar estava fazendo no pescoço dela?
- Ian o colocou lá.
- Como você sabe disso? – Mel e eu perguntamos ao mesmo tempo.
- Ian me contou.
Minha respiração parou, e eu pude ver meus olhos arregalados no retrovisor.
- O quê? – perguntamos as duas ao mesmo tempo – Mas como? – Mel continuou – Que horas você falou com aquele crápula covarde? Eu deveria ter arrancado aqueles olhos dele.
- Ele estava do lado de fora da delegacia quando eu fui pegar as documentações da dentro do carro. Ele perguntou como você estava e quando iria sair.
- E o que você disse?
- Que não sabia. Foi então que ele começou a falar um monte de coisas que eu não entendi no começo, mas, depois que ele se acalmou, me contou tudo. Ele parecia arrependido.
- Eu não estou com raiva dele.
- Não? – Mel perguntou – Como assim não? Depois de tudo que ele fez você não tem raiva dele? Meu Deus, você tem o coração muito mole mesmo.
- Sentir raiva não vai mudar o fato de que tudo que eu fiz foi com plena consciência de que não estava certo. E de que provavelmente não me traria nenhum aprendizado, pelo menos um aprendizado que prestasse. A culpa não é apenas de Ian, a culpa foi minha também que me deixei levar pelo meu “sonho americano”. Como Alfred disse, quando se é jovem, você quer deixar queimar-se em um fogo sem fim, pois só se é jovem uma vez e todos os segundos contam.
- Entendo o que você quer dizer. – Mel disse.
- Você também já foi presa, Mel?
- Não, mas trabalhei em um bar uma vez.
- Fazendo o quê? Vendendo ingressos?
- Não, como uma coyote.*
- Naughty Mel. – falei, vendo Alfred entrar pelo portão da frente da minha casa.
- ! – Mel me repreendeu.
- Mel, de todas as coisas do mundo, eu nunca pensei que você tivesse sido uma coyote.
- O quê? Todo mundo já teve seu momento.
- Mas o seu momento superar os nossos. Não estou certa, Alfred? – falei, vendo Alfred estacionar o carro em frente à minha casa.
- Com certeza não chega nem perto. – Alfred desceu do carro gargalhando, o que fez com que Mel bufasse.
Abri a porta do carro com minha barriga doendo de tanto rir. Mel e Alfred eram meus segundos pais, era como se eles tivessem ajudado na minha criação junto com meus pais. Ainda não me contento com o fato de eles não serem casados, ou muito menos namorarem. A química entre os dois era visível, mas eram muito bobos para admitir, pois tanto Alfred quanto Mel já tinha filhos de casamentos passados, mas, por obra do destino, os dois haviam ficado viúvos quase ao mesmo tempo.
A mulher de Alfred morreu três meses antes do marido de Mel morrer em um acidente de carro. Lembro-me bem de como os dois sofreram e lembro-me também de como eles trouxeram a felicidade um ao outro, mas são velhos e cabeças duras demais para admitir.
- Alfred, eu vou te matar enquanto você estiver dormindo. – Mel falou, andando em direção à porta.
- Vai invadir meu quarto à noite? Naughty Mel. – ele disse, andando atrás dela e fazendo-lhe cócegas.
- Alfred! – ela falou, batendo o pé no chão – Como... – Mel foi interrompida por um ranger de uma moto.
Olhei para o lado e vi uma moto estacionar a alguns metros de nós. Meu coração parou e minhas narinas se fecharam, fazendo com que minha respiração parasse em meus pulmões. Eu sabia que aquela moto não era a de Ian, passava muito longe. A moto de Ian era uma Harley, essa era uma Honda, uma daquelas que você só vê naqueles filmes de ação e deseja ardentemente estar naquela garupa segurando aquele bad boy, que, no final, acaba sendo o príncipe de sua vida.
O tal motoqueiro tirou o capacete, e eu pude ver seu rosto. E quando pensei que não poderia morrer sem ar, o mesmo fugiu de meus pulmões e meu coração começou a bater mais rápido, quase como um carro de corrida pronto para partida. Quase pulando de meu peito. estava naquela moto e, mesmo com a roupa de ontem, com botas sujas de lama, camisa desabotoada mostrando seu peitoral e os cabelos todo bagunçados, ele ainda parecia o homem mais bonito de todos os tempos. Ele desceu da moto arrumando os cabelos bagunçados pelo vento e, quando conseguiu, olhou diretamente para mim.
Minhas pernas tremeram na base, especialmente quando ele passou por mim dando um sorriso de lado e foi em direção à Mel, abraçando-a pelo pescoço.
- E aí, Mel, onde eu vou ficar? – ele falou, sorrindo para ela.
- Espera, espera aí. – falei, fazendo com que os dois virassem para mim – O que você disse? Ficar aqui? Você vai ficar aqui? Quem disse que você disse que você vai ficar aqui? Você não vai ficar aqui.
- E quem foi que disse isso? Você? – ele falou, virando-se completamente para mim.
- Essa casa é minha. Você não pode ficar aqui sem a minha permissão.
- Primeiro, essa casa não é sua, é do seu pai. Segundo, quando seu pai e sua mãe não estão aqui, Mel e Alfred são os responsáveis pela sua casa. E terceiro, você perdeu todo o direito de reclamar sua responsabilidade por si própria quando se meteu com o cara errado. – ele deu as costas para mim, abraçando Mel de lado novamente – Onde nós estávamos? Ah, sim, onde eu posso tomar um banho? Ainda estou com cheiro de bebida impregnado em mim. – ele continuou até que os dois desaparecessem pela porta.
Bufei e bati o pé no chão. Idiota, Idiota, idiota, pensei, jogando a cabeça para trás. Virei para o lado e vi sua moto a alguns metros de distância.
Talvez meu príncipe realmente tivesse vindo em uma moto, mas era apenas eu quem estava andando na garupa da moto errada.




Capítulo 30 – Together As One

- Você não se incomoda? – Mel perguntou enquanto escovava meus cabelos.
Já era noite e, desde que eu havia chegado da delegacia, eu estava trancada em meu quarto lamentando ardentemente por ser o ser mais estúpido da face da Terra. Eu deveria saber que Ian era só mais uma ilusão. Dessa vez, porém, não tinha sido a maldição que o tinha colocado no meu caminho, mas minha mente, que tinha criado uma imagem de Ian, como um dos galãs dos filmes que eu assistia.
- Me incomodo com o quê? – perguntei, vendo Mel colocar a escova em cima do aparador.
- Com dormindo aqui. Sei que vocês não estão mais juntos.
- Não, Mel, não me incomodo. – Mas bem que eu o preferia dormindo em minha cama, pensei – Se você se sente mais segura com ele aqui, não vou fazer nada pra impedir.
- Não se trata de mim, . Trata-se de você. – ela girou a cadeira, fazendo com o que eu ficasse de frente para ela – Eu já não tenho mais idade para ficar correndo atrás de você e tentado evitar com que você se machuque. Agora você está por contra própria. Mas, às vezes, estar por contra própria não é a melhor solução, pois ninguém é feliz sozinho.
- Eu sou feliz sozinha.
- Oh, minha filha, claro que não.
- Sou sim, Mel. Eu estou sozinha desde que eu terminei com... Com .
- Mas você se esqueceu que desde que terminou com tem andado com aquele marginal?
- Mas não era do mesmo jeito. Com , era diferente. Quando eu estava com , não sentia que estava sendo forçada a fazer algo apenas para impressionar um garoto. Com , eu posso ser eu mesma, até mesmo aquela princesa boba que acredita em filmes americanos e românticos. – falei, abaixando a cabeça – Quando estava com Ian, parecia que toda a vida que eu levava era apenas uma bobagem e que tudo que eu fazia eram coisas sem sentido e anormais que quase nenhuma garota faz. Era como se eu estivesse sendo forçada a ser outra pessoa, uma pessoa que eu nunca quis ser. Como se eu fosse uma daquelas garotas que sempre estava fazendo coisas más no início do filme e acabavam sozinhas no final. – levantei o olhar – Estou sendo muito boba?
- Não, , – ela segurou minhas mãos – você está sendo você mesma. Aquela mesma garota que eu vi crescer, mas que agora amadureceu e tem um pouquinho de... – ela parou de falar e abaixou a cabeça.
- Um pouquinho de que, Mel?
- Eu não deveria falar isso.
- Ora, Mel, fale. Quando você falar, decidirei se está sendo inapropriada ou não.
Ela respirou fundo e falou:
- Um pouquinho de Lucy. Isso não foi a coisa mais apropriada de se dizer.
- Não, Mel, – falei, interrompendo-a – você está certa. É como se mesmo depois da morte dela, eu me lembrasse dela em tudo que eu faço. Por um momento, achei que Lucy estava dentro de mim, mas mesmo com toda essa maldição e essa história de manter o equilíbrio, eu sei que ela se foi para sempre. Pois, se Lucy estivesse aqui, com certeza, não deixaria com que eu me metesse com caras como Ian.
- Você sente falta dela?
- Claro que sinto. – falei, levantando-me – Mesmo o fato de eu ter sido a pessoa que a matou, Lucy era minha irmã, mesmo que essa maldição idiota diga ao contrário.
- Nunca se deve acreditar em um velho livro na última prateleira de uma estante. – Mel falou, fazendo com que nós ríssemos – Ela sempre dizia isso.
- Vai ver ela sempre pressentiu que a verdade chegaria um dia.
- Pode ser, mas sabe que verdade eu sinto chegado agora?
- Qual?
- A da senhorita indo para a cama.
- Oh, é o que eu mais desejo agora. – falei, enquanto caminhava até minha cama e me jogava na cama – Nunca percebi o quanto minha cama é gostosa, macia e aconchegante.
- Também, faz mais ou menos um mês que você não dorme nela.
- Mas isso vai mudar, Mel. – falei, apoiando-me pelos cotovelos. Observei-a pegar alguns lençóis dobrados em cima da poltrona – Prometo me comportar de agora em diante.
- Assim espero. Boa noite, minha princesa. – Mel falou, abrindo a porta.
- Ei, Mel, aonde você vai com todos esses lençóis?
- São para o . Como ele vai dormir aqui hoje, acho que ele merece mais do que um sofá velho e duro.
- Você o colocou no quarto de hóspedes? – perguntei, sentando-me na cama – Aquele aqui do lado?
- Foi sim. Por quê? Você se incomoda?
- Não, não. – falei, levantando-me e andando até ela – Deixa, Mel, eu levo as coisas para o . – falei ao pegar os lençóis de seus braços.
- Tem certeza? Digo, esse é o meu trabalho e eu não vejo problema algum de fazê-lo.
- Eu tenho que pedir desculpas ao , Mel. É melhor pedir agora enquanto estou com coragem, do que esperar quando ele for embora pela manhã.
- Oh, entendo. – ela abriu a porta e deu passagem para que eu passasse. Mel fechou a porta e virou-se para mim – Boa sorte, minha filha. Tomara que vocês se resolvam.
- Mel, eu não estou indo lá para acertar tudo com o . Eu apenas... Eu apenas estou indo me desculpar.
- Nós duas sabemos que não é apenas isso. – ela sorriu e começou a andar em direção à escada. Vi Mel desaparecer à medida que ela a descia. Respirei fundo e comecei a andar em direção ao quarto de hóspedes, que ficava ao lado do meu.
Dentro do peito, meu coração começou a bater lentamente, enquanto minhas mãos suavam contra o lençol em meus braços. Parecia até que eu estava dando os meus últimos passos para a minha sentença final, por mais que eu não quisesse aceitar o que aconteceria naquele quarto que, provavelmente, decidiria o meu destino.
O meu destino com .
Eu não queria aceitar, mas essa conversa poderia ser o ponto final da nossa história ou poderia ser apenas a metade dela. Eu iria preparada para o pior de qualquer jeito, pois eu sabia que o que eu tinha feito a desde o dia em que o conheci fora apenas piorar a vida dele. Eu era a maldição, o carma que carregava e eu me odiava eternamente por ser o único motivo da sua felicidade não estar completa. Eu queria que fosse feliz, sem toda essa porcaria de descendente de bruxa e namorada amaldiçoada por uma velha rejeitada. Eu desejava o melhor para ele, pois é isso que se deseja para a pessoa que ama. Você só deseja que ela esteja feliz, que ela esteja saudável, que tudo em sua vida dê certo e que todos os seus sonhos se realizem porque, quando se ama, sua própria vida é deixada em segundo lugar.
Amor é essa coisa inexplicável que nos faz cometer loucuras e imaginar momentos que nunca em sua vida imaginaria com outra pessoa. Amor é o mistério que nem com todo o avanço da ciência pode-se entender, porque nem quem ama realmente entende o amor, apenas acha que entende. Mas, oh, como eles estão errados.
Não teve um minuto desde o dia em que eu olhei naqueles olhos que eu não desejasse toda e completa felicidade. Que sua felicidade fosse, de alguma maneira, completa comigo ao seu lado. Parecia um pouco egoísta – e ainda é egoísta –, mas o que eu poderia fazer se cada célula do meu corpo queimava em um fogo sem fim por esse homem? Eu nunca havia desejado um amor de homem como eu desejava o dele, nem mesmo os dos galãs dos filmes que eu assistia. Oh, não, eu sonhava que um dia eu teria o meu próprio príncipe encantado, aquele que iria me salvar quando todas as minhas esperanças já estivessem esgotadas.
era esse príncipe. No entanto, restava saber uma coisa: será que, mesmo depois de toda a confusão que eu armei, meu príncipe ainda iria me amar com a mesma intensidade que eu o amo?
Respirei fundo e bati em sua porta, imaginando que ele iria apenas me olhar com desprezo e iria me mandar embora.
- , o que você está fazendo aqui? – ele perguntou assim que abriu a porta. Desci meus olhos pelo seu tórax, que estava levemente molhado, e logo voltei para seu rosto, vendo seus cabelos molhados e bagunçados.
- Nossa! Você anda malhando? – falei automaticamente – Digo, vim trazer lençóis para você.
- Você pode colocar em cima da cama enquanto eu arrumo a bagunça que fiz no banheiro?
- Claro. – respondi. Dei um passo para frente e esperei que desse espaço para que eu passasse. Mas, muito pelo contrário, ele ficou parado, me encarando com aqueles olhos do jeito que só ele sabia fazer – , você poderia me dar licença?
- Claro! – ele foi para o lado, finalmente deixando que eu passasse – É melhor eu arrumar o banheiro.
- A Mel pode fazer isso por você. – falei ao colocar os lençóis em cima da cama.
- Não quero dar tanto trabalho para Mel. Ela já tem que cuidar de você. – ele falou, ao mesmo tempo em que entrava no banheiro.
- Eu posso cuidar de mim mesma, eu apenas...
Fui interrompida pelo barulho de uma janela sendo quebrada. Virei para o lado e vi um homem caído no chão do quarto. Antes que eu pudesse gritar, o ar sumiu de meus pulmões assim que o homem levantou seu rosto e olhou diretamente para mim.
- Ian? – falou atrás de mim – Eu não acredito que você teve a cara de pau de vir aqui. – passou por mim e caminhou diretamente em direção a Ian, logo depois o segurando pelo colarinho, o que fez com que ele se levantasse do chão – É melhor você me dizer o que veio fazer aqui antes que eu arranque todos os dentes da sua boca.
- O que é isso, , meu amigo? – ele perguntou, segurando nos braços de – Pensei que eu e você fôssemos amigos.
- Nossa amizade acabou no dia em que você colocou a vida da em risco. – ele empurrou Ian, fazendo com que ele batesse as costas na estante ao lado da janela – Agora me diz: o que você veio falar com a ?
- O que eu vim falar com ela não é da sua conta. – ele se recompôs – E o que você está fazendo aqui na casa da ?
- Eu vim para protegê-la de idiotas como você.
- Você é o cão de guarda dela, por acaso? – Ian perguntou, dando uma risada sarcástica.
- Seu bastardo. – falou, partindo para cima dele. Mas, antes que ele conseguisse dar um passo, eu o segurei pelo braço, impedindo-o de ir.
- , não. – falei, fazendo-o olhar para mim – Eu quero ouvir o que ele tem a dizer.
- Mas, , o que esse cara fez você passar... – ele falou, virando-se por completo para mim e segurando meus ombros.
- Todos merecem uma segunda chance.
- Está vendo? – Ian chamou a atenção de – Ela quer falar comigo, , e você pode ir se retirando.
- Eu aceito falar com você, – eu disse, andando um pouco para frente, a fim de ver Ian por completo – mas eu nunca disse que não ficaria aqui comigo.
- Ele vai envenenar você.
- Não mais do que você fez, pode apostar. – retruquei, olhando diretamente para Ian. Ele não parecia tão legal ou carismático como pensei que ele era. Oh, não, ele agora aparentava um dos condes burros que me pediam em casamentos e os mais feios, devo ressaltar – Então, Ian, o que você quer?
- Eu vim te pedir desculpas.
- Isso eu já imaginava, mas por que usar a janela? Digo, portas foram feitas para isso.
- Imaginei que seus criados não deixariam que eu falasse com você.
- Eles não são meus criados, eles são meu amigos. Praticamente me criaram juntos com meus pais.
- Eles não iriam deixar com que eu falasse com você depois que descobrissem que eu fui o motivo de você ir para a cadeia. Oh, , eu sinto tanto em ter te colocado naquela situação e principalmente por quase ter... – ele abaixou a cabeça.
- Tudo bem, Ian, eu te perdoo.
- Ah, . – Ian deu um passo em minha direção, e eu dei dois passos para trás – O que foi?
- Eu te perdoei, Ian, mas isso não quer dizer que eu queira você de volta na minha vida. Você foi um ótimo amigo, mas eu não quero mais te ver.
-
- Não, Ian, eu amei passar esse tempo com você e foi uma das melhores experiências da minha vida, mas essa não era eu.
- Quer dizer que eu nunca mais vou te ver?
- O futuro é incerto. – falei, abaixando a cabeça – Agora que você já fez o que tinha que fazer, peço que você vá embora. Pela porta dessa vez, por favor.
- Eu o acompanho para que ele não se perca no caminho. – falou, andando em direção à porta e abrindo-a.
- Eu vou você para ter certeza que os dois permaneçam inteiros.
- Vamos logo, Ian, - falou, pegando-o pelo braço e arrastando-o pelo corredor – quero você longe da . E o mais rápido possível. – ele continuou a levar Ian por escada abaixo.
Segui os dois praticamente correndo, na esperança de alcançá-los para que nada acontecesse com nenhum dos dois. No entanto, ao chegar ao pé da escada, já estava trancando a porta e batendo as mãos em forma de trabalho feito.
- Desculpe. – disse baixinho para que ele só escutasse – Eu não quis causar tanto problema na vida de todos.
- Ian não vai mais causar problema algum. – ele disse andando até a janela e afastando a cortina para ver se ele tinha realmente ido embora – Depois dessa, eu acho...
- Talvez tivesse sido melhor que Lucy tivesse ganhando. – falei, interrompendo-o – Ela sim era forte o suficiente para aguentar uma vida como essa.
- Era seu destino. – ele falou ao mesmo tempo em que caminhava em minha direção.
- Quem disse? Um livro velho deve decidir o destino de alguém? Talvez ele pudesse estar errado, talvez Lucy se desse melhor se estivesse aqui.
- Por que você está falando isso? – ele disse, cruzando os braços.
- Porque eu faço tudo errado, . – falei um pouco mais alto – Tudo que faço desde o dia que matei Lucy é besteira. Eu estou decepcionando as pessoas, pessoas que eu amo. Se Lucy estivesse aqui, ela faria tudo certo. E não se meteria com uma pessoa como Ian. Ela não ia se deixar enganar por um charlatão que a única coisa que fez foi me mostrar o seu mundo, e eu não o culpo por isso, porque quem se deixou levar fui eu. A culpa não é apenas de Ian, a culpa também é minha. Eu acabei me transformando na única pessoa que eu disse que nunca iria ser. Tudo isso só por uma estúpida vontade de te tirar do meu peito e por um rasto de felicidade que eu sentia apenas quando estava com você. – falei, sentindo as lágrimas descerem por meu rosto – Desculpe, eu entendo o porquê você não quer ficar comigo e fico feliz que você esteja com alguém que te faça feliz.
- Você está feliz que eu esteja com outra pessoa? Como é que você pode dizer isso depois de tudo que a gente passou, ?
- O que você quer que eu diga, ? Que eu odeio a ideia de você namorando aquela esquelética sem cérebro? Que eu deseje o mal para você? Eu nunca faria isso porque, quando se ama alguém, só se deseja o bem para ela, só se deseja que essa pessoa seja feliz, mesmo que não seja com você.
- E quem disse que eu sou feliz sem você?
- Mas eu pensei...
- Pensou errado, . – ele me interrompeu – Deus, como você é burra. – ele falou, dando as costas para mim – Eu só fiquei com a Ashley porque ela é o mais perto que eu encontrei parecida com – ele se virou para mim – você. Pode até parecer estranho, mas vocês têm muito em comum.
- Mas...
- Eu sei que eu nunca deveria ter feito isso, mas eu sabia que você teria que descobrir o seu caminho de volta para ser quem você realmente é sem mim. – ele se aproximou de mim – A verdade é que eu te amo, , e tudo que eu fiz foi para te proteger. Só eu sei o quanto doeu ter que ver você dando a atenção que era para ser minha para o Ian.
Todas as paredes de gelo do meu coração se derreteram com essas simples palavras e meus braços se jogaram em volta de seu pescoço, fazendo nossos lábios se encontrar. Só Deus sabia o quando eu sentia falta de me derreter nesses lábios e em seus braços, que rodearam minha cintura e fizeram com que seu tronco nu se encontrasse o tecido fino da minha regata. Senti seus dentes prenderem meu lábio inferior, puxando-o para si, e logo depois nossas bocas se encontrarem, fazendo com que nossas línguas dançassem uma valsa da saudade. me apertou mais contra seu peito, deixando-me nas pontas dos pés, mesmo estando em um degrau da escada.
Minhas pernas deram um impulso para que as mesmas rodeassem sua cintura. Todo o meu corpo começou a queimar em um fogo que eu conhecia, um fogo que só queimava em minhas veias quando eu estava na presença de . E, oh, esse fogo fazia meus pensamentos irem a mil, mas sempre me levavam a um mesmo resultado: o quanto eu desejava que nossas roupas não estivessem onde estavam. O que se confirmou quando seus beijos desceram de meus lábios até meu pescoço, fazendo com que eu fechasse os olhos e arqueasse minha cabeça para trás. começou a subir as escadas comigo em seu colo enquanto eu me agarrava mais aos seus ombros e puxava seus cabelos.
Senti minhas costas baterem de encontro com a porta de meu quarto e os beijos de descerem por meu colo. Um gemido escapou de minha garganta e minhas unhas cravarem em seus braços. sorriu contra a pele de meu colo e abriu a porta de meu quarto com uma das mãos, fazendo com que meus pés fossem parar no chão outra vez. Ele, então, segurou meu rosto entre suas mãos e fez com que eu olhasse em seus olhos. Ofegante, disse:
- Tem certeza? – ele perguntou, olhando em meus olhos.
- Nunca tive tanta certeza em minha vida. – respondi, sorrindo, e vendo-o sorrir também.
me segurou pela cintura enquanto sua boca vinha de encontro à minha outra vez e me deitava suavemente em minha cama, deitando-se em cima de mim depois. Suas mãos tiraram minhas roupas delicadamente enquanto eu tirava as suas e, naquela mesma noite, nosso amor estava completo.
Eu era dele. E ele era meu.

Em cada sonho mais louco que eu já tive em minha vida, nunca imaginei que o melhor de todos seria aquele que eu estava vivendo aqui. Agora. Continuei olhando para , que dormia calmamente, como um anjo. Porque era isso que ele era. Um anjo que apareceu em minha vida para me salvar de todas as enrascadas que, provavelmente, eu me meteria e teria todo o prazer de fazer, pois saberia que ele estaria lá, em sua moto, pronto para me arrastar de volta para casa em seus braços.
Eu nunca deixei de amá-lo. Oh, não. Meu amor por só aumentava a cada dia dentro do meu peito, fazendo com que meu corpo todo entrasse em chama apenas em vê-lo. Agora eu sabia porque todo o meu corpo fervia pelo seu toque, era por isso que meu corpo esperava ardentemente. E agora que já o teve, não quer que essa sensação vá nunca embora.
- Onde ela está, Mel? Diga-me! Agora! – escutei gritos virem do andar debaixo, fazendo com que eu me assustasse.
Levantei-me em um pulo e coloquei a camisa de , que mais parecia uma camisola em mim, e logo depois um short. Abri a porta lentamente na esperança que não acordasse. Olhei para ele e vi que ele continuava dormindo.
- Mel, vá chamá-la agora! – escutei mais um grito vindo do andar debaixo, agora um pouco mais alto. Eu conhecia aquela voz. Parecia bem com a voz de meu pai.
- Ela ainda está dormindo, senhor Jonathan. – agora foi a vez de Mel se pronunciar.
- Acorde-a. – meu pai parecia furioso, e eu engoli em seco ao mesmo tempo em que descia os primeiros degraus da escada.
- Não é preciso, – falei, descendo a escada um pouco mais rápido – eu já estou acordada. – continuei andando em direção à sala, onde meu pai, Lorenzo e minha mãe se encontravam.
- E você me recebe com essa calma? – ele perguntou ao dar um passo em minha direção.
- Não sou mais criança para sentir medo do senhor, pai. – falei, cruzando os braços.
- E desde quando você me responde dessa maneira?
- E o que o senhor queria que eu fizesse?
- Pedir perdão seria um bom começo. Você sabe o quanto foi humilhante pedir para que você fosse solta de uma prisão porque roubou uma bijuteria qualquer? Você tem tantas joias! O que diabos você queria que com uma simples bijuteria?!
- Como o senhor sabe disso?
- Como eu sei disso? Além de ter me ligado, tive sorte porque a Rainha teve o bom senso de abafar o caso e pediu para que você fosse solta.
- ?
- é um rapaz de ouro, . Foi ele quem me deu a ideia de que você fosse embora de Londres.
- Embora de Londres? O senhor não pode me prender naquele castelo outra vez.
- E quem disse que você vai para o castelo? Você está indo pro acampamento junto com Lorenzo. Agora.
Oh, não. O acampamento não.

Capítulo 31 – Camp

Eu não o vi.
E ele também nem teve a decência de descer para se despedir.
De fato, ele já tinha ido quando Lorenzo subiu comigo para arrumar minha mala. Isso fez com que meu coração batesse lentamente e uma lágrima descesse por meu rosto. Eu esperava que ele, pelo menos, me explicasse o motivo para ter chamado meu pai e, principalmente, ter lhe dado a ideia de me colocar naquele acampamento dos infernos. Eu sabia que eu não tinha sido o modelo exemplar de princesa e, muito menos, de filha, mas qual a princesa que nunca tinha feito uma loucura? Digo, algumas delas saíam depois do toque de recolher e achavam que aquela era a coisa mais louca que elas já fizeram. Eu sabia disso porque foram inúmeras as vezes em que eu saí de meu quarto e fui em direção à parte velha do castelo para poder olhar a lua e as estrelas em cima do telhado. Era ali que eu tinha certeza de que minha vida era mais do que festas com a realeza e conhecer príncipes mais burros que uma porta. Oh, não, eu sabia que minha vida era muito mais do que isso.
Minha vida estava além dos muros daquele castelo e estava apenas esperando a oportunidade para ser vivida.
Pode até ser que eu tenha balançado as estruturas e passado dos limites quando fui parar naquela delegacia, mas, de certa forma, não tive culpa. Quando Ian me chamou para sair daquela festa, eu apenas queria fugir da dor que meu coração estava sentindo naquele momento; queria esquecer o que eu tinha acabado de presenciar. Nunca foi minha intenção invadir uma loja para roubar bijuterias. Eu tinha joias, e das mais caras do mundo. O que diabos eu queria com uma bijuteria de um Walmart qualquer? Não fazia nenhum sentindo, mas meu pai não sabia disso, ele pensava – e essas foram as exatas palavras que saíram de sua boca – que eu estava passando por uma fase, aquela que todos os adolescentes passam depois de viverem experiências não tão boas – como matar sua própria irmã por causa de uma maldição –, onde acabam fazendo coisas que elas mesmas não sabem que estão fazendo.
Eu não discuti com meu pai. Eu sabia que ele não estava apenas sendo pai quando me baniu para esse acampamento, ele estava sendo rei também. E eu podia chorar, gritar e implorar, mas ele não mudaria de ideia.
O acampamento não era tão ruim assim, não para as pessoas que queriam estar lá. O acampamento era o local onde os soldados que protegiam o reino treinavam. Lembro-me até do dia em que Lorenzo e seus irmãos foram levados para o treinamento – foram os piores meses da minha vida. Pela primeira vez, após quinze anos, eu realmente tive que escutar o que os nobres falavam nas festas dadas no castelo. E posso ressaltar que nunca escutei tantas futilidades e estupidez em toda a minha vida.
Eles eram treinados como guerreiros, igual àqueles filmes em que usavam espadas e tudo. Lorenzo dizia que armas eram muito rápidas e que espadas mantêm a originalidade de ser guerreiro. Ele também dizia que havia aprendido os mais diversos tipos de artes marciais, o que eu pude notar quando ele voltou e tinha, praticamente, o dobro do tamanho que foi. Estava até parecendo uma porta com ombros tão largos e braços tão fortes. Mas Lorenzo não tinha sido o único de sua família a ir para o acampamento. Como se não bastasse, seus irmãos também foram, fazendo com que minha vida praticamente se tornasse um buraco de tédio sem eles. Porém, eu entendia que eles tinham que ir e não seria só porque eu pedi para que eles ficassem, eles ficariam. Na verdade, eu realmente acho que eles ficariam se eu pedisse para eles, mas como eu poderia ser tão sem coração a ponto de pedir para que eles ficassem depois de saber que seu pai estava muito doente?
Lorenzo e seus irmãos não tinham ido ao acampamento por livre espontânea vontade. Todos eles preferiram ficar em casa e frequentar a faculdade local e, até mesmo, tocar a padaria que seus avós tinha deixado de herança para eles. No entanto, o marido de Marta ficou doente e não aguentava mais os serviços pesados que o castelo exigia que ele fizesse. Como bons filhos, Lorenzo e seus irmãos decidiram ir ao acampamento para que pudessem tomar o lugar do seu pai e ajudar sua mãe financeiramente.
Quando se entrava no acampamento para se tornar um dos guardas do castelo, ganhava-se uma boa quantia de dinheiro para ajudar a família que ficava na cidade. Como eram três, a família de Lorenzo ficou muito bem. Seu pai tocou a padaria e descobriu que não era apenas seus pais tinham o talento para cozinha.
- Você não vai falar nada? – Lorenzo interrompeu meus pensamentos.
- E o que eu poderia dizer? – perguntei, olhando pela janela do carro.
- Eu não sei. Diga que me odeia, que quer me socar na cara, fale alguma coisa. – ele se virou para mim – Sinta alguma coisa.
- Bem, Lorenzo, acho que isso está fora de questão no momento.
- Ah, não, , não fique chateada comigo. Não gosto quando você fica com raiva de mim. Principalmente, quando fica em silêncio.
- E o que você quer que eu faça o que hein, Lorenzo? – olhei para ele – Abra a janela e saia gritando o quanto feliz estou de ir para um lugar no meio do nada por dois meses?
- O acampamento não é tão ruim assim.
- Para as pessoas que querem ir para lá pode até ser que não, mas para mim pode ter certeza que vai parecer o inferno.
- Você preferia ficar trancada naquele castelo pelo resto da sua vida?
- Bem, entre viver no luxo e ficar presa no meio do mato ficar trancada naquele palácio, não me parece uma ideia tão ruim assim.
- E o que você iria aprender com isso? Nada. Você ainda teria um bando de gente para passar a mão na sua cabeça e dizer que o que você fez não foi nada de errado.
- E o que eu poderia aprender? Como eu deveria usar uma espada? Oh, me desculpe, mas esse é o seu trabalho. Você foi treinado para isso, para me proteger e dar sua vida por mim, se for preciso.
- Uau! – ele falou, surpreso – Bem que ele tinha razão. Você realmente mudou!
- E o que você esperava, Lorenzo? Que eu ficasse a mesma garota depois de tudo que eu passei? Oh, meu amigo, você está muito enganado. – ele abriu a porta do carro e saiu – Ei, Lorenzo. O que você está fazendo? – perguntei. Abri a porta do carro e saí também – Lorenzo, volte aqui, eu estou mandando. – falei, vendo-o andar pelo gramado em direção a um portão – Lorenzo, eu estou falando com você. – parei atrás dele enquanto ele conversava com um homem que estava posicionado em uma torre. Olhei para cima e vi o homem virar de costas, fazendo com que eu pudesse ver uma espada – Quem disse que eu mudei? – perguntei, olhando para Lorenzo outra vez. – Lorenzo, me fala. – falei, estalando os dedos perto de seu rosto – Muito maduro, Lorenzo, você não vai falar comigo? Oh, quanta maturidade. – falei, virando de costas e indo em direção ao carro.
- disse. – ele falou, o que me fez parar de andar – Ele disse que você tinha mudado, que não era mais a mesma e que estava andando com as pessoas erradas. Na verdade, com a pessoa errada.
- E o que diabos ele tem haver com minha vida? Foi ele quem partiu. Foi ele quem decidiu sair da minha vida. – falei, virando-me para ele.
- Mas isso não te dava o direito de afastar todos os que te amam e se transformar em uma... – ele se interrompeu – Deixa para lá.
- Em uma o quê?! – gritei, cruzando os braços – Vamos, Lorenzo, diga! Não seja covarde!
- Em uma versão piorada de Lucy. – ele olhou para mim – Acho que nem Lucy era tão desprezível. – ele sorriu sem humor – De fato, acho que Lucy era a que deveria ter ficado viva porque você está me saindo pior que encomenda.
O portão atrás de Lorenzo se abriu, o que fez com que ambos olhássemos para ele. Engoli em seco quando vi três homens, com praticamente o dobro do meu tamanho, saírem de lá. Eles pareciam versões reais do Superman e aparentavam ser feitos de aço de tão intimidadores que eram, além da confiança que sustentavam em seus olhares. Era como se eles fossem invencíveis e que nada nesse mundo, nem mesmo a espada do aço mais grosso, pudesse atravessar seus peitorais ou muito menos vencê-los em uma batalha. Não era assim que eu lembrava dos guardas do castelo. A maioria deles era velha, já casados e suas esposas trabalhavam na cozinha ou como arrumadeiras no castelo.
- Lorenzo. – o do meio falou, abrindo um sorriso. Pude jurar que o ar de meus pulmões haviam desaparecido em questão de segundos. Ele não era apenas extremamente alto e forte, ele também era ridiculamente lindo. Pelo que me lembro, o treinamento era baseado nos treinamentos dos antigos soldados que não perderam nenhuma guerra durante as gerações da família Gillbard. Os guardas do castelo nunca haviam sido tão lindos e, se eram, estavam bem escondidos.
De repente, isso me fez lembrar de todas as vezes que Lucy se escondia dentro do guarda-roupa por ter sido pega por alguma das arrumadeiras com algum cara extremamente lindo na parte do castelo onde as filhas do rei não podiam frequentar. Se me recordo, Lucy era o motivo disso. Papai havia proibido nossa ida à parte do castelo onde ele cuidava de assuntos burocráticos, políticos e entre outros, e isso se dava ao fato de Lucy não saber controlar seus hormônios. Mas não a havia impedido de fugir uma noite ou outra e acabar aos beijos com um dos guardas do castelo. Lucy ficou com tantos guardas do castelo que a maioria deles foram trocados por homens com um pouco mais de idade e já casados enquanto os mais novos tinham sido colocados nas patrulhas para assegurar a segurança da cidade. Lembro-me também das loucas histórias que ela contava todas as vezes que chegava no quarto ofegante. Eram raros os momentos em que nós duas ficávamos no castelo e eram ainda mais raros os momentos em que conversávamos sobre nossas vidas.
- E aí, George. – Lorenzo disse, cumprimentando o homem do meio. George olhou para mim e sorriu.
- É ela?
- É sim. – Lorenzo olhou para mim com desprezo – Mas não precisa fazer reverência, ela é um de nós agora. Ela deve ser tratada como os outros. – Lorenzo deu um sorriso de lado.
- Como assim tratada como os outros? – perguntei, confusa.
- Você vai descobrir. – Lorenzo me pegou pela mão – Agora vamos. – ele me arrastou por uma pequena estrada de terra.
- Lorenzo, o que você está fazendo? – perguntei, olhando para os lados. Eu só enxergar mato e mais mato. Provavelmente, eu estava em um daqueles parques do Jurassic Park e só perceberia isso quando tiranossauros rex corressem atrás de mim, tentando me comer – Para onde você está me levando? Lorenzo, você está tentando me matar? Eu retiro tudo que disse, eu me arrependo de tudo que eu fiz. Posso ir para casa agora? – ele continuou a me arrastar pelo braço – Eu não quero ser devorada por dinossauros! – gritei, fechando meus olhos e sentindo-o parar de me puxar.
- Dinossauros? – Lorenzo olhou para mim – Aonde você pensa que está? No filme Jurassic Park?
- Bem, se você olhar em volta, realmente parece um daqueles parques. – falei, olhando para ele.
- Mas você não está. Bem-vinda à vida real, . – ele recomeçou a me puxar novamente – E principalmente, bem-vinda ao seu pior pesadelo.
- Meu pior pesadelo não é esse lugar. Eu vou estar fora daqui em dois dias.
- Eu não teria tanta certeza disso.
Avistei outros homens a alguns metros de distância. Estreitei meus olhos e vi alguns jogarem outros em uma poça de lama e, logo depois, esses correrem para um obstáculo feito de pneus. Arrepiei-me da cabeça aos pés, pedindo para que eu não tivesse que passar por isso. Eu era uma princesa, não precisava passar por isso.
Lorenzo continuou me arrastando até que chegássemos em frente a alguns garotos. Eles estavam na mesma posição na qual o soldados ficavam quando a família real passava, e estavam tão sérios que eu tive que conter o riso para não soltar uma gargalhada.
- Junte-se a eles. – Lorenzo disse, apontando para o final da fila.
Cruzei os braços e olhei para ele.
- Como é que é?
- Junte- se a eles. Você é uma iniciante agora. – ele disse, cruzando os braços também – Vamos, soldado, isso é uma ordem.
- Isso só pode ser algum tipo de brincadeira.
- Eu nunca estive falando tão sério em minha vida. Na verdade, eu nunca pensei que estaria aqui nessa posição. Você como um dos meus soldados, e eu te dando ordens.
- Talvez porque esse nunca foi o seu habitat natural. Você não nasceu para mandar. – Lorenzo me olhou surpreso. Para falar a verdade, até eu fiquei surpresa com o que eu disse – Lorenzo, eu...
- Iniciantes, para a lama. Agora! – Lorenzo gritou, o que fez com que eu me assustasse. Mas nada se comparou ao que veio depois.
Meu corpo foi brutalmente elevado do chão e um grito rouco ecoou pela minha garganta, à medida que eu era levada para a poça de lama mais próxima. O que me reconfortava era saber que eu não era a única que iria me jogar nessa lama que só Deus sabe o que eles colocaram para que ela parecesse dez mil vezes mais nojenta do que o normal.
Eu estava prestes a soltar um grito pedindo por ajuda quando fui jogada naquela poça. Minhas costas bateram naquela terra pouco macia e, antes que eu pudesse me recuperar, eu estava sendo bombardeada com pequenas bolas de areia molhada por todo o meu corpo. Eu sei que tinha sido uma vadia sem coração, mas isso não lhes dava o direito de me humilharem dessa maneira. Eu os tinha salvado. Se não fosse por mim, Lucy teria tomado o reino e teria feito todos deles escravos e, provavelmente, os teria deixado para morrer de fome. Eles tinham que estar beijando meus pés por isso, não jogando lama em mim.
- Iniciantes, para os obstáculos de pneus! – Lorenzo gritou e logo os garotos que estavam na lama ao meu lado correram em direção aos obstáculos de pneus. Lorenzo se abaixou, fazendo com seu olhar ficasse na altura do meu – O que foi, princesa? Você não é tão durona quanto diz ser? – ele se aproximou mais – Bem, sempre soube que tudo aquilo era puro arranque. Você não precisa dar um telefonema e vai estar fora em dois dias. Você vai estar chorando e implorando para nós pararmos, e aí nós que não vamos querer você aqui.
Senti o choro entalar em minha garganta e o engoli de volta. Eu não iria me humilhar na frente de Lorenzo.
Eu iria fazê-lo comer areia. Literalmente.
- Pois bem, – levantei-me e o vi levantar-se também – você não me conhece tão bem assim.
Pisei fundo e fui em direção aos obstáculos de pneus. Entrei na frente do próximo da fila e atravessei os obstáculos de pneus sem cair.
- Para uma princesa, você que manda bem nos obstáculos. Onde você aprendeu tudo isso? – George perguntou.
- Meu melhor amigo. Nós costumávamos brincar disso. – respondi, indo em direção à fila que se formava daqueles que já tinha atravessado – Mas parece até que ele se esqueceu.
- Esqueceu do quê?
- De como eu sempre fui sua melhor aluna também.
- Iniciantes, formação! – Lorenzo gritou. Eu podia sentir o ódio pulsar em suas cordas vocais. Parei ao lado de um garoto, muito mais alto que eu, que sorria para mim.
- Meu nome é . – estendi a mão para ele.
- Eu sou Kyle.
- Nada de conversa. – Lorenzo falou, fazendo com que ambos voltássemos nossa atenção para ele.
- Isso é apenas um exemplo do que vocês vão passar nesses dois meses que estarão aqui. Vocês pedirão para sair, alguns vão chorar e outros vão até se revoltar contra nós, mas, no final, quando tudo terminar, vocês vão nos agradecer porque aqui nós não vamos apenas ensiná-los a como se proteger ou a proteger os outros, nós vamos ensiná-los a ser homens e mulheres de caráter. Vamos ensiná-los a dar valor ao que deixaram para trás, a dar valor a tudo que vocês têm e, principalmente, a ensinarem a tratarem a todos com igualdade porque aqui somos todos iguais. Não importa se seus pais são um dos comerciantes da cidade, se você mora no vilarejo mais pobre ou, até mesmo, em um castelo. Quando você se tornar um de nós, não importa de onde vier, todos serão tratados com o mesmo respeito e honra porque todo sacrifício é válido, mesmo que mude você. Pois é você que decide se vai ser uma melhor versão de você ou uma bem pior – ele olhou diretamente para mim. – Vocês não servem ao rei ou à sua família, vocês servem ao povo, porque sem o povo não há rei. – ele deu uma pausa – George vai dizer a divisão dos alojamentos.
Lorenzo deu a volta e caminhou em direção aos alojamentos se nem ao menos olhar para trás, com a cabeça baixa, contando seus passos. Ele costumava fazer isso quando sua raiva ultrapassava os limites que ele não podia mais suportar. Eu conhecia Lorenzo tão bem que sabia que ele, provavelmente, estaria contando os seus passos para que a raiva passasse mais rápido.
- , você vai ficar no alojamento 25. – George anunciou, e eu voltei minha atenção para ele – Vocês podem ir para os seus alojamentos e se acomodarem. Hoje nós teremos apenas a fogueira para conhecermos mais vocês, mas o verdadeiro treinamento começa amanhã. Iniciantes, dispensados. Exceto você, . – ele olhou para mim – Você vem comigo.
- Acho que eu sei contar até vinte e cinco. Você não precisa me tratar como criança.
- Acho que você nunca deixou de ser uma criança, de fato. – eu ia rebater, mas ele foi mais rápido – Vamos, você não tem o dia todo. A fogueira é daqui a duas horas e você ainda tem que tirar essa lama toda do seu corpo. – ele começou a andar, deixando-me de boca aberta – Vamos, , ande logo.
Balancei a cabeça e comecei a andar para alcançá-lo.
- Como assim nunca deixei de ser criança? Digo, já tenho dezoito anos e já experimentei muitas coisas da vida.
- Como beber e fazer algumas outras besteiras? Ser presa, quem sabe. – ele olhou para mim.
- O Lorenzo te contou, certo?
- Nós precisávamos de um motivo para te trazer pra cá.
- Por causa de uma bijuteria? Vamos lá, não é como eu tivesse matado alguém.
- Nós dois sabemos que isso não é verdade, hein?
- Como você... Digo, ele não tem o direito de ficar comentando minha vida com ninguém, muito menos com um desconhecido.
- Ele não fez por querer.
- Não vejo como alguém conta uma história como a minha sem querer. Digo, não é uma história fácil de contar e muito fácil de acreditar.
- Bem, admito não é uma história fácil de contar. Mas não se é todo dia que você descobre que sua melhor amiga anda aprontando por aí na garupa de uma moto e, muito menos, sabe explicar o motivo de ato tão rebelde vindo de uma princesa tão exemplar. – ele me olhou – Meninas de toda a cidade cresciam tendo você como modelo. Elas queriam ser você, queriam estar com você, queriam ter a sua vida.
- Todas querem ter uma vida de princesa, mas aposto que, quando descobrissem sobre a maldição, implorariam para desistir.
- É por isso que você será uma ótima rainha.
Olhei para ele com os ovos arregalados.
- Como?
- Muitas meninas amariam ser princesas, principalmente por causa do luxo que teriam. Mas quando se tratasse de uma maldição, especialmente uma que as impediriam de sair de casa, uma que a fizesse abrir mão do amor do único cara que amou em toda a sua vida e a obrigasse a ter que matar sua própria irmã, elas apenas ficariam em casa chorando até seus olhos começarem a sangrar. Até que alguém segurasse em sua mão e a fizesse cravar uma adaga sua própria irmã.
- Mas isso foi exatamente o que eu fiz.
- Não. Pode até ser que a parte de cravar uma adaga em sua própria irmã seja, mas a parte de ficar chorando até os olhos sangrarem passou longe. – ele olhou para mim novamente – Lorenzo me contou que você estava disposta a morrer pelo seu reino. Ele disse que você fugiu do próprio conforto do seu castelo e tentou fugir para encontrar Lucy e tentar matá-la, mesmo sabendo que você não mataria nem mesmo uma mosca. Você se arriscou, mesmo sem saber se iria retornar e, pelo o que eu escutei de você, sei que você tinha certeza que não iria voltar. Ainda assim, você seguiu em direção à sua sentença de morte apenas para salvar o cara que ama. Não se é todo dia que a donzela se torna a heroína.
- Bem, isso é o que nós vamos descobrir.
- Acho que vocês não estão entendendo. Eu não quero estar aqui e eu daria tudo para sair desse mundo porque esse acampamento é apenas para treinamento de soldados, não para princesas que decidiram aproveitar um pouco a vida. Eu já sou uma mulher. Posso tomar minhas próprias decisões.
- Amadurecer não é apenas sair com amigos para alguns clubes e pubs e beber algumas. Não é apenas sobre ganhar sua carteira de motorista ou ter sua primeira vez, isso é o ciclo normal da vida. Todos vão passar por isso. Amadurecer é como você vai encarar todas essas fases da vida, se você vai continuar se comportando como uma criança e fazer tudo sem pensar nas consequências ou se você vai encarar como um adulto e pensar duas vezes antes de fazer alguma coisa. Às vezes, temos que nos comportar como crianças e fazer tudo em um impulso porque pensar duas vezes te impede de ter os melhores momentos de sua vida. Mas, muitas das vezes, temos que nos comportar como adultos e pensar nas consequências de nossos atos, principalmente em quem vamos machucar com isso. Agora depende de nós sabermos em que momentos vamos nos comportar de qual maneira. – ele parou, o que fez com que eu parasse também – O acampamento pode servir apenas para o treinamento de soldados para você, mas, para aquelas que já passaram por aqui, pode acreditar que é mais que isso. Esse lugar vai mudar você e, antes que você perceba, seus valores estão retomados. Seu alojamento é aqui. – ele apontou para a pequena cabana atrás de mim. Olhei para trás e rolei os olhos – Boa sorte com sua nova vida de camponesa.
Ele sorriu, e eu tive a certeza de que ele estaca caçoando de mim.
Respirei fundo e me virei para encarar os três degraus que me separavam do meu futuro. Subi os três degraus, sentindo um pequeno enjoo em meu estômago, imaginando quantas teias de aranha e quantos tipos de inseto eu teria de encontrar quando abrisse a porta desse alojamento que deveria existir muito antes dos dinossauros.
Abri a porta e, para a minha surpresa, não era cheiro de mofo que eu sentia e, sim, de lavanda. O quarto era grande, considerando que apenas uma pessoa iria morar nele. Logo ao lado de uma escrivaninha, estavam minhas malas. Olhei para o lado e vi duas camas, e uma estava mal feita, com a aparência de que acabara de ter sido usada. Franzi o cenho e dei alguns passos, escutando o chão de madeira ranger debaixo dos meus pés. Em seguida, a porta à minha frente se abriu e uma mulher saiu lá de dentro segurando uma adaga em sua mão.
- Quem é você? – perguntamos as duas ao mesmo tempo.
- Eu perguntei primeiro. – falei, cruzando os braços.
- Eu perguntei primeiro? Sério? – ela soltou uma gargalhada – Você acha que isso aqui é o maternal? – ela andou em direção à cama que estava mal feita – Se você não notou, está muito velhinha para brincar de quem chegou primeiro.
- E você está se achando a Shena, a princesa guerreira, com essa faca.
- Prefiro ser a Shena a uma princesinha fresca.
- Eu não sou... – comecei, mas parei no mesmo instante – Do que você se chamou? De princesinha fresca? Quem te disse isso?
- O quê? Que você é uma princesa? Bem, acho que não só eu, mas toda a população de Florença sabe que você é a filha do rei. – ela pegou uma bolsa e a colocou em cima da cama, abrindo-a em seguida – Mas nem todos sabem o porquê de você estar aqui.
- E você sabe?
- Lorenzo não consegue esconder nada de mim. – ela tirou um casaco de dentro da bolsa e a fechou – E ele precisava também de um motivo para que George deixasse você entrar e, principalmente, para que eu deixasse você dividir o alojamento comigo. A princesinha que virou uma adolescente rebelde depois que conheceu um garoto britânico e decidiu curtir a vida. – ela jogou a bolsa no chão outra vez e pude senti-lo tremer debaixo dos meus pés – Você não merece estar aqui – ela começou a andar em minha direção –, enquanto vários cidadãos de Florença o desejam para que possam dar às suas famílias uma vida que nem que trabalho por um ano inteiro poderia dar. – ela parou à minha frente – Agora me diga por que você, alguém que claramente não quer estar aqui, tem o direito de tirar o lugar deles? – ela deu um passo para trás – Oh, por que o rei não consegue controlar sua filha e com quem ela anda?
- Você não sabe do que está falando.
- Tanto quanto sei, como posso afirmar que, enquanto você estiver nesse acampamento, eu vou tornar sua vida um inferno.
- Cassie, – Lorenzo colocou a cabeça para dentro do quarto – posso falar com você um minuto?
- Claro. – ela olhou para ele e depois para mim – Você deu sorte, novata, – ela começou a andar até a porta – mas não conte com a sorte nos próximos dias. Porque ela com certeza não estará ao seu lado. – ela abriu a porta e, quando estava prestes a sair, virou-se novamente para mim e continuou: – E antes que eu me esqueça, todo mês nós nos reunimos em volta da fogueira para compartilhamos um pouco de nossas vidas. Mas eu acho que todos já sabem como sua vida é, hein, princesinha? Não se atrase.
Ela bateu a porta com força, o que fez com que eu me assustasse.
E foi aí que eu senti as lágrimas caírem pelo meu rosto.


Capítulo 32 – Feel

Entrei embaixo do chuveiro e deixei a água descer por meu corpo, fazendo-o relaxar por inteiro. Fazia algum tempo que eu não relaxava em um banho. Na verdade, fazia algum tempo que eu não relaxava e parecia que a tensão já fazia parte do meu corpo, como se fosse um órgão ou um membro.
Cassie cumpriu sua palavra quando disse que transformaria minha vida em um inferno. Desde que cheguei aqui, há um mês, ela havia feito minha vida um pouco mais complicada a cada dia que se passava e, como se não fosse possível, ela fazia questão de me lembrar o quanto eu não era bem-vinda e o quanto ela desejava que eu pedisse para sair, ajoelhada aos seus pés. Até eu pensei que faria isso depois da primeira semana nesse lugar, mas a vontade de mostrar o quanto ela estava errada a meu respeito, me fazia sempre deixar para a semana que vem, e na próxima, e na próxima... Quando percebi, já fazia um mês que eu estava nesse lugar.
Lorenzo me ignorou completamente durante esse mês. Por mais que eu pudesse ver seu olhar suplicante todas as vezes que Cassie me destratava, ou fazia com que eu repetisse uma rotina inteira pela quarta vez, ele não fazia nada. Apenas olhava, enquanto ela se divertia me maltratando. O treinamento que Cassie comandava era composto apenas por uma integrante, o que permitia que ela desse total atenção para cada passo que eu dava, tornando o meu treinamento praticamente impossível. Como se não fosse pior, ela decidira que o treinamento que eu teria seria o formazione precedente, um dos mais velhos treinamentos aplicados no acampamento e um dos que se apresentava da lista de “praticamente impossíveis” entre os novatos e veteranos. Enquanto os outros aprendiam a atirar com armas de fogo, eu estava sendo nocauteada com golpes vindo de uma espada feita de bambu.
Eu não acreditava naquele mito que dizia que as pessoas sonhavam no dia em que pudesse trocar de papeis com nobres e fazer deles escravos de todas as suas vontades. Não acreditava até o dia em que conheci Cassie. Sei que nobres poderiam ser desprezíveis, eu conheci alguns deles e desejei nunca mais ter que encontrá-los outra vez, mas isso não era motivo para maltratar um ser humano. Na maioria das vezes – senão todas –, você realmente não sabe o que se passa na cabeça de uma pessoa, você não sabe o que ela passou até se transformar no que é hoje. Cassie não tinha ideia do que eu havia passado, até porque se eu apenas começasse a contar a historia da minha vida, ela, provavelmente, deixaria toda aquela arrogância de lado e começaria a correr, desejando nunca mais cruzar meu caminho.
Ri sem humor e desliguei o chuveiro. Escutei o barulho da porta batendo, o que fez com que eu rolasse os olhos. Só pode ser Cassie esperando para fazer minha vida um pouco mais difícil, pensei, começando a me enxugar.
Era típico de Cassie me maltratar não apenas na hora do treinamento, mas dentro do alojamento também. Foram as inúmeras às vezes em que eu tive que sair no meio da noite para procurar meu colchão e encontrá-lo em cima do telhado do alojamento de Lorenzo e George. Como Cassie sabia que eu e Lorenzo não estávamos tendo o melhor momento de nossa amizade, ela fazia questão de me irritar o máximo possível quando o assunto era Lorenzo. Até que eu desisti e, em uma dessas noites, me encontrei com Kyle, que queria fugir do seu colega de quarto que roncava como um porco. Juntos, encontramos um alojamento, um pouco mais afastado dos outros, que se tornou nosso refúgio de todas as noites.
Kyle era um cara incrível e estava no acampamento apenas pelo dinheiro e regalias que os guardas recebiam. Ele sempre disse que não esperava a hora de sair do acampamento para poder ir para faculdade, já que queria ser engenheiro. As famílias dos guardas recebiam uma boa quantia em dinheiro quando seus filhos eram escolhidos para ir ao acampamento e esse era o maior motivo para a maioria de eles estarem aqui. Não era apenas sobre o dinheiro, também tinha os estudos que seriam pagos para que eles escolhessem se continuariam sendo guardas ou seriam algo a mais. A maioria dos homens que eram trazidos pra cá era composta por homens de famílias que não tinha uma condição de pagar por uma faculdade sozinhos ou eram famílias em que os pais já estavam velhos demais para continuarem servindo ao castelo.
E em uma dessas conversas, eu descobri o motivo de Cassie me odiar tanto. Segundo Kyle, Cassie entrou no acampamento para ajudar o seu pai, um senhor doente que passava a maior parte do tempo deitado em cima de uma cama, pois suas pernas já não respondiam aos seus comandos. Ela precisava do dinheiro e de um plano de saúde que pudesse pagar pelo tratamento de seu pai e, ao entrar no acampamento, ela conseguiu isso. Porém, a felicidade não durou muito, pois seu pai faleceu meses depois. Cassie ficou devastada, mas alguém teria que pagar as contas da casa e seu irmão não tinha atingido a maior idade ainda, então ela assumiu o posto de uma das instrutoras do acampamento.
- Mas o que isso tem a ver comigo? – perguntei a Kyle na hora – Minha família só tem ajudado a família dela. Por que diabos ela me odeia tanto?
- Você roubou o lugar do irmão dela de entrar no acampamento esse ano. Lorenzo decidiu que você entraria, pois precisava mais do qualquer outro, e Cassie ficou furiosa e quase estrangulou Lorenzo na mesma hora. Foi aí que ele explicou sua história.
- E como você sabe disso?
- As pessoas falam principalmente o motivo de você ser a única a ter aquele treinamento.
- Pensei que era só por ciúmes do Lorenzo, mas agora eu entendo. Não que justifique o jeito que ela me maltrata.
- Às vezes, eu acho que Lorenzo vai falar alguma coisa.
- Lorenzo me odeia. E eu não o culpo por isso.
- Ele vai te perdoar, você vai ver.
- Assim espero.
Saí do banheiro, lembrando-me da última conversa que eu e Kyle tivemos em cima do telhado do velho alojamento. Kyle era o único amigo que eu tinha, o único que não me olhava com o nariz empinado por causa do meu título e entendia o que eu estava passando. Ele realmente entendia.
Andei em direção ao espelho e olhei meu reflexo no mesmo. Eu estava mais magra e um pouco musculosa, mas cheia de hematomas por causa do treinamento de espadas de bambu. Cassie tinha acabado comigo. Peguei minha calça em cima da cama, a vesti em seguida e senti minhas costelas doerem enquanto eu me abaixava.
Dei um pulo logo que escutei a voz de Kyle vindo da porta.
- Você deveria colocar um remédio nisso.
- Meu Deus, Kyle, você não bate não? – perguntei, começando a colocar minha camisa.
- Só quando Cassie está aqui. Ela é meio assustadora. – ele falou e fez uma careta enquanto andava em minha direção – Como você está se sentindo?
- Bem. – respondi, sentando-me na cama para colocar meus coturnos.
- Tenho certeza de que você consegue formar uma frase. – ele se sentou ao meu lado.
- Eu estou bem.
- A maior mentira de todos os tempos.
- O quê? – olhei para ele enquanto amarrava os cadarços – Eu estou bem. Não há nada com o que se preocupar.
- Isso é o que me preocupa. Você não se importa consigo mesma.
- Do que você está falando?
- Devemos começar pelo fato de que eu posso ver a dor em seus olhos em todo movimento que você faz e, mesmo assim, você não pede um dia de descanso para Cassie.
- E se eu pedisse, ela daria? – coloquei meus pés no chão – Claro que não, Kyle, ela me odeia.
- Por que você não fala com Lorenzo?
- Porque ele me odeia também.
- Não, ele não te odeia.
- Claro que sim.
- Mas vocês eram tão amigos.
- Eu sei, mas as coisas mudaram agora. – levantei-me – Eu causei muito mal a Lorenzo, e não só para ele. Eu mereço o que eu estou recebendo.
- Ninguém merece ser espancada e ficar cheia de hematomas.
- Você quer que eu desista? Quer que eu vá chorando pedindo para que Lorenzo ligue para o meu pai para me tirar daqui? Todo o meu esforço nesse mês que eu estive aqui não valeria para nada. Seria como desistir. E eu não quero fazer isso.
- Parece que você gosta de apanhar.
- Na verdade, eu não gosto. Mas ver a cara de ódio de Cassie depois que eu termino uma sequência de obstáculos sem um erro não tem preço. – falei, levantando-me e sentindo uma dor nas costelas.
- O que foi?
- Ela me bateu com força com aquele bambu.
- Eu tenho um remédio. Aliás, era isso que eu vinha te entregar. – ele se levantou – O Lorenzo disse que você talvez fosse precisar. – olhei para ele – Acho que ele quer se redimir.
- Ele pode se redimir não me olhando com cara de pena.
- Levante sua blusa. – ele me ignorou, e eu fiz o que ele pediu. Kyle passou o remédio em cima do grande hematoma que tinha em minhas costelas. Senti o remédio gelado em contato com minha pele, fazendo- a queimar – Se estiver queimando, quer dizer que o remédio está começando a sarar.
- Você já pensou em ser médico? Você tem jeito com as pessoas. Você as entende e, ainda por cima, resolve seus problemas.
- Talvez ele possa resolver o seu.
Olhamos os dois para a porta, onde Cassie estava parada com aquela cara de psicopata que ela tinha.
- Vocês sabiam que não é permitido que um homem e uma mulher fiquem sozinhos em um alojamento, principalmente se um deles está quase sem camisa? – ela perguntou. Afastei-me de Kyle e abaixei minha camisa.
- É mesmo, Cassie? Então você deveria parar de fazer visitas noturnas no alojamento de Lorenzo. – o sorriso no rosto dela desapareceu – O que foi, Cassie, não gosta que as pessoas comentem sobre sua vida? Pois deveria parar de dar palpite na dos outros. Vamos, Kyle.
Peguei Kyle pelo braço e caminhamos até a porta. Desviamos de Cassie e saímos do alojamento em direção à pequena estrada de areia que iria nos levar até o local onde a fogueira seria.
- Soldado, eu ordeno que você volte aqui! – ela gritou da porta do alojamento.
- E eu lhe peço, encarecidamente, que você cale a boca. – falei, olhando para ela, enquanto andava de costas.
- ! – Kyle me pegou pelo braço, fazendo com que eu olhasse para ele – Você não deveria fazer isso. Ela é sua supervisora.
- Bem, ela atravessou essa linha quando colocou minha vida pessoal no meio do meu treinamento.
- Eu só acho que você deveria tentar ter o pavio mais longo quando o negócio é a Cassie.
- Maior do que eu já tenho?
- Quase infinito.
- Não posso prometer que vou, mas posso tentar.
- Isso já é um começo. – ele se sentou em um tronco e me puxou para o seu lado.
- Se não fosse você, eu estaria perdida nesse lugar. – falei, colocando minha cabeça em seu ombro. Olhei para frente e vi Cassie chegar com Lorenzo ao seu lado. Ela estava bufando.
- Acho que já podemos começar. – George falou – Então, quem quer começar? Alguma crítica? Alguma reclamação? Alguma recomendação? Alguém quer falar alguma coisa?
A fogueira era parecida com uma terapia em grupo. Todos vinham e falavam dos seus problemas, suas famílias, histórias engraçadas ou não. Era um modo de deixar com que os soldados lembrassem-se de suas famílias e se esquecessem um pouco das dores físicas.
- Acho que a deve começar. – Cassie falou, o que fez com que todos olhassem pra mim – Desde que ela chegou, ela não falou nada. É como se mal a conhecêssemos.
- Acho isso impossível. Todos sabem quem eu sou e minha histórias.
- Mas não se deve acreditar em todos os rumores.
- Rumores? Acho que você quis dizer histórias.
- Isso também.
- Como assim isso também?
- Você sabe, as pessoas falam.
- Melhor você falar logo de uma vez e dizer aonde você quer chegar do que ficar enrolando. Outras pessoas querem falar.
- Vamos falar da sua irmã.
Engoli em seco.
- O que você quer falar sobre ela?
- Devo começar pela irresponsabilidade ou você quer falar da vida leviana que ela levava em Londres?
- Cassie, você deveria controlar sua boca. – avisei, respirando fundo.
- Por quê? Por acaso, eu estou dizendo alguma mentira? Sua irmã não era uma irresponsável e, por causa dela, vários antigos guardas tiveram que voltar à ativa porque ela não conseguia controlar a língua?
- Cassie, você deveria respeitar a memória de Lucy.
- Por quê? Ela respeitava alguém desse acampamento? Quantos de vocês não foram levados até o rei com ordens de não encostarem um dedo nas filhas dele, caso contrário seriam cortados os fundos de ajuda financeira para suas famílias?
- Se você olhar em volta, Cassie, a maioria deles são novatos. E pelo o que eu saiba, não estiveram com Lucy.
- Que você saiba.
- Eu já escutei demais. – falei, levantando-me.
- Isso mesmo. Volta para sua caminha e vai chorar sentindo falta dos seus criadinhos que faziam tudo por você.
- Você não tem coração não, garota? – perguntei, virando-me para ela.
- Eu tenho sim. Quem não tinha era sua irmã e, pelo visto, você também. Nenhum telefonema, nenhuma carta, nem mesmo uma mensagem trazida por alguém...
- Do que você está falando?
- Do fato de você não ter ninguém. Vai ver o mal da Lucy passou inteiramente para você. Vai ver é uma coisa de genética.
- Você sempre tem que colocar as pessoas para baixo para essa sua mente diabólica se sentir melhor? Você fala como se só você tivesse sofrido na vida!
- E você já sofreu alguma vez? Pelo quê? Papai não deu o sapato do mês que você queria?
- Não, Cassie, eu não sou fútil a esse ponto. Eu perdi alguém que eu amava, não só uma pessoa, mas várias. Você sabe como é perder alguém?
- Sei, eu tive que te aceitar nesse acampamento enquanto meu irmão podia estar aqui. Aceitar alguém que foi arrastado porque o papai não conseguiu controlar.
- Não, Cassie, eu estou falando de perder alguém de verdade e, ainda por cima, ser motivo que a levou embora.
- .
- Não, Lorenzo, ela tem que saber, não era isso que era queria? Então é isso que ela vai ter. Ela tem que saber que eu também sofri e, por mais que ela me odeie por ter roubado o lugar do irmão dela nessa droga de acampamento, ela não tem o direito de me tratar dessa maneira. – olhei para Cassie – Você, pelo menos, tem ideia do que está falando? Você, por acaso, conheceu alguém da minha família? Você conheceu Lucy? E quando eu falo de conhecer, não digo apenas o que as pessoas falavam dela ou a ideia que você tinha dela, eu falo de conversar, de conviver. Você conviveu com ela, Cassie? Porque, pelo o que eu estou vendo, você deixou bem claro que prefere a forca a conviver com alguém da realeza. Você não me conhece, você não conheceu Lucy ou algum membro da minha família. Você acha que conhece, mas, na verdade, você não sabe um terço do que se passa naquele castelo e, muito menos, o que se passa dentro da cabeça de uma pessoa como eu. E sabe por quê? Porque você não ia aguentar um dia na minha vida e não estou falando apenas de ter que usar aqueles vestidos patéticos, saltos desconfortáveis e ter que aturar pessoas querendo tirar proveito de seu título a cada segundo que você respira. Eu estou falando de muito mais, de algo que as perfeitas filhas do rei jamais poderiam imaginar em passar. Você sabe por que as festas são todas feitas dentro do castelo? Por que nem mesmo a praça da independência pode ser usada no dia da independência? Você sabe por que o rei não pode passar das 23h em uma das feiras das nações que acontecem todos os meses nas ruas de Florença? Você, pelo menos, tem alguma coisa dentro dessa sua cabeça que só vê o pior das pessoas e julga os outros sem nem ao menos ter trocado uma palavra com eles, hein? – dei um passo para frente – Qual a desculpa mesmo que eles usam? Oh, porque as filhas do rei não podem. E não tem nada a ver com sonho de beleza, afazeres reais e fúteis do dia seguinte, tem a ver com proteger as pessoas que nós amamos. Tem a ver com proteger nosso reino e todos aqueles que estão nele. – dei outro passo à frente – Aposto que você já ouviu falar da maldição menzanotte, certo? Mas é claro que sim, qualquer cidadão sabe da lenda que acompanha o sobrenome do rei. As pessoas gostam de lembrar que algo de ruim já aconteceu em nosso reino e que nós sobrevivemos a isso, mas o que eles não sabem que ela não só existe, como foi alterada para que fosse “bem vista” para os leitores do livro. E você sabe o que diz nessa versão ilimitada? Que o bem deve prevalecer sobre o mal. A rainha daria a luz para duas meninas, sendo que a primeira só traria sentimentos ruins para o reino e a segunda seria pura de coração para que a maldição fosse quebrada, fazendo com o que o reino vivesse feliz para sempre. Para isso, a garota pura de coração deveria matar sua própria irmã pelo bem de todos. E caso ela não o fizesse, sua irmã tomaria o reino e só traria mal, desgraça e sofrimento ao seu reino. As duas teriam que se enfrentar depois que tivessem idade o suficiente, depois que as palavras “eu te amo” saíssem de sua boca para se libertarem da maldição. E você sabe o que é mais sarcástico nisso tudo? Ambas as irmãs terem se apaixonado pelo mesmo homem. Como se não pudesse piorar, ele tinha que ser descendente da bruxa que jogou a maldição em sua família. O que torna essa história mais sinistra é um livro velho, escrito por um velho, que decide o destino de um ser humano. E o pior é as pessoas acreditarem nele e fazerem com que eu matasse minha própria irmã.
- Você matou sua irmã? – ela gaguejou.
- Eu precisava fazer isso, não só para ficar com o mocinho, que acabou me abandonando no fim, mas também para proteger o meu povo. E sabe o que é o pior disso tudo? É que eu não posso sentir nem um pingo de arrependimento, nem um pingo de remorso e, muito menos, saudade da minha própria irmã porque ela queria transformar Florença em um inferno. Mas você, Cassie, me fez pensar que talvez eu deveria ter morrido, porque aí você saberia o que é o real sofrimento e o que o inferno se parece. Porque, mesmo fazendo tudo por esse reino, você abre essa sua boca para soltar piadas patéticas e sarcásticas sobre pessoas que você nem conhece. – cheguei mais perto dela – Lucy podia ser uma vadia sem coração e até querer transformar Florença no reino em que todos a temeriam, mas, no fim do dia, ela ainda era minha irmã. E ela ainda é minha irmã. Então, se você abrir essa boca outra vez para falar mal dela, eu vou fazer com que sua vida se torne um inferno e pode apostar que Lucy seria comparada a um anjo depois que você provasse do meu veneno. – limpei as lágrimas do meu rosto e coloquei-me ereta outra vez – E se o problema é o dinheiro, não se preocupe. Eu posso arranjar para você, pois dinheiro não é problema para uma pessoa como eu. Aproveitem sua fogueira.
Girei em meus calcanhares, pisando fundo para longe daquela fogueira. Eu podia sentir as lágrimas ainda descerem por meu rosto, além de ofegar a cada passo que eu dava. Parecia que eu havia tirado um peso de minhas costas e agora a única coisa que me restava fazer era me derreter em lágrimas, como eu nunca havia feito. Não só por Lucy, mas por todos aqueles que eu maltratara ao longo do meu caminho. Eu sabia que o que eu tinha feito não era certo e, muito menos aceitável. Eu estava certa ao me divertir, mas, ao ultrapassar os limites, acabei perdendo a razão e aqueles que eu mais amava, um a um. Papai me odiava, Lorenzo me desprezava, havia ido embora, mamãe não me escrevia e, muito menos, tentou ligar. O pior de tudo era que eu tinha perdido Lucy.
Às vezes, esconder de nós a verdade sobre a maldição realmente fora preciso, pois a maldição era a única coisa que nos mantinha juntas e fazia com que aproveitássemos tanto tempo juntas porque nós entendíamos a dor. Uma dor como ninguém conseguia. Ninguém realmente sabia o que era viver com aquela maldição. Podiam até imaginar, dar palpites e admirar o quanto éramos fortes por estarmos sempre sorrindo sem deixar um rastro do que realmente acontecia quando a noite chegava. Mas a imaginação não chega nem um perto quando se está vivendo o momento – no nosso caso, vários momentos.
A maldição podia ter acabado e tirado a única pessoa que me entendia, mas ela não tiraria a saudade que eu sentia no meu peito. Eu amava Lucy e não teria um ser humano que diria o contrário.
Abri a porta da cabana, sentindo-me um pouco tonta. Coloquei a mão na testa e a senti molhada. Apoiei-me no móvel ao meu lado, até que minha vista ficou turva. E como um blackout, eu pude sentir todo o meu corpo cair no chão de costas. Fechei meus olhos, sentindo todo o meu corpo arder de baixo para cima e, logo, um grito saiu da minha garganta. Meu coração pulava do meu peito como nunca tinha feito antes, apenas quando eu estava perto de . Antes que eu pudesse abrir meus olhos outra vez, ou soltar um grito pedindo ajuda, o rosto de apareceu em minha mente. Seus olhos esverdeados. E, oh, seus olhos me encarando enquanto Londres se tornava nossa em cima daquela roda gigante. Seu sorriso quando viu o meu sorriso ao invadirmos o aquário dos golfinhos. Seus lábios sobre os meus me fazendo sentir todo o amor que ele carregava dentro do peito. Sua voz pronunciando que não iria me abandonar, e sua doce voz quando dizia com todas as letras que me amava. Seus braços fortes quando me rodeavam, parecendo que nunca iriam me deixar sair, ou quando ele estava bravo comigo, aqueles mesmos braços cruzados em seu peitoral de uma forma autoritária. Oh, como eu amava quando ele fazia isso.
Por último, seu corpo sobre o meu enquanto nos tornávamos um naquela noite em minha casa quando a chuva caía lá fora. Por mais que os acontecimentos seguintes tenham estragado uma reconciliação, eu não me arrependia nem por um segundo por ter feito aquilo.
E a imagem havia trocado outra vez de lugar. Agora, eu estava em Londres. No primeiro dia de aula, no momento em que eu conheci . Logo depois, estávamos no jogo, olhando os garotos. Depois, estávamos em minha casa, no momento em que eu lhe contei que eu era uma princesa. havia sido a amiga que eu havia pedido a Deus, e eu não estava dando valor a isso. E a imagem da nossa briga pelo jeito que eu estava agindo apenas para impressionar um cara surgiu. E, agora, estávamos as duas, com sorrisos nos rostos, enquanto nos arrumávamos para sair como os caras que nos faziam suspirar.
E logo, a imagem do povo de Florença me veio à cabeça. Lorenzo, Marta, Betty, John, Marcus, Gaspier, Monna e Lucio. Todos aqueles que haviam me ajudado quando eu morava em Florença e tinha que aguentar aquele bando de frescos.
De repente, tudo ficou preto outra vez. Antes que pudesse pensar em abrir os olhos, meu sangue começou a borbulhar dentro de minhas veias novamente, um grito mais alto saiu de minha garganta, fazendo com que meu corpo arqueasse no chão. A lembrança de meu pai, minha mãe e Lucy, juntos como uma família, apareceu diante de meus olhos como um filme. Desde o começo, quando éramos crianças e vivíamos todos juntos no palácio, e eu e Lucy ficávamos correndo pelo gramado enquanto mamãe e papai estavam encostados em uma árvore com sorrisos nos rosto. Até quando mamãe teve que ir embora com Lucy, sem nem ao menos dizer adeus. Eu me lembro que, naquele dia, eu senti todo o meu corpo doer e o sangue em minhas veias ferverem como uma chaleira a ponto de explodir. Naquele dia, eu senti lágrimas caírem de meus olhos, enquanto meu pai me segurava em seus braços e me levava para dentro do castelo, fazendo com que meu choro acabasse ao poucos. Mas, em vez disso, a imagem havia trocado outra vez, mostrando o dia em que minha mãe chorava em meus braços. Meu corpo arqueou mais uma vez, e eu pude sentir minhas mãos se contraírem em punhos fechados e começarem a bater no chão atrás de mim. A imagem de Lucy e eu tinha acabado de tomar conta da minha vista. Nós estávamos indo até um estúdio de tatuagens do amigo dela no seu aniversário de dezesseis anos. Flawless Curse, era o que as tatuagens diziam. Por um momento, estávamos as duas sorrindo e levando uma bronca de mamãe e papai pelo nosso ato não pensado. E a imagem foi trocada e nós estávamos naquele maldito castelo, brigando como duas gatas; rolando no chão e tentando salvar nossas próprias vidas. Subitamente, os olhos de Lucy se arregalaram, e eu pude sentir o sangue dela descer pela faca até chegar à minha mão, mas havia algo que eu tinha ignorado naquele dia, algo que ela tinha dito em seu último suspiro: Você sempre será minha irmã, .
O sangue em minhas veias percorria como um vulcão prestes a entrar em erupção. Minha pele formigava como se facas fossem cravadas lentamente em minha pele. Eu sentia que todo o meu corpo não aguentaria tanta pressão. Minha cabeça parecia estar a ponto de explodir e a única coisa que eu podia fazer era gritar enquanto eu me debatia no chão.
Eu estava sentindo outra vez. Não da melhor forma possível, ou da mais fácil, mas eu estava sentindo. O amor que meus pais me deram, uma família pequena, mas feliz assim mesmo. A amizade daqueles que deveriam ser inferiores a mim, uma melhor amiga que mudou todo o meu ponto de vista sobre como uma melhor amiga deveria ser. O amor de um garoto que, por mais errado e por mais proibido que fosse, não saía da minha cabeça e, muito menos, do meu coração. E por último, o arrependimento, a culpa e a saudade daquela que, por força do destino, nunca deveria ter nascido, mas que havia me ensinado a viver. Aquela que havia dado sua vida para eu viver.
E como começou, havia terminado. Meu corpo parou de se debater no chão, deixando para trás apenas minha respiração ofegante e o suor por toda a minha testa.
- , você está bem?
Abri os olhos e vi a imagem de Lorenzo. Sorri. Antes que eu pudesse pronunciar uma palavra, tudo estava preto outra vez.

. . .
Escutei alguém falar meu nome ao longe, como um sussurro. Apertei meus olhos e tentei me levantar, mas parecia que meu corpo inteiro estava pesado. Como se algo estivesse sobre mim. Eu estava cansada e nem sabia ao certo a razão. Eu apenas estava com muita vontade de ficar na cama o dia inteiro.
Senti um beliscão no meu braço e mais alguns sussurros de longe. E outro beliscão. Ainda assim, a cama ainda era mais confortável. Foi aí que veio outro beliscão e esse fez com que eu abrisse os olhos e me sentasse na cama soltando um grito.
- Mas que droga, quem foi o imbecil que fez isso? – olhei para o lado e vi Lorenzo sentado ao meu lado – Você tem problemas mentais? Você não pode sair por aí beliscando as pessoas enquanto elas dormem. – falei, olhando para ele, que sorria – Dá pra você parar de sorrir? Lorenzo, sério, você está com um olhar meio psicótico agora. Lorenzo. – estalei os dedos em frente ao seu rosto – Hello, alguém aí dentro? Lorenzo, dá pra você...
Não pude terminar a frase. Ele pulou em cima de mim e me sufocou em um abraço.
- Eu pensei que você tivesse morrido.
- Para estar morta, o coração tem que parar de bater. Meu coração parou de bater? – ele me segurou pelos ombros – Ou eu sou um espírito que veio te atormentar, Lorenzo? Vish, coitado de você. – ele sorriu.
- Graças a Deus, você está bem.
- E por que eu não estaria?
- Você dormiu por três dias. Chegamos até em pensar que você estava em uma espécie de coma, mas o médico disse que você estava bem e só estava dormindo.
- Eu dormi por três dias? Nossa, acho que bati meu recorde.
- Nós ficamos preocupados, chegamos até a...
A porta do alojamento se abriu em um estrondo, mostrando uma mulher com os olhos extremamente vermelhos, também conhecida como minha mãe. Fazia tanto tempo que eu não a via que estava quase me esquecendo como ela era. Mas, com certeza, ela estava mais linda do que nunca.
Levantei-me da cama e caminhei em sua direção a passos largos. Quando cheguei à sua frente, não resisti em abraçá-la pela cintura como se fosse sufocá-la.
- Meu bebê, eu fiquei tão preocupada. Eu não aguentaria perder você também.
- Não é para tanto. Eu estava apenas dormindo.
- Por três dias? – ela me segurou pelos ombros – Você nunca dormiu tanto.
- Eu também nunca me esforcei tanto.
- Eu disse para o seu pai que não deveria ter te mandado para esse lugar, mas ele não me escuta. – ela olhou para meu pai, que estava um pouco atrás.
- Está tudo bem, mãe.
- Não, não está. – meu pai se colocou ao lado dela – Te mandar para cá foi uma decisão imatura. Eu não estava pensando direito.
- Tudo bem, pai. Não tem problema.
- Você não pertence a esse lugar, minha filha. Você é uma princesa, não um soldado. E é por isso que nós vamos te levar para casa.
- O quê? – perguntei, afastando-me dos dois – Sei que vocês devem ter ficado muito preocupados comigo, mas eu não vou embora desse acampamento até que meu treinamento esteja completo.
- Você não precisa ficar aqui.
- Mas eu quero. Eu não vou simplesmente largar tudo do jeito que está. Esse acampamento realmente muda as pessoas, e eu estou precisando de mudanças. E, bem, não vejo lugar melhor para começar do que viver um pouco do que aqueles que me protegeram desde o dia em que souberam que minha mãe estava me carregando. O que eu quero dizer é que posso ter nascido com sangue real, mas isso não quer dizer que eu não possa ser um soldado também.
- Você tem certeza, filha?
- Claro que tenho.
- Bem, se é isso que você quer, então quem sou eu para dizer o contrário? – ele olhou para Lorenzo – Cuide bem da minha filha.
- Pode deixar, sua majestade.
- Antes de você ir, pai, será que você poderia enviar o dinheiro que a minha família iria receber por eu estar aqui para o irmão da Cassie? Digo, eu não preciso do dinheiro e, com certeza, acho que ele faria mais proveito dele do que eu. – falei, enquanto caminhava em direção ao banheiro – Além do mais, eu tirei o lugar dele de estar aqui e não vejo nada mais justo. E dá para vocês falarem com o cozinheiro para me fazer um daqueles sanduíches bem gordurosos? – perguntei, apoiando-me no batente – Acordei com uma fome de leão. Obrigada, até mais.
Entrei no banheiro e encarei meu reflexo no espelho. É, eu realmente tinha mudado.

Capítulo 33 – The Warrior Princess

Abri os olhos e respirei fundo, puxando a maior quantidade de ar que eu podia. Parecia que eu estava me afogando, sem nenhuma chance de encontrar ar outra vez. Era o mesmo sonho pela quarta semana consecutiva – ou, para ser mais precisa, um mês – e parecia que não iria parar até que virasse realidade. Passei minha mão sobre a minha testa, sentindo-a completamente molhada, e olhei para o lado, vendo que Cassie ainda dormia.
As coisas em nosso alojamento estavam menos tensas desde meu ataque na fogueira; Cassie abaixava a cabeça todas as vezes que eu passava. Quanto ao meu treinamento, bem, continuava o mesmo, mas com um pouco menos de disciplina e ódio. Às vezes, eu achava que Cassie estava muito assustada para me olhar nos olhos depois do que eu confessei na fogueira do mês passado. Às vezes, eu até achava que ela tinha medo de que eu fizesse com ela a mesma coisa que fiz com Lucy, ou que eu cumprisse a promessa de transformar sua vida em um inferno. Mas o que Cassie não sabia era que eu nunca iria fazer algo tão maléfico com alguém, especialmente algo que eu disse em um ápice de ódio. Por mais que ela tivesse insultado a mim e a minha família, eu não teria coragem de lhe fazer mal. Algum tempo atrás, eu colocaria fogo nos cabelos dela só para ter um gostinho do que seria sua vida daqui para frente, mas, agora, depois de tudo que passei, vingança não era a solução.
Levantei-me, colocando meus pés gelados no chão. Calcei meus tênis, vesti um casaco e olhei para o relógio ao lado da cama, que marcava meia-noite. Revirei os olhos antes de andar em direção à porta do quarto.
Parecia que todo o meu mundo tinha virado de cabeça para baixo depois que cheguei aqui e, ao mesmo tempo, tudo fazia sentido. Meus pais e Lorenzo poderiam ter me colocado nesse acampamento apenas como uma forma de me mostrar que nem sempre ser uma princesa poderia lhe salvar de sofrer as consequências. Porém, agora, eu sentia que era mais que aquilo. Viver nesse acampamento tinha aberto meus olhos para a vida, além de ter me dado um motivo para avaliar o que eu havia me tornado e o mal que estava causando para todos aqueles que me amavam. E também quantas desculpas eu precisaria pedir depois que saísse desse lugar. “Desculpe” seria a palavra mais dita por mim nos próximos cem anos.
Abri a porta e coloquei os pés para fora, sentindo o ar gelado da noite. Desci a pequena escada e fui em direção à estrada de terra. Kyle, com certeza, estaria acordado me esperando no telhado de seu alojamento, já que seu companheiro de quarto havia decidido tirar-lhe o sono todas as terças. Olhei para cima e, ao ver o telhado de seu alojamento vazio, lembrei-me rapidamente de que hoje, além de não ser terça-feira, era o dia em que Kyle ficaria de guarda. Girei meus calcanhares de volta à estrada, olhando para cima e tentando vê-lo em cima da torre ao lado do portão. Assobiei, tentando chamar sua atenção e fazer com que ele se virasse para mim e acenasse freneticamente. Mas, antes que eu pudesse acenar de volta, Kyle estava sendo golpeado nas costas.
Abafei um grito e fui em direção ao arbusto mais próximo para me esconder. Escutei passos, mas não de simples botas, e sim, botas de cowboys que faziam aquele pequeno barulho desagradável e que só podia ser escutado em filmes de faroeste.
- O nosso espião disse que a princesa está no último alojamento. – um dos homens falou – Ele também disse que ela é dura na queda.
- Todas elas são no começo, mas aposto que ela vai chamar pelo pai dela rapidinho. – outro respondeu.
- E os outros guardas? O que nós faremos com eles?
- Quando eles perceberem, já vai ser tarde. Nossa princesa já vai ter virado churrasco até lá.
Engoli em seco ao ver os dois rirem enquanto andavam em direção ao meu alojamento. Esperei para que eles estivessem mais afastados para abrir a janela que estava ao meu lado e pular para dentro do alojamento.
Senti minhas costas baterem no chão e um cano de uma arma ser apontado em meu rosto.
- Que belo jeito de receber visitas, Lorenzo. Desse jeito, elas, com toda certeza, irão sempre voltar. – falei, empurrando a arma para o lado e conseguindo finalmente me sentar.
- O que você pensa que está fazendo aqui? E por que você entrou pela janela? Já esqueceu seus modos, princesa?
- Poupe-me do seu sarcasmo.
- E em alguma situação você poupou o seu? – ele perguntou. Revirei os olhos e dei um impulso para ficar de pé – Por que você está aqui?
- Porque estamos sendo atacados. – falei, limpando a poeira de minhas mãos – Nossa! Isso definitivamente soa bem melhor em filmes. – olhei para Lorenzo.
- E como você sabe disso?
- Bem, Kyle não está...
- Você não larga desse menino, hein, ? – ele colocou a arma no ombro – Vocês vivem juntos para cima e para baixo, conversando todo o tempo... Não sei como vocês ainda têm assunto.
- Não gostei muito do tom da sua voz, mas não temos tempo para isso, então lidaremos com isso outra hora. Temos coisas mais importantes para fazer.
- Só devem ser um bando de outro acampamento. Eles sempre fazem isso. Eles vêm, pregam uma peça na gente e depois vão embora se achando os campeões, pensando que somos principiantes como eles. Não se preocupe, não há nada do que se preocupar.
- Nessa brincadeira, a frase “Nossa princesa vai ter virado churrasco até lá” está incluída?
- O quê? De onde você tirou isso?
- Um dos caras que está indo em direção ao meu alojamento tentar me matar falou.
- Mas se você está aqui, eles não podem te fazer nenhum mal. Nós podemos cuidar deles rapidinho.
- Mas Cassie está lá e aposto que, nesse escuro, eles não vão fazer perguntas.
Lorenzo olhou para mim com os olhos arregalados.
- Eu vou até lá. – ele andou em direção à porta, mas eu o impedi – Me larga, .
- Nós precisamos de um plano e, para o seu alívio, eu tenho um.
- Você tem um plano? Desde quando você pensa tão rápido?
- Acho que o treinamento da Cassie está fazendo efeito, afinal de contas. – falei, largando seu braço – É o seguinte: você vai atrás dos outros pedir ajuda. Eles, provavelmente, não vieram sozinhos e sabem que você irão me proteger acima de tudo. Então, sugiro que você saia pela porta dos fundos para ser mais discreto. Depois que você chamar os outros, certifique-se de que o acampamento está em nossos cuidados outra vez e que não exista nenhuma opção para eles fugirem, aí nós pegamos eles.
- E quem vai salvar a Cassie?
- Eu vou.
Lorenzo prendeu o riso.
- Melhor você chamar os guardas, e eu vou salvar Cassie.
- Eles não confiam em mim e, muito menos, gostam de mim. É capaz de, quando eu aparecer em seus quartos, eles correrem pensando que matarei cada um deles. Se você não percebeu, aos olhos de todos aqui, eu sou uma aberração que matou a própria irmã.
- ...
- Não temos tempo para isso. Vá logo antes que seja tarde demais.
- E como você pretende distrair esses caras?
- Não sei, usando meu sarcasmo. – Lorenzo riu pela segunda vez.
- Ou você pode usar algo que é seu por direito. – ele andou em direção ao guarda-roupa.
- Nossa, Lorenzo, roupas vão nos ajudar agora com certeza. – falei, cruzando os braços. Ele olhou de relance e abriu o guarda-roupa, mostrando o arsenal de armas que eles guardava ali dentro.
- Seu pai não queria te dar logo no seu aniversário de dezesseis anos, – ele começou a falar enquanto retirava algo de lá – ele dizia que você era muito delicada para, pelo menos, segurar uma dessas. – ele se virou para mim, mostrando uma katana – Ela foi criada por um mestre em espadas de samurais há muito tempo atrás. Seu tataravô tinha muitos amigos e o mestre Khami era o seu braço direito. Seu tataravô não gostava muito de armas, ele as achava um tanto quanto rústicas e deselegantes, então o mestre Khami fez essa espada para seu tataravô e o ensinou tudo que ele sabia. – ele colocou a espada em cima de minhas mãos que estavam esticadas – Ela deveria pular uma geração, já que seu pai teve apenas meninas, mas vejo que dessa vez não será o caso.
Segurei a espada pelo cabo, tirando-a da bainha de proteção, e a girei com meu punho. Ela não era tão pesada quanto aquelas que eu usava em meus treinamentos. Era leve, como se tivesse sido feita especialmente de acordo com o peso que eu deveria suportar.
- Por que você não me deu essa espada antes? As que eu treino são bem mais pesadas do que essa.
- Porque eu estava esperando o momento certo.
- Que momento certo, Lorenzo?
- Quando você voltasse a ser quem você era.
- Mas eu não sou a mesma.
- Eu sei, – ele sorriu e foi em direção à porta dos fundos – você voltou uma versão melhor de você. Da verdadeira você.
Ele saiu pela porta dos fundos, sem nem olhar para trás. Peguei-me sorrindo enquanto olhava para a espada. Havia algo escrito em sua lâmina, nada que eu pudesse entender, mas eu sabia que aquela frase me daria força.
Abri a porta da cabana, sentindo a fumaça invadi-la e o cheiro de queimado entrar por minhas narinas. Desci a escada do alojamento e pude ver o meu alojamento em chamas. Comecei a correr pela estrada de terra, mas, antes que eu pudesse chegar ao meu destino, os mesmos homens que eu vi antes vinham andando em minha direção.
- Hora, hora. Xena, a princesa guerreira chegou. – o homem mais alto falou, batendo suas botas de cowboy uma na outra. Um tanto desprezível e brega, devo ressaltar – Vai ser um prazer te mostrar que reinos não devem ser defendidos pelo sexo fraco.
- E vai ser um prazer te mostrar o quanto você está errado. – falei, vendo-o sacar uma arma e apontá-la para mim. Prendi a respiração e o vi puxar o gatilho. Com uma rapidez que eu mesma não sabia que tinha, eu me vi mover minha espada para desviar a arma.
Antes que ele pensasse em atirar outra vez, eu movi a espada, o que fez com que a arma caísse de sua mão e fosse para longe.
Eu vi a raiva em seus olhos quando ele olhou diretamente para mim e, logo em seguida, seu pulso vir em direção ao meu rosto. Consegui desviar e dei um soco em seu abdômen. Afastei-me dele e, segurando em seus ombros, dei uma joelhada no mesmo lugar. Eu o vi ficar de joelhos e minha mão se fechar e voar em seu rosto, fazendo com que ele caísse para o lado. Olhei para o lado, do qual seu parceiro já não se encontrava. Provavelmente, já tinha fugido, na esperança de não ser preso.
- Socorro! – escutei um grito vir da cabana. Corri até o local, que estava em chamas. Joguei a espada de lado e chutei a porta, o que fez com que ela abrisse. Pude ver Cassie presa a uma cadeira e toda a cabana pegando fogo ao seu redor.
- Eu vou te tirar daqui. – falei, desamarrando suas mãos e seus pés.
- , eu não... – ela tossiu e segurou em meu braço, fazendo com que eu olhasse para ela – Eu não consigo... – ela tossiu mais uma vez – Eu não consigo respirar. – ela disse, começando a tossir sem parar.
- Calma, Cassie, – falei, ficando em pé e colocando seu braço por cima do meu ombro – nós já vamos sair daqui.
Levei Cassie para fora da cabana e vi o fogo tomar conta da mesma depois que nós saímos. Lorenzo estava esperando do lado de fora e logo ele a pegou em seus braços.
- Deixe que eu a levo para a enfermaria. Kyle está lá perguntando por você.
Quando cheguei à enfermaria, Kyle estava sendo atendido pela enfermeira que se certificava que não havia ficado nenhuma sequela, enquanto Lorenzo colocava Cassie em cima de uma maca para que ela fosse atendida. Kyle afastou a enfermeira para o lado e olhou para mim. O mesmo se levantou e correu em minha direção, quase me esmagando em um abraço. Eu não tinha percebido, mas Kyle tinha um físico escultural e, sem a blusa, eu podia sentir os músculos do seu braço ao meu redor, além de um arrepio.
- Eu fiquei tão preocupado. – ele segurou em meus ombros e me afastou, o que permitiu que eu olhasse para seu rosto. Ele tinha um machucado ao lado da boca, um olho roxo e um corte perto da sobrancelha – Eles disseram que iam te matar.
- Eu estou bem. – falei, olhando para ele e sorrindo – Eles bem que tentaram, mas pegaram a Cassie no lugar.
- E se não fosse pela , eu não estaria aqui. – Cassie falou. Todos olharam para mim. Kyle fez o mesmo, surpreso. Antes que ele pudesse formular uma frase de desgosto sobre a situação, George entrou na sala dizendo:
- Conseguimos pegar os invasores.
Uma onda de gritos de comemoração tomou conta da sala e todos começaram a correr em direção à porta. Kyle passou o braço por meu ombro, o que fez com que eu olhasse para ele.
- Vamos.
- O que vai acontecer agora? – falei enquanto andávamos em direção à porta.
- Nós vamos maltratá-los um pouco.
- Maltratar? Isso não é certo.
- Vamos jogar bolas de terra, água, óleo, essas coisas.
- Eles sempre fazem isso?
- É. George diz que sempre que eles pegam prisioneiros, eles fazem essas brincadeiras e depois os libertam. – ele disse enquanto andávamos em direção ao campo de treinamento, que estava lotado de homens. Quase todos com bebidas na mão e conversando alto – Prisioneiros também significam passe livre para diversão. Quando prisioneiros tentam invadir o acampamento e são pegos, significa que nosso treinamento, mesmo não completo, está avançado e, por isso, que devemos comemorar durante dois dias.
- As pessoas desse acampamento, definitivamente, não são normais.
- Começando por você. – sorri, olhando para ele.
- Não pense que essa vai ser a última vez! – um dos prisioneiros gritou, o que fez com que todos pararem de falar – Nós não vamos parar até que ela seja vingada!
- A ex-namorada o trocou por um de nós e o bebê aqui não aguentou ser trocado.
- Rosalie terá sua vingança.
- O quê? – falei um pouco mais alto. Andei em direção aos prisioneiros, que estavam amarrados a troncos. Um tanto rústico para o século XXI, mas quem sou eu para falar, certo? – O que você disse?
- Oh, Vossa Alteza, vejo que não foi dessa vez.
- Bem, quando você pretende matar alguém é aconselhado saber como a pessoa se parece.
- E quem disse que eu não sabia?
- Você tentou matar Cassie no meu lugar.
- Bem, não se deve deixar testemunhas quando se pretende cometer um crime. – ele sorriu – Devo dizer que você deixou a todos impressionados quando matou sua irmã má. Muitos acreditavam que você não conseguiria, mas eu sabia que você conseguiria. Eu sempre acreditei em você.
- Do que você está falando?
- Quando vocês duas rolaram no chão brigando para finalmente decidirem qual das duas deveria viver, isso não foi excitante? Oh, e quando vocês brigaram pela adaga e você a pegou e a deslizou pela barriga da sua irmã, antes de empurrá-la para o lado, onde ela caiu morta? – ele riu – Você nunca se sentiu mais viva, não estou certo? Ou devemos falar sobre suas aventuras em cima de uma Harley por toda a Londres? Aposto que foi aí que você percebeu que matar Lucy foi a melhor coisa que você fez.
- Não fale da minha irmã. – falei, colocando minhas mãos em volta de seu pescoço – Nunca mais fale da minha irmã desse jeito. – apertei mais minhas mãos em seu pescoço, vendo-o ficar sem ar – Ela poderia ser o que fosse, e eu posso até tê-la matado, mas isso não significa que eu não sinta falta dela e que eu não desejasse que essa maldição fosse uma lenda estúpida.
Soltei seu pescoço e o vi respirar ofegante. Girei meus calcanhares e caminhei em direção à multidão de guardas, que me olhavam boquiabertos. Antes que eu pudesse dar outro passo, ele disse:
- Ainda assim, você gostou. Eu sei que sim.
Virei-me para ele outra vez e levei meu punho até seu rosto, o que o fez cuspir sangue.
- Quem conseguir fazer algum deles comer cebolas, ganha uma semana de folga! – George gritou. Antes que eu pudesse dar outro passo, eu estava sendo esmagada por um bando de homens e seus portes físicos esculturais.
- Vem cá, pimentinha. – Kyle me puxou para outro abraço esmagador.
- Você acha que ele estava falando sério? – Lorenzo perguntou.
- Acho que não. – falei, afastando-me de Kyle – Qualquer um pode saber o que eu fiz em Londres. Não foi nenhum segredo.
- Só por precaução, vou pedir para alguns dos guardas levarem-nos para a prisão em Florença. Mas ainda temos um problema.
- Qual?
- Onde é que vocês duas vão dormir?
- Tem uma cama sobrando no meu alojamento. – Kyle falou – pode dormir lá.
- E a Cassie pode ficar com você. – disse, apontando para a Cassie, que estava calada.
- Por mim tudo bem. – Lorenzo disse, olhando para ela – E por você, Cassie?
- Tudo bem também.
- Então acho mais do que justo eu ir dormir porque a última vez que eu tive tanta ação assim foi quando Cassie me obrigou a pular de seis metros de altura para dentro da piscina olímpica.
- Sobre isso... – Cassie começou a falar.
- Não precisa se preocupar. Eu sei que faz parte do treinamento.
- Então vamos, pimentinha. – Kyle nos pegou nos braços – Você é mais pesada do que aparenta ser.
- Ou você não é forte o suficiente.
- , será que eu posso falar com você? – Cassie perguntou, o que fez com que Kyle me colocasse no chão.
- Tudo bem. – olhei para Kyle e Lorenzo, que continuavam parados nos encarando – Ela disse que queria falar comigo. Vocês dois podem se retirar.
- Que azeda! – Kyle disse, fazendo careta.
- Que intrometidos. – respondi, dando língua e vendo os dois se afastarem para a direção dos alojamentos – Então, Cassie, o que você quer?
- Obrigada por me salvar. Você não precisa fazer aquilo, principalmente depois do que eu fiz para você.
- E o que seria isso?
Ela me olhou com os olhos arregalados.
- Você realmente quer que eu diga?
- Eu sei o que você fez para mim, Cassie. Mas nada disso me deixa no direito de decidir se você deve viver ou não. Eu te salvei porque era a coisa certa a se fazer e, além do mais, se você tivesse me tratado como todos da burguesia me tratam, que graça teria esse lugar? – abri os braços – E melhor, o que eu teria aprendido?
- Uau! Você realmente não é quem eu pensei que fosse. – ela sorriu – Obrigada por me salvar e me desculpe por toda a dor que eu lhe causei.
- Valeu a pena. – sorri de volta.
- Espero que agora possamos ser amigas. – ela estendeu a mão.
- Mas é claro. – falei, apertando a mão dela – Agora me deixa ir porque eu realmente preciso de um banho e descansar.
- Vai lá. – sorri para ela uma última vez antes de correr e pular em cima de Kyle.
- Vamos, pimenta? – falei, descendo de suas costas.
- Vamos, Xena.
- Não apreciei o sarcasmo.
- E também não vai apreciar a poeira que vai comer. – ele disse antes de começar a correr em direção ao alojamento dele.
- Covardia! – gritei, começando a correr atrás dele – Você começou primeiro.


Capítulo 34 – London

Eu não acreditava. Muito menos imaginaria que estaria pensando em algo desse tipo. Lorenzo, pelo visto, também não, e Kyle parecia tão surpreso que deixou até sua comida cair em cima da mesa. Cassie também estava lá e, mesmo sem apreciar a ideia, estava ao meu lado me apoiando.
Cassie e eu tínhamos nos entendido depois de muita conversas – e garrafas de vinho –, e nós finalmente tínhamos enxergado o lado uma da outra. Deixamos toda a imaturidade de lado e nos juntamos para infernizar os homens desse acampamento. Kyle não tinha gostado muito da ideia de ser trocado pela cobra venenosa, mas, logo na primeira noite em que levei Cassie comigo para cima do telhado do alojamento, sua opinião mudou no primeiro minuto.
O acampamento parecia mais tranquilo do que antes, sem intrusos e, muito menos, sem olhares assustados. Depois que Cassie e eu saímos andando pelo acampamento soltando gargalhadas, as coisas pareciam estar finalmente nos lugares. Até agora.
- Você perdeu a noção? – Lorenzo falou, quebrando o silêncio – Esse não era o plano.
- Às vezes, as coisas nem sempre saem como o planejado.
- Você não pode fazer isso.
- Tanto posso, como vou. – cruzei os braços – Eu me formei hoje e tenho até o diploma para provar. – apontei para o pedaço de papel enrolado em cima da mesa.
Hoje seria o último dia em que eu ficaria no acampamento. Parecia que esses três meses tinham passado tão rápido que tudo tinha sido reduzido a uma longa e louca semana. Eu mal podia acreditar que eu estava finalmente livre.
- Seu pai nunca vai permitir, você não nasceu para isso. – ele começou a andar de um lado para outro – Você não nasceu para ser um de nós. O seu lugar é com aquele bando de nobres, botando-os em seus lugares, vestindo aqueles vestidos feitos perfeitamente para você e inspirando pessoas, sentada em seu trono.
- Eu posso fazer tudo isso sendo uma de vocês. – Lorenzo olhou para mim – O que foi? Eu posso. Além do mais, você mesmo disse quando me deu a katana que era dos meus ancestrais.
- Aquilo era para te dar forças, não para você decidir virar a Xena e sair por aí em missão atrás de bandidos. O que você acha que seu pai vai dizer sobre isso? E sua mãe? E Londres? Você não quer voltar a Londres?
- Meu lugar é aqui, não em Londres.
- E quanto a seus amigos? Você vai abandoná-los?
- Eles estão melhor sem mim.
- Ninguém é melhor sem você. – ele olhou para mim – E quanto ao...
- Qual é o seu problema? – falei, interrompendo-o – O que tem de tão ruim no fato de virar uma das guardas, hein? Tem alguma coisa que eu deveria saber ou é apenas uma birra sua comigo? O que tem de tão ruim sobre isso?
- Eu não posso arriscar quase te perder outra vez! – ele gritou – Eu apenas não posso te deixar sozinha outra vez, veja o aconteceu da última vez! Você foi obrigada a matar sua própria irmã!
- Eu vou ficar bem. – falei, andando em sua direção – Eu estou mais forte do que antes. Você não precisa ficar me vigiando como se eu fosse uma donzela indefesa.
- Vamos! – ele pegou em meu braço, começando a me arrastar em direção à porta.
- Lorenzo! – repreendi-o – O que você está fazendo?
- Você precisa entender do que estou falando.
Ele abriu a porta e me arrastou em direção ao alojamento da frente, o que, para mim, era mais do que estranho, já que ele abominava a ideia de meus pés, pelo menos, tocarem os degraus daquele alojamento. Mesmo assim, ele abriu a porta e me puxou para dentro de uma sala escura. Por uma fração de segundo, quando Lorenzo soltou meu braço, senti como se algo terrível estivesse prestes a acontecer. Quando ele ligou a luz, eu tive certeza.
Eu nunca tinha visto tantas fotos minhas e da minha família juntas em um só lugar, nem mesmo nos corredores do castelo, onde meu pai fazia questão de encher de fotos. Oh, não, isso era outro nível. Era quase como se eu tivesse entrado em um daqueles filmes policias que eu costumava assistir tarde da noite, quando Marta não estava olhando, mas, em vez de pistas sobre o assassino, eram pistas sobre mim coladas nas paredes e ligadas por uma grande teia de barbante vermelho. Quando olhei para o lado, senti um arrepio passar por minha espinha, pois aquelas não eram só fotos sobre minha vida na Itália, mas o tempo que eu passei em Londres também.
- O que é isso? – perguntei, olhando para Lorenzo – Você andou me espionando? Meu pai mandou fazer isso?
- Eu tenho mais o que fazer e seu pai também. – ele disse, cruzando os braços – Esse foi o trabalho daqueles dois que invadiram o acampamento. Depois que nós soltamos um deles em prol de saber para quem eles trabalhavam, ele nos levou até uma cabana no meio da floresta e todo esse material estava, desse mesmo jeito, espalhado pela cabana. – ele andou em direção à mesa que estava à minha frente – Quem está atrás de você está fazendo um trabalho bem feito, especialmente depois da sua ida em Londres. Ele sabia onde você estudava, onde você morava, o que você fazia nos seus tempos livres, com que você andou e, principalmente, quem você namorou.
O ar fugiu de meus pulmões em questão de segundos.
- E como você sabe que ele estava atrás de mim? – perguntei, recuperando meu ar – Eu posso ser apenas uma isca para chegar até meus pais.
- Eles vieram aqui, colocaram fogo no seu alojamento, quase mataram a Cassie, quase mataram você e você ainda acha que eles querem matar o seu pai? Aquele alojamento era para ter queimado com você dentro! Eu agradeço todos os dias por você ter virado amiga daquele idiota ali – ele apontou para o Kyle –, e desobedecido todas as regras desse acampamento naquela noite. Porque, daqui para frente, eu poderia te proteger da mesma forma que eu protegia quando éramos crianças. – ele andou em direção a uma parede que estava coberta por um pano preto – Isso deve te convencer. – ele puxou o pano e foi como se um soco tivesse sido dado em meu estômago.
Era tudo que eu estava evitando durante todo esse tempo. Era aquilo que eu queria e estava tentando me esquecer desde que saí de Londres, há três meses. Eu sei que não se esquece alguém dessa maneira, principalmente alguém que marcou tanto sua vida, mas, depois de ver tantas fotos nossas juntos, parecia que eu nem havia tentado tirá-lo da minha cabeça. Chegava até a ser patético a forma que, mesmo sem vê-lo, tocá-lo ou, muito menos, tocar em seu nome, em fração de segundos, meu coração já estava quase pulando fora do peito e seu nome era a única palavra que passava por minha cabeça.
Ver nossa história contada através de fotos desde o primeiro dia em que nos vimos no meu primeiro dia de aula, até quando ele chegou em minha casa em sua moto naquele mesmo dia em que nos tornamos um só, fazia com doesse enquanto eu me lembrava de tudo que passamos. Doía ainda mais enquanto as cenas passavam em frente em meus olhos, ao mesmo tempo em que eu olhava para aquelas fotos. Mas, à medida que doía, fazia com que meu coração batesse mais forte e com que eu lembrasse que, mesmo com tantos momentos ruins, eu poderia me agarrar aos momentos bons quando sentisse saudades.
- Como eles conseguiram tudo isso?
- Eles vêm espionando você desde que você foi para Londres. Até antes disso, se for possível. Eu não sei como eles conseguiram, mas eles tinham guardado uma espécie de papelada sobre cada passo que você dava. – ele se encostou à mesa – Eles até seguiram seus amigos.
- e estão bem? – respirei fundo – E o ? Ele está bem?
- Eles estão bem. Nós estamos protegendo-os há cerca de um mês.
- Um mês? Por que você não me disse antes?
- Porque eu precisava que você terminasse seu treinamento.
- Há menos de dez minutos, você estava me chamando de louca por querer ser uma de vocês.
- E você é, mas você também precisava aprender a se defender, por isso te deixei aqui mais tempo do que você precisava.
- Como assim “mais tempo que eu precisava”?
- Isso não vem ao caso agora.
- Lorenzo, eu já estou muito irritada com você, então você vai querer me agradar antes que minha mão voe na sua cara. E eu garanto, ela vai fazer um estrago grande.
- Nossa! Para que todo esse estresse? Eu só aumentei sua temporada por aqui. Você deveria ficar uma semana aqui e eu estiquei por três meses.
- EU PODERIA TER IDO EMBORA NA PRIMEIRA SEMANA? – gritei, andando em sua direção.
- Você não deveria ter ficado nem um dia, mas sua arrogância fez com que eu estendesse por uma semana, e por outra, outra, outra e, quando eu me dei conta, você já estava gostando daqui, mais do que eu desejava. – ele disse, andando em minha direção, segurando em meus ombros – Desculpe-me, mas quando eu soube da ameaça...
- Ameaça? – afastei-me dele – Quer dizer que você sabia que esses caras podiam atacar? Quer dizer que você podia ter evitado tudo isso?
- Evitado eu não sei. Mas estar preparado, pode-se dizer que sim.
- Lorenzo!
- Entenda, – ele segurou em meus ombros outra vez – tudo que aconteceu, até mesmo as coisas ruins, foram por uma razão. Eu sei que todo mundo diz isso, mas, se você realmente for pensar nisso, eles estão certos. – ele me soltou – Se eu poderia ter evitado todo esse sofrimento nesses três meses que você esteve aqui? Sim, eu poderia. Mas eu preferi deixar as coisas rolarem, para ver como você se saía, e olhe onde estamos agora. – ele apontou para mim – Você quer ser uma de nós, uma pessoa que pode ter tudo, quer largar seus vestidos e andar pelo mundo com uma espada presa em suas costas. Não me leve a mal, eu sempre quis que você burlasse todas as regras, mas, vendo você agora, pedindo, implorando para que eu faça de você uma de nós, eu percebi o quanto você pertence àquele castelo. Então, eu tenho uma proposta para você. – cruzei os braços, esperando que ele começasse a falar – Você se tornará uma de nós, mas não precisará fazer tudo que nós fazemos, como trabalhar no castelo protegendo a família real, até porque estaríamos mais preocupados em lhe proteger do que o castelo como um todo. Você fará tudo que nós fazemos, mas vai usar seu título para isso.
- Como assim?
- Você se lembra de quando seu pai foi ameaçado naquela festa na França e nós não tivemos permissão de entrar com ele porque ela era uma festa apenas para “nobres”? Esse seria um exemplo, você entraria em nosso lugar.
- Mas isso não quer dizer nada. Eu ainda teria que ir àquelas festas chatas, as quais eu detesto ir ardentemente. Eu quero ver o mundo, Lorenzo, eu quero sair pelo mundo ajudando os outros.
- E você fará isso, na nossa próxima missão.
- Próxima missão? E quando seria isso? Na próxima encarnação?
- Não, daqui a dois dias. – ele pegou um papel dentro do bolso – Esse convite apareceu em cima da mesa do seu pai dois dias atrás. – ele abriu a carta – “Com as estrelas, você andará até a supernova encontrar. 1994 stars.” Isso não soa familiar para você?
- Não.
- Você se lembra do baile das estrelas onde a Rainha da Inglaterra chama os principais reis, rainhas e celebridades do momento? O seu pai recebeu um convite duas semanas atrás. Nele, vinha seu nome no envelope, convidando-a para o baile do ano. Não tinha endereço ou remetente, apenas essa frase. Ele pensou que podia ser uma brincadeira de um dos príncipes, então não se preocupou.
- Eu não vejo problema nisso. Eles sempre fazem alguma pegadinha quando o baile se aproxima.
- E não há. A não ser pelo fato de que outro convite chegou na semana passada e, nele, apenas dizia que o rei e sua família estavam convidados para o baile. Seu pai ligou para o palácio da Rainha e os assessores disseram que o convite tinha sido enviado na semana passada e que nunca ouviram falar nessa frase.
- Eu não vejo o que eu tenho a ver com isso.
- 1994 é o ano em que você nasceu. Estrelas, quer dizer que seus maiores ídolos vão estar nessa festa. E você sabe o que supernova significa? – balancei a cabeça, em uma forma de negar – Supernova é o que acontece quando um corpo celestial morre, uma explosão que faz com que estrelas nasçam. Você sabe o que esses homens querem? Querem fama e atenção por ter conseguido matar alguém da família real.
- Se ele me quer morta, por que você está me levando direto para a armadilha deles?
- A Rainha concordou em nos ajudar a pegar esses homens de uma vez por todas. Ela cedeu alguns de seus homens para nos ajudar.
- E o que está faltando para nós partirmos?
- O seu “sim”.
- Então podem arrumar as malas. Nós estamos indo para Londres.


Capítulo 35 – Back Home

Bati na porta da minha casa esperando que Alfred ou Mel a abrisse. Fazia três meses que eu não os via ou ouvia deles e logo uma saudade bateu em meu peito. Como será que eles estavam? Será que eles estavam muito chateados com minhas atitudes? Será que eles haviam me esquecido? Ou será que eles tinham sentindo minha falta?
Nesses três meses que eu passei no acampamento, eu não pensei muito nas pessoas que eu deixei aqui fora. Lorenzo e Cassie faziam questão de me manter ocupada desde o momento em que eu acordava até a hora em que eu ia dormir. Chegava até a ser patético o jeito que eles me tratavam só para não me ver triste pelos cantos, lamentando todo o mal que eu tinha feito. Mas, mesmo com toda a distração do dia a dia, Cassie e Lorenzo, eu podia controlar meus sonhos e eram neles que eu via o que eles queriam esconder.
Eu sei que eu sou uma boa pessoa. Eu sei que, mesmo depois de tantos obstáculos e tanta confusão, lá no fundo, eu ainda tinha algo daquela princesa estúpida que vivia sonhando em viver uma vida cheia de emoções. Foi nela que eu me agarrei para me tornar a melhor versão de mim mesma que eu podia ser. E não foi só nela, mas também no amor que todos sentiam por mim e, principalmente, na vontade de pedir perdão por tudo que eu fiz.
Alfred e Mel eram membros dessa lista. Eles eram minha segunda família e ficar longe deles doía tanto quanto ficar longe de papai e mamãe.
Lorenzo, Kyle, George e Cassie estavam atrás estava atrás de mim e podiam sentir a ansiedade que eu sentia. Kyle tinha mandado eu parar de roer as unhas pela vigésima vez desde que chegamos; havia chegado ao ponto de ele bater na minha mão toda vez que eu pensava em levá-la à boca.
Quando Mel abriu a porta, segurei forte a mala que estava em minhas mãos, enquanto eu via seu sorriso desaparecer. Eu não sabia se ela estava surpresa ou chateada por tudo que eu a tinha feito passar naqueles meses em que eu fiquei em Londres antes de ir para o acampamento. Mas logo essa incerteza desapareceu quando ela me abraçou pelo pescoço, quase me sufocando.
- Meu Deus, como você cresceu! – ela me segurou pelos ombros – Nem parece que eu te vi três meses atrás!
- Você não está chateada?
- Chateada? Por que eu estaria chateada? Eu estava com saudade da minha menina. – ela me abraçou outra vez – Você perdeu peso? – ela me segurou pelos ombros outra vez, olhando-me da cabeça aos pés – Oh, meu Deus! , você está parecendo um graveto! – ela olhou para Lorenzo – O que você fez com ela? No acampamento em que você e aquele garoto a colocaram não tinha comida não? – ela falou em tom seco.
- Eu... – Lorenzo ia começar a falar quando Alfred apareceu na porta, perguntando quem era.
Ele parou ao lado de Mel com uma cara surpresa.
- ? – ele sorriu – ! – ele me abraçou pela cintura e me rodopiou no ar – Meu Deus, menina, como eu estava com saudades! – ele me colocou no chão – Você perdeu peso?
- Que tal nós levarmos essa conversa lá para dentro? – falei.
Alfred e Mel se olharam e depois olharam para Lorenzo.
- Vocês não querem esperar aqui fora um instante? A casa está uma bagunça. – Mel disse e eu podia sentir em sua voz que ela estava mentindo.
- Por que você não quer que nós entremos? Vocês estão escondendo alguma coisa? – dei um passo à frente – O que vocês dois estão aprontando?
- Nós vamos nos casar! – Alfred gritou.
- Alfred! – Mel deu um tapa em seu braço e eu pude ver o anel de noivado em seu dedo – Você não dá uma notícia dessas em tempos como esse.
- Vocês realmente estão noivos? – perguntei, olhando para eles – Isso é o máximo! Quando vocês vão casar?
- Próximo mês, em Florença. – Mel falou, com um sorriso em seus lábios.
- Isso é fantástico! Agora podemos entrar? Eu estou cansada e preciso cair em minha cama antes do baile. – falei, passando por entre eles, andando pelo corredor.
- , espera. – Mel falou, fazendo com que eu me virasse para ela – Tem algo que nós precisamos te contar.
- Será que dá para você me contar depois que eu me jogar no sofá? – falei, virando-me para o lado e olhando para a sala. Parei no batente antes mesmo de pisar no primeiro degrau. A sala continuava a mesma, mas as pessoas que estavam sentadas no sofá fizeram com que eu ficasse parada como uma estátua.
sorriu, mesmo parecendo estar tão assustada quanto eu. apenas estava surpreso segurando o salgadinho que levava à boca no ar. Vendo-os agora, eu podia sentir o quanto eles fizeram falta nesses meses em que eu estava longe. Mesmo que eu tivesse feito novos amigos, esquecer os velhos nunca foi uma opção.
deu dois passos para a frente, com um sorriso de orelha a orelha, mas parou subitamente quando escutou passos vindos da escada.
Virei meu rosto e meu sorriso desapareceu.
- Acho que esse terno vai servir. – ele disse, abotoando os botões do terno. Ele parecia diferente, mudado, como se fosse outra pessoa. Não sei se era eu quem tinha mudado ou se era apenas aquele sentimento que você tem quando não vê uma pessoa por um bom tempo, mas algo nele não era o mesmo – Será que Johnny não se incomoda? Digo, afinal, é apenas um baile idiota. Não é como se eu tivesse um par mesmo. , o idiota que mandou a única... – ele levantou os olhos. Eu os vi pousar sobre mim, fazendo com que ele parasse de falar.
O jeito com que ele me encarava fazia parecer que eu não estava vestindo nenhuma peça de roupa. Ele estava lindo usando um dos ternos do meu pai. Aparentava ser um terno velho, já que estava coberto de poeira, mas, mesmo assim, a beleza de ficava mais destacada.
Nenhum de nós sabia como reagir. Por um longo momento, um silêncio constrangedor se formou na sala, até que Cassie o quebrou e, devo ressaltar, ela o fez em grande estilo.
- Então esse foi o imbecil que fez com que você fosse parar no nosso acampamento, hein? – ela estava no corredor, apontando o dedo para – Bem parecido com você, Lorenzo.
Ela olhou para Lorenzo e sorriu.
- Cassie! – eu e Mel a repreendemos – Pelo amor de Deus, menina, tenha modos! – Mel completou.
- O papo está muito bom, – Cassie ignorou Mel – ou o não papo, mas nós temos trabalho a fazer. Então, bonitão, você e seus amigos podem sair para as pessoas de verdade começarem a trabalhar?
- Cassie. – falei, dando um beliscão nela.
- Ai, . – ela massageou seu braço – Precisava beliscar tão forte?
- Da próxima vez, arranco um pedaço. – falei, olhando para ela – Desculpem. – falei, andando em direção a e – A Cassie esqueceu todas as lições de etiqueta que eu a ensinei. Lorenzo, Kyle e George, vocês podem entrar e deixar as coisas aqui pela sala. Nós não vamos ficar muito tempo mesmo.
Lorenzo chamou os meninos com um aceno e, logo, estendeu a mão e cumprimentou , que estava parado no lugar que eu estava.
- Você veio para Londres por causa do baile? – perguntou, tirando minha atenção dos meninos.
- Claro. Eu não perderia essa por nada.
- Você já tem um par?
- Aham. Meu pai vai comigo. – falei, apontando para o canto da sala, indicando onde eles poderiam colocar os equipamentos.
- Seu pai vai com você ao baile de formatura?! – gritou, fazendo com que todos olhassem para ela.
- Baile de formatura? – perguntei, confusa – Que baile de formatura?
- É, o baile de inverno. – ela pegou o convite em cima da mesa e me entregou – Não é por isso que você está aqui?
- Eu estou aqui para o baile, mas é para o baile no palácio da Rainha. – olhei para baixo, analisando o convite em minhas mãos, e não foi o cair dos flocos de neve ou as letras extremamente curvilíneas que chamaram a minha atenção, mas a pequena frase que tinha no final do convite. Nela dizia: “Com as estrelas, você andará até a supernova encontrar. 1994 stars” – Qual é o tema desse baile mesmo? – perguntei, olhando para .
- A noite das estrelas. Segundo Kelly, a organizadora, o caminho até o salão será feitos por estrelas. 1994 estrelas, ela disse. Aí você se pergunta: como ela conseguiu arrumar 1994 estrelas? – falou – Segundo ela, um homem deu a ideia logo que o tema original do baile foi destruído e ele ainda doou todas as estrelas. Bem legal, não é? – ela olhou para mim, que apenas sorri sem os dentes.
Entreguei o convite para Lorenzo, que olhou assustado para mim depois que leu o que estava escrito. Cassie arrancou o convite das mãos de Lorenzo e analisou o mesmo.
- Eu não acredito. – ela falou, olhando para mim – Você sabe o que isso significa? Alguém está te chamando para uma briga, menina. E se eu fosse você, aceitaria.
- Wow! Wow! Wow! – Lorenzo falou – Nós viemos aqui para ir ao baile da Rainha, não para um baile de formatura qualquer.
- Mas o convite é o mesmo que você me mostrou no acampamento. Isso quer dizer que quem estava me vigiando está dentro daquela escola, o que coloca todos que vão comparecer a esse baile em perigo.
- Mas nossos homens estão todos no palácio da Rainha esperando.
- Então mandem-nos para a escola.
- Você realmente acha que a Rainha mandará todos os seus homens para um colégio qualquer só porque você “acha” que o ataque será lá? Acho mais fácil o Oasis voltar a fazer shows.
- Então é isso? – Cassie disse – Nós vamos deixar o cara que está perseguindo nossa princesa Xena aqui fugir, então? Para que, na próxima vez, ele ataque o castelo e tome o reino para si?
- Não precisa tanto, Cassie. – Kyle falou.
- Pode não ser agora, mas e depois? Eles já tentaram matá-la no acampamento com mais de quinhentos novatos em treinamento e com alguns veteranos. O que você acha que eles podem fazer quando descobrirem que ela – Cassie apontou para mim – vai sair por aí distribuindo bondade sem nenhum tipo de proteção?
- E todo o treinamento pelo qual ela passou? – Lorenzo respondeu – Não valeu de nada?
- Eles invadiram seu precioso acampamento e quase botaram fogo em mim. Você realmente acha que eles não podem pegá-la desprevenida? Pelo amor de Deus, Lorenzo, eles pegaram a mim! Imagine só o que eles poderiam fazer com a princesa aqui!
- Nós vamos protegê-la, mesmo que isso seja a única coisa que faremos quando estivermos em missão.
- Não vai ser preciso, – disse, olhando para Lorenzo – porque eu vou a esse baile. E eu vou pegar esse idiota, com ou sem vocês.
- Vocês podem ir a esse baile, mas eu vou para onde a Xena for. – Kyle disse.
- Querendo ou não, concordo com o Kyle. – Cassie falou – Eu vou para onde a Xena for.
- Se nós formos a esse baile, estaremos sozinhos. – Lorenzo disse – Se precisarmos de reforços, temos que confiar na polícia londrina e vamos precisar de toda a ajuda possível. – ela olhou para – Podemos contar com a ajuda de vocês?
- Com certeza. – disse – Estou me sentindo em um filme policial.
Cassie rolou os olhos.
- Só existe um problema. – disse – Você precisam de um par que estude no nosso colégio para poder entrar.
- está sem par. – falou – Eu e podemos fazer o sacrifício de entrarmos separados e também não tem par, então acho que estamos bem.
- pode entrar com Cassie, – George começou – Lorenzo com , pode ir com Kyle e eu e podemos entrar pela porta dos fundos. Vai ser moleza.
- Mas é obrigatório ir com o par. precisa de um de qualquer jeito. Se ele ficar sozinho pelo salão, Kelly, com certeza, irá gritar com ele.
- Então, pode ir com e eu e George podemos entrar pela porta dos fundos. – Kyle falou – Ninguém vai nos perguntar por que estamos sozinhos em um baile onde ninguém nos conhece. Provavelmente, vão pensar que estamos esperando nossos pares voltarem de algum lugar.
- Então acho que está tudo certo. – Lorenzo falou – Vocês podem ficar aqui até a hora do baile? – e concordaram. Não pude olhar para , pois eu estava de costas para ele. Mas, de acordo com Kyle, que estava à minha frente, ele tinha concordado também – Então acho justo que nós, míseros mortais, descansemos até a hora desse baile.
- Eu levo vocês até seus quartos. – Mel falou, fazendo com que eu virasse para ela, podendo olhar para agora.
Ele desviou o olhar para os pés. Quando Mel passou por ele e cochichou algo em seu ouvido, ele a seguiu.
- Devo ressaltar, – Cassie começou, fazendo com que eu tomasse um susto – ele não é nada de se jogar fora. Você me deixa testar?
- O quê? Testar? Do que você está falando? – perguntei, vendo e subirem a escada.
- É, você sabe. – ela deu uma piscadela.
- Você quer ficar com o ? – perguntei, incrédula – Mas é claro que não.
- Por que não?
- Porque não.
- Porque não não é resposta. – eu ia começar a falar, mas ela me interrompeu – Eu sabia.
- Sabia o quê?
- Você ainda gosta dele. – ela apontou o dedo na minha direção – Oh, Deus, você ainda gosta desse idiota que te jogou naquele acampamento!
- Cassie, você sabe que não foi só isso.
- Sei? – ela cruzou os braços – Você ficou furiosa com o Lorenzo por semanas, chegou até a irritá-lo de qualquer maneira possível no acampamento e, agora, você está aqui, em frente ao imbecil que o ajudou, e não faz nada?
- E o que você quer que eu faça? Bata nele até ele sangrar? e Lorenzo não foram os causadores de eu ter acabado naquele acampamento, nem mesmo essa maldição ou Ian foram! O jeito com que eu lidei com as coisas fizeram isso! Eu não me arrependo do que eu fiz. Acho até que foi bom ter feito tudo aquilo, porque eu aprendi que existem consequências quando a gente vira uma vadia sem coração e sai por aí fazendo o que dá na telha, sem nem ao menos pensar em quem vai machucar no caminho! – praticamente gritei – Eu passei toda a minha vida fazendo o certo e desejando fazer algo com que eu me fizesse sentir alguma coisa, qualquer coisa que fosse, e, quando eu vim para cá, foi quando eu senti. Eu posso ter exagerado na dose e me deixado levar pela vibe, mas, pela primeira vez na vida, eu senti as consequências, mesmo que elas tenham me custado o cara que eu amo e quase a minha família e meus amigos! – respirei fundo – Eu estava, sim, com raiva do Lorenzo e do . Na verdade, eu estava com raiva de tudo e de todos. Mas isso passou quando eu passei a sentir novamente. Você não vai entender, mas uma maldição pode mexer com sua cabeça, distorcer seus sentimentos até que não sobre mais nada de você. Faz até você se perguntar o porquê de você ter sido a escolhida.
- Eu entendo. – olhei para trás e vi atrás de mim – Na verdade, eu realmente acho que você deveria ter passado por tudo isso, porque aí você poderia ser a melhor versão de você que você pode ser. E Deus sabe o quanto esperei por isso. – ela me abraçou de lado – Nós sentimos sua falta.
- Nós quem? Você e seu namorado? – Cassie disse.
- Não só nós. também. – ela falou – Eu sei que você não gosta dele, mas, se você soubesse, ficaria chocada pelo que ele fez.
- Acho que não ficaria tão chocada se descobrisse que seu príncipe, na verdade, é o vilão.
- nunca faria mal a . – falou, soltando-me.
- Claro que não, porque ele já fez.
- Você é novata na história. Não deveria se meter tanto como se estivesse aqui desde que tudo começou.
- Posso ser novata, mas parece que sou a única que está pensando direito. – ela aumentou o tom de voz – Vai ver você está defendendo ele porque está tramando com ele!
- Cassie! – gritei, fazendo com que as duas me olhassem, assustadas – Você poderia, por favor, dar um tempo? Pelo amor de Deus, estamos aqui em missão e eu não sei você, mas eu estou muito cansada da viagem. Como vamos ter que dançar como adolescentes, acho mais do que justo todas nós irmos descansar.
- Mas... – Cassie começou.
- Eu não estou nem aí, Cassie. Eu estou muito cansada para ficar escutando suas teorias sem nexo. Agora, se vocês me dão licença, eu vou para o meu quarto, porque tenho que usar não apenas salto, mas um vestido, e isso tudo enquanto tento combater um imbecil que está tentando acabar com a minha família.
Virei-me para a escada e subi, sem nem ao menos olhar para trás. Cassie estava me dando nos nervos.
Como se não bastasse ter passado horas dentro de um avião e ter um psicopata ameaçando minha família e meu reino, eu tinha que ver , a única pessoa que eu pedi ardentemente que não encontrasse enquanto estivesse aqui. Eu sentia sua falta, é claro que sentia, mas será que ele havia sentido a minha? Afinal de contas, Cassie estava certa, ele havia convencido meu pai junto com Lorenzo a me colocar naquele acampamento. No mínimo, ele me queria a milhas de distância e longe da sua vida.
No entanto, lá no fundo, uma pequena faísca de esperança dizia ao meu coração que o que ele havia feito era apenas para o meu bem, sem nenhuma intenção de me mandar para longe dele. Porque, depois de tudo que aconteceu, principalmente naquela noite antes de eu partir, ele ainda sentia o que eu sentia por ele. Até mais, se fosse possível.
Coloquei a mão no trinco e abri a porta do meu quarto. Ele continuava o mesmo, parecia que eu não tinha ficado fora por três meses. Fechei a porta e andei até a cama, jogando-me na mesma e me sentindo completa pela primeira vez.
- Droga de botão. – uma voz veio do banheiro, fazendo com que eu ficasse em pé. E como se não bastasse, minha sorte decidira deixar-me quando eu mais precisava. Porque não eram todos os dias que saía do meu banheiro usando apenas uma camisa social aberta e uma calça social – Desculpe, foi costume. – ele falou – Eu vou embora. – ele disse, andando em direção à porta. Antes de abri-la, parou – Droga! – ele falou baixinho, mas eu ainda pude ouvir.
- Algum problema, ? – eu disse. Porém, desejava que não tivesse dito.
- e estão no quarto, então não posso ir me trocar lá.
- Tenho certeza de que eles deixariam você entrar.
- Acho muito difícil. Se fosse comigo, eu não deixaria vo... Eu posso terminar de trocar de roupa aqui? – ele olhou para mim, fazendo com que eu me arrepiasse.
- Claro que sim. – falei, sorrindo – Essa roupa é do meu pai?
- É sim. Mel achou no guarda-roupa no quarto da sua mãe e, como eu não tinha um terno, ela disse que eu poderia ficar com esse. – ele falou, tentando tirar o botão de cima – Só que esse botão não ajuda muito.
- É porque ele foi mal colocado. – falei, andando em direção a ele – Meu pai sempre reclamava desse botão, mas nunca pediu para nenhum criado ajeitar. Mamãe dizia que ele gostava de vê-la tirá-lo todas as vezes que ele usava esse terno – falei, parando à sua frente – Eu posso? – olhei para o seu rosto, agora um pouco mais próximo. Ele assentiu e eu levei minhas mãos até o botão – É só um jeitinho de nada. – empurrei o botão, fazendo com que ele saísse – Pronto, viu? Com um jeitinho de nada, tudo se resolve.
- Até a gente? – ele disse, fazendo com que eu olhasse para ele. Seus olhos procuraram os meus e, quando acharam, fizeram com que eles ficassem focados nos dele. Eu não sabia o que era, mas um simples olhar de podia dizer muito sobre ele, principalmente quando estava assim tão perto – Se você soubesse... – ele segurou em meus braços, puxando-me para perto.
- Mas eu não sei. – andei para trás, fazendo com que ele me soltasse – E também não quero saber. – levantei a cabeça – Eu só quero que tudo isso acabe. – falei, vendo-o abaixar a cabeça – Você entende, certo?
- Claro que eu entendo. – ele levantou a cabeça – Você merece um pouco de paz depois de um ano tão agitado. – ele disse, sorrindo sem humor – Eu vou embora. – ele disse, virando-se para a porta.
Mordi o lábio, desejando que ele fizesse algo mais que concordar. Eu sentia falta dos braços de e, principalmente, dos seus lábios. Porém, eu não iria admitir isso nem em um milhão de anos e nem na frente dele. Mas acho que pensou o mesmo porque, no segundo seguinte, ele fechou a porta que tinha acabado de abrir e se virou para mim. Eu juro que tentei segurar o sorriso, mas, mesmo assim, ele fugiu de meus lábios. E, quando eu menos esperei, seus braços estavam rodeando minha cintura e seus lábios estavam sobre os meus.
Senti sua língua pedir passagem e eu a dei, deixando-a tomar conta da minha boca, enquanto em me agarrava aos seus cabelos. Seus braços continuavam a me apertar contra seu corpo, deixando que a distância entre nós fosse mínima e meu tórax fosse esmagado contra o dele. No momento seguinte, em uma tentativa de de me puxar mais um pouco, nós nos desequilibramos e acabamos caindo na cama. Sorri entre os lábios, fazendo com que ele sorrisse também e mordesse meu lábio inferior.
Abri meus olhos, encarando os dele. Ele deu um selinho demorado em meus lábios e sorriu, fazendo com que eu sorrisse também.
- . – ele começou, mas eu o interrompi.
- Shiu! Não fala nada. – coloquei meus dedos em seus lábios – Vamos fingir que as coisas entre nós não são tão complicadas e vamos apenas aproveitar o momento. – falei, passando a mão em sua bochecha – Vamos fingir que somos um casal normal, pelo menos, por algumas horas. Aposto que o mundo lá fora não se importa.
- Tudo bem. – falei, vendo-o sorrir.
se levantou em um pulo e andou até a porta.
- ! – eu o chamei enquanto me sentava na cama – Aonde você vai?
- Bem, eu vou para o meu quarto. Isso não é hora de um homem estar no quarto de uma garota. Seu pai, provavelmente, não aprovaria.
- Para o inferno com isso. – falei, levantando-me da cama e andando até ele – Não tem ser humano algum que me impeça de passar essa noite dormindo em seus braços, . – segurei em sua mão – Vem para a cama, vem! – falei, chegando mais perto e lhe dando um selinho.
- Seu pedido é uma ordem. – ele me pegou nos braços e caiu com tudo em cima da cama. Deitou-se e me puxou para deitar-me em seu peito, ao mesmo tempo em que eu deslizava uma de minhas mãos por sua barriga, abraçando-o pela cintura, enquanto ele acariciava meu braço.
O mundo lá fora poderia explodir, mas, nessa noite, eu iria apenas pensar em mim.

Capítulos 4 e 5 betados por Lily E.





Capítulo 36 – The End: Part I

Acordei quase pulando da cama, assustada, porque sabia que tinha dormido além da conta. Quando olhei para o relógio em cima do criado, confirmei minha certeza. Levantei-me da cama e fui em direção à porta. Não ligava se as solas dos meus pés estavam quase congelando devido ao piso gelado, eu só queria chegar no andar de baixo e dar uma bronca em quem não havia me chamado. Quando coloquei os pés no último degrau da escada e estava virando em direção à cozinha, uma bandeja apareceu em minha frente. Voltei dois degraus da escada e pude olhar a pessoa que segurava a bandeja nos olhos. Quando eu o fiz, os vi brilharem.
- Bom dia! – ele disse, sorrindo. Seu sorriso me fez levar algum tempo para responder.
- Bom dia. – respondi, sentindo minhas bochechas queimarem – Na verdade, boa tarde. Já passam das duas.
- Pois é, Kyle e eu concordamos que você merecia dormir mais um pouco, principalmente porque ele disse que as camas do acampamento eram péssimas e desconfortáveis.
- Kyle é um marica exagerado. – falei, fazendo-o sorrir. Olhei para a bandeja que ele segurava e vi um café da manhã mais do que reforçado – Para quem é isso? – apontei para a bandeja.
- É para você.
- Mas isso é um café da manhã. Você não acha que deveria estar levando um almoço ou algo assim?
- Não. Estou levando o café que deveríamos ter tomado há três meses, antes de você ser levada. – ele abaixou a cabeça – Mas eu vou entender se que você não quiser tomar, além do mais...
- Então vamos comer logo antes que eu desmaie de tanta fome. – falei, descendo o resto da escada e indo em direção à sala.
Sentei-me no sofá, encostando as costas no braço do mesmo e colocando meus pés em cima das almofadas. Eu o vi colocar a bandeja lentamente em cima da mesa de centro e sentar-se, fazendo com que eu o olhasse de perfil. Eu não tinha reparado, mas ele usava nada mais que uma regata, o que o deixava extremamente sexy, e fazia com que um arrepio passasse por todo o meu corpo.
Ele olhou para o lado, o que fez com seu olhar encontrasse o meu.
- Por que nós não podemos ser assim? – perguntei, vendo-o pegar uma torrada na bandeja e me entregar.
- Assim como? – ele perguntou, pegando outra torrada e a levando à boca.
- Assim. – apontei para nós dois – Um casal normal.
- Bem, deve ser pelo falo de que eu sou descendente de uma bruxa e você, uma princesa amaldiçoada. – ele olhou para mim – Desculpe.
- Não, não. Tudo bem.
- Olha, – ele chegou um pouco mais perto e levantou minhas pernas, fazendo com que as mesmas ficassem em seu colo – nós somos um casal normal. O que muda é que, em vez de brigas, temos que lutar por nossas vidas e seu pai carrasco foi trocado por dois lobos cinzas. – ele sorriu e olhou para mim – Eu não trocaria nada, nem um detalhe do que vivemos, por uma chance de ser um casal “normal”. Eu gosto do que nós temos. É isso que torna nossa história especial. – estendi a mão e passei por seu rosto. Ele segurou a mesma e beijou a palma – Só uma pergunta: a gente não tem que correr daqueles lobos outra vez, certo?
- Não. Quando eu... – dei uma pausa e suspirei – Matei Lucy, a maldição se quebrou. – ele ficou em silêncio – Desculpe, eu me esqueci que isso te incomoda.
- Eu já me acostumei. Na verdade, foi tudo isso que eu fiz desde que você foi embora, me acostumar com toda essa história e entender seus motivos. – ele beijou minha mão outra vez – Obviamente, não foi fácil, mas eu tive ajuda.
- Então você não se incomoda se eu falar.
- Não. – ele chegou mais perto – Na verdade, eu esperava que você me contasse tudo.
- Tudo?
- Sim. Tudo, desde o começo.
- É uma longa história.
- Bem, eu tenho todo o tempo do mundo. E você? – sorri em resposta.
Então eu comecei, logo do começo, desde o dia em que Lucy e eu ficamos sabendo da maldição até o dia em que fui mandada para cá. Contei tudo em detalhes, sem esconder nada. Eu sentia que um peso em meus ombros estava sendo levemente tirado. Eu nunca tinha contado essa história para ninguém. Os outros, principalmente os que trabalhavam no castelo, contavam as histórias que seus avós tinham contado. Ninguém da minha família nunca realmente parou e contou o porquê de suas filhas terem que voltar mais cedo de todas as festas e, muito menos, o porquê da segurança ser reforçada depois da meia-noite, mas os rumores da maldição faziam com que eles fizessem seu trabalho com precisão.
Quando chegamos à parte de Londres, começou a contar uma parte de sua história, até que finalmente chegamos no dia em que decidiu jogar bola no meio do pátio da escola. Ele disse que a culpa não foi totalmente de , na verdade, foi dele, que se deixou distrair quando me viu entrar pelos portões da escola. Ele disse que nunca tinha visto alguém como eu, alguém que exalava tanta vontade de viver, mas aparentava nunca ter vivido. Como um pássaro dentro de uma gaiola pronto para voar.
- Isso explica muito da história e como você chegou tão rápido para me ajudar. – falei, fazendo-o rir.
Continuei a história, contando toda a nossa trajetória. E, então, ele continuou a preencher as lacunas que faltavam. Ele explicou o lado dele da história, principalmente o motivo para ele e Lucy terem ido juntos ao meu aniversário e o motivo para ele ter me deixado depois que eu matei Lucy.
- Lucy havia me dito, antes de morrer, que você ainda não sabia quem era. Que você era como um pássaro preso em uma gaiola e que, quando fosse solto, voaria o mais longe que pudesse antes de voltar para casa. – ele disse, fazendo carinho em minhas pernas – Ela disse que você precisava passar por isso sozinha e que, em nenhum momento, eu deveria interferir. No momento, eu não entendi bem o que ela quis dizer, mas, quando me falou que você estava diferente e que estava andando com o auxiliar de técnico, só eu sei o quanto eu quis socá-lo até ele ir embora de Londres.
- Você não estava no direito de socá-lo.
- E por que não?
- Você estava com Ashley. Ela era sua namorada.
- Ashley nunca foi minha namorada.
- Então o que vocês faziam juntos pelo colégio?
- Ela veio pedir desculpas por tudo que tinha feito. Ela até ia pedir desculpas para você, mas ela te viu com o Ian, então decidiu infernizar sua vida um pouquinho mais.
Encostei a cabeça no sofá.
- Muito maduro da parte dela.
- Ela estava disposta a fazer de tudo para te machucar.
- Pensei que ela estava querendo mudar.
- Ela queria, mas você desperta o pior dela. – ele sorriu – Então qual é?
- Qual é o quê?
- Sua história com Ian. Digo, vocês não se conheceram na escola, porque no primeiro dia dele, vocês já estavam de mimo.
- Como você sabe disso? No primeiro dia, ele nem trabalhou, só acompanhou o treino.
- Eu estou no time, . E eu não sou cego. Quando eu olhei para o lado e vi Ian de papo com você, eu juro que quis chutar a bola na cara dele.
- Isso é ciúme, ? – perguntei, vendo-o virar o rosto.
- Não é ciúme, porém zelo do que é meu.
- Oh, mas é claro. – falei, sarcástica.
- Então me conte.
- Acho melhor não, .
- Conta logo, . Quero saber de tudo, quero ter um motivo para bater nesse indivíduo.
- Tudo bem.
Então eu comecei a contar minha história com Ian, desde o dia em que nos conhecemos naquele bar até o dia em que eu fui parar na cadeia por causa dele. escutava tudo com uma expressão séria e fazia caretas ao longo da história. Ele até se levantou e ameaçou ir atrás de Ian por ter tentado avançar o sinal comigo. Mas logo ele se acalmou quando eu comecei a falar do dia em que ele me salvou na delegacia e, principalmente, quando ele apareceu na minha casa naquela moto, parecendo um daqueles garotos maus dos filmes que fazem qualquer mocinha perder o fôlego.
- Aquela moto é do pai do . Era a única coisa que ainda funcionava na casa dele. – ele sorriu – Quando Mel me ligou dizendo que você tinha se metido em confusão, eu não pensei duas vezes. Fui com a roupa que estava no corpo, liguei aquela lata velha e, provavelmente, levei duas multas avançando alguns sinais só para te salvar.
E, na próxima parte da história, eu senti todo o meu corpo arrepiar e minhas bochechas queimarem. olhou para mim e viu que eu estava com vergonha.
- A gente podia repetir aquela noite. – ele se aproximou, fazendo com que eu ficasse deitada no sofá.
- E a parte em que você foge e ajuda meu pai a me trancar naquele acampamento também? – falei, vendo-o ficar sério.
- Não foi assim que as coisas aconteceram. – ele disse, sentando-se à minha frente – Eu não queria ter te deixado aqui sozinha. Na verdade, eu nunca mais queria te deixar depois daquela noite, mas coisas aconteceram. Quando eu voltei, você já não estava mais aqui. – ele olhou para mim – Eu falei para o seu pai sobre o que estava acontecendo com você desde que chegou aqui, mas ele disse que não poderia fazer nada. Você tinha acabado de perder sua irmã e precisava de espaço para processar essa informação. Eu passei dias conversando com ele e com Lorenzo porque temia que alguma coisa de ruim acontecesse com você, até que, um dia, Lorenzo pediu que eu parasse de me preocupar tanto contigo e começasse a viver minha vida porque, obviamente, você estava vivendo a sua.
- Então você ficou me vigiando todo o tempo? – perguntei, abraçando minhas pernas.
- Todo o tempo, não. Na maioria das vezes, eu perguntava a , que, assustadoramente, sabia de tudo que acontecia com você. E, no dia em que eu me descuidei, você foi parar na cadeia. Eu fiquei tão furioso que jurei ficar perto de você, mesmo que você não quisesse, e ia fazer questão de chutar Ian para bem longe de você. Eu não esperava que as coisas tomassem o rumo que tomaram naquela noite. Eu estava irritado com você por ter se deixado levar por um patife daquele, mas o que eu posso fazer? Parece que, cada vez que eu digo para o meu cérebro que quero te esquecer, meu coração me lembra de que eu não posso.
- Então por que você partiu?
- Minha mãe teve alta no hospital e estava indo para casa. Ela me ligou de manhã cedo perguntando onde eu estava e o motivo para eu não ter ido buscá-la. Acredite, te deixar naquela manhã foi a coisa mais difícil que eu já fiz na minha vida. Quando eu saí da sua casa, eu liguei para pedindo para que ela fosse na sua casa para contar o porquê do meu desaparecimento, mas, quando chegou lá, você já tinha ido. Seu pai estava contando para onde você iria e por quanto tempo ficaria fora. Foi nessa hora que eu cheguei e ele me contou tudo. Foi preciso que me acalmasse, senão eu, provavelmente, entraria numa briga com seu pai. , eu vim quase toda semana saber notícias suas. Depois do primeiro mês, Mel deixou que eu ficasse aqui. – levou um pouco de tempo, mas eu consegui processar tudo. Minha cabeça parecia explodir com tanta informação – Você não vai falar nada? Não vai me bater ou chutar?
- Obrigada. – respondi.
- Obrigada?
- Sim. Eu precisava disso, de tudo isso. De Ian, das festas, do acampamento. Porque só aí eu saberia quem eu realmente sou e veja só... Eu sei. – falei, sentando-me em seu colo, passando os braços sobre seus ombros – Obviamente, eu fiquei com raiva e muita vontade socá-lo até que sangrasse pelo nariz, porém, nesses três meses, eu vivi e aprendi tanta coisa, que eu sei que tudo que todos fizeram foi para o meu próprio bem. Então, obrigada, , por nunca desistir de mim, mesmo quando não existia nenhuma esperança de que nós ficássemos juntos outra vez.
- Foi um prazer, . – ele me deu um selinho – E quanto à esperança de ficarmos juntos, ela nunca se apagou. Pelo contrário, só aumentou.
- Bom saber que sua autoconfiança continua cem por cento. – ele sorriu.
- Eu senti sua falta. – ele começou a beijar meu pescoço – Você não sabe o quanto. – ele desceu os beijos por meu ombro.
- , o que você está fazendo?
- Matando a saudade. – ele parou e olhou para mim – Na verdade, eu acho que não estou fazendo isso certo. – ele se levantou comigo em seu colo.
- ! O que você está fazendo?
- Nós vamos matar a saudade, mas do jeito certo. – ele começou a subir as escadas.
- Você só pode estar ficando louco.
- Louco, eu já sou. E, para falar a verdade, sou desde o dia em que te conheci. E se ser louco é errado, princesa, eu nunca mais quero estar certo.

Capítulo 37 – The End: Part II

- Você está linda.
Virei-me para trás e vi parado, enquanto segurava a porta. Ele estava lindo no terno de meu pai, que lhe caía como se fosse feito sob medida para ele.
- E você não está tão atrás assim. – respondi, andando em sua direção.
A tarde que e eu passamos juntos tinha sido uma das melhores, e o fato de que a casa estava vazia por praticamente toda a tarde tinha ajudado muito. Eu tinha descoberto que tinha dotes culinários dignos de um futuro chef. Até sugeri que ele seguisse essa carreira caso o futebol não desse certo, mas tinha outros planos, e fazia questão de dizer que iria cozinhar somente para mim, para sua mãe ou para nossos futuros filhos.
Era assustador o quanto, em apenas uma tarde, toda a história que durava meses estava resolvida. Sem brigas, lágrimas ou desencontros. Parecia que todo aquele sofrimento tinha sido só uma falha de comunicação, com o pouquinho do meu orgulho e um pouquinho a mais do mau julgamento dele.
Agora eu tinha adicionado um motivo a mais para ficar em Londres. Eu sei que havia prometido que dedicaria minha vida a ajudar os outros, mas, às vezes, nossos planos mudam e dão espaço para outros planos, que, nem em um milhão de anos, você pensou que passariam por sua cabeça. Eu estava pensando em ir para uma faculdade, pelo amor de Deus! Quando em minha vida eu realmente pensei em um futuro além das paredes daquele castelo?
Se me perguntassem no começo do ano o que a vida proporcionaria para mim, eu diria: “Festas e mais calos nos pés.” Eu nunca diria: “Ir a Londres, encontrar o amor da minha vida e, ainda por cima, ir para uma faculdade e estudar um pouco mais sobre Literatura.”
e eu passamos uma boa parte da tarde decidindo o que eu poderia cursar de acordo com meus gostos. Ele achava que a Literatura estava em meu sangue, quem sabe eu não poderia ser uma escritora de sucesso algum dia?
- Você tem certeza de que quer fazer isso? – ele perguntou, colocando as mãos em minha cintura – Digo, você não acha perigoso?
- Perigoso é, mas eu tenho que dar um fim a essa história. Ela já se estendeu por tempo demais e, agora, é a segurança de inocentes que está em jogo.
- E a sua segurança? Não é importante?
- Eu ficarei bem. – assegurei, segurando-o pelo colarinho – Esqueceu que sou uma princesa altamente treinada, quase uma espadachim?
Ele riu sem humor.
- Mesmo assim, eu sinto que algo pode acontecer. Algo ruim.
- É para isso que nós viemos, para evitar que esse mal aconteça.
- Eu não acredito que você está levando isso numa boa.
- Eu não estou levando isso “numa boa”, – fiz aspas com os dedos – Eu só quero que tudo isso acabe, sabe? Eu quero poder viver a minha vida sem a preocupação de que alguém que eu amo possa se machucar.
- Então por que você não deixa os soldados do seu pai darem um fim nisso?
- Simplesmente porque é a minha história e só eu posso dar um fim nela. – disse, passando os braços por sua cintura – Entenda, , eu preciso de um ponto final para que eu possa viver meu “felizes para sempre” em paz. Com você.
Vi um sorriso brotar em seus lábios.
- , dá para você descer logo? Todo mundo está te esperando. – Cassie entrou de uma vez em meu quarto, fazendo com que se afastasse de mim – Opa! Não sabia que você estava ocupada.
- Não, não! – começou – Eu estava vindo chamá-la mesmo.
- Pelo jeito, se perdeu nos braços dela porque se esqueceu de chamá-la.
- Cassie! – repreendi-a, vendo sair do quarto dando de ombros – Ah, ela vai me ouvir. Onde já se viu uma coisa dessas? Ela está precisando urgentemente de umas aulas de boas maneiras.
- Talvez você possa ensiná-la, já que ela te ensinou a se transformar na Xena.
Olhei para ele, que prendia o riso.
- Como você sabe disso?
- Lorenzo. Você não comentou sobre esse seu apelido tão... Como eu posso dizer? Oh... Tão a sua cara, princesa.
- Não comentei porque não gosto desse apelido. Não me sinto nada como a Xena.
- Oh, mas é claro que não. – ele falou, pegando minha mão e colocando-a na curva de seu braço – Talvez, Kiddo.
- Kiddo? – perguntei, descendo o primeiro degrau da escada.
- Sim, Beatrix Kiddo. Kill Bill? Você nunca assistiu a Kill Bill?
- Não, esse daí eu nunca vi.
- Bem, nós teremos todo o tempo do mundo para fazê-lo quando você terminar sua missão.
- Vocês estão perfeitos! – Mel falou tão animada, que eu podia jurar que ela estava mais animada do que todos nós – Oh, eu sempre soube que vocês acabariam juntos. Venham, desçam! Deixe-me olhá-los de perto. – segurei forte no braço de , enquanto ele me conduzia pela escada. Paramos em frente a Mel, que quase chorou quando nos aproximamos dela – Eu nunca vi duas pessoas que se completassem tanto quanto vocês dois. Bem, eu vi, Emily e Jonathan. Eu sempre soube que eles acabariam juntos, apesar de tudo.
- Obrigada, Mel! – respondi, dando um breve sorriso.
Olhei para o resto do grupo e vi Kyle comendo um sanduíche enorme com um babador preso na gola da camisa social. e estavam abraçados enquanto cochichavam algo um para o outro e Cassie olhava para mim com uma cara de poucos amigos, ao mesmo tempo em que Lorenzo a encarava com o queixo no chão.
Mel e eu tínhamos obrigado Cassie a ter um tratamento de princesa antes da festa. Sabíamos que não era nenhum baile da nobreza, porém o prazer de ver Cassie soltando gritos de reprovação ao longo do processo foi mais que prazeroso. Agora ela sabia o que uma princesa passava e nunca mais abriria a boca para dizer o quanto é fácil ser uma princesa.
- Vocês já terminaram? – Cassie perguntou mal humorada – Vamos logo com isso. – ela falou, andando em direção à porta – Estou esperando vocês dentro do carro.
- Eu vou com você. – Lorenzo falou, correndo em direção à Cassie e abrindo a porta para ela passar.
Cassie se assustou, mas deu de ombros e saiu porta afora com Lorenzo atrás.
- Acho melhor nós irmos mesmo também. – falei, olhando para Mel – Vai tudo ficar bem, Mel. Não se preocupe porque eu volto mais tarde.
- Eu espero. – ela me abraçou – Cuide-se.
- Não se preocupe, – começou – eu vou protegê-la.
Ele colocou a mão na minha cintura e me conduziu até a porta. Quando nós passamos pela mesma, vi que não era o típico carro de que nos esperava, e sim uma limusine.
- Uma limusine? – perguntei, olhando para ele.
- Bem, se vamos ao baile, pelo menos, eu acho que deveríamos ir do jeito correto.
- Não precisava.
- Mas é claro que precisava. – me segurou pelos ombros e me virou para que eu ficasse à sua frente – Eu sei que você está indo a esse baile para uma missão, mas isso não quer dizer que não podemos nos divertir ou, muito menos, que eu não possa te dar um presente. – ele colocou a mão no bolso e tirou um anel de lá – Eu sei que não é hora e, muito menos, lugar, mas quem foi que disse que eu tenho um timing perfeito? – ele pegou minha mão direita e deslizou o anel pelo meu dedo anelar – Você se lembra da Thunder? – assenti – Você é igual à Thunder para mim: veio depois de uma tempestade e me mostrou que sempre algo de bom acontece quando você perde todas as esperanças. Thunder me salvou depois que eu a encontrei, e você me salvou depois que eu me apaixonei por você. – olhei-o e senti uma lágrima descer por meu rosto – Não chore, pequena. – ele me abraçou pelos braços, fazendo com que eu passasse meus braços por sua cintura.
- Não estou chorando de tristeza, e sim de felicidade. – afastei meu rosto de seu peito para que pudesse olhá-lo. Ele segurou meu rosto e limpou as lágrimas que caíam – Obrigada, eu...
- Dá para vocês se apressarem? – Cassie colocou a cabeça para fora do carro – Quero voltar antes do jantar!
- Falando em timing, Cassie tem o melhor, principalmente quando se trata de atrapalhar os outros. – ele disse, separando-se de mim.
- Você não tem ideia. – falei, olhando para o carro e vendo Kyle puxar Cassie de volta para dentro.
se adiantou e abriu a porta para que eu pudesse entrar e, logo que eu o fiz, ele se sentou ao meu lado. Confesso que senti um frio na barriga, especialmente quando olhei ao redor e vi as vidas que eu estava colocando em risco.
Eu sabia que seria arriscado, e eu tinha falado isso para eles logo que eles voltaram para minha casa, no final da tarde. No entanto, parecia que eles não estavam escutando porque todos ignoraram meus avisos e subiram para se arrumar para o baile. Pouco tempo depois, Mel apareceu para me ajudar a me arrumar e ela disse algo que eu tinha esquecido:
- Amigos de verdade estão com você nos melhores momentos, mas, principalmente, quando tudo parece que está perdido. Amizade é sobre ser a fé para aqueles que já perderam a sua. É acreditar que, mesmo que tudo esteja perdido, ainda existe algo para se agarrar e acreditar que algo melhor está por vir.
E Mel estava certa. Quando eu havia perdido toda a fé de que eu seria uma melhor pessoa depois do que eu fiz com Lucy, Lorenzo apareceu para me resgatar da pior versão que eu poderia ser de mim mesma. Ele me mostrou que, mesmo que eu estivesse me tornando alguém que ele desprezava, uma parte de mim ainda estava enterrada em algum lugar no fundo da minha alma, e ele foi lá e me resgatou. Lorenzo não sabia, mas eu agradecia mentalmente todos os dias por tê-lo em minha vida, porque só Deus sabia o que eu poderia me tornar se não o tivesse para puxar minha orelha de vez em quando.
Na amizade, nós escolhemos quem nós queremos ao nosso redor, e eu tinha muita sorte de estar rodeada de pessoas maravilhosas que me tornavam uma pessoa melhor. E não era só na amizade que eu tinha feita uma ótima escolha, mas também no amor.
- Chegamos! – o motorista avisou.
abriu a porta e me ajudou a descer. fez o mesmo com e Lorenzo repetiu o gesto com Cassie, que ficou espantada, o que arrancou uma boa risada de Kyle.
- George e eu vamos pelos fundos. – Kyle começou – A gente se encontra lá dentro, então. – Kyle e George desapareceram entre a multidão.
Na mesma tarde, na qual e eu colocamos tudo em pratos limpos, Kyle, George, Lorenzo e Cassie foram com e conhecer a escola para que tudo acontecesse como o planejado. Eles até conseguiram entrar no escritório do diretor e tiraram a planta do colégio para estudar as possibilidades de entradas e saídas.
segurou minha mão, colocou-a na curva de seu braço e sussurrou em meu ouvido:
- Se eu te falar uma coisa, você não fica chateada? – ele disse logo depois que passamos pela porta do ginásio. O ginásio feio e fedido que, provavelmente, era odiado pela maioria dos alunos desse colégio estava irreconhecível.
Havia estrelas por todos os lados e algumas delas estavam dependuradas como bandeiras de São João, dando a sensação de que estávamos em um céu estrelado. No chão, também havia estrelas que levavam por vários caminhos diferentes. O palco estava montado no fundo e a banda que tocava não era tão ruim, era até agradável.
- Não. – respondi, olhando para ele.
- mentiu. – ele me rodopiou, o que fez com que eu ficasse de frente para ele e dançássemos de acordo com a música.
- Sobre o quê?
- Sobre entrar no baile com alguém do colégio ser obrigatório. – ele me girou e me puxou para perto dele outra vez – Não era obrigatório. Ela fez isso porque tinha fé que, se você viesse comigo, teria que me escutar mesmo que você não quisesse.
- Eu não acredito nisso.
- Acho que seu amigo Kyle percebeu o que ela estava fazendo porque ele disse exatamente o que ia dizer. – ele me deu um beijo no pescoço – Você está brava?
- Claro que não.
- Por que não?
- Porque, lá no fundo, eu queria ir com você, mas não queria admitir.
- Oh, minha princesa, estávamos com o mesmo pensamento, então. – ele me deu um selinho – Estou feliz que eu esteja aqui com você, estou feliz que esse capítulo da minha vida vai acabar, e eu vou começar outro com você nele desde a primeira folha.
Sorri e me aproximei dele. Porém, antes que eu pudesse tocar seus lábios, alguém me interrompeu.
- , vem comigo agora. – Cassie segurou meu braço, puxando-me para longe de .
Gesticulei um volto logo e me virei para Cassie com uma expressão não muito amigável.
- O que você está fazendo?
- Eu preciso falar com você. – ela me empurrou para o banheiro e expulsou qualquer um que estivesse lá dentro.
- O que foi, Cassie? – falei, encostando-me na pia – Alguém te maltratou? Te disse algo que você não gostou? Nossa! Você não ia sobreviver no colégio nem que você fosse a menina mais temida daqui.
- Lorenzo me beijou! – ela gritou e colocou as mãos no rosto.
- Isso é incrível. – falei, colocando as mãos em seus braços – Finalmente, hein? Pensei que ia ter que trancar vocês dois em um quarto até que vocês dois admitirem.
- Admitirem o quê? – ela tirou as mãos do rosto – Você acha?
- Mas é claro que sim. Acho que vocês sempre se gostaram, só precisavam de um empurrãozinho para perceber.
- Perceber o quê?
- Que o Lorenzo é um homem e você é uma mulher, então é totalmente aceitável que vocês se sintam atraídos um pelo outro. Mesmo que vocês sejam parceiros naquele acampamento, nada impede vocês de ser um pouquinho mais. Aliás, vocês se amam.
- Como você sabe?
- Já ouviu aquela frase sobre uma imagem valer mais do que mil palavras? Então, quando vocês dois estão juntos, não é preciso dizer nenhuma palavra porque tudo já está dito. – segurei em seus ombros – Então vai lá, vai viver seu final feliz. Não espere um ano e muito sofrimento do mesmo jeito que eu fiz.
- Obrigada. – ela sorriu e me abraçou.
- Boa sorte.
Cassie sorriu mais uma vez e desapareceu.
Olhei para o chão e vi que ela tinha deixado cair um de seus brincos, então me ajoelhei e peguei o mesmo. Virei-me para o espelho e arregalei os olhos.
- “Se estiver pronta, venha me pegar, Xena.” – li o recado escrito em vermelho no espelho. Aproximei-me do mesmo e peguei um bilhete colocado lá – “Siga as estrelas.”
Andei em direção à saída e, logo que eu passei pela porta, vi o caminho de estrelas que dava em direção a uma saída lateral. Levantei a barra do meu vestido e andei a passos largos até a saída. Quando abri a porta, vi o caminho se estender pelo gramado em direção ao ginásio velho. Eu sabia que deveria avisar alguém, porém minha vontade de conhecer o maldito que estava ameaçando meus amigos era maior, então andei em passos largos até o ginásio velho.
O gramado estava vazio. O único barulho era o som das árvores balançando por conta do vento gelado. Senti todo o meu corpo tremer e um mal-estar em meu estômago. Era como se meu corpo soubesse que algo muito ruim estava para acontecer, do mesmo jeito que eu senti que deveria encontrar Greta naquele castelo abandonado e quando acordei no meio da noite no dia em que tentaram botar fogo no acampamento. Era como se eu estivesse dando passos em direção a alguma tragédia que iria resultar em alguma morte.
Nas primeiras vezes, era eu quem deveria ter morrido. Será que, dessa vez, seria diferente?
Cheguei em frente ao ginásio e empurrei a porta, o que fez com que um barulho ecoasse pelo ambiente. O velho ginásio era um pouco menor que o outro, mas tinha a mesma aparência, tirando, é claro, o fato de que tudo estava enferrujado e coberto de poeira. No meio do ginásio, tinha uma luz. Embaixo dessa luz, havia alguém de costas para mim.
- Acho que eu deveria, pelo menos, conhecê-lo antes de acabar com você. – falei alto o suficiente para que ele escutasse.
- Tenho certeza de que não será necessário, – ele se virou, fazendo com que todo o ar de meus pulmões fugisse – você já me conhece. E muito bem, por sinal.
- Eu pensei...
- Pensou errado. Na verdade, pensou certo e ainda pensou do jeito que eu queria. – ele começou a andar na minha direção – No começo, eu realmente pensei que você ia se tocar, mas, após eu conseguir que você fizesse tudo que eu quisesse, bem, eu sabia que você estava em minhas mãos.
- Por que você está fazendo isso?
- Eu poderia dizer todos os motivos, mas eu não tenho o dia todo, então vou tornar isso mais fácil para você entender. – ele deu uma breve pausa – A culpa é toda sua. Não só sua, mas também da sua família e, principalmente, do seu descendente, Alexander, que fez questão de desprezar uma bruxa só para mostrar que nada o atingia. Nada disso teria acontecido se ele tivesse ficado com Rosálie. Porém, por outro lado, eu fico feliz que ele o fez, senão, eu não teria conhecido a mulher da minha vida. Que você, obviamente, matou.
- Eu não matei ninguém.
- Então agora Lucy não era ninguém?! – ele gritou – Pensei que você estivesse arrependida de ter matado sua própria irmã, já que você é uma “nova pessoa”. – ele fez aspas com as mãos.
- Lucy tinha que morrer.
- Por quê? Para você sobreviver? Foi preciso um acampamento de três meses e um estranho em um bar na Perdition Street para você se tornar o que você é hoje. Se Lucy tivesse sobrevivido, não precisaria de tanto.
- O problema de pessoas como você é que vocês realmente acham que eu queria Lucy, minha própria irmã, morta só porque tivemos algumas desavenças. Diga-me: qual irmão não tem desavenças com o outro? Lucy e eu poderíamos ser de mundos diferentes, mas era como se o tempo não tivesse passado quando nós nos encontrávamos. Obviamente, ninguém se lembra desses momentos, certo? Porque vocês preferem se agarrar aos ruins para ter alguém para culpar, o que normalmente sou eu. Se eu pudesse, eu voltava no tempo e matava a bruxa que jogou essa maldição na minha família, porque, obviamente, ela não pensou nas consequências de seus atos quando jogou aquela maldição. Se ela tivesse, pelo menos, um pouquinho de consciência, veria que uma pequena decepção amorosa não é motivo para amaldiçoar uma família inteira.
- Por um breve momento, eu quase caí nesse seu papinho. Mas não tem nada que você faça ou diga que vá me impedir de te matar ou matar aqueles pirralhos com quem você veio.
- Não era papinho. Mas, já que você não caiu naquilo, vamos ver se você cai com isso. – segurei seus ombros e dei uma joelhada em suas partes, o que fez com que ele caísse no chão. Segurei meu vestido e corri em direção à saída.
- Aonde você pensa que vai, princesa? – parei bruscamente, quase caindo para frente. Oh, não! – Nós temos muito que conversar.
- Eu não tenho nada para conversar com você, Greta.
- Aí é que você se engana, – ela andou em minha direção – não só temos muito o que conversar, como temos um acerto de contas. – ela estendeu a mão e agarrou meu pescoço. Segurei seu braço na esperança de tentar fazê-la me soltar, porém Greta era mais forte. – Você vai me ouvir mesmo que você não queira. Eu quero que você saiba o quanto eu sofri todos esses anos naquele calabouço porque sua família nos caçava como se fôssemos ratos e, principalmente, – ela se aproximou e apertou mais sua mão em meu pescoço – eu vim terminar o que Lucy não pôde porque era fraca e te amava demais.
- Solte-a! – escutei um grito ecoar pelo velho ginásio. Olhei por cima do ombro de Greta e vi parado perto da entrada segurando o que aparentava ser a minha espada.
Juntei todas as minhas forças e consegui socar Greta em seu estômago, fazendo com que ela afrouxasse a mão em meu pescoço. Consegui me virar de costas para ela e usei todo o peso de seu corpo para frente, o que fez com que ela caísse no chão à minha frente. Olhei para e fiz menção de andar em sua direção, porém a mão de Greta segurou em meu calcanhar, impedindo-me de andar.
- , me dá essa espada! – gritei, esticando a mão.
- Mas, ... – ele começou.
- , agora! – ele jogou a espada e, em um movimento rápido, me soltei da mão de Greta e peguei a espada. Virei-me novamente para ela e tirei minhas sandálias. Quem tinha inventado o salto alto definitivamente não esperava que alguém fosse usar em uma briga, sobretudo uma que envolvia espadas.
- Eu vou acabar com você, pirralha. – ela se levantou e, em uma fração de segundo, uma espada apareceu em sua mão também. Ela fez o primeiro movimento e veio para cima de mim.
Levantei minha espada, impedindo que ela me acertasse no meio da cabeça. Greta se afastou e atacou novamente, agora rasgando uma parte da saia do meu vestido.
- Ei, esse vestido é da Elie Saab, você sabe quanto custa um vestido desse, sua bruxa? – perguntei, indignada, arrancando o resto do vestido e partindo para cima dela.
Greta desviou todas as minhas investidas, mas o que ela não esperava era que eu segurasse seu braço e atingisse sua costela com meu cotovelo. Ela deu dois passos para trás e deixou a espada cair no chão. Fiz o mesmo com a minha, cerrei o punho e, sem a menor cerimônia, atingi sua bochecha.
- Para quem era uma mosca morta, até que você luta bem. – ela desviou dos meus socos e se pôs de pé novamente.
- É porque você ainda não viu o grande final. – falei, aproximando-me dela.
Greta levantou seu punho e, antes que pudesse atingir meu rosto, eu o segurei. Virei-me, fazendo com que meu cotovelo batesse em sua costela, o que fez com que ela gemesse de dor. Movi meu pé para que ele batesse na parte de trás de seu joelho e, deste modo, ela se ajoelhasse.
Girei meus calcanhares até ficar de frente para ela.
- E isso é por ter manipulado minha irmã. – falei, cerrando o punho e concentrando o máximo de força que eu tinha. Pareceu funcionar, já que Greta caiu desacordada.
Tudo aconteceu tão rápido e, quando eu menos esperava, estava gritando para , implorando que ele parasse de lutar com Ian. Por mais que eu sempre achasse o ultimato romântico o mocinho brigar com o vilão para defender a mocinha, eu não estava achando nada agradável ver travar uma luta de espadas com Ian.
A minha apreensão, porém, se foi no segundo seguinte porque conseguiu acertar Ian, fazendo com que ele cambaleasse e caísse no chão. Ele olhou para mim, antes de correr em minha direção e me abraçar forte.
- Greta previu meu plano. – eu me afastei dele – Eu estava planejando rasgar esse vestido no momento que eu vi você nele.
Ele sorriu e depositou um selinho em meus lábios.
- Alguém já disse que você tem péssimo timing?
- Não. – a voz de Greta ecoou pelo ginásio, fazendo com que nós nos separássemos. O sangue escorria de seu lábio – Até porque o meu próximo passo, definitivamente, vai vir em boa hora. – ela tirou sua mão das costas e mostrou um dispositivo – Se você não fizer o que eu digo, eu vou explodir esse lugar com você e seu namorado dentro.
Soltei uma gargalhada, o que fez com que e Greta me olhassem assustados.
- Do que você está rindo? – Greta perguntou.
- Não é óbvio? – perguntei, segurando o riso – Bem, eu estou rindo de você.
- E por quê?
- Você é uma bruxa. B-R-U-X-A. Se você quisesse que esse lugar fosse abaixo, era preciso apenas um estalar de dedos.
- Isso foi antes da sua querida guardiã, minha irmã, tirar todos os meus poderes e me fazer uma bruxa de quinta.
Segurei a mão de e retirei a espada lentamente da mesma.
- , – sussurrou em meu ouvido – o que você vai fazer?
- O que eu vim fazer. – falei, começando a andar em direção a ela – Dar um ponto final naquela que começou a escrever o prólogo.
Ergui a espada, segurando-a com as duas mãos. De repente, senti uma pontada na barriga no mesmo lugar onde Greta tinha me machucado, fazendo com que eu andasse mais devagar.
- Eu esqueci de lhe dizer que eu não perdi totalmente meus poderes. – ela levantou a mão, fazendo com que a dor aumentasse, e eu caísse a apenas alguns metros dela – Acho que não vai ser dessa vez que você vai ter seu final feliz, princesa. – ela disse, segurando meu pescoço.
- Não só vou ter meu final feliz, – ergui minha mão e empurrei a espada, o que fez com que ela deslizasse por sua barriga até que chegasse ao outro lado – como estou escrevendo o seu final exatamente como você merece.
Levantei-me, sentindo toda a dor ir embora, enquanto assistia Greta cair inconsciente à minha frente. Retirei a espada dela, vendo o sangue escorrer pela ponta. Eu sentia como se o peso de todo o mundo tivesse sendo tirado de minhas costas e finalmente algo de bom estivesse prestes a acontecer.
Virei-me para , que corria em minha direção e falava alguma coisa a qual eu não entendia.
- Mas você não escreverá o meu. – virei-me para trás e, antes que eu pudesse erguer minha espada novamente, eu já estava sendo nocauteada.
Minha vista estava embaçada, mas eu podia ver que travava sua última batalha com Ian, e eu podia até estar alucinando, mas ele realmente parecia um príncipe lutando por uma donzela indefesa.
Como todo príncipe, ganhou a luta e me pegou pelos braços, levando-me para fora do ginásio. Em menos de alguns segundos, eu vi o mesmo ser tomado pela chamas.
E essa foi a última coisa que eu vi porque nada mais importava. A batalha que eu esperei por meses tinha sido finalmente concluída, não exatamente do jeito que eu tinha planejado porque colocar , ou no meio dessa história não estava em meus planos. Porém, eu, mais do que ninguém, sabia que nem tudo na vida pode ser controlado. Mesmo que eu quisesse sair como a heroína como a dos filmes que eu assistia, eu não poderia; eu estava apreciando demais a ideia de ser a donzela indefesa. Pelo menos, dessa vez.

Acordei como se tivesse acabado de ser resgatada de um afogamento: assustada e tentando resgatar o máximo de ar que eu conseguia. Olhei em volta e não vi ninguém ao meu redor. Era estranho, dado o fato de que eu estava em uma cama de hospital usando um vestido de baile totalmente detonado e um All Star surrado, o mesmo que eu usei no primeiro dia de aula.
Levantei-me sem a menor cerimônia e senti uma tontura logo em seguida. Parecia que eu tinha bebido duas garrafas de vinho e estava com a maior ressaca de todos os tempos. Andei até a porta me apoiando ao longo do caminho e, logo que abri a mesma, me deparei com e Germana, a irmã de Greta.
- Meu Deus, ! – ele correu em minha direção, segurando-me pela cintura – Você perdeu a cabeça, menina? O que você está fazendo fora da cama? Você precisa descansar!
- Eu não preciso descansar, eu preciso de respostas. – soltei-me dele e andei em direção a eles – E então, o que aconteceu?
- Você não se lembra? – perguntou, colocando-se ao meu lado novamente.
- Eu me lembro de ser nocauteada e ser levada nos braços por enquanto o ginásio queimava. Oh, meu Deus! E os alunos? Eles estão bem? E , , Cassie, Kyle e Lorenzo? Eles estão fora de perigo?
- Estão todos bem. – Germana respondeu – e foram para casa com seus amigos de Florença. Lorenzo ligou para os seus pais e os deixou mais aliviados, já que eles perderam o voo para Londres por causa de uma tempestade.
- E você? Como você veio parar aqui?
- Eu estava aqui, minha querida. Estava só esperando o momento certo de aparecer.
- E o momento certo de aparecer era depois de Ian e Greta botarem um ginásio abaixo? E como é que Ian e Greta se conheciam mesmo?
- Seu diretor queria destruir aquele prédio velho mesmo. Acredito que eles fizeram um favor.
- Em qual quarto Ian está?
- Ian não sobreviveu, .
- Nem Ian, nem Greta. – Germana falou – Ambos estavam no ginásio quando te tirou de lá. Eles estavam muito fracos para lutarem ou para impedirem as chamas de tomá-los por completo. Greta estava muito machucada por conta da luta com você, e Ian, por conta da luta com .
- Como é que eles se conheciam mesmo?
- Ian era meu sobrinho, filho de Greta. Ele acabou se envolvendo nisso depois que conheceu Lucy e se apaixonou por ela.
- Mas Lucy era apaixonada por . – respondi.
- Isso não impediu Ian de se iludir e achar que Lucy estava apaixonada por ele, do mesmo jeito que Lucy fez com . Ian podia ser pior do que a mãe às vezes. Só nós sabemos o quanto sofremos para colocar aquele menino nos eixos. Mesmo assim, Greta foi mais rápida, pois já tinha envenenado o menino, o que fez com que ele ficasse igualzinho a ela: com um coração negro e cheio de solidão. – Germana colocou a mão em meu ombro – Não se culpe, você não sabia de nada disso. – sorri em resposta – Agora chegou a hora de viver sua vida do jeito que você queria.
- Obrigada por tudo. – respondi, recebendo um abraço dela.
- Não há de quê. Fico feliz que, pelo menos, alguém saiu feliz dessa história. Cuide dela, , meu querido.
- Pode deixar, eu vou. – ele respondeu, enquanto Germana começava a andar pelo corredor e desaparecia entre as pessoas. – Você está mesmo bem?
- Aham. É muito para processar, mas eu vou ficar bem. Por quê? – olhei para ele.
- Porque eu tinha preparado uma surpresa para você, mas acho que você está muito fraca.
- Eu estou bem. – falei, segurando suas mãos – O que é a surpresa?
- Vem. – ele me puxou para que eu ficasse em pé – Eu vou te mostrar. – ele me guiou até o elevador e apertou o botão do último andar.
- , o que você está fazendo? – perguntei, passando os braços por sua cintura.
- Você vai ver. – ele me abraçou de volta e beijou o topo da minha cabeça.
A porta do elevador se abriu e me pegou pela mão, levando-me em direção a uma escada. Subimos apenas um lance de degraus e logo estávamos em uma porta que dizia: “Proibida a entrada de visitantes”.
- Para alguém que salva donzelas indefesas, você gosta de lugares proibidos, hein? – falei, vendo-o abrir a porta de leve. Ele olhou para mim e sorriu – Vai me dizer que você trabalhou em um hospital também?
- Não, mas eu passava muito tempo vindo aqui enquanto minha mãe dormia lá embaixo. – ele me puxou e esperou que eu passasse para fechar a porta.
Nós estávamos na cobertura do hospital. As luzes da cidade estavam tão lindas como no dia em que me levou para o parque e nós nos beijamos em cima da roda-gigante. Havia um som no canto da parede, e eu vi andar até ele e ligá-lo. Mesmo com o barulho dos carros da cidade, eu reconhecia a melodia da música. Era Everything, do Lifehouse. A minha música preferida.
- Nós não tivemos a chance de ter nossa dança. – ele parou à minha frente – E eu quero dançar com você.
- É mesmo necessário?
- Se vamos ficar juntos para sempre, – ele me segurou pela mão – teremos que contar para os nossos filhos porque papai e mamãe demoraram tanto tempo para ficar juntos. – ele me rodopiou enquanto as primeiras notas da música tocavam – E, obviamente, teríamos que dar um final triunfal a ela. Tem coisa mais triunfal do que dançar em cima do telhado de um dos prédios mais lindos da cidade com a garota que você ama ao som de Lifehouse? Acho que nem Shakespeare poderia pensar nisso.
- Shakespeare gostava de finais trágicos.
- Mas o nosso não vai ser. – ele olhou em meus olhos – Não existe exército nesse mundo que me faça me ficar longe de você outra vez. A não ser o do seu pai, é claro.
- Acho que ele concordaria em deixar minha segurança em suas mãos. Você provou ser um guerreiro e tanto. Agora eu me dou conta de que você era tudo aquilo que eu procurava.
- Só agora? Eu sabia que você era tudo aquilo que eu mais precisava desde o dia em que eu te vi pela primeira vez, princesa.
E foi preciso apenas um beijo para que eu sentisse que o meu “felizes para sempre” estava apenas começando.

Epílogo

Eu conversava animadamente com Cassie, ao mesmo tempo em que elogiava seu vestido. Cassie tinha aprendido muito nesse tempo que havia decidido morar no castelo enquanto seus pais viajavam com o dinheiro que ela tinha recebido do acampamento. Marta estava super feliz em ajudá-la a se transformar em uma dama da corte – obviamente, sem perder um pouco da brutalidade que corria no gene da família. Marta estava fazendo com Cassie o que sempre desejou fazer comigo, até aulas de francês ela estava tendo. Tudo isso para agradar sua sogra.
Lorenzo e Cassie estavam namorando desde o dia do baile que fomos em Londres, há exatamente um mês. Eu nunca tinha visto os dois tão felizes. Eles se completavam de uma maneira que me dava certeza de que esse namoro se transformaria em um casamento algum dia. Eu faria gosto de vê-los tendo seus filhos e os educando como guerreiros iguaizinhos aos pais.
e também estavam mais felizes do que nunca. Eles estavam planejando passar seu aniversário de um ano de namoro aqui, em Florença. tinha gostado tanto da cultura que tinha começado a fazer aulas de italiano para que pudesse entender as conversas da cozinha do castelo.
- Ok, garotas! – Mel gritou ao microfone. – Vamos lá!
Estávamos no casamento de Mel e Alfred, que estava acontecendo no quintal do castelo. Todos estavam vestidos de branco e as damas de honra – eu, e Cassie – usávamos coroas de flores na cabeça, assim como a noiva. Havia sido um casamento simples e lindo; Alfred e Mel tinham uma sintonia que podia ser vista a quilômetros de distância. Vê-los finalmente casados depois de anos de indiretas realmente fazia com que algumas lágrimas descessem do meu rosto.
- Vamos ver quem será a próxima sortuda a subir ao altar. – Mel fez a contagem, fazendo com que algumas das garotas fossem um pouco mais para frente. O que elas não esperavam era que o buque caísse no colo de Cassie, o que a deixou vermelha como um pimentão.
Virei meu rosto para o lado e vi o grupo de garotos que conversava perto do bar. Avistei Lorenzo e gesticulei um “Você é o próximo”, o que fez com que Cassie me beliscasse. Virei minha cabeça para o lado novamente e lá estava ele, de braços cruzados, com aquela manga três quartos branca, parado e escutando atentamente ao que Lorenzo falava. Ele não sabia, mas, desde que eu o vi no aquário nessa mesma posição, tinha prometido que, um dia, iria dizer a ele para ficar sempre daquela maneira para que eu pudesse admirá-lo melhor.
Diferente daquele dia no aquário, quando ele me olhou, não havia nem um pouco de ódio em seus olhos, mas sim amor. Quando ele sorriu para mim, eu podia jurar que não havia coisa mais linda em todo o mundo.
Os casais começaram a encher a pista de dança enquanto aquela melodia conhecida tocava no fundo. Everything tinha se tornado a nossa música, principalmente depois que começou a cantarolar essa música em quase todo o lugar da casa. Ele havia decidido que eu não poderia morar sozinha numa casa tão grande, já que papai e mamãe tinham reatado e decidido viver a história de amor que fora interrompida há anos aqui, em Florença. Mel e Alfred iam partir para uma lua-de-mel por quase três meses e também iam morar em Florença depois que voltassem.
A mãe de tinha decidido tentar reencontrar sua família agora que ela e Germana tinham se encontrado. Germana a tinha convencido de que sua família – por mais estranha que fosse – eram pessoas de bons corações.
- Você me concederia a honra dessa dança, princesa? – ele estendeu a mão para mim.
- Mas é claro que sim, meu príncipe encantado. – respondi, levantando-me.
- Eu já te disse que não gosto de ser chamado assim.
- E eu já te disse que eu vou te chamar assim, mesmo que você não queira. – ele riu, enquanto me guiava pelo salão – Você é um príncipe encantado que veio em seu cavalo branco resgatar a donzela indefesa. Mais de uma vez, se me recordo bem.
- Você não é tão indefesa quando diz ser, mocinha. – ele deu um beijo na ponta do meu nariz – E eu não sou nenhum príncipe encantado em um cavalo branco. Eu sou um cara normal, que é dono de uma moto. – tinha ficado com a moto do pai de , já que o mesmo havia prometido para sua mulher que nunca mais iria subir em uma moto outra vez.
O que não sabia era que um cara normal, que é dono de uma moto, era a minha ideia de príncipe encantado. Mas essa era uma história que eu contaria para ele em outro momento, em algum lugar do nosso “felizes para sempre”.

Fim.



Nota Final:

Depois de dois anos e sete meses, Flawless Curse chega ao fim. Não posso dizer que eu estou que estou completamente feliz porque FC foi minha vida por quase três anos e desapegar de uma história que me fez crescer tanto como escritora e ainda me fez pular em um mundo totalmente novo não foi uma tarefa muito fácil.
Eu quero agradecer a todas que leram, não importa o site: FFJB, FFOBS, JF e FFR. Uma fic só vai pra frente por causa das suas leitoras e eu tive sorte de ter leitoras maravilhosas que sempre me apoiavam mesmo quando o post parecia que não tinha fim elas ficam esperando, e puxando minha orelha pra lembrar que ainda estavam aqui.
Eu não podia de deixar de agradecer as minhas betas porque só elas sabem que o meu português não é dos melhores e que sem elas, com toda a certeza não existiria a fic. Eu queria agradecer especialmente a Duda, porque foi por causa dela que eu me tornei uma escritora melhor ao decorrer desses dois anos. Eu aceitei cada conselho que ela me deu como um aprendizado para me tornar melhor a cada dia, principalmente hoje em dia, em um mundo onde tudo acontece tão rápido, encontrar uma pessoa que tenha paciência e tempo para lhe dar conselhos é raro. Então, obrigada Duda, por ser sempre paciente e ter se tornado uma peça tão importante na história de Flawless Curse.
E obrigada também as outras betas dos outros sites, a Jess, a Priscilla, Lelen, That, Brille e também a Gabriella. Muito obrigada meninas, vocês foram uns amores e definitivamente uma parte importante para fic.
Espero que vocês possam me acompanhar em outros projetos que eu provavelmente ter daqui pra frente. Pra ficarem ligadas no que vem pela frente é só visitar a página das minhas fanfics , seguir o twitter e também curtir minha fan page , onde contem todas as minhas fics. E se Flawless Curse virar livro, quero ver todo mundo com cópia na mão. XOXO. <3

(Eu decidi fazer um agradecimento só pra todos os sites porque vocês não tem noção do quanto eu to chorando e não tenho estrutura pra escrever de um por um.)


Nota da beta: Só queria dizer que foi um prazer betar FC, Roberta.


Qualquer erro nessa atualização é meu, só meu. Reclamações por e-mail ou pelo twitter.



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