Finalmente tinha o corpo daquele homem jazido aos meus pés. Vingança, aquele sentimento que todos dizem ser um prato frio... Bobagem! Eles não sabem o quão quente era ter sangue traidor em mãos. A satisfação de poder respirar e o cheiro ser de vitória. Guardei a adaga, ainda ensangüentada, no bolso improvisado e com os dedos ainda pingando vermelho, escrevi no chão os dizeres “A PRINCESA DE SAINT GERMAIN AGRADECE A CORTESIA E MANDA LEMBRANÇAS”. Quando terminei, não pude deixar o sorriso de escárnio tomar conta do meu rosto. A esposa dele não ia gostar nem um pouco desta insolência, mas e daí? O que ela poderia fazer? Enviar soldados? Eu mataria um por um tão rápido, quanto fiz com os outros. Aliás, mais rápido, pois não precisaria de tortura para achar informações sobre seu comandante, já que ele estava morto neste momento.
Era tão bom ter seu peito vazio de sentimentos ruins – mesmo que aquilo desse muito espaço para a dor corroer ainda mais. Pelo menos tinha vingado quem amava. Pelo menos ele poderia, em fim, descansar em paz. Meus joelhos enfraqueceram, cedendo ao cansaço e às lembranças que invadiram minha cabeça.
Flashback on.
Acordei ofegante e tremendo dos pés à cabeça com o som dos trovões que tocavam uma marcha fúnebre atrás das minhas janelas. Estendi uma das mãos para o copo ainda cheio de água, e o virei aos poucos, retomando o batimento regular de meu coração. Havia tido o mesmo pesadelo das noites anteriores. O mesmo calabouço, com a mesma figura encapuzada que depois se mostrava ser meu tio e depois um corpo. Um corpo estático no chão. Seu sangue em poças e seus membros esfolados, e logo após, uma dor lancinante tomava meu peito. A memória causou-me calafrios. A forma como os olhos de meu tio me encararam... Como se pudesse fazer pior e tivesse tido pena. Era assustadora, parecia uma ameaça. Minha mão buscou novamente o copo na cabeceira e o contato do vidro seco nos meus lábios lembrou-me que ele estava vazio.
Levantei-me em solavanco decidida a não acordar nenhum serviçal do palácio e dirigi-me a cozinha real. A chama da vela que segurava não era forte suficiente para iluminar todo o cômodo, todavia, não precisava de luz para me localizar em um lugar onde vivi a vida inteira. Guiei meu corpo pelas escadarias, tomando cuidado para não fazer barulho, afinal, aquelas paredes sabiam fazer um eco magnífico e não queria meu pai acordado. Ele andava uma pilha de nervos desde a visita do barão e já não dormia bem fazia tempo, não gostaria de colaborar para sua insônia. Posicionada à porta da cozinha, sufoquei um grito quando, ao checar os corredores, um raio alumiou o espaço e na superfície da mesma estava uma marca de mão escarlate. A vela caiu de minha mão.
Sangue.
Era isso que vi e, automaticamente, senti que uma pessoa a metros de distância ouvia o tamborilar do seu coração esmagando as costelas. Quem estaria ali essa hora? O que havia acontecido? Hesitar em abrir a porta não ajudava a ter respostas. Ainda que um pouco confusa se deveria ou não entrar, empurrei a porta, a qual rangeu tranquilamente, revelando o meu maior pesadelo. Desta vez não havia mistérios. Era meu tio e com o mesmo olhar cruel. Havia uma trilha fina de sangue até o corpo que tanto me atormentara. Porém, acho que lá no fundo já esperava tudo aquilo. Todo aquele líquido espalhado, a visão do assassino, o olhar penetrante dele... Todavia, não estava pronta para reconhecer as vestimentas da pessoa morta. Lágrimas escorriam pelo meu rosto rapidamente e meus joelhos já haviam encontrado o chão. A dor que sentira no sonho não era nada se comparada a que sentia agora, ao descobrir quem era o sujeito cujo corpo jazia sem vida. A dor ao ver meu pai morto. - Papai... – murmurei com a voz sufocada – Por quê? – perguntei ao seu assassino, levantando o rosto e fitando os olhos de um traidor – Por que fez isso com meu pai... Com seu irmão? - Ele sorriu sem emoção. - Porque a coroa vale muito mais, meu bem. Muito, muito mais do que um irmãozinho mais velho bobo – ele falava com calma, como se fosse tudo uma brincadeira, e isso me irritava - Ah, esquece isso querida... Não adianta chorar. Ele não volta mais. - Cale-se! – esbravejei – Dê-me um motivo para que eu não o denuncie agora mesmo! Aliás, não sei por quê eu estou te dando a chance de se explicar, sendo você um... - Shh... – ele me interrompeu – Chega de drama, princesinha. Eu posso matá-la agora ou mais tarde, você escolhe. Mas ainda tem a última opção, docinho! – Ele andou até mim e brincou com meus cabelos, exatamente como o sádico idiota que era – Já que não preciso de mais um parente morto, você pode viver comigo, mas só se renunciar o seu posto de rainha, sabe... – ele agora sussurrava no meu ouvido – Senão, tudo o que fiz não vai adiantar de nada e eu terei de matá-la. Que você acha? O que eu acho? Acho que o inferno é um lugar muito simples para pessoas como ele. Embora quisesse ele preso, eu sabia que assim que o denunciasse, ele arranjaria um jeito de me matar. Ele possui tantos amigos fora da cadeia. Mas se eu ficasse... E se eu dissesse que estava tudo bem e fingisse que nada aconteceu, poderia ter minha vingança? Poderia fazer pagá-lo. Será que eu conseguiria? Brincar com o que acontecera com meu pai... Esconder a dor? Não sei, porém tentaria. Se for para vingá-lo, eu teria de conseguir. Respirei fundo uma, duas vezes, forcei meus dentes a aparecerem e meus lábios a se curvarem. - Claro, tio. Eu posso ficar com você – respondi – Já pensou em uma explicação para essa bagunça? Ele sorriu, desta vez, verdadeiramente. - Ah! Claro, eu pensei em... Parei de ouvir daí, deixando meus neurônios formularem um plano, algum ponto fraco. Deixando-os acharem todas as formas dolorosas de atingir meu tio. Todas as armas e rotas que poderia usar. E foi muito difícil não sorrir imaginando.
Flashback off.
Quando fui dormir naquela noite, já tinha tudo arquitetado e era imensamente bom saber que ele havia funcionado hoje. Forcei meus braços a empurrarem o chão e caminhei até a entrada da caverna, limpando o sangue nas minhas vestes. Pela primeira vez em anos, eu sorria. Sorria verdadeiramente.
FIM!
N/a: Olá de novo! Como já disse é a primeira fic que posto e realmente espero que tenham gostado ou pelo menos achado que valeu perder seu valioso tempo com ela >< Se tiverem gostado, adivinha só? Sim, tem outra kkkkk só vai demorar pra ser postada.
Enfim, eu estava escrevendo um conto de fadas para um trabalho de narração da escola e depois assisti Tróia (sim, pela primeira vez. Pode chamar de sem cultura kkkkk) e no filme eu pensei: Ah! Como seria ser uma serial killer naquela época? E foi daí que puxando as ideias surgiu None Wonderland.
Ps: Josephine você é um anjo.
hey Vick, obrigada de verdade :3
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