Estava acabado. Estava tudo acabado. Sim, ainda restavam alguns inimigos, mas esses temiam “O Grande Vencedor” da guerra e, por isso mesmo, escondiam-se nos últimos resquícios de escuridão que permaneceram desde que “O Grande Líder” caíra em desgraça.
Seu corpo mantinha-se esticado sobre uma espécie de cama, cuja cor dos lençóis era de um tom indecifrável. Ele apenas concentrava-se na atividade de mirar um ventilador de teto.
Aquilo era uma espécie de aparelho trouxa que, em teoria, deveria ser responsável por mandar algum vento pelo aposento, entretanto, o objeto girava lentamente, em pequenos rodopios, sem aliviar um terço sequer do calor infernal que era culpado por fazer seu rosto brilhar de suor. Esboçou um riso sem graça e mordeu o lado inferior ao pensar que seu pai que, nesse momento deveria estar sendo devorado por diversas espécies asquerosas, jamais soubera que, apesar do repúdio da Família Malfoy a respeito dos trouxas, seu único e mimado filho conhecia boa parte daquele mundo. Mas afinal, o que diferia o mundo dos trouxas do mundo dos bruxos? Exceto pelo fator da magia, ambos possuíam suas políticas, seus povos, seus ideais... Em suma, deveriam ser equiparados na maioria dos itens.
Passou a mão pelos cabelos claros, deixando-os eriçados para que não grudassem na testa devido ao calor daquele mundo comum. Olhou a sua volta. O quarto estava mais imundo do que no momento em que chegara nesse hotel. Vários exemplares de antigas edições do “Profeta Diário” espalhavam-se ao redor do lugar e de sua cama. Todos noticiavam a mesma coisa. Extra, extra! A Profecia fora cumprida! Todos venerem Potter! Por que não nomeá-lo Ministro da Magia? Afinal, ele salvara o mundo! Potter era o grande salvador do mundo da magia, O Escolhido, o herói! Todos não admiravam os heróis? Não amavam os heróis? Não idolatravam heróis? Contudo, todos desconheciam a existência do conflito interno pelo qual estes mesmos passavam. Vê-los em cena era fácil. O difícil seria vivenciar o que aqueles futuros ídolos vivenciavam para chegar à fama. A maldita fama que os faziam amados.
Malfoy não queria ser um maldito herói. Desejava, na verdade, que todos fossem para o inferno com seus ideais perfeitos e toda a sua falsa simpatia. E não fora essa a atitude que tomara? Ao perceber que Voldemort iria decair, resolvera fugir. Partiu em direção ao mundo trouxa, afinal, eles jamais iriam procurá-lo ali devido ao forte ódio que alimentara por aquele povo. Escolhera residir no primeiro hotel que encontrara. Um lugar completamente imundo, quente e refugiado. Tentara usar sua magia para melhorar as condições em que deveria viver por um tempo, entretanto, não conseguira. Amaldiçoara os quatro ventos, pois, pelo visto, sua única e última ligação com o mundo em que vivera toda a vida fora rompida. Havia sido banido para sempre, e a prova disso era a anulação de sua magia. Já não se sentia diferente frente aos outros que viviam naquele mundo. Sentia que todo o diferencial de ser um bruxo esvaíra-se de seu corpo. Sua varinha, que lhe escolhera há sete anos, não passava agora de um pedaço de madeira inútil. Tão sem utilidade quanto o ventilador que pairava sobre ele. Tão sem utilidade quanto o próprio Draco.
Desviou a atenção para a pequena mesa de cabeceira que se encontrava ao lado de sua cama. Ali, não havia nada exceto poeira de séculos atrás e uma garrafa de bebida que o próprio Malfoy trouxera de casa juntamente com outras vinte que há muito haviam sido esvaziadas e jogadas pelo carpete esverdeado do quarto. Tomou a garrafa entre os dedos da mão esquerda e bebeu goles consecutivos sem parar ao menos para pensar no ardor que tomava conta de sua garganta. Descobrira o falso prazer de se afogar na bebida quando descobrira também que sua mãe, assim como seu pai, estava morta. Na realidade, ela não suportara o fardo de conviver com a ideia de um marido morto e um filho desaparecido e renegado. Ainda sim, apesar de tudo, entre seu pai e sua mãe, ele só conseguira ter afeto pelo lado materno da família. Fingia suportar o pai, pois fora ele quem trouxera à tona a desgraça de aliar-se ao lado da guerra que só lhes trouxera problemas e infelicidade. Mas agora, que já não possuía mãe, agarrava-se a sua única amiga, seu único refúgio: A bebida. Entornou mais um gole e sentiu o gosto descer pela goela, não se importando ao derrubar um pouco sobre a camisa preta de mangas puídas. O sabor era amargo. Tão amargo quanto a guerra.
Seus olhos lacrimejaram ao sentir a bebida alcançar o estômago. Uma lágrima escorreu pela extensão de sua face, entretanto, o gosto da bebida não possuía ligação alguma com esse gesto. Esta única lágrima que pendia em seu queixo era responsável por carregar consigo uma parcela de toda a desgraça contida na guerra. Afinal, quantos não morreram tentando transformar-se em heróis futuramente esquecíveis? Valia à pena? Realmente valia? Todo o sofrimento? Todas as perdas? Entregar a vida em troca de uma vitória que nem ao menos era garantida? Bem, nem mesmo ele, Draco Malfoy, saberia ao certo a resposta de todos os questionamentos. Afinal, não ficara para ver quem venceria aquele pandemônio. Foi um covarde, mas ainda sim, um humano, ao simplesmente temer o maior de todos os inimigos: A morte.
Sua única certeza desde que aquilo começara, era que nunca havia desejado de fato estar na guerra. Mas quem, em sã consciência, gostaria de adentrar um conflito? Todos lutariam! Todos se arriscariam! Mas ele não fazia parte dessa grande massa. Tornou a levar a garrafa novamente aos lábios, sentindo boa parte da bebida lhe escorrer pelo rosto. Sentia pela amiga que era desperdiçada, entretanto, não podia reclamar por aquilo que não tinha volta.
Ainda recordava-se de seu pai lhe forçando a ajudar o Lord das Trevas, pois, caso contrário, sua família seria extinta do mapa. Entretanto, ele não fora capaz de se juntar ao lado obscuro da guerra, assim como não fora capaz de se juntar ao lado de Potter. Fora somente capaz de fugir cometendo assim o pior de seus erros, pois, desse modo, deixara seu pai ser morto e sua mãe partir. Só pensara em si mesmo, ou melhor, em si e nela.
Draco tivera que alimentar a vida inteira um ódio mortal por todos os bruxos que não possuíssem um sangue tão puro e imaculado quanto o da Família Malfoy. Mas ninguém, nem mesmo sua mãe soubera que, um dia, ele se apaixonara perdidamente por uma trouxa ou, como eles gostavam de chamar, uma “sangue ruim”. Conhecera no seu primeiro dia no trem para Hogwarts. E, com impecável clareza, se recordava do momento exato.
Crabble e Goyle haviam saído do vagão no qual ele se encontrava para atazanar Neville Longbottom, deixando Draco sozinho. Assim que os dois saíram, uma garota – também primeiranista – adentrara sua cabine sem ao menos perguntar se poderia se sentar ali. Malfoy lançou um olhar fixo para a menina na esperança de que ela se amedrontasse ou que, simplesmente, desse o fora do seu vagão, porém, ela fizera exatamente o contrário. Sentou-se à frente do garoto de cabelos loiros e mirou seus olhos cinzentos.
- Olá. Sou . – sorriu, sem estender a mão ou algo parecido, apenas esperava que ele lhe dissesse seu nome em resposta.
Draco a ignorou e mirou a paisagem que circundava o trem.
- Não dói ser educado, sabe? – rebateu, mas continuou sem uma resposta vinda do garoto.
Ela suspirou e permaneceu três infindáveis minutos em silêncio, mas, quando Draco finalmente achou que ela fosse dar o fora para outro vagão, tornou a falar.
- Você tem lindos olhos. Um lindo tom acinzentado! – elogiou, sorrindo novamente na esperança de que ele lhe elogiasse também, entretanto, sem receber nem se quer um “oi” em troca, ela jogou: - Mas possui um péssimo humor! – exclamou e saiu pisando firme pelo trem fazendo que a última coisa que Malfoy avistasse fossem seus olhos , tão escuros quanto a intensidade do sentimento que não conseguira entender, mas que, com certeza, começara a partir daquele momento.
Ele voltara de seu devaneio ao entornar outro gole da ardente bebida que agora depositara sobre a mesa. Malfoy nunca tivera a oportunidade de lhe dizer, mas nunca vira em toda a sua vida olhos tão enigmáticos e furiosos quanto naquela tarde.
Era uma criança naquela época, mas mesmo antes de sua entrada a Hogwarts, fora instruído a se sentir superior. E, ao ouvir a garota mencionar seu sobrenome, já tomara conhecimento de que, ao contrário dele, ela não possuía uma linhagem pura. Sendo assim, seu inconsciente já lhe mandava avisos de seu pai proibindo qualquer tipo de amizade que não envolvesse pessoas de seu nível.
Mas ele nunca conseguira evitar os encontros com . Por mais que desejasse nunca mais vê-la, sentia o destino conspirar a favor desses mesmos encontros. Mais tarde, depois daquele primeiro ano, ele tornara-se um sonserino e ela, como seu coração negava prever, uma grifinória. Lembrava-se de esbarrar com ela durante algumas aulas ou de momentos em que seus olhares se cruzavam e se desviavam durante os intermináveis corredores de Hogwarts.
Deveria ter pensando nela, ou melhor, deveria ter trazido ela consigo, mas como ele poderia adivinhar que lado venceria aquela guerra? Tivera medo! Tivera medo de Voldemort vencer, de todos os trouxas serem eliminados do mundo e, com eles, a própria , mas seu arrependimento não a traria de volta, do mesmo modo como não traria sua mãe.
Sentou-se em uma cadeira de frente a um dos poucos objetos que se encontravam no pequeno quarto em que agora morava: Um espelho. Um estranho o fitava. Um estranho de cabelos loiro-sujos, de pele branca como papel, de olhar inexpressivo, ou melhor, expressivos na arte de presenciar uma guerra. Um estranho de grandes marcas roxas abaixo dos olhos, que demonstravam os horrores não ditos. Um estranho reconhecível: Ele mesmo, Draco.
Tornou a fitar novamente sua figura estranha no espelho. Seu queixo estava molhado pelos resquícios de bebida que haviam escorrido por ali. Ele entornou o restante que sobrara na garrafa e jogou o vasilhame vazio no chão, quebrando-o em algumas pequenas partes. Limpou a boca com um pedaço da manga da camisa preta e tirou alguns fios do cabelo loiro que teimavam em pender sob os olhos. Esse gesto o fizera recordar mais uma vez de , mas, dessa vez, era uma lembrança que pertencia ao terceiro ano dele em Hogwarts.
Hermione Granger havia acabado de lhe desferir um soco no rosto, fazendo com que ele tomasse uma única atitude: Fugir. Correu pelos arredores de Hogwarts até alcançar os campos perto do local onde praticava quadribol. Sentou-se na grama, tentando abstrair toda a raiva que sentira. Ele merecera aquele golpe, entretanto, não era obrigado a suportá-lo. Sentiu um vento cortante bater no lado do rosto em que fora atingido e, automaticamente, passou a mão sobre sua face. Granger havia atingido sua bochecha e seu nariz, e esse último parecia ter adquirido uma cicatriz e um vazamento de sangue que começara a lambuzar seu rosto e manchar suas roupas. Devido à raiva, não lembrava nenhum feitiço que pudesse sibilar para que o sangramento parasse. Conformou-se com isso. Mais tarde iria até a enfermaria, mas agora, queria simplesmente que a euforia passasse. Deitou-se sobre a grama, deixando que o sol secasse o sangue em seu rosto. Aos poucos, sentiu o corpo relaxar e uma sombra ocultar o calor tão bem vindo do sol.
- O que há de errado com você, Malfoy? – uma voz indagou. Ele a via de cabeça para baixo, pois estava deitado e ela em pé.
Draco revirou os olhos. Dois anos haviam se passado desde que eles conversaram, ou melhor, desde que ela havia lhe dirigido à palavra.
- Eu solicitei sua presença, ? – rebateu, fechando novamente os olhos. – E não bloqueie meu sol.
emitiu um som de insatisfação com os lábios e, em seguida, jogou sua mochila na grama, sentando ao lado do garoto loiro.
- Não sei se você sabe, mas o mundo não gira ao seu redor – falou, enquanto ele continuava com os olhos fechados. – E deixe-me ajudar com isso!
Ela abriu lentamente a mochila e retirou um recipiente e um pano. Tomou a varinha das vestes e evocou água no recipiente, molhando o pano. A seguir, deslizou-o delicadamente tentando descolar o sangue do rosto de Malfoy.
- O-o-qu-que diabos você está fazendo? – perguntou, ao abrir os olhos e perceber que algo lhe tocava o rosto.
- Acredite ou não, estou te ajudando!
Ele apoiou-se sobre os cotovelos e evitou mirar os olhos de . Ela dava pequenas e leves batidinhas com o pano, tentando recolher todo o sangue que escorrera sobre seu rosto.
- Aposto que foi Potter. Vocês não se suportam por cinco segundos! – exclamou, continuando a minuciosa tarefa.
Draco mirou a grama, numa tentativa de não dirigir-se a ela. Mas, ao ouvir aquele palpite, soltou uma risada rouca e um tanto sarcástica.
- Quase! Foi a amiguinha dele: Granger – rebateu, sem esperar que ela perguntasse se ele havia revidado o golpe.
O vento, que antes lhe doía o machucado, formava agora uma dupla maravilhosa com o pano úmido que ela lhe passava no rosto. A umidade e o vento suave faziam com que sentisse a pele mais refrescada.
Ele tornou a fechar os olhos uma última vez, deixando que ela terminasse a limpeza. Afinal, sua raiva já havia se esvaído e, apesar de não lhe permitir nenhuma amizade com , não podia negar que aquilo era mais íntimo do que qualquer relação que possuísse e isso lhe dava medo, muito medo.
- Por Merlin, Granger lhe bateu na testa também? – perguntou. Malfoy deu de ombros mostrando indiferença.
Ela voltou o pano uma última vez na água, pois o líquido do recipiente já não estava mais tão límpido devido ao sangue. Passou-o sobre a testa de Draco e soprou levemente para que a umidade secasse ainda mais rápido. Nesse exato momento, ele abriu os olhos e notou que agora era ela quem estava com os olhos fechados soprando sua testa. Seus lábios fartos e rosados estavam unidos em um biquinho. Seus cabelos longos se estendiam por suas costas e esvoaçavam com o vento ao redor. Draco sentia o perfume dela adentrar seus poros. Ele, o perfume, misturava-se ao cheiro da grama e ao calor do sol. Malfoy continuava sentindo medo, porém, nunca se sentira tão bem perto de alguém em toda a sua vida.
finalmente abrira os olhos e encontrara os de Draco fitando-a, mas não se sentiu envergonhada ou algo parecido, simplesmente retirou os fios claros do cabelo dele de cima do corte que estava escondido sob sua testa. Colocou-os cuidadosamente longe do ferimento.
- Cuide-se, certo? Eu só limpei os pequenos ferimentos. Depois vá até a enfermaria que Madame Pomfrey fará algo mais útil – recomendou, e saiu sem esperar ou exigir um “obrigado” em troca.
Draco voltou de seu devaneio e respirou fundo. Mesmo ali, naquele quarto imundo, ainda mantinha em suas lembranças o perfume da garota que lhe ajudara aquele dia.
Seus cabelos loiros estavam maiores que o comum. Quase lhe alcançavam os ombros agora, mas já não possuíam mais a cor clara de antes. Eram de um loiro-sujo, refletindo a sujeira que ele comportava em si. Malfoy se perguntava o que acharia disso. Apoiou o cotovelo sob a mesa e tentou se fixar no reflexo de seus próprios olhos. Sendo assim, entrou novamente em seu estado de loucura disfarçado em reminiscências e reviveu o momento em que estivera com ela em seus braços.
Agora se lembrava do quarto ano em Hogwarts. Recordara-se, com extrema clareza, que aquele ano fora marcado por um evento inesquecível: O Torneio Tribruxo. Três campeões haviam sido selecionados, entretanto, um quarto e imprevisível elemento adentrara o quarteto: Potter. Draco não pôde segurar uma risada de escárnio ao lembrar da cara do grifinório dirigindo-se aos portões que acolhiam os “vencedores”. Odiara Harry, contudo, não desejava a morte do garoto, mas, mesmo assim, esperava que ele ficasse ao menos um tanto danificado.
Porém, a escolha de Potter como favorito definitivamente não era o que lhe agradava em suas lembranças do quarto ano em Hogwarts, e sim um dos acontecimentos que vinham no pacote junto ao Torneio Tribruxo: O Baile de Inverno. Draco simplesmente não queria ir ao baile. Não desejava ver a felicidade estampada no rosto de todos enquanto ele jamais poderia dançar com quem sempre desejara. Mas, como suas lembranças teimavam em trazer a tona, Draco, por imposição de Narcisa, sua mãe, teve que comparecer ao baile. A Sra. Malfoy sempre alegara que a presença da família era indispensável em eventos de qualquer porte, mesmo que isso incluísse a presença de pessoas de menor escala social. Sendo assim, Draco resolveu por fim convidar Pansy Parkinson. Não possuía afeto de espécie alguma pela menina, mas Pansy sempre fora agradável com sua mãe e, por puro amor a Narcisa, fizera o sacrifício de desempenhar o papel de um bom acompanhante para a garota.
Havia combinado com Pansy em um local que ficava um pouco antes da escadaria em que os convidados adentravam o baile. Olhou no relógio de pulso e notou que a garota estava atrasada quinze minutos. Batia o sapato social preto firmemente no chão. Vestira-se com uma rapidez sem precedentes e agora se apresentava em um smoking completamente preto. Por isso, a atenção se voltaria exclusivamente para seus cabelos loiros, que estavam penteados cuidadosamente e também para seus olhos, pois o preto das vestes realçava ainda mais o tom acinzentado de seu olhar.
Mais quinze minutos se foram e agora Pansy estava atrasada pouco mais de meia hora. Draco havia começado a ficar impaciente. Começara a ter a impressão de que todos os convidados a comparecer no baile já haviam descido a escadaria passando por ele. Vira Rony Weasley passando com uma roupa que fazia todos rirem, fazendo-o ficar mais vermelho que seus próprios cabelos. Vira Granger em um magnífico vestido e, pela primeira vez na vida, notou como ela era bela. Vira Diggory, Krum, Chang, vira até mesmo seus capangas da Sonserina passando com seus respectivos pares. Mas, quando já estava começando a cogitar a possibilidade de abandonar Pansy, avistou . Não havia mais ninguém no topo da escadaria e, mesmo se houvesse, ele se negara a enxergar.
era a noite. Seu vestido era de um tom dourado completamente delicado. À medida que o vestido alcançava seus pés, sua cor ia ficando mais escura quase tendendo para um marrom ou até mesmo preto. Não possuía alças e era completamente decorado com milhares de pontinhos prateados que mais lembravam uma constelação. Assim, ela se transformava na noite. Nada era mais propício, pois uma relação entre ela e Draco só seria permitida por sua família no momento em que a meia-noite fosse tão límpida quanto o meio-dia.
- Você jamais deveria usar um vestido como esse! – exclamou, de cabeça baixa, conforme a garota esperava seu par um pouco à frente dele mesmo.
virou o rosto para trás, procurando a fonte da voz mesmo sabendo de quem se tratava. Não havia mais ninguém ali, exceto os dois. Sendo assim, percebeu de imediato que o garoto se referia a ela.
- Posso saber por quê? - indagou, colocando impacientemente uma mecha de seus cabelos ondulados e soltos atrás da orelha.
Draco deu de ombros enquanto encostava seu corpo na parede e cruzava os braços à frente de seu peito. Tinha medo de cometer qualquer besteira com ela ali, tão próxima de seu corpo.
- Acho que eles desviam a atenção dos seus olhos... Ou da sua personalidade irritante - falou, mirando o chão e quase cochichando a frase com receio de que as paredes ouvissem.
Agora era ela quem dava de ombros.
- Posso saber quem é sua companhia? – indagou Malfoy, tentando mudar o rumo da conversa.
Ela sorriu sem graça e, pela primeira vez, Draco vira a garota ficar vermelha.
- É um amigo de Krum... Matt Farwell. Eu nem estava querendo vir ao baile, mas ele me viu estudando com Hermione e ela ficou me mandando sinais de que ele estava interessado em me convidar – explicou, passando a mão no vestido.
Olhou rapidamente para Draco reparando em suas vestes. Ao notá-las, esboçou um sorriso de satisfação.
- Acho que está atrasado, não? – perguntou retoricamente, tentando uma brincadeira com a garota.
sorriu em deboche e se aproximou ainda mais de Malfoy.
- Acredito que você não está em uma posição privilegiada para ficar rindo do atraso de Matt. Afinal, onde está Pansy? – debochou, cutucando-o no peito com seu dedo indicador.
Rapidamente, Draco tomou controle da afronta. Abraçou o dedo da menina com sua mão direita e, em seguida, já estava entrelaçando todos os seus dedos com os dela. Levou levemente a mão da garota aos lábios e a beijou delicadamente.
- Obrigado por me ajudar com aquele soco de Granger no ano passado. Nunca lhe agradeci como deveria! – lembrou, dando outro beijinho em sua mão.
Continuou segurando-a firmemente. Depois, deslizou sua outra mão sobre a pele do rosto e dos ombros da garota. nunca ficara tão feliz por ter escolhido um vestido sem alças. Ele tomou a liberdade e colocou outra mecha marota do cabelo de atrás das orelhas da garota. Por fim, tomou-lhe a cintura com um dos braços e, com a outra mão, segurou firme na sua para lhe guiar nos passos de dança que sua mãe tanto lhe ensinara quando era criança.
entendeu o sinal e deixou-se guiar por Draco. Colocou a cabeça sobre o ombro direito do garoto, tentando evitar um contato maior com seus olhos cinzentos.
Uma música lenta comandava a dança, pois esse era o momento do Baile em que os campeões dançavam com suas companhias. Draco a conduziu com passos leves. Não dava a mínima para dança e, arriscara-se até a dizer que, nesse momento, não dava a mínima nem se alguém os tivesse observando. O que importava era aquele instante. Um instante que, sem dúvidas, jamais se repetiria.
Sentia um perfume floral emanando da pele e dos cabelos da garota. Aproximou seu rosto dos fios ondulados e tentou guardar o aroma em suas lembranças. Ela levantou o pescoço do ombro do garoto e o apertou ainda mais em um abraço carinhoso. Draco dirigiu seus lábios até a orelha direita da menina.
- Você se superou – sibilou, beijando o lóbulo da garota, provocando arrepios por todo o pescoço e ombros de . Draco sorriu ao notar tal reação.
- Obrigada! – murmurou ela, sem saber se deveria ou não retribuir o elogio.
Os dois continuaram abraçados enquanto a música diminuía o ritmo. Malfoy foi parando rapidamente de conduzir a dança deixando que pudesse sair – ou não – de seu abraço.
Por fim, olharam-se fixamente sem saber o que fazer. Ambos queriam mais do que aquelas rápidas atitudes trocadas, mas sabia perfeitamente que jamais teria uma vida plena com Draco.
- Nos vemos por aí! – exclamou ele, soltando por último a mão da garota enquanto apertava seus dedos com cuidado. – E obrigado novamente.
depositou um beijo na bochecha de Malfoy, deixando-a com um tom mais rosado que o normal. Não precisava dizer mais nada, pois a noite fora repleta de acontecimentos. E, se não fosse por Pansy chegando ao longe, poderia ter terminando ali mesmo... No ápice de um sonho, pois um momento como aquele, jamais viria a se repetir.
Sorriu em indignação ao lembrar-se de como fora um inconseqüente tomando aquelas atitudes. Quem lhe garantira que Pansy não havia presenciado nada daquilo? Mas agora já não importava. E, como um dos últimos atos de seu desespero, agarrou-se à sua lembrança mais preciosa e deixou-a inundar seu estado falho de consciência.
Era agora monitor de sua casa no quinto ano em Hogwarts. Fazia sua vigia noturna quando, de repente, ouviu sons abafados, algo como um choro vindo de algum lugar. Já pensava na deliciosa sensação de punir quem estivesse zanzando pelos corredores em horários não permitidos. Acelerou o passo e encontrou a fonte do choro. Era ninguém mais ninguém menos que .
- O que você está fazendo aqui? – perguntou em tom ríspido, depositando a luz no rosto da menina. Percebeu que ela rapidamente tratou de secar as lágrimas com a manga das vestes. Mas a vermelhidão dos olhos estava longe de desaparecer.
não respondeu.
- Eu falei com você, ! – insistiu Malfoy, puxando com força o braço direito da menina para que ela lhe olhasse no rosto.
Rapidamente, o rejeitou, empurrando seu braço e desviando do corpo do rapaz.
- Não me toque! Não me interessa o que você vai fazer comigo por estar transitando pelos corredores. Só não me toque. Não suporto mais gente como você! – falou, tentando não gritar para não acordar mais ninguém.
Malfoy tentou não demonstrar a surpresa ao ver, pela primeira vez, como ela poderia ficar hostil e zangada.
- Só não suporto mais ninguém me chamado de sangue-ruim! – esclareceu, e cruzou os braços tentando proteger o corpo. Tentava permanecer forte. Tentava não chorar novamente. – Não suporto mais você!
Draco olhou para ela incrédula.
- E me diga por que motivos eu tenho que te aceitar e lhe tratar como a melhor pessoa do mundo? Nós mal nos conhecemos, não lhe devo nada – falou dois oitavos mais alto do que ela falara anteriormente. Com uma mão prendeu o corpo da garota contra a parede, e com a outra elevou a luz para que pudesse olhar no rosto da garota.
Seus corpos se tocavam conforme ele a prendia contra a parede fria do castelo. Draco podia sentir a respiração ofegante dela, conforme ele tentava, com muito custo, se manter calmo. Agora era ele quem retirava os fios de cabelo dela que haviam colado em seu rosto devido às lágrimas salgadas do choro. Colocou, cuidadosamente, uma mecha atrás da orelha de .
- ... - murmurou, pela primeira vez, o apelido que ele mesmo criara para a garota. Em seguida, avançou sobre os seus lábios fartos. Primeiro depositou-lhe um beijo suave e meigo nos lábios da garota. Depois, sem que ela mostrasse qualquer tipo de relutância, ele aprofundou mais ainda o beijo. Deixou que, levemente, o ato ficasse menos singelo e mais quente. Sua língua encontrou espaço entre os lábios dela e, sem que percebesse, ele tomara entre seu braço livre metade da cintura da garota, pressionando-a ainda mais na parede. Por fim, depositou nela um último beijo cálido nos lábios.
- Não deixe que babacas como eu te chamem dessa maneira – pediu, quase que em tom de ordem.
não conseguira dizer nada. Sentira-se boba, sem ação e ainda mais fraca que alguns minutos atrás enquanto chorava.
- Nós não nos vimos – avisou Draco, postando o dedo indicador da mão que não segurava a luz sobre os lábios da garota como se a alertasse para que ficasse em silêncio. Liberou o corpo da garota da parede fria e deixou que ela se fosse. Pela primeira vez, estava confuso quanto a seus sentimentos. Eram extremos. Abrigavam dois polos. A extrema felicidade pelo que acabara de fazer e, ao mesmo tempo e intensidade, o medo de que alguém descobrisse seu maior segredo.
Ele sorriu, tocando os lábios com a mão esquerda como se tentasse se lembrar do gosto adocicado do beijo de . Sorriu para seu reflexo insano, na esperança de que meras lembranças aliviassem a dor que insistia em abater sobre seu corpo.
Dirigiu-se novamente à cama e esticou seu corpo sobre o colchão tentando se deliciar com aquela sensação tão distante. Dois anos haviam se passado desde que aquilo acontecera. E, nesse curto período, aconteceram tantas coisas e tantas mudanças que dois anos pareciam se equivaler a duas décadas.
Draco retirou a carta amarelada do bolso da frente de sua calça jeans preta e postou-a sob os lábios, beijando-a. Em uma caligrafia delicada e fina lia-se à frente da carta: “Você”. Ela, provavelmente, nem tivera tempo de cogitar a possibilidade de escrever ou não seu nome na carta. Escolhera a opção mais sensata: Não escrever. Afinal, todas as corujas estavam sendo interceptadas e, com isso, ninguém deveria adivinhar que Malfoy tinha uma “amiga” rejeitada pelo lado que sua família escolhera lutar.
Ele sabia o conteúdo de cór, mas, mesmo assim, não resistia a dar uma última olhada na caligrafia de . Abriu o pedaço de papel amarelado e leu mais uma vez.
Eles pegaram minha família. Eu fugi. Fugi porque minha mãe me ordenou que o fizesse, ou melhor, fugi porque ela suplicou por sua vida que eu o fizesse. Não sei para onde vou. Não sei por quanto tempo conseguirei fugir. Só sei de uma coisa: Eles vão me pegar. Por favor, assim como minha mãe eu lhe suplico, abdique disso, fuja, seja feliz com alguém que mereça seu amor. Sei que você fez algumas escolhas erradas, mas, ainda sim, não é tarde demais. Fuja! Só... Só quero que saiba que apesar de seguirmos caminhos totalmente opostos nos últimos dois anos, eu nunca me esqueci de nenhuma daquelas poucas vezes que estivemos juntos. As lembranças são tão nítidas e claras em minha mente, quanto o sol naquela tarde em que lhe encontrei deitado sobre a grama nos jardins de Hogwarts. Desde aquela tarde no trem, em que conheci seus olhos cinzentos (e não seu nome ou sua linhagem familiar), nunca mais te esqueci. Fuja e não se envergonhe de ser um sobrevivente.
Com amor,
.
Essa era a última lembrança que possuía dela. Depois do beijo no quinto ano, ainda a encontrara em meio a várias aulas. Mas o sexto ano em Hogwarts fora um misto de confusão e loucura graças a ele próprio e a invasão da escola. Obviamente, no sétimo ano, não pisara o pé na escola e ele, amargurado por não receber notícias, nunca soubera do paradeiro da garota até que a carta lhe chegou às mãos tempos depois.
E isso era tudo que lhe restara. Uma vida renegada, sem magia, sem familiares. Contando apenas com o álcool que lhe abrigara em seus malditos braços e com um amor sem precedentes em sua família. Com algo que acontecera de forma tão rápida e esporádica que até mesmo ele se recusava a entender. Havia feito exatamente o que ela pediu, mas a verdadeira questão era o que fazer em seguida? não dera nenhum conselho na carta e, assim, só o fez perceber como era um verdadeiro inútil que só acatava ordens e fingia ser superior perante os outros.
Ela o pedira para fugir e ele o havia feito. Mas, ainda sim, fora mais forte que ele. tinha todo o azar do mundo contra ela. Vinha de uma família que o temido Lord das Trevas repudiava, entretanto, isso não a impediu de lutar enquanto ele, Draco Malfoy, nunca havia partido em direção à guerra, mas a guerra havia vindo em sua direção. Tinha a impressão de ter lutado durantes dias intermináveis, incontáveis, contudo, era tudo uma destorcida miragem. O espelho denotava isso, um rosto marcado pelo fracasso, pelo medo, pela desistência, por um amor que jamais seria concluído.
O cansaço não se devia aos longos conflitos, a luta desvairada pela sobrevivência, ao combate com a magia. E sim por alguém que se negara até ao último minuto a partir para guerra e, inacreditavelmente, acreditava tê-lo feito. As marcas, o cansaço, a tristeza, a preocupação, reforçavam a face daquele que havia enlouquecido perante a morte das únicas pessoas que amara na vida: Narcisa Malfoy, sua mãe e , a garota de olhos , sorriso espontâneo e uma pele que parecia irradiar todo o sol existente contrapondo com as sombras que ele sempre carregara dentro de si.
Draco não acreditara e jamais acreditaria, mas aquele no espelho era o reflexo de seu eu interior marcado pela derrota e medo da guerra, da perda de quem mais amava. Um dia, ele possuíra quase tudo. Hoje, porém, nada mais restava. Pegou mais uma das garrafas que se encontrava no quarto e retirou seu lacre, entornando outro gole da bebida, deixando-a ser sua fonte de calor e fitou o estranho no espelho. Sorriu para si mesmo enquanto alimentava sua loucura, afogando-se no álcool, nos sonhos e na pura solidão. Malfoy jamais lutara. A guerra enfim havia terminado. E ele sempre estivera ali, em total segurança enquanto poderia estar sendo estraçalhada pela maldição da morte ou até mesmo por Greyback. Enquanto ele lamentava a vida, ela fugira, se refugiara, lhe enviando uma carta às escondidas e pedindo para que ele permanecesse vivo. Como se tudo fosse ficar bem, se ele estivesse bem.
Estava só. Fechou os olhos tendo a visão completa de cada traço físico e de personalidade de . Podia ver as curvas de seu corpo, o desenho de seus lábios, assim como, conseguia ver sua expressão zangada no dia em que a vira na sua ronda noturna. Sua expressão curiosa no primeiro dia no trem, seu sorriso confiante e nada tímido quando seus olhares se cruzavam nos corredores. Entornou um último gole da bebida nos lábios e deixou metade do líquido escorrer pelo rosto, sorrindo para si.
Draco continuava só, mas em seu devaneio, em sua loucura por alguém que jamais voltaria a vê-lo, mas ainda sim continuaria a amá-lo, ele sonhava... Sonhava que, no momento em que Greyback dilacerou o corpo e o rosto de , ele estava lá para acolhê-la em seus braços, para acabar com o inimigo. E enfim, tomaria os lábios de nos seus como se estivesse gritando para todos os imaculados de “sangue-puro” que nada mais era relevante, que o mundo girava para todos do mesmo modo: bruxos, mestiços ou trouxas. E que, no final da guerra, nada disso importaria.
Na tristeza insana, Draco adormeceu sonhando profundamente. Seu estado de devaneio o fazia acreditar nessa realidade fantástica. Ele não veria os lábios de quando despertasse. E sim um mundo ao qual ele já não pertencia mais. Deixara para se preocupar com isso quando o efeito do álcool passasse. Seguira o conselho de . E, em sua insanidade incurável, fora o mais corajoso de todos os heróis. Afinal, ele era um sobrevivente.
N/A (12/09/2012 - 16:55) Hello para as garotas da Grifinória, Sonserina, Corvinal e Lufa-Lufa (:
Como vão vocês, lindas? Espero que bem!
Bom, para falar rapidamente dessa fanfic gostaria de dizer que, na verdade, ela é baseada em um challenge que escrevi há mais ou menos um ano. Era sobre a guerra com o Lord das Trevas e, como subtema, eu peguei o pós-guerra, ou seja, o que sobrou depois que o Tio Voldy se foi, é.
Espero que não achem a fanfic tão insana quanto eu acho. Sim, você e Malfoy tiveram basicamente um encontro a cada ano, entretanto, ele morreu de amores pelo impossível. Afinal, quem já não leu ou soube de alguém que já vivenciou isso? Acho extremamente comum! Mas aqui ele se negou a viver esse amor para tentar proteger a personagem, entretanto, infelizmente, foi em vão.
Gostaria de agradecer a Barvin, que leu primeiro, fez essa linda capa, e insistiu até vencer (Barvs ganhou, mas só dessa vez haha) para que eu colocasse uma cena do baile. Acho que por isso foi uma das piores cenas, porque eu escrevi por último e tals. E esse calor não está ajudando, rs. E gostaria de agradecer também a Camisss que, carinhosamente, leu minha fic e expressou sua linda opinião, obrigada diva!
Por fim, um beijo para tia J.K por ser responsável pelo melhor universo criado em uma saga de livros, rs.
É isso, nos vemos por aí gatinhas.
Nota da Beta: Qualquer erro nessa fanfic é meu, então me avise por email ou mesmo no twitter. Quer saber quando essa fic vai atualizar? Fique de olho aqui. Obrigada. Xx.