CAPÍTULOS: [CAPÍTULO ÚNICO]





A fúria de Florence






Mamãe sempre dizia para mim e meus irmãos, que a escuridão fria e sombria era a mais perigosa de todas. "Não saia enquanto o escuro banhar a vila", ela dizia. E eu podia ouvir seu sussurrar em plena calada da noite, "Não devemos acreditar na fúria", era o que ela falava em meu ouvido. O vento assobiava na janela, tornando o quarto gelado, e alguns pássaros batiam suas asas bem perto, fazendo­me temer a entrada deles. Porém, nada seria mais assustador que um grunhido vindo do lado de fora do quarto. As luzes se apagaram assim que o relógio marcou meia noite, todos da pequena cidade se afogaram em uma escuridão dolorosa, onde só podíamos ouvir ruídos.
"Vá para cama", mamãe dizia afastando­nos de perto, abrindo a porta lentamente para não fazer barulho. Qualquer barulho chamava a atenção ali, entregando­nos. É melhor dormir do que assistir. Pela janela podíamos observar que pessoas ainda passavam. Pessoas que perderam a hora. Corriam contra sua vontade para não serem pegas, suas pernas apressaram­se assim que seus olhos avistaram o grande relógio da vila. 00:05. "Vão embora, o sonho já se acabou, se não forem embora agora, cuidado, a fúria já chegou".
Juntando o medo e a pressa, parecia que as calçadas ficavam mais longas; assim, dessa forma, não alcançariam a perfeição. Jamais pensei em ter pena deles, onde se havia casas e comida, se queriam se dar o prazer da morte, então a culpa não seria minha. Deitei­me na cama novamente, meus pés estavam gelados, levei uma eternidade para cobri­los; não podia enxergar nada.
Fechei meus olhos, e tampei meus ouvidos. Gritos começaram a ecoar por toda a parte; a vila estava em chamas. Pequenos rastros de cor vermelha e laranja pairavam perto da janela, e um calor surgiu em minha testa fazendo­me suar. Mais gritos, agudos e ensurdecedores, ecoavam por todo o lado.
Há teorias de que o mal ronda sua casa durante a noite, para pegá­la se você não dormir na hora certa. Digamos que, nunca fui de tanta eloquência para contar uma história com tanta facilidade de absorção, embora eu fosse uma das melhores a fazê­lo. Mas quando a lua sobe até o topo do céu e ilumina seus olhos, você não consegue enxergar nada além da morte observando­lhe de longe. Porque uma hora outra ela irá vir até você.
Não haveria outras chances.
A regra era bem clara. Não saia na rua quando a escuridão banhar a cidade! Ou senão... A escuridão vai te engolir.


Capítulo Único


Dia especial. Mamãe acordou­me às seis, afim de fazer­me ajudá­la com o café da manhã. Levantei de bom grado, pondo um pequeno sorriso nos lábios, fazendo­a andar pelo longo corredor da casa até a cozinha. Meus pés já não estavam mais tão gelados.
"O que aconteceu desta vez?" papai resmungava na cozinha enquanto segurava seu pequeno jornal semanal, e tomava seus goles de café caseiro. A cozinha nem sempre fora tão grande, porém quanto mais gente se abrigava ali, menos espaço sobrava. Mamãe estava na pia quando me dei conta de que ela pusera os pães em cima da mesa. "Não vai cortá-los, menina?" assenti indo até lá. Segurei a grande faca afiada em minhas mãos; e a coloquei sobre os pães cortando­os em fatias pequenas. Nosso vilarejo era pobre; não tínhamos tanta comida para nos alimentar, então uma das normas era economizar.
"Já não era sem tempo", papai disse dando uma pequena gargalhada, quase cuspindo o café quente de sua boca.
"O que foi agora?" mamãe secou as mãos no pano de prato e se aproximou de papai inclinando­se para frente botando seus olhos no jornal. "Ora, até que enfim!", ela resmungou voltando­se a para mim. "Ande mais rápido com isso, seus primos vão chegar daqui a pouco". Revirei os olhos impaciente e continuei a cortar os pães em meu ritmo. Jamais gostara tanto de mamãe, seus olhos transpiravam medo e insegurança. Já os de papai, mostravam que ele era um homem forte e profundo, o que me fazia gostar dele ainda mais. Terminando de cortar todos os deliciosos pães, deixei­os em cima da mesa para que pudessem ser servidos.
"Vou tomar banho", falei, retirando­me da sala, arrancando olhares de aprovação de minha mãe. Dei um pequeno sorriso de lado encarando­a enquanto abria a porta do banheiro.
Podia ouvir as risadas da cozinha enquanto colocava meu vestido branco e minha capa vermelha. Perguntava­me o por quê de tanta felicidade, quando não se podia ao menos ter uma noite tranquila no vilarejo. Peguei minha pequena cesta, e me olhei no espelho pela última vez. Meus cabelos eram longos e loiros, e o capuz vermelho deixava­os quase escondidos. Forcei um sorriso, e saí.
"Não vai comer nada, pequena ?" O tio gordo e barbudo perguntou vindo em minha direção, dei um passo para trás e o encarei com pudor, fazendo­o parar.
"Irei pegar flores da floresta!" mamãe olhou para mim sorridente.
"Ficou sabendo que o prefeito da cidade ao lado vai nos emprestar soldados?"
"Para que, posso saber?"
Mamãe negou com a cabeça como sempre, respirando fundo. "Para pegarmos a fúria, menina." pisquei algumas vezes a fim de absorver a informação, impossível.
"Não vai dar certo", falei movendo­me de um lado para o outro impaciente.
"Ora, não diga bobagem, flor", papai levantou­se e foi até a pia pegar mais um pouco de café. Dei de ombros.
Caminhei até a porta enquanto todos os olhos na cozinha me seguiriam, um em especial. O encarei chamando­o com a cabeça disfarçadamente.
"Tome cuidado", pude ouvir mamãe gritar assim que saí porta afora. Florence era o vilarejo onde eu morava, pequeno e confortável durante o dia, perigoso e mal frequentado durante a noite. Não podia dizer que tinha medo de morar ali; durante o dia todos eram felizes e amáveis. Não tínhamos medo de andar pelas calçadas, e eu muito menos de entrar na floresta.
"!" Alguém gritava meu nome bem distante de mim, não me virei para encontrá­lo, apenas continuei caminhando em minha trilha. A floresta não ficava tão longe da minha casa, apenas mais alguns passos e eu estaria dentro dela. “! Espere!" O garoto conseguiu me alcançar parando ao meu lado, apoiou as mãos no joelho tentando recuperar o fôlego. Tanto esforço para nada. Sorri delicadamente para ele.
"Posso saber por que me segues, pequeno ?" assim que ele conseguiu levantar­se de novo seus lábios se moveram, parecia não ter uma resposta plausível para minha pergunta, embora eu já soubesse o motivo.
"Acho perigoso uma menina como você andar pela floresta sozinha", um riso baixo saiu de minha garganta e eu o encarei como se fosse louco.
"E quem vai me proteger? Você?" Apontei para ele tocando seu peitoral com o dedo, e algo me dizia que ele sentiu­se ofendido.
"Bom, melhor que ninguém, certo?". Neguei, colocando a cesta no outro braço enquanto saltitava pela trilha. Já podia avistar as grandes árvores uma ao lado da outra; e belas rosas que enfeitavam a entrada. "Se incomoda se eu lhe acompanhar?" ele me alcançou novamente fazendo­me parar. Geralmente eu fazia aquilo sozinha, mas ele não me incomodaria tanto. Andamos juntos um ao lado do outro, ele com suas mãos nos bolsos da calça jeans rasgada, e eu cantarolando enquanto segurava fortemente a cesta em minhas mãos. Abaixávamos sempre que víamos flores bonitas e as colocava dentro da cesta; formando um belo buquê. parecia entediado ao pegar flores; geralmente os rapazes por lá cortavam madeiras para colocar nas fogueiras ou matavam animais para fazer carne. Ele era meu primo, ou quase isso; meu tio o adotou quando o achou sozinho no caminho da vila. De acordo com ele, o garoto choramingava dizendo estar perdido e sozinho, alegava que sua mãe havia o abandonado. Desde então, nos tornamos amigos inseparáveis, portanto, ele era a única pessoa da minha idade naquela vila que me fazia companhia. Andávamos calmamente pelo caminho de terra enquanto em nossas voltas só tinham árvores e mais árvores, já havia perdido a noção de tempo.
A floresta estava silenciosa como sempre, o vento batia nas árvores fazendo­as balançar e algumas folhas caíam em nossas cabeças. Os pássaros cantavam alegremente enquanto eu cantarolava junto a eles.
"Você não acha que é melhor voltarmos?" disse baixinho enquanto pegava mais uma tulipa do chão.
"Não, acabamos de chegar". Ele parou subitamente e segurou meu braço.
"Estamos aqui há mais ou menos duas horas, , estamos bem longe de casa". Olhei em volta percebendo que nunca tinha ido àquela parte da floresta antes; estava banhada por árvores secas, sem flores ou folhas. A cesta já estava cheia, tão cheia que algumas pequenas flores caíam sem querer pelo chão. Fascinada pela imagem que se passava em meus olhos, fiquei parada imóvel rodando meu corpo afim de captar cada detalhe daquele lugar. As árvores eram assustadoramente finas e seus galhos eram grandes; daqueles que batem em sua janela durante a noite e fazem uma sombra no chão do seu quarto e logo você se assusta achando que é um monstro. Mas eu não estava nem um pouco amedrontada por aquilo; ao contrário de . Ele era forte, seus músculos eram visíveis embaixo da blusa branca apertada; mas isso não o deixava menos frouxo. Apesar de corajoso, os mitos que corriam por aquele lugar o deixavam preocupado.
"Vamos embora, , se escurecer não vamos conseguir chegar a tempo em casa". Revirei os olhos, impaciente, e voltei a mover meus pés para frente, dando pequenos passos adiante. , que com certeza não ficaria ali sozinho, seguiu­me até onde eu ia. ", onde você está indo?" sua voz era falha porém grossa, e ele se juntou a mim segurando minhas mãos. Recuei por um instante, mas um calafrio passou por meu corpo, arrepiando­me; aleatoriamente apertei suas mãos sobre as minhas. Um uivo forte e estrondoso ecoou pelo local, fazendo­nos dar um pulo para trás e nos encolher pregados um no outro. Meu corpo tremeu dos pés à cabeça, e apertava minha mão fortemente fazendo­me gemer de dor, porém, eu não queria que ele a soltasse. "Podemos voltar, por favor?" Assenti desesperadamente e demos meia volta. Um vento frio e forte invadiu o caminho em que estávamos, espalhando todas as minhas flores pelo chão, tirando o capuz de minha cabeça e fazendo meu cabelo voar para trás. colocou as mãos no rosto para impedir que entrasse areia em seus olhos e eu fiz o mesmo largando a cesta no chão. Nos encolhemos de novo um ao lado do outro e nossas mãos se juntaram mais uma vez; as árvores se balançavam fortemente como se estivesse prestes a caírem no chão. Assim que o vento diminuiu, nos recompusemos e voltamos a andar, seguindo o caminho das flores. De repente, parou olhando para trás e então voltando a encarar o caminho em sua frente. "Já passamos por aqui, ", ele disse parecendo sufocado,sua voz estava macia e rouca, e seus olhos escuros e profundos, assustadoramente apavorados. Andamos mais um pouco até alcançar uma grande árvore úmida. Olhei para cima encontrando nuvens cinzentas e escuras chocando­se uma com as outras. Então, um trovão alto surgiu no alto do céu e ao mesmo tempo em que raios apareciam no ar correndo até o chão, um uivo alto soou bem perto de nós, fazendo­nos encolher novamente atrás da árvore.
"Vai chover", falei baixinho agarrando­me nos braços fortes de que procurava com os olhos, atentamente, por uma saída próxima. Ele estava leve e irrequieto; como uma criança, e apavorado demais para conseguir se mexer. Gotas frias e pesadas caíam em meu rosto assim que olhei para cima novamente, e começaram a ficar cada vez mais grossas e rápidas.
"Vai escurecer, temos que sair daqui", ele agarrou minha mão e me puxou para perto dele fazendo­me andar de acordo com seus passos apressados e pesados. A terra no chão começou a tornar­se barro, e pregavam em minha sapatilha preta. Àquela altura já estávamos molhados, não ensopados, mas em breve estaríamos. de segundo a segundo olhava para trás para verificar se não estávamos sendo seguidos. "Ele só pode nos pegar depois da meia noite, certo?" perguntei apavorada, minha voz quase não saiu, eu mal pude me ouvir. A chuva engrossou e um vento tão forte quanto o primeiro bateu em nós fazendo­nos ir para trás sem vontade.
"Certo... Eu acho!", ele disse no mesmo tom que eu, quase num sussurro. Voltamos a andar assim que o vento diminuiu, uma tempestade começou a cair em cima de nossas cabeças. Meu capuz já não estava em minha cabeça, e meu cabelo estava molhado sobre meu rosto.
De repente, não conseguíamos enxergar nada que estivesse em nossa frente. "Onde estamos?!" ele gritava para que eu pudesse ouvir.
"Eu não sei, não estou vendo nada!" gritei também e o senti mais perto de mim.
"Nenhuma luz, nada?!" ele chegou bem perto e eu pude sentir seu corpo colado no meu. Olhei ao meu redor para ver se encontrava algo, mas estava impossível.
“Nada!" seu corpo ficou leve como se ele se rendesse, então ele saiu de perto de mim superando minha mão contra a dele.
"Não se separe de mim, está bem?!" eu assenti e ele começou a andar para frente seguindo o caminho de barro; mesmo não enxergando nada. Não sabíamos que horas eram, não podia ser tão tarde, não estava escuro ainda antes de chover. Outro uivo alto nos assustou fazendo­nos parar por um instante.
"Ele está perto de nós”, falei baixinho, meu corpo começou a tremer e me encolhi ao lado de , que parecia ficar mais corajoso quando me via com medo. Ele agarrou minha mão e me puxou para outro lado do caminho, uma curva estreita à direita, que nos levava para dentro de uma neblina úmida, a chuva já havia diminuído, e fazia mais de quinze minutos que andávamos perdidos por ali. De acordo com a teoria de estávamos andando em círculos, mas não me lembrava de ter visto neblina nenhuma vez. Logo, avistei uma pequena luz vindo de um lugar próximo; apontei para lá e seguiu meus dedos com seus olhos. Um pequeno sorriso aliviado tomou conta de seus lábios, e ele me puxou até a direção da luz. Não tinha certeza se aquela luz era de alguma casa do vilarejo, porque na minha cabeça a vila era do lado esquerdo da floresta, e estávamos totalmente no direito.
tirou alguns galhos de árvore da nossa frente enquanto marchávamos para a luz; tentando ao máximo não nos afundar no barro. Assim que conseguimos sair da estrada de barro para uma pista cinza, avistamos uma cabana, não muito grande, mas espaçosa o suficiente para nos abrigar por uma noite. Aliviados, respiramos fundo e andamos até ela. Meu corpo tremia, de frio e de medo, assim que chegamos perto da pequena casa no meio do nada, um pressentimento ruim invadiu­me, fazendo meus pés travarem. parou subitamente ao perceber que eu não estava mais o acompanhando.
"O que foi, ?" ele chegou perto de mim e segurou meus braços, preocupado. "Estou com medo, , não devemos entrar na casa de estranhos.". Ele suspirou e juntou meu corpo ao seu envolvendo­me em um abraço rápido e apertado.
"Não vou deixar que nada de ruim aconteça com você, ok?" assenti e ele voltou a me puxar para a escada que levava até a porta. Uma mulher velha, de cabelos grisalhos, cheia de rugas e dentes quebrados estava parada do outro lado da porta assim que ela foi aberta pela mesma. Carregava um sorriso simpático no rosto e seus olhos emanavam cansaço. Era alguém familiar para mim, devo ter visto uma ou duas vezes caminhando pela vila, que provavelmente não estava muito longe.
"Ora, crianças, não deviam estar do lado de fora ao anoitecer..." sua voz era fina e rouca, falhava como se ela a forçasse a sair pela sua garganta.
"Desculpe incomodá­la, saímos para passear na floresta durante a tarde, e nos perdemos. Será que não podemos passar a noite na sua cabana?" falou confiante e educado, e a mulher ergueu uma sobrancelha sorrindo ainda mais para o garoto ao meu lado. Afastou­se da porta num passo e nos deu passagem para dentro. Adentramos o local e então ela fechou a porta atrás de nós, trancando­a. Sua casa era elegante e delicada, havia algumas poltronas em volta de uma pequena mesa, onde se encontrava biscoitos e chá.
"Sentem­se!", ela foi em nossa frente até a pequena sala e acendeu a fogueira, sentamos cada um em uma poltrona sentindo o calor do fogo invadir nossas peles molhadas. A mulher andava lentamente como se morresse de dores e sentou­se em uma poltrona em nossa frente. "Então, seus nomes?" Ela parecia indefesa e meiga, sofrida por morar sozinha no meio do nada.
"Eu sou , e este é ." ela assentiu sorrindo.
"Imagino que queiram dar notícias para seus pais.", assenti lembrando­me que deixamos nossos pais em minha casa, e provavelmente estariam morrendo de preocupação. "Há este telefone...", ela o pegou em cima da mesa e o ergueu para mim "Mas não sei se há sinal." o peguei e comecei a discar o número de minha casa, o único que eu havia decorado. Depois de dois toques alguém atendeu. Era Papai.
"Deus do céu, !"
"? Querido, ela está bem?", mamãe dizia baixinho atrás de papai.
"Espere, querida. Filha! Onde você está?"
Suspirei e fechei os olhos a fim de ignorar toda a tensão de meu corpo.
"Me perdoe. Papai, nós nos perdemos na floresta. Mas estamos em uma cabana, uma senhora nos deixou ficar. Estamos seguros aqui, não se preocupe.”
Tentei falar o mais rápido que conseguia antes que o sinal caísse. Pude ouvi­lo respirar rapidamente, aliviado.
"Está bem, logo pela manhã irei te buscar.", assenti sorrindo mesmo que ele não pudesse me ver.
"Durma bem, pai." falei e desliguei o telefone o devolvendo para a senhora, que sorria de orelha a orelha ao pegá­lo e guardá­lo.
O relógio na parede marcava 23:40, minhas roupas e de já estavam secas. A mulher trancava todas as janelas e portas da cabana rapidamente, deixando­nos mais confiantes.
"Há um quarto com uma cama para vocês ficarem, melhor irem rápido." A mulher disse espantando­nos com as mãos, e fomos apressadamente até o quarto em que ela nos levou. Era pequeno e escuro, e a janela estava trancada e coberta por uma cortina grossa. Deitamos na cama um pouco longe um do outro, virei­me para um lado envergonhada, enquanto ele fitava o teto escuro. Ainda podíamos ver a luz da sala invadir o quarto pelo lado da porta aberta. "Boa noite, queridos" a mulher disse fechando a porta deixando­nos na escuridão, um breu. Dois segundos depois a ouvimos desligar a luz da sala e então uma porta foi fechada.
"Não sinta medo, pequena , estou bem aqui." disse passando as mãos em meu cabelo, conformando­me, e então ele se encolheu em seu canto. Pude ouvi­lo suspirar antes que o sono o abatesse.
"Boa noite " falei baixinho, não obtendo respostas, imaginei que ele já tivesse caído no sono. Ao contrário de mim, ele sempre dormia muito rápido.

Estava quase inconsistente, os sonhos começavam a aparecer em minha mente, não controlava mais minhas pálpebras que insistiam em ficar abertas por medo; me rendi àquela cama quente e confortável, fechando meus olhos levemente e então um barulho fez­me pular na cama. Olhei para o lado e dormia profundamente, sereno como um anjo. Percebi então que já devia ser muito mais que meia noite e ainda não ouvira nenhum grito ou uivo alto. Levantei­me da cama lentamente para não fazer nenhum barulho, cambaleei até a porta nas pontas dos pés e a abri devagar. Uma pequena luz estava ligada na sala, provavelmente de um abajur, que com certeza ela deixara ligada sem querer. Descuidada, até; porém ela não deixaria ligada de propósito sabendo dos perigos que aquilo trazia. A não ser que ela estivesse acordada. Minha pernas travavam mas eu as empurrava para fora do quarto, controlando meu corpo que tremia, fui até a sala para desligar o abajur, mas um pequeno ruído fez­me parar. Ali do lado, a mulher estava no chão, espatifada, com suas mãos jogadas para o lado, e sua boca entreaberta, seus olhos estavam abertos e arregalados, mas ela não se movia, parecia um tanto petrificada. Virei­me para trás subitamente, sentindo um calor a mais na sala, e encontrei imóvel com cara de sono nos observando.
"O que houve?" ele perguntou docemente aproximando­se lentamente de mim.
"Eu não faço ideia , eu vim aqui desligar o abajur e ela estava caída no chão. Ajude aqui!", abaixei­me ao lado da mulher e a toquei, mas ela não se moveu. Segurei em seu pulso e não havia sinal de batimento. Instantaneamente a larguei no chão e me levantei. "Ai meu Deus, , ela está morta!" lágrimas queriam rolar pelo meu rosto, mas respirei fundo e virei­me para trás, assim que o fiz, meu coração parou.
Uma figura alta, bem mais alta do que eu poderia descrever, estava parada ali em minha frente. Era peludo, e tinha grandes olhos negros, seus dentes eram enormes e algumas babas caíam sobre seu queixo. Ele respirava fortemente, fazendo um barulho agonizante, um ruído fraco. Eu quis correr mas meus pés não me obedeciam, enenhuma voz saía de minha garganta para que eu pudesse gritar. Aquele monstro gigante me observava raivoso, e um uivo alto saiu de sua boca. Tampei meus ouvidos e fechei fortemente meus olhos. Era mil vezes mais alto dos que ouvira na floresta junto de . Meu corpo todo tremeu e eu só pude desejar que tudo aquilo passasse.
Assim que o uivo parou, e eu percebi que ele não estava me matando, abri meus olhos e ali estava . Respirei fundo e... Seus olhos estavam pretos como a noite, e um sorriso malicioso surgia no canto de sua boca. Seus braços estavam peludos, e em algumas partes o pêlo ia sumindo enquanto sua pele branca aparecia novamente. Dei um passo para trás, recuando­me e tentando me afastar, mas seus olhos pretos penetravam nos meus com tanta intensidade que me deixava paralisada, e a cada passo que eu dava para trás ele dava para frente, chegando bem perto de mim.
"O... O que? ..." ele levantou suas mãos e colocou o dedo na boca sussurrando um 'shhh'.
"Cuidado, pequena , você pode atrair a fúria até aqui se falar demais" ele disse sorrateiramente, sua voz estava rouca e grave, um pouco robótica, e ele se aproximava de mim malignamente. "Você já deve ter entendido tudo, não é mesmo?", ele perguntou baixinho encarando o chão.
"Não pode ser! Não!" foi o que eu consegui dizer assim que encontrei a parede atrás de mim, me encolhi ali mesmo tentando segurar as lágrimas. "Você estava junto comigo quando ouvimos os uivos... Não pode ser.".
Uma risada má e irônica saiu de sua boca, sua pele estava pálida e sua roupa estava rasgada. Ele cerrou os punhos e chegou mais perto olhando­me com pudor.
"Aqueles uivos são de lobinhos da floresta que temem a minha presença. Eles ficam por perto e uivam quando eu chego, mas eles nunca aparecem por medo de serem devorados.", sua voz era fria e calculista, cheia de falhas. "Você acha mesmo que aqueles uivos são meus? MEUS UIVOS SÃO MAIS ALTOS, capazes de estourar seus tímpanos se eu quisesse." ele aumentava o som da voz gritando as palavras em minha cara e fazendo­me encolher ainda mais na parede. Ele chegou bem perto de mim,encostando seu corpo no meu. "Eu esperei muito tempo para que você fosse a minha vítima. Mas cada momento valeu à pena!", ele passou as mãos pelo meu rosto fazendo­me chorar, mas não conseguia me mover para tirá­lo de perto de mim. O medo estava me impedindo de fazer qualquer coisa, até respirar. "Se não fosse a sua mãe cheia dos medos te botando para dormir cedo e desligando todas as luzes antes da meia noite... Você já estaria em meu estômago" aquilo me fez estremecer, e eu o olhei nos olhos pela primeira vez.
"…"
"Não me chame mais assim, você não sabe o meu nome, pequena ?" ele disse calmamente fazendo­me encarar seus olhos esverdeados escuros. E então do nada eles ficaram pretos novamente. "EU SOU A FÚRIA!" Ele gritou fazendo­me fechar os olhos e então senti­o vindo para cima de mim, e dores por todo o meu corpo. Gritei com toda a força que eu tinha, mas tudo que conseguia ver quando abria os olhos era uma imagem embaçada de um monstro cheio de pêlos em cima de mim, uivando como se necessitasse daquilo, então encontrei seus olhos mais uma vez, observando­me sentir dor. "Eu te amo..." sussurrei baixinho, deixando escapar a minha ultima lágrima.



Fim.



Nota da autora: (14.04.15)
Caramba. Oi! Sempre quis escrever uma fic assim, meio suspense, não sei se alcancei meu objetivo, isso depende de vocês. Sentiram medo? Porque eu honestamente sou muito fraca pra essas coisas, e senti medo enquanto escrevia. SERIO. Mas enfim, espero que vocês tenham gostado, e quero agradecer ao filme "A garota da capa vermelha" por ter me inspirado MAIS UMA VEZ a escrever uma história, agradecer também a amanda seyfried por ser minha atriz favorita e ter feito uma atuação incrível como Valerie (Se você nunca viu este filme, veja!) e me inspirado a escrever a pp (que originalmente se chama Amélia, agora vocês sabem) e, a minha querida beta Lila, por ser sempre taaaao maravilhosa comigo e me aturar mandando tanta fic pra ela. Obrigada Lila, você é demais!!! é isso, não esqueçam de me contar o que acharam. :*
Minhas outras fics: Será que é pra sempre, sempre há uma nova chance, 5 dias, half, todos em (outros/finalizadas).
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