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Última atualização: 10/08/2017

Capítulo 25


"Dizem que o tempo cura todas as feridas, mas quanto maior é a perda, mais profundo é o corte e mais difícil é o processo para ficar inteiro novamente. A dor pode desaparecer, mas as cicatrizes servem como lembrete do sofrimento e nos deixam preparados para nunca mais sermos feridos."


's POV
- Você dança muito bem! - Jackson comentou sorridente, tentando acompanhar meus passos elétricos.
Trancamos e em um quartinho e voltamos para aproveitar a festa. Callie e Chloe estavam ocupadas demais com seus bofes, e Jackson se ofereceu para passar o restante da festa comigo, e claro, não neguei.
- Só às vezes! - respondi ofegante, parando de dançar junto com o fim da música.
Fomos até a mesa de bebidas, virando alguns copos de uma vez e rindo das caretas que cada um fazia.
- Ei, acho que está na hora de tirarmos os dois de lá. Já faz uma hora! - Callie se aproximou, tirando o copo da minha mão, me fazendo prestar total atenção em sua fala.
- Acho melhor eu não ir, pois se não tiver dado certo a vai querer me encher de porrada e eu sou muito jovem pra morrer. - respondi com o bom humor presente em minha voz, e até Jackson riu, mesmo sem saber do que eu estava falando.
Callie deu uma piscadinha e se afastou. Torci mentalmente para não estar brava conosco, mesmo sabendo que ela provavelmente estaria.
- Você trancou a com o ? - Jackson arriscou o palpite.
- Talvez eu tenha trancado. - arrastei a voz de maneira inocente, gargalhando em seguida.
- O casal está em crise?
- Talvez estejam.
- Qual é, você pode me contar essas coisas! - falou com certa insistência coberta em bom humor.
- Não estou autorizada a falar nada sobre a vida dos dois. - fingi estar fechando um cadeado em minha própria boca, e até me senti infantil por isso mas Jackson riu.
- Meu bem, não tem nada sobre que eu não saiba. - sorriu debochado, passando um dedo pelo meu rosto.
- Mesmo assim. - dei os ombros.
- Amor é uma coisa maluca, ainda mais nessa idade. - o garoto murmurou, encarando todas aquelas pessoas felizes e animadas a nossa volta.
- Amor é amor. Nessa idade estamos confusos e descobrindo o mundo, mas o amor continua sendo do jeito que é. Aliás, nós que complicamos tudo até demais. - exclamei, procurando com os olhos e o encarando de longe. Droga, o que eu estou fazendo?
- Que seja. - o garoto pareceu não dar importância a minha fala e riu.
- Me conte sobre você. - mudei de assunto, indo para o meu favorito: conhecer pessoas novas. Digo, conhecer de verdade. Sobre sua vida, medos, o que se passa na mente e por aí vai.
- O que você quer saber? - sua atenção voltou para mim, com um olhar divertido e sapeca.
- Hm... Saber tudo seria uma boa. - apresentei uma boa opção, sorrindo como quem não quer nada.
- Não gosto de falar, gosto de mostrar. - o garoto sorriu e arqueou uma sobrancelha, e não pude evitar um arrepio que percorreu pelo meu corpo. Seus olhos azuis me encaravam de maneira divertida, mas eu podia ver tanta coisa em meio àquele azulão que acabei me distraindo.
Ok. Ele gosta de mostrar. Mostrar. Mostrar o quê?
- E o que você pode me mostrar? - acordei do meu transe, desviando meu olhar para algum ponto que não fossem seus olhos.
- Você só vai saber quando ver. - deu uma piscadela, e não me segurei em revirar os olhos. Detesto suspense.
- E quando você vai me mostrar? - estreitei os olhos, determinada a saber onde aquela conversa iria parar.
- Quando você quiser. Podemos sair algum dia. - deu os ombros, desviando das pessoas que passavam ao seu lado, tentando não esbarrar nelas.
Ele estava me chamando pra sair? Pra sair mesmo? Um encontro? Ai caramba.
- Ah... Sair... Sim, claro. - balancei a cabeça, tentando disfarçar minha confusão interna.
Uma multidão se juntou ao ser anunciado que a noiva jogaria o buquê. Nesse mesmo instante, Callie chegou com ao seu lado, me fuzilando com os olhos e provavelmente me esganando mentalmente.
Ok, tentar pegar o buquê seria uma boa, né? Por que não?
Callie e Chloe deram passos longos até onde eu estava, se preparando também para pegarem o tão esperado buquê.
- Lá vai, pessoal! Um... Dois... Três. - Paige gargalhava alto com toda a multidão atrás de si. Jogou com força, e eu nem precisei me esforçar. O buquê bateu em meu peito, e em questão de segundos o peguei com força, levantando o mesmo.
Desmanchei em sorrisos ao observar as orquídeas rosas, ignorando os resmungos das mulheres que não conseguiram pegar aquela belezinha.
- Ah, pelo amor de Deus! Logo você? - Callie bufou e cruzou os braços.
- O buquê eu já tenho, só falta o noivo. - ergui o mesmo, fazendo graça.
- Talvez Jackson Tuck seja uma boa opção. - Chloe deu um sorriso sapeca, e arregalei os olhos em resposta.
- Menina, você já andou bebendo, né? - levei minhas mãos até a cintura, perguntando com falsa indignação na voz.
Meu olhar cruzou com o de , que não estava nada agradável. É oficial, eu vou levar umas porradas até morrer.
's POV end

BA-BA-CA.
É isso que é.
Passei horas tentando me distrair de todas as maneiras e tentando não estrangular , mas aquele olhar fofinho amolecia meu coração todinho. Droga, eu sou uma trouxa mesmo.
Nos despedimos carinhosamente de Paige e Ben, os parabenizando e desejando toda a felicidade do mundo, mesmo sabendo que aquilo era o que não faltava entre eles. Foi uma longa caminhada de volta aos carros, e mais um longo caminho até voltarmos para casa.
Marchei até meu quarto, ouvindo os passos de atrás de mim.
- O que é, hein? - esbravejei impaciente. Minha única vontade era de deitar e dormir por três séculos, e talvez chorar um pouco. Só talvez.
- A ideia de te trancar não foi minha - espalmou as mãos no ar, declarando inocência - Mas não vou negar que estou curioso pra saber sobre o que vocês conversaram.
- Nada. Foi só encheção de saco. - bufei, me jogando na cama e fechando os olhos com força.
- , desembucha. - exigiu autoritário, se sentando ao meu lado.
-Não vale a pena. Está tudo definitivamente acabado. - murmurei ainda com os olhos fechados, sentindo o sono pesar.
- E o que você está sentindo? - insistiu em arrancar as informações de mim, e minha vontade de chutá-lo para fora do quarto estava grande.
- Sono. Muito sono. - bocejei, mostrando sinais verdadeiros da minha resposta.
Ele finalmente saiu do quarto, me deixando sozinha com meus pensamentos. Vamos por partes; é um babaca. Um babaca que mesmo fazendo burrada atrás de burrada, sua pessoa não se torna desinteressante. E céus... Como eu queria que ele se tornasse desinteressante. Como eu queria que ele sumisse e levasse consigo todas os momentos que passamos juntos, e me deixasse como eu era antes de tê-lo em minha vida.
Correção: como minha cabeça queria aquilo. Já meu coração... É outra história.

***


"Esta palestra é um convite a uma profunda e divertida reflexão sobre o modelo educacional atual. Uma reflexão sobre o que é a educação hoje, de onde veio nossa filosofia educacional e para onde ela parece caminhar."
Foi assim que começamos nossa manhã de uma nova entediante segunda feira. Uma palestra sendo feita por muitos dos nossos professores na sala de teatro. Na merda da sala de teatro.
Estávamos todos sentados em uma fileira, e por sorte, estava longe de mim.
- Posso sentar aqui? - Jackson sussurrou, sentando no único assento vago que tinha ao meu lado assim que assenti positivamente.
- Onde você estava? - perguntei baixinho, estranhando o fato dele só ter aparecido quase meia hora depois que aquela chatice de palestra havia começado.
- Por aí.
- O que você fez de errado agora? - cerrei os olhos, observando um sorriso divertido se formar em seu rosto.
- Nada, . Sou um homem de negócios. - deu os ombros, desviando o olhar e fingindo estar prestando atenção nas pessoas que estavam no palco.
- Vender drogas não é ser um homem de negócios, é ser idiota. - esbravejei, dando um sorriso triunfante ao perceber que aquilo tinha o atingido de certa forma, pois seu sorriso se desmanchou no mesmo instante.
- Negócios são negócios, .
- Você nunca me explicou a história desse negócio. - frisei a última palavra, com um tom de cobrança. Toda a minha curiosidade ainda vai acabar comigo.
- Eu estava sem dinheiro, conhecia gente que trabalhava com isso e me interessei. Não é como se eu fosse um traficante foragido. Isso tudo é só por diversão. - sussurrou cuidadosamente sem me olhar, dando um pequeno sorriso no final.
Todo esses envolvimentos com drogas me dão um incômodo sem tamanho. As drogas fazem meu próprio pai se tornar pior do que já é. As drogas foram o motivo de Ritter vir atrás de mim, ameaçando matar minha própria mãe. Jackson fazer aquilo por diversão me fazia querer bater sua cabeça no chão.
- Ok. - murmurei, me controlando para não esbravejar todo o meu pensamento.
- Eu sei que você não curt...
- É, não curto mesmo não. - o interrompi, respondendo de maneira grosseira.
Oras, Jackson tem tudo na vida e insiste em estar nisso por diversão? Isso pode ser classificado como um total absurdo.
- , me deix...
- Não. Nem mesmo quero ouvir. - balancei a cabeça negativamente, o impedindo de explicar qualquer coisa.
- Porra mulher, me deixa falar! - elevou seu tom de voz, surpreendendo as pessoas ao nosso redor.
- Não, Jackson. Você faz isso por diversão, e posso te garantir que não tem nada de divertido nisso. Você não se sente mal por contribuir para o vicio das pessoas? Porque talvez, se você soubesse como é passar por isso, você pararia com essa merda. - perdi o restinho de paciência que me restava, esbravejando em tom discreto porém bravo. Muito bravo.
- , eu não sabia que esse assunto era tão sério pra você. - pude ouvir certo receio em sua voz, junto a um olhar surpreso.
- Que seja. - dei os ombros, finalizando nossa conversa.

***


- E sim, nesse sábado os meninos terão jogo, e isso significa o quê? - Callie perguntou animada, ouvindo alguns resmungos junto com um "significa que teremos que ensaiar" de todas nós.
A verdade é que eu já não sabia o que estava fazendo ou pensando. Eu ainda não tinha parado pra pensar em tudo o que aconteceu. Eu estava evitando fazer aquilo ao máximo, porque no momento em que eu fizer, serei obrigada a encarar a realidade nua e crua, que é: nunca confiou em mim.
Droga, eu contei tudo sobre minha vida. As minhas fraquezas, compartilhei pensamentos, e o pior, desenvolvi sentimentos. É uma merda aceitar isso, mas não consegui controlar. me ajudou, teve paciência, e me fez sentir sensações que ninguém nunca conseguiu fazer, e agora tudo desmoronou. Como sempre.
Não que eu estivesse apaixonada, pois não estou, mas... É estranho. Extremamente estranho. Eu achava que tinha controle absoluto de tudo, e mais uma vez eu estava enganada. Mas de uma coisa eu tenho certeza: eu sou melhor sozinha, como sempre fui.
- ? Hello! Terra chamando! - Chloe estalou os dedos em frente aos meus olhos, me despertando e espantando todos aqueles pensamentos malucos.
- An? O que foi? - perguntei perdida, olhando desesperadamente para todos os lados, observando todas de pé enquanto eu estava sentada.
- Jogo no sábado. Treino. Ensaio. Foco. Atenção. - Callie numerava as palavras chave que resumia a situação com os dedos, me mandando um olhar autoritário para que eu levantasse.
Claro que, Callie não teve dó de nossas almas no treino. Sua cara de boazinha não corresponde com suas atitudes.
Caminhamos para o vestiário, e o quadro de avisos, o qual eu nunca prestava atenção, pela primeira vez me chamou atenção.
Hawthorne VS. Randleman High School.
Randleman. A merda da minha antiga escola.
Senti meu coração bater tão forte que podia jurar que ele pularia pra fora. Minha agonia foi notada, e antes mesmo que alguma das meninas perguntassem algo, adentrei o vestiário às pressas, me trocando com uma pressa fora do normal. Engoli o choro, determinada a não derramar uma lágrima por aquilo. Já havia passado, eu havia seguido em frente, e tudo estava bem. Ou quase tudo. Ou nada estava bem. Eu já nem sabia mais.
- O que aconteceu? - Callie correu atrás de mim pelo corredor. Eu só queria ir pra casa e me jogar na cama.
- Cadê o ? - respondi sua pergunta com outra, procurando meu primo com os olhos, mas não havia movimentação nenhuma no vestiário masculino.
- Eles vão ficar um pouco mais no treino de hoje. Agora me diga, o que houve? - sua expressão serena porém preocupada poderia me quebrar ao meio.
- Nad...
- Nada uma ova, ! Não me diga que não é nada, não me diga pra deixar pra lá, e não me diga que não precisa de ajuda. Cansei. Eu estou aqui pra você, ta legal? Eu estou aqui pra te ouvir, te ajudar, e fazer o melhor pra você. Agora vamos, me diga o que aconteceu! - Callie exclamou tudo de uma vez, sem nem se dar alguns segundos para respirar. Aquilo me surpreendeu muito. Sua firmeza podia ser notada há metros de distância.
- Randleman. - apontei para o quadro de avisos, deixando a garota com uma expressão confusa.
- O que tem?
- Clay e Lilian estudam lá. - meu coração se apertou só em dizer o nome deles. Eu jurava que não doeria tanto caso eu teria que falar deles novamente.
- , eu quero mesmo te ajudar mas vai ficar mais fácil se você me disser quem são Clay e Lilian. - Callie tombou a cabeça pro lado, pedindo delicadamente uma explicação.
- Clay e Lilian são o meu motivo de ter mudado de escola, lembra? Ex traidor e ex melhor amiga? - mordi os lábios, apertando os olhos com força.
- Ai caramba! Eu não fazia ideia, . Eu sinto muito por isso. - senti seus braços em minha volta, com um abraço gostoso e desajeitado - Mas talvez possa ser uma coisa boa. - me soltou aos poucos, com aquele olhar que só dizia uma coisa: ela iria aprontar.
- O que você vai fazer, hein? - rolei os olhos, rindo da sua falsa expressão de inocência. Acreditem, essa carinha de boazinha é realmente uma farsa.
- Talvez eu vá com uma faca na meia e picote aquela vaca todinha. - deu os ombros, como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo.
- Você não presta mesmo! - gargalhei alto, imaginando aquela cena de maneira engraçada.
- Sabe aquela frase bem brega que é "mexeu com a minha amiga, mexeu comigo também"? Então, é exatamente assim. - fez aspas ao citar a frase, fingindo uma expressão de braveza.
- Você não precisa fazer nada contra ela, Callie. - dei os ombros, tentando disfarçar a minha verdadeira vontade: ver Lilian se ferrando.
- Você acha que me engana? - a garota riu alto, estreitando os olhos, como se estivesse lendo todos os meus pensamentos.
- Ok, você me pegou - me rendi à verdade - Mas me promete uma coisa? - perguntei séria, acabando com a brincadeira e esperando sua afirmação - Você não vai falar sobre isso com ninguém, ok?
- Mas...
- Eu não quero que as pessoas pensem que isso ainda me afeta. Promete logo! - bati as mãos impaciente, agoniada com a pequena demora da garota.
Aquilo não iria estragar minha vida. Não mais.

's POV
A verdade é que me evitou na segunda, na terça, e continua me evitando. Ele estava extremante quieto e distante. Sabe quem me restou nessa história? Jackson Tuck. Digamos que minha disposição para conhecer gente nova e simpatia se juntou com todo aquele bom humor dele que eu nem sabia que existia, resultando em conversas na escola, e até troca de mensagens.
- O que você acha de passarmos o dia juntos? Faz tempo que não fazemos isso. - me despertou dos meus pensamentos, fazendo minha atenção ir para seus olhos cheios de brilho.
Pela primeira vez, o intervalo estava sendo esquisito. Sem por perto, sem Chloe, que estava copiando uma lição atrasada, e com calada ao extremo.
- Ah... Eu... Acho melhor não. - respondi um tanto quanto sem graça. Eu nunca havia negado a companhia de . Nunca.
- Pelo amor de Deus, ainda é por aquilo? - perguntou baixo, e eu sabia que ele estava se referindo aos nossos erros. Opa, beijos - , ainda somos melhores amigos, se lembra?
- Sim, eu sei, mas é que... - levou no máximo três segundos pra pensar que merda eu estava fazendo. Por que eu ainda estava envergonhada? Já havia passado e tudo estava do jeito que devia ser - Quer saber? Vamos passar o dia juntos sim. - ergui o queixo mostrando minha decisão séria, afastando qualquer sentimento que me fizesse lembrar do que aconteceu entre nós.
O sinal bateu e levantamos resmungando. Aulas de biologia me faziam querer dar um tiro no meio da minha cara. Aonde já se viu uma matéria maluca como essa? Só Jesus na causa mesmo.
- , você vai precisar me explicar aquilo de n... - parei de tagarelar no mesmo instante que percebi que a mente da garota estava longe dali. Seu olhar estava preso a algo que eu não sabia o que era, mas nem se esforçou em me olhar - , você está bem? - parei em sua frente, chocando o corpo seu corpo contra o meu, finalmente a acordando daquele transe.
- Estou. Só estou pensando. - sua expressão perdida me fez engolir em seco.
A semana não estava sendo fácil. Descobrir todos os segredos de e vê-la extremamente vulnerável do jeito que vimos no dia da confusão com o pai de , tinha mexido muito com ela. E desde então, ela estava sempre assim... Distante.
nos disse para darmos um tempo a ela, mas aqui vai um fato sobre mim: odeio esperar.
- , o que você está sentindo?
- Sono. - soltou o ar audivelmente, dando um longo bocejo em seguida.
- Eu estou falando sério! Está tudo tão estranho... Nós estamos estranhos! - bati o pé com certa impaciência.
Mais um fato: não tenho muita paciência.
- Você não acha que depois de tudo o que aconteceu comigo, eu não tenho o direito de ficar estranha? De ficar pensativa ou calada? E até onde eu sei, nada aconteceu com você. NADA. Então por favor, me deixe quieta. - me lançou um olhar frio antes de sair andando para longe dali. Seus olhos, que eram uma das coisas que eu mais adorava nela, estavam simplesmente vazios. Sua fala foi como um tapa na minha cara bem dado, daquele que deixa a marca dos cinco dedos no rosto.
- Ela só precisa de mais um tempo. - senti a mão de Callie fazendo um carinho rápido em meu ombro direito, tentando esconder o desânimo em seu olhar.
- Eu só queria ajud...
- Sabemos disso, até a própria . Mas as coisas não funcionam assim. Não é tão rápido. E ainda mais agora que sábado está chegando e ela vai ter que ver aquele ex namorado imbecil e aquela vaca da ex melhor amiga traidora. - seu tom de voz calmo mudou bruscamente para bravo, balançando a cabeça negativamente.
- An? Como assim?
- O que? - me olhou com os olhos arregalados, levando a mão até a boca, a tapando e apertando os olhos com força - Não é nada. Nadinha mesmo. - deu pequenos passos para trás, se preparando para fugir dali. Ah, até quem não a conhece saberia que ela está escondendo algo.
- O nosso jogo é contra a escola antiga de ? É isso? - liguei os pontos rapidamente, pressionando a garota com o olhar. Acredite, sempre funciona. Ou quase sempre, mas deixa essa parte pra lá.
- Ai caramba, viu! Eu tenho uma boca muito grande, vou precisar costurá-la! - a garota começou a andar de um lado para o outro, batendo na testa incansavelmente como castigo.
- Eu não acredito! O que vamos fazer? - foi a minha vez de andar de um lado para o outro, já pensando em mil e uma vinganças.
- , você é afobada demais! Acabou de levar um chega pra lá de e ainda assim, tenta dar um jeito em tudo. Cala a boca, respira fundo, e para com essa porra, está me ouvindo? Vamos deixar tudo como está, e vamos ajudá-la aos poucos, ok? - pegou com força em meus ombros, me fazendo parar de andar e encarar seus olhos castanhos.
Talvez, bem talvez, eu seja um pouco afobada. Mas em minha defesa, são culpa dos meus extintos. Eu me sinto uma mãe quando algo acontece com algum amigo. Me sinto na obrigação de tentar consertar a situação, mesmo que não esteja ao meu alcance e nem que seja meu dever. Eu só... Gosto de ver as coisas certinhas. Gosto de ver tudo bem, gosto de ver sorrisos, ouvir gargalhadas, e ter meus amigos unidos.

***


- Ei, me espera! - apertei o passo ao ver saindo às pressas do vestiário masculino.
- Preciso ir a um lugar. - nem mesmo se deu o trabalho de me olhar, e aquilo já estava me tirando do sério.
- Eu sou sua amiga, e provavelmente a melhor das poucas que você tem. Eu fui a primeira a saber da sua história, guardei seu segredo bem guardado e sempre me preocupei com você. Nada mudou, . Eu ainda me preocupo e estou aqui pra você. Eu sei que as coisas estão estranhas e complicadas, mas você não pode simplesmente afastar todos de você. - segurei em seu braço com força, fazendo ele ouvir cada palavra que estava guardada em minha mente há dias.
- Conversamos à noite, ta legal? - passou a mão pelos cabelos com certa impaciência, mas sua expressão estava calma. Minha intimidação não tinha o deixado bravo, e sim, aparentemente, aliviado. Observei meu amigo se afastar até sumir completamente da minha visão.
- Ei, gatinha. - aquela voz num timbre animado me despertou, me fazendo sorrir automaticamente.
- O que Jackson Tuck quer dessa vez? - perguntei de maneira divertida, me virando até encarar aquele belo par de olhos azuis.
- Seu endereço.
- Que? - não disfarcei minha confusão. Ele disse endereço mesmo ou eu estou ficando surda?
- Seu endereço, . Vamos sair hoje à noite. - respondeu rindo, percebendo toda a minha confusão.
- Mas hoje é quarta feira, e... Sair? Sair pra onde? Hoje mesmo? - tombei a cabeça pro lado, me rendendo a toda àquela confusão. Misericórdia, eu sou a personificação de mico.
- Sim, vamos sair numa quarta feira. Hoje mesmo. Eu sou um cara que gosta de mostrar, lembra? - sua diversão na voz evaporou, ficando sério e arqueando uma sobrancelha, o que foi totalmente... Sexy.
- Ah sim. Mostrar. Entendi.
- É essa a hora que você me dá o seu endereço, gatinha. - Tuck gargalhou fraco, erguendo o celular em minha direção.
- Mas olha, eu cuido da irmã do durante a tarde, e se você quiser que vá só nós dois, só posso depois das nove. E não posso voltar depois das onze e meia se não meu pai arranca minha cabeça, e eu estou falando bem sério! - tagarelei sem pensar, explicando de maneira rídicula meus horários disponíveis e o limite deles enquanto anotava meu endereço em seu bloco de notas.
- Então até as nove horas.

acabou dormindo ao chegar em sua casa, o que resultou em nosso plano de passar o dia juntos ir para o beleléu. Mesmo assim, o convidei para jantar em minha casa. Digamos que meus pais amam mais ele do que eu.
-Nem acredito que você está quase namorando! Te vi molequinho, com a fralda cheia de merda. - papai se manifestou ao saber da notícia de que estava com Chloe.
-Eu sempre tive esperanças de que você e ficariam juntos. - foi a vez de mamãe, num tom emburrado. Olhei para , que estava com os olhos minimamente arregalados. Valeu, mãe.
- Eu prefiro o com a do que com a Chloe. - Sophia não deixou de fazer o mesmo, nos fazendo gargalhar em meio àquela pequena tensão que se formou no local. Ela é ou não é o melhor ser humano desse mundo?
Terminamos o jantar e meus pais subiram para o andar de cima, e Sophia foi arrumar suas coisas, pois a hora de ir embora estava próxima. Eu e ficamos com a tarefa de arrumar a cozinha, e por algum motivo, o que mamãe havia falado nos deixou sem graça. Não vou mentir, aquilo soou estranho. Eu nunca me imaginei numa situação onde meus sentimentos se balançavam pelo meu melhor amigo.
Melhor AMIGO.
Deus, o que está acontecendo?
- Você está bem próxima do Tuck agora, huh? - tentou disfarçar a curiosidade, e eu tentei disfarçar meu pequeno surto.
Jackson Tuck! Eu vou sair com Jackson Tuck e nem ao menos estava me lembrando!
- AI MEU DEUS! Eu vou sair com ele daqui a pouco e estou nesse estado! - soltei o pano de prato que estava em minhas mãos no mesmo instante, correndo até a escada, vendo a pequena Sophia sentadinha no sofá, à espera do irmão.
! Ele disse que conversaríamos à noite, e eu nem ao menos estava me lembrando TAMBÉM!
Será que é alzheimer?
- Como assim você vai sair com o Jackson? - me seguiu até meu quarto, onde eu já estava com o guarda roupa aberto, procurando uma roupa decente para... Um encontro? Seria um encontro pra valer ou seria... Ah, eu não sei de nada!
- Saindo, oras. Qual é melhor? - ergui um vestido florido com uma mão e um preto com a outra, olhando brevemente a expressão de reprovação do meu melhor amigo.
- Você já ouviu tanta ruim coisa sobre Jackson e mesmo assim vai sair com ele? - ignorou minha pergunta, e seu tom de voz debochado estava contribuindo muito pra eu ficar de saco cheio de toda aquela proteção.
- Vou, porque eu contrário de você, eu sei dar chances para as pessoas se mostrarem serem diferentes do que falam ou aparentam ser. - cuspi as palavras com impaciência. Pelo amor de Deus, as coisas já estavam uma porcaria e estava mexendo na merda, e estava fedendo mais ainda.
- Eu só estou tentando te proteg...
- Não precisa, ta legal? Eu sei me cuidar e eu sei com quem eu saio.
- Você já parou pra pensar que possa ser mais do que proteção e preocupação também? - se desencostou da parede, dando passos lentos até se posicionar em minha frente.
Não, não e não. De novo não.
- É o que, então? Ciúmes? - deduzi a primeira coisa que veio em minha mente, e eu daria tudo pra não ter visto a expressão de surpresa de , que nem mesmo tentou negar o que eu havia dito.
- Tuck vai te levar pra sair, e você sabe o que acontece em encontros, ? - pousou suas mãos em minha cintura, fazendo meu corpo inteiro se amolecer - Acontecem beijos. Beijos do tipo que eu te dei. E me desculpa por isso, mas só de imaginar Tuck te beijando, e não eu... - fechou os olhos com força, apertando minha cintura ao mesmo tempo, colando nossos corpos ainda mais.
- CHEGA! - falei mais alto do que devia, o que assustou o garoto, e aproveitei para me soltar dali - A diferença é que eu sou solteira e Tuck também, então SE acontecer um beijo, eu não vou me sentir culpada como me senti ao beijar você. Eu já te disse pra esquecer aquilo, então esqueça! Eu não quero que você toque nesse assunto nunca mais ou faça esse tipo de coisa, está me ouvindo bem ? - ergui o dedo em riste ao verbalizar toda a minha indignação com sua atitude. Pelo amor de Deus, aquilo foi um erro gigante e ele praticamente disposto a cometê-lo novamente.
bufou e saiu do quarto, batendo a porta com força. Me troquei rapidamente, optando pelo vestido florido e uma meia calça preta. Avisei meus pais que iria sair, e meu pai quase que não permitiu, mas jurei voltar antes de onze e meia. Aquilo era realmente sério. Ele acha muito importante eu ter uma noite de sono bem dormida, então durante a semana eu tenho horário para voltar pra casa.
Desci rapidamente para a sala, e se levantou do sofá, me dando um olhar indecifrável.
Pera aí... Isso nunca aconteceu.
- Já vou indo. Boa noite. - acenou com a mão um tchau sem graça, caminhando até a porta. Fui mais rápida, correndo até ficar na frente da mesma, batendo em sua mão para tirá-la da maçaneta.
- Eu não quero que as coisas fiquem estranhas entre nós, ok? Eu só quero que tudo volte a ser como antes. Eu quero meu melhor AMIGO de volta. Será que é pedir muito? - fiz meu melhor biquinho, sabendo que aquilo sempre causara certo encanto no meu melhor amigo, facilitando meus pedidos.
- Eu juro que estou tentando, mas é qu...
- Shhhhh, eu nem quero saber o resto disso. - levei meu dedo até sua boca, o impedindo de continuar - Apenas lembre-se que você tem Chloe, ok? Ela gosta de você! - fui obrigada a partir para um golpe bem baixo, colocando a coitada no meio da minha chantagem psicológica.
- Você é terrível, sabia? - ao contrário do que eu pensei que ele estaria, mostrou seu bom humor que eu tanto admirava.
- Sei, eu sou assim mesm... - fui interrompida pelo som da campainha tocando. Ai caceta.
Abri a porta, revelando e Jackson, lado a lado.
Misericórdia, que cilada!
- Vocês também estão enxergando Jackson Tuck ao meu lado ou eu estou ficando maluco? - estreitou os olhos, com um bom humor que estava me fazendo muita falta.
Sophia correu até o irmão, que ofereceu uma carona para , que aceitou sem pensar duas vezes.
- Ei, eu sei que iríamos conversar hoje, mas é que... Olha, desculpa mesmo! - corri até antes dele entrar dentro de seu carro, batendo a mão na testa repetidamente.
- Está tudo bem, .
- Você pode passar a tarde comigo amanhã, que tal? - sugeri sem graça. Deus, como eu posso ser tão atrapalhada? Com certeza foi a convivência com por tantos anos.
- Pode ser.
Em questão de segundos, só restou eu e Jackson ali. Ele estava com um jeans azul e uma camisa branca com alguns detalhes pretos. Bem arrumado. Deduzi mentalmente que talvez fossemos a um restaurante. Se bem que... Tuck e restaurante? Nada a ver!
- Vamos, gatinha? - o som da sua voz tomou conta dos meus ouvidos, e assenti sorridente.
Jackson estava com um carro um tanto quanto chique. Não é pra menos, afinal, sua família nada e mergulha no dinheiro pelo o que dizem. O trajeto foi quieto, sem muita conversa, e não tem nada que me incomode mais que isso. Gosto de falar, rir, ouvir histórias malucas e compartilhar experiências. Gosto do processo que é conhecer alguém. Gosto de observar a facilidade que alguns têm em fazer isso, e também a dificuldade.
Não demorou muito até chegarmos a...
- Skinder Empire? - olhei confusa para o garoto, que sustentava um sorriso largo nos lábios. Ele me trouxe a um prédio. Ou melhor dizendo, uma empresa!
- Sim senhora. Vamos.
Caminhamos até a entrada do prédio, que não era nada pequeno. Tuck cumprimentava as pessoas dali com simpatia, e todos retribuíam como se o conhecessem. Acompanhei seus passos até o elevador, onde entramos juntos e o botão para o 30º foi apertado.
- Isso aqui está meio bizarro, sabe? Parece que quando essa porta abrir, vai ter um monte de zumbi querendo me comer viva e você sabe que eu sou muito jovem pra mo... - me calei no instante em que a porta foi aberta.
Segurei meu queixo para ele não cair no chão. Saímos do elevador, sentindo o vento fresco nos atingir. Estávamos na cobertura do prédio, onde tinha uma simples mesa de madeira com duas cadeiras, e vários pacotes de fini acompanhado de algumas latinhas de refrigerante. Não consegui evitar uma gargalhada alta, observando Jackson me encarando de maneira divertida.
Pra ser sincera, aquela visão valia mais do que ir no melhor restaurante de Charlotte. Dava pra ver tanta coisa! Eu tinha razão... Jackson e restaurante não tem nada a ver.
- Você não esperava um jantar ou algo do tipo, né? - Jackson quebrou o silêncio, rindo triunfante com as sobrancelhas arqueadas.
- Pra ser bem honesta, eu nem sabia o que esperar. - respondi com sinceridade, ainda observando todas aquelas luzes brilhantes indicando as casas, postes, e carros que passavam pela cidade.
- É isso o que eu chamo de mostrar. As garotas que eu trago aqui adoram. - pude perceber que Jackson segurou o riso, tentando permanecer sério com a sua provável falsa afirmação.
- Então você trás todas aqui, huh? - cutuquei seu braço com meu ombro, fazendo graça.
- Claro! Depois que você for embora, trarei outra, inclusive. - Jackson não se aguentou e caiu no riso, e acompanhei aquela risada contagiante e gostosa.
- As vezes eu tenho vontade de ter nascido homem. - tombei a cabeça pro lado, falando a primeira coisa que passou pela minha cabeça. Ao contrário do que pensei, Jackson não estava me olhando esquisito nem nada do tipo. Ele riu.
- Não é tão bom quanto parece. - o garoto mergulhou no assunto, exclamando sua opinião.
- Ah, para, vai! Vocês não têm cólic...
- Vocês não tem cólica, não tem filhos, não tem que usar sutiã apertado o dia todo e blá blá blá. - Tuck atropelou minhas palavras, afinando a voz, provavelmente tentando me imitar.
- Viu só! E vocês também não tem TPM. - fiz um biquinho emburrado, cruzando os braços e fazendo charme.
- Mas tem toco, tem pau duro na hora errada... - Jackson falou naturalmente, e eu não consegui segurar uma risada extremamente escandalosa. Aquilo não me deixou sem graça, muito pelo contrário. Aquela estava sendo de longe, a conversa mais esquisita e interessante que eu estava tendo há tempos.
- Você é muito engraçado, Tuck.
- Eu sei. - o garoto se sentou, abrindo um pacote de fini e encarando toda aquela imensidão que estava a nossa frente.
- É muito lindo. - acompanhei seu olhar, ainda encantada por estar vendo aquela maravilha - Mas por que estamos aqui? Digo, isso aqui é uma empresa, certo? - desviei o olhar até encará-lo, com a voz carregada de confusão.
- Sim. Meu pai trabalha aqui, então... - não terminou sua frase, esperando que eu entendesse que seu acesso ali fosse facilitado por tal fato.
- E você também vai trabalhar aqui futuramente? - me sentei ao seu lado, enfiando a mão no pacote de guloseimas.
- Não. Não quero isso pra mim.
- E o que você quer?
- Não sei. - respondeu indiferente, abrindo uma latinha de refrigerante.
- Tuck, todos nós queremos algo. Eu sei que você também quer! - tentei forçar o garoto a dizer a verdade, mas ele não expressou nenhuma vontade a mais de responder aquilo. Ele parecia... Vazio.
- Você quer ir pra faculdade, ? - desconversou, fazendo o assunto se tornar sobre a minha pessoa. Eu não entendi direito, mas preferi não contestar.
- Quero.
- Eu não quero. Eu não tenho um plano de vida. Não me imagino na faculdade, não me imagino sendo um marido, um pai... Eu não quero nada. - seus olhos azuis foram de encontro aos meus, e Deus... Que homem!
Existem momentos em nossas vidas que nos vemos totalmente perdidos. Com medo e confusos. As escolhas que fazemos nesses momentos podem definir o resto da nossa vida. Claro que quando se está de frente com o desconhecido, a maioria de nós prefere dar meia volta e retornar.
É assim que eu me sinto sobre Jackson Tuck. É isso o que seus olhos me mostram. Pode até ser exagero, pois nos conhecemos muito pouco, mas eu confio nos meus extintos. E sabe o que mais? As vezes as pessoas precisam de alguém que os pressionem por algo melhor. Alguém que os façam buscar por um sonho. Porque às vezes, você só descobre quem é, quando existem opções para seguir sua vida. E bem... Eu amo ser a pessoa que mostra isso tudo.
- Jackson, no fundo, bem no fundinho desse coração, você quer significar alguma coisa. - apontei meu dedo indicador no seu coração, estreitando os olhos e analisando aquele olhar que dizia tanta coisa, e ao mesmo tempo não dizia nada.
- , você por acaso ouviu o qu...
- Não me venha com essa historinha! Todo mundo quer alguma coisa. Todo mundo tem uma ambição. Todo mundo tem sonhos, vontades... Você tem, e eu quero saber quais são. Ou talvez, eu te ajude a mostrar que você pode ter tudo isso. - abri um sorriso largo ao notar que minha fala fez efeito no garoto. Seus olhos estavam minimamente arregalados, com um pequeno sorriso feito no canto da boca.
- Garota, a gente vai se dar muito bem. - Jackson disse firme, gargalhando baixo.
- Espero que a gente faça isso mais vezes. - tombei a cabeça, observando cada detalhe do seu rosto.
- Isso o quê?
- Ser amigos.
's POV end

Digamos que minhas noites estavam sendo dormidas graças a calmantes, e meus dias movidos a cafés. Eu nunca havia me sentido tão desconfortável na minha própria pele como me senti durante a semana, e pra piorar, eu teria que ver a cara do Clay e da Lilian depois de todo esse tempo.
- Você está pronta? - adentrou meu quarto, encostando-se na parede.
- Aham.
- , você está pronta mesmo? - cruzou os braços, com um tom de voz diferente, dando a entender que estava falando de Clay e Lilian. Merda.
- Estou! Vamos logo.
Tio Chris nos deu carona até a escola, onde todos já estavam. Não demorou para entrarmos no ônibus, e Callie foi ao meu lado durante o caminho todo.

Flashback on; Randleman High School.
- Clay, eu entendo que não estamos nos nossos melhores dias, mas será que você pode me dizer o que está acontecendo? - gritei impaciente, sem me importar se alguém ouvisse. Me coloquei à frente do garoto, o fazendo parar de andar.
- Que saco, , me deixa em paz. - não se intimidou com o meu grito, esbarrando em meu ombro e voltando a andar.
- Você está estranho há dias! O que aconteceu, hein? - puxei seu braço com força, fazendo seu corpo ficar em frente ao meu novamente, revelando sua expressão fria e impaciente.
Fria e impaciente. Eu já havia visto aquilo. Sempre, aliás. Isso resume exatamente o jeito do meu pai: frio e impaciente.
- Você não se toca mesmo, né ? - gargalhou alto, tirando minha mão do seu braço com força.
Acho que quando uma tragédia está prestes a acontecer, nosso cérebro já se prepara, mesmo não tendo a certeza de que algo terrível está pra acontecer. Somos assim, programados para nos defendermos caso algo aconteça conosco. Ou talvez, era pra ser assim...
- Do q-que você está f-falando? - cerrei os olhos, tentando encontrar a verdade em seu olhar. O olhar que sempre admirei e que sempre me arrancava suspiros apaixonados, agora estava me encarando de maneira divertida, como se eu fosse uma... Piada.
- Acabou, ok? Não somos um casal, aliás, nunca fomos. Por Deus, , larga do meu pé! - respondeu impaciente, acrescentando àquela última frase um peso em meu coração que eu nunca havia sentido até o momento.
- Clay, do que você está falando? - eu já não sabia mais o que estava sentindo, e nem como consegui coragem para fazer tal pergunta. Eu sentia doses de tristeza sendo depositadas em meu corpo, que pareceu estar sendo sugado de mim mesma.
- Você por acaso é surda? - dessa vez, riu alto, sem discrição nenhuma - Eu nem mesmo gosto de você!
Suas palavras foram mais fortes do que qualquer tapa de Sam. Suas palavras me deram calor, frio, tristeza, agonia, e claro... Dor. Muita dor.
Aos poucos, as pessoas se encostavam nos cantos das paredes a nossa volta, tentando disfarçar que estavam ali pra ouvir nossa discussão.
- O que aconteceu aqui, hein? - Lilian chegou no local rolando os olhos, esbarrando em todos até ficar ao meu lado.
- E-ele terminou c-comigo! - verbalizei com dificuldade, sentindo as lágrimas virem com uma força tremenda, se tornando impossível de conte-las.
- Ah, pelo amor de Deus, né? Você realmente não tinha percebido esse tempo todo que ele não gostava nadinha de você? - Lilian levou as mãos até a cintura, cuspindo as palavras na minha cara.
Implorei mentalmente para aquilo ser apenas mais um dos meus pesadelos. Infelizmente, não era. Os olhares curiosos sobre mim estavam tirando todo o meu ar. Eu sentia tudo sendo sugado de mim, inclusive o tantinho de felicidade que estava em meu coração desde quando havia conhecido Clay.
- Por que você está falando isso? - perguntei baixo, de maneira desesperada e afobada - Lilian, me ajuda! - arregalei os olhos minimamente, pedindo socorro com o olhar também.
- Ajudar no quê, menina? O cara não te quer mais, o que eu posso fazer? - tirou as mãos da cintura, cruzando os braços - Talvez ele tenha cansado das suas crises. - revirou os olhos, me encarando com desdém.
Eu já não conseguia respirar. Parece que, todas as coisas que eu aprendi durante minha vida, como respirar, me mexer e correr, fossem ações impossíveis de serem executadas no momento. Eu estava paralisada.
- O que está acontec... ? - a voz de me deu um leve susto. Meu primo se aproximou, me envolvendo num abraço que me fez voltar à realidade.
- Viu só? Pra mim já chega. - Lilian deu passos nervosos para longe dali, e pude observar Clay indo junto a ela.
Eu sempre soube que a dor de uma decepção amorosa é terrível, tão grande que as vezes nem se consegue palavras para descrevê-la, mas nunca me disseram que seria... Assim.

Sabe quando você tenta fazer algo dar certo e o universo parece conspirar contra? Aquele dia, semana ou mês que absolutamente tudo dá errado? Quando as pessoas, a natureza e sei la mais o que se juntam para atrapalhar aquele seu sonho, projeto ou meta? Então.
Essa semana foi, de longe, a pior. Eu fiz o que estava ao meu alcance. Eu fiz coisas que nem deveria ter feito. Eu tentei ir atrás, tentei conversar, e a única coisa que recebi em troca foi: Clay e Lilian. Juntos. Como um casal. Como uma merda de um casal, como nós éramos.
Quando se ama alguém e é recíproco, você se torna um pouco vulnerável. O amor tem o poder de te machucar de um jeito que nada mais pode. Mas o problema é que eu amei sozinha. Eu amei uma farsa. Amei um garoto que se dizia uma coisa, e se mostrou outra, e não há desespero tão absoluto como esse que vem com os primeiros momentos da primeira grande tristeza. Eu nunca soube o que é ser machucada e curada. Nunca.
Como lidar com essa situação?
Flashback Off.

- ? Ei, chegamos! - estalou os dedos repetidamente em frente aos meus olhos até eu finalmente acordar do meu transe.
Não. Eu não estava pronta. Eu provavelmente nunca estaria.
- Eu n-não consigo! Eu não... Não posso! - meu desespero já havia tomado conta de mim. Eu sentia meu coração extremamente acelerado. Minha ferida estava sendo aberta novamente.
O ônibus estava vazio. Só restava eu e meus amigos. Todos me olhavam confusos, e não pude deixar de comparar tal cena como a do dia em que Clay terminou comigo. Aqueles olhares contribuíram para as minhas noites mal dormidas, e eu odiaria ver aquilo se repetindo.
- , presta atenção em mim, ok? - Callie se sentou ao meu lado, pegando em minha mão com delicadeza - Clay e Lilian são dois idiotas. São pessoas desprovidas de amor ao próximo e fizeram aquilo com você. Mas você sabe que tudo que vai, volta, não sabe? - me deu certo tempo para responder, e só consegui assentir com a cabeça - Nós vamos entrar lá, e você vai mostrar o quanto você está bem sem eles, ok? - seu olhar cheio de carinho e gentileza fez uma lágrima escapar do meu olho. Ao contrário de Lilian, Callie sempre foi uma pessoa companheira. Suas palavras me tiraram o fôlego, mas dessa vez, de uma maneira boa.
- Será que eu posso falar com a ? - a voz de chamou nossa atenção, fazendo nossos olhares irem para ele - A sós. - esclareceu, sem ainda me olhar. Todos dali obedeceram sem contestar, exceto , que assim que abriu a boca, foi calado pela mão da namorada.
Foram dias resumidos em ignorar sua existência e tentar não pensar em tudo o que aconteceu. Foram dias vazios, complicados e cinzas. E honestamente... Eu não sabia da cor que havia trago para o meu mundo até perceber que tudo estava cinza novamente. Isso me faz pensar que a felicidade vai embora antes mesmo de sabermos que estava lá.
Espera aí... Felicidade?
- O que você quer? - balancei a cabeça, me desfazendo dos meus pensamentos. continuava sem me olhar.
- Clay e Lilian são quem eu estou pensando que são? - questionou com a voz um tanto quanto brava.
- São. - eu não podia me dar o luxo de mentir numa situação dessa. A grande verdade é que eu estava desmoronando por dentro e mentir só pioraria a situação.
- , vou precisar que você confie em mim. - se abaixou, ficando ao lado do meu corpo, finalmente me olhando com aqueles olhos azuis que poderiam me enlouquecer de vez.
-Sim, porque funcionou tão bem da ultima vez. - minha resposta saiu carregada de deboche, com uma risada sem humor no final.
- , eu não vou deixar aquele babaca achar que te deixou destruída, está me ouvindo? - tocou em meu queixo, o virando gentilmente de forma que fizesse nossos olhares se encontrarem - Você vai esquecer da burrada que eu fiz, pelo menos por hoje, ok?
- Algumas vezes você faz com que seja difícil te odiar. - respirei fundo, apertando os olhos e encostando meu corpo inteiro no banco.
Eu não sabia qual era a ideia de , e nem quis perguntar. A única coisa que se passava pela minha mente era: como ele consegue ter um efeito tão grande sobre mim?
Felicidade... Ta aí algo que eu achava ser desconhecido. Até aparecer. Se todas aquelas sensações e sentimentos que ele me deu durante esse tempo significavam felicidade, então que assim seja. Mas claro, minha vida não foi feita para ser feliz, e sim, o contrário. É tão estranho como a mesma pessoa pode te fazer tão feliz e ao mesmo tempo te trazer tanta dor. Mas é como aquele ditado diz: o amor e o ódio as vezes insistem em andar de mãos dadas.
Saímos do ônibus assim como o amor e o ódio: de mãos dadas. Claro que o queixo do pessoal quase ficou no chão, mas ninguém abriu a boca para falar nada sobre aquilo. Eu e as garotas caminhamos lentamente até o vestiário feminino, e eu sentia meu coração quase pulando do meu peito.
- , preciso saber quem é a Lilian e qual é o uniforme dela. - Callie pediu baixo, como se tivesse tramando algo. Mas... Ai meu Deus, ela estava tramando algo!
- O que você vai fazer?
- Colocar meu plano em prática, oras! - respondeu como se fosse óbvio.
- Ei, eu te ajudei com isso! - Chloe se manifestou, batendo o pé como uma criança.
- Ok, nosso plano. - Callie se corrigiu.
- Callie, o que você vai fazer? - estava tão curiosa quanto eu, porém muito, mas muito, empolgada.
- Elas ainda estão se trocando, então eu preciso que alguma de vocês corra lá dentro e jogue isso aqui - Callie fuçou em sua pequena bolsa, retirando um rato de mentira com muito cuidado, de maneira que ninguém o visse - E mantenham elas aqui fora enquanto eu entro lá e jogo o pó de mico na roupa de Lilian.
Será que alguém nesse mundo acha que Callie é normal? Porque ela já provou milhares de vezes que tem alguns parafusos a menos.
- Eu jogo. - Chloe pegou o rato e o enfiou dentro do bolso de sua blusa com rapidez, disfarçando até chegar na porta do vestiário.
- Isso não vai dar certo, Callie. Deixa isso pra lá! - quase atropelei minhas próprias palavras por conta do desespero. Na minha cabeça só passava as possibilidades daquele plano maluco dar errado.
Chloe jogou o brinquedo e entrou no vestiário, gritando feito louca sobre ter um rato ali. Callie me puxou para um canto onde ninguém nos visse, mas que nos dava uma visão perfeita de como a primeira parte do plano estava dando certo. Abaixei o olhar ao ver Lilian correndo para longe junto com as outras garotas, que estavam vestidas pela metade.
Chloe fez sinal para que nós entrássemos ali. disse que gritaria a palavra "abacate" caso alguém estivesse vindo. Quando eu digo que só arranjei amiga maluca, não estou mentindo!
Nada havia mudado, exceto pela cor dos armários dali. Lilian sempre foi líder de torcida, mas nunca tentou me fazer virar uma. Pensando e analisando bem, Lilian sempre foi do tipo que só queria as coisas pra ela.
- O armário dela é esse aqui mas está vazio! Ela já está vestida, Callie! - me coloquei à frente do armário de Lilian, o olhando de maneira entre irritada e brava ao perceber que estava vazio.
- Algum desses sapatos é o dela? - Callie perguntou rapidamente, observando os três pares que estavam espalhados pelo chão. Não tive dúvidas ao apontar para o sapato próximo ao seu pé. Eu conhecia bem o gosto de Lilian, e pela primeira vez em muito tempo, me senti alegre por me lembrar de algo sobre ela.
Callie retirou uma caixinha que estava dentro de uma sacola de sua bolsa, espalhando aquele pó com cuidado dentro do sapato da garota. Não vou mentir, aquela cena colocou um sorriso largo no meu rosto. Aquilo não apagava e nem tirava um terço da dor de Lilian me trouxe, mas só de imagina-la naquela situação já me fazia querer rir.
Corremos para fora dali, rindo todas juntas ao finalizarmos aquele plano doido.
- Você não vale nada, mas obrigada por ter se dado o trabalho de pensar em uma vingança contra Lilian! - abracei Callie de lado, e aquilo se formou um abraço em grupo.
- Posso saber o que as mocinhas aprontaram? - nos surpreendeu com o timbre grosso da voz forçado. Os garotos saíram do vestiário masculino juntos, e estavam nos olhando como se soubessem que havíamos aprontado algo.
- Callie jogou pó de mico no sapato da Lilian. - Chloe revelou a verdade como se fosse a coisa mais normal do mundo.
- Eu tô fodido! Imagina se um dia eu termino com essa menina?! - fingiu estar indignado, fazendo uma careta ao terminar.
- Se você terminar comigo eu coloco mó de mico nas suas cuecas! - Callie respondeu firme, com o queixo levantado. Ah, esse casal...
- E ainda tem a vingança contra o Clay! - Chloe manteve a serenidade em sua voz, mas não pude deixar de arregalar os olhos.
- O QUÊ?
- É, oras. Ou você achou que eu faria meu serviço pela metade? - Callie fingiu estar afrontada.
- Não precisa se vingar dele, o que é ruim se destrói sozinho. - se manifestou, dando uma piscadinha marota para a garota.
- Ah, cala essa boca! Precisa de vingança SIM! - Callie esbravejou.
- Precisa mesmo. Só falei pra fingir que sou sensato. - debateu, nos fazendo rir - Mas conta qual é a vingança.
- Um ótimo suquinho de morango com uma alta dosagem de laxante! - Callie fuçou em sua bolsa novamente, revelando uma garrafa de Gatorade. Rimos, mas rimos muito mesmo!
- Garota, você é o máximo! - ergueu a mão e os dois deram um hi five - Mas só dê no intervalo do jogo, ok? Quero que ele preste atenção na goleada que o time dele vai tomar.
Ouvimos muitas vozes tomar conta dali, e todas as garotas estavam voltando para o vestiário feminino junto com o professor delas, segundo o que o uniforme do homem dizia. Ele entrou ali impaciente, e assim que achou o rato de brinquedo, Chloe correu discretamente em direção contrária, e decidimos fazer o mesmo, porém sem correr.
Os minutos se passaram e estávamos sendo chamadas para entrarmos na quadra. Eu iria me apresentar para o meu ex retardado e minha ex melhor amiga traidora. Claro que isso nem passava pela cabeça deles, já que a antiga nunca se tornaria líder de torcida, mas não posso negar que eu estava dividida entre ansiedade e nervosismo. Muito nervosismo mesmo. Eu sentia minhas mãos tremendo, e meu corpo esfriando. Eu sentia meu mundo girar em volta à dor.
- Você está legal? - todas as garotas já haviam entrado, exceto , que voltou no mesmo instante que percebeu que eu não tinha conseguido me mover para dentro daquela quadra.
- Eu só preciso de um minuto. - joguei a cabeça pra trás, evitando de olhar em seus olhos. sussurrou um "ok" bem compreensível, e pude ouvir a porta da entrada para a quadra se fechar novamente.
Acontece que não é tão fácil enfrentar suas decepções novamente. Não é fácil aceitar o fato de que pessoas te magoam e nem mesmo pedem desculpa. Não é fácil viver.
- Ei. - o som da voz de me deu um pequeno susto. Me virei lentamente, encarando o azul de seus olhos - Como você está se sentindo?
- Não sei. Eu não sei se consigo fazer isso! - a essa altura, meu alto controle estava desgovernado. Andei de um lado para o outro incansavelmente, pensando em desculpas esfarrapadas para poder sair dali.
- , me escuta! - suas mãos me seguraram brutalmente, chocando meu corpo contra o seu - Bebe isso aqui. - ergueu uma garrafa de água, e mesmo sem sede, levei minha boca até o bico da garrafa, bebendo aquele líquido gelado, sentindo passar pela minha garganta até chegar em meu estômago - Agora feche os olhos, respire fundo e vamos contar até dez juntos! - puxou a garrafa da minha mão com gentileza, a colocando no chão. Pegou em minhas mãos, sem as entrelaçar e começou a respirar fundo junto comigo, fazendo uma contagem lenta de um a dez.
Nossas Intenções são sempre sinceras. Nós sempre queremos fazer o que é certo, mas claro, nem sempre é possível. E às vezes... Bem... Às vezes acontece isso aqui. Essa conexão, essa ajuda, essa força. não é nenhum santo, e disso eu sei bem, mas não posso negar que em alguns momentos ele consegue me surpreender com tais ações.
- Obrigada por isso, . - abri meus olhos lentamente, tendo a visão perfeita daquele rosto que me fazia sentir tantas sensações malucas. Nossos corpos se separaram lentamente, e Deus... Como eu queria mantê-lo perto. Como eu queria abraçá-lo e sentir a sensação de estar em paz e segura.
-Boa sorte, não fique nervosa, e lembre-se que Clay é um babaca, beleza? - numerava os tópicos com as mãos, e aquilo se tornou um tanto quanto adorável.
entrelaçou nossas mãos, e antes mesmo que eu pudesse pensar em protestar sobre aquilo, ele disse que eu precisava confiar nele. Nossa relação é algo engraçado. Os laços que nos unem as vezes são impossíveis de explicar. Eles nos conectam até mesmo quando deveriam ser quebrados. E não, isso não é algo ruim, por mais que eu desejasse que fosse.
Não tive tempo de notar a presença de Clay e Lilian, apenas me concentrei em nossa coreografia, que foi muito bem aplaudida ao terminarmos. Demos um abraço em grupo e assim que nos soltamos, pude observar aquela pessoa caminhando até mim.
Clay estava vindo em minha direção.
Meu sensor interno de perigo estava apitando alto, e eu não conseguia me mexer. Droga.
- Amor, você foi muito bem! - senti os braços de me abraçando por trás, e eu nunca havia sentido um alívio tão grande por aquilo. Clay parou de andar no mesmo instante, e antes mesmo que eu pudesse me virar para encara-lo de uma vez, sussurrou em meu ouvido para eu dar oi.
- Obrigada, babe! - continuou abraçado comigo, me virando de lado lentamente até ficarmos de frente para Clay, de modo que aparentasse ser sem querer - Opa! Oi, Clay! - sorri simpática, engolindo todo o meu nervosismo. A cara de surpresa do rapaz quase me fez rir, e antes mesmo que ele abrisse a boca para falar algo, me puxou pela mão gentilmente para longe dali.
- Estou orgulhoso de você, amor. - frisou a última palavra, dando um belo sorriso bem humorado. O sorriso que faria falta na vida de qualquer um.
- Obrigada, obrigada, obrigada! - me empolguei demais, o abraçando forte. A verdade é que não dei a mínima para aquilo, apenas fiz o que meu corpo - e coração - estavam me implorando para fazer. Eu não teria feito aquilo se não fosse por . Ele me fez encarar a situação de queixo erguido e com muita bravura. me deu forças para ser corajosa.
- Acho que você vai querer ver aquilo. - pelo seu tom de voz, pude perceber que ele estava segurando o riso.
Lilian estava sentada no chão, com seus sapatos fora de seus pés, os coçando feito louca e conversando aos berros com qualquer um que tentava ajudá-la. O pessoal se aproximou de nós, observando aquela cena aos risos. Não posso negar que aquela pequena vingança tinha tirado aquele peso todo das minhas costas. Agora, analisando bem a situação, consigo entender um pouco melhor a história de que coisas ruins precisam acontecer para dar sentido quando as coisas boas acontecerem. Lilian nunca foi metade do que , Callie e Chloe são.
As líderes de torcida se apresentaram sem Lilian, que foi tirada dali a força. A garota só retornou quando o jogo estava prestes a começar, juntamente a um balde d'agua nos pés, e ficou sentada em um canto bem distante da arquibancada. Minha barriga já estava doendo de tanto rir daquela situação toda.
O jogo começou, e posso dizer com todas as letras que todos estavam jogando como nunca haviam feito antes em nenhum outro jogo. Pode parecer exagero mas... Eu sentia que aquilo era por mim. Todos dali sabiam do ocorrido com Clay, e talvez Callie não fosse a única que vingativa do grupo. Alias, tem vingança melhor do que a vitória?
O trabalho em time era muito bem distribuído, principalmente entre e Jackson, o que era um tanto quanto irônico. Ah, como essa vida é maluca!
Em meio a tanta animação, gritaria e tensão, me vi com um tiquinho de desconforto. Clay havia cruzado seu olhar com o meu, por no máximo três segundos, e aquilo havia sido o suficiente para me deixar balançada. Não, não e não! Eu não podia demonstrar tristeza nem nada do tipo. Assim como falou, eu não podia deixar que ele pensasse que tinha me deixado destruída, embora tivesse deixado.
O jogo estava complicado. O time adversário era realmente bom, mas claro, nada se compara aos Ravens. fez o primeiro gol e correu em minha direção, me dando um abraço apertado que até me tirou do chão. Às vezes eu paro e penso: como foi que arranjei essas pessoas? Como foi que consegui algo tão bom, em meio a tanta coisa ruim? Mas pra ser extremamente honesta, eu nem me importava com as respostas daquelas perguntas. Eu tinha amigos companheiros e verdadeiros, que estavam sempre à disposição para coisas novas, que sabiam ouvir e dar as melhores opiniões e conselhos, e claro... Me arrancavam melhores risadas. O meu ponto é: não adianta ter uma vida repleta de pessoas, se tais não são seus amigos de verdade. Não adianta ter tudo o que deseja, se não tem amigos. Porque no final, nada tem importância se não for com eles.
A tensão podia ser sentida sem nenhuma dificuldade. Clay havia feito a porra de um gol, empatando o jogo. O juiz apitou anunciando o intervalo, e sem que eu percebesse, se colocou ao meu lado, tomando uma garrafa inteira de água em questão de segundos.
- Até que esse bostinha joga bem. - o garoto acompanhou Clay com os olhos, que estava sentado do outro lado da quadra.
- Gente, está na hora do meu show! Será que eu devo levar um penico? - chegou saltitante em nossa frente, com um olhar diabólico e com aquela garrafa do mal em suas mãos.
- Cala a boca e vai, só isso. - exigiu bem humorado, se divertindo muito com aquilo, dava pra perceber em seus olhos.
Assistimos aquela cena de longe com atenção. jogava a cabeleira de um lado para o outro, em uma pose um tanto quanto sensual. Ela era uma ótima atriz. Clay pegou a garrafa sorridente, bebendo quase todo o líquido benzido em laxante. Aquilo estava melhor do que eu podia imaginar!
O juiz agitou os jogadores novamente, que estavam com a corda toda para o segundo tempo. Mesmo não entendendo nada de futebol, eu tentava nomear os toques que cada um dava. Eu estava tão concentrada no jogo, que consegui esquecer por alguns segundos que Clay e Lilian estavam ali.
O tempo estava acabando, e estávamos quase arrancando nossos cabelos fora. Empate resulta em pênaltis, e não tem algo mais agonizante que aquilo. Clay ainda estava firme e forte, e Callie teve uma breve discussão com Chloe sobre a dosagem do laxante. Nossa atenção voltou ao jogo assim que um gol foi feito.
Gol... Dos Ravens!
havia feito aquela belezinha, e correu em minha direção, me puxando forte pela cintura e me enchendo de selinhos. Puta merda! Eu sentia que desmancharia por tal acontecimento. Sua boca macia se dava muito bem com a minha. Muito mesmo.
- Parabéns, babe! - me afundei naquele teatro de casal feliz, e mesmo sendo apenas algo falso, uma partezinha de mim aproveitou tanto como se fosse real. Talvez, se as coisas não tivessem sido do jeito que foram, realmente poderia ser real.
O juiz apitou anunciando o fim do jogo, e o time todo, junto às líderes de torcida se abraçou, gritando pela vitória. Eu gostaria de pausar o momento e guarda-lo numa caixinha e revive-lo sempre que quisesse. Os sorrisos, a união, a felicidade e os corações em festa me deixavam flutuando. Por breves segundos, nada de ruim existia no mundo. Nada mesmo. E não existe sensação mais prazerosa.
Voltamos saltitantes ao vestiário, nos trocando rapidamente, mas nossa saída foi barrada. Lilian.
A própria, bem na porta do vestiário, com os braços cruzados e uma cara nada agradável.
- Ora, ora, ora, se não é , a nova líder de torcida do pedaço. - Lilian arrastava a voz entre deboche e falsa surpresa.
- Me erra, garota. - ao contrário do que eu pensava, Lilian não me trazia a dor de volta, e sim, raiva. Seu jeito cínico não havia mudado. Revirei os olhos, pronta para sair dali, mas sendo impedida pela garota, que insistia em me peitar de maneira desafiadora.
- Vejo que aparentemente você está melhor. Como foi ter que mudar de escola por não saber lidar com a rejeição? - colocou a mão sobre o coração numa dramática interpretação de falsa dor, gargalhando sem humor ao terminar.
As garotas do vestiário estavam grudadas na porta, observando aquele show causado por Lilian. Flashbacks se passavam pela minha cabeça. Foi como tudo aconteceu pela vez. Foi como eu permiti que aquilo tomasse conta da minha vida.
Não. Eu não deixaria aquilo acontecer de novo. Minha caminhada para uma vida melhor estava em andamento, e Lilian provavelmente era um maldito obstáculo. Sua insegurança e vontade de me colocar pra baixo não seriam mais aceitos. O jogo estava prestes a virar.
- A verdade é que eu estou bem, e não é só aparentemente. Eu me mudei de escola sim, porque eu não era obrigada a olhar você com Clay e sentir todo aquele nojo que eu sentia. Eu preferi simplesmente sair de cena e continuar a minha vida em outro lugar. Eu fui madura o suficiente pra fazer uma escolha. Eu escolhi mudar, ao contrário de você, que precisa sempre estar pisando em alguém pra se sentir melhor consigo mesma. Pelo amor de Deus, Lilian, vê se cresce! Eu juro que não dói. - meu coração esperneava para colocar todas as palavras para fora. O alívio que senti foi instantâneo. Lilian estava com a boca quase aberta em um "O", ainda surpresa com minhas palavras. Acontece que, eu não estava surpresa. Eu estava me sentindo eu. Completa. Certa. E pela primeira vez, enfrentando um problema de cabeça erguida.
- Eu preciso pisar nas pessoas pra me sentir melhor? , me poupe! - Lilian espalmou as mãos no ar, não abandonando seu tom debochado. Eu podia ver e sentir que minhas palavras tinham mexido com sua cabecinha. É como dizem; a verdade dói, e nem sempre estamos preparados para ouvi-la.
- Então por qual motivo você está enchendo a merda do meu saco? Por que você achou que iria me humilhar e eu correria pra longe? Se enganou, meu bem! - cruzei os braços, abrindo um sorriso inédito. Eu me sentia radiante. Eu já havia feito muita merda na vida, mas aquilo estava sendo, de longe, um dos meus maiores bem feitos nesses 16 anos de carreira. Estava na hora de botar Lilian em seu lugar de uma vez por todas.
- Olha só, finalmente está mostrando as garras! Nem parece aquela garota proble...
- Vou te parar por aí mesmo. A única problemática aqui é você e isso está nítido. Você realmente quer continuar essa discussão que não nos acrescenta em nada ou eu já posso sair daqui? - nem disfarcei o tédio que a sua falta de argumentos estava me causando. Observei minhas unhas, ignorando completamente a garota em minha frente. Eu estava me divertindo muito com aquilo.
- Garota, voc...
- Acabou, né? - interrompi sua fala. O som de sua voz estava começando a me incomodar. A garota movimentou a boca novamente, prontinha para falar algo novamente, mas fui mais rápida - Tchau, au revoir, e arrivederci. - foi uma ridícula mistura de com as únicas palavras em francês e italiano que eu tinha conhecimento. A paralisia que me deixaria imóvel em uma situação como essa, já não existia mais. Movi minhas pernas para longe dali, esbarrando com vontade em Lilian, que nem mesmo conseguiu abrir a boca para reclamar.
Todos estavam ali, inclusive os garotos. Todos assistiram o jogo virar de camarote. Pela primeira vez, eu estava me sentindo extremamente confortável em estar na minha própria pele. Estava extremamente orgulhosa da maneira que lidei com a situação. Por alguns segundos, me senti invencível. Se eu estava assim por ter feito isso pela primeira vez, imagina se fizesse sempre?
No meio de tantos sorrisos orgulhosos para mim, o meu corpo se chocou.
Com o corpo de Clay.
Nos encaramos por alguns segundos, e seus olhos não me causavam nada, assim como sua presença. Nem mesmo raiva.
- , eu só queria qu...
Não. Eu não queria ouvir nada. Clay foi como um príncipe na minha vida, e o que ele fez comigo foi como descobrir que príncipes, de fato, não existem. Eu não queria ouvir o que ele tinha a dizer pelo simples fato de não precisar. Qualquer coisa que ele falasse, não mudaria o fato de que eu sou uma melhor depois de tudo o que aconteceu. Ao contrário do que ele provavelmente pensava, assim como Lilian, eu melhorei e evoluí. Abri meu coração a pessoas e experiências novas, e por mais que as coisas tivessem saído dos trilhos, não posso negar que muitas coisas boas aconteceram também.
Céus... Admitir e aceitar esse fato faz uma baita diferença!
- Nos poupe disso, ta legal? Qualquer coisa que você falar, não vai acrescentar nem diminuir na minha vida. Você já está fora dela há tempos e quero que continue assim. Passar bem, Clay. - dei passos longos para longe dali, dando uma breve olhada na reação do garoto. Ele estava incrédulo, e uma leve onda de zoação tomou conta do local.

***


- Eu ainda nem acredito que você falou tudo aquilo! - me deu provavelmente o milésimo abraço durante o dia.
Combinamos de jantar na casa de . E bem... A janta era pizza.
Meu coração ainda estava em uma espécie de paz e tranquilidade, algo totalmente diferente do que eu sentia diariamente.
- Eu estou tão orgulhosa de você! - Callie se juntou ao abraço de um jeito desengonçado. Eu já estava ficando exausta de tanto contato físico, mas claro, era por uma boa causa.
Eu realmente nunca tinha me imaginado fazendo o que fiz. Posso dizer com a maior certeza que me surpreendi comigo mesma, e dessa vez, no bom sentido.
- Você deixou o Clay no chinelo. Eu não queria ser ele de jeito nenhum. - acrescentou, fazendo uma careta ao mencionar Clay, afastando o prato sem pizza de si.
Eu estava sem palavras. Mal conseguia parar de sorrir. Quando o assunto cessou, conversamos sobre outras coisas e decidimos ir embora, pois os pais de haviam chegado e aparentavam estarem cansados.
- . - a voz baixa de quase me fez pensar que eu estava louca e estava ouvindo demais, mas assim que virei pra trás, seus olhos azuis estavam me encarando.
- É... Oi? - sorri sem graça, parando de andar e ficando em sua frente. Ainda estávamos dentro da casa de , e todos estavam fora batendo papo, nem mesmo reparando na nossa ausência.
- Você quer carona? - perguntou sério, após clarear a garganta para chamar minha atenção. Sua pergunta me surpreendeu, e precisei pensar por alguns segundos antes de responder.
- Não acho uma boa ide...
- Nem eu, mas precisamos conversar. - encostou-se a porta, cruzando os braços. Deus... Como ele conseguia ser desse jeito? Cada detalhe, gesto e olhar acabavam comigo aos poucos.
- Sobre? - estreitei os olhos, incerta sobre o que pensar sobre aquilo, mesmo tendo uma ótima dedução sobre o que podia ser.
- Ah, pelo amor de Deus, vai logo, ! - gritou, e só assim pude notar que todos estavam ali, olhando para nós.
É, talvez essa seja a prova de que estar com me fazia esquecer de todo o resto. Aceitei o convite com certo receio, e o caminho inteiro foi um silêncio extremante agonizante.
- Como você se sentiu sobre hoje? - a pergunta foi feita no momento em que o carro foi parado na frente de casa. Quer dizer, na casa dos meus tios, que também estava sendo minha casa. Ah, tanto faz.
- Muito bem. Nunca me senti assim em toda minha vida, sério! - não consegui segurar o sorriso que insistiu em se formar, estampando meu rosto todo.
- Sabe por que você está se sentindo assim? Porque não doeu. Você estava com medo de que encarar Lilian e Clay depois de todo esse tempo seria uma coisa extremante difícil, mas foi mais fácil do que você imaginava. Você finalmente mostrou com quantos paus se faz uma canoa, e isso te deu uma paz estranha. Paz de quem está livre de qualquer culpa. Não houve dor não porque não feriu, e sim porque você está mais forte, mas pra falar a verdade, você sempre foi, mas agora sabe disso. Isso tudo se tornou insignificante perto do seu valor, e eu estou orgulhoso de você, babe. - as palavras de saíam com muita serenidade e carinho, inclusive o apelidinho. Eu até conseguia sentir. Vê-lo dessa maneira, falando esse tipo de coisa, foi como se doses de felicidade estivessem sendo injetadas no meu peito.
Felicidade!
Eu não consegui me conter. Suas palavras foram o ápice. As lágrimas desceram lentamente pelo meu rosto, e aí eu percebi que aquelas lágrimas estavam sendo de orgulho. Orgulho de mim mesma.
- , voc...
- Eu estou bem. Mais que bem!
- Eu estou tão feliz por você, garota. - limpou uma lágrima com seu dedão, que encostou em meu rosto lentamente, fazendo um carinho gostoso. Ah... Aquele toque. Fechei os olhos, sentindo toda aquela conexão novamente.
- O que você está fazendo? - abri os olhos rapidamente ao sentir algo se aproximar. Algo não, alguém. Sua boca, pra ser mais precisa.
- Que saco, . Eu só... Sei lá, ta legal? Eu sei que pisei na bola e que você provavelmente não vai me perdoar tão cedo, mas ser...
- Shhhhh. Eu não quero falar disso agora, ok? - levei minha mão até sua boca, colocando o indicador ali, o impedindo de terminar sua fala.
Eu realmente não queria. Não porque não estava pronta, e sim, porque realmente não queria. Eu só precisava aproveitar aquele sentimento magnífico que estava instalado em meu peito.
Receio vem em tudo que é forma e tamanho. Alguns são pequenos, quando fazemos algo ruim por uma boa razão. Alguns são grandes, como quando decepcionamos um amigo. E algumas vezes temos que lutar pra entrar de acordo com o que passou. Mas, creio eu, que nossos maiores receios não são por coisas que fizemos, são pelas coisas que não conseguimos fazer.
Coisas que não conseguimos dizer, como a verdade. Coisas que entende bem. Mas claro... As pessoas cometem erros, mas se elas querem deixar no passado, então, talvez devêssemos também.
Mas com isso vem a terrível dúvida: será que vale a pena?

's POV
- A única coisa que eu quero saber é por que você não me contou essa porra toda antes! - Dan esbravejou impaciente, ainda me encarando com o pior dos olhares.
Eu não tinha aberto a minha boca para comentar sobre os acontecimentos recentes. Não queria, e nem estava com vontade. Richard consegue fazer minha mente ficar mais avoada do que tudo, e eu odeio admitir que ele tem esse domínio sobre mim.
- Dan, da um tempo. Eu não te contei tudo pra você brigar comigo. - rolei os olhos, pousando minhas mãos sobre meu rosto, exausto de encarar sua cara nervosa.
- Você recorreu ao Cooper e não a mim! Como você esperava que eu reagisse? - continuou esbravejando aos berros. Massageei minhas têmporas, tentando ignorar aquele surto de indignação.
- Dan, eu estava desesperado! Richard pegou , você entende a gravidade da coisa? E sabe o que é pior? Eu sinto que isso é só o começo! Ele está determinado em acabar com as nossas vidas. - me levantei bruscamente, surpreendendo o homem com as minhas palavras ditas aos gritos.
Minhas intuições não falham, e disso eu tenho plena certeza.
Tudo estava indo... Bem. Razoavelmente bem. Minha relação com estava de volta aos trilhos de maneira devagar. E o grande problema é esse. Eu não deveria ter tentado ajeitar as coisas. Eu deveria apenas ter deixado ele me odiar, mas não... Essa maldita vontade de querer mantê-la perto, mesmo sendo perigoso, se tornou uma necessidade absurda. A necessidade de sentir seu perfume, sua pele, seu beijo, seus toques... Céus, o que está acontecendo?
- , nós vamos pegar Richard, ok? Eu prometo! - Dan disse firme, relativamente mais calmo, com os olhos firmes no meu.
Não prolonguei minha visita e fui embora assim que terminei de falar o que precisava. Eu só precisava deitar e pensar em que merda eu estava fazendo da minha vida.
Busquei Sophia, também não prolongando minha presença ali. Abri a porta de casa e encontrei minha mãe arrumada, e nem mesmo me dei o trabalho de deduzir para onde ela iria, pois estava óbvio. Jantar na casa dos Tuck.
- Vocês tem dez minutos pra se arrumarem. Vamos, vamos! - minha mãe disse em tom animado, ignorando totalmente minha expressão de reprovação ao ouvir aquilo. Sophia nem pensou duas vezes antes de correr até seu quarto.
- Mas eu n...
- Mas você vai! - me interrompeu, me impedindo de recusar aquele convite maluco.
- Me dê um ótimo motivo para ir, dona Elena. - cruzei os braços indignado, tentando irritá-la por pirraça. Sempre funciona. Ou pelo menos, costumava funcionar... Droga.
- Você está vendo alguma panela em cima do fogão? - apontou para o mesmo, que não possuía nem uma panelinha sequer - Não, não está, porque eu não fiz comida, ou seja, ou você vai jantar na casa dos Tuck comigo ou você fica aqui com fome, porque sabemos que você não sabe nem fritar um ovo. - terminou com uma risada triunfante, com as sobrancelhas arqueadas. Puta que pariu, eu sempre ganhava esse jogo e agora minha própria mãe está passando por cima de mim. - Eu não acredito que isso está acontecendo. Vai ter volta, mulher! - resmunguei derrotado, já subindo as escadas até meu quarto.

Adentramos a casa, repleta de luxo como sempre, junto aos beijos e abraços fortes de Julie. Não demorou para sermos levados a cozinha, e antes do jantar ser servido, Cooper apareceu em um traje bem diferente do que sempre estava vestido; roupa social. Sua bermuda larga e camiseta azul quase me fizeram rir. Mal nos olhávamos. Era realmente esquisito.
- Como estão as coisas na escola, ? - Julie perguntou animada, colocando uma quantidade generosa de comida em seu prato.
- Estão normais. - respondi distraidamente.
- E como está sua vida? Já está namorando? - sua pergunta quase me fez engasgar de verdade. Misericórdia.
- Não, namorando não, que isso. Não estou namorando. - balancei a cabeça negativamente milhares de vezes, me assegurando que estava sendo claro que minha afirmação.
- Mas ele está afim de uma garota. Vive levando ela lá em casa! - minha mãe se manifestou, dando um sorrisinho sapeca para Julie, que me olhou surpresa e se rendeu aos risos. Puta que pariu, cadê os limites, Elena? CADÊ?
- Eu não estou afim de ninguém. - me defendi com pressa, observando todos rirem de mim, inclusive Cooper.
Boa parte do jantar foi resumido em zoar com a minha cara, mas não foi totalmente ruim, afinal, a comida estava realmente impecável. Com uma cozinheira dessa, eu nunca mais sairia de casa pra comer fora.
A empregada trouxe a sobremesa. Cheescake. Nessas horas eu agradeço mentalmente por ter uma mãe insistente. Eu e Sophia quase lambemos o pequeno prato com o final da sobremesa ali, mas seria bizarro demais. Minha mãe e Julie se empolgaram demais, e a fofoca rolou solta. Pelo amor de Deus, elas trabalham juntas! De onde sai tanto assunto?
- SERÁ QUE ALGUÉM PODE ME EXPLICAR QUE MERDA ACABOU DE ACONTECER? - a porta foi aberta com força, revelando Jackson com... ?!
- Ei mocinho, o que é isso? - Julie caminhou com pressa até o filho, tentando disfarçar a surpresa. Colocou as mãos na cintura, mostrando indignação.
- ALGUÉM PODE ME EXPLICAR PORQUE O PAI DESSE GAROTO - Jackson pousou seu olhar furioso sobre mim, apontando para a minha pessoa - VEIO ATRÁS DE MIM, DIZENDO QUE É MEU PAI??? - finalizou com um grito ainda mais raivoso. estava incrédula, mas algo deu forças para ela puxar Sophia pela mão para fora da cozinha.
Eu estava perdido. Perdido em meio a gritos, olhares furiosos e surpresos. O que diabos estava acontecendo? Minha intuição estava certa novamente?
's POV end

's POV
Um começo de semana resumido em tentando agradar Chloe de todas as maneiras possíveis. Callie e como o melhor casal do mundo, como sempre. ... Estava sendo . e voltaram a conversar, mas não como antes. E eu... Eu ainda tinha Jackson Tuck na minha cola. Não que fosse algo ruim, muito pelo contrário, mas é que estava sendo muito bom. Muito bom mesmo.
Tuck se mostrou ser engraçado, companheiro, amigo, sentimental - mesmo fingindo não ser -, e cada dia mais bonito. Sério, ele estava cada dia mais bonito mesmo!
- Acho que já te mostrei bastante coisa, agora está na hora de fazer você sentir. - as palavras de Tuck quase fizeram com que eu me engasgasse com a minha própria saliva. Bati a porta do meu armário, já com o meu material em mãos, encarando o garoto com a expressão mais confusa do que tudo. O que ele queria que eu sentisse?
- Hein? - tombei a cabeça para o lado, e a minha confusão o fez soltar uma gargalhada fraca.
- Vamos sair de novo, . Te pego as nove e meia! - não me deu a opção ou o tempo de recusar e se afastou com um sorriso no rosto.
Jackson Tuck, o que você está tramando dessa vez?

***


- Ele nem te disse pra onde vai te levar? - Callie retirou mais uma peça de roupa do meu guarda roupa, e novamente, balancei a cabeça negativamente, recusando aquela peça.
não pôde se juntar a nós na missão de montar um bom look para sair com Jackson Tuck, pois jantaria com a sua mãe. Chloe saiu com , e Callie e Sophia foram as únicas que restaram. Coitadas.
- Não! Ele só disse que já me mostrou bastante coisa, e agora está na hora de me fazer sentir.
- OI? Como é que é? - Callie largou a calça cor de vinho que estava em suas mãos, se aproximando e sentando ao meu lado, com o olhar mais malicioso que eu já havia visto vindo dela.
- Eu também não entendi! - joguei meu corpo pra trás, deitando em minha cama e suspirando alto.
- , você tá namorando? - Sophia perguntou curiosa, com os olhos minimamente arregalados. A garotinha estava sentada na poltrona ao lado da minha cama, pintando uma revistinha de colorir.
- Não, meu anjo, eu não estou namorando, mas eu vou sair com um garoto muito bonito. Com qual roupa você acha que eu devo ir? - me sentei novamente, e a garotinha me levou a sério. Sophia saltou da poltrona, pegando a calça vinho que Callie largou no chão, e puxando um suéter cinza básico do cabide que estava dentro do guarda roupa. Agora me diz, tem como não morrer de amores por essa garotinha?
- Eu adorei! Boa escolha, Soph! - Callie também não se conteve, e pegou a garotinha no colo e a encheu de beijos.
Eu realmente havia gostado das roupas que Sophia escolheu, e pra falar a verdade, ficou uma ótima combinação. Coloquei uma botinha cano baixo preta, e me senti deslumbrante mesmo não estando chique. Conforto é o mais importante, certo?
Callie se despediu de nós com abraços fortes e sussurrando bobagens no meu ouvido como "não esquece de usar camisinha" e coisas do tipo. Essa garota é uma capetinha, sério!
tocou a campainha, e por mais que eu quisesse bater um super papo, não podia pois; iria sair com Jackson, e porque aparentava estar exausto. Suas olheiras estavam muito visíveis, e os olhos cansados também. Conversamos apenas o básico e os dois foram embora dali, me deixando apenas na espera de Tuck.
Não demorou muito para o garoto chegar com seu Toyota Camry. Jackson não saiu do carro, apenas buzinou para que eu entrasse. O cumprimentei com um beijinho no rosto, e pude sentir o seu perfume invadir minhas narinas. Droga. Além de bonito é cheiroso. - Você não tem um CD nesse carro, não? - perguntei sem vergonha, observando o rapaz dirigindo com certa pressa. Esses corredores de racha...
- Pra que? É só conectar o celular no rádio. - sua resposta me fez arregalar os olhos, e antes mesmo de falar algo, Jackson estava me olhando confuso - O que foi? Falei algo de errado?
- Não, não, não! - repeti desesperada, tirando qualquer dúvida que o garoto tivesse sobre aquilo - É que o falou exatamente isso quando eu fiz essa pergunta pra ele. É até engraçado. - soltei uma risada fraca, me sentindo uma pateta por aquilo. Sem nervosismo, !
- Mas é só a verdade. - Tuck deu os ombros, fazendo uma careta e voltando a atenção às ruas. Eu conhecia aquele caminho...
Bingo!
"Bem vindos a Opper."
- Por que estamos no lugar onde você corre? - perguntei em tom confuso, saindo do carro, assim como Jackson. Estava vazio, afinal, ninguém corria em plena quarta feira.
- Porque hoje você vai sentir o que eu sinto quando corro. - Jackson sorriu de imediato, e suas palavras fizeram o meu corpo se arrepiar todinho.
- O que isso quer dizer? - estreitei os olhos, torcendo para não ouvir o que imaginava que ouviria.
- Você vai correr comigo, oras. - respondeu como se fosse óbvio, e não me deu oportunidade para negar aquilo e virou as costas.
Tuck dava passos longos até chegar a pista, e deduzi mentalmente que alguém havia deixado tudo pronto, pois apenas o seu carro de corrida estava ali. Um arrepio percorreu por todo o meu corpo ao observar o quão grande o lugar era. No que eu estava me metendo?
- Você acha mesmo que eu vou entrar nesse carro enquanto você corre a mil quilômetros por minuto? - parei de andar assim que estávamos chegando perto demais. Coloquei os braços na cintura e fiz uma pose ridícula. Tão ridícula que fez Jackson rir.
- Ahhhh você vai sim, ah se vai! - a empolgação na voz de Jackson era incrível. Ele ignorou completamente a minha pergunta e se aproximou aos poucos. Ai meu coraçãozinho!
- E por que eu iria? - cruzei meus braços, e aquele jogo estava me divertindo. Adoro fazer charme, mas eu realmente não estava adorando a ideia de Jackson. Não iria me render tão fácil.
- Porque você VAI. - Jackson frisou a última palavra, se aproximando... E se aproximando... E...
- ME PÕE NO CHÃO! - Tuck me pegou no colo sem nenhum esforço, me levando até onde o carro estava. Não pude negar que minhas gargalhadas me impediam de reclamar, pois Jackson sussurrava piadinhas ridículas enquanto se divertia com aquilo.
- Ou você entra no carro por bem, ou você entra por mal. A escolha é toda sua. - Jackson tentou ficar sério, mas não conseguiu. O som da sua risada era algo gostoso de se ouvir.
- Nossa, que tentador! - minha voz estava carregada de sarcasmo - Mas você já pode me soltar. Juro que vou entrar no carro por bem, e não por mal, até porque se você me jogasse lá dentro eu iria sair daqui com alguns hematomas. - imaginei a cena rapidamente, e vi que a primeira opção era a melhor.
- Você só vive uma vez, . Aproveite e sinta todas as sensações e emoções que a vida te proporciona, ok? - sua mão foi até meu rosto, fazendo um carinho gostoso em minha bochecha. O olhar de Tuck pousado sobre mim estava quase me deixando sem graça. Olhares me afetam.
Entrei no carro, colocando o cinto e respirando fundo incontáveis vezes. Eu simplesmente não estava acreditando no que estava prestes a fazer. O barulho do acelerador me fez fechar os olhos e encostar a cabeça no encosto do banco.
Não sabemos se nosso tempo aqui será longo ou curto. Não sabemos se iremos conseguir o que almejamos. Não sabemos de absolutamente nada. E é por isso que estamos sempre com pressa. Queremos tudo rápido, e a vontade de pular a etapa onde lutamos para conseguir o que queremos é grande. Não temos paciência para esperar. Mas isso não significa que somos errados. Somos ambiciosos. Perseguir as coisas com integridade é algo bom.
A velocidade do carro estava alta, mas a minha mente estava em câmera lenta. Eu estava conseguindo pensar perfeitamente. A feição tranquila de Jackson me fez sorrir de canto. A corrida o acalmava. Ele não fazia aquilo por hobby, e sim porque gostava, e estava nítido.
Acontece que, não existe limites que não possam ser superados. Podemos correr rápido ou devagar, mas só importa se estivermos satisfeitos. Cada meta é o começo de uma nova corrida. Ou seja; todo dia é um bom dia se você correr atrás do que você quer. Talvez seja por isso que Jackson goste tanto de correr. Se todas as corridas lhe mostrarem ou ensinarem algo novo, ele é realmente uma pessoa inteligente, principalmente de espírito.
O carro parou aos poucos, e não hesitei em sorrir para o garoto.
- Isso foi incrível! - me manifestei animada, e Jackson entreabriu os lábios, pronto para dizer algo, mas não permiti - Sério, foi muito bom! Agora eu entendo o porque você corre e... Caraca, é incrível mesmo! - terminei de tagarelar ao perceber seu olhar analítico sobre mim. Será que eu falo demais? Imagina.
- Mais uma missão cumprida. - Jackson expôs seu bom humor novamente, saindo do carro, e não demorei a fazer o mesmo.
Estava tudo indo bem. Bem demais. Eu tenho amigos maravilhosos e disso não tenho dúvidas, mas Jackson me tratar tão bem assim a troco de nada e do nada começou a se tornar estranho. Digo, por que uma pessoa como ele gostaria de ser amigo de alguém como eu? Não que eu esteja me diminuindo, mas a fama de mala sem alça, porém gostosão, capitão do time de futebol e heartbreaker do Jackson é grande.
- Por que você está sendo tão legal comigo? - me encostei no carro e cruzei os braços, chamando a atenção do garoto - Eu nunca te vi assim com nenhuma menina, então não tem como não estranhar. - senti minhas bochechas queimarem, e comecei a mexer no cabelo em disfarce. A expressão de surpresa e confusão de Tuck se desfez aos poucos, pronto para responder.
- Eu não sei. Digamos que eu provei em ser legal e acabei gostando. Vamos? - estendeu a mão para mim, e demorei em pegá-la. Sua resposta meia boca foi o suficiente para a minha curiosidade sumir. Jackson não fazia o tipo mentiroso. Sério. Acho que em meio a tanta mentira e segredo que rolou entre o pessoal, acabei ficando expert em detectar um falsinho.
Andamos novamente até a entrada do lugar, onde simplesmente entraríamos no carro e iríamos embora, mas tinha algo nos impedindo. Algo não, alguém. Na verdade, mais do que alguém, e sim, três homens.
- Eu estou ficando velho mesmo! Olha só o seu tamanho! - o homem do meio quebrou o silêncio que havia se instalado. Jackson estava incrédulo, mas com uma expressão nada boa.
- Por que você está aqui? - gritou em resposta, em um tom nada amigável. Uma pitada de pânico estava se espalhando pelo meu corpo, e não demorou muito tempo para que ele tomasse conta de mim. Agarrei no braço de Jackson com força, e o garoto tentou me tranquilizar com o olhar, mas não adiantou muito.
- Eu vim ver o meu filho, oras! Por que eu viria aqui se não fosse por isso? - o homem gargalhou fraco, dizendo aquilo como se fosse óbvio.
- Você sumiu e ficou maluco, né? Mas me deixe refrescar sua memória: é seu filho, não eu. Agora se sinta à vontade para dar meia volta e vazar daqui. - Jackson cuspiu as palavras com desdém e impaciência.
AI MEU DEUS.
Estávamos de frente com o pai de !
Me encolhi atrás do corpo de Jackson, que nem mesmo estava entendendo todo o meu medo.
- Oh, é verdade! Eu me esqueço que sua mamãe nunca te contou a verdade. Me perdoe por isso, filho. - o homem verbalizava com uma frieza sem tamanho, seu falso bom humor nem mesmo conseguia disfarçar a falta de sentimentos em suas falas.
Eu estava torcendo mentalmente para aquilo tudo não passar de uma brincadeira de mal gosto, mesmo sabendo que aquilo seria improvável. Depois do que ele fez com a família do meu amigo, e o que fez com , as chances dele blefar daquela maneira eram mínimas. E o pior de tudo é que Jackson não fazia ideia!
- Que porra você está falando, Richard? Você sumiu por anos e agora chega aqui falando esse monte de merda com qual objetivo? Vai pro inferno! - Jackson gritava enfurecido, sem paciência para aqueles joguinhos.
Os outros dois homens que estavam acompanhando Richard ameaçaram a se aproximar, e me agarrei no corpo de Jackson ainda mais. Só de lembrar o que Richard havia feito com minhas pernas já bambeavam, e eu nem conseguia imaginar o que aqueles homens eram capazes de fazer. Era um monstro com ajudantes, e para ajudar uma pessoa daquela, deviam ser piores que o próprio Richard.
- Eu vou ser bem claro com você, seu playboyzinho de merda. O sangue que corre nas suas veias é o mesmo que corre nas minhas. Eu sou o seu pai! Eu que te fiz! Mas é claro que sua mãe nunca iria contar isso. Por que ela perderia um sobrenome tão valioso, não é? - respondeu com um grito raivoso, mas sem tirar aquele sorrisinho cínico do rosto. Eu estava o xingando mentalmente, e me faltavam palavrões para expressar o monstro que Richard realmente era, mas eu não podia pensar naquilo. Eu precisava fazer algo, ou pelo menos tentar.
- Jackson, por favor, vamos sair daqui! Eu tenho certeza que quanto mais você ouvi-lo, mais vai ser pior. Por favor, vamos embora! - sussurrei no ouvido do rapaz, que me ouviu com atenção, mas não tirou os olhos de Richard, que estava prestando atenção atentamente em nós dois.
- Eu não vim aqui para brigar, Jackson. Só vim te contar a grande verdade sobre a porcaria da sua vida, e com isso, me despeço. - Richard sorriu descontraído. Sua feição tranquila estava acabando comigo. Aquele olhar cínico, como se não tivesse feito nada de mais, me incomodava de maneira absurda. Ele deu as costas, pronto para ir embora, mas Jackson insistiu em dar passos longos até o homem, e antes mesmo que ele pudesse chegar perto demais, segurei em seu braço com uma força que eu nem tinha noção que tinha.
- Você acha que pode simplesmente ir embora assim? - Jackson berrou furioso, tentando se todos os jeitos, fazer minhas mãos soltarem seu braço. Minhas unhas estavam cravadas em sua pele e eu só havia percebido quando o garoto demonstrou estar com dor.
- E você acha mesmo que pode vir atrás de mim? - Richard soltou uma risada alta, porém sem humor. Deu um olhar rápido e significativo para os capangas, que no mesmo instante, tiraram armas de suas cinturas, porém deixando-as abaixadas. Senti minhas pernas tremerem, e até mesmo perdi a noção do que estava acontecendo por alguns segundos. Jackson me abraçou de maneira protetora, encostando meu rosto em seu peito, de maneira que eu não pudesse mais ver o que estava acontecendo. Pude ouvir os passos dos três homens para fora dali, portas de carro batendo, e em seguida, carros sendo arrancados com pressa.
Eu não entendo muito disso, mas já ouvi relatos. Às vezes, quando algo é descoberto, ou quando algo acontece fisicamente conosco, entramos em choque. Jackson havia acabado de descobrir algo grande sobre sua vida. Algo gigante. Algo que muda tudo. Bem... Ele não estava em choque. Muito pelo contrário.
O garoto correu para seu carro, e eu nem mesmo pensei em não entrar também. A velocidade alta me deu um leve pânico, mas não tanto quanto o olhar furioso que estava estampado no rosto de Jackson Tuck.
Não demorou para chegarmos em uma casa gigantesca, onde deduzi ser sua casa. Praticamente pulei para fora do carro, acompanhando o ritmo acelerado do rapaz.
- Olha só, que maravilha! - Jackson parou bruscamente ao perceber que o carro de estava ali, em um dos lugares reservados na grande garagem. Droga!
- Ei, você precisa ter calma! Eu sei que é praticamente impossível, mas você nem sabe se essa história é verdade! - me apressei até parar em sua frente, tentando, mesmo sabendo que seria impossível, fazê-lo pensar claramente.
- Só tem um jeito de saber, . - respondeu ríspido, me olhando com certa insegurança, medo, e muita, mas muita raiva. Por alguns segundos, me senti afundar naqueles olhos que no momento pareciam dois poços vazios. O garoto finalmente deu um suspiro e entrou em casa transbordando fúria.
- SERÁ QUE ALGUÉM PODE ME EXPLICAR QUE MERDA ACABOU DE ACONTECER? - Jackson adentrou a cozinha aos berros, surpreendendo a todos que estavam ali. Dei um olhar rápido em , que arregalou os olhos ao me ver.
- Ei mocinho, o que é isso? - uma mulher alta, bem trajada, e extremamente bem arrumada caminhou com pressa até o rapaz, e deduzi rápido que aquela era sua mãe. A mulher colocou as mãos na cintura, mostrando indignação.
- ALGUÉM PODE ME EXPLICAR PORQUE O PAI DESSE GAROTO - Jackson pousou seu olhar furioso sobre , apontando para ele ao mesmo tempo - VEIO ATRÁS DE MIM, DIZENDO QUE É MEU PAI??? - finalizou com um grito ainda mais raivoso.
Incrédulos. Todos nós estávamos incrédulos. Meu coração poderia sair pela boca a qualquer instante. Sophia estava ao lado do irmão, e no momento em que Jackson berrou aquela bomba, a garotinha derrubou o copo de suco que estava em suas mãos, o quebrando em incontáveis pedaços.
Eu precisava ser racional por quem não estava sendo. Não pensei duas vezes antes de correr até a garotinha, a puxando pela mão para fora dali. Chegamos até a sala, onde o barulho quase não era audível.
- O que está acontecendo, ? - a voz confusa e trêmula da pequena foi como uma facada em meu peito. A pequena vida de Sophia já havia sido tão complicada, e ver tudo se complicar ainda mais, fazia meu coração doer de maneira incontrolável.
- Olha bebê, eu queria saber o que está acontecendo, mas a verdade é que eu também não sei. Mas vamos fazer um combinado, ok? - me abaixei aos poucos, ficando do tamanho da garotinha - Se você descobrir, me conta, e se eu descobrir, te conto. Fechado? - me esforcei ao máximo para dar um belo sorriso. Dei um beijo forte na testa da garotinha e a abracei, como se aquele abraço fosse a proteger de toda aquela loucura. E Deus... Como eu queria que meu abraço fosse capaz de fazer tal coisa.
Às vezes, coisas sobre o passado muda tudo sobre o presente. Merda... Por que tanta coisa ruim está acontecendo com meus amigos?

Capítulo 26


''Na vida, apenas uma coisa é certa, além da morte e dos impostos: não importa o quanto você tente, não importa se são boas suas intenções, você cometerá erros. Você irá machucar pessoas. E também irá se machucar."


's POV
A vida de ninguém é repleta de momentos perfeitos. Perfeição nem mesmo existe. Mas claro, todos nós esperamos ter uma vida que se aproxime da perfeição.
Bem... Eu achava que esperava. Agora, eu só consigo esperar desgraça, desgraça, e mais um pouco de desgraça. É só o que eu ando recebendo há anos. Não importa o esforço que eu faça, nada muda.
- Jackson, será que você pode nos explicar que baixaria é essa? - Cooper desceu as escadas às pressas, parando em frente ao filho, cruzando os braços e esperando uma resposta.
- Richard dizendo que é meu verdadeiro pai aconteceu! Que porra de história é essa? - Jackson gritou em resposta.
A vida consegue ser uma grande merda às vezes. Bem na hora que você pensa que está tudo resolvido, em que você finalmente começa a pensar que as coisas podem ser diferentes, sente como se soubesse a direção em que está seguindo, tudo muda. Absolutamente tudo. E então você se perde novamente. Todos esses anos minha vida se resumiu em uma grande loucura, e pelo jeito, ainda tem muito por vir.
Os olhares confusos entre todos na sala se intercalavam.
- Jackson, o que aconteceu? Eu quero que você me explique com calma. - minha mãe se aproximou do garoto aos poucos, com um cuidado extremo. Seu olhar já magoado podia ser visto há quilômetros de distância. Merda. Outra vez.
- Eu estava na... - Jackson se calou no mesmo instante, me olhando como se estivesse pedindo ajuda, e foi aí que me toquei. Ele foi para onde não devia, porém, não era hora para esconder o jogo. Tudo precisava ser esclarecido.
- Onde é você estava? - Cooper perguntou com um olhar de advertência. Ele sabia.
- Eu estava na Opper e...
-Eu não acredito que você estava naquela merda de novo! O que foi que eu te falei? - Cooper berrou, fazendo o filho dar alguns passos pra trás. Seu olhar enfurecido piorou mil vezes.
É, estava tudo definitivamente fodido.
- Deixa ele falar! - minha mãe gritou, surpreendendo a todos.
- Eu estava na Opper e ele apareceu. Disse que era meu pai e... - Jackson estreitou os olhos de uma maneira entre irritado e magoado, respirando fundo antes de continuar - E o pior é que ele não parecia estar brincando. - ergueu seu corpo ao extremo, se virando até encarar sua mãe.
Julie parecia um fantasma. Aparentava estar sem chão, e sua demora para se manifestar estava piorando a situação. O silêncio avassalador estava corroendo nossos pensamentos e nossa vontade de sair correndo de toda a merda que estava por vir.
- Isso não passa de uma mentira! Você não pode acreditar nessa história ridícula, Jackson! - Cooper quebrou o silêncio, revirando os olhos inúmeras vezes, mas eu sentia o cheiro do seu nervosismo. Ele provavelmente estava com vontade de correr até Richard nem que fosse ao quinto dos infernos e acabar com a sua raça. Mexer com seu filho havia sido o fim da linha para ele.
Então, silêncio.
- Julie, por que você não está falando nada? - minha mãe se aproximava da mesma aos poucos, até ficar completamente em frente a mulher, perguntando a dúvida que provavelmente estava rondando na cabeça de todos ali.
- Eu... É... Elena, por fav... - a mulher tropeçou em suas próprias palavras, sendo interrompida antes mesmo de tentar formar uma frase.
- Essa história é verdade, não é? Jackson é filho de Richard? - o tom intimidador e frio de minha mãe fez com que Julie jogasse a cabeça pra trás, dando um longo suspiro. Seus olhos estavam marejados.
- Elena, você precisa me esc... - Julie foi interrompida por um tapa na cara muito bem dado, e ainda assim, não foi o suficiente para fazer ninguém se mexer.
Meu coração estava... Deus, eu nem mesmo sabia do meu próprio estado. Minha mente estava mais bagunçada do que nunca. Isso era tudo que eu não precisava.
- Não perca seu tempo tentando explicar que você não é uma vagabunda traidora, porque você é, e você sabe disso. - as ultimas palavras da minha mãe antes de se afastar e ir em direção à porta fizeram Julie desabar no choro. O olhar indecifrável de Cooper e o desespero de Jackson fizeram meu coração... Droga, deixa meu coração pra lá.
Corri até a sala, onde estava com Sophia, num estado confuso e triste. A pequena me abraçou no mesmo instante em que me viu, enquanto me olhava apreensiva.
- Se você quiser, ela pode dormir lá em casa. - tomou coragem para dizer algo, e dava pra perceber seu medo de dizer algo errado ou impróprio para o momento. Anjos definitivamente existem, e tinha um bem na minha frente.
- O que você acha, Soph? Quer dormir na casa da ? Se eu fosse você, ia sim, porque lá sempre tem comida gostosa, você sabe. - despachei todo rastro de raiva ou inquietação apenas para convencer minha irmã a aceitar o convite mais rápido. Auto controle é uma benção, mesmo que em sempre eu o tenha.
Seguimos para fora dali rapidamente, onde minha mãe se encontrava ao lado do carro, com as mãos no rosto. O caminho foi extremamente silencioso até Sophia comemorar que iria dormir na casa de . Minha mãe nem mesmo reclamou, ela sabia que precisava de um tempo sozinha, e também para conversarmos sobre o ocorrido.
O lado bom de Sophia ser pequena é que ela não precisa ser envolvida em toda essa merda. Ainda podemos a proteger de tudo isso.
Passamos em casa para pegarmos algumas roupas para minha irmã, e insistiu em ter a responsabilidade de levar a garotinha para a escola, e eu nem mesmo tentei negar. A situação estava feia, e eu nem sabia por onde começar a enfrentar tudo aquilo.
A primeira coisa que minha mãe fez ao entrar em casa foi fazer um chá. Isso mesmo, um chá. Eu observei cada passo que ela deu, até a mesma se sentar e apreciar sua bebida. Aparentemente, ela estava ótima, normal, e feliz, mas por dentro, eu nem conseguia imaginar.
- Uma vez eu li que em caso de ansiedade, pânico, tensão ou desespero, tomar uma bebida quente e prestar atenção no sabor e no cheiro, te ajuda a se controlar. - se manifestou com a voz branda, como se nem estivesse ali. Sua mente estava longe.
- Sem rodeios. O que você vai fazer? - me desencostei da parede e sentei ao seu lado, indo direto ao ponto. Se tem algo que sempre fomos, foi ser direto um com o outro. Isso eu definitivamente puxei da minha mãe.
- Amanhã sairei pra procurar um novo emprego. Não posso ficar em casa remoendo essa história. Eu não quero voltar a ser o que eu era, de maneira alguma! - juntou as sobrancelhas e balançou negativamente a cabeça, se incomodando só de pensar na possibilidade de tudo voltar a ser a merda de antes - Sabe, passei tanto tempo fazendo perguntas absurdas pra mim mesma, do tipo "o que eu fiz de errado para Richard me deixar?" e então eu descobri que nunca fiz nada de errado. Me levou um tempo danado pra descobrir isso, mas eu consegui. Também descobri, que não importa você dar o seu melhor pra pessoa errada, porque nunca será o suficiente pra ela. Richard nunca foi um verdadeiro homem, então ele decidiu procurar coisas melhores, e aí ele encontrou Julie. Não vou mentir, está doendo muito, mas eu me recuso sofrer por isso. Pra ser sincera, isso só me prova que tudo tem seu motivo. Tudo isso aconteceu pra eu poder enxergar que posso sim, ser feliz sem as coisas e pessoas que eu achei que precisava, porque a verdade é que eu já tenho tudo o que preciso, você e sua irmã! - a voz serena e cheia de orgulho da minha mãe me fez sentir coisas que eu nem sabia que eram possíveis de se sentir. Seu olhar sincero e finalmente livre era de longe, uma das coisas mais lindas que eu já vi nessa vida.
- Estou orgulhoso da grande mulher que você se tornou, mãe. Eu nem sei o que dizer. - eu podia jurar que tinha água nos meus olhos, mas foi engano. O sorriso da minha mãe me fez explodir de orgulho. Eu realmente não esperava por aquilo.
- Eu lutei pra ser a mulher que sou agora. Não foi fácil e nem rápido, mas agora não tem nada nem ninguém nesse mundo que me desmorone novamente.
- Eu esperei tanto por isso! - me levantei animado, puxando minha mãe para um abraço bem apertado.
- Você aprendeu a abraçar? Que gracinha, filho! - sua gargalhada tomou conta do local, e não pude deixar de acompanhá-la. As coisas realmente mudam.
- Precisei de algumas aulas pra isso. - dei os ombros de maneira divertida, mas minha mãe continuou rindo, e rindo, e rindo mais... - O que foi?
- Você... Voc... Você e Jackson são meio irmãos! Dá pra acreditar nisso? Vocês brigavam até pelo ar que respiravam, e agora descobrem que são meio irmãos! Isso é tão engraçado! - pousou uma de suas mãos em sua barriga. Sua risada cessou aos poucos, e por mais que eu tenho soltado uma risada rápida sobre o que ela considerava engraçado, eu estava enfurecido.
- Acho que esse chá não te fez bem, senhorita. - falei em um tom bem humorado, ainda tentando esconder minha raiva. Merda. - E eu acho que preciso dormir. Descobri que fui chifrada, que você tem um meio irmão, e ainda por cima preciso de um novo emprego. Francamente viu, espero que meu lugar no céu já esteja guardado porque eu mereço. - minha mãe resmungou em uma falsa frustração. Colocou sua xícara na pia e deu um beijo em meu braço, desejando boa noite e subindo as escadas, me deixando finalmente sozinho.
Como é que as coisas chegaram a esse ponto? Como é que eu consigo acompanhar tudo isso, sendo que a cada dia que passa tudo piora?
Richard é um ser humano desprezível e disso todo mundo sabe, e o acontecimento dessa noite foi definitivamente a gota d'água. Meus dias são resumidos em pensar no momento em que eu finalmente vou poder matá-lo e acabar com toda essa palhaçada. Ele já machucou gente demais.

- , relaxa. Sophia dormiu muito bem e a deixamos na escola sem problema nenhum. - repetiu a mesma coisa que havia dito poucos segundos antes, mas ainda não estava me convencendo. A última coisa que eu queria era que minha irmã se sentisse mal com toda essa confusão que ela nem mesmo sabia do que se tratava.
- Ok, se você está dizendo. - decidi desistir de encher o saco da coitada apenas para fazer com que eu me sentisse melhor - Agora, falando mais sério ainda, você não pode contar pra ninguém sobre o que aconteceu ontem, tudo bem? - minha voz saiu num sussurro por cuidado. O corredor estava movimentado, mas nenhum de nossos amigos estava por perto.
- Você não aprende mesmo, né? - cruzou os braços e rolou os olhos - Você sabe que guardar segredos piora tudo.
- Eu não posso simplesmente revelar que Jackson Tuck é meu meio irmão.
- E por que não? Todos já sabem da sua história, oras! - estava indignada, balançando a cabeça negativamente para mim.
- Exatamente as duas pessoas que eu estava procurando! - Jackson disse em tom alto, não o suficiente para chamar a atenção de todos, e sim, só a minha e de . Minha vontade de lidar com ele era zero.
- , acho que preciso deixar claro qu...
- Que você não quer que ninguém descubra que temos esse grau de parentesco infeliz. Eu já sei. - deduzi rapidamente o final de sua frase, nem mesmo o olhando. Minha cabeça estava cheia demais para lidar com Tuck preocupado em fazer as pessoas não descobrirem aquilo para ele não perder a graciosa popularidade.
- Não. Eu ia dizer que preciso deixar claro que eu quero uma explicação pra tudo isso. Richard está de volta depois de todos esses anos, e aqueles homens que estavam com ele não eram simples coleguinhas. Eu preciso saber de tudo. - a voz firme e pretensiosa de Jackson me deixou surpreso e um tanto quando nervoso. Por que as pessoas gostam de se meter onde não devem?
- Você sabe que eu não sou obrigado a te dar explicação nenhuma, né? - cerrei os olhos e cruzei os braços de modo debochado. Essa é a melhor arma pra afastar alguém. Ou pelo menos, era, ou simplesmente não funcionava com Jackson.
- Olha , eu nunca te dei motivos pra gostar de mim, mas acho que agora é uma boa hora pra agirmos como verdadeiros homens. Eu não brinco, eu não corro e eu não fujo. Eu quero saber da verdade, porque eu sei que tem algo por trás de toda essa história. - Tuck me lançou um olhar irritado, mas não se deixou levar. Sua irritação acabou me irritando, e antes mesmo que eu falasse mais do que devia, ou começasse alguma confusão, parti para o meu outro método para afastar alguém: sendo um idiota.
- Cala essa boca. Você não sabe nem um terço e quer rezar a missa inteira. - fui o mais irônico possível, torcendo para Tuck perder a paciência e me xingar de qualquer coisa, porém nada disso aconteceu. Ele simplesmente deu um longo suspiro e sussurrou algo para .
- Pare de agir feito um idiota. - falou baixo, de modo que só eu conseguisse ouvir, antes de ser puxada por Tuck para longe dali.
Foi mais fácil do que eu imaginei.

O último sinal do dia foi a melhor coisa que eu poderia ter ouvido. Passos longos para fora da escola foram dados, até que fui obrigado a diminuí-los ao ver encostada em meu carro, de um jeito incrivelmente lindo. Bem coisa de filme mesmo. O vento batendo em seu cabelo e o jeito como ela observava as coisas ao redor, a deixaram ainda mais linda. Voltei a realidade mesmo não querendo.
- O que eu fiz dessa vez? - joguei a cabeça pra trás, respirando fundo e pensando que o único motivo que havia levado até ali, fosse uma bronca.
- Você esteve desligado do mundo durante o dia todo, e então eu pensei em vir aqui te convidar pra tomar um sorvete ou algo assim, e dizer que eu estou prontíssima pra ouvir sua explicação. Digo, eu realmente preciso saber, e nós precisamos parar de regredir, você não acha? - estava diferente. Estava firme. Seu pedido saiu naturalmente e sem sinal de medo. Ela estava altamente determinada.
A primeira coisa que se passou pela minha cabeça foi que eu já tinha combinado que ia à casa do Dan contar as novas bombas. Claro que eu não deixaria de ficar com por isso, mas agora, mais do que nunca, eu precisava fazer de tudo para pegar Richard.
E então, observei seu rosto. Eu não estava com um pingo de vontade de conversar sobre aquilo. Não por má vontade, e sim, por medo da sua reação se descobrisse de toda a história. A história por completo, inclusive, da minha vontade de matar meu próprio pai.
Eu não estava disposto a arriscar perde-la por isso, por mais que eu pudesse perde-la por outras coisas.
Talvez, o melhor era realmente deixá-la longe de mim.
Talvez.
- Hoje não posso. - respondi indiferente, mesmo não querendo. rolou os olhos e desencostou do carro, pronta para dar o fora dali, mas fui mais rápido. Entrelacei meus braços em sua cintura, a trazendo para perto. Eu simplesmente precisava ter seu corpo perto do meu, pelo menos por alguns segundos.
A verdade é que cada manhã que ela pensa que eu estou com a cabeça em outro mundo, ou evitando algo ou alguém, boa parte de mim deseja estar ao seu lado. Deseja estar te tocando, te beijando, e por aí vai. Uma pena ela não saber disso, e um alívio também.
- Você não pode hoje, já entendi. - tentou manter o rosto longe do meu, mas estava sendo uma tarefa difícil para ambos.
- Talvez você tenha entendido errado. - encostei nossas testas, sentindo seu hálito quente batendo em meu rosto. Meus movimentos estavam sendo cuidadosamente calculados. Nossas bocas estavam quase se encostando, até que ela se afastou de vez.
- Por que você faz isso? Estou farta desses joguinhos. - resmungou alto, se soltando dos meus braços. Deu alguns passos pra trás, mantendo uma boa distância, e respirando fundo até voltar a pensar com clareza.
- , eu estou tentando, ok? Sei que não parece, mas eu estou. É complicado e você sabe.
- Eu só estou pedindo que você me conte o que estava disposto a me dizer. Você escondeu por tanto tempo que resultou no seu pai me... Eu nem sei como eu posso chamar aquilo. - a garota balançou a cabeça várias vezes, como se tivesse espantando as memórias ruins daquele dia. Meu coração se apertou ao vê-la naquele estado traumático por algo que Richard havia feito.
Merda. Tudo de ruim tem esse desgraçado no meio.
- E eu vou te contar, só não hoje, tudo bem? - me reaproximei da garota sem receio, dando um beijo estalado em sua testa.
- Precisamos evoluir, . É só o que eu estou pedindo. - seus braços se entrelaçaram em meu pescoço, e os meus voltaram para sua cintura, a envolvendo em um abraço apertado.
E são em momentos como esse que eu me lembro que é impossível tentar ficar longe dessa garota. Ao mesmo tempo em que eu quero, não consigo.
's POV end

's POV
- Você está bem? - Jackson parou seus passos, olhando diretamente em meus olhos.
- Eu que deveria estar fazendo essa pergunta. Quem descobriu que tem um meio irmão foi você. - arrisquei fazer graça mesmo tendo ciência de que o assunto era extremamente sério. Pra minha sorte, Jackson riu fraco, aceitando aquilo numa boa.
Paramos em frente à saída da escola, onde várias pessoas passavam por nós com pressa.
- Eu nem sei como estou. Ainda não acredito que minha mãe teve a coragem de trair meu pai com Richard . Me pergunto como ela conseguiu esconder isso de nós por todos esses anos. - Jackson interrompeu seu próprio desabafo com uma expressão enojada. Seu olhar claramente decepcionado podia quebrar o coração de qualquer pessoa que o visse.
- Eu nem consigo imaginar o quanto você deve estar confuso com toda essa situação. Sei que está chateado com a sua mãe e isso não vai passar da noite pro dia, mas ela continua sendo sua mãe. - falei vaciladamente, quase me embolando em minhas próprias palavras. Ora, era uma situação extremamente complicada e aposto que quase ninguém sabe o que dizer em momentos como esse.
- Não quero conversar com ela tão cedo. - bufou, rolando os olhos - Podíamos sair hoje, o que você acha? - seu olhar mudou em questão de segundos, de chateado e raivoso para esperançoso e animado. Estava aceso feito uma árvore de natal.
- Bem, você já me mostrou, já me fez sentir, e já te acompanhei descobrindo um super babado da sua vida. O que será que teremos hoje? - coloquei a mão no queixo em forma pensativa, fazendo o garoto rir. Vê-lo alegre e sorrindo deveria ser filmado e distribuído para todos nesse mundinho, apenas para apreciarem seu lindo sorriso.
- Acho que é melhor não pesarmos nisso. Te pego ás nove e meia. - se despediu com um beijo estalado em meu rosto e um sorriso que poderia me quebrar as pernas.

***


A pergunta é: precisamos mesmo passar por perrengues para aprendermos a ser um ser humano melhor?
Eu não faço a mínima ideia.
O pior que me aconteceu foi ter sido ameaçada de morte por um garoto que provavelmente não tinha esperança na vida e no mundo. E então tem e . As duas pessoas mais lascadas e fortes que eu conheço. Eles ainda não sabem disso, mas vão saber.
Eu não passei por muito nessa vida, e talvez o meu jeito de tentar resolver as coisas não seja o melhor, mas eu aprendi a lidar com essa loucura. Claro que tem muito a se aprender, mas fico feliz por ter chegado onde cheguei, mesmo sem ter sofrido tanto, ou desmerecido o sofrimento de outras pessoas. Digamos que, eu cresci sozinha. Consegui distinguir o que é certo e o que é errado e enfrentei o mundo do meu jeito.
Deus, eu fiz isso tudo!
Acho que a compreensibilidade é um bem valioso. Se você compreender, vai automaticamente aprender a lidar. Você pode soltar ou agarrar.
Até agora, não me arrependo de nada que eu agarrei.
A vida é doce se conseguirmos compreendê-la, se conseguirmos entender que tudo tem seu motivo e propósito.
Meu pensamento foi interrompido pela segunda vez. A primeira foi meus pais chegando do trabalho mais cedo e saindo às pressas para um jantar de negócios, e a segunda, ninguém menos que .
- Eu estava tendo o melhor pensamento reflexivo da minha vida nesses 18 anos e você estragou. Parabéns, viu? Muito obrigada. - cruzei os braços e resmunguei ironicamente. mantinha um olhar debochado e divertido no rosto.
- Venho aqui na maior boa vontade, quase duas horas antes do horário de pegar Sophia, e você ainda ousa reclamar? É muita ingratidão! - o rapaz rolou os olhos numa falsa indignação. Seu bom humor me pegou de surpresa. Conhecendo ele do jeito que é, depois de toda a revelação que ouvimos um dia atrás, eu imaginei que ele fosse ficar de cara fechada pelo resto do ano.
- Você interrompe meu pensamento, aparece nos meus aposentos sem hora marcada, e ainda por cima não trouxe nem um docinho pra me agradar. Você é péssimo, . - numerei com os dedos cada vacilo que o rapaz tinha dado ao aparecer ali. A parte do docinho foi uma ótima estratégia. Meu estômago estava roncando.
- Ah, vai á merda. - abandonou a discussão que provavelmente duraria mais alguns minutos e entrou de uma vez em minha casa.
- Sophia está dormindo. Ela teve uma gincana na escola e a bateria dela finalmente descarregou. Isso é tão raro de acontecer. - finalizei pensativa, me perguntando de onde das crianças tiram tanta energia. Sério, chega a ser assustador.
- Fala a verdade, , você dopou minha irmã pra poder ter o seu pensamento reflexivo. Pode falar, eu te conheço. - o bom humor na voz do rapaz estava começando a me deixar mais assustada do que o fato de crianças terem uma energia inacabável.
- Por que você está tão brincalhão? Você descobriu que Jackson Tuck é seu meio irmão e está desse jeito? - não me segurei e perguntei de uma vez.
- A vida é uma brincadeira, . Jackson Tuck é meu meio irmão. Da pra acreditar nisso? Parece até piada, então estou entrando no clima. - o rapaz nem mesmo tentou disfarçar o desdém em sua voz. Por trás de todo aquele bom humor, estava escondido uma raiva e indignação absurda. Eu podia sentir.
- Como sua mãe está? - foi a primeira coisa que apareceu em minha mente. Por sorte, era uma ótima pergunta, e eu realmente queria saber da resposta.
- Por incrível que pareça, ela está bem. Muito bem. - tombou a cabeça pro lado, estranhando a própria resposta. estava tão acostumado a ver a mãe pra baixo, que dizer o contrário se tornava esquisito para ele.
Ugh. Eu odeio ver pessoas acostumadas com coisas ruins.
- Isso é ótimo! Acho que ela aprendeu a lid... - eu estava pronta para compartilhar meu pensamento reflexivo que tivera minutos atrás, mas a campainha tocou. De novo.
Jackson.
Chorando.
Não era isso que eu esperava para o nosso encontro de hoje. A propósito, ele estava duas horas adiantado.
- Sabe o que é mais engraçado? Eu sempre fui considerado popular. Nunca passei um dia da minha vida sozinho. Hoje, você foi a única opção que eu tive. Eu não tenho mais ninguém, . - ele disparou, seu tom de voz trêmulo e choroso fez meu coração palpitar de um jeito péssimo.
Quando dizem que sorrisos e olhares são poderosos, não é mentira. São as duas coisas que não dá pra se fingir, por mais que você tente. Horas atrás, pude ver Jackson Tuck com o melhor dos sorrisos e com brilho nos olhos, mesmo em meio a toda confusão da noite passada. E então, eu o vejo assim, exatamente ao contrário. Dói. Ver um amigo nesse estado é ridiculamente doloroso.
- O que foi que aconteceu? - não perdi tempo e o envolvi em um abraço apertado, que estava sendo retribuído de maneira difícil. Era como se ele estivesse sem forças para nada.
- Ela está com câncer. Foi por isso que ela se reaproximou da Elena. Ela pretendia contar a verdade antes de morrer. - o choro quase inaudível porém sofrido de Jackson foi como um tapa em meu rosto. Meus braços o abraçavam o mais forte que podiam, mas não parecia ser o suficiente. Ele estava machucado, e infelizmente, nenhum abraço era capaz de curar sua dor.
- A sua mãe...? - não terminei a frase, recebendo um sinal positivo de sua cabeça, confirmando a desgraça da noite. Senti meu coração sendo amassado de maneira insuportável. Nossos braços foram se afrouxando aos poucos, até estarmos frente a frente. Eu não podia chorar. Não podia.
Puxei Jackson pela mão até ele entrar completamente em minha casa. estava com a expressão mais confusa, surpresa e triste que eu já havia visto. Limpou a garganta e finalmente abriu a boca após longos segundos de troca de olhares.
- Jackson, eu sinto muito.
- Eu também sinto. - Tuck respondeu com a voz distante. Enxugou todas as lágrimas que ainda estavam impregnadas em seu rosto com a manga da blusa e se sentou. Encarou o chão por alguns segundos, respirou fundo e jogou a cabeça pra trás como se estivesse buscando forças para dizer algo. E então, ele estava pronto - Ela descobriu quando estava no estágio 3 do câncer, e então, piorou. Ela desistiu do tratamento para não ficar tão debilitada e aproveitar os meses que a restam. Ela provavelmente tem quatro meses pela frente. Quatro. Tudo isso por culpa de um maldito câncer de pulmão. - e suas lágrimas desceram novamente - Ela não quis contar antes para não me deixar triste. Ela que está doente, e se preocupou comigo. Vocês tem noção do que é isso? - fungou, fechando os punhos e dando um grunhido de frustração - , ela pretendia contar pra sua mãe toda a verdade, mas antes, ela queria poder ajudá-la. Foi por isso que ela ofereceu um emprego a Elena. - Jackson pausou o olhar em , que permanecia confuso, surpreso e triste. Assim como o meu coração.
- As coisas vão se ajustar. Sua mãe não vai partir estando brigada com a minha, eu te prometo. - disse firme. Tão firme, mas tão frágil. Diante a tal situação, ele só queria se mostrar forte para não piorar o estado de Jackson.
- Ela... Ela vai morrer. Eu não tinha pra onde ir. Eu parei aqui. Não que isso seja uma coisa ruim, mas... Minha mãe vai morrer, e eu estou na casa de uma garota que eu conheci há pouco tempo, mas que conquistou minha confiança, e de brinde, veio junto. Sabe, que merda está acontecendo? - Jackson levantou, disparando a falar, sem pausa alguma. Seus passos agoniados de um lado para o outro pioravam a situação. Ele estava prestes a surtar.
- Jackson, presta atenção em mim - levantou rapidamente, parando em frente ao rapaz, que estava prestes a desabar. De novo - Sei que na sua mente deve estar ecoando a pergunta "o que eu vou fazer?", mas você precisa se recompor pra poder pensar com clareza. É, sua mãe vai morrer e isso é uma merda. A vida consegue ser bem filha da puta quando quer. Mas agora, respire fundo e pense em tudo que você já percorreu. Você não pode perder seu caminho agora, e nem o seu auto controle. Se recomponha por você e pela sua mãe, e faça esses quatro meses valerem mais do que quarenta anos. Você me entendeu bem? - exclamou tudo num tom de voz alto e autoritário, prendendo a total atenção de Jackson em si. Até então, ele estava relativamente calmo e recomposto.
E chorou novamente.
E o abraçou forte. O abraçou como um irmão.
Quando você é criança, tem medo do escuro e de dormir sozinho. Você acha que tem monstros debaixo da cama. Você cresce e os monstros são diferentes. Decepção, aflição, dor, solidão e arrependimento. E embora você seja mais velho e mais sábio, você ainda se vê com medo do escuro.
Mas, uma vez que enfrentamos os nossos monstros, os nossos medos e pedimos ajuda uns aos outros… A noite não é tão assustadora assim porque nós percebemos que não estamos totalmente sozinhos na escuridão.
E Jackson não está sozinho.

***


Ele faltou. Jackson Tuck nunca falta. Ele matava muita aula, mas faltar? Não.
Claro que os novos acontecimentos eram um tanto quanto confusos e desanimadores, mas estar sozinho em momentos difíceis como esse poderia ser tão ruim quanto. Jackson não merecia passar por tudo sozinho.
Pensei. E pensei de novo.
Eu não aguento.
Não perdi tempo e mandei algumas mensagens. Em plena 7 da manhã. Deus, por que eu simplesmente não consigo deixar uma pessoa lidar com algo do jeito dela?
E foram mensagens e mais mensagens até que eu recebi a que me deu um suspiro de alívio e ansiedade.
"Venha aqui pra casa depois da escola. Preciso de você."
Alívio por ele aparentemente não ter se fechado e decidido enfrentar essa barra sozinho. Ansiedade por... Eu preciso mesmo dizer? Bem, tudo o que eu mais quero é ajudar, mas a verdade é que eu não faço ideia de como fazer isso. E ele disse que precisa de mim.
Ok, ok, com certeza ele se referiu ao meu apoio, mas... Ai, chega de pensar.

- Ei mocinha, pra que tanta pressa? - me encarou de modo divertido após nossos corpos se esbarrarem. Eu nem mesmo estava prestando atenção por onde estava andando.
- O sinal tocou e eu preciso ir embora, oras. - abri meu armário com pressa, socando todas as minhas coisas ali de qualquer jeito e fechando rápido para nada cair.
- Mas hoje tem treino. - disse como se fosse óbvio a frase que eu estava torcendo para ninguém me lembrar que existia. O bendito treino.
- Mas eu preciso ir pra casa! - respondi à altura, mas não de um modo bacana. Saiu meio... grosseiro.
- Você não vai pra casa, eu te conheço! Você vai... - parou sua própria fala, provavelmente ligando os pontos em sua própria cabeça até chegar a uma resposta. - Você vai encontrar o Jackson?
- Sim. E tenho que ir rápido porque quando o treino acabar, Sophia vai pra minha casa, então, tchauzinho. - eu sabia que me livrar daquilo não seria fácil, mas pelo menos tentei. Meu braço foi puxado com delicadeza até eu me virar para novamente. Eu já sabia o que estava por vir.
- Aconteceu alguma coisa? Ele não veio hoje e...
- Não aconteceu nada. Eu realmente preciso ir, tchau . - dei as costas novamente com pressa para não correr o risco de ser puxada novamente. sempre consegue arrancar a verdade de mim, e ficar ali por mais tempo significava minha boca abrindo e contando coisas que não podiam ser contadas.
O vento fresco batendo em meu rosto estava sendo um tanto quanto agradável. Parei em frente à casa de Jackson, me preparando psicologicamente antes de entrar ali. Andei pelo jardim gigante até chegar a entrada. Respirei no mínimo, umas quinze vezes antes de tocar a campainha.
Quem atendeu foi, ninguém menos que a própria mãe do Jackson, que eu nem sabia o nome até saber que ela tinha câncer. Foi uma ótima apresentação do Jackson sobre a mãe, não?!
- Boa tarde. Jackson está? - fiz a pergunta mais estúpida que podia ter feito. É claro que ele estava. Senti minhas pernas bambas, e fiz de tudo para esconder meu nervosismo e minha vontade de abraçá-la e dizer que tudo ficaria bem.
- Boa tarde, meu bem. Me desculpe, mas você é a...?
- , mas pode me chamar de . Eu estudo com o Jackson. - fui rápida ao responder, especificando que não era uma total desconhecida e que seu filho não tinha me conhecido em um lugar qualquer.
- E você estava aqui no dia que... Você sabe. - Julie não escondeu seu desconforto, dando um sorrisinho sem graça. Sabíamos exatamente ao dia que ela estava se referindo, e nem ferrando que eu prolongaria o assunto sobre aquilo.
- Não precisamos falar sobre isso, afinal, nada daquilo diz respeito a minha pessoa.
- , meu filho nunca trás garotas para casa. - Julie cruzou os braços de maneira divertida, e eu me vi mais perdida que cego em tiroteiro. Eu não fazia ideia que rumo aquela conversa tomaria.
- Me desculpe, eu acho que não entendi o que você quis dizer. - minha voz raspar no fundo da garganta enquanto meu foco era não me atrapalhar em minhas próprias palavras.
- Ele te chamou aqui porque você é uma amiga. Ele não te chamaria se não fosse importante ou se não confiasse em você, e isso me leva a pensar que você sabe de toda a verdade. - suas palavras saíam suaves e calmas, mas com um toque de diversão. Eu estava encurralada. Não fazia ideia do que responder, aliás, o que dizer? "Sim, eu sei que a verdade é que você tem câncer e está morrendo."
- Eu acho que sim. - estreitei os olhos e tombei o pescoço, provavelmente parecendo uma imbecil.
E então ela riu.
E eu estava sem entender nada.
- Meu bem, eu tenho câncer e você não precisa ficar sem graça por isso. Fico feliz que Jackson tenha com quem contar. - ela abriu um sorriso que era impossível não sorrir junto. Jackson tinha os traços e o sorriso da mãe.
- Eu sinto mui...
- Oh querida, estou tão cansada de ouvir essa frase. - soltou uma gargalhada incrivelmente natural. Ela estava rindo da frase que o maldito câncer estava a fazendo escutar. Rindo.
- Mãe, será que... - pude observar Jackson descendo as escadas e parando de falar assim que me viu na porta junto com sua mãe - Mãe, você ainda não a convidou pra entrar? - lançou um olhar divertido misturado com uma falsa indignação.
- Oh meu Deus, me desculpe, ! - Julie abriu espaço para que eu passasse, fechando a porta rapidamente e caminhando comigo pela enorme sala.
- Estaremos lá em cima, mãe. Qualquer coisa é só gritar. - Jackson deu um beijo estalado no rosto da mãe e pegou em minha mão, me puxando até seu quarto.
Ele pegou na minha mão.
Para irmos até seu quarto.
Ai cacete.
Por incrível que pareça, estava tudo incrivelmente arrumado. O tom azul suave nas paredes ficava mais agradável com o sol fraco que batia ali. Respirei fundo, observando cada detalhe de seu quarto, até encontrar seus olhos azuis. Os olhos da mesma cor que os de .
Eu ainda preciso me acostumar com essa ideia.
- Fiquei preocupada com você. - depois de dar um longo suspiro, falei o que estava preso em minha garganta.
- Hmm... Obrigado?! Eu acho. - ele riu fraco, desviando o olhar por alguns segundos, mas voltando sua atenção para mim.
- Eu nem mesmo consigo imaginar o quão difícil está sendo toda essa loucura pra você. E eu sei que talvez seja estranho a ideia de você confiar em mim, que sou uma pessoa que você conhece há tão pouco tempo, mas acredite, eu realmente me preocupo com você. - me manifestei com a voz um tanto quanto nervosa, me sentindo afundar naqueles lindos olhos.
- Por alguns minutos eu tentei entender. Tentei entender porque você foi a única pessoa que eu considerei estar disponível para mim. Mas acho que eu nem quero descobrir, e sabe por quê? - Jackson arqueou uma sobrancelha e encostou-se à porta, numa pose incrivelmente... Sexy - Porque eu nunca havia sentido isso. Eu nunca havia tido uma pessoa como você, que com apenas algumas conversas, consegui me sentir totalmente confortável e aberto para dizer qualquer coisa. É estranho, , mas eu estou adorando ter você na minha vida. - finalizou com um sorrisinho de canto que fez com que eu abrisse o melhor dos meus sorrisos em retribuição. Caminhei até estarmos frente a frente e o abracei forte. Um abraço que mostrou o quão grata eu estava por, mesmo sem nem querer ou imaginar, estar em sua vida.
Gostamos de ter tudo planejado. Gostamos de saber o que vai acontecer em nossas vidas, mas agora, eu acho que o melhor é não saber. O melhor é se surpreender com coisas desse tipo.
- Eu estou feliz por isso, de verdade mesmo! Eu nem sei o que falar! - gargalhei sem graça, nos separando do abraço e pousando meus braços sobre seus ombros. Estávamos próximos. Muito.
- Acho que você pode me ajudar a convencer minha mãe que eu não quero viajar no fim de semana. Sério, ela está me dando nos nervos com essa história. - Jackson se afastou completamente com delicadeza e se sentou na cama, e por mais que aquilo tivesse me incomodado um pouquinho, tomei a liberdade para me sentar na poltrona que tinha ao meu lado, obtendo uma boa distância entre nós.
- Viagem em família?
- Não. Temos uma casa em Willmington e ela quer que eu vá para lá relaxar. Ela disse que toda essa história deve ter mexido muito comigo e bla bla bla. Da pra acreditar? Ela está morrendo e quer que eu tire um final de semana pra viajar! - resmungou indignado e bufou ao terminar, jogando seu corpo para trás e deitando sobre a cama de casal de maneira impaciente.
- Eu vou ser bem sincera. Talvez seja bom ter um final de semana tranquilo e longe de toda a tensão daqui. Ela só está pensando no seu bem. - o corpo de Jackson se ergueu novamente, com uma expressão nada boa. Mordi meu lábio inferior, pronta para ouvir sua defesa.
- Eu não posso sair daqui! E se algo acontecer com ela? E se ela... morrer? - as palavras saíram com tanta dificuldade, que quase não saíram. Jackson estava chocado por dizer aquilo em voz alta. Ele sabia que a mãe estava doente e que não tinha muito tempo, mas dizer aquilo parecia deixar tudo mais real.
- Nananinanão. Você não vai viver na base do "e se"! Se for assim, e se você for e nada acontecer com ela? E se ela continuar bem como está hoje? - me levantei, andando de um lado para o outro, analisando a situação rapidamente e formando uma bela argumentação em minha mente - Deu pra perceber que você não está conseguindo processar a informação de que sua mãe tem alguns meses de vida, e por mais que você queira estar aqui e fazer de tudo por ela, você vai precisar estar com a cabeça vazia e pronto para ajudá-la a enfrentar os próximos perrengues. E você claramente não está preparando. Agora se renda e aceite a viagem, Jackson Alek Tuck. - terminei com uma pose vencedora, como se estivesse certa de que ele aceitaria meu discurso sem retrucar.
- Como diabos você sabe meu nome inteiro? - de repente, tudo o que eu falei não valeu de nada e não havia prendido sua atenção. Ele apenas ficou intrigado em como eu sabia que existia um "Alek" no meio de seu nome.
- Seu bobinho, eu sou a ! Eu sei de tudo. - sorri triunfante, jogando o cabelo para o lado de maneira que demonstrasse que eu estava, de fato, me achando. Jackson gargalhou alto, e nem eu mesma me aguentei e ri junto da minha própria palhaçada.
- Você é uma mistura de imbecil com incrível, dona sabe-tudo!
- Ei, assim você me ofende! - coloquei os braços na cintura, mostrando minha indignação.
- Que tal irmos todos juntos? Eu posso convidar o pessoal e pronto, tudo certo! O que você acha? - Jackson arregalou os olhos em animação com a ideia que lhe atingiu.
- INCRÍVEL! Sério, toda vez que saímos pra acampar ou algo do tipo, é muito legal! Nunca te chamamos porque não íamos muito com a sua cara, mas agora... Meu bem, agora vai! - minha voz cheia de entusiasmo fez Jackson abrir o melhor sorriso que eu poderia ver no dia de hoje.
- Estou rendido, . Vamos todos para Willmington!
's POV end

- Eu não acredito que você ainda não parou de chorar. - adentrou em meu quarto pela terceira vez em menos de vinte minutos. Rindo.
- Eu não consigo parar! Eu quero que esse álbum vire uma pessoa pra gente se casar! - gargalhei em meio às lágrimas que desciam pelo meu rosto ao som de Heaven. Eu estava ouvindo o álbum novo do One Republic desde a hora que cheguei da escola e não consegui conter o choro.
- Se eu fosse você parava de chorar porque sua mãe está chegando. - ele gargalhou ainda mais alto e fechou a porta novamente.
Me levantei, ainda com a música tocando, e fui ao banheiro lavar meu rosto. Me encarei por alguns segundos, e dessa vez quem riu fui eu. Ri do fato de não estar chorando de tristeza e em como isso havia se tornado motivo de comemoração com direito a fogos se fosse possível.
Não demorou para minha mãe chegar e jantarmos as delícias da tia Márcia. Conversamos como se não tivesse nada de errado com a minha família e isso de certa forma foi bom, tirando o fato de que eu conhecia muito bem minha própria mãe. Sabe quando dizem "você tem a quer puxar"? Então. Minha mãe sempre preferiu esconder suas decepções e dores, e por lidarmos exatamente da mesma maneira quando acontece algo, é assim que eu descubro quando tem algo errado e ela não quer falar. É só observá-la. Ela deixa óbvio pra quem conseguir entender seus sinais.
- Eu lavo e você seca? - ergui o pano de prato para minha mãe, que apenas sorriu e o pegou. Apesar de tudo, fazíamos um bom time.
- Como estão as coisas? - quebrou o silêncio depois de alguns minutos.
- Estão normais. Já percebi que você está pra baixo, então não vamos prolongar isso aqui. O que aconteceu dessa vez? - questionei sem rodeios ou receio. Seu olhar quase surpreso se tornou triste e magoado. Como sempre.
- Eu quero esquecer, tudo bem? Sabemos que falar sobre isso é como reviver de novo, e não foi pra isso que eu vim aqui. - largou o pano de prato sobre a mesa e se encostou ali, cruzando os braços e batendo o pé inquietamente. Desliguei a torneira e sequei a mão rapidamente, fazendo exatamente a mesma pose que minha mãe, esperando que ela cedesse e falasse a verdade. Mas não falou.
- Mãe, nós duas estamos nisso. Você sabe que...
- Eu te trouxe uma coisa! - a frase pulou de sua boca de maneira tão natural que era impossível ela ter falado aquilo para me interromper de propósito. Minha mãe foi até sala, voltando em poucos segundos com sua bolsa em mãos, tirando uma caixinha de dentro. A abriu com cuidado, retirando dali uma pulseira prata com diversos passarinhos em volta - Filha, você é o meu passarinho. Você tem asas, mas ainda tem medo de voar. Não se engane, porque você está pronta. O mundo inteiro é seu. Você tem todas as cores dentro de si, e precisa deixar que elas transbordem. Precisa deixar que elas te pintem. Você precisa viver, mas viver sem medo. - se fosse possível meu coração derreter, ele derreteria. Senti uma enorme felicidade misturada com angústia ao ouvir as palavras de minha mãe. Ela confiava tanto em mim e tinha tanta fé que eu teria uma vida melhor que a sua, que todos os pensamentos negativos iam embora por alguns minutos. Seus olhos esperançosos, porém ainda magoados me encaravam. Ergui meu braço esquerdo, onde minha mãe prendeu a linda pulseira rapidamente. Claro que não podia faltar o nosso abraço. O melhor e mais seguro de todos.
- Mamãe, eu realmente amei, de verdade mesmo, mas... Tem algum motivo por trás disso? - afrouxei nosso abraço aos poucos, observando seu riso fraco ao ouvir o "mamãe" novamente depois anos, como se eu fosse uma criancinha novamente. Senti-me um pouco estúpida por acabar com um momento tão lindo e único, mas aquela dúvida estava me incomodando. Aquilo parecia uma... Despedida.
- Não, meu amor. Eu apenas quis te dar um presentinho, mas saiba que você merece muito mais, viu? - seu sorriso se abriu novamente, e mesmo que ainda restasse um tiquinho de dúvida em relação a tal ato, me entreguei ao momento, abraçando minha mãe novamente o mais forte que podia.
Família é, definitivamente, a coisa mais doida e valiosa que temos em nossas vidas. Ninguém escolhe, compra ou troca, e mesmo que nem tudo seja perfeito, temos alguém ao nosso lado que nos ama incondicionalmente. O amor que não tive de pai, tive de mãe. Passamos por tantas coisas juntas, e mesmo em meio à tanta discussão e discordâncias, permanecemos juntas. É um laço que não pode ser quebrado nem se quisermos.

***

- Tem tanto trabalho e lição pra semana que vem... Eu pago se alguém fizer pra mim! - anunciou animado, esperando que alguém realmente topasse a ideia, mas ninguém se manifestou.
Mais um intervalo normal, em um dia de escola normal.
parecia distante, e eu detestava isso. Detestava o fato de não saber o que se passava em sua mente, e detestava ainda mais o fato dele nem cogitar a ideia de me contar algo. Ele simplesmente guardava pra si mesmo e era feliz dessa maneira.
- Bom dia meus queridos. Gostaria de informar que Jackson Tuck tem um convite muito especial a fazer para todos vocês. - chegou saltitante e animada, imitando ridiculamente a voz dessas vendedoras de produtos rejuvenescedores que passa na TV. Jackson estava ao seu lado, não tão animado quanto ela, mas a alegria da garota parecia deixá-lo minimamente alegre também.
- Vocês topam passar o fim de semana em Willmington? - Tuck perguntou de uma vez, sem nem dar um "oi" antes. Mas pra ser sincera, esse tipo de gente é o meu favorito.
- Como assim? E ficar aonde? - Chloe, como sempre, a primeira a fazer perguntas.
- Minha família tem uma casa lá, e tem espaço o suficiente para todos nós. Pensei que seria legal chamar vocês porque... eu... não queria ir sozinho. - Jackson foi abaixando o tom de voz a cada palavra que dizia, como se aquilo fosse motivo de vergonha ou algo similar. Ao contrário do que ele pensava, aquilo tinha sido incrivelmente adorável. O jeito que ele estava se entrosando com o pessoal estava me agradando muito.
- Vocês sabem muito bem que eu topo até ir pro inferno. - disse animado, com um olhar divertido que fazia qualquer um rir. Não tem tempo ruim pra esse garoto.
Claro que todos toparam, menos . Digo, ele nem mesmo se manifestou, mas como a maioria concordou, nem deram importância pela falta de resposta do mesmo.
Eu sabia muito bem o que causava seu silêncio. O famoso ciúmes. Não tinha como negar.
O sinal bateu e a tristeza também. Fomos até nossos armários pegar o material da aula seguinte, e mesmo não tendo o armário perto ao de , não consegui evitar observá-lo por alguns segundos. Sua expressão tensa só tinha uma explicação: algo estava o incomodando.
O corredor esvaziava cada vez mais, até que sobrou... Nós. Encostei-me no armário e não disfarcei em encará-lo, coisa que ele só percebeu depois de alguns segundos.
- Algum problema, ?
- Eu ia te perguntar a mesma coisa, . - arqueei uma sobrancelha, mas meu sorrisinho não deixava dúvidas que eu estava só enchendo o saco, mas ainda sim, querendo saber da verdade.
- Então me deixe responder. Não, problema algum. - o que estava sendo brincadeira para mim, estava sendo sério para ele. Ele mantinha o olhar duro e claramente estava sem ânimo para brincadeiras. Aquilo me deu um arrepio pelo corpo, como se seu olhar tivesse algum poder sob mim, e de fato, tinha. E como!
- Engraçado, porque parece que tem. Você está quieto, tenso e distante. Nem mesmo ainda me explicou toda a história do seu pai, que caso você tenha esquecido, passou um tempinho nada agradável com uma arma apontada pra mim. Quando é que vamos conversar sobre isso, hein? - entrei no seu jogo e me deixei levar. Falei sem pensar, mas gostei do resultado. estava com a boca entreaberta, sem conseguir dizer nada por alguns segundos.
- E você quer me cobrar agora? Quando eu tentei conversar, você disse que não queria saber sobre aquilo no momento, e adivinha só? Agora eu que não quero, . - ele estava relativamente calmo até elevar o tom de voz. Se desgrudou de seu armário e caminhou até estar com o corpo em frente ao meu, com o olhar duro e afrontado, como se o que eu tivesse tido fosse um absurdo total.
- Mas que maravilha! As coisas agora vão andar do seu jeito? Me poupe! - revirei os olhos e cruzei os braços, controlando a raiva que estava tomando conta de mim.
- O que você queria? Que as coisas andassem do seu jeito? Porque se você achou isso, tenho uma grande novidade pra você: as coisas são mais complicadas do que parecem. - finalizou com uma sobrancelha erguida e a voz carregada de sarcasmo.
- Realmente, são bem complicadas mesmo, afinal, eu não sei se a próxima vez que eu sair na rua vou ser pega pelo seu pai novamente! - esbanjei uma raiva que saiu junto com a frase de modo tão forte e poderoso, que foi capaz de deixar sem o que dizer por um longo tempo. Apenas nossos olhos se comunicavam de maneira desesperada.
- , não fale como se...
- Por que ele veio atrás de mim? Você sabe então me responde! Por quê? - a esse ponto, minhas perguntas precisavam de resposta mais do que nunca. Eu precisava entender. Precisava compreender porque continuava tão... inalcançável.
- Eu não sei! - praticamente gritou, batendo com força no armário de um desconhecido. Sua frustração não era por não saber, e sim, exatamente pelo contrário. O olhar dele o entregava.
- Pare de mentir! Você sabe sim! Vamos, diga a verdade pelo menos uma vez, ! Deve ser muito difícil pra você, mas imagina como foi pra mim? Você imagina o tamanho do meu medo naquele momento? Voc...
- VOCÊ IMPORTA! - o grito da verdade. A grande resposta, que mesmo dita em alto e bom som, eu não havia entendido.
- O que? - minha voz saiu quase inaudível. Foi como jogar água no fogo.
- Ele não foi atrás de você por acaso. Ele sabia e sabe que você importa pra mim. - seus olhos azuis se mantinham sob os meus. As mãos de pararam no armário, me cercando em seus braços. Sua respiração ofegante e exausta batia em meu rosto. Ele finalmente havia dito a verdade - E é por isso que deveríamos nos afastar. Eu quero te proteger e sei que preciso fazer isso, mas não posso tomar isso como garantido. Não posso arriscar que ele faça algo com você novamente.
- Não! Você não vai me afastar por causa desse homem! - rebati raivosa, mas não por ele, e sim, pelo monstro que seu pai era. A ideia de termos de nos afastar parecia absurda e dolorida. Não era o que eu queria nem de longe.
- Não é só por ele, ! É por mim! Eu não te faço bem e sabemos disso. - ele dizia com tanta convicção que chegava a ser assustador e difícil de responder sem sentir diversos sentimentos que atrapalhavam minha linha de pensamento.
- Pare! Não ouse inventar desculpas para se afastar. Você acha que não merece algo, então estraga tudo. Mas comigo NÃO vai ser assim. - dei ênfase no "não", deixando bem claro a minha discordância com a proposta e justificativa absurda do rapaz. Mante-lo por perto já era difícil, mas eu sabia que ele afastado doeria mais. Muito mais. Eu sabia que não podia deixá-lo escapar, porque mesmo com tantas coisas ruins que aconteceram, mentiras, segredos e outras coisas que eu provavelmente nem imaginava, uma parte de mim dizia que valeria a pena passar por tudo isso.
- Você pode não querer se afastar de mim, mas eu posso me afastar de você, e acredite, é melhor assim. - as palavras saíram de maneira tão fácil de sua boca, que não tive dúvidas de que minha presença em sua vida não tinha importância. conseguiu ser mais duro do que qualquer outra pessoa. Ele conseguiu, de vez, parar minha respiração por longos segundos, e também... me quebrar. E quebrar meu coração.

Minha mãe. Era só o que eu queria, fora o último sinal, que quando tocou, foi como um peso sendo tirado das minhas costas.
Disquei o número da minha mãe desesperadamente, pedindo para que ela jantasse comigo novamente. Assim que desliguei e terminei de socar todo o meu material dentro daquele bendito armário, estava parada atrás de mim com um olhar fofo e agradável. Típico de quando ela está prestes a pedir algo.
- , estou morrendo de saudade de você. - sua voz arrastada e melancólica me fez arquear as sobrancelhas e estranhar completamente sua frase.
- A gente se vê todo dia. - respondi de maneira óbvia, tentando entender onde ela queria chegar.
- Oi amigas! - Chloe e Callie chegaram juntas, formando uma rodinha.
- Que tal irmos pra minha casa? Faz um tempinho que não fazemos isso. - e lá estava ela, pedindo delicadamente, como se fosse necessário. não era de fazer isso. Ela provavelmente estava... carente?!
- Você vai me desculpar, mas não estou muito afim. Vou jantar com a minha mãe hoje, e quero tirar um cochilo antes. - respondi praticamente resmungando, como se ir para a casa de fosse um sacrifico. A verdade é que eu gostaria de ficar sozinha e pensar. Ou talvez não pensar fosse melhor. Ah meu Deus, já não sei de mais nada.
- E quando vamos conhecer sua mãe? Digamos que agora você não tem mais desculpa pra isso, certo? - mordeu o lábio, tentando esconder a vergonha e o receio ao dizer tal coisa. Não havia me incomodado nenhum pouco, apenas me deixado surpresa. Ela tinha razão, eu já não tinha mais desculpas.
Pensei. Repensei. Querendo ou não, eu precisava de alguém ao meu lado, e ninguém melhor que minhas amigas e minha mãe, certo? Certo. Aliás, me distrair seria uma boa.
- Vocês podem conhecer hoje. Estão todas convidadas para jantar lá em casa, ou melhor, na casa do , que agora também é minha casa. - o olhar confuso e divertido estampado no rosto de cada uma me fez parecer uma bobona - Enfim, vocês entenderam.
- , você não precisa nos convidar só porque se sentiu pressionada ou algo do tipo. - Chloe murmurou sem graça, e por incrível que pareça, aparentemente todas elas estavam pensando o mesmo.
- Não estou me sentindo pressionada! Sério, vai ser bem legal ter todas juntas. - respondi tão rápido, que meu desespero se tornou óbvio.
Por muito tempo, ficar sozinha era a minha melhor opção. Então eu ganhei tudo isso. Querendo ou não, acho que você acaba se tornando um pouco dependente disso. Saber que tem alguém ali pra você se torna tão incrível e ao mesmo tempo maluco. Se tem uma coisa que eu tenho certeza, é que com as garotas não tem tempo ruim. Claro que, temos nossos momentos de seriedade, mas os momentos alegres, onde conseguimos rir e fazer palhaçada com tudo são únicos. São momentos onde nada mais importa ou existe. O tempo para. E felizmente - ou infelizmente - eu gostaria de usar isso para afastar todo o esgotamento que me causou.
Foi assim que ele me deixou. Esgotada.
- Está tudo bem? - Callie cerrou os olhos, tentando achar algum indício que mostrasse que eu poderia não estar bem.
- Aham. Espero vocês no jantar!
E também tem esses momentos onde eu fujo. Apesar de todas as coisas boas, a pergunta "está tudo bem?" ainda é assustadora.

***


- Isso é o que eu chamo de evolução! Chamar as garotas pra jantarem aqui e conhecer sua mãe?! Uau. Sério. - batia fracas palmas com um sorriso divertido.
- Pare de ser bobo! Você me encorajou a contar a verdade pra elas e eu contei. Agora preciso fazer todo o resto, né? Aliás, conhecer minha mãe não é graaaaande coisa. - dei os ombros, levantando da cama e me preparando para sair do quarto.
- Estou orgulhoso de você, sabia? - seu sorriso se formou, assim como o brilho em seus olhos. Não consegui pronunciar uma palavra sequer, então o abracei.
- Não acredito que estou sem minha câmera aqui pra registrar esse momento adorável! - minha mãe abriu a porta aos poucos, observando nosso abraço e desmanchando de amores.
- Nenhuma câmera suportaria tanta fofura, tia. - fez graça, a cumprimentando e dando um abraço forte - Vou deixar vocês conversarem. - e saiu dali, fechando a porta.
- Oi meu amor! Aconteceu alguma coisa? Você parecia aflita no telefone. - mamãe puxou minha mão gentilmente até sentarmos na cama.
- Não. Eu só queria te ver. - abri um sorriso fraco, tentando disfarçar.
Minha mãe já tinha a cabeça cheia por conta dos problemas, e contar os meus apenas a deixaria mais preocupada ainda. Mas nada se comparava a sua companhia. Mesmo sendo ligadas por todas as tragédias, formávamos uma dupla incrível.
- Acho que você esquece que eu que te botei no mundo, né? - arqueou uma sobrancelha de modo engraçado e riu, mostrando que não estava nem um pouco convencida com a minha resposta - Eu te conheço, mocinha. Agora vamos, me conte o que houve.
Batidas na porta. Salva pelo gongo. Ou não.
- , as meninas chegaram. - enfiou apenas o seu cabeção para dentro do quarto.
- Que meninas?
- A não te contou, tia? - riu e minha mãe balançou a cabeça negativamente sem entender sobre o que se tratava aquilo - Ela chamou as amigas para jantarem aqui e te conhecer.
- Ai meu Deus, isso é sério? Peça para as garotas subirem aqui, aí podemos ter uma girl's night! - ela pediu animada, se levantando e arrumando sua roupa, que nem mesmo estava bagunçada. Sua animação toda nos fez rir, e não foi pouco.
- Girl's night? De onde você tirou isso? - perguntei ainda rindo.
- Ouvi umas garotinhas falando na rua e achei legal. Estava esperando a ocasião certa pra falar isso. - e aí rimos mais ainda. demorou alguns segundos para se recuperar e finalmente fazer o que minha mãe pediu.
Não demorou em , Callie e Chloe adentrarem o quarto, se apresentando e cumprimentando minha mãe com entusiasmo.
- Prontinho, todas estão apresentadas e felizes. - exclamei, sentindo uma espécie de peso sair das minhas costas. Era como se uma etapa estivesse concluída.
- Agora vamos sentar e conversar. É tão bom conhecer as pessoas com quem minha filha está andando. Inclusive, vocês também são amigas do namoradinho da ? - minha mãe soltou a pergunta sem vergonha alguma, muito pelo contrário, ela estava bem à vontade e entrosada. As meninas caíram na gargalhada, e minha vontade era de cavar um buraco e me afundar nele de tanta vergonha.
- Mãe! - a repreendi, e aparentemente tinha deixado tudo mais engraçado, pois foi aí que riram mais. Todos os sorrisos ali faziam parte da minha vida. Faziam parte da nova pessoa que eu estava me tornando. Estávamos em um daqueles momentos onde nada importa. Eu tinha tudo - ou quase tudo - que eu precisava exatamente dentro daquele quarto. Decidi entrar na brincadeira, afinal, é o que não falta entre nós - Ele não é meu namoradinho.
- Digamos que eles são um casal complicado. - Chloe passou a mão pelos cabelos, com uma expressão pensativa.
- Também não somos um casal. - adverti.
- Mas sim, também o conhecemos. é incrível, porém complicado. Ele e são resumidos em seis dias de guerra e um de paz, mas no fundo, bem no fundinho, eles sabem que não aguentam ficar longe do outro. - deu uma piscadinha marota para mim, dando os ombros e rindo. O que ela disse era totalmente verdade, tirando a parte que não conseguimos ficar longe um do outro.
- Ele aparentemente aguenta ficar longe de mim sim. - soltei a frase sem querer, ainda presa naquele pensamento que eu tanto queria me livrar. Falar sobre era a última coisa que eu queria.
- Vocês brigaram de novo? - Callie nem mesmo fingiu estar surpresa.
- Não foi bem uma briga, foi mais pra um... término?! - minha expressão estava confusa, assim como meu pensamento. O que diabos era aquilo, afinal?
- Gente, pelo amor de Deus! Vocês dois sabem que...
- Pensem comigo. Quando ficamos sem certas coisas por tempo o suficiente, é fácil esquecer o quanto precisamos delas. Não que o precise de mim, mas se ele não conversar comigo, vai ser muito mais fácil dele me esquecer e aí ele nunca vai ser meu namoradinho de uma vez. Ele não me quer perto, então não tenho o que fazer. Agora vamos mudar de assunto. - interrompi Chloe, dizendo meu pensamento em voz alta e tentando acabar com aquele assunto. Eu não estava afim de lembrar que não faz questão de me ter em sua vida.
- Filha, homens são confusos. Nem sempre eles conseguem ter certeza que querem aquilo, ou às vezes é só medo. E você não pode tirar suas conclusões sem saber o que ele pensa ou sente. Talvez ele possa viver sem você, mas isso não significa que ele queira. - mamãe finalizou tranquilamente, com um sorrisinho vitorioso e triunfante por me deixar sem palavras. Ela dizia com tanta facilidade e certeza, que parecia que ela tinha absoluta certeza sobre aquilo.
- Mas acho que a grande dúvida que reina aqui é: por que nós tentamos, quando as barreiras são tão altas, e as chances tão baixas? Por que simplesmente não deixamos pra lá e vamos embora? - Chloe quebrou o silêncio que se instalou por poucos segundos, dando um suspiro leve e cheio de dúvidas. Não demorou para que todas ficassem pensativas com sua pergunta, porém, também esperando uma resposta.
- Vocês precisam entender que no fim, não existe glória no fácil. A graça de tudo é lembrar-se da longa e agonizante luta até alcançar o que se almeja. - o queixo erguido e orgulhoso de minha reinava. Parecia que ela estava dizendo algo que sempre quis dizer.
E foi aí que eu entendi.
Apesar de todo o seu medo de Sam e de que algo acontecesse conosco caso fizéssemos algo contra ele, mamãe tinha certeza que a lei do retorno funcionaria. Claro que, isso não justifica nossa decisão de nunca termos feito nada, mas ela tinha isso como garantido. Ela sabia que a própria vida tomaria as providências. Ou talvez, ela finalmente as tomaria.
Minha mãe estava mudando, assim como todo o resto de nossa vida. Cada dia descobrimos algo a mais sobre nós mesmos. Quem somos, de onde viemos e para onde vamos. Nesse meio, tem a busca de uma vida melhor.
Minha mãe, com certeza, estava nessa busca. A vida estava mudando. A vida é uma constante mudança.
Eu entendi.
- Tia, você é incrível para conselhos! - Callie se manifestou fascinada, como se tudo o que minha mãe tivesse falado, tivesse causado um grande impacto em sua vida.
- É, mais ou menos. - o tom de voz convencido e divertido de minha mãe nos fez rir. Ela realmente estava se divertindo. Ela estava vivendo.
- Acho que prefiro que você viaje conosco, tia. Que tal trocarmos, meninas? A mãe da é bem melhor. - me encarou com um olhar cínico e com falso desdém. E rimos. De novo.
- Sua falsa! - joguei o primeiro travesseiro que vi na minha frente em sua direção.
- Vocês vão viajar? Que delicia!
- Vamos sim, mãe. Sei que ainda não pedi permissão, mas... será que eu posso? - afinei minha voz num tom de fofura exagerado, com o meu olhar mais fofo e puro.
- No dia que eu te proibir de sair com seus amigos, me interna! - sua voz carregada de bom humor, mais uma vez, nos arrancou algumas risadas.
Deus, como eu queria pausar esse momento e poder revivê-lo quando quisesse.
's POV
- Eu nunca tive uma semana tão maluca como essa. - Jackson suspirou alto, me encarando tanto que estava me deixando constrangida.
- Eu sei. Digo, eu sei porque eu sei, mas não que eu saiba o que você está sentindo, porque isso eu realmente não sei. Mas imagino. - tombei a cabeça pro lado, tentando não deixar minha frase mais confusa e atrapalhada do que já estava. Ficar calada era uma boa. Jackson riu fraco e continuou ajeitando as coisas no carro.
Depois de muitas queixas sobre ser um saco viajar sábado de manhã, decidimos adiantar. Viajar numa sexta à noite parecia muito mais agradável para todos.
A única coisa que me incomodava era o propósito da viagem. Jackson precisava se distrair, se é que isso é possível. O pior era que ninguém sabia. Eu não podia pedir ajuda ou auxílio para ninguém.
Ninguém sabia que Jackson e são irmãos. Exceto eu. Mais uma vez, eu estava escondendo um segredo, mesmo sabendo no que isso pode dar.
deu um "chega pra lá" em e eu nem mesmo consegui conversar com ele sobre isso, pois meus dias estavam resumidos em garantir que Jackson estava bem e não perdendo a cabeça.
... bem, aí complica. Estávamos distantes. Pela primeira em nossas vidas.
Deus, quanta coisa!
- Filho, não está esquecendo nada? - Julie saiu enrolada em uma manta fina, embora estivesse um clima fresco. Ninguém que a olhasse imaginaria que ela está no estágio IV do câncer. Merda, odeio me lembrar disso.
- Não, mãe, você que basicamente arrumou tudo, lembra? - Jackson riu, tirando onda com a cara da mãe - Por favor, esteja aqui quando eu voltar, tudo bem? E qualquer coisa me liga, pelo amor de Deus! - ele suplicou sério, beijando as mãos da mãe inúmeras vezes, sem contar o abraço bem apertado no final.
- Eu não vou morrer nesse final de semana, eu juro! - Julie rolou os olhos e riu, não se permitindo ficar triste em nenhum segundo.
Eu a admirava tanto. Ela não se entregou à doença, muito pelo contrário. Julie estava, literalmente, aproveitando cada segundo da sua vida. Ela se permitia fazer tudo.
Me despedi com um abraço e prometi cuidar de Jackson, recebendo um olhar de reprovação vindo do mesmo. Ok, ele não precisava de cuidados, mas eu cuidaria e pronto.
Entramos na Chrysler Town & Country vermelha e buscamos a todos, que estavam reunidos na casa de . Demoramos tempos até organizarmos todas as malas, até porque né, convenhamos... mulheres são mais cuidadosas e preparadas do que homens, então precisamos levar todos os tipos de roupa que temos. Apenas precaução.
- Vamos ter que comprar um ônibus, sério. - fechou o porta malas rapidamente, impedindo que algo saísse do lugar e estragasse tudo o que fizemos para tudo ali se encaixar.
- Agora são oito e meia, então acho que chegaremos até meia noite. - comentou ao olhar em seu relógio, logo abrindo a porta do passageiro da frente e se acomodando.
Acontece que Jackson Tuck e sua família usavam aquele carro exclusivamente para as viagens. Era bem confortável e daria pra dormir tranquilamente se não fosse toda a falação do pessoal.
queria ouvir o novo álbum do One Republic, mas começou a fazer suas palhaçadas e a última coisa que estávamos nos importando, era a música.
Incrível como conseguíamos ser a calma no centro do caos de cada um. Conseguimos fazer milagres quando estávamos todos juntos. Éramos a melhor versão de nós mesmos apenas por estarmos fazendo o que gostamos, com quem gostamos. O poder da amizade é realmente algo indiscutível.

Depois de horas, finalmente chegamos. A casa ficava localizada num bairro pequeno, e creio eu que era pela intenção de ter o máximo de paz e tranquilidade que a família Tuck pudesse ter.
Retiramos nossos pertences do carro e adentramos a casa, encantados com tanta beleza e tanta simplicidade ao mesmo tempo. Era muito aconchegante.
- São quatro quartos, então se os casais quiserem ficar juntos, alguém vai ter que ficar no quarto com mais duas pessoas. - Jackson falava enquanto organizava as coisas na cozinha, e os casais já começavam a subir para o andar de cima atrás de seus quartos. permaneceu na mesma posição, de braços cruzados e encostada no balcão, com os olhinhos cansados de sono. Já , tentava disfarçar que estava a olhando. Ser observadora é muito bom.
- Eu e ficamos no mesmo quarto, e vocês três ficam no outro. - resolvi o pequeno problema que havia ali, mesmo sendo algo bem óbvio e esperado, afinal, com quem mais eu ficaria?
- Ah que merda, pensei que eu dormiria com vocês duas. - fez um biquinho decepcionado, arrancando nossas gargalhadas.
Estávamos exaustos. Nossas bundas estavam quadradas de tanto ficarmos sentados no carro. se apressou e subiu, e eu não demorei em fazer o mesmo.
- Boa noite, . - se trocou às pressas, se jogando na grande cama de casal que havia no quarto. Não era tão grande, mas tinha espaço o suficiente para nós, fora que, a decoração era adorável.
- Boa noite, chuchu. - ela não demorou a dormir. Em menos de cinco minutos, aparentava estar tendo altos sonhos com seu amado Ryan Tedder.
Me troquei preguiçosamente e deitei. Me virei de um lado para o outro inúmeras vezes tentando achar uma posição confortável. Eu me sentia cansada, mas não conseguia manter os olhos fechados para dormir. Tentei mais que uma vez, mas nada adiantou. Olhei para o lado e se mantinha na mesma posição, com a mesma tranquilidade. Desisti de tentar, levantando e marchando até o quarto ao lado. Encostei meu ouvido na porta para descobrir se eles ainda estavam acordados, e por sorte, estavam.
-Sabia que ela não resistiria e viria atrás de mim. - soltou mais uma de suas piadinhas assim que abri a porta do quarto. Ele realmente não perdia uma oportunidade sequer.
- Não estava conseguindo dormir, aí lembrei que tinham três gatinhos dormindo no quarto ao lado e decidi fazer uma visita. - arqueei as sobrancelhas e mordi o lábio numa tentativa falha de ser sexy. Eles nem mesmo haviam arrumado a cama para deitarem, e não perdi tempo e me joguei ali, deitando e observando seus olhares em reprovação sobre mim.
- Você é tão folgada! - resmungou, deitando também apenas para provocar.
- Escuta aqui mocinho, precisamos conversar! - o tom de voz autoritário não o afetou. revirou os olhos sem nem disfarçar.
- E não adianta fazer cara feia! Agora me explica que história é essa de você simplesmente afastar de você? Qual seu problema? - eu já estava fora do sério. Dei um tapa fraco em seu braço, fazendo sua atenção voltar inteiramente para mim.
- Vocês já brigaram de novo? - perguntou com a boca aberta, realmente surpreso por aquilo.
- , essa não é a melhor hora pra isso. - nem mesmo tentava disfarçar o tédio e a indisposição para me dar uma resposta decente. Jackson parecia estar perdido, mas não abriu a boca.
- Sério, me explica que merda você estava pensando quando decidiu isso. Você não pode simplesmente se afastar de alguém e esperar que ela esqueça de tudo o que vocês passaram. Histórias foram vividas, lembranças foram feitas e coisas foram construídas! - questionei com uma razoável irritação, sem conseguir compreender qual era o motivo dele ter feito aquilo.
- Eu me recuso a responder. - estava incrédulo e levemente sem graça, surpreso com todo o meu discurso.
- Mas você vai! Vamos, anda, me responde logo.
- Se vocês quiserem, eu saio do quarto pra vocês conversarem. - Jackson passou a mão pelos cabelos, realmente disposto a sair dali, como se ele fosse o que estivesse impedindo de responder minha pergunta. Coisa fofa.
- Pare de ser besta, Tuck! Aliás, você e são irm...amigos! Não são? Amigos compartilham tudo! - me corrigi a tempo de perceber que eu iria revelar mais um segredo bombástico. Mais um. arregalou os olhos e levantou, me puxando pela mão para fora do quarto, o deixando com uma expressão confusa, porém ele já estava acostumado com coisas assim. Era algo que você sempre deve esperar de .
- Você está doida?
- Doido está você! E afinal, quando você vai contar a verdade? Eu não quero guardar esse segredo! Você sabe que isso aqui não dá certo! - sussurrei em resposta da mesma maneira que ele, olhando para cada porta do longo corredor.
- Tá, tá, tá. Vai dormir que é melhor. - rolou os olhos, perdendo a paciência e querendo sair o mais rápido possível de perto de mim e minha boca grande. Ele se virou para sair dali, mas segurei em seu braço.
- Você ainda não respondeu minha pergunta. - arqueei as sobrancelhas, o olhando nos olhos e deixando minha seriedade dominar.
- Não posso deixar que ela fique perto de mim. Eu não quero. - sua resposta foi dita rapidamente, mas não me convenceu nem de longe. Eu o conhecia o suficiente para saber quando estava mentindo. E o olhar... bem, o olhar nunca mente. Eu conseguia perceber sua dificuldade em dizer tal frase. Podia ser tudo, menos verdade.
- Você não consegue mentir tão bem quanto antes, sabia?
- Chega. Boa noite. - ele respirou pesado, bufando e se virando de vez até entrar no quarto novamente.
Era uma pena ele mentir pra si mesmo.

***


Duas da tarde. Essa foi a hora que eu acordei, junto com . Descemos às pressas, cheias de fome. Os garotos estavam preparando waffles, e pela carinha de cada um, também tinham acordado a pouco tempo.
sussurrou um "bom dia" baixinho e caminhou até a porta dos fundos, que dava acesso ao quintal. Não pensei duas vezes antes de ir atras, afinal, algo podia estar errado.
A casa à beira do lago era incrivelmente linda. A princípio não conseguimos observar direito, pois chegamos tarde e estava escuro, mas agora... Uau.
não se incomodou com a minha presença e fez o que tinha que fazer, que foi ligar para a mãe. O cuidado que as duas tinham uma com a outra era mais lindo ainda.
- Sua mãe está bem? - mordi o lábio, com uma vergonha desnecessária se apossando de mim.
- Está sim, é que... Ela... Ela ainda mora com ele. - ela gaguejou, desviando o olhar decepcionado e pesado. se referiu ao pai com certo medo e receio. Ela obviamente tinha medo dele.
- Vocês já pensaram em fazer algo? - tentei ser o menos invasiva possível, mesmo sendo uma tarefa bem complicada.
- Será que a gente pode mudar de assunto e aproveitar esse lugar lindo? - despertou, mudando de expressão em questão de segundos. Realmente era um momento bem chato pra falar sobre tal coisa.
Adentramos a casa novamente, com o cheirinho de waffles invadindo nossos narizes. As garotas também já estavam ali, ajudando a preparar tudo... Ou a bagunçar.
- O que faremos hoje? - perguntou curioso.
- Ver um filme? - Jackson perguntou esperançoso, recebendo olhares reprovadores de todos, e então ele gargalhou. Obviamente estava zoando com a nossa cara - Conheço um lugar incrível e podemos ir lá à noite.
- É disso que eu gosto! - comemorou animado feito uma criança. Fofo.
- Podemos conversar? - se colocou ao meu lado lentamente, sussurrando em meu ouvido discretamente.
- Aham. - dei minha última mordida e larguei o prato em cima do balcão.
Eu sabia o que estava por vir. Ou talvez não. Fomos para o quintal, onde o sol estava quente e o vento batendo agradavelmente em nossos rostos. se sentou na grama, batendo com as mãos no lugar ao seu lado para eu me sentar.
- Antes que você fale ou reclame de algo, só quero dizer que, em minha defesa, eu estava ajudando Jackson com algo muito muito muito importante mesmo. Eu me afastei por um bom motivo. Sei que é uma justificativa bem merda, mas é isso. - disparei de uma vez, sem nem mesmo respirar, e perdendo todo o meu fôlego. Meu melhor amigo arqueou as sobrancelhas, me encarou bem, e riu. Riu na minha cara.
- Você e essa sua auto defesa impulsiva. Não quero conversar pra brigar ou reclamar de nada, eu só quero minha melhor amiga por um tempo. Será que eu posso?
- Jura? Porque eu pensei que...
- Você pensa demais às vezes. Eu sei que as coisas desandaram, mas eu estou disposto a fazer tudo certo agora. Talvez eu possa ter ficado com ciúmes de você e do Jackson, mas não posso mentir, o cara é bacana. Eu passei dos limites e te enchi o saco em relação aos nossos... é.... aos nossos beijos, mas isso não vai acontecer de novo. Estou me focando em fazer Chloe feliz, e isso que importa agora. - abriu um sorriso, e por mais lindo que fosse, tinha algo por trás. Suas palavras foram surpreendentes e sinceras, mas não em tudo. Algo estava sendo dito a força e eu sabia.
- , o que há de errado? - prendi meu olhar ao dele, determinada a descobrir tal coisa. Eu o conheço melhor do que ele mesmo. Algo estava errado e era meu dever de melhor amiga ajudar.
- Chloe. Sabe, foi uma coisa bem bobinha no começo, mas eu realmente achei que teríamos futuro. Todos os dias eu tento gostar dela, de verdade mesmo, mas eu não consigo retribuir na mesma intensidade. Não estou dizendo isso pelo o que aconteceu entre nós, e sim, porque é algo que está acabando comigo. - ele respondeu a verdade sem nem tentar escondê-la. A voz carregada de culpa e nervosismo estava óbvia. Me lembrei de quando disse que ele tinha Chloe e deveria respeitá-la. Mas acontece que, o próprio, não está se respeitando. Ele está ignorando as verdadeiras vontades para satisfazer outra pessoa. Isso, definitivamente, é uma merda.
- Você pensa tanto em protegê-la, que nem enxerga que quanto mais você levar isso adiante, mais ela vai se magoar. Você é incrível por pensar que pode fazê-la feliz, mas nada vai adiantar se você não estiver. Quando dois não querem, não acontece. A dor do amor é realmente um saco, e acho que ninguém sabe lidar com isso, mas Chloe é forte. Assim como você tem seus objetivos, ela também tem, e isso deve ser o suficiente pra mover vocês pra frente. Nem sempre o amor é tudo. Tem um mundo inteirinho pra vocês conquistarem, só não juntos. - tombei minha cabeça para o lado, finalizando meu discurso com a sensação de dever cumprido. Parecia a coisa certa a se dizer. estava visivelmente tão satisfeito quanto eu.
- E se eu nunca conseguir amar alguém? - seu olhar satisfatório se desfez, sendo substituído por uma expressão duvidosa gigante.
- Meu bem, o amor é como um raio, não se sabe onde cai até você ser atingido. - respondi com convicção, me sentindo incrível por arranjar uma frase tão boa que fez meu melhor amigo ficar incrédulo.
- O que seria de mim sem você? - seu sorriso completamente verdadeiro estava a mostra, e claro, o meu também.
- Também não sei. - rimos.
- Às vezes sinto falta de quando éramos só nós dois, mas eu fico tão feliz em te dividir com outras pessoas. Você diz coisas que ninguém mais diz, e sério, isso te torna muito especial, . - seu tom de brincadeira misturado com seriedade, mais o brilho dos seus olhos me fizeram derreter de amores. Nossa conexão jamais mudaria. Somos, definitivamente, a tampa da panela um do outro.
- Eu sempre vou estar aqui para você, .
- E você sempre vai ser minha melhor amiga.
's POV end


's POV
O desespero de passar por algo pela primeira vez. Foi assim que eu me senti ao afastar de mim depois de revelar que ela era importante na minha vida. A gente não sabe como lidar com algo que nunca passamos, mas claro, aprendemos. É tudo por uma boa causa.
Eu nem mesmo queria viajar. Pegar Richard estava em primeiro lugar na minha lista de prioridades, mas Dan insistiu muito. Muito mesmo. Todo aquele papo de "dê um tempo pra si mesmo" e bla bla bla. Nunca sabemos quando Richard faz algo, e estar longe podia prejudicar nosso plano.
- Está tudo bem? - Jackson me despertou do meu transe, se sentando ao meu lado. Estávamos no quintal, e francamente... Que vista!
- Está sim e com você? - nem mesmo o olhei, ainda vidrado com o movimento da água no lago.
- Está tudo uma bagunça, mas está tudo bem na medida do possível. - respirou pesado, e foi aí que notei sua expressão não tão boa.
- Você está com medo? - disparei a pergunta sem nem pensar.
- Não sei. Acho que sim.
- Caso precise de algo, já sabe com quem contar. - dei uma piscadela, esperando que ele entendesse o recado.
- Com você? - Tuck perguntou surpreso, me deixando da mesma maneira. Eu não estava falando sobre mim, e sim, sobre , já que eles estavam tão próximos.
- Comigo também. - dei um sorriso fraco, sentindo um arrepio. Eu não sentia aquilo como um peso, muito pelo contrário. Parecia que, minha raiva por Jackson sumia a cada dia.
- Dá pra acreditar nisso? Minha mãe vai morrer e você é meu irmão. Logo você! - arregalou os olhos minimamente, num tom divertido e perdido. Ele ainda não estava conseguindo acreditar, assim como eu.
- Quando dizem que a vida é uma caixinha de surpresas, não é mentira.
- Realmente.
Silêncio.
Um final de tarde quieto e com mentes barulhentas, cheias de perguntas.
Um meio irmão com um problema que não tem solução. Uma garota que não posso me aproximar. Um pai pra matar.
É, a vida é mesmo uma loucura.
- Você quer contar pra alguém sobre isso? - quebrei o silêncio, fazendo a pergunta que me deixava levemente assustado. Só de lembrar de toda a história, me fazia sentir coisas não agradáveis. Não por Jackson, e sim, por Richard. O homem mais vigarista desse mundo.
- Acho que seria melhor. Sei que a história em si, é terrível, mas... eu sempre quis ter um irmão. - passou a mão pelos cabelos, visivelmente sem graça. Uma sensação me atingiu. Uma das boas. Uma das que você deseja parar o momento só pra curtir mais o sentimento.
- Você tem um agora.
- Desculpa por todas as vezes que eu enchi seu saco em relação à sua mãe. Você sabe que...
- Você anda com pessoas que fazem você ser a pior versão de si mesmo. Eu entendo perfeitamente, pelo menos agora. Você quando está com a gente se mostra uma pessoa totalmente diferente, e acho que é nisso que você tem que investir. - o interrompi manifestando minha humilde opinião. Ele prestou atenção em cada palavra, e então, sorriu.
- Podemos começar tudo de novo?
- Claro. Mas lembre-se que eu sou dois meses mais velho e mais bonito. Eu mando em você. - me levantei, o ajudando a fazer o mesmo. Tuck riu debochadamente.
- Você já pode virar comediante, . - o som da sua voz ficava cada vez mais baixo e distante. Antes dele entrar para dentro da casa novamente, mostrei meu maravilhoso dedo do meio em resposta.
De fato, nossas vidas tem altos e baixos. Coisas que nem imaginamos, acontecem. Quando ganhamos tantas coisas assim, fica difícil acreditar que nossa vida possa melhorar tanto a esse ponto. Eu não imaginava ganhar tanto. Tantos sentimentos juntos. De todos os tipos. Eu finalmente, no final do dia, sei de tudo o que eu tenho. E também, o que eu gostaria de ter.

***


Eu juro que eu tentei não encarar. Tentei desviar o olhar o tempo inteiro. Tentei fingir que nem conheço. Foi tudo em vão. Foram no máximo, trinta minutos até chegarmos num barzinho, onde estava, literalmente, arrancando suspiros de vários homens. Estava cheio, gente dançando e beijando pra todo lado. E eu? Bem, eu estava só olhando.
Pedimos nossas bebidas, entrando no clima da melhor maneira. Se bem que, seria melhor se eu pudesse deixá-la pertinho de mim.
As luzes se alternavam de acordo com a música, e eu me esforçava para não a perder de vista. Callie, como sempre, agitou todos para dançar.
- Você não cansa de olhar pra ela não? - a garota parou ao meu lado, quase gritando em meu ouvido. Seu olhar pervertido quase me fez rir.
- Está tão óbvio assim? - perguntei inocente, mesmo sabendo da resposta. Eu não me importava das pessoas perceberem que eu não conseguia tirar os olhos dela, afinal, quem conseguiria parar de olhar aquela coisa linda dentro daquele vestido preto maravilhoso?
- Está. E a propósito, eu que escolhi a roupa dela. - Callie deu uma piscadinha antes de se afastar e entrar na multidão, dançando com as amigas como se não houvesse amanhã.
Eu tinha que parar. Eu queria parar. Queria simplesmente não me importar mais. A voz de ecoava em minha mente dizendo "histórias foram vividas, lembranças foram feitas e coisas foram construídas". Eu não conseguiria esquecer nem se quisesse, e minha maior certeza é que ela também não.
- Ai meu Deus, me desculpa! - uma garota ruiva fingiu um tropeço, derrubando uma quantidade mínima de bebida em minha blusa. Eu conhecia tal tática de longe.
- Tudo bem. - sorri sem mostrar os dentes, voltando meu olhar para , que não estava mais na pista de dança. Olhei rapidamente em todos os cantos, não a encontrando. Me desencostei do balcão, pronto para procurá-la, sendo puxado de volta pela ruiva, que envolvia as mãos em meu pescoço.
- Não tão rápido, benzinho. - ela teve que ficar na ponta dos pés para alcançar meu pescoço, onde distribuía uma trilha de beijos.
Há meses atrás, eu era a versão masculina da ruiva. Chegava de maneira ridícula em qualquer garota que me chamava atenção, sem nem dar oportunidade a elas de dizer muita coisa. Eram inúmeros beijos em uma noite só, garotas que eu nem mesmo sabia o nome. Todas, insignificantes. A ruiva continuava de maneira incansável chegar até minha boca, mas eu não conseguia.
Eu queria querer, mas não queria. A única coisa que eu aceitaria no momento sem hesitar, seria a boca de colada na minha.
Retirei as mãos da ruiva gentilmente do meu pescoço, a encarando por alguns segundos e saindo dali sem dizer uma palavra. Eu precisava beber. E muito.

- Ei, você não vai ficar a noite inteira aqui, né? - se sentou ao meu lado. Eu estava colado naquele banco há muito tempo, enquanto todos estavam dançando e se divertindo. Senti meu corpo ficar dormente. Eu estava oficialmente quase bêbado.
- Você viu a ? - virei mais uma dose, mal sentindo o gosto.
- Cara, essas garotas hoje se soltaram de vez. Até a Chloe que é a Chloe aguentou o tranco. - riu divertido, pedindo uma bebida em seguida.
- está bêbada?
- Creio que sim. - pegou sua bebida e levantou, olhando pra trás como se estivesse me esperando. Fomos de encontro com o pessoal, que estava totalmente eletrizado com a batida da música.
não estava ali. Merda. A procurei com os olhos incansavelmente, determinado a fazer o que já devia ter feito. Esbarrei em algumas pessoas, caminhando por alguns cantos até achá-la.
Com outro cara.
Nossos olhares se cruzaram pela primeira vez na noite inteira. estava bêbada, isso era indiscutível, mas ela dançava deliciosamente naquele vestido preto, perto demais do tal cara. Ela queria aproveitar o momento. Dançava e sorria, aproveitando a batida e o sangue que bombeava álcool.
Eu estava incrédulo. Não conseguia me mover ou parar de olhar aquela cena, causando certo desconforto na garota, que parou de dançar com o rapaz, desfazendo seu sorriso lentamente. "Não de aproxime" era a frase que rondava em minha cabeça. Mandei meus próprios pensamentos irem para o inferno, desobedecendo sua ordem. Me aproximei de uma vez, sem nem pensar. tentava se recompor, voltando a se movimentar e conversar com o rapaz tranquilamente, que teve a ousadia de pousar suas mãos na cintura da garota. Ela virou o rosto lentamente, dando uma piscadinha discreta para mim, provando que não precisava de mim e que também sabia ser cruel. Ela deu o sinal verde para o cara avançar, e eu sabia bem aonde aquelas mãos iriam parar. Continuei encarando aquela cena por alguns segundos até tomar uma decisão. Eu podia ficar ali feito um otario, ou poderia fazer o mesmo que ela.
Claramente a segunda opção.
Avistei qualquer rosto que me agradasse e me aproximei. Só não sei o próximo passo.
Merda.
Eu não conseguia querer. Eu não conseguia desejar outra boca. Eu simplesmente queria .
Voltei para onde todos estavam, encontrando uma tristonha e decepcionada sentada.
- Você está bêbada ou triste mesmo? - perguntei alto, me abaixando e ficando em sua frente.
- Bati meu pé não sei aonde. Não consigo dançar. - respondeu com um bico enorme. Sorri. Só ela mesmo.
- Bebe que você esquece a dor. - sussurrei em seu ouvido, apontando para as bebidas que estavam na mesa. Seu olhar sapeca e convidativo foi o suficiente. Nem mesmo tive noção do quanto estava bebendo, apenas bebi. se recompôs, disposta a voltar a dançar e me puxando junto.
Consegui me divertir. Não tanto quanto o esperado, mas consegui. Foi bastante tempo nesse ritmo até todos decidirem ir embora. Estava tarde e o único aparentemente sóbrio ali era Jackson.

foi a primeira a entrar em casa, desesperada para se jogar no sofá. Foram inúmeras as vezes que ela me olhou e soltou uma risada debochada enquanto voltávamos.
Todos estavam subindo para seus quartos, cada um se enfiando na primeira cama que via. e deram um jeito de se enfiarem no mesmo quarto de Jackson e , que estavam já jogados. Muito bacana esse lance de união, mas eu havia perdido minha cama.
cambaleava pelo corredor, e a auxiliei a entrar no mesmo quarto onde Callie estava, junto com Chloe, que já estava praticamente dormindo.
Sobramos nós. Como sempre.
Desci novamente para a sala, observando pegando no sono em uma posição aparentemente não muito confortável.
- , vamos. - tirei a mecha de cabelo que estava no meio de seu rosto, pegando em suas mãos em seguida. Ela soltou.
- Me deixa.
- Não vou deixar você dormir aqui desse jeito.
- Você me deixa exausta, sabia? Tanto bla bla bla pra agora se fingir se preocupado? Vai pro inferno, . - cuspiu as palavras com desdém, rolando os olhos com impaciência.
A bebida entra, a verdade sai.
- , vamos logo! - mantive a paciência, tentando não me deixar levar pela tontura que a bebida havia me causado. Minha cabeça estava pesada, mas eu tinha que cuidar dela.
- Me deixa aqui, merda. Eu não preciso de ninguém que não queira estar comigo. - ela falava com a voz arrastada e cheia de raiva. Mais uma vez, algo que saía de sua boca teve impacto tão forte que parecia como um soco em meu estômago.
- Você está linda, sabia? - foi a única coisa que saiu da minha boca. Me rendi por um momento e sentei ao seu lado, observando toda aquela beleza de perto. Sua boca estava entreaberta, demorando em formar uma frase.
- Você está bêbado. - respondeu sem graça, como se nunca tivesse ouvido um elogio antes. Até mesmo desviou o olhar.
- Você é linda quando eu estou bêbado e quando estou sóbrio também. - puxei seu queixo delicadamente até seu olhar se encontrar com o meu novamente. Uma explosão de coisas não ditas. Olhares com sentimentos misturados.
Me levantei, a puxando junto, ajudando na subida as escadas e a entrada num quarto vazio. Ela se sentou na cama, dando um longo suspiro pesado. Mesmo depois de toda a farra, ela continuava linda de verdade.
Merda. Deu a hora de sair e deixá-la sozinha. Infelizmente.
- Eu preciso que você precise de mim de volta. - minha mão não girou a maçaneta. Eu não consegui. Não depois de ouvir tal coisa.
- Quem disse que eu não preciso de você?
O momento. Eu me deixei levar. Foi a hora da verdade. A única coisa que eu desejei a noite inteira, foi ela. Eu precisava dela. Eu tinha uma necessidade louca de querer seu corpo junto ao meu. Eu queria tudo. Tudo mesmo. Queria saber o que se passava por sua mente, pelo seu coração, por tudo.
Eu preciso dela. Mas ela não sabe.
- Então prova que você precisa, . Você me deixa louca, sabia? Eu não consigo te acompanhar. Você cada dia é uma coisa. Será que você não enxerga que isso só me fa...
Eu precisei beijá-la. Eu precisei fazê-la calar a boca e me deixar fazer o que eu quis durante todo aquele tempo.
- Você quer mesmo que eu te prove?
- Considerando que Ethan mostrou mais interesse que você... Acho bom você tomar uma atitude. - enrolou uma mecha do cabelo no dedo, com uma sobrancelha arqueada e um sorrisinho nada inocente.
- Quem é Ethan? - perguntei mais alto do que devia, o que fez a garota afrouxar o sorriso.
- O carinha do barzinho. - sorriu provocativa, e esse foi o MEU sinal verde. Ela pagaria tão caro por ter me provocado.
Não poderia existir mulher mais incrível que ela nesse mundo. Iniciamos um beijo intenso e cheio de tesão. mordiscou meu lábio inferior, dando um riso e um olhar safado. Deus, ela acaba comigo!
- Espera. Você está bêbada. - por um momento, meu bom senso esperneou, mas perdi a capacidade de raciocínio quando ela apertou mais ainda contra meu corpo, passando a mão pelo mesmo de maneira que me deixasse incrivelmente arrepiado e animado.
Eu quase podia dizer que ela estava desesperada por aquilo, mas acredite, eu estava mais. A ajudei na remoção de minhas roupas, ficando completamente nu, enquanto ela ainda estava naquele vestidinho que tanto me fez delirar durante a noite toda. Não tive dó em tirá-lo o mais rápido possível, a deitando na cama enquanto jogava seu sutiã para longe. Seus seios saltaram para fora e aquela visão me deixou mais duro do que já estava. Fiz uma trilha de beijos até apalpar seu seio direito enquanto dedicava minha boca ao esquerdo. Lambi, suguei e mordi seu mamilo de maneira provocadora, sentindo puxar meus cabelos. Ela controlava seus gemidos, provavelmente com medo de alguém acordar ou suspeitar de algo, mas eu não estava afim daquilo. Queria vê-la perdendo o controle, ate porque quem começou com o joguinho de provocação foi ela.
Fui descendo meus beijos por sua barriga, provocando inúmeros arrepios na garota. Sorri com sua expressão entorpecida, e aproveitei o momento de distração da garota para tocar em sua intimidade, ainda por cima da calcinha. Pressionei meus dedos em seu clitóris, com movimentos provocativos ao extremo.
- Anda logo com isso! - ela ordenou com a voz falha, e foi aí que pressionei mais.
- Você não tem o direito de pedir nada. - não desisti de toda aquela provocação, ainda investindo naquilo e recebendo um ótimo retorno - Está molhada por mim, ou por Ethan, ? - sussurrei em seu ouvido, sem tirar minha mão de seu clitóris. Ela rebolava contra minha mão, aproveitando inteiramente os meus toques - Responda, . - disse autoritário, determinado a torturá-la como troco de tudo o que ela me fez passar e sentir durante a noite inteira.
- Por você, . - ela tentou controlar a respiração antes de responder, sua voz saiu quase inaudível.
- Não ouvi direito. - abaixei sua calcinha bruscamente, conduzindo meus dedos até a entrada de sua intimidade molhada. Abri um sorriso enorme.
- Estou molhada por você, . Só por você. - ela disse alto, não se importando mais se alguém ouvisse tal revelação.
Seu líquido encharcava meus dedos e seus gemidos ficavam cada vez mais frequentes. Ela grunhia baixo, forçando o quadril e fazendo com que meus dedos entrassem ali em perfeita sincronia. Aumentei a velocidade dos meus dedos, me deliciando com todos os seus gemidos incontroláveis.
- Não ouse me provocar novamente, ouviu bem? - diminui o ritmo dos meus dedos propositalmente, ouvindo resmungos baixos e um olhar reprovador.
Seus olhos cheios de prazer tinham um efeito maluco sobre mim. Ela estava tão linda. Tão entregue a mim. Seus seios expostos roçavam em mim enquanto meus dedos trabalhavam com mais agilidade a cada segundo. Sua vagina estava completamente molhada, e a expressão satisfatória da garota me deixava mais extasiado a cada momento.
- , por favor... Me fode de uma vez. - seu pedido irrecusável fez meu pau latejar, e mantê-lo dentro da boxer se tornava uma tarefa difícil a cada segundo que passava.
- Seu pedido é uma ordem. - retirei meus dedos dali e os coloquei em sua boca, onde ela saboreou cada gota de maneira sexy e excitante.
Me ajeitei de maneira que me garantiu o total conforto da minha garota. A encarei por alguns segundos, e céus, que coisa mais linda. Demos um beijo que foi, de longe, um dos mais intensos e cheios de segundas intenções. Suas mãos quentes, pequenas e nada bobas foram caminhando pelo meu peitoral, abaixando cada vez mais. Foi a minha vez de não resistir e soltar um gemido fraco. Aquelas mãozinhas tiraram minha boxer com certa impaciência. Tateavam meu pênis latejante delicadamente, um toque insanamente suave e provocador. Seus movimentos cuidadosos quase me fizeram perder o controle. Meu bom senso foi pro beleléu quando senti suas mãos em contato com a minha glande, e antes que ela tomasse conta da situação, peguei em suas mãos de maneira brusca, as colocando por cima de sua cabeça.
Minhas mãos pousaram em sua cintura, finalmente entrando dentro dela. Tão molhada, tão linda, tão quente, tão minha. Fechei os olhos e apreciei a sensação gostosa que era estar ali. rebolava contra mim e puxava meus cabelos enquanto gemia baixo ao pé do meu ouvido. Ela me proporcionava um prazer indescritível. Meus movimentos foram aumentando, chegando até a chegar em um modo violento, porém prazeroso. Eu jamais a machucaria.
O contato era precioso. Eu puxava seu quadril com força, a fazendo me sentir por inteiro. Ela jogou a cabeça pra trás, arfando. Inclinei até chegar em seus lábios, o beijando desesperadamente e me fez ir ao céu ouvi-la gemer por entre os nossos lábios unidos. Mordi seu lábio com força, dando um tapa em sua bunda exposta. Caminhei meus dedos discretamente até chegar em seu clitóris, o pressionando com o polegar e observando perdendo todo o seu controle.
- Caralho, . - ela jogou a cabeça pra trás, mordendo os lábios e apertando os olhos com força. Ela estava quase gozando. Intensifiquei minhas estocadas, e não demorou para eu ouvir aquele gemido delicioso e aquele gozo escorrendo pelo meu pau.
Ela ignorou o cansaço e inverteu nossas posições antes mesmo que eu apreciasse o momento. Me deu um beijo rápido antes de enfiar meu volume dentro dela novamente, rebolando e me olhando diretamente nos olhos, mordendo os lábios de maneira tentadora.
Céus, ela é maravilhosa!
A sensação de pulsar dentro dela era melhor do que qualquer outra. Dei um tapa em sua bunda e a trouxe pra mais perto, estocando tudo sem nem dar a chance de respirar direito.
- Você é minha, . - disse em meio aos nossos gemidos, que a essa altura não estavam tão baixos.
Meu gozo estava próximo. Senti meus músculos contraírem, metendo mais forte na minha garota, que rebolava sem parar. Mais três estocadas e finalmente senti meu orgasmo liberado.
se deitou ao meu lado, com seus cabelos bagunçados, lábios avermelhados e a expressão cansada, porem satisfeita.
O corpo é escravo dos nossos impulsos. Mesmo sabendo que não podemos fazer aquilo, fazemos. Nós podemos tentar não cair em tentação, mas então, novamente... Caímos.
- O que acontece agora? - ela quebrou o silêncio que se instalou enquanto recuperávamos nosso fôlego.
- Quero que você saiba que no fim do dia, quando eu olho pra você, é como se o peso do meu dia sumisse. - levantei o corpo, ficando um pouco mais alto e por cima do de , a olhando diretamente nos olhos. Aquilo parecia estar preso na minha garganta há anos, e finalmente dizer foi um puta alívio. E uma puta verdade também.
- Dizem que as melhores coisas acontecem quando a gente menos espera. Eu não esperava você. - ela respondeu pausadamente, tentando lutar contra o cansaço, atenta a cada palavra que dizia. Tentei pensar em uma resposta à altura. Algo que a marcasse. Algo que, mesmo quando eu, de fato, me afastasse, ela se lembraria com carinho. Eu queria deixar claro que gostaria de estar com ela o tempo todo.
- , eu...
- Por que é tão difícil me deixar segurar seu coração? Eu não vou levá-lo longe e nem deixá-lo cair, eu juro! - ela dizia com a maior sinceridade do mundo, com certa angústia, querendo me passar certeza do que estava falando. Oras, ela nem precisava se esforçar, aqueles olhos não mentiam.
- Eu não posso te responder isso. Eu não consigo. - pensamos tanto sobre o que dizer e nos calamos que, no final, o que realmente falamos é o que menos nos representa. Respondi porcamente, observando o olhar decepcionado da minha garota se formar. Mal sabia que aquilo estava me matando por dentro.
- Isso é uma pena. Eu adoraria se déssemos certo, apesar de tudo. Agora vou aproveitar enquanto ainda te tenho ao meu lado. - ela abriu um sorriso fraco, me aproximando e encostando a cabeça em meu peito, me abraçando de lado com a maior intensidade que conseguia.
Queria ser capaz de desistir de tudo. Queria ser capaz de me livrar dessa sede de vingança e seguir minha vida pra frente. Adiante. De uma vez. Mas algo me prendia. Alguém me prendia. Não era só uma vingança, e sim, uma necessidade de acabar com Richard e o fazer pagar por todo o mal que ele já causou, e infelizmente, isso me impedia de manter por perto. Era perigoso demais, e a última coisa que ela precisava em sua vida era isso.
Eu me tornei uma pessoa extremamente cautelosa, tanto que, me fechei em todos os sentidos. Me apaixonar nunca esteve em meus planos. É preciso um certo tipo de maturidade que eu ainda nem mesmo compreendia. Eu blindei meu coração, simples assim. A grande surpresa foi que o tiro que disparou foi forte o suficiente para essa tal blindagem simplesmente não funcionar.
Não, não estou apaixonado. Não estou disposto a desistir de tudo por .
Mas eu queria.

Ela não estava deitada ao meu lado. Ouvi diversas vozes, deduzindo rapidamente que todos já haviam acordado. Olhei para o meu celular com certa dificuldade por conta de todo aquele brilho, notando que já havia passado das três da tarde. É, a noite foi bem longa.
Me arrependi segundos depois de levantar, já querendo deitar e dormir novamente. Criei uma falsa coragem e saí chutando o que estava jogado pelo quarto, abrindo a porta e dando de cara com passando pelo corredor. Ela deu um sorrisinho fraco, não me dando chance de dizer qualquer coisa. Tentei ignorar o incomodo que tentava me dominar, descendo as escadas e me juntando a todos para o café da manhã. Ou da tarde.
- Acho que passei dos limites. - Chloe massageava a testa, notando-se de longe que ela estava de ressaca.
Ninguém teve a ousadia de dizer uma palavra sequer enquanto comíamos, e não era pra menos, certo? Estávamos acabados.
- Tenho uma coisa engraçada para contar pra vocês. - Jackson quebrou o delicioso silêncio que nos acompanhava em nossa refeição. Alguns resmungaram, mas ele garantiu que valeria a pena ouvir tal coisa - Eu e somos irmãos. - abriu um sorriso enorme, me encarando e tentando segurar o bendito riso. Eu não esperava por aquilo, mas também precisei me conter para não rir das expressões que se formavam assim que assimilavam a bomba que ouviram.
- Não teve graça, idiota. - Callie jogou um pedaço mínimo de sua torrada, revirado os olhos e não acreditando no que seus ouvidos ouviram.
- Ele não está mentindo. - me manifestei sério, engolindo o riso porém tentando não rir dos queixos que estavam caindo no chão em surpresa, ou seja lá o que fosse aquelas expressões.
- O QUÊ? - gritou, e todos deram um pulinho de susto e incomodo.
Eu e Jackson nos divertimos com todos falando ao mesmo tempo. Pareciam que tinham levado algum choque, pois toda a preguiça e mau humor sumiram em segundos.
- Digamos que minha mãe pulou a cerca. - Tuck revelou divertido, caindo na risada junto a mim.
Somos apegados ao passado e nossa insegurança com o futuro é gigante. Mas a vida te dá certas surpresas no meio disso tudo, mas ainda assim, esquecemos de viver o momento. Esquecemos de apreciar uma longa gargalhada ou o momento em geral. Apenas vivemos certas situações onde nos esquecemos de realmente aproveitá-lo. Mas com eles, meus amigos... O presente, o momento, se torna tão bonito que uma das minhas certezas é que valerá a pena ser relembrado.
Após Tuck dar um grande toque de humor na história e explicar tudo, cada um tentou assimilar a verdade enquanto arrumava sua mala para a voltarmos para casa. A moleza acabou.

***


Horas de viagem e horas de cansaço. Jackson deixava cada um em sua casa, mesmo todos dizendo que não era preciso. Ele era, de fato, uma pessoa gentil. E o melhor? Ele não teve medo da mudança brusca em sua vida, nem mesmo tentou evitar. Ele não se importou se perderia toda a popularidade, os supostos amigos, as garotas... Ele se entregou à pessoa que tinha dentro dele. A sua melhor versão.
desceu do carro junto ao primo, e antes de entrar em sua casa ela deu, de longe, o olhar mais magoado que já tivera dado.
Acho que já posso substituir a expressão "soco no estômago" pelo sentimento que realmente me atingia. Uma pontada no coração. Seu olhar me dizia tanta coisa, e vê-lo machucado daquele jeito só me dava vontade de gritar e resolver essa merda toda.
- , acho que já estou no meu direito de pedir que você me explique seu lance com . - Tuck me acordou dos meus pensamentos, pedindo com uma ligeira esperança. Ele sentia certa insegurança comigo. Estava óbvio seu medo de que uma hora eu me revoltasse e cagasse para o fato de que somos irmãos.
- Não tem nada para explicar. - essa foi a resposta mais cínica que eu podia dar. Nem mesmo me importaria se levasse um soco como resposta. Eu realmente não estava no clima para falar sobre .
- Eu já esperava por essa resposta, irmãozinho. Mas vamos lá... A coisa mais excitante e poderosa que pode acontecer em sua vida é se apaixonar. É a coisa mais fácil de fazer. Quando você se obriga a negar isso, ou tenta, de todas as formas ignorar o sentimento, é quando dói mais ainda. No fundo, bem no fundo, todos nós queremos ser amados e felizes, mas nós simplesmente nos tornamos especialistas em sabotar a nossa própria felicidade, caçando mil e um motivos para não mergulharmos de cabeça no amor, mas depois, quando a culpa se estabelece, nós pioramos as coisas.
- O que você quer dizer com isso tudo? - franzi a testa, surpreso com todo aquele discurso que eu podia jurar que já estava pronto em sua cabeça.
- Vai se foder, né?! Não vou responder o óbvio.
- Você está insinuando que eu estou apaixonado?
- Não, estou tendo certeza que você está apaixonado. Tenho dois olhos que enxergam muito mais do que você imagina, irmãozinho. Mas se serve de consolo, é um mistério como nos apaixonamos, mas as a gente se apaixona. Acontece com todo mundo. - Tuck deu um sorriso maroto, tranquilo ao extremo enquanto eu estava pronto para chuta-lo de seu próprio carro por ter uma certeza tão grande. Como é que eu deixei isso tão óbvio?
Opa.
Espera aí.
Como eu posso pensar isso? Como eu posso deixar óbvio algo que eu nem entendo que sinto?
- Eu não estou apaixonado. - me defendi rapidamente, torcendo mentalmente para chegarmos logo em minha casa e encerrar com o papo que estava me deixando mais confuso que tudo.
- Ta ta ta. - respondeu impaciente, gargalhando alto e me olhando com certa indignação.
- Não me responde de qualquer jeito não. Eu sou mais velho, lembra? - bufei, entrando no clima de todo o seu bom humor.
- Bla bla bla. - ele continuou, e não nos aguentamos e caímos na gargalhada. Ter um irmão não estava sendo tão ruim.

Minha maior surpresa foi ver Dan estava em casa com a minha mãe. O olhar dela brilhava ainda mais ao me ver, totalmente empolgada com todas as novidades que eles compartilhavam, e fazia de tudo pra me colocar no meio, perguntando como foi a viagem e tudo mais. Meu pensamento estava longe, mas tal momento me parecia único. Um momento inteiramente feliz, onde nem mesmo Dan parecia ser o homem que era. Ali, éramos todos... família.
's POV end


A madrugada é meu momento preferido. É quando chega o silêncio absoluto, o escuro, a queda de temperatura, e a sensação de ser a companhia mais agradável pra si mesma te invade. E pensar que quando era pequena, tudo isso me assustava...
É o momento onde tudo ou nada importa. É quando viajamos sem sair do lugar, quando sensações incrivelmente estranhas te invadem, quando você sente clareza pra pensar e planejar certas coisas... Oh, tanta coisa a madrugada já viu de mim, tristezas e alegrias nos seus ápices. Chega a ser engraçado. Em meio a todo esse silêncio que talvez, certas pessoas o considerariam perturbador, é de onde surge ideias e decisões. Claro que tem aquele arrependimento enorme quando o despertador toca de manhãzinha te lembrando que a vida não para, mas, esses momentos são únicos. Enquanto a cidade dorme, minha mente acorda mais elétrica do que nunca. E, então, chega o momento onde preciso pensar no que realmente precisa ser pensado.
.
A única coisa que eu queria, era convencer meu coração que nunca sentiu nada. Ignorar todos esses arrepios, sorrisos, sensações que ele me causa. É uma angústia tão grande. Uma vontade de gritar, me jogar, cair, espernear, arrancar minha própria pele. Ele me deixa assim, maluca!
Eu tentei não me atingir. Eu tentei ignorar o máximo que pude, mas toda a raiva e tristeza explodiram dentro de mim. Para uma relação dar certo, ir para frente, existe muito mais coisas envolvidas do que a gente imagina. E para dar certo, os dois precisam estar dispostos. Os dois precisam fazer de tudo. Os dois precisam abrir mão do orgulho, dos segredos... Eu fiz a minha parte. Foi difícil, mas eu consegui. Eu dei espaço para todos que quiseram entrar na minha vida, e a única pessoa que eu deixei entrar também, literalmente por inteiro, é a pessoa que faz com que eu me sinta um lixo. Eu ganhei varias pessoas novas, uma penca de amigos, e eu estava permitindo que apenas UMA estragasse tudo.
Não, não e não. Não mais, não de novo.
O trabalho duro estava sendo feito há meses e eu não podia jogar tudo pelo lixo. Eu ganhei muita coisa boa e precisava focar nisso.

***


- Eu fico revoltada com essas coisas! Quem aquele professor pensa que é? - Callie batia as mãos no armário incansavelmente, ainda revoltada com o teste surpresa de geografia, o qual, não vou mentir, eu amei.
- Ahmm... Nosso professor?! - retruquei com o tom de voz obvio, a tirando mais do sério ainda.
- Você está tão diferente hoje! O que aconteceu? - ela finalmente desistiu de bater no pobre armário, se sentando no banco de madeira que havia ali.
Tínhamos acabado de sair do treino, soadas e fedidas. Brincadeira. Tive alguns segundos pra assimilar a pergunta de Callie com tudo que tinha acontecido. Eu realmente estava diferente, porém de um jeito bom. Encarei o desafio diário que era a sobrevivência, e com isso, veio um bom humor que até mesmo me surpreendeu. Olha, pra ser bem sincera... com bons amigos e determinação, qualquer um pode ir longe! Sim, claro, tem um longo caminho pela frente e sempre devemos tomar cuidado com as recaídas, mas eu estava me sentindo incrivelmente estranha. Também num bom sentido. Eu tranquei o que me fazia sentir e joguei a chave fora.
Ou talvez só a tenha guardado.
Mas isso não importa. Eu precisava trabalhar em mim mesma, por mim, pra mim.
- Eu acordei determinada, só isso. - respondi leve, com um sorrisinho no rosto. e Chloe saíram do vestiário, se juntando a nós no corredor.
- Determinada em relação a o quê? - Chloe perguntou perdida, se intrometendo e tentando acompanhar a conversa.
- A muitas coisas, inclusive, cooperar com a tarefa de me afastar de . - ignorei o pequeno incomodo que tentava me atingir ao responder. Eu realmente estava disposta a cooperar. Sério.
- Caraca, você disposta a ficar longe do rapaz que gosta enquanto eu estou aqui tentando assimilar o fato de ter dito que amo o . - Chloe riu sem graça, e eu nem mesmo consegui debater sobre ela ter dito que eu gostava de .
arregalou os olhos em surpresa, e Callie, por incrível que pareça, também.
- E o que ele disse? - perguntou rapidamente, curiosa ao extremo.
- Ele me beijou.
- E você não está incomodada por isso?
- Eu disse o que sinto, e se ele não está pronto pra dizer o mesmo, eu posso esperar. Nós dois estamos nos esforçando muito pra fazer isso dar certo. - ela respondia serena, realmente tranquila e com nenhum indício de incomodo.
- Lembro quando disse que amava o pela primeira vez. Passou tanta coisa pela minha cabeça. Eu pensava que podia ser loucura já que eu sou tão jovem e não entendo muito da vida, mas quando você se dispõe a aprender junto com outra pessoa, você não tem dúvidas de que é amor. - Callie se manifestou feliz, com a mão no coração e um típico olhar de boba apaixonada.
Um tiro na cabeça seria apropriado no momento. Falar sobre amor nunca foi um dos meus assuntos favoritos.
Por sorte os garotos saíram do vestiário, vindo em nossa direção. não ficou por muito tempo, se despedindo com um simples aceno. Idiota. aproveitou a oportunidade e deu o fora dali, e não hesitei em ir atrás da minha amiga.
- Você não gostou de saber daquilo, né? - me senti um tanto quanto estupida ao fazer tal pergunta, pois nem precisava de resposta. andava o mais rápido que podia e eu tentava acompanhar, não demorando em chegarmos a sua casa.
- É loucura! Eu ajudei a basicamente tomar coragem para terminar com Chloe e agora ela diz que ama ele? E o pior é que agora que ele não termina mesmo! - ela andava de um lado para o outro, claramente desesperada. Eu não sabia o que aquilo significava.
- , calm...
- Eu não quero ver meu melhor amigo preso num relacionamento que ele não quer estar. Ele é o meu melhor amigo, ! - ela finalmente se sentou, colocando as mãos na cabeça e largando o corpo no sofá, ainda apreensiva.
- Você tem certeza que você está assim só porque ele é o seu melhor amigo? - quase doeu fazer a pergunta de tão sem graça que fiquei.
- Não complica mais. Hoje não. - suplicou, arrancando um pedacinho do meu coração.
- Foi tudo certo pra dar errado. - disparei, refletindo se tal frase era sobre o que estava passando, ou se era sobre mim.
- Pronto. Acabou. Vamos dançar. - ela levantou aparentemente renovada, como se fosse outra pessoa. Eu estranhei por alguns segundos, mas me lembrei sobre sua loucura em dançar em momentos malucos.

- Essa comida está uma delícia! Você deveria aprender com sua mãe, . - não perdi a oportunidade de provocar minha amiga, que me lançou um olhar indignado, e se pudesse, provavelmente quebraria o prato na minha cabeça.
Jantar com os pais de e com Sophia não podia ser mais divertido. Cada um tinha sua própria essência, e quando misturados... Só coisa boa. Ajudei a tirar a mesa, e não demorou para que eles subissem para dormir. Deus que me livre de dormir às dez da noite. Também não demorou para a campainha tocar, e meus olhos reviraram quando a porta revelou quem eu já sabia que era.

's POV
Ela nem mesmo tentou disfarçar o incomodo de me ver ali. Estava sendo um jogo de quem conseguia ignorar o outro por mais tempo.
Sem a parte do "jogo".
- , melhor eu ir andando. - juntou suas coisas, já se despedindo da amiga com um beijo no rosto, um abraço apertado em Sophia e um olhar vazio para mim. Justo.
A porta bateu, anunciando a ida da minha garota. Merda.
- Você quer jantar? - perguntou sem jeito, claramente sem graça por ter presenciado algo tão desagradável.
- Depende, quem fez a comida? - brinquei, e a garota bateu o pé como uma criança, dizendo que sabia, sim, cozinhar.
Não demorou para aparecer um prato com uma generosa quantidade de comida ali, e a garota aproveitou para se sentar na cadeira ao lado.
- Às vezes você não percebe que a melhor coisa que aconteceu a você está bem debaixo do seu nariz. - lançou-me um olhar decepcionado, e até soltei o garfo, sentindo meus ombros caindo em derrota. A última coisa que eu queria era conversar sobre .
- Eu não quero falar sobr...
- Não estou me referindo a você d , e sim, a mim. Estou confusa, . - dessa vez foi um olhar quase que debochado, se não fosse pela pitada de decepção que ainda o habitava.
- Espera aí, confusa em relação a quem? Jackson? - segurei o riso, e sua fúria se manifestou quando ela me deu um tapa até que forte no braço. Meu celular tocou, anunciando uma mensagem nova. A voz de sumia aos poucos enquanto meus olhos liam aquele absurdo.
"Estou pensando em ter uma conversinha com ela novamente. O que você acha?"
Embaixo, havia uma foto de andando na rua. Eu não acreditaria se não fossem as mesmas roupas, a mesma mochila, e também a mesma beleza, mesmo que fosse de costas. Em um extremo curto espaço de tempo, minha cabeça ligou uma coisa a outra. Se Richard estava a pé, provavelmente algum capanga estava por perto de carro, o que significava que ele realmente podia fazer algo com .
Não pensei duas vezes antes de correr para o carro, deixando e minha irmã ali sem dar qualquer explicação.
A vida parecia não ter valor nenhum. Qualquer um que quisesse podia te infernizar da maneira que desejasse e poucas pessoas te ajudariam por conta do medo. A vida é frágil, mais do que imaginamos. Tudo o que temos, é o agora. O agora que eu me recusava a ter com para protegê-la.
Nada parecia fazer sentido ou adiantar. Meu esforço parecia ser em vão.
Meu pé não saía do acelerador, fazendo o exato caminho até chegar onde a foto indicava. Avistei andando com certa pressa, enquanto uma moto com duas pessoas a seguia lentamente.
Desgraçado.
Pisei fundo, não sendo nenhum pouco discreto na minha chegada. A pessoa que dirigia a moto acelerou, enquanto eu desacelerava e parava o carro em frente à calçada onde estava, que percebeu rapidamente que eu estava no local. Saí do carro às pressas, indo ao seu encontro e me certificando que ela estava bem e intacta.
- Eles fizeram algo com você? - peguei em suas mãos, passando por seus braços e subindo até seu rosto, onde pousei minhas mãos e me certifiquei que ela não tivesse um arranhão sequer.
- Eu... Eu percebi que estava sendo seguida mas... Eu não sabia o que fazer. Eu não consegui nem correr! - ela gaguejava e tremia, ainda em choque.
A ajudei a entrar no carro, onde ela deixou algumas lágrimas escaparem. Ela não parou de tremer por um segundo, e todo aquele nervosismo estava me matando.
- , eu sei qu...
- Foi seu pai de novo, não foi? - perguntou pausadamente, sem me olhar, limpando uma lágrima que insistiu em sair de seu olho.
- Foi.
O peso da derrota. A sensação de falha. O momento se girava em torno disso. A raiva de tudo que Richard fazia com ela.
Eu não estava autorizado a mentir num momento desse.
- Se seu trabalho era me proteger, você foi péssimo. - foi a última coisa que ela falou antes de sair do carro, entrando em sua casa totalmente sem jeito, ainda nervosa.
Merda, merda, merda.
O barulho de mensagem novamente.
"Agora será que você me entende? Mulheres apenas tiram o foco do que realmente queremos."

Capítulo 27


"Você pode aparecer com os planos que quiser, mas no fim não faz a menor diferença. Coisas acontecem."


Existem duas tragédias na vida: uma é perder o que o seu coração deseja. A outra é conseguir e ver que não é o suficiente. Digamos que, o tanto que eu ganhei recompensou o que eu perdi. Ou pelo menos era nisso que eu gostava de acreditar. Eu jamais recuperaria todo o tempo que perdi fazendo basicamente tudo errado. Bem, antes tarde do que nunca.
Três semanas se passaram. Três semanas sem trocar uma palavra sequer com . Pra ser honesta, eu nem sabia como havia conseguido ser tão firme.
Mentira, eu sabia sim.
Acontece que quando você enxerga que é a única pessoa que se esforça para que um relacionamento, amizade, ou seja lá o que for, funcione, você cansa. Não, cansada não é a palavra. Não pra mim. Eu meio que... esperei as coisas esfriarem, porém, esfriou demais. Não contei para ninguém sobre o ocorrido que me fez pegar uma grande quantidade de raiva de e me posicionar sobre o que realmente deveria fazer. Posso até dizer que fiquei feliz pelas coisas terem esfriado, porque francamente... ô garoto complicado!
Ok, talvez eu tenha mentindo um pouquinho. Existe uma dorzinha no lado esquerdo do meu peito. Uma falta dele, que me maltrata todo dia. Aquilo que ele não sente. Saudade.
Nos vemos todos os dias, mas se torna torturante não poder trocar uma palavra, um toque, um beijo. Engraçado, não?! Parece que só gostamos do que não podemos ter. Todo mistério de com o pai se tornou desgastante pra nossa relação, que nem mesmo era uma relação. Terminou antes mesmo de começar.
A princípio, todo o seu mistério me deixou tão curiosa que eu quis me afundar nisso. Mergulhei no lugar mais raso do mar, dando de cara com a areia. me parecia tão interessante, mas agora ele só parecia... vazio. Não posso ser hipócrita e dizer que não sinto nada, mas também não posso ser burra para gostar por dois.
Ai meu Deus.
A aceitação. A fase de aceitar que, infelizmente, meus sentimentos por eram e ainda são mais intensos do que deveriam. Não houve limites ou barreiras. Só aconteceu.
Deus, como isso é complicado!
Três semanas que ocorreram algumas coisas. Conseguimos conciliar que e Jackson eram irmãos.
Mentira, eu não consegui. Toda a curiosidade rondava pela minha cabeça de maneira absurda. Jackson apenas havia contado que sua mãe traiu seu pai com o pai de , sem muitos detalhes, mas com muita palhaçada, o que foi o suficiente para deixarem todos desfocados e aceitarem aquilo numa boa. Mas claro que tinha uma história muito maior por trás, a qual eu daria tudo pra saber. estava cada dia mais perdido em relação à Chloe. passava a maior parte do seu tempo com Jackson e , e aquilo me dava certo incômodo. Ela simplesmente conseguia se aproximar de qualquer um a qualquer momento, conseguindo um retorno incrível. Juro, estava até me irritando. Estava mesmo, de verdade.
mal conseguia abrir a boca quando estava comigo, mas quando estava com ela, era difícil mantê-la fechada.
Olha, vou te contar...
- Ei! O que houve? - a voz confusa de me despertou. Restava apenas nós no corredor que dava entrada á quadra, onde teríamos nosso treino.
- Nada, eu apenas pensei demais.
- ? - perguntou direto, com uma sobrancelha arqueada e um olhar de quem, no fundo, sabia que o garoto rondava em meus pensamentos.
- . - afirmei, me sentindo completamente derrotada.
- Semanas se passaram e vocês nem trocaram uma palavra sequer. Todos entendem o quão fechada você é, mas se você quiser, eu estou aqui pra você, . - abriu um sorriso agradável, passando o braço pelo meu pescoço, e começamos a caminhar até entrarmos ali.

Como sempre, cansativo.
Eu podia sentir todos os meus músculos suplicando por uma bela cama. Os garotos teriam jogo no sábado, o que significava que daríamos nossos pulinhos em uma escola por aí.
- Vocês não querem ir lá pra casa? - perguntou afobada, ainda se recuperando de todo o esforço que teve de fazer.
- Hoje não. Vou estudar. - a mentirosa estava de volta, mas uma mentirosa do bem. Eu não estava nenhum pouco a fim de ir pra casa de , e eu realmente precisava estudar. Foi uma mentira que se tornaria verdade. Claro que, houve certa desconfiança da parte dela, mas dei o meu melhor para convencê-la de que eu ia, de fato, estudar. E ia mesmo.
O caminho pra casa até se tornou curto pela rapidez que eu o fazia. Eu tentava me livrar daquela maldita insegurança, mas estava sendo mais complicado que o imaginado. Ninguém sabia, e eu apenas tinha que lidar do meu jeito.

***


Três semanas e cinco dias. Nada mudou.
- Ei, tire a mão daí! - Callie esbravejou, exigindo que não tocasse nos cupcakes que nós tínhamos acabado de decorar.
Estávamos na casa de , e a ideia dos cupcakes veio de ninguém menos que . Digamos que esses dias estivemos um tanto quanto... afastadas. Mas não só dela, e sim, de todos. Foram dias simplesmente terríveis, e ao mesmo tempo, não. Pensar muito nem sempre é bom, e foi o que eu mais fiz. Me perguntei inúmeras vezes se tudo ainda é absoluto. Se ainda existe o certo e o errado; bom e ruim; verdades e mentiras. Tudo é negociável, deixado aberto à interpretações. Às vezes as pessoas escolhem transformar a verdade. escolheu esconde-la. Foram dias tentando lidar com a raiva que a cada dia crescia.
Mais uma vez, meus pensamentos estavam tomando conta de mim. Observei brevemente a todos que estavam conversando e se divertindo. gargalhava alto, mas nós sabíamos que por dentro, ele estava desesperado por ainda não saber lidar com todo o lance com Chloe. , Jackson e ... eu já nem sabia o que pensar, apenas tinha um enorme certeza que algo rolava entre os três. Apenas os três. Caminhei até o quintal, onde Duke veio ao meu encontro animado, abanando o rabinho. Ele já não era mais o filhotinho que era quando o conheci, mas ainda assim cabia tranquilamente em meu colo.
Foi o quintal onde toda a confusão começou, onde a mentira que havia contado, foi revelada.
O cachorrinho se divertia com o carinho que estava recebendo, dando inúmeras lambidas em minha mão como agradecimento. Eu gostaria muito de poder trocar de lugar com Duke às vezes.
- Está tudo bem? - a voz arrastada e calma de tomou conta do lugar. Ela me olhava com serenidade, encostada na parede, esperando por uma resposta.
- Uhum.
- , o que está acontecendo? - ela tomou a liberdade para se aproximar e se sentar ao meu lado, com um olhar firme e sério. Era a hora da verdade, não estávamos para brincadeira.
- Às vezes eu sinto vontade de dar uma porrada na sua cara. Você conseguiu tudo o que eu queria. - esbanjei a verdade de uma vez, e uma expressão confusa tomou conta de seu rosto.
- Do que você está falando?
- Você se aproxima de alguém e puft, consegue tudo. Consegue entrar na vida dela sem problema, e sabe, isso me deixa um pouco chateada. Todos sabem que você é a mais simpática, a mais calminha, a mais defensora, mas eu tento ser alguém melhor todos os dias e eu sinto que isso não importa porque eu não ganho o retorno que gostaria. Às vezes eu simplesmente queria ter a sua sorte. Você é... perfeita. - bufei, finalizando com um olhar significativo. Eu me sentia mal por estar sendo basicamente uma invejosa, mas não podia mais guardar aquilo. Ela perguntou e eu respondi, simples assim.
- , você tem noção do quanto eu te admiro? Apesar de tudo, você sempre salvou a si mesma. Você não procurou pela mão de outra pessoa e se levantou sozinha. Ainda assim, isso não te faz perfeita, e também não me faz. Eu entendo toda a sua decepção em relação ao , mas sabemos o quão complicado ele é. Nem ele se entende às vezes, eu juro. - ela me lançou um olhar doce e inocente, lotado de sinceridade. Droga, é impossível ficar com raiva dela por muito tempo.
- , o pai dele veio atrás de mim novamente há três semanas. E sabe o pior? Ele não teve a coragem de me dar uma explicação. Ele simplesmente se recusa a se abrir, e eu me recuso a permanecer numa relação como essa. - fiz aspas com as mãos ao dizer "relação", o que foi levemente engraçado, mas ela arregalou os olhos assim que assimilou tudo.
- Eu não sabia! Naquele dia ele saiu voando da minha casa depois que recebeu uma mensagem, mas ele não quis abrir o jogo de jeito nenhum!
- Eu estou farta disso, de verdade. Eu meio que... desisto. - e novamente, um incômodo que eu fazia questão de ignorar. Eu precisava desistir, mas a droga do meu coração queria exatamente o contrário. Como é trouxa.
- Vocês tentaram e falharam, mas nenhum parou de pensar no outro, e se ambas as partes estão desse jeito, é porque, obviamente, ainda tem algum sentimento aí dentro. - ela apontou para o meu coração, que se acelerou só de ouvir tamanha verdade. Merda, merda, merda!
- Eu estou cansada. - sussurrei, apertando os olhos com força.
- Vai ficar tudo bem. - encostou a cabeça ao lado da minha, também fazendo um carinho gostoso em Duke, e eu podia jurar que o cachorrinho estava sorrindo já que seus dentinhos estavam a mostra.
- E você e Jackson? Tem algo rolando e eu sei. - me atrevi a fazer uma das perguntas que me despertava uma curiosidade gritante.
- Esse é um assunto mais delicado do que você imagina, . - mordeu o lábio inferior, visivelmente aflita.
- E você não pode contar, certo? - arqueei uma sobrancelha, já tendo certeza da resposta que eu receberia.
- Não, mas eu gostaria. É uma coisa do Jackson, e somente ele pode contar. Me desculpe. - ela claramente esperava compreensão, e por sorte, ela conseguiu. consegue ser fiel a cada amigo de maneira única, e com isso, qualquer rastro de raiva ou incomodo que ela me causou durante a semana, sumiram rapidamente.
Voltamos para a sala, onde todos já haviam atacado grande parte dos nossos cupcakes. O cheiro estava ótimo, porém enjoativo. Como sempre, não faltou risada e diversão, exatamente tudo o que eu estava precisando.

***


Mais um jogo, Ravens contra os Buccaneers. Nem preciso dizer quem ganhou, certo? Foi de longe, um dos jogos mais fáceis e tranquilos para os garotos, porém, o cansaço era o mesmo, tanto deles, quanto o nosso.
Combinamos de comer num restaurante novo que tinha aberto no bairro assim que voltássemos do jogo, e assim foi. Nem mesmo nos trocamos, apenas pegamos os carros que haviam ficado no estacionamento da escola. Claro que, agora que Jackson fazia parte da turma, possuíamos um carro a mais, deixando apenas eu e Callie no carro com , ou seja, eu controlava o som e não tinha ninguém para reclamar tanto quanto antes.
Não demorou a chegarmos, e resmungava impaciente enquanto caminhávamos até a entrada do restaurante, que parecia ser bem aconchegante, mas Jackson parou para atender o telefone.
- Como assim no hospital? O que aconteceu? - ele gritava sem se importar. Tal ligação mexeu tanto com ele, que mal parecia o Jackson brincalhão que era. Foi como se aquilo tivesse sido o suficiente pra tirar todo o seu brilho.
- O que aconteceu? - correu até ele, com os olhos arregalados e a pior das expressões.
Foi quase que uma cena de filme. Jackson entrou no carro de às pressas, falando algo para antes de acelerar para longe. Nos entreolhávamos confusos, sem reação. estava com os olhos marejados, e a única coisa que fizemos foi abraçá-la mesmo sem entender a situação.
- É a mãe do Jackson. Precisamos ir para o hospital. - ela finalmente conseguiu formar uma frase completa sem gaguejar, jogando a chave do carro de Jackson para , que entendeu o recado e entrou no veículo rapidamente.
dirigia rapidamente, e não demorou para chegarmos ao Carolina's Medical Center, onde nos sentimos perdidos de verdade. Nenhum sinal de Jackson ou .
- , o que está acontecendo? - Callie questionou nervosa, assim como todos nós.
- Ei! - surgiu na recepção, sendo recebido por um abraço apertado de , que foi incrivelmente bem retribuído. Bem retribuído mesmo!
Ok , não é hora pra isso.
- A mãe do Jackson, ela... - se soltava do abraço aos poucos, nos encarando visivelmente sem jeito, olhando para como se fosse um pedido de socorro.
- A mãe do Jackson tem câncer de pulmão. Agora, ela tem três meses de vida. Ou tinha. - ele finalizou rapidamente, se virando novamente e andando de um lado para o outro. Ele estava irritado.
De repente, foi como se toda a minha vida fosse algo pequeno. Eu me senti imensamente egoísta por todas as vezes que desejei a morte, enquanto a mãe de Jackson estava, de fato, morrendo de uma das piores doenças que existe.
Não gostamos de perder, e a morte parece uma perda. A morte é simplesmente ridícula, ou te leva rápido, ou te faz sofrer antes que você morra de vez. A morte é... escura. Saber que vamos perder tudo o que conquistamos, ou que poderíamos ter feito mais durante a vida deve ser, de longe, uma das piores sensações desse mundo.
É assim que você enxerga que deve algo a vida. Você deve aproveitar cada segundo. Você deve fazer valer a pena antes que a escuridão te pegue.
Nos acomodamos nas poltronas da recepção depois de assimilarmos toda a revelação que havia caído sobre nossas cabeças. Eu me sentia inquieta, levantando e sentando de cinco em cinco minutos, recebendo alguns olhares tortos pela roupa de líder de torcida que ainda estava usando. Eu queria me livrar do sentimento de egoísmo que estava impregnado em meu ser.
Chloe se ofereceu para ir até a lanchonete do hospital, deduzindo que todos estivessem com fome já que antes de estarmos ali, enfrentamos um jogo que exigiu muito das nossas forças. Me juntei a ela para ajudar a trazer tanta coisa, afinal, o grupo é grande. A variedade de lanches e bebidas da lanchonete era imensa, mas acabamos pedindo algumas mini pizzas, coisa que ninguém recusaria.
O cheiro da pizza de queijo foi agradável pelos primeiros vinte segundos. Procurei pelo banheiro mais próximo, segurando o vomito que eu sentia que sairia a qualquer segundo.
- Você está bem? - Chloe correu até a porta do banheiro no mesmo instante, com os olhos arregalados e uma expressão enojada. Convenhamos que não era algo agradável de se ver.
- Estou. O cheiro daquela pizza virou meu estômago. - dei descarga, me livrando de vez daquele vômito repentino. Passei uma água no rosto, me recuperando do ocorrido. Encarei-me por alguns segundos no pequeno espelho que havia ali, sentindo algo estranho tomar conta do meu corpo. Algo que eu nunca tinha sentido em toda a minha vida.

's POV
Injustiça é a palavra. Julie não era uma mulher má, muito pelo contrário. Ela não merecia nada do que estava acontecendo.
Merda. O mundo é extremamente injusto.
Caminhei até a entrada do hospital, sentindo o ar fresco bater em meu rosto. Eu precisava por o pé no chão e pensar no certo a se fazer. Precisava estar pronto para tudo, inclusive para amparar Jackson.
Quem diria, não?
- A gente sai de casa sem saber se vamos voltar. Não sabemos de absolutamente nada. Não sabemos quanto tempo ainda temos aqui, e ainda assim, perdemos nosso tempo com coisas fúteis. Julie é uma mulher muito forte e Jackson é uma pessoa incrível. Quero dizer... que diabos está acontecendo? Como a vida pode ser tão ingrata assim? - me virei ao ouvir a voz embargada de , que estava de braços cruzados e num estado totalmente desolado.
- Corremos riscos todos os dias e essa é a graça da vida, mas acredite, entendo perfeitamente seu ponto de vista.
- , a vida é tão incerta. Você sabe o que quer, mas foje do que precisa. Sei que as vezes você se esquece de lembrar o quanto a vida pode ser maravilhosa, mas isso aqui é um aviso, entende? Você não pode perder tempo. - sua voz raspava no fundo da garganta, e minha atenção se perdia em algum lugar do meu pensamento que envolvia a pessoa que estava se referindo.
- Não é hora pra isso, mocinha. - adverti, levemente indignado por ela trazer ao assunto sendo que era totalmente sem sentido.
- É exatamente a hora pra isso! Julie vai morrer e nem por isso está perdendo o tempo que ainda tem, mas e você? - ela debateu levemente indignada, limpando os rastros das lágrimas que ficaram sobre seu rosto, numa pose autoritária e... fofa.
- , você faz a tristeza ficar bonita. - sorri, me aproximando e envolvendo meu braço em volta do seu pescoço, a trazendo perto. Ela estava fragilizada, mas ainda pensava no bem da amiga. Definitivamente um anjo.
Voltamos a recepção, ainda esperando algum sinal de Jackson ou de qualquer um que pudesse nos dar alguma noticia. Era um tanto quanto estranho um bando de líder de torcida e jogadores de futebol na recepção de um hospital. e Chloe chegaram com alguns lanches e bebidas, mas se sentou rapidamente, um tanto quanto exausta. Ela estava pálida, e a minha vontade era de correr e ajudá-la. Droga.
- Ei! - Jackson deu o ar da graça, recebendo todos os abraços que tinha direito. Parecia que todos pensavam a mesma coisa, e se afastaram aos poucos quando me aproximei, nos deixando a sós.
- Em volta do pulmão dela estava cheio de exsudato. É um líquido maldito, foi isso que eu entendi. - ele disparou a falar como se me devesse tal explicação, e eu até que me senti mal por aquilo. Ele mal parecia o Jackson Tuck que todos nós conhecíamos.
- Tem algo que eu possa fazer por você?
- Minha mãe acha que a hora está chegando. O médico disse que ela vai ficar bem, mas ainda assim, ela cismou que vai morrer logo. Sei que não é fácil lidar com tudo isso, mas será que você consegue trazer sua mãe até aqui? Seria muito importante para a minha. - lançou-me um olhar dolorido, porém visivelmente aflito e nervoso, ansioso pela minha resposta.
- Eu não demoro.

***


- Câncer de pulmão, huh? - mamãe perguntou pela milésima vez em questão de minutos. Ela finalmente se sentou, passando a mão pelo rosto e tentando assimilar tudo o que acabara de ouvir.
Eu fui direto. Precisava ser. Julie corria contra o tempo e ela não podia partir sem estar numa boa com a minha mãe, mesmo apesar de tudo. Ela não merecia.
- Mãe, ela gostaria muito de te ver. - me aproximei, ficando a sua frente, observando cada detalhe da sua expressão surpresa e extremamente triste.
- Você sabe, foram anos sentindo meu coração doer tanto a ponto de me fazer querer arrancá-lo do meu peito com as minhas próprias mãos. Ter Julie presente na minha vida me ajudou tanto. Ela me ajudou. Ela... Ela está com câncer. Ela fez uma coisa horrível, mas... Deus, ela fez tanto por mim! Meu coração está doendo como nunca, mas eu não tenho tempo para desmoronar. Me leve até o hospital. - ela pediu com a voz embargada, porém com o queixo erguido, entre brava e impaciente. Eu entendia sua indignação. Essa é a vida como a conhecemos; triste e com perdas.
Não demoramos a chegar ao hospital novamente. Alguns ficaram confusos, afinal, nem todos conheciam minha mãe, mas não importava no momento. Sophia se sentia perdida, apertando minha mão e me encarando confusa conforme andávamos por ali. Ela sempre detestou hospitais.
Jackson não estava ali, mas também não demorou a voltar, abrindo um grande sorriso ao notar que eu realmente tinha conseguido o que ele havia pedido. Missão dada é missão cumprida para mim, mas pra ser honesto, nem mesmo foi difícil. Peguei Sophia no colo, enquanto minha mãe e Jackson caminhavam para uma porta de acesso restrito.
Ninguém quis ir embora, e foram poucas as palavras que foram trocadas entre nós durante o resto do dia. O acontecimento deixou todos pensativos e reflexivos. Não era pra menos.
's POV end

- Bom dia, ! Você dorm... O que houve? - apressou o passo, deixando o copo de suco no móvel que tinha ao lado da minha cama, se sentando ao meu lado às pressas. As lágrimas caiam pelo meu rosto de maneira incontrolável, e os soluços não me ajudavam a formar uma frase com completo sentido.
- Eu não sei o que está acontecendo, eu só... estou me lembrando de tudo. Eu meio que desabei, não consegui lidar com o mundo por tanto tempo, e depois da noite passada esse sentimento estranho me dominou de uma maneira péssima. A mãe do Jackson está morrendo e eu estou me sentindo tão, tão, tão egoísta!
Meu coração doía de maneira imensa. Todos os meus medos pareciam estar envolvidos a minha volta. Os medos que, na realidade tem um significado a mais. O medo não é de altura, e sim, de cair. Demorei tanto pra me tocar que quando uma pessoa pensa em suicídio, ela quer matar a dor, não a si mesma. No fundo, eu nunca quis morrer, e foi por isso que as minhas tentativas foram falhas. Saber do estado de Julie realmente mexeu comigo. Foi como se eu precisasse daquilo pra finalmente cair na realidade. Mas claro, ainda tem as perguntas que parecem ser impossíveis de responder. O que mais importa nessa vida? São as coisas que criamos? As coisas que conquistamos? O mundo que ganhamos? É sobre quem somos quando falhamos? O que é mais importante; o que nos tornamos, ou como? A dor no meu coração me lembrava tanta coisa, tantas situações, tantos momentos, tantas sensações. A dor que sempre me acompanhou, mas aos poucos, se afastava cada dia mais. Mas ainda assim, é engraçado como o passado nos molda, como a pessoa que éramos nunca se afasta de quem somos. Nos assombram como fantasmas. Mas agora essa é minha vida, eu não posso abandonar isso. Eu perdi muita coisa nesse caminho, mas agora não posso perder tudo que conquistei e não vou.
- Você se surpreende ao perceber o quanto pode suportar, né?! Se sinta orgulhosa por tudo o que você passou, pois cada dia que passa, seu passado te ajuda a se formar uma pessoa incrível. - seus dedos limpavam minhas lágrimas, fazendo um carinho gostoso em meu rosto e o encostando em seu ombro. Um abraço tão bom, tão cheio de amor e carinho. Eu queria poder morar ali.

***


Estranho e tenso. Ninguém sabia ao certo como agir ou o que dizer para Jackson, que aparentemente estava normal. Se eu não soubesse que dentro de um "aparentemente normal" morava o caos, eu nem me preocuparia. Eu sentia que devia falar com ele, sentia que deveria deixar claro que estaria disponível para qualquer coisa que ele quisesse.
- Ei, posso falar com você depois? - murmurei visivelmente sem graça, após clarear a garganta para chamar sua atenção.
- Claro que pode, . Depois do treino? - sugeriu tranquilo, pegando o livro de biologia em seu armário. Tanta tranquilidade me surpreendeu. Éramos parecidos. Uma bagunça por dentro, mas aparentemente ótimo por fora.
Assenti positivamente, também pegando meu material e indo para a aula de matemática, na qual tínhamos inúmeros exercícios de média, moda, mediana, variância e desvio padrão. Nada difícil, porém trabalhoso. Surgiam-me algumas dúvidas e eu ia direto para ou , que eram muito bons em matemática. também era, mas as circunstâncias não me permitiam pedir sua ajuda.
- Mas e agora? - perguntei confusa, perdida em minhas próprias contas.
- Agora você calcula a média aritmética, se der 61 é porque está certo. - respondeu no lugar de , a pessoa que eu dirigi a pergunta. Tombei a cabeça para o lado e nos encaramos por alguns segundos enquanto eu tentava entender o que seu olhar estava tentando me dizer, mas estava complicado. Talvez ele simplesmente não quisesse me dizer nada.
- Obrigada. - sussurrei, ainda vidrada naqueles olhos azuis que tanto me encantavam, e ao mesmo tempo, me matavam.
Tentei de todos os jeitos me livrar do sentimento que aquele pequeno momento tinha me proporcionado. Eu não gostava de estar perto de sem estar, de fato, perto dele. Minha vontade era de abraçá-lo e... droga. Chega.

Ahhh, o cansaço do treino me deu uma baita fome. Eu já visualizava o momento em que eu chegasse em casa e comeria, mas antes disso, precisava falar com Jackson. Precisava mesmo!
Parei em frente ao vestiário o esperando, e não demorou para que ele saísse dali inteiramente soado. Ugh.
- Você está um nojo. - reclamei, fazendo sinal para que ele não se aproximasse tanto, mas não adiantou nada, muito pelo contrário. Jackson me deu um abraço apertado, se esfregando ao máximo e distribuindo seu suor em mim.
- Agora você também está.
- Seu porco! - grunhi brava, batendo em seu braço e arrancando algumas gargalhadas do rapaz, que foi parando aos poucos e ficando sério.
- , você quer conversar sobre o que eu estou pensando?
-Sim, mas se você não quiser eu entendo perfeitamente. - me adiantei, me sentindo extremamente invasiva.
- Vamos. - ele riu fraco e se virou a caminho da saída.
Eu não sabia aonde iríamos, mas entrei em seu carro do mesmo jeito, me preparando mentalmente para dizer tudo o que queria.
Nunca foi fácil dar espaço para pessoas novas em minha vida, mas de uns tempos pra cá, foi se tornando menos complicado. Uma coisa que eu nunca imaginei mesmo, foi estar pronta para usar a minha história como ajuda.
Jackson parou o carro em frente à melhor sorveteria do bairro. Sério, o sorvete dali foi fabricado no paraíso.
- Acho que você leu meus pensamentos. Um sorvete era tudo o que eu precisava. - sorri animada, entrando no local e me observando a diversidade de sabores que tinha ali. Optei pelo clássico de flocos, enquanto Tuck escolheu de chocolate com morango. Nos sentamos numa mesinha que dava vista para a rua, que estava tranquila.
- Minha mãe sempre me trouxe aqui. - seu sorriso se formou e foi crescendo cada vez mais, como se estivesse tendo alguma lembrança ou algo do tipo. Ele voltou a realidade após alguns segundos, se focando em seu sorvete.
- Eu passei um bom tempo querendo morrer, e fiz algumas coisas que prejudicaram meu físico e psicológico. Eu não me orgulho dessas coisas, mas sei que se não fossem por elas, eu não estaria melhorando como estou hoje. Aquele dia no hospital me fez pensar muito, foi como se eu precisasse daquilo pra me tocar que eu tenho que fazer minha vida valer a pena. Me fez perceber o quanto a vida é frágil, mas ainda assim, tem que ser vivida da melhor maneira mesmo com todos os altos e baixos. Eu aprendo a lidar com isso todos os dias, e eu quero que você saiba que eu estou aqui pra qualquer coisa que precisar, Jackson. Qualquer coisa mesmo. Sei como é se sentir sozinho e desamparado, e eu não quero que você sinta isso. - senti uma alegria descomunal me invadir, sentindo uma espécie de peso sair das minhas costas. Falar sobre toda essa libertação me deixava mais livre ainda. Eu me sentia feliz por estar disponível a ajudar alguém me usando como exemplo.
- , lembra quando eu disse que sentia que você faria diferença na minha vida? - assenti rapidamente, ansiosa para ouvir o resto - Eu fico feliz por ter estado certo. Obrigado por isso, de coração! - soltou sua tigela de sorvete e pegou em minhas mãos, as apertando carinhosamente.
- Quem diria, não?! Você sempre encheu meu saco e agora estamos aqui, assim. - passei as mãos pelo rosto, ainda sem acreditar que tal momento estava acontecendo de verdade.
- A vida é mesmo uma loucura, cunhadinha. - ele deu uma piscadinha marota e gargalhou enquanto eu rolava os olhos e jogava a cabeça pra trás.
- Será que podemos não falar de ?
- Você quer falar sobre a minha mãe com câncer ou sobre meu irmão? - arqueou uma sobrancelha como se estivesse me desafiando.
- Eu não sou sua cunhadinha.
- Vocês são tão bobos. Perdem tempo a toa.
- Ei, não é culpa minha. Eu fiz o que pude, mas ele sempre deixou os segredos ficarem acima de tudo. Isso cansa muito. - rebati com certo desespero, deixando muito claro de quem foi o erro na "relação".
- Que segredos? - Jackson se mostrou realmente curioso.
- Os segredos em relação ao pai. - descontei minha frustração no sorvete, que estava sendo massacrado pela colher que estava em minhas mãos. O olhar confuso de Jackson deixava claro que ele não fazia ideia do que eu estava falando - Os segredos que você também não tem a mínima noção dos quais são.
- Não mesmo, mas eu vou descobrir. - balançou a cabeça, espantando as dúvidas que estavam em sua mente - Enquanto isso, não se arrependa do empenho que teve que fazer pra dar certo, e também tente enxergar o lado dele. Existe uma grande diferença entre quem erra ciente do equívoco e quem erra querendo acertar.
- O problema é que ele não se importa se errou ou não, ele continua sem dar nenhuma explicação.
- Deixe rolar. Uma hora ele vai se arrepender muito mais das atitudes que não teve, das palavras que não disse, e dos sentimentos que se privou de sentir. - apresentou seu ponto de vista com uma convicção gigante, como se tivesse certo de que aquilo aconteceria.
- Será que agora a gente pode parar de falar dele? - implorei, sentindo um grande incômodo por estarmos falando de . O plano não era falar sobre ele.
- Tudo bem, cunhadinha.
Tudo se voltava à minha primeira conversa com . Naquela época eu nem imaginava que um dia estaria numa sorveteria com Jackson Tuck, mas aquela frase se encaixava perfeitamente no momento. Ela disse que se eu deixasse alguém se aproximar e permitir que a pessoa me conhecesse, eu poderia me surpreender. Ela estava tão certa! Meu coração dava cambalhotas por tudo de bom que aconteceu depois que eu dei o braço a torcer e me permiti ser mais aberta. As coisas mudam e eu não tenho mais dúvidas sobre isso.

Um sentimento esquisito eu sentia além de todo um enjoo mais esquisito ainda depois de tomar um ótimo café da manhã. Não foi o suficiente pra me fazer ficar em casa, então fui pra escola do mesmo jeito, fazendo as mesmas coisas, com as mesmas pessoas. Uma rotina um tanto quanto monótona, mas, por sorte, já estávamos pensando no que faríamos no fim de semana. sugeriu o Lane Karting, onde iríamos andar de kart, mas ninguém se animou muito, o que a frustrou bastante. Chloe sugeriu o Carowinds; parque de diversões. Eu nunca tinha ido, nunca mesmo, então me animei como uma criança de 5 anos.
Incrível como nossa união conseguia ser tão forte, e nossa conexão, tão inexplicável. Cada um tinha algo a acrescentar no grupo, e honestamente? Não faltava nada.

Eram raros os dias em que eu chegava da escola e dormia direto, mas caraca, foi mais forte que eu. Eu sentia um cansaço descomunal, e as horas de sono foram realmente necessárias antes de nos juntarmos na casa de . Não, não enjoávamos um do outro.
Bem, eu fui a última a chegar, mas o motivo foi muito justo. Juro.
- Você veio de jegue? - cerrou os olhos, com uma falsa desconfiança. Adentrei a sua casa mesmo sem permissão, indo rapidamente a cozinha.
- Misericórdia, pra que você trouxe isso? - Chloe abriu a sacola que eu havia colocado no balcão enquanto eu procurava uma faca decente para cortar o grande pedaço de melancia que eu tinha comprado no mercado antes de ir. Eu disse que o motivo era justo.
- Você não tem noção da vontade gigante de comer melancia que me deu. Sério, parece coisa que outro mundo! - exclamei animada e surpresa, porque sério, a vontade foi realmente grande. Cortei a melancia, atacando cada pedaço rapidamente com vontade e desejo, aproveitando o gostinho doce do alimento.
- , está tudo bem? - Chloe manteve um olhar desconfiado enquanto ouviu cada palavra que saiu da minha boca.
- Está sim.
Chloe abriu a boca para dizer algo, mas foi impedida por um grito de , que nos chamava repetidamente até irmos para a sala.
- Eu inventei uma brincadeira. Cada um vai pegar um papel e escrever o que deseja até o fim das aulas, e também, deve escrever algo para alguém daqui, uma carta, um bilhete, o que vocês quiserem. Vamos sortear os nomes para não repetir pessoas, e o mais importante: não podemos dizer quem tiramos. - pontuou cada coisa que devíamos fazer com grande animação, já com os papéis de sorteio em mãos.
Alguém tem dúvidas que ele é o melhor ser humano desse planeta?
- De onde você tira essas coisas? - perguntou com um olhar confuso e divertido, com uma risadinha que eu podia ouvir por dias seguidos.
- Cala a boca e faz o que eu falei. - meu primo rebateu e riu, distribuindo um papel para cada pessoa, e o silêncio se instalou por alguns minutos enquanto escrevíamos o que desejávamos para o resto do nosso ano escolar.
Não foi difícil escrever o que eu queria, pois era bem óbvio. Claro que, eu queria muitas outras coisas, mas eu já tinha basicamente tudo. Bastava pra mim.
Colocamos nossos papéis numa caixinha, e prometeu que nunca a abriria, já que ficaria em sua casa. Ele balançou os pequenos papéis dobrados que tinha em sua mão e foi passando de pessoa em pessoa até cada um tirar o seu. Ora, ora, ora, eu estava mais do que satisfeita com o nome que tinha no meu papel.
Eu aprendo algo diariamente com cada um, mas acho que eles nem mesmo sabem disso. Eles me mostram que, a vida é sim feita de escolhas. Cada um escolheu ser uma pessoa boa, acolhedora e parceira, resultando num perfeito... squad?! É, isso mesmo. Nossas escolhas nos completam.
Voltei a cozinha, me deliciando com o resto de melancia que ainda tinha sobrado, mas para o meu azar, já não estava tão boa quanto antes, muito pelo contrário, me deu um baita enjoo. Corri para o banheiro, botando toda aquela ex delicia para fora. Estavam cansativo os enjoos sem motivo, o que me levou a pensar que...
- Acho que estou doente. - me recompus, dando descarga na privada e lavando minhas mãos, aproveitando para passar uma água no rosto. Chloe estava encostada à porta, observando tudo com cara de nojo, e com motivos.
- , há quanto tempo você está assim? - sua voz estava carregada de curiosidade.
- Assim como?
- Assim, vomitando, comendo melancia do nada... - numerou os tópicos com os dedos com tranquilidade, mas sua cara me dizia o oposto. Ela parecia nervosa e aflita.
- Eu... não sei. Há algumas semanas. - tentei lembrar o tempo exato, mas não conseguia. Parecia que Chloe tinha ouvido algo bárbaro, sua expressão se transformou em algo meio... Não tem palavras.
- Você andou fazendo certas coisas com o ? - ela estava entre sem graça e séria, com um olhar significativo firme no meu. Ouvir tal pergunta foi basicamente como um choque. Falar sobre minha vida sexual não era lá um dos meus assuntos favoritos.
- Chloe, não é nada disso. Deve ser algum problema no estômago ou algo do tipo. - a essa altura eu já estava me sentindo completamente desesperada. Eu disse a primeira coisa que veio em minha mente, mas a suposição de Chloe me assustou, e muito.
- Ei, podemos ir ao hospital onde meus pais trabalham amanhã, ok? Tiraremos a dúvida e pronto. - seus braços me envolveram num abraço apertado enquanto eu tinha leves flashbacks da minha última noite com , a qual eu me lembrava de apenas algumas coisas.
Não podia ser verdade, não podia!
- Chloe, o que eu vou fazer? Eu não posso estar... grávida! - senti meus olhos marejarem, sem controle nenhum das lágrimas de desespero que insistiram em cair.
- Não chora! Agora vamos descer e vamos fingir que nada disso aconteceu, ok? Amanhã depois da escola revolvemos isso!

Se eu dormi por 2 horas, foi muito. Me remexi durante a noite inteira, numa inquietação terrível. Toda aquela dúvida estava grudada em minha mente e nada que eu fiz me fez a esquecer, nem por meros segundos. Há certo momento que toda sua vida sai de seu curso. Nesse momento de desespero você deve escolher a sua direção. Nesse momento, quem você será? O que você vai fazer?
O mesmo enjoo que me acompanhava há algum tempo vinha de maneira estrondosa pela manhã. Calma. Poderia ser qualquer coisa como gastrite, intoxicação alimentar, úlcera péptica, ou um... bebê. Droga.
O caminho até a escola foi silencioso, o que meu primo respeitou, aliás, ninguém é como ele, que acorda todos os dias bem humorado. Todos mesmo.
- Bom dia! Está preparada pra amanhã, ? - , como sempre, saltitante e cheia de alegria, coisa que eu ainda não conseguia entender.
-Preparadíssima! - assegurei com firmeza, me referindo a nossa ida ao Carowinds.
Preparada para ir ao parque diversões, e não, levar uma criança até ele, porque é isso o que mães fazem. Meu nervosismo crescia a medida que cada minuto passava. A dúvida me corroia, mas uma parte de mim não queria saber nada, gostaria apenas de enterrar tal suspeita e não lidar com isso nunca. Pena que isso não é possível.
não estava por ali, e agradeci mentalmente aos deuses por aquilo. Aumentaria meu nervosismo sem sombra de dúvidas.
- Ei, como você está? - Chloe chegou de surpresa, encostando-se ao armário do lado e sussurrando como se perguntar se eu estava bem fosse um segredo que tivesse que ser mantido a sete chaves.
- Ficando maluca. Você disse alguma coisa aos seus pais?
- Não, e nem precisa. Um teste de gravidez é rápido. Eu acho. - ela tombou a cabeça pro lado, sendo dominada pela dúvida.
- Chloe, eu desisto. Não quero fazer teste nenhum. Deixa pra lá. - bati meu armário, sentindo que meu cérebro podia explodir a qualquer segundo. Toda aquela loucura estava me deixando fora de mim. Eu não queria saber. Eu não podia estar grávida. Minha respiração se descompassava, e o desespero tomou conta do meu ser. Senti meus olhos marejarem, prestes a chorar de vez.
- Engole esse choro e fica calma! Talvez o teste dê negativo! Se você não quiser, não vou te obrigar, mas acho que é melhor você acabar com essa dúvida de vez, certo? - ela deu um sorrisinho esperançoso.
- Você que colocou essa dúvida na minha cabeça! Eu não desconfiava de nada até você aparecer com essa suspeita doida! - minha mudança de humor repentina assustou a garota. Fui imensamente rude, como se ela fosse a verdadeira culpada por tudo aquilo. Mas espera aí... ela era mesmo.
- Desculpa, mas quando uma mulher sente enjoo com cheiros e vomita o que come, pra mim isso só significa uma coisinha! - ela não se deixou abater, respondendo firme e cheia de si. A vontade de chorar novamente tomou conta de mim, e sussurrei para que ela saísse dali o mais rápido possível antes que as coisas saíssem do controle.
Eu sentia minhas pernas fraquejando. O maior desespero da minha vida. A dúvida mais atormentante. Encostei minhas costas no armário, sendo amparada pelo mesmo. Fechei os olhos e respirei fundo incontáveis vezes, sendo obrigada a abri-los novamente ao notar um barulho que indicava que alguém estava ali.
Ele.
As minhas forças definitivamente estavam evaporando. A gritante vontade de chorar e de querer compartilhar o desespero, mesmo sabendo que não podia. não podia nem sonhar que aquilo estava acontecendo. Nossos olhares se cruzaram, mas não por muito tempo, já que sua atenção estava em pegar seus livros de história.
O coração dizendo uma coisa, a cabeça outra, e a boca, infelizmente, querendo se abrir. E se abriu.
- .
- O que foi? - ele caminhava em minha direção mas eu fiz um sinal para que parasse. Ele perto tornaria tudo pior.
- Eu quero que você saiba de uma coisa. Eu sempre preferi ficar sozinha porque eu achava que era o que eu merecia, e eu me sentia mais feliz, mas há um motivo para dizer que eu seria mais feliz sozinha. Não foi porque eu pensei que seria mais feliz, e sim, porque eu pensei que se eu amasse alguém e depois acabasse, talvez eu não conseguisse sobreviver. É mais fácil ficar sozinha. Ou era. Porque, e se você descobrir que precisa de amor e depois você não o tem? Eu não queria me dar o luxo de modelar minha vida em torno do amor porque eu nunca saberia quando ele iria acabar. Mas e você? Consegue sobreviver a essa dor? Porque perder o amor é como perder algo que faz parte de você, e isso pode continuar pra sempre. - meu coração estava acelerado e a respiração descompassada. Eu não sabia dizer ou entender ao certo de onde saiu coragem de dizer tanta coisa sem tropeçar em minhas palavras ou deixar o desespero falasse mais alto. Foi um questão extremamente necessária para eu ter uma noção do que eu faria caso o teste desse positivo. Eu basicamente me declarei indiretamente, e tudo dependia dele. Eu continuava encostada no armário, que era a única coisa que me mantia em pé.
- Eu estou tentando entender. Não sei o que dizer. - respondeu firme depois de alguns segundos processando tudo o que saiu da minha boca. Ele definitivamente deu a resposta errada.
- Mesmo se soubesse. Não é o que você diz, . É o que você faz.
A escolha de me afastar foi muito bem vinda e muito bem sucedida. Eu não aguentava passar mais um segundo o encarando e engolindo aquelas palavras que me soaram um tanto quanto secas e vazias. Ele não se importava mais. Foi realmente fácil demais para ele pegar tudo e jogar pela janela.
Definitivamente tudo acabado.

Você já se perguntou quanto tempo demora para mudar sua vida? Quanto tempo é o bastante para alterá-la? São os anos de colegial? Um mês? Ou em um único dia? Nós sempre estamos com pressa, para crescer, para ir em lugares, seguir adiante. Mas as vezes, apenas 1 hora pode mudar tudo.
- Chloe, você nem mesmo avisou seus pais que está aqui! - quebrei o silêncio, perguntando a única dúvida que rondava pela minha cabeça fora o meu exame de sangue que estava há minutos de ficar pronto com a resposta que poderia mudar minha vida inteira.
- Eles estão em cirurgia. - ela encarou as unhas sem dar verdadeira importância. Eu podia sentir certo incômodo em sua voz, mas ela tentava não demonstrar.
- Olha, nem sei como te agradecer, sério mesmo! Isso que você está fazendo por mim é incrível. Obrigada de verdade! - disparei nos agradecimentos, pois ela merecia aquilo e muito mais. Se não fosse por Chloe, eu estaria mais perdida que cego em tiroteio.
- Não precisa agradecer, . A enfermeira que fez seu exame me conhece desde quando eu era um feto e eu sabia que ela faria qualquer favor que eu pedisse, e afinal, não podemos continuar nessa dúvida, certo? - arqueou uma sobrancelha e sorriu de canto, voltando sua atenção a um ponto fixo da parede extremamente branca.
Os arrepios e a tremedeira que não me abandonavam de jeito nenhum. O nervosismo que dominava cada célula do meu corpo. A ansiedade que estava tirando minha sanidade a cada segundo. Tudo numa pessoa só.
- Ei, está pronto. - a enfermeira cujo nome era Holly apareceu com um envelope branco em mãos. O corredor estava vazio, deixando apenas nós e toda aquela tensão. Ela me encarava com um olhar cheio de carinho, na intenção de me acalmar. Não funcionou.
- Será que você pode só me falar se eu estou ou não esperando um bebê? - passei a mão pelo rosto e as deixei ali, apoiando meus cotovelos em minhas pernas. Por alguns segundos, fantasiei outra realidade, na qual eu não estaria passando por tamanho nervosismo. Meus pés tocaram o chão novamente quando Holly se abaixou, ficando numa altura razoável para que nossos olhares se encontrassem.
- Meu bem, preste bem atenção no que eu vou te dizer. Cada criança vem com uma mensagem de que Deus não desistiu de nós. Dar a luz é intenso, mágico, e vai te transformar pra sempre. Vai te fazer crescer como nada no mundo poderia fazer, mas acredite, é tudo para o melhor. Filhos são anjos, e você tem um anjinho na sua barriga agora.
Um bebê. Eu me tornaria mãe. Mãe do bebê de . Minhas emoções extremamente afloradas dominaram, me fazendo desabar no choro. Um choro que eu nem sabia o verdadeiro significado. Não dá para saber qual dia será o mais importante da sua vida. Os dias que você pensa serem importantes nunca atingem a proporção imaginada. São os dias que supostamente deviam ser normais que acabam se tornando os mais importantes.

's POV
A maioria das pessoas procuram por um amor verdadeiro, aquele amor que te faz virar do avesso de tantos sentimentos que te faz sentir. Bem, eu nunca fui assim. Nunca foi o meu foco. Eu nunca me apeguei a alguém até aparecer. Ela estava grudada em meus pensamentos há semanas. Eu não fazia ideia se ela também pensava em mim. A única coisa que restou foram olhares codificadas, que eu deduzia serem olhares de decepção e um pouco de raiva. Ou muita.
Sempre temos a certeza que aquele amor aparentemente destinado para você, é o qual jamais podemos ter. Não que ela tivesse sido destinada a mim, mas ficava difícil achar que não. Eu nem mesmo conseguia entender tantos sentimentos juntos, os sentimentos que eu tranquei e joguei a chave fora por tanto tempo. Tais sentimentos que cresceram tanto que eu nem mesmo percebi, pois estava ocupado demais pensando na minha vingança contra Richard, homem que causou tanta desgraça em tantas vidas. Essa era a minha motivação diária para seguir adiante.
- Ei, você vai fazer algo hoje? - Jackson me acordou dos meus devaneios, abrindo a porta do seu armário e pegando sua roupa limpa para se trocar. Digamos que o treino nos deixa um pouco nojentos.
- Sim, por quê? - eu realmente tinha algo a fazer, no caso, um encontro com Cooper e Dan.
- Eu ia te chamar pra ir comigo a Opper. Vou me aposentar. - as esperanças de Jackson desapareceram quando eu disse que já teria compromisso, mas seu bom humor dominou, com uma risada engraçada ao dizer o motivo.
- Jackson Tuck caindo fora dos rachas? Vai chover pra caralho. - gargalhamos juntos, e por mais que aquilo fosse algo muito difícil dele largar, não aparentava estar triste ou algo do tipo. Ele abriria mão daquilo para dedicar seu tempo a mãe. Tuck largaria seu hobby de anos porque aquilo simplesmente não servia mais para ele. A glória e a popularidade já não valiam mais nada. Não posso negar que senti uma pitada de inveja, porque eu queria ser capaz de largar minha vingança, mas algo sempre me puxava de volta a ela, não permitindo.
- Vai chover as lágrimas do pessoal quando descobrirem isso. - sorriu convencido.
- Tá se achando demais, irmãozinho, mas de qualquer forma, boa sorte. - o dei um abraço de lado rápido, bati meu armário e saí dali.

Dan, Jimmy e Noah já estavam no lugar combinado, que era o mesmo de sempre. Cooper demorou um pouco mais, aliás, o homem é do mundo dos negócios, ocupadíssimo.
- Sem enrolação. Agora que estamos todos reunidos, já posso dizer que descobri o próximo passo de Richard. Ele fará uma entrega no depósito da Shock Una, no domingo à noite. O lugar foi bem escolhido, pois é um depósito que não é mais usado pela empresa. - Noah jogou algumas fotos do local em cima da pequena mesa que havia no meio de nós - Temos que ser cuidadosos, porque é praticamente um lugar deserto, então qualquer movimento que fizermos errado, tudo dará errado. - finalizou sério, com a mesma pose firme de sempre.
Jimmy deu as instruções, explicou detalhadamente onde ficaríamos, como, e quando. Foi um plano bem bolado, devo admitir.
- Domingo à tarde quero todos aqui para repassarmos tudo, ouviram bem? - Cooper se levantou, abotoando seu terno e encarando um por um antes de caminhar até a saída.
Não tínhamos conversado sobre o que Richard tinha feito com sua família. Ele estava sempre sério, focado, e não dava nenhuma brecha para puxarmos assuntos alheios, mas eu mudaria isso, afinal, todos estávamos ali por acontecimentos pessoais que Richard nos fez passar.
- Cooper.
- Vejo que você tomou coragem para conversar comigo. - ele se virou com um sorrisinho divertido no rosto, coisa que eu não via há tempos.
- Eu estava te dando um tempo. - respondi a altura, disfarçando a verdade atras do bom humor.
- Não estava não. - respondeu não convencido, e com razão.
- Ok, vamos lá. Eu sei que Richard fez algo horrível e com isso, desencadeou o segredo de Julie, porque ela também escondeu a doença de você. Isso vai acabar no domingo, e vamos fazer isso juntos.
- Quando Jackson nasceu meu mundo mudou. Foi a melhor sensação que eu já senti em toda a vida. Eu nem mesmo acreditava que fui capaz de fazer algo tão incrível como ele, e descobrir que de fato, não fui eu que fiz aquilo, fez tudo mudar. Julie errou feio, mas eu não largo aquela mulher por nada, e meu amor pelo meu filho também não muda, mas eu quero de uma vez por todas acabar com Richard para impedir que ele bagunce outras vidas. - todo aquele bom humor foi dominado por seriedade e pontos altos de raiva, onde Cooper apertava os olhos e fechava os punhos.
- Ótimo, porque queremos a mesma coisa. - escutei atentadamente a cada palavra que saiu de sua boca, dizendo algo que eu tinha certeza que ele gostaria de ouvir. Cooper se virou para sair dali, mas algo o trouxe de volta.
- , como você está com aquela garota?
- Não estou.
- Por qual motivo?
- Richard pode fazer algo com ela e eu não quero que isso aconteça. - minha resposta trazia um incomodo e um peso que era capaz de fazer com que eu me sentir como se estivesse sufocado.
- Ele já fez. Você se afastou dela por causa daquele desgraçado. É assim que ele suga a sua vida sem você perceber. - sua voz foi de séria e curiosa para um tom óbvio de indignação.
- E o que você quer que eu faça?
- Quero que você desfaça essa merda. Onde já se viu ficar longe da pessoa que gosta por causa de um filho da puta como Richard?! Me poupe, moleque. - e então se virou de vez, entre indignado e divertido, já que saiu rindo debochadamente.
Talvez ele tivesse razão.

Capítulo 28


"Às vezes focamos tanto em achar nosso final feliz que não aprendemos a ler os sinais, a diferenciar entre quem nos quer e quem não nos quer, entre os que vão ficar e os que vão te deixar. E talvez esse final feliz não inclua um cara incrível. Talvez seja você sozinha recolhendo os cacos e recomeçando, ficando livre para algo melhor no futuro. Talvez o final feliz seja só seguir em frente."

Eu não dormi. Estava com a cabeça cheia demais para me sentir cansada. Tentei organizar meus pensamentos, tentei descobrir o que faria da vida, mas nada adiantou. Na verdade, eu pensei em mim. Pensei em tudo o que ocorreu durante todos esses anos e cheguei numa conclusão que nunca imaginei que poderia ter chegado.
O auto perdão vai muito além do que qualquer pessoa imagina. Às vezes precisamos nos enxergar como se fossemos outra pessoa, e quando você sai de você, acaba enxergando que é muito mais linda do que imaginava. Que você é uma pessoa que vale a pena não para os outros, mas para si. Eu passei todo esse tempo me perguntando o motivo de todas as minhas tentativas falhas em desistir da vida deram errado. Eu achei minha resposta. Aos poucos, a própria vida me mostrou que é bom dar risada com meu Eu interior e poder viver sem tantas culpas. Eu fui capaz de me abrir, me permitir, e me entregar. O auto perdão também é uma maneira de dizer "eu me aceito". Não vou dizer que tudo está cem por cento bem, mas assim que parei de pensar que tudo estava inteiramente ruim, as coisas automaticamente melhoraram. O sol pareceu mais brilhante. A tristeza pareceu mais distante. Foram coisas que eu só percebi que realmente tinham mudado quando me olhei no espelho e não senti mais aquele imenso desconforto de estar no meu próprio corpo. Foi como se eu finalmente tivesse conquistado a capacidade de olhar pra mim mesma e me enxergar como um passarinho com a asa quebrada, porém, que teve cuidados o suficiente de pessoas que em algum momento sussurraram carinhosamente: "viva!"
E então vem o enjoo matinal. Aquele que, me tira da cama rapidamente, e também faz meu pensamento funcionar a mil por hora. As dúvidas em relação ao bebê me fazem querer correr e me esconder. Cem por cento sem coragem de enfrentar isso tudo ainda.

Digamos que talvez eu tenha dormido demais e perdido a hora. Combinamos de sair para irmos ao parque às sete, e eu comecei a me arrumar às seis e meia. Algo que eu deveria me organizar também, aliás, mães são responsáveis, certo?!
Deus, eu vou ser mãe!
Eu e Michael fomos no carro com Callie. Tentei me distrair ao máximo com todo aquele papo aleatório que os dois conversavam, mas estava realmente difícil. Eu estava com um medo absurdamente gigante de ser julgada, largada ou de ouvir coisas que não gostaria. Ok, ok, estamos falando de Michael e Callie, mas também tem o resto. Eu não fazia ideia de como reagiriam, e a melhor solução seria manter a boca fechada pelo máximo de tempo que pudesse até conseguir pensar em algo.
Chegamos ao parque, e a primeira atração que tomou toda a minha atenção foi o carrossel, que estava cheio de criancinhas. Continuamos andando até chegarmos em frente à uma gigante fila para a montanha russa. Encarei toda aquela loucura que o brinquedo fazia e me neguei em ir nele.
- Você vir ao parque e não ir à montanha russa é o mesmo que não vir. - se manifestou indignado, encarando a montanha russa como se fosse a coisa mais incrível que já tinha visto.
- Eu não confio no que não está no chão. Simples assim. - em minha defesa, exclamei a minha verdade.
- Você está é com medo. - ele continuou de maneira provocativa, e eu entrei em seu jogo, fingindo estar profundamente ofendida. e seu bom humor eram capazes de fazer um defunto levantar para rir.
- Eu não vou nesse negócio e pronto. - cruzei os braços e bati o pé, erguendo o queixo como se estivesse desafiando alguém a dizer algo, mas apenas riram.
Uma montanha russa maluca com gente mais maluca ainda. Honestamente, eu seria mais feliz num carrinho bate-bate. A fila andava e andava, papo pra lá e pra cá, e a única coisa que eu conseguia pensar era no tanto de criança que tinha ali. Sério, muita criança mesmo.
- Até daqui a pouco, bobinha. - se despediu irônico antes de andar até os assentos do brinquedo junto com o pessoal. Exceto . Ele disse algo que eu não pude ouvir e voltou, me encarando de maneira intimidadora, e antes mesmo que ele abrisse a boca, continuei a andar, observando o máximo de brinquedos que podia.
Passamos minutos caminhando lado a lado, e por mais que eu tentasse apertar o passo, ele me acompanhava. Aquilo me deixou um tanto quanto irritada. Toda a enrolação para dizer algo que, eu sabia que ele queria dizer, estava me deixando com vontade de atropelá-lo com um dos carrosséis. Parei de andar bruscamente, cruzando os braços e o encarando intimidante como ele fizera poucos minutos antes. Estava na hora de acabar com a palhaçada.
- Então você nunca veio ao parque? - ele arqueou uma sobrancelha e riu torto, e por mais que fosse algo lindo de se ver, eu sentia uma vontade enorme de amassar sua cara.
Algumas pessoas não dizem claramente que não querem estar nas nossas vidas. Elas simplesmente vão desaparecendo aos poucos. Era o que acontecia com . Eu o via todo dia, mas era como se fossemos um grande nada um para o outro. Se tem uma coisa que é verdade, é que as relações nos transformam, e com isso eu aprendi que não posso permitir que entre e saia da minha vida quando bem entender. Machucava tanto, que talvez se ele soubesse, não faria isso.
E estava na hora dele saber.
- , não me venha com essa aproximação cínica. Sabe, eu trago boas intenções no coração, eu nunca entraria na vida de alguém com a intenção de sair, mas você tem que entender que eu não sou de ferro, e não sou obrigada a tolerar todas as vezes que você pisou na bola. Posso até te perdoar uma, duas, ou até três vezes se for preciso, mas não significa que eu vou esquecer o que você fez. Todo mundo tem seus limites, e eu cheguei no meu. Agora seja direto, o que você quer comigo? - provavelmente saiu mais ríspido do que eu imaginei. se manteve incrédulo, com os olhos levemente arregalados. Eu podia jurar que tudo o que saiu da minha boca o fez prender a respiração por longos segundos. Me senti tão pesada por gritar as verdades em sua cara, e ao mesmo tempo, aliviada.
- O que deu em você? - ele gritou alto, me fazendo dar um pulinho de susto. Nada agradável sua maneira de reagir.
- Eu que te pergunto! Semanas sem nem olhar na minha cara direito e você acha que pode se aproximar quando quer? Não é bem assim. Eu te dei tantas opções, , tantas! Eu tentei estar com você, tentei ser sua amiga, tentei...
- Não podemos ser só amigos, ! Eu não consigo ser só isso pra você! - gritou novamente, com uma grande onda de decepção em sua voz. O momento em que finalmente ficou óbvio que, apesar de tudo, ele sentia algo por mim. Não foi coisa da minha cabeça. Eu ouvi muito bem. Eu senti o poder das suas palavras. Senti que, mesmo ele sentindo algo, ainda não era o suficiente.
- Na verdade não podemos ser nada. Isso aqui nunca vai dar certo e a culpa é sua! - dessa vez, quem gritou fui eu. O grito que eu não queria ter dado, as palavras que eu não queria tinham saído. Foi como se algo estivesse desmoronando em frente ao rapaz. Seu olhar ia murchando como uma flor sem cuidados. Nossas respirações estavam aceleradas, e demorou alguns segundos para ele se recompor e abrir a boca novamente, se reerguendo como um animal feroz.
- A CULPA É MINHA?
- Pare de ser cínico pelo menos uma vez nessa sua vida! O que você quer? O quê? Eu cansei de tentar descobrir. Aparentemente eu sou a única que sabe o que quer aqui! - eu o estapeava enquanto gritava em sua cara, até que ele segurou meus braços e nos encaramos por alguns segundos. O azul de seus olhos fazia com que eu quase perdesse todas as forças de tanta tensão que apoderou meu corpo.
- E o que você tanto quer?
-Você é cego? O que eu quero está bem na minha frente. Mas e você? Me diga logo se não sou o que você quer. - sussurrei chorosa, tentando de todas as maneiras engolir o choro.
- Eu não posso querer você, . - ele não pensou muito antes de responder, soltando meus braços e andando novamente sem rumo, sem nem virar pra trás.
Ele me parte, me junta e me espalha. é o pior dos meus erros, o maior. Me recusei a derramar uma lágrima sequer, respirando fundo até toda aquela sensação horrível sumir. Ok, não sumiu, mas voltei todo o trajeto e fiquei em frente à saída da montanha russa, que tinha acabado de parar, libertando meus amigos malucos.
- Esse negócio é incrível! Você não tem noção do que perdeu, ! - disse elétrico, tão animado que provavelmente enfrentaria a fila novamente.
- Estava tudo ótimo aqui no chão. - respondi tranquilamente, mostrando que não estava arrependida de não ter ido à montanha russa. E não estava mesmo. Se bem que, ter ficado aqui embaixo não foi muito agradável quanto eu disse.
- E onde está? - Callie perguntou curiosa, me lançando um olhar pervertido discreto, o qual eu respondi rolando os olhos.
- Estou aqui. - apareceu com a expressão plena, como se não tivéssemos brigado minutos antes. Gente cínica é assim mesmo.
gostava dos brinquedos mais radicais, enquanto eu queria mesmo é ir no carrinho bate-bate. Evitei todos os brinquedos que me levariam para metros acima do chão, enquanto o pessoal se divertiu em todos eles. Chloe deixou de ir em alguns para ficar comigo, mas ainda assim, se divertiu bastante. Jackson topou competir no twister comigo, e também foi fofo a ponto de pegar um presentinho pra mim no tiro ao alvo. Ele ganhou um chaveiro, mas a intenção é o que vale. No fim, todos cederam e finalmente fomos ao carrinho bate-bate. Pelo amor de Deus, não tem brinquedo melhor!
Ok, talvez eu seja um pouco sem graça ou medrosa.
Com esse pessoal não tem descanso. A disposição que os garotos tinham era contagiante, mas pra mim, não mais. sugeriu irmos ao Tin Roof, coisa que eu toparia sem problemas se não estivesse... grávida. Claro que eu deveria disfarçar ao máximo, mas tentei inventar uma desculpinha esfarrapada dizendo que estava cansada demais. Resultado: não funcionou. O caminho para o bar foi rápido, como se todos ali precisassem daquilo pra fechar a noite com chave de ouro.
- Pelo amor de Deus, o que eu vou fazer aqui? - sussurrei no ouvido de Chloe enquanto caminhávamos até a entrada do bar, que como sempre, estava cheio.
- Só não tomar nada. Disfarce. Peça um refrigerante e finja que é bebida. - respondeu perdida, sem muitas ideias, assim como eu.
Eu me sentia diferente. Eram tantas sensações que nem conseguia explicar uma por uma. Era algo tão doido que quase me deixava perdida. Eu tentava parar para pensar sobre o que faria mas nunca dava certo. Como eu criaria um bebê agora? Como minha família lidaria com a notícia? Como ficaria meu futuro?
Perguntas sem respostas, mas eu tinha uma certeza. Eu me tornaria mãe. Encarei minha barriga que, ainda não se dava pra notar nada, mas senti como se toda a música e agitação tivessem parado e o momento, congelado. A barriga que seria o lar de uma criaturinha que sairia de mim. A criaturinha que eu protegeria a todo custo, e amaria acima de tudo.
Mas... sozinha. Eu não tinha planos de incluir nisso. Aliás, nem o próprio deveria querer se incluir.
Me sentei em um banquinho em frente ao balcão, reconhecendo o dono de um rostinho familiar. Era o filho do dono do bar, que organizou toda a festa de .
- Ei, você está sozinha hoje? - por incrível que pareça, ele me reconheceu. Abriu um sorriso largo, se aproximando até se apoiar no balcão, e assim pude perceber o nome gravado em sua camiseta. Zack.
- Não, mas não estou afim de bagunça hoje. - virei o rosto, observando de longe todos os meus amigos dançando e bebendo sem problema nenhum.
- Hmmmm. Brigou com o namorado? - cerrou os olhos de maneira curiosa, desencostando do balcão e preparando a bebida da mulher ao meu lado.
- Eu não tenho namorado.
- Não? - arqueou as sobrancelhas, realmente surpreso.
- Não.
- Nesse caso...
- Mas eu estou grávida. - o interrompi, abrindo um sorriso sem graça e observando sua reação mais surpresa ainda. Ele gargalhou alto, preparando uma bebida e colocando em minha frente.
- Desculpe, mas eu não sou o pai. - ele continuou rindo, e foi inevitável não rir junto - Beba isso, é sem álcool.
- Engraçadinho. - beberiquei com cuidado, me certificando que não tinha álcool na bebida, que tinha um gosto misto entre morango e laranja.
- Se for um menino, você pode chamá-lo de Zack. - ele apontou para o próprio nome em sua camisa, dando uma piscadinha divertida.
- Vou pensar no seu caso. - respondi com um falso desdém na voz, e o rapaz juntou os lábios em um biquinho triste.
Enquanto Zack atendia as pessoas, eu observava toda aquela multidão junta. Tantas histórias em um lugar só. Eu não conhecia a vida de todos, e também não conheciam a minha, mas eu gostaria de dizer a todos eles que tudo muda de verdade. Aquela dor no estômago, aquela dor no coração, aquela angustia... vai embora. Nossos problemas são temporários. Me levou anos pra entender que quando você se perde, tens duas opções: achar a pessoa que você é, dentro de você, ou perdê-la completamente. Muitas vezes eu desisti de mim mesma, me coloquei pra baixo, me desanimei, mas sempre teve alguém por perto que nunca desistiu de mim. Eu só não conseguia enxergar. Nem sempre as pessoas mostram diretamente que estão lutando pela sua vida junto com você. É aí que precisamos prestar atenção aos detalhes. Eles mudam tudo.
Zack me deu mais um copo daquela bebida que a princípio estava deliciosa, mas acabou me dando uma vontade de vomitar gigante. Não é nada fácil usar o banheiro de um bar. Corri até a saída, vomitando ali mesmo, na calçada. O segurança me lançou um olhar nada agradável, como se estivesse me advertindo. Merda.
Adentrei novamente, olhando a hora que meu celular indicava. 01:57 da manhã. Pra mim, estava mais do que bom. Caminhei com dificuldade em meio a todas aquelas pessoas, procurando a primeira pessoa conhecida para poder irmos embora. Ninguém estava por perto. O Tin Roof podia ser grande, mas nem tanto. Continuei caminhando até uma parte mais reservada do bar, onde as luzes azuis dominavam, dando um toque mais... sexy. Havia dois corredores ali, e de um deles estava vindo uma voz que eu reconheceria há quilômetros de distância.
segurava Chloe, que tentava a todo custo se soltar de seus braços. e estavam tentando acalmá-la, mas suas tentativas só pioravam a situação. e Callie tentavam se manifestar, mas nem mesmo conseguiam uma brecha para isso. Jackson estava entre perdido e surpreso, e por fim, Michael foi o único que notou minha presença ali, se aproximando as pressas.
- O que aconteceu aqui? - tentei me aproximar da confusão, mas fui impedida pelos fortes braços do meu primo. - Ela viu e se beijando. - respondeu sério, e aquilo foi como chumbo caindo em minha cabeça. Ele não tentou me prender ali novamente, e assim tive a liberdade de me aproximar. Chloe gritava absurdos enquanto tentava verbalizar uma frase inteira. Não tive tempo de pensar e me coloquei em frente à Chloe, que se debatia na esperança de se livrar dos braços que a seguravam.
- Você precisa ficar calma e precisa ouvir o que tem a dizer. Eu tenho certeza que isso foi só um mal entendido. - tentei melhorar a situação, mas aparentemente tinha piorado.
- Desde quando a boca de na boca dessa vaca é mal entendido? - ela gritava sem dó ou limites, grunhindo de tanta raiva. Me virei para encarar ), e mesmo com a pouca iluminação no corredor, dava para notar seu desespero.
- Me deixa explic...
- Aposto que não é a primeira vez que vocês fazem isso, não é? Me respondam! - ela continuava a gritar do modo mais raivoso possível. e se entreolharam, como se estivessem concordando em revelar a verdade.
- Chloe, nunca foi nossa inten...
- , não!!! - me virei com certo desespero, impedindo que minha amiga piorasse a situação. Ela dizer a verdade naquele momento seria pior ainda.
- Deixe ela responder, ! Ou vocês tem algo a esconder? - eu gelei. Procurei apoio no olhar de alguém, algum tipo de ajuda, mas estávamos todos no mesmo barco. Nos calamos e nos entreolhemos com cuidado, cientes que o pior estava por vir - VOCÊS TODOS SABIAM? - a raiva da garota foi tão grande que, em uma cotovelada certeira no estômago de foi o suficiente pra fazer ele soltá-la, e antes que ela voasse em cima de e , Michael a segurou novamente.
- Chloe, foi tão difícil pra gente esconder isso de você! - Callie se manifestou com a voz embargada.
- Vocês são um bando de falsos! Eu pensei que você fosse minha amiga, Callie! Pensei que estávamos indo bem. - as lágrimas escorriam pelo rosto das duas, uma cena que quebraria o coração de qualquer um. Chloe me lançou o pior olhar que eu já tinha visto dela. O olhar que, eu sabia que seria capaz de fazer uma bagunça maior. Sussurrei pedidos de "por favor" para ela não fazer o que estava prestes a fazer, mas não adiantou - Olhe o que eu fiz por você, ! É assim que você me retribui? Pois acho que está na hora de dizer a verdade, não?! Por que você não conta de uma vez que está grávida, hein?
Eu senti como se o chão tivesse sumido dos meus pés. Senti como se algo tivesse sido tirado de mim, e de fato, foi. Não era nem de longe como eu gostaria que todos descobrissem que eu estava grávida. Até a própria Chloe parou de se debater, apenas apreciando o momento em que todos os olhares foram para mim. Eu não vi opção melhor a não ser correr o máximo que podia, parando só quando saí do bar, tentando recuperar o fôlego e sentindo o ar gelado bater em meu rosto.
- ?! - saiu desesperado, e a última coisa que eu queria era conversar com ele. Me obriguei a andar o mais rápido que podia, porem parando no momento em que ele se colocou em minha frente, fixando suas mãos em minha volta, me prendendo contra a parede - Isso é verdade?
- Eu não quero falar sobre isso. - tentei e falhei ao tentar sair dali. Ele continuava me prendendo ali, com o olhar mais sério que eu já tinha encarado em toda a minha vida.
- Você está grávida ou não? - ele apertou os olhos com força, provavelmente tão despreparado quanto eu.
- Estou.
- , eu... Nós vamos...
- Nós? Não existe "nós", . - aumentei meu tom de voz de maneira estrondosa, quase o assustando. Ele não tinha o direito de querer ou tentar mudar as coisas a essa altura.
- Você vai ter o meu filho, é óbvio que tem um "nós"! - debateu a altura, retirando seus braços da parede e andando inquieto, como se tal notícia tivesse sido como um choque. De fato, foi. A maneira como ele tinha certeza de tudo que falava me incomodava num nível tão grande.
- Não tem não. Nossa relação parece um buraco. Eu posso jogar o que for, seja dedicação, paciência ou amor, parece que esse buraco tem um furo, e eu cansei. Cansei de tentar. Um bebê não vai mudar isso. Eu estou por conta própria. Não quero você por perto. - eu nunca me senti tão firme ao dizer tais verdades para , que me encarou chocado, demorando a assimilar tudo o que tinha acabado de ouvir.
- Amor? - parecia que ele só tinha ouvido aquela palavra. Todas as coisas que eu precisei dizer com uma coragem inexplicável não valeram de nada. Mas eu não estava brava ou nada do tipo, na verdade, eu estava tão chocada quanto ele. Eu disse amor. Amor!
- Tchau, .

's POV
Deveria existir algo a se dizer em momentos como aquele, mas ao invés de dizer algo, eu simplesmente a vi ir embora. Eu ouvi tudo o que ela disse, absolutamente tudo, mas aquela única palavra foi capaz de tirar minha cabeça do lugar. Claro que eu ouvi perfeitamente a parte em que ela confirmou que está... grávida. Mas... céus, está grávida!
Às vezes eu me sinto preenchido e vazio ao mesmo tempo. É como se eu amasse muito algo, mas não gostasse tanto disso, mas todos os acontecimentos recentes foram capazes de me mostrar o que realmente devia ser feito. O que eu realmente devia estar sentindo. Merda, eu demorei tanto tempo pra admitir isso!
Vamos por partes. está grávida, e aparentemente não estava em seus planos me contar tão cedo. Está claro que o problema com os segredos é que mesmo que você pense que está no controle, você não está. E como eu entendo disso...
Chloe descobriu que foi traída, mas isso era o de menos. Eu vou ser pai. Logo eu! Todas as sensações que me atingiam ainda eram novas e indecifráveis. Eu não me sentia nenhum pouco preparado para isso. Nenhum pouco preparado para nada, mas estava na hora de tomar sérias decisões. Eu não podia mais me esconder ou esconder o sentimento que estava em meu coração há tempos.
Eu neguei que estava em negação. Menti tanto que as mentiras começaram a parecer verdade. Neguei tanto que quase não consegui reconhecer a verdade, até a própria vir até mim, com um golpe certeiro. Neguei tanto que mal consegui reconhecer a verdade quando ela estava na minha cara, e agora é a hora de enfrentar as sérias consequências pelos meus estúpidos atos.
O dia amanheceu nublado. Não tinha sequer um mísero sinal do sol. Meu celular estava lotado de ligações e mensagens que preferi ignorar. Cada minuto que passava me deixava mais ansioso. O grande dia havia chegado, o dia em que acabaríamos com Richard de uma vez por todas. O dia em que tudo acabaria, e eu finalmente poderia acertar as coisas com .
Nada daria errado. O universo não tinha o direito de fazer isso comigo.
- Você não vai comer? - demorei alguns segundos para voltar a realidade e notar que minha mãe estava parada em minha frente, aproximando o prato de macarrão para mim. A falta de fome era o menor dos meus problemas no momento.
- Estou sem fome.
- Sophia, vá brincar lá em cima. Preciso ter uma conversa com seu irmão. - ordenou com um tom de voz doce, e minha irmã não demorou a obedecer. Puxou uma cadeira e se sentou, me encarando por alguns segundos como se estivesse estudando cada detalhe meu, mas aquilo fazia parte da sua estratégia. Minha mãe sempre conseguiu muitas coisas só com um olhar, e eu falo bem sério - Desembuche de uma vez. O que aconteceu?
- Como é que você descobre essas coisas? - espalmei as mãos no ar em sinal de uma cruel dúvida que eu nunca havia entendido em 18 anos de carreira.
- Quando você for pai, vai saber. Agora vamos, fale. - ela riu fraco enquanto meu coração acelerava de maneira absurda e meus olhos se arregalavam, também quase engasgando com a minha própria saliva. Me recompus rapidamente, evitando que ela suspeitasse de algo, e finalmente abri a boca para dizer o que estava me incomodando. Não foi fácil.
- Eu... bem... eu perdi algo. Na verdade, alguém. Essa pessoa se cansou de mim porque eu joguei todas as chances que tinha fora.
- O melhor conselho que eu posso te dar é: não perca tempo. Deixe de esperar que amanhã tudo seja maravilhoso, e que todos os seus problemas vão ter sumido, porque isso só vai acontecer quando você fizer algo para mudar a situação, e isso não inclui esperar. - ela finalizou com um sorrisinho de canto, encostando-se à cadeira e respirando fundo, como se tivesse selecionado todas as palavras com cautela antes de dizê-las.
- E se não der certo? - uma insegurança descomunal me invadiu. Pensar na possibilidade daquilo não dar certo havia se tornado motivo de um dos meus maiores desesperos.
- E se der? - ela arqueou uma sobrancelha e nem mesmo tentou conter um sorrisinho triunfante - Agora vá atrás de e ajeite as coisas. Não te criei pra quebrar o coração de ninguém, está me ouvindo? - ela se levantou e veio em minha direção, apertando minhas bochechas e tirando o prato com a comida já fria dali. As coisas estavam tão óbvias que ela sabia que eu estava falando de mesmo sem mencionar o nome dela.
É difícil dar segundas chances, porém é ainda mais difícil pedir por elas. Uma chance de fazer de novo, sabendo o que você sabe agora, o que você aprendeu. Uma chance de fazer completamente diferente. Uma chance de consertar todos os erros, de tentar fazer dar certo. Uma chance de começar de novo do zero. Era só o que eu precisava.
Mas antes, precisava também, acabar com Richard.

- Hoje é o dia em que acabaremos com Richard de uma vez por todas. - Cooper sorriu animado com a própria fala, colocando as munições nas pistolas imbel calibre 30, e as entregando para mim. Dan me deu um olhar preocupado, e tentei confortá-lo com uma expressão calma e tranquila, coisa que eu realmente não estava.
Entramos todos em um carro só, sendo dirigido por Noah. O local praticamente abandonado onde era o antigo depósito da empresa de produtos de limpeza, Sock Una, me deu um arrepio. A má iluminação deixava tudo mais tenso. Conforme andávamos, eu sentia que iria surtar a qualquer momento. Quanto mais me aproximava, aquele sentimento de tantos anos transbordava. Fechei meus olhos com força, tentando me livrar do tamanho incomodo.
Todo o inferno que minha vida havia se tornado era culpa de Richard, e ele mereceria pagar com a vida por tudo que fizera durante tantos anos.
As pessoas dizem que você não pode seguir em frente até esquecer o passado. Não é fácil esquecer algo que te tirou o sono por tantos anos. Seguir em frente dói. Deixar algo que você planejou por tanto tempo me tiraria ainda mais o sono. Eu precisava fazer aquilo por mim, e também por outras pessoas. Precisava me assegurar que após tudo acabar, eu poderia viver minha vida tranquilamente. Depois disso, seguir em frente seria o menor dos problemas.
- Richard não traz muita gente quando faz sua entrega de mercadoria para não levantar suspeitas. Eu, Jimmy e Noah ficaremos dentro do depósito, e vocês dois aqui fora, caso ele tente fugir. - Cooper disparou as instruções enquanto encaramos o enorme depósito que aparentemente não servia pra mais nada. Assentimos positivamente, indo até um dos carros velhos e abandonados que tinham ali, que serviria para nos proteger caso algo acontecesse.
- , você está bem? - Dan questionou sério, deixando de observar a entrada do local para me olhar nos olhos, realmente preocupado.
- Estou ótimo.
Dez e meia da noite. Meu coração acelerava tanto que poderia parar a qualquer segundo. Mais dez minutos, e uma van preta chegou ao local, com apenas Richard e o motorista dentro dela. Peguei minha arma com o maior cuidado do mundo, tentando controlar minhas mãos trêmulas, mirando no desgraçado que arruinou tantas vidas. A vontade de atirar de uma vez era grande, mas eu não podia. Tínhamos que ver qual era a mercadoria primeiro. Richard não era um homem bobo. O motorista estacionou a van de modo que não nos permitia observar Richard, o que nos levou a pensar que...
- Porra! - eu e Dan resmungamos ao mesmo tempo, provavelmente pensando a mesma coisa.
Não tivemos tempo de pensar. A porta de trás da van se abriu, saindo cinco homens dali, com armas maiores do que imaginávamos. Tentei me mexer, mas Dan me segurava para baixo.
- Você não vai se arriscar dessa maneira, . Só faça algo quando eu mandar. - ele tentava controlar o tom de voz para não sair tão alto, mas estava claramente dando uma ordem.
Os cinco homens entraram no galpão, e a essa altura eu já não conseguia raciocinar. Dan continuava a me proteger, porém atento a qualquer movimento que nos ameaçasse. Cooper, Jimmy e Noah corriam cuidadosamente pela saída contrária do galpão, trocando tiros com os homens. Dan se levantou e começou a atirar, revelando nossa localização, mas também dando tempo para os rapazes se movimentarem para um lugar seguro. Os tiros pegavam na lataria velha do carro, e foi aí que entrei em cena. Dan me deu um olhar positivo, me juntando a ele e atirando incansavelmente. Cooper e Noah se esconderam atras de outro carro velho que estava a poucos metros do nosso, como uma fortaleza que os deixava minimamente protegidos. Jimmy correu até minha direção, levantando-se e disparando contra quem estava do outro lado, abaixando-se novamente assim que recebia outros tiros como resposta. Dan se abaixou para colocar munição na arma, e assim que se levantou novamente, foi atingido por um tiro na altura do ombro.
- DAN! - gritei enquanto via ele perdendo a força na mão e largando a arma, mas fiz questão de me arriscar e pega-la novamente, disparando diversos tiros com as duas armas.
Ele pôs a mão sobre o ferimento, suspirando pesadamente. Cooper deu cobertura enquanto Noah vinha até nós, pegando Dan e o ajudando a se levantar, mesmo ele tentando negar a ajuda.
- Chega, vamos sair daqui! - Cooper gritou, se arriscando e indo até nós, ainda atirando contra os homens, que estavam diminuindo seus ataques.
O plano era recuar o mais rápido possível. Eu e Jimmy ajudávamos Dan, que mordeu o lábio inferior e ignorou a dor, se desfazendo de nossa ajuda e pegando sua arma novamente, atirando e correndo, enquanto intercalavam na segurança de cada um. Continuamos até, por fim, ver de longe o nosso carro. Os cinco homens continuavam a atirar, mas entramos no veículo sem nenhum ferimento a mais. Jimmy e Cooper abaixaram seus vidros apenas o suficiente para o cano da arma passar ali, continuando a atirar, também acelerando bruscamente o carro, nos levando para longe de toda a confusão.
Soltamos todo o ar que estava preso em nossos pulmões ao ouvir o silêncio novamente. Dan não se deu o trabalho de virar-se e encarar os homens que haviam tentado matá-lo, apenas respirou tranquilamente por ainda estar vivo, embora estivesse com muita dor.
- ELE PRECISA DE AJUDA! - gritei desesperado, observando seu semblante de dor.
- Nós vamos ajudá-lo. Sem desespero, ! - Noah disse alto, com um olhar entre sério e preocupado.
- Dan, eu vou ser pai. Você vai ser praticamente avô. Você é a figura mais próxima de pai que eu tenho, então você vai precisar aguentar firme, ok? - tentei de todas as formas conter as lágrimas que se juntaram em meus olhos. Lágrimas!
- está grávida? - ele arregalou os olhos e sorriu fraco em meio à dor, e aquilo foi o suficiente para sentir aquele líquido descer pelo meu rosto.
- está grávida. - assenti positivamente várias vezes, acompanhando seu sorriso. O momento em que a ficha finalmente caiu. Um sentimento tão grande me atingiu, que eu me sentia... Deus, não tem palavras pra isso!
- Por favor, conserte as coisas com ela o mais rápido possível. - ele sussurrou piedoso, fazendo meu estômago dar piruetas.
- , precisamos te deixar em algum lugar. - Jimmy anunciou, e meu olhar confuso passou por cada um dali.
- Como assim? Eu não vou deixar o Dan.
- Nós vamos cuidar dele, já te disse. - ele debateu impaciente, deixando claro que eu não podia ir junto.
- Vá fazer o que você tem que fazer. Eu sei como isso funciona. Vou ficar bem. - Dan continuou a sussurrar, apertando minha mão numa tentativa de me passar segurança. Seu olhar encantado com a notícia que recebera segundos antes ainda permanecia ali.
Fui deixado na rua mais próxima da casa de , observando o carro sumir dali em alta velocidade. É assustador como tudo pode dar errado tão rápido. Acho que, as vezes, precisamos de algo chocante para nos lembrarmos do que realmente importa.
Toquei a campainha mais de três vezes seguidas, fechando o zíper da minha blusa, que escondia o sangue de Dan que estava ali.
- Olha só quem resolveu aparecer. - Michael abriu a porta, com um tom debochado e raivoso. Ele provavelmente estava furioso pelo fato de não ter atendido nenhuma de suas ligações.
- Por favor, eu preciso falar com a ! É... urgente! - eu me sentia tão exposto, tão cru, tão aberto. As lágrimas se formaram novamente, e o peso do meu próprio corpo parecia algo pesado para se aguentar, como se eu fosse cair a qualquer momento. O olhar de Michael se transformou para realmente preocupado.
- , o que aconteceu?
- Eu só preciso falar com ela! - apertei os olhos com força, implorando mentalmente para que ele não fizesse mais nenhuma pergunta. Pude ouvir passos se afastando, e passos se aproximando. Abri meus olhos, vendo a garota que era capaz de me fazer sentir o que eu sempre me neguei. O amor.
- O que aconteceu com você? - ela se aproximou com os olhos arregalados, observando meu estado deplorável.
- Isso aconteceu. - abri o zíper da blusa novamente, revelando o sangue impregnado na minha camiseta branca. abriu a boca mas não conseguiu dizer nada - Eu fui atrás do meu pai, mas como você pode ver, não deu certo. Ele atingiu uma pessoa muito importante pra mim, e isso me fez acordar pra vida. Eu não quero ficar longe de você, e muito menos do nosso filho. Eu poderia te prometer que vou parar de pisar na bola com você, mas a única coisa que posso te prometer é que vou te magoar de novo, mas também farei de tudo para te recompensar, e farei você enxergar que me perdoar vai valer a pena. - disparei sem descanso, dando um longo suspiro a finalizar, observando a expressão de choque da garota, que demorou longos segundos para absorver tudo o que tinha acabado de ouvir.
- Você descobre que vai ser pai e tem a coragem de se arriscar pra ir atrás de um homem que só serve pra ferrar a sua vida? Você tem noção da idiotice que fez, ? - ela gritou, de repente, me assustando. Começou a me estapear, furiosa, como se aquilo fosse aliviar algo. Eu não esperava a explosão.
- Você precisa entender que é mais delicado do que você imagina. Richard é perigoso, e eu só precisava acabar com isso... - permiti que ela descontasse sua raiva em meu peitoral, afinal, eu não estava com muita moral pra impedi-la de fazer nada. Por um lado, ela estava inteiramente certa, e eu não tinha me tocado até o momento.
- NÃO! Você precisava criar juízo e se tocar que a vida não é brincadeira! Como você tem a coragem de se submeter a esse risco? Você não pensou em mim e muito menos nesse bebê! - ela parecia um furacão, com tanta fúria, que me vi obrigado a finalmente segurar seus braços para acalmá-la. Ela não podia ficar nervosa. Não mais, e principalmente por minha causa.
- , eu...
- Eu achei que me apaixonar e depois me decepcionar doía. Na verdade, dói, mas nada doeu mais do que te amar e ver que você nunca se esforçou pra continuar tendo o meu amor. Nossa amizade começou de uma maneira estranha porque eu tinha inúmeras dúvidas em relação a você. Aos poucos fui abrindo meu coração, fui destrancando as portas que eu tinha fechado e fui te deixando adentrar na minha vida. Não me arrependo de nada porque você me fez sentir coisas que ninguém nunca conseguiu fazer, mas me arrependo de ter acreditado cegamente que existiria um "nós". Você não está nem aí pra mim. - ela deu dois passos pra trás, com a respiração descompassada, e com o olhar cheio de decepção. Seus olhos estavam marejados, assim como os meus. De longe, o momento de mais desespero de toda a minha vida. Tentei me aproximar, quanto mais tentava, mais ela se afastava.
- , eu te amo! - as palavras saltaram da minha boca, e por um segundo, me senti livre, leve, e finalmente liberto da jaula que me obriguei a trancar meus sentimentos. Esse sentimento não durou muito, pois as lágrimas de decepção rolavam sem parar pelo rosto da minha garota, como se eu tivesse dito a coisa mais errada do planeta - Me perdoa, por favor!
- Eu também te amo, , e é por isso que eu te perdoo, mas agora eu me afasto porque me amo também. - ela fungou, passando a blusa pelo rosto molhado, limpando a garganta e dizendo a coisa que eu mais temia ouvir. entrou novamente, batendo a porta na minha cara, e eu nem mesmo tinha forças pra tentar fazer mais nada. Meu coração estava quebrado pela primeira vez na vida por conta do amor.

As incansáveis batidas na porta me fizeram levantar e abri-la, revelando minha mãe com um olhar preocupado, com Sophia ao lado, já vestida com seu uniforme da escola.
- Você se atrasou ou não vai estudar hoje? - minha mãe perguntou curiosa, observando a bagunça do meu quarto com certo nojo, tentando melhorar a situação e recolhendo a roupa que estava no chão.
- Não vou.
- O QUE É ISSO? - seu grito escandaloso foi como uma facada na cabeça, se bem que acho que a facada seria menos complicada de explicar que a camiseta manchada de sangue que estava em suas mãos.
- Nada, mãe. - deitei novamente, jogando o travesseiro em meu próprio rosto, tentando ganhar tempo para inventar uma boa desculpa.
- , onde você estava noite passada? Me explica agora ou você vai se arrepender de ter saído da minha barriga! - mamãe sussurrou para Sophia sair do quarto antes de gritar uma ameaça sem valor, porém que foi capaz de me arrepiar inteiro. Sentei na cama, observando o nervosismo presente em seu rosto.
- Foi uma briga.
- Me fala a verdade, garoto!
- Eu estou falando! - falei mais alto do que devia, dando um susto na minha própria mãe. O silêncio tomou conta do quarto por alguns segundos, até meu celular apitar, indicando a chegada de uma nova mensagem. Olhei para o aparelho que estava jogado no chão, e antes mesmo de me mexer, minha mãe se abaixou, o pegando e lendo a mensagem que a deixou mais furiosa do que já estava.
- "Dan está bem. A bala não atingiu nada importante. Ele estará em casa novamente a partir do começo da tarde." - ela leu a mensagem em voz alta, deixando o celular cair sem nenhuma preocupação, me encarando de boca aberta e com os olhos ameaçando a chorar - O QUE ACONTECEU?
- RICHARD ACONTECEU, OK? - me levantei num pulo, ficando a sua frente e gritando a verdade em sua cara. As lágrimas caíram por seu rosto, balançando a cabeça negativamente e andando pelo quarto sem rumo.
- Vocês foram atrás dele?
- Fomos. Pronto, falei a verdade. - respirei pesadamente enquanto observava a decepção no rosto da mulher mais importante da minha vida.
- O que você tem nessa sua cabeça? Você acha mesmo que eu não sei que aquele desgraçado partiu pra uma vida bandida e que pode acabar com a vida de qualquer pessoa a hora que quiser? - parecia que eu estava passando pela mesma situação pela segunda vez, e de fato, estava, só que com minha mãe o buraco era mais embaixo.
- Eu queria que ele parasse de infernizar a vida das pessoas. Queria que ele pagasse pelo o que fez com você!
- Filho, isso já passou. Eu estou bem. Nós estamos! Você tem , e você não precisa se vingar pra viver em paz. - ela abaixou o tom de voz aos poucos, tentando ter controle da situação. Ela dizer aquilo foi como um soco no estômago, tendo efeito imediato, dessa vez, fazendo os meus olhos se encher.
- Sim, eu preciso, porque além de tudo o que ele fez conosco, ele também já foi atrás de , que por sinal, também não quer saber de mim. - respondi derrotado, sentindo uma dor gigante por finalmente ter que dizer aquilo em voz alta - Você o amava tanto e isso te fez sofrer muito, e olha onde eu estou agora! - tentei virar o jogo usando a boa e velha ironia, obtendo um resultado falho. As lágrimas desceram pelo meu rosto mesmo sem permissão, e os braços da minha mãe me envolveram num abraço gostoso e confortável. O abraço que sempre me acalmou quando Richard tinha duas crises de loucura quando eu era pequeno.
- Você é uma boa pessoa, filho, mas você está deixando sua vida passar por minha causa e eu não quero isso para você. Meu passado não é o seu futuro, tudo bem? Você pode ser feliz com ! - ela dizia com uma certeza gritante, como se de fato, aquilo fosse se concretizar. Permanecemos naquele abraço por mais alguns segundos, até nos soltarmos lentamente e nossos olhares magoados se encontrarem.
's POV end

Há momentos em nossas vidas em que o amor realmente conquista tudo, e depois há aqueles momentos em que parece que o amor não nos traz nada além de dor. Sabe essa coisa de julgar um livro pela capa? É um fato. Às vezes, você já leu o livro todo e, ainda assim, não consegue saber a história toda. Era como eu me sentia em relação a até noite passada.
Também, há momentos em que as coisas mudam sem que a gente perceba de uma vez. Nós evoluímos. Avistamos um caminho e o seguimos, mesmo quando não sabemos onde vamos parar. Foi isso que eu fiz. Segui uma estrada que no momento, só tinha uma mão. Eu não podia voltar e me jogar nos braços de .
- Eles já foram. - Michael adentrou meu quarto sorridente, anunciando que meus tios já haviam saído para o trabalho. Não fomos para a escola, tínhamos muito que pensar.
- Eu não quero sair desse quarto nunca mais. Só vou sair quando tudo estiver resolvido, sério. - cruzei os braços emburrada, fazendo um biquinho.
- Você vai ter que sair pra ter o bebê, ou você vai tê-lo nesse quarto? - fez uma careta engraçada, observando o quarto de ponta a ponta.
- Ainda não consigo acreditar que vou ter um bebê.
- Nem eu. Vou ser um tio e tanto. - ele fechou os olhos e sorriu, provavelmente já imaginando como seria a vida com um neném por perto.
- Michael, o que eu vou fazer? - ameacei chorar, e meu primo arregalou os olhos assustado em como meu humor se transformou tão rapidamente. Malditos hormônios.
- Vamos dar um jeito em tudo isso, eu prometo. - ele se aproximou, colocando meu rosto em seu peito, fazendo um carinho gostoso em meu cabelo.
Passamos praticamente a noite inteira esclarecendo certos assuntos e tentando achar soluções para eles. Não conseguimos muitos resultados, mas só de não ter estado sozinha em um momento tão complicado como aquele já me ajudou muito. Nossos celulares apitavam a cada minuto, com nossos amigos pedindo por notícias e perguntando como tudo estava. Callie também não ia para a escola, e em poucos minutos estaria ali conosco. Mandei uma mensagem para fazer o mesmo, e o que me restou foi tentar ter uma refeição decente.
Não demorou para a campainha tocar, não só com e Callie, e sim, com todo mundo, exceto e Chloe, claro.
- Eu tentei ser discreta, mas fui pressionada até dizer para onde estava indo e puft, esses malucos me seguiram. A propósito, bom dia, pessoal! - disparou de uma vez, transbordando ironia no final, recebendo alguns resmungos como resposta.
- Que falta de educação, gente! - Callie balançava a cabeça negativamente e com falsa decepção no olhar, nos fazendo dar boas gargalhadas.
- Bom dia , ou eu deveria dizer, mãe do meu sobrinho? - o olhar pensativo de Jackson foi um tanto quanto engraçado. Ele me abraçou forte antes de entrar completamente e se juntar na bagunça.
- Você não está... sei lá... triste?! Não era um filho que você planejava, então... - se perdia nas próprias palavras, recebendo um tapa de , que o olhou feio e ordenou que ele sentasse e calasse a boca.
- Eu nem sei como estou direito, mas tenho certeza que tristeza não faz parte disso. Eu estou bem... nervosa. Não contei pra ninguém da minha família a não ser Michael. Não me sinto preparada pra isso ainda. - mordi meu lábio inferior, sentindo a insegurança se apossar de mim. O meu maior medo era não ter apoio da minha própria família.
- Vai dar tudo certo, mas se não der, você pode dormir a cada dia na casa de um de nós. - apresentou a solução que eu com certeza não usaria.
Michael e Callie prepararam alguns lanches, salvando nossos estômagos. Eu me sentia furada, quanto mais comia, mais fome tinha. Me encostei no balcão, me deliciando enquanto não sentia vontade de por tudo pra fora.
- , acho que tenho que te pedir desculpa por isso. Não era o jeito que você planejava nos contar que está grávida, e graças a besteira que eu fiz, Chloe acabou descontando em você. Você me desculpa? - se encostou do outro lado do balcão, ficando frente a frente comigo. Soltei o lanche no mesmo instante, encantada com a fofura do garoto.
- Você não precisa pedir desculpa por isso. Não foi sua culpa.
- Foi sim.
- Foi não. Deixe isso pra lá. Mas me responda, como aquilo aconteceu? - me locomovi até ficar ao seu lado, numa imensa curiosidade.
- Um rapaz estava enchendo o saco dela e eu me intrometi. Ela ficou um pouco brava, então pra não discutirmos na frente de todos, eu a levei até aquele corredor, e por impulso, eu a beijei. - ele explicava enquanto olhava para a própria , que fazia inúmeras palhaçadas com .
- Impulso? - cerrei os olhos, dando aquele olhar totalmente não convencido.
- Ok, não foi impulso, mas sabe, agora que eu e Chloe terminamos de vez, eu consegui enxergar que eu tentava forçar as coisas com a só pra ter uma verdadeira justificativa pra terminar com ela. Eu confundi as coisas durante todos aqueles meses. Achei que era sentimento, mas não era. - ele finalmente me olhou nos olhos, abrindo um sorriso sincero e um longo suspiro, como se estivesse livre de um grande peso.
- Que saco! Eu sempre imaginei vocês casando e tendo de três a quatro filhos. - bufei emburrada, fazendo o meu típico biquinho. gargalhou alto, me abraçando de lado.
- Não nessa vida. Desculpe te desapontar.
- Não me arrasa desse jeito, meus hormônios estão descontrolados. - me desenrolei do seu abraço, fingindo frustração.
- Michael disse que esteve aqui ontem à noite. O que ele te disse? - Callie adentrou a cozinha, me pegando no flagra enquanto atacava a geladeira. Respirei fundo antes de começar a falar. Falar dele me cansava. e Jackson também entraram ali apreensivos, como se estivessem esperando minha resposta. Bem, eles realmente estavam.
- Ele foi atrás do pai, mas não deu certo. Chegou aqui com a blusa cheia de sangue, mas eu não sei de quem era. Pediu perdão, mas terminamos de vez. - respondi porcamente, sendo mínima nos detalhes. Eu não queria dizer a ninguém que trocamos aquelas três palavrinhas que deveriam ser um sonho se tornando realidade, mas foi exatamente o contrário.
- Ele foi atrás do Richard para... matá-lo? - Jackson arregalou os olhos, estagnado.
- Aparentemente sim. Ele é um egoísta. Eu aqui, grávida, e ele arriscando a própria vida a troco de não sei o que. Eu não quero mais essa confusão toda a minha vida, pra mim chega. - eu queimava de raiva, socando as coisas dentro da geladeira novamente, batendo com força a porta da coitada. Minha raiva tinha ficado por cima de toda a minha vontade em tê-lo por perto, e acredite, dessa vez é pra valer.

's POV
Depois de três longos dias, me obriguei a ir para a escola. Eu me sentia completamente diferente, de uma maneira totalmente nova. Me atrasei de propósito, o suficiente para não ter que falar com ninguém, pelo menos não naquele momento. Foram três dias sem falar com ninguém, exceto Michael, que havia mandado uma mensagem dizendo que precisávamos conversar quando eu desse as caras novamente.
Para o meu azar, Callie, que nunca chegava atrasada, por ironia do destino, também havia chegado. Eu podia observar seu olhar furioso de longe, que foi confirmado quando ela me deu um tapa forte no braço. Ok, merecido.
- Eu vou ser muito direta com você. Pare de fazer idiotice. Aquele bebê precisa de um pai, e isso não vai ser possível de você ficar se arriscando por aí para ir atras do seu pai por vingança. Você me ouviu?
- Callie, eu amo ! - revelei de uma vez, deixando a garota sem reação por alguns segundos, e até me permiti dar um sorrisinho vitorioso. Ela fechou a cara, me olhando feio, como se estivesse lutando para não se desmanchar com o que eu tinha dito e permanecer firme na bronca.
- Você ama ela? Tem certeza disso? Você não machuca quem você ama dessa maneira. Você deixou toda essa vingança estúpida ficar em cima desse amor.
- Eu sei que eu errei e não foi pouco, mas você vir aqui e me dizer tudo o que eu já sei não vai adiantar nada.
- Conserte isso tudo!

De longe, a pior manhã de todas. O pessoal falava apenas o básico comigo, como se a qualquer momento eu fosse fazer algo com eles. Me senti o mesmo rapaz que se escondeu na sala de teatro no primeiro dia de aula, procurando alguma segurança e algum modo de continuar seguindo em frente. Me senti sem apoio, sem ninguém. Eu me tornei uma pessoa tão diferente depois de baixar a guarda e me permitir a ter amigos, que agora, estar sem eles, se tornou uma das piores coisas que poderia ter acontecido. Meu ponto é, não importa o que eu faça, nada disso importa sem meus amigos.
Andei rapidamente até meu carro, num desespero absoluto para estar no conforto do meu quarto, onde eu não precisava me fingir de forte o tempo inteiro.
É, me fingir. Coisa que fiz por tantos anos.
- Não vá tão cedo, irmãozinho. - me virei para trás, vendo Jackson e o restante dos garotos com um olhar divertido no rosto. Respirei aliviado, como se aquelas expressões fossem o suficiente para me fazer sentir melhor.
- Eu sou mais velho, Tuck. Você é o irmãozinho.
- Bla bla bla, como você é chato. - o garoto rolou os olhos, desistindo da discussão.
- Pensei que vocês estivessem bravos comigo. - depois de longos segundos me manifestei novamente com certa insegurança, olhando para o rosto de cada um dali.
- Jamais. Estávamos te dando um tempo, aliás, não é fácil. - respondeu bem humorado, dando um olhar significativo no final, se referindo a todas as confusões recentes.
- Como vocês aguentam todas essas confusões sem desistirem de mim? - apertei os olhos com força, sentindo todo o meu medo e insegurança tomando conta do meu corpo, como se a possibilidade deles virarem as costas e desistirem de uma vez da minha pessoa fosse me quebrar ao meio.
- Você é nosso irmão também, . - respondeu como se fosse algo óbvio, e todos os olhares o acompanharam da mesma maneira. O sentimento de carinho e acolhimento surgiu no mesmo instante, espantando tudo de ruim que eu estava sentindo. Eles tinham o poder de mudar as coisas de maneira rápida e eficaz.
A vida sempre da um jeitinho de surpreender. Quando tudo parece estar perdido, uma luz aparece. A luz que vem em forma humana, que nem sempre merecemos, mas alguém se dispõe a continuar ali pra você. A vida estava me dando mais uma oportunidade de tentar fazer tudo certo, e assim eu faria. Eu sentia os muros que me cercavam se destruindo, finalmente me libertando de uma vez. As coisas mudariam, e dessa vez, pra melhor. Eu não podia mais me esconder. As coisas deveriam ficar esclarecidas, só assim, eu conquistaria a confiança de todos ali por inteiro, incluindo a de .
- Venham comigo, preciso levar vocês a um lugar. - apontei com a cabeça para o meu carro, e mesmo confusos, todos entraram, exceto Jackson, que também estava com seu carro ali, mas me seguiria até o lugar ainda não revelado.
O trajeto foi feito com muita conversa e palhaçada, como se nada de ruim estivesse acontecendo no mundo fora daquele carro. Céus, como o sentimento de conforto e alívio eram bons de sentir. Parei o carro, respirando fundo e tomando coragem para sair do veículo, os esperando a fazer o mesmo. Jackson desceu de seu carro, encarando a rua estranha com cuidado, com a expressão cheia de dúvidas.
- O que estamos fazendo aqui? - Jackson girava ao observar o lugar, esperando uma resposta com ansiedade. Parei ali mesmo na calçada, respirando fundo antes de revelar o verdadeiro motivo da presença de todos ali. Estava na hora.
- Eu vou ser pai. Eu, ! Não posso mais permitir que coisas do passado afetem meu futuro. Quero acabar com todo o tipo de segredo que, por algum motivo, ainda nos separe de algum modo. Vocês são meus amigos, e eu quero que vocês se sintam confortáveis ao meu lado, e isso só vai acontecer quando eu me livrar de tudo isso. Trouxe vocês aqui para serem a prova de que a partir de hoje, eu sou um novo homem. Nada de mentiras ou segredos. Tudo acaba aqui, e renasce também. - engoli totalmente todo o meu orgulho, não abaixando minha cabeça em nenhum momento. Aquilo não era motivo de vergonha, e sim, de orgulho. Todos prestavam atenção atentamente, totalmente incrédulos com as palavras que saíram da minha boca, mas logo eu podia notar os sorrisos se formando, os sorrisos que eram o meu novo combustível para uma nova vida.
Andamos em silêncio até a porta da casa de Dan, que nos atendeu com entusiasmo. Todos foram devidamente apresentados, e nos acomodamos sem vergonha. até aceitou uma cerveja.
- Esse aqui é o Dan, o homem que eu considero o pai que não tive. Nos juntamos para tentar acabar com Richard, meu verdadeiro pai, mas acho que isso não serve mais pra mim. As coisas mudaram e eu preciso seguir minha vida. - dessa vez as palavras saíram com certa dificuldade. Era tão estranho dizer em voz alta que eu estava oficialmente largando uma vida toda basicamente baseada em um planejamento de uma vingança que provavelmente acabaria comigo do pior jeito.
- Estou tão orgulhoso de você e do homem que se tornou. Se tem algo que eu posso te falar agora, é para que não tenha medo de cometer erros ou de tropeçar e cair, pois, na maioria das vezes, os melhores prêmios vem quando se faz aquilo que você mais teme. A hora da mudança chegou. A hora de você conseguir tudo o que deseja e tudo o que merece, e talvez você até consiga mais do que jamais tenha imaginado. - Dan parecia deslumbrado, e as palavras saltavam de sua boca com uma sinceridade fora do comum. Eu podia ver em seus olhos toda a felicidade que ele estava sentindo. Tentei verbalizar, mas o estado alegre e orgulhoso de Dan e do restante não me permitiria formular palavras. Demos um abraço em grupo, selando ali um clico e iniciando um novo.
O que moveu minha vida durante todos esses anos foi a sede de vingança. Eu mal percebi que isso teve um impacto tão grande na minha vida que eu já não sabia distinguir certas coisas, pessoas e sentimentos. Desde quando conheci todas essas pessoas que hoje são meus amigos, tudo foi renovado. Eu sinto e vivo. Eu detestava não ter motivo algum para acordar todas as manhãs além da minha vingança, mas ainda assim me convencia de que era o suficiente e um bom propósito para continuar vivendo. Detestava a sensação que tinha quando acordava, que era um imenso vazio. Detestava não ter nada por que ansiar. Mas agora... Oh, agora eu tenho o mundo dentro de cada pessoa que estava em minha vida. Finalmente aceitar e admitir isso pra mim mesmo foi melhor do que me vingar vinte vezes se pudesse. Eu estava pronto para uma nova vida. Estava pronto para finalmente me tornar alguém melhor.
Às vezes o destino parece cruel, te separa da pessoa mais importante da sua vida. Mas apesar de cruel, duvidoso e infeliz, o destino não erra. Tudo precisou desmoronar para finalmente começar a dar certo. Sim, esse é só o começo. Não será fácil reverter todos os meus erros, mas minha intuição diz que por mais que demore, tudo dará certo. Uma história pra ser quase perfeita precisa de muita luta, e eu me sentia plenamente pronto para enfrentar todos os obstáculos. Eu seria feliz com e meu filho.

Capítulo 29


"Albert Camus uma vez escreveu: "Abençoados os corações flexiveis, pois nunca serão partidos." Mas eu penso comigo mesmo que se não se partiram, não se curam. E se não houver cura, não há aprendizado. E se não houver aprendizado, não há luta. Mas a luta é uma parte da vida. Então todos os corações precisam ser partidos?"


Faltava pouco para o jogo começar. Ravens contra Chargers. Era a primeira vez que ficaríamos no mesmo local que Chloe desde o grande ocorrido. O resto da semana foi um tanto quanto agradável. Nada de enchendo o saco, e eu estava sendo bem paparicada. Sério, muito paparicada mesmo. Tudo estava basicamente normal, tirando o fato dos garotos e estarem mais grudados que cu e cueca. Nada importante, não pra mim.

- Estão todas prontas? - Callie andava e confirmava a presença de cada uma ali, nos apressando para sairmos do vestiário. Estava tudo tranquilo até o bendito enjoo. Estávamos na porta da quadra até eu correr de volta para o banheiro de maneira desesperada, entrando ali e vomitando toda aquela nojeira que me acompanhava na maioria dos dias.

Lavei as mãos e o rosto às pressas, tendo uma grande surpresa ao sair do banheiro. estava na porta de braços cruzados, com um sorrisinho simpático sem mostrar os dentes no rosto.

- Você sente muitos enjoos?

- Não te interessa.

- Interessa sim, porque caso você tenha esquecido, é o nosso filho que está na sua barriga. - ele segurou em meu braço antes que eu tentasse sair dali, virando meu corpo para que eu pudesse olhar diretamente em seus olhos. Ele estava sério, e aparentemente determinado a conseguir algo - Você não tem o direito de me deixar de fora disso. Eu te deixei em paz esses dias para que você organizasse sua mente, assim como eu fiz com a minha, agora está na hora de você engolir esse orgulho e me deixar participar dessa fase, aliás, tem muita coisa envolvida nesse meio, e isso inclui contar para as nossas famílias. Esse bebê não é só seu, . - ele fez um carinho com o polegar em meu braço antes de soltá-lo completamente, finalizando com uma postura firme e um olhar ansioso. Minha vontade era de chutar sua cara. Como ele tinha a ousadia de dizer tanta asneira?

foi poupado de um tapa na cara graças a Callie, que apareceu no corredor para me apressar.

Nossa apresentação foi tranquila, exatamente o contrario do jogo, que foi puro nervosismo. Acabou empatado de 02x02. Tanto nervosismo me deu uma imensa fome de... melancia!

Me apressei ao máximo para poder ir embora daquela escola e ir para a minha casa, onde eu comeria até enjoar. Literalmente enjoar. Caminhamos todos juntos até a saída, onde nosso treinador estava coçando a cabeça e nos dando os ombros, como quem não podia fazer nada. Estava chovendo, ou melhor, caindo o mundo. Uma chuva extremamente forte.

- Melhor vocês esperarem essa chuva passar um pouco. Pode ser perigoso. Fiquem à vontade! - disse o treinador do time adversário, observando toda aquela chuva que podia causar um grave acidente caso saíssemos dali naquele momento. Bufei frustrada, batendo o pé no chão discretamente. Eu só queria uma melancia!

Nos acomodamos na quadra novamente, sentando bem ali, no meio dela mesmo, e todos fizeram o mesmo. Me deitei sem me importar, encostado a cabeça na perna de Callie, explicando o quanto queria comer uma melancia. Ela caiu na risada, transformando aquilo numa grande palhaçada. Todo o resto se juntou, dizendo que meu bebê nasceria com cara de melancia. se aproximou, fazendo um carinho gostoso em minha barriga. Meus olhos marejaram no mesmo instante. Era a primeira vez que alguém fazia aquilo. Foi um dos momentos que eu gostaria de congelar e reviver. A única palavra que rondava em minha mente era gratidão. Tudo o que eu precisava estava ali. Eu não percebi, mas aprendi a agradecer por toda grandeza que estava sendo realizada em minha vida, e até pelos detalhes mais simples, que por vezes, meus olhos distraídos e cansados não conseguiam ver. Eu sou muito amada. Disso não tenho mais dúvidas.

saiu marchando dali, como se aquilo tudo estivesse o incomodando. Jackson me olhou torto, dando a entender que eu tinha causado sua saída.

- , ele é o pai do bebê. Vocês precisam se acertar. - Jackson finalmente abriu a boca, se aproximando ainda mais e tentando ser discreto, mas todos ali estavam atentos ao que ele estava falando.

- Não precisamos não.

- Você não tem noção do quanto ele nos surpreendeu. Ele desistiu da vingança contra o pai de vez quando se tocou da burrada que tinha feito. - se intrometeu, pouco se importando se estava incomodando ou não.

- Isso é verdade. Ele nos levou até a casa de Dan, o homem que o ajudava a ir atrás do pai. Ele abriu mão de tudo na nossa frente. - finalizou, com um olhar cheio de sinceridade.

- Isso deve ser mais um dos joguinhos dele. Ele fala muito e prova pouco. - cruzei os braços indignada e brava, me recusando a acreditar em toda a mudança repentina de . Ninguém desiste de algo daquele tipo da noite pro dia.

- Não fale assim. Não se esqueça que você basicamente passou pelo mesmo que ele. - o defendeu, agora, com certa braveza, assim como eu. Ok, ele estava no direito de defender o amigo, mas eu também estava no meu direito de não acreditar depois de tudo o que tinha acontecido.

- Mas é diferente!

- O que é diferente? - foi a vez de cruzar os braços, com o queixo erguido como se estivesse me desafiando.

- É que... eu... que saco, vocês me deixam nervosa!

- Diga o que você quer dizer. Somos seus amigos também. - Jackson segurou em uma de minhas mãos, me encarando de maneira intimidadora, como se estivesse tentando adivinhar o que se passava pela minha mente. De algum modo, ele sabia que eu queria dizer algo, e eu só precisava daquele empurrãozinho para me abrir de vez.

- O que eu estou fazendo é me esconder da verdade. E a verdade é que eu estou com medo de me deixar ser feliz por um momento e tudo desabar de novo, e... E eu não sei se vou conseguir superar.

- Mas , você...

- Chega. Não quero mais falar sobre isso. - passei a mão pelo rosto, me escondendo por alguns instantes. Eu amava o fato de todos quererem nos ver bem, mas era um assunto que ainda me incomodava de maneira gigante.

Por sorte, o respeito sempre ficava acima de qualquer coisa em nosso grupo. Não demorou para nos distrairmos e começarmos a papear sobre coisas aleatórias, até que meu pensamento parou em minha mãe. Eu precisava contar pra ela. Precisava começar a ir ao médico para cuidar do bebê, e não tinha como fazer tudo debaixo dos panos. Peguei meu celular e disquei seu número, mas só chamou. Eu já tinha tentado ligar de manhã, mas ela também não tinha atendido. Ela também não ligou no dia anterior. Não pude ignorar a enorme preocupação que de apossou de mim, afinal, nos falávamos todos os dias.

Depois de quase uma hora ali largados no meio da quadra, tivemos permissão para irmos embora pois a chuva havia cessado. Eu ainda estava com vontade e comer melancia e ainda preocupada. Entrei em casa às pressas, sem saber o que fazer primeiro. Tio Chris estava na sala, perdido em meio a tantos papéis do trabalho, enquanto tia Márcia estava na cozinha preparando uma sobremesa que aparentemente estava ficando deliciosa.

- Uau, chegaram tarde! - ela nos recebeu com um típico beijo estalado na bochecha - , você tem falado com sua mãe? Ela não me atende desde ontem! - ela pegou a tigela com a sobremesa e levou até a geladeira, logo em seguida colocando uma mão na cintura e esperando minha resposta. Senti meu mundo girar. Toda aquela preocupação dobrou de tamanho, me fazendo entrar num desespero maior do que eu gostaria.

- Ela não me atendeu hoje. - respondi baixo, imaginando mil coisas que poderiam ter acontecido e encontrando o olhar preocupado de minha tia, que arregalou os olhos ao notar os meus cheios de água - Precisamos ir lá agora! Ela sempre retorna nossas ligações, aliás, ela sempre liga todos os dias! - a essa altura eu já estava andando de um lado para o outro, pegando a chave do carro com pressa e correndo até a porta. Tio Chris levantou assustado, sem entender quase nada.

- , tenha calma! O que aconteceu? - ele se aproximou, fechando a porta que eu tinha aberto há poucos segundos.

- Minha mãe não me ligou ontem e não me atendeu hoje. Tem algo errado, tio. Eu sei que tem. - foi preciso muito esforço para formar uma frase toda sem me embolar em minhas próprias palavras por conta do desespero que já tinha tomado conta de mim.

- , você não pode ficar nervosa. Pense no bebê! - segurou meus braços com força, se calando no mesmo instante em que percebeu o que havia dito. Arregalou os olhos e colocou a mão na boca. Senti meu corpo inteiro se arrepiar, gelando no mesmo instante. Mais uma vez, o mundo estava caindo na minha cabeça.

- Que história é essa? - titia parou de se mover no mesmo instante, nos encarando com o olhar mais duvidoso do mundo. Eu não fui capaz de formar uma palavra sequer. Ela me encarou surpresa, com as sobrancelhas arqueadas, e eu apenas espalmei as mãos no ar, ainda sem saber o que dizer. Ela abriu e fechou a boca inúmeras vezes, mas não emitiu som algum.

- Me desculpe por isso. - mordi o lábio, apertando os olhos com força e jogando a cabeça pra trás, tentando conter o choro. Estávamos nos distanciando do verdadeiro assunto, e era a vida da minha mãe que mereceria atenção no momento - Eu sei que vocês acham que isso é um absurdo. Um bebê nessa idade não é o sonho de ninguém, mas será que a gente pode deixar essa conversa pra depois e irmos atrás da minha mãe? Eu sei que ela precisa de nós.

- Ô meu amor, você não precisa pedir desculpa por isso! Te amamos acima de tudo, . Aconteceu, não foi? É o seu filho, e vamos amá-lo assim como amamos você. - meu tio finalmente acordou do seu transe depois de ter conseguido assimilar todas as informações que tinha acabado de ouvir. Envolveu seus braços longos em meu corpo, num abraço cheio de amor e conforto. Nada de raiva ou similares, apenas amor e apoio. Tudo o que eu e meu bebê precisávamos.

- Eu não contei pra minha mãe. Eu preciso contar. Precisamos ir atrás dela, por favor! - me soltei de seus braços aos poucos, chorosa. Minha mãe estava em perigo. Eu sabia, eu sentia.

- Nós vamos.

Entramos no carro nervosos e apreensivos. Ninguém queria admitir, mas também estavam tão desesperados quanto eu. Merda, eu nunca devia ter deixado minha mãe sozinha com aquele monstro.

Minha vida em casa nunca foi boa. Meu pai sempre me dava motivos para querer sumir desse mundo o mais rápido possível. Ele sempre foi uma pessoa fria. Sempre quis nos ver no auge da dor e da tristeza. O prazer dele era nos ver chorando, mas agora... agora estava na hora dele pagar.

O carro parou na frente da casa que eu nunca suportei estar dentro. Saímos do carro e corremos até a porta com pressa.

Os gritos.

Os gritos dela.

De longe, uma das piores sensações. Ela estava sendo violentada mais uma vez.

- Eu vou entrar. Vocês fiquem aqui e chamem a policia! - tio Chris se manifestou após alguns minutos andando de um lado para o outro, pensando num plano rápido. Deu um abraço em e um beijo rápido em minha tia, que tentou o puxar pela camisa de volta, mas ele deu aquele olhar de quem realmente precisava ir. O homem mais corajoso que eu conhecia. O homem que fazia de tudo pela família.

- Eu não posso ficar aqui sem fazer nada! - bati o pé, aflita ao ver meu tio se arriscando tanto por algo que nem deveria.

- Você vai ligar pra polícia. É o melhor que você pode fazer. Não vou permitir que você entre e se arrisque. - minha tia ergueu seu celular em minha frente, com um tom autoritário. Segurou em uma de minhas mãos, como se aquilo fosse nos manter fortes. fazia um carinho em meu braço, mas não escondia todo o seu nervosismo, aliás, seu pai estava se arriscando por demais.

Tio Chris foi esperto o suficiente para pular a pequena cerca que tinha ali, dando acesso ao jardim e a porta dos fundos. Grudei meu ouvido na porta novamente, ouvindo aqueles gritos desesperados. Senti o peso do mundo em meus ombros. Ela estava aguentando tudo sozinha, e nada no mundo podia ser mais injusto. Em poucos segundos, inúmeros flashbacks rolavam pela minha mente. Tantas dificuldades, mas minha mãe sempre tentou me proteger, mesmo nem sempre dando tão certo quanto ela esperava. Seu amor por mim sempre foi tão imenso, que ela se sacrificava diariamente só para me ter em segurança. Seu amor sempre foi o mais puro e verdadeiro. O maior.

Estava na hora de retribuir.

Mais um grito. O grito que, chacoalhou meu mundo inteiro. O grito que me atingiu como um raio.

A tremedeira me acompanhava, mas não me dei o luxo de errar o número da polícia. Enquanto todos contribuíam para a distração de Sam, eu tentava ser mais rápida possível na ligação, dando detalhes rápidos e falando muito baixo. Meu coração estava acelerado como nunca. Aquela ligação foi o que nós sempre sonhamos em fazer, mas nunca tivemos coragem. Senti minhas pernas fraquejarem e tudo ficando embaçado por conta das lágrimas. Deus, como as pessoas podem ser tão cruéis? Como a maldade pode ter esse poder tão grande? Sam se perdeu. Sam desistiu, e consequentemente, nós também. Desistimos de tentar salvá-lo dele mesmo. Desistimos de tentar. Mas se tem uma coisa que nunca desistimos, foi da vontade de vê-lo pagando por tudo que já tinha cometido. Em meio a tanta desgraça, conseguimos manter nossas esperanças, mesmo havendo dias em que também queríamos desistir de exatamente tudo. Não nos demos por vencidas. Perdíamos as guerras, mas não a batalha. E agora, estava oficialmente na hora de vencê-la.

- Eu vou entrar lá. - anunciou nervoso, nem mesmo dando tempo para o impedir. Ele correu, seguindo os mesmos passos que o pai havia dado. Coloquei a mão em minha barriga, tentando manter a calma e respirar fundo. Minha mãe precisava de mim. Meu bebê precisava de uma avó. Dei o primeiro passo, ainda mole pelo tamanho nervosismo.

- Nem pense nisso. - os braços de minha tia me seguraram com força, mais autoritária do que já fora em sua vida inteira.

- É a minha mãe! - sussurrei quase inaudível, sentindo as lágrimas se formarem novamente.

- É a polícia! - ela apontou com o queixo para as três viaturas que corriam com toda a velocidade, freando bruscamente em frente a casa.

Não demorou para que os policiais se posicionassem em diferentes lugares, nos perguntando coisas que pudessem os ajudar, e pedindo para nos afastarmos. A coisa mais difícil que eu já tive de fazer. Dois deles foram até os fundos, assim como ; outros dois, prontos para arrombarem a porta caso ela não fosse aberta rapidamente.

O desespero.

O medo.

O tiro.

Não teve braço forte o suficiente para me segurar. Toda a ação não demorou nem dez minutos. A polícia tentou negociar, mas Sam se recusou a cooperar. Corri mais rápido do que imaginava, parando no momento em que vi todo aquele sangue se espalhando pela sala. Sam agonizava no chão pelo tiro que recebera em seu braço. A arma que estava em suas mãos, agora estava jogada no chão.

Ele queria matar minha mãe.

Ele quase a matou.

Minha mãe, que estava sendo ajudada por dois policiais finalmente se levantou do chão, correndo até minha direção. Nos abraçamos mais forte do que qualquer outra vez que já tínhamos nos abraçado na vida. Suas lágrimas caiam sem parar, fazendo um carinho gostoso em meu cabelo.

Estava acabado.

- Está tudo bem, meu amor. Está tudo bem. - ela sussurrava em meio ao choro, dando um longo suspiro aliviado. O restante se juntou conosco num abraço em grupo.

- Marie, eu sinto muito por isso! - nos separamos aos poucos, e minha tia pegou nas mãos de minha mãe, se segurando para não chorar também.

- Obrigada por terem vindo! - mamãe desabou no choro, sendo amparada por nós, que a abraçamos novamente.

O barulho de ambulância tomou conta de nossos ouvidos. Os paramédicos entraram com rapidez, colocando Sam numa maca, e antes que o tirassem completamente dali, criei coragem para me aproximar. Ele estava vulnerável de uma maneira que eu nunca tinha imaginado. Eu poderia enchê-lo de porrada naquele instante, mas eu estaria me rebaixando até seu nível. Ele teve a audácia de me encarar, tentando me intimidar como tinha feito por anos. Não funcionou. Permaneci com a postura séria, o olhando nos olhos. Os olhos que sempre me davam medo. Os olhos que sempre estavam cheios de raiva. Senti um arrepio correndo pelo meu corpo, assim como a raiva que agora, eu que sentia.

- Você vai apodrecer na cadeia, seu monstro! Acabou de vez. Espero que você nunca se esqueça desse dia. O dia em que VOCÊ foi o fraco e inútil. - esbravejei com desdém, cuspindo em seu rosto junto com toda raiva que estava em meu peito. Seu olhar de dor e surpresa me fez sorrir.

A maior arma que Sam havia usado contra nós foi nossa própria mente. Ele nos fez acreditar que éramos fracas e inúteis. Um grande nada. Ele nunca esteve tão errado. Quem são as fracas agora?

Ouvi o impacto do corpo da minha mãe bater no chão. Ela havia desmaiado, e o sorriso no meu rosto se desfez no mesmo instante. Os paramédicos voltaram, na intenção de também levá-la ao hospital, mas antes mesmo de encostarem em seu corpo, minha tia gritou, não permitindo de maneira alguma.

- Ela não vai para o hospital na mesma ambulância que aquele desgraçado. Nós a levaremos. - tio Chris a pegou no colo, levando até o carro com pressa, sendo seguidos por todos nós.

Todos juntos. Ambulância e polícia. Tínhamos muito que fazer ainda. Chegamos ao hospital em poucos minutos, e a primeira coisa que fiz ao sair do carro foi vomitar. Tia Márcia foi a única permitida a ir com a minha mãe para uma área restrita, e toda aquela correria estava me deixando sem forças. Eu sentia dificuldade em respirar, sentindo que meu pulmão podia falhar a qualquer instante. Minha visão estava ficando embaralhada, me dando uma tontura fora do comum.

- , você precisa de um médico! - apoiou meu braço em seu pescoço, me ajudando a entrar no hospital de uma vez.

- É só uma crise. Vai passar. - senti aquele líquido quente descer pelo meu rosto. Malditos hormônios que me faziam chorar a todo instante.


's POV

- Onde ela está? - corri com pressa ao avistar de longe, que estava na frente da recepção do hospital com seu pai.

- Ei, calminha. Deixaram ela entrar pra ver a mãe, daqui a pouco ela deve sair pra dar notícias. - os braços de grudaram em meus ombros, como se estivessem me prendendo ali. Soltei um suspiro pesado, e uma ansiedade que estava me fazendo soar.

Eu já me sentia um funcionário do hospital. Estava praticamente batendo cartão ali. Primeiro minha mãe, a mãe de Jackson e agora a mãe de .

- O que aconteceu? - tomei o copo de água que Chris me ofereceu, calmo o suficiente para finalmente sossegar e sentar, pedindo por uma explicação completa e detalhada, coisa que não conseguiu dar por telefone.

Meu pedido foi atendido, e a cada detalhe do ocorrido assustador me fazia sentir inúmeros arrepios. Sam podia ter feito uma grande loucura, mas a vida finalmente deu o que ele merecia. Minha vontade era de entrar ali, achar o leito onde ele estava e terminar o serviço, porem a morte era bom demais pra ele. A cadeia seria o seu pior pesadelo, o lugar onde ele se arrependeria até o último segundo por ter feito o que fez enquanto estava livre.

Senti um alívio imenso. Era como se uma grande barreira tivesse sido derrubada. sempre sonhou com o dia em que o desgraçado do pai se ferrasse de vez, e o dia finalmente havia chegado. Minha garota sempre enfrentou essa barra de cabeça erguida, e agora, ela finalmente estava livre. LIVRE!

A presença de iluminou o local. Foi como se tudo ao redor tivesse parado, prendendo meus olhos apenas em seu corpo. Ela arregalou os olhos ao me ver, e antes mesmo de abrir a boca, me agilizei, levantando e a abraçando forte. O abraço que eu precisava dar há tempos. Ela mal sabia onde colocar as mãos de tão surpresa, mas finalmente cedeu, me abraçando de volta. Não tinha nada melhor do que tê-la ali em meus braços. Era tudo o que eu precisava.

- Por algum motivo eu precisava falar com você. Liguei no seu celular mas ninguém atendeu, então liguei no de , e como você pode ver, ele me disse a verdade, e aqui estou eu. - a soltei aos poucos, mesmo contra a minha vontade. Abri um sorriso maroto, e a garota se permitiu sorrir também. Ela aparentava estar exausta. Seus olhinhos inchados e a pontinha do nariz vermelho a deixava um tanto quanto fofa, embora o motivo daquilo não fosse nada fofo. Fiz um carinho rápido em seu rosto, até que ela segurou em minhas mãos, as tirando dali, mas ainda as segurando - Você está bem? Está machucada?

- Estou bem sim. Na verdade, ótima! - ela abriu um sorriso largo, fazendo meu coração palpitar.

- E o bebê? - perguntei curioso, e me olhou receosa, quase desmanchando aquele sorriso. Implorei com o olhar para que ela me respondesse. Eu entendia que ela ainda estava magoada, mas precisava me dar espaço para reconquistar sua confiança.

- O bebê está bem.

- Como você está se sentindo? Deve ser surreal tudo isso.

- Livre. Finalmente livre. Como um passarinho fora da gaiola.

- E sua mãe, como está? - disparei nas perguntas, elétrico e curioso, como uma criança que estava descobrindo o mundo. Ela soltou uma risada fraca, sendo claramente a coisa mais gostosa que eu ouviria durante o dia inteiro.

- Ela está bem. Está um pouco desidratada, e aí juntou com todo o nervosismo e puft... fora isso, ela deve estar tão feliz quanto eu!

- Estou tão orgulhoso! Você foi tão corajosa! - foi a minha vez de abrir o maior sorriso, segurando em seu rosto novamente, pronto para grudar nossos lábios. virou o rosto, um tanto quanto desconfortável com a minha atitude. Sussurrei pedidos de desculpas. Não era a minha intenção estragar o momento daquela maneira.

- Obrigada por isso, . Caso queira ir embora, pode ir. Já está tudo bem. - ela respondeu ainda com o rosto virado, sem graça em olhar em meus olhos novamente. Aquele pouco de timidez que nunca sumia, mas que eu adorava. Se ela soubesse o quão linda ficava...

- Eu não vou te deixar. Nem agora e nem nunca. - tomei a liberdade para tocar em seu rosto novamente, o virando para mim. Desci minhas mãos, tocando em sua barriga e fazendo um carinho ali. Observei todo aquele arrepio que a proporcionei, sorrindo fraco. Meu coração estava mais acelerado que uma ferrari em alta velocidade. Ela não reclamou, e muito menos tentou me impedir.

Meu coração transbordou felicidade, assim como esperança. Nós três seríamos muito felizes.


***


- Sinto como se tudo finalmente estivesse se ajeitando. Não vou dizer que foi fácil desistir de tudo, mas cara... o pai da vai pra cadeia e eu vou ser pai! Vai ter um mini eu por aí! - exclamei extasiado para Dan, que me encarava com um sorriso largo. Eu ainda estava sem acreditar nos acontecimentos recentes.

- Então está tudo oficialmente acabado. - Cooper surgiu na sala de repente, me dando um baita susto.

- Há quanto tempo você estava ali? - apontei para a cozinha, que era de onde ele tinha saído. Eu havia chegado na casa de Dan em menos de dez minutos e nem mesmo tinha percebido a presença de Cooper ali.

- Tempo o suficiente para ouvir você falar de como está feliz. A propósito, também fico feliz por isso. - ele se encostou na parede, dando um gole em sua cerveja. Aquele traje de camiseta e bermuda era algo que eu nunca imaginava ver na vida. Cooper usava terno até pra tomar banho.

- Você não está bravo comigo? - cerrei os olhos desconfiado, querendo me certificar de que estava tudo numa boa.

- Garoto, você é muito ruim de memória mesmo! Até onde me lembro, eu mesmo te disse para consertar as coisas com . - ele juntou as sobrancelhas como se estivesse ofendido, logo relaxando, dando um olhar mais agradável, indicando que aquele olhar feio não passava de uma brincadeira.

- Pensei que estivesse bravo por eu ter desistido da vingança contra Richard. Eu joguei a toalha sem te avisar.

- E desde quando você me deve alguma satisfação? Por Deus, . - ele gargalhou alto, revelando um bom humor que era raro de se ver - Aliás, eu estava aqui com Dan discutindo exatamente sobre Richard, e chegamos à conclusão de que dar uma pausa é o melhor a se fazer. Eu preciso estar ao lado de Julie e de Jackson, você precisa estar ao lado de e do seu filho, e Dan precisa dar um jeito nessa merda que ele chama de vida. - Cooper segurou o riso, enquanto Dan mostrava o dedo para ele e rolava os olhos. Eu estava estagnado com tanta notícia boa de uma vez só. Claro que Richard merecia pagar por tudo que havia feito, mas aprendemos que quanto mais se mexe na merda, mais ela fede. O melhor a se fazer era deixar a poeira baixar, evitando mais alguma confusão.

- Acho que todos nós temos muito com o que nos preocupar. Agora, se vocês me dão licença, preciso dizer a minha mãe que ela vai ser avó. - fiz uma careta de falso sofrimento, tentando não pensar na reação da minha mãe. Ela com certeza surtaria.

Pela primeira vez em muito tempo, não dirigi com pressa. Estava tranquilo. O dia tinha sido cheio de... alegrias. Sam estava fora do jogo. finalmente poderia respirar aliviada, sem medo de ser agredida novamente, assim como sua mãe. Duas guerreiras. Meu filho com certeza teria ótimas referências para ser a melhor pessoa desse planeta. Liguei meu radio, conectando com o celular e colocando o álbum V do Maroon 5 pra tocar. Eu também respirei aliviado. Cantei, senti. Coisas que não fazia há tempos. Céus, eu me sinto tão vivo, tão repaginado, tão... novo!

Marie passaria a noite no hospital, e mesmo insistindo muito em querer ficar ao lado de durante a noite toda, Chris me aconselhou a voltar pra casa. Só me restava uma coisa a fazer, algo bem complicado!

A luz da cozinha estava acesa, indicando que minha mãe ainda estava acordada. Não tinha jeito, eu precisava falar.

- Onde você estava? - ela soltou a xícara de café e cruzou os braços, com uma expressão nada boa. Opa. Pensei em muitas desculpas esfarrapadas, descartando todas. Estava na hora da verdade. De toda a verdade. Para as coisas darem certo, nada podia ficar de fora, nem mesmo um detalhe sequer.

- Eu vou me sentar porque a história não é tão curta, então vou te recomendar a fazer o mesmo. - sorri simpático, com os ombros na mesa e as mãos no rosto como uma criancinha. Ela se sentou, ainda com a expressão brava e desconfiada - Você já conhece , mas não conhece muito da vida dela. Bem, ela tinha um pai maluco, bem maluco mesmo. Ele agredia ela e a mãe, mas de algum tempo pra cá ela foi morar com a tia para não sofrer mais esse tipo de abuso, mas a mãe dela continuou nas mãos daquele traste. - dei uma pausa, acompanhando a transformação de expressão de minha mãe, que ficava entre triste e surpresa. Muito surpresa! - Hoje o traste foi preso. Isso mesmo, preso! Sabe o que isso significa? Que e Marie, sua mãe, estão finalmente livres! Eu passei o dia todo no hospital e dei uma passada na casa de Dan. Foi isso. - finalizei com entusiasmo, quase rindo do "O" que minha mãe formou com a boca. Ela precisou de longos segundos para processar tudo. Tomou um gole da bebida que estava em sua xícara, pensou mais um pouco, e finalmente abriu a boca, ainda chocada com tanta informação.

- Misericórdia! Está tudo bem com as duas?

- Está tudo ótimo, mãe!

- Meu Deus, que loucura! Eu nem consigo imaginar o tanto que as duas sofreram com tudo...

- Eu preciso te contar mais uma coisa! - interrompi nervoso, batendo as mãos na mesa para chamar sua atenção. Ela me encarou feio, como se aquilo tivesse sido uma atitude horrível. E foi mesmo, mas eu precisava ser rápido para saber se seria cortado em pedacinhos, ou se viveria feliz para sempre com a minha garota. A ansiedade tomou conta. Todas as palavras sumiram, e me senti como um bebê que ainda não sabia falar. Merda.

- Fala menino! - ela agitou, pois meu silêncio já estava sendo estendido por muito tempo e isso dava a entender que algo ruim estava por vir. Pra mim, estava longe de ser algo ruim, pra ela...

- Olha, talvez você fique muito brava ou muito feliz, e eu quero que você saiba que foi totalmente não planejado, mas...

- , o que você fez? - ela se levantou com fúria, e eu já estava pronto pra ser morto. Puta que pariu.

- está grávida. - falei de uma vez, apertando os olhos com força, pronto pra ser atingido pela xícara que estava ao alcance dela. Por incrível que pareça, nada me atingiu. Abri os olhos lentamente, observando sua expressão... derretida. Emocionada. Feliz!

- Eu vou ser avó? - perguntou chorosa, se aproximando lentamente.

- Você não está brava?

- Como eu estaria brava? É uma criança! Claro que não é a idade ideal, mas filho, você vai ser pai! Mais uma vida vai vir ao mundo! - ela se rendeu ao choro, me abraçando forte.

Meu peito estava cheio de tanta felicidade. O sentimento que eu nunca imaginei que fosse sentir. Como a vida é maluca, né? As coisas mudam tão rápido, mas tudo tem seu propósito. Agora entendo isso com toda a clareza do mundo. Clareza que, me mostra diariamente o caminho que devo seguir de verdade. O caminho da felicidade!


***


Três dias se passaram. continuava trocando poucas palavras comigo e eu sentia que meu tempo estava acabando. Minha mãe exigiu que eu arranjasse um encontro com e sua mãe, afinal, seriamos todos uma família. O problema é que a lindinha se recusava a trocar mais do que meia dúzia de palavras comigo e sempre fugia quando eu tentava me aproximar. Não quis expor essa minha dificuldade pra ninguém, aliás, eu tinha o dever de consertar tudo sozinho. Marie estava bem pelo o que havia dito. Jackson estava cada dia mais grudado com a mãe, evitando até de ficar tempo a mais no treino. Estávamos todos andando com nossas vidas, ou pelo menos, tentando.

Me troquei rapidamente, determinado a falar com antes do treino. Ela precisava me ouvir. Praticamente me plantei na frente do vestiário feminino, não me mexendo pra nada. Pelo amor de Deus, mais de dez minutos pra colocar um shorts e uma blusinha?!

- Ah não. Você não. - ela rolou os olhos assim que me viu, ainda dentro do vestiário. A lindinha foi a última a sair. A não sair, na verdade.

- , para com isso. Você não pode me evitar pra sempre!

- Você não entende que eu não te quero por perto? Eu não me importo se você é ou não o pai dessa criança, porque eu não preciso de você! - esbravejou ríspida, arregalando minimamente os olhos, surpreendida com a própria grosseria. Aquilo me atingiu em cheio, mas não me deixei abalar.

- Você precisa parar de me condenar e me dar uma chance de consertar a nossa relação.

- Que relação? - ela arqueou as sobrancelhas, gargalhando ironicamente, o que me tirou do sério.

- Pelo amor de Deus! Você não está cansada desse jogo de fingir que não gosta de mim? - foi a minha vez de esbravejar, deixando a garota sem palavras. Ela abriu e fechou a boca algumas vezes, tentando encontrar palavras para me responder a altura.

- Não estou fazendo joguinho nenhum.

- Então apenas termine tudo de uma vez, aqui e agora, se é o que você quer. Olhe nos meus olhos e diga que não me quer por perto, que não me ama, e que me quer longe. - a cada palavra eu me aproximava mais, pouco me importando por estar no vestiário feminino e na punição que levaria por aquilo. Ela se afastava, até finalmente bater as costas na parede, sendo obrigada a me olhar nos olhos. Senti meu estômago revirar de ansiedade por sua resposta. Coisas que só me faz sentir.

- Não posso. - sussurrou com a cabeça baixa, me dando um imenso alívio. Tinha uma luz no fim do túnel!

- Claro que você pode, faz assim: ", eu não te amo mais" ou ", eu não te quero na minha vida". - forcei a barra, não me importando se aquilo pudesse deixá-la em um estado ainda mais confuso. Eu precisava da verdade, e pressionar era minha melhor chance.

- , eu te amo. Eu não posso te deixar, mas você está sempre me deixando. Você se afasta quando quer, volta quando quer… não de todos, não dos seus amigos, mas de mim! Não tenho mais energia pra essas coisas. Não posso mais agir como uma adolescente que não sabe o que quer da vida, porque eu vou ser mãe! Preciso ter comprometimento com as minhas decisões. - ouvir aquele "eu te amo" sair de sua boca me fez ir ao céu. O resto, me fez despencar. Meu coração se apertou, e eu desejei por um breve segundo nunca ter aceitado todos aqueles sentimentos, porque a dor era grande e profunda. Eu queria dizer algo grande e bonito que a fizesse mudar de opinião, mas eu apenas conseguia pensar em uma frase que, se ela dissesse sim, tudo mudaria.

- Eu só preciso de mais uma chance! É só o que eu te peço! - segurei delicadamente em seu rosto, a impedindo de olhar para outro lugar que não fossem meus olhos. Ela não disse nada, e nem aparentava querer dizer. Ela simplesmente estava esperando que sua liberdade fosse concedida, e foi isso o que eu fiz. Mais um segundo olhando para ela e meu coração pararia. respirou fundo, andando rapidamente para longe dali, mas antes dela entrar no corredor que a levaria para a quadra, gritei o que eu achei que ela gostaria de ouvir no momento - Contei pra minha mãe que ela vai ser avó. Ela amou a notícia, e também quer um encontro com você e com sua mãe. Você pode não me querer por perto, mas não é justo minha mãe pagar por um erro meu. - ela prestou atenção em cada palavra, sumindo dali em poucos segundos, ao contrário da dor, que permanecia ali, me maltratando a cada segundo.

's POV end


- Você não tem dó de mim, né? Eu vou ter um bebê! - resmunguei baixo enquanto saía da quadra com Callie ao meu lado, que tinha me feito pagar os pecados de tanto esforço no treino.

Pelas minhas contas, já era um mês e duas semanas de gravidez e eu já me sentia mais espaçosa do que o normal. A necessidade de dormir, comer e vomitar várias vezes ao dia eram incontáveis. Uma experiência e tanto. Me sentei em um dos banquinhos que tinha ali, apenas trocando de blusa. Analisei rapidamente as cicatrizes que ainda possuía em minha barriga, dando um sorrisão. Nunca na vida imaginaria que sorriria ao olhar aquilo, mas sorri. Aquilo ali indicava que a página finalmente havia sido virada. Estava tudo indo extremamente bem com Sam preso e minha mãe perto de mim. Por outro lado, as coisas não estavam tão boas assim. Eu me recusava a pensar em , parecia demais pra mim. Ao mesmo tempo que eu o queria perto, queria longe.

Uma breve discussão sobre a possível mudança de posições começou, e Chloe virou bicho. Aquela voz, que agora parecia insuportável, contribuiu muito para o meu enjoo e para a minha paciência já começar a se esgotar.

- Eu não vou ficar como base!

- É só um teste, Chloe. - Callie rolou os olhos, já exausta da confusão que a garota estava causando.

Desde o ocorrido ela parecia ter se transformado. Havia se tornado em uma garota tão... estúpida!

- Acho que poderíamos formar duas bases com duas garotas para saltar. em uma, e Callie na outra. - Paige manifestou sua singela opinião, sendo fuzilada com os olhos por Chloe. Aquilo estava um tanto quanto engraçado, porque o olhar de Paige dizia nitidamente que havia feito aquilo só pra provocar.

- nem mesmo sabe saltar direito! - Chloe gritou em um tom irônico, claramente na intenção de fazer com que a mesma ouvisse. nem mesmo deu ouvidos, apenas fingiu que não era com ela, deixando a garota ainda mais furiosa - Mas ela sabe ser uma bela fura olho! - o vestiário inteiro ficou em silêncio. bateu o armário com força, altamente indignada. Eu já até conseguia prever o quer estava prestes a acontecer.

- Pare de fazer o seu problema comigo se tornar público. Ninguém precisa saber de nada disso! - tentou ser discreta, mas todo o silêncio capacitou a todas nós ouvirmos suas palavras.

- Por que não? Por que todos acham que você é muito legal e simpática pra ser uma traidora? Porque é exatamente isso o que você é! - Chloe riu sem humor, apontando o dedo na cara de , que tentava se afastar e manter a calma, mas estava cada vez mais difícil.

- Cala essa boca.

- Não calo! Você sabe que é verdade, e te dói na alma perceber que depois disso, todos vão te olhar diferente, porque ninguém confia numa traidora!

- Eu não fui uma traidora! estava querendo terminar com você há tempos e você nunca percebeu! - soltou a verdade em sua cara, tapando a própria boca segundos depois, sem acreditar no que ela mesma tinha dito.

- Como você ousa me dizer isso agora? - Chloe estreitou os olhos, gritando de raiva.

E assim começou a confusão.

Levantei rapidamente, extremamente receosa em me meter naquele meio. Chloe empurrava contra os armários com força, fazendo a mesma bater a cabeça ali. Callie correu para chamar ajuda, enquanto o resto... bem, o resto nem teve a decência de tentar separar, exceto Paige, que acabou levando uma cotovelada na boca, que fez sangrar no mesmo instante. Aquilo foi a gota d'agua pra mim. Eu não deixaria ela machucar minha amiga. Ah, mas não deixaria mesmo!

As duas caíram no chão, declarando uma briga oficial. conseguiu ficar por cima por alguns segundos, até Chloe puxar seu cabelo e dar um tapa estalado em seu rosto. Não tive dúvidas que aquela era minha hora de agir. Empurrei Chloe para o lado com toda a minha força, sem me importar se aquilo estava sendo vergonhoso ou não. Ela me encarou por alguns segundos, e antes mesmo dela pensar em atacar novamente, grudei minhas mãos em seus braços, dos quais ela lutava para se livrar.

- Garota, você tem sorte de estar grávida, senão você apanharia junto!

- Meu amor, você tem sorte que eu estou grávida! Acho que está na hora de você acabar com esse show, não é? - com isso, a soltei no mesmo instante, observando seu estado deplorável. Nos encaramos por alguns segundos enquanto ela tentava recuperar seu fôlego. Deduzi que ela realmente havia desistido daquilo, pronta para me levantar e seguir meu rumo. Bem... acho que o que aconteceu foi o verdadeiro significado de "ser apunhalada pelas costas".

Ela não teve dó e com toda a força, jogou o corpo pra cima de mim, fazendo minha cabeça bater diretamente no armário. Callie voltou com a tropa inteira do time dos garotos, e correu em minha direção. Aceitei sua ajuda, me levantando rápido e ignorando a dor que a pancada tinha me dado. Jackson tentou segurar , que finalmente havia conseguido grudar Chloe no armário, devolvendo o troco na mesma moeda.

- Esse é por você ter empurrado minha amiga. - ela deu um tapa certeiro no rosto de Chloe, que nem teve tempo de pensar, já recebendo o próximo - E esse é por você me culpar por um erro que eu já me desculpei e me arrependo!

Jackson finalmente a segurou, enquanto um dos outros garotos segurava Chloe. Alguns riram, alguns parabenizaram , e alguns tentaram fugir quando o diretor adentrou o local.

- Por Deus, gente! Eu já estou velho demais pra cuidar de briga de criança! Quem são os envolvidos? - ele colocou as mãos na cintura, já cansado da situação, que não o agradava nenhum pouco. Sabíamos como as coisas ali funcionavam e estávamos prontos para aquilo. Todos os dedos foram apontados para nós. e Jackson, que estavam próximos a nós, também foram declarados como culpados, e assim que abriram a boca para tentarem se explicar, o diretor os calou - Nem tentem se explicar, rapazes! Eu quero vocês cinco na detenção imediatamente!

Lá fomos nós, totalmente derrotados. Nossa primeira vez na detenção, por um motivo tão lixo como aquele. Entramos na sala cheios de má vontade, e pra nossa sorte, ainda não tinha nenhum professor ali. Sentamos em lugares próximos, exceto , que sentou ao lado de Chloe. O olhei confusa, apenas observando onde ele queria chegar.

- Chloe, quando alguém nos machuca, queremos machucar essa pessoa de volta. Eu sei muito bem como é isso, mas se tem uma coisa que eu aprendi, é que na vida você irá machucar pessoas e se machucar. Se algum dia você quiser se recuperar, há apenas uma coisa que pode ser dita: esquecer e perdoar. É isso que dizem por aí. É um bom conselho, mas não muito prático. - pausou sua fala, me dando o olhar mais significativo que já havia dado em toda nossa história, fazendo um arrepio percorrer por todo o meu corpo. Ele falava pra ela, mas parecia querer que as palavras me atingissem, e honestamente, funcionou bem - O melhor que você faz é seguir sua vida sem carregar essa tristeza junto. - Chloe o olhava com uma expressão entre triste e irritada, mas não abriu a boca pra dizer nada. percebeu que já não tinha mais nada a fazer ali, mudando de lugar novamente, dessa vez, para o meu lado.

Eu ainda não gostava da sensação de estar perto dele, mas não poder me aproximar da maneira como gostaria. Eu até podia, mas sentia que se me aproximasse novamente, toda aquela dor voltaria. Todos os momentos ruins ainda estavam por cima dos momentos bons, e nem aquele par de olhos azuis eram capazes de me passar a segurança que já tinha me passado alguma vez. havia se transformado numa referencia de dor, e nada podia ser mais decepcionante do que aquilo.

- , se você estiver pensando em dizer algo, não diga. Estou exausta, não posso lidar com você agora. - disparei com a voz arrastada de cansaço, fazendo um carinho sem graça na minha própria cabeça que ainda doía um pouco.

- Eu nem abri minha boca! - ele retrucou indignado, com as sobrancelhas juntas, claramente incomodado com a minha reclamação.

- Eu te conheço! Você ainda não consegue entender que eu preciso de um tempo, e você não está me dando esse tempo!

- CHEGA! - Jackson se levantou, assim como seu tom de voz, que foi mais como um grito. Seu semblante em raiva nos surpreendeu, afinal, não esperávamos aquilo - Vocês não conseguem sentar e conversar feito gente? A única coisa que vocês sabem fazer é discutir e discutir! Esse bebê vai precisar dos dois pais, e nenhum de vocês estão facilitando as coisas. Eu já me ferrei com o amor também, já feriram meu coração, e mesmo assim, se aparecesse alguém na minha vida agora, eu não tentaria afastar essa pessoa. Eu tentaria, porque a vida é feita de tentativas, e vocês nem mesmo estão tentando! - ele andou em nossa direção, parando em minha frente e me encarando com aqueles olhos azuis, assim como os do irmão. Bateu as mãos na mesa, chamando minha atenção - , você precisa se decidir se você ama a ponto de perdoá-lo ou se você vai continuar deixando o ódio que você tem pelo o que ele fez estragar tudo. Você que escolhe.

O professor adentrou a sala, e todas as palavras de Jackson ainda me deixaram estagnada por um longo tempo. Sempre ouvi dizer que o amor e o ódio andavam lado a lado. Eu não acreditava, aliás, qual o sentido? E então me vi nessa situação que sempre julguei impossível e sem sentido. Eu já estava perdida em meus próprios sentimentos. Perdida em uma situação que não era fácil de se resolver, mas que eu estava, admito, empurrando com a barriga. Meu bebê tem um pai e não tem como simplesmente o manter longe, mesmo uma boa parte de mim desejando isso. Eu nem mesmo tinha um plano, apenas não queria por perto. Pelo menos, não por ora. Tudo estava sendo tão novo pra mim. Uma vida sem Sam, mas com um bebê. Claro que não tem comparação, mas são mudanças que causaram um impacto gigante em minha vida, e foi aí que eu evitei de lidar com . Parecia muito para se pensar. Ora ora ora... amor e ódio, certo? Tão sem sentido. Mas afinal, desde quando amor faz sentido? Até onde eu sabia, ele apenas me fazia sentir. E muito. Eu podia esconder, mas aquilo ainda fazia meu peito queimar, meu estômago virar, e meu coração disparar.

O sinal indicando o fim da detenção tocou. Chloe saiu como um furacão, e eu nem mesmo me lembrava como andar. Parecia que tinha aberto a porta de todos aqueles sentimentos bons que me causava, e eu juro, eles eram capazes de me fazer voar. Andamos todos em silêncio, e novamente, as palavras de Jackson ecoavam pela minha cabeça. Talvez, bem talvez, estava na hora de dar o braço a torcer.

- . - sussurrei aquele apelido que não saía de minha boca há tempos. O garoto se virou, com um olhar cansado, provavelmente esperando mais uma briga. Meu orgulho tentava me impedir de fazer o que estava prestes a fazer, mas fui mais forte. Precisava ser - Eu não contei pra minha mãe sobre o bebê ainda. Caso você queira ir comigo... - aquilo foi o suficiente para o garoto abrir um sorriso que era capaz de me derreter por inteira. Ah, o amor...

Caminhamos ainda em silêncio até seu carro. O som foi ligado, tocando uma música que meus ouvidos conheciam muito bem.

- Não acredito que você está ouvindo Maroon 5! É só eu deixar de frequentar esse carro que você já troca One Republic, seu falso! - cerrei os olhos, fingindo uma imensa indignação.

- Maroon 5 é muito melhor e você vai ter que aceitar! - ele não se atingiu pelo meu xingamento, batendo no volante conforme os toques da música.

- If I ever let you down, forgive me, forgive me, now. Would it kill you to forgive me? - cantarolamos juntos com toda a animação, e o olhar de deixou claro que a letra daquela música era o que ele queria dizer. Não consegui segurar um sorriso, sentindo uma felicidade que só conseguia sentir ao lado dele. Algo único e natural. Hmmm, o amor!

Cantamos escandalosamente mais algumas musicas antes de chegarmos em casa. Mamãe estava acomodada na casa de titia, que fez questão de tomar a responsabilidade da venda de nossa casa antiga. Pois é, iríamos nos desprender de todos os rastros de nosso passado com Sam, e finalmente teríamos nosso verdadeiro lar!

A chave quase não encaixava na fechadura. Mais uma vez a tremedeira estava me acompanhando. Santo nervosismo! A porta foi aberta após mais algumas tentativas, e aquele cheiro de comida da minha mãe já indicava que ela estava ali, fazendo o que mais gostava. Mamãe sempre foi uma cozinheira de mão cheia!

- Oi meu amor... Opa, oi! - ela arregalou os olhos em surpresa por ver ali, se aproximando rapidamente e o cumprimentando com um abraço apertado, aproveitando para me dar um sorriso sapeca que se desfez assim que eles se separaram.

- Mãe, te apresento oficialmente . - apontei para o mesmo, que sorria simpático e sem jeito.

- Muito prazer, , eu sou a Marie! Vocês não querem almoçar? Está tudo fresquinho! - ela nos convidava já andando em direção à cozinha, revirando os armários e preparando a mesa rapidamente. Eu e nos entreolhamos nervosos, sabendo muito bem sobre o que realmente deveríamos estar conversado, e não era sobre almoço.

- Marie, eu agradeço muito o convite, mas na verdade viemos aqui te contar algo bem importante. - deu o primeiro passo, com a voz firme e séria, o que me deixou chocada, já que por dentro a minha vontade era de correr e me esconder. Sua frase foi capaz de fazer minha mãe soltar o último prato no mesmo instante, e toda aquela alegria que estava em seu rosto segundos antes, já não estava mais, apenas seriedade. Estava na hora.

- O que aconteceu? - seu tom de voz enfraquecido parecia estar esperando uma péssima notícia. Ela se sentou, provavelmente se preparando para caso a revelação a chocasse tanto que fosse capaz de fazê-la cair.

- Mãe... é... é complicado. Talvez você me odeie por isso, mas eu quero que você saiba que foi um acidente. Nem nos meus sonhos eu planejava isso para esse momento, mas... aconteceu. - assegurei, pronta para dar continuidade. Eu sentia minha voz sumindo, assim como a minha coragem. Seu olhar nada feliz fez meus olhos se encherem, me fazendo transbordar nervosismo e ser incapaz de finalizar.

- Você está tentando me dizer que...

- está grávida. - finalizou de uma vez, e eu finalmente pude respirar novamente. Joguei o cabelo pra trás, sentindo o nervosismo se transformando em suor mesmo estando frio. Mamãe se levantou, caminhando de um lado para o outro sem se importar com ali no meio.

- Meu bebê vai ter um bebê, é isso mesmo? - ela parou, me encarando com os olhos marejados, e aquilo foi o que faltava para as minhas lágrimas começarem a rolar.

- Me desculpa!

- Eu não tenho que te desculpar por nada, filha! Você vai ser mãe, isso não é um crime, muito pelo contrário! Você é tudo o que eu tenho, e eu jamais te odiaria ou te rejeitaria por isso! - ela tombou a cabeça para o lado com a voz chorosa, abrindo os braços e me chamando para um abraço. Aquele abraço que era o meu remédio para qualquer coisa. O mais seguro e confortável. O abraço de mãe.

Sempre achei que fôssemos ligadas pela desgraça em comum em nossas vidas, mas eu estava completamente enganada. Nossos corações sempre foram ligados pelo nosso amor e compreensão. Tenho a infinita certeza que não existe nada maior, melhor e verdadeiro que o amor de mãe para filho. Eu sinto. Meu bebê já era imensamente amado!


***


2 SEMANAS DEPOIS...

Pulei da cama ao perceber aqueles floquinhos brancos caindo pelo céu. Neve! Como sempre, o enjoo matinal me acompanhando, mas tudo ok, afinal, NEVE! Desci às pressas, observando todos ali espiando os floquinhos caírem do céu pela janela.

- Ei mocinha, bom dia! - mamãe me deu um beijinho na testa e um carinho rápido na barriga, que já estava um pouco mais aparente. 2 meses, meu bebê já estava crescendo!

O fim de semana que planejamos por duas semanas havia chegado e eu não podia estar mais feliz. Ok, vamos por partes. Eu e estávamos indo bem... com calma, muita calma, mas bem. Nessas duas semanas, Chloe soltava fumaça a cada vez que nos via. Pelo jeito ela simplesmente havia ignorado tudo o que havia falado, o que me dava um incômodo gigante, afinal, éramos amigas! Eu estaria disposta a conversar com ela e acertar os ponteiros se ela não tivesse sido banhada na ignorância desde quando descobriu que basicamente tomou um chifre. Agora, a melhor parte de tudo... passamos dias e dias pensando em algo bacana para fazer, considerando que tinha uma grávida no grupo, o que descartava todas as coisas que fazíamos antes. Chegamos a uma brilhante idéia que envolvia a todos, exatamente todos mesmo, inclusive todos os pais. Já que somos um squad e tanto, decidimos juntar então, os responsáveis por cada pessoinha que acrescentava algo único e valioso ao nosso lindo grupo. Decidimos fazer uma festa com direito a muita comida, dança, iluminação especial e decoração, tudo feito por nós mesmos!

Quem diria, não? Uma vida sem Sam e com muita, mas muita alegria! Meu coração chegava a doer por ver o quão rápido minha vida tinha mudado, no bom sentido, claro. Nunca pensei que fosse agradecer tanto pelas minhas tentativas de suicídio terem dado errado. Nunca imaginei que seria tão grata por tudo o que a vida me deu, mesmo uma parte de mim ainda achando que nem merecia tanta coisa.

Eu estou viva, eu estou aqui, e aqui é bom!

Passei o dia na cozinha com minha mãe e minha tia, preparando o nosso camarão com manteiga de alho e um cheescake de chocolate. Foi difícil me controlar para não comer tudo antes da hora, mas fui firme. Em minha defesa, agora como por dois!


Oito da noite, bem no horário combinado. Nos acomodamos na casa de Jackson, que insistiu que a festa fosse em sua casa. Me derreti de amores por Julie, que era incrivelmente agradável e simpática. Cooper, seu pai, também era muito atencioso. Não demorou para o pessoal começar a chegar, cada um com um prato salgado e um doce, e toda a mistura de cheiros estava me deixando maluca. Se comporte, bebê!

- Como está esse bebezinho? - Julie se aproximou sorridente, dedilhando minha barriga como se estivesse brincando.

- Com fome o tempo inteiro. - ri da minha própria fala, realmente achando aquilo engraçado. Era o sono, eu juro.

- Posso te contar uma coisa? - ela ainda sorria, só que com um tom mais sério. Ela ajeitou sua postura sem tirar os olhos dos meus.

- Mas é claro, Julie!

- Você acha que o amor verdadeiro é a única coisa que pode iluminar sua vida, e então… você se torna mãe. O nascimento desse bebê vai te abrir como um terremoto abre a terra. Vai ser o momento mais dolorido e lindo da sua vida. Eu não vou estar por perto para poder ver o rostinho desse bebê, mas eu espero, do fundo do meu coração que tudo ocorra bem! Tenho certeza que Jackson será um tio incrível. - os olhos de Julie estavam marejados, assim como os meus. Ela falava com tanto carinho e sinceridade. A energia boa que ela trazia consigo era algo que eu nunca tinha visto. Uma mulher completa, incrivelmente incrível em todos os sentidos. Agora eu entendia todos os elogios que Jackson fazia a mãe, e ela merecia cada um deles de verdade.

- Você não pode simplesmente chegar aqui e me fazer chorar! Eu estou tão feliz e honrada por estar aqui com você, de coração! Jackson é um rapaz incrível graças a você, Julie Tuck. Tenha certeza que esse bebê vai ouvir muitas coisas boas sobre você. - as lágrimas ainda caiam com frequência, até os dedinhos mágicos de Julie tocarem em meu rosto, tirando cada rastro de lágrima dali. Ela merecia se lembrar dos nossos momentos felizes, e não dos choros.

- Ô meu amor, não chore!

- Eu estou tão feliz por tudo isso, mas às vezes eu fico assustada, sabe? Eu não faço idéia de como minha vida vai ser quando meu filho nascer! - arqueei as sobrancelhas, sentindo um leve medo me atingir. Eu não gostava de conversar sobre aquilo com ninguém, mas era a mais pura verdade. Era uma dúvida que me corroia todos os dias.

- Escute bem, meu anjo. Sei que você tem toda uma vida planejada em sua cabeça, é claro que você tem planos, mas a verdade é que eles se tornam ridículos em comparação com as oportunidades que a vida te reserva! - ela colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, me olhando de um jeito tão doce que eu nem sabia que aquilo era possível.

- Você só pode ser um anjo, Julie!

- Na verdade eu espero me tornar um. - ela rolou os olhos de modo sapeca, se referindo ao momento em que ela não estaria mais no mundo. Incrível como ela conseguia driblar a tristeza e estar alegre até ao se referir a própria morte.

- Sei que isso vai parecer loucura, mas se você virar um anjo mesmo ou se continuar por perto, você manda um sinal, por favor? - mordi o lábio, me sentindo um tanto quanto iludida e infantil, como uma criança que ainda acreditava em fadas. Mantive o olhar esperançoso, arrancando uma risada gostosa de Julie, que jurou fazer o possível.

chegou junto com a mãe, Sophia e Dan, o rapaz que eu havia conhecido em uma das corridas de Jackson. Elena me deu um abraço forte, fazendo uma voz engraçada enquanto conversava com a minha barriga. Sophia fez o mesmo, ainda confusa com a história de ter um bebê dentro da minha barriga. Dan foi um fofo, me parabenizando por ter transformado em um homem melhor. Aquilo ali foi musica para os meus ouvidos, me fazendo transbordar em alegria. foi o último a se aproximar, me dando um beijo estalado na bochecha. Como eu sentia falta daqueles lábios nos meus...

Eu podia jurar que estava no paraíso. Tudo tão perfeito, tão cheio de amor, união e risadas. Nossos pais estavam se dando tão bem que mal estávamos acreditando. Era tudo tão natural! A frase "as melhores coisas da vida vem de graça" nunca teve tanto sentido.

Jackson convocou o squad até o jardim, que mesmo cheio de neve estava decorado com algumas velas e lâmpadas coloridas.

- Acho que vocês já sabem o motivo de todos estarem aqui. - seu tom de voz grosso e sério nos deixou confusos, até aquele olhar se transformar, indicando que ele estava prestes a aprontar.

Jackson fingiu ter deixado algo cair, formando uma bola de neve e jogando em .

E começou.

Tentávamos nos esconder para evitarmos os ataques, mas não tinha como. Callie me ajudava a acertar e , que gargalhavam alto e tiravam sarro de nossa mira. escorregou da maneira mais hilária que um ser humano podia cair. pulou em cima do amigo, jogando neve em cima do mesmo incansavelmente. resmungava pelo tanto de boladas que levava de Jackson, que se matava de rir da garota. Em meio a tanta diversão e correria, nem percebemos que nossos pais também saíram, observando tudo aquilo com risadas altas. Paramos nossos ataques, nos entreolhando e assentindo positivamente. Estava na hora de mudarmos o ataque. Juntamos o máximo de bolas de neve que podíamos e jogamos em todos os pais que estavam ali de plantão, e a cara que cada um fez foi impagável. Claro que, teve volta. E como teve!

Meu rosto estava dolorido de tanto que eu sorria. Tudo o que eu sempre desejei estava bem em minha frente. Um dos meus maiores desejos sempre foi um lar, uma casa de verdade, mas agora eu enxergo com clareza que nosso lar é onde quem a gente ama está. Na vida iremos conhecer lugares sensacionais e faremos coisas maravilhosas, mas aonde quer que formos, ou quem quer que nos tornemos, sempre iremos nos sentir melhor em nosso lar ou com quem amamos.

Depois de muita guerra e muito cansaço, entramos e atacamos as comidas. Sério, só coisa boa!

- , você terminou com a Cuhloe? - Sophia questionou curiosa, quase nos fazendo cuspir o que estava em nossas bocas de tanto que rimos. CUHLOE!

- Menina, de onde você tirou isso? Não foi assim que eu te criei! - tentou dar bronca na pequena, mas nem ele conseguia parar de rir.

- A chamava ela assim. - a pequena deu os ombros, voltando a comer tranquilamente como se aquele apelido fosse o mais normal do mundo. Nossos olhares foram para , que encarava as unhas em disfarce.

- O que foi? Ela era um porre no começo! - ela se defendeu

- E por isso você a apelidou assim? - fingiu uma falsa braveza, cruzando os braços e fechando a cara.

- Ih, vai defender ela? - entrou em seu jogo, num tom provocativo.

- Não, eu vou arranjar uma briga e dar dois tapas na cara dela. Oh, é verdade, você já fez isso! - sorriu triunfante enquanto colocava as mãos no rosto para se esconder, porem rindo tanto quanto nós.

Honestamente, se isso não for felicidade, eu não sei o que é!

- Psiu. - me chamou discretamente, me chamando com o dedo. Me aproximei, observando aquele par de olhos que voltou a me fazer sentir coisas que nenhum homem foi capaz, e pra ser sincera, eu nem queria que outro homem tentasse nada, nunca, jamais - Você é tudo o que eu nunca soube que queria. Te amo. - ele sussurrou baixo em meu ouvido, me dando uma sensação tão magnífica que nem se eu tentasse conseguiria descrever. Sorri, sussurrando o mesmo de volta, me acomodando em seu corpo em um abraço, sentindo aquele perfume invadir minhas narinas.

O único homem que eu gostaria que continuasse a me abraçar, me tocar e me amar. A gente vai e a gente volta. A gente é da gente e da gente ninguém tira. A gente se ama.


***


- Ei, posso falar com você rapidinho antes do chegar? - mamãe abriu a porta aos poucos, ainda fora do meu quarto. Fiz um sinal para que ela entrasse, e aquela expressão séria não me agradou nenhum pouco.

- Claro, mãe. O que foi? Aconteceu alguma coisa?

- Não, meu amor. É que... é a primeira vez que você vai ver esse bebezinho! Eu lembro quando te vi pela primeira vez. - toda aquela seriedade foi quebrada com um sorriso. Minha mãe fechou os olhos, como se estivesse passeando pelas memórias do passado.

- E como foi? - arregalei os olhos curiosa, sentindo aquela ansiedade me atingir ainda mais forte.

- Você vai descobrir. - seu riso continuou ali presente, com o olhar mais confiante. Mamãe estava imensamente feliz, assim como eu. Não havia brigas ou broncas pela minha gravidez.

- Eu estou tão feliz, mas também estou morrendo de medo. Eu... sei lá, sabe? É tão esquisito!

- Filha, se você não tivesse medo seria estranho, afinal, é um bebê! Mas olha... é a coisa mais incrível do mundo todo. Todo o seu pensamento e todo o seu cuidado vai se voltar pra esse serzinho que, mesmo tão minúsculo, já provoca emoções tão grandes. Ser mãe é um grande desafio de uma nova jornada que vai durar pro resto da sua vida. - mamãe colocou a mão sobre o coração numa interpretação de amor. Meu lado emocional começou a dar indícios de querer falar mais alto, fazendo meus olhos se encherem.

- Isso é tão fofo e... assustador.

- Você vai se dar bem nisso, filha. Eu vou estar aqui pra te ajudar em qualquer coisa.

Não demorou para aquela buzina conhecida se fazer presente em nossos ouvidos. Descemos com certa pressa, principalmente eu, que mesmo estando nervosa, estava animada demais pra ver meu bebê pela primeira vez. Dei um selinho em ao entrar no carro, me acomodando no banco.

- Está ansiosa, ? - Elena, que também estava ali presente, perguntou animada. Quase tão animada quanto eu.

- Muito. - abri um sorriso largo, aproveitando o momento pra fazer uma das perguntas mais importantes que eu gostaria muito de saber a resposta - Você tem algum conselho pra me dar sobre maternidade? Acho que qualquer coisa que eu ouvir é válido, né?! - virei o olhar para , que me encarou confuso, sem nem entender porque estava sendo metido no assunto.

É, vai ser uma jornada e tanto...

- Meu bem, não acredite em tudo que as pessoas te falam, caso contrário você irá enlouquecer. - ela respondeu divertida, com o bom humor bem nítido em sua voz.

Pela primeira vez, eu e não brigamos pela música que iria tocar. Nos fingimos de civilizados. O trajeto até a clínica onde meu pré natal seria realizado não era tão longe.

- Você está nervosa? - entrelaçou nossas mãos assim que saímos do carro, indo em direção à entrada do local que cuidaria do nosso bebezinho.

Meu Deus. Nosso bebê. Uma criança dentro de mim!

- Eu estou tentando não pirar. - sorri de canto tentando realmente não me descabelar de tanto nervosismo.

Para o nosso azar, o consultório era no terceiro andar. Sim, obriguei subir de escada comigo enquanto minha mãe e Elena pegaram o elevador. Certas coisas nunca mudam. Não demorou para o meu nome ser chamado, e por alguns segundos eu não consegui ter força sobre meus passos. Caminhar para dentro daquele consultório seria oficialmente encarar a verdade de que eu vou ser mais e vai ser pai.

- Boa tarde, ! Eu sou o Doutor Charles e vou ser o responsável pela sua gravidez. Está pronta pra ver esse bebê? - o homem que aparentava ter não mais que 50 anos me cumprimentou com um abraço apertado, feliz da vida. Tive que me deitar na grande poltrona que estava a minha frente, sendo instruída a levantar a blusa que estava vestindo.

Doutor Charles não nos poupou dos detalhes, explicando sobre o gel que foi colocado na minha barriga, e logo em seguida um aparelho foi colocado ali, chamado transdutor. Ele apontou para o monitor que tinha ao nosso lado, mostrando uma coisinha pequena, que mais parecia um nada. Mas na verdade, era tudo.

- Diga oi para o seu bebê! - doutor Charles virou o monitor de modo que eu pudesse ver mais nitidamente aquela coisinha minúscula com um significado tão importante. Uma vida.

- Esse grãozinho miúdo aí é o nosso filho? - se esforçou para não gaguejar. Seus olhos estavam levemente arregalados, entre chocado e emocionado. Nossos olhares se encontraram, e foi como se todas as nossas emoções tivessem se juntado, enchendo nossos olhos de lágrimas.



Capítulo 30




"A mudança vem como um pequeno vento que agita as cortinas no amanhecer, e vem como o discreto perfume das flores selvagens escondidas na grama."


3 MESES DEPOIS...


Julie faleceu às 3:31 da manhã de uma quarta feira.
Na vida, acompanhamos muitos ensinamentos a como combater a morte, mas ninguém nunca ensinou nada que nos mostre a continuar vivendo em meio à dor e a falta de alguém. O luto vem em seu próprio tempo para todos, à sua própria maneira. O melhor que qualquer um pode fazer, é tentar ser honesto. A pior parte do luto é que não se pode controlá-lo. O melhor que podemos fazer é tentar nos permitir senti-lo, mesmo que fazer tal coisa tire seu fôlego.
Há cinco estágios de luto. Negação. Raiva. Barganha. Depressão. Aceitação.
A medicina assume quando o corpo começa a falhar. Os medicamentos e tratamentos são feitos, mas quando não se tem mais saída, o único sentimento que fica é o de dever não cumprido. A medicina não conseguiu ser boa o bastante para salvar aquela vida. A morte não é fácil. Não gostamos de perder, mesmo a vida sendo baseada nisso.
Julie Tuck era filha, irmã, esposa e mãe. Eu não passei muito tempo com ela, mas nos tornamos boas amigas. Eu tive o privilégio de passar os últimos três meses com sua presença em minha vida. Acho que certas pessoas sentiriam inveja de Julie pela tamanha falta que ela já fazia. Ela foi amada até o último instante e ainda mais que isso. Julie Tuck era filha, irmã, esposa, mãe, e também um anjo, mesmo sem asas. Agora ela finalmente podia voar.
A cerimônia de cremação terminou, e cada parente, amigo ou conhecido saía aos poucos do local, antes dando fortes abraços e frases de apoio para Jackson e Cooper. A morte de Julie tinha nos pegado de jeito. Depois de uma grande festa de três meses atrás, todas as nossas famílias mantinham contato de alguma forma. Todos haviam se tornado amigos, e todos também estavam em dor.
Cooper nos convidou a ir para sua casa. Ele tentava esconder, mas estava nítido em seu olhar o seu medo de ficar só. Ele precisava de apoio e o teria. O trajeto até sua casa foi silêncio total. Ninguém teve a coragem de abrir a boca para falar nada. Desejei mentalmente com todas as minhas forças que aquilo fosse um pesadelo. Infelizmente não era.
Tantas alegrias foram vividas naquela casa pelos últimos três meses, e agora parecia ser a coisa mais difícil entrar ali. Ergui minha cabeça, passando pelo enorme jardim e entrando na casa que já não tinha o mesmo brilho de antes. Tentamos nos acomodar, mas o desconforto era imenso. Ela já fazia uma tremenda falta.
- Eu não quero sentir isso, eu não sei se consigo! - Jackson quebrou o silêncio, andando de um lado para o outro impaciente com a voz tremula, assim como suas mãos. Cooper tentou ajudar o filho, que deu um grito tão alto que poderia ter derrubado as paredes. Ele atingiu seu ponto máximo. O ponto em que nada faz mais sentido. O ponto em que seu próprio cérebro se torna nebuloso, e se sente como se estivesse preso em um túnel que só traz dor. Negação. A perda foi tão grande que ele não conseguia lidar. Não tinha abraço ou frase que diminuiria sua dor.
Eu não consegui olhar aquela cena por mais um segundo. Meu coração estava sendo esmagado. Corri para o jardim dos fundos, sentindo minha respiração se descompassar cada vez mais. Eu precisava ser forte por Jackson, mas não conseguia. Vê-lo sofrendo daquela maneira era de longe, a pior coisa do mundo. Limpei as lágrimas que caíam de meus olhos sem descanso. A morte de Julie tinha sido como um corte profundo em minha alma.
- Ei, o que houve? - apareceu, respirando ofegante, recuperando seu fôlego. Encarou-me de longe com os olhos também marejados, provavelmente se sentindo tão mal quanto eu. Foi como se o meu corte na alma tivesse acabado de sofrer mais uma danificação.
A morte simplesmente vem e te leva sem avisar. A morte não pensa nos seus entes queridos, ela simplesmente te leva para um lugar em que não podemos mais achar. A morte é egoísta por tirar Julie de um lugar que ela era tão amada. A morte a tirou de nós, deixou Jackson sem mãe. Passei a mão em minha barriga que já estava grande pelos 5 meses de gestação, fazendo um carinho desesperado, sentindo a necessidade de mostrar ao meu bebê que ele não estava só, e jamais estaria. ainda me encarava triste e confuso.
- Ela morreu! Ela simplesmente morreu. - gritei nervosa, tentando me livrar daquele sentimento tão ruim que se apossava de mim ao lembrar de toda aquela dor.
- , eu sei que...
- Me escuta! - chamei sua atenção, decidida a dizer tudo o que estava entalado em meu coração há tempos. Eu já não tinha mais tempo a perder. Julie tinha morrido e eu não tinha como saber quanto tempo ainda teria em vida. Eu não podia deixar de viver minha vida pelas inseguranças do passado - Eu nunca entendi nós dois. Nunca entendi se houve realmente um "nós" entre eu e você. Nunca entendi porque os seus abraços me faziam sentir como se fossem meu lar. Você procurava a mim quando podia ter qualquer outra garota nesse mundo, e muito mais bonita. Nunca entendi como as pessoas não enxergavam a beleza que havia dentro de você. - dei uma pausa, respirando fundo e tentando engolir o choro entalado em minha garganta - Sempre me disseram que amor não se entende, e sim, se sente. , eu ainda não entendo nada, mas eu ainda sinto, e muito! - a essa altura eu já não conseguia manter o controle. Meus hormônios que me deixavam ainda mais sensíveis, me fizeram chorar tudo o que tinha pra chorar. me abraçou forte, me apertando contra si de maneira protetora, e eu podia sentir todo aquele amor me envolvendo. Nosso abraço se desfez aos poucos, me permitindo notar toda a sua felicidade, junto com um olhar encantando, olhos esses que diziam coisas que as nossas bocas não falavam. Era tão bom vê-lo daquele jeitinho.
- O que importa de agora em diante é que você está nisso tanto quanto eu. - ele sussurrou as palavras enquanto se aproximava, finalmente encostando nossas bocas num beijo calmo e elétrico. Deus, como eu senti falta do seu beijo! Nossas bocas definitivamente foram feitas uma pra outra - Nós iremos durar, , eu prometo. - ele arfou contra meus lábios, separando nossas bocas e encostando nossas testas. Em meio a tanta tristeza, também felicidade. Eu estava completa.
Ficamos mais alguns minutos ali, nos recompondo de todas as emoções. Agarrei-me ao pouco de coragem que tinha, determinada a falar com Jackson. Marchei para a sala novamente, onde ele se encontrava sentado no sofá com as mãos no rosto com sentada de um lado e o pai do outro. Aproximei-me com cuidado, conversando com pelo olhar, que entendeu que eu gostaria de falar com o rapaz. Ela se levantou e eu me sentei, encostando minha mão com cuidado em suas costas, fazendo um carinho que o fez levantar a cabeça e me encarar. Seu rosto estava inchado de tanto chorar. Estava na hora, eu precisava agir.
- Às vezes a dor serve pra te falar: "Ei, você tá vivo, tem sangue correndo nessas veias, tem um coração batendo, e uma vida toda pela frente". Não sentir nada que é ruim. Pois então, pode sentir, pode gritar e espernear se quiser também, mas não se esqueça que estou aqui pra você, tudo bem?
- Obrigado por isso, . - ele respondeu com a voz baixinha, quase falhando. Lhe dei um abraço meio desengonçado, pronta para me levantar e me afastar novamente, afinal, tudo o que ele precisava era tempo. Levantei-me, sentindo algo estranho em minha barriga, algo que eu nunca havia sentido. Meu coração disparou ao sentir aquilo novamente. Coloquei a mão na barriga, tentando entender. Abri a boca, tentando formar alguma palavra ou frase, mas nada saiu. - Ei, está tudo bem? - Jackson notou meu nervosismo, se levantando e segurando em meus ombros num tipo de auxílio, com o medo de algo ruim estar acontecendo comigo.
- O bebê chutou! - sussurrei, encontrando seus olhos que mesmo estando tristes, brilharam ao ouvir minhas palavras. Sorri largo, sentindo mais um chutinho que havia sido dado com toda a força, como se meu bebê quisesse chamar atenção. De fato, tinha chamado. Jackson sorriu junto, e mesmo um pouco receosa peguei em sua mão direita, a puxando até encostar em minha barriga. Meu bebê chutou novamente, fazendo o rapaz gargalhar com a surpresa. Era tão bom fazê-lo esquecer daquela dor, nem que fosse por apenas alguns minutos.
- Dê oi para o titio, neném! - sussurrei para a minha barriga, onde a mão de Jackson ainda estava pousada.
Entre todas as sensações, aquela era a melhor, e em dose dupla pelo fato de arrancar um sorriso de Jackson. Meu coração transbordava amor e gratidão por ter uma vida dentro do meu ventre. Ainda me encanta o quão maravilhosa a vida pode ser, e o quanto ela pode te surpreender. Este momento é diferente do que qualquer outro.

***


Jackson voltou para a escola após uma semana. Tomávamos cuidado com as palavras e com nosso jeito de falar. Parecia que a qualquer momento ele poderia quebrar, e não queríamos contribuir de maneira alguma para tal coisa acontecer. Amizade é assim; apoio, compaixão, compreensão, puxões de orelha, mas acima de tudo, muito amor e cuidado.
- , você viu o ? - parei meu amigo que caminhava pelo corredor, saindo de mais um treino soado. A demora de estava me deixando impaciente.
Bem, os treinos... eu ainda era uma líder de torcida, mas a dor nas costas às vezes contribuía para a minha indisposição. 5 meses de gestação e eu só conseguia pensar em comer, dormir e fazer xixi.
- Eu estava mesmo atrás de você! Ele pediu pra te avisar que vai sair com Jackson quando sair daqui, então você vai ter que ir com para casa. - repassou o recado com excelência, e por mais que eu aparentasse que tudo estava bem, não estava.
A ultrassom do bebê estava marcada e eu queria levar , que ainda não sabia. Meu plano era fazer surpresa. Jackson precisava de cuidados e mesmo ficando um tanto quanto desapontada, também ficava feliz por saber que estava se esforçando tanto pelo bem estar do irmão. A ansiedade para finalmente descobrir o sexo do meu bebê aumentava a cada segundo. Eu podia então, fazer uma surpresa a partir disso.
Caminhei tranquilamente até em casa, que estava perto de não ser mais minha casa. Mamãe e minha tia passaram os últimos meses visitando imóveis e mais imóveis, até que acharam o perfeito, ali no bairro mesmo. Foi engraçado, pois mamãe não havia gostado de quase nenhum que havia visitado, mas se apaixonou pela última casa que visitou, cuja dona estava de mudança para a Austrália. Foi engraçado também pelo fato de que eu tinha certeza que tinha dedo do destino nesse meio.
Tomei um banho rápido, e os baixos vinte graus de primavera ainda me impediam de vestir o lindo vestido que tinha comprado há alguns dias. Optei por uma roupa simples; calça, bota e um cardigã alongado azul. Pedi um táxi que chegou rapidamente, e não tive de quem me despedir, já que não tinha ninguém em casa.
Não demorou para chegar na clínica em que meu pré natal estava sendo feito. Dei uma singela gorjeta para o simpático rapaz do táxi, que me desejou um ótimo dia com um sorriso largo. Adentrei a clínica, me identificando e sendo encaminhada até o terceiro andar. Eu fui de escada. Ainda não confiava em elevadores.
- Boa tarde, futura mamãe! - Doutor Charles sorriu animado com a minha presença, me cumprimentando com um aperto de mão como sempre. Ele era um ótimo profissional e estávamos nessa jornada desde a minha primeira consulta.
Ele ligou o monitor, me pedindo gentilmente para me deitar na grande poltrona que tinha ali e erguer a blusa. Eu me encantava a cada dia com a minha barriga que crescia e com o ser dentro dela. Meu pequeno bebê que já não estava mais tão pequeno. As pessoas já notavam sem sombra de dúvidas que eu não andava mais sozinha. Doutor Charles passou um gel gelado em minha barriga, aproximando o aparelhinho até tocá-la. A imagem que para muitos não passaria de um borrão tomou conta da tela, mostrando meu bebê. Ele perguntou se eu gostaria de ouvir o batimento cardíaco do feto, e assenti sorridente e com pressa. Um botão foi acionado, assim permitindo que o som daquele coraçãozinho tomasse conta do consultório. Meus olhos se encherem de lágrimas junto com a felicidade descomunal que apoderou meu ser. O corpo humano é uma verdadeira loucura. Eu nem mesmo tinha visto aquele rostinho e já amava tanto o serzinho que estava em meu ventre, cada dia maior e mais sapequinha.
- Dez dedos do pé e dez dedos da mão, tudo certinho. Você quer saber o sexo? - o doutor me encarou animado, caminhando com o transdutor de um lado para o outro, pressionando um pouquinho mais a fim de visualizar com mais nitidez as estruturas fetais, se certificando que tudo estivesse ok. Mordi meu lábio, sendo pega por certo incômodo pelo fato de não estar por perto. Ele adoraria estar acompanhando o momento.
- Quero sim.
Doutor Charles apertou um pouco mais o transdutor contra meu ventre em um ponto específico, virando mais a tela do monitor para que eu pudesse ver melhor.
- Essa aqui é sua filha. Diga oi!
Não me aguentei. Chorei mesmo, não encontrando palavras para me expressar. Uma menininha! Observei o monitor, estática e eufórica por dentro, porque a revelação havia congelado todos os meus músculos.
UMA MENINA!
Saí do consultório radiante, levando comigo uma pequena foto do ultrassom. Chamei um táxi novamente, com o coração acelerado de tanta ansiedade. precisava saber logo.
- Moça, você pode me informar que horas são, por favor? - um homem alto e bem vestido perguntou educadamente, me acordando de todo aquele devaneio que me fazia sentir como se estivesse no paraíso. Mãe de uma menininha!
- Cinco e vinte e quatro. - acrescentei um sorriso simpático, esperando que o moço se afastasse no momento em que recebesse a informação desejada. Um carro preto parou em nossa frente com velocidade, e o vidro abaixou lentamente. Não, não podia ser. Minha perda de raciocínio durou longos segundos até uma grande onda de choque me atingir. O medo. Eu precisava sair dali. Virei meus pés para correr para longe dali, sendo segurado pelo rapaz que havia pedido a hora antes mesmo de dar o primeiro passo. Era uma armação.
- Você já sabe como funciona, boneca. - Richard sorriu diabólico e a porta de trás do carro foi aberta. Olhei desesperadamente para todos os cantos em busca de um rosto conhecido que pudesse me ajudar. Nem mesmo pensei em gritar, sabendo que nada sairia da minha garganta pelo imenso nervosismo. O rapaz continuava a me segurar pelo braço, me guiando até a porta do carro, onde fui obrigada a entrar, e ele também entrou em seguida.
O veículo foi acelerado, nos levando para só Deus sabe onde. Envolvi meus braços em minha barriga, orando mentalmente para que nada que pudesse ocorrer prejudicasse minha filha.
- Que saudade que eu estava. Como está meu netinho? - Richard mantinha aquele sorriso cínico, se aproximando com a mão na tentativa de encostar em minha barriga. Não pensei duas vezes e bati em sua mão, o impedindo de me tocar. Meu corpo se acendeu em fúria como um fogo que se alastra.
- Não encosta a mão em mim. - grunhi de raiva, fechando os punhos e tentando me controlar ao máximo, o que estava sendo uma tarefa quase impossível.
- Olha só, pelo jeito as coisas mudaram mesmo. - ele gargalhou alto, voltando a me encarar com aqueles olhos cheios de nada a não ser ignorância - Vou ser rápido dessa vez, afinal, grávidas vomitam o tempo inteiro e eu não quero que você suje o meu carro. Diga a que isso ainda não acabou. Ele sabe muito bem o que eu quero em troca para deixar vocês em paz e viverem tranquilos com esse negócio que tem na sua barriga. - cuspiu as palavras com desdém, não escondendo o quão cretino e frio era. Suas últimas palavras me atingiram com um peso que eu nem entendia. Ele simplesmente não se importava com nenhum ser humano em sua vida. Nenhum. Observei a paisagem que passava pelos meus olhos. O carro dava voltas e mais voltas ao redor do parque, que estava começando a ganhar movimento.
- Mais alguma coisa? - perguntei num tom cheio de cinismo, o que aparentemente ele tinha adorado, já que seu sorriso se formou novamente. Minha vontade de estapear sua cara até deixar a marca dos meus cinco dedos ali estava aumentando a cada segundo em que eu respirava o mesmo ar que Richard. Ele se divertia com o desespero alheio e eu não podia mais dar esse gostinho a ele. Não mais. Na minha cabeça rolavam todos os xingamentos possíveis e existentes que tinha no mundo, mas nenhum deles era adequado para Richard. O que ele era ainda não tinha nome.
- Sim, boneca. Você acha mesmo que o imbecil do vai ser um bom pai? Vamos lá, você é esperta e sabe que essa vida não é pra ele, e mais cedo ou mais tarde ele vai se tocar disso. - sua voz energizada com um misto de falsa dó e cinismo estava contribuindo muito para que eu chegasse ao ápice da minha paciência - Agora saia do meu carro e vá dar o recado para o seu namoradinho. - aquilo foi uma mistura de alívio com mais uma montanha de raiva. Eu queria voar em cima daquele desgraçado e esmurrá-lo até não sobrar nem um osso sequer para contar a história. Enquanto eu ainda era incapaz de fazer tal coisa não pensei duas vezes e abri a porta do carro, correndo o máximo que podia para longe daquele carro que tinha vindo do inferno.
Tentei recuperar meu fôlego, sabendo que seria um pouco difícil. Senti meus brônquios se fechando cada vez mais, me impedindo de respirar como um ser humano normal. Nem mesmo conseguia raciocinar. Esbarrei em uma mesa que tinha ali na calçada de uma pequena doceria de esquina, perdendo totalmente a força das minhas pernas, pronta para cair, mas sendo amparada pela funcionária que correu para me ajudar.
Desespero.

's POV
- Você não precisa ficar todos os dias comigo, . Eu sei me cuidar. - Jackson resmungou pela milésima vez, e foi assim durante o trajeto inteiro até chegarmos em sua casa.
- Eu sei que você sabe.
- Então vai embora. - ele franziu a testa e me encarou por alguns segundos. Tentei adivinhar o que se passava por sua mente, e ele provavelmente estava crente de que eu finalmente fosse deixar todo aquele cuidado e proteção de lado. Totalmente errado.
- Não posso.
- Por que não?
- Porque alguém uma vez disse que a morte não é a maior perda na vida. A maior perda é o que morre dentro de nós enquanto vivemos. Eu não posso te deixar sozinho porque você vai sofrer mais. O silêncio vai te fazer pensar em coisas horríveis. Não vou deixar você morrer por dentro. - disparei de uma vez, sem saco ou paciência para joguinhos. Jogávamos limpo. Jackson merecia a verdade, mesmo que o fato de que eu estava praticamente cuidando dele como uma babá cuida de uma criança o irritasse. Ele ficou incrédulo por alguns segundos e se sentou, jogando a cabeça pra trás e suspirando audivelmente.
- Às vezes eu me sinto tão... frágil. Eu nunca me senti assim. Invento historinhas para mim mesmo o tempo todo como se minha mãe ainda estivesse aqui, mas aí eu chego nessa casa e nada. Minha mãe não está aqui e nunca mais vai estar. - eu podia sentir todo aquele peso que estava em seu coração. Eu podia sentir que suas lágrimas estavam prestes a cair novamente. Eu queria ter o poder de arrancar aquela dor de seu peito.
- Sua mãe ainda está aqui, só não em carne e osso. Ela te ensinou tudo, desde pular as poças d'água até a ser um homem de verdade, e vou ser honesto, eu nem sabia que você conseguiria se transformar no que é hoje. Você me surpreendeu tanto, até cheguei a sentir um pouco de inveja do quanto você não se importou em abrir mão de certas coisas. Você é forte. Você não precisa inventar historinhas pra si mesmo o tempo todo, sabe por quê? Está tudo no seu coração. Todos os seus momentos com ela estão guardados. Lembre-se deles e também que você tem uma vida inteirinha pela frente para continuar orgulhando sua mãe. - arrisquei o discurso, observando o olhar de Jackson que, agora, parecia ter se acendido. Ele só precisava das palavras certas. Meu irmão sorriu torto, ainda incapaz de verbalizar algo concreto. Só aquele sorrisinho já tinha feito meu dia valer a pena. Demorou alguns segundos para ele se recompor, evitando que as lágrimas saíssem de seus olhos.
- Ok, vamos lá. Como você e estão? - ele disse sem graça e captei seu recado. Ele não queria mais tocar no assunto. Sua pergunta tirou o sorriso do meu rosto rapidamente. As coisas com estavam perfeitas, mas o fato de falar sobre felicidade com Jackson não me parecia apropriado. Não consegui esconder meu incomodo, fazendo meu irmão rolar os olhos e bufar alto. Éramos tão parecidos e tão diferentes ao mesmo tempo - Sua felicidade não tira a minha, . - ele resmungou de maneira engraçada, já exibindo seu bom humor novamente. Chega a ser engraçado como as pessoas lidam com certas situações de diferentes maneiras.
Jackson e eu entramos em assuntos que nunca imaginei que conversaríamos. Ele se mostrava cada vez mais... legal. Meu Deus, quem diria que logo eu falaria isso?
Cooper chegou de sei-lá-aonde e essa foi a minha deixa. Não que eu estivesse enjoado de passar o tempo com meu irmão, e sim, porque sabia que os dois precisavam de um tempo juntos. Coloquei o bendito CD do One Republic pra tocar, curtindo aquele som que não era nada mal sozinho. Uma estranha sensação me atingiu, como se algo não estivesse certo ou indo bem. A sensação de que algo tinha acontecido. Tentei me concentrar na música e esquecer daquilo. Só queria ir até a casa da minha garota e lhe dar um beijo bem gostoso, e claro, também ver o meu moleque que ainda estava na barriga. Certeza que seria um meninão, se bem que, uma menininha não seria nada mal. Uma mini por aí seria capaz de me fazer ter altos ataques cardíacos de tanto amor. Nossa mistura vai dar um belo bebê e eu falo sério. O mais bonito do mundo inteirinho!
A música foi interrompida pelo barulho do meu celular recebendo uma ligação de um número desconhecido. Meu coração disparou. Aquela incômoda sensação se tornou ainda maior, me fazendo atender rapidamente.
- Alô?
- Oi! Aqui é a Molly da doceria Candy Wopp. Sua namorada acabou passando mal na rua e eu me ofereci para ajudar. Ela pediu para que eu te ligasse, porque a coitadinha não consegue nem segurar o telefone de tanto que está tremendo. - a voz cheia de pena da mulher me fez imaginar coisas que eu não gostaria de ter imaginado. Meu coração parou. Acelerei o máximo que pude, desligando o celular e o jogando em qualquer canto do carro. Algo estava acontecendo com e com o meu filho!
Saltei do carro ao estacioná-lo rapidamente ao lado da doceria, correndo feito louco até entrar no estabelecimento, encontrando com as lágrimas descendo ferozmente pelo seu rosto.
- Ei. - anunciei minha presença e a garota se levantou às pressas, pulando em meus braços, me abraçando o mais forte que podia - O que houve? Você está bem? É o bebê? Precisamos ir ao médico! - eu não sabia o que fazer ou onde tocar, tocando em seu rosto e em sua barriga, me certificando de que meu filho ainda estivesse ali dentro, seguro e saudável. continuou a chorar cada vez mais, me dando a entender que não era nada daquilo.
Nada daquilo.
Então...
- Richard. - ela disse depois de muita dificuldade, ainda chorando muito.
De repente, foi como se todas as vozes do local estivessem sumindo. Todas as coisas ficando distante. Tudo o que sobrou nesse bizarro momento foi apenas e meu desespero. Richard estava de volta. Ou talvez, nunca nem tivesse se movido de Charlotte, apenas esperou o momento certo pra atacar novamente.
- Ele fez algo com você? O que ele disse? - disparei nervoso e elétrico, observando cada centímetro do corpo de para me certificar que estava tudo bem pelo menos com seu físico. As lágrimas no rosto da minha garota ainda rolavam sem descanso, e aquilo foi capaz de fazer meu mundo inteiro se chacoalhar.
- Ele disse que isso ainda não acabou e que você sabe muito bem o que ele quer em troca para nos deixar em paz. - ela fungou, tentando de todas as maneiras controlar o choro. Seu olhar assustado e decepcionado estavam acabando comigo a todo segundo que passava. A mesma raiva de meses atrás se reacendeu com extrema grandiosidade, deixando meu peito pesado e sombrio, exatamente do jeito que era. Por segundos me senti o mesmo homem que apenas se importava com a vingança contra Richard. Talvez esse rastro ainda seja uma parte indestrutível de mim.
Não.
Estava tudo indo bem. Eu não podia simplesmente jogar tudo o que dei duro para reconquistar no lixo por Richard. Não mais. Dizem que a coisa mais triste que um homem deve encarar é o que poderia ter sido. Eu não podia arriscar minha vida por uma vingança que até então, só tinha me dado dor de cabeça. Eu já estava farto de Richard e suas palhaçadas.
Respirei fundo, pensando rapidamente numa solução para o meu problema. Meu coração e minha cabeça entraram num consenso. Quase um acontecimento histórico.
Agradeci incansavelmente à Molly, que desejou suas mais sinceras melhoras a . Ajudei minha garota a me acompanhar até o carro, e mesmo sem entender o que se passava pela minha cabeça, ela nem mesmo abriu a boca. Sabe o que é isso? Confiança. Deus, eu sou um homem sortudo pra caralho. Nenhum sentimento no mundo chegava aos pés do que eu sentia ao olhar aqueles olhos de , que me encaravam com tanto carinho e afeto. Ela sabia que podia ficar tranquila, pois eu não faria nenhuma burrada. Agora, não mais. O de meses atrás provavelmente correria a cidade inteira tentando encontrar Richard, mas agora... oh, eu já disse que as coisas mudam?
Eu achei meu caminho. Levei tempos para lutar contra meus arrependimentos e remorsos. Eu queria consertar tudo, até coisas que não estavam ao meu alcance. Não vou dizer que tudo ocorreu da noite pro dia, porque não ocorreu. Eu passei anos me deixando levar por algo que apenas me tirou tempo, sono, paciência e muitas oportunidades. Richard roubou uma parte da minha vida, e eu, tolo, permiti. Agora tenho coisas maiores e melhores para pensar. Tinha muita coisa a fazer, e isso não incluía Richard, não mais, e nunca mais. Estava na hora de fazer as coisas certas, exatamente do jeito que deviam ter sido desde o começo.
Estacionei o carro na frente da casa de Dan, tentando não deixar o desespero me tomar por inteiro. desceu do carro ainda abalada, mas um sorrisinho fraco se formou ali quando entrelacei nossas mãos. Aquelas mãozinhas com certeza foram feitas para mim. Bati na porta algumas vezes, sendo recebido por uma expressão estranha no rosto de Dan, que tentou disfarçar quando o encarou. Aquilo não acontecia todo dia, então tudo bem o estranhamento.
- Algum rostinho me diz que algo ruim aconteceu. - Dan disse com certo receio, virando a cabeça lentamente até encarar , que ficou visivelmente sem graça. Seu rosto denunciava o seu choro.
- Ele voltou. - foi só o que precisei dizer para que a expressão de Dan se transformasse em algo cabuloso.
- Ele foi atrás de você, não foi? - tentou controlar sua raiva enquanto falava com , que assentiu rapidamente. Dan grunhiu, dando um murro em sua mesa - O que ele quer agora?
- Eu não sei. - sussurrou extremamente baixo, claramente perdida e sem entender nada do que Richard quis dizer.
- Ele quer tudo o que é seu. Ele quer que você desista. Quer que você largue tudo para que ele não tenha concorrência. - me intrometi sem rodeios, jogando a verdade ali sem pensar. Dan foi subindo o olhar até me encarar, mais sério do que jamais fora em toda sua vida. O silêncio estava quase perturbador.
- Tudo bem. Se é isso o que ele quer, é isso o que ele vai ter. - ele sorriu de canto, aparentemente não se importando ou se atingindo nenhum pouco pelo fato de que concordando com aquilo, ele perderia tudo. Eu podia jurar que minha cara foi ao chão. Dan se sentou em seu sofá tranquilo, convidando ao fazer o mesmo, cuja estava com um olhar tão surpreso quanto o meu.
- Você me ouviu bem? Você vai ter que desistir de tudo, entendeu? Tudo mesmo! - usei as palavras nuas e cruas em alto e bom som, e ainda assim, ele permanecia com a mesma expressão tranquila e divertida ao notar o meu pequeno desespero.
- , se acalme. Vamos lá... Desde quando Richard voltou, nossas vidas viraram de cabeça pra baixo. Ele te prejudicou, me prejudicou, e também prejudicou a Cooper. Ele sempre esteve um passo à frente de nós e isso é um fato. Lembra quando nós resolvemos que dar uma pausa nisso era o melhor a se fazer? Então, naquele dia, Cooper disse uma grande verdade. Eu precisava arrumar a minha vida, e é isso o que vou fazer. Essa vida pra mim não é mais o suficiente. Eu vou ter um netinho e preciso estar perto para vê-lo crescer, e isso só vai acontecer quando eu sair dessa vida de vez. Richard vai ter o que quer, e eu vou perder o que já não me faz mais feliz. Simples. - Dan finalizou com um sorrisinho sacana, sorriso de quem realmente estava tranquilo com a própria decisão. Minha cabeça demorou a processar e aceitar, achando que segundos depois ele iria gargalhar e dizer que era tudo mentira. Mas ele não o fez. Ele se manteve firme, apenas esperando que eu dissesse mais alguma coisa. Abri a boca, tentando formar alguma frase que descrevesse o que se passava pela minha mente e pelo meu coração.
- Uma netinha. - exclamou de repente, mordendo o lábio inferior. Eu e Dan nos entreolhamos, arregalando os olhos no mesmo instante. Não podia ser! - Você vai ser avô de uma menininha!
PUTA MERDA!
- É uma menina??? Eu vou ser pai de uma menina? Eu ouvi bem? - disparei eufórico, puxando seus braços para que ela ficasse de pé, segurando delicadamente em seu rosto. abriu o sorriso mais lindo e encantado do mundo, confirmando a notícia que quase foi capaz de tirar meus pés do chão do jeito mais incrível do mundo.
- Vamos ter uma menina! - eu a abracei o mais forte que pude, mesmo sendo quase impedido pela sua barriga que carregava nossa menininha. Enchi seus lábios com inúmeros selinhos, logo após me ajoelhando e fazendo o mesmo em sua barriga.
UMA MENINA!
- Eu tô lascado! Já vi que além de avô, vou ser segurança em período integral! - Dan se manifestou com um tom forçado de sofrimento, mas claro, ele também estava feliz e não podia deixar uma piadinha passar. Típico dele. Nos abraçamos todos juntos, formando o momento mais incrível e feliz de toda a minha vida.
Céus, eu vou ter uma menininha!
Uma nova luz ao mundo. Uma menininha que eu já amo sem limites. Uma menininha que é fruto do meu amor com a mulher mais incrível do mundo inteiro. Uau... todo mundo vai poder ver a belezinha que fizemos. Uma garotinha que já nos unia de maneira indescritível, junto ao amor que nunca vai sumir.
Eu nem mesmo consigo imaginar uma vida melhor que essa. Se for um sonho... não ouse me acordar!
- Quando você descobriu? - perguntei curioso, mas ainda eufórico. Eu sentia que iria explodir!
- Hoje. Eu ia te chamar pra ir junto de surpresa, mas você teve que sair com Jackson e eu decidi que poderia ser mais divertido se eu fizesse outra surpresa já ao saber o sexo do bebê. Tcharam!!! - ela ergueu as mãos e as balançou como se realmente estivesse fazendo uma surpresa. Caralho, como eu consegui toda essa sorte? Ela não conseguia parar de sorrir, e muito menos eu.
Agora eu entendo. Eu vejo claramente que precisei passar por tantas coisas ruins para chegar onde estou agora. Feliz, destemido e... feliz. Mesmo com Richard ainda à solta, já tenho a capacidade de olhar pra trás e sentir uma pitadinha de orgulho, que agora, a cada dia cresce mais e mais. Orgulho de ter passado por todas as coisas terríveis para estar onde estou agora, com amigos maravilhosos e uma família que ainda não consigo descrever. Claro, eu poderia ter evitado muita coisa, mas caralho... EU ESTOU NO PARAÍSO!

Ela surtou. Minha mãe surtou, chorou, pulou, nos abraçou... ela fez de tudo quando contamos que está esperando uma menina. Sophia ficou imensamente feliz, dizendo que ia levar a sobrinha para passear e brincar a todo momento.
Agora me diz, eu preciso de mais alguma coisa nessa vida?
- Não acredito que minha mãe te deu isso! - adentrei o quarto, passando a mão pelo rosto em desaprovação ao ver com um dos meus álbuns de fotos da infância nas mãos.
- Eu pedi. - ela sorriu como se não tivesse feito nada de errado, voltando a olhar aquele álbum da vergonha. Tá, ela não fez nada de errado, mas aquele álbum era sim, vergonhoso.
Me joguei na cama, puxando a minha garota delicadamente até ela ceder e deitar também, mas não soltando o bendito álbum de maneira alguma.
- Você acha que ela vai nascer parecida com a cara de quem? - questionei com a voz branda, quase distante, também me perdendo em todas aquelas fotos que me deram uma sensação estranha, mas que não era desconhecida.
- Não sei. O que você acha? - ela virou o rosto curiosa, ansiosa pela minha resposta.
- Acho que ela vai nascer com cara de joelho como todo bebê. - manifestei minha humilde e sincera opinião, recebendo um tapa e uma cara feia em troca - Mas é verdade e você sabe! - tentei me defender, mas só piorou a minha situação. Ela me atacou com o meu próprio álbum de fotos, o deixando cair em cima da cama. Tentei pegá-lo, mas fez aquele olhar que derrete o coração de qualquer um, e claro, acabei cedendo.
- Que coisa mais fofuxa! Você estava lindo nessa foto! - apontou para uma foto em que eu tinha aproximadamente seis anos. Mais uma vez, aquela sensação estranha voltou como uma pontada no peito. Parecia um sinal. Um sinal para que eu me livrasse de vez daquela sensação que não me era estranha.
Eu precisava me livrar.
Só tinha um jeito para fazer aquilo.
Uma única saída.
- , preciso que você preste atenção no que vou dizer agora, ok? - peguei o álbum de sua mão com calma, e a garota se sentou com pressa, com testa franzida, provavelmente esperando uma péssima notícia. Toquei em seu rosto, sentindo aquela pele macia e sedosa que tanto amava. Eu estava pronto. Pronto por mim, por ela e pela minha filha. Pronto por nós! - Richard nunca foi um pai bom, e esse foi um dos motivos pelo qual eu nunca quis te contar a verdade. Eu nunca quis que você se frustrasse ainda mais com esse tipo de pessoa. Um pai que não age como pai. Minha infância foi um tanto quanto complicada por causa dele, ainda mais depois que ele nos abandonou e virou um criminoso. Ele entrou no mundo do tráfico das drogas e das armas, e pior, voltou para infernizar a minha vida e de todos que eu gosto. - fiz uma pausa rápida, observando aquele par de olhos que me olhavam com tanta ternura e tanto sentimento. Me senti leve e finalmente confortável, sem nenhum rastro de vontade de parar ou de distorcer qualquer coisa da história toda. merecia a verdade assim como eu merecia me livrar daquilo - Dan sempre foi desse ramo, e é por isso que Richard voltou. Ele quer ter total poder sobre nossas vidas mesmo estando fora dela. - ameaçou dizer algo, mas coloquei meu dedo indicador em seus lábios, a impedindo - O mais louco de tudo é que tudo o que Richard tem hoje é resultado de um roubo que ele fez contra Cooper, o pai de Jackson. - tirei meu dedo dali, esperando que a garota surtasse ou algo parecido, mas ela nem mesmo conseguiu formular uma palavra sequer, claramente chocada com tal revelação, então me permiti a continuar a falar - Jackson não sabe disso e eu não pretendo contar. Ele tem muita coisa na cabeça, ainda mais agora que a mãe morreu. Cooper também desistiu de vez em tentar recuperar tudo o que perdeu, agora ele quer mesmo é trabalhar honestamente e ficar ao lado do filho, assim como eu quero estar ao lado da nossa filha. - levei uma de minhas mãos até a barriga de , fazendo um carinho gostoso com o polegar.
- Eu não sei muito bem o que dizer, então vou apenas agradecer. Obrigada pela honestidade. Obrigada por me permitir entrar na sua vida de vez, e principalmente por ter mudado. Meu coração está em festa por tudo isso. Absolutamente tudo. Quem diria, não? Somos tão parecidos! - sua voz tão calma fez o momento ficar ainda mais leve e gostoso. A voz que era capaz de me fazer ir até o céu e voltar. se aproximou lentamente, me dando um selinho demorado e se endireitando ao meu lado, deixando nossos corpos em próximos - Agora e aqui, nesse momento, eu percebo que é você. Sempre foi. Aquele garoto marrento que conheci naquela festa do lago se tornou o homem da minha vida. Estou terrivelmente apaixonada por você, . - abriu o sorriso mais lindo do mundo inteiro. Deus, essa garota fica mais linda a cada minuto que passa! Nossas bocas se encostaram apaixonadamente em um beijo lento e calmo, e naquele momento eu tive a maior certeza da minha vida: era aquela boca que eu queria beijar para sempre. Nossas mãos se entrelaçaram, e aquele sentimento gostoso foi como fogo num incêndio. Parti o beijo, observando seu pulso com cuidado e carinho, passando a maior confiança que podia para a minha garota. Ela sorriu fraco, visivelmente sem graça. Estava na hora dela saber o quanto eu estava orgulhoso. Ela merecia mais do que ninguém.
- Essas marcas não são pelas vezes que você quebrou a cara e ficou irreconhecível, e sim porque você voltou à tona e reconstruiu seu olhar, sua maneira de se enxergar no mundo, o quanto de entrega vale a pena ou não. Essas marcas são pra te lembrar do quanto de vida habita aí dentro de você. Elas dizem pro mundo que você viveu e que ainda tem vivido. Eu sinto um orgulho imenso de você e espero que você sinta também. Você chegou até aqui porque é forte e esse é um dos zilhões de motivos pelo qual eu te amo.
- ... - ela sussurrou, e logo sua voz foi dominada totalmente pelo choro. Aquele olhar emocionado e grato valeu cada perrengue que passei durante a vida. Nada no mundo era mais lindo de se ver do que ela.
- Você é linda até chorando, sabia? - limpei uma das lágrimas que rolou pelo seu rosto, recebendo um sorriso extremamente meigo como resposta - Mas não digo que você só é linda pela sua beleza exterior, e sim, pela interior. Você enxergou o melhor de mim enquanto ninguém mais enxergou. Você não desistiu. Só é bonito quem vê com o coração. - e então, a liberdade. O melhor sentimento. O imenso alívio por finalmente dizer tudo o que tinha que ser dito. Minha garota sorriu alegremente, me enchendo de selinhos repetidamente, e juro, nada no mundo é melhor do que seus lábios nos meus. Fomos feitos um para o outro e isso é um fato.
Em meio a tanta desgraça, nós dois. Ou melhor, três!
's POV end

's POV
Charlotte é apenas um local em algum lugar do mundo, talvez seja bem parecido com seu mundo, talvez não se pareça em nada. Foi aqui que eu achei tudo o que preciso. Achei pessoas tentando encontrar seu caminho, tentando encontrar a si mesmo, e também tentando se encaixar em algum lugar. Aqui eu consegui tudo o que sempre desejei, mesmo tendo muitas complicações no meio disso tudo.
Esses últimos meses foram complicados e confusos. Minha minúscula relação amorosa com foi capaz de me fazer enxergar muita coisa. É fácil você se enganar ou tentar enganar a si mesmo. Em meio a tanta confusão, eu meio que me perdi em meus próprios sentimentos em relação ao meu melhor amigo. Todas as vezes que meu coração disparou ou que meu olhar não se desgrudou do seu, foi apenas uma confusão. Eu achava que sentia algo a mais, mas no fundo, era apenas consequência de todos os acontecimentos. Oras, vejo Callie e felizes todos os dias, também vejo e , que agora também transbordam felicidade. Uma parte de mim também queria sentir esse tipo de coisa, mas infelizmente, não era que me fazia sentir esse tipo de coisa. E tudo bem. Está tudo bem, aliás, estamos melhores do que nunca. Isso serviu de lição para os dois.
Mas... tem Chloe.
Os últimos meses foram essenciais para ela me querer morta e jogada num bueiro qualquer sem sombra de dúvidas. Me coloquei no lugar da garota inúmeras vezes, sentindo como se um peso ainda estivesse em meus ombros. Chloe é uma garota solitária, e claro que o ocorrido a fez mudar, e não, não foi pra melhor. Às vezes é mais fácil se sentir como se fosse a única no mundo que está frustrada, insatisfeita e infeliz, mas esse sentimento é uma mentira. É preciso coragem para encarar tudo isso por mais um dia, alguém ou algo irá te encontrar e fazer com que tudo fique bem. Porque todos precisam de um pouco de ajuda às vezes, alguém para nos lembrar que nem sempre será assim.
Chloe também merece.
- Ei, vamos? - Callie me despertou do meu pensamento, já andando até a saída da escola. Combinamos de tomar um belo sorvete, e até mesmo ia conosco, mas seu sono, indisposição e dor nas costas não permitiram. Em compensação, ela convidou a todos nós para jantarmos em sua casa, mas ela deixou um tanto quanto óbvio que não era só aquilo. Em certas coisas sabia disfarçar muito bem, já em outras... Já sinto o cheiro de alguém aprontando! Caminhamos tranquilamente até a sorveteria, aproveitando os fracos raios de sol que batiam em nosso corpo. É pedir muito pelo verão?
Pegamos nossos sorvetes e nos acomodamos em uma das mesinhas que ficavam na calçada.
- O que você tem? - Callie me olhou torto, sem tirar completamente o olhar do seu grande sorvete de flocos com cobertura extra de caramelo.
- Por que a pergunta? - tentei desviar o assunto, esquecendo por um minuto que Callie é a pessoa mais esperta do planeta terra. Digo sério! Nunca vi uma pessoa que consegue ligar os pontos ou perceber algo tão rápido quanto ela. Callie cruzou os braços, me encarando de cima abaixo, claramente me intimidando e me achando idiota demais por achar que poderia engana-la. Ok, eu me rendo - É um pouquinho de tudo. A história com Chloe ainda me dá certo incômodo, e de uns dias pra cá Jackson vem me evitando de todas as maneiras e isso me deixa triste porque eu sei que ele precisa de alguém do lado dele, mas não está me dando espaço pra ser esse alguém.
- É bem óbvio que você ainda está balançada com a história da Chloe, e nós duas sabemos que você vai acabar indo conversar com ela uma hora ou outra. Nem mesmo vou tentar impedir, até porque acho que é uma boa ideia vocês finalmente sentarem e conversarem sobre tudo o que aconteceu. - ela dizia com muita convicção, e eu nem mesmo podia contestar. Era tudo verdade. Callie é uma ótima observadora. Deu uma colherada em seu sorvete antes de prosseguir - E em relação ao Jackson... Poxa, ele acabou de perder a mãe. Ele ainda está tentando lidar com toda essa mudança, e talvez você não seja o que ele precise nesse momento. - mordeu o lábio inferior, um pouco sem jeito por ter falado algo que poderia me magoar de certa forma, mas não magoou. Longe disso. Callie estava coberta de razão. Tudo era muito novo para Jackson.
- Isso é loucura! Há alguns meses eu achava Jackson Tuck um belo idiota, mas eu estava errada. Ele se mostrou completamente o contrário. Quem poderia imaginar? - joguei minha cabeça pra trás, sorrindo abertamente pelo fato de poder desfrutar das mudanças que a vida faz. Jackson foi a minha grande surpresa.
- Vou dizer algo agora, mas você não pode retrucar, ok? Então você vai ter que me jurar que não vai. - Callie ergueu o dedinho mindinho, tentando segurar o próprio riso pela infantilidade do momento. Se bem que, juramentos de dedinho são realmente sérios. Cerrei os olhos, tentando imaginar o que sairia daquela boquinha que as vezes falava mais o que deveriam. Juntei nossos dedinhos, selando meu juramento - Acho que você e Jackson vão acabar juntos. - ela disse com imensa convicção, dando uma piscadela sapeca e balançando o indicador negativamente ao perceber que quase estava saindo algum som da minha boca. Disparamos a rir juntas, e eu não posso negar que Callie é sim, a pessoa mais espertinha desse mundo.
Não pude evitar uma sensação que chegou de fininho, mas que logo foi se alastrando. O que Callie tinha dito mexeu comigo como alfinetadas, e para tirar os alfinetes dali, eu precisava encarar a verdade.
Chegamos todos na casa de por volta do mesmo horário. Me fazia ir ao céu vê-la tão feliz, principalmente depois que seu pai foi preso. Ela e finalmente se acertaram, o que me deixava ainda mais feliz e completa. Os dois mereciam todas as coisas boas que estavam acontecendo, e ainda mereciam muito mais.
A gravidez de serviu apenas para nos unir e nos divertir ainda mais. Em alguns dias gostava de irritá-la imitando o jeito que ela ficava quando sentia vontade de comer melancia. Sério, eu nunca vi tanta melancia na minha vida inteira como vi nos últimos meses. enfiava algumas roupas debaixo da camisa conforme a barriga de ia crescendo todo mês, tirando polaroids e numerando os meses da gestação em cada foto. Era o jeito carinhoso dele de acompanhar a gravidez. Jackson e chamavam o bebê de "John", crentes de que era um meninão, enquanto eu e Callie estávamos firmes no nosso palpite de que era uma menina. A cada dia que passava, ficava mais radiante e babão pelo bebê, assim como , com sua felicidade que podia ser vista a quilômetros de distância.
Nos deliciamos com as costelas ao molho barbecue e o purê de batata de Marie. Me senti ainda mais humilhada, porque vamos lá... sou um desastre na cozinha. Torta de maçã foi a sobremesa, coisa que era bem normal, exceto que aquela era a torta de Marie. Ai meu Deus, quero essa mulher como mãe! Terminamos de comer, fazendo um grande revezamento para arrumarmos tudo com rapidez. pediu um minutinho da atenção de todos, e claro, meu chão já tremeu. Sua expressão de felicidade junto com a de me acalmou rapidamente, e foi aí que eu me toquei. Sabia que estava aprontando algo!
- Eu até pensei em guardar isso pra mim e fazer surpresa quando o bebê nascesse, mas a verdade é que eu não consigo. Eu descobri o sexo do bebê. - anunciou risonha, passando a mão por sua barriga e observando nossa reação com uma gargalhada escandalosa. Nos entreolhamos surpresos, e a ficha demorou para cair. sabia! Ela já sabia!
Ai. Meu. Deus!
- Eu sei que é menino, fala logo! - resmungou apreensivo e curioso, levando suas mãos até a cintura e balançando a perna repetidamente, claramente impaciente.
- O nome dele vai ser John, né? Vou ensinar tanta coisa pra esse moleque! - foi a vez de se manifestar, com os olhos fechados e uma expressão de paz, provavelmente já imaginando a vida com um garotinho ao seu lado.
- Hmmm. É mesmo um menino, ? - se virou para a garota com um tom de curiosidade forçado na voz, passando a mão pela barba que já estava grande, fingindo estar pensativo. entrou no seu jogo, também fingindo estar pensativa.
- Ah cacete, falem logo! - não me aguentei e reclamei mesmo, arrancando uma gargalhada rápida do casal.
- Esperem só um segundo! - o casal se enfiou na cozinha, voltando do mesmo jeito que entraram. Não tinha nenhuma plaquinha, nenhum balão ou um bolo com alguma cor que indicasse o sexo do bebê. Bufamos frustrados, já impacientes.
- Porra, falem logo! - Jackson resmungou bravo. ,br> - Ué, vocês ainda não perceberam? - perguntou cinicamente, fazendo uma bola de chiclete junto com .
Uma bola de chiclete rosa.
ROSA!
- É MENINA!!! - me levantei aos gritos, tão feliz e serelepe que podia explodir. Nos juntamos todos juntos para abraçarmos o casal ao mesmo tempo, claramente saindo um abraço desengonçado, porém cheio de amor e felicidade. Meu palpite estava certíssimo!
- Caraca, logo uma menina? , você está fodidão! - gargalhou, tirando sarro do amigo que respondeu mostrando o dedo do meio e revirando os olhos. Convenhamos que realmente está fodidão mesmo. Não tem como a mistura dos dois sair menos do que maravilhosa. Já preciso preparar meu psicológico como titia de menina.
, e Jackson se juntaram em volta de , sugerindo nomes e mais nomes para o bebê, e também jogando algumas indiretas em relação ao padrinho do bebê. ria e ria, assim como eu. Ela merecia o mundo.
- Parabéns pela filha, seu ex-idiota! - dei um abraço apertado em , que me girou enquanto me abraçava, feliz da vida. Aquele sorriso era a melhor coisa de se ver na vida.
- Obrigado por tudo, . Sem você eu não conseguiria ter feito metade do que fiz. Você me fez um ser humano melhor, sabia? - continuei envolvida no abraço de , que sussurrava aquelas coisas maravilhosas em meu ouvido com a maior sinceridade do mundo. A única coisa que se passava pela minha mente é o quanto as coisas se bagunçam primeiro para depois se ajeitarem. Estava tudo certo, tudo finalmente indo pra frente. A única coisa que eu precisava era me livrar daquelas duas coisinhas que ainda estavam me incomodando. Você consegue, .
Avistei Jackson indo pra cozinha, e foi pra lá que eu fui depois de muito me esforçar, já que se recusava a me soltar. Acho que alguém me ama...
- Ei. - notifiquei minha presença com um aceno sem graça, como se nunca tivesse trocado uma palavra com Jackson. A verdade é que eu estava com medo dele simplesmente me responder de qualquer jeito e se afastar, coisa que ele já fazia há dias.
- Ei. - e então, ele me respondeu de qualquer jeito e se afastou, sem nem um sorrisinho sequer. Não tive nem a oportunidade de tentar dizer algo de tão rápido que ele saiu dali. Joguei a cabeça pra trás e respirei pesado, me sentindo inteiramente derrotada.
- Acho que alguém está passando pela mesma coisa que eu passei com . - disse quase que cantarolando, rindo fraco, já encostada na entrada da cozinha, onde Jackson passou feito um raio - Não é a toa que eles são irmãos, né? - deu os ombros, dando um olhar significativo. Eles realmente eram bem parecidos.
- ... - resmunguei quase chorosa, correndo para os seus braços, que se abriram rapidamente.
- Mostre o que você sempre me mostrou, ou seja, que tudo tem uma solução. Tudo o que está quebrado pode ser consertado. O que está machucado pode ser curado. Mostre que não importa o quão escuro esteja, o sol vai brilhar de novo. - encostou as duas mãos em meu rosto, olhando bem em meus olhos enquanto dizia todas as palavras que me deram forças o suficiente para me determinar a falar com Jackson de uma vez. Falar mesmo, ter uma conversa decente. As palavras de tem um poder tocante, mas eu nem sei se ela sabe disso.

Jackson's POV
Dizem que existem cinco estágios para o luto. Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Quero deixar claro que esses cinco estágios podem ir para o inferno. Perder alguém é uma merda e ninguém realmente pode fazer nada sobre isso. Não existem palavras para isso, apenas a porra da dor. Eu fiquei bravo com o mundo, inclusive comigo mesmo. Supliquei para que o tempo voltasse e que aquele maldito câncer fosse em mim. O desespero foi certeiro. Foi como se eu estivesse preso em uma bolha, incapaz de respirar ou viver. Cada dia um sacrifício diferente.
Minha mãe costumava cantar pra mim quando eu era pequeno. Acho que nunca contei isso a ninguém, era nosso segredinho. Toda noite ela me colocava para dormir e cantava. Conforme fui crescendo, ela achava que já não era mais necessário aquilo. Claro, eu também contribuí para que ela achasse que eu estava grande demais para ouvir canções de ninar antes de dormir. E então ela morreu. Senti o silêncio e percebi que perdi aquilo pelo resto da minha vida. As músicas foram embora, assim como ela. Ainda tento achar novas músicas para preencher o silêncio. Ela se foi. A parte mais difícil em se despedir é ter que fazer isso todos os dias.
Nossos pais tem certo poder sobre nós. O poder de afetar nossos pensamentos e emoções do jeito que só eles conseguem. É um laço que muda com o passar do tempo, mas nunca some.
Merda.
Eu só a queria de volta.
Corri pelos corredores, indo para o único lugar que me traria silêncio. Tudo o que eu precisava.
- Ai! Desse jeito sua sobrinha nasce mais rápido. - não estava em meus planos esbarrar em , principalmente em sua barriga. Não foi nada grave, mas foi o suficiente pra me fazer gelar de medo.
- Me desculpa! É que eu... sério... foi mal! ,br> - Ei, tudo bem! O que aconteceu com você? - ela se aparentou preocupada de verdade, e com motivos. Provavelmente minha cara não estava das melhores, e minha respiração acelerada contribuía para ela pensar que algo errado estivesse acontecendo.
E estava.
O mundo estava todo errado.
- Não é nada. - me aprontei para dar o fora dali, mas não perdeu tempo, ficando em minha frente e cruzando os braços, deixando óbvio que já tinha sacado tudo. Merda. Essas garotas sabem de tudo hoje em dia - Eu não quero falar sobre isso. - reforcei, mas dessa vez, dizendo a verdade. Realmente não queria falar sobre, mas ao mesmo tempo tudo aquilo estava me deixando maluco, e eu sentia que podia surtar a qualquer momento. O pior é que não sei disfarçar. Nunca soube. me analisava profundamente com o olhar, como se tivesse buscando as informações necessárias para ter uma base antes de dizer algo.
- Ok, eu já entendi. - com isso, eu esperava que ela abrisse o caminho novamente, mas a única coisa que se abriu foi sua boca - Sua mãe tinha orgulho de você, e partiria o coração dela saber que o lindo, gentil e inspirador filho dela está sofrendo desse jeito, e pior, sofrendo sozinho. Sei disso porque eu sou uma mãe também. - aquelas palavras foram capazes de tirar o ar do meu pulmão. O jeito como ela descobriu que eu basicamente estava sentindo podia ser considerado injusto. Eu não queria compartilhar, muito menos ouvir mais palavras bonitas.
Eu só quero minha mãe de volta.
Bufei nervoso, e mesmo sem querer, deixei isso bem claro para a garota, saindo dali como um furacão. Oras, quem foi o retardado que achou que meia dúzia de palavras bonitas consertariam algo assim? A vida continuava sendo uma porcaria coberta de injustiça.
Apertei o passo, sendo o mais discreto que pude ao entrar na sala de teatro. Era a sala que e frequentavam quando estavam com algum problema, e agora entendo perfeitamente o porquê da preferência. O silêncio consegue ser encantador, mas também perturbador. Na verdade, eu só queria silenciar minha mente. Queria parar de raciocinar tanta raiva. Por sorte, eu tinha a solução pra isso.
Abri minha bolsa com rapidez, pegando um dos inúmeros cigarros de maconha que tinham ali. Digamos que sempre tive isso na minha vida, principalmente depois que entrei na Opper. Vender drogas sempre me pareceu um bom negócio, aliás, era o meu meio de conseguir tudo o que queria, mas claro, nem tudo. Eu poderia vender todas as drogas do mundo, minha mãe ainda não voltaria. Mas... eu podia aproveitar, certo?
Certo.
Maconha pra mim sempre foi como comer carne no churrasco. Ok, vamos com calma. Não sou uma chaminé ambulante, mas também nunca neguei umas belas tragadas. Conforme as coisas vieram mudando nesses últimos meses, eu larguei tudo. Larguei o meu negócio com a venda de drogas, larguei os rachas, larguei a porra da minha popularidade e dos imbecis que diziam serem meus amigos. Otários.
De certa forma, eu e somos muito parecidos. Ele desistiu da vingança contra Richard enquanto eu desisti de tudo o que tinha. Foi fácil? Não. Não foi. Me corroeu durante todos os dias, mas cara... foi a melhor coisa que eu fiz nessa merda de vida. Eu ganhei um grupo de amigos verdadeiramente incrível, com uma garota mais incrível ainda. Grande .
Não... chega. Está na hora de parar de pensar um pouco.
- O que você pensa que está fazendo? - a voz de tomou conta do lugar, quase me dando um susto. O isqueiro estava prestes a acender meu baseado, mas larguei tudo apenas pra observar aquela beldade caminhando até mim. Ela nem mesmo se importou com o grito alto, porque claramente sua indignação estava maior que ele.
é linda, mas também consegue ser um tanto quanto chata. Insuportável até. Sempre querendo ter razão, sempre querendo te dizer o que fazer. Um porre. Era tudo o que eu não precisava.
- Não me enche. - fiz sinal para que ela parasse ali mesmo, mas não adiantou. Ela continuava a andar em minha direção com aquele olhar de advertência, que me fez rolar os olhos mais de uma vez.
- Olha Jackson, eu entendo que você está passando por um momento muito difícil e entendo que não é fácil conviver com isso, mas será que você pode parar e pensar por cinco minutinhos? Olhe o que você está fazendo! Estamos na escola! - sua voz quase falhou, num tom extremamente preocupado e indignado. Aquilo me deu nos nervos. Por que ela de importava tanto? Por que queria ajudar? Não adiantaria nada.
- E você acha que eu me importo?
- Você pode não se importar, mas EU me importo! - ela apontou pra si mesma com convicção, num misto de preocupação, indignação, braveza e uma pitada de decepção. Ótimo. Talvez assim ela me entenderia.
- Ok, então se importe bem longe de mim. - me virei junto com um sorrisinho cínico, me divertindo com a sua perda de paciência total.
- Se é assim que você quer então, por mim tudo bem. Quando você virar gente de novo, me liga! - ela ergueu as mãos para o alto indicando sua desistência, fazendo meu sorriso se desfazer repentinamente. Ela é a ! Ela não desiste e sai de campo, a menos que... a menos que eu realmente tenha a magoado. Merda, merda, merda! Que droga eu estou fazendo? A garota querendo o meu bem e eu agindo feito o completo idiota que era há meses atrás. Larguei tudo o que estava em meu colo com rapidez, procurando meu celular feito louco, ligando para a garota no mesmo instante, que estava prestes a abrir a porta para sair de vez dali. Observei de longe sua reação, que mesmo tentando esconder, vi s risada fraca que a garota soltou, caminhando novamente até minha direção - Ok, vamos começar de novo. Por que me ligou?
- Porque sei que posso confiar em você. - apertei os olhos com força, ainda me sentindo um completo idiota. O mínimo que podia fazer era dizer a verdade, e a verdade é que me encantou desde o primeiro momento. A garota mais leal e prestativa que já conheci em toda minha vida. A garota que mesmo sem obrigação, compra a briga de qualquer amigo, defende, ajuda, enche de bronca, mas faz tudo isso por amor. E digo mais, pois não é só isso não! Ela é como aquela luzinha no fim do túnel. Ela é aquele único pingo de esperança que você tem na vida, e que mesmo sendo pouco, consegue ser o suficiente. Ela simplesmente conseguia ser tudo. Conseguia ser a luz. A luz que faltava na minha vida.
- Algumas perdas são irreparáveis, eu sei disso. Ok, tudo bem, fique de luto, mas lute! Ache seu caminho de volta. Sua mãe queria que você fosse brilhante e inspirador quando você a perdesse. Ela ia querer que você lutasse com todas as forças que tem, porque foi esse o filho que ela criou e amou. - ela disse em tom cansado, se sentando lentamente ao meu lado e me encarando com aquele par de olhos claros que só podia ser uma obra de Deus. Um arrepio percorreu pelo meu corpo, junto com uma sensação similar a... um choque. Eu me sentia assim ao lado dela. Todas as vezes.
- Eu não queria que você me visse nesse estado porque desde o começo eu me mostrei um cara... forte. Eu me esforcei pra te impressionar. Eu não...
- Jackson, sua mãe morreu! A última coisa que você tem que pensar nesse momento é sobre o que eu vou pensar de você. A única coisa que eu quero é que você me deixe te ajudar. Você não deixa de ser menos forte por isso, está me ouvindo? - ela me interrompeu, deixando sua indignação ainda mais explícita. Revirei os olhos e senti meus ombros caindo em derrota. Ela estava tão certa, enquanto eu apenas merecia um troféu de imbecil do mês.
Ela sempre tem razão. Ela sempre tem a coisa certa a dizer. não é insuportável, e sim, o contrário. O pior nem foi eu pensar barbaridades dela, e sim, não fazer o que estava prestes a fazer...
- Eu cometi um erro. - falei embarascado, fazendo a garota pensar que eu tinha ignorado tudo o que ela disse. Mas não. Eu prestei muita atenção, o suficiente para saber que meu maior erro era realmente aquele.
- Não, Jackson, você não cometeu um erro, é que voc...
- Quero dizer, eu cometi um erro por não fazer isso aqui antes. - coloquei meu indicador em seus lábios, impedindo que qualquer outra palavra saísse dali. franziu a testa, visivelmente confusa. Tão adorável. Levei uma de minhas mãos até sua nuca, aproximando seu rosto do meu, juntando nossos lábios em um beijo tão delicioso e calmo que foi capaz de me fazer ir até o céu. Duvidava que as batidas do meu coração não pudessem ser ouvidas pelos ouvidos de , porque honestamente... estava muito acelerado. Não houve hesitações, e nossas línguas finalmente se juntaram, assim como nossos gostos. Não tinha mais nada em minha cabeça. Não tinha mais nenhum problema ou nenhum sentimento que estivesse me fazendo sentir aquela imensa angústia. Não tinha mais nada, apenas eu, e o nosso beijo. Tudo o que eu precisava.

Capítulo 31




"Nós vamos envelhecer, querendo ou não. Só resta saber se vamos seguir com a vida, ou vamos nos agarrar desesperadamente ao passado."


's POV
- Eu só queria entender o motivo do seu surto. - Callie deu os ombros, com os olhos cerrados como se estivesse buscando o real motivo do meu surto, que era muito simples.
- Jackson Tuck me beijou. Na boca. De língua. Está bom pra você? - respondi um tanto quanto indignada pelo fato da minha melhor amiga não estar dando a devida importância ao acontecimento.
- Ah, pelo amor de Deus! Você é bobinha demais, . Todo mundo sabia que isso ia acontecer uma hora ou outra. - ela gargalhou alto, claramente tirando sarro da minha cara. Pensei seriamente em jogar meu chinelo em sua cabeça, mas a única coisa que consegui fazer foi uma cara feia.
- Isso é verdade! - confirmou com dificuldade, e meu olhar se pousou na garota, que estava com a boca cheia de bolo. Ela espalmou as mãos no ar, se declarando inocente.
- Tá bem, admito que uma partezinha de mim sempre sentiu que talvez, repito, TALVEZ, algo pudesse rolar, mas é que... - foi como se minha voz tivesse sumido. Eu sabia exatamente como terminar minha frase, mas simplesmente não saiu. Ao dizer aquilo em voz alta eu estaria admitindo de uma vez que...
- Você nunca se apaixonou, e beijar Jackson foi extremante bom, mas também te trouxe sentimentos que você nunca sentiu antes. - Callie finalizou, me deixando totalmente incrédula. A garota sorriu fraco, se aproximando aos poucos e me dando um abraço rápido - Bem vinda ao clube. Foi exatamente assim que eu me senti com . - ela respirou fundo, olhando para um ponto fixo da sala, e deduzi que ela estava lembrando da sua trajetória com o namorado até o momento. Por um momento, me senti perdida. Não sabia pra onde olhar ou o que dizer. Callie estava inteiramente certa.
- , você basicamente foi a luz pra o meu relacionamento com dar certo. Sério, você nos ajudou tanto! Agora está na hora de você pensar na sua felicidade, e se for com Jackson, apoio totalmente. - se apoiou no balcão, pondo as duas mãos no próprio rosto numa pose extremamente adorável, assim como suas palavras. Aquilo era estranho. Novo. Diferente.
- É que... ai caramba... eu nem sei o que falar! - passei as mãos pelo rosto de maneira impaciente, soltando um grunhido alto. Eu sou a pessoa que ajuda os relacionamentos a darem certo, não a pessoa que tem um relacionamento.
- Tudo bem você se sentir perdida no começo. Tudo bem também se você quiser ir bem devagar. O importante é você feliz. - Callie garantiu de maneira meiga, lançando um olhar para , que rapidamente concordou.
Eu sou o que sou, sem desculpas, mas sempre me esforcei ao máximo para fazer todos a minha volta notarem que eu posso ser tudo o que elas quiserem. No meio disso tudo já fui barraqueira, já consertei relacionamentos, já acabei com um também, mas sempre, sempre, tentando trazer o melhor a todos.
Para os de fora, Jackson Tuck é apenas um festeiro mimadinho, mas para os de dentro, ele é muito mais do que isso. Ele é mais do que essas duas palavras. Me faz ir ao céu ver que todos os meus esforços para entrar na vida das pessoas tem um ótimo retorno, mas eu nunca incluo o amor no meio disso. Minha vida sempre foi resumida em fazer o bem para os outros, e eu posso tentar de todas as formas enterrar esse sentimento, mas quando se trata de Jackson Tuck meu coração acelera mais do que deveria. Talvez estivesse certa, talvez eu devesse mesmo me focar na minha felicidade. Sempre preguei que nada acontece se não corrermos alguns riscos. Talvez esteja na minha hora de arriscar.
Talvez.
Não tem coisa melhor do que começar o dia com aula de química e eu falo bem sério. Mas também tem a parte ruim. Educação física. Fala sério, não é possível que ninguém tenha percebido que nasci pra comer, comer e comer. Sem exercícios ou esforços físicos.
Antes mesmo do jogo de vôlei começar dei a minha incrível desculpa de que precisava falar com o professor de química, conseguindo um tempinho livre para simplesmente passear pela escola. Caminhei em direção ao banheiro, vendo uma cena que quase fez meu coração pular do peito. Talvez seja o restinho de culpa que eu ainda sentia, mas ver Chloe chorando doeu mais do que o tapa na cara que ela me deu. A garota notou minha presença ali, apertando o passo e entrando no banheiro às pressas.
- Ei, o que houve?
- Mas é claro, só podia ter você num momento como esse, né? A grande , a garota que ajuda a todos, e a que todos amam. - Chloe cuspia ironia, junto com um sorriso debochado. Tudo isso em meio às lágrimas que pulavam de seus olhos sem descanso.
- Chloe, não é bem assim. O que está acontecendo?
- Você quer mesmo saber o que está acontecendo? Então lá vai. Eu não suporto mais pertencer a tudo, mas não caber em lugar algum. Estou farta! É uma merda ser apenas mais uma linha na história de amor de alguém. É uma merda ter pais ocupados demais pra notarem sua existência. Eu. Estou. Farta! - ela esbravejou com raiva, pontuando cada palavra com pausas prolongadas, e eu jurava que iria leve mais alguns tapas. Chloe praticamente voou em cima de mim, me fazendo bater contra a parede. Ela estava surtando. Havia chegado ao seu limite. Coisas desse tipo não tem dia, lugar nem hora, apenas acontece, e eu não a culpo, longe disso. Ela merecia ajuda e compaixão. Ficamos longos segundos nos encarando até ela acordar daquele ataque, se afastando assustada, como se aquela atitude não tivesse vindo realmente dela. As lágrimas continuavam a cair, e tudo o que eu queria era fazê-las pararem. Respirei fundo antes de me aproximar com passos lentos e calculados, com medo de que qualquer movimento assustasse a garota que não estava em seu melhor juízo.
- Olhe bem para esse espelho que está na sua frente. - apontei para o mesmo, e mesmo com aquele olhar extremamente triste e raivoso de Chloe, me mantive firme, tão firme, que ela cedeu. Ela se virou lentamente, se olhando pelo grande espelho que tinha ali - Essa é a pessoa que você quer ser? Porque eu tenho certeza que não. Eu sei que isso é bizarro de se pedir, mas você precisa acreditar que o amor está por aí. Você se lembra do que disse uma vez?! Um passo de cada vez. Sobreviva a hoje. Mas não só sobreviva, e sim, viva. Você é melhor do que isso!
- Quando as coisas ficam ruins eu sempre dou um jeito de deixá-las piores. - ela disse com a voz embargada, passando a mão pelos cabelos de maneira raivosa, andando de um lado para o outro.
- Isso não é verdade! - adverti, sentindo meu coração se apertar. Me aproximei na intenção de abraçá-la, mas fui impedida pelo seu sinal que me impedia de completar minha ação.
- Não quero que você me abrace porque aí vou chorar mais e eu não quero isso. - ela buscou apoio na parede, onde se encostou. Ela me deu aquele olhar típico que você recebe quando fica claro que não há outra resposta aceitável senão a que concorda com o pedido solicitado, embora eu estivesse me segurando para não correr ali e abraçá-la, na esperança de tentar diminuir sua dor.
- Eu vou estar aqui pra o que você precisar. - garanti, sussurrando baixo e ainda tentando me aproximar. Chloe entreabriu os lábios, pronta para dizer algo, mas fui mais rápida, dizendo coisas que praticamente saltaram da minha boca. Não foi preciso muito esforço. Era tudo verdade - Você ainda tem a gente, ok? Mesmo apesar de tudo, jamais te negaríamos qualquer tipo de ajuda, está me ouvindo?
- Eu agradeço por isso, , de verdade, mas está na minha hora de encontrar meu caminho, e acima de tudo, me encontrar. Acho que isso não vai ser ao lado de vocês, mas não pense que vocês são o problema, porque é exatamente o contrário. Eu realmente te agradeço por isso aqui. - ela se reergueu de maneira surpreendente, deixando que a serenidade transparecesse em sua voz, passando as mãos pelo rosto, tirando dali qualquer rastro das lágrimas. Deu passos rápidos até a saída do banheiro, parando quase no final, se virando e dando um sorriso cheio de gratidão junto a um olhar doce, como se quisesse me passar uma mensagem. Chloe estava me libertando da minha própria culpa. Ela foi nobre o bastante mesmo em meio a um momento tão difícil. Senti todo aquele peso sair das minhas costas, respirando audivelmente aliviada quando a garota saiu de vez dali.
A vida é feita de ciclos, e Chloe finalizou um da sua. Ela provavelmente vai lutar para se tornar uma pessoa melhor a partir de hoje, e embora eu queira muito estar por perto para ajudá-la e também acompanhar essa mudança, sei que ela é capaz de fazer isso sozinha. Às vezes tudo o que precisamos é encarar nossos maiores medos sozinhos. Claro, provavelmente tem aquela dorzinha no coração dela pelas coisas não terem dado certo com , e consequentemente conosco, aliás, toda a adrenalina da entrega é natural porque a gente vai e se joga, mas nem sempre contamos com a queda. Mas sabe qual é a melhor parte? A que você se levanta.
Chloe pode ter suas recaídas, seus dias ruins e insuportáveis, mas ela é inteiramente capaz de qualquer coisa nesse mundo. Muitos ciclos ainda virão. Na vida, algumas pessoas vão te machucar não por aquilo que você é, mas por aquilo que elas mesmas são. Digo isso porque machuquei Chloe pelo o que eu sou, pelas minhas atitudes, pelos meus erros. Mas sabe, depois da dor e do processo de regeneração, ela vai olhar para trás e perceber que todas essas decepções a fizeram mais forte, assim como se tornou uma pessoa extremamente forte e confiante com todas as desgraças de sua vida. Tudo, impreterivelmente tudo, passa.
Saí do banheiro com o sorriso quase rasgando meu rosto, e até mesmo a vontade de fugir do vôlei fugiu. Chloe estava pronta pra enfrentar uma vida nova, o mínimo que eu podia fazer era enfrentar aquela aula.
E... que maravilha. Até mesmo o esforço físico foi gostoso. A sensação de leveza e alívio me faziam flutuar. Observei Jackson de longe, que deu uma piscadinha marota e se dirigiu até o vestiário. Não tinha nem como disfarçar o sorriso em meu rosto, e muito menos o coração que palpitava ainda mais rápido.
- Hmmm, eu vi isso aí. - a voz de me despertou daquela pequena distração, me fazendo soltar uma gargalhada fraca. Virei meu corpo pra trás, encontrando meu melhor amigo com uma expressão extremamente maliciosa no rosto. Eu queria muito ter um momento brincalhão, mas minha ansiedade falava mais alto. Eu precisava contar tudo.
- Eu conversei com Chloe. - disse um tanto quanto sem graça, afinal, era um assunto ainda delicado para os dois. O olhar de se apagou, indo de malicioso para preocupado.
- Sobre o que? Vocês não brigaram de novo, né?
- Acho que nunca me senti tão aliviada em toda a minha vida. - aquele momento tenso se quebrou quando abri um enorme sorriso, deixando claro que estava tudo mais do que bem. respirou aliviado, juntando as mãos como agradecimento.
- Ela está bem? Sobre o que vocês conversaram? - sua curiosidade se manifestou em um nível grande, quase me fazendo rir, já que aquilo estava quase sendo considerado desespero.
- Tudo o que você precisa saber é que tudo está no seu devido lugar. - respondi animada, logo cessando toda aquela felicidade ao lembrar daquela coisinha que também precisava ser falada - Ou quase tudo.
- O que você quer dizer com isso? - ele cerrou os olhos, me encarando de um modo intimidador que só ele conseguia. Aquele olhar era capaz de me fazer dizer qualquer coisa, até mesmo a senha do meu cofrinho.
- Eu e Jackson nos beijamos ontem. Na verdade, ele que me beijou, mas como eu retribuí, posso dizer que nós...
- Demorou, viu! - me interrompeu da minha confusão com as minhas próprias palavras, com as sobrancelhas levantadas e um olhar que eu podia jurar que deixava nítido que ele estava feliz por aquilo. Abri a boca várias vezes, mas não consegui emitir som algum. Balancei a cabeça algumas vezes para me certificar que aquilo não era coisa da minha cabeça, arrancado uma risada fraca do meu melhor amigo - , nosso pequeno romance foi ótimo para me fazer perceber que eu estava apenas perdido, e você sempre foi a pessoa que fez eu me encontrar, e por isso eu queria insistir tanto naquela história que, convenhamos, não tinha pé nem cabeça. Mas agora, isso aqui é sobre você. Não preciso perguntar detalhes porque sei bem o que vai sair da sua boca. E já faz um tempo que eu venho observando o jeito que você olha para Jackson, e sério... sabemos bem o que é isso, e sabemos também que você está assustada, mas a vida é curta, lembra? Tá com medo? Vai com medo mesmo, mulher. - ele finalizou com uma grande tonalidade de bom humor, me abraçando forte a ponto de me tirar do chão, de um jeitinho também que só ele sabia fazer. é único, e não importa as coisas que aconteçam em nossas vidas, nada entre nós muda. Meus pés tocaram o chão novamente, me dando uma bela oportunidade de encarar aqueles olhos que sempre me viram da melhor maneira, e até em momentos em que eu não acreditava em mim, aqueles olhos me disseram o contrário.
Não consigo encontrar palavras para expressar o quão incrível é ter essa conexão com alguém. Uma pessoa que está ali sempre querendo o seu bem e o melhor pra sua vida. A grande verdade é que todos na vida mereciam um em suas vidas, mas enquanto isso ao acontece... que fique claro que eu não divido mais esse aqui. É meu e meu.
Até outra pessoa aparecer e fisgar seu coração. Mas aí eu posso jogar meu charme novamente e conseguir meu melhor amigo pra mim novamente.
Ok, ok, eu sei.
Eu nem mesmo devia fazer piadas sobre isso.
- Eu tô te procurando feito idiota lá dentro e você está aqui fora só fofocando? Que coisa mais feia! - a voz de tomou conta do local, que por sinal, não era onde devíamos estar ainda. Sussurrei um "muito obrigada" no ouvido de enquanto caminhávamos para fora da quadra de vôlei, nos juntando a um muito bem humorado e sorridente.
Nem mesmo preciso dizer o quanto ele mudou ao saber que iria ser pai, né? Sério, é a prova que milagres realmente aconteceram.
- Eu já disse que você precisa marcar horário com a minha secretária pra falar comigo. - forcei o desdém em minha voz, o olhando de cima abaixo em reprovação. Ele parou de andar no mesmo instante, erguendo o dedo em riste, fingindo uma extrema decepção. Como sempre, caímos na gargalhada.
- Antes de qualquer coisa, vai se foder. - ele sorriu cinicamente, e antes mesmo que eu pensasse em retrucar, ele retomou - A mudança pra casa nova da vai começar e eu queria fazer algo especial, e como você é uma amiga ótima, pensei que você pudesse...
- Te ajudar? Ok, posso sim, mas só que você vai ter que me levar pra assistir o próximo jogo do Charlotte Bobcats. - cruzei os braços, abrindo um sorriso largo e oportunista enquanto o do garoto se desmanchava. Qual é? Nada é de graça nessa vida. - Estou brincando, bobinho. - respirou aliviado, e por mais que eu realmente quisesse ser bancada no próximo jogo do meu time de basquete favorito, não era justo cobrar pra ajudá-lo, especialmente com - Leve ela a um restaurante bem romântico. Você nunca fez nada disso, então tenho certeza que isso vai surpreendê-la. - disparei a minha melhor dica.
- Jantar romântico? - fez uma careta desagradável, procurando apoio no olhar de , que deu os ombros, obviamente deixando claro que não podia ajudar muito.
- É o que as mulheres gostam, cara.
- não vai nem precisar olhar o menu porque ela vai comer na palma da minha mão. - soltou a piada que ao mesmo tempo me fazia querer eliminá-lo do mundo, também me fazia querer dar um prêmio para ele. Sério, ainda estou tentando processar o fato de ser tão honrada por ter pessoas desse tipo ao meu lado.
- Essa foi péssima, mas adorei. Vou aderir. - se manifestou em meio aos risos descontrolados, dando um hi five no amigo, que retribuiu orgulhoso. Garotos...
- Você já comprou o presente de aniversário dela também? É semana que vem. - cruzei os braços, com a voz lotada de falso desdém, erguendo o queixo como se estivesse o desafiando. Isso nunca perde a graça.
- Eu comprei o melhor presente do mundo inteiro, minha filha. - ele ironizou, cruzando os braços também, nos deixando no mesmo nível de idiotice. apenas observava com aquele olhar de quem realmente não sabia o que ainda estava ali, mas também não queria se afastar.
- Veremos!
's POV end

- Ei, você está pronta? - encostou-se à porta, dando uma olhada rápida pelo quarto que já não tinha mais nada além das memórias. As minhas memórias.
- Eu passei tantas noites em claro aqui nesse quarto imaginando o que eu me tornaria. - andei pelo dormitório que até fazia eco. Meu coração se apertava conforme eu andava, e juro, eu tentei segurar minhas lágrimas.
- Qualquer coisa que tenha imaginado, saiba que você conseguiu. E eu sou apaixonado pelo o que você se tornou. - adentrou aos poucos, me puxando pela cintura de um jeito carinhoso, encostando suas mãos quentes em meu rosto e limpando as lágrimas com seus polegares. Ele ainda me tirava o fôlego a cada vez que dizia algo, quando sorria, ou quando me beijava. O encanto crescia a cada dia mais, assim como o companheirismo. Ter naquele momento foi mais importante do que eu jamais poderia imaginar. Finalmente - ou infelizmente - o adeus. Adeus ao lugar que me proporcionou tanta memórias ruins, mas também que me acomodou fisicamente e espiritualmente. Dar adeus àquela casa tinha uma grande proporção de alivio e de página virada, mas também com uma pitadinha de decepção por não ter o que sempre sonhei ali; um verdadeiro lar e uma família unida. Claro que a única maneira que encontrei de fazer aquilo era em meus sonhos, mas agora tudo parece diferente. Agora eu sou mãe. Agora eu preciso pensar no que é melhor para a minha filha, e claro, o melhor era criá-la longe daquelas memórias tão infelizes, mas que também contribuíram para formar o que sou hoje.
Claro, ainda tem muito chão pela frente. Tem muita luta, muito esforço e muitas coisas a serem conquistadas, mas eu mudei. E pra melhor.
Eu corri sem parar, perdi o fôlego e me feri. Mas acabou. Os percursos pelos quais passei durante a vida me fizeram entender que eu não necessitava ter corrido tanto. Corri, e apressei as coisas. Ou pelo menos, tentei. Tentei apressar minha morte, tentei apressar as mudanças e tentei apressar minha relação com . Sim, muitas dessas coisas podiam ter tomado um rumo diferente e mais rápido, mas agora o único sentimento que tenho em meu coração é gratidão por todas essas coisas terem acontecido. Por anos, apenas pensei na escuridão dos dias ao invés de aproveitar o sol. Mas a vida se encarregou de tudo. Obtive respostas, soluções e outros caminhos ao parar de correr e respirar. A graça extraordinária do ser humano é sua capacidade de atravessar por todos os caminhos, chutar todos os obstáculos, e se amparar em si mesmo para continuar. Eu fiz isso por tantos anos e nem mesmo percebi, mas agora... Agora tudo mudou. Para melhor.
- Nós vamos ouvir One Republic SIM! Eu estou grávida, você tem que me dar o que eu quero, e nesse momento eu quero ouvir música boa. - resmunguei pela milésima vez, tentando puxar o cabo que conectava o celular com o rádio das mãos de , que declarou guerra contra mim sobre qual música iríamos ouvir ao caminho da minha casa nova - E a propósito, eles vão fazer um show aqui em Charlotte bem no dia do meu aniversário!
- Não, nós vamos ouvir Maroon 5! E para de fazer chantagem barata porque eu já tive que comprar uma plantação de melancia pra você, sua ingrata! - continuava a me contrariar, e eu precisei segurar o riso para não me descontrolar e perder aquela guerra em que estávamos. 5 meses de gestação são 150 dias. Digamos que em 100 deles eu comi melancia. O que eu posso fazer, oras? Minha filha gosta - E a propósito, eu não me importo que a sua bandinha vai vir pra cá. - aquilo foi o suficiente para me frustrar o bastante. se referiu a One Republic com um enorme desdém.
- Ahhhh, eu cansei! - soltei o cabo repentinamente, causando certo impacto em , que quase bateu em seu próprio rosto. Cruzei os braços e fiz bico, visivelmente emburrada. soltou uma gargalhada fraca, levando uma de suas mãos até meu rosto, sendo impedido por um tapa meu. Ele não tinha o direito de insultar minha banda e agir normalmente.
- , eu estou brincando. Você sabe que eu faria de tudo pra te levar ao show deles, né? - ele me encarou com aquele olhar que era capaz de me desmontar inteira, com um arrependimento sincero na voz. O olhei torto, ainda de braços cruzados, desfazendo meu bico e abrindo um sorriso no rosto do garoto, que deduziu que tudo já estava bem - Rádio? - ele sugeriu simpático, e dava pra perceber que internamente ele estava torcendo para que tudo realmente estivesse bem.
- Rádio. - assenti positivamente, desistindo de continuar com aquela pequena discussão sem necessidade.
A voz de Troye Sivan tomou conta de nossos ouvidos com WILD. Nos entreolhamos contentes, sem admitir que aquela música se encaixava perfeitamente no momento.
- Leave this blue neighborhood, never knew loving could hurt this good, oh. - cantarolamos alto, e finalmente deu partida no carro, nos levando em paz até meu novo cafofo, que na verdade também era dele.
A confusão entre adolescentes que ainda são muito jovens para morarem sozinhos e que não tem dinheiro o suficiente para bancar essa vida ainda, pra ser mais exata. Nossa vida e rotina iriam mudar, mas ainda não tínhamos planos certos e exatos para quando nossa filha nascesse, e cada vez ficávamos com menos tempo para pensar nisso.
O carro parou. Um lindo jardim logo de cara, junto a uma entrada extremamente agradável até a porta, fazendo caminho com diversos tipos de flores ali. Sorrir foi inevitável. Procurei pela mão de e as entrelacei. Não tinha ninguém no mundo inteiro que eu gostaria que estivesse ao meu lado em um momento tão importante a não ser ele. O amor da minha vida.
limpou a garganta, levando as duas mãos até minha barriga, onde iniciou um carinho relaxante. Nossos olhares se encontraram, e eu sabia que ele estava prestes a dizer algo.
- Em alguns momentos da sua jornada, você tirou forças da onde nem sabia que existia. A loucura quase abraçou seu corpo frágil, mas você resistiu não só a ela, como também a todos os outros tropeços que poderiam te desestabilizar. Parabéns, , todos os seus esforços valeram a pena. Você tem um lar, meu amor! - não importa como planejou ou como imaginou. A vida dá um jeito de fazer você encontrar o que precisa. Ou quem precisa. Não consegui conter as lágrimas que se formaram em meus olhos, sendo envolvida pelos braços de em um abraço aconchegante e com inúmeros selinhos apaixonados.
Passei muito tempo pensando que se me apaixonasse, tudo desmoronaria. Pensei que o amor fosse uma grande tragédia.
Agora, honestamente?
Se isso for tragédia, me dê tragédia, pois eu não trocaria por nada nesse mundo.
Andamos juntos até a porta do lugar onde criaríamos novas memórias. A porta foi aberta, e embora tivessem apenas as caixas com nossas coisas e os móveis ainda deslocados, a sensação de página virada foi a mesma. Um grande e novo recomeço.
- , olha pra isso! É enorme! - exclamei maravilhada por cada detalhe da casa, andando de um cômodo para o outro, tendo uma grande surpresa ao entrar na cozinha - O que é isso aqui?
- Isso aqui é pra te mostrar o quanto mexeu comigo. O quanto me mudou. Aliás, em que mundo eu, faria um jantar romântico para uma mulher?! Você me transformou em um homem ao te amar, . - as mãos de estavam pousadas em meu rosto, com aqueles olhos lindamente azuis grudados nos meus. Ainda não inventaram as palavras que descrevem o quanto eu o amo.
A única coisa que tinha ali era uma mesa nova com apenas duas cadeiras, e um jantar incrivelmente cheiroso e apetitoso.
- , isso é incrível!
- Não, você é incrível! É só uma maneira de te dar boas vindas, por mais que você ainda vá passar alguns dias na casa da sua tia pra ficar longe do cheiro de tinta durante a pintura, e também... eu preciso te perguntar algo muito sério. - arqueou as sobrancelhas de modo preocupante, passando as mãos pelos cabelos nervoso. Meu sorriso foi se desfazendo aos poucos, já esperando por algo terrível. Estava tudo bom demais para ser verdade.
- O que aconteceu dessa vez?
- É que eu preciso saber se você quernamorarcomigo. - ele disparou rápido, apertando os olhos e fechando os punhos em raiva.
- Ãn? - gargalhei alto, tentando esconder o nervosismo que se apossou do meu corpo. Eu ouvi bem ou ele...
- , você aceita namorar comigo? - ele repetiu pausadamente, segurando minhas mãos delicadamente, e embora seu nervosismo estivesse muito grande, seu olhar esperançoso ficou preso ao meu durante o pedido.
O amor. Tanto amor que nem tentando odiar eu consegui deixar de amá-lo. Tanto amor que fomos presenteadas com uma filha incrível, que mesmo sem conhecermos, já era imensamente amada. , o homem que trouxe leveza e lucidez pra minha vidinha medíocre. Um sentimento tão grande e único que nem mesmo cabe em mim. Tenho vontade de gritar para o mundo todo essa sensação incrível que esse amor me proporciona todos os dias. , o homem que me faz cair num abismo infinito e rouba todas as palavras e expressões existentes. Cada vez que nos olhamos é uma explosão que sinto no meu peito e alma, apenas me confirmando o que no fundo, eu sempre soube.
- Eu seria maluca se não aceitasse!

***


5 DIAS DEPOIS.

Você pode encontrar bondade em qualquer lugar se der a ela, o benefício da dúvida. Você só vai conseguir ser feliz quando ouvir seu coração.
Bem, estou orgulhosa por ter ouvido o meu.
- Ok, já entendi que hoje é seu aniversário e que você não quis ir pra escola, só não entendi o porquê de você ainda estar deitada nessa cama! - mamãe abriu a porta do quarto sem aviso, resmungando com um ótimo bom humor. Ela não conseguia nem fingir estar brava.
17 anos, um bebê na barriga e uma mãe que ficou acordada até meia noite apenas para me dar parabéns. Eu realmente não preciso de mais nada.
- Mas mãe, são dez da manhã ainda, e acho que você ainda lembra o quanto essa barriga pesa! - retruquei preguiçosa, passando a mão pela minha barriga em círculos, maravilhada pelo o quanto meu bebê crescia a cada dia. Mãe babona? Pode crer que sim!
- Então tá bom, vou tirar o presente que deixaram pra você ali embaixo. - ela deu os ombros, sumindo dali com rapidez. Me sentei na cama rapidamente, tentando adivinhar se aquilo era simplesmente uma estratégia para me fazer levantar mais rápido ou se era verdade.
Eu sou curiosa.
Muito.
Me levantei rapidamente, me apressando na higiene matinal e tentando não correr pelas escadas, mas foi inevitável.
Porém...
- Cadê meu presente, dona Marie? - gritei em revolta, não vendo um rastro sequer de presente ali.
- Está aqui na cozinha! - mamãe gritou em meio aos risos, e marchei até lá.
- SURPRESA! - todos gritaram juntos, com alguns balões rosas em mãos, junto ao bolo que estava em cima da mesa. Mal tive tempo de reagir, já sendo abraçada e amassada por todos ali, que me desejaram os parabéns mais lindos que qualquer pessoa gostaria na vida.
- Vocês faltaram a escola pra virem aqui fazer isso pra mim? - perguntei chorosa, arrancando algumas risadas dos meus amigos. Hormônios...
- Na verdade eu só vim pelo bolo e porque não estava a fim de enfrentar aquela chatice de aula de geografia. - se manifestou brincalhão, recebendo uma cotovelada bruta de Callie.
- Você tem cinco minutos pra tomar banho e se arrumar pra ver seu verdadeiro presente. - ordenou mandão, me puxando pela mão até as escadas, claramente me apressando.
Agora sou uma curiosa apressada.
O famoso banho de gato.
A dificuldade do dia a dia era encontrar uma roupa que ainda servisse numa boa. Mas honestamente? Era o de menos. A cada chutinho que meu bebê dava me fazia ter certeza de que tudo valeria a pena. A ansiedade crescia a cada dia para ver aquele rostinho que até então eu só conseguia ver por ultrassom.
Ah, filha... como eu já te amo!
Desci novamente curiosa, sendo instruída a ir para o carro de , onde fomos juntos, e o resto junto com Jackson. Aquele caminho já me era conhecido, e confirmei com certeza absoluta ao sentir o carro parando em frente à minha nova casa, que estava em seus ajustes finais.
- Por que estamos aqui? - me virei confusa para , que apenas sorriu torto e saiu do carro, andando até a porta do passageiro e a abrindo, me ajudando a sair com delicadeza. Ele entrelaçou nossas mãos, andando até a porta e parando, indicando com o pescoço para que eu olhasse para , que obviamente gostaria de dizer algo.
- teve essa ideia doida de nos chamar para pintarmos um dormitório em específico da sua casa nova, e aproveitamos para deixar todos os nossos presentes de aniversários nele também. A cada toda já está quase pronta, mas tenho certeza que esse vai ser seu cantinho favorito dela.
balançou a chave em frente aos meus olhos em provocação. Peguei-as de suas mãos e abri a porta às pressas, ignorando totalmente a lindeza da sala, correndo até meu quarto, que era o lugar que eu esperava que estivessem todos os meus presentes.
Mas não.
apontou para o dormitório ao lado, que estava combinado para ser o da... nossa filha.
As cores rosa e branco tomaram conta das paredes.
Um berço, uma cômoda para roupas e para troca de fraldas, uma cadeira de balanço que me parecia extremamente confortável junto a um abajur pra lá de fofo, e cortinas incrivelmente lindas para finalizar e me fazer cair no choro.
Estava tudo ali.
- E-eu nem tenho palavras! Vocês são absolutamente incríveis! - coloquei as mãos em meu rosto como uma criança, sem acreditar que tudo aquilo era real mesmo. Foi preciso tocar em cada móvel e enfeite que estava ali, me certificando de que aquilo não era um sonho.
- Mas ainda nem acabou! - abriu um sorriso sapeca, e a menos que eu quisesse que meu bebê nascesse naquele momento de tanta emoção, foi necessário sentar na cadeira de balanço que estava ali. Extremamente confortável.
abriu uma das gavetas da cômoda, tirando dali três pacotes de presente e os colocando em meu colo. Muitas emoções, muita vontade de chorar, e também muitos sorrisos. Ataquei o primeiro pacote com curiosidade, tirando dali o novo álbum do One Republic, e o gritinho foi inevitável. O próximo foi um lindo porta retrato com a nossa primeira foto juntos no primeiro jogo de futebol e de líderes de torcida. O último presente fez o meu coração cair no chão e se derreter; um conjunto lindo de body e calça com uns gatinhos de estampa para a minha filha.
Me levantei com certa dificuldade pelo peso da barriga e dor nas costas, mas isso não me impediu de abraçar cada um que estava ali presente. Um abraço cheio de gratidão pelos presentes e pela pessoa que cada um dali era. Nem mesmo se eu tentasse iria conseguir dizer o quanto cada um era importante na minha vida. Na verdade, fazíamos isso diariamente. Não desistimos um do outro, não fugimos das encrencas que cada um se envolve, e o mais importante: nossas mãos sempre se estendem um para o outro. Isso é a simples mistura de amor e união, e eu não trocaria por nada nesse mundo inteiro!
- Gente, isso é realmente incrível. Eu não tenho palavras pra dizer o quão grata eu sou por esse dia e por todos os outros que eu tive vocês ao meu lado. A melhor coisa em mim são vocês, tenham certeza disso! - eu disse, simplesmente, me sentindo afundar nos olhos de cada um dali, os olhos que me faziam ter certeza que ainda existe gente boa nesse mundo maluco.
- Isso tudo aqui pode ser maravilhoso, mas acho que você vai gostar mais do presente do . - Callie disse, nem mesmo escondendo a ansiedade em sua voz, junto a um olhar sapeca. Cerrei os olhos, olhando para o meu namorado que ria sozinho, com as mãos no bolso de maneira insegura, como se estivesse escondendo algo.
- , cadê meu presente? - cerrei ainda mais os olhos, analisando o quarto e vendo que não tinha outra possibilidade de haver outro presente ali, então continuei a me focar naquelas mãos em seu bolso.
- Adivinhe! - ele tombou a cabeça pro lado e ergueu o queixo como se estivesse me desafiando.
- Eu não sei... Eu acho que é... Não, não pode ser. - gargalhei fraco sem acreditar, sentindo meu coração se acelerar mais a cada segundo. Meus olhos se arregalaram, enquanto assentia positivamente sobre a minha desconfiança sobre o presente que me faria sair pulando por aí - , é isso mesmo que eu estou pensando? - senti meus olhos marejarem, passando a mão pelos meus cabelos de maneira nervosa.
- É claro que é. Você achou mesmo que eu não te levaria no show da sua banda favorita no dia do seu aniversário? - ele juntou os lábios em um biquinho irresistível, fingindo estar afrontado - Vamos lá, , você sabe que eu te levaria até a lua se pedisse. - finalizou com uma piscadinha marota, finalmente tirando do bolso a coisa que eu esperei ver por anos.
Os ingressos.

***


Acho que o amor é isso de não se aguentar em si, de sentir que seu coração bate noutro peito. O amor é tudo isso de excitação, aventura, mistério, esforço e sorte também. A minha foi grande. Mas o amor também tem isso de brigas, paciência esgotada e teste diário e esforço de novo. Esforço entra na parte boa e na nem tão boa assim, mas sabe, esforço vale a pena. Quando a gente sente um amor desses, arrebatador, a gente congela, para, fica na defensiva, não sabe o que fazer ou falar, até o momento em que simplesmente ama. E não chegou de mansinho não. Meteu o pé na porta, me escancarando com sentimentos que nunca imaginei que fosse possível de serem sentidos.
O amor tem esse poder de te fazer uma pessoa melhor, mais esperta, mais atenta, mais segura e mais confiante. O amor te da a certeza do futuro, somando o presente e esquecendo o passado.
Eu sempre supliquei por uma vida melhor, e agora, eu tenho mais do que já imaginei. Um amor, amigos, e uma filha.
- Está pronta para o melhor show da sua vida? - perguntou animado, tirando seu cinto de segurança e o meu também. Nos encaramos por alguns segundos, e me faltou palavras para dizer o que ele merecia ouvir.
Essa é a vida em cor. O dia de hoje não é como nenhum outro.
Saímos do carro com certa pressa. O grande anfiteatro PNC Music Pavilion estava em frente aos meus olhos. Puxei com mais pressa ainda pela mão, apertando o passo e me juntando a toda aquela multidão que já estava ali. Nosso portão de entrada já estava aberto, e após entregarmos tudo o que devíamos, finalmente entramos.
Segunda fileira da arquibancada inferior, onde daria perfeitamente para ver minha banda favorita de toda a vida cantar as músicas que de certa forma, sempre me ajudaram.
A vibração, os gritos, e claro, o amor.
As primeiras batidas de Heaven se fizeram presentes em meus ouvidos, e juro, eu poderia morrer ali mesmo de tanta euforia. Meu olhar se intercalou entre , que também estava maravilhado, e entre os homens que formam a banda mais incrível do mundo.
Dei um selinho demorado em meu namorado, que me abraçou de lado, aproveitando cada segundo daquela experiência incrível comigo.
Eu juro, esse homem é o meu destino!

Capítulo 32




"Há coisas que são conhecidas e coisas que são desconhecidas, e entre elas, há portas."


Jackson's POV
- Você está me dizendo que ainda não teve aquela conversa com ? Depois de todos esses dias? - deu ênfase no "aquela", com os olhos cerrados e a indignação clara em sua voz. Talvez não seja tão bom ter um irmão às vezes.
- Não, ainda não sentamos e conversamos sobre nosso beijo. Sei lá, parece que... ah, não sei. - desisti de tentar expressar o que se passava pelo meu pensamento, porque estava tudo uma bagunça.
- Eu sabia que uma hora isso ia acontecer, estava na cara. Você e até que combinam. - ele me encarou com aquele olhar analítico antes de confirmar o que saiu de sua boca, como se apenas um olhar fosse o suficiente para confirmar que fazemos um bom par.
Mas espera. Não somos um par, nem casal, nem nada. E por algum motivo que ainda é desconhecido, isso me frustra.
- , é sério! Eu não sei muito bem o que dizer. Sabe, eu nunca... nunca... me envolvi com alguém de verdade, de verdade MESMO. Sempre foi só diversão. - tropecei em minhas próprias palavras, sem nenhuma noção de como lidar com a situação. Perdidão.
- Em primeiro lugar, acho que você deve ir com calma. Talvez essa coisa com a dê certo, ou talvez não. Você só vai saber quando arriscar, mas saiba que o amor tem uma energia absurda, e se permitir senti-lo é a melhor coisa que você pode fazer por si mesmo todos os dias. - pontuou seus tópicos com as mãos, finalizando com um sorriso alegre e esperançoso, como se estivesse esperando alguma atitude de minha parte. Bem, também estou esperando uma atitude de mim mesmo.
O sinal tocou.
As garotas saíram da quadra com pressa em direção ao vestiário. Aqueles trajes para o treino ainda me tiravam alguns suspiros.
Epa! Foco, Tuck!
Ela passou. Nada de "uau, minha donzela passou e senti como se o mundo estivesse em câmera lenta" e esses bla bla bla, ela apenas passou. Linda, da cabeça ao pé, e suada também. Um arrepio percorreu pelo meu corpo junto com um nervosismo que nunca senti em toda a minha vida.
Estava na hora.
- Valeu, . - agradeci com a voz branda, quase desligado do mundo por conta de todos os pensamentos que tomaram conta da minha mente.
Se minha mãe ainda estivesse aqui, com certeza apoiaria a ideia. Ela amou conhecer , mesmo sendo a única garota que apresentei para ela a vida inteira. A única.
As coisas mudam mesmo, não?!
- Terra chamando Jackson! Alô??? - aquelas mãozinhas eu reconhecia de longe. Foquei minha atenção naquele par de olhos que nunca perdiam o brilho. estava em minha frente, balançando as mãos para chamar minha atenção enquanto todos os demais passavam por nós em direção à saída. Nada saiu, mas iria sair. Eu não colocaria o pé pra fora dali antes de dizer tudo o que precisava ser dito. Peguei na mão de , a puxando pelo corredor sem dizer uma palavra sequer, ouvindo alguns resmungos da garota.
A sala de teatro. Não podia ser diferente. Agilizei nossa entrada sem que ninguém nos visse, passando a mão no rosto antes de me virar por completo e ficar em frente à garota novamente, que me encarava confusa com as sobrancelhas arqueadas.
- Sei que todo mundo tem que ser meticuloso ao entrar no caminho de alguém, mas acho que você não foi. Você simplesmente chegou da maneira mais boba possível, mas sabe, minha mãe sempre foi muito atenta aos detalhes. Ela costumava dizer que as pequenas coisas são as que te trazem mais felicidade, e por isso que muitas pessoas se perdem, porque não dão atenção aos detalhes pequenos. Parei pra pensar, e você foi a única que chegou sem julgamentos, sem interesses ou sem segundas intenções. Você foi diferente, e ainda é. - respirei fundo, encontrando forças para continuar naquele olhar que, agora, estava ainda mais radiante - Eu sei que aquele beijo mexeu com você o tanto que mexeu comigo, tanto que nem tivemos coragem de conversar sobre isso, mas estamos aqui agora. Vamos resolver. Eu sei que você não é uma garota qualquer e nem se eu quisesse ficaria nesse lenga-lenga de ficar com você apenas de vez em quando. Então... acho que isso é basicamente um... pedido... de... uma chance. Eu acho. - levei a mão até o queixo, cerrando os olhos e pensando comigo mesmo, o que fez a garota soltar uma gargalhada gostosa. A palhaçada é sempre a saída, mas ainda assim, meu nervosismo estava mais óbvio do que a gravidez de .
- Deixa eu falar também, que eu penso em você todos os dias desde que senti suas mãos segurando meu rosto e seus lábios tocando os meus. - suas mãos foram em direção ao meu rosto, me tocando delicadamente e me olhando com aquele olhar encantado, parecendo ainda não acreditar no que tinha acabado de ouvir - Eu admiro sua coragem, Jackson, de verdade mesmo, mas acho que devemos ir com calma. O que você acha? - seu sorriso foi se afrouxando, e ela então mordeu os lábios, visivelmente apreensiva e sem graça. A coisa mais linda. Não consegui evitar sorrir, e nem foi preciso dizer nada. Ela sabia e sentia, assim como eu. Indo devagar ou não, eu só queria ir. Com ela. Envolvi meus braços em sua cintura, aproximando seu corpo do meu e dando um beijo demorado em sua testa. Aqueles braços curtinhos também passaram pela minha cintura, me abraçando forte. Sua cabeça em meu peito, como o encaixe perfeito. Fechei os olhos, aproveitando o momento ao máximo.
Alívio e confiança. Acho que foi isso o que minha mãe sentiu durante a vida. Se foi, que ótimo!
Uma sensação completamente diferente se apossou de mim. Abri os olhos devagar, como se algo estivesse ali pra mim.
Algo não, alguém.
Ela estava ali pra mim.
Minha mãe sorriu feliz, dando uma piscadinha discreta, claramente orgulhosa. Sua imagem ali me fez sorrir junto, e a sensação se expandiu. É felicidade o nome. Estou reaprendendo a viver de novo, e agora, de um jeito melhor.
Estou no caminho certo. Minha mãe está me ajudando.
Jackson's POV end

's POV
04:37 da manhã. continuava a dormir, porém inquieta. Minha filha com certeza estava fazendo a festa dentro da barriga da mamãe. O livro de matemática continuava aberto, e a maioria dos exercícios daquela página, feitos. Muito trabalho a se fazer, e um grande futuro pela frente. Me levantei cuidadoso, desligando o abajur e finalmente pronto para me render ao sono. Deus, ela é linda demais.
Foram longos segundos encarando minha garota. Sua respiração e feição tão tranquilas. Eu poderia passar a vida toda apenas a olhando. É... eis a questão sobre se entregar: quando você se entrega, realmente se rende, você se esquece do porque resistiu em algum momento. Eu nem mesmo gosto de imaginar que em algum momento tentei negar tudo isso, esse amor, essa vida, essa mudança, essa felicidade.
Eu tenho tudo.
- Ei, o que você está fazendo? - a voz rouca e cansada da minha garota se fez presente, me chamando a atenção. Aqueles olhinhos que mal se mantinham abertos arranjaram forças para continuarem a me olhar da maneira doce de sempre.
- Nada importante. - fechei os livros que estavam em cima da mesa que me acomodou pelas duas horas anteriores. se sentou, encarando meus movimentos com um olhar confuso.
- , você estava estudando essa hora?
- Mais ou menos. - respondi sem empolgação, me deitando e esperando que minha namorada fizesse o mesmo.
- O que está acontecendo? - ela permaneceu sentada, com um olhar extremamente preocupado. Aquilo me deu certo incômodo. Não era a primeira vez que eu fazia aquilo, mas era sim a primeira que fui pego pela garota.
- É que... vamos ter um bebê. Preciso ir pra faculdade pra garantir que nada vai nos faltar. Eu não posso continuar acomodado. Preciso ser melhor por você e pela nossa filha, e é isso o que vou fazer. - clareei a garganta antes de responder, um pouco sem graça. Logo eu! É lamentável e ao mesmo tempo incrível o ser humano ter que precisar de algo surpreendente como uma gravidez não planejada para se tocar de que precisa se esforçar para ser tornar uma pessoa melhor, e buscar outros caminhos, outras ideias. Não que eu esteja reclamando, mas isso mostra que a maioria das pessoas fazem as coisas não por elas, e sim, pelos outros. No meu caso, também faço por mim, mas me frustra saber que precisei disso para me tocar de que eu também tenho uma importância gigante na minha própria vida.
- , você se torna melhor a cada dia que passa. Você me enche de orgulho, sabia? - se abaixou aos poucos, encostando o queixo em meu peito, com aqueles olhos que Deus... os olhos mais lindos do universo! Um sorrisinho se formou em seus lábios, e cada vez que aquilo acontecia me confirmava que é a mulher da minha vida e sempre vai ser, até depois que ela acabar.
- Eu pensei em um ótimo esquema! - exclamei empolgado, acordando do meu próprio devaneio que seus olhos me causaram - Eu vou pra faculdade e arranjo um emprego enquanto você fica com a bebê durante o ano, e depois, ela começa a ir pra creche e você também inicia a faculdade. Tenho certeza de que se precisarmos de algo, nossas mães vão nos ajudar, então acho que está tudo certo, né? - questionei animado, já que a expressão de deduzia que ela estava tão contente quanto eu, até que aquele olhar foi se desfazendo aos poucos, murchando... Ela salivou, desviando o olhar e cerrando os olhos, como se estivesse analisando o que estava acontecendo com ela.
- Apenas uma coisa não está certa. - ela virou o rosto em minha direção novamente aos poucos, com a testa franzida e o olhar confuso. Ela se sentou rapidamente, e claro, fiz o mesmo. Alguma coisa estava acontecendo.
- O que foi? Você está com dor? É a bebê?
- Eu tô morrendo de vontade de comer chocolate branco! - ela bufou frustrada, jogando a cabeça pra trás. Minha boca se abriu diversas vezes, mas nada saía. Aquilo só podia ser brincadeira! Adverti a garota com o olhar, que deu um sorriso sem jeito - Sério, eu posso até sentir o cheiro! - ela fechou os olhos e inspirou, tentando me fazer entrar naquela loucura.
Grávidas...
- Mas , você odeia chocolate branco. - passei a mão pelos cabelos, confuso. Ok, grávidas tem desejos malucos, mas querer comer o que elas odeiam e abominam como faz com chocolate branco?! Isso é loucura. puxou meu rosto com delicadeza, me fazendo observar seu biquinho se formando, assim como um olhar pidão. Droga. O amor te deixa como um cachorrinho obediente - Ok, eu já volto.
- Eu vou junto! - ela me acompanhou, pulando da cama com animação.
- Não vai não. Pode deitar e descansar! - falei autoritário, apontando para a cama. Minha namorada se emburrou e tentou contestar, mas antes mesmo dela terminar sua frase eu repeti a mesma coisa. Ela precisava descansar mesmo!
O novo CD do One Republic começou a tocar assim que liguei o carro. Pois é, eu basicamente me rendi depois de ter ido ao show dos caras, eles são fodas! O vento fresco batia em meu rosto enquanto dirigia tranquilamente. Claro que estava torcendo para que eu chegasse logo, mas acontece que as ruas vazias, boa música e um bom momento te faz refletir muito. É difícil digerir a notícia da gravidez de uma mulher. Você não sabe se precisa comemorar ou de um emprego pra dar conta dos gastos que virão, por isso, vou contar como foi a jornada até aqui.
ficou um pouco estranha. Vômito pra lá e pra cá o dia todo. Ela também engordou, mas tenho amor a minha vida e não abri minha boca sobre isso. Fui proibido por todos, inclusive pela minha mãe, sobre comentar sobre o excesso de calorias que ela está ingerindo. Poxa, é a minha filha que come muito, então tudo bem.
Eu entendo perfeitamente que ela está fazendo um grande trabalho, mesmo que aparentemente não esteja fazendo nada. Dentro da sua barriga está se formando a nossa filha. Os pezinhos, a cabeça, rins, e orelhinhas, e isso, é muito importante.
também vive se descontrolando um pouco por causa dos hormônios. Agora, eu sei que quando ela fica chorona, não é por minha causa. Ou talvez às vezes seja... bem, eu tento fazer meu melhor e não irritá-la, por mais que seja bem engraçado as vezes. O temperamento dela oscila entre um filhotinho de gato e um leão faminto.
A barriga já está bem grande, e a cada dia que passa minha fixa cai mais e mais. Em 4 meses teremos nossa garotinha nos braços! Isso já me provocou inúmeros mistos de sensações. Por um lado, já começou a pesar a responsabilidade de ser pai, e isso me deixa com um pouco de medo. Por outro, eu mal posso esperar. Isso foi tudo o que eu sempre quis mesmo sem saber que queria. O de anos atrás pensaria que um bebê precisa apenas de fraldas, mas agora eu sei que precisa de muito mais, e é isso o que minha filha vai ter.
Continuando...
Sei que, no fundo, só quer se sentir segura. Não é tão simples gerar um bebê, eu pesquisei sobre exatamente tudo. Dá um sono danado, uma azia do cão, além de outros mil incômodos. Também sei que, minha namorada é foda. Incrível. Espetacular. E tenho certeza que minha filha vai ser como a mãe.

***


- E cara, essa noite eu tive que sair de madrugada atrás de um chocolate branco pra . Chocolate branco! - dei ênfase nas duas últimas palavras e arregalou os olhos. Justamente a reação que eu esperava.
- Mas ela odeia chocolate branco!
- Exatamente! Gravidez é uma coisa louca! - fechei meu armário do vestiário, já trocado, indo em direção à saída com , que estava ouvindo meus updates das loucuras de grávida de .
- Ei! - a voz de nos chamou atenção. O rapaz veio correndo em nossa direção junto com - Vocês nem esperam mais os parceiros! - ele usou aquele tom de falsa decepção. Um clássico.
- Desculpa, mas eu vou ser pai e tenho muita coisa pra pensar. - dei os ombros de maneira inocente.
- já está quase com 6 meses de gestação e eu ainda não consigo acreditar nisso. É surreal! Vamos ter uma molequinha entre nós, vai ser tipo um chaveirinho! - a empolgação de era incrível. Ele era, de longe, o mais feliz com a ideia, até mesmo mais feliz que .
- Às vezes eu acordo e acho que tudo isso é um sonho, e aí eu me toco e vejo que eu sou um filho da puta sortudo demais! Eu tenho uma namorada incrível, uma filha, e amigos do caralho! - me manifestei emotivo. Sim, emotivo. Sabe quando você quer parar o momento? Então. Nada no mundo se comparava a sensação de ter eles comigo, os meus verdadeiros amigos!
- E também um irmão bonito pra cacete! - Jackson anunciou sua presença com um tom de voz convencido, se enfiando na nossa rodinha.
- , você teve que crescer com os murros da vida, e sabemos que isso doeu, embora tenha sido necessário. Você mereceu tudo isso que você tem agora! - arqueou as sobrancelhas, me olhando um tanto quanto... orgulhoso?! Acho que é essa a palavra. Ele dizia como se aquilo fosse algo óbvio, e as cabeças presentes ali assentindo foram a minha confirmação. Eu merecia de verdade.
Todo esforço tem seu retorno.
Senti os braços de tentando me abraçar por trás, tendo um certo impedimento por causa da barriga. Agradeci as palavras ditas pra mim com um sorriso, me despedindo logo em seguida. Eu e minha namorada tínhamos coisas a fazer.
Bem... na verdade, não a gente, e sim, Dan. Estava tudo pronto para ele encerrar esse capítulo da sua vida, e ele queria conversar conosco antes de finalizar toda aquela mudança, afinal, sua decisão foi tomada após o ocorrido com .
I See Fire, do Ed Sheeran começou a tocar. O olhar sapeca de a denunciava. Ela tinha colocado a música. Não contestei, até gostei. Aquele som me fez pensar e pensar... Algumas pessoas vão te machucar por aquilo que elas são. Passei boa parte da minha vida tentando entender o que eu e minha mãe fizemos de errado para que Richard nos odiasse tanto, mas a verdade é que nunca fizemos nada. O problema de Richard sempre foi ele mesmo. O problema em nunca conseguir um emprego tão bom quanto o de Cooper e conseguir levar uma vida sem preocupações com dinheiro. Richard se deixou dominar pela ganância e esqueceu o que realmente importa nessa vida. Engraçado, né?! Eu estava me tornando a mesma coisa, mas graças ao universo, que conspirou a meu favor, tive tempo de consertar meus erros.
Estacionei o carro, observando de longe Cooper, Jimmy e Noah em frente à porta de Dan, provavelmente se despedindo. Retirei meu cinto, pronto para fazer o mesmo por , mas ela foi mais rápida. Minha namorada tirou o cinto de segurança com pressa, se abaixando as pressas como se estivesse se escondendo de algo. Seu olhar assustado me fez sentir um leve desespero no mesmo instante. Observei ao nosso redor. Nada. Não tinha nada ameaçador.
- , o que houve? - perguntei confuso, intercalando meu olhar entre ela e os quatro homens que ainda conversavam tranquilamente, sem nem notar minha presença ali, já que o carro de Cooper estava exatamente em frente à sua casa, me obrigando a estacionar atrás.
- ... é ele!!! - ela respondeu com certa dificuldade, ainda abaixada, extremamente desconfortável, porém mais assustada do que tudo.
- Amor, é ele quem? Do que você está falando? - franzi a testa, mais confuso do que estava, olhando novamente em volta, só que com mais calma, tentando de qualquer jeito achar qualquer pessoa que parecesse suspeita o bastante a ponto de atormentar minha namorada daquela maneira. Nada.
- Aquele homem alto, de cabelo preto e de olhos azuis! No dia em que eu descobri o sexo do bebê um rapaz me parou na rua para perguntar as horas, e eu respondi. Logo após o carro de Richard parou em frente, e o mesmo rapaz me enfiou ali dentro e entrou no banco do passageiro. É ele, eu tenho certeza absoluta! Esse cara ajudou o Richard! - sussurrou aflita, visivelmente com o medo maior do que eu imaginava. Olhei pra frente rapidamente. Noah. Meu coração parou por alguns segundos.
não confundiria uma pessoa que ajudou Richard a fazer mais uma de suas ameaças, mas... Noah?!
Minha namorada estava em um nível de pânico que me fazia querer sair daquele carro e esmagar Noah, mas ao invés disso, apenas peguei em sua mão e tentei passar o máximo de confiança que podia.
Ficamos na frente da casa de Dan até Cooper, Noah e Jimmy irem embora. O nervosismo de me corroeu a cada instante, e não tinha como ela estar mentindo, e Dan precisava saber o mais rápido possível.
Ela saiu do carro com certa dificuldade por conta do nervosismo, mas conseguimos. Batemos na porta como pessoas civilizadas, fomos atendidos com aquele olhar marrento e ao mesmo tempo alegre de Dan, mas nossas expressões não estavam nada alegres... Ele percebeu. Sempre percebe. Entramos. Contamos a situação.
Oh, os problemas... Eles insistem em nos perseguir.
- Você tem certeza absoluta? Porque isso é extremamente sério, ! Cooper vai enlouquecer quando souber disso! - Dan perguntou pela milésima vez, num nível de aflição tão grande que a qualquer momento ele surtaria de vez de tanto nervosismo pela revelação que minha namorada tinha acabado de fazer.
- É ele, eu sei que é! - ela confirmou novamente com toda a certeza do mundo. Botei meus neurônios para funcionar. Como aquilo podia ser possível? Como Noah, e provavelmente Jimmy também, podiam estar ao lado de Richard?
Vamos lá, cérebro, pense!
- É ISSO! - gritei exclamativo, chamando a atenção dos dois para mim, que me encaravam confusos, esperando uma explicação - Richard roubou tudo de Dan através de Noah e Jimmy! Eles são o braço direito de Cooper e sabiam de tudo desde sempre, então por isso Richard conseguiu roubar tudo tão facilmente sem deixar suspeitas!
- , isso é muito sério! Não temos certeza de nada e... - Dan respirou fundo, e pela sua cara, estava perdido em todo o meu raciocínio - Isso pode ser verdade, até porque faz um puta sentido. Merda! - grunhiu raivoso, ligando todos os pontos e concluindo que aquilo tinha uma grande possibilidade de ser verdade.
- Richard não imaginou que eu fosse rever Noah novamente, mas ainda assim, acho que ele não arriscaria isso. Se ele permitiu que isso acontecesse, significa que ele não se importa que descubram sobre Noah porque... porque talvez ele esteja planejando coisas piores contra vocês, junto a Noah e Jimmy.
- Espera aí, tem razão! - Dan ergueu o dedo em riste, pensativo, andando de um lado para o outro - Richard queria que eu entregasse tudo isso aqui pra quando ele me matasse, não ter problemas com qualquer outra pessoa que me conheça e queira se vingar. O plano dele é conseguir todo o meu território e me matar, e provavelmente matar Cooper também! - seus olhos se arregalaram, mas logo todo aquele choque foi cessando, e o sorriso em seu rosto se formando. Dan já estava pensando em um plano.
- Eu acho bom você, , não se meter nessa confusão novamente, porque eu não estou disposta a criar nossa filha sozinha, está me ouvindo bem? - a voz autoritária e nervosa de , junto a uma cara feia quase me fez rir. Era um momento extremamente sério, mas ela conseguia ser fofa até quando tentava ser brava.
Não demorou para nos despedirmos, afinal, todo aquele assunto estava deixando mais nervosa a cada segundo, e ela não podia se estressar. Dan ficou com a tarefa de contar toda a nossa descoberta para Cooper, dizendo que me manteria informado.
Entramos em casa, que estava vazia, já que Marie havia conseguido um emprego novo há alguns dias. marchou até o quarto da nossa filha, onde se jogou na poltrona. Ela também passou a ficar mais tempo ali dentro, muitas vezes pra pensar, pra ler, pra chorar, pra comer, e provavelmente pra imaginar como as coisas vão mudar.
- Ei, eu não vou me envolver nessa loucura novamente, eu juro! - me encostei na porta, observando minha namorada com a cara fechada, balançando na poltrona e segurando um ursinho rosa.
- , acabar com o seu pai foi o que você sempre quis. Uma parte de você sempre vai querer ir lá e fazer justiça com as próprias mãos e não tem nada que eu possa fazer pra impedir. - sua voz embargada me fez correr em sua direção, abaixando e ficando em sua frente, limpando aquelas lágrimas que não eram de alegria, coisa que eu odiava.
- Eu juro que não vou me envolver nisso, ok? Não vou mesmo! Você não vai criar nossa filha sozinha! - passei meu polegar pelo seu rosto, tirando as lágrimas que insistiam em cair.
- Ela está chutando. - fungou, tentando se controlar, mas chorou ainda mais. Já não era mais pelo nervosismo, e sim, pelos hormônios. Coloquei minhas mãos em sua barriga, sentindo a nossa garotinha chutando, e muito, como se quisesse chamar atenção.
- Acho que ela quer o pai por perto também. - abri um sorriso largo, todo bobo, sentindo os chutinhos que me confirmavam que amor existe, e consegue ser mais incrível do eu jamais pude imaginar - Espera um pouquinho. - me levantei com pressa, pegando o fone de ouvido que estava em nosso quarto, os encaixando na barriga de , junto ao iPod, tocando nada mais, nada menos, que Gavin DeGraw - Acho que ela tem que se acostumar com música boa.
- Você vai ser um ótimo pai, sabia? - sorriu, com aquele brilho nos olhos que poderiam iluminar a cidade inteira.
- Nós vamos ser ótimos pais! Isso é um tanto quanto assustador, mas essa pequenininha vai ser muito amada, e eu tenho certeza que ela vai nascer linda de morrer!
- Eu amo você, , e eu amo essa criaturinha que está crescendo aqui. - as mãos de se juntaram com as minhas, ainda em cima de sua barriga.
Felicidade. Amor. Família.
Não tem vingança no planeta que me faça mais feliz do que isso.
's POV end

Jackson's POV
Amar sempre esteve fora de cogitação. Qual é, a maioria dos caras com 18 anos só querem saber de festas e mulheres. Típico. Sei disso porque eu era um desses há meses atrás, até tudo mudar. Digamos que a minha incrível vida nunca foi tão perfeita como todos imaginavam. Meu pai nunca foi tão presente, e minha mãe, sempre ocupada. Eu sempre tive muita liberdade, e por um lado isso foi ótimo, mas por outro, teve aquele incomodo no fim do dia, aquela solidão, aquela sensação de mesmo tendo centenas de contatos no celular, não eram pessoas ideais para se ligar no meio da noite caso eu estivesse com algum problema.
E então tudo mudou.
Tirar sarro de sempre foi um dos meus passatempos favoritos, e me fazia rir ver ele se enturmando com pessoas que eu julgava de uma maneira terrível. Mas agora, sendo completamente honesto, eu perdia alguns minutos observando aquele grupo de amigos. Amigos de verdade, dava pra perceber de longe. Eles construíram um mundinho só deles, e sinceramente... é um mundinho incrível, que agora, eu sou incrivelmente honrado de fazer parte.
Muitos dos meus antigos "amigos" ficaram extremamente bravos com a minha mudança tão repentina, principalmente por abandonar os rachas. Amigos que cresceram comigo, mas que apenas estavam ao meu lado por causa da porcaria da popularidade. Uma vida imensamente fútil, e doía, mas ninguém sabia. Mas a vida é assim, né? A gente quebra a cara, e da pior forma possível. Mas também tem as coisas boas! E como tem... Sou abençoado por ter aberto meus olhos para enxergar que há a essência do bem implantada nas pessoas. Claro, também me frustra saber que nessas voltas que o mundo deu, meus antigos "amigos" continuam perdidos, dando importante apenas a coisas materiais.
Às vezes é sufocante essa confusão constante. A morte da minha mãe e toda essa loucura com . Como posso sentir tanto? Como é que essa coisa toda funciona? Chega a ser engraçado. Zombei tanto de , e olhe só onde estou agora. Tantos lugares por aí e aparece justamente na minha escola, lugar que sempre julguei não ter ninguém interessante.
- Olá mocinho! - a voz de me acordou daquele pensamento que me acompanhava há alguns minutos. Saímos da sala juntos, em direção ao pátio para o intervalo.
- Olá mãe da minha sobrinha. Afinal, quando é que você vai dar um nome pra essa menina? - cerrei os olhos, realmente curioso.
- Eu ainda não sei. Quero um nome legal, bonito e incrível pra minha filha, e pra isso é preciso muito tempo e muita pesquisa.
- Está tudo bem? - franzi a testa, observando seu semblante numa mistura de incomodo e dor.
- Fora a dor nas costas, os enjoos, o sono, os seios doloridos e os pés inchados, está tudo bem sim. Tudo ótimo! - ela tentou deixar o tom irônico dominar, mas sua exaustão a impediu. estava morrendo de sono, e dava pra se notar de longe.
- Esse é o seu milagre, ! - passei a mão em sua barriga, fazendo um carinho rápido apenas para dizer um alô para minha sobrinha, que por sinal, eu estava morrendo de ansiedade pra conhecer.
- Eu sei, e é incrível. - ela sorriu orgulhosa, se permitindo respirar fundo e jogar a cabeça pra trás, voltando a me encarar de modo sapeca depois de alguns instantes - E você e , como estão? Eu já sei de tudo!
- Estamos indo devagar, sem pressa. Passos de bebê. - me permiti a fazer tal piadinha, que mesmo sendo péssima, arrancou uma risadinha rápida da minha cunhada.
- Espero que você não faça essas piadas com ela, mas vamos lá, me conte como você está se sentindo! - ela quase deu pulinhos de tanta ansiedade, junto com toda aquela animação que eu nem mesmo entendia. O melhor era abrir o jogo de uma vez, afinal, mexer com uma grávida não é recomendável.
- Ah, eu gosto um pouco dela.
- Um pouco? - levantou uma sobrancelha, claramente não convencida com a minha resposta. Rolei os olhos, enquanto ela abria um grande sorriso, já sabendo que a verdade estava por vir.
-, é desse "um pouco" que eu tenho medo.
- Quando se gosta de uma pessoa, é impossível ser lógico com relação a ela. Eu entendo seu medo. O amor é assim mesmo, te faz sentir todas as sensações possíveis e imagináveis, mas por favor, de coração, não deixe que isso impeça o amor de florescer e existir em sua vida. - praticamente implorou, com a voz tão calminha e convicta sobre o assunto, que chegava a ser algo lindo de se ver e de se ouvir. Ela com certeza sabia muito bem do assunto.
Então ela apareceu, andando rapidamente em nossa direção, provavelmente se sentindo aliviada por nos achar ali. A preocupação é algo predominante em cada um dali. Não se podia nem demorar alguns minutos para se encontrar com todos no intervalo, que já vinha alguém te puxar pra lá, e bem, pode me puxar pra qualquer canto que ela quiser. Antes mesmo dela se aproximar totalmente, lancei um olhar significativo pra , indo em direção a , que diminuiu o passo.
- Posso te pegar as nove? - me permiti em encostar uma de minhas mãos em sua cintura, a trazendo pra mais perto, deixando a garota visivelmente sem graça, porém satisfeita com a minha atitude. Ela assentiu sem pensar muito, mordendo os lábios, numa tentativa muito bem sucedida em me provocar.

Comida japonesa e o terraço da Skinder Empire. Só precisei disso pra impressionar , que sorria lindamente a cada cinco segundos.
- Acho que nunca vou querer ir embora de Charlotte. Sério, esse lugar é incrível! - ela exclamou com a boca cheia, a tapando rapidamente, com os olhos arregalados, impressionada com a falta de atenção com seu comportamento. Eu não ligava. Ela continuava linda.
- É isso que você sente quando está no seu lar, certo? Você nunca quer ir embora.
- Exato! Eu tenho tudo aqui, absolutamente tudo! - ela fechou os olhos, sentindo o vento gelado bater em seu rosto.
- e vão ter um bebê. Dá pra acreditar nisso? - mudei de assunto, e aquilo claramente era um dos seus assuntos preferidos já que seus olhos se arregalaram em animação. se ajeitou em sua cadeira, ficando completamente virada para mim.
- Depois de descobrir que você e são irmãos, eu acredito em tudo! - ela tentou segurar a risada, mas não conseguiu. Rolei os olhos, não resistindo e rindo também. Era o tipo de coisa que eu ouvia toda semana.
- Eles conseguiram. Mesmo com todas as diferenças e confusões, eles conseguiram, e olha que eu jurava que nunca iria namorar sério, muito menos formar uma família! - nossas risadas foram cessando após a seriedade presente em minha voz, e assim, nossos olhares se encontraram num perfeito conflito. Tínhamos coisas a dizer, mas um estava esperando o outro começar, e por sorte, tomou a iniciativa. Não que eu estivesse com medo demais para falar, mas é que ouvi-la era um privilégio.
- Eu tenho vontade de entrar na sua vida de vez, de compartilhar meus pensamentos, de poder saber das suas opiniões sobre o mundo, de sair pra tomar um sorvete, ou simplesmente desfrutar da sua companhia num silêncio cheio de intenções. É engraçado sentir isso, porque é algo novo pra nós dois, mas não podemos dar um passo maior que a perna. e estão juntos agora, mas rolou tanta confusão, tanta briga e tanta loucura antes disso tudo acontecer, e a última coisa que eu quero é passar por todo o sofrimento que eles passaram. - ela respirou aliviada, jogando o cabelo gigante para trás e ficou, como se estivesse juntando forças pra ouvir minha resposta. Ela voltou ergueu o rosto lentamente, com o olhar mais adorável do planeta inteiro.
- Algumas questões são absurdamente inquestionáveis, como a estranheza de gostar de alguém. Estamos cansados de saber que o amor é o melhor remédio, mas que também pode ser o motivo de adoecimentos psicológicos, então tudo bem, eu estou feliz em pelo menos estarmos tentando. - abri meu melhor sorriso, ela merecia. Foi a minha vez de respirar aliviado. A melhor parte de tudo era poder conversar numa boa, sem esconder nada. Gostar de vale a pena, e muito.
Ela levantou, colocando seu prato na mesa e erguendo a mão para que eu me levantasse também e a pegasse, e assim o fiz. Foram alguns segundos em silêncio, apenas observando aquela puta vista incrível que o terraço nos proporcionava. Seus olhos foram de encontro aos meus, e só aquilo foi o suficiente pra me fazer encostar nossos lábios, num beijo calmo e lento. Seu gosto, seus movimentos, seu toque. Tudo nela era incrivelmente encantador.
Agora eu entendo perfeitamente quando diz que tem sorte de ter uma garota incrível ao seu lado, porque agora, eu também tenho. Ou terei. Não importa. já é minha. Não estou tomando como garantido, e sim, porque sei que é. Somos pra ser.
- Não é estranho? - sussurrou entre o beijo, com os olhos presos aos meus.
- O que? Nós dois? - questionei confuso, tentando achar a resposta em seu olhar.
- Não! Nos beijarmos depois de termos comido um monte de coisa crua. - ela respondeu num tom sério, realmente pensativa. Eu não me aguentei, tive que rir, e alto. Se existir alguém nesse mundo que consiga ser tão esperta, inocente, brincalhona e sexy quanto , não me apresente, pois não quero saber. Ela é única, e se prova uma pessoa incrível a cada momento, mesmo quando não está se esforçando para isso.
É, eu também sou sortudo pra caramba.
Ficamos ali por um bom tempo, mas infelizmente tivemos que voltar para nossas devidas casas. Estava tudo ainda intacto. Nada da minha mãe foi tirado de casa, e nem eu e nem meu pai tocávamos no assunto. Ele passou a ficar mais tempo no trabalho enquanto eu passei a ficar mais tempo com qualquer pessoa que me distraísse, e claro, minha pessoa favorita era . Minha mãe estaria tão orgulhosa de me ver assim.
- Ei molecão, levou a namoradinha pro terraço de novo, não foi? - a porta foi aberta, com meu pai e seu olhar sacana, que me fez rir mais do que deveria. Claro que ele saberia sobre aquilo, e claro que também não perderia a oportunidade de deixar claro que sabia.
- Ela gosta de lá, vou fazer o que, né? - dei os ombros, com um tom inocente que dessa vez o fez rir.
- Estou feliz por ver você com pessoas que realmente te levam pra frente. Sei que não tenho muita moral pra falar sobre isso, já que nunca acompanhei sua vida tão de perto quanto deveria, mas essa sua mudança é tão nítida que não tem como não comentar. Estou orgulhoso de você, filho! - ele falava enquanto tirava a gravata que sempre o incomodava. Aquelas palavras foram como música para os meus ouvidos, por mais estranho que fosse de se ouvir. Eu e meu pai sempre fomos abertos para qualquer tipo de conversa, sempre nos divertimos quando podíamos, mas esse tipo de comentário é algo bem... novo. Ele notar meu comportamento me deixou um tanto quanto feliz.
- Mamãe estaria orgulhosa disso, né? - abaixei a cabeça por alguns segundos, a levantando esperançoso. Falar dela ainda me causava um peso indescritível, mas ao mesmo tempo, uma força completamente estranha.
- Não só estaria, como está! Sua mãe ainda está aqui, meu filho, só não em carne e osso.
- Eu sinto saudade dela. - as palavras custaram a sair, com um nó formado em minha garganta.
- Eu também. - meu pai me observou analítico, tendo certeza que aquilo estava me causando coisas que não eram legais de se sentir - O que você acha de sairmos um dia desse pra fazermos algo legal? Inclusive, quando é o seu próximo jogo? Quero ver meu molecão jogando! - ele finalizou animado, desconversando totalmente.
- Pai, você não precisa fazer essas coisas só porque ela morreu. - rolei os olhos, incomodado em como a dó faz as pessoas se disponibilizarem a fazer coisas que raramente fazem. Qual é, eu não preciso de dó, principalmente do meu próprio pai.
- Jackson, sua mãe morreu, mas eu não. Só temos um ao outro, e agora, mais do que nunca, eu preciso agir como pai. Você não está sozinho, e nunca vai estar! - suas palavras vieram com uma sinceridade arrebatadora, coisa que nunca vi antes nesses meus dezoito anos na terra. Meu pai realmente estava disponível pra mim, mas agora, por vontade própria.
Isso pode ser considerado sorte? Porque se puder, eu estou cheio dela!
Jackson's POV end

- Você tem certeza que não quer ir? - perguntei esperançosa, por mais que Elena já tivesse dito milhões de vezes que não poderia ir ao jogo.
- Eu já marquei de sair com sua mãe, . Mas quando der, eu juro que vou! - ela respondeu simpática, sem perder a paciência com a minha insistência.
- Como a bebê foi parar aí dentro? - Sophia tombou a cabeça pro lado, com uma carinha confusa e curiosa. Arregalei os olhos, procurando ajuda no olhar de , que apenas riu e deu os ombros. Elena gargalhou alto, também dando os ombros, esperando pela minha resposta. Que família, não?!
- Ah... ela... bem... eu acordei e ela já estava aqui dentro. Foi tipo um presente! - tentei ser o mais convincente possível, mas pela cara da garotinha, não tinha funcionado.
- Me fala a verdade! - Sophia cruzou os braços, com as sobrancelhas levantadas. Como é possível uma criança ser tão esperta?
- Ah, Soph... - supliquei com o olhar para que , que ainda estava rindo, para que me tirasse daquela saia justa que aquela criaturinha me colocou.
- Um dia você vai descobrir. Precisamos ir. - engoliu sua risada e respondeu sério, dando um ponto final na conversa, já puxando minha mão para fora dali.
- E se um dia a nossa filha perguntar isso? O que vamos dizer? - questionei um pouco desesperada, já pensando no quão complicado seria explicar todas as coisas que acontecem na vida para ela.
- A gente fala a verdade, ué. Ela vai descobrir de um jeito ou de outro. - ele respondeu sem nenhuma preocupação, abrindo a porta do carro para que eu entrasse.
Não demorou em chegarmos à escola, onde nos dirigimos diretamente para o ônibus. Eu não iria participar da torcida, mas eu ainda fazia parte da equipe, o que me dava o direito de andar naquele ônibus do mesmo jeito. E bem, o motivo de não participar? Simples: sono, enjoo e cansaço. Não conseguiria gravar a nova coreografia nem se quisesse.
- Oi moça que carrega um mamão debaixo da blusa! - se sentou ao meu lado, junto a um novo apelido, coisa que havia se tornado normal conforme a barriga crescia. Com três meses de gravidez ele dizia que eu carregava uma pera dentro da barriga, que é exatamente o tamanho do bebê com três meses. Se ele andou pesquisando sobre isso? Com certeza, mas ele nunca admitiria.
- Se eu te falar o nome que eu decidi pra bebê, você para de compará-la com uma fruta? - virei meu rosto para encará-lo, observando seu sorriso animado se formando.
- Me conta!
- Eu pensei em Claire, mas ainda não falei pro . O que você acha?
- Claire é lindo! Oi, mamão Claire! - a mão dele foi para a minha barriga, fazendo um carinho gostoso.
- ! - chamei sua atenção, segurando o riso para manter a seriedade.
- Ok, ok, só Claire. Como você está se sentindo?
- Ansiosa. É uma coisa tão louca! É um bebê que está aqui dentro, o meu bebê! Eu nunca pensei que pudesse ficar tão feliz assim! - o sorriso se formou em meu rosto da maneira mais natural do mundo. Falar sobre a minha bebê fazia meu coração acelerar, a ansiedade aumentar, assim como o amor. Não tem sentimento igual!
- São 9 meses de espera, mais de 270 dias de ansiedade, 6480 horas de expectativas pra conhecer a pessoa mais importante da sua vida. Deve ser uma coisa louca mesmo! - eu podia jurar que minha boca estava no chão de tão impressionada. Claro, eu estava ansiosa pra conhecer minha filha, mas não fazia ideia de todos os dias e horas que levava para isso. deu os ombros, como se aquilo não fosse grande coisa. Sua resposta foi incrivelmente natural, o que me levava a ter certeza que aquela conta toda foi feita no mesmo instante - O que foi? Você sabe que eu sou bom de matemática. - ele respondeu convencido, junto a uma piscadinha. Esse garoto não tem jeito... ainda bem!
- Da pra acreditar em tudo isso? Eu grávida, mudou, e Jackson praticamente juntos... parece um sonho! - exclamei extasiada pelo tanto de emoção que me atingiu, da maneira mais gostosa, claro.
- Vocês todos felizes enquanto eu e estamos na merda. Você acha isso um sonho? - ele forçou a voz num tom de extrema indignação, com um olhar sério. Gargalhei alto, mas meus risos se cessaram com aquela sensação que vivia me perseguindo. franziu a testa, estranhando a minha mudança repentina - O que foi?
- Eu preciso de um milkshake de morango. Sério!
- Mulher, não vem com essas loucuras de grávida pra cima de mim não. É cada uma, viu... Daqui a pouco tá querendo comer até cimento! - embora a vontade de tomar o milkshake fosse grande, me acabar de rir foi inevitável. Desconheço uma pessoa mais divertida do que .
O ônibus parou, anunciando a chegada. Jackson teve uma surpresa e tanto ao descer do ônibus. Cooper estava ali. Aquele momento foi imensamente adorável, e foi como um combustível para a minha ansiedade. Mal podia esperar para ver com a nossa garotinha daquele jeito.
Desejei boa sorte para todos, caminhando até a quadra para achar um lugar decente, e olhe só, Cooper estava me acompanhando. Conseguimos lugares na segunda fileira da arquibancada, nos dando perfeita visão de tudo ali.
Ravens x Jets.
- Acho que tenho que te agradecer, . - Cooper limpou a garganta antes de finalmente abrir a boca, mas aquela frase havia me deixado um tanto quanto confusa.
- Agradecer pelo o quê?
- Por ter dito tudo aquilo sobre Noah. Agora sei de tudo o que preciso fazer, graças a você. - aquilo quase me fez sorrir, mas aquele olhar triunfante não me agradava muito. Aquela idéia, em geral, não me agradava. Richard era um mostro, e tinha o poder de despertar o pior lado nas pessoas.
- Desde que não seja envolvido nesse meio, tudo bem por mim. Mas agora me responda uma coisinha: o que você vai fazer com Richard?
- Eu quero fazer tanta coisa com aquele homem que você não tem noção. Quero que ele pague por cada merda que ele fez com todos nós. - Cooper respondeu raivoso, apertando os olhos com força, como se estivesse lembrando de cada barbaridade que Richard já tinha feito em nossas vidas.
- Você já parou pra pensar que além de todas as coisas ruins que ele já fez, ele também fez com que você se tornasse alguém...hmm...é... alguém diferente? É isso o que Richard faz, ele transforma as pessoas, e não digo isso no bom sentido. Toda essa raiva que você sente te deixa cego e te faz até esquecer que qualquer besteira que você faça, também pode te prejudicar, e caso tenha esquecido, você ainda tem um filho. - talvez o meu discurso tenha sido um pouco rude, mas foi inteiramente sincero. Cooper estava com os olhos minimamente arregalados, e sua boca se abriu varias vezes, mas nada saiu. Era como se eu estivesse vendo a mesma história se repetindo novamente, até porque era exatamente assim. Era.
- Jackson não pode saber de nada disso, tudo bem? - foi a única coisa que saiu de sua boca, e nem a coragem de me olhar ele teve. Parece que alguém ficou atingido.
- Eu vou ser bem sincera, guardar segredos nunca é uma boa ideia, então te recomendo a contar a verdade para ele uma hora antes que tudo vire um desastre. - dessa vez, seu pescoço se virou aos poucos, me encarando quase que de maneira assustadora. Me encolhi, e foi aí que Cooper riu. E alto. Eu estava jogando as verdades em sua cara e ele estava rindo?
- Quantos anos você tem, garota? - seu bom humor predominou, e Deus... homens são malucos mesmo!
- Tenho dezessete.
- Você vai ser uma mãe e tanto! - e foi aí que eu sorri. Cooper ficou incomodado com todas as verdades ditas, mas ele sabia que eu tinha razão. Todos os acontecimentos ajudaram a formar a mulher que estou me tornando aos poucos, e honestamente, eu não podia estar mais contente com tal coisa. Aprender e descobrir a cada dia que passa é um privilégio inexplicável, e talvez Cooper também consiga desfrutar dessa beleza antes que seja tarde demais. Talvez ele consiga aprender a reviver sem ter que se preocupar com Richard.

***


- Soph, o que você acha sobre a bebê se chamar Claire? - questionei curiosa, e a pequena arregalou os olhos animada, abrindo um grande sorriso.
- É um nome muito bonito, mas que tal ela se chamar Sophia? - ela sugeriu animada, crente que aquela ideia funcionária.
- Sua espertinha! Ela não pode ter o mesmo nome que o seu. Agora, já pra sua cama, mocinha! - disse autoritário, ajudando a irmã a se desenrolar do grande cobertor que a envolvia. Sophia estava no meio de nós em nossa cama, coisa que estava ficando frequente. Ela nos divertia de maneira única. Cada história que ela contava nos fazia rir até chorar. Sophia já tinha uma personalidade incrivelmente forte, e isso nos orgulhava a cada dia. Ela nos encheu de beijos antes de pular da cama, andando toda desengonçada para fora do quarto, batendo a porta com força, mesmo sabendo que não era necessária tanta força para fechá-la.
- Você gostou mesmo de Claire? Podemos mudar se você quiser! - mordi o lábio aflita, ainda incerta e insegura sobre a opinião de . - Gostei, amor. É lindo!
- Que loucura, né? Estamos aqui juntos, depois de todos esses meses e com um bebê. As coisas aconteceram tão rápido, mas aconteceram do melhor jeito. Isso tudo é muito mais do que eu imaginei, . Você é meu tudo e mais um pouco. Obrigada! - as lágrimas se fizeram presentes, e eu nem mesmo tentei impedir que elas caíssem. Os hormônios contribuíram para o meu momento, mas o choro de alegria tem que ser chorado mesmo. Os agradecimentos têm que ser feitos, e o reconhecimento também. A minha vida é incrível, e agora posso dizer isso com a boca cheia.
- Obrigada por ser ter sido a luz no meu mundo que era uma completa escuridão. - seus lábios tocaram os meus, num beijo mágico, que podia até me tirar do chão. Isso é a força do amor.
Estávamos prontos para dormir, até o celular de fazer barulho, indicando uma nova mensagem. Ele o pegou, lendo aquilo com uma expressão indecifrável.
- O que foi?
- Cooper está com Noah e Jimmy nesse instante. - ele respondeu indiferente, ou pelo menos, tentou. Uma parte dele ainda se animava com todo o andamento do desenrolar daquela história completamente exaustiva.
- E o que isso significa? - tentei prolongar o assunto para ver até onde ele ia.
- Significa porrada, raiva pela traição, sangue e ameaças. Nada agradável. Agora, boa noite pra vocês duas. - ele me deu um selinho demorado junto com um sorriso simpático. O antigo provavelmente sairia louco dali no mesmo instante para estar lá acompanhando tudo de perto, mas o novo , mesmo ainda tendo um pouco de vontade dentro de si em acompanhar tudo aquilo, tinha conseguido criar seu limite em relação a tal assunto, colocando definitivamente um ponto final aquilo tudo, e eu não podia estar mais orgulhosa.

- Vovô, vem brincar comigo! - aquele tom de voz pidão era capaz de tudo. Meu pai não resistiu, e mesmo inacabado, ele deixou toda a montagem da decoração da mesa de lado para brincar com a pequenininha.
A risada mais gostosa e contagiante do mundo era a dela. Aquele rostinho angelical ainda fazia meu coração palpitar da mesma maneira que palpitou quando vi seu rosto pela primeira vez. Vê-la crescer é melhor do que ter todo o dinheiro, luxo e qualquer outra coisa desse mundo.
3 anos. Há 3 anos minha vida mudou completamente, desde o dia em que ouvi seu chorinho, até agora. 3 anos de amor, alegria e aprendizado. Eu nunca imaginei que poderia ser tão bom assim.
- Acho que se nós dois sumíssemos ela nem ia se importar. Olha como ela age com Sam! Eles são a dupla perfeita. - comentou sorridente, também olhando aquele momento lindo entre neta e avô. Meu pai corria atrás dela sem se importar se tinha coisas a fazer ou não. Pra ele, o mundo era só ela. Ok, também tinha um espacinho pra minha mãe, mas um bem pequeno.
- Quem é a garotinha do vô? É você, Hope! - ele a chacoalhava no ar, fazendo minha filha gargalhar cada vez mais alto. O som mais gostoso de se ouvir no mundo inteiro.
- Vocês dois juntos só aprontam, né? - me aproximei da melhor dupla que eu conhecia, recebendo um beijo no rosto da minha filha.
- Vamos brincar, mamãe! - ela pediu animada, e começou a pular assim que o avô a colocou no chão. Ouvir aquela palavra ainda me fazia querer chorar de emoção como se fosse a primeira vez.
"Mamãe".
- Ok, mas só um pouquinho, ok? - não resisti, e quem resistiria? Hope conseguia qualquer coisa de qualquer um - Vou contar até dez e você se esconde. Valendo! - minha filha correu, soltando alguns gritinhos conforme dava seus passos. Meu bebê já sabia fazer tudo. Meu orgulho apenas crescia e crescia.
- Hoje é aniversário dela, mas na verdade nós quem fomos presenteados. - meu pai seguiu Hope com os olhos, dizendo com uma felicidade tão grande, que o sorriso em seu rosto não se desfazia por nada.
- Obrigada por ser esse pai e avô tão incrível que você é. - fiz questão de dizer aquelas palavras olhando em seus olhos para ter certeza de que ele entenderia claramente. Meu pai merecia todo o agradecimento do mundo inteiro, e ainda era pouco para ele. Seu olhar emocionado quase foi capaz de me tirar algumas lágrimas, e logo senti seus braços me envolvendo no abraço mais incrível de todos. O abraço que foi meu lar a vida inteira. O abraço que sempre fez o ruim se tornar bom.
Nada me trás mais alegria do que esses momentos. Não foi fácil, mas nesses 3 anos eu aprendi muita coisa. Ter minha família ao meu lado me ajudou, e muito, principalmente meu pai. Hope sempre foi apaixonada pelo vô, do mesmo jeito que ele sempre foi apaixonado por ela. Meu pai sempre fez de tudo pela neta, assim como fez pela família durante a vida inteira. O relacionamento dos meus pais sempre foi o que eu sonhei em ter, e por sorte, eu tenho.
Eu tenho tudo.
Eu tenho Hope, a garotinha mais incrível que me ensinou o que é amor incondicional. Tenho , que é o homem da minha vida, e também tenho pais incríveis.
Todos os meus sonhos se realizaram, e agora eu nem mesmo tenho o que pedir. Eu realmente tenho tudo.


Levantei ofegante, encarando todos os cantos do quarto para me certificar que nada daquilo era real. Levei algum tempo para controlar minha respiração, sentindo uma espécie de peso junto com uma sensação esquisita, como se algo estivesse querendo chamar minha atenção.
Um chute. Minha filha chutou.
A sensação continuava, assim como os chutinhos incansáveis da minha bebê. Peguei o celular, que indicava 03:31 da manhã.
Hope. O nome que não saía da minha mente. Encostei minhas mãos em minha barriga, fazendo um carinho na intenção de acalmar minha filha, mas nada adiantou.
- Ei, o que foi? Você também teve o mesmo sonho? - sussurrei, recebendo um chute como resposta - Você está agitada por quê? Gostou do nome que você tinha no sonho? - continuei a conversar com meu bebê, que não teve dó nos chutes seguintes.
Meu sorriso se abriu. A conexão entre nós já era tão grande que não era necessário muito raciocínio para entender aquilo.
Hope, a minha filha.
- . - cutuquei meu namorado com certa dó, mas minha felicidade estava grande demais para deixar aquilo para ser dito pela manhã - Acoooorda!
- An, o que foi? - ele resmungou desnorteado, se sentando na cama com certa pressa, procurando o que tinha de errado.
- Desculpa te acordar, mas é que eu tive um sonho com Sam. Eu sonhei que ele era basicamente o pai dos sonhos, e também que nossa filha já estava fazendo 3 aninhos. Isso não importa muito, mas é que ela começou a chutar e chutar, e parece que o nome que ela tinha no sonho, realmente a agradou! - disparei a falar com tremenda animação, e meu namorado tentava acompanhar meu raciocínio energizado.
- E qual era o nome? - ele se forçou a manter os olhos abertos, mantendo a atenção presa a mim.
- Hope!
- Você gostou desse nome, pequenininha? - ele respirou fundo antes de aproximar o rosto da minha barriga, colocando as mãos ali também a espera de uma resposta, que não demorou muito. Nossa filha chutou novamente, e nossos sorrisos se formaram juntos.
A nossa Hope.
A gravidez é transformadora em todos os seus sentidos, desde as várias mudanças que aconteceram no meu corpo até a minha forma de pensar. Sabemos que as estrias, barriga flácida e gordurinha extra pode vir no pacote, mas sabe o que é mais interessante? Nada disso importa. Não pra mim. A cada dia eu vejo que o amor que eu sinto pela minha filha se multiplica, e que a minha pequena família não podia ser mais incrível. Eu tenho , tenho minha mãe, meus tios e meus amigos. No sonho, Sam era perfeito, mas a realidade é outra, e pra ser bem sincera, eu gosto disso. Claro que ter um pai seria incrível, mas eu aceitei o que eu tenho, e não podia ser melhor do que é. Eu tenho tudo, mesmo sem um pai perfeito por perto!

- Está tudo certinho! - olhou para a mesa, se certificando que não estava faltando nada.
- Só está faltando o novo casal. - Callie riu fraco, e se algum dos dois estivesse ali, ela sabia que levaria uma pequena bronca pela palavra "casal". Ela cruzou o olhar com por alguns segundos, e seu riso se desfez. Ele não estava com um olhar nada bom - Ai , desculpa. Eu pensei que não tinha problema falar sobre isso, até porque você e não têm mais...
- É muito fácil te enganar, Callie Amalia Bruckner! - caiu na risada antes da coitada terminar de se desculpar. A garota rolou os olhos, jogando o pano de prato que estava em suas mãos na cara do rapaz, que riu ainda mais.
- Você é um idiota! Ainda bem que preferiu o Jackson. - ela resmungou num tom debochado, na esperança de atingir o garoto num ponto desagradável, mas foi exatamente o contrário.
- Ainda bem mesmo. Ela come demais, ia me dar um baita prejuízo! - revidou num tom sério, quase deixando Callie de boca aberta - Ok, mas falando sério, eu não me incomodo com eles dois, muito pelo contrário. Nunca me senti tão aliviado em toda a minha vida. está finalmente se relacionando com alguém que é bacana pra ela, enquanto eu estou aqui, vivendo minha vida enquanto alguém bacana não aparece pra mim. - ele finalizou tranquilo, e nem se ele quisesse teria diria tudo aquilo se não fosse sincero. queria o bem de , assim como ela queria o dele, porque a amizade dos dois sempre ficou por cima de qualquer aventura ou confusão. Isso me deixa um tanto quanto tristinha porque sempre pensei que eles fossem ficar juntos, mas vendo agora ela com Jackson... não podia ter alguém melhor para ela no mundo!
- , já estou indo! Nunca deixei minha casa com vários adolescentes dentro, então, por favor, tome conta de tudo! - Elena desceu as escadas com pressa, estranhando todo aquele movimento, mas ao mesmo tempo feliz por aquilo estar acontecendo. Eu e decidimos fazer um jantar para todos, sem data comemorativa mesmo, apenas por fazer, mas Elena e minha mãe decidiram sair para comer fora, provavelmente para conversarem sobre a bebê, a bebê, e sobre a bebê de novo.
Tá, não é bem assim. Elena e mamãe se tornavam grandes amigas a cada dia, e nada podia me deixar mais feliz do que as duas se dando tão bem.
O barulho da campainha se repetiu muitas vezes em um curto espaço de tempo, provavelmente sendo mais uma das gracinhas de Jackson junto com . Elena abriu a porta, na esperança de sair logo em seguida que o casal entrasse, já que eram os únicos que estavam faltando, mas o que aconteceu foi muito diferente do planejado.
As lágrimas escorriam pelo rosto de , e todos pararam o que estavam fazendo.
- O que aconteceu? Alguém fez alguma coisa com você? - tratou de se aproximar o mais rápido possível da melhor amiga, que soluçava em meio a todas aquelas lágrimas.
- Levaram o Jackson! - ela sussurrou com dificuldade, com a voz rouca, sem força nenhuma para dizer uma palavra sequer.
- , tente dizer o que aconteceu! O que aconteceu com o Jackson? - se aproximou como um foguete ao ouvir o nome do irmão.
- Dois carros nos cercaram assim que saímos da garagem da sua casa, estavam todos armados, e aí... eles...eles levaram o Jackson! - desabou no choro novamente, enquanto o peso do mundo, mais uma vez, caiu em nossas cabeças.

Capítulo 33


"Essa é a parte engraçada do destino: acontece, quer você queira ou não."


- TODO MUNDO EM SILÊNCIO! - Elena gritou alto, calando a todos no mesmo segundo. Estava tudo uma bagunça e eu nem sabia o que pensar. Richard havia sequestrado Jackson e nada poderia ser pior naquele momento.
- Dan está vindo pra cá com Cooper. - adentrou a sala novamente após ligar para Dan.
continuava a chorar e não desgrudava de seu lado pra nada. Callie tentava de todos os jeitos distrair Sophia, enquanto o resto de nós estávamos completamente chocados, sem saber o que fazer. Por sorte, não demorou para que Dan e Cooper chegassem, afinal, aquilo era de extrema urgência.
O meu coração estava apertado.
Dolorido.
O olhar desesperado de foi a pior coisa que eu poderia ver na vida. Mesmo ele não tendo nenhum envolvimento com Richard, uma parte dele se culpava muito pelas atitudes do pai.
Por muito tempo, eu procurei o que tinha de errado em mim para que Sam me odiasse tanto, mas o problema sempre foi o próprio Sam. Com Richard não é diferente. Ele é tão desgraçado que a única maneira que ele encontrou em ser feliz foi infernizando as pessoas. Mas, tem um grande problema. Richard é tão infeliz quanto Sam. Ele não suporta não ter atenção, amor e felicidade como uma pessoa normal, e com isso, ele decidiu partir para uma vida bandida que o proporcionou poder. Mas mal sabe ele que tudo o que ele sente é momentâneo. Ele nunca conseguiu ver a beleza e a verdadeira felicidade em Elena, e Sophia. Ele sempre foi tão ganancioso pela grandeza que nunca apreciou o que realmente o faria feliz.
Se a verdadeira felicidade não o fez mudar, nada no mundo faria. Isso é uma droga, mas sua alma já havia se perdido há muito tempo, e ninguém precisa disso no mundo.
Dan e Cooper entraram ali interrogando com pressa. A garota poderia explodir a qualquer momento de tanto nervosismo, mas deu todas as informações necessárias.
- Como foi que isso tudo aconteceu? Por que Richard pegaria Jackson? - Elena questionou no meio de toda a confusão, fazendo a pergunta que estava na cabeça de todos ali presentes.
- Porque eu descobri que os dois rapazes que eu confiei exatamente tudo sobre meus negócios, eram informantes de Richard. Com isso, eu meio que... os prendi em algum lugar. Eu peguei o celular de um deles e liguei pro Richard, crente que com aquilo, tudo estava perto do fim, mas pelo jeito eu me enganei. Ele pegou o meu filho, O MEU FILHO! - Cooper grunhiu nervoso, socando a mesa em sua frente. se afastou assustada, sendo abraçada por Dan.
- Ligue de novo! - os olhos de Elena marejaram, mas ela se manteve forte, com o queixo erguido.
- Eu já liguei mas ele na... - o som da voz de Cooper foi cortado pelo som do celular tocando. Todos nós nos entreolhamos apreensivos, esperando ele atender, e demorou alguns segundos para ele tomar coragem e finalmente acabar com aquilo. Foi uma conversa rápida, de no máximo dois minutos. Dois minutos que pareceram dois dias. Cooper apertou os olhos, quase sem coragem de abrir a boca novamente, mas ele conseguiu dizer as palavras que eu queria nunca ter ouvido - Richard quer um encontro com todos nós.
- O que você quer dizer com isso? - perguntei exaltada.
- Com "nós" quero dizer eu, Dan, Marie, e Sophia. - Cooper respirou pesadamente, sem forças para olhar pra ninguém.
- Não, isso não! Ele quer... Sophia? Todos vocês? Não, não e não! De jeito nenhum! - falei alto o suficiente para não deixar dúvidas que eu não estava de acordo com nada daquilo. Como
Richard ousava pedir aquilo? Como ele tinha a coragem?
- , calma! - pousou as mãos em meus ombros, numa tentativa falha de me acalmar - Onde ele quer que esse encontro aconteça? - ele perguntou curioso.
- No galpão abandonado da Spaffy na Alpha Mill. - Cooper respondeu quase que num sussurro, ainda desnorteado com aquele pedido absurdo.
- Spaffy, a empresa de produtos de limpeza que causou todo aquele escândalo? - perguntou com imensa curiosidade na voz, realmente intrigado com aquilo. O escândalo era nada mais, nada menos, que o dono da empresa estar envolvido com roubo de joias, usando os galpões de estoque para esconder as peças dos roubos. Pelo menos foi o que o jornal informou há certo tempo atrás.
- Uhum.
- Cooper, os galpões da Spaffy voltaram a funcionar há pelo menos duas semanas. A TV não mostrou, mas é verdade. Meu pai é advogado e estava no meio de todo o processo para a reabertura deles! - exclamou chocado e ao mesmo tempo eletrizado por tudo aquilo que saía de sua boca. Cooper ergueu seu rosto com os olhos arregalados, franzindo a testa confuso segundos depois. Aquilo significava que...
- Richard está armando! Ele quer despistar vocês por algum motivo! - falou tudo o que estava prestes a sair da minha boca, numa agilidade de raciocínio tão rápida quanto a minha.
- O que vamos fazer agora? - sussurrou agoniada, com alguns rastros de lágrimas em seu rosto. Levantei e me sentei ao seu lado, encostando sua cabeça em meu ombro, fazendo o melhor carinho possível na intenção de acalmar minha amiga.
- Cooper, tem alguma coisa que Richard ainda queira usar contra você? Ele está tentando nos despistar por algum motivo, e talvez você saiba o porquê! - Dan questionou a fundo, com o propósito de passar um pente fino na situação, querendo saber o motivo da armação de Richard.
- Não tem nad... os meus arquivos! - Cooper gritou com um olhar impactado, passando a mão pelo rosto em puro nervosismo.
- Que arquivos são esses? - me apressei em perguntar, sentindo a tensão aumentar mais e mais.
- São arquivos que contém todas as merdas que eu fiz na Skinder Empire e também alguns documentos que eu tinha enquanto eu ainda tava metido com as drogas e as armas. Aquilo tudo pode me deixar na cadeia pro resto da vida!
- E onde estão esses arquivos? - perguntou com pressa.
- Na minha casa, num cofre que nem mesmo Julie sabia a senha, até porque ela nem soube da existência dele, mas eu contei sobre isso pro Noah e pro Jimmy. Merda!
- Por isso Richard queria que fôssemos até o galpão da Spaffy na Alpha Mill, porque é um tanto quanto longe, e isso daria tempo pra ele agir tranquilamente. - Dan balançava a cabeça negativamente enquanto encaixava as peças finais daquele quebra cabeça.
- Foi por isso que ele pegou o Jackson, pra poder entrar na casa numa boa, sem correr risco de acionar nenhum alarme. - Cooper andava de um lado para o outro, ditando seu pensamento em voz alta - Preciso ir atrás dele agora mesmo! - ele anunciou energizado, já indo em direção à porta.
- Você não vai sozinho! - se pronunciou rapidamente, fazendo Cooper o encarar de maneira confusa, pousando o olhar sobre mim.
- , você não está pensando em ir, não é? - meu coração estava mais do que acelerado e as lágrimas estavam se formando em meus olhos.
- , ele está com o meu irmão!
É preciso seguir em frente, porque é esse o sentido da vida. Mas quando é finalmente seguro pra isso? Talvez você nunca saiba. Ou talvez você precisa simplesmente arriscar. Pra arriscar, você precisa ser nobre para deixar de lado qualquer promessa feita. Você precisa deixar que a confiança e que a justiça da vida sejam maiores que o orgulho e o medo. sempre quis se vingar do pai, e agora, mais do que nunca, precisava agir como um bom irmão, e eu era a única pessoa que podia permitir aquilo.
- Só prometa que vai voltar pra mim, ok? E me prometa também que não vai matá-lo! Eu preciso de você aqui comigo, e não numa cadeia, está me ouvindo bem, ? - sussurrei em seu ouvido enquanto o abraçava apertado, de um jeito que não soasse como uma despedida, mesmo uma grande parte de mim tendo medo de que aquele pudesse ser nosso último abraço. Dei um selinho demorado em seus lábios, demorando mais um certo tempo antes de soltá-lo.
Elena tentou impedir de cometer aquela loucura por alguns minutos, mas Dan prometeu que não deixaria nada acontecer com ele. Cooper tentou dispensar a ajuda dos dois, alegando que aquilo era um problema apenas dele, mas seus esforços foram em vão.
E então... os três saíram porta afora.

's POV

Cooper fez o trajeto mais rápido, com a maior velocidade que foi possível naquele momento. Um domingo à tarde deixa as ruas bem vazias, o que foi uma grande ajuda para nós. Richard mostra que não tem medo de brincar com fogo ao agir durante a luz do dia sem um pingo de medo.
Mas a hora dele estava chegando.
Cooper diminuiu a velocidade, analisando todo o movimento de sua rua e observando qualquer carro que não fosse conhecido por ali.
E lá estava ele. Um Jaguar XF preto estacionado ali. Saltamos do carro com pressa, seguindo os passos de Cooper, que nos levou até a entrada dos fundos discretamente. Passamos pelo quintal até pararmos na entrada pra cozinha, onde a porta foi aberta com imenso cuidado. Cooper fez um sinal para que esperássemos fora enquanto ele checava no visor de câmeras que tinha na parede da cozinha onde Richard estava. Ele fez um novo sinal, dessa vez, para que entrássemos.
- Ele está no meu escritório!
- Por que diabos você tem câmera em todo canto dessa casa? Como você conseguiu esconder os arquivos aqui com toda essa monitoração? - questionei com a voz entre curiosa e nervosa, observando cada centímetro do que meus olhos conseguiam captar.
- Nós deixávamos as câmeras ligadas apenas quando saíamos de casa. Eu sempre bloqueei a câmera do escritório quando ia mexer no cofre.
- Ele está armado? - Dan perguntou aos sussurros.
- Está. Acho melhor você ir por fora e o resto você sabe como prosseguir, certo? - Cooper arqueou as sobrancelhas, esperando a confirmação de Dan.
- Certo. , você vem comigo.
- Acho que é melhor eu ir com Cooper. Richard com certeza vai falar algumas baboseiras ao me ver, e talvez isso sirva pra algo. - respondi inocente, sem demonstrar nenhuma intenção de fazer algo a mais.
- Ok. Agora vamos.
Nos separamos e começamos a andar com extrema cautela até o escritório.
- E agora? - sussurrei quase inaudível, ainda esperando a próxima coordenada de Cooper, que havia travado no meio do corredor e guardado sua arma de um jeito discreto na calça.
- Agora eu vou entrar ali e você vai ficar aqui, está me entendendo? Quando eu mencionar seu nome, você entra! Não fique na mira onde Dan possa atirar e acertar em você, ouviu? - após alguns segundos apenas calculando seus passos e bolando o a última parte do plano, Cooper deu as últimas ordens antes de entrar ali sem medo.
Ouvi o barulho de algo quebrando, e logo em seguida, a risada grotesca de Richard.
- Parece que você finalmente conseguiu ser esperto, não é? - ele esbanjava ironia, aparentemente não incomodado com a surpresa da presença de Cooper ali.
- Solta o meu filho agora antes que eu acabe com a sua raça! - eu pude sentir todo aquele ódio no ar com o tom de voz de Cooper, que grunhiu raivoso.
- Me diga aonde estão os arquivos e aí eu solto o MEU filho, ou você se esqueceu disso, Cooper Tuck? - ele retrucou provocativo, mais uma vez, com aquela risada que tirava qualquer um do sério.
- Seu filho da puta! Solta ele agora! - Cooper gritou ainda mais alto, e do pouco que eu podia ver, ele aparentemente estava prestes a perder as estribeiras. Eu precisava interferir antes que ele perdesse a cabeça e tudo fosse por água abaixo.
- Pelo visto você não tem muito jeito com os seus filhos, não é pai? - adentrei o escritório com graciosidade, com a voz lotada de deboche, principalmente na última palavra dita. Cooper me encarou feio, mas seu olhar foi cedendo rapidamente, reconhecendo que minha entrada foi em boa hora.
- Era só o que me faltava! - Richard rolou os olhos, bufando impaciente. Ele mantinha o braço em volta do pescoço de Jackson, junto com a arma apontada para seu abdômen. Meu irmão aparentava estar desesperado, mas seu olhar se acendeu ainda mais em esperança ao me ver, pedindo ajuda com o olhar.
- A única coisa que te falta é um tiro no meio dessa cara! - retirei a minha arma de trás da calça, surpreendendo a todos, principalmente a Cooper, que não esperava por aquilo. Os olhos de Richard se arregalaram, mas ele tentou ser rápido o suficiente e manter sua pose de durão como uma muralha.
- Você realmente acha que me intimida desse jeito, garoto?
- E você realmente acha que esse é o meu objetivo aqui? Porque não, não é. Eu só quero que você me escute pela última vez antes de ir pra trás das grades. A verdade está bem aqui para todo mundo ver e nenhuma palavra precisa ser dita. Você se superou em suas monstruosidades, apontando uma arma para o próprio filho em troca de alguns arquivos que te dariam certo poder e manipulação sobre a vida de Cooper. Mas você pode acaso já ouviu falar de felicidade? - arqueei uma sobrancelha, com um tom sério, prosseguindo antes que ele pensasse em me interromper - A felicidade controla todos os aspectos do comportamento humano. É sobre acreditar em quem você é. Infelizmente, Richard, você é infeliz demais para acreditar em quem você poderia ter sido. Mas no fim, você não pode se esconder. A infelicidade pode sufocar, pode destruir de dentro pra fora, e pode até matar. Mas a morte é algo bom demais para você, e mesmo com o poder de acabar com tudo nesse instante, eu escolho deixar seu corpo vivo para pagar por todas as suas atrocidades no lugar que você deveria estar há tempos! - continuei com um tom de voz sério e calmo, sem nenhum tipo de alteração, mesmo sentindo o sangue fervendo em minhas veias. Meu braço já estava cansado de tanto mirar a arma em sua pessoa, mas respirei fundo e dei continuidade, com uma força que surgiu de repente, como de algo de novo estivesse no ar - Todos os dias a vida te deu segundas chances para você se tornar qualquer pessoa que quisesse ser. Você podia ter deixado o passado para trás ou poderia ter aprendido com ele e honrá-lo. Poderia ter se decidido. Nunca é tarde demais para mudar, e sabe por que eu digo isso? Porque eu mudei. Eu fiz uma escolha. Mas você... você não tem essa chance pelo simples fato de não querer. Essa foi a sua escolha! - finalizei nervoso, apertando os olhos e respirando fundo. As palavras saíram da minha boca, assim como qualquer rastro de culpa ou remorso que Richard havia causado em minha vida. Eu estava me auto libertando. A voz de me fazendo prometer que não mataria Richard ecoou pela minha cabeça. Nossos melhores momentos se passaram em rápidos flashbacks, me lembrando do que realmente valia a pena, que era estar ao seu lado. Mesmo um lado meu querendo muito, aquela foi a minha força para não apertar aquele maldito gatilho.
- Já acabou? Ouvir isso é como ouvir uma piada, sabia? Vocês deveriam saber que eu sempre estive no controle, assim como sempre vou estar! Sempre! - Richard se vangloriou, totalmente inabalado pelas minhas palavras. Jackson aparentava estar cada vez mais desconfortável e aquilo merecia um basta. Um fim. Observei Dan pela janela atrás de Richard, que acenava desesperadamente para que eu continuasse a distrair o homem e foi isso o que eu fiz, dando um olhar significativo para Cooper, que captou toda a interação.
- Tem certeza? - desafiei Richard com o olhar mais cínico que pude fazer, esperando a verdadeira confusão começar.
Dan deu uma cotovelada no vidro da janela, o quebrando em incontáveis pedacinhos, fazendo Richard se virar assustado para observar a nova distração, e nesse minúsculo espaço de tempo, Jackson arriscou um soco giratório, o acertando em cheio, fazendo o homem perder o equilíbrio. Cooper não perdeu tempo, avançando em Richard de maneira furiosa, a fim de afastá-lo do filho.
Mas tinha algo ali que poderia causar uma grande tragédia.
Richard lutava com Cooper e o primeiro movimento em que ele fez menção de erguer sua arma novamente, foi a minha deixa para agir.
Por um momento, na minha cabeça, apenas nós dois estávamos ali. O mundo inteiro parecia ter parado.
Richard tentou levantar a arma e em meio a toda aquela confusão eu me arrisquei. Quase sem pensar. Chutei sem dó a perna de Richard, que gritou alto, sendo empurrado até a parede, chocando seu corpo ali finalmente soltando a arma.
Ele não tinha mais nada que pudesse assustar ou ameaçar a vida de alguém.
Nada.
- VOCÊ VAI APODRECER NA CADEIA, SEU ORDINÁRIO! - Cooper continuava com a agressão nada piedosa, jogando o corpo de Richard no chão, pronto para atacá-lo novamente, mas sendo impedido por Jackson.
O observei jogado ali, e pela primeira vez, notei a expressão diferente em Richard. Ele estava assustado. Surpreso. Sem reação. Só de ver tal coisa já valeu por qualquer esforço que eu poderia fazer para esmurrar sua cara. Meu sorriso se formou, enquanto o dele finalmente sumiu.
Eu estava mais do que vingado.
- Você perdeu! - me dei o trabalho de abaixar, olhando no fundo dos seus olhos e dizendo as palavras que no fundo, estavam doendo no fundo da merda da alma que ele tinha.
Estava tudo finalmente acabado.
Dan entrou pela janela mesmo, dando o sorriso mais maligno que eu já tinha visto em seu rosto. O pior de todos. Ele estralou os dedos, ficando de frente para Richard.
- Levanta agora! - ordenou com a voz séria, mas Richard nem mesmo se mexeu. Dan partiu então, pra o que eu chamo de castigo por desobediência. Ele não teve dó em pisar com toda a força seu peito, e um gemido alto de dor tomou conta de nossos ouvidos - Eu poderia ficar aqui te machucando o dia inteiro, seu merda, mas você não merece nem a minha raiva. Você não serve mais pra nada, Richard ! Acabou!
- Ah, e caso você pense que tem alguma maneira de se livrar disso, lembre que você é procurado pela polícia, e não tem um pingo de chance de alguém te ajudar a partir de agora. E a propósito, Noah e Jimmy vão para a merda junto com você, porque eu mesmo vou me encarregar disso! - Cooper finalizou com um sorriso alegre e uma piscadela, fechando a porta para não ter nenhuma possibilidade dele fugir dali.
Olhei para Jackson, que ainda parecia assustado, mas muito feliz. Abri um sorriso gigante, abraçando meu irmão com todo o carinho, agradecendo aos céus por nada ter acontecido com ele.
- Desde quando você tem uma arma? - Dan perguntou em uma mistura de curioso e bravo enquanto sacava seu celular do bolso, provavelmente pronto para ligar para a polícia.
- Que arma esse garoto tem? - Cooper perguntou num tom brincalhão e divertido, fingindo não saber de nada, pegando minha arma como se eu não fosse perceber, a colocando dentro de um saco de plástico, juntamente com a sua e a de Dan.
Acontece que desde quando apareceu aos choros em minha casa, eu sabia que coisa boa não podia ser, e assim que fiquei sabendo que tinha Richard no meio, sabia que a arma podia ser muito útil, e quando liguei para Dan pra avisar sobre o sequestro, aproveitei para pegar minha preciosa arma no meu esconderijo.
Agora eu não precisava mais de nada. Só queria sair dali e abraçar .
- Eu preciso de uma explicação muito boa pra tudo isso! - Jackson sussurrou alto o suficiente para que apenas eu e Cooper ouvíssemos, já que Dan estava em uma ligação com a polícia, finalmente agilizando definitivamente o fim de toda aquela loucura.
Richard nos encarava feio, sentado no canto do escritório, provavelmente pensando mil loucuras que gostaria de fazer, mas que não eram possíveis porque sabia que qualquer respiro a mais que desse, as consequências não seriam nada bonitas.
O barulho estrondeante das sirenes policiais se fizeram presentes em nossos ouvidos.
Finalmente!

's POV end
Jackson's POV

A única coisa que eu entendi durante o trajeto até a delegacia foi que meu pai iria dar uma passadinha num tal galpão para dizer a Noah e Jimmy que Richard foi preso, e que aí com certeza eles iriam querer jogar toda a culpa nele pra não pegarem uma pena maior do que seria dada a eles.
Eu ainda precisava de muitas respostas. Muitas mesmo.
Mas... quando eu digo que tenho sorte, falo sério. E além do mais, agora também tenho um anjo que cuida de mim o tempo inteiro. Claro, não foram os momentos mais agradáveis da minha vida, mas eu pude sentir minha mãe em todos eles, até quando eu senti mais medo. De alguma forma, eu sabia que tudo ficaria bem e eu tenho certeza que ela ajudou em toda essa história.
Qualquer dia em que você acorde e seu corpo ainda se move é um bom dia. Eu acordei, combinei de almoçar com meus amigos e acabei sendo sequestrado. Isso definitivamente não estava nos meus planos, mas a situação toda me ensinou uma grande lição.
Você pode recomeçar.
Pode viver cada dia como se fosse o último.
Todas as frases cafonas escritas em almofadas e parachoques, são verdade.
Você está vivo.
Eu fui abençoado com uma nova oportunidade, e Richard finalmente vai pagar por todas as coisas horríveis que ele já causou. A vida é assim, não tem como fugir dessa justiça. Pode demorar, mas o que você planta, você irá colher um dia.
Mesmo Richard tentando tantas vezes apenas fazer o mal, o bem sempre venceu. Não tem como conspirar contra o próprio universo.
Eu me sinto novo. Pronto pra qualquer coisa no mundo.
Coisas ruins vem de repente, sem avisos, mas nos esquecemos que, às vezes, é assim que as coisas boas acontecem também.
Agora estão todos livres.
O tempo passava e a única coisa que eu queria era ir embora, mas não podia sair sem dar meu depoimento. Mas afinal, que diferença faria? Richard ficaria o resto da vida na cadeia mesmo.
- Jackson? - me virei bruscamente ao ouvir o som daquela voz mais que conhecida. A voz dela. estava no fim do corredor junto com meus amigos, que pareciam maravilhados ao meu ver ali. Me levantei no mesmo instante, enquanto corria em minha direção, chocando nossos corpos em um abraço que valia mais do que qualquer coisa no mundo inteiro - Eu não quero ir devagar, ok? Eu não quero fugir disso. Eu gosto tanto de você. Gosto de te ter pertinho de mim, exatamente desse jeitinho. Eu...eu...gosto do seu sorriso, e gosto de poder te tocar. Eu gosto de tudo, sem tirar nem por. Ai caramba, eu fiquei tão preocupada! - ela disparou de uma vez, me dando inúmeros selinhos e me abraçando novamente, ainda mais forte. Eu apenas consegui sorrir, sentindo o cheiro do seu cabelo em meu nariz. Fechei os olhos e respirei fundo, aproveitando o momento em que absolutamente tudo mudou. O momento em que não tinha mais coisas ruins, e sim, só felicidade.
- Está tudo bem, . Acabou. O tormento acabou. Agora somos só nós dois. - levei minhas mãos até seu rosto, o segurando de maneira que a fizesse olhar apenas pra mim. Um arrepio percorreu pelo meu corpo, uma sensação completamente diferente. Algo parecido como... sentir que tudo estivesse finalmente no seu lugar. Tudo.
- Ei! - eu estava prestes a finalmente dar um beijo em até aquela coisinha pequena chamar nossa atenção. Sophia estava com os olhos cerrados, balançando a cabeça de um lado para o outro como se estivesse analisando aquilo tudo.
- Sophia tem algo pra te falar, Jackson. - Elena se aproximou aos poucos, me abraçando apertado, assim como o resto do pessoal, que pelo jeito apenas esperaram o meu momento com acabar para me cumprimentarem. Era nítido o quão aliviados eles estavam por me ver bem e também era nítido o quão feliz eu estava por finalmente ter pessoas que realmente se importavam comigo.
- O que você tem pra me falar, mocinha? - me abaixei, olhando aquele rostinho angelical da pequena, e por um segundo meu coração se apertou. Sophia nem mesmo tinha noção do quanto as coisas foram malucas em sua vida.
- Mamãe me contou que você é meu irmão também, mesmo tendo nascido da barriga da tia Julie. Somos uma coisa chamada "meios irmãos", mas acho que podemos ser "inteiros irmãos", não é? - Sophia abriu um sorriso animado, com os olhinhos arregalados, esperançosos. Ninguém aguentou e caiu na gargalhada, principalmente eu.
A vida é essa constante loucura. Cada dia você espera que as coisas mudem pra melhor, claro. Se espera ganhar o que sempre quis, mas às vezes, você ganha o que nunca esperou, que acaba sendo melhor do que o que você sempre quis. A vida é assim, uma montanha russa. Uma hora você está lá embaixo, e na outra, está lá em cima. Enquanto estiver no topo, agarre as oportunidades, as chances de rir, de brincar, de aproveitar, de se encantar, e também de aceitar. O que você nunca esperou pode te fazer mais feliz do que qualquer outra coisa.
- Claro que podemos! Agora você tem dois irmãos incríveis, mesmo eu sendo mais legal do que . - respondi animado, pegando a pequena no colo e não perdendo a oportunidade de fazer graça.
- Mas não é mesmo! - apareceu ali com um tom debochado, e correu até o namorado, o abraçando forte.
É... está tudo no seu devido lugar.
Elena me olhou emocionada, pronta pra derramar algumas lágrimas. São nessas horas que eu enxergo o quão imbecil era. Ela sempre foi uma mulher forte, muito mais do que qualquer uma que eu já conheci na vida, e ainda assim, eu fui idiota o suficiente para usar ela para zombar de . Mas ainda bem que as coisas mudam, certo?
- Você não precisa chorar. Agora está tudo acabado, finalmente tudo no seu lugar. Minha mãe estaria muito orgulhosa disso tudo, sabia? - arqueei as sobrancelhas junto com um sorriso, a abraçando também, mesmo com Sophia no colo. Um abraço triplo desengonçado, porém cheio de carinho.

(...)


- Então você era traficante de armas e de drogas, é isso? - perguntei estagnado após assimilar tudo o que meu pai tinha me dito. Toda a verdade. A terrível verdade.
- Jackson, eu sinto muito mesmo! - ele fez menção em se aproximar, mas pedi com a mão para que ele não o fizesse.
- Por quê? Me diz! Por que você queria dinheiro? Poder? - arrisquei os palpites com a voz quase falha, saindo como um sussurro. Joguei a cabeça pra trás, a encostando totalmente no sofá. Aquilo tudo estava difícil de entrar na minha cabeça.
- Foi pelo poder. Pela vontade de querer mandar em algo grande. Isso me tirou muito tempo com você e com a sua mãe, e eu me arrependo muito por isso. Você me perdoa, filho? - ele suplicou com o olhar, esperançoso. Eu queria não estar ouvindo aquelas coisas. Minha vontade era de correr para os braços da minha mãe, coisa que já não era mais possível.
- Mas aqueles dois caras, o tal do Noah e do Jimmy? - desviei da pergunta que eu ainda não sabia responder, com outra pergunta.
- Eles eram como meu braço direito. Quando Richard roubou tudo, eu mantive os dois ao meu lado pra poder ter ajuda para achá-lo novamente. - meu pai respondeu num tom calmo e explicativo, mas eu sabia que por dentro, nada estava calmo. Assim como nada estava calmo em minha mente, que recebia a cada minuto uma nova informação sobre a história que explicava o motivo do meu pai ser tão distante durante a vida toda.
Eu disse a vida toda.
- Acho que você estava pagando pelo seu erro mesmo sem saber, já que os dois não passavam de traidores.
- Pra você ver como a justiça sempre é feita, não?! Mas eu quero saber se você me perdoa, Jackson. Você é tudo o que eu tenho agora! - lançou-me um olhar arrependido e desesperado, assim como a sua voz indicava sua sinceridade. Meu coração se apertou no mesmo instante, e eu comecei a me sentir sufocado. Precisava sair dali e respirar ar fresco, algo que me fizesse pensar com clareza.
- Pai, eu preciso de um tempo agora, tá legal? É muita coisa pra mim. - me levantei nervoso em direção à porta, evitando de olhar em seu rosto decepcionado. Saí dali sem olhar pra trás, indo em direção ao meu carro.
Eu precisava ir a um lugar. Pra ser mais direto, à casa de . A única pessoa que me fazia pôr a cabeça no lugar. Ela também não tinha ido pra escola, assim como provavelmente todos os outros. Nossas cabeças estavam a mil com a prisão de Richard.
Toquei a campainha da sua casa várias vezes, numa ansiedade gigante em ver seu rosto.
- Ave maria, quem é que... Ah, é você! - ela abriu um sorriso sem graça ao me ver ali, e eu nem tentei me segurar. Aproximei nossas bocas rapidamente, e mesmo sendo pega de surpresa, ela deu passagem para a minha língua. Eu precisava daquele beijo, do seu gosto, de tudo. Eu precisava dela. Nossas línguas tinham uma sincronia incrível, me proporcionando a melhor sensação que eu podia sentir no momento.
- É, sou eu. - parti o beijo, e mesmo ofegante, abri meu melhor sorriso.
- Você está bem?
- Meu pai me contou toda a verdade sobre ser um ex traficante de drogas e armas. Eu ainda não sei o que pensar, eu... precisava te ver. Você sempre tem as palavras certas, . - respondi um tanto quanto sem graça, dando os ombros. A garota sorriu de maneira acolhedora, me puxando pra dentro de sua casa e fechando a porta. Ela me encarou docemente por alguns segundos, respirando fundo e finalmente disparando tudo o que eu precisava ouvir:
- Jackson, sabemos que a confiança entre pai e filho importa muito, e quando você se sente traído ou enganado isso é realmente uma porcaria, mas ele é seu pai. Ele te ama! Deve ter sito decepcionante e até assustador descobrir a verdade, mas só porque ele era envolvido com essas coisas terríveis, não significa que ele algum dia ainda vá querer mexer com isso novamente. Ele mudou, e você precisa aceitar que as coisas são diferentes agora! - ela finalizou se sentando ao meu lado, com um olhar esperançoso, cheio de carinho. As palavras saltavam de sua boca com uma facilidade que eu nunca tinha visto em toda a minha vida. era como um anjo. Ela se esforçava para ajudar de verdade. Ela se determinava a mostrar o lado bom de exatamente tudo. Eu nunca tive uma pessoa assim na minha vida e talvez seja por isso que ela me encante tanto. Meu sorriso se formou ao observar os detalhes do seu rosto. Um riso alegre e totalmente satisfeito com cada palavra que saiu daquela boca que eu podia beijar o dia inteirinho.
Sabe as noites em que você torce por uma vida melhor? As noites em que você torce para algo melhor estar em seu caminho?
Pois bem...
As vezes esse "algo" se torna alguém. E aí são duas pessoas num caminho só. Uma soma. Eu pra ela, e ela pra mim. Como uma equipe, preparada contra à tempestade do mundo. E o amor... será sempre a força guiando nossas vidas.
Deus... eu estou destemidamente apaixonado por .

Jackson's POV end
's POV

A melhor coisa da vida é se livrar de algo ruim. Isso é libertador. Me livrar de Richard me fez enxergar o quanto fui forte em todos esses anos. Também serviu pra me mostrar que tenho que ter apenas o que eu preciso e nada mais. E o que eu preciso não é de vingança e nem de pensamentos ruins. Agora, definitivamente, não mais.
É engraçado o trajeto que você faz durante a vida até chegar no seu melhor momento. Damos o nosso melhor, mas às vezes não é o suficiente. Apertamos o cinto de segurança, colocamos o capacete, andamos por caminhos iluminados e tentamos ficar seguros. Também tentamos proteger as pessoas que amamos, mas não faz a menor diferença, porque quando coisas ruins acontecem, quer você queira, ou não.
Claro, se pode evitar que elas aconteçam, mas tudo, exatamente tudo tem um propósito. Richard sempre quis poder, e foi isso o que ele teve por muitos anos, mas agora, a única coisa que ele vai ter é a saudade desse poder. A saudade de que um dia ele pode desfrutar do que ele sempre quis. E na minha humilde opinião, acho que não tem mais nada torturante do que isso; saber que você tinha tudo, e de repente não se tem mais nada.
- Bom dia, moça bonita. - sussurrei assim que abriu os olhos lentamente, se espreguiçando.
- Bom dia, moço bonito. Como você está se sentindo? - ela riu fraco, se virando totalmente pra mim, mordendo o lábio inferior.
- Eu ainda não tenho palavras pra explicar.
- Eu estou tão feliz por você. Por nós. Por tudo. Não tem mais ninguém que possa atrapalhar nossa vida! - exclamou sorridente, com os olhos brilhando.
Também é engraçado o trajeto que você faz durante a vida até encontrar o amor, mesmo nunca tendo o desejado. A vida te traz o que você precisa, e aqui estou eu, com a mulher mais incrível do mundo todinho, junto com a minha filha, que mesmo ainda estando na barriga já é incrível como a mãe. Você percebe que sua vida é tão incrível quando se pergunta se aquilo tudo realmente está, de fato, acontecendo. Parece que é mais do que você merece.
Mas não é.
Todo mundo merece felicidade.
Um amor.
Uma família.
É a melhor coisa que pode acontecer na vida de qualquer ser humano.
Observei o rosto da minha namorada. Cada mínimo detalhe. Toda a beleza que mesmo sendo absurdamente encantadora, não valeria nada se ela não fosse bonita por dentro. Bem, sorte a minha que ela é o pacote completo, não é? Caminhei uma das minhas mãos até encontrar a sua. Eu nunca fui uma pessoa que gosta de palavras bonitas ou com significados profundos, mas ela merecia pelo menos a tentativa.
- Eu amo como as suas mãos tem dedos de tamanhos irregulares e como ela se encaixa na minha. Eu amo o fato de você ser mais baixinha, e isso me faz te acomodar de um jeito mais envolvente em meu abraço. Essas diferenças são o que nos completam. Somos feitos um para o outro e disso eu não tenho um pingo de dúvida. - coloquei pra fora todas as palavras que estavam em meu coração e estavam desesperadas pra sair. me fazia sentir algo diferente a cada dia, despertando coisas em mim que eu nem mesmo sabia que existiam. Nascemos com vendavais, incêndios em florestas e cometas dentro de nós. Nascemos capazes de cantar para aves e ler para nuvens. Nascemos, crescemos e aprendemos, e o amor é uma aprendizado e descoberta diária.
Descemos esfomeados, nos deparando com Dan ali junto com minha mãe e Sophia.
- Então a mocinha não foi pra escola? - chegou cutucando a barriga de Sophia, fazendo cócegas e a risada alta da minha irmã tomou conta por alguns segundos.
- Bom dia! - minha mãe disse animada, terminando de colocar as panquecas na mesa com a ajuda de Dan.
- Alguém está bem feliz hoje...
- Como não estar, filho? - ela perguntou retoricamente, radiante, com um sorriso estampado de orelha a orelha.
- Nada melhor do que começar uma vida nova com um café da manhã desses! - Dan passou a mão pela barriga, olhando para cada coisa que estava na mesa. Aquele era de longe, o café da manhã mais bem elaborado que minha mãe tinha feito em toda sua vida.
- O que você quer dizer com "vida nova"? - questionou com um olhar confuso, pegando um pedaço de melão e enfiando na boca.
- Agora sou um cidadão correto. Faltam resolver algumas coisinhas, mas eu estou oficialmente me aposentando da minha vida... - Dan parou de falar ao olhar para Sophia, que estava atenta em cada palavra que ele dizia - Da minha vida feia. - ele respondeu perdido, sem saber como lidar com aquele pedaços de gente ainda o encarando. Caímos na gargalhada no mesmo instante, enquanto Dan franziu a testa, ainda estagnado pelo modo em que agiu por conta de uma criança.
- Eu amo cada um de vocês, sabiam? - minha mãe disparou de repente, observando o rosto de cada um. Ela estava TÃO feliz, e nem mesmo nos meus sonhos eu pude imaginar que ela conseguiria ficar de tal maneira.
Isso se chama gratidão. Elena é uma verdadeira guerreira. Criou dois filhos, ficou no fundo do poço e se reergueu. Ela sobreviveu aos piores momentos de sua vida. Ela conseguiu reconhecer que todos os momentos terríveis em que ela achou que nada pudesse tirar a dor do seu coração valeram a pena. Eles a fizeram mais forte. Ela estava grata por ter sobrevivo.
Ser grato pela sua vida é tão importante quanto viver. A gratidão muda tudo!

2 MESES DEPOIS...
Dan passou a trabalhar com Cooper na Skinder Empire e minha mãe arranjou um novo emprego numa confeitaria.
Mas a grande notícia é que minha mãe e Dan estavam praticamente namorando. Isso mesmo. Jantar toda semana, passeios divertidos com Sophia e até cinema. Se eu gostei? Bem, acho que nem preciso responder.
- Vocês estão atrasados, andem logo! - o treinador resmungou com um olhar feio enquanto corríamos até o ônibus, que por sinal, já estava cheio com todos os jogadores e líderes de torcida. Só faltávamos nós.
- Desculpa treinador, mas a culpa é toda dela que sente vontade de comer umas coisas malucas nas horas mais inapropriadas! - paramos em frente ao treinador, e apontei para , que carregava uma barra de chocolate com um pote cheio de tomate.
CHOCOLATE E TOMATE! Vê se pode uma coisa dessa?!
- Meu filho, se você visse tudo o que minha mulher sentiu vontade de comer durante a gestação dos nossos quatro filhos você comeria esse chocolate com esses tomates numa boa! Agora vão, entrem logo! - o treinador gargalhou, perdendo alguns segundos conosco mas logo nos apressou novamente.
4 filhos! Eu com uma já estou ficando maluco, imagine 4?
Me sentei rapidamente ao lado de , enquanto se sentou ao lado de Callie.
- Se ela quiser comer chocolate, eu tenho que correr pra comprar chocolate. Se quiser iogurte, eu tenho que encher a geladeira de iogurte. Se ela quiser salsicha temperada com mousse de limão, beleza, eu tenho que me virar! - resmunguei em voz alta, ainda inconformado com todas as coisas doidas que sentia vontade de comer. Gravidez é esquisito demais!
- Cara, do que você ta falando? - por um momento me esqueci de , que se fez presente novamente ao me questionar com um olhar confuso, sem entender absolutamente nada do que eu estava falando.
- Daquela doida ali. - apontei com o queixo para , que intercalava entre o chocolate e o tomate, e aquilo me deu um arrepio de nervoso - Chocolate com tomate, ! CHOCOLATE COM TOMATE!
- Acho que eu não quero ter filho não. - ele olhou horrorizado para aquela cena e respirei aliviado por não ser o único que estava achando aquilo estranho.
- Ei, no sábado que vem nós vamos roubar você, já que vai ser o chá de bebê da e é uma coisa só pra mulheres e bla bla bla. - estava sentado do banco da frente, se apoiando nele para basicamente me intimar a sair, já que ele não deixou a opção em aberto caso eu quisesse recusar. Ele rolou os olhos ao falar sobre o chá de bebê, que realmente era só para mulheres.
- E vamos sair pra onde?
- Pra fazer o que não fazemos há tempos, oras! - ele respondeu como se fosse algo óbvio, dando um olhar sapeca logo em seguida.
É, iriamos pra algum bar, uma festa, alguma coisa do tipo.
O ônibus parou, e descemos com certa pressa para terminarmos de organizar tudo. Era o nosso penúltimo jogo antes da grande final. Precisávamos ganhar!
As garotas, inclusive , se apresentaram com John Wayne, da Lady Gaga. Mesmo com 7 meses de gestação, continuou na equipe, dizendo que não queria perder nenhuma oportunidade de aproveitar o pouco tempo que ainda restava na escola.
Pois é. Faltava pouco tempo mesmo.
Entramos em campo. Ravens contra Giants, um dos times mais fortes que poderíamos enfrentar. Nos posicionamos no meio do campo, e o barulho do apito nos agitou no mesmo instante.
Não há como negar a importância que o futebol exerce na vida de cada um presente na quadra. É o esporte que ajuda a trabalhar em equipe, sofrer em equipe e elevar a simpatia com seus companheiros. A quadra é o lugar onde você só tem um objetivo. Nada mais importa. Você precisa pegar a bola e chutá-la dentro da rede.
Porém é muito mais do que isso.
É a emoção. Há algo tão unificante sobre o esporte na sua forma mais pura. Além de colocar a bola no gol, você precisa ser um bom companheiro para o seu time. Todos precisam alcançar a grandeza juntos. E sabe o mais engraçado? A vida é como um futebol. Você precisa correr atrás do seu objetivo e chuta-lo no gol, mas também precisa de companheiros ao seu lado para acompanhar seu sucesso. Precisa de alguém pra te ajudar, pra te dar a mão, e pra ajudar a te passar a bola.
É assim que você ganha esse jogo que é a vida.

(...)


- Bom dia! Meu nome é Anthony, e você é o , certo? - o rapaz com um terno muito bem passado e aparentemente caro perguntou, com uma voz extremamente grossa. Aquele óculos o deixava um pouco estranho, mas nada assustador. Ele não aparentava ser tão velho, e por algum motivo, isso me deixou um pouco nervoso.
- Certo.
- Bem, vamos ver o que temos aqui. - ele abriu uma pasta com provavelmente todas as informações que ele tinha que saber sobre a minha pessoa - Você está no time de futebol, que por sinal, está na final do campeonato. Também já teve alguns problemas com Jackson Tuck. O que você me diz sobre isso? - ele tirou os óculos, com um sorrisinho fraco no rosto, encostando-se inteiramente na cadeira, esperando minha resposta. Me senti um tanto quanto desconfortável. Cara, é isso o que você sente quando precisa passar com o orientador?
- Briga de irmãos, nada grave. - respondi rapidamente tentando esconder meu nervosismo, mas aquilo parecia ter o surpreendido. Anthony arqueou as sobrancelhas de modo controlado, não querendo demonstrar tanto.
- Vocês são irmãos? Eu não sabia disso.
- Eu também não sabia até alguns meses atrás. Somos meio irmãos. - soltei uma risada fraca sem humor, mas ele permaneceu sério. Muito sério.
- Suponho que isso tenha sido algo bom de se descobrir, já que as brigas pararam.
- Pode crer. - balancei a cabeça positivamente por alguns segundos, prendendo o olhar nas anotações que mesmo estando de ponta cabeça, tentei decifrar o que estava escrito ali a meu respeito.
- Não posso deixar de comentar sobre o grande avanço que você teve nas aulas de uns meses pra cá, principalmente em matemática. O que aconteceu? - ele deu a clássica tossida falsa para chamar minha atenção, e foi aí que ergui o olhar novamente, fingindo plenitude como se nada tivesse acontecido e como se eu não estivesse nervoso.
- Eu vou ser pai. - quase rolei os olhos ao observar seu olhar chocado. Qual é, todo mundo ali sabia que eu era o pai do bebê de , então como é que o próprio orientador não sabia? Engoli toda a minha vontade de fazer qualquer comentário a mais que não fosse apropriado, então apenas prossegui com o que eu estava dizendo há meses desde quando comecei a estudar mais. Muito mais - Eu preciso estudar pra ser alguém melhor pra minha filha, entende? Eu precisava melhorar, e foi isso o que eu fiz.
- Parabéns pelo bebê! - ele finalmente desmanchou aquela cara desagradável, abrindo um sorriso simpático - Você já tem alguma noção do que quer cursar?
- Acho que engenharia seria bacana. Também acho TI interessante. Ainda não sei. - franzi a testa em confusão, perdido em minhas próprias opções.
- Olha, , estou aqui para zelar pela formação dos alunos como cidadãos e também ajudar os professores a compreender os comportamentos dos alunos. - ele disse explicativo, dando continuidade ao perceber que eu não tinha mais nada a dizer - Eu estou aqui pra qualquer dúvida que você tiver, tudo bem? Faltam pouco tempo para as provas finais e os exames para a tão sonhada faculdade.
Saí da sala rapidamente, dando de cara com , que estava sentado em um banquinho do corredor.
- O que você está fazendo aqui?
- Eu sou o próximo. Acho que ele vai falar com todos os alunos aos poucos. O que ele falou? - ele levantou aflito, e de longe podia se perceber seu nervosismo. Pensar em faculdade deixava nervoso e disso o mundo inteiro sabia. Mas não, não é um desespero normal, ele simplesmente pira quando qualquer pessoa toca no assunto.
- Nada importante. Acho que ele só está fazendo isso pra ver quem vale uma carta de recomendação.
- Ah caralho... - ele passou as mãos pelo cabelo indicando nervosismo. podia ser engraçado, companheiro, e ótimo em compreender e ajudar as pessoas, mas se algo nele pudesse ser considerado como defeito, seria a falta de confiança em si mesmo.
- , relaxa! Você com certeza vai conseguir umas trezentas cartas de recomendação. Você vai ser o melhor advogado da Carolina do Norte, está me ouvindo bem? - falei as palavras que provavelmente ele amaria ouvir, e pelo pequeno sorriso que ele deu, realmente amou. Uma pena palavras não serem o suficiente em todas as situações.
- É foda pensar nisso. - ele sussurrou desanimado, cruzando os braços e se encostando na parede, encarando o chão.
- Eu sei que é, mas não tem nada nesse mundo que você não consiga. Qual é, cara! Você é esforçado pra caramba, não tem como você não conseguir uma vaga na faculdade. - fui o mais animado e confiante possível, porque se tem alguém que confia na capacidade de , esse alguém sou eu. O melhor de tudo é que eu não acredito por acreditar ou por ele ser meu amigo, e sim, porque ele realmente mostra esforço. Ele realmente quer se dar bem. E ele vai. Só que ainda não consegue acreditar em si mesmo. Por outro lado, ele tem amigos que acreditam nele o suficiente pra mostrar que ele pode conquistar o mundo se quiser.
- Sempre tem alguém melhor, . - ele resmungou, ainda desacreditado. Respirei fundo, analisando a situação toda por alguns segundos. Todo mundo se sente inseguro quando está prestes a enfrentar uma grande mudança como sair da escola e ir faculdade, mas até chegar lá, nesse meio tem os exames que são uma grande dor de cabeça. É um passo muito grande. Mas acho que tudo fica menos assustador quando você tem o apoio de quem gosta. Saber que alguém acredita em você faz toda a diferença.
- E sempre tem alguém pior também, mas esse não é o caso. Você precisa colocar nessa cabeça que você está fazendo o melhor que pode. Não deixa, de jeito nenhum, que todo esse nervosismo te faça duvidar da sua capacidade, está me ouvindo?
- Você é foda, . - ele finalmente abriu um sorrisinho fraco, e embora eu soubesse que aquela insegurança não passaria da noite pro dia, eu estava mais do que determinado a ajudar .

(...)


Deixei todo o fru fru, a casa enfeitada e os doces decorados do chá de bebê para buscar . É, iriamos sim para um bar. fez prometer provavelmente umas oitenta vezes que ficaria de olho em mim. Sim, ela estava com ciúmes.
Coloquei uma música qualquer para tocar, já que meu pensamento estava tomando quase toda a minha atenção. Ir a um bar depois de tanto tempo parecia um tanto quanto... estranho. Não que eu tenha deixado de gostar de toda a agitação, de corpos próximos e de toda a bebedeira, muito pelo contrário, eu até sentia falta, mas existe essa coisa... essa coisa chamada família. A saudade das baladas se tornam inúteis em comparação ao que sinto agora.
Desde quando descobri que seria pai, tudo mudou. A descoberta já vem com um turbilhão de emoções inexplicáveis, e principalmente vem o medo. A grande maioria diz por aí que ter um filho e abrir mão de bagunça é difícil, mas poucos dizem o lado bom da história. Filhos são uma mistura de amor, fé e esperança. Filhos salvam. Pelo menos, Hope me salvou. Ela me tornou um ser humano imensamente melhor sem nem ao menos ter nascido. Hope foi capaz de me mostrar o verdadeiro sentido da vida, e eu nem mesmo consigo imaginá-la de outro jeito. Claro, no começo é um puta desespero. É um choque. Demora muito até você cair na real, mas quando isso acontece, quando você por fim aceita, vem os planos... você pensa no quarto do bebê, no nome, nas roupinhas, no rostinho… Você também vira um expert em matemática, contando toda bendita semana. Você escuta o coração do seu bebê nas consultas do ultrassom e percebe que ama aquele pedacinho mais que tudo. É ai que começa a espera e o amor por alguém que você nunca viu, que nunca tocou.
E isso, meu caro, vale mais do que todas as festas, baladas e bebidas do mundo inteiro.

's POV end

Observei todo o nosso trabalho com emoção. Estava tudo finalmente pronto, incrivelmente perfeito. Andei de um lado pro outro, ainda estagnada com tanta beleza. Toda a nossa mistura de cores tinha dado mais certo do que eu imaginava.
Passei os últimos dois meses pesquisando sobre temas para o meu chá de bebê, até que... não tem tema. Simplesmente não tem. Eu, e Callie tivemos diversas ideias e juntamos tudo, resultando em algo incrível de verdade. Os cupcakes estavam perfeitamente decorados e distribuídos na mesa principal, assim como as saborosas rosquinhas. Abracei minhas amigas, dando um suspiro aliviado, e também sorrindo até doer. Não tinha jeito melhor de estrear o primeiro acontecimento importante na minha casa nova.
As convidadas começaram a chegar, incluindo a mãe de , , Callie e . Minha mãe, minha tia e Elena nos ajudaram com as comidas, coisa que eu estava louca pra atacar. Também convidei a equipe de líder de torcida, inclusive Chloe, que não soube dar certeza da sua presença, o que basicamente significou um "não vou não, obrigada", mas a esperança é a última que morre, certo?
- Caraca, olha só pra isso! Minha filha nem nasceu e já ganhou mais presente do que eu ganhei durante a vida inteira! - olhei deslumbrada para todos os presentes que se amontoaram numa caixa que Callie havia conseguido de última hora.
- O meu presente com certeza é o melhor! - Callie sorriu convencida, erguendo o copo de refrigerante que estava em sua mão, junto a um lanche natural. Coisa da tia Marcia.
Foi quase um sacrifício sair de perto das empadinhas que Elena havia feito. Minha sogra tinha mãos de anjo, e isso não é puxação de saco.
- Ok, está na hora de começarmos a melhor parte! - mamãe sorriu sapeca, distribuindo bodys brancos para cada pessoa, trazendo logo após muitas tintas de diversas cores.
Paige sabia desenhar como ninguém. Em apenas alguns minutos, sem aparentar esforço ou dificuldade nenhuma, ela desenhou um tipo de fazendinha. Me surpreendi em como ela conseguiu fazer tanta coisa em um body tão pequeno. Já Sophia, que estava realmente se esforçando, apenas desenhou um... cavalo. É, um cavalo. Ou era pra ser. Tudo bem, o que vale é a intenção.
- Ok pessoal, agora vamos pra minha brincadeira favorita. - Elena se manifestou animada - vai colocar uma colher de papinha na boca de cada uma e vocês vão precisar adivinhar o sabor. Quem adivinhar primeiro, ganha um prêmio!
E lá fui eu. Foi um ótimo treinamento colocar papinha de neném na boca de cada uma, mas a reação de algumas não foi nada boa.
- Isso aqui é sabor maldade! Como vocês tem coragem de dar isso pra uma criança? - Emma questionou indignada, com a língua pra fora indiciando deu nojo. Caímos na gargalhada, ainda mais depois de perceber que ela não tinha sido a única a detestar.
- Acho que é papinha de legumes com carne. - Jess analisou o gosto em sua boca, sendo aplaudida pelo acerto. Seu prêmio foi um potinho cheio de balinhas. Tem algo melhor do que ganhar comida?
Fizemos outras inúmeras brincadeiras como adivinhar o tamanho da barriga, palavra proibida e a pintura de barriga. E não foi a Paige desenhista que fez a obra não, foi com Sophia. O desenho ficou... melhor não comentar.
- Agora vamos a melhor parte! - tia Marcia bateu palminhas animadas, trazendo para o centro da sala a caixa lotada de presentes.
Tinha de tudo. Fraldas, shampoos, sabonetinhos, óleos, pomadas, talco, chupetinhas, e uma mamadeira tão incrível que eu nem mesmo estava com vontade de tirar da embalagem. Era uma roupinha mais linda que a outra e não consegui evitar de pensar em Hope ali, já as vestindo. ergueu sua caixa de presente super delicada em minha direção. Tirei dali um sapatinho lilás e uma touca branca com o nome da Hope nele, e também alguns filmes que fizeram meu coração pular de alegria.
- Você ainda gosta dos filmes da Barbie, então acho que você e ela vão assistir muito. - mordeu o lábio inferior, dando um dos seus melhores sorrisos. Eu pouco me importei se alguém tivesse ouvido que aos 17 anos, eu ainda gostava dos filmes da Barbie. Acho que sempre resta um pouquinho de criança em nós, e vale a pena satisfazer esse pouquinho que restou, seja assistindo Barbie ou brincando de boneca.
- Eu queria te dar algo que fosse tão especial pra você quanto pra Hope, então... - Callie ergueu seu presente largo e bem embrulhado. Não era algo grosso. Estava mais pra um livro. Desisti de tirar o pacote de presente com delicadeza, revelando o diário do bebê que tinha ali dentro, junto a uma cartinha que eu nem mesmo tinha lido mas já tinha amado. Folheei o diário, que em dois meses já começaria a ser usado. Callie acertou em cheio no presente. Claro que tudo ganhado foi incrível, mas ter o diário vindo de uma pessoa especial como ela parecia deixar tudo ainda mais especial. Os momentos de Hope seriam escritos com muito amor.
- Como você está se sentindo? - mamãe perguntou sorridente, e por algum motivo, todos os olhares foram pra mim. Era como se elas esperassem por algum tipo de discurso ou sei lá.
- Eu sei que ser mãe exige responsabilidade, maturidade, paciência, tempo, amor, carinho, dedicação. É muito intenso, porém, quando esse sonho vem antes do esperado e quando não se tem nada planejado, ser mãe exige o dobro de tudo isso e exige também a coragem. É preciso muita paciência pra responder as perguntas do tipo "Nossa você tá grávida? Quantos anos tem?", mas afinal, o que importa a minha idade? O que importa se foi planejado ou não? Filho é filho! - exclamei convicta, com todos os olhares presos a mim - Como se isso já não fosse o suficiente, ainda tem o emocional, o baque da descoberta, saber que dentro de você tem um bebê. Uma pessoinha totalmente dependente de você, frágil e incapaz de se cuidar sozinho. Aí vem o desespero, o medo e é tudo muito difícil, até você conseguir por fim, aceitar os fatos. Mas aí tem esse momento... o momento em que você vê o seu bebê no ultrassom pela primeira vez e sente seu coração bater mais forte e quase sair pela boca. A vontade de ter o bebê nos braços é imensa e você pensa nisso todos os dias. - fechei os olhos, abrindo um sorriso sincero. Um sorriso ansioso. Um sorriso pela minha filha - Estou preparada pra deixar de pensar só em mim e cuidar de alguém.
- Temos certeza que você vai se dar bem nessa nova vida, . - Callie sussurrou carinhosamente, pousando a mão em minha barriga em um carinho gostoso.
Engravidar é um tanto quanto estranho. Pessoas sem intimidade alguma, ou mesmo desconhecidas, já passaram a mão pela minha barriga e dispararam conselhos e os mais descarados palpites. É um fenômeno que atinge todas as grávidas. Basta a barriga crescer para que as pessoas comecem a te olhar diferente e coisas do tipo, principalmente na escola. Além disso, toda mulher prestes a se tornar mãe é bombardeada por um surto consumista. Tem que comprar fralda, brinquedo, bebê conforto. As listas são infinitas. É muita coisa pra se pensar, muita mesmo. Mas tudo fica mais fácil quando se tem pessoas que te amam ao seu redor. Tudo fica mais fácil quando sua família te ajuda em exatamente tudo. Eu gostaria que toda garota que também engravida jovem tivesse a mesma sorte que eu.
A campainha tocou e minha mãe correu pra atender, voltando logo em seguida e dizendo que alguém gostaria de falar comigo. Confesso que soltei alguns xingamentos baixinho, afinal, eu estava no meu glorioso momento de comer, comer e comer. Me surpreendi ao ver Chloe ali, totalmente sem saber como agir.
- Você veio!
- Hm, é... sim, eu vim. - ela respondeu um pouco perdida, com um sorriso fraco. Puxei sua mão com delicadeza para que ela entrasse, mas ela parecia ter travado no começo da sala, sem coragem de dar mais um passo sequer. Foi aí que precisei enrolar um pouquinho mais até ela se sentir um pouco mais confortável com o ambiente. Estar no mesmo local que ainda era estranho pra ela.
- Eu fico feliz por isso, de coração mesmo, Chloe. Você quer comer ou beber algo? Tem muita coisa boa aqui!
- Por enquanto não, , valeu. Olha, eu trouxe isso aqui. Espero que você goste. - ela ergueu uma caixinha pequena, junto com um sorriso mais aberto e animado. Peguei a pequena caixinha, abrindo a boca em surpresa e encanto pela pulseirinha em ouro com o nome de Hope gravado ali. Eu nem mesmo conseguia formar uma frase, então abracei Chloe. Um abraço cheio de carinho e de saudade.
É, ela foi um tanto quanto estupida durante os primeiros meses desde quando descobriu a traição, mas ela também melhorou muito. Muito mesmo, em todos os sentidos. Com o passar dos meses ela se tornou mais alegre, mais falante, fez amizades novas e me cumprimentava sempre que me via. Passamos a conversar rapidamente em alguns dias, e foi em um desses dias que eu descobri mais uma loucura da vida. Algumas pessoas entram na sua vida apenas para ensinar algo. Talvez passar por isso doa, mas quando a dor passa você finalmente enxerga o propósito daquilo. Chloe não queria ter o mesmo contato que já tivemos uma vez, e eu entendia perfeitamente. Ela quis seguir a vida, quis aprender a se levantar sozinha. E ela conseguiu. Eu não fiquei chateada não. Ela finalmente estava bem, com pessoas novas ao seu redor. Entramos na vida dela para a ensinar algo, e ensinamos.
É por isso que precisamos aprender a sobreviver. Porque mesmo achando que nada nunca vai dar certo, isso não é verdade. Chega um ponto da sua vida que todos as coisas que já te colocaram no chão, te fazem forte e você passa a viver de verdade com todos os aprendizados.

- Ei, como foi a noite? - perguntei animada ao ver entrando no quarto, que caminhava e tirava todas as peças de roupa do seu corpo, ficando só de boxer e se jogando na cama.
- Foi ótima, e pelo visto o chá de bebê também. - ele deu um olhar significativo, deixando claro que havia passado pelo quarto da nossa filha e visto aquela montanha de presentes que estava lá.
- Hope nem nasceu e já ganhou tanto presente!
- Ela merece. - as mãos do meu namorado foram parar em minha barriga, fazendo aquele carinho que só ele sabia fazer.
- , ainda não decidimos os padrinhos! - aquilo me atingiu como um raio. Arregalei os olhos um tanto quanto desesperada. Eu tinha esquecido completamente daquilo.
- Nem me fale sobre isso! Vivo ouvindo indiretas sobre isso dos garotos e eu me finjo de morto. Precisamos escolher!
- E se fizermos um sorteio? - sugeri animada com a primeira coisa que se passou pela minha cabeça.
- Mulher, sorteio pra padrinho? Onde já se viu isso? - juntou as sobrancelhas, num tom de voz em uma mistura de confusão e ironia.
- Ué, é um ótimo jeito de resolver sem briga nenhuma, porque se nós escolhermos a dedo, vamos ouvir abobrinha pro resto da vida. Eu voto pelo sorteio. - cruzei os braços determinada com a minha ideia, enquanto ficou em silêncio, provavelmente pensando sobre a minha sugestão.
- É, até que não é uma má ideia.
- Eu sabia! - sorri triunfante, e meu namorado rolou os olhos. Ele aparentava exaustão, e uma pontinha de curiosidade se fez presente dentro de mim para saber como havia sido a noite que o deixou tão cansado - Mas me conte qual é a sensação de ir pra um bar depois de todas essas mudanças.
- É bem estranho. Ainda é legal, claro, mas não é o mesmo que antes. É diferente quando se sabe que tem duas pessoas incríveis te esperando em casa. - seu olhar carinhoso se virou pra mim, me arrancando um sorriso largo e fazendo meu coração bater mais forte. Nada muda. O sentimento só cresce. conseguia me conquistar a cada dia, e meu coração ainda disparava com suas palavras carinhosas. Isso é o amor.
- Como você está se sentindo, ? Eu sei que todas essas mudanças não são fáceis pra você também. - mordi o lábio inferior, seguindo o meu extinto de que aquele assunto devia ser conversado.
- Eu nunca me senti melhor, . Tiramos a sorte grande em ter tanto apoio, mas eu fico pensando em outros casais que acabam sendo discriminados por serem pais tão jovens. Por exemplo, muitas adolescentes são mais responsáveis e mais mães do que muitas mulheres de 30 anos, mas ainda assim, todos a julgam como irresponsável e incapaz. Todo esse julgamento da sociedade é uma merda. Pra ser mãe ou pai não tem idade, só é necessário amar e cuidar mais que tudo aquele ser que você gerou. - desabafou, como se tudo aquilo estivesse entalado em sua garganta há tempos. É, meu extinto não falha.
Não digo muito por mim, porque realmente tivemos muita sorte em receber tanto apoio, mas muitas garotas por aí são descriminadas, humilhadas e até expulsas de casa pela gravidez na adolescência. O julgamento é realmente muito grande e falo isso pelo pouco incomodo que eu passei ao ir ao mercado e ver pessoas sussurrando sobre a minha pessoa. Pessoas na escola me olhando torto como se carregar minha filha em meu ventre fosse um absurdo. Mãe é mãe, sendo jovem ou não, e eu sou apaixonada por essa nova tarefa que vou ter que exercer.
- Você me enche de orgulho, .
- Eu sei que está sendo complicado pra você também, ainda mais agora que está tão perto da Hope nascer. Eu sei que talvez você talvez esteja explodindo de tensão, de medo do que está por vir, de ansiedade, e de peso mesmo. - ele soltou uma gargalhada gostosa, que por sinal, continua sendo meu som favorito. O jeitinho que seus olhos riem junto me encantam cada vez mais. O assunto era sério, mas o medo parecia não me atingir com ao meu lado.
- Quando ela nascer vai começar a maratona de verdade. Você está pronto? - fiz a pergunta que eu já sabia a resposta, mas gostava de a ouvir de novo, de novo e de novo.
- Com você ao meu lado eu estou pronto pra tudo!


Capítulo 34


"E até hoje, eu acredito que, na maior parte do tempo, o amor é uma questão de escolhas. É uma questão de tirar os venenos e as adagas da frente e criar o seu próprio final feliz."

's POV
- Ela me expulsou do quarto e está ouvindo o álbum do One Republic e chorando há mais de vinte minutos! - me manifestei assustado enquanto Marie mantinha o olhar pleno, como se aquilo fosse totalmente normal.
- Isso são os hormônios à flor da pele. Faltam apenas dois meses pra Hope nascer, e é aí que o desespero aumenta, é choro pra lá e pra cá. Se acostume com isso. - ela me encarou calma, ignorando totalmente o meu susto. Mas aquilo não era o pior... O pior era o que estava dentro de mim. O meu medo, o meu desespero, a minha insegurança em falhar como pai. Aquilo precisava sair de dentro de mim, e Marie era a única pessoa disponível no momento.
- Marie, eu... eu não sei se consigo fazer tudo isso. É muita coisa! Eu me mantive forte esse tempo todo, ou pelo menos, tentei, mas eu não sei fazer nada, nada mesmo! Eu não sei nem como limpar a bunda de um neném! Como é que eu vou lidar com tudo isso?
- Olha só quem está surtando. Até que demorou, hein? - ela arregalou os olhos minimamente em falsa surpresa, como se aquilo fosse algo esperado há algum tempo - Sei que é complicado, até porque você não sabia que seria tão difícil lidar com a sua demanda emocional e com a dela. Por isso, converse, desabafe, conte como está se sentindo, e se precisar, se junte e chore com ela. - ela deu um sorriso acolhedor, mas nem as suas sugestões foram capazes de me acalmar. Muito pelo contrário.
- Eu quero ajudá-la, não ficar igual ela! - retruquei indignado, ficando quase desesperado por nem a minha própria sogra conseguir me ajudar com a merda do meu surto.
- Mas você não pode ignorar suas inseguranças também, ! Ela precisa justamente de alguém cuidando dela, e claro que você quer ser essa pessoa, mas você não pode se deixar de lado também, ok? - toda aquela calmaria finalmente se transformou em seriedade. Marie me encarou preocupada e foi nisso que entendi seu verdadeiro ponto. O tanto que estava sendo difícil pra , também estava sendo pra mim. Claro, ela tem dificuldades maiores, mas creio que nosso desespero esteja no mesmo nível.
- Ok, eu acho... - respondi um tanto quanto inseguro, mas finalmente um pouco mais aliviado.
- Você vai se sair muito bem, tenho certeza disso! Você vai aprender a limpar a bunda da Hope e vai até sentir saudade do cheiro do cocô, e eu não estou brincando! - ela disse confiante, tentando segurar a risada ao ver minha careta ao ouvir sua última frase. Como é que sentir saudade do cheiro de cocô de neném é possível?
- Marie, você é doida!
- Me fale isso daqui 5 anos, meu querido! - ela pareceu muito convicta ao dizer sua última frase antes de se levantar com seu prato vazio em direção à cozinha.
Fiquei ali por mais alguns segundos antes de voltar para o quarto, encontrando já recuperada, lendo um livro sobre cuidados com o bebê.
- Você está melhor? - me encostei na porta, observando minha namorada com aquele barrigão incrível.
- Me desculpe por te expulsar. - ela respondeu sem graça, largando o livro e batendo na cama para que eu me deitasse junto a ela.
- Eu entendo, , de verdade mesmo. - usei meu tom mais compreensível, não deixando dúvidas de que aquilo não tinha me deixado bravo ou nada do tipo.
- Você deveria estar dormindo! Essa semana foi puxada com os treinos e amanhã é o grande dia, você precisa descansar! - ela disse autoritária, me dando um selinho demorado e um sussurro de boa noite, desligando o abajur na intenção que aquilo apressasse meu sono, que por sinal, estava longe.
O grande dia. O dia da final do campeonato. Tantos meses, tantos jogos, tantas perdas e tantas vitórias, pra finalmente tudo ser decidido em um jogo só.

(...)


- Eu estou orgulhoso por tudo o que conquistamos até aqui. Estou orgulhoso por ter acompanhado o crescimento de vocês como time e como pessoas. Aquele troféu vai ser de vocês, afinal, foi pra isso que treinamos o ano inteiro! Agora vamos entrar naquela quadra e mostrar como se chuta uma bola no gol! - o treinador gritou confiante, sorrindo de um jeito inédito. Vibramos juntos, num abraço coletivo totalmente desengonçado.
Tivemos o azar de sair do vestiário junto ao time adversário mais antipático até então. Os Patriots.
- Você viu aquela líder de torcida dos Ravens loirinha que está andando com a grávida? Misericórdia, aquilo que é mulher! - a conversa entre um grupinho do time adversário tomou conta dos meus ouvidos enquanto caminhávamos pela quadra. Jackson estava um pouco mais adiantado, sendo incapaz de ouvir o absurdo que estava sendo dito sobre . Fechei meus punhos, respirando fundo e me contendo ao máximo para não enfiar a porrada no bando de imbecil que caminhavam ao meu lado.
- Mas a grávida também é uma maravilha, queria eu ter feito aquela criança! - um deles falou a frase que me enfureceu no mesmo instante. Olhei pro lado, encarando o garoto moreno e alto que havia falado a pior coisa que podia ter saído da sua boca, avançando nele no mesmo instante.
- VOCÊ NÃO ABRE A BOCA PRA FALAR DA MINHA NAMORADA! - o empurrei com toda a força, fazendo seu corpo se chocar contra a parede. O garoto me encarou surpreso, levantando com rapidez, e antes mesmo dele tentar revidar, seus colegas de time o seguraram, o que deu tempo de Jackson e o resto do meu time aparecer ali, com olhares confusos e assustados.
- Que merda aconteceu aqui? - meu irmão perguntou confuso, olhando com a testa franzida para o garoto que resmungava aos gritos para os colegas o soltarem.
- Esse otário me empurrou do nada! - o garoto respondeu nervoso, e me segurei para não cometer algo pior.
- Você estava falando da minha namorada, seu lixo! - gritei em debate, dando um passo à frente e sendo segurado com força por , com um olhar que tentava passar calma.
- Eu nem sabia que ela era sua namorada, porra! - o garoto finalmente foi solto, mas não se atreveu em me enfrentar, apenas continuou tentando justificar a merda do comentário que tinha feito.
- Então agora você sabe! - finalizei com um sorriso debochado, continuando a andar em direção à quadra com o resto da minha turma, fingindo não ouvir as idiotices que o garoto continuou a gritar.
Todo o nosso nervosismo, entusiasmo e ansiedade aumentaram mais ainda quando entramos na quadra, que por sinal, era a da nossa escola, o nosso lugar. Ganhar e honrar nossa escola era o mínimo que podíamos fazer. O time dos Patriots nos olharam feio ao passar ao nosso lado, principalmente Will, o nome que indicava na camiseta do garoto que empurrei. As garotas se organizaram em suas posições, e logo a música My Songs Know What You Did in The Dark, do Fall Out Boy tomou conta dos nossos ouvidos, assim como aqueles incríveis movimentos prenderam o nosso olhar. Mesmo grávida, estava se saindo incrivelmente bem. A semana havia sido complicada tanto pra mim, que tive que treinar pra caramba, quanto pra ela, que teve que ensaiar sua última coreografia como líder de torcida, e pra ser bem honesto, sem puxação de saco, ela estava indo mais do que bem!
Todos aqueles movimentos que eu não sabia o nome acabaram, sendo aplaudidos com muita animação. correu em minha direção, me dando um beijo cheio de felicidade. Callie cutucou meu braço, apontando para o canto da quadra, onde minha mãe, Sophia, Dan e Marie acenavam desesperadamente até chamarem nossa atenção.
- Ei, você achou que não viríamos, né?! - Sophia perguntou com um falso tom de decepção, com as mãos na cintura, balançando a cabeça negativamente. Aquele toquinho de gente arrancou risadas de todos nós, me fazendo esquecer de toda aquela tensão por um segundo.
- Cooper está pra chegar também! - Dan comentou animado.
- Ele vai ficar muito feliz em ter o pai aqui! - meu sorriso se abriu naturalmente, olhando Jackson de longe, que estava com envolvida em seu abraço.
-Você também está feliz em ter o papai aqui, né? - Sophia questionou num tom extremamente curioso, me causando um baque enorme. Franzi a testa, um tanto quanto confuso, buscando a resposta daquela pergunta no olhar de minha mãe, que também estava tão confusa quanto eu.
- O que você quer dizer com isso, filha? - minha mãe tentou disfarçar o tom curioso, recebendo um olhar confuso da própria Sophia. Que confusão!
- O Dan está namorando com a mamãe, então agora ele é nosso pai, não é? Quero dizer... você quer ser nosso pai, tio Dan? - Sophia quase se perdeu em sua própria fala, mais uma vez, arrancando boas risadas de nós. Aquela pergunta inocente fez meu coração quase parar. O coração da minha irmã reconhecia bem quem a amava de verdade, a ponto de querer que Dan fosse seu pai. O olhar dele se acendeu de maneira única, com um sorriso sincero no rosto, emocionado.
- É claro que eu quero, garotinha! - Dan pegou Sophia no colo, dando um beijo estalado em seu rosto. Os olhos da minha mãe estavam marejados, e por incrível que pareça, os meus também! - E você, , quer que eu seja o seu pai também? - ele se virou pra mim com certa insegurança, e aí que eu não tive mais controle de mais nada. Tal pergunta fez meu coração se acelerar de maneira que eu nunca imaginei que fosse possível. Era a última coisa que eu precisava ouvir pra tudo estar completamente completo. Tudo, absolutamente tudo, em seu devido lugar e posição.
- Você já é meu pai, Dan. - foi a pergunta mais fácil de responder, sem medo, sem gaguejar e sem pensar. A verdade simplesmente saiu do jeito mais natural que pudesse sair. Eu sempre quis uma família, e agora eu tenho.
O nosso momento foi interrompido pelo sinal que indicava o começo do jogo. Eu me sentia mais forte e imbatível do que nunca.
A merda começou quando aos 11 minutos tomamos nosso primeiro gol, fazendo a torcida adversária vibrar, quase fazendo meus ouvidos sangrarem. As garotas gritavam animadíssimas, não deixando de abalar pelo gol do time adversário. estava com a bola, conseguindo driblar lindamente os jogadores do Patriots, pronto pra chutá-la em direção ao gol, sendo impedido por Jackson, que roubou a bola sem mais nem menos, dando um lance ridiculamente falho. Os gritos dominavam nossos ouvidos. Aparentemente eu não era o único que estava confuso com a atitude de Jackson, mas continuamos do mesmo jeito.
Conforme jogávamos, mais tínhamos certeza de que Jackson estava totalmente fora de controle. Ou ele perdia as oportunidades de chutar a bola, ou tentava roubá-la de qualquer um, até mesmo de nós do time.
- Cara, que porra que você está fazendo? Já é a segunda vez que você me atrapalha! - gritou nervoso para Jackson, que fingiu não ouvir.
Passados 15 minutos que mais pareceram 15 anos, o nosso primeiro gol saiu graças aos toques de , que conseguiu fugir de Jackson, acertando o gol em cheio. Respirei um tanto quanto aliviado, abraçando em comemoração, enquanto meu irmão apenas se manteve longe, aparentemente com a cabeça em outro lugar. Não tive tempo de dizer uma palavra sequer, já sendo apitado para voltar para a devida posição.
Driblei um fulano que estava determinado a tirar a bola de mim, e pra não correr riscos, a chutei para , que foi impedido de chutar por Will, e logo em seguida, Jackson tentou a todo custo tirar a bola do garoto, que correu e correu, e juro que tentei impedir que aquilo acontecesse, mas o gol foi certeiro.
Mais uma vez.
- PUTA QUE PARIU, JACKSON! - foi a minha vez de gritar, já alterado pela raiva que meu irmão estava me causando. Que diabos ele estava pensando?
- Você quer que a gente perca, porra? - resmungou junto, com uma expressão totalmente brava.
A bola estava no meu pé novamente, e nem mesmo me aproximar do gol eu estava conseguindo. A pessoa mais próxima era Jackson, e querendo ou não, foi a melhor opção. Ele podia muito bem fazer uma ótima jogada com a bela posição que ele estava, mas não. O ápice da incompetência de Jackson foi ele conseguir errar o chute na cara do gol, chutando a bola praticamente nas mãos do goleiro dos Patriots, que pegou a bola com tanta facilidade que até soltou uma risada debochada.
Depois disso... foi basicamente cada um por si. Não conseguimos entrar num consenso de jogadas, o que nos prejudicou bastante, embora tenhamos tentado nos virar do nosso jeito. Mas então... o segundo gol dos Patriots chegou graças à jogada ensaiada deles, que foi capaz de me enganar direitinho.
O apito do juiz foi um puta alívio para acabar com a humilhação por ora. Eu estava pronto pro esporro. O treinador nos convocou aos gritos.
- Alguém pode me dizer pra onde foi todo o treino de vocês? Esse jogo está ridículo! Vocês estão feito barata tonta sem saber o que fazer! - ele estava furioso. Não era pra menos.
- Jackson está desesperado por todas as bolas! Não da pra fazer nada com ele em cima o tempo inteiro. Parece até que ele tá jogando pro outro time! - se manifestou emburrado, e logo os comentários foram aumentando.
- Ei, fala direito! - Jackson não tentou se defender das acusações, mas não estava gostando nenhum pouco de ouvir todas aquelas críticas, gritando de modo nervoso, dando corda pra começar uma possível briga.
UMA BRIGA DE UM MEMBRO DOS RAVENS CONTRA OS RAVENS. AONDE JÁ SE VIU ISSO?
- AH NÃO! Ninguém vai discutir agora não! - o treinador gritou de modo estrondoso, nos calando no mesmo segundo - Se vocês perderem, ok. Mas não percam desse jeito, jogando sozinhos e tirando chances uns dos outros na quadra. - ele finalizou com o olhar entre esperançoso e decepcionado, deixando aquela reflexão para cada um de nós.
- Nós vamos ganhar, treinador. Eu prometo! - sorriu otimista, pegando uma garrafa d'agua e se sentando no banco ali próximo. Jackson estava andando entre os cantos da quadra, e por mais que eu estivesse com raiva, eu sabia que tinha algo errado. Me aproximei sem medo, podendo observar de perto sua expressão decepcionada.
- Cara, o que está acontecendo com você?
- Não é nada. - respondeu seco, sem nem me olhar.
- Jackson, você não me engana! Vamos, diga!
- Meu pai não está aqui, ok? É isso. Ele disse que viria e não veio. - aquilo saiu fácil demais, o que deixou óbvio que o incomodo por Cooper não estar ali era tão grande que ele não fazia questão de esconder.
Mas Cooper estava ali.
- Então acho melhor você desfazer esse bico e começar a jogar direito porque seu pai acabou de chegar! - os olhos de Jackson se arregalaram no mesmo instante, e então apontei para o seu pai, que estava entrando na quadra com pressa, provavelmente não querendo perder nem mais um segundo daquilo. O sorriso de Jackson se formou no mesmo instante, me dando um abraço de lado rápido.
- Garotos, venham aqui! - gritou com ansiedade, fazendo sinais com a mão para irmos rápido. Nos aproximamos, podendo observar de perto uma lousa sendo sustentada por um tripé ali no meio de nós e uma vareta na mão de , que esperou todos nós ficarmos em silêncio e voltarmos nossa atenção apenas pra ela - Ok gente, esse é o plano para o jogo! - ela bateu a vareta na lousa que só Deus sabia de onde ela tinha tirado, onde estava escrito em letras grandes a palavra "GANHAR". Foi impossível não rir daquele jeito autoritário dela, que nos encarava séria - E eu estou decepcionada com você, Jackson Tuck. Se você não jogar direito e vencer esse jogo eu juro que você nunca mais vai beijar a minha boca. - ela fez uma séria ameaça, e todos nós fizemos um "uuuh" em coro, enquanto Jackson ria envergonhado.
- Ô minha princesa, empresta esse negócio aqui pra mim. - se levantou rapidamente, apagando o que estava escrito na lousa com a mão, pegando o pequeno pedaço de giz que tinha ali e desenhou horrivelmente um esquema de jogo, se pronunciando sobre o mesmo - Os Patriots tem uma defesa bem merda pelo o que eu pude perceber, e todas as jogadas deles são combinadas com os mesmos jogadores, então se nós atrapalharmos eles nisso, vai ser fácil chegar no gol! - ele bateu a vareta no seu desenho ridículo que indicava o gol com animação, provavelmente se sentindo um gênio. E ele realmente foi um.
- Gente, desculpa por praticamente foder o time no primeiro tempo. Agora está tudo bem, vamos jogar em equipe novamente! - a sinceridade de Jackson era nítida, e o olhar apaixonado de foi impagável. É o amor...
- Ô gente, escolhe um papel aqui rapidinho! - chegou eufórica, com quatro papéis pequenininhos em sua mão.
- O que é isso? - questionou curioso e confuso.
- Em um desses papéis está escrito "Eu vou ser padrinho da Hope maravilhosa", e então finalmente teremos o padrinho da minha filha. Isso também vale pra vocês, meninas. - ela abriu a outra mão em direção à e Callie, com apenas dois papéis. Ela falou como se tudo aquilo fosse a coisa mais normal de se fazer no momento, deixando alguns incrédulos por sua loucura.
Eu sabia que aquilo ia acontecer brevemente, só não sabia que iria acontecer daquela maneira. Eu nem mesmo fui consultado!
- , você nem me contou nada disso! - me manifestei tão surpreso quanto o resto do pessoal.
- Eu não sabia qual era o momento mais apropriado pra isso então... vai aqui mesmo. Você não está bravo, né? - ela finalmente se tocou que aquela ideia podia me provocar uma reação tão agradável, mas eu nem mesmo conseguia ficar bravo com ela. Aquele rostinho redondinho pelo inchaço da gravidez a deixava mais adorável que o normal, o que contribuía muito pra ela conseguir tudo o que quisesse.
- , isso é algo muito delicado pra se decidir assim, sua insensível! - forçou a voz em decepção, fingindo querer chorar.
- Você quer decidir quem serão os padrinhos da Hope num sorteio por papeizinhos? Você é maluca! - Jackson opinou sem acreditar naquilo, rindo de nervoso.
- Se eu não for o padrinho não vai valer! - resmungou, sendo o primeiro a pegar um papel da mão de , e logo em seguida todos fizeram o mesmo.
- EU SABIA! AI CARAMBA, NÃO ACREDITO! - soltava gritos escandalosos enquanto pulava de alegria, enquanto Callie cruzou os braços, claramente frustrada.
- Sinto em te informar, , mas você não vai ser padrinho da querida Hope. - deu uma piscadela provocativa, abrindo o papel que indicava sua vitória.
- Não valeu! - fechou a cara, se juntando à namorada, compartilhando a mesma frustração.
- Desculpa gente. - sussurrou sem graça, entre feliz e sem reação pelos que perderam o sorteio.
- Essa menina vai gostar mais de mim, vocês vão ver só! - comentou num tom convencido, aparentemente sendo o único que não estava revoltado com o resultado.
Uma pequena discussão começou sobre de quem Hope gostaria mais e o porquê, até que fomos alertados sobre o fim do nosso descanso de 15 minutos, indicando o começo do segundo tempo do jogo.
- Ok pessoal, vocês estão prontos? - o treinador nos juntou numa rodinha, perguntando sério e ouvindo um "sim" em coro em resposta - Jackson Tuck, você está melhor? - ele deu um olhar significativo para meu irmão, que assentiu positivamente no mesmo instante - Agora vamos virar esse jogo, ok? Mostrem o que vocês sabem fazer de melhor! - ele finalizou com um grito incentivador, um sorriso confiante, e um olhar cheio de expectativas. Não podíamos decepcioná-lo.
O som do apito fez nossas pernas se movimentarem no mesmo instante. Corri até alcançar a bola nos pés de um dos jogadores adversários, sentindo toda aquela adrenalina percorrer pelo meu corpo. Foram necessários alguns dribles pra manter a bola no meu pé, que foi roubada pelo imbecil do Will, que riu debochado antes de correr loucamente em direção-geral ao gol, e por sorte, sendo impedido por .
estava com a bola no pé por um bom tempo, chutando para Jackson que fez finalmente um gol certeiro, e a primeira coisa que meu irmão fez foi mostrar o dedo do meio para o goleiro que no primeiro tempo riu de sua jogada, e que agora, tinha sido goleado.
Empatado.
A bola estava rolando novamente, e por algum motivo parecia estar mais difícil conseguir pegá-la. teve a sorte de chegar praticamente na cara do gol, chutando a bola com força.
Escanteio.
Voltei para o meu lugar, cada vez mais nervoso. Os minutos passavam e nada. Não podíamos ir para os pênaltis.
- Ei, ta na hora de executarmos o meu plano. - gritou de modo que só o nosso time escutasse, correndo novamente para a sua posição.
Faltavam dois minutos. DOIS!
Eu passei para Liam, que estava mais próximo, mas ele foi bloqueado, perdendo a bola para o mesmo grupinho de idiotas que faziam tal jogada. correu junto com , fingindo uma jogada que confundiu Will, que estava com os pés na bola, fazendo então ele cair, dando oportunidade para pegar a bola, chutando diretamente para mim.
Eu tive um segundo para olhar para , que torcia aos gritos e com um sorriso gigante no rosto. Estava na hora. Olhei o relógio, indicando os 30 segundos finais.
Eu corri.
E corri muito.
Os Patriots também correram desesperadamente para tirar a bola do meu pé, mas fui mais rápido. Chutei com toda a força para o gol, prendendo minha respiração e fechando os olhos num ato involuntário, só respirando aliviado e os abrindo ao ouvir todos os gritos de comemoração. A bola tinha entrado e quase tinha levado o goleiro e a rede junto.
Muitos gritos, os barulhos de instrumentos que eu só tinha descoberto que estavam ali naquele momento, e muita, mas muita alegria. Minha garota correu em minha direção naquele uniforme azul que a deixava incrivelmente sexy, com gritos alegres.
- Vocês ganharam, meu amor!
- Nós ganhamos, gatinha. - enchi seus lábios com inúmeros selinhos, olhando para o lado e vendo Will com um olhar frustrado, e foi a minha hora de abrir um grande sorrisão, o melhor que pude dar.
Eu ganhei o campeonato com os melhores amigos do mundo, junto com a melhor equipe de torcida que podia existir. Também ganhei uma namorada incrível e uma filha pra lá de bagunceira, já que ela não parava de chutar um minuto sequer.
Eu ganhei tudo.

Ficamos pouco tempo na festa de vitória dos Ravens e logo voltamos para casa, porque cá entre nós, não tem nada melhor do que ficarmos só entre nós.
- Cara, da pra fazer um castelo com todos esses pacotes de fralda. - saiu do quarto de Hope com os olhos arregalados, e as gargalhadas foram certeiras.
- Vamos ser os melhores padrinhos do mundo todo! - passou pelo amigo e os dois deram um high-five animado.
- Eu ainda não acredito nessa palhaçada! - Callie bufou indignada, com um bico enorme.
- Supera, menina! - praticamente ordenou, logo desmanchando aquele tom sério em risadas escandalosas, logicamente zombando da perda de Callie.
- Vai se foder, vai. - ela colocou um ponto final naquela conversa, ainda mais emburrada, se jogando nos braços de , que estava sentado ao lado dela.
Tem essa coisinha no meu peito. Essa sensação. Algo que eu nunca senti em toda a minha vida até finalmente ceder, aceitar, me esforçar e perceber que eu sou um ser humano melhor graças a todos que estavam ali presentes. É a sensação de amor, afeto, companheirismo e alegria.
Eles são tudo o que faltava em mim.
's POV end

Jackson's POV
Eu achava estranho ver na casa de tantas vezes. Claro, eu não tinha o direito de achar absolutamente nada da relação dos dois porque eles se conheciam desde... hm... é... sempre. Mas ainda assim, era estranho pra mim, mas não foi difícil para me acostumar. A parte mais complicada foi conhecer os pais da . Eu nunca tinha feito aquilo na vida.
Então tem dias como esse... em que eu janto com e seus pais e com de brinde, e pra completar, muitas vezes com Sophia junto.
Definitivamente a palavra "normal" provavelmente nunca mais faria parte da minha vida.
- , se você não descer em dois minutos, quem vai sair com Jackson sou eu! - minha sogra berrou do pé da escada na intenção de apressar a filha, que por sinal, estava demorando mais que o normal. Ela me lançou um sorriso divertido, e era impossível não sorrir junto. Ela gostava muito de mim e eu era imensamente grato por essa glória. Imagina uma sogra maluca?
Ih, falei sogra!
- Eu posso sair com vocês dois? - Sophia juntou as mãos e fez um biquinho que eu já tinha sido alertado sobre os riscos de ser feito de bobo por aquilo. Era realmente fofo.
- já está vindo te pegar, Soph. Prometo que da próxima vez você sai com a gente, ok? - torcia mentalmente para que minha irmã não fizesse nenhum tipo de birra ou nenhum escândalo pela minha resposta, e por sorte Sophia era simplesmente a criança mais educada, tranquila e compreensível do mundo inteiro, totalmente o contrário do que eu fui durante a infância.
Ok, eu disse "minha irmã". Ainda estou chocado por isso, mas já estou me acostumando bem.
- E eu? Posso sair com vocês? - , que estava sentado no sofá á minha frente, fez um biquinho ridículo, logo rindo de si mesmo. Sophia sentou ao lado dele, encostando a cabeça em seu colo, recebendo um cafuné gostoso.
Ela é, definitivamente, a coisa mais adorável do mundo, enquanto é... bem, ele é o , garoto que beijava a minha namorada antes de mim, e que agora janta conosco e pega carona com no final da noite. Se isso é estranho? Não, nenhum pouco. Não mais.
E eu falei namorada.
Beleza.
- Sai fora, você não. Nunca. Jamais. - pontuei minhas falas com bom humor, e me olhou com uma falsa vontade de chorar.
Não, não prestamos quando nos juntamos.
finalmente desceu as escadas correndo, sorrindo ao ver nossas palhaçadas. Nos despedimos de todos ali e fomos ao lugar que considerava ser o seu favorito. Terraço da Skinder Empire. Pra ela, nunca perdia a graça.
- No que você está pensando? - observei aquele rostinho que denunciava sua falta de atenção à realidade enquanto subíamos para o terraço.
- Nada demais, só pensando nas provas para a faculdade. - ela tentou dar um sorriso simpático, mas simplesmente não rolou. Aquilo estava a preocupando.
- Você vai se dar bem, . - o barulhinho do sino nos indicava o fim da subida, abrindo a porta do elevador, nos liberando em um corredor onde era preciso subir um lance de escada até chegarmos, de fato, no terraço.
- Eu sei que vou. Bem, eu espero, mas é que eu... - ela simplesmente travou, sendo incapaz de terminar aquela frase.
- Você o que?
- Eu quero ir pra Central Carolina Community College! Não é tão longe daqui, mas dependendo de onde você quiser ir, vai ser longe sim, e aí a gente vai... você sabe. - e mais uma vez, ela foi incapaz de dizer qualquer coisa. Aquele olhar inseguro e decepcionado pelo o que o futuro pudesse fazer conosco foi horrível de se ver. A tristeza não combinava com ela.
Eu acredito em amor verdadeiro. Ah, e como! Basta apenas uma pessoa pra mudar seu jeito de pensar, de agir, de mostrar e de sentir. Basta apenas isso pra te fazer enxergar que tudo é mais bonito quando se tem alguém do lado. Eu sei que a vida não é fácil e nem sempre vai ser tudo um mar de rosas, mas ter alguém do seu lado, e saber que essa pessoa gosta de você na mesma intensidade... torna tudo mais fácil. Eu queria manter assim.
- Sabe, a melhor parte do meu dia é quando eu te vejo. Eu acordo toda manhã e a primeira coisa que quero fazer é ver seu rosto e esse sorriso que deveria ser ilegal. Eu quero continuar tendo esse sentimento. Eu quero continuar tendo você, . - o vento batia levemente em nossos rostos, deixando o momento ainda mais único. A boca dela se abriu algumas vezes, sem conseguir pronunciar uma palavra sequer, se tornando uma cena adorável de se ver. Minha pausa teve fim ao perguntar a coisa que eu mais tive certeza em querer em toda a minha vida - Você quer namorar comigo? - fiz a pergunta que eu já queria fazer há certo tempo e finalmente havia achado o momento perfeito. Passei a ficar nervoso com a demora que a garota teve pra se pronunciar, como se ela estivesse em estado de choque, sem acreditar no que tinha acabado de ouvir.
- É claro que eu quero! - seu sorriso se abriu, seu olhar se iluminou e seu corpo se chocou contra o meu num abraço gostoso. Meu coração se acelerou de tanta alegria, totalmente eufórico e dessa vez, eu quem não estava acreditando que tal graciosidade estava acontecendo na minha vida.
- A propósito, eu também quero ir pra Central Carolina Community College. Eu queria fazer surpresa, mas não aguentaria ver você agoniada achando que eu seria maluco de deixar nosso relacionamento acabar por distância. Agora você pode ficar tranquila, meu amor, porque nossos problemas estão resolvidos. - joguei aquela chuva de revelações sobre a minha namorada, que possivelmente poderia ter algum colapso por tanta informação em tão pouco tempo.
Namorada.
Finalmente namorada.
É tão bom dizer isso.
- Você não existe, Jackson Tuck! - aquela gargalhada que me fazia ir ao paraíso tomou conta dos meus ouvidos, e na minha frente eu podia ver uma totalmente extasiada pela felicidade que eu podia enxergar em seus olhos. Felicidade que, também era minha - Estamos em um daqueles momentos em que tudo é tão perfeito, que eu estou quase ficando triste porque parece que nada pode ser melhor que isso aqui. - ela jogou a cabeça pra trás, respirando fundo como se quisesse guardar cada lembrança daquilo. Do nosso momento. Toda aquela felicidade transbordava. Um sentimento incrivelmente único, que me levava a dizer as três palavrinhas que estavam na ponta da minha língua. As três palavras que eu estava totalmente destemido em dizer.
- Eu amo você, sabia?
- Jackson, você... você não pode ficar fazendo isso, ok? - seus olhos marejaram, e aquilo parecia ser demais para os seus ouvidos. No bom sentido. Meu sorriso se alargava ao ver o quão poderosa as minhas palavras foram. O quanto um "eu te amo" pode mexer com a cabeça de uma pessoa, assim como o amor pode transformar um ser humano - Eu acabei de falar que nada poderia ser melhor que isso e aí você fala que...
- Que te amo, porque eu amo mesmo. - fiz a interrupção mais necessária até então, em toda a minha vida. Eu a amava. Amava muito. Ela precisava ouvir quantas vezes fossem necessárias até aquilo entrar em sua cabeça.
- Isso é muito bom, porque pra sua sorte, eu amo você também. - eu gelei. Foi a minha vez de sentir todo aquele misto de sentimentos que Deus... eu nem sabia que um coração podia sentir tanto. Uma lágrima escapou, escorrendo pelo rosto da minha garota. Uma lágrima de alegria pelo nosso momento. Por nós.

Algumas semanas depois...

Um final de semana inteiro de estudos. Isso mesmo, estudos. O SAT chegando e as provas finais da escola nos obrigaram a isso.
- , você entendeu mesmo? - fez pela décima vez em menos de cinco minutos a mesma pergunta. Ela havia explicado geografia e um pouco de biologia pra , que estava completamente exausto.
- Entendi, agora chega. Não aguento mais. São sete na noite e nós ficamos enfurnados nessa sala o dia todinho! Eu preciso tomar um ar e ir pra minha cama urgente! - ele se declarou oficialmente cansado, com a voz totalmente sonolenta e irritada.
- Da pra acreditar que tudo isso já está acabando? Nós vamos pra faculdade e... é incrível! - Callie se manifestou pensativa, porém atenta a cada um de nós. Ela parecia não acreditar que estávamos perto de enfrentarmos a maior mudança de nossas vidas, e pra ser sincero, nem eu.
- Passamos por tantas coisas nesses meses juntos! - entrou na onda, acompanhando o pensamento da namorada e se manifestando em voz alta.
- Eu que o diga! - passou as mãos pela barriga redonda, com os olhos minimamente arregalados.
- Nós não vamos perder contato, né? Não vamos ser aquelas pessoas que vão pra faculdade e esquecem uma das outras, certo? - parecia desesperado, aflito por uma resposta rápida. O assunto "faculdade e mudanças" era algo delicado pra ele e disso todos sabiam, mas a cada dia que passava e o nosso fim na escola se aproximava, o desespero dele aumentava.
- , eu não te esqueceria nem se quisesse! - Callie falou o que provavelmente todos pensavam. É impossível esquecer o menino . Impossível mesmo. MESMO!
- Claro que não vamos mais ter tanta disponibilidade como temos agora, mas espero que a distância deixe todo esse amor e união entre nós ainda mais forte. - completou com um olhar apaixonado para , e não teve como não olhar para a minha namorada também.
- Pessoal, vocês não se tocaram que somos tipo aqueles personagens de Sense8? Vamos sempre estar juntos de alguma forma! - minha namorada se manifestou com um tom de voz óbvio junto a um sorriso no rosto. se mostrou mais tranquilo, rindo da palhaçada da garota.
É, não tem jeito. Não vamos nos separar nem por um decreto.
Jackson's POV end

's POV
Se existe uma semana pior do que a de provas eu desconheço. Pouco descanso, muito nervosismo e muita coisa ao mesmo tempo. As maluquices da prova de biologia ainda rondavam pela minha mente. Cruzes.
Mas chegou o pior. O temido SAT.
Encaramos o prédio que nos aguardava com a prova que basicamente decidiria nossas vidas. reclamava incansavelmente da dor nas costas, e por mais que eu quisesse correr dali pra levá-la ao massagista se fosse possível, minha maior preocupação era com . Ele se sentou no gramado do grande prédio, com a expressão mais nervosa que eu já tinha visto.
- Se eu falar que tudo vai ocorrer bem, vai adiantar algo? - me sentei ao seu lado, observando todas aquelas pessoas que estavam ali para terem seus futuros garantidos ou não.
- Na verdade não. Tente outra coisa. - ele nem sequer me olhou, apenas continuou com o olhar preso em um ponto fixo e provavelmente se afundando nas coisas bizarras que passavam pela sua mente.
- , entre trancos e barrancos você foi o que mais estudou entre nós! Todo esse esforço já faz de você um vencedor! - afirmei com toda a confiança que tinha em meu coração. Jesus, como alguém como ele consegue se sentir tão incapaz sendo que é exatamente o contrário disso?
- E se der errado? E se eu não conseguir? - sua insegurança continuou falando mais alto.
- Tudo nessa vida acontece por algum propósito que desconhecemos até o momento exato em que ele ocorre. E, meu amigo, até chegar nesse momento é um porre... Se der errado, ok. Tudo precisa dar errado pra poder dar certo. É como um arco-íris que aparece depois da tempestade.
- Minha cabeça está à mil. Eu só quero fazer essa prova logo e dar o fora daqui. - ele bufou nervoso, passando a mão pelo rosto e balançando a cabeça, tentando se livrar daquela sensação tão terrível.
- Eu sei que isso parece ser demais, até mais do que você pode aguentar. É complicado e eu entendo, mas pense que depois de tudo isso vai ter algo incrível te esperando. Você vai pra faculdade e vai se tornar um advogado bom pra caralho! Só não desanime, cara. Você é capaz de tudo nesse mundo! - fiz questão de olhar diretamente em seus olhos, deixando claro que todo o meu apoio era real. Aquele sorriso contagiante finalmente se abriu, assim como o meu por ter cumprido a minha pequena missão do momento.
- , se você fosse solteiro eu casava contigo agora mesmo! Obrigada de verdade! - e ali estava o que todos conheciam e amavam. Alegre, brincalhão e que não se deixa abalar.

- Depois de um dia cansativo como esse você ainda tem disposição pra isso? - adentrei o quarto depois de um banho relaxante, encontrando praticamente todo o guarda roupa de jogado no chão.
- , eu não tenho nenhum vestido bonito pra formatura! Nenhum mesmo! Nada entra com esse barrigão! - minha garota resmungou feito uma criancinha, jogando a última peça que estava em suas mãos no chão junto ás outras.
- Cala a boca e vem deitar, vem. Ainda faltam três semanas pra formatura e essa é a nossa última na escola. Precisamos aproveitar! - fui até ela, a puxando delicadamente até ela cair na cama, deixando aquela pilha de roupas jogadas no chão de qualquer jeito. Não importava. Ela precisava descansar, assim como eu.
- Quem diria, não? Escola acabando, a ansiedade pela faculdade, um bebê chegando... - aquele tom de voz ansioso nunca perdia a graça pra mim. Passei meu braço em volta da minha namorada, pousando minha mão naquele barrigão que tinha o melhor presente do mundo.

(...)


Sabe a união que eu tenho com os meus amigos? Então, ela se expandiu durante a semana inteira. Todos nós, sem exceção, nos unimos pra fazermos nossa última semana, a melhor de todas. Com isso, eu quero dizer; cada vez que nosso professor de artes entrou em nossa sala, cantamos parabéns pra ele. Não, não foi aniversário dele em nenhum desses dias, mas foi engraçado.
Combinamos com a turma toda de que quando o professor de química sentasse, todos levantassem. Infantil, né? Mas também foi engraçado pra caramba.
Na quarta feira, se escondeu do professor de geografia atrás da porta, dando um baita susto no homem. Foi hilário.
Libertamos a criança que estava dentro de nós, aprontando feito ensino fundamental, mas valeu a pena. Vivemos o momento, vivemos a união, vivemos tudo. Juntos.
Até hoje. O oficial último dia. O fim é a coisa mais antiga que existe. Sabemos que é necessário e que o fim sempre chega.
Dizem que a melhor época da sua vida é quando você está na escola, e vou ser obrigado a concordar. É o lugar onde você conhece seus inimigos, seus amigos, onde você pode rir, e onde se consegue um lugar especial como a sala de teatro. Claro, essas coisas são possíveis na faculdade também, mas na escola... parece que é tudo mais especial.
É na escola que aprendemos a lidar com o outro. É na escola que nos ensinam que não somos os únicos nesse mundo. Nos ensina a ter consciência do que é estar no mundo e te prepara para a interação com ele. Aprendemos que existem diferenças. É na escola que você entende porque tem letras no meio das contas de matemática. Valeu a pena? Sim, valeram a pena os dias de angústia, de cansaço, de tédio e exaustão. Valeram a pena todos os passos pelo caminho traçado. Cada momento vivido nessa louca correria em busca de um objetivo em comum. Mas sair da sua área de conforto é preciso. Não podemos esquecer que, embora a alegria do presente exista, o futuro reserva outras oportunidades. Deixar para trás momentos plenos de união e companheirismo passados na escola é doloroso, mas não podemos nos estagnar no tempo. É necessário seguir em frente.
- Ei, eu estava te procurando. - estava encostada na parede do corredor que dava acesso às quadras onde treinávamos.
- Só estou me despedindo. - ela suspirou alto, sem nem mesmo tentar dar um sorriso. Ela estava triste.
- Eu já entendi. Foi tudo muito especial, né? - me encostei na parede junto a ela, sentindo o cheiro dos seus cabelos que foram lavados naquela manhã.
- Até demais. Foi aqui que eu senti raiva, tristeza, alegria, nervosismo. Tudo. - ela se virou com os olhos marejados, abrindo um sorriso emocionado - Eu me lembro daquele dia que você deixou seu celular comigo e Sophia ligou dizendo que sua mãe estava passando mal. Você foi um grosso comigo por perguntar sobre ela depois. - ela riu daquela memória que, mesmo não sendo a melhor, foi importante pra nossa história.
- Ainda bem que as coisas mudam, né? - ri junto, passando meu polegar naquelas lágrimas que insistiram em cair dali mesmo em meio à sua risada.
- Você tem noção que um dia vamos acordar e sentir falta disso tudo? - ela deu uma olhada geral no local, claramente se referindo a todos os momentos que passamos ali e na escola em si.
- Tudo bem. Vai estar tudo aqui. - bati a não no lado esquerdo do peito, abrindo o meu melhor sorriso. A gente sai da escola, mas as memórias ficam em nosso coração, assim como todas as sensações que sentimos pela primeira vez e até os sustos que levamos por tal acontecimento. Estará tudo guardado num lugar que ninguém pode tirar.


(...)


Dia Da Formatura.

A gravata apertada me incomodava, mas eu mantive a boa pose para as fotos, assim como , que mesmo com algumas dores manteve o brilho no olhar junto ao vestido azul detalhado que estava em seu corpo que combinou perfeitamente com seu tom de pele. Fomos instruídos até o lugar onde colocamos nossa beca, e logo em seguida toda aquela melação de frases fofas em colação de grau começou.
Ah, Callie seria a oradora. Ela passou as últimas duas semanas se matando pra escrever um discurso bom, e todos nós tínhamos certeza de que estava ótimo, mesmo ela se queixando incansavelmente que não estava bom a nossa altura. Coisa da cabeça louca dela.
O salão lindamente decorado se escureceu, dando focos de luz apenas em nós formandos, que estávamos sentados ali no meio, e no palco, onde estava nosso paraninfo, o professor de artes.
- Boa noite a todos! Eu estou honrado por ter sido escolhido para ser o paraninfo dessa turma incrível que eu tive o prazer de ensinar. Foi uma luta e tanto, não? Cada aula, cada discussão, cada sentimento, cada sufoco, cada alegria, tudo resultou nesse momento. Essa noite é sobre vocês. É sobre o quão bem fizeram uns aos outros durante todos esses meses, inclusive a mim. Eu não apenas ensinei, como também aprendi com vocês. Me sinto orgulhoso e completo por ter acompanhado o crescimento de cada um, e de principalmente ver o quão capazes e incríveis vocês se mostraram a cada dia que se passou. O que vocês estão alcançando hoje é uma pequena parte do que ainda podem conquistar com seus talentos. O talento, a força de vontade e a persistência trouxeram todos vocês até aqui. Eu, e todos os professores esperamos que esta vitória seja o início de muitas outras conquistas na vida de vocês. - ele discursou com entusiasmo, finalizando com um sorriso orgulhoso, sendo aplaudido por longos segundos.
Nosso diretor exagerou um pouquinho nas palavras e finalmente deu início à colação de grau. Nossos nomes foram chamados e aplaudidos incansavelmente. Passar por aquele palco foi melhor do que eu imaginei. A sensação de dever cumprido era grande, assim como a minha felicidade. Mais uma etapa cumprida!
E aí chegou a vez dela de brilhar. Callie maluca-paranóica-divertida Amalia Bruckner. Suas mãos trêmulas eram estavam visivelmente nítidas, assim como o seu nervosismo.
- ARRASA, AMOR! - deu um grito alto, não poupando o ouvido de ninguém que estava ali presente no salão. Nossas risadas tomaram conta do local por alguns segundos pelo olhar confiante e apaixonado que ele olhava para a namorada. Se esse não é o casal mais incrível do mundo, eu não sei qual é.
- Distintos convidados, pais e formandos. Dia de Formatura. O dia em que oficialmente deixamos o refúgio do colegial e começamos realmente nossas vidas. Isso é um tanto quando assustador, né? - Callie gargalhou fraco, dando um suspiro nervoso, olhando para toda aquela plateia que a encarava em silêncio e ansiedade. Ela apertou os olhos e abriu um sorriso, dando continuidade ao discurso que ela escondeu de nós por semanas até então - É assustador porque queremos que nossa vida seja incrível. Todo mundo quer isso, mas nem todos fazem por onde. Nossas vidas são definidas com os sonhos que perseguimos e com as escolhas que fazemos. Está na hora de sermos as pessoas que sempre sonhamos ser. - ela deu uma pequena pausa, olhando para todas aquelas pessoas que estavam acompanhando nossa etapa concluída conosco, e o sorriso que se formou em seus lábios foi inevitável - Eu sei que dói. Dói muito. Dar adeus a tudo isso é mais difícil do que imaginávamos. Foi na escola onde aprendemos sobre exatamente tudo. Claro, nada disso seria possível sem nossos professores, que mesmo vivendo em pé de guerra conosco, nunca desistiram. A missão de vocês está cumprida, e agora a nossa também está! Foram anos caminhando lado a lado, mas agora é hora de dar adeus ao lugar que nos formou quem somos hoje. A escola foi onde tudo ficou melhor e mais seguro. A escola foi o nosso lar. Agora, mesmo indo para caminhos diferentes sempre vamos ser parte da vida um do outro, e é isso o que faz meu coração transbordar de gratidão. - Callie finalizou chorosa, sendo aplaudida de maneira estrondosa. A abraçamos no momento em que ela desceu do palco, e juro, tinha lágrimas de todo mundo ali no meio.
Depois de mais alguns minutos de falatório, jogamos nossos chapéus de formandos para o alto e tiramos a beca que cobria nossos trajes chiques. A parte que todos estavam esperando havia chegado. Primeiro comemos, porque ninguém é de ferro, e então... dançamos. Dançamos muito mesmo, até eu, que nem mesmo sabia nada. As únicas coisas que me importavam estavam ali. Minha família e meus amigos, exatamente tudo o que eu precisava.
O melhor da vida é poder enxergar que você é merecedor do que tem. O melhor da conquista é o esforço que você teve que fazer para alcançá-la. Lembre-se de ser feliz, porque você merece ser independente de qualquer erro do passado. A vida é linda!
Eu estava, sem dúvidas, tendo as melhores horas de toda a minha vida.
- Ei, aqui está a sua carta daquela brincadeira maluca que inventou. Chegou o fim das aulas, ou seja, hora de abrir as cartinhas! - Callie ergueu um envelope azul claro com um sorriso orgulhoso, e não perdi tempo para envolvê-la em um abraço cheio de gratidão. Aquela criatura que era uns 15 centímetros menor que eu mudou minha vida de uma maneira que não pode ser explicada, então um abraço era o mínimo que eu podia fazer.
Eu estava prestes a abrir o envelope em minhas mãos até ver aquela cena que arrancou todo o ar do meu pulmão. Eu podia sentir o desespero no ar.
- , a bolsa estourou! - caminhou até mim com a ajuda de , sussurrando as palavras que... Oh meu deus! Hope estava prestes a vir ao mundo!
Mesmo em meio às luzes piscantes eu consegui notar aquele líquido que deixou rastros em suas pernas que estavam à mostra. Não demorou para chamarmos atenção, juntando todos os nossos familiares em volta de nós. Todos mesmo.
- Como assim a bolsa estourou? Você nem...
- Eu sei! Ainda faltam três semanas pra nove meses, mas... AAAAAH! Estourou, ! - me interrompeu impaciente enquanto todos nos encaravam incrédulos, sem acreditar no acontecimento.
Dan foi o primeiro a agir, pegando minha namorada no colo e caminhando rapidamente até a saída do salão. Eu me senti um banana por não conseguir me expressar ao saber que minha filha estava vindo ao mundo. É a porra do nervosismo.
Minhas mãos trêmulas quase não conseguiram apertar o botão que destravava o carro. Abri a porta com rapidez, e Dan colocou no banco de trás enquanto Marie entrava pela outra porta, e minha mãe se acomodava no banco do passageiro.
- Você não quer que eu dirija? Você está nervoso! - se ofereceu tentando passar uma falsa impressão de calmaria, mas não adiantou. Todos estavam nervosos e surpresos.
- Não precisa, apenas vá lá em casa e pegue a bolsa da Hope, ok? Já está tudo pronto, é uma bolsa rosa. - dei as instruções com rapidez, ainda perdido com tanta informação. Me obriguei a respirar fundo, balançando a cabeça para ver se minhas ideias se acertavam - Minha filha vai nascer, ! MINHA FILHA VAI NASCER! - e foi nesse momento que, de fato, minha ficha caiu. Eu agi rápido, entrando no carro com pressa e dando partida.
- ... - olhei pelo retrovisor minha namorada com o semblante em dor, apertando os olhos com força.
- Estamos chegando, filha. Aguenta só mais um pouquinho! - Marie tentou pela décima vez acalmar a filha, embora estivesse sofrendo junto.
Em um dia normal, a minha freada brusca seria motivo de inúmeros xingos, mas naquele momento ninguém teve coragem de falar nada. Alguns enfermeiros que estavam na emergência do hospital correram em direção ao carro, ajudando a sair do carro com cuidado, a colocando numa maca com rapidez.
- Eu não acredito que aquela dorzinha que senti o dia todo era... ISSO! - grunhiu, com a respiração descompassada.
- Tente respirar direito, meu amor! Mantenha a calma. - passei a mão pela sua testa soada, correndo junto com os enfermeiros até um corredor onde fui barrado. Sim.
Barrado!
Era necessário a colocação da roupa de acompanhante, e juro, nunca em toda a minha vida eu me troquei tão rápido. Eu precisei andar por mais três corredores até chegar a sala onde estava, também com a roupa trocada. A enfermeira que a ajudou provavelmente levou um arranhão no meio da cara, porque parecia uma onça feroz.
- , isso... dói! - berrou, se desmanchando em gemidos de dor.
Um médico alto e jovem entrou na sala às pressas, totalmente preparado para o que estava por vir.
- Ei, mamãe, eu sou o doutor Paul, e pelo o que temos aqui, chegou a hora! - o médico se manifestou eufórico, se colocando na melhor posição para trazer minha filha em segurança ao mundo.
- De... novo! - outro grito escapou pela minha garganta da minha namorada, claramente se referindo as contrações que vinham cada vez mais fortes a cada minuto.
- , você leu tantos livros e viu tantos vídeos pra se preparar pra esse momento! Lembre-se deles! - tentei de alguma forma, amenizar sua dor ou pelo menos distraí-la, coisa que não deu certo pelo olhar que recebi como retribuição.
- , eu estou aqui prestes a botar a nossa filha no mundo e você está me lembrando sobre livros e vídeos? - ela gritou em meio aos gemidos, e por algum motivo aquilo foi incrivelmente engraçado. Eu ri mesmo, e ela também. Aquele misto de emoções que estava falando mais alto do que nunca.
- Você está pronta, ? Preciso que você empurre com toda a força, ok? - o doutor pediu sério, mas com um sorriso no rosto, tentando passar calma e confiança.
tentava ao máximo para conseguir respirar como um ser humano normal. Entrelacei nossas mãos, olhando em seus olhos sofridos, que exalavam dor e felicidade. Meus olhos marejaram, e minha garota fez tanta força que aquilo parecia doer em mim.
- Vamos, amor, você consegue! - sussurrei em seu ouvido em pedido de uma nova tentativa, observando as lágrimas se formando também nos olhos dela. Acariciei sua testa mesmo com as mãos trêmulas, ouvindo mais uma vez aquele gemido com força para que Hope saísse dali.
Nada.
- Vamos lá, ! Empurre! - o doutor pediu novamente, agora com mais ansiedade, demonstrando certo nervosismo. As lágrimas grossas rolaram pelos olhos da minha garota, que mesmo um tanto quanto desnorteada, empurrou com toda a sua força.
Minha mão estava praticamente sendo esmagada, mas foi o menor dos meus problemas. O mundo parou. Minha alma, minha mente e meu coração estavam apenas vivendo aquele momento. Nossos suspiros aliviados foram dados exatamente no mesmo instante.
E então ouvimos aquele chorinho.
Uma sensação indescritível tomou conta do meu ser, fazendo meu coração querer sair do peito ao ver aquela criaturinha sendo erguida inteiramente para fora do útero da minha namorada.
O cordão umbilical foi cortado e uma manta envolveu nossa filha, que finalmente foi colocada nos braços de .
- Bem-vinda ao mundo, meu amor! - minha voz falhou e meu choro ganhou força ao ver a pessoa mais importante da minha vida ali, na minha frente, tão pequena e tão linda. fez um carinho na cabecinha de nossa filha, com os lábios entreabertos, mas sem forças pra verbalizar qualquer coisa, completamente estagnada pela visão deslumbrante da nossa pequena. Hope estava deitada no peito de , e aquele chorinho foi cessando aos poucos pelo contato com o calor da mãe - Eu pesquisei que o bebê sente o coração da mãe bater a partir da décima semana. Por isso que agora ela está calminha, porque ela conhece esse barulho! - manifestei uma lembrança que me atingiu que se pareceu extremamente apropriada para o momento. Levei minha mão até a cabecinha da minha filha, caminhando por seus braços até parar em sua mãozinha minúscula. Os olhinhos ainda mal abertos se fizeram atentos ao me encarar, e as lágrimas rolaram ainda mais pelo meu rosto.
, garota cuja força, paixão e beleza mudaram a minha vida de um modo que nada no mundo mudaria. Naquele momento, meu triunfo não foi a formatura, foi a simples claridade de uma vida nova. A visão de que sempre estaremos sempre juntos, e qualquer instinto contrário será sempre negado pela vida.
Eu sou e sempre serei apaixonado por e pela nossa pequenina que é uma mistura de nós.
's POV end

Eu me sinto crua, emotiva, diferente. Eu me sinto como se estivesse me movendo para frente e para trás, entre a felicidade e a gratidão. Desde 03:31 da manhã tudo se transformou. O vazio em meu ventre traz um sentimento esquisito, mas essa nova vida procura meu peito macio e eu me sinto inteira outra vez. Eu ainda estou processando a bela transição do parto e estou extasiada pela força que tive, como ser humano, mulher e mãe.
Horas atrás, eu tomei decisões por mim mesma. Decidi comer, dançar e aproveitar minha festa de formatura. Eu era dona do meu tempo. Eu tinha autonomia e sabia fazer tudo o que eu precisava. Às 03:31 da manhã, ela nasceu. E aquela mulher que sabia de tudo, que era dona do seu tempo e da sua vida, começou a morrer naquela hora. Não era apenas a minha filha que estava nascendo. Nasceu uma mãe, uma nova mulher.


Continua...



Nota da autora: (10/08/2017) Capítulo 34 e 2 anos de fanfic. É, loucura!!! Esse é o penúltimo capitulo de Blink e meu coração já está doendo, e vou ficar quietinha e guardar textão pra o último capitulo. Obrigada por acompanharem, vocês são incríveis! Até a próxima (e última).
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Nota da beta: Minha nossa senhora, não costumo fazer notas, mas preciso. Acredito que me assustei com o número de páginas quando a Lua me mandou a fic, mas admito que cada linha valeu a pena ser lida! Essa fic merece sucesso e tenho certeza que vai alcançar logo logo. Obrigada, Luna, por ter me escolhido como Beta! ??
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