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Capítulo I


Aquelas palavras lhe caíram como toneladas nas costas. As músicas do rei do jazz, Bing Crosby, e as inconfundíveis notas de Ella Jane Fitzgerald já não tocavam mais. Tampouco o rock ‘n’ roll de seu ídolo Elvis Presley. Não existiam mais bailes, onde os soldados recém-chegados do exército comemoravam suas vidas com as amadas esposas.
Os topetes altos inspirados nos cantores da década de 50 também não faziam mais parte do visual daqueles homens que lhes olhavam atentos.
Os vestidos rodados e cheios de pequenos detalhes inspirados em Marylin Monroe já não estavam mais em seu corpo. As longas saias de bolinhas e os laços na cabeça, menos ainda. As maquiagens pin-up não pintavam o rosto daquelas mulheres vestidas de um branco limpíssimo. Aparentemente, a modelo inglesa Twiggy e a atriz Raquel Welch não eram mais ícones da moda. Não naquela década. Não naquele século.
Aquele século. XXI. Aquela década. 2014.
estava sentada numa maca, num ambiente com o cheiro particularmente hospitalar. Ao olhar em volta, não encontrou os móveis rústicos de madeira maciça, pelo contrário: o brilho do aço daqueles objetos faziam seus olhos arderem. Ela voltou o olhar para seu próprio corpo e se viu com uma blusa larga branca e uma calça cinza extremamente folgada de um tecido desconhecido. Aquilo soava tão... masculino. Era masculino de mais até para homens.
Sua cabeça girava com todas as informações que havia acabado de receber. Aquelas pessoas estranhas, vestidas de um modo mais estranho ainda, lhe olhavam como se ela fosse alguma aberração. E talvez fosse.
“Querida, você não está em casa, não chame por seus pais ou amigos. Eles não estão aqui... Ao menos estão nessa vida. – o homem riu cruel e franziu o cenho, não o compreendendo. – Você não está mais em 1957, . Nem você e nem ninguém... Estamos num novo século. Estamos em 2014.”
Aquilo lhe parecia tão surreal que ela poderia jurar estar sonhando, mas esse pensamento logo se esvaiu quando sentiu uma picada forte no braço. Calmante. Seus músculos amoleceram e seus olhos pesaram. No entanto, ela não dormiu de imediato, como achou que aconteceria. virou um pouco o rosto e pôde ver algo que lhe parecia um espelho, com uma moldura extremamente diferente, mas ainda sim pôde ver seu reflexo ali, e, com isso, quase desmoronou.
Se eles não estavam mais em 1957, como ela poderia estar exatamente igual? Sua aparência ainda era a mesma; não havia rugas, cabelos brancos e nem nada referente a uma mulher de 78 anos, que seria sua idade atual, caso aqueles estranhos estivessem falando a verdade. O que, afinal, estava acontecendo ali? A esquizofrenia, doença que seu pai lhe falara há alguns meses, havia lhe afetado? Ela não sabia o que havia acontecido, mas quando o sono lhe venceu novamente, ela apenas fechou os olhos, deixando-se levar e, quem sabe, voltar à realidade. À sua realidade.

12, setembro, 1957. – 18h02 PM.
- Oh, céus, Jane! Você vai mesmo passar esse batom? – exclamou, encarando a pequena embalagem vermelha nas mãos de Jane, sua melhor amiga.
- Vou... Acha que fica mal visto? – a outra disse, enquanto observava seu reflexo no espelho.
- Seus olhos já estão bem pintados, amiga. Não queremos que coloquem uma manchete no New York Times: “Filha do presidente vai a baile com mulher de bordel”. – disse, gargalhando. Jane abriu a boca, incrédula, e esguichou um pouco de perfume na cara da amiga.
- Você foi totalmente mal educada, senhorita filha do presidente! – brincou, enquanto passava os dedos sujos de batom nos lábios, deixando um leve rosado. – E então? – a olhou, sorrindo.
- Agora, sim, é uma moça de família! – riu, dando o ultimo retoque no laço azul em seus cabelos.
Alguns poucos segundos se passaram e após duas batidas na porta, Louise, governanta da casa branca, entrou no quarto.
- Meninas, meninas! – Disse a senhora que carregava uma barriga de oito meses de gravidez.
- Que afobação, Louise! – riu, indo até ela e beijando seu rosto. A mulher tinha em média seus quarenta anos, e por isso sua gravidez seria de risco. – Como está esse menininho lindo? – sorriu, acariciando a enorme barriga da empregada.
- Peter está indo bem, quase chegando! – ela sorriu e fechou os olhos em seguida, balançando a cabeça em negação, como se tivesse esquecendo-se de algo. – Oh, céus! Quase me esqueci. – gargalhou, dando alguns tapinhas em sua própria testa. – Max e Adam já estão lhes esperando, meninas. – passou a mão nos cabelos lisos de . – Você está linda, querida.
- Eu agradeço! – sorriu simpática.
- E você também está, Jane! – a outra fez pose e todas riram. – Mas vão, vão! Não deixem os rapazes esperando. – piscou, como se fosse tão jovem quanto as amigas. E de fato, talvez fosse em espírito.
e Jane se despediram da governanta e correram para a escada, ao chegarem lá, avistaram seus companheiros. e Adam. Jane e Max. Ambos se conheceram no colégio, há alguns anos, e hoje estavam juntos. A filha do presidente, entretanto, estava perto de mudar seu estado civil, já que em pouco mais de cinco meses iria se casar com o rapaz.
Elas se olharam entre si ao verem o sorriso deles, esperando-as. Os topetes altos, junto dos óculos escuros que ambos carregavam nos rostos os deixavam ainda mais atraentes. Sem contar o fato da calça jeans ligeiramente largas e as jaquetas de couro, pretas.
Ao chegarem ao último degrau, os rapazes pegaram suas mãos e as beijaram. Ambas coraram.
- Oh, Adam! Meu pai está em casa! – riu tímida, enquanto o namorado tirava os óculos, mostrando seus lindos e intensos par de olhos.
- Logo estaremos casados, querida, não vejo problema nisso. – sorriu galanteador e ela corou mais ainda, enquanto rodava os dedos no rabo de cavalo alto, no topo de sua cabeça.
- Mas que cena romântica! Digna de Cantando na Chuva! Onde está Gene Kelly para cantar para vocês? – Max brincou, recebendo um leve beliscão de Jane. Todos riram.
- Isso se chama inveja! – disse. – Bem... O que acham de irmos logo ao baile? Não vejo a hora de ouvir Elvis! – comemorou, puxando Adam para a saída. O outro casal fez o mesmo.
Ao saírem dos portões da casa branca, uma chuva de luzes quase lhes cegaram. Os fotógrafos dos pouquíssimos jornais do país mal os deixavam chegar até o carro.
“Quando acontecerá o casamento da filha do presidente dos Estados Unidos?”
“Para onde estão indo?”
“É verdade que a senhorita está esperando um filho?”
“A notícia sobre o uso de drogas ilícitas procede, ?”
“Você pode nos dar uma pequena entrevista?”
“O que seu pai tem a dizer sobre as ameaças de Yan , presidente da Alemanha?”

- Acho que esta última pergunta deveria ser destinada a ele. No entanto, em minha opinião, esse velho tem que ir para alguns bordéis, isto é falta do que fazer! – sorriu sarcástica e mostrou o dedo do meio. Os flashes aumentaram e os dois casais entraram no carro, gargalhando.
- Você é louca, ! – Jane disse, colocando o cinto de segurança.
- Sou sincera, meu amor! Coisa que falta e muito para essa sociedade tão antiquada. Estamos no século XX, o que há de errado com essa gente hipócrita? – rolou os olhos, encarando as unhas pintadas por um esmalte renda.
- O que você fez foi errado, querida. – Adam disse, enquanto pisava no acelerador. suspirou frustrada e ele pôde ver através do retrovisor. – Eu vou mesmo me casar com você?! – brincou, fingindo estar sério. Ela abriu a boca, incrédula.
- Você é um cretino, sargento Evans!
- Há alguns minutos estava vendo uma perfeita cena de romance. Agora é praticamente uma daquelas lutas, onde está o ringue, afinal? – Max, namorado de Jane, falou entre risos.
- Eu sou a queridinha da América, meu bem. – piscou, recebendo gargalhadas dos amigos. Ela riu também.
- Você é a vergonha da América, ! – Jane continuou rindo, enquanto arrumava o pequeno laço vermelho que tinha na cabeça.
- Querido, por favor, me diga que aquele lugar no final da rua é onde iremos descer, sim? Ou então amanhã teremos uma matéria para a primeira página: “Filha do presidente comete assassinato” - escreveu no ar e todos riram novamente. Quando , Adam, Jane e Max estavam juntos, não havia nada mais propício no momento do que gargalhadas. Aquelas eram as pessoas mais felizes de Nova Iorque. Quiçá do mundo.
- Você está no cargo errado, . Sem dúvidas, deveria ser da família real. É uma verdadeira princesa! – ironizou, em tom de brincadeira. Adam estacionou o carro.
- Elizabeth é uma vaca! – disse, e rapidamente tapou os lábios. Todos arregalaram os olhos, mas logo voltaram a rir. – Certo, vejamos... Sem fotógrafos mexeriqueiros?
- Sem sinal deles, queridinha da América! – Max disse, saindo do veículo. Ele abriu a porta para que as garotas saíssem. Elas sorriram em agradecimento. Cada uma entregou o braço para seu par e caminharam até a entrada no baile.
- Oh, meu Deus! – e Jane disseram num uníssono, assim que ouviram as primeiras notas da música que tocava no lugar. Jailhouse Rock - Elvis Presley, o grande ídolo de ambas.
- É um jogo perdido, meu amigo. Ninguém pode competir com Elvis! – Adam ergueu a mão para Max, que retribuiu o gesto. Eles riram e viram as amadas correrem até a pista, balançando os cabelos e as mãos.
- Let's rock, everybody, let's rock. Everybody in the whole cell block, was dancin' to the jailhouse rock! cantarolou, enquanto arrastava seu noivo para a pista.
- Por que não chama Elvis para dançar com você? – o outro disse, fazendo bico. Ela rolou os olhos e balançou a cabeça, negando.
- Já tentei na última visita dele à casa branca... – brincou, vendo-o arregalar os olhos. – Um pena ele não me dar bola! – gargalhou, aproximando o rosto ao de Adam e selando seus lábios aos dele, num beijo rápido. O rapaz sorriu. – Vamos, seu descoordenado! Onde está toda malemolência? – sorriu, puxando as mãos dele e levantando-as, num passo de dança.
- Eu sou o melhor dançarino do século XX, querida! – mordeu o lábio inocentemente. Adam pegou uma das mãos de e a rodou no ar, fazendo seu vestido levantar alguns centímetros. Eles gargalharam. Ao puxar o corpo dela de volta ao seu, ele beijou a parte descoberta de seu pescoço e ela arregalou os olhos, se afastando ligeiramente.
- Deixa só o meu pai saber o que o amado e ansiado genro dele anda fazendo com a sua filhinha inocente! – sorriu, balançando os pés no ritmo da música.
- Eu te amo, ! – Ele confessou, puxando-a para si novamente. Ela sorriu tímida e sentiu seu rosto corar.
- Eu também te amo, soldado Stevens. – mordeu o lábio inferior, e, no segundo seguinte já havia voltado a dançar como se não houvesse amanhã. Esse era o seu lema, afinal.

; filha do presidente do país mais influente do mundo: Estados Unidos. Uma jovem de vinte e um anos que ao menos se importava com o que falariam dela logo após mais um escândalo, ela só queria viver. Viver e se divertir como se não houvesse amanhã. A vida era curta para ser levada a sério, não era? Há mais na vida do que apenas existir. O tempo que temos é muito pequeno para ser desperdiçado pensando no que os outros irão dizer, pensar ou inventar.
Atualmente estava noiva de Adam Evans, garoto que conhecera durante o tempo no colégio, seu primeiro e único namorado até então. Adam havia entrado para o exercito há pouco tempo, entretanto, o sargento havia sido dispensado. Os tempos eram de paz.
Jane era a sua melhor amiga desde... Desde o berço. Suas mães eram melhores amigas e engravidaram juntas, com uma singela diferença de quatro meses. O destino de ambas era o mesmo desde sempre. A mesma escola, o mesmo grupo de amigos e as mesmas ordens. Era definitivamente uma pena Max não tê-la pedido em casamento ainda, senão tinha a plena certeza de que se casariam no mesmo dia. E teriam o mesmo destino na lua de mel. Lua de mel... Mel. Max. Max era, sem dúvida, um doce. Max se tornara seu amigo assim que começou a namorar Jane. No começo, tinha um pé atrás com ele, mas com o passar dos meses e anos, havia se tornado seu melhor amigo. Sabia que poderia contar com ele em todos os momentos, sendo eles bons ou ruins. Max era um bobo, mas o bobo que ela amava como se fosse um irmão.
Irmão. não tinha irmãos. Sua mãe havia falecido assim que deu a luz a ela, deixando seu pai devastado por diversos anos. A garota havia sido a única que o fizera se reerguer, transformando-o num homem bom, generoso. E foi justamente isso que o levou a se candidatar a presidente dos Estados Unidos. John já estava em seu segundo mandato e era o presidente admirado por todos.
Não só por eleitores, diga-se de passagem. John era o herói de . Seu exemplo. A garota amava o pai mais do que qualquer coisa ou pessoa no mundo.

- Olá, casal! – Max disse, enquanto chegava da pista de dança com Jane. e Adam estavam sentados, tomando milkshake e comendo hambúrguer com batata frita.
- Olá. outro casal. – Adam acenou, colocando algumas batatas na boca. – Cansaram de dançar?
- Não, na verdade, não. – foi a vez de Jane se pronunciar, enquanto pegava algumas batatas do prato da amiga.
- Ei! – deu um tapa na mão da outra, que murmurou algo, acariciando a própria mão. – Sua ladra de batatas, vá pegar as suas! – fingiu dar bronca, enquanto Jane lhe mostrava a língua como uma criança mimada.
- Mas, voltando... Para onde vamos amanhã?
- Estava conversando com Adam sobre isso e achamos bacana a ideia de irmos andar de bicicleta no lago. O que acham? – opinou, tomando um gole de seu milk-shake, pelo canudinho.
- Hm, eu acho uma ótima ideia! – Jane sorriu, sentando-se no banco estofado vermelho, ao lado da melhor amiga. – Mas temos que acordar cedo, senão não tem graça.
- Acordar cedo... Oh, céus. – Max sentou-se ao lado de Adam e deitou a cabeça na mesa, para fazer graça. – Eu odeio acordar cedo.
- Modos, Max. Modos, amor. – Jane rolou os olhos. e Adam se encararam, rindo logo depois.
- Tudo bem... Agora, se nos dão licença, eu e vamos dar uma saída. – Adam esticou a mão para a noiva, que franziu o cenho.
- Vamos?
- Vamos, amor! – ele riu, puxando-a pelo braço enquanto ouvia assobios e palavras sujas de Max e Jane.

O casal correu até a porta dos fundos do local e a abriu, dando visão ao imenso jardim que aquele lugar ambientava. Tudo era tomado por verde, com exceção de alguns arbustos e algumas flores coloridas em volta. e Adam pararam de correr e se apoiaram em seus próprios Adamlhos, tentando recuperar o fôlego. Eles se entreolharam e sorriram cúmplices. Alguns segundos se passaram e quando finalmente o ar havia voltado, se sentaram na grama, para, logo depois, deitarem na mesma. A garota apoiou a cabeça no ombro do namorado, que deixou um braço envolto à sua cintura, acariciando-a.
- O que o senhor quer, afinal? – ela perguntou, repousando a mão no peito dele.
- Você. – sorriu, encarando as estrelas, que hoje pareciam estar ainda mais brilhantes.
- Mas isso você já tem. – ela mordeu o lábio inferior, erguendo um pouco o olhar para encarar o rosto dele.
- Para sempre? – olhou-a de soslaio, vendo-a assentir com um sorriso carinhoso no rosto. – Eu sou um cara muito sortudo, mesmo. – levou a mão para seu peito, onde a dela estava, e a segurou.
- Por que esse romantismo todo hoje, meu bem? – ela riu, sentindo-o acariciar as costas de sua mão. – Ei, sargento Evans?
- Hm?
- Como você se vê daqui dez anos?
- Bem... Essa é uma pergunta complicada. – riu, voltando a encarar as estrelas. – A única certeza que tenho é que quero estar com você. – ela ergueu um pouco o corpo e lhe deu um beijo rápido, seguido de um sorriso. – Quero ter filhos com você. – olhou no fundo dos olhos dela, encarando sua própria figura refletida ali. – E você? O que vê em dez anos?
- Você. – mordeu o lábio inferior, apoiando-se no cotovelo. – Eu nos vejo, na verdade. – sorriu, levando uma das mãos ao rosto dele, acariciando-o. – Nos vejo assistindo um show do Elvis, com nosso filho nos braços... – Adam riu, negando com a cabeça. – Tudo bem, falando sério. – suspirou. – Eu nos vejo num gramado, como esse aqui... – olhou em volta, sorrindo tímida. – Fazendo um piquenique com o nosso filho, que já vai estar com uns cinco aninhos... – ela riu, escondendo o rosto no pescoço dele. – Eu pareço uma garotinha dizendo essas coisas.
- É claro que não, ! – riu, erguendo o rosto dela para encarar o seu novamente. – Eu quero muito que isso aconteça. E vai acontecer, tenho certeza. – piscou.
- Com a parte do Elvis e tudo? – fez bico, como uma criança querendo um brinquedo novo. Adam riu, assentindo. – Oba! – comemorou, sentando-se na grama. Ele a acompanhou.
- Agora... Será que a queridinha da América pode me fazer um favor?
- O que foi? – sorriu, virando-se para ele.
- Um beijo. – ergueu o dedo indicador, sinalizando a numeração. riu, logo depois aproximando seu rosto do dele.
O beijo começou lento, somente com o toque dos lábios. Contudo, quando Adam encostou a língua nos lábios de , ela os entreabriu, sentindo-o invadi-la de maneira carinhosa. Eles sorriram e continuaram o beijo, sempre lento, mas com muito sentimento. O homem desceu uma das mãos para a cintura dela, apertando-a levemente. Ela gemeu involuntariamente e aprofundou o beijo, levando as mãos para o cabelo dele, entrelaçando os dedos ali. Quando o ar ficou escasso, ambos se separaram com selinhos.
Adam, no entanto, não se afastou dela. O rapaz levou os lábios para seu pescoço, onde depositou suaves beijos. mordeu o lábio e só então se deu conta do que aquilo poderia levar.
- Adam... – ela chamou, erguendo o rosto dela para encará-lo novamente. – Castidade, amor. – sorriu fraco. – Só mais cinco meses, sim?
- Você tem razão. – ele assentiu, se levantando. – Desculpe. – esticou o braço para ajudá-la a se levantar. Ela o fez. – Vamos voltar e ver o que aqueles dois estão fazendo.
- Não se preocupe. – sorriu, dando um beijo no canto da boca dele. – E, sim, vamos! Aposto que estão dançando no meio da pista, com todas as luzes voltadas para eles!
- Não tenho dúvidas quanto a isso! – ele brincou, dando a mão para ela e logo caminhando de volta para o salão, onde acontecia o baile.
Ao entrarem novamente no lugar, só confirmaram o que haviam imaginado. Max e Jane dançavam no meio da pista, onde todos à volta paravam para acompanhar o casal. olhou para Adam e eles riram, negando com a cabeça. Oh, nem em mil anos encontrariam amigos como aqueles.
No outro dia, acordou assim que Louise entrou em seu quarto, chamando-a para o café da manhã. A garota se levantou, espreguiçando-se logo após. Ao caminhar até sua janela, abriu a cortina e encontrou um dia ensolarado, do jeito que sempre amara. Ela sorriu involuntariamente e olhou os portões da casa branca, encontrou vários soldados fazendo a segurança do lugar, e, como sempre, alguns fotógrafos prontos para conseguirem qualquer furo de reportagem. Abutres.
foi até seu banheiro e tomou um banho. Ao sair do ambiente, foi até seu guarda-roupa e escolheu um vestido acentuado azul, xadrez. Por fim, colocou uma de suas fitas, no tom azul escuro, e a amarrou abaixo da cintura, deixando a roupa ainda mais rodada. A garota foi até o espelho de sua penteadeira e buscou outra fita, idêntica a da cintura, e a amarrou em sua cabeça, deixando os cabelos soltos – lisos. No rosto, fez uma maquiagem simples, nada mais do que um delineador nos olhos e a boca levemente rosada, assim como as bochechas.
- Querida – Louise, a governanta, entrou no quarto novamente. – Vamos logo, sim? Seu pai quer conversar com você.
- Oh... – fez uma careta, pegando um de seus perfumes e esguichando um pouco em seu pescoço. – O que eu fiz dessa vez?
- Eu não sei, meu bem. Mas pela cara dele, coisa boa não foi.
- Que novidade, não é? – bufou, se levantando sem muita vontade. – Vamos enfrentar a fera! – suspirou, colocando as mãos nos ombros de Louise, que riu, seguindo para fora do quarto.
Ao descer as escadas pelo saguão da casa branca, encontrou seu pai de costas, observando o jornal. Ela parou de andar, fechando os olhos e franzindo o cenho.
- .
A voz dura de seu pai soou e ela engoliu seco, abrindo os olhos. O homem continuava com os olhos no jornal. Ela respirou fundo e caminhou com passos lentos até a mesa.
- Olá, papai! – sorriu doce, como se nada houvesse acontecido. Ela se abaixou na altura dele e deu um beijo demorado e estalado em seu rosto. – Como vai? – se sentou, colocando o guardanapo de pano sobre o colo.
- Eu vou bem, e você, querida? – olhou-a de soslaio, com o mesmo tom dela. riu, negando com a cabeça.
- O que eu fiz agora, senhor ?
- O problema é o que você falou, meu bem. – suspirou, soltando o jornal sobre a mesa. – “Em minha opinião, esse velho tem que ir para alguns bordéis, isto é falta do que fazer.” – repetiu a frase da filha e ela fechou um dos olhos, fazendo uma careta.
- Desculpe? – sussurrou, como se aquilo fosse sua carta de alforria.
- Não é a mim que você tem que pedir desculpas, . O que você disse foi totalmente inaceitável. – bufou, frustrado.
- Foi só uma brincadeira. – deu os ombros, olhando para o pedaço de bolo que estava em seu prato.
- Isso não é brincadeira que se faça! Filha, você tem noção do que acaba de fazer?
- Eu não falei nada de mais, papai... Estou mentindo, por sinal? Esse velho é um babão invejoso que só sabe nos irritar.
- Por mais que seja! Você não podia ter ido isso... Oh, céus. – colocou a mão sobre a testa, apertando os olhos.
- O que quer que eu faça? Quer que eu vá até onde aqueles repórteres estejam e peça desculpas publicamente? Tudo bem, eu faço. – suspirou entediada, brincando com o garfo à sua frente.
- Não é tão simples assim, querida.
- Aqueles fotógrafos e repórteres imbecis estavam me irritando tanto que eu não vi outra forma de sair dali senão fosse respondendo-os. E o senhor sabe, eu não consigo mentir sobre o que penso. – olhou o pai, que continuava com o rosto sobre a mão. – Se eu soubesse que iria te deixar assim, juro que...
- Não é por mim, filha. – ergueu o rosto, olhando-a. – As coisas estão difíceis... Eu tentei não te alertar, mas depois disso...
- O que está acontecendo? – questionou, com a voz preocupada.
- Yan está procurando motivos para nos confrontar, e essa frase só pode ajudar em sua ideia maldita.
- Ideia? – franziu o cenho, observando a feição triste do pai.
- Yan quer uma guerra, filha. Ele quer a terceira guerra mundial.


Capítulo II


arregalou os olhos assim que sua mente foi capaz de traduzir a frase que seu pai lhe dissera há alguns segundos. Uma guerra? Uma nova guerra? Oh, não. Isso não podia acontecer. Não agora. Milhares de pessoas haviam morrido há alguns anos por esse maldito combate. Isso não poderia voltar a acontecer, e ainda mais por sua causa. Nem que ela tivesse de bater na mansão de Yan na Alemanha e implorar de joelhos para que ele a perdoasse. Isso era ridículo, afinal. O que se ganha com uma guerra? Mortes? Mensurar força com outros países? Ela não podia aceitar. Uma guerra em tempos de paz? Oh, por favor. Há crianças que querem crescer, há adolescentes que querem amadurecer, há adultos que querem envelhecer e idosos que querem falecer em paz. Há vidas que não podem ser atrapalhadas por uma batalha irracional. Que hasteiem a bandeira branca.
- Uma guerra? – Quando finalmente foi capaz de falar, sua voz saiu fraca. – É algo concreto?
- Não, ainda não, pelo menos... Tudo não passa de ameaça, portanto, fique tranquila. – ela riu irônica, voltando a encarar a mesa. – Falo sério, querida. Não se alarme antes da hora... Eu só peço que não dê mais declarações como essa, tudo bem?
- Tudo bem. – suspirou, tomando um pouco de suco. – Eu devo pedir desculpas publicamente?
- Não. Vamos botar panos quentes nisso, sim? – sorriu fraco. – Não se preocupe, . Está tudo sobre controle, ok? Vá sair com seus amigos e se divertir.
- Depois de uma notícia como essa?
- Sim, meu bem. Eu repito: só estou te alertando para não cometer o mesmo erro. – piscou, tomando um gole de seu café. – Para onde irão hoje? – sorriu, na tentativa de mudar de assunto.
- Andar de bicicleta no lago... – suspirou, comendo um pedaço de bolo. – Está tudo bem mesmo, não está?
- Está, querida. – continuou, sorrindo. – Queria ter a sua idade e suas responsabilidades para sair por aí também. – riu, balançando a cabeça. Ela sorriu. – Oh, meus vinte anos... – sorriu nostálgico.
- Agora você é o presidente dos Estados Unidos. Aposto que deve ser bem mais emocionante!
- Oh, é claro que é... Hoje mesmo, vou passar o dia inteiro enfurnado numa sala de reuniões com vários homens tentando mudar meu conceito sobre distribuição de dinheiro em educação e segurança. – rolou os olhos, entediado.
- Fique forte, papai! – brincou, rindo. – Os vença pelo cansaço!
- Acho mais fácil eu ser vencido pelo cansaço... – bocejou, fazendo a filha gargalhar.
- , querida! – Louise chamou, com um sorriso no rosto. A garota a olhou, sorrindo. – Seus amigos e Adam já estão na sala de visitas, esperando por você.
- Já? – fez uma careta. – Mas eu nem tomei café ainda!
- Mande-os virem para cá, Louise. – John disse, dando mais um gole em seu café.
- Ok, com licença. – a mulher saiu.
Pouco mais de um minuto passou e logo estavam eles, em fila e em silêncio, entrando na sala de jantar.
- Oi! – sorriu, acenando.
- Oi, ! Oi, senhor John! – Jane disse, sorrindo.
- Oi, . Bom dia, senhor presidente. – Max.
- Oi, . Bom dia, senhor John. – Adam esticou a mão para cumprimentá-lo. O homem retribuiu, sorrindo cordialmente.
- Olá, crianças! – respondeu simpático, como sempre.
- Quantas variações para saudar o meu pai. Quem vê assim parece até que esses três são gente. – rolou os olhos, rindo. – Sem formalidades, por favor. – sorriu, apontando para as cadeiras. – Sentem-se, bobos.
- Não, obrigado, querida. Vamos só esperar você terminar para irmos logo, já são dez horas. – Adam disse, olhando para seu relógio de bolso.
- Como quiserem. – deu os ombros, sorrindo e dando mais um gole em seu suco. – Pronto, vamos? – riu, vendo a surpresa dos amigos e do pai.
- Mas você nem comeu direito, ! – John disse, incrédulo.
- Estou satisfeita, papai. – sorriu, se levantando. – Boa reunião! – beijou seu rosto novamente. – Tchau, amo você. – buscou a mão de Adam e seguiu para fora da sala de jantar, acompanhada dos amigos, que se despediram com um rápido “Tchau, senhor John!”.
Ao chegarem à sala principal, encontraram Louise.
- Louise, meu amor! – disse, sorrindo carinhosamente. Todos riram.
- O que quer, ? – colocou as mãos na grande barriga, acariciando-a.
- Que tal ir para a entrada da Casa Branca e despistar os fotógrafos e jornalistas?
- E devo dizer o quê? – sorriu.
- Diga que irei fazer o pronunciamento da data do meu casamento! E em uns quinze minutos, fale que estou indisposta e não posso sair.
- Você e suas ideias mirabolantes...
- Por favor! – fez bico, encostando a cabeça no ombro do namorado. – Nós sairemos pelas portas do fundo, com as bicicletas.
- Certo, certo... – riu, balançando a cabeça em afirmação. – Bom passeio, querida. Bom passeio, queridos. – acenou para os outros, que retribuíram o aceno.
- Obrigada, meu doce! – foi até ela, lhe dando um abraço. – Tchau, pequeno Peter. – acenou para a barriga de Louise, como se o bebê pudesse vê-la.

Os dois casais foram para a saída dos fundos e buscaram suas bicicletas. Duas, na verdade. Uma para Adam e outra para Max. e Jane foram checar as portas e tiveram a certeza que precisavam: todos os fotógrafos e repórteres estavam na porta da frente. Elas correram então para a bicicleta de seus namorados e sentaram nos guidões. Os rapazes começaram a pedalar e elas balançaram os pés, rindo. Quando os seguranças abriram o grande portão, os dois aceleraram os pés e correram com a bicicleta até saírem, finalmente, da Casa Branca.
Mais alguns minutos pedalando e estavam mais longe do lugar, com isso, diminuíram um pouco a velocidade. Jane e se entreolharam e, como se somente com o olhar pudessem se entender, elas abriram o braço, enquanto o vento batia em seus cabelos e elas soltavam altas risadas, acompanhadas por Max e Adam , que riam da alegria das amadas.
- Vocês vão acabar caindo! – Adam alertou em tom de brincadeira, mas elas não ligaram.
- Deixa a gente ser feliz, seu chato! – disse, sorrindo e fechando os olhos. – Ser livre... Ter paz. – e, no momento em que ela disse isso, seu sorriso se fechou.
- Aconteceu alguma coisa? – o namorado questionou, freando a bicicleta, o que a fez cair para frente. – Oh! – ele correu para ajudá-la, mas, ao contrário do que pensava, ela não estava brava. Estava rindo... Rindo de si mesma. – Machucou? Desculpa... – esticou a mão, para que ela a pegasse. Ela negou com a cabeça e continuou rindo.
- Nessas horas aqueles malditos fotógrafos não estão aqui, não é? Daria tudo por uma foto desse momento! – Max disse, rindo. Sua bicicleta também já estava parada.
- Colocaria na parede do meu quarto! – Jane gargalhou, indo até a amiga. – Você tá bem? – sorriu, passando a mão nos cabelos dela, arrumando-os.
- É claro que estou... – riu, balançando a cabeça. – E você é um cretino, Max! – mostrou o dedo para ele, que fingiu estar ofendido. Ela lhe mostrou a língua. – Agora, andem, vamos logo para o lago, que eu to maluca para dar um mergulho! Esse sol está infernal. – rolou os olhos e voltou para a bicicleta, onde voltou a se sentar no guidão. Jane fez o mesmo.
- Segurem firme! – Adam voltou a alertar, logo depois para recomeçar a pedalar.
Durante todo o percurso ria, e, de vez em quando, olhava para os lados, encarando os amigos e o noivo. Como ela era feliz. Como era sortuda por ter pessoas como essas a sua volta. Só em pensar que aquilo tudo poderia ter um hiatos, por sua causa, seu ser tremia. Tudo estava tão bem... Tudo teria que continuar daquele jeito. Ela já podia se imaginar com quarenta anos, ao lado de todos eles e com ainda mais pessoas; seus filhos. Como ansiava por esse momento. Mas não agora... Queria aproveitar cada segundo até o dia em que isso chegasse.
Max tocou o sino de sua bicicleta, fazendo voltar a prestar atenção no que fazia. Jane chutou o ar e Adam girava o guidão, para que a bicicleta não andasse em linha reta. A filha do presidente levou a cabeça para trás e voltou a rir, sentindo a brisa e o sol da manhã sobre seu rosto.
- Já sou capaz de sentir o cheiro do lago! – a garota comemorou, sorrindo involuntariamente.
- Graças a Deus! – exclamou Max, tirando a boina da cabeça e jogando-a logo a frente. – Que calor! – ele riu, parando de pedalar. Adam fez o mesmo.
Max e Jane correram para próximo do lago; faria o mesmo, mas Adam tocou em seu pulso, impedindo que ela andasse.
- Ei? – ele sorriu fraco, vendo-a sorrir abertamente. – O que aconteceu um tempo atrás? Eu só parei aquela bicicleta porque vi sua cara quando falou de paz... O que houve?
- Não é nada, Adam. Sério. Não se preocupe. – sorriu fraco, aproximando o rosto do dele, para lhe dar um beijo rápido. Ele esquivou, encarando-a desconfiado. – Certo... Eu falo. – suspirou. – Mas vamos até a Jane e o Max, tudo bem? Quero que eles saibam. – deu os ombros, voltando a andar.
Quando se sentaram na grama, próxima ao lago, o outro casal já estava ali.
- Que foi? Que caras de mortos são essas? – Jane perguntou, rindo. Quando viu que os dois somente haviam sorrido fraco, ela parou. – O que aconteceu?
- Eu também quero saber o que aconteceu. – Adam encarou , que assentiu, suspirando.
- Hoje de manhã eu estava conversando com o meu pai e... Lembram sobre aquela frase que disse ontem? Quanto ao presidente da Alemanha? – todos assentiram. – Então, parece que já há algum tempo ele está fazendo ameaças de começar... – ela respirou fundo, fechando os olhos por alguns segundos. – Uma nova guerra.
- O quê?! – Jane disse, arregalando os olhos.
- E isso que eu disse só pode piorar a situação! E se acontecer uma nova guerra? Por minha causa?!
- Mas é certeza que vai acontecer essa nova guerra? – Max perguntou, preocupado.
- Não... Pelo menos meu pai disse que não. – deu os ombros, passando os dedos pela grama. – Por enquanto são só ameaças.
- Então por que está se preocupando, meu bem? – Adam passou a mão no rosto dela, acariciando-o.
- Eu não vou me perdoar se essa guerra acontecer, Adam. – suspirou. – Se tudo já estava quase acertado, esse pode ter sido só o estopim.
- É claro que não, ! – Jane se pronunciou. – Afaste já esses pensamentos dessa cabecinha linda. Nada irá acontecer, ok? O mundo está em paz. – sorriu. – Tudo continuará como está, sim?
- É isso mesmo! – Max disse, sorrindo. – Agora, vamos logo entrar nesse lago para espantar de vez essas besteiras?
- Isso, amor. – Adam beijou o rosto dela. – O sol está quente e não vejo hora mais oportuna para que possamos entrar nessa água que... – encarou o lago - aparentemente está maravilhosa! – riu.
- Eu amo vocês. – disse, sorrindo estonteante. – Agora, por favor, vamos logo mergulhar e esquecer isso! – se levantou, desamarrando a fita que estava em sua cintura. Jane fez o mesmo. Os rapazes tiraram suas camisetas e suas calças, ficando com roupa de baixo. Alguns segundos mais tarde, as garotas fizeram o mesmo. Não havia vergonha ali, afinal. Ao menos uma vez por mês os casais iriam para o lago, e, ficavam de trajes íntimos. Todos eram amigos, e, mesmo com a ditadura em cima da castidade da época, não havia malícia.
Jane e Max correram para o lago e pularam no mesmo, diante de risadas e gritos.
- Esse lago está congelado! – Jane disse, abraçando seu próprio corpo enquanto tremia. Max abraçou a namorada e eles sorriram, cúmplices.
- Depois nós que somos o casal mais cheio de melado, não é?! – exclamou, sendo levada por Adam até uma árvore, onde existiam alguns cipós. – Vai, você primeiro, Adam!
- Achei que a regra fosse “damas primeiro”... – brincou, rindo. – Certo, certo. – sorriu, pegando a ponta do cipó. – Aí vamos nós! – gritou, e, por fim, pulou do pequeno alto onde a árvore estava.
gargalhou ao vê-lo cair desajeitadamente na água. Quando o noivo voltou a alcançar a superfície, fez sinal para que ela pulasse também. A garota balançou a cabeça, em negação.
- Vem logo, ! – ele riu. – Não está tão gelada, anda.
- Sinto cheiro de gente medrosa! – Max gritou.
- Mimadinha! – Jane brincou, e, como se aquele fosse o combustível que precisava, ela se agarrou no cipó.
Antes de saltar, no entanto, ela ergueu o dedo do meio em direção à Jane, que retribuiu o gesto. fechou os olhos apertados, deu impulso e pulou. Ao abrir os olhos, viu o quão longe estava da água e gritou, jogando a cabeça para trás e rindo descontroladamente. O frio que corria por sua barriga era agonizante, mas, ao mesmo tempo, libertador. Ela voltou a encarar o lago e, ao ver Adam com os braços estendidos, sentiu que era hora de soltar o cipó. abriu os braços e quando seus pés finalmente tocaram o lago, ela sentiu o corpo ser envolto pela água gelada. Um arrepio se apossou de sua espinha e ela bateu os pés, sendo erguida pela força da água logo após. Quando abriu os olhos, encontrou os de Adam. Ela sorriu involuntariamente e agarrou o pescoço do namorado.
- Isso foi incrível!
- Não é? Eu sabia que ia gostar! – Adam sorriu, aproximando o rosto do dela. – Não vejo a hora de me casar com você. – sussurrou.
mordeu o lábio e olhou para baixo, sorrindo tímida. Adam assoprou levemente em seu rosto e ela voltou a encará-lo.
- Mal posso esperar por esse dia. – sorriu. O fato era que, apesar de parecer a garota má dos Estados Unidos, a rebelde sem causa, tinha um grande coração e era só uma garota como todas as outras. Sentia vergonha do namorado, brincava com os amigos e estava disposta a ajudar quem fosse, se necessário.
E assim a tarde passou. , Adam, Jane e Max continuaram no lago, vez ou outra voltavam para a grama e conversavam. Contudo, ao olhar por entre uma das grandes árvores, Jane encontrou dois homens tentando se esconder, enquanto seguravam máquinas fotográficas com as mãos.
- Acho que temos visita, pessoal. – a garota disse, enquanto se levantava e colocava o vestido depressa.
- Que visi... – começou, mas, ao olhar na direção que a amiga olhava, viu os mesmos fotógrafos, que há essa hora já estavam cientes de que haviam sido descobertos. – Ótimo! – exclamou, irônica, enquanto colocava depressa seu vestido também. – Andem, levantem-se! – olhou para Adam e Max, que prontamente colocaram suas roupas e correram para suas bicicletas. – Não se pode mais ter privacidade, não?! – ela gritou em direção aos fotógrafos, que se aproximaram com suas câmeras. – Droga. – xingou, correndo até a bicicleta onde Adam estava.

Max e Adam começaram a pedalar depressa. Diferentemente de horas atrás, não se ouvia mais risos ou múrmuros animados das garotas, pelo contrário, elas xingavam em sussurros aqueles malditos fotógrafos. Quais eram seus problemas, afinal? O que a sociedade iria ganhar em saber notícias sobre a filha do presidente? Quais eram seus interesses? Ela só era uma garota. Uma garota como qualquer outra de vinte e um anos, que só queria se divertir, ser feliz, ter paz... só queria ser uma garota normal. Jamais culpara o pai por querer ser presidente, ao contrário, o admirava muito por lutar por seus ideais e melhorar a cada dia o país. No entanto, era inevitável sentir-se infringida. A garota se sentia como um passarinho na gaiola. não reclamava de sua vida, tinha um noivo, família e amigos incríveis, que as compreendiam e entendiam como ninguém. Mas não podia deixar de sentir uma pontada no peito sempre que pensara em como sua vida era vigiada e comandada por todos aqueles fotógrafos, jornalistas e repórteres. Aquelas pessoas eram os vilões de sua história.
Diferente de todas as meninas de sua cidade, jamais desejara ser famosa. Nunca quis ser atriz, cantora ou qualquer personalidade da mídia. E como o destino sabe muito bem quem escolher para certos cargos, colocou-a como uma das pessoas mais vigiadas do planeta. Por que não escolhera a menina de sua aula de piano? Ou a filha de sua empregada? Ou, por fim, a garota metida de seu colégio? Quanto menos queremos, mais temos. Grande e controverso destino.
Quando se deu conta, os seguranças de sua casa já estavam abrindo o enorme portão para que os garotos passassem com suas bicicletas. Ao frearem, saiu da bicicleta. Jane fez o mesmo.

- Malditos fotógrafos intrometidos! – Jane disse, suspirando frustrada.
- Eu... Eu sinto muito, pessoal. – sussurrou, encarando os próprios pés.
- O quê? Por quê? – Adam perguntou, erguendo o rosto dela.
- Esses fotógrafos só estavam lá por minha causa, eu não queria ter estragado o passeio. O dia estava incrível! – deu os ombros, balançando a cabeça. – Por que vocês não voltam para lá? Sou eu que eles querem.
- Que conversa é essa, senhorita ? – Max cruzou os braços, fingindo dar bronca. – Você não tem culpa!
- Não mesmo. Pode parar com isso já, tudo bem? – Adam sorriu.
- Tudo bem. – sorriu fraco. – Vocês entram?
- Não... Minha mãe está me esperando. – Max bufou, rolando os olhos. Eles riram.
- E a minha também. Fiquei de levá-la à casa da minha tia. – Adam subiu em sua bicicleta novamente.
- Eu fico, amiga! Sou a única que não te abandona. – Jane abraçou-a com força, de lado, quase a quebrando em duas. Todos riram.
- Você é sensacional, Jane! – sorriu, indo até o noivo. – Nos vemos amanhã?
- Eu passo aqui ao entardecer. – piscou, colocando o rosto dela entre as mãos. – Até amanhã, amor. – sussurrou, dando-lhe um beijo rápido.
Há pouco mais de um metro, Jane e Max também se despediam carinhosamente.
- Vamos então, Max? – Adam disse, sorrindo. O outro assentiu. – Até mais, Jane! – acenou. A moça fez o mesmo.
- Tchau, filha do presidente! – Max acenou, já começando a pedalar sua bicicleta.
- Tchau, bobo! – acenou também, sorrindo.
Os seguranças voltaram a abrir o portão e os dois saíram. Quando o portão foi fechado novamente, as garotas se olharam e suspiraram, rindo logo depois.
e Jane entraram na casa e correram para o quarto da garota. Sentaram-se na cama e pegaram as almofadas que estavam na mesma, abraçando-as.
- Certo, me conta! – Jane disse, sorrindo sugestivamente.
- Contar o que?
- Ora... Você e o Adam! Estão tão íntimos...
- O que quer dizer com isso? – entreabriu os lábios, surpresa.
- Vocês não... Não é?
- Óbvio que não, Jane! – ela riu, batendo na amiga com a almofada.
- Ah! Que susto. – levou a mão ao peito, suspirando aliviada. – Porque eu e Max já. – sussurrou. sentiu seu queixo cair, ao mesmo tempo em que seus olhos se arregalaram.
- Como assim?! – gritou, ainda incrédula. – Quando? Onde? Oh, céus! – ela sorriu boba, sentindo os olhos encherem-se de lágrimas. – Por isso que hoje vocês estavam num doce só! – riu, balançando a cabeça. – Você é um bebê ainda, Jane!
- Isso é ciúme? – cruzou os braços, recebendo a risada dela. – Ah, amiga... – sorriu, mordendo o lábio inferior. – Foi ontem, logo que saímos do baile. Max me levou em casa e meus pais estavam dormindo... Aí, bem, ele entrou e nós começamos a conversar...
- Conversar, é?
- Não só conversar! – riu, colocando o rosto sobre as mãos. – Nós nos beijamos e tudo esquentou, não sei. – deu os ombros, ainda rindo.
- E como foi? – sorriu, encarando-a.
- Incrível. – tirou o rosto das mãos para olhá-la. – Acho que foi o momento mais lindo da minha vida. – suspirou. – Max me tratou como uma verdadeira princesa! Eu nunca me senti tão amada quanto ontem.
- Isso é lindo. – fez bico e pulou em cima da amiga, abraçando-a. – Mas, espera... – voltou a encarar seu rosto. – Doeu?
As duas gargalharam alto.
- Óbvio que sim. – balançou a cabeça, ainda rindo.
- Muito? – arregalou os olhos.
- Não... É suportável. Só desconfortável no começo...
- Você está parecendo um pimentão de tão vermelha! – ela riu, acompanhada da outra.
Duas batidas soaram da porta e gritou um audível “entre”. Louise sorriu, entrando.
- Olá, queridas.
- Oi, Louise! O que houve?
- Seu pai está te chamando, meu bem.
- Duas vezes no mesmo dia? Tudo bem, isso não é nada bom! – riu, fazendo careta.
- Dramática. – Jane rolou os olhos. – Talvez não seja nada grave. – piscou. – Vamos, eu vou com você. – sorriu, levantando-se junto da outra. – Oi, Peter! – acenou para a barriga de Louise, a governanta.
- Olá, Jane! – a mulher acenou de volta, fazendo uma voz infantil. As três riram.
e a amiga correram até a sala principal, onde John estava. Ao chegarem lá, avistaram o homem sentado numa das poltronas, em frente à TV.
- O senhor me chamou, papai?
- Sim, querida. Sente-se. – olhou-a. – Boa noite, Jane. – sorriu cordialmente.
- Boa noite, senhor John. – sorriu, sentando-se ao lado de .
- Aconteceu algo?
- Não... Ainda não, na verdade. – suspirou. – Yan fará um importante pronunciamento em dois minutos.
- O quê...? – sussurrou, sentindo todo seu corpo passar a uma temperatura negativa. Jane olhou para a amiga e apertou os olhos, sabia o que a outra estava pensando.
- Vamos manter a calma, sim? Ninguém sabe do que se trata. – sorriu fraco, virando-se para encarar a TV.

Jane segurou a mão de e a apertou, como se pudesse lhe dar forças.
Poucos segundos se passaram e o tal pronunciamento começou. A garota engoliu em seco e sentiu seu coração saltar.
“- A situação não é de nenhum modo boa para nenhum dos lados, eu tenho certeza. Existem desavenças... Desde que o mundo é mundo existem incoerências. – Yan começou. O homem estava atrás de uma mesa de vidro, enquanto lia alguns papeis. – Mas, acredito que enquanto houver meios, conseguiremos terminar com tais diferenças. E, como bom patriota, sei que não existe maneira melhor do que colocando nossos povos para defender nossos países, com suas próprias mãos e armas. Uma disputa paralela.”

O aperto da mão de Jane se afrouxou e colocou o rosto sobre as mãos, já deixando as lágrimas caírem. John deu um soco no braço da poltrona de onde estava sentado.

“- Acredito, sim, que nosso país poderá batalhar de igual para igual com os Estados Unidos. Gostaria, antes de tudo, de dizer que foram vários fatores para me levar a este veredito. Dentre eles, o desrespeito de , filha de John . Minha família e meu país os respeitam, não? A regra é mutua. Mas, isto não vem ao caso no momento. Todos terão a sentença que merecem. Por fim, daremos o tempo de duas semanas para que preparem seus homens e armamentos. Queremos uma guerra honesta. De igual para igual, como disse antes. – o homem suspirou, voltando a encarar a câmera. – Estamos esperando resposta de países aliados. Em duas semanas iniciaremos esta nova batalha, que eu espero que termine da melhor forma possível. Mais vidas poupadas e... Que vença a melhor nação. Obrigado.”


Capítulo III


viu a televisão desligar e seu pai se levantar, xingando a tudo e a todos, enquanto chutava a estante à sua frente. Jane colocou o rosto sobre as mãos e começou a chorar.
Tudo o que temia, na verdade, estava acontecendo. O que era um bando de fotógrafos comparados à uma guerra?
passou a mão no rosto, na tentativa de secar as lágrimas, no entanto, era em vão. A garota se levantou e correu como um furacão até seu quarto.
- ! Filha, venha aqui! – John gritou, na frustrada intenção de trazê-la de volta. Ele não estava bravo, pelo contrário, só queria um abraço da garota. Algo que o desse força.
- Eu... Eu vou tentar conversar com ela. – Jane disse, subindo as escadas. Ao chegar ao final do corredor, bateu na porta. – ? Abre a porta, por favor, vamos conversar!
- Vai embora! – ela gritou.
Ao colocar o ouvido sobre a porta, pôde ouvir o barulho de algumas coisas se quebrando, junto dos gritos desesperados da amiga.
- Pelo amor de Deus, não é sua culpa, !
Mais objetos quebrando, e o silêncio finalmente tomou conta do lugar.
- ? ! – bateu na porta. – Eu vou pegar uma chave pra abrir essa porta se você não a abrir imediatamente!
Alguns segundos depois e a porta abriu. estava de costas e com o rosto coberto pelas mãos.
- Amiga... Por favor, não haja dessa forma. – suspirou, colocando a mão sobre os ombros dela. – Seu pai precisa de você. Seu país precisa de você.
- Meu país precisa de mim?! – ela se virou depressa, encarando-a incrédula. – Eu destruí o meu país! Essa guerra está acontecendo por minha causa!
- Foram vários fatores! Você não viu aquele velho falando isso?
- O único que ele citou foi o desrespeito...
- Mas não é assim, você sabe. Ele só estava esperando mais um “a” vindo da Casa Branca para finalmente ter algum mísero motivo para começar essa maldita disputa. – deu os ombros, passando a mão sobre o rosto. – Eu também estou triste, você acha que não? Pelo amor de Deus! – ela fungou, olhando em volta. – O Max vai ter que ir nessa maldita guerra... Meu pai também. – negou com a cabeça, colocando o rosto sobre as mãos. – Logo agora...
- Desculpe. – ela mordeu o lábio, sentindo o nó em sua garganta se alargar. – Eu... Eu vou dar um jeito nisso! Eu vou até a Alemanha hoje mesmo e vou implorar de joelhos para aquele cretino do .
- Será em vão. Aquele monstro deve ter um pedaço de pedra no lugar do coração... Isso não vai adiantar nada, pelo contrário. – deu os ombros. – O jeito é lidar com isso e, como ele disse, esperar que tudo termine bem.
- Você tem razão. – fungou, balançando a cabeça. – Eu... Eu vou falar com o meu pai.
- Sim, vá. – sorriu fraco. – Eu vou para minha casa, tudo bem? – assentiu, abraçando-a. – Não se culpe, . De verdade. – sussurrou.
- Eu vou tentar. – sorriu fraco.
Ambas desceram para a sala principal e encontraram John com as mãos apoiadas na estante, enquanto tinha a cabeça baixa. As amigas se despediram com um abraço rápido e caminhou até o pai, logo colocando a mão sobre o ombro do homem.
- Pai? – ela sussurrou, já sentindo sua voz embargar.
- ... – ele disse no mesmo tom. O homem se virou para encarar a filha. – Não é sua culpa.
- Desculpa. – e, no próximo segundo, ela já estava nos braços do pai, que retribuiu o abraço. – Me diz que ainda exista algo que o faça mudar de ideia, por favor, me diz que se eu for até ele e pedir perdão, ele esquecerá essa ideia de guerra.
- Eu já te disse que não é assim, meu bem. – o homem afagou os cabelos da filha. – Não se preocupe dessa forma, sim? Nós também estamos preparados para essa guerra. – sorriu fraco, se afastando dela. – Nós temos muitos países aliados.
- Isso é insano. – deu os ombros, balançando a cabeça em negação.
- Nós não queríamos guerra nenhuma, mas já que ele propôs... Nós somos a maior potência mundial. Eles mexeram com o país errado. – e, dito isso, o homem saiu com passos firmes.

respirou fundo e subiu para seu quarto, ao fechar a porta do mesmo, ela sentou em sua cama. Como a vida era engraçada, afinal. Há algumas horas ela se sentia a garota mais sortuda do mundo, e agora, a mais culpada. Não era justo. O que aconteceria com as famílias dos soldados mortos na guerra? Todos esses pensamentos já haviam invadido sua mente no começo da manhã, mas antes eram somente hipóteses. Agora eram certezas. A guerra aconteceria e não havia nada que pudesse acontecer para evitá-la, infelizmente.
As horas correram e só despertou quando Louise entrou em seu quarto, chamando-a para tomar uma sopa, já que a garota ao menos havia descido para o jantar. também negou a sopa. Sabia que se colocasse qualquer alimento na boca, iria colocá-lo para fora no mesmo minuto.
No entanto, o chamado de Louise a fez se lembrar de que Adam já teria chegado da casa de sua tia, e então poderia conversar com o noivo. Ela caminhou até o telefone em seu quarto e discou para o noivo. O telefone chamou algumas vezes e enfim uma voz feminina atendeu. Noah, mãe de Adam.
- Senhora Noah?
- Sim, sou eu, . – a voz da mulher parecia triste, o que fez a garota suspirar.
- Como a senhora está? Adam está aí, por favor?
- Acho que nenhum cidadão americano está bem no momento, querida. E Adam... – a mulher respirou fundo antes de continuar – Os soldados o vieram pegar em alguns minutos.
- Soldados? – ela se levantou, arregalando os olhos.
- Sim, meu bem. Você sabe. Adam foi para o exercito há alguns anos, mas como os tempos eram de paz, havia sido liberado. Contudo, ele terá de voltar para lá. Nosso país precisa de seus serviços.
- Mas isso... – a voz lhe faltou e ela negou com a cabeça. – A senhora sabe se eu posso encontrá-lo em algum lugar?
- Amanhã às dez horas da manhã eles estão liberados para receber os familiares. Será a última visita antes de mandá-los para o campo de treinamento.
- Eu... Oh, tudo bem. Eu irei amanhã então. – fungou. – Até mais, senhora Evans.
desligou o telefone e ofegou, voltando a sua cama logo após. Ela não sabia o que pensar. Sabia que havia chances disso acontecer, mas duvidava. Ainda havia esperanças.
A garota colocou a cabeça sobre o travesseiro e fechou os olhos, na tentativa de dormir. Dormir era uma boa escolha. Só ali poderia sonhar e imaginar um futuro em paz, onde todos estivessem felizes. E foi assim que o sono chegou à sua mente: imaginou o dia de seu casamento, onde todos estariam radiantes. O mundo estaria em paz novamente; e ela, em paz consigo mesma.

- É tudo culpa minha, não é? – lamentou, colocando o rosto sobre as mãos, enquanto sua voz saia entre soluços entrecortados causados pelo choro desesperado. O dia já havia amanhecido e ela estava junto de Adam, finalmente.
- O quê? É claro que não! – Adam afirmou, indo até ela e abraçando-a.
- Não seja gentil, Adam. – fungou, ainda chorando. – Essa maldita guerra só está acontecendo por causa daquela maldita declaração minha à imprensa! - ergueu o rosto, encarando os olhos preocupados do noivo. – Eu sinto tanto! – soluçou, deslizando a cabeça sobre o ombro do outro. – Eu faço qualquer coisa para que isso pare, eu juro! – exclamou, sentindo as mãos calmas de Adam afagando seus cabelos. – Eu sou uma inconsequente, milhares de pessoas irão morrer por minha culpa! Minha culpa, Adam!
- Não diga isso, querida... – disse, tentando manter a voz firme. Provavelmente a intenção fora sem sucesso, já que o choro da garota só aumentou. Consideravelmente. – Você sabe que aquele homem já queria essa guerra. Isso foi só o estopim. – respirou fundo, passando o olhar pelo novo quarto, no alojamento militar. As fardas dos outros soldados estavam sobre a cômoda, diferentemente da sua, que já estava no corpo. – Não se culpe dessa forma, por favor... Isso iria acontecer de qualquer jeito. Tudo irá acabar bem, eu prometo. – sorriu sem humor, ainda afagando os cabelos de .
- Não prometa o que você não pode cumprir, querido. – umedeceu os lábios, desencostando a cabeça do ombro dele. – Você tem noção de quantos inocentes vão pagar por essa maldita guerra? O que aquele velho de merda vai ganhar com isso? – passou a mão no rosto, tentando secá-lo. – “Oh, vamos medir forças com a maior potência mundial, vamos acabar com todos aqueles americanos filhos da mãe” – zombou, com um sorriso sem vida brincando nos lábios, encarando o pequeno broxe do exército costurado no bolso da farda de Adam. – Eu tenho tanto medo. – sua voz saiu fraca, baixa, embargada. Céus, como doía tudo aquilo.
- Não tema. – sorriu, buscando a mão dela, que estava em seu colo. – Em cinco meses nosso casamento vai acontecer e essa guerra já vai ter terminado do melhor jeito possível. – acariciou as costas de sua mão.
- Tem algum jeito de uma guerra terminar de um jeito bom? – riu, olhando para suas mãos juntas.
- É algo para se pensar. – brincou, sorrindo. – ? – ela ergueu o olhar, encontrando o dele. – Eu quero que saiba... – suspirou, fechando seu sorriso. Ela sentiu seus olhos marejarem, já imaginando o que ele diria. – Eu quero que saiba que independente do que aconteça nessa guerra... Eu te amo. – levantou sua mão junto à dela e a beijou carinhosamente. gemeu em descontentamento, sentindo as lágrimas rolarem por sua face novamente. – Eu queria poder te prometer que vou estar maravilhosamente saudável em cinco meses, mas eu não posso, infelizmente.
- Não, Adam... – fungou, negando com a cabeça.
- Você já tem vinte e um anos e eu queria poder te dizer que o que vai acontecer lá fora em alguns dias só vai ser uma brincadeira, algo para nos testar, mas não é. – respirou fundo, fechando os olhos por alguns segundos. – Eu vou lutar pela minha vida... Vou batalhar a cada segundo para voltar pros seus braços tão bem quanto estou indo. – sorriu fraco, mordendo o próprio lábio. – Não é culpa sua, entendeu? – ela abaixou a cabeça, chorando.
- Eu queria que você pudesse ficar aqui comigo... – sussurrou em meio aos prantos.
- Eu tenho que lutar pelo meu país, querida. – levou a mão ao rosto dela, acariciando-o suavemente. – O nosso país precisa de mim.
- Eu preciso de você. Eu! – implorou, se jogando nos braços dele. Adam murmurou algo e a abraçou com força, como se pudesse protegê-la de tudo que estava por vir.
Alguns segundos se passaram e a porta abriu, revelando o sargento do lugar. Ele pigarreou e logo começou a falar:
- Sinto muito, senhorita , mas você precisa ir agora.
encarou Adam por alguns segundos, e ele somente sorriu em sinal de que estava tudo bem.
- Você pode nos dar mais alguns minutos, sargento? Por favor, eu imploro! – juntou as mãos, como se estivesse fazendo uma oração.
- Eu não poderia estar fazendo isso, mas... – suspirou. – Tudo bem. Dois minutos. – sorriu fraco, fechando a porta novamente.
- ...
- Não, me escuta. – interrompeu, pegando as mãos dele. – Nós temos dois minutos e eu não quero gastá-los enquanto digo o quanto isso é culpa minha ou você diz que algo pode ou não acontecer. – respirou fundo, tentando manter o máximo de firmeza na voz. – Eu quero que vá naquela guerra para ganhar, entendido? – ele assentiu, sorrindo fraco. – Estou falando sério, Adam! Eu vou estar te esperando naquela droga de sala do exército no dia em que essa maldita guerra terminar, e quero te ver lá, certo? Quero que você corra para os meus braços e me diga “Tudo acabou bem, meu amor. Podemos ser felizes agora.” – fungou, passando a mão pelo rosto. – Olhe para todos os lados quando estiver no campo de batalha, tenha cuidado com as bombas, com tudo... – suspirou. – Fique seguro, eu imploro. – se aproximou dele, ficando há centímetros de seu rosto. – Eu te amo, Adam.
- Eu te amo também, . – sorriu, colocando o rosto dela entre as mãos. – Tudo vai acabar bem, meu amor. Poderemos ser felizes em breve. – sussurrou, beijando-a.
O beijo durou pouco, mas foi intenso como jamais fora. Era como uma despedida. Por mais que tentasse se convencer do contrário, aquele beijo soava saudade. Desespero. Nenhum dos dois queria que aquilo terminasse, porque quando isso acontecesse, saberiam que era hora de partir. Hora de dizer até mais, até logo... Adeus.
O sargento entrou no recinto e eles se separaram, sorrindo tristonhos. foi até o ouvido dele e sussurrou: “mostre para eles quem manda, soldado Evans.” O homem sorriu e beijou seu rosto, assentindo no momento seguinte.
- Avisa pro Max se cuidar também, ok? – riu fraco. – Eu quero os dois inteiros! – sorriu fraco, indo até a porta onde o sargento estava. Ela olhou novamente para a cama, onde Adam estava. Encontrou o sorriso fraco e os olhos esperançosos dele, o que fez seu sorriso aumentar alguns milímetros. – Boa sorte. – sussurrou, saindo logo após.
Ela respirou fundo e fechou os olhos. Quando os abriu, encontrou o sargento encarando-a, sorrindo fraco também.
- Evans é um ótimo soldado. – ele disse, somente.
assentiu, sorrindo cordialmente. Com passos lentos, ela caminhou até o final do corredor, onde seu motorista a esperava. Ela o cumprimentou com um sorriso leve e ambos andaram até a porta, onde vários flashes foram direcionados à filha do presidente. Ela fechou os olhos por alguns segundos e voltou a andar, colocando as mãos um pouco a frente do rosto, na intenção de proteger os olhos das fortes luzes, que pareciam aumentar a cada passo.
“Como a senhorita está se sentindo quanto a guerra?”
, seu noivo irá para a guerra. Você tem esperanças de que ele volte vivo?”
“Está se sentindo culpada?”
“Como o presidente tentará abrandar a situação?”
“Seu casamento será cancelado?”
“O que você tem a dizer para a população?”
, você pode nos dar uma entrevista?”
“Há mais algo que queira dizer para Yan ?”
“O que pretende fazer agora?”

E, quando não aguentava mais questionamentos e fotógrafos em sua frente, ela resolveu se pronunciar.
- A única coisa que quero dizer é que eu realmente sinto muito por tudo isso estar acontecendo. Sei que uma palavra não vai mudar a situação, mas eu gostaria de dizer... Perdão. Não, não a Yan . Tudo o que eu disse sobre ele foi sincero e eu diria outra vez, se não ocasionasse nessa maldita guerra. Eu peço perdão à população que terá de pagar por isso. E, bem, eu tenho esperanças que Adam volte vivo, assim como tenho esperanças que isso termine o mais breve possível, com o menor número de mortes possível.
“Há mais algo que queira dizer para Yan ?” – a repórter repetiu.
- Se tenho algo a dizer para o ? Não, eu acho que não. Tudo o que já foi dito, basta. Pra mim esse homem é um monstro e deve ter uma pedra no lugar do coração, assim como uma amiga disse. Eu espero que ele seja o primeiro a sofrer as consequências dessa guerra sem fundamentos. É só isso. – assentiu, passando pelos fotógrafos com a ajuda dos seguranças. Ela entrou no carro e jogou a cabeça para trás, respirando fundo.
- A senhorita está bem? – o motorista perguntou, olhando-a através do retrovisor do carro.
- Estou... – suspirou, arrumando a postura. – Só vamos logo, por favor? - o homem assentiu, ligando o motor do carro.
Durante todo o caminho, permaneceu calada. Ela preferia somente pensar no que estava acontecendo, sabia que se começasse a falar com o motorista, iria desabar. E se aquela tivesse sido a ultima vez em que vira Adam? Ela não sabia como lidar com esse pensamento. Adam ficaria protegido, não ficaria? O sargento havia lhe dito que ele era um ótimo soldado. Adam pensaria duas vezes antes de fazer qualquer coisa. Ele era um homem esperto.
Quando o carro se aproximou da Casa Branca, bufou frustrada ao ver os montes de fotógrafos e jornalistas que estavam na porta do lugar. Provavelmente querendo algum discurso de seu pai, ou até de sua educada, atenciosa e simpática filha. Ela riu fraco com o pensamento. Estava mais para vergonha da América. A rebelde... Agora com causa.
abaixou a cabeça e colocou uma das mãos na janela, para impedir que os flashes das máquinas voltassem a lhe cegar.
Mais perguntas cheias de más intenções e questionamentos sobre a guerra. Um interrogatório completo. A garota rolou os olhos com o que ouvira. O portão finalmente abriu, revelando os seguranças da casa branca. O carro finalmente adentrou sobre o lugar, trazendo a “paz” que a garota ansiava. Paz... Uma palavra engraçada de se dizer quando o mundo está prestes a guerrilhar.
Ao passar pela porta, a primeira pessoa que encontrou foi o pai, que batia na mesa onde o telefone estava, enquanto gritava com a pessoa do outro lado da linha. Ela suspirou. Há quantos anos não o via daquele jeito? O homem estava a ponto de ter um colapso. Ao encontrá-la, no entanto, ele se despediu da pessoa com um “depois nos falamos” e desligou o aparelho.
- Quem era? – ela questionou.
- Um dos meus chefes de governo, nada importante. – suspirou, massageando as têmporas. – E você, como foi? Conseguiu ver o Evans?
- Consegui. – sorriu fraco. – Nos despedimos... – sussurrou, passando a mão pelos braços. John fechou os olhos por alguns segundos. – Eu... Eu vou para o meu quarto, tudo bem?
- Não, espere. – ela o olhou de volta. – Talvez seja necessário sairmos dessa casa.
- Oi? – ela franziu o cenho. – Mas essa é a Casa Branca! É onde todos os presidentes devem morar.
- Não em tempos de guerra. deixou bem claro que quer nos atingir, principalmente você. Não posso deixar que nada lhe aconteça.
- Mas... – ela engoliu em seco. Sabia que era um dos possíveis alvos... Mas ouvir isso da boca seu pai era, de alguma forma, assustador. – Para onde vamos?
- Eu ainda não sei, mas resolveremos isso em breve. – suspirou. – Provavelmente em duas semanas, quando a guerra começar.
- Sim, senhor. – ela sorriu fraco, subindo as escadas para chegar a seu quarto. Ao fechar a porta do cômodo, caminhou até sua penteadeira e encarou sua figura no espelho. Rosto inchado, olhos fundos, nariz vermelho e cabelo desarrumado. Sua aparência não poderia estar pior. A garota passou a mão pelo rabo de cavalo e desfez o nó do laço que o prendia.
Em anos não se lembrara de estar tão mal quanto naquele dia. Tudo estava de ponta cabeça. Ao recordar-se do beijo de Adam, seus olhos se encheram de lágrima e seu coração de ódio. passeou os olhos sobre os perfumes e maquiagens em sua penteadeira e, no próximo segundo, os cosméticos já estavam no chão. Com uma passada forte de braço e um grito, a garota havia os derrubado. O barulho foi alto, o que só fez com que toda a situação piorasse. Ela colocou os braços sobre o lugar onde há segundos estavam os perfumes e deitou a cabeça sobre as mãos, deixando o choro vir com força.
Pouco mais de um minuto se passou e Louise, a governanta, entrou no cômodo, assustada.
- Meu Deus! Um furacão passou sobre seu quarto? – ela levou uma das mãos à boca, enquanto olhava em volta. continuava com o rosto entre os braços, em cima da penteadeira. Os soluços e ofegos eram as únicas coisas que podiam ser ouvidas. – ... – começou, mas a garota a interrompeu, erguendo a cabeça.
- Eu sei, Louise. Eu já sei o que você vai falar. Não é culpa minha, não é? – ela riu sarcástica. – Todos já me disseram isso, mas, acredite, não está funcionando. – balançou a cabeça, em negação.
- E chorar desse jeito? Está? – cruzou os braços, logo acima de sua barriga. voltou a negar, mas agora já deixava suas emoções falarem por si.
- Você... Não está preocupada? Com você e seu filho?
- Óbvio que estou. – sorriu fraco, caminhando até ela. – Mas essa preocupação só vai me fazer mal... Eu tenho que esperar pelo dia de amanhã e rezar para que eu ainda esteja aqui. Para que meu filho esteja aqui e para que você e seu pai também. – abaixou a cabeça, deixando as lágrimas escorrerem por sua face. – Você precisa se erguer, meu bem. – ela levantou a cabeça. – E eu não só falo disso. – sorriu. – Eu digo no sentido psicológico. – suspirou, sentando-se ao lado dela. – Onde está o sorriso mais conhecido dessa Casa Branca? Vamos, me mostre que ele ainda está aí.
sorriu fraco, logo a abraçando. Louise retribuiu, sorrindo carinhosamente.
- Obrigada. – sussurrou, se afastando da governanta. – Eu vou ficar bem.
- Tenho certeza que irá. Você, o senhor John, Jane, Max, Adam, eu e Peter. Em poucos meses estaremos não só comemorando a volta deles, mas também o seu casamento. – olhou-a sugestivamente, o que a fez rir.
- Meu casamento... Quero tanto que isso aconteça em breve.
- Será em breve. – sorriu. – Encare isso como uma viagem de negócios, sim? Enquanto isso, você fica planejando na sua mente tudo o que terá no casamento do século. – piscou, caminhando até a porta. – Vou ver se o almoço já está pronto. – acenou, abrindo a porta e saindo pela mesma.
Quando a porta finalmente fechou, deixou que seu sorriso murchasse. Como queria acreditar no que Louise falava. Como queria. Algo, dentro de si, expulsava todas as esperanças que ela guardava. Como um pressentimento... A garota odiava sentir aquilo, mas sentia. Infelizmente sentia. Era como se tudo não passasse de uma despedida. Com Adam, com Max... Seus olhos voltaram a encher de lágrimas e ela voltou a encarar seu reflexo no espelho. O brilho tomava conta de suas íris, mas não de uma forma boa, como quando se está apaixonado. O brilho ali era de lágrimas, porque, ela tinha plena certeza, se não fosse por isso, estariam opacos. Sem vida. Assim como sua alma.

As duas semanas passaram depressa. Mais depressa do que desejava, na verdade. Durante o decorrer dos dias, a saudade que sentia de Adam só aumentava. Jamais passara tanto tempo longe do namorado, e agora, pensando na situação, só doía ainda mais. A garota via Jane quase todos os dias. Ambas se passavam força, conversavam e, às vezes, até riam um pouco.
Em sua casa as coisas estavam mais tensas do que nunca. Toda vez que vira seu pai, fora com governantes ou no telefone, conversando-gritando com chefes de estado. Tudo não passava de planos de ataque, soluções para os feridos e abrigo para a população vitima da guerra. sentia-se a beira de um colapso de nervos ou algo parecido.
Hoje, a garota se focara em olhar álbuns de fotos antigas. Numa página, Jane e ela sorriam, ambas não tinham mais do que quinze anos e estavam abraçadas. Noutra, as duas já estavam com dezessete anos, os rostos já estavam com maquiagem e as roupas eram mais despojadas. Elas estavam no sofá, com as pernas cruzadas e o rosto levemente virado para o lado. A garota sorriu involuntariamente, passando mais uma página. Na próxima, estava com Adam. Ela mordeu o lábio e sentiu o coração acelerar. Os dois estavam um ao lado do outro, com as mãos dadas e sorriam estonteantes. Ao folhear novamente, encontrou uma foto onde estavam os quatro. , Adam, Jane e Max. O quarteto fantástico. Os rapazes estavam em suas bicicletas e as duas moças estavam à frente, fazendo pose. A filha do presidente passou os dedos sobre a foto, sentindo como se pudesse reviver cada momento novamente. passou mais uma página e aquele foi o estopim. Uma foto onde estava com seu pai, na sacada da Casa Branca, onde havia milhares de americanos, erguendo e balançando lenços brancos. Aquela foto fora tirada há dois anos, quando seu pai fora reeleito. A garota fechou o álbum com força e passou pela porta de seu quarto como um redemoinho. Sua decisão estava tomada. Iria impedir aquela guerra nem que fosse a última coisa que faria em sua vida. Decidida, não pensou duas vezes antes de ir em direção à saída dos fundos, onde buscaria a primeira motocicleta que visse, rumando logo em seguida para onde os soldados americanos estavam apostos. Mesmo sem ter a menor noção de como comandaria o veículo à sua frente, a garota não hesitou em aproveitar a distração dos seguranças para, finalmente, sair da Casa Branca pilotando a motocicleta. respirou fundo e buscou a todo modo manter a direção firme, em linha reta; o que lhe pareceu uma tarefa bastante árdua, já que nunca havia tentado dirigir. No entanto, naquele momento nada mais importava. Havia assuntos muito mais importantes a serem resolvidos. Poucos segundos e ela já estava na estrada de paralelepípedos. Até que descobrissem seu sumiço, ela já estaria na sede do exercito.
Alguns minutos dirigindo a motocicleta e chegou ao lugar. Ela desligou o miniveículo e desceu depressa. nunca fora uma princesinha delicada, ao contrário, sempre gostara de brigar com os meninos e não se intimidava diante de vários homens, como as outras moças da época. Se quisesse algo, iria até tê-lo.
Quando avistou os soldados à frente da sede, sorriu cordialmente.
- Olá, rapazes.
- Mas... Senhorita ? O que a senhorita está fazendo aqui? – um deles disse, parecendo surpreso o bastante.
- Oh, céus. O sargento não os avisou? Meu pai me mandou aqui para discutir sobre os planos de ataque à Alemanha. Como não soube? – arregalou os olhos.
- Eu... Bem, nós sentimos muito. Mas, pode entrar, por favor. – sorriu cordialmente, abrindo o enorme portão à sua frente. se despediu com um sorriso igualmente cordial ao de minutos atrás.
Após alguns poucos minutos caminhando durante o campo, chegou à sede do exercito, finalmente. Não demorou até encontrar o sargento e alguns soldados.
não hesitou em pigarrear, chamando a atenção de todos. Ao a encararem, os soldados arregalaram os olhos e entreabriram os lábios.
- Eu sei, eu sei. O que estou fazendo foge totalmente de todas as regras, mas... Escutem-me, por favor. Eu não quero lutar, não quero guerrilhar por aí se é o que estão pensando. – ela engoliu em seco, fechando os olhos por alguns segundos. – Eu já deveria ter feito isso há dias, mas me faltava coragem. Eu... Quero pedir para que, não sei, não lutem. Não deem essa guerra a eles. Deve existir alguma forma de terminar essa guerra mesmo antes de ela ter começado! Não há?
Ao terminar de falar o texto pronto, entretanto, não sentiu que a ideia de ter ido até lá havia sido boa. O que ela havia dito, não era suficiente o bastante. Sentia-se ridícula agora. Dane-se, contudo.
- A senhorita enlouqueceu? – o Sargento disse, parecendo ofegante. – Você está no nosso exército! Em horas, minutos ou até segundos os soldados alemães podem nos atacar. Por favor, volte para a Casa Bra...
- Não! Eu não quero ficar lá de mãos atadas. Eu quero terminar com isso...
- Criança, por favor. Você não sabe o que está dizendo. Estamos lidando com uma guerra, não é uma brincadeira.
- ?
E aquela voz foi suficiente para que a garota voltasse toda sua atenção para o final do corredor. Adam. Ela sorriu fraco e umedeceu os lábios, sentindo finalmente o coração estar preenchido.
- Evans, o que ela está fazendo aqui? Leve-a para a Casa Branca agora mesmo!
Adam assentiu e correu até eles, no entanto, um barulho ensurdecedor tomou conta do lugar, desviando todas as atenções. Todos ficaram em alerta. O sargento encarou os soldados, preocupados, e assentiram, indo para seus postos. A Alemanha começava a atacar.
- Adam? – chamou, com os olhos arregalados. O rapaz negou com a cabeça, enquanto a pegava pelo braço e corria através dos corredores. Os pés de batiam contra o chão duro do corredor, enquanto sua respiração ofegava e seus olhos marejavam. Os Alemães estavam atacando na sede do exercito Americano. Isso deveria ser contra as regras da guerra, não deveria? Ela não sabia. Mal sabia que se existiam regras para uma guerra. No fim, tinha certeza de que quando se tratava de uma batalha como aquela, jogar baixo era favorável. No amor e na guerra vale tudo.
Quando finalmente saíram da sede, a visão que tiveram não foi nada tranquilizante. Os alemães haviam invadido o lugar. Tiros, bombas, lutas braçais. As pernas de se paralisaram no chão, ela não conseguia sair dali, havia algo que a segurava. O medo, talvez. O cenário era devastador. Agonizante. Adam, que já estava bem à frente, só percebeu que a noiva não lhe seguia mais, quando ouviu o grito da mesma, chamando-o. Ao olhar em sua direção, contudo, pôde ver dois soldados atrás de si. Correr seria inútil, ajudá-la seria impossível.
sorriu fraco ao perceber que Adam finalmente havia notado que ela havia parado do correr. No entanto, ao ver a boca dele curvar-se e, logo após, um som alto escapar por seus lábios, ela sentiu uma pancada forte na cabeça. Tudo pareceu distante, quase como num sonho.
passou os olhos pelos soldados, mesmos que agora distorcidos. Acompanhou Adam dar alguns passos até ela, com os olhos arregalados e preocupados. Por fim, tudo escureceu. Não havia mais peso em seu corpo. Não havia mais dor ou angustia. A escuridão foi confortante. Não havia e nem haveria mais guerra.


Capítulo IV


Aquelas palavras lhe caíram como toneladas nas costas. As músicas do rei do jazz Bing Crosby e as inconfundíveis notas de Ella Jane Fitzgerald já não tocavam mais. Tampouco o rock ‘n’ roll de seu ídolo Elvis Presley. Não existiam mais bailes, onde os soldados recém-chegados do exército comemoravam suas vidas com as amadas esposas.
Os topetes altos inspirados nos cantores da década de 50 também não faziam mais parte do visual daqueles homens que lhes olhavam atentos.
Os vestidos rodados e cheios de pequenos detalhes inspirados em Marylin Monroe, já não estavam mais em seu corpo. As longas saias de bolinhas e os laços na cabeça, menos ainda. As maquiagens pin-up não pintavam o rosto daquelas mulheres vestidas de um branco limpíssimo. Aparentemente, a modelo inglesa Twiggy e a atriz Raquel Welch não eram mais ícones da moda. Não naquela década. Não naquele século.
Aquele século. XXI. Aquela década. 2014.
estava sentada numa maca, num ambiente com o cheiro particularmente hospitalar. Ao olhar em volta, não encontrou os móveis rústicos de madeira maciça, pelo contrário: o brilho do aço daqueles objetos faziam seus olhos arderem. Ela voltou o olhar para seu próprio corpo e se viu com uma blusa larga branca, nas pernas; uma calça extremamente folgada de um tecido desconhecido, cinza. Aquilo soava tão... masculino. Era masculino demais até para homens.
Sua cabeça girava com todas as informações que havia acabado de receber, e aquelas pessoas estranhas, vestidas de um modo mais estranho ainda, lhe olhavam como se ela fosse alguma aberração. E talvez fosse.
“Querida, você não está em casa, não chame por seus pais ou amigos. Eles não estão aqui... Ao menos estão nessa vida. – o homem riu cruel e franziu o cenho, não o compreendendo. – Você não está mais em 1957, . Nem você e nem ninguém... Estamos num novo século. Estamos em 2014.”
Aquilo lhe parecia tão surreal que ela poderia jurar estar sonhando, mas esse pensamento logo se esvaiu quando sentiu uma picada forte no braço. Calmante. Seus músculos amoleceram e seus olhos pesaram, no entanto, ela não dormiu como achou que aconteceria. virou um pouco o rosto e pôde ver algo que lhe parecia um espelho, com uma moldura extremamente diferente, mas ainda sim pôde ver seu reflexo ali, e, com isso, quase desmoronou.
Se eles não estavam mais em 1957, como ela poderia estar exatamente igual? Sua aparência ainda era a mesma; não havia rugas, cabelos brancos e nem nada referente a uma mulher de 77 anos, que seria sua idade atual, caso aqueles estranhos estivessem falando a verdade. O que, afinal, estava acontecendo ali? A esquizofrenia, doença que seu pai lhe falado há alguns meses, havia lhe afetado? Ela não sabia o que havia acontecido, mas quando o sono lhe venceu novamente, ela apenas fechou os olhos, deixando-se levar e, quem sabe, voltar à realidade. À sua realidade.

abriu os olhos lentamente e encontrou a imensa escuridão daquele lugar. Ela se sentou no chão e tentou olhar em volta, contudo, não encontrou nada além de uma pequena janela na parede à sua frente, onde frestas de sol entravam, clareando alguns míseros centímetros daquilo que mais parecia um calabouço. Mais alguns segundos se passaram e seus olhos se acostumaram com a escuridão, trazendo o ar precariamente de volta a seus pulmões.
A mulher abraçou seus joelhos e respirou fundo, sentindo o cheiro de mofo do lugar. Uma tosse alta soou e ela arregalou os olhos, olhando para onde o som saíra. cerrou os olhos, tentando enxergar além da escuridão e encontrou aquilo que parecia um senhor, sentado no outro canto da sala.
- Quem está aí? – questionou e ouviu o quão fraco e arrastado seu tom de voz havia saído. Não sabia se pelo medo ou pela fraqueza que sentia.
O silêncio tomou conta do ambiente e ela suspirou frustrada. Precisava conversar com alguém ou enlouqueceria... Ainda mais.
- Por favor... – resmungou, tateando o chão à sua volta. Ela se levantou devagar e sentiu uma tontura repentina. se segurou na parede ao seu lado e voltou a caminhar lentamente, com cuidado a cada passo. Ao se aproximar do que achava ser onde o senhor estava, voltou a se sentar, ainda abraçando os joelhos. – Eu só preciso conversar com alguém. – mordeu o lábio, encarando as próprias mãos. – Preciso saber o que está acontecendo... Se isso é só um pesadelo ou estou num sanatório. – ao terminar a frase, ela riu. Riu de nervoso. Riu do quão ridículo aquilo havia soado. – Sabe... Horas atrás eu estava no exército, tentando arrumar uma solução para que essa maldita guerra não aconteça, e agora estou aqui. Um lugar que eu ao menos sei o que é. Onde é. – deu os ombros, sorrindo amargurada. – Eu só me lembro de tudo escurecer, e, quando acordei, estava aqui, com desconhecidos vestidos estranhamente diferentes me dizendo que estou num novo século. – olhou para cima, ainda rindo. O homem não lhe respondeu nada e ela colocou o rosto entre as mãos, sentindo um nó se apertar em sua garganta.
- Não foi há horas. – O senhor se pronunciou e ela ficou alerta, destapando o rosto e olhando para ele. – Isso aconteceu há quase sessenta anos.
A mulher voltou a rir, rir alto. Ela balançou a cabeça em negação algumas vezes e continuou rindo... Como uma louca. Quando as risadas cessaram, sentiu o rosto queimar, ao passar as mãos sobre o mesmo, conseguiu sentir as lágrimas escorrendo sobre sua face.
- Isso é impossível. – sorriu fraco, voltando a olhar para o homem, que agora estava mais visível, já que a escuridão parecia estar cada vez menor. Ele aparentava não ter menos de sessenta anos, talvez estivesse caducando. Talvez todos ali estivessem.
- Então como você explica estar aqui?
- Os alemães devem ter me prendido logo que me encontraram no exército. – deu os ombros, fingindo ter certeza do que falara.
- Você está certa. Eles te prenderam... Há quase sessenta anos.
- É claro. E eu com mais de setenta anos continuo com essa aparência de vinte. Boa genética. – zombou, se levantando devagar, tentando chegar até a pequena janela.
- Eu também não sei como você continua assim... Estou preso nesse lugar desde que me entendo por gente. – suspirou. – Você se lembra da governanta Casa Branca? Louise? – a outra não respondeu nada, estava assustada demais para manter algum diálogo. Como aquele senhor poderia conhecer Louise? Nunca vira aquele homem na Casa Branca antes. – Ela estava grávida, não estava? – riu, amargurado. – Prazer, senhorita . O meu nome é Peter.
Assim que a frase que ele havia dito fez sentido na cabeça de , ela se virou depressa, encarando-o com os olhos arregalados e a respiração descompassada. A mulher balançou a cabeça assiduamente, levando as mãos aos cabelos e bagunçando-os.
- Você está mentindo. Isso não está acontecendo, isso não está acontecendo... – sussurrou, ainda descontrolada.
- Se acalme, por favor.
- Não! Eu quero sair daqui! – gritou, indo até o canto da sala, onde havia uma enorme porta de aço. Ela respirou fundo e começou a socar a peça, enquanto gritava descontroladamente. – Socorro! – chutou a porta algumas vezes, na tentativa frustrada de arrombá-la.
Mais alguns minutos incansáveis fazendo aquilo e a porta abriu, revelando dois homens grandes e fortes, que mais pareciam armários. Ela respirou ofegante e encarou os dois, que a puxaram, colocando uma venda em seus olhos.
- Por favor! Me ajudem! – implorou, sentindo ser levada por eles. Nenhum dos homens respondeu, deixando-a ainda mais aflita. Depois de alguns minutos caminhando, eles finalmente pararam. ouviu uma porta se abrindo e logo depois seus olhos foram descobertos.
A garota abriu os olhos lentamente, se acostumando com a claridade do lugar. Ela olhou em volta e pôde ver como tudo era diferente. As paredes eram pintadas de branco e havia uma mesa de vidro no centro, junto de duas cadeiras escuras, de madeira. Ao lado, um armário de aço e no teto uma lâmpada cumprida, da qual jamais havia visto.
- Sente-se. – uma voz masculina soou e só então se deu conta de que não estava sozinha na sala. Ela encarou o homem que estava de costas e se deu a chance de observá-lo; talvez o conhecesse, afinal. Ele tinha os ombros largos e os cabelos curtos, totalmente diferente dos topetes que os homens usavam. O desconhecido vestia aquilo que parecia ser uma farda, entretanto, não era verde como a dos soldados, mas sim, azul.
suspirou e fez o que o homem ordenou. Ao sentar-se, colocou as mãos sobre a mesa, entrelaçando-as.
- Por favor, eu não tinha a intenção de começar guerra alguma. Se puder me dizer o que eu posso fazer para que isso acabe, eu farei. – murmurou, tentando ver o rosto do homem, que continuava de costas. – Eu só quero que tudo termine em paz. Que tudo termine agora. – sussurrou, descendo o olhar para suas mãos entrelaçadas em cima da mesa.
- A guerra acabou há mais de cinquenta anos. – O homem se virou, encarando-a. Ela ergueu o rosto, finalmente olhando para ele.
- Essa história de novo não... – balançou a cabeça em negação, logo depois apoiando os cotovelos na mesa e colocando o rosto sobre as mãos.
- Por que acha que inventariamos isso? – Ele cruzou os braços.
- Eu não sei... Eu não sei! – destampou o rosto, voltando a encarar o homem. – Isso é impossível. – disse baixo, tentando afirmar mais para si mesma do que para o outro. Ela suspirou derrotada, por fim. – Você tem algum espelho, senhor...?
- . – Ele apontou para a parede atrás de si, onde havia um espelho. – .
- ? – se levantou, se aproximando do homem. – Mas esse sobrenome...
- Você conheceu alguém com o mesmo sobrenome. Yan . Meu avô.
entreabriu os lábios para dizer algo, mas assim que encontrou seu reflexo no espelho, suas palavras se esvaíram como folhas numa ventania. Se, de fato, houvesse passado quase sessenta anos desde a guerra, por que sua aparência continuava a mesma? Sua pele, cabelos e corpo estavam intactos. Era como se ela observasse sua figura com vinte e um anos de novo. Aquilo não estava acontecendo, era impossível. fechou os olhos brevemente e balançou a cabeça na tentativa frustrada de voltar à realidade. Onde estava sua sanidade, afinal? Se tudo não fosse um sonho, só havia uma explicação cabível para a situação: havia enlouquecido. Esquizofrenia. É. Como havia pensado há horas, quando acordou naquela sala totalmente estranha, só podia ser esquizofrênica. Agora que não estava mais sob efeito de calmantes, tinha pensado melhor e era só isso que havia acontecido.
A garota abriu os olhos novamente e tocou em seu rosto, analisando cada pequeno centímetro de pele ali existente. Seu olhar passeou pelo espelho e ela pôde enxergar ao fundo, olhando-a também. Oh, céus. A quem queria enganar? não estava louca coisa nenhuma. Muito menos num pesadelo. Aquilo era a pura realidade... Por mais impossível que parecesse.
- Como? – disse, e sentiu sua voz sair mais fraca do que jamais fora. Ela continuava a observá-lo através de seu reflexo no espelho. – Como fizeram isso? – questionou, sentindo o maldito e conhecido nó se apossar de sua garganta. De novo.
- Projeto Ironm4x. – disse, jogando alguns papeis na mesa. – Sente-se e eu lhe explicarei tudo.
A mulher se olhou pela última vez no espelho e voltou para a cadeira onde estava, colocando as mãos sobre a mesa, novamente.
- Por favor.
- Há uma semana encontrei esses papéis na sala do meu pai e passei algumas horas avaliando-os. Eu sequer sabia da existência dessa máquina, quanto mais da sua nela. – Deu os ombros, colocando as mãos sobre a cadeira que estava à sua frente.
- Máquina? – e, novamente, sua voz havia soado mais fraca do que planejara.
- Ironm4x. – Apontou para o nome que estava no centro da folha, em letras garrafais. – Um compartimento de ferro que consiste em transmitir raios que têm o a função de manter a pessoa em sua forma atual: mental e fisicamente. O número 4 do nome significa que a máquina obteve sucesso em sua quarta tentativa. – passeou os olhos sobre o rosto dela, observando cada detalhe dele. – E pelo que eu vejo, sucesso é, definitivamente, a palavra certa. – franziu o cenho, tentando procurar algum sinal diferente na aparência de . Não encontrou nada.
- Quer dizer que me congelaram no tempo? – ela riu, mas a risada não parecia nenhum pouco feliz. Era amargurada, triste. Incrédula. – Vocês roubaram os melhores anos da minha vida... – sussurrou, virando-se para encarar o homem em sua frente. – Monstros! – bateu as mãos na mesa, fazendo barulho suficiente para que o outro se assustasse. Entretanto, não demorou mais do que cinco segundos para que ele se recompusesse. – Eu tinha uma vida toda pela frente! Um casamento, uma família, amigos... – sua voz embargou e ela respirou fundo, balançando a cabeça. – E agora? Vocês podem construir uma máquina que me faça voltar? Não podem! – bateu na mesa novamente. O choro veio com força e ela não o impediu. cruzou os braços, observando-a.
- É um drama inútil. Não posso fazer nada quanto a isso. – ele disse, deixando sua voz soar mais fria do que o necessário. deu os ombros novamente, cruzando os braços em seguida.
- Inútil?! – exclamou, rindo sarcástica. – Eu perdi todo mundo... Eu perdi a minha vida. – se levantou, olhando nos olhos do outro. – Você me dá nojo. – cuspiu as palavras, com o maxilar trincado. – Você e todos os culpados por aquela guerra e por tudo o que aconteceu!
- Pelo que eu saiba, foi você quem procurou por isso...
- Oh, mas é óbvio. Uma guerra começa porque a filha do presidente dos EUA fala que o presidente da Alemanha precisa fazer mais sexo? – cruzou os braços, balançando a cabeça. – É realmente um motivo muito plausível.
- Eu acho que só teve o castigo que merecia. – encostou-se sobre a mesa, inclinando um pouco a cabeça para o lado, observando-a.– Você não deveria ter mexido com a minha família.
- Não dá pra acreditar no quão frio você é! Todos são! – gesticulou com as mãos. – E agora? O que pretendem fazer comigo?
- O mesmo que fazemos com Peter.
- Me manter naquele purgatório até que a morte bata a minha porta? É isso? – sorriu irônica. – Aliás, por que ele está lá?
- Ele era um bebê quando nossos soldados invadiram a Casa Branca, eles optaram por deixá-lo viver.
- Viver... – riu irônica, secando as lágrimas que escorriam por seu rosto. – Você chama aquilo de viver? – colocou a mão na cintura, olhando em volta.
- Você já pode voltar para seu novo lar. – sorriu cruel, enquanto tirava do bolso um bip. – Podem vir pegá-la. – disse, desligando-o logo após.
- O quê? – disse e ouviu sua voz sair esganiçada. – Eu não quero voltar para lá! Eu não vou!
- Oh, não? – colocou as mãos nos bolsos, sorrindo da mesma forma de antes – É claro. Você é quem manda, queridinha da América. O que quer? Um quarto aconchegante à beira do mar? Se quiser posso chamar Elvis Presley para fazer um show particular para você. – piscou, rindo. – E pode deixar, não vou me esquecer de mandar o seu chá com biscoitos às 18h.
franziu o cenho com o que ouvira. Como aquele homem podia ser tão frio dessa forma? Ele era novo, provavelmente não tinha mais do que vinte e cinco anos, como perdera todos seus sentimentos bons? Um aperto se apossou de seu peito e as lágrimas voltaram a cair de seus olhos. Agora sem ao menos pedirem permissão. Quando a razão voltou para sua mente, só então uma frase que lhe dissera há poucos havia feito sentido para ela.
Os homens de antes entraram na sala e ela deu alguns passos à frente, se aproximando de .
- Você disse que a Casa Branca foi invadida? – sussurrou, incrédula. O outro fingiu pensar alguns segundos, mas logo voltou a encará-la, assentindo. – Eu posso te fazer uma pergunta? - fungou, tentando sem sucesso secar o rosto.
- Quem sabe eu não seja bonzinho? - o mesmo sorriso cruel brincava em seus lábios. – Faça a pergunta e talvez eu responda.
- O meu pai... – sussurrou, com a voz embargada. – O que aconteceu com ele? Onde ele está? – a inocência com qual perguntara havia sido tanta, que por um milésimo de segundo, sentiu pena. Mas não, ela havia procurado por aquilo. Aquela maldita guerra havia começado graças àquela maldita frase que custou a paz de tantas famílias, principalmente da sua. Não só durante a guerra, mas ao decorrer dos anos também. Tantas vidas não haviam sido perdidas. Tantas vidas inocentes... E importantes. Extremamente importantes.
Quando se deu conta de que já haviam passado alguns segundos desde a pergunta dela, ele respirou fundo e deixou que as palavras tomassem forma através de sua boca.
- No mesmo lugar que o meu. – sorriu amargurado, mas em segundos voltou à pose irônica e imponente de antes. – Os soldados o mataram durante a guerra.
O silêncio que tomou conta do lugar fora de longe o mais desconcertante e desconfortante que pudera acontecer. balançava a cabeça em negação, enquanto seu corpo inteiro tremia e tentava entender as palavras que acabaram de ser formadas em sua mente. Seu pai havia morrido por sua causa. Sua vida havia se tornado um inferno por causa de sua irresponsabilidade.
- Não... Não, não, não. – ela murmurou em meio à soluços. – Vocês não poderiam ter feito isso! – gritou, surpreendendo com um tapa certeiro e extremamente forte em seu rosto.
Ele não disse nada no segundo seguinte, a não ser respirar fundo enquanto seu rosto estava virado para o lado, com os olhos ainda fechados.
- Sua vadia! – urrou, pegando a mão dela e apertando seu pulso com força. – Você pensa que é quem?! – gritou. sentia tanta raiva que era capaz de sentir seus olhos quase saltando por suas órbitas e suas veias do pescoço e rosto prontas para estourarem. Nenhuma mulher jamais o bateu. Nenhuma mulher jamais ousou fazer tal insanidade.
- Quem sou eu? – ela riu sarcástica, enquanto chorava. – Eu sou , uma aberração de setenta e oito anos que aparenta ter vinte e um; a garota que perdeu toda a vida por culpa de uma maldita frase! – soluçou, olhando nos olhos do outro, que transparecia ódio. Seu rosto já começava a mostrar o resultado do tapa de segundos atrás. Estava vermelho e com as marcas de seus dedos. – E você, quem é? Neto de um homem que matou milhares de pessoas com uma guerra por causa de uma besteira! A coisa mais insignificante do mundo! – gritou, em meio a ofegos. – Você é um nada, . Você é nojento! – ele desfez o aperto de seu braço e ela se soltou, massageando o pulso.
- Levem ela para o Zimmerman. – virou-se de costas, encarando a cortina à sua frente.
- Mas senhor, ela é mul...
- Me obedeçam ou quem vai ter uma conversinha com Zimmerman são vocês. Andem! – deu um soco na mesa, fazendo com que os papeis que estavam sobre ela caíssem.
Os homens não demoraram mais de um segundo para obedecê-lo. Os dois foram até e a imobilizaram, logo arrastando-a para fora da sala.
- Pra onde estão me levando?! Quem é Zimmerman? – exclamou, tentando se esquivar dos braços dos homens. Tentativa totalmente frustrada. – Me larguem, seus trogloditas!
riu ao fundo e ela virou o rosto para encará-lo.
- A máquina só não foi capaz de atualizar sua mente, não é, ? – ele cruzou os braços, ainda rindo. – Você fala como minha avó.
- Vá-se-foder. – Ela disse entre os dentes, se debatendo contra os homens.
- Que garotinha mais rebelde. – fez bico, fingindo se abalar com as palavras dela. – O que estão esperando, imbecis? Levem-na logo! – apontou para a porta, onde os guardas andaram depressa. Os gritos da garota ecoaram por todo o corredor e quando não foi mais capaz de ouvi-los, permitiu desfazer o sorriso sacana que estava no rosto. Maldita vadia. Como ela havia dado aquele tapa em sua cara e ainda teria falado todas aquelas coisas? Quem ela pensava que era? Uma americana filha da mãe. A americana filha da mãe.
caminhou até o espelho - onde ela se observara antes - e enxergou seu rosto vermelho com a marca dos dedos da garota. Ele trincou a mandíbula novamente e passou a mão pela bochecha, examinando o local. Agora já não importava mais. Ela teria seu castigo... Alguns minutos com Zimmerman e ela jamais voltaria a sequer lhe dirigir a palavra. Atrevida.

agora se via sendo arrastada por aqueles dois trogloditas para um lugar totalmente desconhecido. Zimmerman... Quem era Zimmerman, afinal? Oh, céus. Tudo estava tão confuso. Ela não tivera um só minuto para pensar em tudo que estava acontecendo, não pudera ao menos chorar em paz. Lamentar sua dor.
Pensando em suas frustrações, ao menos viu quando os homens pararam de andar em frente a uma porta escura.
- Vocês já podem me soltar. Eu não sou nenhum animal e não vou sair correndo por aí. – dito isso, os homens a largaram e ela recuperou a postura, logo depois cruzando os braços.
- Você poderia controlar mais essa boca e mãos, garota. – um dos homens disse, enquanto tocava um botão próximo à porta. – Essa será uma experiência que ninguém daqui gostaria de ter.
Um arrepio tomou conta da espinha de , que o encarou curiosa e confusa.
- Quem é Zimmerman?
- Me chamaram?

's POV

A voz desconhecida soou, logo sendo figurada por um senhor que apareceu na porta, abrindo-a. O homem aparentava ter não mais do que cinquenta anos; era magro e tinha o rosto parecido com o de uma caveira. As roupas eram, se me permito pensar, extremamente grosseiras. Os primeiros botões da camisa – que já fora social um dia – estavam abertos, as calças encardidas, e, no rosto uma feição nada amigável. Por que aquele filho da mãe me mandou para cá, afinal?
O homem me olhou dos pés a cabeça e, devo admitir, um enjoo tremendo se fixou na boca do meu estômago.
- Vejam se não é a famosa ... – ele sorriu cruel. Será que todo mundo nesse lugar tem que usar desse sorriso?
- a mandou para cá logo depois de levar um tapa no rosto e ouvir algumas coisas... Indevidas. – um dos guardas disse e eu engoli seco. Certo, eu não estava gostando nada do rumo que aquela conversa estava tomando.
- Ora, ora... Que mocinha mais corajosa, não? – ele cruzou os braços, voltando a me olhar de cima abaixo. E isso está me incomodando profundamente. Não é nada educado ou cavalheiro. Oh, céus. Será que é pedir demais por umas horas de paz? – Aliás, que mocinha. Você está ótima para sua idade. – todos os três riram e eu rolei os olhos. Maldita piada sem graça.
- Escutem, por favor. Eu acabo de descobrir que fui cobaia de uma máquina que me congelou por mais de cinquenta anos, descubro que perdi tudo. Tudo mesmo. Minha dignidade, liberdade, amigos, família, um noivo e sabe se lá mais o quê. – eu suspirei, tentando manter a voz firme. – Então, por favor, se não for incômodo, eu gostaria de ir para onde quer que me levem, sentar à vontade e chorar até que meu corpo seque ou até que me encontrem e digam que isso é só uma mentira, que a guerra nem ao menos começou e que tudo está exatamente como estava um dia antes de eu acordar aqui. – respirei fundo ao terminar de falar, tentando recuperar o fôlego. Os dois olharam para mim surpresos e sérios. A não ser Zimmerman, que continuava com aquele sorriso no rosto.
- Logo você poderá fazer isso, querida. Mas não vai chorar só pela dor psicológica... Mas pela física também. – ele piscou, me puxando para entrar na sala. Ok, tudo bem. O que ele estava querendo dizer com “dor física”?
- Quando terminar, estaremos aqui para levá-la novamente. – um dos guardas disse. – E, Zimmerman... Pega leve, ela já sofreu demais para um dia só, ok?
- Não posso prometer nada. – dito isso, o homem fechou a porta e me encarou, sorrindo. Engoli seco, dando alguns passos para trás, até chegar naquilo que parecia ser uma maca. – E então, bonitinha... Deixe-me apresentar: sou Zimmerman e sou, digamos que, o carrasco desse lugar. Sempre que alguém se comporta mal, eu sou o responsável por deixá-lo na linha, se é que me entende...
- O que você vai fazer comigo? – minha voz soou fraca, quase como um sussurro. Oh, merda. Minha vida podia piorar? Como eu queria que Adam estivesse aqui... Oh, Adam. Um nó se formou em minha garganta e meus olhos encheram-se de lágrimas. O que havia acontecido com Adam? É como se há horas eu estivesse correndo com ele pelos corredores do exército, tentando achar uma saída. Ou como a duas semanas, quando nos despedimos, dizendo que o amava e sabendo a reciprocidade daquilo. Adam me salvaria disso. Adam socaria o nariz daquele sem coração do . Adam cuidaria de mim... Quando percebi, as lágrimas já escorriam por meu rosto, fazendo um caminho lento e tortuoso. Tortuoso... Tortura. Olhei para Zimmerman de novo e lá estava ele, segurando uma tesoura nas mãos.
- O que... O que você vai fazer com isso?
- Começar a nossa brincadeira. – o homem abriu e fechou a tesoura, fazendo com que a luz refletisse o aço do objeto. Só deixando tudo pior. Tudo pior.
Fechei os olhos por alguns segundos e quando os abri de novo, senti Zimmerman passando as mãos nos meus cabelos, enquanto erguia com a tesoura com uma das mãos.
- São belos cabelos... O que acha de deixá-los no corte da moda? Do nosso século?
Meus cabelos... Meus cabelos, não! Oh, foram tantos anos para deixá-los nessa altura. A altura do meu quadril... Meu lindo cabelo. Eu neguei com a cabeça e suspirei, o que eram cabelos para quem já tinha perdido tudo?
Ouvi o barulho da tesoura sobre meu cabelo e continuei com os olhos fechados, só esperando que aquilo terminasse. E, por favor, que termine logo!
Mais alguns minutos daquela forma, sentindo meu cabelo cair sobre meus pés e ouvi o homem me chamar, dizendo que tinha terminado. Passei a mão pelos cabelos e eles estavam um pouco acima do ombro. Certo, poderia ser pior. O carrasco me encarou novamente e, num susto, acertou meu rosto com um soco. Oh, céus, o quê? Coloquei a mão no rosto, enquanto arregalava os olhos e ofegava.
- Sinto muito, bonitinha.
Nojento. Nojento. Nojento.
Quando estava prestes a me recuperar do primeiro soco, senti uma dor aguda no meu estômago e meu corpo caindo para trás. Outro soco. Tossi um pouco, tentando recuperar o fôlego, mas ao menos tive tempo para isso. Zimmerman me puxou pelos cabelos, fazendo-me levantar e me arrastou sobre o chão rustico. Eu mal tinha forças para gritar. Quando cai no chão novamente, senti o chute dele sobre minhas costas e arfei, tentando me erguer. O carrasco voltou a me puxar pelos cabelos, agora me colocando em sua altura. Ele colocou a mão sobre meu pescoço e me levou até a outra parede, onde apertou sem dó ou piedade aquela área. O ar estava se esvaindo... Tudo estava começando a rodar.
- Espero que não vê-la de novo aqui, queridinha da América. – cuspiu entre os dentes, afrouxando um pouco a mão sobre meu pescoço. – Não gosto de bater em mulher, por isso, não vou te machucar mais. – ele me soltou e eu respirei fundo, colocando as mãos sobre o pescoço. – Ah, só para que o não me encha o saco. – ele suspirou entediado e quando menos esperei, me deu um soco na bochecha oposta a de antes. E, certo, esse havia doído ainda mais do que o outro.
Eu caí no chão, já sem forças para me aguentar em pé e senti-o puxar meus cabelos novamente. Mas, agora, graças a Deus, não era para mais uma pancada, e sim para abrir a porta. Onde os guardas me esperavam. Pela cara que fizeram, meu estado devia estar deplorável. Ainda mais.
Os olhei com os olhos cerrados, estava com muita dor para tentar me levantar e, como se ouvissem meus pensamentos, um deles se abaixou sobre mim e me pegou nos braços. E eu agradeci. Agradeci mentalmente, já que não era capaz de dizer uma palavra sequer. Estava doendo demais. Física e mentalmente.
Os três conversaram mais alguma coisa que eu não fui capaz de ouvir e logo depois senti meu corpo ser movimentado para fora daquele corredor imundo.
- não quer que a levemos ao menos para a enfermaria? O lábio dela tá sangrando muito!
Oh, então era por isso que doía tanto.
- Eu não sei... Mas, provavelmente, não. Ele estava puto.
- Ela é uma mulher corajosa.
- E forte.
Meus olhos voltaram a se encher de lágrima e eu novamente os agradeci mentalmente. Só Deus sabe o quanto ouvir isso me fez bem. Ouvir coisas que me fazem sentir bem. Elogios... Jane me elogiava tanto. Jane. Oh, minha amiga Jane. O que será que aconteceu com você? Casou-se com Max? Oh, Max o bobão. Até de você eu sinto falta.
Quando dei por mim, já chorava alto no colo do guarda, que me olhava num misto de pena e culpa. Pena, não. Eu odeio que sintam pena de mim. Solucei ao perceber que o máximo que podiam sentir era pena... Então era isso? Eu estava fadada ao sofrimento? A passar o resto da minha vida trancafiada num quarto escuro, sem ao menos uma cama digna? As lágrimas voltaram a rolar sobre minha face, se misturando com o sangue que saia pelos meus lábios. Doía tanto. Não digo só sobre a dor física... Mas a psicológica. A mental. A interna.
- Eu penso que até amanhã o deixe que você vá à enfermaria. Só espere que a raiva passe... Amenize.
A voz novamente me faltava, então somente assenti com um sorriso fraco no rosto.
Adam. Jane. Max... Papai.
Isso tudo só está acontecendo por minha culpa. “Perdoem-me, por favor.” Sussurrei, como se eles fossem capazes de ouvir minha suplica... De onde quer que estejam.
O guarda que me carregava nos braços, logo parou de andar, esperando que o outro abrisse a porta que estava à frente.
- Você ficará aqui até que segunda ordem, tudo bem? – o homem disse e eu voltei a assentir. Quando virei o pescoço para observar o lugar, enxerguei o mesmo breu de horas atrás. Era lá que estava aquele homem, Peter, não era?
Senti meus pés tocarem o chão e me apoiei nas paredes, na tentativa de me equilibrar. Caminhei lentamente até uma distância considerável da porta e me sentei, logo abaixo da pequena janela. Gemi ao sentir minhas costas tocarem a parede dura e fria. Aquele maldito chute começara a fazer efeito. Respirei fundo e abracei meus próprios joelhos, apoiando os braços sobre eles. Inclinei a cabeça para trás, encostando-a a parede. Encarei o teto escuro acima e suspirei, sentindo o ansiado choro voltar, e, agora, não havia meios se segurá-lo. Eu sequer queria segurá-lo. Fechei os olhos e engoli seco, sentindo o conhecido nó tomar posse de minha garganta. Ao abri-los, notei minha visão embaçada, o que não durou muito, já que o que as lágrimas que a cobriam rolaram por meu rosto. Solucei alto e só então notei o quanto havia segurado esse choro.
Soluços, fungadas, ofegos, tosses... Existem mais sinais de um choro desesperado do que esses? É, eu tenho certeza que não há. Por fim, era tudo o que me restava no momento. Chorar era a única solução que eu tinha para que essa agonia em meu peito ao menos se amenizasse. Como uma anestesia... Chorar seria um anestesiante para àquela hora. Chorar seria um anestesiante para toda a minha vida... Por toda a vida que eu passasse nesse inferno.


Capítulo V


- Agora você acredita em mim?
Uma voz disse e eu não evitei em ver de onde vinha. Oh, claro. Peter. Eu quase havia me esquecido que não era a única a ter minha vida como um verdadeiro inferno.
Esperei que minha voz voltasse às minhas cordas vocais e suspirei, antes de respondê-lo.
- Acho que não existe outra explicação para tudo isso, não é? – ri, sem humor. – Eu mal acredito como você conseguiu viver tanto tempo aqui. Trancafiado nesse inferno.
- Algumas vezes por mês eles me levam para dar uma volta pelo Ministério. –pigarreou. – Você está bem?
- Levando em consideração os últimos acontecimentos, eu acho que não. – respondi no meu tom mais sarcástico. Certo, aquilo era errado. Mas eu não seria simpática nem mesmo com a minha sombra agora.
- Imaginei que responderia isso. – ele riu. – Parece que você foi ter uma conversa com o Zimmerman, não é?
- já lhe mandou para lá? – virei o rosto para encará-lo com mais clareza.
- ? Oh, não. Eu já tenho 58 anos, meu bem. – ele sorriu fraco, enquanto brincava com uma pedra. – Aos dezessete anos, quando a inconsequência e rebeldia da adolescência tomou minha mente, decidi tentar fugir desse lugar e, é óbvio, a tentativa foi frustrada. Quando me pegaram, Barth não pensou duas vezes antes de me mandar para aquele... Inferno. Oh, sim. Aquilo pode ser considerado o inferno. Tive a companhia de Zimmerman por dois dias inteiros... Até hoje minhas pernas não voltaram a serem as mesmas.
- Dois dias?! – perguntei, atônita. Eu mal passei quinze minutos com aquele crápula e já sinto dores por cada músculo do meu corpo. Quanto mais dois dias? Isso é loucura. – Barth ?
- Sim, dois longos dias. Talvez os mais longos de minha existência. – suspirou, nostálgico. – Barth , filho de Yan e pai de , que você conheceu há pouco.
- Se existe alguma família do diabo na terra, posso afirmar que seria essa. – sorri fraco, passando as mãos nos meus cabelos, agora curtos.
- Não tenha dúvidas. – ele sorriu também. – Sabe... Eu... Gostaria de lhe fazer uma pergunta. – eu assenti, esperando que ele continuasse. – Como a minha mãe era?
Oh, céus. Um homem com a aparência do meu pai, me perguntando como era a mãe dele. Isso é, definitivamente, inacreditável. Mas, bem, o que não é inacreditável por aqui?
Eu sorri fraco ao me lembrar de Louise, ela era uma grande mulher e se orgulharia de ver o filho vivo, mesmo depois de tanto sofrimento e humilhação.
- Louise era maravilhosa. – passei a mão no rosto, secando-o. – E esperava ansiosamente por sua chegada... – pigarreei, chacoalhando a cabeça. – É definitivamente aterrorizante pensar que há dias, pelo que eu me lembre, ela estava grávida, e hoje você está aqui, com 58 anos! – dei os ombros, mordendo o lábio, sentindo meu queixo tremer.
- Eu teria dado minha vida inteira por um abraço dela.
Tudo bem. Talvez eu devesse parecer forte para ele, mas depois dessa declaração eu não consegui fazer mais nada a não ser colocar o rosto entre as mãos e chorar. Chorar... Até que meu corpo secasse, talvez. Tudo aquilo só havia acontecido por minha causa. Minha causa! Minha culpa. Oh, se eu pudesse voltar no tempo e mudar tudo... Eu teria sido a amiga, a namorada e a filha do presidente; perfeita.
- Está tudo bem, não chore. – o homem disse e eu chorei ainda mais. Qual é o mecanismo em nosso corpo afinal que nos faz chorar ainda mais quando alguém diz o contrário, ou nos abraça? Eu realmente não entendo. E talvez nunca entenderei.
- Desculpe... Tudo isso só aconteceu por minha causa. – solucei, tentando secar meus olhos com as mangas da grande camiseta que vestia. – Oh, meu Deus! Eu sinto tanto, tanto, tanto por isso.
- Não se culpe. Tudo só aconteceu porque tinha que acontecer.
- Adam falaria algo assim... – sorri fraco.
Oh, é claro. Eu tinha que me lembrar de Adam, não tinha? Uma pontada na boca do meu estômago e eu solucei, na tentativa de gritar. Aquilo doía mais do que qualquer soco ou chute que Zimmerman me desse. As lembranças de Adam em minha mente eram muito claras e vivas para pensar que tudo acabara. Jamais voltaria a vê-lo. Jamais sentiria seus abraços, seus beijos... Jamais ouviria suas palavras doces e confortantes novamente. Neguei com a cabeça, nada mais fazia sentido.
- Adam? Eu nunca ouvi falar sobre ele.
- Adam era meu noivo... – mordi a manga longa da camiseta e observei o horizonte. –O amor da minha vida, na verdade. – admiti, porque era assim que me sentia. – Adam não era só um companheiro amoroso, era um amigo, um irmão... Ele significava tudo para mim. Aquele homem tinha o incrível poder de me acalmar e me tranquilizar com poucas palavras e um confortável abraço. – abracei meu próprio corpo, como se ainda pudesse sentir a pele dele sobre a minha. – Eu o amava tanto, tanto!
- Eu já ouvi mil definições sobre o amor... Mas nunca o senti. Nem teria como, não é? – Peter riu amargurado. – Dizem ser a melhor sensação que um alguém pode sentir.
- Você tem razão. – sorri, umedecendo meus lábios. – Amar é incrível. – suspirei, passando os olhos por aquele pequeno cômodo. – Mas não só o amor carnal. O fraternal, o platônico ou o que, até a minha época sem nome, sentimos por nossos amigos.
- Eu nunca senti nenhum desses... Na verdade, acho que sou uma casca vazia. Sem sentimentos.
- Não diga isso, Peter. Você só não teve oportunidade de senti-los... Mas ainda terá, eu tenho certeza disso.
- Oh, não, por favor, não. Eu não preciso que me iluda, . Jamais sairei daqui e estou conformado com isso.
- Mas eu não. – o encarei, séria. Como ele ousa dizer algo assim? Onde estão as esperanças? – Sinto muito, Peter. Descobri que tudo que eu achava ter, ou construído ate hoje, foi desfeito. E sabe o que sinto? Vontade de recomeçar. Sim, até alguns minutos minha única vontade era morrer encostada naquela parede. Mas, agora? Oh, não, Peter! Há muita coisa lá fora para descobrir. Novos amigos, novas culturas, novas pessoas e, quem sabe, até um novo amor? Eu não estou fadada ao fracasso. Eu me recuso a passar os próximos anos da minha vida aqui... Sejam eles dois, vinte, ou cem. Eu nem sei mais quantos anos vou durar! – dei os ombros. – Eu posso até morrer enquanto tento escapar daqui, mas isso não me intimida. Morrer para mim seria até um favor. Viver seria sensacional, mas eu não me importaria se tirassem a minha vida... Não a essa altura. Contudo, eu me nego a acreditar que vou passar mais tempo nesse lugar. É como eu disse, que eu morra... Mas morra tentando.
- Sua confiança é admirável. – o homem sorriu fraco e eu balancei a cabeça, em negação. – Queria eu ter a mesma confiança...
- E por que não tem?
- Depois de tentar escapar daqui dezenas de vezes, a gente acaba se desiludindo. – deu os ombros, erguendo o olhar para encontrar o meu. – Você está sangrando muito!
- Não tem problema. – menti, passando a mão sobre meu queixo molhado. Ao encarar meus dedos, no entanto, o pânico que se apossou do meu corpo foi inevitável. O sangue estava jorrando da minha boca e do meu supercílio. Para alguém que jamais havia sofrido um arranhão, aquilo definitivamente era sério. – Você... já tentou muitas vezes fugir? É tão difícil assim? – tentei não parecer tão preocupada quanto estava. Fui traída por meu tom de voz, entretanto.
- É como uma prisão de psicopatas. – ele riu sem humor, se levantando e vindo até mim. Peter passeou os olhos sobre meu rosto e franziu o cenho, parecendo preocupado. – Isso está feio, mocinha.
- Em breve deve cicatrizar... – suspirei, tentando esconder meu rosto.
- Vamos esperar até amanhã. Caso não resolva, chamo Joshua e Brandon. – sorriu fraco, voltando a se sentar.
- Joshua e Brandon? Quem são?
- Os guardas que ficam na porta de nossa cela. – suspirou, deitando sobre o fino colchão que estava ao lado.
- Cela? – ri sarcástica. – Achei que nunca ao menos fosse ver uma de perto, quanto mais estar numa.
- Eu imagino como deve ser difícil para você... – ele sorriu fraco. – E então, já te explicaram por que você está assim? Com a mesma aparência de cinquenta e sete anos atrás?
- me falou sobre uma máquina... Ironm4x, eu acho. – voltei a olhar para frente, encarando a janela à minha frente. Já era noite. – Algo sobre me manter em raios que me congelaram no tempo. Física e mentalmente.
- É incrível. – ele me observou. Certo, eu já estava quase me sentindo como o quadro de Monalisa. – Você tem uma beleza diferente... Como a das mulheres de antigamente, sabe? – questionou e eu ri. Ri com humor, pela primeira vez naquele dia.
- Eu sou de antigamente, Peter.
- Não... Você não entendeu. – ele riu também, balançando a cabeça. – Tudo bem, você entendeu e eu estou confundindo tudo. Mas me entenda... É estranho. Você parece aquelas mulheres de fotos antigas, entende? Naquelas fotos preto e branco...
- Fotos preto e branco? Oh, por quê? – franzi o cenho, confusa. – Hoje em dia as fotos não são mais em preto e branco? – arregalei os olhos e o outro gargalhou. Se sentir a pessoa mais burra e atrasada do mundo é, definitivamente, constrangedor.
- Não! São coloridas... Com uma qualidade ótima, na verdade.
- Que estranho! Mas... Como você sabe? Você não passa todos os dias aqui, sem ninguém?
- Sim, . – ele sorriu cordialmente. – Mas, às vezes, os guardas ou alguns enfermeiros vêm me visitar, trazem fotos de suas famílias e amigos, notícias... Livros. – apontou para o lado, onde havia uma pilha enorme de livros. E, céus, como eu não havia percebido aquilo antes? – Agora, se não se importa... O que acha de dormirmos? – perguntou e eu sorri, assentindo.
- Boa noite, Peter. Até amanhã. – disse, vendo-o sorrir fraco, antes de fechar os olhos e se virar para o lado.
- Oh, claro! – ele voltou a se virar, encarando-me. – Enquanto você estava com , alguns guardas vieram lhe trazer esse colchonete, um cobertor e um travesseiro. Deve ajudar no frio... E acredite, aqui faz muito frio durante a madrugada.
- Obrigada. – sorri carinhosamente. Ele assentiu e voltou a se virar.

Quando percebi que Peter já dormia, pude finalmente voltar a chorar. Não, eu não precisava esconder dele... Mas me parecia cruel. Afinal, eu havia sido muito mais feliz do que ele. Eu havia tido amigos sensacionais, um pai maravilhoso e um amor correspondido. Peter jamais havia passado mais de dois dias fora daquela prisão, ele nunca havia sido feliz verdadeiramente. Eu sentia pena, por mais que odiasse sentir isso, eu sentia. Contudo, também tinha minha dor. Agora que ele já descansava, eu poderia aliviar minha dor de alguma forma.
Certifiquei-me de que estava com uma blusa por baixo e tirei o casaco sujo que estava por cima, colocando-o sobre meu queixo, na intenção de impedir que o sangue – que já não escorria mais – sujasse o resto de minhas roupas.
Por fim, joguei minha cabeça para trás e fechei os olhos. Os anos cinquenta estavam de volta... Todos estavam de volta. Papai, Adam, Jane, Max e até mesmo os fotógrafos e jornalistas intrometidos. Tudo voltara a fazer sentido. As lágrimas rolaram silenciosamente pelo meu rosto e eu apertei os lábios, na tentativa de segurar o ofego que soltaria. Como papai havia reagido à notícia que sua filha havia sido capturada pelos Alemães? Ou Adam? Jane então... Até hoje aquela garota deve me odiar por tentar impedir a guerra. Se eu não tivesse tentado... Talvez não estivesse aqui. Talvez estivesse até morta.
Como houvera sido o casamento dela? Sorri fraco ao imaginar. Jane num altar não era lá algo que se vê todo dia. Eu adoraria ter visto. Será que ela teria tido filhos? Netos, quem sabe? O nó em minha garganta aumentou consideravelmente com o pensamento. Como queria ter visto minha amiga em todos esses momentos... Max deveria ser o pai mais bobo de todos. Deveriam formar uma bela família, na verdade.
Família... Como eu ansiava formar uma com Adam. Adam havia formado uma? Com a possibilidade, mordi o lábio, sentindo o choro aumentar. Adam pode, muito bem, ter se casado com alguém, não é? Pode ter tido filhos com essa mulher... Oh, não. Eu não deveria pensar nisso. Isso definitivamente não ajuda.
Alguns minutos se passaram e, finalmente, o sono parecia começar a tomar conta de meu corpo e de minha mente. Eu tinha certeza de amanhã seria um longo dia, com isso, teria que descansar o máximo que conseguisse nesta noite.
Levantei-me com certa dificuldade e fui até onde Peter indicou que o colchonete, travesseiro e cobertor estavam, os peguei com cuidado para não fazer barulho e caminhei até onde estava antes, colocando o colchão ao lado da parede. Respirei fundo e me deitei... Oh, céus. Isso nem de perto se parecia com a cama da Casa Branca, mas, com as dores o cansaço emocional que sentia, parecia ser o lugar mais macio e confortável do mundo inteiro. Busquei o travesseiro e o coloquei embaixo de minha cabeça, deixando-o um pouco mais alto que o suficiente. Com os pés, puxei o cobertor e me envolvi no mesmo, sentindo a incrível sensação de proteção que precisava. Abri os olhos novamente e encarei o teto úmido acima de mim. Seria uma longa jornada daqui para frente. Suspirei e fechei os olhos, na tentativa de, finalmente, dormir. Só então poderia sonhar e esquecer um pouco da realidade que estava vivendo. Só então poderia voltar a ser feliz.

/'s POV

acordou cedo naquele dia. Não antes de Peter, mas consideravelmente cedo. O homem já tomava café da manhã levado pelos guardas. Ao tentar se sentar no fino colchão, uma dor aguda tomou conta de sua barriga e ela gemeu alto, recebendo a atenção de Peter.
- Você está bem? – o homem questionou, com a feição claramente preocupada.
- Eu... – ela tentou, mas nenhuma palavra sequer foi capaz de ser formulada por sua boca. Após respirar fundos algumas vezes, finalmente sentiu suas cordas vocais ganharem força. – Não. Definitivamente, não. – sussurrou, segurando-se na parede ao seu lado, para, finalmente, sentar-se. A dor ganhou ainda mais proporção.
- Eu vou chamar os guardas. – Dito isso, Peter se levantou e correu até a porta, dando três batidas acompanhadas de um chute. Talvez um código.
Não demorou mais de dois minutos para que Joshua e Brandon entrassem no pequeno cômodo.
olhou para um deles e fechou os olhos, apertando-os. Mais dor. Um dos homens correu até ela e se abaixou em sua altura.
- O que houve?
- Tudo dói... – sussurrou novamente, com a voz mais fraca do que nunca.
- Vamos te levar para a enfermaria, tudo bem? Depois falamos com o . – assentiu e sentiu seu corpo ser envolto pelos braços do guarda. Se é que aquilo poderia piorar, piorou. Cada centímetro de seu corpo pareceu criar vida e se mostrar dolorido. A garota voltou a gemer e alguns segundos depois, já estava nos corredores do lugar.
Ela não soube quanto tempo se passou, mas no que pareceu um piscar de olhos, já se viu deitada sobre uma maca, num ambiente que ela julgou ser a enfermaria. Ao ver Joshua se aproximando – durante todo o percurso de seu cômodo à enfermaria, havia lembrado somente de uma coisa. O nome dos guardas e agora tinha certeza, aquele era Joshua. – pôde observar a feição preocupada do homem, o que só a deixou ainda pior.

- Não tenho boas notícias. – ele suspirou pesadamente. – Nossas enfermeiras ainda não chegaram e só tem uma pessoa nesse lugar que entende de medicina. – assentiu, esperando que o rapaz continuasse. – é recém-formado.
E ela riu. Não como uma gargalhada, mas como um gemido e um sorriso nos lábios. Aquilo era tão irônico. nunca iria ajudá-la.
- E você está pensando em chamá-lo? – questionou a garota, surpreendendo-se no mesmo segundo por ser capaz de elaborar tal frase mesmo sentindo tamanha dor.
- É a única saída. – Joshua sorriu fraco, saindo logo após. iria dizer algo, mas preferiu se manter calada. Tinha plena certeza de que o cretino do não viria. Seria até hipocrisia.
Cinco.
Não, dez.
Talvez quinze minutos houvesse se passado quando a garota ouviu passos vindos do corredor, passos esses que ela achou que seria algum tipo de miragem, já que com toda a demora, achou que jamais fosse ser socorrida. Dramática, sim. Era seu hábito, afinal.
Ao ouvir uma voz masculina reclamando ao fundo, jurou que, de fato, seria alguma miragem. Havia escutado aquele tom somente uma vez, mas o reconheceria em qualquer lugar. .
- Que fique claro que eu só estou aqui porque me obrigaram. – ele disse, colocando as luvas cirúrgicas que estava numa mesa próxima. – Nossos cientistas precisam de você inteira para fazer as pesquisas que dizem respeito à Ironm4x.
- Eu devo deixá-lo me tocar? Tem certeza de que não há perigo que eu fique pior do que já estou? – ironizou, fechando os olhos por alguns segundos.
- Percebo que o humor sádico continua aí, nem vejo motivo de tanto alarde. – deu os ombros, no entanto, ao virar para encará-la, seus olhos se arregalaram levemente e seus lábios se entreabriram. – Zimmerman fez um ótimo trabalho. – ele disse, mas, diferentemente do que parecia, a frase não figurava seu rosto, que parecia surpreendentemente preocupado.
- Você é tão carinhoso quanto um ogro. – sorriu fraco, virando o rosto para melhorar fita-lo.
- Eu iria citar Shrek, mas sinto que não o conheça, afinal... Você é de que época mesmo? – franziu o cenho, cruzando os braços.
- E tão engraçado quanto um velório. – bufou, rolando os olhos.
- Agradeço os elogios, . – ele sorriu, indo até ela. – Sente-se.
A garota colocou as duas mãos sobre a maca embaixo de si e tentou erguer o corpo com toda a força que tinha em si. Tentativa inútil. Ela tentou mais uma vez, entretanto, o máximo que conseguiu foi sentir ainda mais dor.
- Você pode, por favor... – ela começou, mas parou no meio da frase. Aquilo era humilhação demais. Contudo, surpreendendo-a novamente, se aproximou e colocou uma das mãos nas costas dela e a outra em seu braço, conseguindo apoio. Com uma delicadeza cirúrgica, ele a ergueu sem dificuldade. Ambos se encararam – sem ironias ou sarcasmos – e assentiram, como se dissessem na ordem: “Obrigada”. “Por nada.”
- Vamos ver, onde está doendo? – rolou os olhos. – Tudo bem, onde está doendo mais?
- Barriga, rosto...
- Você pode tirar sua camiseta? – ele perguntou, naturalmente. , ao contrário, arregalou os olhos como se houvesse escutado a frase mais imprópria já dita pelo homem.
- Enlouqueceu? É óbvio que não!
- Oh, é claro... Esqueci de que você tem a mente um pouco antiga... – rolou os olhos, impaciente. A garota bufou, abaixando a cabeça. – Eu sou médico, . Recém-formado, tudo bem, mas sou tão bom quanto todos os outros. Por favor, eu tenho profissionalismo, seja com quem for. – suspirou, apoiando uma das mãos sobre a maca, ao lado dela. – Eu sou homem, mas não é porque vou ver uma mulher sem camiseta que vou atacar ela e obrigá-la a transar comigo. – a garota, que até agora estava com a cabeça baixa, ergueu a mesma e arregalou ainda mais os olhos. – Oh, me esqueci. Essas palavras eram “proibidas” antigamente, não é?
- Não é como se todos fossemos todos terrivelmente inocentes, mas não é algo comum. – suspirou. – Ainda mais com alguém tão baixo quanto você.
- Voltamos ao ponto inicial então. – bufou, frustrado. – Eu juro que também não gostaria de estar aqui, . Eu juro. – a outra voltou a abaixar a cabeça, como uma criança que acabou de levar uma bronca dos pais. – Eu posso cuidar do seu rosto primeiro, tudo bem pra você? Depois daremos um jeito de cuidar do seu abdômen.
- Tudo bem. – suspirou, voltando a erguer a cabeça.
caminhou até a pequena mesa que estava no canto direito da sala, onde uma caixa de primeiros-socorros estavam. Ao voltar, suspirou profundamente antes de olhar, finalmente, para sua mais nova paciente.

's POV

Estranho. Estranho é definitivamente a palavra certa a usar. Ergui minhas mãos, tocando o rosto de pela primeira vez e ela pareceu pular da maca, como se tivesse se assustado. Talvez estivesse assustada. Talvez devesse estar assustada. Fora eu mesmo que havia causado aquilo, não era? Oh, é claro, não com minhas próprias mãos, mas dava no mesmo.
Molhei algumas gazes no pote de água que estava próximo; levando-as até o rosto de , novamente. Limpando-o. Zimmerman havia exagerado... Ou não. Talvez sua pele fosse mais frágil pelos raios da Ironm4x, não? Balancei minha cabeça em negação, aquilo era ridículo. Eu jamais deveria tê-la mandado para Zimmerman. Por mais que essa garota tenha o incrível poder de me irritar e me desautorizar com um só olhar, eu deveria ter me controlado. Controle... Controle é o certo. Controle é tudo.

/ POV

gemeu de dor e parou o que fazia, deixando olhá-la.
- Está tudo bem?
- Definitivamente, não. – sussurrou, franzindo o cenho.
- E vai doer ainda mais. – riu fraco, vendo-a olhá-lo incrédula. – Provavelmente esse corte no seu supercílio precisará de alguns pontos.
- Obrigada, . – disse, sarcástica.
- Não há do quê, querida. É um prazer cuidar dos seus ferimentos. – piscou, usando o mesmo tom sarcástico.
- Você sabe muito bem do que estou falando. – rolou os olhos, cruzando os braços, com certa dificuldade.
- Não adianta chorar pelo leite derramado, não é? – deu os ombros, caminhando até uma das gavetas do móvel ao lado. tirou uma seringa e linhas cirúrgicas dali, levando-as até a garota. – Vou aplicar essa anestesia e vai doer um pouco menos, tudo bem?
- Tanto faz.
- Lembre-se de que tudo isso é culpa sua. – disse, enquanto terminava de colocar o liquido numa das seringas. – Vai ser rápido. – e, dito isso, ele empurrou levemente a agulha sobre a pele da garota, que apertou os punhos com força. – Pronto, pode abrir os olhos.
fez o que pedia e no mesmo momento se arrependeu. O rosto dele estava tão próximo do seu que ela sentiu o próprio queimar. Jamais havia tido contato tão próximo com alguém, a não ser de Adam. provavelmente percebeu seu desconforto, já que no próximo segundo balançou a cabeça e se afastou, voltando à bandeja de primeiros socorros.
- Vai demorar? – questionou, olhando para as próprias mãos; que agora estavam cruzadas em seu colo.
- Por quê? Tem algum compromisso, senhorita ? – zombou, enquanto preparava a sutura.
- Não, não. Só que ficar no mesmo cômodo que você por mais de minutos me dá ânsia.
- Não posso dizer que não é recíproco. – caminhou até ela, novamente. – Vamos fazer com que isso seja rápido, sim? – a outra assentiu, fechando os olhos novamente.
Alguns poucos segundos se passaram quando finalmente sentiu começar a fazer a sutura. Não doía, talvez graças à anestesia, mas ainda assim era extremamente desconfortável. Não, não falando somente sobre os pontos. A presença de era extremamente desconfortante. Quase uma afronta.
Os minutos passaram ligeiramente rápidos, levando em consideração às situações que ambos estavam impostos. colocou os materiais usados para fazer a sutura numa pequena bandeja; que logo foi levada pessoalmente até o armário. O homem jogou os materiais descartáveis no lixo e tirou as luvas, lavando as mãos em seguida.
- E então... – disse, ainda de costas. – Decidiu se vai me deixar ver suas luxações por bem ou por mal? – virou-se para encará-la, enquanto secava as mãos numa toalha branca.
- Por mal seria o quê? Você ameaçaria me mandar de novo para o Zimmerman? Sinto muito, , mas tenho plena certeza de quê os cientistas e médicos que querem estudar essa aberração que vos fala, não deixaria que isso acontecesse. Eles precisam de mim bem, não precisam? Ou serão quase sessenta anos de trabalho jogados fora... – sorriu fraco, erguendo a sobrancelha esquerda, desafiando-o.
- Você não vai me tirar do sério de novo, . – disse entre os dentes, sentindo o maxilar trincar. Sua vontade era de mandá-la para Zimmerman de novo e deixá-la lá por dias, até que sua maldita boca fosse capaz de ser calada. No entanto, ela estava certa. Todos o matariam se ousasse mandá-la novamente para aquele lugar. Até, no fundo, bem no fundo, ele mesmo. – A única pessoa que vai perder algo não me deixando te examinar, é você mesma. – deu os ombros. – Não sou eu que vou me retorcer de dor todas as noites por causa disso.
- Você é insuportável. – rolou os olhos. – Tudo bem. – suspirou, vencida pelo cansaço. Ele tinha razão, por mais que odiasse admitir. – Você venceu.
- Ninguém venceu aqui, . Ao contrário, os dois só estão perdendo um na presença do outro. – sorriu sarcástico, sendo acompanhado pelo mesmo sorriso dela. – Erga a camiseta. – mandou, num tom firme. rolou os olhos e o fez, levantando-a até a altura onde seus seios terminavam. – Deite-se. – disse no mesmo tom anterior. A garota o fez, novamente. – Aqui... – encostou alguns dedos num hematoma na pele dela, que logo se arrepiou ao toque frio. Ambos se encararam por alguns segundos, mas logo voltaram a si. Tudo era tão novo para , que jamais havia sido tocada de forma tão intima por outro homem. Ou até mesmo por outra mulher. – Aqui e onde mais?
- Onde mais o quê? – disse baixo, enquanto fitava seus olhos.
- Dói. – pigarreou, voltando a encarar a barriga de , que, por Deus, era inacreditavelmente e inexplicavelmente sexy. Ok, talvez essa não fosse a palavra, mas em sua mente infame, foi a única definição que conseguira achar.
- Oh, claro. – balançou a cabeça. – Na altura do estômago. Zimmerman tem um chute invejável. – riu irônica.
- Vamos ver isso. – sussurrou, colocando uma mão sobre o hematoma e outra sobre a camiseta dela, erguendo-a um pouco mais. engoliu seco e levou as mãos inconscientemente até os seios, mesmo que eles não estivessem totalmente descobertos. – Dói? – apertou devagar o local. arqueou as costas e gemeu com a dor que sentira. – Acho que isso responde. – riu fraco, umedecendo os próprios lábios. – Não me parece nada grave, vou mandar entregarem um relaxante muscular no seu quarto. – respirou fundo. – Enquanto isso, tome esse comprimido, vai ajudar nas dores. – lhe entregou um comprimido, que prontamente o tomou. – Você vai ficar bem. – subiu o olhar para o rosto dela, onde fitou seus olhos. fez o mesmo, não quebrando o contato.
- Estou liberada então? – disse, fechando os olhos por alguns segundos.
- Está. – abaixou a camiseta dela e virou-se de costas. – Vou mandar levarem-na para um dos nossos vestiários, onde poderá tomar um banho. – suspirou, voltando a olhá-la. – Roupas limpas também.
- Como é gentil, . – sorriu sarcástica, erguendo o corpo na maca. – Eu posso descansar hoje ou ainda tem planos para mim?
- Pode descansar. Amanhã lhe chamaremos para que os testes comecem. – foi até a porta, onde encontrou Joshua e Brandon. – Podem levá-la para o vestiário, peçam roupas limpas e a entreguem. – os homens bateram algum tipo de continência e entraram na sala, ajudando a se levantar.
cruzou os braços enquanto via sendo carregada por um dos homens, Joshua talvez. A garota lhe olhou por uma ultima vez e ele não foi capaz de decifrar o que aquele olhar lhe dizia. Raiva? Ódio? Tristeza? Ou, talvez, agradecimento? Quem sabe um pouco de todos? já não tinha mais certeza de absolutamente nada. No entanto, ao vê-la sorrir para o homem que a carregava, sentiu o súbito sentimento de inveja. Não, não era inveja. Novamente não conseguia decifrá-lo. Perto daquela mulher, não conseguia decifrar nem a si mesmo. Tudo era um grande mistério. Ela era um grande mistério que precisaria ser desvendado.


Capítulo VI


Enquanto era carregada até o vestiário, sorria brevemente para Joshua, que insistira em levá-la nos braços até o destino.
- Chegamos. – o homem disse, colocando-a no chão, finalmente. – Vamos esperá-la aqui para levá-la novamente aos seus aposentos. – sorriu fraco.
- Você chama aquilo de aposentos? Deveria chamá-lo de pedacinho do inferno na terra. – riu fraco. – Olha só, um ótimo jeito de nomeá-lo. – deu os ombros. – E tudo bem.
- Brandon já está chegando com suas roupas, veja só. – sorriu, esticando os braços para pegar o vestuário que o outro trazia nas mãos.
- Obrigada, Brandon. – sorriu cordialmente. Brandon somente assentiu. – Bom, eu vou lá... – apontou para a porta. – Obrigada novamente. – sorriu, encarando os dois. Joshua lhe sorriu de volta.
Ao entrar no lugar, pôde ver várias cabines com chuveiros em cada uma delas. Finalmente teria um tempo para si. A garota ergueu sua camiseta e a tirou, lembrando-se imediatamente de minutos atrás, quando fizera isso na frente de . O que a sociedade de sua época lhe diria se fizesse isto para um homem que não fosse seu marido? Tudo parecia ter mudado. Tudo havia mudado. Como gostaria de poder viver neste novo século... Como gostaria de experimentar as coisas novas que o mundo havia inventado. Seria injusto com todos que havia perdido, mas era sua vontade. Ela deu mais alguns passos até uma das cabines e tirou sua calça de moletom, ficando somente de calcinha. Olhou de soslaio para o enorme espelho ao seu lado e observou sua imagem por alguns segundos. Tudo estava igual, afinal. Tudo continuava, estranhamente, igual. Seu corpo, sua pele... A única coisa que lhe soava diferente eram os cabelos, cortados anteriormente pelo carrasco Zimmerman. Uma coisa a mulher havia de admitir: estava curiosa sobre as pesquisas que fariam. Aquilo era absurdamente surreal. Certamente, chocaria a todos. Outro escândalo na vida da “queridinha” da América. Ela quis rir. E, novamente, não de alegria. O que a mídia havia publicado sobre seu paradeiro? “ , filha do presidente, é sequestrada por governo Alemão” “Filha do presidente é morta por Alemães” “O paradeiro de ainda é desconhecido” Como todos haviam reagido às notícias? Haviam sofrido muito? Haviam superado rápido? Eram tantas dúvidas a serem esclarecidas. Tantas perguntas a serem respondidas.
Sem mais delongas, tirou a única peça que restava em seu corpo e ligou o chuveiro, deixando na temperatura morna. Ao sentir as gotículas em sua pele, seu corpo inteiro relaxou. Era como se um fio de luz houvesse aparecido na escuridão que sua vida se encontrava. Sim, poderia parecer loucura, mas somente um banho já lhe fazia ter tal pensamento. As coisas simples da vida agora eram apreciadas como as melhores. Quando finalmente foi capaz de colocar sua cabeça sobre a água, foi como se um mundo paralelo houvesse surgido. Era como se a água fosse capaz de limpar toda a imundice que seu corpo, mental e fisicamente, se encontrava.
Ela buscou o sabonete numa pequena prateleira que a cabine tinha e ensaboou todo o corpo, com cuidado nas partes onde havia hematomas. E, por Deus, o remédio que lhe dera já havia feito algum efeito. As dores já não eram tão agudas quanto logo cedo. Bendito fosse aquele que o havia criado.
Mais alguns minutos se passaram e, após lavar os cabelos devidamente, desligou o chuveiro, enrolando-se na toalha que estava sobre o box. Ao encontrar um pente, penteou os cabelos enquanto observava, novamente, seu reflexo no espelho. Tudo igual. Talvez, em sua precária imaginação, ainda tivesse alguma esperança de que a água lhe trouxesse de volta aos anos 50. Ou, no mínimo, que sua aparência se transformasse.
Sem mais delongas, a mulher pegou as roupas que estavam sobre a pia e as colocou, voltando a encarar-se no espelho. Não era nada mais do que as mesmas de ontem, mas agora limpas, o que a tranquilizava mais.
Ela fechou os olhos, deixando suas memórias se voltarem novamente à sua realidade. Será que tudo havia realmente terminado? Não poderia existir algum modo de voltar aos anos 50? Ela negou, balançando a cabeça. Aquilo era ridículo. Tudo havia acabado. As pessoas que conhecia já haviam morrido e sua cultura já havia sido extinta. Não adiava chorar ou praguejar, toda a tragédia já era consumada. O jeito era se conformar... Se conformar com uma vida baseada em estudos de si própria, morar num quarto escuro com um senhor que jamais sentiu outro sentimento a não ser saudade, saudade do que nunca viveu, saudade de uma felicidade que nunca sentiu.
Os homens de bateram na porta e ela se despertou do transe. Respirou fundo algumas vezes, encarou sua imagem pela ultima vez no espelho e saiu, com passos lentos e doloridos. A surra que havia levado ainda deixava marcas.
Ao abrir a porta, encontrou Joshua e assentiu, como se dissesse que já podia ser levada ao seu "quarto".

- Melhorou? - o homem disse e só então ela pode observá-lo. Como a maioria dos alemães, ele era branco, com os cabelos num loiro médio e a pele com sardas. Os olhos eram extremamente azuis e o sorriso aberto, com uma pequena falha entre os dentes da frente.
- Me sentindo gente, pelo menos. - deu os ombros e ele sorriu fraco, olhando para a frente, enquanto caminhavam.
- Como é a sensação? - ela o encarou, confusa. - De estar num novo mundo... Com outras culturas, pessoas de aparência e estilos diferentes... Saber que você já tem quase oitenta anos e continua com a aparência de vinte.
- Com você falando assim até parece ser bom. - riu sem humor, suspirando. - É muito mais do que a "aventura" - fez aspas com as mãos. - de estar num novo século. Muito mais do que aparentar a mesma imagem de cinquenta anos atrás... Pra começar: eu ao menos vi a luz do dia desde que acordei, estou fadada a viver o resto da minha vida - e, diga-se de passagem, eu nem sei quanto mais tempo terei - presa num... - olhou em volta. - Eu nem sei onde estou! - sorriu fraco. - praticamente num campo de concentração. Perdi todos que amava, todos os meus planos nunca se concretizarão... E ainda tirei a felicidade de milhares de pessoas com uma guerra. Eu acho que não é a melhor das sensações.
- Eu sinto muito.
- Não. - ela negou com a cabeça. - Você não sente. - deu os ombros. - Essa é uma frase tão imbecil: "eu sinto muito", ninguém sente quando alguém que nem conhecia morreu, só diz isso para agradar quem está sofrendo. - bufou, rolando os olhos. - Você só vai me deixar no quarto e sair com seus amigos e viver normalmente, sequer irá se lembrar do que eu te contei agora. Quando alguém lhe contar algo ruim, somente diga "sinto muito por você", e não "eu sinto muito". Aliás, no seu caso, é ridículo dizer isso. - aumentou o tom de voz, parando de andar. - Você também é alemão, seus avós sofreram demais com aquela guerra, talvez até morreram por ela... Eles também foram lutar contra o meu país! Eles também torceram para que eu morresse, para que tudo terminasse bem para o seu país! Você trabalha aqui e está ajudando aos . Assim que houver uma nova guerra, você também irá batalhar contra o meu país. Sempre vai ser assim! Enquanto houver humanidade, haverá guerra. E enquanto houver Estados Unidos, a Alemanha irá guerrilhar contra. É sobre a nossa cultura, é sobre o que aprendemos. Então não, Joshua, você não sente merda nenhuma. - dito isso, ela se virou e caminhou até o fim do corredor, entrando em seu quarto, deixando o rapaz boquiaberto.

analisava os documentos e pesquisas sobre a Ironm4x; na antiga sala do pai. Lembrava-se do dia em que havia encontrado tudo sobre a máquina, há uma semana.

estava com o rosto sobre as mãos, enquanto chorava desesperadamente, lembrando-se da última conversa que tivera com o pai segundos antes de sua morte, um dia atrás. Uma pneumonia mal tratada. Isso havia lhe levado seu herói, seu melhor amigo. Os soluços altos e ofegos ocupavam toda a sala, fazendo-o perder o ar por certas vezes. Ele se sentia como uma criança de dez anos, precisando de ajuda, de aconchego, de segurança. Ele precisava do pai.
Num momento de fúria, ergueu o rosto e encarou os papeis milimetricamente arrumados na mesa do pai e, não pensou duas vezes antes de passar a mão pela mesa com força, derrubando todas as pastas, folhas sulfite e pequenos objetos que ali estavam. Levantou-se, ainda coberto de ódio, e chutou o pequeno armário de arquivos, fazendo com que todas as gavetas de abrissem; ele passou a mão pelas mesmas, também derrubando toda a papelada. Após ver toda a zona no chão, ele respirou fundo algumas vezes, tentando normalizar a respiração. Dentre os milhares de papéis ali, um lhe chamou atenção: "Ironm4x" dizia o letreiro em negrito. Ele secou o rosto úmido e, já mais calmo, pegou a pequena pasta.
se sentou novamente na mesa do pai e abriu a pasta, encontrando inúmeros códigos, outros escritos provavelmente com alguma máquina de escrever, com escritos mais formais, e pequenos parágrafos escritos à mão, como num diário.

"13 de novembro de 1957. Finalmente conseguimos capturá-la! está, finalmente, sob nosso poder. A guerra acaba de começar e já temos bons números. A economia deles está perdida."

... já havia ouvido muito a falar daquela garota, a garota causa de todo o problema.

“- Aquela garota nos arruinou, querido... - sua avó lhe dizia, enquanto ambos viam fotos de . Nesta, ela estava num lago com três pessoas. - Ela destruiu tantas famílias... Teve o fim que todos desejavam. Nunca respeitou as leis e nem ninguém.
- Mas o que ela fez, vovó? - , que na época tinha oito anos, questionou.
- Ela ajudou com que a guerra de 57 se iniciasse. Ela foi o estopim de tudo! - afagou os cabelos do neto; que lhe tinha como uma mãe.
- Isso é muito ruim. - o garoto suspirou, pousando a cabeça no colo da avó.”

“- Este é o vídeo em que fala sobre o seu avô, querido. - Barth , pai de , disse ao filho.
- Há anos ouço falar sobre essa e sobre tudo o que ela nos fez! - , que já estava com quatorze anos, avisou. Barth colocou a fita no videocassete e se sentou ao lado do filho.
O pequeno vídeo começou: “O que seu pai tem a dizer sobre as ameaças de Yan , presidente da Alemanha?”
- Acho que esta última pergunta deveria ser destinada a ele. No entanto, em minha opinião, esse velho tem que ir para alguns bordéis, isto é falta do que fazer! – sorriu sarcástica e mostrou o dedo do meio. Os flashes aumentaram e os dois casais entraram no carro, gargalhando."
- Nossa! Que vadia. - o pai lhe olhou torto e ele riu. - Como ela pôde dizer isso para o presidente da Alemanha?!
- E por causa dela eu perdi o seu avô sem antes conhecê-lo. - suspirou, encarando o filho. - Os malditos conseguiram matá-lo no meio da guerra. Eu tinha acabado de nascer.
- Ainda bem que ela morreu também! - exclamou, vendo o pai olhar para o horizonte, pensativo.”

sempre fora envenenado sobre aquela mulher, sobre o quão mal a sua família ela tinha feito. Sobre como ela havia destruído a sua família. Ele trincou o maxilar e continuou a leitura do pseudo-diário.

"Em nossa quarta tentativa, finalmente conseguimos! Ironm4x está oficialmente ligada e fazendo o seu trabalho. Todas as pesquisas já foram iniciadas."

E, de repente, se lembrou de uma cena que viu aos dezesseis anos.

“- Já se passaram cinquenta anos, Barth! Precisamos tirá-la de lá ou nunca saberemos sobre o efeito da máquina! - Franz, um dos sócios de governo dos , disse.
- E então faremos o quê? A entregaremos para os inimigos de bandeja? "Tomem, a deixamos viva e intacta para vocês.". Não! - Barth bateu em sua mesa, derrubando todos os papéis e fazendo com que saísse dali, no susto de ser pego.”

Então era disso que estavam falando. Mas que máquina era essa? Retomando a leitura, outro parágrafo lhe chamou a atenção. Mas este era escrito por máquina de escrever. A escrita manual não dera mais as caras no papel, talvez Yan já houvesse morrido.

"Ironm4x já tem dado ótimos resultados. A maquina continua fazendo o seu papel. A aparência de continua intacta. Os raios Ov5² juntamente do fluorciomol estão deixando-a congelada em sua cabine. Sem sinais de cabelos ou unhas crescendo."

franziu o cenho. Sua visão lhe mostrava algo, mas sua impossibilitada mente lhe dizia que aquilo não era possível: eles mantinham numa espécie de cabine, congelada no tempo? Até quando isso durou? O que aconteceu com ela?
Seus olhos guiaram-se novamente às inúmeras folhas do documento, mas não encontrou mais do que códigos e fórmulas.
não pensou duas vezes antes de ir procurar pela avó, em busca de informações. Ao chegar em sua casa, encontrou-a olhando para a TV, enquanto usava preto.

- Vó? - chamou, tendo a atenção da senhora. A mulher lhe sorriu fraco, batendo no sofá ao seu lado para que ele se sentasse também.
- O que houve, querido? Você está bem? - ele assentiu, suspirando. Nada estava bem, mas agora o assunto não era esse. - Então o que aconteceu?
- Eu estava na sala do meu pai... - ela fechou os olhos por alguns segundos, assentindo. - E encontrei alguns papéis... - ela abriu os olhos, olhando-o desconfiada. - Você sabe sobre... A Ironm4x?
- O que você sabe sobre a máquina? - a senhora disse, levantando-se depressa. fechou os olhos, respirando fundo. Ela também sabia.
- Por que me esconderam isso por tanto tempo?!
- Porque ainda não era a hora de lhe contar sobre, querido. Os cientistas estão...
- Parados. - interrompeu, completando a frase da avó. - A mulher está congelada no tempo há mais de cinquenta anos, vó!
- Ela merece tudo isso e muito mais! Você já sabe tudo o que ela nos fez... Me tirou a pessoa que mais amei na vida, sem ao menos poder ter uma família de verdade com seu avô. Seu pai ao menos o conheceu! - disse, com claro ódio na voz.
mordeu o lábio e fechou os olhos, lembrar-se do pai ainda doía... E como doía.
- Eu também a odeio, vovó. A odeio por tudo que ela fez aos , a odeio por somente existir sendo que as pessoas que mais sofreram pelo modo de como ela agiu, estão mortas. Mas o que a senhora acha que ficar naquela máquina irá fazê-la de mal? Ela ainda deve achar que está dormindo. Ela tem de acordar para pagar por seus erros em vida! Ver tudo o que ela fez conosco e com tantas famílias. Estar aérea a tudo é muito fácil.
- Você tem razão. - a mulher voltou a se sentar, suspirando.
- Fora que nossa família gastou valores altíssimos com esta máquina! Temos que saber se ela realmente funciona e... Estudar sobre tudo.
- Certo, querido. Você está coberto de razão. Pretende fazer o que agora, então?
- Desligar a máquina, vó. Vamos saber se a Ironm4x funciona mesmo.


abriu os olhos lentamente, lembrando-se de como tudo havia acontecido. Sua cabeça estava tão confusa. Será mesmo que ele devia ter desligado esta máquina? Talvez devesse ter continuado desacordada; congelada. Aquela mulher lhe daria tanto trabalho. Justo agora, que ele estava passando por um momento tão difícil, teria ainda mais com o que se preocupar.
Ele teclou o interfone para um de seus empregados.
- Como está ?
- Foi para seus aposentos já algumas horas e parece estar conversando com Peter.
- Então já está melhor?
- É o que parece, Senhor.
- Certo.
E desligou.
Mesmo com todo o mal que havia feito ao seu clã, ele conseguia sentir o mínimo de pena dela. Sim, pena. Aquele sentimento que ele tanto detestava. Fazia sentido, afinal. Ambos eram detestáveis.
Descobrir toda a verdade sobre a máquina, saber que toda sua geração havia morrido e ainda levar uma surra de Zimmerman no mesmo dia não era nada fácil. Ele teria dó até de seu pior inimigo, o que não deixava de, ao menos em parte, ser verdade.
se levantou e foi até o banheiro da sala, abriu a torneira e deixou a mão em concha, jogando uma boa quantidade de água no rosto. Repetiu o gesto mais duas vezes e olhou para o espelho. Seu rosto estava horrível. As olheiras fundas causadas pelos choros na madrugada desde que o pai se foi; estavam ali. E agora o choro queria voltar. Às 16h55. Não era hora de mostrar fraqueza. Ele respirou fundo e jogou a cabeça para trás, tentando fazer com que as lágrimas voltassem para os olhos. Após voltar a encarar seu reflexo no espelho, decidiu que o melhor a fazer agora era esquecer um pouco os problemas. Sem pensar no pai, finanças, governos, e, finalmente, .
Ele voltou à sala e pegou seu blazer, iria a qualquer lugar com pessoas normais, com problemas pequenos e risadas altas. Schwarzwald's Bar talvez fosse uma boa pedida.

- Como ele pôde se acabar assim?! - disse, indignada com o fim que seu maior ídolo teve. - Elvis tinha um talento inigualável! - suspirou. - Jane deve ter sofrido por dias! - sorriu fraco, recordando-se da melhor amiga. - Você já chegou a ouvir alguma música dele?
- Brevemente, quando ainda era criança... Jailhouse Rock era o nome.
- Oh, Deus! - ela fechou os olhos, nostálgica. - Ele havia lançado esta música no ano em que tudo aconteceu. Era o maior sucesso! Até na Casa Branca Elvis havia ido cantá-la. Eu enlouqueci!
- Deve ser sido incrível.
- E foi! Nossa, Peter... - mordeu o lábio, olhando para cima e sorrindo. - Foi uma ótima época. Aposto que aí fora não tenha ninguém que chegue aos pés dele!
- Realmente... Muitos aparecem, mas nenhum fica. A não ser Michael Jackson, enquanto Elvis foi o rei do rock, Michael foi o rei do pop.
- Michael Jackson? - perguntou, interessada.
- Sim! O cara era um revolucionário da música. Começou ainda pequeno e se tornou um dos maiores sucessos que o mundo já viu. Todos sabem alguma música dele! Até eu, que nunca cheguei a sair das redondezas. - riu fraco.
- Então cante uma música dele pra mim! - pediu e Peter riu alto, negando com a cabeça. - Ora, por favor! Eu quero saber como andam as músicas atualmente.
- Mas do que adiantaria? As músicas atualmente nem são mais como as de Michael eram, é um ritmo só! Todas parecem ter a mesma melodia. Principalmente a de festas; é só barulho.
- Não me admira. Como ouvir música numa geração onde Elvis Presley está morto?!
Peter riu, enquanto se arrumava em cima de seu colchonete.
- Você é uma figura, .
Ela riu também, mas mais fraco.
- Conversar me faz bem. Me faz esquecer um pouco de tudo... - suspirou, passando os dedos no chão, traçando linhas. - Há tanta coisa nesse novo século e eu ao menos posso desfrutar ou conhecer.
- Certo - pigarreou, tentando mudar de assunto, não queria deixá-la pior -, eu canto algo do Michael Jackson se você cantar Jailhouse para mim! Eu nem me lembro mais como é. - deu os ombros.
- Ora... - ela riu, negando com a cabeça. - Seria uma afronta a Elvis! Fora que a melodia daquela música era alucinante!
- Só um pouco! - insistiu e ela riu, aceitando.
Ela começou estalando o dedo do meio no polegar, tentando chegar ao ritmo. Peter sorriu, vendo-a feliz por lembrar-se da música.
- The warden threw a party in the county jail, the prison band was there and they began to wail, the band was jumpin' and the joint began to swing, you should've heard those knocked out jailbirds sing... - ela aumentou o barulho dos estalos e foi para o refrão: - Let's rock, everybody, let's rock, everybody in the whole cell block, was dancin' to the Jailhouse Rock! - Peter batia palmas no ritmo da música também, fazendo-a sorrir. - E por aí vai! Isso animava tantos nossos bailes!
- É contagiante, mesmo.
- Agora é a sua vez! E sem desculpas.
- Tudo bem. - ele riu, pigarreando. - 'Cause this is thriller, thriller night, and no one's gonna save you, from the beast about to strike. You know it's thriller, thriller night, you're fighting for your life, inside a killer, thriller tonight, yeah!
bateu palmas e ambos riram.
- É uma ótima música! E, me deixa ver... O nome é "Thriller"?
- Como sabe?!
- Não é tão difícil adivinhar... - riu, suspirando logo após. - Peter, acho que vou dormir um pouco, tudo bem?
- Claro, querida, descanse bastante.
- Vou tentar. - ela sorriu, arrumando-se no fino colchonete. apertou os olhos ao sentir as fortes dores que estava no corpo, pela surra de Zimmerman. Seria uma longa jornada.

apertava o volante com força, enquanto deixava o volume da música rock alta no carro. A velocidade era o máximo permitido para a estrada. Sua cabeça estava à mil. Ele se sentia num filme de ficção científica, tudo aquilo era ridículo. O que a mídia diria de estar viva? Ele riu, negando com a cabeça. Já haviam se passado dias desde que descobrira, mas ainda parecia algum tipo de brincadeira. Como aquela mulher poderia ter quase oitenta anos? Ora, por favor.
Ao ouvir o celular tocando, apertou o botão no painel no carro e ouviu a voz de Kyara do outro lado da linha.
- Finalmente você atendeu este telefone! Onde está, ?
- Acabei de sair do Ministério, o que você quer? - disse, desinteressado.
- Falar com você, não posso?!
- To no trânsito, Kyara. Pode passar na minha casa depois, se quiser.
- Por que essa grosseria toda? Aconteceu alguma coisa?
rolou os olhos. Kyara ao menos era sua namorada para querer tantas satisfações.
- Não aconteceu nada, só to cansado. - suspirou. Não deixava de ser verdade, afinal.
- ... - a mulher disse baixo, como se estivesse tentando manter o último milímetro de paciência que tinha no corpo. - Não desconte em mim. Sei que seu pai morreu e você está mal, mas, porra, você não teve culpa. Só era a hora dele.
"Só era a hora dele". já estava cansado de ouvir esta maldita frase. Então era isso? Todos tinham sua "hora" de morrer, como um relógio? É óbvio que não. Todos mereciam viver, sejam eles bons ou ruins. Todos têm o direito de viver mais um dia que fosse. E quanto a bebês que morrem assim que nascem, eles nascem com o relógio negativo? O homem riu irônico, vendo a amiga bufar do outro lado da linha.
- Tanto faz.
- Vá se foder. - dito isso, Kyara desligou o telefone e respirou fundo para não socar o painel do carro novo. Quem aquela mulher pensava que era? Alguém que havia ficado com ele algumas vezes, só isso. Desde quando sexo se tornou compromisso? Todos estão no século XXI, sexo é só um modo - excelente, diga-se de passagem - de passar o tempo.
Ao sair da zona de limite, pisou no acelerador e seguiu à caminho do Schwarzwald's Bar. Precisava de uma boa dose de vodka. Uma não, duas... Três. Ou até que os problemas sumissem de sua mente.
Não demorou mais de quinze minutos até que ele estacionasse no bar. Ao entrar no ambiente, foi para a mesa mais afastada; fez seu pedido e pegou o celular no bolso da calça, digitando a seguinte mensagem: "Tem como você vir ao Schwarzwald? Preciso conversar com alguém, bro."
Três minutos depois, a mensagem foi respondida.
"Tem que ser agora? To morto, "
"Tem"
"Antes de tudo: vá se foder. To indo."
"To na mesa 7, filho da puta"

Aquela era a segunda vez que fora mandado se foder, numa só hora. Ele riu fraco, balançando a cabeça. Sua grosseria já estava passando dos limites, até ele mesmo estava achando isso. Seus problemas eram somente seus e ninguém era culpado, a não, é claro, .
Cerca de vinte minutos se passaram quando viu James, seu melhor amigo, entrar no bar. Ele acenou, chamando-o.

- Olá, docinho, por que estava tão carinhoso hoje? - James ironizou, vendo rir. Ele riu também.
- Não enche o saco. - ergueu o dedo do meio, dando mais um gole em sua bebida. - James?
- O quê? - disse, acenando para a garçonete. - Um dry martíni, por favor. - pediu, vendo a garçonete assentir e anotar o seu pedido.
- Primeiro, ninguém pode saber dessa conversa, ok? É segredo de Estado, literalmente. - sussurrou, colocando os cotovelos na mesa, se aproximando mais do amigo, para que ninguém mais ouvisse.
- Não vai me colocar em fria, hein? - pediu, arrumando-se na cadeira. - O que houve?
- Você acreditaria se... Eu te dissesse que está viva?


Capítulo VII


- ? - James questionou, parecendo pensar. - ... - cerrou os olhos, na intenção de recordar-se daquele nome nada estranho.
- Meu avô, terceira guerra mundial...
- ! - exclamou, batendo com a mão na mesa. - O quê? Mas isso é impossível, ! Ela morreu assim que nosso exército a capturou, não?!
- É aí que você se engana, meu amigo. Eu tinha esse mesmo pensamento até encontrar uma papelada na sala do meu pai, um dia depois que ele morreu. - engoliu seco ao falar a ultima parte da frase. Balançando a cabeça logo em seguida, espantando aqueles pensamentos. - E eu descobri que ela está viva, e... - fechou os olhos, respirando fundo. - Com exatamente a mesma aparência.
James abriu a boca, surpreso, mas logo a fechou, começando a rir alto.
- Seu imbecil, quantas doses você já tomou?! - ainda rindo, pegou o copo dele e o olhou.
rolou os olhos, arrumando-se na cadeira.
- Estou falando sério, idiota. - deu outro gole em sua bebida, tirando-a bruscamente da mão do outro. - Trata-se de uma máquina com códigos e raios laser dos quais nunca entenderemos, mas enfim, é verdade. Por mais estranho que seja.
- Tá bem, supondo... Apenas supondo que isso seja verdade: ela continua gata? - sorriu malicioso.
- Você é retardado, James. - negou com a cabeça, rindo fraco. - Ela é insuportável.
- E o que você pretende fazer agora que descobriu tudo? - disse, sorrindo para a garçonete que lhe trouxe seu martíni.
- Estudos sobre a máquina e o resto não posso te contar. Já falei até demais sobre isso. - deu os ombros, pedindo uma cerveja à garçonete. - Eu só sei que to pirando com tudo isso. Primeiro o meu pai, agora essa mulher... - soltou o ar pela boca, devagar. - Preciso transar.
- Precisa, mesmo! Você tá insuportável, cara. - se espreguiçou no banco em que estava, encostando a cabeça no estofado atrás de si.
- O pior é que acabei de dar um fora na Kyara. - estalou a boca, abrindo sua cerveja e dando um gole na mesma.
- E agora você só pode transar com a Kyara? - riu, virando de uma só vez o dry martini que tomava. - Argh! - fez careta. Ambos riram.
- Óbvio que não, nós não temos nada sério e...
- E vocês estão nessa há quase um ano. - o interrompeu, rolando os olhos. umedeceu os lábios, suspirando e se acomodando no banco.
- Ela é legal, cara. É gostosa, faz um oral como ninguém, me ouve quando preciso, mas...
- Mas não é pra namorar. Eu sei, bro. - James sorriu, dando alguns tapinhas no ombro do amigo. - Aliás, quem é pra namorar quando se trata de ?
- Emma Watson! Porra, eu casava com aquela mulher e ainda queria dezessete filhos.
James gargalhou, já um pouco afetado pela bebida. Ele era o ser mais fraco do mundo quando se tratava de bebida, segundo .
- Você é um otário, ! - continuou rindo, negando com a cabeça. Ele chamou a garçonete e pediu uma dose de vodka.
- Mas e quanto a você, rei dos reis... Como está o caso "Lily"? - deu alguns goles em sua garrafa de cerveja, apoiando o rosto na mão. A garçonete trouxe a dose de vodka de James e ele não esperou mais de um segundo para tomá-la por completo, em um só gole.
- Lily é uma vadia. - disse, com pura amargura na voz. Lily havia sido sua namorada por quase três anos, até lhe colocar um belo par de chifres com seu primo. Ela fora seu primeiro, e ele esperava que, único-ultimo amor. Para que amar se existe sexo sem compromisso por aí? Humanos são extremamente burros. Amor rima com dor, amor é sinônimo de dor. Ou, ao menos, era assim que ele descrevia aquilo para . - Nem se ela aparecesse pintada de ouro aqui na minha frente, implorando para que voltássemos, dizendo todas aquelas coisas que ela sempre falava... - umedeceu os lábios. - Nem se ela... - suspirou, rindo. Já estava alterado pela bebida, e havia reparado.
- Esse não é um bom assunto. Lily é uma vadia e ponto final. - ergueu a garrafa de cerveja, brindando com o copo vazio de James. - Não vamos mais falar de mulher! - James assentiu, meio tonto. - Como está na empresa?
- O de sempre... - suspirou, entediado. - Eu odeio minha profissão, odeio meu emprego... - bufou, jogando a cabeça para trás e encostando-a no banco. - Eu sabia que deveria ter virado ator! - riu, dando o último gole de sua cerveja. - E no Ministério?
- A última coisa que eu quero falar agora é sobre aquele lugar, cara. - suspirou, olhando em volta.
- Ah, é! - sorriu, erguendo a cabeça para encarar o amigo. - Não, não, não! Vamos falar sim, agora que estou mais feliz quero saber. Você tá tão puto com tudo isso que eu realmente quero saber o que essa mulher tem! - ele riu, apoiando os cotovelos na mesa, interessado.
- Ela é uma vadia, assim como Lily. - deu os ombros, como se acabasse de falar a coisa mais óbvia do mundo. James rolou os olhos.
- O que ela fez?
- Ela acabou com a minha família. Meu pai ao menos pôde conviver com seu próprio pai por causa dela! Aquela mulher destruiu milhares de famílias com a guerra.
- O que ela te fez?
- Ela é insuportável! Prepotente, se acha com direitos! - riu sarcástico, enquanto James continuava com a feição serena de sempre. - Acho que ela esperou que fôssemos recebê-la com flores, tipo, "bem vinda ao novo século! como dormiu?". Ora, vá se foder!
- O que ela te fez, ? - disse, já perdendo a paciência.
- Acredita que ela ainda xingou o meu avô? Cara, ela é realmente muito otária! Você não tem noção, ela...
- Que porra ela te fez, ?!
- Me deu um tapa. - disse, como se confessasse seu pior pecado para algum padre. James abriu a boca, surpreso, e logo depois começou a gargalhar. continuou sério, trincando o maxilar, esperando que o outro parasse de rir.
- Eu amo essa garota! - disse, ainda rindo. - Cara, você apanhou de uma mulher, de uma... Mulher! - deu ênfase, batendo a mão na mesa de tanto rir. sorriu sarcástico, encarando-o. - Ta... Eu parei já. - mordeu o lábio, segurando o riso. - Agora eu entendo todo esse ódio! E você fez o quê? - sorriu.
- A mandei para o Zimmerman. - disse, sem encarar o rosto do amigo, que juntou as sobrancelhas, ficando atônito.
- Você o quê?!
- Ela pediu por isso, velho... - tentou se explicar, passando a olhá-lo.
- , ela é mulher! É a porra de uma mulher. Você enlouqueceu?! - apontou para a cabeça, incrédulo.
- Eu fiquei cego com ela me dizendo tanta merda e ainda me batendo! James, ela me bateu, nenhuma mulher nunca sequer levantou a voz comigo, você tem ideia?
- Você é um babaca, . - negou com a cabeça, sério.
- Ela está bem, eu mesmo receitei alguns remédios hoje. - suspirou, brincando com os dedos em cima da mesa.
- Morde e assopra. - riu, irônico. - E o arrependimento veio quando? Na mesma hora ou assim que a viu?
- Não veio. - umedeceu os lábios, sabendo que, no fundo, bem no fundo, estava mentindo. - Se você ouvisse as coisas que eu ouvi... Ah, cara! - balançou a cabeça, sorrindo sarcástico. - Fora que ela mereceu aquilo! Tanto pelo que havia me dito e feito, quando pelo que aconteceu há cinquenta anos. Acordar num dia e saber que está bem, não viu todas as catástrofes da guerra, todas as pessoas que morreram, o caos que o mundo esteve por sua culpa... É fácil demais, James. Eu cresci com todos me mostrando o quão terrível aquela garota era. Ela só teve uma boa lição, e Zimmerman nem fez tanta coisa assim. - disse, para convencer mais a si mesmo do que o outro. - Ela já fez muita merda, cara.
- Mas a guerra só aconteceu mesmo por causa dela? Uma declaração e "bam, vamos começar uma guerra!"?
- Não sei direito, parece que os países já tinham dívidas a ser acertadas, mas isso foi o estopim.
- De qualquer forma... - deu os ombros, mudando de assunto. - Acho que já vou pra casa, to morto. - bocejou, se espreguiçando.
- Certo, eu te levo. - James franziu o cenho. - Ora, James, você não vai dirigir assim. - fez sinal para a garçonete, pedindo a conta.
- Estou bem. – bufou, rindo logo após. Sabia que não estava. – Certo, amanhã eu passo aqui e pego meu carro. – deu os ombros, se levantando. – Você paga. Já fiz muito em vir aqui ouvir suas reclamações! – brincou, olhando-o.
- Só não acostuma. – disse, pegando a quantia da carteira e colocando sobre a mesa. James riu, dando alguns tapinhas nas costas do amigo.

levou o amigo até sua casa e seguiu em direção à sua. Diferentemente do que pensara hoje mais cedo, ele não precisava transar com alguém agora, só precisava ficar sozinho. Pensando, dormindo, bebendo, assistindo algum filme ou o que quer que fosse. Por fim, decidiu se jogar em seu confortável sofá e ligar a TV em algum canal de filmes, onde no momento passava algum de ação. Ele suspirou e começou a prestar atenção, no entanto, quando começava a entender algo, seu celular apitou.

"Vamos começar com os testes da Ironm4x amanhã, às 05h00 AM, e acho bom você estar no Ministério meia hora antes. Sem atraso, ."

rolou os olhos ao terminar de ler. Cinco horas da manhã era cedo demais! Ora, por que tinham que começar tão cedo? O sol ainda nem iria ter começado a clarear o céu, quanto mais iria conseguir entender algo dos testes. Uma das coisas que mais odiava no mundo era acordar cedo, imagine acordar durante a madrugada? Não, não, não. Ele não iria e estava certo disso. Afinal, não tinha nada a ver com a história toda. Aliás, não sabia ao menos porque estava se preocupando com aquilo. Isso era assunto dos cientistas e de seu avô e pai... Que agora não estavam mais aqui para isto. bufou. Havia ficado com todas as responsabilidades para si.
Ele massageou as têmporas, sentindo a dor de cabeça que acabara de começar. Teria de ir ao Ministério, querendo ou não. Era de sua responsabilidade. Era seu dever. suspirou, encostando a cabeça no sofá, onde estava sentado. Que se dane tudo o que estava acontecendo. Não poderia ser tão complicado analisar aquela... Aberração, não é?

bocejou ao sentir o sono começar a lhe invadir. O dia havia sido cheio e cansativo, mas imensamente melhor do que o anterior. Ela olhou para a pequena janela a sua frente e viu o breu tomar conta da mesma. Já era de noite, e provavelmente já bem tarde. Peter dormia pesadamente, a poucos metros dela. O invejava pela forma calma que dormia, como conseguia dormir ali, naquele cubículo escuro? Ele já estava acostumado, afinal. Peter estava acostumado com o fracasso, com o pouco, com o ruim, com o desconforto. Mas ela não, se negava a aceitar aquela vida medíocre, qualquer fosse a sua idade e aparência.
Ainda veria como o mundo estava lá fora, como eram as pessoas, suas roupas, suas músicas, seus lugares e seus costumes com os próprios olhos. Sentiria todas as emoções de estar naquele novo mundo. Pelo que Peter havia lhe contado logo cedo, aquele novo planeta era incrível. Exatamente do jeito que sempre sonhou. Ao pensar nisso, lembrou-se de como era há alguns dias (ou há cinquenta e sete anos) e talvez só houvesse nascido na época errada e então fora mandada para a certa. Podia ser isso, não podia? Ela riu fraco da conclusão. Fazia sentido. Mas, se fosse isso então, por que estava trancafiada nesse minúsculo porão, fadada a continuar ali por todo o resto de sua vida, mesmo que não soubesse quanto ainda teria? Não, não. Aquilo estava absurdamente errado. bufou, com raiva, e então lembrara-se de Jane. Aquela saudade que não cessara. Agora, sim, era como se ela não a visse há anos. A um dia, ao acordar, era como se tivesse encontrado a amiga no dia anterior, mas hoje não mais. Depois de saber toda a verdade, a impressão da falta da amiga ocupou a realidade de seus pensamentos. Será que ela continuara viva? Oh, Deus. Era tão difícil pensar que jamais encontraria sua amiga novamente, pelo menos não do modo como a conheceu; com a energia e imaturidade da juventude.
Juventude... permitiu-se rir baixo.

- Eu tenho setenta e oito anos. – sussurrou para si mesma, e logo após, uma risada abobalhada tomou conta de sua garganta. Era como se houvesse, de fato, enlouquecido. – Ei, Peter!? – chamou, já sem pensar se estava sendo educada ou não. – Ora, Peter, acorde! – riu, com os olhos cheios de lágrima.
- O que... – o senhor disse, com a voz ainda rouca. – Você está bem, ?
- Eu tenho setenta e oito anos, Peter! – exclamou, audivelmente. – Há dois dias eu tinha os meus novos e bem vividos vinte e um aninhos. Hoje tenho setenta e oito! Ora, estou com um pé na cova. – riu alto, olhando para cima.
Peter suspirou, sentando-se. Sabia que ela não estava em seu melhor estado. Quem estaria, afinal?
- ...
- Não, não. Estou falando sério! – gesticulou com as mãos, sem deixar de rir. A esta hora, as lágrimas já escorriam por sua face, passando despercebidas por si mesma. – Eu já poderia estar com meus netos, talvez bisnetos. Vivendo numa casinha no lago, ao lado do meu marido, onde todos os nossos filhos viriam com suas respectivas famílias nos visitar, aos domingos. – ela mordeu o lábio, suspirando. – E sabe qual é a melhor... Ou pior, eu nem sei mais! – deu os ombros. – Parte disso tudo? Eu não tenho uma ruguinha sequer! – riu, negando com a cabeça. – Eu não tenho um só fio de cabelo branco.
- ... Vamos dormir, sim? Tudo vai estar melhor pela manhã.
- Não, Peter. Nada vai estar bem pela manhã. Nem pela manhã, nem à tarde, e muito menos à noite. Jamais vai voltar a estar bem. – deu os ombros, sorrindo amargurada. – Eu jamais vou voltar a abraçar minha melhor amiga Jane. Não vou irritar Max, seu namorado e meu melhor amigo. Nunca irei poder beijar Adam de novo e dizer o quanto o amo, fazer planos para o futuro. E, nunca, ao menos não nessa vida... Vou poder ganhar um beijo na testa do presidente dos Estados Unidos, o meu pai. – sussurrou a ultima parte da frase. As lágrimas grossas já estavam por todo o seu rosto.
- Você não deve se lamentar por tudo o que já passou e não passará mais. – Peter disse, e ela o encarou; incrédula. – Deve agradecer por ter tido a chance de viver momentos como esse, por menor que fosse o tempo. – sorriu fraco. – Eu sou um senhor de cinquenta e sete anos e jamais pude ganhar um abraço de minha mãe, ou de um melhor amigo... Eu nunca soube o que fosse amor por outra mulher. – sorriu fraco.
- Acredite em mim Peter, você não iria querer tê-los caso fosse os perder tão brevemente. – balançou a cabeça, respirando fundo. – Eu odeio os . Odeio com todas as forças que tenho em mim! – esbravejou, socando o chão em que estava sentada.
- Todos odiamos, . – suspirou, olhando para a janela a sua frente. – Eles são os próprios descendentes de Hitler. – encarou , que parecia observar o nada. Seus pensamentos estavam longe, talvez há cinquenta e sete anos atrás. – Onde você está?
- Hm? – indagou, virando-se para olha-lo. – Como assim?
- Em que ano, momento da sua vida? – ele sorriu fraco e ela também. – Seus pensamentos estão tão longe...
- 1956, na Casa Branca.

Adam, , e John jantavam na mesa principal da Casa Branca. Pela leitura corporal de Adam, ele não estava nada calmo, fazendo com que desse algumas risadas durante o jantar. John sorria para os dois, simpático como sempre era.
Louise servia a sobremesa, e os tiques nervosos de Adam só pareciam aumentar.
- Tudo bem, Adam, você já pode dizer o motivo desse nervoso todo! – gargalhou, tomando um gole de água.
- !? – o namorado repreendeu, parecendo engasgar com o mousse de chocolate.
- tem razão, Adam, você está inquieto desde que chegou aqui. Nos diga o que está lhe afligindo. – sorriu, pegando o guardanapo de pano que estava sobre o colo e limpando os lábios.
- Bom... – Adam suspirou, virando-se para encarar o sogro. – Senhor John, eu amo a sua filha e isto não é segredo para ninguém. – sorriu fraco. cruzou as mãos embaixo de seu queixo, observando-o. – Ela é a mulher da minha vida, se me permite dizer. – John assentiu, sorrindo. – é tudo para mim e eu não me vejo com outro alguém para passar o resto da minha vida comigo, sendo a mãe dos meus filhos e minha esposa. – pigarreou. entreabriu os lábios, deixando de encostar o rosto nas mãos. – E por isso, hoje, eu gostaria de ter a sua benção e pedir, com todo o respeito do mundo, a mão de sua filha em casamento.


suspirou, deixando que mais algumas lágrimas escorressem. A dúvida sobre como Adam estava, o que tinha feito da vida e se havia, de fato, tido uma vida após a guerra, lhe consumia. Ao pensar em seu Adam com outra mulher, seu estômago revirara. Ele deveria ter casado novamente, não teria? Tido filhos, com certeza.
Malditos. .
Sussurrou, entre os dentes. Cada vez que pensava em seu passado, e em tudo que havia perdido, seu ódio por aquela família só aumentava. E ela jurava que se visse algum deles no momento, não se importaria de tirar sua vida com as próprias mãos.

As 04h da manhã não demorou a aparecer, pela tristeza de e a quase felicidade de . Tristeza para ele, que teria de madrugar, e pseudo-felicidade ela, por estar próxima a sair daquele cubículo.
caiu da cama, amaldiçoando até a sua sétima geração. Acordar antes das dez da manhã deveria ser fora da lei, principalmente quando for para fazer algo com cálculos e pessoas insuportáveis. Ele suspirou, tropeçando nos móveis que separavam sua cama do banheiro, em sua suíte. Ao chegar no grande banheiro, abriu a torneira e encheu as mãos – em concha -, com a água gelada, jogando-a no rosto logo em seguida. Quando sentiu o choque de temperaturas, seu corpo todo se arrepiou e ele deu alguns pulos, na tentativa de espantar aquela sensação. Buscou a toalha de rosto ao lado e secou o mesmo. Após um longo bocejo, encarou a sua própria imagem no espelho e riu fraco, estava um caco. Quem mandara ir dormir às 02h00 da madrugada, afinal? Duas horas de sono não era nada. deu os ombros e começou a se despir, tirando a única peça que vestia; uma cueca boxer.
Caminhou até o chuveiro e o ligou na temperatura mais quente possível, precisava relaxar, o dia seria longo.
O banho demorou cerca de vinte minutos. Quando saiu, estava bem mais disposto e agradeceu aos céus por isso. Tomou um café bem forte e comeu algumas torradas, no entanto, a mensagem de Franz, chefe da parte cientifica do Ministério, lhe enviou uma mensagem.
“Onde você está, ? Faltam só dez minutos. Espero que já esteja estacionando.”

- Vai sonhando, Franz. – riu, dando uma última mordida na torrada e caminhando até o enorme espelho que sua sala tinha. Arrumou a farda e pegou suas chaves, logo em seguida indo até a porta e saindo de seu apartamento. 04h54. Atrasar um pouco não mata ninguém, não é?

já estava sentada numa espécie de corredor sem saída. Já de banho tomado e roupas quase limpas, podia até sentir-se um pouco gente. Hoje começariam as avaliações, e ela se sentia apreensiva. O que fariam? O que perguntariam? O que testariam? Eram tantas dúvidas. Tanto medo. Quando esses testes terminassem, o que aconteceria com ela? Seria descartada como lixo? Bom seria se fosse. Jogada na esquina de alguma rua, oh, como seria bom se ver livre daquele maldito lugar.
Os cabelos úmidos batiam em seus ombros, deixando-a com um pouco de frio. Todo amanhecer é frio. Suspirou. Estava ansiosa.
Finalmente, cerca de dez minutos se passaram quando um homem alto, loiro, e extremamente carrancudo, apareceu. Chegava até a ser um insulto.

- ? Me acompanhe. – disse, com o inglês meio descompensado, mas ainda sim compreensível. o fez, levantando-se e indo até o homem, com passos apressados.

O caminho foi em silêncio e não durou mais do que cinco minutos, segundo as contas mentais da garota. Quando o homem que a acompanhava abriu a porta, ela encontrou uma sala bem parecida com a de dois dias atrás, quando acordou do sono que durou cinquenta e sete anos. Quatro pessoas já estavam sentados em bancos à frente de uma cadeira, que provavelmente seria para ela.
A luz forte fez seus olhos doerem e ela os fechou com força, dando um passo para trás, no entanto, o homem loiro lhe deu um pequeno empurrão para que ela entrasse. Ela o fez, mesmo contra sua vontade.
Os únicos móveis que aquele lugar tinha, era, além das quatro cadeiras, um armário ligeiramente grande, com portas de vidros. Somente. Mais nada. Nenhum aparelho de tortura ou algo parecido. Já era um ponto positivo.
Depois de caminhar absurdamente lenta até a cadeira que a esperava, ela finalmente se sentou. Encarou aqueles dois homens e duas mulheres – que estavam vestidos de branco, como médicos ou enfermeiros. – e suspirou, esperando quem falaria primeiro. Os quatro a observavam atentamente, anotando coisas em seus pequenos cadernos de mão. O silêncio era dominante, até que o som estridente da porta se abrindo aconteceu.
- Estou dezessete minutos atrasado, não é muito! – apareceu ofegante e rindo, enquanto fechava a porta. – Espero que não tenham começado sem mim! – sorriu confiante, virando os calcanhares para encarar , que encarava as próprias unhas, parecendo entediada. Céus, como ele amava saber que o ódio era recíproco. – Ah, quase me esqueci de você, orgulho da América. – disse, sarcástico e ela o encarou, mais confiante do que nunca. – Bom dia, . Preparada? – ergueu a sobrancelha esquerda, desafiador.


Capítulo VIII


quis gargalhar, se levantar daquela cadeira e estapear aquele maldito. No entanto se segurou, contentando-se em somente sorrir desafiadora e erguer uma das sobrancelhas, assim como ele.
- Não há nada mais que eu não esteja preparada, .
- Uma pena saber disso, . – entortou a boca, fingindo sentir pena. Ela rolou os olhos, voltando a olhar para frente. – Mas, enfim, onde está a minha cadeira? Ou vocês esperam que eu fique de pé às... – olhou para o relógio em seu pulso. – Argh, 05h20 da madrugada?! – fez uma careta.
- Não deixem a princesinha de pé, gente. Vamos, onde está sua poltrona de veludo para que ele possa ter seu cochilo de beleza?! – cruzou os braços e riu, balançando a cabeça.
- É disso que estou falando! – rindo, apontou para ela. – Obrigado, . – sorriu.
- Vá se foder. – disse, séria.
- , não banque a criança. – um dos homens disse, parecendo impaciente. deu os ombros, indo até a parede ao seu lado e encostando-se a ela.
- Eu realmente vou ter que ficar em pé?
- Logo vamos para fora, aquiete-se.
- Para fora? – questionou, num fio de voz. Então ela veria o dia novamente? Mesmo que por gigantescas paredes a impedindo de ir além, já era algo. Ela sorriu, e a observou. Ela estava tão feliz dessa forma só por poder ver o sol? Por Deus, ele só queria sua cama e a noite novamente.
- Bom, por mais que eu não ache necessário, é meu dever lhe apresentar quem irá te estudar pelos próximos meses.
– Meses? – Céus, seria uma longa jornada.
deu os ombros ao terminar de falar, ignorando completamente a pergunta anterior da garota.
– A mulher à sua esquerda - a encarou, era uma mulher que não aparentava ter mais do que quarenta anos, era loira e aparentemente simpática – é Anette. Nossa melhor química; está conosco há dezesseis anos e trabalhou com grandes nomes, dos quais eu acho melhor não citar, pois você não os conheceria. – riu fraco, vendo Franz pigarrear. – Certo. Anette conhece códigos que químico nenhum jamais conseguiu decifrar. Ela é capaz de criar uma nova bomba que acabaria com um país inteiro, em segundos. – arregalou os olhos e Anette sorriu orgulhosa de si mesma. – Ao lado de Anette, temos Eva. – a garota encarou a mulher, que parecia ser um pouco mais velha do que Anette. Ela tinha os cabelos castanhos, curtos na altura do ombro, e era longilínea. – Eva é psiquiatra e é capaz de descrever até o modo de como você pisca, dizer o que está pensando e o que mais for. – Emy arregalou os olhos, encarando a mulher. – É especialista em leitura corporal. Já prendeu dezenas dos piores psicopatas do planeta, somente assistindo a um depoimento deles. Já trabalhou num dos piores hospitais psiquiátricos do mundo, afastado de toda a sociedade. Uma hora lá e você enlouquece, segundo fatos. – deu os ombros, continuando a apresentação. Já sabia de cor tudo aquilo. – Ao lado de nossa corajosa Eva, Klaus. – encarou o senhor, que devia ter uns cinquenta anos, talvez. Seus cabelos já eram grisalhos e sua postura invejável. – Além de estar no ministério há décadas, é físico e historiador. Klaus poderia ser chamado de novo Albert Eisten. Tem milhares de histórias e fórmulas guardados na memória... E eu realmente preciso continuar? – suspirou entediado, coçando a cabeça. – Klaus é um gênio. – deu os ombros. – Sabe a história do nosso país como ninguém, além, é claro, de saber basicamente tudo sobre outros países, principalmente nosso querido EUA. – sorriu sarcástico, passando o peso de uma perna para a outra. – Franz. – cruzou as pernas, observando o homem. – Franz é como o chefe de tudo aqui. – deu os ombros, suspirando entediado. – Está no Ministério desde completou dezesseis anos, trabalhando junto do meu pai. É formado em ciências biológicas, além dos conhecimentos em química, física e psicologia, também. Entre outros, que não vêm ao caso agora. Era o responsável pela Ironm4x até que eu tomasse conhecimento. Ele irá passar o maior tempo com você. – Franz assentiu para , que suspirou, encarando as próprias mãos. – E, enfim... . – disse, referindo-se a si mesmo. ergueu o olhar, encarando-o. Era a primeira vez que ela o olhava assim, com calma para analisar o que ele dizia, sem estar xingando-o ou batendo em seu rosto. – Como você deve ter percebido ontem, eu sou formado em medicina. E, perto de todos aqui, sou um nada. – riu fraco. – Me formei com louvor na melhor e maior universidade de medicina do mundo. Comecei a faculdade de ciências biológicas, também, mas no segundo semestre a larguei. Tenho um vasto conhecimento sobre a história do meu país e dos Estados Unidos.
- Você tem quantos anos? – questionou.
- Vinte e quatro. E você?
- ... – Franz repreendeu, fazendo com que risse, balançando a cabeça.
- Setenta e oito, com carinha e corpo de vinte e um. – sorriu, e sorriu sem humor. Sentia-se meio desnecessário, pela primeira vez em anos. Ela fechou o sorriso, voltando a olhar para frente.
- O que acham de começarmos logo com isso? O quanto antes eu estiver na minha cama, melhor. – ele deu os ombros, arrumando a postura.
- Certo, você tem razão. Quanto antes começarmos, melhor para todos nós. – Klaus disse, levantando-se. Todos fizeram o mesmo, incluindo , que respirou fundo, umedecendo os lábios.
- Sei que já foram acontecimentos demais para uma só semana, . Mas tente se acalmar. – Eva disse, encarando a garota, que franziu o cenho. – Ainda não sabemos as suas condições clínicas, então sugiro que continue respirando fundo, tente tirar toda essa tensão de si. – prestou atenção, enquanto andava junto dos outros. – Sua parte física já está debilitada, não queremos prejudicar ainda mais a emocional, correto?
- Por mim, tanto faz. – deu os ombros, dando alguns passos à frente. Que se danem todos. Ela não iria ser simpática com ninguém, talvez o humor da terceira idade já estivesse em seu corpo.
- Sem mais delongas - Franz disse, abrindo uma das portas daquele imenso corredor –, começaremos com exames clínicos. Vamos ver como você está por dentro, . – a garota voltou a dar os ombros, parecendo entediada. – Sente àquela maca e tente relaxar. – apontou para os aparelhos e maca à sua frente. os encarou e deu um passo para trás, encarando os outros três presentes – com exceção de . Além da maca, havia um enorme aparelho que mais parecia um túnel. Ela engoliu seco, não iria entrar ali. – Você está com medo, não está? – ela não respondeu nada. Ele riu. – É só uma aparelhagem médica, . Ressonância Magnética. Iremos ver como você está por dentro, como numa filmagem. Você sabe o que é raio-x, não é? – assentiu.
- Ora, deixe de bancar o pai babão, Franz. Ela não é mais nenhuma criança, muito pelo contrário. Deite-se logo nessa merda de maca e realize esse exame! – esbravejou, já sem paciência.
- ... – Anette chamou, mas ele a ignorou.
- Qual é? Ela não precisa saber o que é isso. É só deitar e pronto!
- Acima de tudo, ela é um ser humano, . Pare com isso. – Eva repreendeu, balançando a cabeça.
o encarava, passiva, prestando atenção em cada palavra que o homem dizia e observando o quão sujo uma pessoa poderia ser.
- Parem de defendê-la! Seus avós ou pais morreram por sua causa, não sejam tolos! É ela quem ter de ser repreendida.
E, ao terminar de falar, viu que nenhum mais de seus colegas prestava atenção em suas palavras, mas sim olhavam por trás de seu ombro. Ele virou-se de costas e viu que já estava deitada na maca, com as mãos cruzadas sobre a barriga e com os olhos fechados. estalou os lábios, sentindo-se desnecessário pela segunda vez numa só hora. Que se dane. Ele estava certo, de qualquer forma; segundo sua mente.
- Vamos começar. – Franz suspirou, dando meia volta e indo atrás do biombo que separava a sala. Os outros o seguiram. Como era o único médico formado dali, ficou encarregado de ficar no meio, prestando atenção em todo o trajeto que a máquina fazia. Ele franziu o cenho, chegando mais perto da tela. Aquilo ficava cada vez mais inacreditável. Os outros quatro estavam com os braços cruzados, também observando as imagens.
Alguns poucos minutos se passaram e o exame chegou ao fim. A máquina foi desligada e Eva foi até , ajudando-a se levantar.
- E então, ? Quantos anos eu ainda tenho? – disse, cruzando os braços na frente do peito.
- Você tem vinte e um anos por dentro também. – soltou o ar pela boca, dando os ombros.
- É impressionante. – Franz deu os ombros.
- Teremos de fazer exames mais precisos, é óbvio. Sangue, eletrocardiograma, ultrassom, mas... Sua saúde é ótima.
- Isso quer dizer que...?
- Que os raios da máquina não lhe afetaram de nenhuma forma! – Anette pronunciou, orgulhosa de si mesma. – Ou melhor... Afetaram-lhe da melhor forma possível. Você continua intacta, garota! – a mulher bateu uma mão na outra, como se fosse aplaudir. – Ironm4x é um sucesso. – sorriu, olhando para os colegas.
- Não tão rápido, Anette... – Franz disse. – Precisamos de testes mais precisos, como disse . E ainda não sabemos se é porque faz apenas dois dias desde que a máquina foi desligada... Os raios podem continuar em seus órgãos, músculos e pele... Ainda não temos certeza de nada.
- Tem razão, Franz. Mas é um ótimo começo.
- Podemos fazer os outros exames, então?
- Nós não iríamos para fora? – questionou.
- Outro dia, . – Eva sorriu. – Eu vou acompanhar o durante os exames e depois pretendo conversar um pouco com ela, tudo bem para vocês?
- Não. – disse, balançando a cabeça. – Eu não quero conversar com ninguém.
- Vai te fazer bem. Não aceito o seu não. – fingiu dar bronca e a garota suspirou.
- Vamos logo com isso. – rolou os olhos, dando alguns passos à frente. – Nos vemos depois. – disse, olhando para Franz, Klaus e Anette, que assentiram.

começou a andar atrás de , encarando suas costas largas. O que teria feito um homem tão jovem ser tão amargurado? Ela se perguntava se era somente com ela, por todo o passado, e, mesmo assim, não conseguia encontrar a razão de tanto ódio. Não fora culpa dela! Ela suspirou, apertando os olhos. Após sentir uma mão em suas costas, ela se virou depressa, encontrando Eva, sempre sorridente.

- E então, está melhor? – a mulher questionou e ela deu os ombros. Por alguma razão, não odiava tanto aquela mulher quanto a todos os outros ali. Talvez fosse porque ela fosse mais branda, a não ser que estivesse mentindo.
- Não gaste paciência e saliva com ela, Eva. – disse, abrindo uma porta.
rolou os olhos e bufou, já estava cansada daquele homem.
- Vá se foder, . Qual é o seu problema?! Cara, você consegue ser mais insuportável do que o seu avô! – esbravejou, fazendo-o virar o rosto incrédulo. – Estou ouvindo seus insultos e idiotices desde cedo e não aguento mais! Eu sou um ser humano, caso não tenha percebido. Um ser modificado, mas ainda assim tenho uma vida, uma alma, um cérebro e um coração. Porra! – gesticulou com as mãos, subindo o tom de voz. cruzou os braços, encarando-a. – Eu sei que você me odeia, e sabe que é totalmente recíproco, mas... – respirou fundo, balançando a cabeça. – Que se foda. Me manda logo pro Zimmerman. – deu os ombros, encostando-se à parede.
- Ele não vai te mandar para lugar nenhum, . – Eva disse, interrompendo . – Sente-se àquela cadeira para que ele possa colher uma mínima quantidade do seu sangue para avaliarmos no laboratório, sim? E você está certa, só se acalme. – segurou a mão da outra, levando-a para a cadeira à frente.
- Estique o braço. – ordenou e o fez, fechando os olhos. – Não o mova até que eu diga. – A garota virou o rosto, encarando o chão ao seu lado. Após sentir uma picada forte, ela mordeu o lábio e gemeu. A dor foi se abrandando e ela respirou aliviada ao sentir apertando um algodão contra seu braço, estancando o sangue. Ela o encarou e ele fez o mesmo. Seus olhos se encontraram e faíscas saíram. Eles queriam se matar, era fato. Mas, além disso, havia outra coisa... Como uma curiosidade. pigarreou, colocando um pequeno curativo do braço dela, e se afastando logo depois. – Deite-se na maca e erga a camiseta. – riu sarcástica, aquilo estava virando rotina? – Pare de ser infantil, . É para o ultrassom. – e, mesmo contra vontade, Emy deitou-se na maca, erguendo a camiseta até um pouco abaixo dos seios. buscou um pequeno frasco de gel e espirrou na barriga dela. A garota se arrepiou com a temperatura do líquido e se enrijeceu. voltou a encarar seu rosto e ela o dele. Nenhuma palavra foi dita. Quando a pequena TV ao seu lado finalmente ligou, começou a passar o aparelho por sua barriga. E tudo parecia normal, até franzir o cenho e aproximar o rosto da tela. seguiu seu olhar, assim como Eva.
- Algo errado? – a psiquiatra questionou.
- Como imaginei. – deu os ombros, desligando a tela. – Só terei certeza ao receber os resultados do exame de sangue, mas é provável que o útero tenha sido afetado. Por incrível que pareça, é como eu vi antes na ressonância. – Arrumou-se na cadeira onde estava sentado. – Não acho que isso mude muita coisa na sua vida - começou, encarando –, mas você é, ou se tornou estéreo, .
A garota fechou os olhos e virou o rosto para o teto. Isso mudava mesmo algo? Ao sentir o grosso nó em sua garganta, ela suspirou, deixando as poucas lágrimas escorrerem pelo lado de sua face. O sonho de formar uma família, de ver seus filhos crescendo ao lado de Adam... Ora. Adam também já não poderia mais lhe dar filhos, mas ainda sim ela tinha a esperança de sair daquele inferno e encontrar um novo amor. De formar uma nova família, uma nova história para a sua nova vida. Contar para suas crianças o que havia lhe acontecido, compartilhar histórias. Cuidar. Amar.
- ... – Eva se aproximou, buscando a mão dela, que a tirou dali, levando-a a sua barriga. – Só este órgão, ?
- Aparentemente, sim. – encarou , que ainda tinha os olhos fechados. – Sejamos sinceros, isso realmente muda algo? Todos sabíamos que ter uma vida normal após a Ironm4x é impossível.
- ! – Eva repreendeu. – Cale essa boca. Você já fez tudo que precisava, não fez? Agora me deixe sozinha com , por favor.
- Me deixe você sozinho com ela. – Emy abriu os olhos, virando o rosto para ele. Eva balançou a cabeça, negando. – Eu não vou fazer nada, não sou tão burro a esse ponto. Sei quanto dinheiro está em jogo.
- Não se trata só de dinheiro, !
- Saia da sala, Eva.
- Eu vou estar por perto. – avisou. assentiu, apoiando os antebraços em seu colo. Eva saiu da sala. Cerca de dois minutos se passaram em silêncio até que alguém pronunciasse algo naquela sala.
- - ele começou, e ela voltou a encará-lo, com os olhos vermelhos –, seja sincera consigo mesma. Você realmente achou que poderia ter uma vida normal quando acordou naquela maca, há dois dias?
- Não sei.
- Deixe-me ser mais claro: você sinceramente achou que poderia ter uma vida normal depois de ter assistido ao discurso do meu avô na televisão, em 57?
Ela negou com a cabeça, respirou algumas vezes, tentando segurar o que estava por vir, mas no fim, não teve êxito. Ela fechou os olhos e segurou o lábio inferior entre os dentes, pondo-se a chorar. O choro guardado há dias, há anos, há cinquenta e sete anos. O choro libertador que tanto ansiava. O choro que iria amenizar a dor que tanto lhe destruía.
- Você destruiu milhares de famílias no mundo inteiro. Tirou pais de suas casas, onde jamais voltariam a pisar, por uma guerra. , você acha que seria justo ter uma vida bonitinha, acordar num mundo de paz, formar uma família... Depois de tudo? Toda ação tem uma consequência. E eu estou aqui para cobrá-la. – suspirou, vendo-a sentando-se na maca, colocando o rosto entre as mãos.
- Eu não queria machucar ninguém! – soluçou, tirando o rosto das mãos para encarar . – Pelo amor de Deus! Você realmente acha que eu desejaria fazer com que alguém sofresse?! Olhe bem para a minha cara, . Olhe para onde estou hoje. Seja sincero consigo mesmo – imitou a frase anterior que ele havia dito. – Você acha que eu procurei por ser tão infeliz? – se levantou, indo até a porta. – Você realmente acha que alguém seria imbecil o suficiente para fazer algo que acabasse com sua própria vida e a de todos que ama? – ele abaixou a cabeça, olhando para as suas mãos. – Eu posso ir descansar? - ergueu a cabeça, assentindo e indo até ela. Ele abriu a porta, encontrando um dos seguranças do local.
- A leve para descansar. – o homem assentiu e ela começou a andar, sem ao menos olhar para trás.

Ao entrar em seu mais novo “quarto”, ela ao menos se deu o trabalho de olhar para Peter, que encarava o horizonte. sentou-se em seu colchão e jogou a cabeça para trás, encostando-se à parede. Será que nunca iria melhorar? Será que todo aquele sofrimento nunca teria fim? Tudo só parecia piorar com o passar dos dias. Se fosse para ser assim, por que não a deixaram dormir para sempre na Ironm4x? Aquela dor estava a matando.

- Você aprenderá a conviver com ela. – Peter disse baixo.
- Ela? – questionou, virando o rosto para ele.
- A dor. A saudade. A prisão. O ser humano foi feito para se acostumar a qualquer ambiente, . Seja ele bom ou ruim.
- Não quando já e viveu no melhor lugar do mundo, com as melhores pessoas do mundo.
- E chorar adianta de algo? Sofrer, odiar a todos, se colocar para baixo? Me diga, , você se sente melhor agora?
- Me deixe em paz, Peter. – suspirou, encarando suas próprias mãos.
- Há pessoas com piores problemas por aí...
- Mas que merda! – se levantou, exaltada. – Me deixa em paz, Peter. Esquece que eu existo! – gritou, chutando a parede ao seu lado. Peter respirou fundo e ficou em silêncio. Ela suspirou, fechando os olhos. – Obrigada.

Já fazia uma semana desde o primeiro dia de testes com . Sete longos dias de exames dos mais variados tipos. Três consultas com Eva, sua psiquiatra, e uma conversa com Franz. Tudo o que sabia até então era que sua saúde continuava perfeita, como a que tinha com seus vinte e um anos, no entanto, o que desconfiavam desde o primeiro dia, havia sido constatado: era estérea. Mas, por mais difícil que fosse acreditar na possibilidade, ficou em dúvida quando lhe disseram que talvez ela já tivesse este problema antes mesmo da Ironm4x, já que todo o seu corpo e funcionamento dos órgãos estavam em perfeito estado. Sequer uma lágrima foi derramada quando lhe contaram a notícia. Ela se negava a voltar a chorar. Não só ali, com aquela notícia, mas com qualquer outra ou com qualquer outra coisa que acontecesse naquele ministério. No primeiro dia do teste, quando se permitiu chorar na frente de e discutir com Peter, havia chorado tudo o que necessitava e se impedia de continuar daquele jeito. Não iria dar o gostinho para quem quer que fosse.
Quanto a seu relacionamento com , as coisas continuavam praticamente na mesma. As farpas trocadas continuavam, mas já não eram tão frequentes quanto antes e ambos já haviam acostumado com a presença um do outro. Finalmente conseguiam enxergar alguma fresta de luz no fim, bem no final do túnel. Talvez não fossem se matar na próxima hora, como sempre pensavam enquanto estavam no mesmo ambiente.
Agora, caminhava até a sala aonde ia todos os dias, desde o primeiro dia de testes. Os cinco já esperavam por ela, que fez questão de não ser nem um pouco simpática, como todos os dias.
se virou para encará-la e ela o olhou, também. Aquela troca de olhares dizia muito mais do que podiam imaginar. Não era somente ódio, pelo contrário. Era demais até para que eles próprios pudessem descrever. Talvez uma pequena faísca de perdão pudesse começar a estar nascendo ali, no fundo, bem no fundo do coração de ambos.

- Sua saúde está em perfeito estado, – Franz disse, despertando a atenção de e . – Pelo menos toda a sua corrente sanguínea, órgãos e afins estão melhor do que o de todos nós aqui. – todos riram fraco, com exceção da própria e , que somente sorriu. – Mas agora precisamos saber sobre a parte física.
- E isso quer dizer o quê? – ela questionou, cruzando os braços.
- Precisamos fazer você se exercitar. – disse, dando alguns passos à frente. – Ver seu pulmão em funcionamento, articulações, carga física... – suspirou e ela franziu o cenho, ainda não entendendo onde ele queria chegar. – Você voltará a ver a luz do dia, .
E, no mesmo segundo, o sorriso que há cinquenta e sete anos não habitava o seu rosto, apareceu ali. Sendo capaz de acender até o coração mais obscuro de todos os presentes.


Capítulo IX


(Música do capítulo: Why – Rascal Flatts. Play quando eu avisar)

sorriu fraco ao vê-la com aquele sorriso radiante. Como ela poderia ficar tão feliz com algo bobo daquela forma? Ela só iria sair no jardim do Ministério, ver a luz do sol... Depois de cinquenta e sete anos. Ele balançou a cabeça, ela tinha razão em estar assim.
- E estamos esperando pelo quê para sair? – ela disse, sorrindo.
- Nada, querida. – Eva sorriu, indo até ela e colocando uma das mãos em suas costas, para que ela começasse a caminhar. Ela o fez, ainda sorrindo fraco.

Franz olhou para e ambos balançaram a cabeça, sorrindo. Sabiam o que estavam pensando.
Após alguns poucos minutos de caminhada, chegaram à frente do da porta principal do ministério. Ao a abrirem devagar, a luz entrou de uma só vez no ambiente e deu um passo para trás, tapando a visão com as mãos. , que estava atrás da garota, colocou uma mão em suas costas, com a intenção de incentivá-la. Ela lentamente tirou as mãos do rosto e abriu os olhos devagar, tentando se acostumar com a luz do dia. engoliu seco, ainda com as mãos nas costas da outra. Quando Emy foi capaz de abrir os olhos normalmente, ela sorriu emocionada, mordendo o lábio. Toda a obscuridade que sua vida passava, literalmente, parecia ter tido ao menos uma pausa.
Ela deu alguns passos para fora e finalmente pisou na grama, ao fazer isso, no entanto, ela parou para tirar os finos sapatos que calçava, colocando, literalmente, os pés no chão. Quando sentiu o áspero da grama sob os pés, ela fechou os olhos e sorriu ainda mais. Não havia palavra, frase ou texto no mundo capaz de expressar o que a mulher sentia. O vento passou por seus cabelos e ela respirou fundo, sentindo o ar puro correr por seus pulmões, como um sopro de vida. Agora, sim, ela se sentia viva novamente. Sentia-se viva como quando saía às manhãs para ir ao lago com seus amigos. Um arrepio tomou seu corpo e ela abriu os olhos novamente, encarando o céu extremamente azul.
, que agora estava ao seu lado, pôde observar seu rosto e engoliu seco ao ver a sua emoção. Ele deveria cortar aquilo e lhe dizer que não estavam ali para observar as coisas simples da vida, mas, sim, estudar o que a Ironm4x havia feito. No entanto, não conseguiu. Faltaram-lhe forças, coragem. Se aquela mulher não fosse quem era, ele tinha a plena certeza de que buscaria o celular no bolso no mesmo momento e gravaria a cena para ver todos os dias ao acordar e ao dormir. Mas não.
Ela não era uma mulher qualquer.
Aquela era ; a causa, razão e motivo da ruína de sua família.
“Ela nos arruinou, querido.” A imagem de sua avó lhe dizendo isso foi o que bastou para que ele balançasse a cabeça e desses alguns passos para trás, virando o rosto.
- Vamos começar logo. – ele disse, frio, despertando a todos que estavam entretidos com a emocionante cena. suspirou e se virou para encará-lo. – Bom você estar de pés descalços, pode ser o nosso primeiro teste.
- Mas isso machucará seus pés, . – Anette repreendeu.
- Óbvio que não. Isso é grama! – deu os ombros, parecendo óbvio. – Depois passaremos para o tênis. Acredito que ela não será capaz de correr uma maratona ainda, vamos aos poucos. Temos todo o tempo do mundo. Ou não. – olhou brevemente para ela, que trincou o maxilar.
- Acho bom termos, sim, todo o tempo do mundo... Seria desperdício demais jogar bilhões de dólares no poço, . Fora que outra experiência com a Ironm4x demoraria tanto... Talvez nem os seus filhos seriam capazes de ver o resultado. – fez uma careta, simbolizando pena. Ele rolou os olhos. – O que eu devo começar a fazer?
- Corra até aquela árvore, . – Franz disse, buscando um pequeno cronômetro no bolso de seu blazer. Ela assentiu. – Pronta? – ela voltou a assentir, ficando em posição. – Já!

O homem avisou e ela começou a correr, contudo, nos primeiros três segundos, a garota parou, caindo no chão. Todos fizeram menção em ir até ela, mas só correu, se abaixando em sua altura. Ela o encarou e ele fez o mesmo, com os olhos arregalados.
- Reflexo de médico. – tentou se justificar, se levantando e esticando a mão para que ela fizesse o mesmo. Ela o fez. – O que aconteceu?
- Eu não sei. – deu os ombros, passando as mãos pelos cabelos curtos. – Foi como se todo o fôlego faltasse em meus pulmões e minhas pernas perdessem a força!
- Isso deve ter acontecido pela falta de movimentação, não, Franz?
- Sem dúvida. – o mais velho assentiu, observando a garota. – Podemos começar com uma caminhada mais rápida, tudo bem? – ela assentiu, em dúvida. – A acompanhe, .
- O quê? Por que eu?!
- Porque você é o mais novo e poderá ajudá-la, caso ela volte a cair. Vá. – mandou, cruzando os braços. Mesmo contra a vontade, bufou e parou ao lado dela; ambos se olharam e começam a andar depressa até a tal arvore. A respiração da garota ficou ofegante facilmente e ele se aproximou, com medo que ela caísse.
- Pode ficar calmo, . Não vou quebrar no próximo segundo. Você não perderá bilhões, não por enquanto. – sussurrou ofegante.
- Só quero ter certeza disso. – disse, olhando-a de soslaio.
- Você é inacreditável. – ela riu irônica, parando de andar por alguns segundos. Ele parou em seu lado. – Sabe que eu me pergunto se você é esse carrasco só comigo, ou com todos. Você consegue ser pior do que o seu avô!
- Não fala do meu avô, você não tem moral alguma para isso. Pelo contrário!
- Você é muito babaca mesmo, . E cego também! – bufou. – Teu avô iniciou uma guerra... A terceira guerra mundial! Ele destruiu milhares de famílias, não eu. Ele destruiu cidades, não eu. Ele é quem quis tudo isso, não eu. Eu só falei algo que uma adolescente inconsequente diz... – suspirou, abaixando a cabeça e erguendo-a logo em seguida.
- Você não deveria ter dito nada! Ele não teria começado essa guerra sem aquela sua frasezinha maldita!
- Ora, deixe de ser imbecil, ! Yan teria começado uma guerra de qualquer forma, ele só usou o que eu disse como pretexto! – disse, começando a acreditar que aquilo era realmente verdade. As palavras iam saindo de seus lábios e ela mal acreditava no que estava falando, só tinha certeza de que faziam total sentido. Como ela havia se culpado tanto? Sim, ela tinha mentalidade e corpo de uma garota de vinte e um anos, mas, querendo ou não, sua forma de pensar havia amadurecido. Talvez fosse pela máquina, talvez não, talvez só fosse a semana de cão que havia vivido ali. – Seja sincero consigo mesmo! Você iniciaria a terceira guerra mundial, sabendo que milhares de famílias seriam destruídas, bilhões de mortes de inocentes, só porque uma garota inconsequente te mandou fazer mais sexo, para que seu humor mudasse um pouco? O quão idiota isso é?! – disse, incrédula. Seus olhos já se enchiam de lágrima. Aquilo era tão óbvio.
- Ei, ei, vocês dois! – Eva chamou, se aproximando. – Acho que já tivemos emoções demais para um só dia, certo? – ela sorriu, colocando as mãos nos ombros de . – Pode voltar para casa, . Até amanhã.
ainda encarava , atônito. Era óbvio que fazia sentido, mas não era assim. Ela havia sido a culpada de tudo. Ela. Seu avô estava em seu dever em querer defender sua honra. Ao vê-las ao longe, ele soltou o ar que estava preso em seus pulmões e caminhou até a saída. Precisava conversar com sua avó.

- Essa sua relação com está impossível, ! Por favor, eu temo pelo dia em que ele lhe mandará para Zimmerman, e tenho certeza de que ele não será tão bonzinho com você quanto foi da última vez. – Eva disse, sentada em sua cadeira. estava sentada a sua frente, encarando as próprias mãos.
- Ele não tem o direito de me tratar daquela forma, eu não fui culpada! Eu não quis aquela guerra! – disse exaltada, erguendo a cabeça e olhando para a psiquiatra.
- Há muito mais, não há?
- O quê?
- , vocês parecem cão e gato... Estão se atacando sempre que podem e sempre que não podem também. não é uma pessoa má, e eu tenho certeza de que você também não. Continuarem se odiando, se jurando de morte por algo que aconteceu há quase sessenta anos, sendo que ele ao menos pensava em nascer ainda? Você o incomoda, . Você o deixa inquieto. Você o faz querer se matar por sequer pensar em te achar atraente...
E, no próximo segundo, a gargalhada de ecoou pelo ambiente, fazendo Eva rir também.
- Você é uma piada, Eva! – ainda rindo. – Céus! – balançou a cabeça, em negação.
- E você também o acha atraente... – disse, e, o sorriso que antes ocupava o rosto de , se desfez depressa. – Não se esqueça do que o próprio disse em minha apresentação... Eu sei ler as pessoas, ah, como sei! É o melhor que faço! – sorriu animada. – E eu vejo isso tão claramente... Principalmente da parte dele. Aliás, eu vejo até o que ele não vê ainda. Ou o que não quer aceitar ver. – deu os ombros.
- Você está errada, Eva. A única coisa que sinto por aquele homem é nojo, ódio, e pena.
- Pode sentir tudo isso sim, mas sei que ele também te atrai. Ora, . é um homem absurdamente encantador. – sorriu, vendo a outra ainda com a cara fechada. – Você amava seu noivo, não amava?
- Ainda o amo. – disse, sem pestanejar.
- E me deixe adivinhar... Ele foi o seu primeiro e único amor? Único garoto que você gostou na vida.
- Como você sabe? – franziu o cenho.
- Essa sua aversão a falar de outros homens... Primeiros amores são tão intensos...! – suspirou, nostálgica. – Quando somos novas, então?! – riu. – Se soubessem que ainda terão muitos amores tão fortes quanto, ou quem sabe até mais...
- Eu não acredito nisso. – deu os ombros.
- Ninguém acredita, até que aconteça consigo mesmo. Não te culpo. – sorriu, suspirando. – Acho que por hoje terminamos, né? Quer conversar sobre algo mais? – negou. – Certo, vou mandar lhe pegarem para que tome um bom banho, nada mais renovador, correto?
- Há controvérsias. – deu os ombros, se levantando. – O que pode ser mais renovador do que a Ironm4x, afinal? – disse em tom divertido e a outra riu, balançando a cabeça. não deixou de rir também.

À medida que o sol aparecia através das altas e cheias árvores fora e dentro do jardim do ministério, sorria fraco. O primeiro mês havia sido vencido, afinal.
Com muitos tropeços, discussões, e raiva, muita raiva, o mês havia passado. O mês que a garota achou que não chegaria com vida ou sanidade pelo menos até a segunda semana. Passando por cima de todos os seus conceitos e afins, as últimas duas semanas haviam sido até suportáveis. A dor dentro de si continuava ali, presente, durante todos os dias, mas dessa vez mais branda. Como se ela houvesse aceitado o inevitável.

- Pronta, ? Pronto, ?

Franz disse, cronometrando o pequeno relógio que tinha em mãos. e estavam parados, ambos prontos para correrem a pequena pista de corrida que havia sido construída no jardim. Desde o dia de treinamentos ao ar livre, a acompanha na corrida, no começo era forma de fazê-la competir com o rapaz, como se uma briga sem vozes. Ele admitia que era o mesmo. Entretanto, hoje, já nem sabiam mais porque continuavam correndo juntos. Talvez tivesse se tornado um hábito.
Os testes com a Ironm4x estavam a todo o vapor. Principalmente os físicos. havia conseguido ótimos resultados; sua respiração, disposição e velocidade já estavam quase como as de uma pessoa perfeitamente normal, aos vinte e um anos de idade. Agora, durante as corridas - além dos pulmões -, tinha o coração controlado sob um pequeno aparelho preso logo abaixo de seus seios, contabilizando cada batimento.
e assentiram e Franz deu sinal para que eles começassem. foi logo à frente e preferiu correr mais lentamente no início, para ultrapassá-lo logo na curva. Aumentando um pouco das passadas, como pensava, conseguiu ultrapassá-lo, deixando-o extremamente confuso; também aumentando as passadas. Alguns metros à frente e ambos estavam no mesmo patamar. Eles riram, já ofegantes e com uma pequena camada de suor pelo corpo.
Passaram pela segunda curva e aumentaram a corrida, já conseguiam ver Franz, Anette, Eva e Klaus, todos sorriam contentes com o resultado da evolução de seu projeto.
e chegaram juntos à linha de chegada e levaram as mãos aos próprios joelhos, descansando os corpos. Anette ergueu duas garrafas de água e ambos a pegaram, tomando grandes goles da mesma.

- Parece que a senhorinha aqui não corre tão mal, hein, ? – provocou, dando outro gole em sua garrafa d’água. Ele balançou a cabeça em negação, rindo.
- Suspendam as muletas! – retrucou, recebendo um “há-há-há” sarcástico dela.
- Vê-los interagindo é como se visse a quarta guerra mundial acontecer aqui, bem diante dos meus olhos, todos os dias! – Klaus gesticulou com as mãos, apontando para os dois. – Estados Unidos e Alemanha em forma humana. – deu os ombros, perplexo.
- Não vejo nenhum dos dois lados pedirem clemência! – Eva se pronunciou, entrando na brincadeira.
- É uma guerra perdida, sinto muito. – Anette disse, rindo.
E, diferentemente do todos pensaram, e riram. Riram alto. Até mesmos eles próprios se surpreenderam com a reação um do outro, fazendo com que rissem ainda mais. Quando a graça foi acabando, eles diminuíram o tom, terminando com sorrisos.
- É engraçado agora que estamos de fora...! – sorriu, balançando a cabeça.
- Isso me faz lembrar de que você está me devendo aquela conversinha, ! – Klaus disse, fingindo estar bravo. – Você sabe o quanto esse assunto me deixa curioso!
- Não esqueci, Klaus. – ela sorriu cordialmente. Há alguns dias havia prometido lhe contar sobre o tempo pré-guerra e o pós também, já que o havia vivido durante a segunda guerra; quando ainda nova. Ao terminar de falar, entretanto, franziu o cenho ao ouvir uma música ao longe. Uma música muito conhecida, por sinal. Seus olhos se encheram de lágrima na medida em que a melodia ia fazendo sentido em seus ouvidos.
- Onde é essa música?! – disse, já exaltado. – Quem deixou ouvirem música aqui? Isso é o Ministério governamental da Alemanha, cacete! – xingou, olhando em volta, procurando de onde o som, que agora estava mais alto, vinha.

deu alguns passos a frente, sentindo sua respiração ofegar e seu coração se acelerar de forma imensurável. Um filme veio à sua mente. O filme de sua vida veio à sua mente. A melodia de Jailhouse Rock era a melodia de sua vida, ou da época feliz dela. Seus olhos se fecharam instantaneamente e a imagem dos bailes em que ia com Adam e seus amigos apareceu em seus olhos, como se ela estivesse ali, observando tudo acontecendo à sua volta. O abraço caloroso de seu noivo enquanto dançavam. Os risos altos de Jane e Max, que sempre estavam no centro da pista.
Tudo estava passando como se ela estivesse alheia à situação. Era como se toda a sua vida até os vinte e um anos tivesse sido somente um filme. Ela não se sentia mais dali, ela não pertencia mais àquele cenário. Por mais animada que a música fosse, no momento era sombria. Como a trilha de um agoniante filme de terror. abriu os olhos, que já estavam totalmente marejados, e olhou em volta, vendo os olhares atentos sobre ela. Contudo, ao virar levemente a cabeça para o lado, encontrou Sophie. Sophie , avó de . Esposa do homem que arruinou a sua vida.

- Vó? – chamou, franzindo o cenho. Ela nunca tinha ido ao Ministério. – O que está fazendo aqui? – questionou, vendo-a com um celular nas mãos, aparelho este que já havia se calado. Era dali que vinha a música, afinal.
- Eu a tinha que ver com os meus próprios olhos. – sorriu, encarando , que a encarava com a mesma intensidade, mas sem o sorriso no rosto, obviamente. – E em pensar que eu só tinha cinco anos a mais que você quando tudo aconteceu... – balançou a cabeça, tirando os óculos. – É como uma viagem ao passado. – deu os ombros, incrédula.
- , leve-as para uma sala em que possam ficar mais confortáveis, sim? – olhou para Franz brevemente e assentiu, engolindo seco. Pela primeira vez na vida, não estava vendo a avó como sua heroína. Como a dona da razão.

estendeu um dos braços para a avó, que se apoiou nele, e fez um sinal com a cabeça para que também o seguisse. Ambas foram. olhava para cima, tentando fazer com que as lágrimas voltassem para os olhos.
Após alguns poucos minutos de caminhada e silêncio, abriu a porta de sua sala e puxou sua cadeira para que a avó pudesse se sentar. continuou em pé, com os braços cruzados, encarando a senhora. fazia o mesmo.

- É como se eu tivesse feito uma viagem ao passado. – a senhora repetiu, apoiada em sua bengala. manteve o olhar superior, encarando-a. – Como meu marido e meu filho teriam gostado de vê-la assim... Com o sucesso da Ironm4x! – ela riu, com os olhos marejados. – Você se tornou uma aberração num novo mundo... Morrer teria sido bem mais fácil, de fato. Imagine só acordar e descobrir que todos que conhecia morreram, e que você não conhece nada e nem ninguém deste novo século? Dessa nova cultura? Viver presa no Ministério do país que guerrilhou com o seu... – engoliu seco, sentindo os olhos encherem-se de lágrimas também. Contudo, seu olhar continuava firme, assim como o maxilar trincado. – Como é, ? Não vejo mais a sua marra de cinquenta e sete anos atrás! – a senhora tirou o óculos que usava, colocando-o na mesa à sua frente. O sorriso maldoso continuava em seu rosto. – Ora, achei que fosse me mandar fazer mais sexo para melhorar meu humor, assim como mandou meu marido. – deu os ombros, deixando o corpo relaxado na cadeia.
- Não acho que seria possível, senhora , já que o senhor não está mais a disposição. – fez uma careta, como se aquilo fosse uma pena. Sophie tirou o sorriso do rosto, trocando-o por uma carranca.
- Cuidado com o que diz para minha avó, ! – alertou, dando um passo a frente, com o dedo em riste.
- Ou o quê, ?! – virou-se para encará-lo, entretanto, assim que seus olhos encontraram os dele, ela não conseguiu sentir o ódio que estava habituada. Sentia raiva, muita raiva, mas ódio... Não. Já não conseguia mais. – Devo lhe lembrar do quanto sou importante para tudo isso... – sorriu convencida, erguendo uma das sobrancelhas.
- E então você finalmente nos deixaria em paz, acho um preço justo a se pagar. – começou, e o sorriso no rosto dela se desfez. – Além do mais, eu poderia fazer com que tudo parecesse um efeito colateral da máquina... – um sorriso de lado apareceu no canto de seus lábios, mas seus olhos não mostravam que aquilo que dizia era verdade. O que sentia, realmente.
- Então o faça, ! Como a sua avó mesma disse: morrer seria bem melhor. Eu já não tenho mais nada a perder... Faça esse favor para si mesmo, para mim também. – se aproximou dele, ficando a poucos centímetros de seu rosto. – Mande Zimmerman acabar comigo. – sussurrou, encarando seus olhos. Ele engoliu seco, dando um passo para trás e virando-se de costas.
- Você continua do mesmo jeito então. – Sophie disse e voltou a encará-la. – Parece que tudo continua, definitivamente, igual. Bom, pelo menos agora você não tem a companhia de seus amigos para querer se mostrar e se engrandecer. – o sorriso maldoso voltou a habitar o rosto da mulher. – Querido? – chamou, e a olhou, pensativo. – Você pode colocar este DVD, por favor? – sorriu carinhosa, buscando uma pequena embalagem na bolsa. O neto atendeu seu pedido prontamente, indo até ela e buscando o CD. franziu o cenho. – Tecnologia, . – a mulher zombou, vendo-a franzir o cenho enquanto encarava o notebook em cima da mesa. virou a tela para que ela pudesse assistir o conteúdo do DVD, mesmo que ele próprio não soubesse do que se tratava. – Achei que gostasse de matar a saudade de seus amigos.
(Deem play!)
a encarou brevemente, e voltou a atenção para a tela do computador ao ver a imagem preto e branco, mostrando Jane. A garota deu um passo para trás e levou a mão à boca, surpresa. Os olhos voltaram a se encher de lágrima, e dessa vez foi impossível segurá-las.
No pequeno filme, podia se ver Jane saindo de casa, ao lado da mãe, enquanto dezenas de fotógrafos e repórteres a enchiam de perguntas. A garota usava óculos escuros e vestia um vestido vermelho, do qual havia ganhado de .

“E sobre o paradeiro de ? Você realmente acha que ela está sob a posse dos alemães?”
A garota encarou o repórter e tirou os óculos, questionando o rapaz: “Isso irá passar na Alemanha?” o homem assentiu, e ela tirou os óculos, encarando a lente da câmera.


soluçou, era como se a amiga estivesse olhando-a.

“Se vocês estiverem com , pelo amor de Deus, eu imploro! A libertem. Ela é só uma garota que não soube medir as palavras que usara. Ela já teve culpa demais, mesmo sem ser a culpada de verdade por toda essa guerra que está acontecendo! Já dura seis meses...”

entreabriu os lábios, encarando Sophie, que sorria ao ver o sofrimento da outra.

“Nós não aguentamos mais. Nem eu, nem minha mãe, minhas irmãs, minha família, meus vizinhos... Ninguém quer mais isso!” – a garota fungou, com os olhos cheios de lágrimas. – “Yan, se você estiver vendo isso... Eu imploro. Imploro por toda a população, e que eu seja egoísta, mas imploro por mim... Por minha melhor amiga. Ela jamais quisera que tudo isso acontecesse. Eu, mais do que qualquer um, sei o quanto ela sofreu durante aquelas fatídicas semanas. só queria ter uma vida normal...” – a garota fechou os olhos por alguns segundos, respirando fundo.

Emy fez o mesmo, mas agora com a mão no peito, sentindo as fortes batidas de seu coração. a encarava com certa pena, com as sobrancelhas juntas. Entretanto, ao olhar para a avó, viu o sorriso que a senhora dava. Ele não deveria sentir pena, não é?

“Nos dê a chance de sermos felizes, Yan. Dê a chance voltar a ser feliz.” – a garota voltou a colocar os óculos e sorriu fraco para o repórter; logo após entrando em sua casa.
O DVD terminou, desligando a tela.
No entanto, quando iria tirá-lo, outra imagem apareceu na tela. Um telejornal.

“Acabamos de receber a notícia de que John , atual presidente dos Estados Unidos, está internado em estado gravíssimo no hospital Nacional de Nova Iorque. A Casa Branca foi bombardeada por canhões Alemães. Voltamos em breve com m...”

abaixou a tela do notebook depressa, enquanto via se desfalecer em sua frente, caindo de joelhos. Sophie lhe encarou atônita, como se o repreendesse por não ter deixado o DVD chegar até o fim.

- Chega, vó. – deu um passo à frente, com a intenção de levantar , mas não foi preciso, já que ela o fez sozinha, enquanto seus olhos transbordavam ódio. Emy deu um grito alto e correu até a mesa, puxando os cabelos de Sophie. arregalou os olhos e tentou tirá-la dali; sem resultados, contudo. – Largue-a, ! ! – chamou, sem sucesso.
A garota deu um tapa no rosto na senhora, que tentava a todo custo esconder-se, mas era impossível. contornou a mesa, ficando atrás da mesma e puxou pela cintura. A garota começou a chutá-lo, ao mesmo tempo em que gritava e chorava, desesperadamente. O rapaz buscou os braços dela e colocou-os para trás, segurando-os também.

- Você enlouqueceu, garota!? – Sophie questionou, incrédula, tentando arrumar os cabelos despenteados. – Céus!
- O que passou pela sua cabeça, ? – perguntou, virando-a para encará-lo. – Ela é uma senhora de idade!
- Eu também sou, não sou?! Não é o que você me diz todos os dias e todas as horas? Vá se foder você, a merda da sua avó, sua merda de família e toda a merda de Alemanha! – esbravejou, cuspindo as palavras.
- Mande a para Zimmerman, querido! Por no mínimo duas semanas! O que ela fez é imperdoável! Veja só como ela deixou o meu rosto! – apontou, incrédula. a olhou e viu a marca da mão de sob seu rosto. O rapaz fechou os olhos, apertando-os.
- O que eu fiz foi muito pouco comparado ao que eu queria de fato!
- Cala a boca, ! – gritou, fazendo-a se assustar. – Mas que merda, você não pode se manter calada por um só minuto? Que merda, que merda! – apertou o braço dela, fazendo-a gemer de dor. Ele a soltou e passou a mão pelos cabelos, nervoso. – Que merda, vó! – disse entre os dentes, enquanto socava a parede à sua frente. franziu o cenho, não entendendo aquela reação. Em sua cabeça, ele não pensaria uma só vez antes de mandá-la para Zimmerman. Sophie arrumou-se na cadeira, observando o neto. Reação totalmente, completamente, definitivamente contrária do que ela imaginara. – Volte para seu cômodo, . – disse, virando-se para encará-la novamente. Ele caminhou até a porta e chamou um dos homens que estavam no final do corredor. – Leve-a para seu cômodo, antes que eu me arrependa. – ordenou e o homem fez. o encarou, atônita. – O que foi, ? Quer visitar o Zimmerman? Eu posso providenciar isso. – ela balançou a cabeça, em negação. – Vá, . – suspirou, abrindo mais a porta para que ela passasse. Dessa vez ela o fez, sem ao menos olhar para trás.


Capítulo X


(Música do capítulo: A Moment Like This – Leona Lewis. Play quando eu avisar!)

- Você fez o quê?! – Peter arregalou os olhos, totalmente incrédulo. – Me admira você não estar morta num destes latões de lixo agora!
- Pouco me importa se estivesse, Peter. – deu os ombros, encarando a pequena janela em seu cômodo. – Se você tivesse assistido ao que eu vi... O sorriso maldito daquela mulher ao ver meu sofrimento! – fechou os olhos, apertando-os. – Maldita! – esbravejou, chutando a parede à sua frente. – Eu devia tê-la matado! – disse, entre os dentes. As lágrimas já voltavam a escorrer por seu rosto. Lágrimas de dor. Lágrimas de ódio.
- Você não sabe do que essa família é capaz, ...
- Ah, eu sei. Eu sei, sim. – sorriu amargurada, virando-se para encarar o amigo. – Eles são capazes de causar uma guerra mundial, Peter. No entanto, eles já fizeram tudo o que podiam contra mim, a única coisa que lhes resta é me matar... E sabe de uma coisa? Eu realmente não me importo mais. Na verdade, às vezes até torço para isso. – suspirou, desabafando tudo o que tinha no peito. – Só não entendo porque não acabou logo com isso!
- Somos dois. Se fosse o pai dele, a esta hora, sem dúvidas você estaria morta. Ele não pensaria sequer uma vez. Ou, pelo menos, tomado uma bela surra do Zimmerman.
encarou o horizonte por alguns segundos, e balançou a cabeça, voltando a encarar Peter.
- O que você sabe sobre , Peter?

xx


- Eu não consigo entender, . – Sophie questionou, enquanto apoiava os cotovelos sob a mesa, colocando o rosto apoiado nas costas das mãos. – Por que não mandou para Zimmerman, ao menos?
, que encarava a enorme janela à sua frente, se virou para a avó.
- Eu não posso, vó. Estamos em processo de estudos sobre a Ironm4x... Qualquer lesão física iria atrasar o processo. – disse, caminhando até a mesa e sentando-se à cadeira em frente a ela.
- Que atrasassem! – rolou os olhos, entediada. – Você não sentiu pena dela, sentiu?
- O quê? – o rapaz ergueu a cabeça depressa, atônito. – É óbvio que não, vó! – se exaltou, franzindo o cenho.
- Eu realmente espero que não, você sabe o quão mal ela nos fez... – explicou, desapoiando a cabeça das mãos para segurar a mão do neto. – Você sabe, ... – balançou a cabeça, em negação. – Olhe para mim, querido. – ele o fez, ainda mantendo o olhar firme. – Você não pode sequer sentir pena dela, está me entendendo? – acariciou a mão do mais novo, que fazia questão de encarar as mãos juntas. – Acredite em mim, ela nos fez mal... Não só para nós, mas como para o mundo inteiro!
- Eu posso ficar com os vídeos? – voltou a olhar para a avó, que franziu o cenho. – Quero analisar tudo... Não se preocupe, eu a odeio tanto quanto a senhora. – suspirou, tirando a mão que estava sob a da outra. – É o meu dever, afinal, não é? – sorriu sem humor, buscando o notebook em cima da mesa e retirando o DVD dali.
- Não só um dever como , mas como alemão. Como humano. – deu os ombros, levantando-se. – Tome cuidado, . – deu à volta a mesa, dando-lhe um beijo demorado na testa. – Eu te amo, meu neto.
- Eu também te amo, vovó. Mais do que tudo. – sorriu sincero, enquanto buscava a mão da mulher e a beijava delicadamente. – Vou levá-la até sua casa. – fez menção de se levantar, mas a senhora tocou em seu ombro, fazendo o parar.
- Fique aí, não se preocupe. Trabalhe direitinho. Orgulhe o seu pai! – sorriu, caminhando até a porta. – Até mais, querido.
- Até. – ele disse, acenando.

Quando a porta bateu, encarou o DVD em suas mãos e suspirou. Ao fechar os olhos, encontrou a imagem de . A qual jamais havia visto. Uma fraca, sofrida, desesperada. Os olhos dela ao ver e ouvir o que aquele DVD em suas mãos mostrava. Ele jamais esqueceria.
Ao abrir os olhos, entretanto, pôde perceber o quão marejado estavam. Ele podia sentir a sua dor. Ele queria... Abraçá-la. Ele sentia pena. Ele queria acolhê-la, e se negava a acreditar no que sua traiçoeira mente estava lhe mostrando.
Ela é sua pior inimiga, não é? Ela destruiu sua vida, de sua família, e de milhares de pessoas, não era?
Que se dane. No momento ele só precisava vê-la.
Após bufar alto numa discussão interna entre suas razões e sua emoção, se levantou depressa e saiu de seu escritório, seguindo em direção ao cômodo de . Ele não se permitia pensar no segundo, pois sabia que se o fizesse, daria meia volta. Ao passar por alguns soldados, que o olharam atento, ele finalmente chegou à pequena porta onde estava. Ele encarou o pedaço de ferro e engoliu seco, respirando fundo. “Abram” foi o que disse, referindo-se aos dois homens que estavam ao seu lado.

Quando a forte claridade alcançou seus olhos, os tapou depressa, no entanto, ao ver ali, parado, encarando-a, ela os descobriu. Seu maxilar trincou e ela se levantou depressa, com a respiração ofegante. Tudo bem, era agora. Ele havia vindo pessoalmente dar a sua sentença, era isso? Ele iria matá-la com as próprias mãos pelo que ela havia feito com sua querida e insuportável avó?
Porém, a feição dele não demonstrava ódio ou nada parecido, pela primeira vez desde que o conhecera. Então, se não fosse por aquele motivo, o que fazia ali, pessoalmente?
- Nós podemos conversar, ? – ele disse com a feição séria, diferentemente do sarcasmo que estava acostumado, e, pela primeira vez na vida, teve vontade de obedecê-lo, sem ao menos respondê-lo malcriadamente. Ao contrário disto, somente balançou a cabeça em afirmação, olhou de soslaio para Peter, que estava estático, e saiu, seguindo .

Todo o caminho foi em silêncio. Nenhum dos dois se atrevia a dizer uma só palavra ou sequer encarar um ao outro. Os passos eram apressados, pesados, tensos. sentia-se caminhando para a forca, e , mesmo que inconscientemente, também. Por razões diferentes, obviamente. tomou a frente e abriu a porta de seu escritório para que passasse, e ela o fez depressa, cruzando os braços e encarando a grande janela à sua frente.
fechou a porta atrás de si e colocou as mãos nos bolsos da calça, encarando a mulher em frente. O sol da tarde fazia com que sua silhueta reluzisse, e então ele pôde enxergá-la como jamais havia feito. Os cabelos, na altura dos ombros, estavam maltratados, mas ainda assim bonitos. A calça de moletom e a camiseta regata branca não era o traje mais atraente de todos, mas ali, naquela bendita mulher, parecia ter sido moldado.
Alguns minutos se passaram e ele nem sentiu, tanto foi que virou-se exaltada, com a falta de paciência estampada em sua feição. Como um estalo, balançou a cabeça, voltando a si. Voltando a enxergar quem estava ali.

Deem play!

- Eu peço para que seja rápido, por favor. Já sofri demais e... – disparou a falar, enquanto gesticulava com as mãos. franziu o cenho, erguendo uma das mãos, com sinal para que ela parasse. – O quê?!
- Não será rápido e nem lento, . Não te chamei para te matar. – colocou a mão novamente no bolso de sua calça, e foi a vez dela franzir o cenho. – Como você está?
- Oi?
- Não torne isso mais difícil do que já é, – deu a volta em sua mesa, sentando-se. - Aqueles vídeos... – disse, desviando o olhar do dela. – Eu acho que posso chamar Eva para conversar e...
- Qual é a piada dessa vez, ? – exigiu saber, enquanto mantinha o olhar firme, diferentemente de sua voz; que parecia mais fraca do que nunca.
- Piada nenhuma, . – a encarou, olhando em seus olhos.
- Devo acreditar então que por um milagre você virou bonzinho e quer saber como estou em relação a tudo? – riu sarcástica, enquanto continha as lágrimas que se formavam em seus olhos. – Eu não nasci ontem, pelo contrário...!
- Você é ridícula. – riu, também sarcástico. – Você é tão ridícula, ! – bateu suas mãos na mesa, com força, assustando-a. – Eu seria um monstro se aqueles vídeos não me tocassem ao menos um pouco...
- E você não é?! – desafiou, deixando uma lágrima rolar por seu rosto. Lágrima esta que foi seca rapidamente por sua mão.
- Você me acha um monstro? – riu, encarando suas próprias mãos.
- Você e todos os ! – esbravejou. – Ou você é cego o bastante para isso? Enxerga, ! Vocês são uns monstros. Eu os odeio! Odeio todos, e odeio você ainda mais! Odeio, odeio, odeio! Está me ouvindo? Eu. Te. Odeio! – disse, entre os dentes. A raiva já havia dominado sua voz e ações. As grossas lágrimas escorriam por seu rosto, acompanhado dos ofegos.
se levantou, caminhando até ela.
- Ah, é? Ótimo! Ótimo, . É ótimo saber que é recíproco o meu sentimento por você, querida . . ! O nome que sempre ouvi, e olha só, está bem a minha frente agora, dizendo que me odeia... – ele riu amargurado, jogando os papeis que estavam em cima de sua mesa; no chão. – E não, eu já não te odeio tanto pelo que fez no passado, por que, afinal, é passado! Mas por hoje... Por ontem, por um mês atrás. Por você ter acordado! Por ter que simplesmente olhar na sua cara todos os dias!
- Sabe que eu penso o mesmo?! – se aproximou da mesa, colocando suas mãos sobre a mesma. – Ter que te ver todos os dias, ouvir a sua voz, suas piadinhas infames, sua risada irritante... Ah, como eu odeio! Você é o pior dos . Podiam ter me acordado quando seu futuro filho comandasse isso tudo, não é? Seria menos desagradável, talvez!
- Você quer falar de risada irritante? – fingiu gargalhar, aproximando-se ainda mais dela. – A sua risada é a coisa mais absurda que já ouvi em toda a vida! E seu sorriso? Você devia manter essa sua maldita boca fechada, porque ele é... Ele é... – gaguejou, procurando o pior xingamento que podia encontrar em sua memória. Ele não encontrava, entretanto. – Não importa! Você me irrita!
- Tudo em você me irrita, . – fungou, brava. – Eu te odeio absurdamente. – sussurrou, encarando o rosto tão próximo do outro. – Odeio.
- Eu quero te beijar. – confessou, olhando os lábios dela. arregalou os olhos e deu um passo para trás. – Quer dizer, eu... Eu... – engoliu seco, balançando a cabeça.
- O quê? – disse, confusa.
- Eu também te odeio absurdamente, se é o que quer saber. – deu os ombros, arrumando a postura. – Pode voltar para o seu cômodo, acho que já terminamos o assunto.
Ela assentiu, ainda confusa, e começou a andar até a porta. No entanto, ao tocar na maçaneta, deu meia volta.
- Você queria saber como estava me sentindo ao assistir aqueles vídeos, não é? Pois então eu lhe digo, mesmo que já não esteja mais interessado: péssima é apelido. Abismo abaixo do inferno talvez seria mais apropriado. Eu não sei se você tem amigos, , mas caso tenha, deve entender o que é ter um. Existem amigos que valem mais do que irmãos, não é? Existem amigos pelos quais você daria a sua vida. Existem amigos que você ama mais do que qualquer coisa, e jamais será capaz de expressar o quão grande é o que sente por eles, não é? É isso que eu sinto pela Jane. Ela sempre foi minha melhor amiga, minha mãe, minha irmã, minha-qualquer-coisa-mais-importante-de-tudo. – ela fungou, deixando o choro voltar, agora com ainda mais força. – Vê-la dizer aquilo para os fotógrafos e repórteres que tanto odiávamos me doeu tanto... Tanto. – sua voz saiu como um fio, e ela soluçou. – Nós tínhamos planos, tínhamos promessas, tínhamos uma vida toda planejada pela frente! E eu realmente, de todo o coração, espero que ela tenha vivido tudo o que planejamos, mesmo que não tenhamos vivido isso lado a lado. – fechou os olhos, apertando-os. As lágrimas estavam fazendo com que ela não consegue enxergar mais nada além de borrões. – E que se danem os vídeos, eu quero te dizer como me sinto em relação a tudo, ! – gesticulou com as mãos, voltando a abrir os olhos. a encarava, atento. – Não é só sobre a minha melhor amiga, mas sobre tudo. Sobre meu melhor amigo e noivo de Jane, Max. Sobre minha quase mãe Louise, mãe de Peter, aquele que você mantém no mesmo cômodo que eu. Sobre meu noivo... – e seus olhos voltaram a se fechar. levou sua própria mão ao seu peito, sentindo os batimentos fortes e acelerados de seu coração. – Oh, meu noivo, . Meu noivo foi meu chão quando mais precisei. Eu o amava tanto... – e, ao dizer isso, seus olhos encontraram o do que estava à sua frente. Seu coração, que já parecia acelerado, tomou uma proporção ainda maior. Aquilo era ódio, não era? – E sobre o meu pai? Ele era o meu herói. John não era o presidente dos Estados Unidos para mim, ele só era... O meu pai. – sussurrou a última frase da frase, enquanto ofegava alto. – Vocês vivem dizendo que eu destruí tudo... Acabei com milhares de famílias, mudei o mundo. E, quer saber? Na verdade, eu só era uma garota como qualquer outra, que tinha um “cargo” – fez aspas com os dedos – a mais do que todas as outras. Quando me formei, continuei saindo com meus dois melhores amigos que eram um casal, e com o meu namorado, que conheci no colégio, como qualquer outra pessoa. Toda semana íamos ao lago, nadávamos, fazíamos piqueniques, ríamos, conversávamos... – um pequeno sorriso apareceu em seus lábios e sorriu também, inconscientemente. – No entanto, apareciam aqueles malditos fotógrafos e faziam com que saíssemos dali, estragando tudo! Mas não importava na verdade. Nos finais de semana íamos aos bailes, dançávamos por horas... E, ao voltar para casa, tinha de encontrar aqueles malditos fotógrafos e repórteres me perguntando sobre meu pai, planos de governo, minha vida pessoal, bombas nucleares e sabe-se lá mais o quê! Eu só queria “paz”. Dei uma resposta mal criada, como qualquer outra garota daria, e veja só onde vim parar? – ela fungou, respirando fundo. – Num minuto todos os meus planos e sonhos foram por água abaixo, minha vida terminou. – deu os ombros. – Então, se quer saber como estou, , lhe responderei: estou levando. Existindo por aí. A , a que ria de tudo e com todos, que vivia de sorrisos “irritantes” por todo o lado, a rebelde sem causa... Ela morreu. Morreu quando Yan apareceu na TV, naquela fatídica tarde de semana. “Em duas semanas iniciaremos esta nova batalha, que eu espero que termine da melhor forma possível. Mais vidas poupadas e... Que vença a melhor nação. Obrigado.” - fechou os olhos novamente, suspirou, e ao abri-los, encontrou estático. Ele não sabia o que dizer. – Voltarei para o meu cômodo, com licença. – disse, sem sarcasmo ou ironia. Sem ódio ou alegria. Sem sentimento algum. Ao bater a porta, acordou do transe, desabando o corpo em sua cadeira. Seus olhos piscaram rapidamente algumas vezes, e seu coração palpitou. Que merda estava acontecendo consigo?!

ergueu a manga de seu moletom, enquanto preparava a agulha para outro exame rotineiro. Já fazia dois dias desde a trágica e tubulada conversa no escritório de . Ambos só tinham se visto uma vez desde então, mas não chegaram a trocar mais do que duas ou três palavras.
Ao sentir a fina agulha atravessar sua pele, encarou o rosto do rapaz a sua frente, vendo-o também encará-la. As coisas estavam extremamente mudadas ali, mesmo sem uma sequer palavra, os dois se encaravam de modos diferentes.
“Eu quero te beijar.” Aquela maldita pequena frase não saía por um só minuto do pensamento de Emy, que teimava em ouvi-la a todo o tempo, como um vinil arranhado. Por que ele tinha dito isso? Eles se odiavam. Ela o odiava, e ele, principalmente, a odiava. Desejo era algo impossível naquela relação, para ambas as partes.
E, céus.
Ela queria se matar por sentir seu interior retorcer-se ao sentir o olhar dele sobre si.
A possibilidade era nula, totalmente nula. O único sentimento que os dois poderiam nutrir era ódio, puro e intenso. O exame chegou ao fim e virou-se de costas, enquanto tirava as luvas e lavava as mãos.

- Pode voltar para o seu quarto, . – ele virou-se novamente para encará-la. – Por hoje é só. – cruzou os braços, vendo-a não se mover. “Ódio, . Você a odeia.” – Precisa de algo?
- Conversar com Eva. – foi tudo que ela disse, sem quebrar contato com o olhar dele.
- Posso providenciar isso. – descruzou os braços, respirando fundo e caminhando até a porta. – Chame Eva. – ordenou a um dos homens que estavam na porta. – Até amanhã, . – suspirou, acenando com a cabeça. Antes que ela respondesse, ele saiu como um raio.

afundou-se contra a cadeira que estava sentada e encarou o teto acima de sua cabeça. Os olhos fecharam-se com força e seu pensamento tomou outro rumo, bem distante dali: Adam.
Por que ela não conseguia mais sentir todo aquele amor que sentia há dias? Por que seu coração já não palpitava tanto quanto antes? O amado havia tomado menos tempo em sua memória, nos últimos dias. Será que a máquina havia falhado também quanto a seus sentimentos? Sua memória? A idade a estava fazendo esquecê-lo? Seus olhos voltaram a se abrir e ela balançou a cabeça. Não fazia sentido.
havia tomado todo o tempo de seus pensamentos, mesmo que fosse para xingá-lo ou imaginar maneiras de matá-lo durante as vinte e quatro horas de seu dia. Ela riu fraco ao pensar nisto. Estava enlouquecendo. A confusão de sua cabeça e sentimentos estava a enlouquecendo, de fato.

- Soube que estava querendo conversar comigo! – Eva disse, entrando no pequeno consultório e fechando a porta atrás de si. Ela cruzou os braços, sorrindo simpática. a olhou de soslaio e voltou a encarar o teto, suspirando profundamente. – Acredito que para você me chamar o motivo não deva ser fraco... , . Eu quase posso adivinhar o que está passando em sua cabeça.
- Eu odeio tanto o , Eva. – bufou, arrumando-se na cadeira. – Juro, é uma coisa absurda! Eu só consigo pensar nele vinte e quatro horas por dia, xingamentos, palavrões, cenas imaginarias de tortura. – Eva riu e a encarou, confusa. – Estou falando sério. Ele me irrita extremamente! – e, como num click, seus olhos se encheram de lágrima. E ela nem soube o porquê. – Eva - a garota olhou para cima, tentando fazer com que as lágrimas voltassem aos olhos –, eu o odeio tanto que tenho medo que isso se transforme em outra coisa. – disse com a voz embargada e Eva se aproximou, colocando uma mão em seu ombro.
- Se está dizendo isso, é porque com certeza você sabe que isso está se transformando em outra coisa, não é? – sorriu sem mostrar os dentes, enquanto se abaixava na altura dela. – , não é o carrasco que aparenta ser e eu sei que você já percebeu isso... – a mulher voltou a ficar ereta, encostando-se ao balcão atrás de si. – O que você sente por Adam já não é tão mais forte?
- Eu ainda o amo, Eva. Eu sei que o amo! – gesticulou com as mãos. – Mas então eu me lembro de seu olhar... E, inconscientemente, é o olhar de que eu vejo. É o seu sorriso que eu vejo. – fechou os olhos por alguns segundos, respirando fundo. – Eu continuo o odiando, não me entenda mal. – voltou a abrir os olhos (marejados), e encarou-a intensamente. – Mas há algo... Há algo nele que me deixa confusa. Quando estou correndo ao seu lado, ou quando deixamos de nos atingir por alguns minutos e somente rimos como pessoas normais... – sorriu fraco, balançando a cabeça. – Seu jeito como defende a família e o país, mesmo que seja contra mim. Seu senso de humor, por mais podre que seja. E, claro, sua aparência. Ele me atrai. – confessou, desviando o olhar. Eva gargalhou, jogando a cabeça para trás ao ver a outra sem graça. – Se você soubesse o quão difícil é assumir isso... – bufou, cruzando os braços. – E, por favor, Eva! Eu não estou apaixonada e nem nada do tipo. Ele só me atrai. Assim como deve atraí-la também. – deu os ombros.
- Não queira passar a bola pra mim, mocinha! – ela riu. – Está tudo bem em admitir, . – sorriu amiga, suspirando logo após. – Eu sei que ainda não está apaixonada, dá pra perceber... Mas isso não quer dizer que isso seja pouco o suficiente para não ser enfrentado. Aliás, se fosse tão singelo assim, acho que você nem se daria o trabalho de me dizer, certo?
- É difícil. – suspirou. – Está tudo confuso pra mim. Há horas em que não sei se estou pensando nele por ódio, ou por simplesmente pensar. Lembrar. – se levantou, andando de um lado para o outro. – E se estou te falando isso, é porque quero ajuda. Você é a melhor psiquiatra do mundo, Eva! – Eva riu, negando. – É sim, nem vem. E é por isso que deve saber como consigo evitar que isso aumente... Ora, por favor, não estou num conto de fadas para viver um novo amor nessa fase da minha vida e nem nunca mais. Ainda mais com ! – virou-se bruscamente para a outra, que estava séria. – Há uma forma, não há? Qual é, estamos no século vinte e um! No segundo milênio.
- Eu acredito que nem no décimo seremos capazes de controlar algum sentimento, ... – suspirou, passando os dedos pelo balcão atrás de si, desenhando linhas imaginárias. – Mas, se quer saber, acho que está tão confuso quanto você.
- Por que acha isso?
- Esqueceu que consigo ler as pessoas? – sorriu, orgulhosa de si mesma. – E, acredite, para ele está sendo dezenas de vezes pior do que pra você. Você é a lenda que o atormentou por toda a vida. Ele cresceu, mesmo que inconscientemente, para vingar a família contra você. Já parou pra pensar?

xx


- Você vai acabar desprendendo esse saco de pancadas daí, . – James alertou, vendo o amigo socar repetidamente o saco de boxe da sala, na academia onde estavam. – ? – chamou, vendo que o outro continuava, agora ainda com mais força. – ! – gritou, indo até ele. parou, ofegante, enquanto segurava o objeto com as mãos, encostando a testa no mesmo. - Calma, velho! É só uma mulher. – gesticulou com as mãos, estendendo as duas palmas, com sinal para que o outro parasse.
- Não é só “uma mulher” – sussurrou, balançando a cabeça em negação. – Eu não posso me atrair por ela, você não entende! – bufou, virando-se para o amigo. – Eu tenho de odiá-la a ponto de a qualquer momento mandá-la para Zimmerman, para que ele acabe com ela. Nenhum afeto é permitido, James. Merda de testosterona que me faz querer correr atrás de qualquer uma! – chutou o saco de pancadas.
- Testosterona? – James riu, voltando a pegar seus pesos. – Tem certeza de que é só de hormônios que estamos falando, ?
- O que você tá insinuando? – questionou, cruzando os braços e erguendo uma das sobrancelhas.
- Insinuando? Eu? Nada! – sorriu, enquanto colocava os pesos no chão novamente. – Mas já pensou que pode ser mais do que algo físico? Qual é, velho, você não para de falar dela há mais de mês. isso, aquilo.
- Você não sabe o que tá falando. – riu irônico, dando os ombros. – Aliás, é impossível gostar dela. É impossível sentir algo por ela a não ser amargura... No máximo pena. Ela só é muito bonita, talvez pelo fato de ser de outra época... – abriu uma garrafa de água e tomou longos goles do liquido. – Eu só preciso transar. – estalou os dedos, colocando a garrafa de água no chão e pegando seu celular, que estava ao lado. – Vai ver como uma noite com a Kyara e estou curado! Duvida?
- Eu não tenho que duvidar de nada, cara. – James riu, tomando um pouco de água também. – Espero que esteja certo, se é o que tanto quer.

o encarou de soslaio e voltou a olhar a tela do celular por alguns segundos, tentando enganar a si mesmo. Ele sabia que James estava mais certo do que podia imaginar.

“Kyara, podemos nos ver hoje?”
“O que devo a sua ilustre presença em mensagem, ? Ha! Claro que podemos, senti sua falta.”
“No mesmo lugar de sempre, ok? Em uma hora estou lá.”
“Você é quem manda! Ha. Estarei lá. Beijos!”

Ele voltou a guardar o celular no bolso e encarou o amigo, que o olhava pensativo.
- Que é?! – disse, parecendo óbvio. O amigo riu, negando com a cabeça. – Enfim... - deu os ombros, irritado. – Vou ver a Kyara, você vai ficar?
- Vou. – sorriu desconfiado. – Ei, bonitão? – chamou, vendo o outro pegar suas coisas para sair. – Qualquer coisa, to aqui. – sorriu, ganhando um sorriso tímido do outro.

entrou em seu carro e ligou o som; precisava ouvir algo que não fosse seus pensamentos, por mais literária que a expressão parecesse. Um rock romântico qualquer começou e ele riu sozinho. Como o destino conseguia ser ainda mais sacana com ele. Batucando os dedos no volante, lembrou-se do DVD que sua avó lhe emprestara; com os vídeos de , e, com isso, não pensou duas vezes ao colocar o CD – que estava no porta-luvas – para assisti-lo. Ou ouvi-lo, já que não queria causar nenhum acidente no transito.
O farol ficou vermelho e ele acelerou as imagens do DVD, queria ver desde o início de tudo. Ou quase tudo, já que a imagem de dizendo a famosa frase já havia sido assistida por ele diversas vezes durante sua infância e adolescência.
Enquanto o DVD rodava pela pequena tela do carro, franziu o cenho.
“- A única coisa que quero dizer é que eu realmente sinto muito por tudo isso estar acontecendo. Sei que uma palavra não vai mudar a situação, mas eu gostaria de dizer: Perdão. Não, não a Yan . Tudo o que eu disse sobre ele foi sincero e eu diria outra vez, se não ocasionasse nessa maldita guerra. Eu peço perdão à população que terá de pagar por isso. E, bem, eu tenho esperanças que Adam volte vivo, assim como tenho esperanças que isso termine o mais breve possível, com o menor número de mortes possível.”
parecia tão frágil. Ainda mais frágil do que parecera quando a viu naquela maca, um dia após a surra de Zimermann. engoliu seco, observando o quão linda aquela garota-mulher era. Apesar dos traços de dor e angustia, ele conseguia enxergar o brilho e vida da juventude ali. Uma juventude bem vivida, segundo a mesma. Brilho este que ele jamais teve o (des)prazer de vê-lo pessoalmente, com os próprios olhos.
Uma buzina forte soou e só então se deu conta de que o sinal havia aberto, com isso, ele acelerou o carro. Passando só a ouvir o que o vídeo dizia.

“Há mais algo que queira dizer para Yan ?” – a repórter repetiu.
- Se tenho algo a dizer para o ? Não, eu acho que não. Tudo o que já foi dito, basta. Pra mim esse homem é um monstro e deve ter uma pedra no lugar do coração, assim como uma amiga disse. Eu espero que ele seja o primeiro a sofrer as consequências dessa guerra sem fundamentos. É só isso. – assentiu, passando pelos fotógrafos com a ajuda dos seguranças.”

Ah, sim. Aquela era a que conhecia. A que impunha uma fortaleza, por mais fraquejada que estivesse. A que erguia a cabeça diante de uma ameaça. Um ligeiro sorriso sombreou seus lábios e ele balançou a cabeça, ainda prestando atenção na estrada. A quem queria enganar? A si mesmo, só se fosse. Ele gostava daquela , querendo ou não. Gostava de sua frieza, por mais delicada que fosse com os outros. Gostava de sua garra, gritando aos quatro ventos e para quem quisesse ouvir, o quanto odeia todos ali. O quanto defende seu pai, sua família e país, mesmo estando no país que guerrilhou com o seu. Seu patriotismo era de se admirar, afinal. era inegavelmente uma garota que havia virado mulher em todo esse tempo, mesmo não estando ciente do que acontecia à sua volta. Ou então estava errado. Ela havia virado mulher dias antes de ser tranquilizada e colocada na Ironm4x. Sua inocência fora sido retirada quando viu Yan em seu televisor, naquela tarde, como a própria dissera.
O DVD avançara um pouco mais, passando despercebido pelos olhos de ; que o encarou ao ouvir uma risada – até então pouquíssimo conhecida por seus ouvidos.
O sinal voltou a ficar vermelho e ele parou o carro, voltando a encarar a pequena tela de TV em seu carro.
passava correndo dentre os repórteres e fotógrafos curiosos que não deixavam de lhe metralharem com perguntas e flashes por um só minuto. A risada da filha do presidente era totalmente audível, talvez até gargalhadas. Ela estava acompanhada de mais uma garota, que reconheceu sendo sua melhor amiga, e dois homens aparentemente de sua idade. Os seguranças da Casa Branca tentavam sem sucesso fazerem uma barreira contra os quatro.

“É verdade que a senhorita e Adam Evans irão se casar no inicio do próximo ano?”
“Os rumores sobre sua gravidez são verdadeiros?”
E dessa vez a garota não teve como evitar ainda mais as risadas. Ela parou por um minuto e virou-se para o repórter curioso.

“- Céus! De onde vocês tiram tanta bobagem? – ela sorriu, negando com a cabeça. – Vocês são tão criativos! – voltou a rir, olhando para suas mãos dadas com o sargento Evans. Olhou um pouco mais para frente e viu que não teria jeito de passar ali sem responder alguns repórteres. Eram muitos. – Tudo bem, eu falo! – disse, animada. A chuva de perguntas voltou a bombardeá-la, mas ela não tirava o sorriso engraçado do rosto por um só minuto.”


não deixou de sorrir ao ver a imagem única. Seu sorriso era contagiante, animado, divertido. Feliz. Perguntara-se se algum dia em sua vida fora tão feliz a ponto de sorrir daquela forma. No entanto sabia, nenhum sorriso em todo o mundo seria capaz de ser tão suave e transparente quanto aquele. Ele já a conhecia há quase dois meses e nunca a vira dar uma pequena porcentagem de um sorriso como aquele.
Seu coração deu um salto em seu peito e ele apertou o volante contra as mãos, encarando o sinal a sua frente – que estava prestes a abrir.
“O que você tem a dizer sobre as críticas que vêm recebendo sobre suas atitudes atualmente, ?”
“- Qual tem sido meu comportamento ultimamente, doçura? Me conte, eu não sei. – questionou a repórter, que engoliu seco.”
riu, balançando a cabeça. Voltou a acelerar o carro com um sorriso no rosto. Estava adorando conhecer essa nova . Ou a verdadeira .
“Como é o senhor Presidente como pai? Estamos todos curiosos para saber!”
“- O senhor Presidente é... – sorriu cativante, parecendo pensar. Levou o dedo indicador ao queixo, batucando-o ali. Jane, sua amiga, lhe gritou algo como “vai logo!” e ela gargalhou, jogando a cabeça para trás. – O senhor Presidente é o meu pai, moço. Ele é só... Um pai. – deu os ombros, vendo o namorado rir ao seu lado. Ela o encarou e riu também.”

observou a cena de soslaio. Ora, ora, eram um bonito casal. Ironizou ao pensar.
“- Um pai como o seu é, como o dela é. – apontou para os outros repórteres. – Ele só tem uma profissão única! – brincou, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. – Oh, por Deus! – arregalou os olhos e entreabriu os lábios.”
Ele voltou a encarar a tela por alguns segundos, enquanto entrava no estacionamento do motel.
“- Isso em seu bolso é uma foto do Elvis!? – questionou a uma repórter, que assentiu prontamente. – Eu amo o Elvis! – disse, extremamente animada.”
gargalhou dentro do carro, enquanto arrumava uma vaga para estacionar.
“- Querida, podemos ir? – Adam questionou, sorrindo carinhoso. sussurrou um “claro!” simpática.
“- Tenho que ir, pessoal. Como vocês viram, estava de boníssimo humor hoje, mas não vamos aproveitar, hein? – sorriu, voltando a caminhar. – Até mais! E vão atrás de Elizabeth, ela é bem mais interessante do que eu! – brincou, ouvindo a risada alta dos repórteres e fotógrafos.”


A filmagem terminou e desligou o DVD, voltando a colocar o CD em seu porta-luvas. Ele deslizou em seu banco, apoiando a cabeça atrás de si. Seus olhos se fecharam e ele levou as mãos aos cabelos, puxando-os ligeiramente.
Já não era tão fácil odiá-la como antes.

Ao chegar ao quarto andar, na suíte 5, encontrou Kyara já deitada na cama, com uma lingerie bordada na cor preta. A mulher lhe sorria maliciosamente, enquanto mordia o canto do lábio inferior. fechou a porta atrás de si e sorriu para a mulher.

- Por que demorou tanto? – ela disse, fazendo biquinho e andando sensualmente até ele.
- Eu levei o mesmo tempo de sempre para chegar aqui, Kyara...
- Não estou falando disso, bebê. – sorriu maliciosa, passando os dedos pelo maxilar trincado do homem. Depositou um suave beijo no local que tocou, enquanto descia a direção das mãos. – Por que demorou tanto a voltar a entrar em contato comigo?
- Estive ocupado durante todo o tempo. – deu os ombros, tocando nos braços dela.
- Mmm... – murmurou, ignorando-o. – Que tal algo mais rápido hoje, pra começar? – sussurrou, sensualmente. sorriu abertamente, totalmente entregue.

Com o passe livre, Kyara começou a descer os lábios pelo pescoço de , deixando rastros de seu batom vermelho por ali. Ora usava da língua, ora dos dentes para arranhar sua pele. Suas mãos – que já estavam baixas – tomaram o botão da calça do homem, desabotoando-o e descendo o zíper. A mulher se abaixou, ajoelhando-se no chão, olhando-o com total luxúria.
A respiração de começou a ficar ofegante e ele levou as mãos para o cabelo da mulher, afagando-os com força. Sua calça foi abaixada lentamente pela ruiva, que voltou a beijá-lo, mas agora em seu abdômen. Ele sorriu, fechando os olhos.
Kyara passou a mão por seu membro mesmo que por cima da cueca boxer, alisando-o. sentiu todos os pelos de seu corpo eriçar e sorriu ainda mais, sabendo o que veria a seguir. Ao sentir a boxer ser retirada por completo, chegando à altura de seus joelhos, ele abriu os olhos e encarou a mulher de joelhos à sua frente. Os olhos totalmente azuis lhe hipnotizaram, juntamente de suas hábeis mãos. Kyara aproximou os lábios de sua extremidade e o beijou longamente. Um baixo gemido escapou por seus lábios e seus olhos voltaram a se fechar, mas o sorriso sacana continuava ali. Quando sentiu a ruiva envolvê-lo por completo em sua boca, sua respiração faltou e já era quase impossível controlar suaves murmúrios de seus lábios.
A mulher acelerou a velocidade e o peito de se encheu, ofegando ainda mais. Aquilo era tudo o que precisava para esquecer . Nem mesmo seu sorriso encantador significava.
Ou não.
Kyara soltou um gemido entre as estocadas, aumentando cada vez mais os movimentos e apertou ainda mais as mãos em seus cabelos, forçando-a contra si. Ele murmurou gemidos, enquanto movia os quadris ainda mais na direção do rosto da ruiva. Porém, ao deixar de lado o filtro de suas perguntas e não saber mais o que dizia, acabou por gemer um nome. ...! Foi o que seus lábios disseram, inconscientemente.
E, no mesmo seguinte, a mulher parou.


Capítulo XI


(Música do capítulo: The World We Knew – Daughtry. Play quando eu avisar!)

Kyara continuou estática, de joelhos, sem mover um só musculo. a encarou incrédulo, esperando que ela continuasse.
- Que foi, porra?! – exclamou, irritado. Kyara trincou o maxilar, levantando-se do chão e encarando-o com puro ódio no olhar. Ele franziu o cenho, ainda extremamente bravo.
- Quem, cacetes, é ?! – sibilou, entre os dentes. deu um passo para trás, não entendendo o que ela falara. – Quem é essa vadia? Por que você estava pensando nela? Vá se foder, ! – virou as costas, indo até a cama e buscando sua bolsa.
continuava paralisado, ali, no meio do quarto, sem as calças e em ponto máximo. A cena seria hilária, se não fosse deprimente.
- Quem falou em ? Do que você está falando? Enlouqueceu?! – apontou para a cabeça, incrédulo com o que ela dissera. Incrédulo consigo mesmo. Incrédulo com como ela podia não terminar o que começara. E, porra, por que ela estava falando da ?! Como ela ouvira seus pensamentos? Ou não teriam ficado só em seu pensamento? fechou os olhos com força, apertando-os. Ele havia falado o nome dela. Sua ereção foi diminuindo e ele subiu a boxer e a calça, abotoando-a. – Desculpa, eu não sei por que falei isso. – deu os ombros, caminhando até a cama e sentando-se. Kyara já tirava a lingerie e colocava sua roupa. – Ora, não seja ridícula, Kyara. Você sabe que não é minha namorada e nem nada do tipo, qual o mal de eu sair com outras pessoas? E eu nem saio com a , foi sem querer. – encostou-se à cabeleira da cama, observando-a. Ela continuava em silêncio, porém visivelmente irritada. – Você deveria agradecer por eu estar explicando, já é muito! – disse, já sentindo o ultimo fio de paciência de seu corpo se esvair.
- Você disse o nome de outra mulher enquanto eu te dava prazer, ! Isso é humilhante. – gesticulou com as mãos, aumentando o tom de voz. – Estamos juntos há meses e não temos nada além de saídas casuais para sexo! Estou cansada. – bufou, rolando os olhos.
- Você quer mesmo “discutir a relação”? – fez as aspas no ar com os dedos. – Kyara, você é uma mulher... Adorável. – disse a primeira palavra que lhe veio em mente, sorrindo fraco. Ela realmente era adorável. – Mas eu não posso lhe dar mais do que isso. – cruzou os braços em frente de seu peito, vendo-a encostar-se ao móvel ao seu lado.
- Por que não?! – implorou, bufando como uma criança mimada.
E, de repente, não tinha o que falar. Não sabia o quê falar. Por que ele não gostava dela? Ela era linda, engraçada às vezes, adorável, e inegavelmente boa de cama.
Ele foi ao fundo de sua memória, no dia em que a conheceu. Kyara era roteirista do jornal onde ele havia dado entrevista, há alguns meses. Ela lhe pareceu encantadora à primeira-vista, e realmente era, mas com o tempo lhe vieram os defeitos, o jeito abusivo, frágil, mimado e irritante. Ela havia se tornado nada mais do que uma boa companhia casualmente. Mas ele podia ignorar aquilo certas vezes, não podia? E ela podia mudar, também. O que lhe faltava para que seu sentimento crescesse? Qualquer homem em sã consciência adoraria tê-la ao seu lado.
- Eu não sei. – foi sincero, enquanto dava os ombros. Kyara voltou a suspirar, balançando a cabeça.
voltou a sua cabeça inconscientemente e ele desviou o olhar, encarando suas próprias mãos, que agora estavam em seu colo.
Talvez, apenas talvez, ele poderia chegar a se apaixonar por ela algum dia, caso ela não fosse quem é. Oh, sim, ele podia.
- Você é complicado demais! – ergueu as duas mãos, rendendo-se. – Eu deveria desistir de você, . – caminhou até ele, lhe dando um beijo demorado na bochecha. – Mas há quem resista ao seu charme?! – sorriu sem mostrar os dentes. Ele fez o mesmo, olhando-a atenciosamente. – Não demore tanto a me ligar e terminamos o que comecei. Hoje estou puta demais pra isso. – assentiu. Era compreensível. Ela andou até a porta, virando-se logo após. – Se cuida. – piscou, saindo do quarto.

deixou o ar preso em seus pulmões sair, respirando aliviado novamente. Um sorriso sarcástico preencheu seus lábios enquanto ele encarava a porta fechada.
Fodido.
Bem fodido, para ser mais sincero consigo mesmo. Fodido era a palavra mais propícia para usar. Fodido, fodido, fodido.
Ele se levantou, pegando suas coisas e saiu do quarto, indo até a recepção e pagando pela hora. Ao entrar no carro, encarou o porta-luvas, onde o DVD com as imagens de estavam. O som de sua risada animada não saía de sua cabeça, e isso o fazia querer se jogar do primeiro precipício que visse à frente.
Ela era o fruto proibido, e talvez fosse justamente este o motivo pelo que ele tivesse começado a gostar dela. Tudo que é proibido é mais atrativo, afinal, não é? Quando sua mãe lhe diz que você não pode comer doce antes do jantar, você sente ainda mais vontade de comê-lo. Quando sua avó lhe diz que você não pode sequer se aproximar da mulher que arruinou sua família, país, e mundo, o que você faz? Você a quer.
Ele sacudiu a cabeça, já era um homem de vinte e quatro anos e paixõezinhas ou desejos enfreados já não podiam mais fazer parte de sua vida. Ele estava na altura de sua vida em que se pode escolher o que sentir, e por quem sentir.
E, contudo, sua consciência o fazia discordar de seu pensamento interior.
“O que os olhos não veem, o coração não sente.” O ditado estalou em sua cabeça como uma mágica. Era isso. Ele precisava ficar longe por alguns dias, uma semana no máximo. Conhecer novas pessoas, viver uma vida normal como um homem de vinte e quatro anos, que não tem em mãos a maior invenção do planeta e que carrega o fardo de ser neto de Yan .
Viajar para a praia seria uma boa ideia. Um mínimo sorriso apareceu em seu rosto e ele ligou o carro. Alguns dias esquecendo quem não deveria ser ao menos lembrada. Parecia certo.

xx


fechou os olhos ao sentir os pequenos choques percorrerem seu corpo através dos fios que estão ligados em seus pulsos, pescoço e tornozelos. Mais testes para a Ironm4x. Já faziam cerca de duas horas que ela estava ali e nem sinal de .
Onde ele estava, afinal? Em pouco mais de um mês de convivência todos os dias, ele jamais se atrasara. E se ousasse, Franz era capaz de sair do Ministério para ir atrás dele. No entanto, tudo parecia normal. Franz na cabine ao lado direito, junto de Anette. Eva na porta, observando-a. E Klaus em sua sala, como sempre. Eram raras as vezes que havia o visto.
- Terminamos, . – Franz sorriu, saindo da cabine. – Tudo maravilhosamente bem. – foi até a garota, tirando os fios de tensão de seus membros. – Por hoje é só, amanhã voltamos com os testes físicos, tudo bem? – assentiu, sentando-se devagar. – Tenha uma boa tarde. – sorriu simpático, voltando para trás da cabine.
quis rir, no entanto não o fez, obviamente. Como alguém poderia ter uma boa tarde se morasse num cubículo escuro, sem conforto algum?! Ela passou por Eva, que lhe deu uma piscadela despedindo-se. Emy somente sorriu, saindo pela porta e avistando Joshua no corredor.
- Como foram os testes hoje? – o rapaz questionou, cruzando os braços atrás do corpo, e sorrindo cordialmente.
- Como toda a semana. – deu os ombros, suspirando. – Prefiro os físicos, admito. – sorriu, ainda andando ao lado do rapaz, que riu. – Você tem filhos, Joshua?
- Tenho, sim! – exclamou, olhando-a surpreso. – Como sabe?
- Ouvi uma conversa sua, desculpe... – pareceu sem graça, e ele riu, dando os ombros. – Ele tem quantos anos?
- É uma menina, na verdade. Tem três anos e é o grande amor da minha vida, juntamente com a minha esposa. – sorriu orgulhoso, e o encarou, sorrindo também. – Aqui, eu tenho uma foto dela. – colocou a mão no bolso da frente de sua farda, retirando uma pequena foto, onde uma garotinha loira, extremamente branca e dos olhos azuis sorria, no colo de um rapaz... o conhecia, e quando estava prestes a dizer algo, Joshua a interrompeu. – Sim, é o . – riu, voltando a guardar a foto. – Ele é padrinho da minha filha. Por mais que não pareça aqui dentro, nós somos amigos. Mas, bem, você sabe... Amigos, amigos, trabalho à parte!
- Sua filha é linda! – sorriu sincera. – De verdade, e parece ser uma criança adorável! – riu, suspirando logo após. – não parece fazer o tipo que gosta de crianças. – deu os ombros, olhando-o de soslaio.
- Ah, mas aqui não parece mesmo... – gargalhou, abrindo uma porta no corredor para que eles a atravessassem. – é muito bacana, . É um homem como qualquer outro de vinte e quatro anos, quando está fora daqui. Sai com os amigos, tem uma conquista uma vez ou outra - corou, encarando seus pés se movimentarem –, alguma ressaca aos finais de semana, e sonha em formar uma família, mesmo não acreditando no tal “amor”. – balançou a cabeça, sorrindo fraco. – E ele é apaixonado por crianças! Minha filha quase o ama mais do que a mim mesmo. – brincou, parecendo enciumado e riu, pensativa. – Ah, eu tenho um vídeo no celular dele com ela, há algumas semanas! Você quer ver?
o olhou, incerta. Ela queria assistir, mesmo que seu cérebro dissesse o contrário, seu coração insistia.
- Vídeo no celular? Celular? – franziu o cenho, dando-se conta de que ao menos sabia do que se tratava.
- Oh, é claro! – deu alguns tapinhas na testa, rindo. – Celular é nada mais do que um telefone móvel, onde você pode usá-lo em qualquer lugar... Entendeu? – mostrou o celular que estava em seu bolso, e ela o segurou, um pouco surpresa. – E, bem, a tecnologia avança cada vez mais... Hoje podemos gravar vídeos com o celular, tirar fotos... É tudo muito fácil, . – explicou, parando de andar, vendo que já haviam chegado ao cômodo em que ela dormia.
- É fascinante. – sorriu inocente, observando o pequeno aparelho em sua mão. – Registrar um momento a qualquer hora. – suspirou, lembrando-se de seus amigos. – Incrível. – entregou o celular para Joshua. – E eu gostaria de ver o vídeo sim, você sabe - deu os ombros –, sua filha é adorável.
- Ela é a razão da minha vida. – assentiu, deslizando o dedo sobre a tela do celular. cruzou os braços atrás do corpo, admirando o quão grande era o amor do pai pela filha. O amor que jamais seria capaz de sentir, pois jamais seria capaz de ser mãe. Ela resfolegou, e voltou a olhar a tela do celular. – Olha só - virou o celular para ela – isso foi há umas semanas, foi visitá-la e levou uma boneca. – riu, e a mulher não resistiu, rindo também.

No vídeo, a pequena garota rasgava sem dó ou piedade a embalagem do presente; antes feita com tanto esmero. ria logo no canto, ajoelhado ao lado da afilhada.
sentiu o coração acelerar e cerrou as mãos. Jamais havia o visto tão receptivo, tão alegre. E, por Deus, aquela era a risada mais gostosa que já ouvira em toda a vida. Ela mordeu o lábio, voltando a prestar atenção no pequeno vídeo.
“- Uma neneca! – a garotinha disse, arregalando os olhos e abrindo a boca, surpresa.
- Gostou, minha linda? – questionou, abrindo os braços. Sem palavras, a pequena saiu correndo para abraçá-lo. Não havia resposta mais sincera. – Desse jeito vou trazer presentes todos os dias! – brincou, ouvindo a bronca da mulher que estava ao seu lado, em pé. Provavelmente a mãe da garota.
- Filha, filha – Joshua chamou, tendo a atenção da filha. – Manda um beijinho aqui! – passou a mão pela frente da câmera do celular. A menina correu e encostou os lábios em forma de biquinho na câmera, estalando um beijo. A risada dos adultos ecoou e o vídeo terminou.”

Joshua ria, enquanto continuava sorrindo encarando o celular com a imagem parada. Céus, ela sentia sua falta. Por que ele não havia ido hoje o Ministério?
A mulher piscou, rindo e voltando a encarar Joshua, que guardava o celular.
- Sua filha é inacreditavelmente linda, Joshua. Parabéns! – sorriu, passando as mãos nos cabelos; que já estavam um pouco maiores. – Você... – começou a falar. Ela não queria terminar. – Sabe por que não veio hoje? – disse rápido, sem graça.
- Obrigado! – agradeceu o elogio à filha. – Na verdade, não. Como disse antes, nossa relação aqui é totalmente profissional... – deu os ombros, abrindo a porta do cômodo. – Tenho que ir, . Até amanhã. – assentiu, despedindo-se. Ela fez o mesmo, sorrindo. A porta fechou atrás de si e ela deixou todo o fôlego que prendia sair devagar pela boca.
Seriam tempos difíceis a partir de agora.
Ainda mais.


Outro dia havia se iniciado, e, novos testes também. Tudo estava correndo normalmente, senão pelo fato de também não ter ido, como no dia anterior.
Como ela poderia sentir falta de alguém que só a insultava? Que a machucava? Que a zombava? não entendia. Talvez não se tratasse só disso.
Ela sabia que há dias as discussões já não eram mais tão grosseiras, às vezes até brincavam xingando um ao outro. Ou quando ele a defendeu de sua própria avó. Bom, não a defendeu, mas também não a mandou para Zimermann, como achou que aconteceria.
As provocações durante suas corridas ou exames feitos. Sua companhia todos os dias. Seu jeito prepotente. Egocêntrico. Persuasivo.
Céus, o que estava acontecendo com ela?

Outro dia.
Outro dia havia se passado, e, como os dois anteriores, não havia aparecido. Quando os testes do dia finalmente terminaram e ela estava para sair, tomou coragem para questionar Franz.

- Onde está ? – olhou-o de soslaio, com a mão na porta para sair.
- Oh, achei que você estava comemorando por não vê-lo todos os dias! – exclamou, rindo. Ela engoliu seco, encarando os próprios pés. – tirou algumas pequenas férias, acredito que não demore a voltar... Para sua tristeza? – perguntou, incerto. Ela bufou, fechando a porta atrás de si. Franz continuou observando a porta fechada, sorrindo confuso para si mesmo.

Uma semana e dois dias. Aquele era o tempo desde sequer pisava no Ministério. estava sentindo mais a sua falta do que deveria. Estava se importando mais do que deveria.
Os testes do dia estavam para começar e a garota estava num dos escritórios, observando a cadeira que ele costumava sentar, quando ainda se importava com aquele maldito Ministério. Com a merda de suas responsabilidades.
(Play. <3)
- Quer dizer que a margarida sentiu a minha falta?
ouviu a voz masculina atrás de si e no mesmo momento em que seu cérebro foi capaz de assimilá-la, um arrepio tomou conta de seu corpo. Sua boca secou e seu coração acelerou inconscientemente. Seus olhos prontamente fecharam-se ao mesmo tempo em que um mínimo sorriso surgiu no canto de seus lábios.
- Quem te iludiu dessa forma, ? – disse, voltando com a feição irônica de sempre. Ela se virou para ele, que estava com a pose imponente de todos os momentos, contudo, o sorriso comedido dele também estava ali. O sorriso que, mesmo que contra a vontade, estava começando a gostar.
- As notícias correm, ... – deu os ombros, inclinando a cabeça enquanto a olhava. – Você continua nova! – ironizou, fazendo-a rir sinceramente.
- E não é?! – exclamou, fingindo surpresa. – Parece que a tal máquina funciona mesmo, rapaz. – colocou as mãos na cintura, observando-o também. O silêncio tomou conta da pequena sala, mas não o silêncio incômodo de quando você está sozinho com alguém que não conhece. Mas sim, o silêncio de quando não se tem nada a falar com palavras, a não ser a troca de olhares e a carga de sentimentos que aquilo carrega. Quando as palavras não são suficientes, se resta o silêncio confortável. – Senti. – sussurrou, chamando a atenção do outro, que franziu o cenho.
- Como?
- Senti sua falta. – sorriu, rolando os olhos. – Ninguém aqui é capaz de me responder à altura quanto você. A quem vou xingar todos os dias, se não você? – riu, balançando a cabeça. Ela também riu, e, pela primeira vez ele pôde ouvi-la rindo. Vê-la rindo verdadeiramente, como no vídeo que assistira.
- Você tem razão. Discutir com ninguém é tão divertido quanto com você. – ergueu as palmas das mãos, rendendo-se. A outra continuou rindo, enquanto olhava para baixo.
- Estamos em uma Nova Era? – Franz disse, enquanto entrava na sala, assustando os dois. – e na mesma sala, sozinhos, e sem uma gota de sangue no chão ou vidros estourados pelos gritos? Deus, temos um progresso aqui! E, espere, eu ouvia risadas?! – cruzou os braços, sorrindo.
- Eu ouvi risadas! – Eva disse, sorrindo animada, enquanto passava pela porta. e se olharam e sorriram, balançando a cabeça. – Sem detalhes, não iremos causar atritos... Em time que está ganhando, não se mexe! – suspirou, rindo. – Como foi a pequena viagem, ? – o olhou de soslaio, curiosa.
- Viagens são sempre boas para esclarecerem ideias ainda não amadurecidas, certo? – colocou as mãos nos bolsos da calça.
- Claro! E pelo que percebi esclareceu todas. – piscou, sorrindo. – Ora, como dizem por aí, sou quase uma mutante que lê pensamentos! – abanou o ar com uma das mãos, fazendo todos rirem, com exceção de , que somente sorriu fraco.
- Bem, mas o que nos trouxe aqui foi uma grande novidade! Principalmente para você, . – Franz sorriu extremamente animado.
- Novidade? – a garota questionou, virando-se para encarar o mais velho.
- Isso mesmo! E até para você também, . – o rapaz assentiu, fechando a cara. Odiava surpresas. – Como sabemos, há pouco mais de dois meses iniciamos os testes com você sobre a Ironm4x... – ela assentiu, prestando atenção. – E como sabemos, o resultado é mais do que comprovado. Futuramente, queremos, sim, apresentar o projeto para o governo. Enfim, vou direto ao ponto. Acabamos nos cativando por você, garota. Com algumas exceções, é claro. – sorriu, olhando para . – E por isso decidimos...
- Decidimos? – questionou, já irritado. – Eu não fui comunicado de nada!
- Diga você, Eva. E depois conversamos, , somos maioria.
- Bem, querida... Primeiro: os testes chegaram ao fim. Provavelmente, não há mais nada que possamos fazer, Ironm4x é um sucesso incontestável. Talvez você tenha que voltar aqui em alguns meses para que refaçamos, mas...
- Voltar aqui? – ela sussurrou, com um fio de voz. Suas mãos já tremiam.
- Você está livre, querida. Tem uma nova chance de viver, por livre e espontânea vontade. Ir aonde quiser, viver onde desejar. Direito de ir e vir. Sua carta de alforria.
sentiu os olhos piscarem constantes vezes, com a intenção de saber que aquilo não era um sonho. As lágrimas já escorriam por sua face, molhando-a por inteiro. As mãos foram ao rosto, segurando-o. O choro já tomava conta da pequena sala, que parecia tão mais cômoda agora.
- Ela não vai.


Capítulo XII


Ao ouvir a voz dura e firme de , ela tirou as mãos do rosto, encarando-o. Aquele era o , de fato. O homem que havia conhecido naquele tórrido dia, quando acordou da Ironm4x, há dois meses. O rapaz frio, calculista, cheio de si e sem piedade de quem quer que fosse. balançou a cabeça em negação, no entanto não conseguia sibilar uma só palavra.
- , já está decidido. Vamos deixa-la na cidade para que isso não tome proporções maiores, sem conhecimento da mídia ou outros veículos. Mas não há mais nada que possamos fazer. Eu mais do que ninguém sei o quanto sua permanência nesse Ministério seria importante, mas seu pai, infelizmente, não está mais aqui para ditar o ódio pela garota. O passado não...
- Meu pai não está, mas eu estou. – disse a Franz, com a postura firme. – Caso me lembre, eu sou o herdeiro de tudo isso, inclusive da Ironm4x, e faz parte do Ministério, e, principalmente, da Ironm4x, então tenho autoridade sobre.
- Eu não sou um objeto! – sussurrou, desesperada. engoliu em seco, desviando o olhar do dela. – , por favor! Eu juro que você jamais voltará... ouvir falar sobre mim. – disse, parecendo em dúvida. Seu coração apertou, e ela não soube se pela frustração ou... Ou por de alguma forma não aceitar o que falara.
- Você é minha responsabilidade agora, . – encarou a parede à sua frente, ouvindo os suspiros aflitos dela. – E além do mais, só são dois meses de testes. Eu preciso de exames mais detalhados, talvez a máquina não tenha sido capaz de imunizar seu útero, lembra? Quem sabe os outros órgãos... – virou-se para ela, que estava com a cabeça baixa, chorando silenciosamente. Ele cerrou as próprias mãos, apertando-as.
- Isso já não estava resolvido, ? – Franz questionou, desconfiado.
- Hm, aparentemente, não. – Eva disse, negando com a cabeça. – Havia me esquecido completamente disso! comentou comigo pouco antes de viajar, Franz. Sinto muito por ter esquecido, a culpa é toda minha. – deu os ombros, bufando. – Queremos o seu bem, querida. – olhou para , que agora a olhava. – E é justamente por gostarmos de você, que queremos que saia daqui bem, assim como quando foi colocada naquela máquina. – foi até a garota, buscando suas mãos.
franziu o cenho, olhando para o chão. Não tinha dito nada para a psiquiatra.
- Não é só por isso, é por aquela maldita vingança! – esbravejou, olhando para , que a encarou, incrédulo.
- E se for, ? Eu tenho todo o direito, não tenho? Sempre foi assim. Você agiu de forma inconsequente, e isso teve consequências. Imensuráveis consequências! Estou aqui para cobrar. – a enfrentou, dando um passo para frente.
- Você só se importa consigo mesmo! É egoísta. Eu sou um peso morto aqui!
- Não finja que não sabe de nada, garota. Você sabe muito bem porque está aqui! Eu devia mesmo mandá-la embora, sem nenhuma casa para morar, alguém que conheça, ou algo que a mantenha viva lá fora. Você morreria em dois tempos nesse mundo, !
- Pelo menos eu morreria longe de você, seria muito mais digno!
- E voltamos à estaca zero... – Franz suspirou, cansado.
- , vamos conversar. – Eva pediu, apontando para a porta.
- Pra quê? Eu não quero conversar! Isso foi como se vocês tivessem oferecido um banquete para um mendigo que não come há dias e logo depois tirado, quando ele estava com o garfo na mão!
- Querida, mantenha a calma. Venha. – disse, com toda a calma do mundo. caminhou até a porta, mesmo contrariada. – E... – ela parou ao olhar , que encarava os punhos vermelhos; anteriormente apertados com tamanha força. – Pensando melhor, eu quero conversar com você antes, . – ele ergueu o rosto, confuso. – Franz, você pode levar até seu quarto? – Franz assentiu, indo até e abrindo a porta para que a garota passasse. Ela o fez.
- O que você quer? – perguntou, irritado.
- Eu achei que você fosse homem o suficiente para enfrentar isso, . – cruzou os braços, apoiando-se na mesa. Ele franziu o cenho, olhando-a. – Enfrentar a sua avó, seu país... E a si mesmo. O que você acabou de fazer aqui foi ridículo! E eu ainda ajudei porque sou uma boba, mas saiba que foi ridículo. Coisa de moleque. – o outro trincou o maxilar, desviando o olhar. – Você não a deixou ir por estar “preocupado” com como o útero dela está! Ou por uma vingança de algo que aconteceu há quase sessenta anos. Eu tive vontade de rir! – sorriu irônica, balançando a cabeça. – Ó, a vingança dos ...! Isso não é uma série de TV, . É a vida real. – sorriu, sem mostrar os dentes. Mas dessa vez, sinceramente. – Você não a deixou ir porque quer tê-la sob seus olhos a todos os momentos. Porque não a quer longe.
- O quê?! É claro que não! Enlouqueceu?
- Ah, não? Então o quê?! Seja homem o suficiente e assuma que gosta dela, ! Que não a odeia como deveria, segundo sua avó. O que foi aquela cena de quando entramos aqui? O jeito de como se olhavam... Deus! – riu, balançando a cabeça e olhando para cima. – Eu não sei se sou uma bruxa como dizem por aí mesmo para enxergar o que há dentro de vocês mais do que vocês próprios ou...
- Vocês? – ergueu o olhar, curioso. A mulher riu, assentindo.
- Parece que você já enxergou. – sorrindo, caminhando até ele e colocando uma das mãos em seu ombro. – , essa viagem foi com a intenção de tirá-la dos pensamentos, não foi? – ele fechou os olhos, suspirando cansado. – E, deixe-me adivinhar, a falta dela só o fez ter mais certeza do que está sentindo bem aqui. – desceu a mão que estava no ombro dele, para seu peito, simulando tocar em seu coração.
- Não estou sentindo nada aqui, Eva. O coração é um órgão muscular como qualquer outro, mas é usado como símbolo do amor por bombear sangue para todo o corpo, é o que nos deixa vivo... É um modo bonito de figurá-lo. O amor está no cérebro, é um sentimento, só.
- Só? – sorriu, negando com a cabeça. – Sem conversa de médico cético, . – deu alguns tapinhas em seu peito, voltando a se afastar. – O que você pretende fazer sobre isso?
- Sobre o quê?
- Não se faça de desentendido! Sobre estar se apaixonando por . – foi até a janela, encarando o jardim. Ao ouvir a incredulidade de , ela riu baixinho, vendo os jardineiros apararem a grama.
- Eu não estou me apaixonando por ela! – praticamente gritou, vendo a psicóloga voltar a encará-lo. – Eu... Eu só não mais a odeio. Certas vezes. Às vezes a odeio de novo. – bufou, encostando-se a sua mesa e desviando o olhar da mais velha.
- Está doendo guardar tudo isso aí dentro, não está? – questionou, séria. Ele encarou os pés, suspirando pesadamente. – Assumir para si mesmo é extremamente difícil, não é? – sorriu sem humor, indo até ele e apoiando-se na mesa também, ao seu lado. – “Oh, Deus. Eu estou gostando da última mulher que poderia gostar... Minha avó me odiaria se somente sonhasse com isso. Eu mesmo me odiaria se assumisse isso para mim. Mas está tão difícil me tapear. Me vigiar. Me controlar. Me policiar.” – terminou, e ao olhar para o lado, viu com os olhos arregalados, com as sobrancelhas juntas, encarando-a atônito. Como se ela acabasse de revelar o seu maior segredo. Não deixava de ser, entretanto. – Não olhe para mim dessa forma, Nick. - riu, balançando a cabeça. – Eu só entendo de pessoas. Entendo como ninguém. – deu os ombros, observando-o. – É isso, não é?
- Eu me sinto um traidor. – sussurrou, como se confessasse seu pior pecado. – Estou traindo minha avó, meu pai, minha família, meu país... – engoliu seco, fechando os olhos brevemente.
- Você não está os traindo, .
- É claro que estou! – ergueu as mãos, incrédulo consigo mesmo. Ele se desencostou da mesa e começou a andar de um lado para o outro. – Meu avô trabalhou duro com essa máquina, meu pai também... Eles deixaram a responsabilidade para mim. Cresci ouvindo e assistindo coisas sobre e o quão mau ela era. – parou de andar, olhando a janela à sua frente. O céu estava extremamente azul e ele suspirou. – De repente, ela acorda e eu estrago tudo. Começo a gostar dela, indo contra todos os meus princípios. – levou as mãos para os quadris, virando-se para Eva novamente. – Seu jeito me encantou. Ela não é má como a bruxa que disseram que era quando contavam para mim, ainda criança. Ela só é uma garota mulher que perdeu tudo que tinha. É a pessoa mais forte que eu já conheci em toda a vida. – disse, com a voz trêmula. Seus olhos marejaram e ele olhou para cima, tentando fazer com que as lágrimas voltassem. Não era só por se referir a ela que sentia vontade de chorar. Mas por estar indo contra si mesmo. Estar passando por cima, pela primeira vez na vida, do que considerava certo. Do que era certo, principalmente para sua família. Ele estava fraquejando, em todos os aspectos. – O modo como ela luta por sua palavra e por seu país, todos os dias, aqui. Ela não teme morrer, não teme a mim. Você se lembra de quando a levamos para o jardim pela primeira vez?! – Eva assentiu, sorrindo carinhosamente. – Acho que foi ali. Foi ali que começou a se tornar mais difícil odiá-la. A garota se emocionou ao poder ver o sol de novo! – riu sarcástico, olhando brevemente para a janela novamente. – Quanto mais eu tentei odiá-la, mais parecia ter o efeito contrário. Eva, ela é a pessoa mais atrevida, relutante e insuportável de todo o mundo! E, mesmo assim, eu não consigo. Talvez essas coisas sejam um dos motivos pelos quais eu goste dela. – sorriu, bufando logo após. Ele colocou o rosto entre as mãos, nervoso. – É ridículo. Ridículo! Isso nunca vai acontecer. – descobriu o rosto, voltando a encarar Eva, que estava com o queixo apoiado na palma da mão, parecendo encantada. – Tudo bem, Eva. Eu assumo. Eu gosto de , gosto muito. Mais do que deveria, inclusive.
- E o que você pretende fazer sobre isso?
- Eu não sei. Eu sinto raiva, sinto tanta raiva! De mim, por não ter conseguido controlar isso. Dela, por ser daquele jeito. Da minha avó, por ter tanta amargura. Do meu avô, por ter começado aquilo em 57. Do destino, por ter cruzado os nossos! – respirou fundo, balançando a cabeça. – Já chega. Eu já falei demais.
- Você está se sentindo melhor agora?
- Foi libertador. – sorriu fraco. – E eu me sinto mais perdido do que nunca. – resfolegou, sentindo o coração apertado. – Você pode conversar com ela? Não quero que ela me odeie ainda mais por não a ter deixado ir. – deu os ombros, coçando a nuca. – Por favor.
- Não se preocupe com isso. Meu poder de persuasão é melhor do que de qualquer um. – piscou, indo até ele e lhe dando um beijo no rosto. – Fique bem. – ele assentiu, sorrindo sem mostrar os dentes.
- Obrigado. – agradeceu sinceramente e a psiquiatra abanou o ar, como se dissesse que não tinha por que agradecer. A mulher saiu e ele soltou todo o ar preso em seus pulmões pela boca, de uma só vez. Fodido, como sempre.

O dia correu e continuava em sua sala. Só parara de pensar no começo da manhã quando pediu seu almoço e quando parou para ver uma série qualquer, tentando distrair-se. Em vão, como de costume. Ele precisava conversar com , vê-la. Deus, como ele queria vê-la.
Passando por cima de seu orgulho próprio novamente, ele pediu para que um de seus empregados a chamasse. Perder para si mesmo já estava virando rotina, afinal. Embora sua cabeça o implorasse para que ele desse um basta naquela loucura, seu coração o impedia. Sua alma o impedia, e nada era mais forte do que aquilo.
Duas batidas na porta e ele se arrumou em sua poltrona, dizendo um audível “pode entrar”. Brandon trouxe , que estava com a carranca de sempre. respirou fundo, apoiando os antebraços na mesa.

- Pode sair, Brandon. Obrigado. – olhou para o empregado, que assentiu e saiu. – Sente-se.
- Estou bem aqui. – respondeu, cruzando os braços e desviando o olhar do dele.
- É uma ordem. – disse, sério. Ela bufou, rolando os olhos, e sentou-se. – Obrigado. – pigarreou, concentrando-se. – Espero que tenha entendido o motivo pelo qual eu não ter concordado com sua saí...
- Desde quando você se preocupa com o meu bem-estar, ?! – exclamou, apoiando suas mãos na mesa, encarando-o.
- Não é sobre o seu bem-estar, . – rolou os olhos, já ficando sem paciência. – Precisamos de mais tempo com você, e depois, talvez, somente talvez, eu possa pensar em lhe deixar em qualquer esquina, por aí. – deu os ombros.
- Era só isso? – suspirou, encarando suas mãos. Nick apoiou as costas em sua cadeira, observando-a. – O que é?! – irritou-se com o silêncio do rapaz. – Argh! Você voltou dessa tal viagem ainda mais insuportável e mesquinho, . – bateu as mãos na mesa, vendo-o sorrir. – Não vai me responder? Certo. Pode ficar mais uma semana fora, irá fazer um favor a mim.
- Não foi tão difícil assim, uh? – apoiou o queixo na mão, vendo-a incrédula. – Ficar sem mim... – brincou e ela riu, balançando a cabeça. – Estou brincando. – riu também. – Você conhece Suspicious Mind?
- É alguma música? Acho que a resposta é óbvia...
- Ou não. É do seu querido ídolo Elvis Presley. – ela arregalou os olhos, interessada. – Certo, acho que a música deve ter sido lançada algum tempo depois de 57. Foi o segundo maior sucesso dele depois de Jailhouse Rock.
- Oh, meu Deus. – ela sussurrou, parecendo mais animada do que deveria. – Eu posso ouvi-la?! – sorriu, apontando para o notebook que estava ao lado. Sabia que aquele pequeno aparelho podia fazer com que ela ouvisse a tal musica, mesmo não o conhecendo. Fora ali que o maldito vídeo de Jane havia sido colocado. – E, espere, como você sabe que eu amava o Elvis?
- Eu sei mais sobre você do que você imagina. – disse, misterioso. Ela franziu o cenho, curiosa. – E sim, você pode. Achei que seria justo que você ouvisse, afinal... Seu aniversário está chegando. – a garota entreabriu os lábios, surpresa. Não fazia ideia de datas. – Enfim... - deu os ombros, pegando o notebook ao seu lado e ligando-o. A música já estava salva. Ele apertou o play e a melodia começou.

encarou a tela do notebook, que tinha nada mais que uma foto com os dizeres “Elvis” e sorriu com as primeiras notas. Era romântica, porém não triste. Uma ótima música para dançar com alguém num baile. Seu pé começou a batucar no chão e ela sorriu ainda mais, sentindo os olhos encherem-se de lágrima. Ouvir a voz do ídolo, depois de tanto tempo, era libertador. Ela olhou para , que a observava. Seu rosto corou e ela riu, balançando a cabeça enquanto olhava para baixo. Deus, estava acontecendo de novo. Seu coração estava acelerando, e não era em Adam que ela estava pensando. O sorriso diminuiu em seu rosto enquanto ela analisava sem pudor o homem à sua frente. Por que ele tinha de ser tão atraente? E sorrindo conseguia ficar ainda mais. A música ficou mais longe de repente, como se fosse uma trilha sonora para a cena, e a única coisa que ela passou a prestar atenção foi em , que continuava encarando-a, agora ainda mais intensamente. Seus olhos eram misteriosos, como se escondessem algo atrás das pupilas. O brilho intenso a hipnotizava. Os lábios do homem se fecharam, chamando a atenção do olhar de , que os observou, e, céus, eram tão beijáveis! Seu pensamento a fez rir e ela voltou à atmosfera. A música estava se aproximando do final quando ela encarou por inteiro, amplamente. Sua boca secou ao lembrar-se da frase dita há dias: “eu quero te beijar”. Ela também queria. Se no momento pudesse escolher qualquer coisa no mundo, qualquer coisa mesmo, mesmo que fosse sair dali, ela escolheria beijá-lo. Sentia-se péssima por isso. Afinal, seria como uma traição ao noivo, mas no momento, ela não queria mais nada a não ser tocar naquele homem.
A música chegou ao fim e ela voltou à realidade, suspirando e fechando os olhos.

- Te atrai?
- Como?! – questionou, com os olhos levemente arregalados.
- A música, ela te atrai? – sorriu, fechando a tela do notebook.
- Oh, sim! – suspirou aliviada, rindo logo após. – É maravilhosa. Não pode se esperar o contrário quando se trata de Elvis. – deu os ombros, arrumando-se em sua cadeira.
- Ele foi um grande músico, de fato. – respirou fundo.
O silêncio predominou no local, o único barulho que podia se ouvir ali era o som de suas respirações fracas. Ambos não sabiam o que falar. O coração dos dois estava acelerado, um sentindo a presença do outro... Era difícil. Era novo. Era tão confuso.
- Por que você viajou?! – exclamou de repente, parecendo ansiosa. Ele olhou-a confuso, franzindo o cenho. – Ninguém tira férias do nada! Você simplesmente sumiu. – bufou, parecendo irritada. Por que ela estava dizendo aquilo, afinal? Seu interior se retorcia. – Isso tudo é seu, e você tem responsabilidades. – gesticulou com as mãos, vendo-o conter um riso. Ela rolou os olhos, encostando as costas na cadeira, mais confortavelmente.
- Eu precisava pensar... Espairecer. – deu os ombros, brincando com uma espécie de cubo mágico que pegou em sua mesa.
- E você não pode pensar enquanto está sentado aqui? – rodeou o ar com seu dedo inferior, simbolizando o espaço de sua sala. Ela fechou os olhos logo após, balançando a cabeça. Aquilo era ridículo. – Esqueça.
- Certas vezes estar sozinho é a nossa melhor companhia, . – disse, levantando-se de sua mesa e dando a volta na mesma, parando ao lado onde a garota estava. Ele apoiou sua própria mão em seu joelho. – Você não pensa ass...
- Você é noivo? – disse depressa, interrompendo-o. Ele franziu o cenho, olhando na direção em que ela olhava; para sua mão, onde havia uma aliança. Ela tocou em sua mão. – Céus, você irá se casar? – exclamou, com o tom de voz mais alto. Era quase como se ela estivesse gritando.
- Não! – balançou a cabeça, parecendo tão assustado quanto ela. Ele riu em seguida, entretanto. – Por Deus, é claro que não! – sorriu, vendo-a olhar em seus olhos. – Eu sempre usei essa aliança, você nunca reparou? – ela negou, engolindo seco. – Todos os usam, ganhamos ao completar dezesseis anos, ou ao entrar na faculdade. – deu os ombros, virando a palma da mão que tocava, entrelaçando-a na dela.
resfolegou ao ver suas mãos juntas, e novamente o silencio tomou conta. Eles jamais haviam se tocado de tal forma. procurou o olhar dela, que estava perdido, e quando o encontrou, sentiu o coração acelerar ainda mais. Ela também sentiu, e isso a preocupou absurdamente. Tudo estava acontecendo rápido demais, mais rápido do que ela podia prever. Nick passou o polegar sobre as costas de sua mão e ela fechou os olhos, sentindo um arrepio tomar conta de seu corpo, da cabeça aos pés.
Aquele arrepio.
O arrepio que sentia ao beijar Adam. O arrepio que a fazia ter certeza da paixão que sentia pelo ex-noivo. Ela agora sentia pelo simples toque de em sua pele.
Quando abriu os olhos devagar, encontrou os olhos misteriosos de sobre os seus, como se quisessem dizer algo. Ela não entendia, contudo. Seus olhos também tinham uma nuvem de dúvida, ela sabia. Ambos estavam confusos, precisando de respostas. Respostas que nenhum dos dois conseguia dar. Eles nem sabiam quais eram as perguntas a serem esclarecidas, afinal.
- ... – começou, e então ela caiu em si. A garota puxou sua mão depressa, levantando-se.
- Não. – disse, sem ao menos fazer ideia do que ele iria dizer. – Não! – repetiu, mas com mais firmeza dessa vez. Talvez ela não estivesse respondendo-o, mas sim, afirmando para si mesma. Não. Ela não podia deixar aquilo acontecer.
Ao ver que ele iria falar mais algo, a mulher correu até a porta, abrindo-a rapidamente e saindo por ela com passos apressados, quase como uma corrida. fechou os olhos com força, enquanto socava a mesa em que estava apoiado. Aquilo estava passando dos limites.

correu o mais rápido que pôde até seu quarto, sem sequer esperar por Brandon. Ela só precisava ficar o mais longe possível de . Agora, ainda mais do que quando o conheceu e o odiava mortalmente. Ao chegar à porta de seu quarto, pediu para que o soldado que estava ali, a abrisse e ele o fez, prontamente. Quando entrou, sentiu-se protegida. Se há dois meses aquele espaço a fazia ter arrepios, hoje era como se daquela porta para dentro ela estivesse segura. Segura de , principalmente. O ar faltou em seus pulmões e ela levou as mãos para os joelhos, apoiando-se. Havia corrido muito.

- ? Você está bem? – Peter questionou, passando a luz da pequena lanterna que segurava para onde a garota estava. – Aconteceu algo?
- Peter... – sussurrou, andando rápido até o senhor. Ela se sentou em sua frente e o abraçou. Há quanto tempo ela não abraçava alguém com tanta sinceridade? O homem retribuiu, sorrindo. – Estou com tanto medo. – disse baixo, ainda abraçada ao homem. – Tanto! – sua voz embargou, e ela se desfez do abraço, passando a encará-lo.
- Por quê? Te machucaram? – segurou as mãos dela, e negou. Peter, apesar de ser mais novo numericamente, agora lhe lembrava seu pai, e com este pensamento não teve como segurar o choro guardado.
- ... – começou, abaixando a cabeça. – – parou, não sabia como dizer e nem o quê dizer. Ela ao menos sabia o que estava sentindo.
- O que ele fez? Me diga, ! O que houve?!
- Acho que estou esquecendo Adam. – confessou, fungando. Peter arregalou os olhos, confuso. – Eu não sei! Talvez seja a falta de sua companhia, ou minha memória está falhando pela Ironm4x... – mentiu para si mesma, balançando a cabeça logo em seguida. – Que se dane! Eu estou com medo por estar gostando de , Peter. Estou me apaixonando por aquele merda do . – sussurrou, erguendo o olhar e encontrando o de Peter, mais confuso do que nunca. O homem entreabriu os lábios, surpreso.
- Como? ... Não faz sentido!
- Nada faz sentido aqui, Peter! Sejamos sinceros. Eu tenho setenta e oito anos e continuo com a aparência de vinte e um, por causa de uma máquina. Você passou a sua vida inteira nessa cela, trancafiado, esquecido. Acha sinceramente que algo nesse lugar tem sentido?! – ele negou, suspirando. – Eu não posso deixar isso acontecer. – se levantou, colocando as mãos na cintura. – Ainda há uma chance de sair daqui, e finalmente reencontrar Adam... – fechou os olhos. Seu coração não condizia com o que sua voz dissera. – De ter minha vida atrasada, cinquenta e oito anos depois, mas sim.
- Ouça o que você está dizendo.
- Eu estou! – exclamou, irritada. Irritada consigo, com Peter, com tudo. – Me nego a aceitar o que está acontecendo, Peter. Me recuso! Vou dar um basta nisso, e será ainda hoje.
- O que você pretende fazer? Pense bem, .
- Eu preciso me afastar... Preciso de minha liberdade, em todos os sentidos. – suspirou. – Eu vou sair daqui. – disse, decidida.
- Eu já disse que não há...
- Há! – interrompeu-o. – Há uma saída, sim, Peter! E eu irei fazê-la. Vamos lá - deu os ombros –, o máximo que acontecerá é ser morta, e você sabe o que eu acho sobre isso.
- Isso é tão egoísta! , você não enxerga? Não é mais somente sobre você. Há pessoas que precisam de você. Eu preciso. – confessou, bufando. – Você cativou muitos... Eva, Joshua, Franz...
- Não estou pedindo a sua permissão. Estou apenas lhe informando. – disse, com pesar na voz. – Desculpe. – sussurrou, com a voz novamente embargada. – Eu juro que se conseguir, irei te tirar daqui também. Eu juro.

Peter encostou a cabeça na parede atrás de si, encarando o teto. sentou-se, planejando o que faria. E, bem, ela já tinha um plano de fuga. Havia o pensado durante todos os dias que estava ali. Nunca perdeu as esperanças de algum dia conseguir sair dali, e agora era a hora. Já havia passado da hora de viver a sua vida novamente.

A noite chegou depressa, e após “despedir-se” de Peter, ela saiu. O homem não havia lhe dito uma só palavra, o que a deixava extremamente triste, mas ela não podia fazer nada. Era a sua vida, e já havia deixado de lado por muito tempo. Muito, mesmo.
Ao ser deixada no banheiro por Joshua, sorriu brevemente para o rapaz e entrou. Iria passar por uma pequena janela que estava escondida, atrás de um armário. Já a via visto alguns atrás, mas havia deixado para lá. Hoje era o grande dia. Hoje voltaria a ver o mundo por trás dos enormes muros do Ministério. Seu corpo implorava por isso, mas seu coração ainda mais.
Sem demora, começou a mexer na janela, conseguindo abri-la em partes. Certo, suas aulas de ballet na adolescência haviam de servir para algo. Colocando uma perna, depois a outra, ela conseguiu passar até com certa facilidade. O corredor em que estava era escuro, e ela não fazia ideia de para onde iria agora. Direita ou esquerda. Frente ou trás. Cima o ou baixo. Seguindo seus instintos, ela foi para a esquerda, entrando numa espécie de túnel úmido.
Após alguns minutos de caminhada, ela chegou ao que parecia ser um novo corredor com esquerda e direita. Aquilo era um labirinto, e ela já havia perdido tempo demais. Os passos aumentaram de velocidade, e, quando viu, já estava correndo. A imagem de segurando sua mão hoje mais cedo invadiu seu pensamento e ela correu ainda mais, tentando fazê-la sumir de sua mente. Fora por causa de sua família que ela estava ali agora. Ele era perigoso. Ele era o inimigo. Ele era a Alemanha, e ela os Estados Unidos, como Klaus havia dito dias atrás.

Com a demora de no banho, Joshua bateu na porta diversas vezes, sem ouvir sinal de voz alguma. Ou barulho algum. Ele estranhou e abriu-a, encontrando o lugar vazio. Seus olhos se arregalaram ao ver que o chão ao menos estava molhado. não havia tomado banho nenhum. Ao olhar para o lado, no entanto, encontrou a saída de emergência descoberta e ligou os pontos: a garota havia fugido.
Ele gritou um “merda!” e saiu correndo pelos corredores afora, buscando seu comunicador no bolso e interfonando para Franz. “Franz, é Joshua Hipewitch. Você ainda está no Ministério?!” disse, aflito. “Estou. O que houve?” questionou, ansioso. “ fugiu, mande homens pelos corredores da saída do banheiro 09. Repito, fugiu!”

Franz desligou seu comunicador, batendo as mãos em sua mesa, com força. Sabia que uma hora ou outra a garota tentaria isso, só não imaginava que fosse a esta altura do campeonato, quando tinha tantas possibilidades de sair dali, com o consentimento de todos. Principalmente de .
.
precisava saber.
Ele pegou seu celular em cima da mesa e procurou o contato do rapaz na agenda, ligando-o prontamente.

Nick havia chegado em sua casa faziam cerca de duas horas. Ele já havia tomado banho, e agora assistia sua série favorita. Pela primeira vez em dias, sentia-se mais leve; talvez por ter desabafado com Eva. Os pés estavam apoiados na mesa, enquanto ele segurava uma garrafa de cerveja.
You should have known, the price of evil...
Ao ouvir o refrão conhecido de Nightmare, procurou seu celular em seu bolso, no entanto não o encontrou. Ele franziu o cenho, olhando para o relógio da televisão: 21h06. Quem ligaria a esse horário?
And it hurts to know that you belong here, yeah...
A outra estrofe soou e ele se levantou, cansado, indo até sua estante, onde o celular estava. Ao olhar o visor, ficou ainda mais confuso ao ler quem lhe ligava: “Franz Ministério”.
O que havia acontecido?

- Franz!? – atendeu, extremamente curioso, e até com uma ponta de preocupação.
- Venha já para o Ministério. fugiu!


Capítulo XIII


(Música do capítulo: Seven Devils – Florence and the Machine. Play quando eu avisar!)

engoliu a seco ao ouvir o que Franz lhe dizia, aflito. Seu coração acelerou e ele piscou algumas vezes. Olhou brevemente para si mesmo, vendo-se somente de calça jeans velha e uma camiseta qualquer. Dane-se. Ele iria assim mesmo. A farda era o que menos importava no momento.
Ao desligar o telefone, dizendo um apressado “em cinco minutos estou aí”, pegou sua carteira em cima da mesa e saiu, sem ao menos preocupar-se em desligar a televisão.
Sua boca estava seca e ele não sabia o que pensar ou sentir. Por que ela tinha feito aquilo? Por que aquela imbecil inventara de fugir agora? Ele socou o volante, bravo com tudo. No momento, todo o sentimento bom que ele sentia pela garota havia dormido. Ele só sentia raiva. Preocupação. Uma merda de preocupação. Ela jamais conseguiria viver na sociedade atual sem ajuda. Ah, mas estava enganada se pensava que ficaria por isso mesmo. ia encontrá-la nem que fosse no inferno. O carro corria à 90 km por hora, e ele não ligava se iria tomar uma, duas, ou dez multas. Pouco importava.
Como prometido, o caminho que fazia em quinze minutos fora feito em seis. Ele pulou do carro e correu até a sala de reuniões, onde todos estavam. Franz andava de um lado para o outro, falando no comunicador. Eva estava sentada, com o rosto entre as mãos. Até mesmo Peter estava ali, no canto da sala, encolhido.

- Quem foi o imbecil inútil que deixou que isso acontecesse?! – disse, extremamente irritado, chamando a atenção de todos os presentes. Franz rolou os olhos.
- Ela foi para o banho, como de costume, e fugiu pela saída de emergência.
- Quanta incompetência! – esbravejou, gesticulando com as mãos. – Ei, você – olhou para Peter, que lhe olhou de soslaio, temeroso. – O que ela te falou?
- Nada, senhor. Ela foi tomar banho como todos os dias, e aconteceu isso.
- Oh, claro. E eu sou Mickey Mouse. – riu, debochado. – Você realmente acha que acredito nisso?! Você era o melhor amigo dela aqui dentro!
- parecia mais triste e nervosa hoje do que nos outros dias, talvez tenha acontecido algo. – disse sugestivamente, vendo o outro desviar o olhar. – No mais, não sei nada que vocês não sabem. – mentiu.
- Mas que porra! – colocou a mão sobre o rosto, nervoso. – Quem estava com ela na hora?!
- Eu, . – Joshua entrou na sala. bufou. – Nem sinal dela. Só sabemos que pela saída principal ela ainda não passou.
- Então há alguma chance dela não ter saído do Ministério ainda?! – Joshua assentiu. – Por que não me disseram logo, cacete?! – rolou os olhos, incrédulo. – Ela saiu pelo corredor do banheiro 09, certo? – o rapaz assentiu. – Vou encontrá-la. – assentiu, caminhando com passos apressados até a porta.
- ! – Eva chamou, o fazendo virar-se, emburrado. – Não deixe a raiva cegá-lo. – aconselhou, vendo-o rir irônico, saindo como um raio.
Peter observou a cena cuidadosamente. Talvez não estivesse sozinha com seus sentimentos.

passou apressado pelos corredores, tentando colocar os pensamentos no lugar para encontrar-se. Ele conhecia aquele Ministério desde que se entendeu por gente, seria ridículo se perder ali. Após respirar fundo, lembrou qual era a saída do corredor qual sairia, caso ela acertasse o caminho. voltou a correr o mais rápido que pôde, rezando internamente para que ainda houvesse tempo. Tinha que dar. Iria dar. Aquele era o seu mundo e ele mandava ali. Ninguém sairia do jogo sem seu consentimento.
E ela não daria tanta sorte em encontrar a passagem pelo túnel em direção à rua principal.
Daria?

A esta altura, já estava com uma camada de suor pelo corpo, totalmente perdida naquele breu úmido. As lágrimas já a cegavam. Lágrimas de dor, de medo, de raiva. Tudo. Àquela hora, todos já provavelmente sabiam de seu sumiço, inclusive . O que ele diria ao saber? Como reagiria? Ela não sabia. Mas tinha certeza de que no fundo, iria gostar da ideia. Talvez ficasse bravo num primeiro momento, por seu desacato, mas logo depois seria um alívio. Seus olhos encheram-se ainda mais e ela parou de correr, apoiando-se sobre o joelho. Será que aquele lugar não tinha saída?! Após um minuto descansando, ela voltou a correr, a correr o máximo que conseguia – o que já não era muito. Ao fazer uma curva, contudo, parou de repente. A pessoa em sua frente também parou, extremamente ofegante. Seu coração acelerou ainda mais e a vontade de chorar aumentou. Tudo havia ido por água abaixo.
- Você. Está. Muito. Ferrada. – sibilou com o dedo em riste, ofegante. Seu tom transbordava ódio. abaixou a cabeça, chutando a pequena poça de água que estava em seus pés. Oh, sim, ela também estava com ódio. Muito.
Após um grito de fúria, já sem consciência de suas ações, a garota começou a estapear , que tentava a todo custo segurar seus punhos, sem muito sucesso, no entanto. As unhas dela começaram a machucá-lo também, arranhando toda a extensão dos braços que a tentavam impedir de continuar. Ela estava furiosa. Por que ele tinha que chegar e estragar tudo?
De novo.
Era sempre assim com os .
Quando tudo parecia ter uma solução, eles chegavam e a desmoronavam.
Malditos.
mordeu seu braço com força e ela deu um grito. Ao mesmo tempo em que isso aconteceu, aproveitando sua distração, ele a empurrou contra a parede sem medir consequências e sentiu a cabeça estalar contra a mesma, e foi nesse exato segundo em que o homem conseguiu finalmente segurar seus punhos, apertando-os.
- Enlouqueceu, ?! – franziu o cenho, unindo as sobrancelhas, totalmente incrédulo. O peito de subia e descia descontroladamente, mostrando o quão ofegante estava. Ela continuava tentando se soltar, ao mesmo tempo em que contorcia as pernas, tentando chutá-lo. era mais rápido contudo, juntando as duas pernas da garota entre as suas, imobilizando-a por completo.
- Que porra, ! – gritou, com a voz embargada. – Por que você veio atrás de mim?! Ora, isso tudo por causa de uma vingança de merda?
- Cala a boca... – sussurrou, fechando os olhos, tentando manter o último fio de paciência que tinha.
- Você jamais voltaria a ouvir falar sobre mim! Me deixe em paz! Eu sou um peso morto aqui, essa merda de Ironm4x já d...
- Cala a porra da boca! – gritou, fazendo a veia de seu pescoço sobressaltar e os olhos quase pularem pelas órbitas. engoliu em seco, dando um passo para trás, encontrando ainda mais a parede às suas costas. Ele soltou os braços, bagunçando seu próprio cabelo. Aquela mulher ainda o enlouqueceria, sem dúvidas. – Já estou cansado desse discursinho de merda, ! Você não voltará mais para 1957 ou para o merda do teu noivo e amigos!
E, no mesmo segundo, sentiu a mão dela estalar contra seu rosto. Outro tapa. Um ainda mais forte dessa vez. Terceira vez que uma mulher o batia.
- Não fala deles!
E última.
sentiu o sangue subir à cabeça e voltou a encará-la. Olhou no fundo dos seus olhos e ergueu a mão, na intenção de revidar o tapa. Não conseguiu.
Não conseguiu revidar a porcaria do tapa.
Com a mão ainda erguida, levou-a com rapidez ao seu rosto e o segurou com força, chegando-a machucá-la também, virou seu rosto na direção que o faria com a agressão, soltando-o e não resistiu a dar um tapa – com absoluta força menor, em sua bochecha.
- Passou, acabou. Aceite. – disse entre os dentes, vendo-a voltar a encará-lo. Ela trincou o maxilar, mantendo o olhar erguido. – Sendo meu avô, você, ou o Elvis Presley culpados ou não! Estamos em 2014 e nada que faça mudará isso. – fez uma pausa, respirando fundo. Precisava manter o último fio de calma que lhe restava para conseguir continuar sem que ambos rolassem no chão se matando. Literalmente. – Anda. – disse, respirando fundo novamente. – Só anda. – fechou os olhos, suspirando cansado e apontando para trás com o dedo polegar. Ela bufou, indo na direção que ele mostrava, mesmo contrariada. – Depressa. – disse, atrás dela.
- Calma, porra. – respondeu, irritada.
sorriu fraco sem que ela visse, analisando-a. Qual era o jogo, afinal? Não conseguia manter a crueldade por muito tempo quando se tratava de . Há cinco minutos seria capaz de acabar com a garota, e agora... Sorria. Sorria por vê-la irritada daquela forma. Era óbvio que ela deveria ficar ainda mais atraente quando agia daquela forma, não era? Não seria o clichê completo se aquele ponto faltasse.
Ela sussurrou um “imbecil”, sabendo que o herdeiro ouviria. não conseguiu fazer outra coisa senão empurrá-la levemente, repreendendo-a: “ei?!”.
Ah, ... Mal sabia ela que se fosse preciso ele realmente iria até à Washington para trazê-la de volta.
Ou ao inferno.
- Para a direita. – instruiu, ainda com o tom bravo. Ela bufou novamente, como uma criança contrariada. – Depois à esquerda, esquerda de novo e chegamos aonde quero.
Ela o olhou de soslaio, desconfiada.
- Aonde? Zimmerman? – disse como se aquilo não lhe afetasse em nada. Falhou na missão, entretanto. Sua voz trêmula a denunciou, ela ao menos conseguia controlar o frio na espinha ao pronunciar o nome do carrasco.
- Não seria uma má ideia, não é? – seu tom sugestivo a assustou e ela se virou completamente para encará-lo, suplicante. – Vamos – apontou para frente –, eu mesmo quero acertar as contas com você.
Saciar o que estava lhe consumando.
Sufocar o que lhe estava lhe destruindo.
Envenenar o que estava lhe matando.

Pôr fim a todas suas perguntas ou encontrar ainda mais questionamentos.
Aquela sala precisava lhe dar suas respostas, ou acabaria enlouquecendo de vez.
entreabriu os lábios, mas não disse nada, somente voltou a andar.
- Você é insuportável. – murmurou, entre os dentes.
- Só com quem merece. – sorriu cinicamente, colocando uma das mãos nas costas delas, incentivando-a a andar mais rápido. Ela engoliu em seco, olhando para seu braço em suas costas.
Eles andaram mais um pouco e viu a claridade, finalmente. Apertando o passo, chegaram a um dos corredores do Ministério.
- Para onde? – questionou, confusa com o caminho.
- Primeira porta à sua direita.

(Play!)

Ela o fez, e ao abri-la achou que encontraria os outros membros do Ministério, mas não. Aquela era a sala de , e estava vazia. A garota franziu o cenho, virando-se para encará-lo, enquanto o via trancava a porta. deu um passo para trás, procurando qualquer coisa que fosse capaz de machucá-lo, em último caso.
- Se você imaginasse o quão cansado estou, ... – disse, virando-se para encará-la.
- Só você?! ! Por favor! – riu sarcástica. – Me manter presa aqui só está nos fazendo mal, você não vê? – apontou para os arranhões no braço dele e as marcas dos dedos do homem em seu punho. – Minha presença é tão insuportável pra você quanto a sua é para mim! Chega! – sua voz embargou. Suas palavras não faziam sentido nem para si mesma. – Chega desse jogo. Como você mesmo disse, não estamos mais em 1957, eu não sou mais a filha do presidente dos Estados Unidos, não existe mais guerra. Deixa-me em paz. Não é só por mim. Isso está passando dos limites... Ainda dá tempo de...
- Sinto muito, . – interrompeu-a, aproximando-se dela. – Sinto mesmo. Mas você não sairá daqui... E sabe por quê? Porque eu não vou deixar. – sorriu abertamente, satisfeito. – Que se dane essa merda de governo e regras dele. Não se trata mais disso. Estou pouco me lixando se querem ou não lhe dar liberdade. Eu não te darei. E posso ser o ser mais egoísta do mundo por isso, mas acredite... - sorriu, olhando para seus olhos. Ele estava ainda mais próximo – Eu não me importo. Nem um pouco. – disse baixo, olhando para os lábios da garota, que engoliu em seco. – Você pertence a mim agora. – sussurrou, ao pé de seu ouvido, fazendo-a arrepiar-se. Ele voltou a encará-la, deixando o rosto a milímetros do dela. arregalou os olhos, no entanto, não se afastou. – A mim, .

E, ao terminar de falar, grudou os lábios nos dela. continuou com os olhos abertos, contudo, ao senti-lo mover os lábios juntos aos seus, ela os fechou, entregando-se completamente ao momento. Oh, sim, ela também queria aquilo. Queria muito. A garota entreabriu os lábios ao sentir a língua de invadi-la, e no começo, sentiu certo incomodo. Jamais havia beijado outra pessoa a não ser Adam. levou uma das mãos aos cabelos dela, embrenhando os dedos ali, e a outra, em sua cintura, apertando-a levemente. colocou uma das mãos no braço dele, e a outra levou à sua nuca, acariciando-a. O beijo se intensificou e ele puxou seu lábio, fazendo-a sorrir levemente. Dane-se o que aconteceria quando aquilo acabasse, no momento ela não queria pensar em mais nada.
a puxou ainda mais para si e sentiu seu próprio coração acelerar-se. Aquilo realmente estava acontecendo? Um mínimo sorriso surgiu em seus lábios durante o beijo, e ali ele soube: era um caso perdido. Ele realmente estava se apaixonando por aquela mulher.
Quando o ar faltou em seus pulmões, franziu o cenho, se afastando. Ela continuava com os olhos fechados. Não queria abri-los e encarar o homem a sua frente. O que eles diriam? O que fariam? Ela temia.

- Eu não sou um objeto para pertencer a alguém. – disse, abrindo os olhos. Era uma boa saída fingir que nada havia acontecido, não era? Ao ver a reação de , que ria, enquanto mordia o lábio, ela teve certeza de que não. E, céus, como ela queria beijá-lo de novo.
- Se quiser, pode continuar fingindo que nada aconteceu, . – sorriu, cruzando os braços. – Mas eu não vou. – fechou o sorriso, vendo ela o olhar de soslaio, sem graça.
- ... – suspirou, fechando os olhos brevemente. – Eu sinceramente não entendo. – deu os ombros, abrindo os olhos novamente.
- A vida é cheia de incertezas, . – colocou as mãos nos bolsos da calça jeans, e só então reparou que ele não usava uma farda como habitualmente, mas sim, uma calça azul escuro - da qual ela não sabia o tecido, e uma camisa lisa, com gola V. Ele conseguia ficar ainda mais atraente naqueles trajes. – Você não tentará mais fugir, não é? – ela desviou o olhar do dele, passando a olhar os papeis em sua mesa. Ele tomou o silêncio como uma afirmação. – Boa escolha. – sorriu sem mostrar os dentes. Ela bufou, rolando os olhos e voltando a encará-lo. Quando seus olhares se encontraram, faíscas saíram. As palavras voltavam a faltar. – Eu... – suspirou. – Vamos para a sala de reuniões, precisamos contar que a fugitiva foi encontrada. – riu fraco, sinalizando com a cabeça para trás, a porta. o obedeceu, caminhando até a porta, no entanto, ao passar por ele, segurou seu pulso, fazendo-a olhá-lo. – Se te consola, eu também não faço ideia de como controlar. – disse, referindo-se ao sentimento que estava crescendo em seu peito. E, depois daquele beijo, ele sabia que era recíproco. Ao ouvir o que ele disse, respirou fundo, encarando sua mão em seu punho.
Ela subiu o olhar e encarou seu rosto, que estava tão confuso quanto o dela. E, no próximo segundo, o beijou. Sim, o beijou. Talvez fosse o impulso das palavras dele, ela não soube. Só não conseguiu segurar o desejo de beijá-lo novamente. Era forte demais para controlar. A garota o abraçou enquanto o beijava, e sentiu os braços dele envolvê-la também. Oh, sim. Seu corpo arrepiou-se por completo e a sensação de estar completa invadiu seu peito. A segurança que tanto precisava estava ali, bem nos braços de quem antes era o motivo de seu medo. A proximidade era tanta, que ambos conseguiam sentir o coração acelerado do outro. E, ora, como estavam acelerados aqueles corações temerosos. Esse beijo era mais lento que o primeiro, como se agora estivessem, de fato, entregues ao momento. apertou em seus braços e ela quase sentiu vontade de chorar, tamanha era a sensação que aquilo lhe causava. O aconchego que aquilo lhe trazia. Era como um escudo.
Ele não pensava muito diferente, mas em situações opostas. Sentia tão pequena e desprotegida em seus braços, como se fosse uma boneca de porcelana prestes a quebrar. Quando James lhe contou como era quando ficava com Lily, jamais conseguiu imaginar o quão grande e bom era aquilo. Embora não acreditasse no amigo, sonhava com o dia em que sentiria algo parecido com a descrição que James lhe dava, e agora, ali, beijando , ele não conseguia imaginar nada mais parecido com as palavras do amigo do que aquilo que estava sentindo.
O beijo foi chegando ao fim e ela terminou lhe dando um selinho demorado. Quando se afastaram, encararam um ao outro, nos olhos. Novamente, não havia palavras. Nenhuma parecia ser digna o suficiente para o momento que acabavam de viver.
E foi então que se deu conta: não estava tentando fugir do Ministério.
Estava tentando fugir de , e do que estava sentindo por ele.

Alguns segundos se passaram e ele respirou fundo, tomando coragem de dizer algo. No entanto, não foi o que ela esperara. Mas, bem, nem ela sabia o que esperara.
- Vamos. – disse somente, sério. Tão sério, que ela novamente sentiu vontade de chorar, mas agora por razões diferentes. Ela preferia o sarcástico de minutos atrás. Sem vontade e coragem para dizer mais nada, somente voltou a andar até a porta, em silêncio.
Ele estava errado quando pensou que teria ainda mais dúvidas quando saísse da sala.
Ele estava errado quando pensou que não encontraria as respostas que precisava.
Ele estava errado quando pensou que não passava de somente uma atração.
Ele estava certo sobre algo, contudo: estava fodido. Perdida e completamente fodido.
Ambos saíram da sala e caminharam até o final do corredor, virando à direita e entrando na segunda porta. A sala de reuniões. abriu a porta e todos olharam em sua direção. O rapaz foi para o lado, abrindo caminho, e apareceu. Um suspiro de alívio foi dado por todos os presentes. Eva correu até a garota, abraçando-a.

- Por que fez isso, ?! Deus do céu, eu fiquei tão preocupada! – segurou seu rosto, beijando sua bochecha. suspirou, com os olhos baixos.
- Você não devia ter feito isso, . – Franz repreendeu e observou a cena. Pareciam pais brigando com a filha que fugiu de casa; era um tanto verdade, afinal.
continuou fitando os próprios pés, dando os ombros, e ao olhar para o lado encontrou Peter sorrindo. Ela arregalou os olhos e correu até o homem, abraçando-o forte. colocou as mãos nos bolsos da calça, observando a cena.
- Por que você está aqui? Você tá bem? – questionou, encarando o senhor.
- Ele está bem, . Só estava aqui para nos dar informações sobre você, e agora já pode voltar para seus aposentos. – disse, fazendo sinal com a cabeça para que Joshua o buscasse.
- Acho que ele mesmo é capaz de responder, . – irritou-se, sem encará-lo. – É a primeira vez que te vejo na luz. – sorriu, passando as mãos pelos cabelos ralos do mais velho. – Você se parece com Louise. – engoliu a seco, ainda sorrindo.
- Ele tem que voltar para seu quarto. – avisou e ela rolou os olhos, virando-se para vê-lo.
- Por que ele tem que voltar?!
- Porque estou mandando.
- Vamos acalmar os ânimos aqui, por favor. – Eva disse, querendo pôr panos quentes na situação. Ela caminhou até , colocando as mãos em seus ombros. – Está tudo bem, não está? Ótimo. – disse, sem esperá-lo responder. – Já está tarde e estamos todos cansados, foi um longo dia. Você pode voltar para casa, .
- Não. Eu quero falar com você. – trincou o maxilar, olhando para , que franziu o cenho, interessado. – A sós. – olhou em volta, como se pedisse para que todos se retirassem.
- Saiam. – ordenou, sinalizando a porta com a cabeça. Todos se entreolharam, em dúvida. – Não vamos nos matar. – avisou, como se fosse óbvio.
- Vamos, Peter. Foi um dia animado, não foi? – Franz disse, colocando a mão no ombro do homem que parecia ter sua idade.
- Ah, foi sim. – disse, tímido. sorriu fraco com a cena. Era estranhamente bom vê-lo interagir com outras pessoas. Talvez ela se sentisse um pouco responsável por aquele homem, mesmo que ele aparentasse ser bem mais velho.
- Posso confiar em vocês, não posso? – Eva questionou, receosa. assentiu, medindo de cima a baixo.
- Teria motivos para desconfiar? Eu sou um anjo. – olhou-a de soslaio, com um sorriso maldoso brincando nos lábios.
- Oh, é sim... – riu, caminhando até a porta com os outros. – Até amanhã. – os dois não responderam com palavras, somente assentiram.

Joshua, Franz, Peter e Eva saíram, fechando a porta. Uma nuvem de tensão tomou conta do ambiente, fazendo seus ombros pesarem. cruzou os braços, observando-a com ainda mais intensidade quê anteriormente. respirou fundo, tentando afastar as imagens de minutos atrás de sua mente. Era impossível, entretanto.
- Enfim... - suspirou, dando os ombros. – Sair daqui é algo que tão cedo sei que não acontecerá. – ele assentiu, incentivando-a continuar. – Mas, se eu pudesse lhe pedir algo... – começou, desviando o olhar do dele. – Você já sabe toda a minha história de vida e acredito que não queira ouvi-la de novo, seria estressante demais e tomaria muito de seu precioso tempo. - ironizou, fazendo-o rolar os olhos.
- Vá logo ao ponto.
- Peter passou toda a vida aqui, . Você viu como ele age em meio a outras pessoas?! – riu sem humor, incrédula. – Eu conheci sua mãe, Louise e, se quer saber, ele fora seu maior sonho. Louise já tinha idade avançada para engravidar, e Peter foi um milagre... Ela era uma mulher maravilhosa. A mãe que jamais tive. – mordeu o lábio, ouvindo a voz tremer. abaixou a cabeça, encarando os próprios pés inquietos. – Ela foi a pessoa mais forte que conheci.
- Eu conheço outra ainda mais. – interrompeu-a.
- Uh. – suspirou, sorrindo em meio ao choro que começava a se formar em seu peito. – Você... Eu gostaria de saber se você pode libertá-lo. – questionou, insegura. arregalou os olhos, totalmente surpreso com sua proposta. – Aceito de bom grado continuar aqui pelo resto da minha vida se isso significar mantê-lo longe de tudo isso e finalmente ter uma vida normal, como todo ser humano deve. – passou a mão no rosto, tentando secar as lágrimas que caíam.
- Deixe-me ver se entendi, ... - ergueu o dedo indicador, como se estivesse pensando. – Você estaria disposta a abrir mão de sua liberdade pela dele? – voltou a encará-la, mas agora sem mais sarcasmos ou ironias. Havia uma surpresa ali, um encantamento. Céus, como ele queria abraça-la.
- Sim. – foi direta, assentindo e sorrindo fraco. Estava orgulhosa de si mesma, afinal.
- Não me parece justo. – deu os ombros.
- O que é justo nisso tudo, ? – riu sarcástica. – Nada é. Aquela guerra em 57 não foi, a Ironm4x também não. Peter, principalmente, não. Estar deixando de te odiar tanto também não é justo. – colocou as mãos na cintura, incrédula. – Aquele beijo naquela sala foi absurdamente injusto. – fechou os olhos. Merda, merda, merda. Ela deveria controlar melhor seus pensamentos, que agora pareciam estar saindo através de seus lábios sem o menor consentimento. E, infelizmente, havia voltado àquele assunto que deveria ser esquecido. – Droga. Esqueça. – balançou a cabeça negativamente.
- Eu prometo pensar em sua proposta sobre Peter, . – ela assentiu, olhando para a porta e ameaçando sair. – O mundo é injusto, . Você nunca ouviu falar isso? – mordeu o lábio, voltando a colocar as mãos inquietas nos bolos da calça. – Mas, bem, eu sou obrigado a discordar da última frase que disse. Não creio que um beijo seja injusto, de qualquer modo. Por quem quer que seja dado, ou recebido. – o olhou, confusa. Ela não sabia o quê pensar. – E quanto a não me odiar mais tanto... – ele riu, vendo-a sorrir fraco. – Já não te odeio tanto há algum tempo, ... Ou acha que deixaria passar em branco o tapa que deu em minha avó? Ou os que acabou de me dar naquele túnel? – ela ficou séria, olhando para as próprias mãos. Suspirou. – Mas é claro que ainda te odeio. – brincou, vendo-a sorrir, voltando a olhá-lo. – Só diminuiu um pouco, pouquinho. – mediu nos dedos, juntando o indicador ao polegar, deixando um mínimo espaço. Ela riu, imitando seu gesto.
- Nada que diminua minha vontade de deixar minha mão marcada em seu rosto, com um bom tapa. Mas, um pouquinho. – fez uma careta e ele riu, jogando a cabeça para trás, evidenciando seu pomo-de-adão. Oh, se soubesse a queda que a garota tinha por aquilo, não o faria certamente. Ela riu, mordendo o lábio. – Vou dormir, . – sorriu, caminhando até a porta.
- Ei? – chamou, fazendo-a encará-lo. – Quando disse mais cedo que seu aniversário estava próximo, não especifiquei. É segunda-feira. – ela arregalou os olhos.
- Já?! Céus! – sorriu, balançando a cabeça. – Não acredito que isso mude algo na minha rotina, mas obrigado por avisar. – assentiu em agradecimento e caminhou até a porta. – Boa noite. – disse, surpreendendo-se até a si mesma por ter dito aquela simples frase, mas que parecia tão libertadora agora. Desejar uma boa noite a . Era engraçado, sem dúvida.
- Boa noite, . – ele sorriu, dizendo suavemente. A frase não deixara de ser surpreendente para si mesmo também.
Sempre seria assim, então? Dois bipolares, que começariam uma conversa com insultos e terminariam com gentilezas? Não parecia certo e muito menos saudável. Mas era inevitável.

narrando.

Ao fechar a porta atrás de mim, não vi nenhum guarda. Se eu quisesse fugir, este era o momento, sem dúvida. Mas, agora, eu realmente queria isso? Comecei a andar em direção ao meu pequeno quarto, eu sabia o caminho como a palma da minha mão. Suspirei e cruzei os braços, sentindo-me extremamente cansada. Havia sido um dia tão longo... Tão confuso. A cena de me beijando há quase uma hora, e eu beijando-o logo depois apareceu em minha mente como um filme. Fechei os olhos brevemente, e ao abri-los enxerguei os corredores do Ministério um pouco embaçados. Aquelas malditas lágrimas de duvidas e medo estavam ali de novo. Eu não podia estar me apaixonando por ele, não é? Vamos lá, ! Você ama Adam, seu noivo. Adam... Oh, Adam. Quantas saudades. Sorri nostálgica. No entanto, não consigo sentir o arrepio que sentia ao somente dizer seu nome. Ao passar os dedos pelos meus lábios, contudo, consigo quase sentir o toque de sobre eles. Meu coração parece tão acelerado, e a sensação de voltar para sua sala nesse mesmo segundo é quase incontrolável. Abraçá-lo de novo... Oh, sim, seu abraço. O quão confortável é o seu abraço? Eu poderia passar a vida toda ali, sentindo seus braços envoltos a mim. Que se dane meu interior relutante a este pensamento, é só a verdade. Dane-se todo o orgulho. Eu o queria, até mais do que podia imaginar. Eu estava me apaixonando por aquele que tanto disse odiar. Era um jogo sem retrocesso.


Capítulo XIV


(Música do capítulo: What You Wanted – One Republic. Play quando eu avisar!)

Segunda-feira chegou rápido, e junto a ela o aniversário de , assim como havia lhe informado há dois dias. Durante a manhã, para sua surpresa, não a tinham chamado para os testes da Ironm4x. Peter havia lhe dado um forte abraço e desejado felicidades, assim como fora ensinado. Ela sorriu, retribuindo suas palavras. Hoje era um dia normal para . Ora, era só mais um ano. 79. Ela riu, sem humor. Talvez devesse considerar “22”. Iria doer menos.
Ao recordar-se de seu aniversário “passado”, a vontade de chorar que há tantos dias não lhe dava as caras havia voltado. Como queria poder comemorar aquela data com todos que amava. Mas nem tudo era possível.
Joshua entrou em seu pequeno quarto, alegando que os membros do Ministério a estavam esperando na sala de reuniões. Ela ficou apreensiva, só não ainda mais porque fora ouvindo um sermão por ter fugido no sábado, logo antes de receber os desejos de Feliz Aniversário de Joshua. A garota ouviu tudo calada, somente sorriu e agradeceu no final. Ele não estava errado, de toda a forma, era seu trabalho.
abriu a porta da sala de reuniões e tomou um susto ao ver um pequeno bolo redondo em cima da mesa, e todos os membros do Ministério ali. Ou pelo menos os que ela conhecia com exceção de .
Todos disseram um uníssono “parabéns!” e sorriu emocionada. Agora eles eram sua família, não eram?
Ela mordeu o lábio, com os olhos cheios de lágrima. Há três meses, quando acordou e encontrou aquelas pessoas desconhecidas, jamais imaginou sequer ter algum tipo de afeto por elas. E hoje, em seu aniversário, com todos aqueles presentes e aquele pequeno bolo decorado em sua frente, ela não conseguia sentir nada abaixo do que gratidão. Ela já reconhecia cada rosto ali, e gostava de cada um deles. Principalmente de Eva, que havia se tornado sua confidente. E Franz, que já era como um... Tio.

- Oh, obrigada! – sorriu, com a voz embargada. – Obrigada, mesmo. – deu a volta na mesa, indo até eles e abraçando cada um. – Eu não esperava isso, de forma alguma. – deu os ombros, encarando o bolo.
- Você merece, ! – Eva a abraçou de lado. – E sem testes hoje. Prometemos!
riu, agradecendo-os. No entanto, ao ver todos conversando entre si enquanto comiam um pedaço do bolo, ela não pôde deixar de pensar em . Onde ele estava? Por que não estava ali? Uma ponta de raiva e decepção tomou conta de seu peito. Ela estava ofendida. E não tinha direito nenhum de sentir isso, mas era incontrolável.
Contudo, quando ela finalmente concentrou-se em comer um pedaço de seu bolo, ouviu a porta abrindo e ao olhar em sua direção encontrou quem tanto procurara: , ali, parado com o sorriso egocêntrico que sempre usava.
- Ouvi boatos de que uma senhora está completando mais um ano de vida, é isso mesmo? – riu, dando a volta na mesa.
- ...! – Franz rolou os olhos. – Não estrague tudo.
- Setenta e nove, você acredita? Mas prefiro pensar que são vinte e dois. – entrou na brincadeira de , surpreendendo a todos. Ele riu, assentindo e tirando do bolso uma rosa e entregando-a. Ela entreabriu os lábios, surpresa.
- Feliz aniversário, . – sorriu sincero. pegou a rosa de sua mão e a levou para mais perto do rosto, sentindo seu aroma.
- Não está envenenada, não é? – questionou, em tom de brincadeira. somente riu, dando os ombros como se não soubesse da resposta. – Obrigada, . – sorriu sincera, enquanto o encarava misteriosa. Todos voltaram a conversar entre si, enquanto os dois continuaram se encarando.
- Quero te levar a um lugar hoje à noite. – disse baixo, para que ninguém mais ouvisse. franziu o cenho, mais confusa do que sempre.
- O quê? – sussurrou, sentindo sua própria voz falhar. Aonde queria levá-la?
- Peço para Joshua passar em seu quarto mais tarde. – sibilou, enquanto saía, sorrindo para outros membros do Ministério, deixando-a atônita, boquiaberta. E mais curiosa do que nunca.
Após uma hora, a pequena recepção terminou e foi levada para seu quarto novamente. Joshua não demorou a abrir a porta para que ela fosse tomar seu banho. Ela se levantou depressa e o seguiu ainda desconfiada. Tudo estava extremamente estranho por ali.
Ao entrar no banheiro, uma muda de roupas e um bilhete em cima da pia lhe chamou atenção. caminhou até a mesma, pegando o bilhete e lendo-o:

“Você ainda sabe ler, não é? Espero que sim! Haha. Ótimo.
Estou deixando essa muda de roupa para que você as coloque depois do banho.
Quando terminar, chame Joshua e ele irá lhe instruir.
Feliz aniversário, Srta. Insuportável!”


Um sorriso bobo brincava nos lábios de , enquanto ela deixava o bilhete na pia e voltava a analisar as roupas: uma calça jeans de lavagem escura, camisa branca com listras vermelhas e uma jaqueta de couro preta. A garota entortou a boca, confusa. Agora mulheres usavam jaquetas de couro? Ela riu, observando as calças daquele tecido até então desconhecido aos seus olhos. Mulheres se vestiam tão... Masculinamente hoje em dia. Balançando a cabeça, ela se despiu e entrou no chuveiro. A água quente tomou seus membros tensos, relaxando-a. A depressão que tanto sentia há meses, já não estava mais tão presente em seu peito e isso a fez sorrir. “Nos acostumamos com tudo”. A frase que Peter lhe falara há algum tempo jamais havia feito tanto sentido.
Ao desligar o chuveiro, pegou a toalha que estava próxima ao box e se enrolou, caminhando até a pia e penteando os cabelos que agora já estavam um pouco abaixo dos ombros. Após secar-se por completo, buscou as roupas e as colocou. Sentia-se tão diferente. Oh, Deus, ela realmente estava em 2014. Quando este pensamento cobriu sua mente, ela não deixou de sorrir emocionada. Caminhou até o espelho de corpo inteiro ao lado e observou seu reflexo. Era outra pessoa, de fato. As roupas lhe caíam extremamente bem, e ela chegou até a se arrepender de pensar que seriam “masculinas”. Seus olhos se fecharam, segurando algumas lágrimas. Duas batidas a alertaram e ela voltou a si, pigarreando e caminhando até a porta, abrindo-a. O olhar surpreso de Joshua a fez sorrir.
- Deus do céu, ! – riu, observando-a. – Você está linda! – exclamou, fazendo-a corar. – deixou isso pra você? – se referiu às roupas, vendo-a assentir.
- Obrigada, Josh. – sorriu agradecida, chamando-o pelo apelido. – E sim, deixou. Estranho, não é? – deu os ombros, fechando a porta atrás de si. – Você sabe por que ele está fazendo tudo isso?
- Não faço a menor ideia. – deu os ombros também, começando a andar. – Só tenho ordens para te levar para a sala dele. Mas, bem, é bom saber que estejam se dando melhor.
Ela se limitou a sorrir e continuaram conversando até que chegassem à sala de . Contudo, quando Joshua deu duas batidas educadas na madeira da porta, a tensão voltou aos seus ombros, fazendo-a respirar com certa dificuldade, e ela nem sabia o porquê. Ao colocar um dos pés para dentro da sala, no entanto, toda a tensão se esvaiu. a estava olhando com o sorriso mais lindo do mundo. Seu coração derreteu-se e sorrir foi inevitável. O rapaz usava uma calça jeans, camisa gola V e jaqueta de couro também.
- Obrigado por trazê-la, Joshua. Isso fica entre nós. – disse, e franziu o cenho. Deus, por que tinha de ficar somente entre eles? O que ele ia fazer? Josh somente assentiu sorrindo cordialmente e saiu, fechando a porta.
- agradecendo por algo... Temos um avanço aqui. – disse, tentando afastar a nuvem pesada que aquela sala carregava.
- Não sou essa pessoa tão má que você imagina, . – disse sério, enquanto a observava. Ele suspirou, sorrindo. Estava encantado, de fato. – Você é linda. – olhou em seus olhos, vendo-a desviar o olhar, enquanto suas bochechas ficavam rosadas. não deixou de rir com a vergonha da outra. Diferentemente de Joshua, ele não havia dito “você está linda”, mas sim “você é linda”. Há alguma diferença nisso, não há? Ela não foi capaz de segurar um sorriso tímido que apareceu por seus lábios. – O que acha de comemorar seu aniversário fora do Ministério? – disse baixo. arregalou os olhos e voltou a encará-lo, extremamente surpresa com o que ele falara.
- Isso é algum tipo de brincadeira? – murmurou, com a voz trêmula. Céus, só podia ser brincadeira. Seus olhos encheram-se de lágrimas involuntariamente e ele sorriu, balançando a cabeça em negação. – Você vai me levar para fora do Ministério?! – a voz falhou.
- Se você preferir passar a noite do seu aniversário aqui... – começou, e ela ergueu as duas mãos na frente do corpo como se pedisse para que ele parasse. Ela riu, nervosa e emocionada.
- Eu vou. – disse, sem ironia, sarcasmo ou qualquer tom de brincadeira na voz. –Ah, meu Deus. – levou as mãos juntas em forma de concha, à boca, enquanto os olhos derramavam algumas lágrimas. Lágrimas de alegria... De liberdade, pelo menos por algumas horas. Ela finalmente iria ver o mundo por fora dos grandes muros do Ministério. – Ah, meu Deus! – exclamou, tirando as mãos da boca e dando um pequeno salto, animada. riu ainda mais ao ver a reação da garota que agora mais parecia uma criança.
- Vamos? Ou então nos atrasaremos. – disse, caminhando até a porta. Ela franziu o cenho, acompanhando-o.
- Atrasaremos? Pra quê? – questionou, curiosa.
- Você vai saber. – olhou-a de soslaio, enquanto andavam no corredor.

Os cinco minutos de caminhada até o jardim chegaram ao fim e o coração de já voltava a acelerar, mas agora era de ansiedade. De medo. O que estava por trás dali? Como seriam as pessoas? Os lugares? A noite estava diferente do que era aos anos 50? Talvez com mais estrelas? Ela não sabia, não fazia ideia, mas estava ansiosa para conhecer este novo milênio. conversou brevemente com o guarda e o rapaz prontamente abriu o enorme portão. deu um passo para trás, engolindo seco. O medo havia tomado posse de seu corpo, e ela já não sabia mais como agir. As luzes dos altos postes da rua lhe assustaram ainda mais e ela abaixou a cabeça, fitando os próprios pés.
- Não é tão ruim quanto parece. São pessoas como você... Só vestidas de diferentes formas. Assim como eu, e agora você. – sussurrou, parando atrás dela, que sorriu fraco e assentiu. Ao erguer a cabeça novamente, pôde observar a rua em sua frente. Era uma rua da qual ela não via o fim, tamanha era sua grandeza. Alguns prédios altos dominavam o restante da mesma. Tudo estava mudado, de fato. E ela sabia que não era só por estar em outro país.
deu alguns passos para fora do portão e sentiu a brisa da noite cobrir seu rosto. Ah, a sensação de liberdade... Ela fechou os olhos e os sentiu encher de lágrimas, novamente. O quanto ela já havia chorado nos últimos dias? Não sabia ao certo, mas tinha certeza de que estava quase superando o dia em que acordou na Ironm4x. Contudo, hoje, suas lágrimas tinham outro significado.
- Obrigada. – ela sussurrou, emocionada. foi para seu lado, olhando-a. Ela se virou para encará-lo também, ambos sorriam. – Meu mais sincero e profundo obrigada, .
E, ao terminar de falar, o abraçou.
continuou com os braços parados ao seu redor, surpreso, mas ao senti-la apertá-lo, ele sorriu, abraçando-a também. Ele colocou o rosto dentre os cabelos dela, sentindo seu perfume natural. não usava nenhum tipo de perfume, mas isso não importava. A garota tinha um cheiro próprio, quase como uma fragrância... Única. Gabriela Sabatina, Carolina Herrera, Marc Jacobs, Paco Rabanne... Nada se compararia àquele cheiro. O cheiro da garota que até poucos meses atrás era sua pior inimiga. A garota da qual sempre fora envenenado quando criança, ouvindo que ela teria sido a única e impetuosa culpada da tragédia de sua família, e, agora, com elas em seus braços, ele não conseguia imaginá-la sequer maltratando uma mosca. Ela estava jogando no lixo todas as suas defesas, todos seus critérios, seu orgulho. E, sinceramente, ele não dava a mínima.
se afastou devagar, olhando-o nos olhos e o sorriso bobo continuava ali, nos lábios de ambos. Ela, por sentir a liberdade finalmente bater à sua porta. Já ele, por vê-la com esta liberdade. O quão feliz ela estava por somente algumas horas fora do Ministério. Significava realmente muito, não era?
Desfazendo-se de seus pensamentos, balançou a cabeça e riu.
- Acho melhor irmos, sim? – passou uma das mãos no cabelo, despenteando-o levemente.
- Ah, sim! – riu também, fitando seus próprios pés por alguns mínimos segundos. – Pra onde vai me levar afinal, ? Não é algo pior do que o Ministério, é? – brincou, fazendo uma careta para ele, que já havia voltado a andar, enquanto ria fraco.
- Você acha que eu te levaria para algo “pior” – fez aspas imaginárias com os dedos – do que o Ministério a essa altura do campeonato, ? – olhou-a de soslaio, enquanto ela balançava a cabeça negativamente, sempre sorrindo. – Só achei que seria bom te levar pra conhecer novos ares desse novo mundo pra você... Não acha? – arqueou uma das sobrancelhas, abrindo a porta do carro para que ela entrasse.
- Eu nem consigo fazer algum trocadilho para dizer o quão idiota você é, – riu, entrando no carro. Ele deu a volta pela traseira e entrou no veículo, colocando os cintos e ligando o motor. – Juro que queria! – brincou, virando-se para olhá-lo. – Mas eu simplesmente não consigo! Só tenho vontade de te agradecer, então, de novo, obrigada. – deu os ombros, apoiando as próprias mãos nos joelhos.
- É realmente bom saber disso - olhou-a de soslaio, enquanto prestava atenção na estrada –, pois eu também não teria o que responder. – sorriu de canto, mas ela pôde ver e não deixou de sorrir também.
- Sabe, ... É um carro legal. – admirou, mudando completamente de assunto e ouvindo a risada alta dele. A gargalhada da qual já não sabia se conseguia passar mais de um dia sem ouvi-la.

O resto do caminho havia sido em silêncio, a não ser pela baixa música que tocava no rádio do carro. De repente, se pegou arrumando os cabelos enquanto enxergava seu reflexo no vidro do carro. Por que raios ela estava se arrumando?
A garota olhou para baixo, encarando as próprias mãos em seu colo. Aquilo realmente deveria estar acontecendo? Não, não deveria. Mas quem é capaz de comandar suas próprias emoções?
Ela voltou a olhar pelo vidro do carro e sorriu involuntariamente ao ver algumas pessoas andando na rua movimentada, normalmente. Céus! Suas roupas, seus penteados, seus jeitos eram tão diferentes. Ela viu uma garota com o cabelo pintado de diversas cores e entreabriu os lábios, surpresa. Era genial! Riu consigo mesma e ouviu a risada suave de no fundo. A garota o encarou através do vidro, mas não era o suficiente. Aproveitando que ele havia voltado a focar toda a atenção na estrada, ela virou o rosto devagar, para que passasse despercebido pelo rapaz, e encarou seu perfil. O rosto era perfeitamente desenhado, com um maxilar marcante – que estava sempre trincado, e o nariz afilado, nem muito grande e nem muito pequeno. Algumas pintinhas davam o charme, juntamente com o rosado suave de sua bochecha – que por qualquer ação, corava. Não necessariamente por vergonha. Os cabelos não chegavam a ser quase raspados, mas também não eram cumpridos: na medida certa para modelar seu rosto. As costeletas que os homens de sua época usavam não estavam mais tão presentes atualmente, mas continuavam gentilmente ali o que a fez sorrir. O lábio se curvou milimetricamente quando ele entrou numa via de duas mãos, e seu próprio sorriso se alargou um pouco mais. Ele sempre tinha aquele hábito quando estava tenso para algo. Um pequeno batucar chamou sua atenção e ela olhou na direção em que o suave barulho vinha: o volante. batucava os dedos no mesmo, no ritmo da melodia que tocava no rádio, algo calmo, mas com algumas batidas fortes no fundo e pode tomar uma pequena decisão: gostava das músicas atuais. As batucadas aumentaram à medida que o refrão chegara e ela riu, não conseguindo segurar. O rapaz era inquieto, e sempre batucava os dedos em sua mesa, ou então uma das pernas. Aquele era seu jeito de aliviar a energia.
a olhou por alguns segundos, enquanto o sinal estava fechado, e sorriu para ela. Sabia que estava sendo observado, não era bobo. Ela não dava a mínima se ele soubesse, contudo. Iria olhá-lo, sim. Cada pedacinho de seu rosto e gestos...
Foi quando ela se deu conta: o conhecia demais. Suas ações, sua personalidade. Podia não conhecer como ele era fora do Ministério, mas seu jeito, oh, como ela conhecia! Chegava até a ser surpreendente. Nem a própria imaginou que fosse tanto.

- Chegamos! – avisou, desligando o motor e virando-se para ela, que olhava em volta, confusa.
- Estamos num completo deserto, . – disse, com certa apreensão na voz.

O lugar era, de fato, deserto. Como uma estrada vazia com um chão terroso e arenoso aos lados. Ao longe, no fim de sua visão periférica ela conseguia enxergar os prédios e luzes da cidade, no entanto, era longe demais. respirou fundo, esperando o que diria.

- Oh, não! – riu, negando com a cabeça. Ele devia imaginar o que ela estava pensando. – Eu não te mataria no dia do seu aniversário, ! – e nem nunca. – Posso escolher um dia mais propício para isso, não é? – brincou, erguendo uma das sobrancelhas. Ela deu uma risada totalmente irônica, algo como um “há-há-há!” e ele riu ainda mais, jogando a cabeça para trás. – Agora vem - abriu a porta de seu carro e deu a volta, indo até a porta do lado em que ela estava, abrindo-a – ou você saiu do Ministério para ficar presa dentro de um carro? – estendeu a mão e ela o olhou em dúvida.
- Me parece mais seguro. – entrou no jogo, erguendo uma das sobrancelhas também. Ela tocou na mão de , mas não deu impulso para se levantar.
- Eu não vou fazer nada, . – a puxou pela mão, fazendo-a se levantar depressa e no susto. A garota encostou a outra mão em seu peito, segurando-se e mantendo o equilíbrio. Seus rostos estavam próximos. – A menos que você peça. –disse, num tom rouco, quase como um sussurro. Ele piscou, por fim, soltando a mão dela e indo até o capô, sentando-se ali.
engoliu seco, recompondo-se e o seguiu. O olhou questionando se podia sentar-se e ele deu os ombros, como se parecesse óbvio. Ela o fez, arrumando-se no confortável e grande capô do carro.
- Me chamou para ver as estrelas, ? – ironizou, mas, no fundo, queria receber uma resposta afirmativa. As estrelas estavam excepcionais dali. O céu extremamente escuro fazia com que elas se destacassem ainda mais. E, de repente, ela se deu conta de que era a primeira vez que encarava o céu à noite, desde que acordara. A garota não via as estrelas há 58 anos. piscou algumas vezes, observando a beleza que aquilo tomava. E, hoje, em 2014, o céu parecia absurdamente mais lindo do que em seu humilde e antiquado 1957.
- Teria sido uma boa ideia também, não é? – sorriu, encarando o céu também. Ele estava com a cabeça apoiada no próprio braço dobrado. – Mas não hojeo. Em... – tirou o celular do bolso de sua jaqueta, checando as horas – exatamente em meia hora começa uma queima de fogos num parque de diversões próximo. A visão daqui é incrível, achei que seria interessante te trazer aqui para comemorar mais um aninho de vida. – brincou e eles riram. – Não sei na sua época - disse, mas diferente do normal, não sentiu um tom irônico na voz dele. Não era como se quisesse zombar dela –, mas atualmente, em festas de Ano Novo, comemoramos com fogos. Pra mim, pessoalmente, fogos de artifícios significam uma passagem, como o próprio nome diz... Um novo ano. Uma nova chance de fazer diferente. De fazer melhor. Começar uma nova vida. – finalizou e ela virou o rosto para encará-lo, ela sorriu emocionada.
- É o meu caso, não é? – sorriu. – Não só com o aniversário... Mas, ora, é uma nova vida. – repetiu as palavras dele e deu os ombros, suspirando. – Gosto de como soa. – sussurrou, fazendo uma pausa. – Quem é ? – ele franziu o cenho, divertido, ainda olhando para o céu, e então virou-se, passando a encará-la. O que ela queria dizer?
- Como? – questionou, na intenção para que ela repetisse a pergunta.
- Melhor dizendo... Quem é ? Os eu conheço, e muito bem, por sinal. – riu sem humor. – Mas como é o ? Sabe... Não estou falando do neto de Yan. Do grande herdeiro do Ministério. – exagerou com a careta, e ele riu baixo. – Quem é o homem por trás daqueles muros gigantescos? – sorriu curiosa, apoiando-se sobre o cotovelo.
- É uma boa pergunta, . – elogiou, suspirando. – ... Eu não faço ideia de quem seja. – deu os ombros, vendo-a franzir o cenho, confusa. – É estranho dizer isso, não é? Mas é só a verdade... Eu realmente não sei praticamente nada além do que você sabe. Sempre fui, abra aspas aí: “o neto de Yan , o atual presidente na guerra de 1957”. Cresci tendo conhecimentos sobre histórias políticas. Histórias que envolviam nossa família... Sua história. – ela umedeceu os lábios, piscando longamente. – Vivi à sombra deles por toda a vida, até hoje.
- Não precisa ser assim, . – balançou a cabeça negativamente, suavemente. – Um sobrenome não deve dizer quem você é e nem como deve agir. É só um sobrenome. – sorriu, como se aquilo fosse óbvio. Ele a admirou, sorrindo também. – Sabe, não é porque alguém tenha o sobrenome como “café”, que deve gostar da bebida. – gargalhou de sua analogia e ela não foi capaz de segurar a risada também. – Ora, você entendeu. Não é porque você é um , que tem que ser mau. – mordeu o lábio inconscientemente e ele lhe olhou repreendendo-a, ainda rindo um pouco. – Mas, vamos lá, não acredito que não tenha uma história própria. Sabe, quantos anos exatamente você tem, por que escolheu medicina, quando faz aniversário... Se está envolvido emocionalmente com alguém. Coisas do tipo! Me conta. – arrumou-se melhor no carro, encostando a cabeça no vidro, enquanto ainda o olhava.
- Hm... Deixa-me ver. – fingiu pensar. Eles riram. – Sou , tenho 24 anos e me formei há dois anos. Comecei a faculdade aos 16... Também há suas vantagens em ser um , afinal. – concluiu, sorrindo. Ela assentiu. – Faço aniversário em três meses, mais precisamente no dia 15. Decidi ser médico porque sempre quis salvar vidas... É algo realmente muito bacana, não é? – balançou a cabeça, sorrindo boba. Deus, sua boca iria congelar se ela não parasse de sorrir tanto daquele jeito, mas era inevitável. – Lembro que um dia estava num restaurante com a minha avó e um cara teve uma convulsão ou algo assim, um médico estava presente e em questão de segundos salvou sua vida. Eu fiquei fascinado. Aquele cara que estava convulsionando era alguém que tinha família, amigos, uma esposa, talvez, uma história. Não era qualquer pessoa, só porque eu não o conhecia, era o alguém mais importante da vida de outro alguém. Consegue me entender? – disse orgulhoso de si mesmo. suspirou.
- Completamente. – inspirou pelo nariz lentamente, enquanto tirava algumas mechas de cabelo que caíam no rosto.
- E desde aquele dia eu disse para mim mesmo que um dia salvaria vidas. Iria ver o sorriso dos meus próprios pacientes e de suas famílias, ao tê-lo salvo. Tê-lo dado uma nova chance. No entanto, como você sabe, nunca fui capaz disso. Com exceção da residência que fiz ao terminar a faculdade, e que, sinceramente, foi o ano mais feliz da minha vida. – suspirou nostálgico. – Bom, eu tenho um melhor amigo e seu nome é James. Nos conhecemos ainda no colégio e hoje o considero um irmão, aquela pessoa que você pode contar toda a hora, sabe? – assentiu com os olhos fechados. Jane veio a sua mente quase que imediatamente. – Tenho uma princesinha como afilhada, e é que um dos grandes amores da minha vida. A filha do Joshua, sabe? – ela assentiu. – Ele e sua esposa são grandes amigos, também. Luto boxe desde que comecei a faculdade e é uma das coisas que me dá mais prazer. – A garota arregalou os olhos, surpresa. – Já tive um cachorro que viveu por doze anos, e quando ele morreu, foi uma das maiores dores que já senti na vida. – deu os ombros e ela fechou o sorriso, olhando-o triste. – O nome dele era Elvis, por mais estranho que soe.
- Elvis?! – disse incrédula, dando um tapa fraco no braço dele, que reclamou, rindo. – Desde que quando Elvis se tornou nome para se colocar em cachorros? Ora! – riu também, mas ainda com incredulidade.
- É uma homenagem! Ouvi Elvis boa parte da minha vida, ou você acha que era a única fã em 57? Minha avó o amava. – riu, arrumando-se no capô. Ela o imitou. – Minha cor favorita é azul, por mais clichê que seja. Me traz paz. Meu filme favorito é Forrest Gamp, e que você deverá assistir, porque é... Incrível. – gesticulou com as mãos, na intenção de demonstrar a grandiosidade do que dizia. – Minha banda favorita é Nirvana, que, por acaso, não existe mais. O vocalista se suicidou há alguns anos. – suspirou triste e entreabriu os lábios. Suicídio? O que leva alguém a fazer isso? Parece tão injusto. Tão triste. – E não, eu não estou “emocionalmente” – fez aspas com os dedos – envolvido com ninguém. Bem, não ainda. – olhou-a de soslaio e a viu morder o lábio, enquanto brincava com os dedos no capô do carro. Ela sorriu, sem graça. – Prazer. – esticou a mão e ela olhou na direção. – . – brincou e ela entrou no jogo, aceitando a mão dele e balançando as duas, como se tivesse acabado de conhecê-lo. Era isso, afinal, não era? Aquele era o de verdade. Sem a máscara durona. Sem o peso do sobrenome. Aquele era só... , ou .
- Prazer. – sorriu, olhando-o nos olhos. Oh, e como eram bonitos seus olhos. Seu olhar. O brilho dele. – . – sussurrou como se fosse um segredo.
- E você acaba de chegar ao ponto em que eu queria: quem é ? – ela entreabriu os lábios para dizer algo, mas ele a interrompeu. – Não a filha do presidente dos Estados Unidos no ano de 1957. Não a garota que foi acusada de ser o motivo da terceira guerra mundial. Não a mulher que foi cobaia do experimento Ironm4x. Quem é a real ?
Terminou e ela não pôde deixar de sorrir encantada. “A garota” em 1957. E “a mulher” atualmente. Haviam se passado cinquenta e oito anos, mas foram nulos para ela. Com isso, se tornar mais madura era algo praticamente impossível... Mas ele havia percebido. Apesar de não conhecê-lo nos anos cinquenta, havia notado sua mudança. E ele não poderia estar mais certo.
- ... – umedeceu os lábios, olhando para frente. Ela riu, balançando a cabeça. Era como . A primeira coisa a vir à sua cabeça era: a filha do presidente dos Estados Unidos. A rebelde da América. A causa da terceira guerra mundial. O experimento do futuro. – Oh, é difícil. – sorriu, virando-se para encará-lo. Ele estava sério, mas não como se estivesse bravo, mas sim, como se a observasse com cuidado. – A de hoje ou a de 57?
- A . Só.
- Uh. – suspirou, parecendo pensar um pouco. – A de verdade é complicada. Dona de si, independente, detesta seguir regras, não tem medo de dizer o que pensa, mas... Ao mesmo tempo é tão sensível. – riu, olhando para baixo. Ela ergueu a cabeça novamente e encontrou os olhos dele. – Acho que só por fora sou tão “forte”, sabe. Tento mostrar ser essa pessoa que não cai nunca, que não tem medo de nada, mas no fundo, eu sou só uma garota. – deu os ombros. – Ou era. – respirou fundo, desfazendo-se do sorriso. – Para os repórteres e fotógrafos eu era a garota birrenta, rebelde sem causa, vergonha da América... Para meus amigos, a engraçada e durona . Meu pai sempre me viu como sua garotinha, mas que sabia muito bem o que queria e devia controlar mais a boca. “ , você não deveria ter dito aquilo!” – imitou uma voz masculina e riu. – Para o meu noivo, eu... Eu não faço ideia de quem era. – deu os ombros, tentando arruar as palavras certas. – Talvez fosse um mistério a ser desvendado. Ele sempre foi o pacifico, o mais calmo... Eu o assustava certas vezes. Mas com ele eu conseguia mostrar um pouco mais do meu lado “menininha”. – riu sem humor. – Adam era bem compreensível, para falar a verdade.
- E a ? Essa que está aqui na minha frente, você era para quem? – questionou. A garota entortou o lábio, como se dissesse que não estava entendendo. – Quem via todas essas suas facetas? A vergonha da América, a durona, a engraçada, a decidida, o mistério, a menininha... Quem enxergava todos estes lados? Os lados da verdadeira ?
- Ninguém, . – disse, com pesar na voz. Oh, céus. tinha razão: quem a conhecia por completo? Ninguém. – E isso é muito errado, não é?
- Você está errada. Eu conheço. – sorriu, sem mostrar os dentes. – Já conheci todas essas s. Desde me entendo por gente, sempre ouvi falar da vergonha da América. Durante esses meses no Ministério você mostrou o tão durona poderia ser, enfrentando tudo e todos de cabeça erguida. Era engraçada com quem te dava espaço... Quantas vezes já ouvi as gargalhadas de Eva em suas consultas? – a garota mordeu o lábio, sentindo os olhos marejarem. – E, cacete, o quão decidida você é?! – ambos riram. – Quando coloca algo na cabeça, não há quem tire. E, bem, acho que passei a conhecer seu lado “menininha” hoje. – sussurrou, erguendo uma das mãos e passando o dedo polegar na bochecha dela, secando a lágrima solitária que caíra. – Quanto ao mistério... Você continua sendo um para mim.
- Sou?
- Você não tem ideia do quanto. – sorriu abertamente, colocando sua mão apoiada no próprio joelho.
- Por trás de todo mistério há uma causa. Os grandes tesouros são os mais difíceis de serem desvendados, não é? O mistério é sempre maior. – cruzou os braços, suspirando.
- Não podia estar mais certa. – concordou, assentindo. – Mas, você se esqueceu de algumas ’s. – alertou e ela ergueu uma das sobrancelhas, curiosa. – A emotiva, que é tão fácil de chorar. – esticou o lábio inferior, como um bico. Ela riu, fungando. – A solidária, que é capaz de dar sua própria liberdade em troca da de um amigo. A moleca que conquista a todos a sua volta, mesmo quando era para ser a prisioneira do lugar. A persuasiva... Oh, e como é! – balançou a cabeça, sem graça. Estava emocionada de novo. – Tem opinião formada, e ai de quem queira contrariá-la. Luta pelo que é certo até suas forças acabarem. E, ora, você se disse forte agora a pouco, mas não citou ninguém que lhe via assim. Como?! Essa é, sem dúvidas, uma das suas maiores qualidades, se não a maior. Você é a pessoa mais forte que tive o prazer de conhecer em toda a vida.
(Play!)
sentiu o peito encher-se e sentiu o coração acelerar absurdamente, naquele momento. As palavras de , junto da noite maravilhosa... Tudo parecia tão fascinante. Ela fechou os olhos por pouquíssimos segundos e respirou fundo, soltando o ar devagar pela boca, logo em seguida. Se há horas, ela já estava confusa. Agora então, era impossível saber o que estava se estava passando por sua cabeça e coração. Este novo , que agora lhe olhava tão atento... Oh, esse . A única certeza que tinha agora era que tudo o que pensava sobre ele havia desmoronado, havia virado pó. Ela não conseguia mais sentir raiva, quanto mais odiá-lo. Ao contrário, naquele segundo só queria poder abraçá-lo e continuar ali por... Ao menos mais cinquenta e oito anos.
- Eu...
- E tenho certeza de que ainda há muitas mais s a serem descobertas aí. – a interrompeu. – E que eu, certamente, quero conhecê-las. Todas. – deu ênfase na última palavra, olhando-a intensamente. Ele se aproximou, virando-se completamente para observá-la.
- Eu devo dizer algo agora? Porque, sinceramente, eu não saberia o quê.
- Sabe – umedeceu os lábios, colocando a mão direita no capô do carro, apoiando-se –, em 1957 eu não sei... Mas, atualmente, quando se faltam as palavras... Há outra forma de se expressar. – se aproximou enquanto dizia, parando há milímetros de seu rosto.
- Me mostre. Mostre que... – sussurrou, mas foi interrompida por ele.
- Shh. – encostou os lábios nos dela, num selinho demorado.
Ele sorriu fraco e roçou o nariz no dela lentamente. Somente sentindo seu hálito quente e ofegante. Institivamente, levou a mão direita à sua nuca, acariciando-a e puxando seu rosto para si, beijando-o finalmente. Seus lábios se entreabriram e ao sentir a língua dele invadi-la, seu coração voltou a acelerar. Agora ainda mais do que há dois dias. Mais do que há cinquenta e oito anos. abraçou sua cintura, colando seu corpo ao dela. Seus corpos se arrepiaram e ele subiu uma das mãos para os cabelos dela, puxando-os suavemente. A garota mordeu seu lábio e o puxou, soltando um suspiro.
Apesar de ser o terceiro beijo, eles já sentiam que conheciam aquilo como ninguém. Era como uma coreografia bem ensaiada. já havia beijado dezenas mulheres durante a vida, mas era como se jamais nenhum houvesse sido tão agradável quanto àquele. Ele queria mais. Queria beijá-la a todo momento, todos os dias. Queria estar com ela.
Já para , era o segundo homem que beijava, no entanto, parecia ser o primeiro. O frio na barriga, as mãos suadas e o coração acelerado de uma garota insegura estavam presentes a todo o momento. Sempre parecia pouco demais, inexperiente demais. a puxou ainda mais e seu quadril escorregou no carro, fazendo com que os dois rissem. Ele colocou o corpo sob o dela, ainda beijando-a. queria parar, mas sabia que não conseguiria. Nem o ar era tão necessário àquela hora. Não se tratava de algo carnal ali, eles sabiam que não passariam de beijos, mas, no momento, já era o suficiente.
Um barulho alto soou longe eles se separaram, no susto. Ao ver o que era, riu, sentando-se no carro e ajudando a fazer o mesmo. A queima de fogos havia começado, e estava mais linda do que imaginara.
- Uma segunda chance. – disse, com todas as intenções possíveis. Referindo-se à uma segunda chance para viver, descobrir-se. Uma segunda chance de fazer diferente. Uma segunda chance para... . Ele sorriu de lado, ainda olhando para frente.
- Não a desperdice. – aconselhou, olhando-a de soslaio.
- Sabe, ... – começou, chamando a atenção dele. – É muito errado pensar que esse possa talvez ser um dos melhores aniversários que já tive? Sabe, sem toda aquela pomba de exército e sua representação, uma festa regada a comidas sofisticadas e músicas tediosas. – perguntou com certa inocência e o outro não pôde deixar de sorrir. – Quando vão entender que para um dia ser importante não é necessário gastar não sei quantos mil dólares em comemorações para os outros? Ora, é o nosso dia. Todos os meus aniversários foram impecáveis, e para quê? Para eu manter aquele sorriso congelado no rosto durante toda a festa, agradando a todos os convidados, quando na verdade só queria deitar em minha cama e assistir a um bom filme. E não sei se hoje também é assim, mas os malditos ainda saíam falando mal! Não é ridículo?! – riu, incrédula. – O quão lindo isso é? – apontou para frente, onde os fogos coloriam o céu escuro. – E é só para mim. Ninguém sairá falando mal, eu não preciso forçar estar contente, porque realmente estou. Quem não estaria em ver algo tão bonito quanto isso, afinal? – deu os ombros, rindo. – A noite está incrível, e por mais impossível que pareça, eu passei um dia ótimo no Ministério. Só faltaria uma coisa para se tornar perfe...
- Seu noivo? – interrompeu-a. As duas palavras que falou inflaram seu pulmão, deixando-o ofegante. Por que era difícil dizer aquilo? Não deveria incomodar, deveria? Ela estava mais do que certa em desejar o noivo ali, em seu aniversário. sentiu vontade de rir, mas não por felicidade. Nervoso, talvez. E ele nem sabia o motivo.
- Também. – sorriu fraco, balançando os pés, como uma criança inquieta. – Mas meu pai, principalmente. Jane, Max, Louise... Peter. – seu sorriso aumentou.
- Todos, menos eu, não é?
- Jura?
- Oi? – franziu o cenho, voltando a encará-la.
- Você ficou ofendido?! – riu, achando aquela uma das situações mais divertida e fofa que já havia presenciado. – Não seja tão duro consigo mesmo, . Ora, você às vezes é até suportável. – brincou, dando um soquinho no ombro do outro, que riu, balançando a cabeça.
- Você é inacreditável, . – continuou rindo.
- Eu sei. Agora, shh. Quero aproveitar os últimos minutos da queima de fogos e do meu aniversário, com licença? – fingiu superioridade, sorrindo enquanto olhava para frente. Os fogos, que agora estavam no fim, pareciam ainda mais coloridos e em maior proporção.
- Toda, senhorita . – sorriu, olhando-a. Ela continuava encarando o horizonte os fogos, mais precisamente. Mas ele não se importava, observá-la era o bastante. Era o bastante para que pudesse dormir aquela noite em paz. O bastante para que se desse conta de que estava num jogo perdido contra si mesmo.

Em poucos minutos e os fogos acabaram. continuou observando o horizonte, agora com resquícios de fumaça, e a observando.
- Obrigada. – sussurrou, sem brincadeiras, sarcasmo ou qualquer outra figura de linguagem.
- Por ter te libertado por essas horas?
- Não só por isso. – sorriu, virando o rosto para olhá-lo nos olhos. – Você me deu o aniversário que ninguém jamais foi capaz de pensar. Em três meses, você me conhece mais do que meu próprio noivo ou amigos. Eu só queria isso.
- Fico feliz em ter acertado. – escorregou no capô, ficando em pé e esticando a mão para ela. – Vamos?
- De volta para casa. – rolou os olhos, como uma adolescente emburrada com os pais. Ambos riram.
- Quem sabe não possamos fugir às vezes assim, de novo? – sugeriu, vendo-a arregalar os olhos, animada. – Mas, vamos, está tarde. – deu a volta no carro, abrindo a porta para que ela entrasse e ela o fez. entrou no veículo também e ligou o motor, guiando para o Ministério.

Durante o caminho, os dois foram conversando sobre assuntos aleatórios. Como o quão irritante Franz conseguia ser, ou como Eva podia ser tão persuasiva certas vezes. fazia questão de encarar a janela todo o tempo apesar de ser tarde, algumas pessoas ainda estavam na rua e ela não cansava de ver o quão diferentes e únicas eram. Personalidades formadas. E, de repente, o fato veio à sua cabeça: ela era exatamente como aquelas garotas. Tinha vontade de ser diferente, necessidade de se mostrar alheia às regras idiotas impostas por pessoas mais idiotas ainda. Sentia-se muito à frente de sua época. Talvez ela devesse pertencer a este século. A esta década.
Pouco depois, eles chegaram ao Ministério. estacionou seu carro e, por incrível que pareça, a garota não sentiu aquele aperto no coração que costumava sentir ao observar os altos muros do Ministério. Era como estar em casa, realmente. Só não sabia se devia ficar feliz por isso, ou não.
abriu a porta principal e ambos entraram. Ele a levou ao corredor de seu cômodo e parou de andar, colocando as mãos nos bolsos da calça jeans.
- Obrigada por esta noite, . Só... Obrigada. – balançou a cabeça, vendo-o assentir enquanto dava um daqueles seus sorrisos misteriosos. – O que foi? – riu.
- Talvez tenhamos que te dar férias de seu treinamento para começarmos outros, com outra pessoa. – ela franziu o cenho e fechou o sorriso. Do que ele estava falando? – Ou você acha que Peter será capaz de viver no mundo lá fora sem algum treinamento? – sorriu de lado, erguendo a sobrancelha.
- Você... – entreabriu os lábios, no entanto, não conseguiu continuar. – ... – gaguejou, sentindo os olhos encherem-se de lágrimas.
- Assim que estiver preparado para ir, ele tem sua carta de alforria. Peter está livre. – deu os ombros, vendo a garota levar uma das mãos à boca, segurando o choro emocionado. – Feliz aniversário, .


Capítulo XV


(Música do capítulo: Never Alone - BarlowGirl. Play quando eu avisar!)

balançou a cabeça negativamente repetidas vezes, ainda sem conseguir acreditar no que havia dito. Ela olhou para ele, sugestiva, ainda com a mão na boca, como se perguntasse se estava falando sério, e ele assentiu com o sorriso aberto que era o único a conseguir dar. Algumas lágrimas escorreram pelos olhos de , que os apertou.
Sentia-se responsável por aquele homem desde que acordara no Ministério e descobrira quem ele era. Sabia o quanto Louise o desejava e já o amava. E, bem, Louise era como sua mãe, o que a tornava uma quase irmã de Peter, mesmo que ele aparentasse ser bem mais velho. Peter jamais havia vivido e agora teria esta oportunidade. Iria conhecer novas pessoas, formar amizades. Quem sabe até conheceria alguém e se apaixonaria? Trabalharia? Seria um homem como todos os outros? Nunca era tarde para recomeçar ou, no caso de Peter, começar.
Após um longo suspiro de alívio, pulou nos braços de , abraçando-o com todas as forças que tinha em si. Ele retribuiu, abraçando sua cintura e enterrando o rosto no pescoço da garota, inspirando seu perfume natural. O abraço continuou e chorou ainda mais ali, encharcando a jaqueta do outro. Mas agora, já não sabia mais se o choro era somente pela libertação de Peter. Havia outro motivo, ela só não sabia qual. Ou sabia, mas não queria deixar-se acreditar.
acariciou sua cintura, como se a consolasse e o choro foi cessando. Ela fechou os olhos, mordendo o lábio. O quão protegida se sentia ali, nos braços do homem que há meses era o causador de seu medo. Ele trouxera toda a insegurança que tinha levado há meses.
- Se eu soubesse – começou, assustando-a. Ela abriu os olhos, voltando à realidade. A respiração dele à medida que falava a fez se arrepiar – que fosse chorar dessa forma, não teria dito nada. – sorriu, afastando-se. – Era pra ser uma boa notícia.
- Idiota. – riu, fungando e secando o rosto. – É uma ótima notícia! É, definitivamente, o melhor presente de aniversário que eu poderia ganhar. Definitivamente. – repetiu, dando ênfase.
- E o que você está esperando para correr e ir contar para seu amigo? Ele irá ficar feliz também, não?
- Você tá brincando?! – riu, incrédula. – É capaz de ele desmaiar! – exagerou, sorrindo animada.
- Devo ficar aqui para caso isso aconteça? – entrou na brincadeira, sorrindo.
- Acho que não será necessário, mas agradeço. – disse, parando alguns segundos para observá-lo. E, Deus, como ele conseguia ficar ainda mais atraente a cada vez que ela o olhava? – Bom - suspirou, voltando a si –, eu já vou. Peter vai pirar! – comemorou, rindo. – Até amanhã, .
- Amanhã talvez eu não venha... – murmurou, vendo-a virar-se de costas. Ela franziu o cenho, voltando a encará-lo. – Assuntos pendentes. – deu os ombros, vendo-a fechar o sorriso por alguns segundos.
engoliu em seco, analisando-o, tentando encontrar a razão pela qual ele não iria. Por que ela se preocupava tanto, afinal? Era só um dia. Ele iria resolver seus assuntos. Com os amigos, a família ou... Com quem quer que fosse. Ela não se importava. Não deveria se importar.
- Hm, tudo bem. Até logo, então. – sorriu, ou ao menos tentou. – Ah, meu Deus, eu tenho que ir contar para Peter! – lembrou-se, sorrindo verdadeiramente.
- Depois vou querer saber de todos os detalhes. – avisou, vendo-a assentir e correr corredor à dentro, pedindo para que um de seus homens abrisse a porta. Ele não pôde deixar de sorrir, vendo-a tão saltitante. Sua felicidade lhe dava uma sensação de... Alegria. Seu sorriso era contagiante. Sua risada era viciante e sua alegria então... jamais sonhou em ver algo tão belo quanto era ver feliz. Nem Danna, sua primeira paixão - a garota de programa que lhe tirou a virgindade aos 14 anos - nua, em sua frente pela primeira vez, conseguia chegar perto da beleza que era a animação de . E ele não deveria sentir-se assim, não era? O que sua avó diria sobre? A mulher que lhe criara com tanto amor, carinho, morais e educação. O que ela diria do neto estar se apaixonando pela mulher que, segundo ela, havia destruído sua família?
No momento, não ligava para o que a avó ou qualquer pessoa falaria. Era tarde demais para enganar-se a si mesmo. o havia conquistado de todas as formas possíveis, e era irrevogável.
Àquela hora, a garota já devia ter contado a novidade para Peter, e ele daria tudo para vê-la chegar estonteante em seu quarto, falando tudo, desde o início da noite até a notícia que alegraria a vida daquele pobre homem. O que seu pai falaria de tal atitude, entretanto? Ele havia soltado o homem que passara toda a vida preso ali. Tomara conhecimento de sua existência há poucos meses e ficara abismado com como seu avô tivera coragem em manter uma criança presa, sozinha, num porão escuro. Segundo o pai, ele estava ali porque sentiram pena ao ver o bebê recém-nascido e matá-lo. não encontrava o bem que fizeram ali, contudo. E, quando lhe fez aquele pedido, ele já tinha tomado sua decisão. Era tarde, mas ainda havia tempo. O homem poderia, finalmente, ter uma vida e ele se sentia realizado por poder lhe dar esta oportunidade. Era isso o que sempre sonhara, não era? Salvar vidas. Dar uma segunda chance as pessoas. Por que não uma primeira?
E, de bônus, ganhar o eterno agradecimento de . A alegria dela. A felicidade que o fazia feliz também.

- Peter, Peter! – chamou, fechando a porta atrás de si. – Oh, céus. – rolou os olhos, ao vê-lo resmungar enquanto dormia. – Acorde, homem! Anda! – riu, o cutucando.
- O que aconteceu? – disse, ainda meio sonolento, enquanto se sentava. – Oh, você está com outras roupas! – reparou e ela sorriu, dando uma volta para que ele pudesse enxergar toda a roupa.
- Estou! Mas isso é o de menos. Está sentindo esse cheiro? – ele fungou, arregalando os olhos, logo após.
- O Ministério está pegando fogo?! – se levantou depressa, assustado. A garota gargalhou, jogando a cabeça para trás. De onde havia vindo tanta felicidade assim?
- Claro que não! Que ideia! – riu, balançando a cabeça. – É cheiro de liberdade, Peter. Liberdade. L-i-b-e-r-d-a-d-e. – soletrou, vendo-o franzir o cenho, extremamente confuso.
- Liberdade do quê? De quem?
- Liberdade do Ministério. A sua liberdade, meu amigo. – sorriu emocionada, sentindo as lágrimas voltarem a surgir no canto de seus olhos. Dizer aquelas palavras era maravilhoso.
- Como? Eu acho que não entendi...
- Entendeu. Entendeu, sim. – afirmou, se aproximando dele. – Você está livre, Peter. Digo, depois de alguns treinamentos para se adaptar lá fora... Você tem carta branca para ir aonde quiser. – sorriu, colocando as mãos nos ombros do homem que estava atônito.
- Você está brincando, não está? – ela negou, mordendo o lábio. – , eu não vou fugir... Estou velho demais para isso.
- E quem aqui falou em fugir? – jogou as mãos para o alto. – Estou falando de liberdade, em todos os sentidos. Sair pelas portas do Ministério com a cabeça erguida e aplaudido.
- Com o aval de quem? – questionou, ainda sem acreditar.
- O herdeiro de tudo isso. – colocou as mãos na cintura, sorrindo. – .
Peter fitou o chão, respirando fundo. Algumas lágrimas brotaram em seus olhos, e só então se deu conta de há quanto tempo não chorava. Mais de vinte anos, com certeza. Ele ainda não acreditava no que ela dizia, talvez houvesse enlouquecido... Mas somente as palavras saindo de seus lábios já foram o suficiente para que seu coração se aquecesse.
- ...
- Peter, olhe para mim. – pediu, agora séria. Ele o fez. – Eu jamais mentiria a você. Desde que te conheci e você se identificou, eu me senti totalmente responsável por você. Tudo bem, hoje eu sei que mesmo que não tivesse dado declaração nenhuma à imprensa, a guerra teria acontecido de todo o jeito, mas... Por ser a única sobrevivente daquela família, a nossa família, eu sinto como se você fosse meu irmão. Você se tornou o meu irmão. – sua voz embargou e ela respirou fundo, contendo-se. – Você me acolheu e foi o meu primeiro amigo aqui. Me aconselhou e me ouviu quando mais precisei. Me ajudou mesmo sem saber nem quem eu era direito. – sorriu, dando os ombros. – Você realmente acha que eu mentiria ou te enganaria?
- É claro que não, mas... – sussurrou, passando as costas das mãos nos olhos. – Eu só não consigo entender.
- Há alguns dias eu estava conversando com e... Bem, eu não conseguia entender porque eles ainda te mantêm preso aqui. Ora, qual é o fundamento?! – riu, sem humor. – Então pedi para que ele te libertasse...
- Você não...
- E hoje ele deu a resposta. – o interrompeu. – Me deu o melhor presente de aniversário que eu poderia ganhar. A sua liberdade. Há alguns minutos, nesse mesmo corredor, ele me disse, Peter. – mordeu o lábio, vendo-o virar-se de costas e o choro antes silencioso, tomar mais proporções. – Você está livre, pequeno. – sussurrou, com a voz trêmula, lembrando-se de quando “conversava” com o bebê, ainda na barriga da mãe.
- Não pode ser. – balançou a cabeça em negação, ainda encarando a parede. tocou em seu ombro. – Não pode ser, ... São 58 anos aqui. Minha vida inteira foi aqui. Não pode ser verdade. – disse baixo, com a voz embargada. – Qual o propósito de me deixarem sair?
- É verdade. – sussurrou, vendo-o se virar. Ela sorriu, secando o rosto. – Por incrível que pareça, e acredite, estou tão surpresa quanto você ao dizer isso: não é como seu avô e pai. é... – procurou as palavras, no entanto, não as encontrou. – Ele somente achou que é a hora disso. Já passou da hora, convenhamos. – riu fraco. – Não questione o bem, Peter. Somente agradeça.
- E eu devo agradecer a quem? A ele, ou a você? – sorriu, finalmente acreditando naquilo.
- A ele. – disse, sorrindo somente com os olhos. – Agradeça a . – disse, lembrando-se de horas atrás. Peter a surpreendeu com um abraço e ela o retribuiu, sorrindo verdadeiramente.
- Mas como? Como vou sair daqui e viver sozinho? Eu não conheço nada, não sei como interagir com outras pessoas, não sei trabalhar, não... – a metralhou de perguntas e ela voltou a rir, secando o canto dos olhos com as costas das mãos.
- Não se preocupe. Eles vão te ajudar com tudo!
- Oh, Deus! Eu não sei nem o que pensar. – riu, estonteante.
- Você está feliz, não está?
- Está brincando? É o dia mais feliz de toda a minha existência! – gesticulou com as mãos, dando o sorriso mais aberto e animado que já vira alguém dar.
- Isso é tudo que eu precisava ouvir. – sorriu fraco, passando a mão nos cabelos ralos do homem.
Era tudo o que ela precisava ouvir para saber que valera a pena trocar sua liberdade pela dele. Porque tinha certeza, apesar do dia de hoje, não havia se esquecido da promessa dela ao pedir a liberdade de Peter. Ela continuaria no Ministério pelo resto da vida, contudo, estava feliz com a escolha. Algo lhe dizia que os próximos meses ou anos que ainda teria, não seriam os piores de sua vida. Não se continuasse ali para infernizá-la... Ou beijá-la.

deu quatro socos seguidos no saco de boxe à sua frente, pendurado no teto da sala da academia que fazia. James assistia a cena enquanto erguia um supino, rindo. não deixou de sorrir. O suor já escorria descontroladamente por sua pele, fazendo sua vista embaçar. Ele deu um chute no saco, batendo com o joelho e murmurando um palavrão. James gargalhou, largando o supino no chão e pegando suas garrafas de água.
- Isso não são socos de quem está querendo descontar em alguém. – James continuou rindo, olhando-o sugestivamente. Se aproximando do amigo. – Mas como se quisesse extravasar algo... Vamos lá, filho da puta. Me fala! – entregou a garrafa de água para o outro, que a abriu e tomou boa parte do liquido prontamente, ganhando tempo.
- O que está querendo insinuar? – desviou o olhar, pegando sua toalha apoiada na barra. – Não estou entendendo. – secou o rosto, escondendo o riso frouxo atrás da pequena toalha.
- ... - começou, encarando-o incrédulo. – Eu te conheço a mais de dez anos. – o acompanhou na saída da sala. entrou no vestiário, tirando a camisa. – Não tenta fugir, imbecil. – riu, vendo-o entrar num dos boxes. – Cacete, ! – reclamou, tirando suas próprias roupas e entrando no box ao lado.
- Você tá pior do que aquelas tias fofoqueiras, cara. – zombou, enquanto passava shampoo no cabelo. James ergueu um dos braços no box, lhe mostrando o dedo do meio e gargalhou. Gargalhou não por achar aquilo extremamente engraçado. Gargalhou por sentir vontade de gargalhar. Gargalhou por sentir uma imensa vontade de sorrir, de rir, de ser feliz desde o dia em que havia colocado os lábios nos de .

O resto do banho de ambos foi em silêncio, já que outros homens haviam chegado ao vestiário da academia. se trocou dentro do box mesmo, colocando uma camisa regatas azul escuro e uma calça jeans com a lavagem clara. Menos de um minuto depois, James também saiu do box já vestido. Eles se entreolharam enquanto andavam saindo da academia, com uma imensa de rir e o amigo encarando-o com um olhar quase mortal.
- Aqueles socos não eram de “eu preciso descontar meu ódio agora”. Mas sim de “porra, isso está acontecendo mesmo?”. Eu te conheço mais do que a mim mesmo, ! – James disse óbvio, enquanto entrava no carro.
- E qual é seu palpite? – questionou, colocando o cinto de segurança e ligando o motor.
- Algo que me diz que tem algo a ver com .
- Bom palpite. – assentiu, sorrindo misterioso. James rolou os olhos.
- Você me estressa, . Estou quase voltando pra aquela academia para colar uma foto sua no saco de boxe e socá-lo até despencar. – gesticulou com as mãos e riu, pela última vez, dando-se por vencido.
Esperou alguns minutos, pensando nas palavras certas para usar. Respirou fundo diversas vezes, vendo a impaciência do amigo.
- Nós nos beijamos. – sorriu fraco, ouvindo a surpresa do amigo. Suspirou, vendo-o rir. Ele devia imaginar. – Meu orgulho foi pra casa do caralho. – riu de si mesmo, vendo o portão de sua garagem abrindo. – E minha sanidade também. – estacionou, desligando o carro e saindo do mesmo, batendo a porta com uma força desnecessária. Admitir aquilo fora mais difícil do que imaginara.
- Há mais do que você podia imaginar, não é? – adivinhou, seguindo-o nas escadas. abriu a porta de sua casa e colocou sua carteira e chaves na mesa logo após foi até sua cozinha e buscou cerveja gelada na geladeira. Ele trouxe duas, oferecendo uma ao amigo.
- Admitir é a parte mais difícil. – deu os ombros, abrindo sua latinha e dando um generoso gole na mesma. – Vai além da minha capacidade de entendimento. – jogou-se em seu próprio sofá, suspirando longamente.
- Sentiu borboletas no estômago, ? – James zombou, sentando-se no lado oposto do sofá. riu da desgraça de si mesmo. Há dois anos era ele quem zombava do amigo apaixonado, dizendo exatamente aquela frase.
- Borboletas, elefantes, dinossauros. – deu outro gole em sua cerveja, encarando a televisão desligada em sua frente. – Antes fossem somente animaizinhos no estômago. São arrepios pelo corpo inteiro, como um porco espinho. Coração acelerado a quase ponto de saltar do peito. Boca seca como se estivesse passado um ano inteiro no Saara. Suor de duas aulas seguidas de boxe. Nervoso como se estivesse a ponto de perder minha virgindade. – terminou e James abriu a boca para dizer algo, mas ele o interrompeu. – Não diga o óbvio. Eu sei. – assentiu, virando-se para encarar o amigo, que sorria.
- Eu disse que você saberia quando sentisse! – riu, colocando sua cerveja no móvel e batendo uma mão na outra, como se fosse aplaudi-lo.
- Se você a conhecesse também sentiria isso. Ela conquistou a todos, eu juro.
- Dessa forma? Ou como uma filha, amiga...?
- Eu não pude evitar. – deu os ombros, desviando o assunto. – Como eu tentei, James. Como! – riu sem humor. – Saí com outras mulheres, incluindo Kyara. Viajei por uma semana na tentativa de me distrair, e só conseguia pensar nela e em como ela estava. Passei duas noites em claro assistindo a malditos vídeos dela nos anos cinquenta, feliz e espontânea como eu jamais tinha visto. De repente, eu queria vê-la daquele jeito na minha frente, entende? Queria fazê-la feliz daquele jeito. Porra, você não tem noção do quão deliciosa é a risada daquela mulher. – balançou a cabeça, rindo. James sorriu, prestando atenção no amigo. – Eu precisava saber se era só um capricho meu ou... Algo mais. A beijei no sábado e foi a única coisa que eu precisava para comprovar como estava errado. Ou certo, depende do ponto de vista.
- foi fisgado. – laçou uma corda imaginaria no amigo, que riu angustiado, com os olhos fechados e as sobrancelhas juntas. Oh, ele estava ferrado... Muito ferrado. – E o que mais? – questionou, chamando a atenção do outro novamente. – Ora, não foi só um beijo que te deixou assim!
- Não transamos, se é o que quer saber. Não que eu não quisesse... Demais. Mas, ainda não. Nós só... – olhou-o desconfiado. – Se você rir ou zombar, eu te mato. – apontou, já vendo o amigo segurar o riso. – Conversamos. Só conversamos, e acredite se quiser, foi o bastante para aquele momento. Ontem foi seu aniversário e a levei para fora do Ministério, finalmente. – James arregalou os olhos, surpreso. – Fomos num lugar bacana e conversamos, nos beijamos... E foi suficiente. Era como se não houvesse história nenhuma no fundo, sabe? Não havia os anos cinquenta, a terceira guerra, a Ironm4x, a briga de famílias e países... Éramos somente dois adultos nos conhecendo. – constatou, sorrindo no final. – Ela é diferente. – aproveitou o espaço que o amigo lhe dera para continuar desabafando. – Talvez seja a influência dos anos cinquenta, ou talvez seja só sua personalidade. Ela tem uma inocência e ingenuidade fora do normal, que me deixa louco. Mas, ao mesmo tempo, é como se fosse mais madura que todas as pessoas que eu conheço, juntos. Uma sensualidade inconsciente no olhar, no sorriso e nos gestos... – sorriu, inconscientemente também. – Ela me atrai em todos os sentidos da palavra. Mulher nenhuma jamais chegou perto de me fazer sentir o que ela faz. E ela já me deu um tapa na cara! – disse, incrédulo consigo mesmo. – Dizer tudo isso me fez bem pra caralho. – admitiu, jogando a cabeça para trás, encostando-a no sofá.
- Você não gosta dela, . – o amigo o olhou, confuso. – Você não só gosta dela. – corrigiu-se. – Você está apaixonado. Perdida e fodidamente apaixonado.
mordeu o lábio, olhando para frente e encarando o horizonte. E, novamente, seu amigo não podia estar mais certo. Agradecera mentalmente por não ter tido que falar as palavras com sua própria voz.

(Play!)
- Por que você não vem logo, sua vaca? – Jane reclamou, enquanto ria descontroladamente. a encarou incrédula e lhe mostrou o dedo do meio, correndo até a amiga.
- Não se pode mais nem nadar em paz!? – sorriu, pegando um morango do prato que estava sob a toalha estendida na grama do lago.
Era o verão de 1959. Já fazia cinco meses desde que a Guerra havia terminado, e o melhor: com a rendição da Alemanha. Foram quase dois anos de batalhas intermináveis, milhares de mortes de inocentes, cidades e países devastados. Mas agora estava tudo bem. Tudo estava na mais perfeita paz. já havia sido perdoada pela sociedade, e hoje era voluntária numa associação destinada à desolados pela Guerra. Crianças que haviam virado órfãs, famílias que estavam sem moradia e afins. Ela jamais se sentira tão bem quanto naquele momento, fazendo o bem. Ajudando-os. Não podia ser considerada a "queridinha da América", mas sem dúvidas estava perto.
Seu pai já não era mais o presidente, mas ela não se importava. Pelo contrário. O atual era tão bom e honesto quanto ele. Contudo, os holofotes continuavam em sua família. Não havia como fugir dos fotógrafos e repórteres, afinal. Eles a perseguiriam pelo resto da vida, ela sempre seria a "queridinha" deles. Com ênfase no sarcasmo, era óbvio.
- Dois dias...! Dá pra acreditar, amiga? Em dois dias você será uma mulher casada. – Jane disse e sorriu, balançando a cabeça em negação. – Evans... Soa bem. Não tanto quanto Presley, mas dá pro gasto. – deu os ombros. Ambas gargalharam.
- Eu ouvi isso! – Adam disse, assustando as duas, e sentando-se ao lado da noiva. Ao olhá-lo, sentiu o coração apertar inconscientemente, mas não soube o porquê. Era como se ela não o visse há anos. – Max, situe sua mulher, por favor. – pediu, vendo-o rir e dar um selinho em Jane, sentando-se também.
- Ouça, Adam, amor. Você não quer irritar o homem que acabou com metade do exército alemão, quer? – exagerou. Adam ergueu a mão, para que o outro batesse. Um hi-5. sorriu orgulhosa, mas ao mesmo tempo, saudosa. Era como se ela ao menos estivesse ali, não conseguia dizer nada. Sorrir era o suficiente. Observá-los era.
- Que homem perigoso! Tem certeza de quer se casar com ele, amiga? – riu, encostando a cabeça no ombro do namorado.
- É lógico que tem. Eu sou o melhor! – piscou para a noiva e ela assentiu, tocando em seu rosto. – Oh, merda. – xingou, ao ver um cachorro vira-lata aproximar-se. –Xo! – abanou-o com a mão, na tentativa de espantá-lo.
- Odeio essa sua ignorância com animais, Adam. – Jane disse, levantando-se e indo até o cachorro e acariciando sua cabeça. – Você pode ir embora, por favor, amiguinho? – pediu e se levantou involuntariamente. Oh, aquela era uma das coisas que não gostava em Adam. Enquanto ela amava perdidamente os animais, ele odiava.
- Ele não é um humano para entender, Jane. – zombou, esticando a mão para que a tocasse, ela o fez, mesmo contrariada. – Você está deslumbrante hoje, querida. – sorriu abertamente e ela não pôde deixar de imitá-lo.
- Minha amiga está sempre deslumbrante. Afinal, ela puxou para mim. – Jane deu os ombros, convencida. Max riu da namorada, enquanto a puxava para seu colo.
- Você é deslumbrante, minha linda. – disse, segurando sua mão. voltou a sentar-se, encarando o casal de melhores amigos tão apaixonados. Era encantador assistir, e ela podia passar o dia ali. De repente, ela sentiu vontade de estar daquele jeito. No entanto, ao sentir o olhar de Adam sobre si, ela virou-se para o noivo e... Não. Não era mais como antes. Não como antes da guerra, embora ainda o amasse. O rapaz tirou seu cabelo do rosto e se aproximou com os olhos fechados. Ao sentir sua respiração quente próxima à sua foi inevitável não sorrir. Quando os lábios tocaram os seus e o beijo iniciou, ela esperou a tão aguardada sensação de completude. Ela não chegou, afinal. Nem os conhecidos arrepios. Nem ao menos o coração acelerado no peito. Continuava sendo maravilhoso, encantador, apaixonante, mas não... Mágico. entreabriu os olhos por alguns instantes e a imagem de Adam ficou distorcida, após piscar algumas vezes, não foi o noivo que encontrara ali. Ela não soube se foi pelo susto, ou por ver quem estava ali realmente, mas seu coração acelerou-se como deveria ter acontecido no beijo. Seus braços e pernas se arrepiaram como deveria ter surgido. O frio na sua barriga foi constante. O que estava fazendo ali, sorrindo como só ele sabia? encarou o casal à sua frente atônita, mas eles estavam ocupados demais para ver a ilusão de ótica a poucos metros. A garota quis gritar, mas sua voz falhou. Ao sentir a mão do homem na sua, ela mordeu o lábio, segurando um sorriso. Havia sentido sua falta, mesmo sem tê-lo sequer conhecido. Ao subir o olhar, entretanto, novamente a figura havia mudado de forma. Era Adam de novo, lhe olhando tristonho. Oh, ela havia o magoado? Não. Ela não podia. Ele era seu noivo e ela o amava, não desejava estar com mais ninguém. Nem sabia o porquê de ter aparecido ali. Adam lhe sorriu tranquilamente de novo, como mágica. E num piscar de olhos, tornou-se novamente. Outro piscar. Adam. Outro. .
Toda a mudança de imagem estava a deixando zonza, e ela fechou os olhos com força. “?” disse a voz mais suave, preocupada, contudo, confusa. “!?” disse o outro tom mais forte. Soava até debochado, irônico, mas, ainda assim, também preocupado. As vozes ficaram mais altas e contínuas e ela tapou os ouvidos, dando um grito alto. Chega.


sentou-se na cama, depressa. Assustada. Ao passar a mão sob a testa, viu que estava encharcada de suor. Seu peito saltava ofegante. Ela olhou para o lado e encontrou Peter dormindo tranquilamente, e ficou feliz por isso. Ao menos não tinha o acordado. Ela umedeceu os lábios e encarou a pequena janela no alto: já estava anoitecendo. Dormir durante a tarde para passar o tempo definitivamente não era uma boa ideia.
O que aquele maldito sonho lhe queria dizer? No começo tudo parecia tão incrível, calmo, normal... Jane brincalhona como sempre. Max, o mesmo. Adam atencioso e apaixonante. Tudo parecia bem... Até ele chegar. Era isso que os faziam com sua vida, não era? A bagunçava. A garota fechou os olhos, lembrando-se do dia anterior. A vontade de chorar tomou seu peito e ela engoliu o nó que estava na garganta, respirando fundo. não era como os avós ou o pai. Não era só por carregar o sobrenome, que deveria ser o próximo Hitler. Sim, quando acordou há três meses, o via como um. E ele realmente era. Ou talvez, somente para ela. havia mudado e hoje a garota já não mais sabia distinguir seus sentimentos. Já não sabia se era mais atração. Paixão. Amargura. Seu sonho havia lhe confundido tudo. E, principalmente, lembrar-se fielmente de como Adam era. De seu olhar, seu sorriso. Seu cavalheirismo e doçura. E então havia chegado ... Passando à sua frente. Tomando seu lugar.
Oh, era isso então.
Era isso que o sonho significava. Mas não era assim... Era? Ela já não sabia mais. Seu coração aclamava por uma solução, mas seu cérebro indeciso e burro era lento demais para isso. O tempo havia de decidir. As atitudes teriam. O destino teria, e nele ela confiava cegamente.

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