Escrita por: Roby e Mah
Betada por: Natacha Mendes




[N/a’s: Coloquem para carregar “Lego House” do Ed Sheeran!]
Seu rosto podia ser comparado a uma obra de arte feita por anjos, cuidadosamente desenhado, pintado, moldado. Seu sorriso gentil mostrava sua felicidade, seu estado contente e despreocupado. Os braços cruzados em frente ao corpo, seus olhos atentos focados em mim.
Por que em mim?
Eu perguntava a mim mesmo, suposições incansáveis para tentar achar um motivo pelo qual uma garota como aquela estivesse dirigindo seu olhar justamente a mim. Mas eu não precisava de explicações concretas. Naquele momento eu só precisava falar com ela. Eu queria ouvir sua voz, ver o que ela queria. Sabendo daquilo, nada mais importaria.
— Ei. – chamei, andando até ela.
, volta! – a voz de Noah me chamava.
— Vão indo, eu já volto, ok? – respondo sem virar meu rosto para ele, com meu olhar preso diretamente no dela.
A garota sorriu de lado numa expressão divertida, desencostando da parede e caminhando de costas para mim. Sigo-a sem hesitar. Não tinha dúvidas, não tinha o que me impedisse. Eu iria falar com ela. Encontraria meus amigos depois, de algum jeito.
Éramos cinco no total. Noah, Byron, John, Will e eu viajando a Califórnia à procura de diversão. Nosso primeiro dia foi dedicado especialmente a um parque aquático local.

“Bem-Vindos ao Whater Meals”


É o que diz o letreiro da entrada. Piscando com algumas das luzes meio apagadas, mostrando talvez o tempo de funcionamento do local, que não aparenta ser pouco. Apesar disso, os brinquedos são grandes, bons e divertidos, as piscinas aquecidas, as pessoas agradáveis e as garotas maravilhosas, o que tornou a escolha muito melhor do que pensávamos que seria.
Mas ela, principalmente ela foi o que me chamou mais a atenção. Desde que eu a vi perto de um dos brinquedos, ela pareceu nos seguir pelo parque, andando entre as atrações e nos observando. Me observando.
E eu a observava do mesmo modo. Com toda certeza.
— Senhorita? – chamo, vendo-a parar atrás de uma das atrações.
— Pois não? – ela se virou de lado e me encarou.
Seus olhos me observam atentos, presos nos meus, me hipnotizando de uma maneira incrível.
— Me daria à honra de saber qual seu nome? – sorri para ela, colocando as mãos nos bolsos da bermuda molhada, me aproximando vagarosamente.
A garota me analisou de cima a baixo e sorriu, voltando a atenção aos meus olhos.
. – sua voz era firme e doce. Observei-a do mesmo modo ao qual antes ela havia feito comigo, descendo pela regata que ela usava, exibindo as alças do biquíni rosa e seu umbigo, analisando suas pernas nuas, o nó da parte de baixo do biquini nas laterais de seu quadril, seu cabelo caindo em cachos por suas costas, voltando ao seu rosto delicado novamente. — E você? Qual seu nome?
Sorri, encarando-a.
. Meu nome é . – me aproximei mais, vendo-a observar atenta cada passo meu. – O que uma garota como você faz aqui sozinha?
— Você está aqui. Não estou sozinha. – ela permanecia calma, neutra, mantendo aquele sorriso leve no canto dos lábios.
— Tem razão – ri baixo a encarando, tentando alcança-la de algum modo. – Hm, e você não gostaria de fazer alguma coisa? – pergunto, estendendo a mão.
Ela parecia me analisar num primeiro momento. Meus dedos, minha palma, meu braço, até encontrar meus olhos novamente.
— Adoraria. – ela sorri de um modo divertido, misterioso, passando por mim sem me tocar – Mas quem sabe outro dia, ? – ela murmura próxima a mim, antes de sumir.
Mas... Por que ela me observava tanto? Pagou um dia no parque aquático para não aproveitar nada? Apenas me olhar? Será que ela é da cidade ou uma turista como eu? Depois que ela sumiu, eu voltei a mim. Acabei percebendo que as minhas perguntas ainda estavam sem resposta, eu não tinha nada. Nada além de seu nome.
. Eu preciso te encontrar de novo, .

~~~~


Após finalmente encontrar os meninos, não houve mais tempo para outros brinquedos. Pegamos nossas coisas nos armários e voltamos para o hotel. Tomei um banho e decidi ligar para os meus pais e avisar que estava bem.
— Will, você pegou o meu celular? – perguntei para o corpo queimado e vermelho jogado na cama ao meu lado.
— Não, cara. Eu não consigo nem levantar meu braço. Nem minha cabeça... Nem nada. – ele disse numa clara expressão de dor.
— Você devia ter passado protetor. – ele concordou, gemendo as palavras “Eu sei” – Mas sobre o meu celular, alguém...?
— Não. – os quatro disseram em uníssono.
É fácil perder um celular no meio da bagunça de cinco caras em um quarto imenso de hotel, mas é mais fácil ainda perdê-lo em um parque aquático de muitos quilômetros quadrados, onde você passou 80% do seu tempo nele olhando e se concentrando apenas em uma garota. É, eu deixei no parque.
Saí do hotel com alguma desculpa barata envolvendo farmácia e fui em direção ao parque, que não era longe. Olhei para os letreiros mal iluminados pela segunda vez no dia e procurei por alguma entrada, mas todas tinham câmeras de segurança e porteiros. O jeito é pular o portão. Não, tem cerca elétrica. A saída de emergência? Parece que entrar pela saída é minha única opção nesse momento.
Mas entrar não é todo o problema, onde eu o deixei? No armário, na cadeira de sol, na lanchonete, na escada atrás do brinquedo em que eu a encontrei. É claro. Eu devo ter deixado lá por me distrair.
Chegando perto do brinquedo, procurei em todos os lugares, começando pelo chão, os degraus da escada, e logo parando para escutar aquela voz pouco familiar, mas já tão presente em meus pensamentos:
— Procurando algo? – virei-me para olhar seu rosto, que indicou com os olhos o canto da parede, onde o celular estava caído. Ela usava ainda as mesmas roupas de quando a vi algumas horas atrás, ainda linda.
— Você... O que você... – as palavras não conseguiam sair e eu desisti, mudando-as. – Você vive aqui?
— Digamos que sim.
— O quê? Seus pais são donos do Whater Meals? Ai você brinca aqui sozinha à noite? Meu Deus, você mora aqui escondida?
— Calma, por favor. Não é nada disso.
— Então?
— Eu meio que moro aqui, mas não por querer. É bem complicado, na verdade.
— Se você quiser me contar, nós temos a noite toda. Mas antes: por que você não ligou pra alguém do meu celular pra avisar que estava com ele? Por que você sequer não o pegou do chão?
— Eu preferi esperar até que você viesse.
— Como você sabia que eu iria vir? E por que você ficou me olhando o dia todo?
— Você faz muitas perguntas, . – ela falou, e eu percebi o meu tom desesperado ao longo da conversa. Mas eu precisava saber. – Eu fiquei te olhando porque... Porque você olhou pra mim.
Aquilo não fez sentido algum. Como alguém não olharia para ela? Ela é radiante.
— E por que eu não olharia?
— Ninguém nunca repara, .
— Qualquer homem repararia em você, .
— Não. , nenhum homem consegue realmente me ver. Não metaforicamente. De verdade. Eu já morri.
Aquilo me atingiu como socos seguidos na mandíbula, nariz e olhos. Meu corpo estava inteiro, mas eu me sentia destruído como nunca.
— Você não pode estar morta, eu tô te vendo, bem aí! Você tá na minha frente aqui, em carne e osso.
— Não, eu não tô. Não foi à toa que eu fugi de você hoje quando você chegou mais perto, não é à toa que eu não peguei seu celular do chão. Eu não posso.
O chão me pareceu uma ótima ideia, enfiar e bater minha cara nele até formar um buraco no chão ou na minha cara, não importa.
— Eu sou o quê? Médium? Não brinca.
— Não é brincadeira, eu juro. – quais são as chances disso acontecer? De alguém acreditar? Nenhuma, eu sei. Mas algo na voz dela me fez confiar. E eu confiei.
— E como eu te vejo?
— Eu sou um espírito, , não uma especialista. Eu não sei o porquê, mas eu fiquei chocada quando você me viu, por isso eu te segui. Você é a primeira pessoa em tanto tempo com quem eu converso, que me vê, que me ouve. Eu preferia estar em baixo da terra, presa em um caixão, a ter que passar a eternidade assim. Isso é tortura. Eu vejo a todos, escuto, sinto suas presenças. Mas ninguém me vê ou me ouve, não importa o quanto eu berre. Ninguém, até você chegar.
— Os meus amigos não podem te ver?
— Não. Só você.
— Você está presa aqui?
— Isso. Me assassinaram nesse parque, não sei o motivo e não lembro o que aconteceu no dia. O assassino foi preso e meus pais, devastados. Mas a minha alma continua aqui, eu não quero vingança nem nada, não sei porque eu continuo aqui. A única coisa que eu sei é que eu não consigo passar do portão, não importa o que eu faça, aquele é o meu limite.
— Tem que ter um jeito, alguma coisa, qualquer coisa!
— Não, , não tem. Eu já tentei de tudo. A minha única opção é aceitar.
, eu não posso, eu não consigo te ver assim. Não dá.
— Não vai embora, por favor. , por favor. Não vai. – sua voz falhando num claro tom de desespero.
— Não, eu não falei disso. – nesse momento, um ponto de esperança surgiu em mim, eu não precisava, mas eu queria.
— O que você vai fazer, ?
— Eu vou te dar o melhor verão da sua vida, .
...
— Desculpa. Da sua eternidade?
— Melhorou.
Um sorriso. Era disso que eu precisava. Eu não a conheço nem há um dia, mas a sua felicidade já é um mundo para mim, eu poderia simplesmente aproveitar o verão com os meninos, mas quantas vezes na sua vida você tem alguém só para você? Literalmente, ela era minha, e eu me fiz prometer que, pelo menos enquanto o meu verão durasse, eu seria dela.

~~~~


Quando fui embora daquele lugar algumas horas depois, fiquei pensando como engoli aquela história tão rápido. “Estou morta”. Não é algo que se escuta em seu dia-a-dia e se leva tranquilamente como eu levei, mas não me importava. Algo dentro dela, no modo como ela me olhava, me provava que era verdade, que cada palavra sua era sincera, e algo dentro de mim queria acreditar nela. E eu acreditava.
Mas eu precisava me convencer realmente daquilo.
No dia seguinte, fiz meus amigos voltarem para lá. Os cinco novamente naquele parque aquático grande e completamente interessante ao meu ver. Assim que entrei vi sentada na escada de um dos brinquedos. Crianças corriam a seu lado, pisando forte na escada sem nem ao menos repararem nela, que sorria gentilmente olhando para mim.
— John? – chamei sem desviar meus olhos dos dela.
— Hm? – ele se virou para mim, me encarando. – Fala.
— O que você vê ali? – perguntei, apontando a escada.
— Crianças? Um brinquedo? Por quê? – ele levanta uma sobrancelha.
— Não está vendo nenhuma garota bonita nem nada, né? - ele ri me encarando e balança a cabeça.
— Cara, não tem garota nenhuma ali. Olha pro brinquedo, as garotas estão pra lá! Vamos... – ele me segura pelos ombros, me virando na outra direção.
— Não, podem ir... Preciso fazer uma coisa. – digo, olhando para eles e andando até lá.
— Tem certeza? – Byron pergunta com as mãos nos bolsos, desviando seu olhar constantemente para um grupo de garotas do outro lado do parque.
— Tenho. Encontro vocês mais tarde. – digo e corro até os fundos do parque, olhando para ela antes, como um convite mudo e simples para que ela me acompanhasse. Não esperei mais de cinco minutos até ouvir sua voz logo atrás de mim.
— Ele me viu? – ela pergunta, simples, cruzando os braços e caminhando até mim, se sentando num banco a minha frente.
— Não.
— Eu disse.
— Eu acreditei em você, eu só...
— Precisava confirmar – ela sorri de um modo doce, calmo. – Eu entendo, não é sempre que alguém te conta que está morto.
— Desculpe.
Ela se levanta de onde está e morde o lábio, esticando seu braço em minha direção. Posso ver em seu olhar o tamanho de sua hesitação, o medo estampado.
— Me toca. – ela pede baixo de um modo que quase não poderia ouvi-la se não estivesse próximo.
Seus lábios estão franzidos e seu rosto mostra toda a dificuldade dela em dizer e pedir aquilo, o que me fez querer abraça-la ali e dizer que tudo ficaria bem.
Se eu pudesse fazer aquilo.
Estico a mão devagar, cuidadosamente, até a dela. Tento tocar sua pele, mas minha mão passa direto pela sua, como se nem ao menos estivesse ali. Engulo em seco, e ela sorri de modo amarelo, fraco, fechando a mão e a recolhendo próxima ao peito.
— É horrível.
— Eu sinto muito. – digo, rápido, a encarando.
— Eu também. – ela me encara. Posso ver seus olhos vermelhos, mas nenhuma lágrima cai. – Não consigo nem ao menos chorar, sabia? As lágrimas não saem. – ela ri de modo triste, e a cada segundo minha vontade de tê-la em meus braços aumenta.
— Não pense nisso. Hoje, hoje à noite eu estarei aqui. E nós vamos aproveitar, , vamos nos divertir como nunca. – sorrio a encarando e vejo seus olhos se iluminarem.
— Promete? – ela sibila, sorrindo de modo sincero.
— Eu prometo.
Prometo, .

~~~~


— Como era sua vida antes? – pergunto, caminhando com ela pelo parque.
Já fazia uma semana que todas as noites eu invadia aquele lugar só para ficar com ela, falar com ela, caminhar a seu lado e ouvir sua voz.
E era incrível como eu parecia não precisar de mais nada a não ser aquilo. Cada noite, cada conversa. Eu parecia cada vez mais preso a ela, hipnotizado, vidrado. Não havia uma palavra certa que descrevesse o que eu sentia, nem nunca haveria.
— Eu era filha única, vivia com meus pais numa casa pequena. Vínhamos aqui quase todo final de semana, era o lugar preferido do meu pai até... – ela para de falar um instante e suspira – Até isso. – a vejo apontando para si própria e sinto meu coração se apertar por alguns instantes, naquela sensação de querer tocá-la, confortá-la de algum modo. – Nunca mais os vi depois.
— Eles devem sentir sua falta – comento, sorrindo e encarando-a.
— Já devem ter esquecido de mim. Cinco anos, .
— Não, tenho certeza que não. Você deveria ser chata demais, eles ainda devem lembrar disso. – brinco, tentando distrai-la.
— Não sou chata! – ela se defende, rindo. Eu sorrio de modo largo.
— Não é? – riu andando a sua frente, logo começando a correr. – Então vem!
— Não! Volta aqui, ! – ela grita, correndo em minha direção, rindo.
Aquela risada, aquela risada maravilhosa e contagiante. Eu poderia ouvi-la sempre, por toda minha vida.

~~~~


, nós vamos pra praia hoje à noite de novo, você vem? – John perguntou, enquanto tomávamos café da manhã no hotel.
Dois meses e meio desde que eu a vi pela primeira vez, ela havia se tornado a minha prioridade. Will, John, Noah e Byron já estavam cansados de me chamar para todos os lugares e eu nunca aceitar. Meu baú de desculpas já estava vazio. Eles perceberam, é claro, que havia algo acontecendo e suas especulações sobre o meu “segredo” já haviam passado de qualquer limite de normalidade. Mas seria mais fácil acreditar em qualquer um de seus chutes bizarros do que na verdade.
É, é melhor eles acharem que eu estou namorando uma velha, um menino ou uma criança do que eu tentar explicar que tenho uma amiga fantasma.
— Claro que ele não vem, John. Ele tem planos com a namorada secreta. – Noah provocou.
— Eu não tenho namorada secreta. Eu só tenho outras coisas pra fazer aqui na cidade. – respondi, calmo.
— Então deixa a gente ir com você?
— Vocês não entenderiam.
Não mesmo. Juro.
— Beleza, tanto faz. Se você mudar de ideia, , a festa vai ser no Pier, só chegar lá. – Will disse, levantando da mesa em direção ao quarto, seguido por Byron, Noah e John.
Como eles tinham planos apenas para à noite e a minha já estava ocupada, saí logo cedo para o parque. Quando entrei, não precisei procurar. Ela estava lá, no mesmo lugar de sempre, encostada na parede e sorrindo para mim.
— Você veio cedo.
— Quer que eu volte mais tarde?
— Não, fica. – seu sorriso se alargou e ela começou a andar, se afastando de mim. – Assim a gente tem mais tempo.
— Quer ir nos brinquedos? Você... Consegue?
— Eu tinha que ter uma vantagem, né? Eu não atravesso os brinquedos, ainda dá pra me divertir. E de graça. – ela riu e eu a acompanhei.
Desculpe, amigos, mas a minha tarde vai ser tão boa que eu realmente não poderia sair com vocês.
A noite chegou logo e eu tive que me esconder em um dos vestiários para não ser expulso do parque. Quando saí de dentro dele com , a escuridão já dominava o parque e nós começamos a andar, lado a lado, como em todos os outros dias.
— Quando você vier de noite, pode tentar pular a cerca, ela não funciona há vários anos. – ela diz, enquanto passamos pelas poças d’água deixadas por centenas de pessoas. – E não precisa se preocupar com as câmeras também. É tudo faixada, nunca funcionaram.
Eu ri de sua honestidade.
— Sem contar que entrar pela saída de emergência é muito mais arriscado pra você. É perto da sala dos porteiros.
— Sem problemas, capitã, seu desejo é uma ordem.
— Certo, capitão, e você está afim de ver como é linda a vista da praia lá de cima? – ela pergunta, apontando para a escadaria de uma das atrações do parque, a mais alta.
— Eu já falei, seu desejo é uma ordem!
Nós subimos as escadas até chegar ao topo, e eu tive a certeza de que foi modesta quando disse que a visão era linda.
— Nossa.
— As pessoas não percebem quando estão se divertindo de manhã, mas essa é uma das paisagens mais maravilhosas que eu já vi.
— Como eu nunca reparei nisso antes? Você paga um pacote completo e esquece de aproveitar as pequenas coisas como essa. – um momento de silêncio. – Certo, isso foi gay.
— Foi, bastante. – nós rimos e voltamos a olhar a lua cheia bem a nossa frente. – Mas sinta-se privilegiado. Por mais que de manhã você possa ter uma visão incrível, nada se compara a ver daqui de cima a lua refletir no mar.

~~~~



— Quanto tempo? – ela pergunta, baixo, olhando suas mãos. Estávamos evitando aquela pergunta a tempo demais. Eu sabia disso, mas não queria admitir. Aquelas simples palavras, simples duas palavras conseguiam fazer meu coração doer simplesmente por serem ouvidas.
— Uma semana. – digo baixo, passando as mãos pelo rosto em seguida, sem conseguir encará-la. Seus olhos eram meu mundo, aquela imensidão era meu próprio labirinto. Um labirinto do qual eu adoraria me perder. Mas eu não podia.
— Você provavelmente nunca mais vai me ver. – ela diz de um modo quase inaudível, abraçando as próprias pernas.
Eu queria abraçá-la. Como eu queria abraçá-la. Tocar nela, sentir. Como seria a textura de sua pele? Sua temperatura? Mas eu não podia. Eu não sentia.
— Não fala algo assim. É claro que vou.
— Não, . Não se engana. E não me engana também, você não vai!
, por favor! Eu não quero te deixar! – olho para ela, sentindo meu desespero aumentar.
— Mas você vai, você não pode ficar aqui! – ela diz, me olhando e suspira se levantando.
— O que vai fazer? – me levanto com ela, procurando em seu corpo ou expressão algum sinal, alguma pista. Alguma última chance.
— Aproveitar cada segundo – ela me olha e sorri, aquele sorriso maravilhoso e radiante, o sorriso que me fez cair. O sorriso pelo qual eu me apaixonei.
— Me acompanha? – pergunta, começando a andar e eu sorrio. Eu a acompanharia. A acompanharia em qualquer lugar do mundo, a qualquer hora, só por ser ela.
Minha . Só minha.

~~~~


Uma hora até o voo. Minhas malas estavam com os garotos quando deixei o quarto indo no primeiro lugar em minha mente, ao encontro dela.
O último.
Entrei no parque, correndo até ela. Ela não estava no lugar de sempre. Eu corria sem saber para onde iria, onde estava, preocupado somente em encontra-la, em vê-la de novo. Eu precisava dela.
! – gritei, sentindo meus olhos arderem, meus pés iam por contra própria, procurando por todos os lados, até finalmente vê-la encolhida num canto, na sombra, quase desaparecendo ali. – Não faz isso comigo! – digo baixo, chegando perto dela.
— Você vai embora – ela diz, baixo, se abraçando sem me olhar.
— Olha pra mim, . Por favor, olha pra mim! – peço, sentindo o desespero em minhas palavras, engulo a seco e franzo os lábios, esperando. se levanta e me olha, ajeitando a blusa no corpo. Posso ver seus olhos vermelhos, a tristeza estampada em sua expressão. Assim como na minha. — Sabe que não quero ir, mas não tenho escolha – digo, baixo.
— Eu sei disso – ela responde, e posso ouvir o embargo de sua voz, a tristeza. As lágrimas que ela não conseguia nem podia soltar. – Mas ainda dói.
Tento falar algo, abro a boca buscando palavras, frases, expressões, qualquer coisa, mas nada sai. Até a voz dela ser ouvida e meu coração praticamente explodir em felicidade e dor.
— Acho que amo você. – ela diz, me olhando nos olhos, e eu posso sentir o desespero tomando conta de mim.
— Vem comigo – peço a olhando – Vem comigo, pelo amor de Deus! – peço, sentindo minhas próprias lagrimas rolando por minha pele.
— Eu não posso! – ela grita, me olhando – Eu não posso sair daqui, tem algo, algo que me impede, , eu não posso!
— Nós podemos tentar! Podemos tentar sair, vem comigo até a saída e pronto. Pelo amor de Deus, vem comigo! – eu peço, sentindo a dor em cada palavra.
Eu sabia que ela não poderia vir. Eu sabia que ela não viria. Mas eu não podia desistir. Eu não queria desistir dela.
— Eu já tentei! – ela diz, alto, seu peito sobe e desce como se sua respiração estivesse acelerada, assim como o minha. Estamos no mesmo estado, do mesmo modo. De coração e mente, estamos iguais. — Eu tentei e não deu certo! Não deu certo, eu simplesmente volto pra cá, eu saio e volto pra cá, isso é frustrante! Eu quero ficar com você! Eu quero você, ! Mas eu não posso! Por que eu não posso ter você?
— Eu amo você, ! Eu amo você! – grito, a olhando. A vontade de beija-la, de senti-la, crescia a cada segundo. – E eu te quero comigo. Vem comigo!
— Fica comigo! – ela pede, me olhando. Seus olhos perdidos, mas fixos nos meus.
— Eu não posso. – digo, frustrado, passando a mão no rosto.
— Eu também não. – ela diz de modo fraco, quando uma lágrima cai por seu rosto.
[N/a’s: Play!]
Sua expressão se transforma numa surpresa inigualável. Ela engole a seco e mais lágrimas começam a cair.
— Você disse que não podia chorar. – comento, baixo, perplexo como ela. Olho cada pequena lágrima que desce por sua bochecha.
— E eu não posso. – ela diz, soltando o ar com força, me encarando. Eu me aproximo no mesmo instante, sem hesitar. Ela não podia chorar, mas estava chorando.
Estico minha mão, tocando seu rosto. Meu coração explode em felicidade quando consigo sentir sua pele e a suave umidade de suas lágrimas.
— Você... Você tá... – ela diz, chorando ainda mais, me encarando com felicidade, surpresa, carinho.
— Eu posso tocar você. – digo, firme, limpando suas lágrimas. Cada uma delas. Segurei seu rosto, como alguém segura uma joia, com cuidado e carinho, como se ela pudesse quebrar a qualquer segundo. — Eu posso te tocar. – digo, novamente, aproximando meu rosto do dela, roçando nossos lábios suavemente.
Novas lágrimas surgem em seu rosto, ela levanta suas mãos e toca meus braços, sinto seus dedos percorrendo minha pele com cuidado e sua expressão maravilhada e feliz.
— Eu posso tocar você. – ela murmura com os lábios tremendo pelo choro. Uma lágrima cai por meu rosto.
— Pode. – concordo, baixo, colando meus lábios nos dela, sentindo sua maciez.
Era como eu imaginava.
Era melhor do que eu imaginava.
Era maravilhoso.
Eu podia senti-la, eu podia tê-la, toca-la, beija-la.
Ela pressiona a boca na minha com vontade, querendo me sentir tanto quanto eu queria senti-la. Nossas mãos não sabem aonde tocar um ao outro, desesperadas pelo toque tão almejado, pelo contato que nós não poderíamos ter. Mas que agora tínhamos.
Amar alguém que você não pode ter é algo cruel. Olhar a pessoa, ter tanto para falar ou querer e não poder é a sensação mais arrebatadora que existe.
Nem mesmo a dor de diversas facas atravessando meu corpo poderiam superar o machucado que se formava em meu coração por olha-la e saber que eu não poderia ficar com ela.
Às vezes me pergunto porque o destino deveria ser assim tão injusto, te fazer conhecer alguém, te fazer amar alguém, sendo que você nunca poderá ter a pessoa realmente. Mas eu não me importava. Eu a amava com tudo que tinha dentro de mim, com cada célula, cada parte. Eu era dela, e ela era minha, independente de qualquer falta de toque ou contato.
Um olhar, e ela era minha.
Um sorriso, e ela era minha.
Naquela noite, naquela última hora que tivemos juntos, eu a toquei como queria, sentindo sua pele, sua maciez, seus lábios nos meus, suas mãos delicadas sobre mim.
Naquela noite, eu não me importei com o resto do mundo, com o que ela era, somente com a certeza de que era ela que eu amava e queria e que tê-la ali pra mim era tudo que eu precisava.
Naquela noite, eu a amei da maneira como ela merecia, cada parte dela, a amei como nunca ninguém havia feito, a amei do modo mais intenso que alguém jamais poderá entender. A amei do jeito que sabia que jamais faria de novo. Mas que naquele momento se fez o melhor e o mais sincero Adeus.
~~~~


— Malas prontas, querido. Vamos?
— Vamos! – falei, carregando todas as malas até a porta de casa e esperando o táxi.
Seis horas de viagem e finalmente podíamos ver terra novamente, as praias estavam cheias e o sol raiava como nunca. Eu amava aquele lugar, tudo dali me deixava bem, cada pedaço, cada canto, todos eles eram um motivo para sorrir e uma lembrança do melhor lugar do mundo.
Eu, meu filho e minha mulher viemos para a Califórnia passar o verão, foi ela quem escolheu o destino do ano, e eu a parabenizo, afinal, tudo aqui merece reconhecimento, são lembranças lindas que nunca saíram da minha mente: as praias, os pontos turísticos, os parques... Esse último ainda mexe comigo nos meus melhores pensamentos, um parque em especial. A primeira parada da viagem.
Depois de guardarmos as malas no hotel e de uma boa noite de sono, o primeiro dia inteiro foi dedicado ao parque aquático local.

“Bem-Vindos ao Whater Meals”


Nossa, o letreiro ainda é o mesmo, algumas luzes sequer acendem mais. Tudo continua exatamente igual.
Na fila, não sei bem o que sentir, já faz tanto tempo desde que estive aqui pela última vez. Olho para a mulher ao meu lado. Eu a amo. Olho para o meu filho de oito anos pulando de ansiedade para brincar nas atrações. Ele é fruto de um amor verdadeiro. Eu sei que é.
Mas existe um vazio que me pressiona há muito tempo. Vinte anos. Esse foi o tempo que meu coração passou sentindo falta de algo tão verdadeiro que me faz duvidar que eu realmente tenha chamado outro alguém de “amor”. E esse “algo” pode estar a um portão de distância de mim.
Será que ela continua aqui? Ela conseguiu sair? Se ela conseguiu, ela foi me procurar? Ela me achou? Será que ela achou um outro alguém, assim como eu? Alguém a faz feliz como eu a fiz naquele verão?
Chegou a nossa vez e nós entramos no parque, eu, meus pensamentos, Amber e Nick. Como um antigo impulso, olhei diretamente para a escadaria de um dos brinquedos, o nosso lugar. Ela não estava lá. Eu deveria ficar tão surpreso e tão frustrado? Meu filho saiu correndo em direção a um dos brinquedos e eu o segui.
— Nick, não corra! – falei e ele virou-se para trás para me esperar.
— Vou guardar as coisas no armário, depois encontro vocês dois. – Amber disse.
— Tudo bem. – falei, já andando até o meu filho.
Quando vi o brinquedo escolhido e depois de muitos lances de escada, reparei em sua altura. Ao chegar lá em cima, tive a certeza de que a vista também não havia mudado. Continuava deslumbrante.
— Filho, vem aqui. Quero que antes de descer você veja uma coisa. – digo, enquanto o seguro em meu colo para que as barras de proteção não o impeçam de ver a paisagem.
— É lindo, papai! – seus olhos brilham.
— Você deveria ver isso de noite, Nick. É melhor ainda.
— Você já veio aqui de noite?
— Já. Com alguém muito especial...
Descemos juntos e eu o levei até a borda da piscina.
— Vamos procurar sua mãe. – peguei sua mão e andamos em frente à piscina de ondas, os refeitórios e entre dezenas de pessoas.
— Papai.
— Fala, filho.
— Quem é aquela moça olhando pra gente? – ele apontou para uma parede, e ela estava lá.
Ela sorri apoiada na parede e, de longe, vejo uma lágrima cair de seus olhos.
Não mudou nada.
Sinto uma lágrima agora pelo meu rosto e acompanho o sorriso dela. Meus olhos fitam minha da mesma forma que fitavam há vinte anos, e eu quero abraçá-la, quero beijá-la. Meu corpo está a metros de distância, mas meu coração está ali com ela, onde nunca deveria ter saído. Ela me reconheceu mesmo tendo envelhecido, e parece feliz por mim. Nick consegue vê-la e não entende o motivo das lágrimas. Mas ele sorri como se sentisse, como eu, a sensação de pertencer ao lugar, à ela.
Ela é meu anjo da guarda, minha alma gêmea, tudo que eu sempre quis.
— Uma amiga, filho. Uma grande amiga.


FIM



Nota da autora: 25/12/2014 - Oi, gente! Esperamos que tenham gostado dessa short <3 se vocês gostaram ou já leram alguma outra fic nossa, agora a gente tem um grupo no facebook \o/ o link é esse pros amores que quiserem participar: https://www.facebook.com/groups/624756710986861/?fref=ts ) beijos da Roby e da Mah <3]

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