Uma vez, um jovem poeta me disse para ter paciência com tudo o que permanecesse inacabado em meu coração. Eu deveria ter quinze anos ou menos na época, uma garotinha em vestidos florais que seguiam sem esforço a direção do vento entre minhas pernas. Esse mesmo poeta disse-me para esperar com a paciência de um doente e com a confiança de um convalescente e viver as minhas perguntas — nunca as respostas, pois não estaria pronta para vivê-las. Ao chegar aqui, alguns anos depois, percebo que eu deveria tê-lo escutado ao menos uma vez... Quem sabe dar razão a ele tivesse me transformado em um ser humano mais receptivo, um indivíduo mais corajoso, uma garota menos perversa. Mas quer saber? Agora, nada disso importa. Estou onde sempre quis estar; pouco poderia me atormentar.
De onde vim pouco se sabe sobre o conceito de esperar — por isso fomos os primeiros a quase nos aniquilar completamente. Frequentemente, ao abrir o jornal, eu me deparava com notícias sobre motoristas que não souberam esperar e atropelaram uma centena de pedestres, ou sobre herdeiros que assassinaram seus parentes a sangue frio na pressa de serem ricos. Aqui (e isso é algo que posso unicamente sentir, sem descrever com a devida perfeição), a vida é recebida com a paciência pacífica de quem cuida de uma semente até colher o primeiro morango da estação. Aqui, o céu é tão limpo e azul (eu nunca vi um azul assim, real como arte e irreal como tudo o que existe) e tão recheado de possibilidades que é impossível desejar morrer antes da hora. De onde eu vim, as nuvens cancerígenas de fumaça cercam completamente todos os arredores de fábricas, tornando impossível aproveitar os resquícios de áreas teoricamente sustentáveis — teoricamente, preste atenção. Aqui, eu ouço o quanto as pessoas querem evitar acidentes, o quanto nenhuma delas quer colidir seu automóvel num poste na esperança de melhorar as coisas. O canto dos pássaros e cantigas amigáveis são coisas que eu nunca ouviria caso permanecesse em meu berço; aqui, posso ser quem quiser, contanto que seja uma boa pessoa. É uma nova vida, um novo alguém que sabe como ser, ao menos, um pouco feliz e um pouco mais digno um dia após o outro. De onde eu vim, vendedores de luzes e cantores não fazem sucesso; de onde eu vim, os padeiros são como coveiros e as crianças vivem numa dislexia inconsciente, mata-se por pouco e a sobrevivência é mais importante do que quaisquer aspectos de vida. Aqui, há arte no modo como se tira pó do peitoril da janela; as pessoas param para ter seus rostos pintados e usam roupas coloridas sem se importar se é conveniente ou não. De onde eu vim, a única arte que é ensinada é a morte — mas faço o máximo para me esquecer disso no momento em que meus pés tocam o paralelepípedo do porto e o cheiro de canela e pão quente me atinge com força total, obrigando-me a mandar as reminiscências do meu berço para longe — eu disse que nada me atormentaria aqui.
Eu devia ter uns cinco anos quando ouvi falar da Campina pela primeira vez. Naquela idade, uma menininha como eu pouco poderia imaginar, mas aprendi rápido que os charutos e tulipas mais cobiçados do mundo vinham diretamente de lá, do outro lado do oceano, de uma cidade construída por antigos navegadores. Para mim foi uma surpresa que, de fato, houvesse algo além da imensidão das praias imundas que ficavam perto de casa. O meu berço era a única coisa que eu conhecia — e assim seria por anos a fio, enquanto eu crescia e observava meus sapatos ficando para trás, as calcinhas manchadas de sangue e as músicas que sempre se repetiam na estação do rádio. Eu teria amado os campos, a sensação de estar em um ambiente limpo, os ventos do Norte... Dependendo da hora, os céus da Campina mudavam de cor — num mesmo dia eu fui capaz de ver tons de rosa, lilás, azul e amarelo colorindo a imensidão acima de minha cabeça; sem falar em algumas nuvens que pareciam tão apetitosas quanto os algodões-doces expostos nas ruas, disponíveis por dois níqueis e cinco centavos cada. A Campina era vida. Bochechas coradas e risadas, livrarias, postos de gasolina organizados, cestas de bicicletas decoradas com flores... Nunca acabava. Conforme eu subia a rua que dava acesso ao centro, deixando o porto para trás — que se fodessem os barcos e os faróis e o maldito, imprevisível, instável mar, pois havia muitos dele de onde eu havia saído —, mais meu coração começava a acelerar e minha respiração ficava entrecortada, mais eu tinha que piscar para me convencer de não estar sonhando.
Imagine uma criança num parque de diversões pela primeira vez. Imagine a música, as conversas, as risadas, as lâmpadas redondinhas penduradas em fios acima da sua cabeça. Imagine que por um instante toda a perversidade do mundo mudou de endereço e que você nunca descobrirá onde ela mora. Imagine que, após toda uma vida de frustrações, as coisas estejam melhorando agora e elas têm um sabor melhor do que tudo o que você pode imaginar um dia. Você deve andar pelas ruas devagar, com cuidado, aproveitar lentamente para não acabar depressa. Deve me imitar: deixar o porto e os velhos navegadores para trás, observar o movimento das bandeiras estendidas ao vento, comprar um picolé e chupá-lo devagarinho, contemplar as vitrines da última estação, se encantar com a nova genética da civilização desconhecida — às vezes, quando estamos em lugares estranhos, nos sentimos forasteiros. Comigo foi diferente: eu me senti em casa; um pouco livre, um pouco entorpecida pela sonoridade da metrópole ao meu redor.
— As notícias do dia! Notícias do dia! — anunciou um garoto baixinho que passava rua abaixo enquanto eu descia o lance de escadas que levava a uma perspectiva diferente: uma praça gigantesca feita em pedra branca, onde uma catedral de ébano se erguia. — As notícias do dia, senhorita. — Com surpresa, notei que o garoto baixinho se dirigia a mim, pois me estendia um rolo de jornal. Antes de aceitar, entretanto, dei uma boa olhada em seus olhos acinzentados, e a bondade que vi neles me fez perder o ar por um breve instante. — Pegue um exemplar — encorajou-me. Só pude obedecê-lo. Pareceu-me irreal como a sua atenção logo voltou à rua adiante, ao que ele recomeçava a exclamar, estendendo os jornais a quem passasse: — Notícias do dia! Notícias do dia!
As notícias do dia
I. Segundo o Estatuto de Cuidado aos Animais, esquilos voltarão a habitar a Campina no próximo semestre. A bióloga Marianne Goethe ressalta a importância do fato e pede que, por gentileza, os cidadãos não molestem os pobres e inofensivos bichinhos;
II. Fica terminantemente proibido o uso de cigarros em ambientes fechados a partir da semana que vem. Caso ocorram falhas no cumprimento da Lei, o cidadão desafortunado deverá pagar, sem reclamações, a multa estabelecida (os valores estarão disponíveis na próxima edição do jornal);
III. A décima-quarta edição do Festival da Campina contará com a participação da banda The Wolfgang, uma vez que seu vocalista, Donny Marko, encontra-se recuperado da cirurgia nas cordas vocais. O evento contará também com a apresentação solo da ex-guitarrista Melissa Strockhoney, de volta aos palcos após a ruptura de sua banda, Sacanas Selvagens;
IV. A filha mais nova do prefeito Justino Larbalestier deverá sair do hospital ainda essa semana, segundo passarinhos anônimos. É claro que estamos todos ansiosos pela volta da pequena Juliann às atividades contra o vírus 678, que nunca esteve tão bem contido desde sua contribuição para a vacina;
V. A presidente afirma, alegremente: a lobotomia está extinta.
A metrópole silenciou-se. Então, é isso. Acabou.
Suspirei a brisa morna de início de tarde e segui o meu caminho.
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Depois de doze dias dormindo em um motel de classe baixa, consegui alugar um apartamento ancorado ao porto. Era um cubículo apertado com um banheiro, uma geladeira minúscula, uma cama de solteiro que rangia se eu me movimentasse demais; eu não tinha um fogão, mas ficava mais do que feliz de cuspir a pasta de dente numa pia decorada com pequenos polvos de opalina azul. Felizmente, havia também uma banheira de água morna. O encanamento não fazia barulho. Todas as lâmpadas acendiam. Havia uma varanda pequena e janelas que davam para o porto abaixo; o mar sutilmente oscilava nas pedras da passarela que dava acesso aos postos onde os navios ficavam ancorados, e por que muitas pessoas passassem ali diariamente, eu não poderia reclamar da poluição sonora.
Eu havia comprado um vaso de uma plantinha estranha de nome ainda mais estranho, e a deixara na janela para tomar sol. Vez ou outra a regava, geralmente quando chegava do trabalho, e ficava observando os navios ancorados. Ah, sim, comecei a trabalhar para me manter. Era um trabalho fácil — por mais hostis que fossem as minhas origens, minha língua era bem disseminada, romântica o suficiente para ser ensinada em escolas. Eu tinha um amor genuíno pelas palavras, por isso aceitei a proposta de dar aulas numa escola de idiomas a dois quarteirões do meu humilde apartamento, confiante de que me daria bem. Mas pagavam pouco, o que me desanimou após o primeiro mês. Entretanto, não era como se eu pudesse escolher.
Tentei outras coisas nesse meio tempo. Passei uma noite numa boate de strip-tease e desperdicei minha única chance por chorar no banheiro depois de ver uma briga entre um garoto descarnado e um marmanjo de dois metros de altura — coisa que eu havia visto demais, mas nunca teria esperado encontrar aqui. Tentei trabalhar como garçonete, mas gastei mais tempo lavando louça pelos copos quebrados do que realmente atendendo mesas. Tentei levar cachorros para passear, mas fiquei traumatizada por quase perder um deles e desisti depois de cinco dias. Então, voltei à sala de aula, ensinando gramática e expressões para alunos que gostavam de mim e que nunca saberiam o pouco de simpatia que eu guardava por eles. Eu desejei morrer ali dentro por um tempo, mas ainda possuía minhas noites no porto e na praça de pedras brancas, possuía minha planta ancorada à janela, possuía pequenos detalhes (o diabo está nos detalhes) que me faziam respirar. Uma de minhas alunas, inclusive, tornou-se uma das minhas companhias. Um dos meus vizinhos ficava mais do que contente em me ceder o fogão quando eu precisava. O garoto baixinho do jornal sempre sorria para mim quando me via passar, e seus jornais vinham sempre com as notícias mais diplomáticas possíveis. O vírus 678 foi extinto; a presidente assinou um acordo de paz com uma das nações inimigas; Melissa Stockhoney recebeu o funeral mais honroso possível após bater com a cabeça numa roda de caminhão e morrer. Eram pequenas visões que tornavam a vida um pouco mais suportável, um pouco mais viável.
Mas, caralho, às vezes eu me odiava.
Odiava ainda mais ser perversa.
Era nisso o que eu pensava, descendo as escadas rapidamente para a praça da catedral de ébano. O jornal daquele dia dizia:
As notícias do dia
I. O contrato de paz assinado pela presidente no último mês está finalmente produzindo resultados satisfatórios. Agora a exportação de absorventes íntimos entre nosso país e a República Velha é total e completamente permitida. Daqui a alguns dias esperamos obter a pesquisa sobre a qualidade desses produtos na visão das velha-republicanas;
II. O último feriado vendeu menos audiência na televisão, segundo dados do HBWER. Pontos para atividades ao ar livre, cada vez mais presentes na realidade do povo da República;
III. A presidente sarou de sua catapora. Nossa Senhora da Pátria descansa bem;
IV. O terremoto que atingiu As Costas Glaciais faz hoje cinco anos. A tragédia foi transformada em uma peça de teatro que está sendo exibida na Praça de Pedras Brancas. Contamos com a presença de todos às quintas e sextas a partir das sete da noite;
V. A produção de tulipas e charutos cresceu no último mês. Para comemorar, o prefeito Larbalestier convida todos os cidadãos a uma festa nos Campos Baixios esta noite. The Wolfgang e The Mockers participarão do evento;
VI. A redução da maioridade penal foi abolida pela presidente. O assunto causou controvérsia no governo e provavelmente será a causa de protestos que devem acontecer nesse final de semana;
Caminhei em direção à catedral, mas guardei todas as minhas orações ao virar à esquerda, para a melhor cafeteria da cidade. O pequeno sino de cobre tocou quando abri a porta. O cheiro de cafeína dominou todos os meus instintos, enchendo minha boca de saliva. Pedi um café e dois muffins, acomodada numa das mesas próximas à janela. Ali, eu tinha uma visão privilegiada da praça e de todas as pessoas que por ela passavam. Meninos, garotas, velhinhas, casais de namorados. E quanto mais deles passavam, e quanto mais eu esvaziava minha xícara de café, e quanto mais eu lecionava e pensava, eu sabia.
Eu simplesmente sabia.
A noite adentrava todos os poros da casa noturna, destemida. A música estava alta, as drogas existiam, algumas pessoas procuravam os banheiros para vomitar suas mágoas — o banheiro era o santuário de todos os bêbados. Eu deveria estar esquecendo um pouco de mim mesma também, mas não era tão fácil assim — e pensar que eu era diferente de todas aquelas pessoas talvez me transformasse exatamente numa delas. Pergunte-me se eu me importava e eu direi que não. Nunca me importei muito, nunca tive dificuldade em admitir que odiava certas coisas que me faziam diferente e iguais aos outros. Fui assim desde criança.
Eu gostava da sensação de estar perdida em uma multidão de estranhos. Gostava de ser uma forasteira na Campina, gostava de deixar meu currículo — poliglota, possui experiência com recursos humanos, trabalha sério, sua maior fraqueza é lançar objetivos impossíveis — em escritórios e pequenas empresas ancoradas próximas a jardins floridos e praças alegres. Foi por isso que, quanto mais conhecida fiquei em alguns lugares, mais busquei outros onde ninguém me conhecesse. O Gato Dançante era um desses locais, uma casa noturna construída sobre a maior rocha da Campina. Foi ali que eu comemorei meu novo emprego de tradutora numa editora, sentada no canto escuro, afastando fumaças de cigarro e matando doses de vodca. Ninguém se interessava por mim. Não que eu fosse feia ou que parecesse morder; me considerava bonita, sabia que tinha olhos brilhantes o suficiente para fazer alguns caras calarem a boca para observá-los melhor em silêncio, sabia que meus vestidos comportados eram um atrativo a mais, assim como minha boca de lábios carnudos. Mas eu sabia me esconder, não tinha medo de ir para casa sozinha ou rejeitar uma companhia. Sempre me dera melhor sendo solitária.
Abri caminho pela multidão atenta à música até uma das portas laterais quase escondidas pela iluminação precária. Uma sensação de liberdade me atingiu ao encontrar as escadas de emergência — o ar ali era limpo e muito mais fresco, sem perfumes ou cheiro de cigarros. Havia um leve aroma marítimo, entretanto, que subia das rochas solo abaixo direto para as janelas pequenas e circulares acima da minha cabeça. A música ainda ultrapassava as paredes e me atingia nítida como um raio de sol — naquela noite, The Mockers tocavam como se pudessem quebrar as paredes que sustentavam o local. Mesmo assim, as luzes brancas das escadas de emergência me deram um momento de mais clareza: eu tinha uma noção mínima de onde me encontrava, mas sabia para onde tinha que ir. O salão do piano ficava no último andar do edifício, o que significava que eu teria que subir lances e mais lances de escada até chegar até lá. Não me dei ao trabalho de lamentar, no entanto. Comecei a subir o mais rápido possível, sentindo todo o meu corpo reverberar conforme meus passos apressados me faziam ultrapassar os andares. O corrimão gélido parecia liquefazer-se sob meus dedos. Sabia que deveria estar corando, mas não era relevante. Pouca coisa poderia ser relevante naquele momento. Até parei de tentar descer meu vestido que insistia em ajustar-se à minha cintura. Inútil. Babaquice. Merda. Droga, puta porra, puta caralho. Que infernos. Não servia para nada. Por que eu insisto em me preocupar com porcarias?
Quando alcancei o último andar, porém, todos os pensamentos e questionamentos borbulhando em minha mente foram silenciados. Encarei a porta que me separava do que estava prestes a acontecer e a distância entre nós mais me pareceu um grande infinito do que apenas um metro. Aquilo era... Medo? Eu estava com medo? Lembrei-me do poeta que havia me pedido para não viver as respostas e sim as perguntas. Quase nenhum medo era justificável para mim. Eu não tinha medo da guerra; eu tinha medo do homem. Mas aquela era a única coragem que realmente poderia ser exigida de mim: enfrentar o que quer que viesse, mesmo com medo. Eu não poderia permitir que aquilo me fizesse sair correndo na direção oposta, eu não tinha nenhum bichinho de pelúcia para abraçar tarde da noite quando estava com medo. Minha barriga rodava como uma pedra de gelo num liquidificador; minha mente começava a programar imagens de um futuro possível, coisas que me fizeram morder o lábio antes de esticar o braço e girar a maçaneta, abrindo a porta devagar.
E lá estava ele.
O velho e branco piano do Gato Dançante, uma peça pertencente à família real de séculos atrás — talvez milênios —, transportado pelos mares em galeões e roubado por um dos mais célebres mestres do crime; encontrado, leiloado, vendido, tocado em centenas de bailes da realeza para o deleite das moças e diversão dos homens — ou o contrário. Tocado iguais vezes em bailes da boemia e das trupes suburbanas que vendiam sua arte aos ladrões mais nobres e reconhecidos do mundo. Uma peça tão rara e tão delicada que tirou de mim qualquer ínfima quantidade de ar remanescente em meus pulmões. E ali estava , deitado sobre a parte superior do piano como se ele nada fosse além de um nome distante pertencente a uma história para crianças.
Eu quis protestar, é claro, mas o barulho da porta fechando sozinha atrás de mim o atraiu e ele se sentou, erguendo o tronco lentamente enquanto deixava as pernas penderem do piano como num balanço para crianças. As luzes estavam apagadas, mas os focos noturnos de iluminação entravam pela parede feita de vidro, deixando-me ver as formas e cores das tatuagens de , que tomavam toda a extensão de seus braços. Ele era uma composição desleixada de jeans surrados, tênis vermelho, olhos absurdamente brilhantes e um sorriso indiscreto de lado. Droga. era bonito, talvez o homem mais bonito com quem eu já estivera trancada num cômodo sozinha. Nada nele poderia ser considerado convencional. Primeiro: os olhos eram legítimos em sua cor, nus e crus, e se você fosse esperto e cauteloso o suficiente, poderia ter uma noção do que significava lê-lo. Segundo: os lábios eram finos, rosados, ridículos de tão beijáveis, e poderiam personificar o sorriso de um anjo e a risada de um gênio malvado. Terceiro: alguém poderia morrer para ter uma mandíbula tão perfeita, de formato tão meticulosamente desenhado que era difícil não suspirar. Quarto: suas tatuagens eram uma bagunça sem fim, retratando romanticamente o que quer que ele tivesse inventado dentro da sua cabeça: âncoras, letras, pássaros, pilhas, mais letras, tentáculos, navios, tomadas, facas, ninfas — e estavam por todas as partes, desde seu pescoço, passando pelo braço e abarcando os dedos. Suspeitei que haveria mais, muito mais de onde aquilo viera, e o desejo de comprovar minha teoria me fez engolir em seco. Ele mantinha os olhos fixos em mim, queimando lentamente como as chamas de uma fogueira, e por um momento eu quis separar com gentileza seu crânio de seu cérebro para ler seus pensamentos.
— Você veio — disse ele. A voz calma preencheu todas as lacunas deixadas pelo silêncio, obrigando-me a agradecer mentalmente pela música nos andares inferiores não nos alcançar ali.
Sem pressa, dei um passo à frente. E depois outro. E outro, até que pude ver cada traço das tatuagens em seus braços. suspirou baixo quando parei diante dele, devolvendo seu olhar com tanta intensidade que ele demorou a perceber minhas mãos ocupadas em baixar o zíper do vestido às minhas costas. A peça escorregou centímetro por centímetro pelo meu corpo, fazendo com que acompanhasse atentamente sua trajetória até o chão. Contemplei em seus olhos um vislumbre perverso ao notar minha roupa íntima rendada e preta, e aproveitei ao máximo a luxúria em seus olhos enquanto desfazia os ganchos de meu sutiã, passando-o pelos meus braços antes de jogá-lo para o lado. Minha pele, vulnerável à temperatura, se arrepiou com o frio; a sensação somada à súbita excitação de me despir diante dele fez com que meus mamilos enrijecessem. Me curvei para tirar os sapatos, e assim que o fiz, subi as mãos à barra de uma das minhas meias ¾. Porém, fui gentilmente interrompida pela sua voz.
— Fique de meias. — Ergui meus olhos para ele, que me encarava com toda a sua atenção voltada para minhas ações. Mas aquilo não era tudo. me olhava como se estivesse diante de algo que precisasse de devoção. Para ser honesta, naquele exato momento pensei em como ele teria sido um garotinho lindo observando uma vitrine de doces, excitado pela ideia de chupar balas a tarde inteira.
A ideia de permanecer de meias me fez sorrir sem mostrar os dentes, e coloquei minha franja atrás da orelha ao erguer o tronco, dando mais um passo à frente, agora próxima o suficiente para descrever cada mínimo detalhe de seu rosto. Minhas mãos encontraram as dele, sentindo sua temperatura elevada enquanto as posicionava nas laterais da minha calcinha. Ele não a baixou, entretanto. Assim que eu permiti que me tocasse, moveu suas mãos para cima, apertando delicadamente cada pedaço de pele conforme percorria meu quadril, barriga e cintura, até alcançar minhas costas. Sustentando-me, aproximou seu rosto da pele abaixo da minha clavícula, e a mescla de seus lábios entrando em contato e seu perfume preenchendo meus pulmões carentes de ar foi o bastante para me arrepiar dos pés à cabeça. Meus dedos encontraram sua nuca, perdendo-se entre os fios macios de seu cabelo. Senti seus beijos subirem pelo meu pescoço, quentes e molhados, causando arrepios elétricos por todas as minhas articulações. Uma de suas mãos foi parar na parte de trás da minha cabeça, segurando-a como se fosse uma frágil peça de porcelana. Com o braço livre, me abraçou, envolvendo minha cintura enquanto me impulsionava carinhosamente contra seu corpo. Simples assim. Eu estava presa entre suas pernas, segura em seus braços de diversas cores e formas, derretendo como manteiga por causa do seu toque.
Eu não esperava que ele me abraçasse, e tampouco teria adivinhado com facilidade que estaria gostando da situação. Deveria ser constrangedor — sempre havia sido. Mas não dessa vez. E por mais que minha natureza estúpida tentasse me fazer mover os braços para afastá-lo, não pude. Todas as tentativas semelhantes iriam para uma brecha em minha mente cansada e embaralhada, fugindo para onde eu não conseguisse alcançá-las. Todo o seu calor me confortava de um modo estranho. Eu estava acostumada a ser a estranha e a achar conforto em assustar e depravar. Mas, agora, era diferente. Era como se ele pudesse docilizar o espectro perverso que vivia em minha companhia, algo que nem eu mesma conseguia.
— Eu vou fazer coisas belas e sujas com você hoje. — Fui pega de surpresa pela sua voz baixa e um pouco rouca ao meu ouvido, sentindo seus lábios abrirem-se num sorriso provavelmente obsceno quando ele constatou que eu estava arrepiada. — Posso?
Minha tentativa de responder foi por água abaixo quando senti minha bunda sendo apertada com força, impelindo-me contra o volume convidativo escondido sob seus jeans. Droga. Ele nem estava totalmente duro e eu já me sentia respirar de forma falha ao sentir o seu tamanho.
— Aham. — O som que escapou dos meus lábios foi vergonhosamente lânguido.
— Responda certo, meu anjo. — Seus dedos se enroscaram numa mecha do meu cabelo, alisando-o com cuidado. Era esquisito como as exigências dele podiam ser tão educadas. Aquilo me acalmava e me excitava ao mesmo tempo, compelindo minha respiração a bloquear. Eu não fazia ideia de quem era, ele não fazia ideia de quem eu era, mas estava praticamente nua diante dele, e seus olhos estáticos em meu corpo me diziam que eu era linda, cativante, que ele me queria porque eu era encantadora e não porque era conveniente.
Além disso, havia um ponto que me atraía a ele quase que instantaneamente. Não tinha nada a ver com a sua aparência ou como ele tocava guitarra — embora eu tenha imaginado, da primeira vez em que o vi tocar, como seria fazer sexo com um cara que suava tanto num palco ao realizar movimentos bruscos e gritar como um animal enjaulado, concentrado nos gestos de seus dedos. Era indiferente se eu ficava vidrada na mandíbula perfeita ou se meus dedos formigavam todas as vezes em que eu pensava em acariciar os seus cabelos. O fato era que era uma das poucas e raras pessoas que me permitiam assumir minha identidade não contemporânea sem que eu me sentisse suja ou inferior. Eu não havia tentado ser legal com ele. Eu não precisei de palavras e atos descontraídos para que ele visse que valia a pena se aproximar de mim e tomar a dianteira. Eu não tive que calcular o quanto de rímel passar e se meu batom estava forte demais. Eu não precisei fingir que não queria me encontrar com ele para que ele ficasse mais instigado. De forma geral, eu não precisei fingir. E isso me magnetizava a ele como nunca havia acontecido antes.
Limpei a garganta, levando meus lábios ao lóbulo de sua orelha.
— Sim, você pode. Quero tudo o que você inventar — murmurei, dando uma leve mordida ali, soltando minha respiração quente por cima. Foi a minha vez de sorrir ao notar que ele havia fechado os olhos e que sua respiração estava ficando alterada. — Eu sou sua, .
A mão que estava em minha bunda deslizou até a parte de trás da minha coxa direita, impulsionando-a até que meu joelho encostou-se à madeira fosca do piano enquanto seu quadril quase, quase colidia com o meu. A fricção da minha calcinha úmida com seus jeans grossos me fez corar. Não pude esconder meu rosto quando ele ergueu meu queixo com o indicador; a boca tentadora tocando o canto dos meus lábios. Meus olhos encararam os dele, que em seguida ocuparam-se em mirar minha boca. Tentei não derreter quando ele umedeceu os lábios.
— Não seja uma boa menina — foi o que ele disse antes de me beijar.
Não consegui respirar ao sentir a pressão perfeita de seus lábios macios nos meus, e antes mesmo que pudesse raciocinar, a mão em minha cabeça me empurrou contra seu beijo subitamente violento e capaz de rasgar meus lábios se eu não o retribuísse. Toda a agressividade daquele ato fez com que minha boca pulsasse enquanto minha língua, em contato com a dele, reivindicava mais do seu gosto agridoce e forte. Ele explorava toda a minha boca, enfiando a língua brutalmente entre meus dentes. Mas não era ruim. Seus braços me apertavam, eu estava na ponta do pé para correspondê-lo, meus seios intumescidos doíam contra a dureza de seu peito, eu não conseguia respirar e todo o meu corpo ardia, mas não era ruim. A língua dele me obrigava a paralisar os lábios entreabertos de maneira a brincar com a minha em círculos. Golpe baixo. Golpe baixo pra cacete. Minhas pernas tremeram quando deu um leve tapa na minha bunda, quebrando o beijo para respirar ruidosamente contra meu queixo. Ele não perdia tempo, no entanto. O ar mal havia voltado aos meus pulmões quando voltei a ser beijada com ferocidade, sentindo suas mãos tocarem todos os lugares que podiam alcançar, explorando minhas curvas e apertando minha pele como se quisesse fundir seus dedos nela. Eu queria mais do seu gosto de menta, do seu toque, da sua pertinência. Desastradamente, apoiei-me nele e subi sobre seu corpo, ficando de joelhos no maldito piano com seu corpo sob minhas coxas. Nossos sexos se encostaram por um segundo, tirando de nós um gemido em uníssono. As mãos de fixaram-se com aspereza em meu quadril, forçando-me a me mover sobre seu membro. Seu tamanho, agora mais evidente, fez com que todo o meu sexo se contraísse à mínima fricção ali embaixo. Meu corpo, como que por vontade própria, começou a se movimentar sozinho, e xinguei baixinho enquanto meus dedos desciam o zíper da sua calça, abrindo o botão e começando a empurrá-la para baixo. Fui pega de surpresa pela incrível força de , que nos trocou de posição num piscar de olhos, deixando-me sentada no piano enquanto ele ficava preso entre minhas pernas.
Suas calças caíam lentamente por suas pernas; eu podia senti-lo se esfregando em mim apressado e em busca do encaixe perfeito, prensando seu órgão no fundo escorregadio e molhado da minha calcinha. Não pude conter o gemido quase pornográfico que deixou meus lábios no momento em que meu clitóris recebeu o impulso, me fazendo mexer o quadril contra o dele em resposta. Meus suspiros intercalavam os gemidos que insistiam em escapar. Ergui meu tronco e o beijei, dessa vez lentamente para fazê-lo decorar meu ritmo, intenso e viciante. Suguei seus lábios, puxando o inferior com os dentes ao me afastar. Mais uma vez, abriu seu sorriso indecente, e logo suas mãos estavam em meus seios, apertando-os sem gentileza. Eu ainda movia meu quadril contra ele, que parecia se controlar dolorosamente para não afastar minha calcinha naquele exato momento e meter em mim de uma vez por todas, mas a expressão de tortura em seu rosto era demais para que eu não o tentasse.
— Preciso provar você — provocou ele, descendo um caminho de beijos pelo meu pescoço. Suspirei um pouco irritada pela perda da intensidade da fricção, mas fui presenteada pela sua língua acariciando um dos meus mamilos com movimentos de baixo para cima. Sua boca fechou-se ao redor dele, sugando-o. Meus dedos estavam perdidos em seus cabelos, afagando sua nuca numa recompensa mínima. Porra, sua língua deixava toda a minha pele febril. Em certo instante senti seus dentes prendendo meu mamilo, puxando-o para dentro da sua boca, e então ele o chupou com perfeição, pressionando a língua de forma incrivelmente talentosa, endurecendo-o ainda mais. repetiu o processo no outro seio, apertando o que deixara livre entre os dedos longos e másculos e dando tapas ardidos nele. Eu já sentia todo o meu sexo tenso estreitando sozinho, pedindo por ele na falta de algo para apertar. Seus beijos e chupões seguiram para o sul, causando-me contrações prazerosas todas as vezes em que sua língua me provava.
Eu quase perdi o ar e a cabeça ao perceber o que ele estava prestes a fazer.
afastou a barra superior da minha calcinha, baixando-a apenas um pouco para que sua boca pousasse na região que ele despia, espalhando selinhos delicados pela minha pele. Protestei com um grunhido frustrado e excitado, obrigando a mim mesma a parar de tremer de expectativa. Pedir por controle seria impossível, pois no momento seguinte seus dedos pressionaram minha intimidade por cima da peça, desenhando círculos em meu clitóris. Com a mão livre, afastou o tecido, tirando-o tão devagar que meu desejo de matá-lo, socá-lo e submetê-lo a mim triplicou em tamanho e intensidade, mas todas essas vontades infantis morreram quando ele ergueu os olhos até os meus, repletos de malícia, enquanto seus lábios beijavam minha vulva. Seus dedos quase cravavam nas minhas coxas, passeando por toda a extensão das mesmas antes de afastá-las por completo. Sentir sua respiração contra minha intimidade me fez fechar os olhos; toda a minha mente ficou embaralhada. Eu mal me dei conta de que ele colocara uma de minhas pernas em seu ombro, embora estivesse consciente de suas carícias que ascendiam de minhas meias à parte interior das minhas coxas, ameaçando cordialmente me marcar com tapas e apertões. Eu sabia que ele queria que eu o olhasse, então forcei meus olhos a se abrirem e mirá-lo. A primeira coisa que vi foi o movimento lento de sua língua subindo pela minha intimidade como um garoto lambendo sorvete derretido; a ponta dela pincelou meu clitóris já bem inchado, arrancando de mim um gemido sôfrego. Mil xingamentos passaram pela minha mente, mas um novo golpe de seus lábios foi o suficiente para me impedir de verbalizá-los. Eu só podia continuar de olhos abertos, atenta a quaisquer das suas atitudes, submissa à sua boca habilidosa e sedada pelos seus instintos. E ele não parou — céus, ele não parou. Continuou me lambendo como um gato, esfregando o rosto entre minhas pernas e me beijando, me mordendo, me chupando. Dois de seus dedos subiram à minha boca, acariciando meus lábios como forma de pedir permissão. Abocanhei-os, começando a chupá-los no ritmo em que entravam e saíam, gemendo contra eles a cada vez que meu clitóris era alvejado pela sua língua. Deixei que minha saliva escorresse por entre seus dedos, e assim que julgou-os bem ensopados, baixou-os até a minha entrada, intimando me penetrar.
Eu estava desconexa, corada, dopada. Sons indizíveis deixavam minha garganta, e quando me dei conta estava puxando seus cabelos, encarando a fundo seus olhos animalescos e cintilantes. Joguei a cabeça levemente para trás quando um de seus dedos adentrou minha intimidade, seguido do segundo. começou um ritmo próprio, adequando os movimentos de sua língua ao compasso torturante de seus dedos. A cada vez que ele aumentava o ritmo, eu podia sentir meu líquido escorregando pela palma da sua mão, além de ouvir os barulhos molhados do atrito somado aos meus gemidos.
— Você é deliciosa — ele sussurrou, me penetrando de maneira cruelmente lenta, entrando por completo e formando ganchos com os dedos, apertando e pressionando, afastando um dedo do outro para me abrir. — Eu preciso que você goze na minha boca.
— ...
— Sim, meu anjo.
Puta merda, a forma como ele conseguia ser cortês enquanto me fodia com os dedos me enlouquecia. Afastei as nuvens que turvavam meus pensamentos, tentando ser mais coerente do que o prazer que se alastrava por todo o meu corpo, e mordi o lábio brevemente antes de pedir num tom de súplica:
— Me foda.
Mais uma vez, quis pegar seus neurônios em meus dedos para ler cada um dos seus pensamentos. Desejei ser capaz de realizar alguma espécie maluca de telepatia para lê-lo inteiro e desvendar todos os fundos falsos que escondiam sua verdadeira perversão. Eu realmente não sei a que tipo de prática ele havia se submetido antes em sua depravação, mas a forma como sua língua me penetrou e começou a levar meu mel ao meu clitóris me fez xingar alto, estimulando a circulação de sangue em minhas bochechas. Uma sequência de movimentos precisos e rápidos me bombardeou enquanto seus dedos — agora três — metiam sem compaixão, deslizando deliciosamente para dentro de mim. Sem forças para me sustentar em meus próprios braços, deitei-me na superfície fria do piano, escancarando minhas pernas enquanto me chupava como se fosse morrer amanhã, sedento por cada mínima gota que eu podia oferecer. Senti meu orgasmo se aproximando, meus músculos internos apertando seus dedos com força no ritmo de suas investidas, e os intervalos entre meus gemidos ficaram cada vez menores. Aos poucos, meu ventre começou a formigar, incapaz de se conter e diferenciar os movimentos de seus dedos e língua, jorrando para sua boca aberta e receptiva. Apertei seu rosto entre minhas coxas, sentindo meu peito subir e descer de forma brusca enquanto o orgasmo durava seus últimos segundos, percorrendo milímetro por milímetro do meu corpo. Seu nome cabia perfeitamente na fresta entreaberta em meus lábios, que chamei de novo e de novo enquanto tentava recuperar a sanidade. A única coisa que senti, entretanto, foi algo duro e grande se acomodando em minha entrada, reacendendo a força de meus músculos.
— Perfeita, perfeita — ouvi dizer com dificuldade enquanto me penetrava lentamente, obrigando nós dois a sentir cada pedaço deslizando pelo meu interior. — Você não sabe o quanto fica linda quando goza... Porra, meu anjo, eu preciso te ver assim de novo.
Eu o ouvia com clareza, mas meu corpo ainda imobilizado pela explosão de sentidos errantes me impossibilitava de responder à altura. Apoiei meu pé coberto pela meia em seu peito, tendo uma visão sublime dos seus braços tatuados enquanto suas mãos buscavam suporte em minhas coxas. Mordi meu lábio inferior com força, submissa à sua glande encurralada em meu sexo, derrapando com vigor até o limite. Sua boca de formato fino e irascivelmente angelical soltou um ganido profundo ao encontrar-se completamente inundado em mim, e para testá-lo, forcei meus músculos ao seu redor assim que ele entrou novamente, prendendo toda a cabeça do seu membro em meu sexo. era grande e definido. Me deleitei com seu gemido quando meu quadril rebolou sobre seu órgão repetidas vezes até que ele se acostumasse apenas para parar, negando o que ele mais precisava, capturando-o num jogo pervertido do quanto eu o testaria antes de vê-lo se aliviar.
Subitamente, uma de suas mãos fechou-se ao redor de meu pescoço, arrancando de mim um sorriso convencido que foi rapidamente substituído por um gemido ao que ele meteu brutalmente, estocando contra um dos meus pontos mais sensíveis.
— Não me torture. — Sua voz séria atraiu meus olhos aos seus, mirando-os em desafio. estocou de novo, desta vez mais forte, deslizando com facilidade pela passagem absurdamente lubrificada. Seu gemido uniu-se ao meu, e avancei para a frente, buscando seus lábios com desespero, beijando-o fervorosamente até deixar seus lábios pulsando, vermelhos. Sua mão continuava firme em meu pescoço, enquanto a outra segurava meu quadril como se pudesse estraçalhar cada um dos meus ossos sob a pele com o propósito de empurrar meu corpo aberto ao ritmo rápido e intenso de suas investidas. Ele não parava ou diminuía por um segundo sequer, deixando vidrada em sua expressão de luxúria a cada vez que me penetrava. Mas algo em mim não ficaria inteiramente satisfeito se eu o deixasse alcançar o orgasmo sozinho. Não era o suficiente se eu não pudesse guiá-lo à minha maneira.
Assim que ele se afastou em ordem de voltar com tudo para dentro, levei minha mão ao seu membro, começando a masturbá-lo devagar. me encarou intensamente, afrouxando sem perceber a mão que apertava meu pescoço. Depositei um longo selinho em seus lábios, empurrando-o para trás com meu próprio corpo, virando-o com as costas para o piano e indicando que ele se deitasse. Voltei a montar sobre ele pela segunda vez na noite, e um sorriso malicioso tomou meus lábios ao que rocei minha intimidade ensopada por toda a extensão de seu membro, alisando e apertando seus testículos com a palma da mão. Vi com satisfação os olhos de revirarem nas órbitas, e sem fazê-lo esperar mais, sentei com vontade em seu mastro, apoiando-me no piano para obter o ritmo certo enquanto meus quadris rebolavam deliciosamente. A sensação de estar sendo preenchida por ele era quase ridícula de tão perfeita, como se eu tivesse sido meticulosamente feita apenas para que nos completássemos. Meus gemidos escapavam sem controle, confundindo minha mente ao se embaralharem com os dele, cada vez mais altos e necessitados.
Senti meus pulmões apertados quando ergueu seu tronco apenas o suficiente para beijar meus seios, dividido entre chupá-los e gemer por mim. Eu podia sentir nosso contato ficando cada vez mais lubrificado, e quando ele se afastou com os olhos deslumbrados e ardentes fixos em mim, tive que me controlar para não gritar com a simples visão do seu rosto tomado pelo prazer. Todo o meu corpo entregava-se cegamente a ele; minhas coxas estavam ficando doloridas, meus seios oscilavam conforme eu cavalgava, meu interior se acostumava ao seu sexo, cada vez mais ansioso para recebê-lo por inteiro. Se eu pudesse tê-lo dessa forma todos os dias, gemendo desconexamente meu nome, cingindo minha cintura a cada firme investida e levando o polegar até meu clitóris, me fazendo gritar alto, eu não poderia pedir por muito mais.
— Goza comigo — pediu , beijando minha boca e parecendo provar dos meus gemidos quando eu me afastava, deliciando-se com os sons. — Deixa vir, eu não vou parar... Por favor, meu anjo, goza pra mim.
Fui arrebatada por um orgasmo poderoso que obscureceu meus pensamentos e quase me impediu de prestar a devida atenção em enquanto ele gozava — e porra, que filho da puta. Toda aquela virilidade expressa no urro que ele soltou ao gotejar dentro de mim me causou tremores que iam desde os dedos dos pés até o topo da minha cabeça, dilacerando meu corpo em dois, explodindo minha mente, fazendo minha boceta pulsar de forma violenta. Seu polegar ainda acariciava meu clitóris, agora sem pressa, aproveitando os resquícios do meu gozo enquanto meu quadril subia e descia quase que imperceptivelmente, diminuindo o ritmo conforme nossas respirações tentavam se recuperar.
Eu podia sentir as gotículas de suor descendo pela minha barriga, e o mesmo acontecia com ele; seus cabelos estavam grudados na testa, os braços descansavam em minhas coxas, seu membro palpitava uma última vez. Ainda preenchida por ele, arqueei o corpo para beijá-lo, apoiando minhas mãos em seus ombros. Sua pele macia estava em estado quase febril, e eu sabia que não deveria estar muito diferente.
Desmontei-o com custo após alguns segundos, virando-me para pegar minhas roupas. Soube, pelo som que o piano fez, que ele havia se sentado e agora me observava atentamente. Me apoiei em meus joelhos, esticando o braço para minha calcinha enquanto deixava meu bumbum arqueado, afastando um pouco as pernas.
Ouvi suspirar.
— Da próxima vez, eu vou comer a sua bunda — disse ele, sem cerimônias, me fazendo rir.
Me levantei com minha calcinha e sutiã em mãos e comecei a vesti-los.
— Eu decido isso — rebati, sorrindo confiante.
Foi a vez dele sorrir. Vi pelo canto do olho, enquanto buscava meu vestido, que ele erguia as calças, fechando o zíper com certa relutância.
— Decida quando vamos nos encontrar de novo, então.
— Não sei se deveria — respondi sem maiores cerimônias.
— Você pode abrir uma exceção pra mim, não pode? Digo... Quanto a me ver de novo.
Demorei dois segundos para perceber o que ele queria dizer com aquilo. É claro que ele sabia, é claro que ele havia captado pela forma como eu começara a me vestir rápido. Eu não repetia homens, eu não repetia noites, por mais que quisesse. Havia algo em mim que me impedia. Eu era solitária e um tanto quanto temerosa, uma loba fora da matilha, o pervertido da história — nunca havia sido a princesa, nunca, nunca, nunca.
Fiquei congelada por alguns instantes, buscando o que responder. O engraçado é que poderia ter dito um simples não. Mas algo não estaria certo se eu dissesse, e eu sabia. notou minha imparcialidade, e isso deve tê-lo posto numa situação desconfortável ao que ele se levantou do piano, caminhando até mim. Ao parar na minha frente, senti seu beijo carinhoso tocar minha testa, derrubando algumas das minhas defesas que eu havia construído após anos mergulhada na depravação do meu berço.
— Você sabe onde me encontrar — disse.
E então ele fez o que nenhuma pessoa havia feito antes: saiu.
Saiu antes de mim.
Eu nunca havia ficado para trás.
As donzelas que ficam para trás. Eu não era uma donzela.
Eu era um pervertido. Uma forasteira. Uma identidade fodida.
E meu corpo ainda queimava enquanto ele caminhava para fora do salão, fechando a porta atrás de si.
Por um instante, aquilo me fez sentir como se estivesse sendo abandonada. Mas não era verdade, era?
Não poderia ser.
A verdade é que aquela não foi uma situação única de abandono, pois ele não havia me abandonado. havia me respeitado, aceitado as minhas condições sem forçar um acaso ou algo parecido. Ele não havia se gabado nem me julgado. Eu o amei um pouco por isso.
Encarei meu vestido miserável no chão, tentando afastar toda a negatividade que a solidão podia trazer ancorada à sua presença. Respirei fundo. Não pense, . Porra, não pense. Apenas faça.
Num instante, eu estava estática no meio de um salão com um piano velho marcado de sexo; no outro, descia as escadas de emergência com passos apressados e rápidos, segurando no corrimão como se fosse a única coisa a agarrar minha existência. Sentia o frio contra meu corpo seminu, concentrada para não tropeçar. Não demorou para que eu o encontrasse; estava tirando um maço de cigarros do bolso da calça, mas deixou-o cair assim que virou-se, fixando seus olhos flamejantes e confusos em mim. Empurrei-o contra a parede e tirei sua blusa, expondo todo o seu peitoral para meus olhos e dedos, calando sua exclamação de surpresa com um beijo entorpecente.
— Eu decido — prendi seu lábio inferior entre meus dentes, respirando audivelmente contra seus lábios. —, e você fica comigo hoje.
E então, como qualquer pervertido, me alimentei da malícia em seus olhos para começar tudo de novo.
Algo incrível pode acontecer se você for esperto o suficiente para continuar tentando. — Tenho certeza de que na hora em que ouvi essa frase pela primeira vez, estava provavelmente olhando para o que havia do outro lado da janela, pensando em quanto seria maravilhoso estar em outro lugar que não uma sala de aula — mas não havia com o que me preocupar, de fato. Sabia que, se fosse uma boa garota, mamãe me levaria na mesma semana para a loja de doces e compraria quatro generosos pacotes de gummy bears. Deveria estar prestando atenção no professor, mas eu sempre gostara muito de cores, então ignorava os tons mórbidos da aula para observar os jardins do lado de fora e seus girassóis prestes a morrer.
Eu tinha uma conduta fácil: deixe o seu olho consumir proteína, não doce. Alimente-o da maneira certa, atribua significados ao que você consegue enxergar. Van Gogh tinha a sua fixação pelo amarelo; eu, pelo arco-íris. E eis algo que eu posso afirmar: sempre demandei uma explicação — era louca pelo arco-íris porque ele surgia na submissão de dois opostos, a chuva e o sol. Entendia praticamente tudo sobre cores primárias e secundárias, quentes e frias; o quanto de vermelho deveria misturar com o azul para obter meu tom de roxo favorito. Essas pequenas combinações, para mim, eram fichinha.
Assim, eu sempre demonstrei curiosidade quanto ao significado das cores. Não que eu as usasse como pretexto para expressar quaisquer das emoções primárias dos seres humanos — sempre fui mais complexa (como uma paleta de cores), embora não fosse academicamente notável. Certa vez, quando tinha sete anos, avistei uma garota ruiva morta boiando no rio de águas cor-de-grafite perto de casa, e a cor perfeita de seus cabelos me inspiraria anos depois a pintar meu próprio cabelo de ruivo — o significado? Eu via na autonomia daquela cor uma vida que significava renovação ao passar pela morte dia após dia. A morte existe em todos os instantes, mas só vale a pena viver se você puder passar por ela conscientemente. Foi isso o que a vida me ensinou.
Minhas mortes, mesmo assim, foram pequenas se comparadas ao que a morte em si quer dizer. A grande morte não se resumiria ao ato final de parar de respirar ou sentir o coração parando, mas sim em sofrer imensuravelmente em vida — por exemplo, quando eu tinha seis anos, cheguei de mãos dadas com meu irmão Miles em casa para descobrir meus pais assassinados na cozinha. Havia sangue por todos os lados, alguns miolos e balas de pistolas cravadas na parede — eu nunca mais vesti nada que fosse vermelho. Mas no dia em que nos deparamos na porta de madeira velha do Conde A., uma semana após o duplo homicídio, o céu estava nublado e a árvore retorcida de flores amarelas despejava pequenas folhas em minha cabeça. Elas grudavam no cabelo como malditas abelhinhas. Eu ainda segurava a sua dócil mão; era a única coisa a qual podia me agarrar.
— E se não gostarem de nós, Miles? — perguntei receosa. — E se fizerem como aconteceu com a Krist? E se nos jogarem num armário e nos deixarem lá dentro, trancados? O que vamos fazer?
— Ninguém vai nos trancar em nenhum armário. — Seus olhinhos eram do tom mais verde possível, e eu poderia olhar para eles com devoção por toda a minha vida se ele continuasse a me confortar só de me olhar. — Algo incrível pode acontecer se continuarmos tentando. E eu nunca vou deixar de tentar te proteger. Você é minha irmãzinha. Vou cuidar de você.
Era tudo o que eu precisava ouvir.
No entanto, a cor ocre dos dentes do Conde A. foi a primeira das cores a me enojar profundamente. Ele fumava, e muito. Durante o dia e durante a noite. Ininterruptamente. Dois maços, ou mais, por dia — num dia ruim, ele podia chegar a fumar quatro deles. Seu sorriso era quase um esboço da porta do inferno, nojento e torto, malvado. Eu odiava quando ele sorria, e esse foi um dos fatores que me convenceu a não dar motivos para deixá-lo feliz. Agora o conde era meu tutor, o homem que zelava pela minha formação — e ficou clara a forma como ele lidava com isso quando matriculou Miles na melhor escola da cidade enquanto eu frequentava uma das mais baixias; mesmo que Miles fosse mais velho, eu fui a primeira a encarar uma turma de drogados tentando enfiar cocaína pelo meu nariz à força na oitava série. Ele veio a experimentar essas pequenas ameaças anos mais tarde e de forma bem mais generosa e passiva. Ele tinha amiguinhos, eu tinha coleguinhas de opressão. Ele tinha autorização para trazer esses amigos em casa, eu não podia sequer dar o meu endereço a terceiros. E é claro que eu sentia isso; toda essa preferência me afetava, eu chorava, eu sentia raiva, eu sentia dúvida. Por que eu não poderia ser o que o conde queria? Se eu fosse um menino, seria melhor? Se eu fosse um menino, eu teria amigos?
Miles me dizia que a culpa não era minha. Ele enfrentava constantemente nosso tutor a meu favor, mas os sacrifícios realizados por ele para que meu irmão se transformasse num grande homem o faziam se calar diante da sua ordem. Eu queria entendê-lo, juro que queria. Mas aqueles anos foram muito perturbadores para que uma criança como eu pudesse entender algo além da minha própria condição. Sabia que Miles carregava uma culpa imensa, e ele até chegou a tirar um pouco do seu tempo para me ajudar a estudar, mas eu me mostrava mais interessada por atividades artísticas — coisa que ele, em sua exatidão, tinha dificuldade para absorver. Então, prestávamos atenção um ao outro, mas nunca tão avidamente.
Nosso tutor nos observava com desafeto nos olhos todas as vezes em que esses eventos aconteciam.
Conde A. era um homem velho e gordo, encurvado como uma árvore que nasce distorcida durante a mudança das estações. Seus olhos eram sempre vermelhos e molhados, às vezes pincelados com rastros nojentos de remela que tirariam qualquer pessoa limpa do sério. Em sociedade, entretanto, ele os limpava meticulosamente. Vestia-se sempre de cinza ou preto, e seu estilo parecia o mesmo de homens do século XIX. Usava chapéus que amava com todo o seu coração. Era rico, egoísta, falava devagar. Seu prato favorito era macarronada; assim que soube que o meu era frango com ameixas, recusou-se a deixar qualquer uma das cozinheiras a servir o prato. Tinha uma antipatia por mim que só não era maior devido ao fato de que trabalhava sempre que eu estava em casa. Tinha um escritório contábil — coisa assim — e clientes fiéis, ia a festas para adultos às quais arrastou Miles assim que ele entrou para a faculdade de medicina. Eu, nessa época, ainda estava no ensino médio, enfrentando deveres de matemática e xaropes para a tosse que me debilitavam. Lembro que senti um orgulho tremendo do meu irmão; talvez, se mamãe a papai estivessem vivos, aquilo seria impossível. O conde estava dando a Miles uma chance na vida como ninguém mais poderia fazer.
É estranho pensar que minha vida poderia ter sido diferente. Quando me sinto culpada, penso que nem tudo foi fruto da minha própria perversão. Não entendo qual tipo de ação poderia ter me modificado mais do que me auto identificar como órfã — sem mãe, sem pai, eu estava castrada. Miles cuidava de mim, mas estudava muito para se importar com a falta de absorventes que eu enfrentava uma vez ao mês; ele me amava, mas a sua masculinidade de ego inflado começou a tomar proporções que o afastaram assim que começou a fazer sexo com o maior número de meninas possível. Talvez ele tivesse percebido do que eu era feita — e ao me renegar por isso, eu o reneguei por ser sexista e hipócrita. Nunca entendi como um homem pode amar tanto a parte de uma mulher e fingir que a odeia por conveniência. Nunca entendi como a ausência de masculinidade em mim me fez um alvo fácil para Conde A. Nunca, nunca, nunca cheguei a tentar entender como ele pode me trancar no armário quando soube que eu havia passado a noite fazendo sexo com meu primeiro namorado.
Isso é bom — quando você não entende os monstros, quer dizer que está no caminho certo.
Esses são traumas. Eu estava falando sobre cores.
As cores dos meus traumas são respectivamente ocre, vermelho e preto. A escuridão contida no preto me causava falta de ar e tremedeiras, mas eu encontrei em mim mesma algo capaz de assassinar um pouco do meu medo, algo tão consistente e tão presente em meus impulsos, fantasias e instintos que não me deixou seguir outro caminho.
Eu podia ser perversa também.
Não pretendo explicar o que significa ser uma pessoa perversa. Você já tem a sua visão sobre isso, você sabe quando uma teoria é perversa demais para ser verdade — e você se surpreende toda a vez que ela se prova como verdadeira. Sei, por procurar mil vezes no dicionário, que a palavra “perversão” tem a ver com má índole, depravação e corrupção. Sei que minha mente corrompida não fez nada além de aceitar uma merda atrás da outra sem se importar em consertar. É caótico, e o caos está, inclusive, nas coisas boas.
Comecei pelo mar — navios afundados, corpos afogados, animais trucidados, correntes marítimas, ondas fortes quebrando na praia, o transporte de conchinhas e corpos de marinheiros. O mar seguia a sua natureza. O que me impedia de seguir a minha? Que me prendessem no armário por horas a fio; eu faria sexo com quem bem entendesse. Que me dessem uma educação idiota; eu me educaria. Que me deixassem histérica; eu seria como o mar. Todo o rio dava para o mar — toda merda que me causavam dava à minha personalidade algo para se orgulhar. Teria sido ótimo se eu tivesse realmente transformado o meu caráter em algo impecável, em algo exemplar, mas não foi assim que aconteceu. Eu me sentia deitada num chão repleto de lixo, e só o que pude fazer foi segurar a mão das pessoas que se deitavam comigo ali e apertá-las com tanta força que elas explodiam em meus dedos.
Eu havia acabado de fazer dezoito anos, contava nos dedos doze anos de submissão e sofrimento. A psicanálise poderia fazer muito por mim, tenho certeza, mas a única ajuda que eu poderia obter era minha própria força. O meu corpo suava. Meus desejos nunca foram tão reais — dezoito anos e um pouco obsessiva, com uma carga de sexo e álcool grande demais para meu próprio corpo, com jogos mentais que desvendavam as pessoas sem dificuldade e se aproveitavam de seus pontos fracos para atacá-las. Eu odiava o Conde A., às vezes eu odiava Miles. Eu era frustrada, fantasmagórica, magra, gorda, cachorra, poetisa, pirata, esquecida, puta — eu era todas as coisas. Estivera apagada há tanto tempo que queria brilhar como todas as estrelas do céu — um único corpo brilhando como o infinito.
Eu sabia exatamente o que dizer para cada um dos rapazes por quais me interessava. Conhecia a fundo o seu desejo de conseguir alguém diferente — e eu fui diferente de mil e uma formas, sempre renegando a minha verdadeira identidade para que as pessoas me amassem. Eu me aproveitei de tudo e de todos, consegui dinheiro, apelo emocional, presentes caros, viagens, amor — e nunca era o suficiente.
As pessoas, de forma geral, tendem a romantizar o caos. As pessoas acham lindo que o amor possa ser obsessivo, elas amam o sabor de vencer, amam pensar que o sol surge por elas. As pessoas amam ler artigos eróticos para testar com seus namorados e namoradas, amam fingir ser aquilo que não são, amam fingir que sabem o que não compreendem. Os garotos querem que pensemos que eles não choram, que seu gosto musical é uma vantagem, que fazer uma garota chorar é sensacional, que fazer uma garota gozar é sensacional, mas menos. As garotas, por outro lado, querem ser legais, descoladas, sexy, os dois lados da moeda que estabelecem uma relação de identidade com a puta e a lady — eu me afundava perdidamente nesses pequenos jogos mentais, eu me divertia fingindo e mentindo. Dê aos homens um pouco de paciência e palavras bonitas, compartilhe sonhos inventados, finja que gosta do que eles têm a dizer, chore romanticamente por ele quando estiver bêbada, faça sexo oral mesmo sem ter vontade, deixe que os desejos dele se transformem nos seus. Seja legal, carinhosa, dê a eles jogos. Alguns deles gostam de juntar peças, alguns acreditam que poderiam mover o paraíso através dos seus olhos. Alguns podem até chorar quando você se for. Use, então, essa sua identidade contemporânea — por meses, ninguém suspeitou que eu fosse o pervertido da história e não a princesa. Mas não se esqueça de dar espaço a si mesma. Se você é o pervertido, siga a sua perversão.
A última cor do meu trauma — amarelo — justifica-se pelo velório do Conde A. Ele era feio e diabólico em vida, mas toda a sua demagogia pareceu agigantar-se quando o deitaram num caixão. Tiveram que enterrá-lo sem roupas, uma vez que a cidade não admitia um período maior de dois dias sem que enterrassem o óbito, e nenhuma região próxima entregaria roupas maiores ao corpo duplamente enchido do defunto nesse espaço de tempo. Ele era uma mescla grotesca de roxo, azul e vermelho. As flores amarelas que davam na árvore retorcida à frente da sua casa decoravam todo o cômodo enquanto seus clientes fiéis compareciam para prestar condolências e dar uma olhada no seu pau absurdamente pequeno. Eu estava sentada num dos sofás da sala de pernas cruzadas, atenta ao meu copo de uísque barato e cansada do clima pesado que se estabelecia na presença de um morto. Os rostos de estranhos poderiam me inspirar de alguma forma, e nunca duvidei de que eu estivesse feliz pelo homem que arruinou anos da minha vida estar morto (obrigada, insuficiência nos pulmões), mas algo não parecia certo. Ajeitei minha saia de seda preta, levantei-me do sofá e segui para a varanda, onde Miles fumava mais um dos seus maços diários.
A árvore retorcida nos agraciava com suas florezinhas amarelas. Eu odiava aquela árvore tanto quanto odiava o cheiro dos cigarros de Miles chegando até mim e corrompendo meus cabelos lavados com shampoo de morango.
— Você parece feliz, irmãzinha — comentou ele ao me ver, usando do seu costume de me chamar de irmãzinha de forma nada carinhosa. Toda a vez que ele dizia aquilo, era como se algo ruim estivesse prestes a acontecer comigo.
— Impressão a sua — rebati, dando de ombros.
Ele mudou o peso para um dos pés, tragando o cigarro com os olhos muito verdes fixos em mim.
— Um dos doutores mais famosos da cidade está aí — disse, batendo as cinzas do cigarro o mais próximo possível dos meus sapatos. — Já ouviu falar do Dr. Collins, acredito. Um neurologista eficiente, sem dúvida; salvou a vida de três pessoas semana passada. Deveria falar com ele.
Suspirei. A cada segundo que passava ali, mais odiava o tom de amarelo daquelas flores.
— Não há muito que eu possa falar que vá interessá-lo — enfatizei. — Ele não deve gostar de discutir coisas como apropriação da cultura, placas tectônicas ou a importância da identidade do gênero na infância.
Miles soltou uma risada nasalada.
— É incrível, sabe? — perguntou; a fumaça do cigarro tornava difícil ver o seu rosto; uma analogia ao que ele e suas intenções significavam: era impossível lê-lo com clareza. — O quão medíocre o mundo pode ser. O quão medíocre você pode ser. Sabe que conseguiria ter o cara nas mãos se quisesse.
Dei um breve gole em meu copo de uísque.
— Eu não quero. Ele é um cara sem tempo, gordo, provavelmente fuma e trai a esposa com quantas quiser. Por que eu iria querer uma pessoa dessa?
— Não julgue tão fácil. Você ficaria surpresa.
— Poucas coisas podem me surpreender, Miles.
Ele voltou a bater o cigarro. Tragou-o com vontade. Eu esvaziei meu copo de uísque.
— O que fazemos agora? — perguntou meu irmãozinho.
Encarei meu copo vazio com desaprovação. Eu precisava de álcool.
— Só tente não se lembrar do pinto dele — respondi. — E fique vivo.
É no embalo. Na reprodução, na irrealidade. Supremacia. Queria ser louca, maluca, queria saber mais. Dormir do lado avesso da cama. Acordar. Dormir de novo. Esquecer, lembrar. Limpar os pensamentos. São coisas e mais coisas. Deveria escrever cartas e endereçá-las a mim, cartas bonitas, cartas de sangue, cartas de nuvens de algodão. É uma lástima saber que o que escrevo hoje e agora, posso queimar/deletar/fazer flutuar nas lágrimas que vou chorar um dia. Meus amigos imaginários e as paisagens que eu crio e queimo e sou piromaníaca mesmo, de qualquer jeito. Não quero mais. Quero queimar tudo. Todas as coisas que eu fui. Acordar numa maldita ressaca e dizer "nasci de novo". Me eternizar em solos de guitarra e dizeres de putaria. Falar tanta putaria no ouvido de alguém que vai doer. Abandonar o que tiver que ser. Voltar à dor como condenada, usar as unhas, falar putaria de novo e cada vez mais, chupar como se chupa pirulito, inventar pronomes de posse, retocar toques. Açoitar bochechas. Aceitar de uma vez por todas que nunca será a última vez que escrevo sobre romance ou sexo porque sempre há mais. Porque todos os dias eu amo de forma diferente, todos os dias eu me excito com coisas diferentes, novas companhias, quero colocar tudo isso em papel e depois queimar. Queimar. Queimar. Deixar sangrar. Sinto-me agora como me senti há dois anos. A mesma música. A mesma sensação, mórbida e excitada, melancólica e cheia, dopada, com muita coisa na garganta, querendo que me batam, querendo bater nos outros, querendo o certo da forma errada e sem foco. SEM FOCO. Sem foco nenhum. Acho que vou pegar o telefone e sair de casa e fugir e dar pro primeiro que passar na rua. Sempre me disseram que eu seria a princesa da história, nunca o pervertido. Nunca o fuso da agulha, nunca o veneno, nunca o corte no sapatinho de cristal. Nunca a ganância - de todas as coisas, a ganância é a mais real. A menos distante. A dança da minha morte. O passo do meu compasso. A imperturbável memória de que todas as coisas são efêmeras. Jogos, não os quero. Amanhã é só mais uma chance de ser melhor do que hoje. A chance de rir de novo e mandar se foder. Chutar. Lamber. Chorar. Crescer - até não caber mais nos meus sapatinhos feitos em perversão, traçados em estradas, esfolados e manchados de sangue discreto.
Eu costumava colecionar pequenas quantidades de açúcar no fundo de xícaras de café quente e forte. E desenhos de crianças, carícias no pescoço de uma cadela. Nas esquinas da minha mente, eu era a maior colecionadora do mundo. Gostava de quartos escuros e não sabia escolher entre cachorros e gatos. Eu me isolava na arte, minha melhor amiga, e nem céus nublados, meu melhor refúgio. Era apaixonante, mas nunca se apaixonavam por mim. Nunca me violentavam ou coisa parecia – eu deveria ter sido marinheiro. Sutilezas e verdades encontrariam seu caminho ao mar até mim e me fariam prosa por lá. Levaria animais de estimação para passear. Ondas... Espuma branca – que me deixassem esquecer o passado. A vida, essa coisa grotesca, me lembra que um apaixonado sofre pelo apaixonado que sofre por outro. Me lembra que ilusões me fizeram procurar forças em músicas poderosas, que foram a tradução livre do oceano, do movimento perfeito e sublime das águas.
Era apaixonante, então. Mas sem pretendentes honestos, o que me fez pertencer antes ao mundo e a minha própria natureza do que aos homens.
Pertencer ao mundo é viver — e há vida na morte assim como há morte na vida. Morrer por viver é quase uma piada. Se não fossem esses pequenos disfarces, talvez eu seria julgada. Mas a morte em vida é algo honroso. Morri uma vez hoje. E ninguém viu porque eu me camuflo. Quanto ao que me faz morrer, essa é uma história para outro louco escrever.
Eu poderia passar horas a fio observando a tatuagem de escorpião no pescoço de sem me incomodar com mais nada no mundo. Poderia acariciar seus cabelos por longos minutos, ouvir sua respiração calma, decorar cada detalhe da palma da sua mão. Poderia permanecer como estava naquele momento, deitada com a cabeça entre suas pernas enquanto ele lia para mim num ritmo suave e coeso:
— Quem fosse retirado de seu quarto, quase sem preparação ou transição, e posto nas alturas de uma grande montanha, necessariamente sentiria algo semelhante: uma insegurança sem igual, um abandono ao inominável quase o aniquilariam. Ele pensaria estar caindo ou sendo arrastado pelos ares ou destroçado em mil pedaços. Seu cérebro precisaria inventar uma mentira enorme para captar e esclarecer a situação de seus sentidos. É assim que se modificam, para quem se torna solitário, todas as distâncias, todas as medidas; dessas modificações, há muitas que ocorrem repentinamente. Como para aquele homem no pico da montanha, surgem então imaginações inabituais e sensações estranhas, que parecem ultrapassar a medida do que se pode suportar. No entanto é necessário que vivamos também isso. Precisamos aceitar a nossa existência em todo o seu alcance; tudo, mesmo o inaudito, tem de ser possível nela. No fundo é esta a única coragem que se exige de nós: sermos corajosos diante do que é mais estranho, mais maravilhoso e mais inexplicável entre tudo com que nos deparamos.
Aqueles eram, sem dúvidas, os meus mais novos momentos favoritos: sexta-feira à noite, quando ele me buscava em seu Chevy Impala de motor ruidoso e me levava para o seu apartamento no subúrbio da Campina, longe de todo o barulho e vivacidade do porto. Assistíamos a filmes, líamos um para o outro, esvaziávamos potes de sorvete de chocomenta, ficávamos juntos, consumindo tudo o que um oferecia ao outro. Era o modo mais firme de proteção que eu conhecia.
Era o que me dava coragem de ser corajosa durante a semana para vê-lo quando anoitecia.
— Esse Rilke era um cara interessante — comentei, virando meu corpo no sofá de forma a encará-lo de frente. — E escrevia bem pra caramba.
— Não melhor do que você.
Abri um sorriso dócil. Meu garoto estava lindo em sua jaqueta de estampa militar, com o cabelo recém-lavado e caído sobre o rosto fino. Seus lábios rosados me atraíam instintivamente, trazendo-me para mais perto do seu rosto. O seu perfume amadeirado me estonteava, fazendo-me respirar fundo toda a vez que podia senti-lo.
— Eu não faço poesia para a arte — sussurrei, sentindo uma das suas mãos passeando livremente em minhas costas. — Eu não levo poesia a sério.
— E é justamente por isso que vale a pena.
— Nós não nos levamos a sério, levamos?
— Nenhum pouco.
Eu poderia assassinar alguém para vê-lo sorrir daquela forma todos os dias, relaxado e feliz, tranquilo. Havia diversos extremos em que eu estava conhecendo aos poucos; ele podia ser louco, carinhoso, intenso, desleixado, obscuro, violento, sedutor, idiota e várias outras coisas que embaralhavam minha mente — o ponto era que eu não usava minha mente quando estávamos juntos, eu não tentava entender; eu apenas permitia que ele fosse o que quisesse, porque era assim que ele me aceitava também. Éramos tão naturais, não precisávamos forçar nada. Apenas precisávamos nos encontrar. Éramos melhores quando nos juntávamos, eu sentia isso. Nunca fora boa em admitir que as pessoas, às vezes, eram capazes de me fazer sentir alegria, mas não seria covarde em negar o que ele me dava. Eu era, em sua companhia, um pouco mais feliz.
— O que foi? — perguntou quando notou que eu o estava encarando por tempo demais, fechando o livro e pousando-o no apoio do sofá.
Suspirei, plantando um beijo em sua bochecha mais próxima.
— Tive uma semana difícil, amor — disse, permitindo que meus dedos começassem a desenhar formas aleatórias em seu peito coberto pelas roupas. — Mas me comportei bem, fui exemplar... Eu merecia uma recompensa.
duplicou a firmeza na mão em minhas costas, me apertando contra a lateral de seu corpo. Suas pupilas dilataram visivelmente e ele soltou uma risada morna e curta, mostrando a perfeição de seus dentes brancos e alinhados.
— Sem dúvida — assentiu, voltando a manejar os dedos às minhas costas. — E o que você quer, meu anjo?
Tentando não sorrir, ergui meu rosto até o seu ouvido. Prendi seu lóbulo entre meus dentes com delicadeza, em seguida chupando-o. Minha língua percorreu totalmente molhada a extensão da sua orelha, e o senti tremer e arrepiar com aquele simples toque, fazendo meu peito inflar de vaidade.
— Seu pau na minha boca — respondi, e sem dar tempo para que ele pensasse, ataquei seus lábios, chocando minha língua com a sua, começando um beijo lento e sensual. soltou um ganido excitado contra meus lábios, e a mão que estava parada em minhas costas subiu até os fios de cabelo em minha nuca; ele puxou-os sem força, resvalando os lábios aveludados e quentes pelo meu pescoço, distribuindo leves lambidas e mordidas ali. Com um sorriso perverso, afastei-me dele, movendo minha cabeça em negação. Dois dos meus dedos foram parar em sua boca, calando-o, e eu quase senti minha calcinha ensopar pela forma ardente e profunda com a qual ele me encarava, como se pudesse me devorar inteira. — Eu vou cuidar de você. Não me distraia.
— ...
Ele não teve tempo de formular qualquer frase, uma vez que meus lábios famintos chupavam com vontade a pele exposta de seu pescoço com o propósito de marcá-lo para mim. Beijei a área desenhada pelo escorpião, pressionando minha língua contra sua pele macia, deslizando toda a umidade da minha boca até a curva de seu pescoço. Minhas mãos foram hábeis em despi-lo, atirando sua jaqueta e, em seguida, sua camiseta para longe. Eu já estava acostumada a cada uma das suas tatuagens, mas nunca me cansava de dar a devida atenção a elas, tocando-as com as pontas dos dedos, acariciando-as em toda a sua extensão com meus lábios e dentes, decorando todas as suas cores. Deixei uma trilha de beijos e chupões em seu peito, e quando meus lábios encontraram a pele abaixo do seu umbigo, levei uma das mãos até o volume já evidente em seus jeans, alisando devagar. Abri o zíper sem pressa, erguendo os olhos para vê-lo atento às minhas ações, mordendo o lábio inferior de expectativa. Para torturá-lo, calculei cada um dos meus movimentos, descendo sua calça devagar e voltando a tocar seu membro sobre o tecido da boxer, apertando-o entre meus dedos e sentindo-o endurecer ainda mais contra a palma da minha mão.
— É assim que você fica por minha causa? — Meus lábios desceram sobre ele, e capturei uma parte do seu órgão em minha boca, subindo e deslizando com ela por cima do tecido, soltando minha respiração quente ali. fechou os olhos, umedecendo os lábios com a sensação e fechando a mão com força em minha cintura.
— Você sabe que sim. — A rouquidão em sua voz me estimulou, fazendo com que eu sentisse minha intimidade molhada clamar por atenção. Mas ela sabia esperar. Meu sexo pulsava ao constatar o quanto eu podia excitar , o quanto enlouquecê-lo me enlouquecia. Toda a minha boca salivou ao vê-lo vulnerável, receptivo às minhas ideias, tremendo sob meu corpo, pronto pra mim.
— Eu devo aliviá-lo, hm? — murmurei, prendendo o elástico da boxer entre meus dentes e descendo-a com a ajuda dos dedos. paralisou e abriu seus olhos, deixando-os fixos em mim. Aproveitei a sua atenção e delicadamente passei a língua pela sua glande, satisfeita com o suspiro profundo que ele deixou escapar. — Você mal pode esperar, não é?
— Droga, ! — Vi com clareza a impaciência em seus olhos, e antes que sua mão alcançasse minha nuca para que ele realizasse o que estava pensando, lambi toda a extensão do seu membro. Abocanhei-o, envolvendo a glande com minha língua, pressionando os lábios contra ela e descendo até a base, deixando minha saliva escorrer centímetro por centímetro nele. Voltei até a ponta, afastando meus lábios apenas o suficiente para cuspir na cabeça de seu mastro, e enquanto meus dedos se ocupavam em masturbá-lo, lubrificando-o, minha boca acariciou seus testículos, chupando cada um deles calmamente antes de voltar ao seu membro extremamente duro. Comecei um ritmo com minhas mãos e lábios, masturbando toda a parte dele que não conseguia engolir, erguendo meus olhos para ele, deleitando-me com cada uma das suas expressões de prazer. Observar , que mantinha a boca entreaberta, os olhos dopados e a garganta retesada, e a forma como ele reagia era, talvez, a melhor parte. Havia algo angelical na forma como as veias em sua testa pulsavam e seus gemidos nítidos eram capazes de, sozinhos, me levar ao êxtase. Sua respiração oscilava a cada lambida, seu olhar me queimava a cada longa chupada que eu dava, seu gosto se intensificava conforme eu brincava livremente com todo o seu tamanho, pincelando-o como uma garotinha inocente provando um pirulito.
Eu conhecia todos os seus sinais muito bem. Por isso, assim que percebi que ele estava corado, intercalando seus dizeres de putaria entre gemidos sôfregos, alternei o ritmo e os movimentos, cuspindo de novo e mais uma vez, arranhando sua coxa com minhas unhas. Busquei por suas mãos e as levei até meus cabelos, encorajando-o com o olhar fixo no dele. Movi minha língua em círculos ao redor da ponta do seu órgão antes de deslizá-lo por toda a minha boca, engolindo-o até a base. Mantive-me ali, enrolando minha língua ao seu redor e focada em realizar movimentos de sucção, repetindo o ato — afastar a boca, brincar com a ponta, engoli-lo — várias vezes. As mãos de puxaram com força meu cabelo, afastando os fios de meu rosto para que ele pudesse me fitar.
— Caralho, — xingou ao que aumentei o ritmo, perdendo toda a minha boca em sua extensão rígida. — Isso, boa garota... Puta que pariu. Engole tudo, meu anjo. Vai me fazer gozar...
Incitada pelas suas palavras, fiz exatamente o que ele pediu. O ritmo tornou-se irracional. Meus dedos o apertavam e iam de baixo para cima, enquanto minha língua e lábios focavam na glande. Meu queixo doía e os puxões de em meu cabelo também, mas não importava. Continuei, derretendo por dentro ao ouvir seus gemidos e palavrões, prendendo seu mastro em minha boca quando ele começou a jorrar para dentro dela, pulsando, impulsionando seu quadril com força contra meus lábios. Mais uma vez presenciei a forma como ele gozava, desconexo e insano, fraquejando e respirando alto, gostoso, tesudo, meu. Engoli gota por gota do seu gozo, limpando seu órgão com minha língua, e um sorriso malicioso e satisfeito tomou meus lábios ao que ele me encarou, inebriado, tentando retomar o controle.
— Minha linda. — Onde antes ele puxava, começou a acariciar meus cabelos, embolando os dedos pela lateral do meu rosto, tocando meus lábios com o polegar. — Você é perfeita pra mim, sabia? Gostosa. — Deixei que seu dedo entrasse em minha boca, chupando-o de leve. Ele abriu um sorriso libidinoso. — Minha vez. Eu quero você sentada na minha cara. — A forma como ele falava comigo... Baixinho, gentil, intenso. Devolvi seu sorriso, sentindo meu corpo reagir à suas palavras.
Ele se curvou para me beijar com perfeição ao que seus braços me envolveram, erguendo-me em seu colo. Demorou um pouco até que ele chutasse os jeans e a boxer de suas pernas; em seguida, tirou nossos corpos do sofá, me carregando com as pernas em volta da sua cintura até o quarto.
— Eu preciso de você, meu anjo. — Ele me deitou na cama, subindo por cima de mim. Suas mãos foram diretamente à minha calcinha, descendo-a sem cerimônias pelas minhas pernas, e seus lábios voltaram aos meus carinhosamente e com vontade enquanto suas mãos exploravam minhas coxas. — Você me deixou viciado. Preciso te ter todos os dias... — Mordi os lábios ao que seus dedos talentosos apalparam minha virilha por debaixo da saia, e fui penetrada de surpresa por um dos seus dedos. Gemi o seu nome, fechando os olhos. — Hm, hm. Olha pra mim, anjo. — O obedeci, encontrando aqueles globos brilhantes e vívidos perigosamente próximos dos meus; seus sussurros eram despejados diretamente contra meus lábios. — Assim. Eu quero a sua bunda.
As palavras dele confundiam meus pensamentos de tanto que me excitavam. Eu as absorvia com facilidade, tremia por conta delas, mas nada se comparava ao ato, ao seu dedo me penetrando devagar, deslizando pela minha intimidade e saindo dela, descendo, apertando, acomodando-se à entrada da minha bunda. Um gemido necessitado escapou da minha garganta, e me vi afastando ainda mais minhas pernas para ajudá-lo a me tocar. Mal captei o movimento que ele fez ao deitar de frente para mim, lambendo a parte inferior da minha coxa e arrancando de mim um murmúrio ávido.
— Vire-se, meu anjo — pediu ele, já deitado de barriga para cima. Meus joelhos pareciam não querer responder aos meus comandos, mas consegui girar o corpo, apoiando-me em minhas coxas e sentando exatamente em seu rosto. Ergui a saia para conseguir enxergar , mordendo com força descomunal meu lábio inferior ao sentir o primeiro impulso deliciosamente prazeroso contra meu clitóris. Voluptuosamente, deixei que meu quadril se movesse de forma lenta e gradual sobre sua língua, suspirando em deleite a cada sugada da sua boca. — Tire sua blusa. — Ordenou, e sem deixar de me mover, rebolando em suas bochechas, abri botão por botão da blusinha que vestia, jogando-a para o lado. Fiz o mesmo com meu sutiã, soltando um palavrão alto ao ter meu ponto importante longamente sugado por seus lábios macios. Suas mãos firmes apertaram meus seios, puxando os bicos enrijecidos entre seus dedos, girando-os com eles. — Você pode me dar o que eu quero?
Fiz que sim com a cabeça, incapaz de dar uma resposta plausível. Eu queria mais e mais dele em mim, preenchendo todas as minhas lacunas, então não pensei duas vezes antes de engatinhar para frente e apoiar meu corpo numa das mãos enquanto usava a outra para afastar meu bumbum, deixando o espaço entre eles livre para . A primeira vez que senti sua língua ali, parei de respirar. Corei, totalmente excitada e no cio, quando ele salivou ali, deixando o líquido escorrer até minha intimidade. Agora ele também mudara de posição, ficando de joelhos atrás de mim, curvado sobre minha bunda, com a língua entrando e saindo dela. Meus gemidos aumentaram quando ele voltou a me penetrar, dessa vez com dois dedos, estimulando meu clitóris em círculos com o polegar a cada vez que investia com vigor. O ar ainda fugia aos meus pulmões, e meu corpo automaticamente encheu-os de oxigênio ao que seus dedos se curvaram, enganchados em órbitas. Sua língua não hesitava nem por um instante em me enlouquecer, deixando uma sensação deleitosa de ardência conforme meu líquido lubrificava a palma de sua mão, mesclado à saliva quente que escorria de sua boca. Eu me sentia totalmente melada, estremecendo, vulnerável, arfando de maneira compulsiva, até que seus dedos e língua subitamente pararam; não me deu tempo para reclamar, entretanto, pois logo senti seu membro novamente ereto se acomodando em meu sexo molhado e apertado.
Ele entrou em mim de forma rápida e forte, derrapando centímetro por centímetro de seu membro a me enlouquecer num ritmo enérgico, gemendo gostosamente o meu nome enquanto apertava minha cintura. Incentivado pelos meus gemidos desconexos dignos de uma gata no cio, levou uma das mãos aos meus cabelos, puxando-os enquanto metia sem misericórdia.
— Você merece que eu te coma assim todos os dias — disse ele, arrepiando todos os meus pelos. Seu quadril encaixado ao meu moveu-se em círculos perfeitos, me fazendo corar e curvar os dedos dos pés em resposta. — Merece esquecer tudo, menos de nós. — Flexionei meus músculos internos ao senti-lo fundo em mim, gemendo baixinho. — Porra, . Você fode tão gostoso comigo.
Eu queria esticar meus braços na cama e deixar que ele me fodesse como bem quisesse — não porque estava cansada, mas porque a sua postura de ordem somada à sua mão firme em meu cabelo, me obrigando a ficar de quatro, era demais para que eu aguentasse; ou pelo menos assim eu julgava. , entretanto, conhecia os meus limites melhor do que ninguém. Eu confiava nele de olhos fechados. Ainda estava meio tonta com suas palavras quando ele me puxou pela nuca, deixando-me apoiada em meus joelhos. Uma de suas mãos alcançou meu seio direito enquanto seus dentes morderam minha orelha, e quase desmanchei em seus braços quando seu órgão moveu-se de forma torturante e devagar, me fazendo arquear o quadril por instinto, desejando que ele fosse mais bruto.
— Me diz o que você quer, anjo. — Sua voz acompanhou meu ganido de frustração ao que eu novamente prendia seu membro entre meus músculos, repetindo o movimento. Toda a força que eu tinha foi soprada para longe quando as pontas dos dedos de dedilharam minha barriga, descendo ao meu clitóris inchado e masturbando-o no mesmo ritmo enlouquecedor e inebriante de suas investidas. Tenho certeza de que teria caído contra o colchão se seu corpo forte não estivesse me segurando. — Se atreva comigo, vai. Me conta tudo.
— Eu quero você — sussurrei, ansiosa, amando a maneira como ele apertava meu seio, possesso. — Nunca dei tão gostoso pra alguém.
Ergui o rosto, mirando-o sobre o ombro. Pousei meus lábios nos seus, acariciando seu cabelo macio, prendendo seu lábio inferior para reprimir a vontade de gemer.
— Nunca, amor?
— Nunca. — Meu coração bateu apressado e inflado; eu estava sensível demais, com a percepção aguçada, sentindo seus dedos aumentarem a velocidade. Era delicioso, insano, intenso. Cada fibra do meu ser estremecia, cada mínima partícula clamava por ele, pela sua voz verbalizando coisas indizíveis, pela sua respiração pesada contra minha nuca, pelos seus beijos ternos, pela sua existência. Eu o queria para sempre. — Me bate, .
Ele depositou um selinho sutil na curva do meu pescoço, baixando aos poucos a mão que sustentava meu seio.
— O que você quiser, amor... — sussurrou. — Eu faço tudo o que você inventar.
O tapa foi rijamente forte contra minha nádega direita, espraiando uma ardência lasciva pela minha pele. Meu instinto fez com que eu erguesse o quadril, e já estava preparado para isso, porque em seguida ele forçou meu corpo para baixo, me compelindo a sentar sobre seu membro. Rebolei sobre ele, ganhando mais um tapa como recompensa. Aqueles eram os sons mais eróticos que eu já tinha ouvido: os barulhos do tapa, a respiração profunda de , meus gemidos, a forma como ele xingava, tão duro dentro de mim que chegava a doer um pouco. Os movimentos em meu clitóris não haviam parado, mas alternavam significantemente para que eu não gozasse de uma vez. Continuei os movimentos, esfregando meu bumbum nele, até que salivei em dois dos meus dedos, levando-os à minha bunda, lubrificando a área. Afastei-me por um segundo dele apenas para segurar seu membro, provocando a glande e direcionando-a ao meu traseiro. arquejou, forçando seu quadril lentamente até que toda a sua extensão me invadiu.
— Você é gostosa pra cacete — disse, umedecendo os lábios. — Safada. Apertada, quente e macia... Me diz que você é minha.
— Eu sou sua — falei sem pensar duas vezes. — Só sua, toda sua.
O deleite visível em seus olhos ao ouvir isso me encheu de excitação e compaixão. Consciente disso, seu olhar estreitou, lúbrico e flamejante, e ele demandou mais espaço em mim quando curvou-se para minha orelha.
— Se segura, minha garota. Eu vou te foder da forma que sempre quis.
Minha teoria de que meu corpo tombaria caso deixasse de segurá-lo provou-se vergonhosamente correta quando ele me soltou, cravando as mãos em minha cintura. Fiquei com o bumbum empinado para cima, com os braços esticados acima da minha cabeça, segurando na cabeceira da cama enquanto os sons pornográficos que escapavam dos meus lábios não pediam permissão. Mordi o travesseiro, submissa às suas investidas profundas e fortes, ouvindo deleitosamente todos os seus xingamentos, gritando contra a fronha entre meus dentes. agora movimentava seus dedos em círculos rápidos, alternando os tapas em minha bunda enquanto me penetrava rápido, sussurrando entre gemidos como gostava do tom da minha pele rosado de tanto apanhar. Eu não conseguia pensar em mais nada. Meu corpo havia sido formulado para aquilo, para caber no dele, para que ele fizesse o que bem entendesse com cada centímetro meu, para que ele preenchesse todas as minhas lacunas. Eu queria cada mísero rastro dele, cada reação. Estar em seus braços inteiramente tatuados me elevava a outra dimensão, perder o controle com ele, nele, era a melhor das sensações. fazia meu corpo e meu coração pulsarem como um só. Eu nunca havia me entregado tanto a alguém. E eu gostava de pensar nele como o primeiro.
Nenhum de nós durou muito, é claro. Ele continuou com seus movimentos até que eu me desmanchasse em seus dedos, contraindo ao redor de seu membro, abafando meu grito contra o travesseiro. Todo o meu corpo vibrou enquanto ele ainda estocava, enfurecido, incentivado pelo meu orgasmo, atingindo o seu momentos depois, derramando-se em mim e rangendo seus dentes enquanto pulsava demoradamente, extasiado. Senti seu corpo afundar na cama ao meu lado, permitindo que eu baixasse o quadril e virasse de barriga para cima, ainda ofegante. não estava muito diferente, tentando respirar fundo enquanto permanecia de olhos fechados, umedecendo os lábios. Observei cada um dos seus traços, prensando uma coxa na outra conforme os últimos resquícios do orgasmo faziam meu corpo pulsar por dentro.
Droga. Eu o queria para mim. E sexo não era o suficiente. Eu estava há tempos aberta a ele, prestando atenção em cada mínimo detalhe que podia absorver. Eu não pertencia a ninguém, não pertencia a mim. Ninguém pertence a ninguém, é uma regra simples; não importava quantas das minhas calcinhas ele conhecia, quantos dos defeitos dele eu amasse, quantas das minhas falhas ele contemplava sem me julgar. Mas ele era uma galáxia e eu queria explorá-lo. Eu queria estar com ele, me perder no sorriso perfeito que desabotoou em seus lábios assim que ele abriu os olhos e me encarou, tão puro e angelical que a última coisa que me atingiu foi o fato de termos nos comportados como animais momentos atrás.
— Você deveria morar aqui, comigo — foi o que ele disse, simples, passando a mão pelo cabelo bagunçado.
Franzi o cenho, abrindo um sorriso de canto.
— Você não teria sossego se eu me mudasse pra cá.
— Eu nunca gostei muito de paz, de qualquer forma. — Ele deu de ombros. Seus olhos brilhavam como pequenas estrelas. — Mas só se você quiser, e seria maravilhoso se você quisesse. Eu poderia te levar para todos os lugares possíveis na cidade. Ver você no meu carro de olhos fechados, cantarolando uma música qualquer comigo é uma das coisas que mais me deixa feliz, e só de pensar em ter isso todos os dias eu fico bobo. Um idiota. — sorriu, levando seus dedos aos meus cabelos. — Olha só no que você me transformou. Olha só no que você me transformou, .
Eu não tinha facilidade em dizer o que ele dizia. O fato era que ele me fazia sentir fora do alcance de quaisquer armários nos quais pudessem me prender; me dava coragem. Ele era um tipo de exemplo, quase um mentor — e ele nem se dava conta. Eu gostava da forma como ele sabia ser solitário, como ele sabia me encorajar a entrar em mim mesma e não me achar por horas a fio e perceber que isso não era ruim. Éramos dois lobinhos solitários, no final das contas, com uma vida tranquila e sem pressa. Ele sabia como eu detestava cigarros, por isso nunca os fumava quando estávamos juntos; eu sabia que ele detestava quando batiam com força a porta do Chevy Impala, por isso era extremamente cautelosa. Eram pequenas coisas que decorávamos, que não nos incomodavam em nada. Coisas que eu me lembro de ver minha mãe e pai fazendo antes de me deixarem.
E havia a minha perversidade. Não a minha — a nossa. Havia um lado em que era totalmente animalesco, um lado onde ele odiava a si mesmo, um lado onde ele se encontrava incapaz de me ajudar. E então eu o ajudava. Eu sussurrava, enquanto o abraçava, que tudo estava bem, que não havia motivos para que ele duvidasse disso. Eu havia lido homens grande parte da minha vida adulta — mas ler era quase impossível. É claro que eu conhecia os seus desejos — música, arte, sexo, paz, euforia, amor; é claro que eu sabia que ele queria filhos, que ele era perverso ao seu modo e sabia aceitar o fato com mais transparência do que qualquer outro. Mas eu nunca poderia adivinhar o quão profundos e intensos eram os seus desejos. Ele me surpreendia ao colocá-los na mesa sem dificuldade alguma. Nisso, eu deveria ser mais como ele.
— Me ajuda a fazer as malas? — perguntei inocentemente, envolvendo suas mãos com as minhas e mordendo sem força um dos seus dedos com um sorriso travesso nos lábios.
Outra vez, ele me surpreendeu com o sorriso infantil e absurdamente largo que me mostrou, aproximando-se e dando vários selinhos em meus lábios, me puxando com o propósito de deitar minha cabeça em seu peito. Fui carinhosamente beijada no topo da minha cabeça, e envolvida pelos seus braços, com seus batimentos cardíacos ao pé do meu ouvido, sorri com doçura quando ele disse:
— Quando você quiser, amor.
Por exatos dois centímetros, não fui atropelada enquanto atravessava a rua; isso porque estava na faixa de pedestres. O motorista soltou um palavrão quando passei por ele, e sem receios ergui o dedo do meio conforme continuava descendo a rua em direção à delicatéssen. Levava comigo níqueis o suficiente para comprar dois pacotes dos meus gummy bears favoritos e mais algumas coisinhas que Miles havia pedido. Estava vestida com o meu vestido favorito: anil de mangas curtas, com delicadas florezinhas bordadas em fios dourados, usando meias ¾ brancas com um sapatinho também em tom dourado.
O dia, dependendo da sua definição, estava agradável. Alguns sinais de nuvens acinzentadas podiam ser vistos no céu, mas eu duvidava de que o tempo ficaria fechado por muito tempo. Cantarolei uma musiquinha tosca antes de virar a rua à esquerda, entrando na delicatéssen e agradecendo pelo ar-condicionado e pelo suave perfume de almíscar do local, marcante. Peguei meus pacotes de guloseimas, pasta de amendoim, torradas, tabletes de macarrão em formato de parafusos e queijo. Muito, mas muito queijo. No caminho para o caixa, parei diante de uma estante de cartões-presentes. Eu sempre gostava de ler cartões-presentes, mesmo que nunca os comprasse. Abri-os um por um, deliciando-me com as frases:
I. O que quer que tivemos, podemos ter de novo? II. Traduza-me como um livro difícil de ser lido. III. Você é arte. IV. Se você me ama, me mate. V. Minhas pupilas dilatam todas as vezes em que eu te vejo. VI. Thank you for the venom. VII. Se você se casar comigo, eu te darei muitos boquetes e autoestima. VIII. Eu sou maravilhoso, mas com você fico mais maravilhoso ainda. IX. Eu me casei com uma vítima de estupro e ela salvou a minha vida. X. Ame a si mesmo.
— Quem foi o gênio que fez isso? — perguntei baixinho para mim mesma, com os olhos cintilando ao fechar o décimo cartão.
— Um poeta.
Virei o rosto para a voz, encontrando um homem jovem e bem mais alto do que eu vestido inteiramente de preto, com a pele alva como leite contrastando com os cabelos também negros. Seus olhos, no entanto, eram castanhos e vivos, em formato de gotas. Os lábios eram muito, muito pequenos; os dentes, enfileirados num sorriso estranho, eram menores ainda. Ele parecia interessante.
— Você o conhece? — perguntei.
— Está falando com ele.
— Oh. — Pisquei. — Um poeta.
Devolvi o cartão-presente à estante, voltando toda a minha atenção ao homem diante de mim.
— O primeiro que você conhece, senhorita?
— Pelo contrário. Já conheci muitos poetas, mas sempre tive dificuldade em escutá-los.
— Algum motivo específico?
— Prefiro ler o que escrevem.
E então eu ri, porque ele usava uma camiseta com o rosto de Charlie Chaplin e eu preferia Buster Keaton. Balancei a cabeça em negação, agachando-me para pegar a cesta que havia deixado no chão para ler os cartões e retomando o meu caminho em direção ao caixa.
— Espere!
Virei-me, esperando enquanto tentava esconder meu sorriso sapeca. Poeta? Ele não era um poeta. Eu era.
— Você não é como os outros — ele disse, como se aquilo pudesse me surpreender. — Qual o seu nome?
Resfoleguei, e meu sorriso não conseguiu ficar escondido, entregando-se ao canto dos meus lábios.
— Eu não sei do que você está falando.
Voltei para casa sabendo que eu estava me dando bem nesse negócio de tentar ser uma pessoa melhor. A porta da frente fechou-se contra minhas costas de forma sutil, e contei até três antes que Lola, minha gata de estimação preta, me alcançasse no caminho da cozinha.
— Cheguei! — anunciei, largando as compras sobre o balcão da cozinha. Agradeci mentalmente por Miles ter comprado uma nova casa com o dinheiro da casa do Conde A., ainda mais por ter me chamado para morar com ele — já estava se tornando um hábito agradecer por isso. Agora que ele tinha uma clínica própria, o caminho estava livre para que eu estudasse em uma escola melhor, e inclusive estava esperando a resposta para uma entrevista de emprego num escritório. As coisas estavam melhorando; aos poucos, mas estavam.
Miles e eu tentávamos ao máximo manter uma relação diplomática. Eu não mais sentia ódio dele. Ele não mais me diminuía — é difícil ter apenas uma pessoa no mundo em quem confiar, e é ainda mais difícil ser hostil com ela. Com o propósito de manter tudo em ordem, eu havia deixado de seguir a minha perversidade sem pensar duas vezes. Após a morte de Conde A., eu preferi a paz. E estar em paz significava ser si mesmo sem interrupções. Deletei todos os números de antigos contatos, passei a beber moderadamente, joguei fora as camisinhas para matar a possibilidade de viver saindo e caçando sexo. Eu sabia que se mantivesse toda a minha perversão para esquecer o mundo, esqueceria mim mesma. Afinal, eu não era unicamente perversa. Eu podia ser outras coisas, embora eu não soubesse nomeá-las.
Isso meio que doía, no fundo.
— Miles? — chamei, recebendo o silêncio em resposta. Bufando, subi as escadas que levavam ao seu quarto com um pacote de gummy bears em mãos, encontrando meu irmão de costas para mim, passando as páginas de um grosso livro de medicina. Aproximei-me mais, notando os desenhos de cérebros tomando uma página inteira. Estreitei os olhos para as letras. — Lobotomia? Por que você se interessaria por isso?
Ele deu de ombros, sem se virar.
— É interessante.
— De fato é, se você é um psicopata.
Sentei-me em sua cama, abrindo o pacote de gummy bears e enfiando dois deles na boca de uma só vez.
— Eu não sou um psicopata, eu só aprecio coisas psicóticas.
Franzi o cenho.
— Imagine se seus pacientes pudessem ouvir isso...
Miles sorriu, sem tirar sua atenção do livro.
— Hey — chamei. Ele fez um barulho estranho com a garganta. — Como você está?
— Muito bem. Mentira. É como castrar uma pessoa — esse lance de dizer que está bem sem ao menos pensar se é verdade. Mas eu não podia culpá-lo, podia?
— E as coisas com o Fred?
— O que é que tem?
— Ele vem hoje, não é? — perguntei com a boca cheia de goma e saliva. — Por isso que você me pediu para comprar muito queijo... Vai fazer macarrão com queijo pra ele de novo.
— E daí?
Reprimi a vontade de dar com aquele livro grosso na cabeça dele e optei por ser direta.
— E daí que, se vocês se casassem, eu seria a primeira a apoiar — soltei, desviando o olhar exatamente no momento em que meu irmão olhou abobado para mim, como se fosse uma surpresa que eu soubesse que ele estava namorando um homem.
O som da campainha impediu-o de rebater qualquer frase contra mim, e me levantei mais do que animada para receber Fred. Ele era um bom moço, também estudava medicina, usava camisetas engomadinhas e era visivelmente mais simpático do que o meu irmão. Fred tinha uma mente colorida, uma natureza gentil que fluía com facilidade, clara como água, e parecia muito confortável quando estava na minha presença.
Abri a porta para ele com um sorriso antecipado. Ele sorriu, aproximando-me para depositar um beijo em minha bochecha, permitindo que eu visse suas sardas espalhadas pelo nariz até abaixo dos olhos.
Eu estava certa. Miles acabou cozinhando macarrão para nós naquela noite, e também na seguinte, e frequentemente passei a ver Fred perdido dentro da minha casa, e acabei encontrando algumas roupas dele no corpo do meu irmão e vice-versa.
Eu ficava absurdamente feliz com isso.
O afeto era revolucionário.
Era por isso que eu me sentava à janela do meu quarto lendo A Espuma dos Dias consciente de que as coisas podiam melhorar se eu me afeiçoasse a pequenas coisas. Comecei por mim mesma. Pintei meu cabelo da minha cor favorita, passei a sorrir para o espelho ao menos uma vez por dia, tomei muita água, exercitei meu cérebro, consegui meu primeiro emprego, guardei meu dinheiro com paciência, lembrei dos poetas da minha infância, dos meus pais, dormi com Lola ronronando ao meu pescoço, visitei frequentemente a clínica de Miles para me certificar de que ele estava bem. Compareci a algumas exposições de arte, e por mais que a cidade que tivesse me dado vida fosse parada e intoxicada pelas mil indústrias ao seu redor, encontrei nela certa beleza.
Aqueles foram os melhores dias da minha vida depois da minha infância, quando meus pais ainda eram vivos. Foram os dias em que eu tive tempo para estudar um pouco de psicologia e arte, medo e repulsão, desvios de conduta e jantares pacíficos com meu casal favorito. Foi o tempo em que passei sem sexo também, e isso me ajudou muito. Pareceu que não colocar qualquer coisa dentro de mim foi o melhor modo de me limpar. Foi quando eu fiz as pazes com a minha perversidade — talvez fosse uma coisa de família. Talvez fosse uma coisa da sociedade em si. Karl Marx estava certo quanto à luta de classes: desde o momento de seu nascimento, o ser humano está em conflito com algo — o pior é quando o ser humano entra em conflito consigo mesmo. E eu soube (obrigado, poeta) que algumas das minhas perguntas nunca seriam respondidas, de forma que a única forma de ser menos perversa foi aceitar o que eu havia sido e andar em paz com a parte daquela pessoa que ainda restava em mim. Descobri, durante aquele verão, que apenas eu poderia me desmoralizar; e eu me desmoralizei de forma tão cruel que ninguém mais no mundo poderia ultrapassar essa crueldade e me causar mais danos do que eu mesma.
Mas eu podia fazer algo bonito disso.
Os primeiros adjetivos além de perversa vieram à minha cabeça quando Fred disse que eu era uma garota gentil e intuitiva. Depois, Miles me chamou de sonhadora. E eu mesma me atribuí a característica de ser determinada quando percebi que não tem nenhum problema em ter recaídas, contanto que você saiba que terá que se reerguer no final.
Então é claro que as marcas da perversão estavam cravadas em mim — memórias, muitas memórias —, mas eu comecei a me preocupar com o que estava lá fora também. E eu não gostei muito do que vi.
A minha cidade era violenta. A população puramente formada por famílias de operários não entendia outra linguagem a não ser o sangue. Por ter estudado num dos colégios mais baixios, eu conhecia bem a política da força (outro ponto para Karl Marx, pois não existe dominante sem dominado) e suas sequelas, eu bem sabia como era ser classificado como fraco, vadia, menininha. Aquele sistema era morto e bruto. Ninguém sorria nas ruas, os ricos riam dos pobres, os operários matavam, estupravam, deturpavam. Através dos meus olhos de cílios endurecidos por rímel, eu constatava tudo isso com uma dor que não era amenizada pelas luzes da cidade. Eu temia o escuro, mas também desgostava da claridade que iluminava tanta violência.
Nenhum jornal comemorava ou informava. Havia noticiários, claro, mas sempre com manchetes estúpidas. Não sabíamos sobre o governo — a maioria de nós nem mesmo tinha acesso a esse tipo de informação —, não entendíamos sobre protestos, ações sociais, ciência. Mas éramos os primeiros a reagir à dor. E tenho um pouco de orgulho em dizer que a suportávamos bem.
Até o dia em que não tivemos mais que suportá-la.
Nesse dia, tudo acabou.
Lembro-me de passar a tarde na única livraria da cidade, localizada no centro, e nunca seria capaz de esquecer como meus ouvidos doíam por passar tanto tempo com um fone metido neles. Lembro-me de provar das palavras de Jean Paul-Sartre, e aquilo havia me deixado confusa e cansada pra caralho. Essa coisa de pensar é foda. Dormir é bem mais confortável. Lembro-me de pagar por um café na volta para casa e de pensar que estava aguado demais, que já era hora de eu aprender a coar café sozinha de forma a fazer melhor do que faziam naquela cafeteria de merda do outro lado da rua. Lembro-me de acariciar Lola no topo da cabeça antes de ligar a tevê e me deparar com o noticiário, onde uma manchete piscava em letras maiúsculas ao que a repórter dizia: — Uma gangue que se denomina como “A Lobotomia” realizou seu segundo ataque esta manhã num dos subúrbios ao sul, fechando um supermercado e fazendo quatorze pessoas de vítimas. As câmeras de segurança não foram desativadas pelos membros da gangue, mas todos usavam máscaras de super-heróis e jalecos de doutores. Dois dos criminosos carregaram equipamentos para dentro do local e realizaram, estrategicamente posicionados diante das câmeras, lobotomia em todas as vítimas. O procedimento foi erradicado há anos por apresentar resultados duvidosos. Dez das vítimas encontram-se incapacitadas. As outras quatro não resistiram.
Meu primeiro pensamento foi Miles, por mais sem compaixão que isso possa soar. Havia poucas pessoas na cidade que saberiam realizar uma lobotomia que “desse certo”, e meu irmão era uma delas. Por isso, fiquei mais do que aliviada — se posso dizer — quando o terceiro ataque aconteceu, pois no momento do assalto, eu e ele estávamos juntos, descendo uma das avenidas para nos encontrarmos com Fred. Eu vi a carnificina que se montou quando a gangue atacou rua abaixo, mas não fui uma de suas vítimas. O quarto ataque aconteceu uma semana depois, e os seguintes, em intervalos menores. Os noticiários explodiam; a administração municipal, formada por uma pirâmide puramente elitista, fingia se importar ao aconselhar o povo a sair prevenido de suas casas, e é claro que isso resultou em mortes. Prevenção, na nossa língua, significava carregar armas brancas e pistolas ilegais por aonde quer que fôssemos; significava meter bala na cabeça de qualquer vândalo ou criança de rua que nos aterrorizasse; significava começar a matar todos os médicos da cidade seguindo o raciocínio de que eram eles, mascarados, que nos levavam à morte.
Foi assim que eu perdi meu irmão.
Fred foi o primeiro a encontrá-lo, morto no jardim em frente à nossa casa. Eu não estava; havia saído para comprar macarrão e muito, muito queijo na delicatéssen de sempre. E uma coisa que sempre me doeu é que eu parei meus usuais cinco minutos para ler cartões escritos por falsos poetas — e talvez aqueles exatos cinco minutos tivessem me impedido de salvá-lo ou me levar para a morte junto com ele.
Encontrei a rua cercada por policiais hostis que insistiam que eu não poderia ultrapassar as faixas amarelas. Mandei-os se foderem, todos eles, e corri para cara de qualquer forma. Deixei as compras para trás. Meus pés queimaram no asfalto úmido de chuva, meus pulmões ejetaram ar rápido demais e eu engasguei enquanto corria, vendo mais faixas amarelas cercando minha casa, uma ambulância, três viaturas e Fred com o rosto desfigurado de lágrimas, em seus joelhos, com um cobertor ao redor dos ombros enquanto dois policiais tentavam levantá-lo.
Quando ele ergueu o rosto, a primeira coisa que viu foi eu.
Eu ainda tentava digerir a enorme poça de sangue que manchava a calçada, perdendo meus sentidos um a um, sentindo as pontas dos dedos frios enquanto o fato me prendia num retângulo de aço preenchido por água, sem ter como respirar. Eu soube antes mesmo de ver e preferi que tivessem me lobotomizado. Preferi que me deixassem incapaz, retardada, sem andar e sem falar, e que deixassem sem gummy bears pela eternidade. Preferi estar trancada num armário com meu irmão vivo do lado de fora, estudando medicina, esgotando maços de cigarro, respirando, me encorajando com seus olhos verdes.
Não me lembro de muitas coisas além dessas. Não me lembro do funeral, nem do enterro, nem do meu vestido preto, nem da forma como as velas queimaram quando baixaram seu corpo sete metros abaixo da terra e o trancafiaram lá. Mas me lembro de voltar num carro velho com Fred, bêbada, brincando com um isqueiro velho de Miles, pensando como eu conseguiria me livrar das suas coisas, suas roupas e seus livros, da sua presença.
Fred não me deixou sozinha nas primeiras semanas. Ele me ajudou com tudo, e ficamos alheios a quaisquer outras coisas no mundo. Não ligamos o noticiário, não deixamos a casa. Não comemos macarrão com queijo, nunca mais. Conversamos, mas bem pouco. Levamos todos os livros de medicina de Miles à biblioteca; doamos as suas roupas (eu chorei muito, demais, demais, colocando-as em caixas de papelão, e a coisa mais difícil que eu já fiz foi não ter mantido uma de suas camisetas para mim). Limpamos o seu quarto. Encontramos em nós mesmos solidões e companhias, e eu sou extremamente grata a ele como sei que ele é grato a mim. Não pensamos no assassino. Fred não o havia visto, nem mais ninguém. Preferimos deixar essas pequenas questões de lado e viver as grandes perguntas que nos cercavam — muitas delas foram tão dolorosas que meu cérebro não me permite acessá-las em meu inconsciente, temeroso de que eu não as suporte novamente.
— Para onde você vai? — perguntou Fred numa noite em que escolhemos dormir na sala para ver um documentário idiota sobre psicotrópicos (coisa que ele já usava, eu não).
— A lugar nenhum, eu suponho.
— Não tente me enganar. Você tem guardado dinheiro, tem pesquisado os horários de navios e eu sei que tem um passaporte agora.
— Você também vai sair daqui. — Suspirei. — Nenhuma pessoa lúcida ficaria nesse lugar.
Fred demorou alguns minutos pensando nas suas próximas palavras.
— Minha mãe mora em Cerco Distante — disse ele, com o olhar fixo no teto. — Pensei em morar com ela durante um tempo. Ela é controladora, mas eu acho que preciso um pouco disso.
— Ela vai te colocar na terapia.
— Tanto faz. Para onde você vai?
— Estava pensando na Campina.
— A Campina?
— A Campina.
Pude ouvir seus neurônios pensando em como seria.
— Deve ser lindo, .
— Deve. Eu realmente quero ir embora daqui, Fred. E logo.
— Quando o seu navio parte?
— Daqui a cinco dias.
As mãos de Fred alcançaram as minhas; seus dedos eram longos e acinzentados, quentes, macios e surpreendentemente duros sob a pele. O seu toque falou diretamente com algo além do meu físico, e quando ergui meus olhos inchados de choro para os dele, encontrei conforto e segurança e algo que me impulsionou a respirar fundo e prender o ar. Ele fez novas lágrimas surgirem, mas essas eram boas. Céus, essas eram boas.
— Quando você chegar lá, nunca mais olhe para trás — disse; suas palavras sendo pronunciadas de forma tão firme que não pude fazer mais nada além de assentir. — Faça isso por ele.
Naquela noite choveu tanto que todas as goteiras da casa ganharam vida, pingando obstinadas em baldes de ferro. Eu me perguntei, antes de dormir, embalada pelos sons dos pingos, se as chuvas na Campina eram assim tão fortes.
Troquei o disco da vitrola, concentrando toda a minha efêmera atenção em baixar a agulha de forma suave, como minha mãe fazia quando era viva e precisava colocar música à noite para que eu me acalmasse. Entreolhei Ferreirinho pelo canto do olho, me lembrando de Lola e sentindo meu coração desmanchar um pouco de saudades; eu não a havia trazido comigo para a Campina por regras da imigração, mas Fred havia ficado mais do que feliz em levá-la com ele. De qualquer forma, mesmo que Ferreirinho fosse um cão, ele era carinhoso e amigável, e suas lambidas na minha panturrilha causavam cócegas gostosas que faziam todo o meu corpo se acanhar. Era fácil rir quando ele estava por perto. Fiquei feliz por ter um animal de estimação. Éramos uma família bonitinha, até.
A música começou com um único e longo riff de guitarra para depois explodir em baterias e baixos irascíveis e furiosos, tomando toda a sala num ritmo frenético com uns gritos guturais. Tirei o disco na hora — minha falecida mãe que me desculpasse o mau jeito com a droga da agulha da vitrola, mas não tinha outro jeito.
— Puta que pariu, que horrível! Como seu dono consegue ficar ouvindo isso? — perguntei ao cão, que abanou o rabinho como se compartilhasse da mesma opinião.
Troquei o disco sem olhar o nome da banda, e esse mesmo acontecimento procedeu mais duas vezes antes que eu achasse uma música feliz, um folk velho; deixei tocando na sala, migrando para a cozinha para fazer café. A voz do vocalista era aveludada e relaxante, e acabei tomando meu café forte e bem doce como se estivesse tomando chá de camomila. Depois, troquei o disco mais uma vez, dessa vez para um arranjo mais animado, até que a música me fez pular no sofá com Ferreirinho latindo, adicionando seus próprios vocais à música.
— Heavy metal, baby — cantarolei, estalando meus dedos e balançando meus quadris no ritmo do solo da guitarra. Ferreirinho subiu no sofá, tentando lamber minhas pernas conforme dançávamos, pulando como doidos enquanto eu sentia meus cabelos revoltosos batendo no rosto. O mais engraçado é que eu poderia ficar assim para sempre com ele, meu amiguinho, e sei que ele também poderia me acompanhar por quanto tempo eu desejasse nessa pequena loucura.
Mas então a campainha tocou.
Baixei o volume da vitrola, correndo para atender a porta. me esperava do outro lado; ele carregava um saco imenso de ração para Ferreirinho, o que me fez dar espaço para que ele passasse e depositasse o mesmo no chão. Em seguida, meu namorado me ergueu em seus braços, me enchendo com breves beijos mornos enquanto o cachorro latia para nós. Provei dos seus lábios com gosto de menta e sorri, envolvendo seu pescoço com minhas mãos que pareciam inofensivas perto das dele.
— Como você está, meu anjo? — perguntou ele.
— Melhor impossível — respondi. — E você, meu herói?
O desenho das suas sobrancelhas era perfeito; seu sorriso inocente e alinhado, mais ainda. Eu não acreditava em perfeição, sempre havia preferido as formas conturbadas e distorcidas, mas me fazia voltar um pouco nas coisas em que eu acreditava.
— Melhor do que nunca. — Ele beijou o topo da minha cabeça. — Vá se arrumar, gatinha. Hoje você vai sair comigo.
A música ainda tocava — heavy metal, baby. Ferreirinho parara de latir apenas para morder as barras dos jeans de .
Ele me colocou no chão, dando um leve tapa no meu bumbum ao que deixei a sala diretamente para o banheiro. Demorei tanto no banho que as pontas dos meus dedos ficaram enrugadas, e escolhi meu melhor vestido, uma combinação de tecido preto com detalhes em dourado, com sapatilhas de bailarina também pretas, sem falar na droga da minha roupa íntima, da mesma cor — negro como a minha alma, negro como a minha alma, dramática como Shakespeare e mais um pouco. Sequei o cabelo, prendendo-o num coque de fios desfiados, e passei rímel e lápis de olho. Coloquei um dos meus casaquinhos, pois sempre esfriava à noite, e eu tinha fé que em um desses dias veria neve pela primeira vez. Feito isso, passei meu perfume; duas borrifadas eram o suficiente, uma no pulso e outra atrás da orelha. Olhei-me no espelho, deixando um suspiro de aprovação escapar.
Antes de abrir a porta que dava para a sala, deixei que minha testa tocasse a madeira envernizada da mesma, e comecei a respirar fundo enquanto a música do outro cômodo me alcançava. É estranho ser quem você é; às vezes eu posso jurar que vou machucar a mim mesma nessa brincadeira de viver. Às vezes estou feliz pelo tempo ter passado; às vezes desejo que ele passe mais depressa. Pensei em , pensei em mim, pensei em nós. O pensamento, inicialmente inofensivo e habitual, preencheu cada um dos poros do meu corpo, até que toda a minha existência se resumisse naquele curto instante. Às vezes eu gostaria de me ver nove meses adiante. Às vezes gostaria de voltar para o tempo em que ainda calçava sapatos número 19. Umedeci meus lábios e girei a maçaneta, invadindo a sala e me deparando com meu namorado sentado no sofá, de banho tomado e com os cabelos grudados na testa, naquela camisa xadrez de tons escuros que eu amava, brincando com o cachorro que nunca se cansava de seus carinhos.
Eu até podia compreendê-lo.
deixou que toda a sua atenção se fixasse em mim, encarando-me com doçura. Ele tinha a capacidade de me fazer derreter com simples olhares, e eu tive que contar até três para não perder o equilíbrio. Meus passos me levaram espontaneamente até ele, e antes que eu pudesse pensar, estava em seu colo, com nossos quadris encaixados e nossas bocas perdidas entre si. Sua língua enrolava ao redor da minha, aquisitiva; suas mãos afastavam meus cabelos do meu pescoço para que seus dedos firmes apertassem ali, acariciando com o polegar minha pele sensível e arrepiada. Quebrei o beijo, me arrepiando inteira com a respiração profunda de na curva da minha nuca, aspirando meu perfume enquanto eu fazia o mesmo, entregue ao seu toque.
— Eu poderia ficar a noite toda aqui, desse jeito — ele disse, roçando seus lábios nos meus. —, mas acho melhor pararmos se quisermos sair de verdade.
Abri um sorriso, plantando um beijo na ponta do seu nariz.
— Para onde você quer ir, princesa?
— Vai reclamar se eu disser que quero hambúrgueres? — Pisquei inocentemente.
— Daqueles bem gordurosos?
— Isso. É sério, estou morrendo de vontade.
retribuiu o beijo, mordendo a pontinha do meu nariz sem muita força.
— Vamos lá, então.
Como Ferreirinho era um cão extremamente sensível e inteligente, teve que estruturar todo um diálogo para deixá-lo saber que iríamos sair, mas que logo voltaríamos:
— Não fique triste, amigão — disse, acariciando as partes traseiras das orelhas do cão, fazendo-o piscar os olhos de maneira relaxada. Escondi meu sorriso na manga da jaqueta jeans que ele acabara de vestir. — Logo o papai e a mamãe estarão de volta. Comporte-se, está certo? Você seria um ótimo pai, pensei comigo mesma, não conseguindo controlar meu sorriso que duplicou de tamanho.
morava num apartamento no centro da cidade, exatamente atrás da Praça de Pedras Brancas. Da janela da sala, eu podia ver o grande sino da catedral de ébano, e éramos frequentemente acordados aos domingos pelo seu badalar insistente e poderoso. Seu apartamento era confortável, mas bem masculino. Ele tinha uma lareira de pedra, uma poltrona velha que pertencia ao avô, uma banheira retangular de superfície amarela e uma cozinha apertada, onde me ensinou a cozinhar coisas estranhas e deliciosas que ele mesmo havia inventado quando fora morar sozinho. Os seus diplomas de músico estavam pendurados numa parede reservada, juntamente com uma guitarra vermelha, a primeira que ele havia ganhado. Agora, havia fotos de nós dois — e Ferreirinho — em retratos, e eu ocupava metade do seu guarda roupa com as minhas tralhas. Eu dormia do lado esquerdo; ele, do direito. Às vezes trocávamos, às vezes ocupávamos só um lado da cama. Eu usava as suas roupas — às vezes ele também usava as minhas camisetas e meias, por mais ridículas que ficassem em seus pés. Era ele quem me ajudava a retocar a tinta do cabelo, e ele ficava mais do que contente em me ver fazendo pequenas obras de arte na sala, modificando alguns móveis, envernizando outros, pintando quadros e escrevendo poemas sobre o tapete. Frequentemente, o ambiente era invadido e dominado por suas composições musicais, e eu estava mais do que habituada com os murmúrios de suas guitarras, microfones e amplificadores. Conheci, aos poucos, todos os membros da sua banda e alguns dos seus melhores amigos, e fiz ótimas amizades com algumas das suas namoradas e namorados. Nós éramos conhecidos como o casal de nerds, mas só porque ainda estávamos na faculdade — ele fazia o seu segundo curso, agora como designer, e eu dava duro para me dar bem em psicologia. Foi naquele tempo que me tornei o máximo de coisas que já havia sido: tradutora, universitária, namorada, apaixonada, artista, poeta, mãe de um cachorro, forasteira. Mas eu nunca seria capaz de reclamar. Nunca, nunca mesmo.
Descemos todos os lances de escada do prédio até a rua, e quando a primeira lufada de ar frio me atingiu e minha boca tremeu e ele riu, tive certeza de que nenhum casal era tão bonito quanto nós dois. Parecíamos aqueles personagens de quadrinhos meio grunge, largados na rua, como se estivéssemos prestes a trocar cartões-presentes com dizeres sem significado, mas bonitos de qualquer forma. Nossos braços estavam enganchados enquanto descíamos a avenida, e nossos olhos subiam com frequência para o céu, porque amávamos cada uma das estrelas; naquela noite, muitas delas decoravam a imensidão anil acima de nossas cabeças.
— Eu vi hoje mais cedo que colocaram um fim em todas as gangues e máfias do Sul — comentei, e percebi como minha voz deixara de ter um pouco de sotaque; eu falava como . E acho que até agia um pouco como ele, agora.
— Já era hora! — Ele suspirou. — Isso te deixa feliz?
— Um pouco indiferente. — Passamos por um casal de velhinhos que moravam no andar acima do nosso e baixamos o rosto para cumprimentá-los. — Quer dizer, é claro que é bom e que agora as coisas vão melhorar e eu fico feliz pelas pessoas, mas não é algo que possa ter efeito sobre mim. Às vezes eu acho que devia ser mais empática e... Me sinto um pouco estúpida. Eu realmente deveria...
Fui interrompida por dois de seus dedos gentilmente postos sobre meus lábios.
— Você não deve se preocupar — disse ele, usando o braço livre para envolver meus ombros. — Está protegida.
De brincadeira, mordi seu dedo.
— Eu realmente deveria me preocupar mais — enfatizei, fazendo com que ele abrisse um sorriso cansado. Era difícil discutir comigo, eu era uma criança livre e imodesta. — Sua vez. Me fale sobre seu dia.
suspirou; eu sabia que havia algo passando por trás dos seus olhos. Ele ficava lindo quando ficava pensativo; a sua mandíbula, pelo o que eu era fissurada, tornava o seu semblante sério e compenetrado, como se ele estivesse diante de um grande quebra-cabeça. Eu amava esses pequenos deslizes — se são deslizes, de fato. Para mim, eram mais uma obra de arte a ser observada.
— Donny está querendo sair da banda. Hoje ele veio conversar sobre isso. Agora todos querem que eu assuma os vocais.
— E...?
— E é uma merda.
Reprimi o riso.
— Eu acho uma boa ideia — opinei. — Afinal, Donny está desanimado; ele não saberia fazer direito. Digo... Não saberia representar bem. Você sim. E você é fofo cantando. Um pouco assustador e tudo o mais, mas de forma geral é bem agradável.
Quando ele sorriu daquele jeito peculiar, como quem acabou de acordar de um sonho bom, eu soube que ele estava pensando no assunto.
Entramos n’O Dominó, uma das lanchonetes temáticas dos anos 60, e enquanto esperávamos nossos hambúrgueres, pedimos um punhado de giz de cera para desenhar nos versos dos cardápios de papel. Desenhei bonequinhas, coraçõezinhos, tulipas e um boneco descarnado com um topete ridículo que chamei de ; ele desenhou dezenas de símbolos, talvez buscando uma nova faceta pra a nova banda que estava arquitetando em sua cabeça. Eu quis rir, mas só no final da noite. Não seria conveniente rir na cara dele naquela hora; além disso, eu estragaria todos os meus planos.
Uma das melhores coisas que se pode ter com um companheiro é liberdade de expressão — eu percebi isso antes que alguém tivesse a chance de me calar. Eu e falávamos sobre tudo e qualquer coisa. Contei os tópicos nos dedos da mão naquela noite, e perdi a conta na metade do caminho, mas sei que discutimos sobre terrorismo, incensos, teologia, heavy metal, marte, Buster Keaton, virais na internet, a construção da nova ferrovia que ligaria a Campina aos Lagos Baixios, cortes de cabelo, molhos de pimenta, vírus de computadores, promessas e tombos. Dividimos uma sobremesa de sorvete, e eu quase o matei quando ele fingiu estar pondo uma noz na boca, porque o otário era alérgico e eu sabia, e o que eu sentia por ele fazia meu peito inflar como um balão de gás hélio, e ele ficava excepcional sob a luz fosca, e eu queria passar o resto da minha vida segurando a sua mão, desejando que as pessoas nos vissem para sempre como o casal grunge da Praça de Pedras Brancas, e droga...
Baixei o rosto, sentindo minhas bochechas corarem.
— Hoje faz três meses que você veio morar comigo — sussurrou ele na volta para casa, segurando minha mão. O frio fez com que minhas pernas se arrepiassem, e eu me aconcheguei ainda mais em seus braços, necessitada de proximidade, de qualquer coisa que ele pudesse inventar, de seu cheiro, suas manias, sua voz, sua forma de falar... Droga. — E eu preciso mais de você hoje do que precisei ontem.
Abracei sua cintura, ficando na ponta dos pés para beijá-lo na mandíbula.
— Você pode me ter mais hoje do que me teve ontem.
E então ele voltou a me beijar, tudo de novo, intenso, lindo, com vontade, me envolvendo e aquecendo meu corpo do vento, até que tivemos que nos separar para voltar para casa, ainda de mãos dadas, e o porteiro fez um comentário usual sobre como a primeira nevasca da estação estava para chegar, mas nós não demos importância. Pegamos as escadas, respirando fundo e rindo para não cairmos nos degraus, principalmente eu, porque eu era a moça e eu tinha uma notícia fenomenal para dar, mas começou a beijar meu pescoço enquanto eu tentava abrir a porta — a maldita porta! — e eu perdi toda a minha linha de raciocínio.
— Assim, olha — murmurou ele, pousando sua mão máscula sobre a minha e realizando o movimento mais simples do mundo, que nada mais nada menos era do que girar a chave na fechadura. Eu o senti afastar meu cabelo, liberando o caminho para que seus dedos brincassem com a área. — Entendeu? Faça outra vez.
Mesmo por cima das roupas, eu podia sentir seu corpo contra o meu. Ele parecia um herói servindo de escudo à sua protegida. E por mais que eu mesma fosse a minha heroína — nunca me salvou, eu nunca o salvei (não saberíamos como salvar um ao outro, essa é a verdade) —, eu adorava aquilo, eu adorava a proteção e o afeto. Eu o adorava independente no que o mundo podia se transformar e do que as pessoas falavam, eu fazia parte dele agora. Eu fazia parte dele e ele precisava saber disso.
Abri a porta, exclamando quando Ferreirinho atacou amavelmente nossas pernas, dessa vez mordendo o cadarço de seda da minha sapatilha. abriu espaço pela sala ao que falava com o cachorrinho, me puxando pela mão:
— Nos dê um minuto, amigo.
Eu pude ouvir os arranhões de Ferreirinho contra a superfície da porta do quarto ao que fechou-a, prensando minhas costas contra ela ao que seus lábios famintos e macios buscavam os meus com urgência. Sem perder tempo, passei sua jaqueta jeans por seus braços, até que o tecido encontrou o chão. apoiou um dos braços na porta e desceu o livre para a minha cintura, me puxando contra seu corpo. Me livrei do meu próprio casaco, atracando meus braços em seus ombros e ficando na ponta dos pés. aproveitou para envolver meu corpo com ambos os braços, cordialmente desprendendo meu cabelo, deixando-o acariciar minhas costas. Seu beijo era carinhoso e ardente, lento e torturante, me fazia demandar cada vez mais dele ao que minha vontade aumentava. Quase dissolvi, sentindo meus músculos amolecerem ao que sua mão segurou rigidamente minha nuca, enquanto a outra descia pela linha das minhas costas até meu traseiro, adentrando meu vestido e prendendo a lateral da minha calcinha em seu polegar. Ele começou a baixá-la sem cerimônias, deixando o tecido aos meus pés. Seus dedos fecharam-se em meu cabelo, e fui mantida estática para que ele tirasse meu vestido, tocando minha pele com vontade, afastando-se apenas para me observar seminua, me deixando molhada apenas por me olhar com tanto desejo. De forma quase desastrada, deitou-me na cama, subindo em cima de mim e voltando a me beijar, continuando sua trilha de beijos até os meus seios cobertos pelo sutiã de renda.
— Espera — sussurrei, erguendo meu tronco ao me apoiar em meus cotovelos, fazendo com que ele erguesse o rosto e prestasse atenção no que eu dizia. — Eu tenho que te contar uma coisa.
esperou, travando os dentes enquanto seu cabelo emaranhado encontrava seu caminho, voltando ao topete desleixado de antes. Olhei fundo em seus olhos, encontrando-os receptivos e imperturbavelmente dilatados, e me esqueci de que encará-los assim, tão próximos, enxergando cada uma das suas cores, me fazia perder o oxigênio, apertando meus pulmões em um nó. Minhas bochechas enrubesceram.
— O que é, meu anjo? — perguntou ele.
— Eu preciso saber se você está pronto pra isso.
Reprimi a vontade de rir quando ele ficou sério. Me fez querer mordê-lo. Inteiro.
— Isso o quê?
— É algo que vai mudar a sua vida, .
Eu corei ainda mais, sem querer, e senti meu coração batendo num ritmo alucinado, saltando do meu peito como se pudesse rasgá-lo e abandonar a proteção das minhas costelas.
ergueu as sobrancelhas, claramente ansioso. Ele moveu-se na cama, afastando o rosto em aflição.
— Céus, o que foi? O que aconteceu?
Fechei os olhos por um segundo. Pensei em como dizer, tentei dizer, mas minha língua secou. Não havia outra forma, não havia outro jeito. Abri os olhos e mais uma vez, em um ataque duplo, as cores do seu olho me fizeram respirar com dificuldade. E eu disse como o disparo de uma pistola no escuro:
— Eu estou grávida.
Achei, por um momento, que o mundo havia parado; que todas as folhas que caíam das árvores haviam congelado em seu caminho para o chão; que todos os faróis vermelhos nunca se tornariam verdes novamente, e que meu coração nunca bateria outra vez. Pensei que os lábios deliciosos de nunca mais tocariam os meus, e o primeiro sinal de que tudo continuava vivo foi o formigamento na minha boca entregando minha vontade de beijá-lo de novo e mais uma vez até que seu gosto se embaralhasse com o meu, tornando-se um só. Meus olhos não conseguiam desgrudar dos seus, atentos a cada um dos sintomas que o levaram de seriedade a algo mais do que surpreso, mais do que brilhante, mais do simplesmente radiante. Vi seus lábios desabotoarem em câmera lenta num dos seus sorrisos mais bonitos e acolhedores, e fui surpreendida pela sua mão quente em minha barriga, acariciando minha pele. Eu quase não pisquei; parecia que o equilíbrio do mundo explodiria caso eu desviasse o olhar, por isso não ousei tirar meus olhos dele, e droga, eu quis chorar. Quis chorar como uma garota chora quando descobre que vai ser mãe pela primeira vez com o melhor cara do mundo para ser pai, e limpou as minhas lágrimas enquanto sorria.
— Shh... — Ele ergueu o rosto à altura do meu, segurando meu rosto entre suas mãos. — Pare de chorar, boba. Essa é a coisa mais maravilhosa que já me aconteceu.
Eu tentei fazer o que ele dizia, mas não adiantou de nada quando eu vi que ele chorava também; seus olhos brilhando de forma absurda através dos globos molhados, seu sorriso borrado, as mãos tremendo ao sustentarem meu rosto. Fui beijada, agora com devoção, sendo ora amaciada com seus lábios, ora incitada a rir por conta do seu sorriso. Ele estava dividido entre me beijar e rir, e isso me fez ficar um pouco tonta, tentando limpar as lágrimas que me cegavam, caindo dos meus olhos sem que eu tivesse controle sobre elas. Mas então seu choro mesclou-se ao meu e quando ele tocou meus lábios, eu senti o gosto de sal.
Retribuí o beijo com fervor, brincando com sua pele sob a camiseta xadrez e arranhando sem força suas costas. As mãos de perderam-se em minha barriga e cintura, obstinadas em tocar cada centímetro meu que pudessem, não poupando esforços quando o assunto era acariciar e apertar. Usei os pés para baixar seus jeans, fazendo-os deslizar por suas pernas enquanto meus lábios eram gentilmente sugados pelos seus. afastou um pouco o corpo apenas para baixar uma das alças do meu sutiã, expondo um dos meus seios. Sua boca institivamente sugou-o, e ele escolheu o momento em que sua língua me provava com maestria para tocar minha intimidade, encontrando-a encharcada. Ele começou a me masturbar com seus dedos num ritmo devagar e gradual, fazendo-me morder seu ombro a cada toque mais firme. Tirei sua camiseta, passando a arranhar toda a extensão de suas costas com vontade, vendo-o morder o lábio enquanto seus dedos lambuzavam todo o meu sexo, fazendo meu líquido escorrer enquanto o espalhava pela minha carne sensível e palpitante.
— — gemi, sôfrega. — Eu preciso de você.
Ele não precisou que eu dissesse duas vezes. De certa forma sei que estava consciente quando ele baixou o último pedaço de tecido que nos separava, e sei que seus dedos molhados seguraram firme minha cintura enquanto seus lábios sussurravam contra os meus o quanto eu era dele, e o quanto ele me queria e o quanto ele me faria feliz, mas só recobrei minha pura racionalidade quando ele me invadiu súbita e solidamente, gemendo meu nome e tendo seu lábio inferior mordido por meus dentes. Seu membro fincou-se na entrada ensopada e estreita da minha intimidade, indo e voltando repetidas vezes, carminando minhas bochechas e me forçando a deixar meus gemidos escaparem, acompanhados por suspiros e ganidos de prazer. Eu me senti completa, plena. Meus músculos apertavam-se ao seu redor involuntariamente, e o ângulo permitia que sua pele, toda a vez que entrava em contato com a minha, roçasse em meu clitóris. Apoiei-me com firmeza em seus ombros, sentindo o instante em que um dos seus braços buscou as grades da cama acima da minha cabeça, e ao que ele se escorou nelas, passou a investir com mais força e rapidez.
Arqueei minhas costas, pousando minhas mãos nas laterais do seu quadril enquanto o sentia entrar inteiro dentro de mim, fazendo toda a minha pele arder.
— Não para — pedi, mais do que excitada até mesmo pelos sons que a cama fazia ao bater contra a parede.
— Não vou parar. — segurou meu rosto, beijando-me fervorosamente, mais do que satisfeito em ouvir meus gemidos sendo despejados contra seus lábios vermelhos por meus beijos. — Eu sou seu.
— Sim, e eu sou sua — Numa nova estocada, senti seu corpo rígido entrando em contato, apalpando minha intimidade de forma a me fazer revirar os olhos. — Porra.
— Goza comigo, amor. Faz isso pra mim. — As palavras dele... Poderia me afundar nelas e no efeito narcótico que possuíam sobre mim. Eu queria passar o resto da droga da minha vida com ele. Eu precisava disso mais do que já havia precisado de qualquer outra coisa, de qualquer outra realidade inventada, de qualquer outra rotina. Eu o queria mais e mais. — Seja minha de novo e de novo. — Seus movimentos não paravam, apenas aumentavam, mais intensos, mais fortes, mais duros. Eu sentia toda a minha pele formigando, pulsando no ritmo do meu sangue em chamas, e sentia algo no meu baixo ventre começando a retesar. — Assim, amor... Eu conheço o seu corpo tão bem, a forma como você me aperta... Deixa vir. — apoiou a mão livre na minha coxa, afastando minha perna enquanto metia sem dó, gemendo gostosamente, sem tirar seus olhos deslumbrantes dos meus. — Isso, boa garota. Libera, meu anjo. Por favor, faz isso pra mim.
Eu poderia ter morrido e revivido naquele quarto mil e uma vezes, dopada pela dosagem de prazer que ele me dava cada vez que o sentia apertado, estocando, e cada uma das suas sílabas era o suficiente para me amortecer. Eu me entreguei ao orgasmo mais tenro e longo da minha vida até então, vendo como se esforçava para mantê-lo comigo, prolongando o momento, me beijando, investido deliciosamente e no ângulo certo, me tocando, murmurando meu nome... Até que ele mesmo não aguentou, derramando-se ao que jorrava dentro da minha intimidade ainda pulsante, abafando um dos seus gemidos na minha língua. Vi a mim mesma corada, viva e quente, desconexa, deixando o ar escapar pela minha boca entreaberta. Fui revirada na cama, e suspeitei que havia feito isso por medo de me esmagar com seu peso; eu não teria me importado, no entanto. Céus, eu não teria.
— É você... — ele começou, ofegando. — Quem faz tudo isso comigo. Se você não... — Ofegando. — Se você não existisse, a minha vida seria uma grande merda.
— Você sabe — foi minha vez de ofegar, e fui bem atenciosa ao que dizer com receio de engasgar com minhas próprias palavras. — que eu vou mudar a sua vida e você vai mudar a minha. O que você quer fazer primeiro?
— Trepar de novo. E depois pensar num nome.
— Menino ou menina?
— Os dois.
— E depois?
— E depois numa casa. Eu quero uma casa bem grande. Dois quartos, para o caso de serem gêmeos. Ou três. E mais um cachorro. E um caminhão de sorvete que passe pela vizinhança todos os dias depois da escola.
Me curvei, beijando sua bochecha.
— Tudo o que você quiser, amor... Mais alguma coisa?
— Você. — Seus olhos assumiram um cenário onde eu era a caça e ele o caçador. — Você. — Seus lábios articularam perfeitamente a palavra, e um sorriso perverso (isso não era ruim) surgiu logo após. Ele era um lobo; eu, a sua presa. — Você. — Eu era neve, ele era sol, prestes a me aquecer e derreter. — Você.
Eu nunca soube qual foi o momento em que o primeiro floco de neve atingiu o chão do lado de fora, pois nunca o vi. Mas eu vi algo a mais. Eu vi um jovem lobo acercando a sua presa e, ao invés de matá-la fincando os dentes em sua carne, vi como ele a amou, protegendo-a de todos os outros caçadores e do inverno ao redor.
Se você é claustrofóbico, eu não recomendo comprar uma passagem de navio para uma viagem de três dias até o Norte. É horrível, seu estômago fica embrulhado, seus neurônios parecem rodopiar num liquidificador sem fim, você passa os dias vomitando numa privada minúscula e suando frio, tomando mais banhos do que o necessário e sentindo a pele enrugar debaixo da água como se tivesse envelhecido de verdade. A comida tem um gosto estranho e é como se todo o globo terrestre tivesse diminuído apenas para girar abaixo dos seus pés como uma pequena roda de quase morte. É torturante, é o oposto da ataraxia, da imperturbabilidade da alma; faz você pensar que, se o mundo fosse acabar, o sentimento seria semelhante; e é ainda pior quando o navio balança e você simplesmente não consegue se equilibrar e acaba agindo como um idiota completo na frente dos outros.
Mas se você tiver alguns sonhos agradáveis, as coisas podem ficar mais fáceis de suportar.
Na noite da véspera da minha chegada à Campina, eu sonhei com flores. Tulipas. As melhores tulipas vinham da Campina, assim como os melhores charutos. E elas vinham em todas as cores, azuis, amarelas, roxas, vermelhas, brancas, esverdeadas, anis, laranjas. Formavam um quadro perfeito diante dos meus olhos. Sonhei também que Van Gogh observava as tulipas comigo enquanto me dizia que eu deveria sempre escolher as amarelas. Rebati, dizendo que as minhas favoritas eram as vermelhas e que, portanto, eu as escolheria. Ele insistiu nas amarelas. Eu insisti nas vermelhas — e de repente a sua orelha começou a sangrar o sangue espirrou no meu rosto e eu gritei de susto, mas tapei a orelha para estancar o sangue e de repente Van Gogh desapareceu e eu estava limpa. Limpa. Limpíssima. Como se ele nunca tivesse sangrado em mim.
Em seguida, algo no meu sonho fez com que eu me sentisse enclausurada num receptáculo quentinho e seguro, onde uma nevasca (nevascas só aconteciam no Norte) seguia o seu caminho para o chão silenciosamente, e um grande buraco em meu peito foi preenchido pela euforia de um sentimento novo. Não sei qual era, só sei que me fez sentir bem e em paz, e que as tulipas que me rodeavam pareceram sorrir, avisando que um dia eu teria uma casa, uma casa de verdade, e que alguém me amaria como eu não conhecia o amor.
Demorou até que eu percebesse que o sonho me dizia que eu, um dia, seria amada. Eu nunca havia me apaixonado — tudo o que eu queria era o nada, às vezes. Mas eu nunca havia amado de verdade; tivera algumas pequenas obsessões amorosas, alguns casos platônicos, algumas brigas e choros, mas nunca pude amar genuinamente. E eu já havia me trancafiado no pensamento de que ninguém nunca se apaixonaria por mim de forma que eu pudesse retribuir. Esse pensamento não estava sempre presente, mas era doloroso e o suficiente para abastecer minha vontade de chorar.
(Eu tinha algumas pequenas noções do que o amor significava, e dentro da minha cabeça, havia estabelecido alguns desejos capazes de traduzir o que eu gostaria de encontrar em uma pessoa que pudesse amar: I. Alguém que não se importasse em comemorar datas importantes com roupas e programas simples; II. Alguém que me deixasse opinar livremente, mesmo que eu estivesse errada, e me respeitasse como ser humano mesmo antes de me respeitar como mulher; III. Alguém que lesse para mim; IV. Alguém com suas próprias ambições e seus próprios abismos, alguém independente, alguém original e criativo; V. Alguém que secasse a louça que eu lavasse; VI. Alguém que me amasse e que fosse amado por mim).
Os meus primeiros dias na Campina foi o dia mais louco da minha vida. Eu engasguei de surpresa em descobrir o novo; meu primeiro apartamento, meus passeios no porto de brisa salgada e quente, meus sonhos com os navios que ancoravam ali... Eu amei cada mínima parte daquela metrópole desconhecida. Peguei o metrô, comprei algodão-doce, frequentei diversas cafeterias, pensei demais em como Miles teria amado a cidade. E vivi por ele, pelo meu irmão, pelos seus ossos e sua carne, sua memória póstuma e o primeiro momento em que havia percebido quem ele era. Miles teria amado isso. Talvez ainda mais do que eu.
Enviei cartas e realizei rápidos telefonemas a Fred, e descobri que ele estava na terapia, se reestabelecendo outra vez. Lola teria gatinhos em breve. Eu nunca os veria. Eu nunca veria a minha gata gorda de tanto carregar pequenos gatinhos na barriga, e nem ouviria as suas lamúrias enquanto estivesse parindo. Eu fui capaz de chorar por causa disso — uma ou duas lágrimas antes de me recompor e voltar à luta.
A vida é uma luta.
O segundo sonho do qual me lembro de ter naqueles primeiros dias na Campina se trata de como eu encontrei o menino baixinho das notícias do dia na Praça de Pedras Brancas, e como agora ele vendia potinhos de sangue e não mais jornais. Era estranho e simultaneamente adorável, porque ele parecia Alice no País das Maravilhas pintando pedra branca por pedra branca de vermelho, e me lembro de ter conversado com ele cara a cara, encarando seus olhinhos amigáveis e tentando descobrir quais eram as notícias do dia. Acho que ele disse algo mais ou menos assim:
— Você foi um pouco perversa. Mas outros foram mais.
Agora, acho que ele tinha razão.
E não acho que eu deva me envergonhar de maneira alguma por ter aprendido com isso.
Eu tenho certeza de que não devo. Eu sei.
O terceiro sonho foi sobre um evento. Eu me lembro de ter visto anúncios em preto e roxo espalhados pela cidade anunciando que os caras do The Wolfgang fariam um show único no Gato Dançante a partir das onze horas da noite. Era algum dia de abril e fazia frio. Eu me lembro de ter pensado em ir, mas desistido em seguida e dormido, mas esse sonho veio para me atormentar. Eu sonhei com perversidades expostas em um corredor: sonhei que passava por um quarto onde Conde A. jazia em seu caixão, sonhei com Miles fumando, comigo mesma queimando cartas de um antigo apaixonado, comigo mesma amando o fato de não conseguir amar, acreditando que era tão mais fácil odiar as pessoas do que amá-las — e isso é verdade. Mas eu me lembro de ter encontrado um lobo solitário no final do corredor, lembro-me da estrutura de suas patas, de sua pelagem acinzentada e grossa, da força dos seus olhos amarelos e da forma como suas presas estavam expostas, mas como Van Gogh, tudo o que ele fez foi cuspir sangue em mim. E dessa vez eu desapareci do sonho sem ter a chance de tentar estancá-lo.
E mesmo a chuva não foi capaz de me manter em casa quando fiquei determinada a ir ao Gato Dançante.
Há uma grande rocha cercada pelo oceano sob a casa noturna. A sua estrutura é quase cômica. Seria, se não desse medo passar por ela. Chega-se até lá por um bondinho em forma de círculo que não para de balançar. As ondas abaixo são altas e numerosas, sem falar do quanto parecem estar obstinadas a estragar tudo, e quando elas quebram nas rochas abaixo, quase tocam a parte de baixo do bonde. Não era a minha primeira vez ali; eu havia ido ao Gato Dançante antes para comemorar meu emprego de tradutora, mas a minha animação parecia maior do que o meu medo. Agora eu estava com a cara na pequena abertura de ar que havia ali para não morrer de claustrofobia e medo de altura, e como não sabia rezar, murmurei algumas palavras que me davam conforto:
— Tulipas. Nuvens. Dicionário. Poesia. Música. Van Gogh. Hitler era um babaca.
Quando encontrei o chão da casa noturna sobre meus pés, foi a melhor coisa do mundo. Respirei fundo, inspirei e expirei várias e várias vezes até me recuperar por completo. Demorou em torno de quatro minutos até que eu seguisse a fila de pessoas jovens que se dirigia à entrada do Gato Dançante; um letreiro cor-de-rosa piscava juntamente com a imagem de um gato maluco com um sorriso imenso com a lua em seus olhos, e eu já podia ouvir a música violenta e profunda que tocava lá dentro. Não era o meu tipo favorito de música, e nem aquelas eram o meu tipo favorito de pessoa — e a minha calça jeans não parava de cair, mas os ventos lá fora eram cruéis e eu não queria pensar nem por um instante em pegar aquele maldito bonde de novo.
Então eu entrei, e por pouco a falta de luz não me cegou completamente. Havia apenas uma luz no final do salão, uma luz avermelhada que iluminava o palco, mas de longe eu apenas conseguia ver uma silhueta ou outra. A casa estava cheia; o cheiro de álcool e perfumes femininos dominavam o ambiente, e um imbecil qualquer soltou toda a fumaça do cigarro no meu cabelo quando passei por ele. Miles odiaria isso. Eu odiaria isso. Que porra eu tô fazendo aqui? Onde foi que eu errei? E mais uma vez, durante toda a minha vida, eu vivi essas perguntas — e de forma totalmente controversa. Eu fiquei me perguntando qual era o meu problema enquanto abria caminho na multidão, sem me importar com os cigarros ou os copos de cerveja, sem ligar para os que me olhavam torto e os que pareciam amigáveis. Eu pensei em matar algumas doses de vodca, e claro que eu faria isso mais tarde, mas eu havia ido até ali para ver a banda, a tal de Wolfgang com um som tão cortante e selvagem que senti meus ouvidos vibrarem. Então me aproximei do palco. E fiquei ali, encarando, sem saber o que pensar da música ou do vocalista, sem saber o que achar de todo mundo ao meu redor, sem saber o que acontecia com o que permanecia sem resolução dentro de mim.
E então eu o vi, e ele era tão bonito que eu quis partir seu coração em pedacinhos apenas para poder oferecer o meu em seu lugar. Eu nunca havia visto uma mandíbula com um desenho tão angelical, ou olhos tão vívidos, ou um nariz com uma curva tão perfeita. Contemplei com paciência e excitação cada um dos seus movimentos bruscos, a forma como sua camiseta velha parecia colada no corpo por causa do suor, o modo bruto como ele cuspia, a maneira quase erótica como seus dedos tocavam sua guitarra — e, caralho, eu quis ser aquela guitarra. Eu quis demais, e eu quase babei, e quando ele me viu eu fingi que não estava olhando e me enfiei num canto escuro só para ficar ouvindo sem ter a chance de ser vista.
Mas é claro que eu fui procurá-lo quando o show acabou.
Eu paguei pela informação de onde encontrá-lo. Vinte e seis níqueis e duas garrafas de cerveja foram o preço total. E se ele for estúpido? E se ele te mandar embora? E se ele for um pervertido? Tentei calar as perguntas em minha cabeça. Bem, se ele for tudo isso, ele te deve vinte e seis níqueis e duas garrafas de cerveja. Esse é o seu preço.
Encontrei-o num corredor vazio; ele guardava uma das suas guitarras, ajoelhado, e então eu notei que ele era muito, mas muito tatuado, e que suas calças eram rasgadas nos joelhos e que ele estava concentrado demais no que fazia para que alguém o interrompesse. Mas você teve que pagar pra falar com ele, indiretamente. Fale logo de uma vez.
— Deve ser legal... — comecei, chamando a sua atenção facilmente, mas a forma como ele me olhou, com os olhos brilhando expectantes e um sorrisinho indiscreto no canto dos lábios me fez calar a boca sem querer.
— O quê? — perguntou ele, curioso. Vinte seis níqueis e...
— Ter orgulho do lugar de onde você veio — confessei. — Você disse quatro vezes que era da Campina enquanto se apresentava. Deve se orgulhar de ser daqui.
— Um pouco — ele não negou. Eu tentei não pensar nas tatuagens ou na mandíbula dele. — De onde você é?
— Do Sul. — Minha resposta alargou o seu sorriso. — O que foi?
— Eu nunca vi uma garota do Sul — respondeu, levantando-se. Bem mais alto do que eu.
— Está vendo uma agora.
— Eu gosto do que eu vejo. Tulipas. Nuvens. Dicionário. Poesia. Música. Van Gogh. Hitler era um babaca.
— Qual o seu nome?
— . O seu...?
— . Pare de pensar nos malditos níqueis e olhe as tatuagens dele.
— Muito prazer, . — Estendi minha mão.
Ele pegou-a sem pensar duas vezes. Se quisesse, poderia tê-la quebrado num único movimento de seus dedos absurdamente grandes.
Eu me senti muito, mas muito pequena perto dele.
— O prazer é todo meu, garota do Sul. É sua primeira vez aqui?
— Não, eu já vim antes.
— Já conhece o piano?
— Que piano?
Ele ainda não havia soltado sua mão da minha. Eu ainda não conseguia entender o seu sorriso, nem mesmo a maneira cordial em que seus lábios se curvaram quando ele disse:
— Venha, eu vou te mostrar.
Só pude ser guiada pelas escadas de emergência, tendo todo o tempo do mundo para observar as tatuagens em seus braços — âncoras, letras, moças, mais letras. Subi os degraus com sua mão atada à minha como se por uma cola especial, mas não ousei desgrudá-las, pois isso seria um pecado. Pelo contrário, apertei-a mais firme entre meus dedos minúsculos quando ouvi as ondas se quebrando abaixo dos meus pés e trazendo para cima um aroma salgado e intenso que entrou pelas pequenas janelas acima da minha cabeça.
Eu não sabia rezar e não sabia para onde estava indo. Então apenas sussurrei mentalmente algumas palavras que tornavam tudo mais suportável. Tulipas. Nuvens. Dicionário. Poesia. Música. Van Gogh. Hitler era um babaca.
.
Fim.
Nota da autora: (15/12/2015) Sem nota.
Nota da beta: Eu amei essa short. Eu amei demais. Banks, seja quem você for e seja lá onde estiver, você tem talento, e já sou sua fã. Eu queria transformar essa fanfic em um livro, só para encontrar pessoas como eu, que também soubessem apreciar a maravilha da sua escrita. Parabéns, e de coração: nunca pare de escrever. P.S: Lembre-se da sua beta aqui quando for escrever mais alguma história para o site, he he.
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