FLASHBACK – POV Ela
Faziam mais de duas horas que eu estava sentada no sofá encarando o grande relógio na parede. O jantar já havia esfriado, as velas apagadas e até mesmo as minhas roupas pareciam desarrumadas.
havia prometido que chegaria na hora certa hoje, que não esqueceria, mas, pela terceira vez naquela semana eu estava sozinha em casa esperando por uma ligação ou qualquer outra coisa que explicasse seu atraso.
Não recebi nada.
Eu sabia onde ele estava. Eu sempre sabia.
Suspirei irritada tentando ligar para seu celular uma ultima vez. Caixa postal. Levantei do sofá rapidamente e subi as escadas, decidida.
Quase uma hora depois, eu estava novamente na sala com duas grandes malas ao meu lado. Peguei um bloco de post-it e escrevi um rápido e direto recado. O colei na geladeira e deixei minha chave em cima da bancada antes de sair do apartamento.
FLASHBACK OFF
Dias atuais –
POV Ele
- Fala sério já fazem quase dois meses. Você precisa mudar essa cara de cachorro abandonado – , um de meus melhores amigos, falou.
- Não foi você que levou um pé na bunda da sua namorada – falei irritado.
- Não fui eu que deixei ela sozinha em casa no dia do nosso aniversario de namoro – retrucou me deixando completamente sem fala.
- Será que dá pra vocês pararem com isso – falou ao se sentar na mesa. Estávamos os três conversando no Ashanti, um pub onde nos apresentávamos com frequência nos finais de semana. – Já tentou falar com ela, ?
- Já liguei, mandei mensagem, até cartas eu mandei para ela, mas não acho que ela tenha lido alguma. Já não sei mais o que fazer – suspirei derrotado.
Faziam quase dois meses que eu havia chegado em casa depois de mais uma noite de bebedeira para encontrar o apartamento completamente vazio, a não ser por um bilhete colado na geladeira:
“Feliz aniversario de 3 anos.
Adeus.”
Na primeira semana após isso, eu ligava todos os dias para o celular dela e ficava horas parado em frente à casa de - sua melhor amiga com quem ela estava morando no momento – esperando ela sair para tentar uma conversa. Na segunda semana as mensagens constantes e recados deixados na caixa postal também passaram a fazer parte da minha rotina diária. Na terceira semana, comecei a escrever cartas quase todos os dias. Nas semanas que se seguiram apenas o desespero de que talvez nunca mais falasse comigo tomou conta de mim me tirando sono e fome, mas eu sabia que merecia.
Merecia isso e muito mais.
Nos últimos quatro meses em que estivemos juntos, eu havia perdido a conta de quantos jantares eu havia perdido para passar a madrugada em um pub qualquer bebendo até não lembrar meu próprio nome.
Muitas pessoas próximas a mim haviam dito que não aguentaria passar por isso por muito mais tempo, que eu não a merecia. Estavam certos. Se eu não os tivesse ignorado, talvez estivesse com ela ao meu lado agora mesmo.
- Ei – me chacoalhou me tirando do transe – a gente ta indo embora. Você vai ficar?
- Não, eu já vou também – deixei minha parte da conta sobre a mesa e sai do pub em direção ao meu carro.
Fiquei mais de dez minutos sentado no carro no estacionamento do meu prédio. Eu não queria subir. Entrar naquele apartamento completamente vazio aumentava o meu desespero. Eu sentia falta de chegar em casa e encontrar sentada no sofá assistindo a algum filme meloso ou mesmo ser recebido com beijos e abraços. Respirei fundo criando coragem para descer do carro.
O vazio do apartamento chegava a ser deprimente. Fechei os olhos fortemente na intenção de que, quando os abrisse, aparecesse na minha frente com seu grande sorriso, mas a sala continuava vazia quando os abri. Liguei o som na tentativa de diminuir o silencio e subi as escadas em direção ao quarto. Assim que abri a porta, a grande caixa rosa no criado mudo apareceu no meu campo de visão. A caixa estava ali desde que havia me deixado e eu ainda não havia tido coragem de abri-la. Pelo menos até hoje. Sentei na ponta da cama e coloquei a caixa no meu colo tirando sua tampa.
Ver tudo o que havia ali dentro foi como um grande tapa na minha cara. Todas as nossas fotos estavam lá desde o começo do nosso namoro. Comecei a tirá-las de dentro da caixa e uma foto chamou minha atenção: nela, e eu estávamos lado a lado sorrindo com algumas folhas de post-it coladas pelos rostos e mãos. Eu me lembrava daquilo.
Era nossa primeira viagem juntos e eu havia decidido surpreende-la todas as manhãs escrevendo bilhetes de amor e os colando pelo quarto do hotel.
FLASHBACK
- É nosso último dia aqui e eu quero muito uma foto de recordação – pediu manhosa.
- Amor você já tem quase um book de recordação – falei rindo.
- Você entendeu o que eu quis dizer!
- Tudo bem, uma última foto – me rendi. Um grande sorriso se formou em seu rosto enquanto procurava alguma coisa em sua bolsa. Instantes depois, vários post-its começaram a ser colados na minha testa e bochechas. – O que você ta fazendo?
- Criando uma foto memorável. Sua vez – me entregou os papeis restantes indicando para que eu os colasse nela também.
- Não acredito que estou fazendo isso.
- Para de reclamar e sorri – apontou a câmera em nossa direção e tirou a foto.
FLASHBACK OFF
Sorri com a lembrança. Uma semana depois daquela viagem eu a chamei para vir morar comigo e eu tinha plena certeza de que jamais esqueceria sua reação.
FLASHBACK
- fala logo para onde você está me levando – reclamou pela quarta vez. Eu havia colocado uma venda em seus olhos assim que a busquei em casa.
- Você é muito curiosa, . Já estamos chegando – falei ao virar na rua do meu prédio.
A ajudei a descer do carro e a conduzi por todo o percurso até o interior do meu apartamento. Quando já estávamos na sala, a posicionei no meio do cômodo ficando na sua frente.
- Pode tirar – falei por fim.
Um sorriso debochado se formou em seu rosto ao reconhecer o ambiente.
- Esse suspense todo para me trazer até o seu apartamento, ? Mesmo?
- – tirei um chaveiro do meu bolso estendendo em sua direção – você gostaria de morar comigo?
O sorriso que se formou em seu rosto foi, sem dúvidas, o mais lindo que eu já vi em toda a minha vida.
- Sim. – respondeu ainda sorrindo e se jogou em minha direção me abraçando fortemente – Eu te amo.
- Eu também te amo – respondi antes de grudar minha boca na sua.
FLASHBACK OFF
Larguei a caixa na cama e peguei meu caderno de músicas e violão antes de descer para a sala.
Minhas mãos suavam frio, meu coração parecia querer sair pela boca e eu tinha certeza que poderia ter um ataque a qualquer momento. Eu estava parado em frente à casa de tentando criar coragem de tocar a campainha.
Demorei mais alguns minutos até finalmente criar coragem. Instantes depois a porta foi aberta. estava linda como sempre, os cabelos compridos estavam presos em um rabo de cavalo e ela vestia um pijama rosa de mangas compridas que eu logo reconheci.
- Oi – falei receoso.
- , tá fazendo o que aqui? – seu tom de voz era rude.
- Eu sei que você não quer falar comigo...
- Não parece já que você não para de ligar – numerou com os dedos – e escrever, e está aqui agora.
- Tudo bem, eu entendi - levantei os braços em sinal de paz - Só me deixa falar tá, e eu juro que vou embora depois disso.
- Você tem cinco minutos – cruzou os braços me encarando.
- Eu sei que você não quer falar comigo, e eu entendo perfeitamente, mas eu não posso ficar sentado assistindo você me deixar, okay? Sei que eu pisei feio na bola, mas eu preciso te pedir um último favor antes de jogar tudo isso pro alto.
- O que você quer?
- Aparece no Ashanti hoje à noite.
- O que vai ter lá hoje à noite?
- Eu e os meninos vamos nos apresentar e eu queria muito que você fosse.
- Não posso prometer nada.
- Pelo menos não é um não. – dei um sorriso.
- Tchau – falou fechando a porta.
- Até de noite .
Sai dali e fui direto para a casa do , já que estava atrasado para o ensaio.
- Você tem certeza disso, ? – perguntou pela segunda vez.
- Já falei que sim.
- Vamos logo com isso – se intrometeu – o show começa em quatro horas e a gente ainda precisa aprender essa música – apontou para os papéis sobre a mesa me fazendo sorrir.
Não levou muito tempo para que eles aprendessem os acordes e melodia da música, fazendo uma pontada de esperança crescer dentro de mim.
- Você se superou dessa vez cara – falou depois de ensaiarmos a música pela terceira vez.
- Preciso admitir , você realmente mandou bem – comentou me dando um tapa nas costas.
- Valeu caras.
Já eram quase oito horas, faltavam cinco minutos para entrarmos no palco e eu ainda não havia visto em lugar nenhum pelo pub.
- Relaxa cara, ela vai aparecer – tentou me tranquilizar.
- Queria ter tanta certeza assim – murmurei antes de seguir para o palco.
- Boa noite – cumprimentou a plateia – nós vamos tocar uma música nova hoje que foi escrita pelo ali – apontou em minha direção – esperamos que vocês gostem.
(Coloque essa música para tocar)
Lembrei você, então sorri
Nada mais a declarar, eu estou aqui
Se você soubesse a falta que me faz
Abrir os olhos, te ver e nada mais
Se eu errei, me diz porquê
Se todos pensamentos me levam a você
A você
Em cartas eu tento me expressar
Te ter de volta eu posso esperar
Mas me diga que a saudade bateu
E o seu amor ainda é meu
Você saberá, antes que o dia acabe
Que nada vai mudar eu e você
Vejo fotos, recados, viagens, sorrisos
Tudo continua comigo
Se eu errei, me diz porquê
Se todos pensamentos me levam a você
A você
Em cartas eu tento me expressar
Te ter de volta eu posso esperar
Mas me diga que a saudade bateu
E o seu amor ainda é meu
Você saberá, antes que o dia acabe
Que nada vai mudar eu e você
Todo dia, toda hora eu tento te explicar
Deixa de lado o passado que eu vou te mostrar
Que aqui é o seu lugar
Em cartas eu tento me expressar
Te ter de volta eu posso esperar
Mas me diga que a saudade bateu
E o seu amor ainda é meu
Você saberá, antes que o dia acabe
Que nada vai mudar eu e você
Antes que o dia acabe
Antes que o dia acabe
Você saberá, antes que o dia acabe
Que nada vai mudar eu e você
Antes que o dia acabe
A música havia acabado e eu não havia localizado na plateia em momento algum. Era isso, ela não tinha vindo. Desci do palco cabisbaixo e abri caminho entre as pessoas até a saída. Ouvi e me chamarem algumas vezes, mas decidi ignorar.
Me encostei na parede ao lado do pub sentindo uma enorme onda de desespero tomar conta de mim.
- Achei que você fosse fazer uma declaração ou coisa parecida – ouvi uma voz conhecida.
- !
- Bela música – falou ao se aproximar lentamente.
- Achei que você não viesse – comentei caminhando em sua direção.
- E eu não ia vim mesmo, mas alguma coisa me disse que eu me arrependeria se não viesse.
- Devo um grande obrigado a essa “alguma coisa” – fiz aspas com os dedos. Estávamos parados um na frente do outro. Minhas mãos formigavam de vontade de tocá-la, mas eu me segurei esperando seu veredito final.
- Sabe , você foi um completo idiota comigo nos últimos meses. Você me deixou sozinha não uma nem duas, mas varias vezes, incluindo no dia do nosso aniversario de namoro. Eu fiquei com tanta raiva. – a cada palavra que saia de sua boca, eu sentia o resquício de esperança que havia se formado dentro de mim se desfazer – Mas viver sem você por dois meses foi como um inferno para mim. E também tem essa música... – um breve sorriso se formou em seu rosto – Só prometa não ser mais um idiota.
- Sabe que eu não posso prometer isso – passei meus braços ao redor de sua cintura a puxando para mais perto.
- Acho que posso conviver com um idiota – falou sorrindo antes de me puxar pela nuca e grudar nossos lábios.