Prólogo, dois dias antes do Halloween:
- Como foi na loja? – Luke perguntou assim que Veronica adentrou a cozinha.
- Uma loucura. – ela respondeu enquanto colocava a abóbora e o depósito com balas e doces em cima da mesa para, então, beijá-lo. – Todo mundo na cidade faz estoque. E eu tive que brigar com Norma Bleeker por eles. – completou, rindo enquanto guardava os doces no armário.
- Amor, ela tem setenta e quatro anos. – Luke observou enquanto se aproximava dela.
- Sim, e é muito mais forte do que parece. – Veronica deu um tapinha na mão de Luke, que tentava alcançar os doces. – Não, não não! Lembra do ano passado? Acabou antes das sete da noite!
- Ah, só uma... – Ele continuou tentando pegar os doces.
- Não! Você pode comer quantas quiser quando o Halloween acabar. – Veronica respondeu fechando as portas do armário e dirigindo-se ao bebê para levá-lo ao banho. – Você vem?
- Logo depois de você. – Luke respondeu.
- Não quero nenhuma bala faltando! – ela disse sorrindo e subiu com o bebê.
Luke esperou que Veronica saísse do local para abrir novamente as portas do armário e, de lá, retirar uma bala. Estava prestes a abrir a segunda quando sentiu uma dor aguda em sua boca, como se navalhas estivessem cortando o céu de sua boca e o gosto férreo de sangue se sobrepôs ao da bala, apagando o sabor doce. Por instinto, Luke levou os dedos à boca para ver o que estava errado e descobriu sangue, como já era de se esperar. “Mas que...?”, pensou, voltando a enfiar a mão da boca para retirar algo que estava preso no céu de sua boca. Retirou de lá uma pequena navalha e, à medida que seu desespero ia crescendo, sangue jorrava de sua ferida, provocando uma tosse forte, mais duas navalhas foram expelidas.
******
- Luke, por que você está demorando tanto? – Veronica voltou despreocupada com o bebê no colo e encontrou seu marido jazendo no chão, com os olhos abertos e sangue ainda escorrendo de sua boca. O grito de horror foi inevitável.
Capítulo 01: Um dia antes do Halloween
’s POV:
A torta de maçã do Fransz Cafe foi uma das melhores que já comi na minha vida. E minha profissão me permite comer as tortas de maçã de quase todas as cidades possíveis dos Estados Unidos. E era nisso que eu estava pensando, quando ouvi uma conversa um tanto quanto curiosa:
- Estou te dizendo, Chad! O cara cuspiu umas dez navalhas depois sangrou até a morte com o rosto dentro do fogão! – um rapaz ruivo comentava com outro loiro enquanto tomavam uma cerveja.
- Ah, certo... Ele também tinha alfinetes saindo pelas orelhas? – o rapaz, que deveria ser Chad, começou a rir ironicamente.
- Eu estou falando sério, Chad! O cara devia ser um satanista, ou algo assim... – o ruivo disse.
- Quem? Luke Wallace? Cara, você sabe de quem você tá falando? Isso é impossível! – Chad respondeu.
Normalmente, é preciso um pouco mais do que isso para despertar meu interesse, mas, levando em conta que apesar de o rapaz ruivo provavelmente ter exagerado em alguma parte da conversa sobre a morte de Luke Wallace, algo de estranho possa ter acontecido de fato naquela casa. E, além disso, está perto do Halloween. Por isso, resolvi investigar, afinal, me certificar que não há nada de sobrenatural nesse caso, não custaria nada.
Minha profissão envolve alguns atos ilegais, como porte de armas de fogo, identidades falsas, invasão de domicílio, algumas vezes roubo e, não tão raramente, arrombamento de túmulo. Sim, eu sou uma caçadora. Mas não uma caçadora que caça leões, ursos ou veados. Eu caço coisas muito piores e mais perigosas tipo fantasmas, semideuses, bruxas, demônios e qualquer coisa que esteja causando o mal e que não seja humana. Os humanos, eu deixo para a polícia... Caso eles não me atrapalhem quando estou fazendo o meu trabalho.
Dessa forma, depois de descobrir esta nova possível caçada, paguei minha conta no Fransz Cafe e me dirigi ao meu quarto no motel para me vestir apropriadamente para averiguar os fatos: coloquei peruca de cabelos ruivos ondulados, uma meia 7/8 fio 15 preta – é melhor para ser usada porque o elástico pode ser usado como coldre –, saia e terninho pretos. Tentei cobrir minha cicatriz que começa no canto esquerdo do lábio inferior e se estende até o ombro com base e, para completar, coloquei um óculos de armação preta e lentes falsas, sapatos pretos de bico fino e peguei meu distintivo. Hoje eu seria uma psicóloga do FBI.
Quando cheguei à delegacia, havia pouco movimento para uma cidade pequena onde uma morte tão chocante aconteceu. O recepcionista da delegacia, um rapaz de, no máximo, 20 anos, não conseguia parar de observar o lado direito do meu rosto enquanto eu falava, provavelmente se perguntando como eu havia conseguido aquela cicatriz tão feia. A sorte dele é que eu estava no meu melhor humor porque a torta de maçã estava realmente deliciosa. E, cara... Eu amo torta de maçã.
- Então... Eu posso falar com o xerife? Ele está? – perguntei depois de limpar a garganta, arrancando o garoto do transe.
- Ah, sim... Claro! – ele respondeu, pegando o telefone. – Desculpe, como é o seu nome mesmo?
- Cavendish, Margaret Cavendish. – Sorri para ele, vendo-o repetir meu nome para o xerife.
- Vamos, vou te levar até a sala dele.
Andamos em silêncio até a sala do xerife, que me esperava sentado, com um grande sorriso na cara. Ele se levantou assim que me viu, dizendo enquanto apertava minha mão:
- Olá, senhorita Cavendish! Não vemos muitos agentes do FBI por aqui...
- De fato... Estou aqui a respeito do caso Wallace, xerife. – eu disse, me sentando onde ele havia sido indicado.
- O FBI ficou sabendo do caso? – Ele mostrou um pouco de espanto, enquanto sentava.
- O FBI sempre fica sabendo de tudo. – Sorri. – Me enviaram para fazer uma avaliação, se a senhora Wallace irá precisar de alguma assistência psicológica, se há alguma sequela a ser apagada. Mas antes, preciso me inteirar do caso.
- Mas você não tem os papéis?
- Sim, tenho, mas prefiro a sua experiência profissional. – Sorri, bajulando-o e constatando que deu certo pela cara de satisfação dele.
- A mulher foi comprar doces e deixou o marido em casa cuidando do bebê... Quando ela voltou, foi dar banho no bebê e deixou o marido na cozinha com os doces. Então, ela o encontrou no chão, morto. Pobre mulher. – Ele suspirou, mostrando sua empatia para com ela. – Ele não comeu os doces, comeu navalhas. Encontramos duas no chão e o legista encontrou uma no estômago e outra na garganta.
- Vocês encontraram mais alguma lâmina nos doces restantes?
- Não. Se quer saber, senhorita Cavendish... Acho que o homem fez aquilo de propósito.<>br
- Bem... Só ele poderia nos dizer agora. – Dei um meio sorriso. – Acho que isso é o suficiente, xerife. Você poderia me dar o endereço da senhora Wallace?
- Sim, claro! Pedirei para Jake te dar na saída.
- Muito obrigada pela colaboração, xerife. – Sorri e apertei sua mão mais uma vez antes de sair.
******
Me olhei no retrovisor do Camaro, mais para constatar que minha cicatriz não estava tão assustadora do que para saber se eu conseguiria me passar bem por uma psicóloga do FBI. Andei até a porta da casa enfeitada com algumas abóboras e toquei a campainha, que não demorou para ser aberta: uma mulher loira com aparência desgastada apareceu.
- Senhora Wallace, sou Margaret Cavendish, psicóloga do FBI, podemos conversar?
- Sim, claro, mas... O que o FBI quer comigo? – ela perguntou, me dando passagem.
- Seu marido, Luke, participava do programa de proteção à testemunha e a morte dele ocorreu sob circunstâncias muito curiosas, então precisamos nos certificar de que a família está bem e, caso seja necessário, devemos prover tudo o que seja necessário para ajudar. – eu disse, enquanto a seguia, olhando para suas costas. Prefiro assim, odeio mentir para pessoas boas, principalmente quando tenho que olhar nos olhos delas. Mentir sem olhar para elas faz minha consciência pesar menos. Infelizmente, é preciso.
- Posso te oferecer alguma coisa para beber? Uma água, um chá...? Notei que seu nome é inglês...
- Não, estou bem assim, obrigada. – Sorri de forma cortês. – Minha família veio da Inglaterra há muito tempo. O nome prevaleceu. Já o sotaque...
- Bem, eu não posso falar que não estou surpresa de Luke estar no programa de proteção à testemunha... – ela disse.
- Ele presenciou um crime horrendo e o programa, como você sabe, é confidencial... Novo nome, nova vida.
- Você acha que alguém poderia estar atrás dele?
- Eu não sei, senhora... Eu estou aqui apenas para averiguar se vocês vão precisar de algum acompanhamento, se há algum estresse pós-traumático... A senhora quer falar sobre o que aconteceu?
- Na verdade, não. – Ela deu um sorriso triste, olhando para o chão.
- Eu sei que é difícil... – falei e deixei que ela tivesse o tempo que quisesse para começar a falar.
- Eu cheguei em casa, ele estava aqui feliz, então eu reclamei com ele que não comesse os doces... Eu avisei... – Ela abaixou a cabeça. – Então eu saí e, no outro segundo, quando eu voltei, ele estava morto. Eu não consigo acreditar que ele se foi. – Então, ela começou a soluçar. – Desculpe. – ela disse entre os soluços.
- Está tudo bem... Demore o quanto quiser.
- Nós éramos muito felizes, sabe? Luke não tinha que morrer agora.
- Senhora... Luke tinha algum desafeto na cidade? Alguém que não gostasse dele ou algo do tipo?
- Não, nada que eu saiba... – Ela voltou a chorar. – Podemos falar sobre isso uma outra hora? Estou muito abalada... E dois agentes do FBI saíram daqui a pouco, me fazendo quase as mesmas perguntas...
A mulher estava tão abalada que não percebeu que minha história sobre o falecido marido dela ser protegido pelo programa era mirabolante demais. Afinal, se dois agentes do FBI passaram por lá antes, por que eles não mencionariam algo assim para ela, não é mesmo? Mas não podemos julgar o estado mental de uma pessoa que perdeu um ente mais do que querido há menos de 24 horas...
- Certamente. – Sorri. – Voltarei a entrar em contato, sim?
- Tudo bem... – ela disse me acompanhando até a porta.
- Só mais uma pergunta, senhora Wallace... Esses dois agentes... Um deles era alto, com o cabelo um pouco grande?
- E o outro tinha um topete e era mais baixo, sim...
- Bem, obrigada pelo seu tempo, senhora Wallace. – Sorri e voltei ao carro.
Eu sabia quem provavelmente estava no caso. E não seria tão difícil assim de encontrá-los.
Capítulo 02 Narrador onisciente:
- Que festa chata... Vamos procurar algo legal para fazer. – a garota vestida de enfermeira falou para a líder de torcida.
- Oi, Justin! – a líder de torcida disse, andando na direção do garoto. – Já conseguiu encontrar a bebida?
- Está trancada. Vocês vão para a festa do mausoléu amanhã?
- Com certeza! – a garota vestida de enfermeira disse. – Vai ser muito melhor que essa aqui.
- Ora, não está tão ruim assim... – a líder de torcida respondeu. – Veja só. – ela disse, andando até uma bacia cheia de água com maçãs.
- Brincar de pegar maçãs é podre. – Justin reclamou.
- Ah, qual é! É Halloween! – a líder de torcida respondeu.
- É podre. – Justin replicou.
Ignorando o comentário, a líder de torcida segurou os cabelos e colocou o rosto na água, onde, facilmente, pegou a maçã. Levantou-se, tirou a maçã da boca e, antes de mordê-la, sorriu e piscou para Justin.
- Mudei de ideia. – Justin comentou.
Vendo que Justin e a líder de torcida estavam trocando olhares para chamar a atenção dela, a enfermeira decidiu também brincar de pegar maçãs e repetiu o que a amiga havia feito. Inicialmente, ela encontrou dificuldade apenas para pegar a maçã, mas, quando ela enfiou o rosto completamente na água, ela não conseguiu mais tirá-lo.
- Nossa, ela consegue mesmo prender a respiração! – Justin comentou, fazendo a líder de torcida rir.
O fôlego começou a diminuir e garota vestida de enfermeira se desesperou e começou a se debater, lutando para conseguir tirar a cabeça da bacia para poder respirar novamente. Nesse momento, os amigos perceberam que algo estranho estava acontecendo e foram até ela para tentar ajudá-la:
- Jenny? – a líder de torcida chamou, agarrando o braço dela. – Me ajudem! – Ela pediu quando viu que não teria força para puxá-la sozinha.
- Jenny? O que foi? – Justin começou a se desesperar e puxá-la juntamente com a outra. – Socorro! Ajudem! Jenny?
Quanto mais os dois puxavam Jenny, mais água jorrava, mas a cabeça dela não saía da bacia de água. Mais esforços, gritos por socorro e nada acontecia, até que a água começou a ferver. Ao ver a água fervendo, Justin gritou:
- Ah, meu Deus! O que está acontecendo?
- Jenny? Meu Deus! – exclamou a líder de torcida, desesperada e horrorizada.
Os pés e mãos de Jenny se debatiam enquanto sua cabeça fervia e ela gritava.
- Ajudem! Jenny! – a amiga gritou, ainda tentando tirá-la da água, até que Jenny parou de se debater.
’s POV:
Estava seguindo meu caminho para o café mais próximo, onde pegaria uma lista dos motéis mais baratos da cidade que, a propósito, não deveriam ser muitos porque a cidade era pequena. Depois, iria começar minha busca pelos irmãos Winchester. Foi aí que eu percebi que não sabia o que esperar. Eu sabia que Dean havia voltado, mas ainda não o tinha visto. Eu não sabia qual seria a minha reação, eu decididamente não sabia o que esperar do nosso reencontro. Mas tenho que admitir que sinto saudades dele e de Sam e, apesar de um nervosismo que me abateu, eu fiquei feliz. Afinal, Dean Winchester está de volta no jogo! Imagens do dia de seu enterro me voltavam à mente, o caixão dele descendo no buraco, já que Sam tinha pedido para não darmos um funeral de caçador a ele, o modo como eu tentava controlar minhas lágrimas, mesmo tendo esperanças de que ele, um dia, voltaria, Sammy me abraçando de lado enquanto olhávamos desoladamente para o caixão, tio Bobby arrasado... Foi tudo demais para mim. Afastei meus pensamentos, me precipitar e pensar demais não ajudariam em nada e continuei minha busca. Que não durou muito. Vi três viaturas da polícia em alta velocidade, indo na direção oposta à que eu estava indo. Mas o meu instinto de caçadora me disse para segui-los. E foi o que eu fiz. As viaturas pararam numa casa cheia de adornos para o dia das bruxas, meu palpite era que alguém estava dando uma festa e aconteceu algum acidente. Ou era só a polícia prendendo uns menores com bebidas alcoólicas, mesmo. Resolvi descer para averiguar.
- Senhorita Cavendish! – o xerife me chamou, sorrindo.
- Olá, xerife... O que aconteceu aqui? – Olhei rapidamente para o lugar e tudo estava normal, a não ser por ter muita água no chão, perto da bacia com maçãs... Alguém havia morrido ali.
- Uma garota estava brincando de pegar maçãs e não conseguiu tirar a cabeça da água. Quando os amigos foram ajudar, a água aparentemente começou a ferver. – A cara do xerife não era de quem estava acreditando muito na história. “Com certeza tem algo acontecendo aqui.”, pensei.
- E cadê o corpo? – perguntei, porque, de todas as coisas que eu encontrei na casa, aquela era a mais importante, e a única peça que estava faltando.
- Nós... –- Ele gaguejou um pouco. – Já retiraram daqui, para ninguém ficar olhando para isso. – Ele disse, um pouco envergonhado. Eu não ia repreendê-lo por isso, apesar de ele ter pensado que eu iria.
- Xerife, posso falar com algum desses jovens? – pedi.
- Sim, claro que pode... Vamos. – Ele me conduziu até uma garota que estava falando com outro policial.
- Deixe que ele fale com ela, depois eu falo. – falei, apontando para os dois, e com o pretexto de poder dar uma olhada no local sem aquele homem atrás de mim o tempo todo, afinal, eu não queria ter de explicar o que eu ia procurar em lugares bem inusitado, muito menos o porquê daquilo.
- Tudo bem... Agora, me dê licença. – o xerife disse e também saiu.
- Claro. – Sorri e assenti com a cabeça.
Nesse momento que fiquei só, analisei o lugar, tentando pensar no que poderia ter acontecido. Por mero costume, fui verificar o sofá e, entre as almofadas, encontrei um saquinho de bruxa.
- Ora, ora, ora... Isso já é um início. – Sorri e, antes que alguém visse, coloquei o saquinho no meu bolso. “Abençoado seja quem inventou que esses terninhos tem que ter bolsos”, pensei enquanto andava na direção da menina loira vestida de líder de torcida que falava com o policial antes.
- Mais uma? – ela reclamou.
- Prometo que será rápido. – Tentei dar o sorriso menos forçado que eu pude. Nunca gostei de garotas loiras que se vestem de líderes de torcida. – Então... Qual o seu nome?
- Tracy Davis.
- Você viu tudo, Tracy? – perguntei.
- Sim, vi sim... Eu tentei ajudá-la a tirar a cabeça... – Ela tinha uma expressão abalada.
- Me conte o que você viu.
- Foi tão estranho, sabe... Ela não conseguia tirar a cabeça da bacia e se debateu muito. Então eu e Justin tentamos ajudar... Mas aí a água começou a ferver...
- Será que sua amiga conhecia Luke Wallace? – Uma voz que me era conhecida interrompeu Tracy, chamando minha atenção. “Ah, é muita sorte para uma pessoa só...”, ri mentalmente e esperei que ele me reconhecesse.
- Agente Seger... FBI. – Ele mostrou o distintivo e, quando finalmente me reconheceu, seus olhos arregalaram.
- Olá, Seger. – disse, dando um sorriso alegre e evitando minha saudação usual, já que chamá-lo de "lindo" no meio de um caso, sendo supostamente agentes do FBI, seria estranho e inapropriado. E, por esses exatos motivos, eu precisei controlar meu ímpeto de abraçá-lo ali mesmo...
- Não acredito... – Dean comentou também sorrindo, mas se lembrou que estava no meio do trabalho. – Então, Tracy...?
- Quem é Luke Wallace? – Tracy indagou.
Meus olhos percorreram a sala à procura de Sam e o encontrei no mesmo lugar onde eu estava há pouco tempo, procurando pelo saquinho de bruxa que eu havia encontrado. Pedi licença a Dean e Tracy e fui falar com ele. Tirei o saquinho do bolso, cruzei os braços e, balançando-o, disse:
- Procurando isso aqui, Sammy?
- Ah, meu Deus! Não acredito... ? – ele disse, se levantando. – Que bom te ver! – completou, dando um passo na minha direção com os braços abertos, mas se deteve: – É melhor manter o profissionalismo.
- É. – Sorri e entreguei o saquinho a ele, que o mostrou a Dean.
Saímos da casa e decidimos nos encontrarmos no hotel onde eles estavam que, ironicamente, ficava a um quarteirão do meu. Mas antes eu passaria no meu quarto para trocar de roupa, obviamente.
Capítulo 03:
- Vou te contar, ... Se eu não te conhecesse há tanto tempo, eu diria que você ficou sexy usando aquelas roupas mais cedo e até te chamaria para uma saída... – Dean disse, abrindo a porta.
- Não que você precise disso, não é mesmo? – respondi passando por ele e dando um sorriso sacana. – SAMMY! – gritei e corri para os braços dele, que me deu um abraço apertado.
- Quase que eu não te reconheci com aquela peruca. – Dean comentou.
- Quase? – Me soltei dos braços de Sam e andei até Dean: – Dean... Você não teria me reconhecido se eu não tivesse falado com você. – Ri. – Estou feliz que você esteja de volta. – Sorri e o abracei.
- Você estava lá? – ele perguntou, sem me soltar. E eu não queria exatamente que ele soltasse. De certo modo, esse era o máximo de sentimentalismo que podemos no nosso reencontro. Não podemos nos dar ao luxo de mais do que isso. Não havia tempo. Tínhamos uma bruxa louca, ensandecida e psicopata matando pessoas. E precisávamos impedi-la o mais rápido que poderíamos.
- Eu precisava ver com meus próprios olhos que você estava morto. – falei, jogando a cabeça para trás, para poder vê-lo dando uma risada gostosa.
- E aí, foi bom? – ele disse me soltando, com aquele ar de deboche que só ele tem.
- Você não imagina o quanto... – respondi sarcástica. – Mas seria melhor se você estivesse vivo. E se eu estivesse naquele caixão com você. – Dei um meio sorriso safado para Dean, que deu uma risadinha.
- Mas agora que as amenidades passaram... Nós precisamos conversar. – ele disse, levantando a manga da blusa, deixando sua marca no braço esquerdo à mostra.
- Podemos nos focar na bruxa, por favor? – eu disse pedindo ajuda a Sam pelo olhar.
- Nós não vamos deixar de conversar sobre isso, . Por que você não nos disse que foi ao inferno também? – Dean disse de forma imperativa, levantando a manga da minha blusa, deixando a mesma marca de mão à mostra. – Você devia pensar nessas coisas, antes de dormir com um cara.
Eu não queria falar sobre o inferno. Pelo menos, não naquele momento. Eu queria resolver primeiro o caso.
- Vamos resolver logo o problema que temos. Depois eu converso o quanto você quiser. Prometo.
Sam, que alternava o olhar entre nós dois, disse:
- Esse não é um saquinho de bruxas normal... Tem até ossos de recém-nascido.
- É uma macumba das pesadas. – eu disse, andando até a mesa onde o saquinho estava aberto. – Alguma pista do que é essa coisa toda? – Levantei o olhar para os dois.
Dean negou com a cabeça, aborrecido. Eu só não sabia se ele estava aborrecido por não saber o que significava aquele saquinho, se ele estava puto porque eu não disse antes que estive no inferno ou se era tudo junto. Eu apostava na última opção.
- Eu estive pensando... Talvez a bruxa não queira vingança. – Sam disse.
- Uma boa alternativa, mas... Então o que ela quer?
- Apenas jogar um feitiço. – Sam pegou um livro e leu: – “Três sacrifícios de sangue em três dias. O último, antes da meia-noite do último dia da colheita final.”
- No calendário celta, o último dia da colheita é 31 de outubro. – eu disse, tentando entender o que aquela bruxa queria. – O dia das bruxas.
- Exato. – Sam respondeu.
- Certo, mas para que os sacrifícios? – Dean perguntou.
- A bruxa está invocando um demônio. – concluí, pensando em voz alta.
- Samhain. – Sam e eu dissemos na mesma hora e trocamos um olhar meio tenso. Aquilo não era bom. Qualquer coisa no mundo era boa, menos Samhain vindo para a Terra.
- Meu Deus, vocês dois são uma enciclopédia de esquisitices? – Dean reclamou. – O que isso significa?
- Coisa boa é que não é. – respondi.
- Samhain deu origem ao dia das bruxas, os celtas acreditavam que, no dia 31 de outubro, o véu entre mortos e vivos ficava mais fino. – Sam disse.
- E os mortos podiam andar entre os vivos. – completei.
- Isso. – Sam falou. – Era a noite de Samhain... As pessoas usavam máscaras para se esconder dele.
- E deixavam doces nas portas para apaziguá-lo. E, para completar, cortavam rostos em abóboras, para adorá-lo. – eu disse, desviando o olhar do livro para os dois na minha frente: – Samhain foi exorcizado há séculos.
- E, mesmo com ele no andar de baixo, as tradições permaneceram. – Dean concluiu.
- É, mas agora temos crianças fantasiadas pedindo doces em casas no lugar de demônios e orgias de sangue... – Sam comentou.
- Agora, uma bruxa louca quer trazer Samhain para acabar com a festa? – perguntei.
- , isso é coisa séria. – Sam me repreendeu.
- Mas eu falei sério. – Levantei os ombros. – Não me confunda com o Dean, por favor...
- Impossível. – Sam disse depois de uma risada. – Isso é bruxaria pesada, o ritual só pode ser realizado a cada 600 anos.
- E o marcador dos 600 anos aponta...? – Dean indagou.
- Para amanhã. – Sam respondeu.
- Obviamente. – Dei uma risada irônica. – E ele não gosta de ficar sozinho... Samhain pode trazer seus parceiros se quiser. E aí o problema fica grande. Aliás, maior do que já é.
Essa conversa toda sobre demônio louco que quer trazer banhos de sangue e orgias estava me dando fome, principalmente se for parar para pensar do ponto de vista que essa pode ser a última vez que eu vou comer um bom cheeseburguer com muito bacon. Me levantei e comecei a andar pelo quarto, pensando na comida e no problema que tínhamos em mãos, no auge da minha impaciência. Como se ficar com fome já não fosse ruim o bastante, eu ainda tinha o bônus do demônio que está prestes a "subir" para a Terra.
- Que tipos de coisas ele pode chamar? – Dean perguntou.
- Tudo. – respondi.
- Fantasmas?
- Sim. – Eu e Sam respondemos.
- Zumbis? Duendes? – A pergunta idiota de Dean me fez parar de andar e encará-lo como se ele tivesse retardo mental.
- Dean... – Sam reclamou.
- Aqueles carinhas me dão medo... As mãozinhas. – ele respondeu como se aquilo fosse óbvio.
- Olha, começa com fantasmas e monstros. O cara continua e, no final da noite, temos as piores coisas que já caçamos. – Sam disse.
- Tudo no mesmo lugar. – pensei alto novamente.
- Vai ser carnificina. – Dean disse.
- E todo o trabalho que já tivemos em anos... – comecei a falar.
- Vai tudo pelo ralo. – Dean completou minha frase, e eu e Sam assentimos.
- Precisamos parar essa vadia antes que ela consiga o que quer. – concluí.
Capítulo 04: Dia das bruxas:
Dean saiu, me deixando a sós com Sam, pesquisando sobre formas mais eficazes de exorcismo. Um silêncio agradável estava instalado no quarto, era sempre agradável ficar com ele, mesmo que nenhuma palavra fosse dita. Eu estava sentada na cama de Dean, folheando o livro que Sam havia mostrado anteriormente, enquanto ele estava sentado na mesa, fazendo pesquisas no notebook.
- ... – Ele me chamou.
- Fale.
- Eu queria falar sobre uma coisa...
- Por favor, não me diga que é sobre o inferno, porque eu não vou aguentar essa conversa duas vezes. – reclamei.
- Não é exatamente sobre isso... – ele disse, andando até a cama de Dean e sentando ao meu lado.
- Sobre o que é, então?
- Por que você não nos disse?
- Porque dizer a vocês não apaga nada do que aconteceu lá. E, conhecendo vocês como eu conheço, eu sabia que vocês iam se preocupar.
- Isso não significa que eu não me preocupe agora.
- Não, mas já passou... E eu já aprendi a conviver com as coisas que aconteceram lá. – Dei de ombros. – Seria mais útil que você se preocupasse com Dean, mas te conhecendo como eu conheço... Você já está. – falei, tentando decifrar a expressão no rosto dele.
- É...
- Como ele está, Sam?
- Mal. – ele disse depois de um suspiro. – Muito mal. Mas ele finge que está tudo bem.
- Isso é bem a cara dele, Sammy... Você sabe disso. Quando for a hora, ele vai falar com você, eu prometo.
- Espero que essa hora não demore muito...
- Vai ficar tudo bem. – falei, tentando reconfortá-lo, e sorri.
- Eu sinto muito. – ele disse, me olhando nos olhos.
- Tudo bem. – falei. – O importante é Dean...
- É só que... Sei lá... Eu queria poder ajudar... O Dean que você está vendo não é mais o mesmo. Ele voltou... Diferente. – Ele suspirou e olhou para os pés.
- Todos nós voltamos, Sammy. – respondi, tocando em seu ombro. – Veja o que fizeram comigo depois que eu saí de lá! – disse, afastando a minha blusa e deixando minha cicatriz à mostra. – Só tenha paciência... Quando ele estiver pronto, ele vai falar, já te disse isso. Paciência, tudo ao seu tempo.
Sam abriu a boca para falar mais alguma coisa, mas seu celular tocou na mesma hora.
- Dean. Como estão as coisas? – O observei enquanto ele ouvia o que Dean tinha a dizer. – Olhe, alguém plantou aquelas ervas. Alguém com acesso às duas casas, tem que ter uma conexão! – ele disse impacientemente e depois parou para ouvir o que Dean estava falando. – Pare de reclamar. – Sam respondeu. Alguns segundos depois, desligou o telefone.
- E aí? – perguntei.
- Nada. – A resposta de Sam me fez andar impaciente pelo quarto.
Alguns minutos depois, Dean estava de volta, sorridente e animado por ter descoberto que Tracy Davis tinha uma conexão com a família Wallace e, por isso, era nossa possível bruxa. Após nos contar toda a história, Sam comentou:
- Sério? A nossa animada líder de torcida pescadora de maçãs?
- Tracy? Era babá do bebê dos Wallace.
- E ela te disse que não o conhecia... Acertei? – falei, sentando numa das poltronas do quarto e tomando um gole da cerveja que Dean havia trazido.
- Ela disse que nunca tinha ouvido falar em Luke Wallace. – ele disse, tirando o casaco e sentando na cama.
- Bem... Pelo menos ela parece bem para uma bruxa centenária. – Sam comentou.
- Se você fosse uma baranga de 600 anos, você escolheria um corpo todo enrugado e cheio de verrugas, Sammy? – respondi, levantando a sobrancelha.
- Eu escolheria ser gostosa. – Dean disse dando de ombros.
- E vocês ainda dizem que não se parecem... – Sam falou e deu uma risada sarcástica. – Tracy não é tão certinha quanto parece, fiz uma pesquisa e descobri que ela teve uma briga séria com um professor e foi suspensa. – ele disse, nos mostrando o notebook.
- Precisamos falar com esse professor. – Dean falou.
******
Avistei o Impala no estacionamento do motel onde eu estava e agradeci por Sam e Dean serem duas pessoas fofas e gentis que resolveram ir me buscar, porque andar aquela distância toda até o motel deles de salto alto seria uma tortura. Peguei meu distintivo do FBI e andei até o carro, onde eles me esperavam e nos dirigimos à escola. Chegando lá, enquanto esperávamos no corredor cheio de máscaras feitas pelos alunos, Sam disse:
- Isso me traz lembranças.
- Como assim? – Dean perguntou.
- Ser adolescente... Toda a fúria... O que acha que eu quis dizer?
- Nada. – Dean estava claramente desconfortável com aquelas máscaras.
Enquanto os dois comentavam sobre alguns garotos que estavam por perto, me perdi em meus pensamentos: o problema com nós, caçadores, é que, todo dia é dia das bruxas... Então nós não esperamos que algo tão grande vá acontecer num dia normal, muitos de nós nem percebemos que o dia 31 de outubro é uma data especial para demônios, bruxas e todas essas coisas malditas. Afinal, se os celtas tiverem razão... O dia das bruxas é uma putaria sem freio para aquelas porras todas. O problema é: como diferenciar quem ficou aqui por causa de negócios inacabados, ou quem vem à Terra só no Halloween curtir uma folga do submundo e volta pra lá no outro dia? No final das contas, acho que isso nem importa muito, o que importa é que mandemos todas essas coisas de volta para onde elas pertencem.
- Os senhores queriam falar comigo? – A voz do professor me tirou dos pensamentos.
- Ah, senhor Harding. – Sam disse estendendo a mão para ele.
- Por favor, Don. – ele falou, apertando a mão de Sam.
Não sei se isso era meio suspeito, mas foi o suficiente para fazer com que eu e Dean trocássemos um olhar. Ele não precisava nem abrir a boca para eu saber o que ele estava pensando. Era a mesma coisa que eu pensava: “O cara é igual ao Ozzy Osbourne.”
- Tudo bem. Don. – Sam disse, vendo-o apertar a mão de Dean.
- Até meus alunos me chamam de Don. – o professor comentou, apertando a minha mão.
- Sou o agente Geddy. Este é o agente Lee. E esta é a agente Cavendish. – Dean disse e nós mostramos nossos distintivos.
- Nós temos umas perguntas sobre Tracy Davis. – eu falei.
- Ah, sim... Tracy. Brilhante, muito talentosa. Uma pena ter sido suspensa. – Don falou com pesar.
- Vocês dois tiveram uma discussão violenta? – Sam perguntou.
- É, ela explodiu. Se o diretor Morrow não tivesse aparecido na hora, Tracy teria arrancado meus olhos. – Acho que notei um certo tom de humor no comentário dele, mas deixei para comentar com os rapazes depois.
- Por que? – perguntei.
- Eu estava tentando falar com ela sobre um trabalho, que ficou inapropriado e perturbador.
- Mais perturbador que aqueles caras ali? – Dean apontou para as máscaras penduradas e riu.
- Ela cobriu as páginas com uns símbolos bizarros e crípticos. – Don disse depois de sorrir – E também fez uns desenhos... Imagens detalhadas de mortes. Sangrentas. Primitivas. Ela se desenhava no meio delas, participando.
- Símbolos? Que tipos de símbolos? Alguma coisa assim? – Sam perguntou e mostrou uma das moedas que estavam nos saquinhos de bruxa que encontramos.
- É, pode ter sido algo assim. – Don respondeu de forma despreocupada.
- Don... Você ainda tem o trabalho? – perguntei e, vendo a expressão confusa dele, expliquei: – Não sou uma agente de campo, sou uma psicóloga, então eu poderia fazer uma análise psicológica da pessoa que desenhou por meio deles...
- Infelizmente, não tenho... Tracy rasgou o trabalho no momento da briga.
- Tudo bem... E você sabe onde ela está agora? – Dean perguntou.
- Acho que no apartamento dela.
- Apartamento dela? – eu e Dean perguntamos ao mesmo tempo, surpresos. Uma garota daquela idade normalmente tem pais e, apesar de sabermos que ela não é tão jovem assim, tínhamos que parecer achar estranho para não levantar suspeitas.
- É... Ela se mudou para cá sozinha, há um ano. Pelo o que sei, ela foi emancipada. Só Deus sabe como eram os pais dela. – Ele deu uma risadinha típica de adultos que fazem comentários maldosos e querem se passar por pessoas que não falam mal de ninguém. Na verdade, essa risada era típica de mulheres.
- Tudo bem, então. – Sam sorriu. – Obrigado pelo tempo.
Despedimos-nos do professor, agradecemos mais uma vez e voltamos ao Impala.
- Ele tem algo suspeito, eu posso sentir. – eu disse assim que me sentei.
- Não sei, ... – Sam respondeu. – Por que você acha isso?
- Sei lá, só sinto.
- É, intuição, sexto sentido, essas coisas de mulher, Sammy. – Dean riu.
- Não, não é, Dean, seu idiota! – respondi e dei um tapa na cabeça dele. – Eu só sei... Ele é suspeito, acreditem. O modo como ele falou dela... Não sei. Tem algo estranho. Possa ser que ele esteja querendo incriminá-la. Ou talvez eles dois estejam juntos nessa. – Dei de ombros.
- , você lembra que você não é uma psicóloga de verdade, né? Você só está assim porque ele parece com o Ozzy! – Dean comentou.
- Mas ficaremos de olho nele mesmo assim. – Sam disse por fim.
Capítulo 05:
Trocamos de roupa e nos separamos à procura de Tracy. Aliás, Sam foi procurá-la, Dean foi falar com os amigos dela para saber alguma coisa e eu me encarreguei de ficar de olho naquele professor. Não sei se era a cara e cabelo de Ozzy que me faziam suspeitar dele, como Dean me falou, mas ele tinha algo de estranho. E essa minha suspeita se confirmou ainda mais quando eu entrei na casa dele e ela estava vazia, apesar de o turno na escola já ter acabado há algum tempo. A casa estava silenciosa e não vi sinal algum de bruxaria ou satanismo, mas o óbvio era que eu não encontrasse nada porque, se aquele cara estava fazendo algo, ele não deixaria nada à mostra. Afinal, a macumba era da pesada e ele provavelmente ia querer estar presente na hora que Samhain voltasse à Terra para sua festinha. Vasculhei a casa inteira e nenhum sinal de bruxaria, nem mesmo no porão. Já estava saindo de lá quando ouvi um carro entrar na garagem e me apressei em sair de lá antes que eu fosse descoberta e corresse o risco de ser estripada.
Estava indo comprar uma torta de maçã para eu e Dean comermos quando Sam me ligou dizendo que deveríamos nos encontrar no hotel deles em 15 minutos. Desisti de comprar a torta porque, pelo tom de voz de Sam, eu poderia dizer que as notícias não eram boas e tortas devem ser comidas e saboreadas em bons momentos. Se uma pessoa quer encontrar a felicidade de forma simples e barata, compre um pedaço de torta de maçã. Sério. Cruzei a esquina da rua do hotel e me encontrei com Sam:
- Alguma notícia de Tracy? – perguntei enquanto caminhávamos até o hotel.
- Nenhuma. – ele respondeu desanimado. “Ainda bem que não comprei a torta... Odeio ter que comer torta quando estou recebendo uma má notícia que impede meu trabalho.”
- Foda. – comentei.
- Encontrou alguma coisa na casa do professor?
- Não, mas eu não consigo confiar nele, não sei... Alguma coisa nele me diz que ele está envolvido na porra toda, Sammy. – disse, vendo Dean estacionar o Impala.
- E aí? – Dean perguntou assim que saiu do carro.
- Nada. – respondi.
- Não encontrei Tracy em lugar algum. – Sam respondeu.
- Alguma sorte com os amigos? – perguntei.
- Sorte não faz muito nosso estilo. – Dean reclamou. – Ninguém sabe onde ela está.
- Ela vai fazer o terceiro sacrifício. – Sam disse.
- Jura, Sam? – eu e Dean dissemos ao mesmo tempo.
- Vocês não ficam assustados com essa mania de falar ao mesmo tempo, não?
- Não... – Dean e eu voltamos a falar ao mesmo tempo, dando de ombros.
- Vocês às vezes falam ao mesmo tempo e você não se assusta, Sam. – retruquei.
- É, mas...
- Gostosuras ou travessuras. – um menino gordinho vestido de astronauta interrompeu Sam, estendendo o balde em forma de abóbora para Dean.
- Isto é um motel. – Dean disse, apontando para a porta.
- E daí? – O menino não se importava se iria encontrar pessoas transando ou apenas pessoas que queriam pagar menos, ele só queria saber dos doces.
- Daí que não temos doces. – Dean respondeu.
- Não, nós temos um monte no... – Sam falou, mas foi interrompido por Dean:
- Tínhamos, mas acabou. – A resposta dele nos fez encará-lo, porque eram muitos doces. – Foi mal, garoto. Não tem. – ele disse por fim.
- Você comeu todos? – Olhei para ele indignada. - Seu pilantra! Cuidado com a diabetes.
- Eu quero doce! – o menino reclamou.
- Eu acho que você já comeu demais. – Dean disse, me fazendo rir e sair de lá junto com Sam.
Assim que Sam abriu a porta, vimos alguém no quarto, de costas para a porta e, instintivamente, sacamos nossas armas e apontamos para ele enquanto Sam gritava:
- Quem é você?
- Sam, ! – Dean correu até nós e abaixou nossas mãos: – Esperem... É Castiel. O anjo. Ele, eu não sei. – Dean apontou com a cabeça para o outro que olhava pela janela.
- Olá, Sam. – Castiel disse olhando para ele e depois desviou o olhar para mim: – E .
Sam, como sempre, se enrolou no que estava dizendo, mas eu não me importava muito porque aquele anjo, bem... Castiel é O anjo. Aliás, o recipiente dele é... Uma belezinha, para falar a verdade. E eu sei, isso soou muito masculino. Mas, cara... “O queixo desse cara foi esculpido pelos deuses do Olimpo.”, foi exatamente o que eu pensei quando o vi. Jeremiah poderia ter escolhido um recipiente daqueles também... Não que eu fosse ter alguma coisa com Jez, mas pelo menos ele seria um grande colírio. Não que ele fosse feio, só era... Paternal demais.
- Sam Winchester, o garoto com sangue de demônio. Fiquei feliz em saber que você encerrou suas atividades extracurriculares. – Castiel disse, segurando o aperto de mão de Sam e me deixando confusa. “Teremos muito o que conversar quando esta caçada terminar.”, concluí.
- Que continue assim. – o outro falou.
- É, tá certo, cara... Quem é seu amigo? – Dean perguntou a Castiel, apontando com o queixo para o outro homem, o negro que olhava pela janela.
- O levante de Samhain... Vocês impediram? – Castiel perguntou. – Vocês acharam a bruxa?
- Sim, nós encontramos a bruxa. – Dean respondeu.
- E ela está morta?
- Não, mas... – Sam disse, mas foi interrompido por Dean:
- Já sabemos quem ela é.
- Parece que a bruxa também sabe quem vocês são. – Castiel disse e andou até a cabeceira da cama, onde pegou dois saquinhos de bruxa: – Isso estava dentro da parede do seu quarto. – Ele mostrou os dois saquinhos e depois me olhou: – E também havia um para você, .
- Precisamos agir rápido. – eu disse baixo para que só Sam ouvisse.
- Se não tivéssemos encontrado esses saquinhos, um de vocês estaria morto, talvez até os três. – Castiel disse.
- Na verdade, eu acho que podem ser duas bruxas. No caso, um homem e uma mulher. – eu disse e, vendo Sam e Dean me olharem meio confusos, completei: – Don. Tem algo nele que me deixa desconfiada.
- Vocês sabem onde ela está? – Castiel pareceu ignorar meu comentário.
- Estamos verificando. – Dean respondeu.
- Isso é lamentável. – Castiel disse.
- Por que acha isso? – Dean perguntou.
- O levante de Samhain é um dos 66 selos.
- Aquela história do seu amigo Lúcifer. – Dean disse.
- Dean. – repreendi. – Isso é sério.
- Lúcifer não é nosso amigo. – o outro anjo disse.
- Foi só jeito de falar. – Dean falou.
- Lúcifer não pode ressurgir. – Castiel disse. “Como se isso não fosse óbvio o bastante...” – O rompimento do selo tem de ser evitado a todo custo. “Óbvio. De novo. Se há música no paraíso, é a voz desse anjo, mas ele fala coisas muito óbvias. Ou sou eu que acho óbvio porque já conheço essa história?”
- Por que não nos dizem onde está a bruxa e nós a matamos? – Dean perguntou.
- Nós não somos oniscientes. – Castiel respondeu. – Essa bruxa é muito poderosa. Ela escapa até dos nossos métodos. “E ele quer que nós, meros mortais, encontremos essa porra dessa bruxa? Puta que pariu, hein, Castiel...”
- Tudo bem, nós já sabemos quem ela é, se nos juntarmos... – Sam disse, mas foi interrompido pelo outro anjo:
- Já chega.
- Certo, quem é você e o que você tem a ver? – Dean perdeu a paciência. Eu também não estava muito feliz com aquele anjo ali.
- Este é Uriel. – Castiel disse, enquanto ele se virava. – Ele é o que vocês chamam de especialista.
- Que tipo de especialista? – perguntei, vendo-o se aproximar.
Alguns segundos de silêncio pesado perduraram enquanto Castiel e Uriel se encaravam, até que Dean, notando que algo estranho estava acontecendo, assim como eu e Sam, porque nós dois não somos idiotas, perguntou:
- O que vocês vão fazer?
- Vocês têm que sair da cidade imediatamente. – Castiel disse desviando o olhar de Uriel.
- Por quê? – perguntei.
- Porque nós vamos destruí-la. – Castiel respondeu calmamente, como se dissesse coisas assim todos os dias.
Sam e Dean trocaram um olhar, eu estava horrorizada demais para fazer qualquer coisa. Anjos deveriam cuidar dos humanos e não sair por aí destruindo uma cidade inteira!
- É o seu plano? Vão destruir a porra da cidade? – Dean aumentou o tom de voz, olhando para Uriel.
- Nós não temos tempo, a bruxa tem que morrer. O selo tem que ser salvo. – Castiel respondeu simplesmente.
- Tem mil pessoas aqui! – Sam disse.
- Mil duzentas e catorze. – Uriel corrigiu.
- E você quer matar todas elas? – Sam perguntou indignado.
- Não é a primeira vez que purifiquei uma cidade. – Uriel disse calmamente.
- Purificar? Purificar? – perguntei, já recomposta e muito revoltada. – Você não está purificando, você está sacrificando. – disse, tentando conter minha raiva. - E pra quê? Se não for esse selo, vai ser outro!
- Olhem, eu entendo, isso é lamentável. – Castiel disse.
- Lamentável? – Dean também estava revoltado.
- Mas temos que garantir. Muitos selos já foram rompidos. – Castiel falou.
- Pisaram na bola com os selos e a cidade terá de pagar? – Dean falou.
- São as vidas de mil contra as de seis bilhões. Temos uma causa maior aqui. – Castiel retrucou.
- Seu argumento é inválido. Primeiro, não importa tentar fazer isso parecer proporcional... São pessoas inocentes de quem estamos falando. Pessoas boas que não têm nada a ver com o apocalipse. – eu disse, andando na direção de Castiel, mas tomando cuidado o suficiente de ficar a uma distância segura para que ele não olhasse nos meus olhos: – E, segundo, vocês querem sacrificar uma cidade inteira sem nem ao menos nos dar a chance de tentar resolver isso? Cara... Você pensa que nós somos quem para sermos rápidos? Os Vingadores? – falei. – Não dá para resolver uma coisa dessas só com a força do pensamento. Acredite, eu já tentei.
- Mais respeito, ... – Uriel veio até mim. – Não esqueça de que foi um dos meus irmãos que te tirou de onde você estava. – Seu rosto ficou a centímetros do meu e desviei meu olhar. Não queria aquele cara lendo meus pensamentos. Ele passou três dedos na minha cicatriz, um para cada marca e disse: – Deve ter doído, não? Quando fizeram isso com você, logo depois de ter saído do inferno? Eu lembro, , eu estava lá. Eu lembro dos seus gritos.
- Então por que você não me ajudou? – respondi, tornando a olhar para ele, que mantinha o olhar fixo na marca que começava no canto do meu lábio e só terminava no ombro. – Você não deveria mostrar tanto orgulho ao falar de Jeremiah... Você não merece ser irmão dele.
- Seu olhar é insolente. Você deveria mostrar um pouco mais de gratidão, afinal, ele te tirou a tempo de lá. – ele falou de forma arrogante.
- Eu mostro toda a gratidão que um ser humano pode ter a ele e você pode saber disso só por olhar nos meus olhos, mas não me peça para ter gratidão por você. Eu nem te conheço. – eu falei, fechando minhas mãos com força e tentando controlar minha raiva.
Depois de alguns segundos em silêncio apenas nos encarando, Castiel voltou-se para Dean:
- Se Lúcifer ressurgir, o inferno voltará com ele. Isso não pode acontecer. É isso o que você quer?
- Vamos pegar a bruxa antes que ela invoque alguém. – Sam disse. – Nós a matamos, o selo não será rompido e nenhum inocente tem que morrer.
- Estamos perdendo tempo com esses macacos. – Uriel disse.
- Então por que ainda estão aqui? – Cruzei os braços e arqueei a sobrancelha.
- Desculpem. Temos nossas ordens. – Castiel disse por fim.
- Vocês não podem fazer isso. Vocês são anjos! Vocês não deveriam... – Sam disse e fez uma pausa de poucos segundos – Vocês deveriam ser misericordiosos!
- Quem disse? – Uriel perguntou.
- Não temos escolha. – Castiel retrucou.
- Claro que vocês têm escolha! – Sam disse.
- Sempre há escolha. – Eu e Dean falamos ao mesmo tempo.
- Qual é? Vocês nunca questionaram uma ordem? O que vocês são? Uma dupla de martelos? – Dean falou, dessa vez, sozinho.
- Mesmo que não possa entender, tenha fé. – Castiel disse. – O plano é justo.
- Como você pode dizer isso? – Sam perguntou.
- O plano vem do céu. Por isso é justo. – Castiel respondeu.
- Deve ser bom ter tanta autoconfiança... – Dean comentou, ainda irritado.
- Me responda uma coisa, Dean... Quando seu pai te dava uma ordem, você não obedecia? – Castiel disse, provavelmente sabendo que esse era o ponto fraco dele.
- Que pena, rapazes... Parece que os planos mudaram. – Dean falou depois de algum tempo calado.
- Você acha que pode nos impedir? – Uriel desafiou.
- Não. – Dean respondeu e andou até ele: – Mas, se vão acabar com a cidade, vão ter que acabar conosco também. Nós não vamos embora. Se você – ele virou-se um pouco para olhar Castiel – se deu ao trabalho de me tirar do inferno, assim como tiveram para tirar de lá... Acho que temos algum valor para o homem lá de cima. Quer acabar conosco? – Dean desafiou. – Vá em frente. Vamos ver o que Ele acha disso.
- Eu vou tirar vocês daqui pessoalmente se for preciso. – Uriel disse, aumentando mais ainda a tensão no quarto.
- É, mas para isso, você vai ter que nos matar. – eu disse.
- E então vamos ter o mesmo problema. – Dean completou. – Ah, qual é! Você vai acabar com uma cidade inteira por causa de uma bruxinha? Parece até que está tentando compensar algo... – Dean encarou Uriel por mais alguns segundos antes de se virar para Castiel: – Nós podemos fazer isso. Vamos encontrar a bruxa e impedir o ritual.
- Castiel, eu não vou deixar esses... – Uriel não pôde completar a frase:
- Chega. – Castiel levantou a mão fazendo sinal para que Uriel se calasse. Uma coisa muito bem-vinda, porque eu não aguentava mais a merda daquele anjo. – Eu sugiro que sejam rápidos.
Segundos depois, estávamos apenas os três no quarto. Castiel e Uriel foram embora, nos deixando com muitas preocupações em mente, que incluíam cuidar de nós mesmos, de uma cidade inteira, parar uma bruxa maluca e psicótica que quer trazer orgias sangrentas ao mundo e deixar Samhain no andar de baixo. E ainda tínhamos de sair vivos dessa para podermos conversar sobre as mil coisas que ficaram pendentes entre nós. E eu tinha que afastar Castiel dos meus pensamentos o mais rápido possível.
- Eu super pegaria aquele anjo. – Apenas quando as palavras saíram da minha boca e quando percebi o olhar assustado de Sam e Dean, que eu percebi que havia pensado em voz alta. – Eu vou pro inferno. – concluí, vendo os dois concordarem comigo com acenos de cabeça. – De novo.
- E vai ficar lá de vez se continuar assim. – Dean brincou e riu, me fazendo rir também.
- Vamos deixar para brincar quando a bruxa estiver morta e todo mundo estiver vivo? – Sam nos repreendeu, como de costume, e saiu do quarto, se dirigiu ao Impala.
- Você é muito sem graça, Sammy. – reclamei e saí do quarto junto com Dean.
Andamos juntos até o Impala, quando choque e raiva me atingiram: ele estava todo melado de ovos. Alguém tinha jogado. E, bem... O carro não é meu, isso é muita verdade, mas ele é uma belezinha e tanto para ser sujo desse jeito por causa de um menino psicótico por doces! Demos a volta analisando o estrago, os ovos foram quebrados no capô e nos vidros. Acredito que minha raiva não se comparava nem à metade do que Dean sentia, principalmente quando ele gritou:
- ASTRONAUTA!
- Eu não costumo bater em crianças, mas... Esse garoto está merecendo. – eu disse, olhando a sujeira.
- Concordo plenamente. – Dean disse e trocamos um olhar cúmplice que Sam aparentemente já conhecia.
- Ei... Vocês não vão... Vocês não vão atrás daquele garoto. – Sam falei, percebendo nossa ideia.
- Ah, qual é, Sammy... A gente poderia fazer uma pequena travessura. – Eu dei um meio sorriso irônico.
- Vocês não vão fazer nada. Entrem logo no carro. – Sam disse e entrou no carro.
Bufei, já que odeio ser contrariada, principalmente quando envolve uma diversão que eu adoro, que é a de assustar crianças, mas entrei no carro, sendo seguida por Dean, que bateu a porta com força.
- O que foi? – Dean perguntou a Sam, que observava o saquinho de bruxa.
- Eu achei que eles fossem diferentes. – ele respondeu.
- Alguns são. – Eu me inclinei para frente, ficando entre eles, lembrando de Jeremiah e fazendo os dois me olharem: – Depois conversaremos sobre isso, temos muito o que falar.
- Pode apostar que sim. – Dean disse.
- Eu só achei que eles fossem corretos... – Sam suspirou.
- E eles são. E esse é o problema... Não há nada mais perigoso do que um fanático religioso que acha que está numa guerra santa. – Dean falou.
- É... Mas eles estão numa guerra santa, Dean. – eu disse. – E nós estamos bem no meio dela. Pode ter certeza disso. Eu só não sei por quê. – Voltei a me encostar ao banco traseiro do carro.
- Vamos descobrir onde está essa bruxa e matá-la ou vamos passar o dia feito três maricas conversando sobre o Apocalipse e vendo Sam alisar esse osso? – Dean falou depois de algum tempo, ligando o carro.
- Sabem o que é preciso para queimar um osso assim? – Sam disse, levantando o osso.
- Certamente não é numa fogueira comum. – respondi.
- Não... Nem um fogão convencional. – Sam completou.
- OK, mulheres prendadas, o que isso significa? – Dean quis saber.
- Que nós temos uma parada. – Sam respondeu.
- A escola! – falei repentinamente, juntando as peças do quebra cabeça: – O defumador! – Me empolguei.
- Exatamente. – Sam assentiu.
O caminho até a escola foi silencioso, cada um de nós estava perdido em seus pensamentos e eu alternava os meus entre Jeremiah, Castiel e o Apocalipse. Eu não queria estar no meio daquela porra toda. Eu queria Jeremiah de volta e Castiel na minha cama. É, isso era muito pervertido, mas eu estava indo para o inferno de todo jeito. Então, que minha ida até lá valesse a pena, não é mesmo?
Quando chegamos à escola, não havia nada nem ninguém no local, então tivemos que arrombar a porta para podermos entrar.
- Mais uma invasão de propriedade... – comentei enquanto abria a porta.
- Ainda bem que somos invisíveis para a justiça. – Dean completou meu pensamento, me fazendo rir, mas sem me desconcentrar do que eu estava fazendo.
- De fato... Mas não esqueça que somos parcialmente invisíveis. – falei, lembrando rapidamente do meu encontro não tão agradável com o agente Henriksen e, alguns segundos depois, a porta estava destrancada: – Pronto.
Dirigimos-nos rapidamente para onde estavam os defumadores, o lugar onde tínhamos falado com Don mais cedo:
- Então, Tracy usava o defumador para queimar os ossos? Isso está ficando cada vez mais bizarro. Até para nós. – Dean disse.
- Dean, as bolsas de ervas apareceram nos nossos quartos não depois de falarmos com Tracy... – Sam falou, vasculhando uma mesa, à procura de mais ossos provavelmente.
- Apareceram depois que falamos com o professor. – eu disse, observando Sam se abaixar e encontrar uma gaveta trancada com cadeado.
- Alguém aqui tem algo que não quer que seja encontrado... – Dean comentou vendo Sam pegar um martelo para arrombar a gaveta.
Depois de algumas batidas do martelo na gaveta, Sam finalmente conseguiu quebrar a fechadura e, antes de abrir, levantou o olhar para nós, como se esperasse por nossa aprovação. Vendo que eu e Dean acenamos positivamente com as cabeças, Sam abriu a gaveta e, como era de se esperar, encontramos os ossos.
- Cara, são todos ossos de crianças. – Dean falou enjoado. – Acho que ele não guardou para o cachorro.
- Eu disse a vocês que aquele cara era estranho. – falei.
Capítulo 06:
Estávamos correndo contra o tempo: não sabíamos onde encontrar Don, Ozzy, seja lá qual o nome dele e não tínhamos muito tempo. Além disso, não deveríamos nos separar. A procura foi árdua, mas finalmente conseguimos encontrar os dois numa casa completamente normal. Eu nunca diria que ela seria palco de um ritual demoníaco para trazer um demônio psicótico e tarado sexual de volta à Terra. Tracy estava amordaçada e com as mãos presas numa corda que caía do teto do porão da casa e tudo o que se passou a seguir foi rápido demais: Sam e Dean deram dois tiros no clone do Ozzy assim que ele levantou a faca para matar Tracy, enquanto eu corria para ajudá-la.
- Obrigada. Ele ia me matar, esse filho da puta. – ela disse depois de solta. – Vocês viram o que ele estava fazendo? Vocês o ouviram? – a garota estava realmente assustada. E quem poderia julgá-la? Ela acabou de presenciar o início de um ritual satânico! – Que encanto mais sem jeito... – ela disse em tom de reprovação, colocando as mãos na cintura e atraindo nossa atenção. “Ah, não... Eram os dois o tempo todo! Puta que pariu, hein...”, reclamei mentalmente.
- Meu irmão sempre foi lesado. – ela disse despreocupadamente e, antes que nós pudéssemos apontar nossas armas para ela, já havíamos sido atirados ao chão, sentindo uma dor excruciante. A dor era tão grande que nos curvamos gemendo. – Ele sempre quis que eu fosse o último sacrifício. Mas agora a honra cabe a ele. – ela completou, desviando o olhar para o corpo do irmão que jazia no chão. – O trabalho é para dois... O retorno do nosso mestre. Por 600 anos eu tive que aguentar aquele filho da mãe. Planejando, preparando... Insuportável. – ela completou ao se ajoelhar ao lado do irmão.
Nós não conseguíamos nos mover devido à dor que me fazia sentir como se meu cérebro estivesse sendo atropelado por um rolo compressor e como se minhas veias fossem explodir.
- Eu queria arrancar os olhos dele o tempo todo. E vocês atiraram nele. Adorei. – ela disse sorrindo ao pressionar o buraco de bala no peito do irmão com a faca, para que o sangue escorresse rapidamente para um cálice de prata. – Antigamente, este era o único dia do ano que as crianças ficavam em casa. Com medo. – Ela se levantou e andou até o altar que estava ali, com velas acesas e alguns símbolos satânicos. – Hoje vocês vão ver o que é o dia das bruxas de verdade.
Tracy ergueu o cálice e começou a falar o encantamento em latim. Havia começado e não tínhamos mais como impedir. A dor havia parado e vi Sam se aproximar da poça de sangue que havia saído de Don e, assim como Dean, me aproximei também e o olhei confusa quando ele molhou a mão no sangue e passou no rosto dele.
- O que é isso? – Dean perguntou.
- Confiem em mim. – Sam respondeu, sujando o rosto de Dean com sangue e, em seguida, o meu. – Me imitem. – ele disse isso e deitou a cabeça no chão e fechou os olhos. Então, eu e Dean fizemos o mesmo. Mas eu deixei um olho entreaberto para saber o que estava acontecendo. Ninguém notaria. Ou, pelo menos, eu esperava que não.
Vi o chão se abrir e, dele, sair uma fumaça negra, como é esperado de um demônio. Mas a fumaça não possuiu o corpo de Tracy, possuiu o de Don. “Ótimo, Samhain chegou para a festa.”, continuei me fingindo de morta, mas ainda vendo que Samhain se levantou e andou até Tracy, que se virou. Ele tomou o rosto dela em suas mãos e a beijou. Pois é, no mínimo, nojento. E bizarro. E nojento mais uma vez.
- Meu amor. – ela disse.
- Você envelheceu. – Samhain respondeu.
- Este rosto... Não te enganou. – ela disse depois de alguns segundos em silêncio.
- Sua beleza é atemporal. – Ele juntou a testa na dela e quebrou seu pescoço como quem quebra talheres de plástico. – Vadia. – disse, vendo o corpo sem vida cair.
Fechei os olhos antes que ele se virasse e algum tempo se passou até que eu pudesse ouvir o barulho dos passos dele deixando o recinto. Só depois de não mais conseguir ouvi-lo, foi que tive coragem de abrir os olhos completamente. Não queria arriscar a minha vida ali, não fui ao inferno e voltei para morrer daquele jeito.
- O que foi aquilo? – Dean perguntou a Sam, levantando um pouco a cabeça.
- Lenda do dia das bruxas. – ele respondeu. – As pessoas usavam máscaras para se esconder dele. Resolvi tentar.
- Resolveu tentar? – Eu e Dean perguntamos ao mesmo tempo, com a voz esganiçada.
- Se sairmos vivos dessa, me lembre de te dar um soco, Sammy. – reclamei, me levantando.
******
- Onde vamos encontrar o capeta? – Dean perguntou quando saímos da casa.
- Aonde você iria para levantar forças obscuras da noite? – Sam perguntou, limpando o sangue do rosto.
- O cemitério. – Dean respondeu.
- Exatamente. – eu disse abrindo a porta do Impala.
- Este demônio é poderoso. – Sam disse depois de algum tempo.
- É, eu notei. – Dean respondeu.
- Precisamos de mais armas do que as habituais. – Sam disse, me deixando confusa e trocando um olhar com Dean.
- Não, Sam. Você não vai usar sua mente de jeito nenhum. – Dean respondeu.
- Como assim usar a mente? – perguntei confusa, me inclinando para frente.
- Sam está andando com demônios... – Dean disse, com rancor. – E aprendeu a exorcizá-los usando só a mente dele.
- Mas, Sam... Demônios? – perguntei. – Que história é essa?
- Longa história. – Dean me cortou. – A faca da Ruby é o bastante.
- Por quê? – Sam questionou, perdendo a paciência.
- Porque os anjos disseram que sim e ponto. – Dean usou seu tom imperativo.
- Você disse que eles eram fanáticos. – Sam retrucou.
- É, mas dessa vez eles estão certos! – Dean replicou.
- Eu não sei, Dean... – Sam ia argumentar, mas foi interrompido por Dean:
- Sam, você mesmo disse que usar os poderes é o mesmo que brincar com fogo. Esqueça os anjos. – Dean deu uma faca a Sam: – Por favor.
Sam suspirou e pegou a faca, mas eu sabia que, apesar de ruins, Sam usaria os poderes se fosse preciso. E, admito, eu senti curiosidade em vê-lo, simplesmente pelo tom protetor e imperativo que Dean usou com ele. Usar aqueles poderes devia deixar Sam desgastado. E devia deixá-lo poderoso... Obviamente, o que eu quis dizer é: mais do que o melhor caçador da nossa época consegue ser.
Ao chegarmos ao cemitério, pudemos ouvir gritos... Haveria uma matança se não fôssemos mais rápidos. Seguimos os gritos o mais rápido que pudemos e chegamos num grande mausoléu, onde alguns estudantes tentavam abrir a grade e os túmulos batiam. Algo grande estava por vir. Aliás, maior ainda.
- Ajudem! – Sam gritou e saiu.
- Para trás, para trás! – Dean gritou e atirou na fechadura da grade.
Eu a chutei e, as portas nem foram abertas direito quando todos aqueles estudantes passaram por nós correndo, quase nos levando junto, ao mesmo tempo que eu e Dean gritávamos:
- Saiam! Para fora! Rápido!
Pouco tempo depois, estávamos a sós naquela sala assustadora e bizarra, com vários túmulos batendo e vários mortos e todo o tipo de mal prestes a ressurgir. O primeiro túmulo foi aberto e, de lá, saiu um... Zumbi?
- Não sei o que é pior... O ressurgimento de madrugada dos mortos ou esse cheiro horrível. – eu disse, pegando duas estacas de prata e dando uma delas para Dean.
- Pode vir, fedor. – ele disse antes dos zumbis avançarem para cima de nós dois.
Estaca de prata logo no coração. Infalível. Estava prestes a estaquear meu segundo zumbi quando senti uma força me atirar contra a parede. Dean viu o movimento, então rapidamente pegou uma estaca, mas a mulher desapareceu no ar e, antes que eu pudesse avisá-lo que ela estava atrás dele, ela o jogou contra a parede também.
- Orgia de zumbi com fantasma, é? – ele disse quando eu o ajudei a se levantar.
- Vamos queimar essa porra toda. – eu respondi e nós dois sorrimos.
Preparamos tudo o que foi necessário e queimamos o local. Se fosse preciso, queimaríamos o mausoléu inteiro. A sociedade teria que nos perdoar, mas é para um bem maior.
Corremos até onde Sam deveria estar enfrentando Samhain e a cena que vimos foi um tanto quanto chocante: Sam estava exorcizando o maldito demônio sem dizer uma palavra! Ele estava com apenas a mão erguida na direção dele, que lutava para permanecer naquele corpo e avançar em Sam. É claro que tudo parecia muito doloroso para Sam, que fazia uma careta e tocou sua testa, provavelmente com uma puta dor de cabeça. Samhain ainda tentava infrutiferamente encostar em Sam, quando o nariz de Sam começou a sangrar, provavelmente devido ao esforço que estava fazendo. Finalmente a fumaça preta começou a sair da boca do bruxo psicopata e, segundos depois, o professor estava no chão e a fumaça negra havia se esvaído. Sam respirava pesado e Dean o olhava com uma expressão que deveria ser uma mistura de desespero e decepção. E eu? Bem... Eu não sabia o que pensar. Aliás, eu sabia, eu sabia que aquilo era maligno e que Sam nunca mais deveria tentar fazê-lo de novo, mesmo que suas intenções fossem boas e que ele estivesse salvando pessoas inocentes. Mas não quis tocar no assunto.
Capítulo 07:
Estávamos tão exaustos que Sam e Dean não foram me deixar no hotel. Precisávamos conversar, mas poderíamos deixar as coisas desagradáveis para quando estivéssemos mais descansados. Fomos para o motel deles, onde tomamos banho. Eu vesti uma camisa social de Sam, do mesmo modo que as mulheres vestem depois do sexo e tomamos uma cerveja juntos para depois capotarmos. No dia seguinte, fui para o meu hotel, mas não sem deixar um bilhete para Dean me encontrar no parque ali perto. Dean me esperava sentado no banco do parque, vendo as crianças brincarem por ali. Pela primeira vez nos últimos dias, me permiti sentir ternura e algo próximo da felicidade. Ele estava vivo e estava bem. Senti lágrimas nos meus olhos, mas as limpei antes de falar com ele.
- E aí? – Sentei ao lado dele e, vendo sua expressão triste, eu disse: – Dean... A gente fez o melhor que poderíamos fazer. A culpa não foi sua.
- Você tem que parar com essas coisas de ler expressões dos outros. Você me assusta quando faz isso. – reclamou, me olhando com uma careta. – Castiel me disse que o selo seria quebrado de todo jeito.
- É... – Eu não sabia o que dizer.
- Por que você não me disse antes? – Ele mudou de assunto, desviando o olhar para as crianças que brincavam no parque.
Suspirei e respondi:
- Porque você não acreditaria que existem anjos. Porque eu não sabia que você só tinha um ano. Porque foi me dito que, apesar de querer te contar, eu não poderia fazer nada para evitar... Sua morte é tipo um ponto fixo na história e eu não podia mudar isso.
- Ah, e quem te disse isso? Os anjos? – ele perguntou depois de uma risada sarcástica.
- Alguns deles não são tão maus quanto parece. – falei, simplesmente. – Até mesmo esse Castiel... Ele segue as ordens, Dean, mas eu não sei... Eu sinto que, sei lá... Tem algo diferente nele.
- Diferente como? – Ele me olhou. – Tipo... Diferente, gay? Ou doente, sei lá...?
- Não acredito nisso, Dean! – falei, sem controlar o riso.
- Se você explicasse melhor, eu não precisaria parecer ridículo para você. – ele reclamou.
- Eu não sei o que é. – Dei de ombros.
- Ah, ! Você é tão sensitiva com as pessoas... Não sabe o que dizer quanto a ele?
- Ele não é uma pessoa, lindo. Eu só sei que o mais perto do que eu senti nele foi em outro anjo... E ele era bom.
- Jeremiah?
- É. – Suspirei. – Mas cada um de nós tem seu papel nessa porra toda... E eu não vejo outra saída a não ser fazer o que deve ser feito... Até certo ponto, é claro.
- Você está me escondendo coisas. – ele concluiu.
- Eu não posso te contar tudo o que me foi dito. Essa é a regra principal. – Suspirei pesadamente mais uma vez.
- Você sabia que eu ia voltar?
- Não... Mas, sei lá, né... Eu sentia isso. – Parei para pensar no que eu havia acabado de dizer, e percebi que não fazia muito sentido. – Quer dizer, se eles fizeram essa coisa toda comigo, que nem merecia sair de lá, imagine o que eles não fariam por você.
- Você está diminuindo seu valor... – Ele quis argumentar.
- É a verdade, meu lindo. – Dei de ombros. – Eu só quero poder fazer a coisa certa dessa vez. Se é que existe isso, né... – Suspirei.
Ficamos em silêncio, observando as pessoas no parque, até que ele resolveu quebrar o silêncio. O melhor desses momentos com ele é que nós não ficamos desconfortáveis, é só... Silêncio, pura e simplesmente.
- Por que você fez o seu pacto? – ele perguntou depois de algum tempo.
- Certamente não foi por fama, dinheiro ou saúde. – Brinquei e dei uma risadinha sarcástica, que foi acompanhada pela dele. Pensei por algum tempo, tentando ordenar meus pensamentos e disse, por fim: – Houve um tempo em que eu quis parar com tudo isso, sabe... Com as caçadas, a porra toda. Alguns anos antes de conhecer vocês. Naquela época, eu já havia mandado muitos filhos da puta para o inferno. – Uma risada sem graça me escapou por causa da ironia da vida. – Então, eles já meio que me conheciam por lá... Eu fiquei muito ferida em uma caçada, mas essa família me encontrou e, por sorte, cuidaram de mim e me acolheram como se me conhecessem desde sempre. Quem diria? Eu finalmente tinha uma família! – Ri, sentindo o nó na minha garganta aumentar. – Eu tinha até uma irmãzinha! Mas você sabe como essas coisas malditas descobrem sua fraqueza e a usam contra você. Então, num belo dia, eu cheguei em casa e estavam todos mortos... A família que eu nunca tive, as pessoas que cuidaram de mim e me acolheram estavam mortas. Não que tio Bobby e tio John não tivessem sido uma família incrível e, depois, vocês... Mas eu tô falando de uma família sem essas loucuras como a gente, sabe? – Mordi o lábio e suspirei antes de continuar: – Havia enxofre por todo o lugar. Então eu fui a uma encruzilhada e fiz o pacto: minha família de volta e os filhos da puta que fizeram aquilo com eles pela minha alma. Ele me deu dois anos... Disse que eu era famosa lá embaixo e que muitos demônios queriam me conhecer. – À medida que eu falava, as imagens me vinham à cabeça e a vontade de chorar aumentava: – O demônio cumpriu com sua palavra. Minha família estava de volta, mesmo que eu nunca mais pudesse vê-los de novo e eu tinha os filhos da puta que fizeram isso com eles... O demônio que fez o pacto comigo tratou de deixá-los num lugar onde ninguém ouviria os gritos deles. Ele fez questão até de fazer as armadilhas pessoalmente! – Nesse ponto, eu falava com lágrimas caindo dos meus olhos. – Passei os dois últimos anos da minha vida torturando aqueles demônios todos os dias de uma forma tão desumana que eu não fazia ideia que eu conseguiria.
- Vingança, ? – O tom reprovador na voz de Dean me fez encará-lo.
- Então você vai dizer que não gostaria de se vingar apropriadamente de Azazel, Dean? De tê-lo feito sofrer por mais tempo do que apenas dar um tiro na cabeça dele? – Esperei uma resposta que não veio. – Eu não me importava com o que sofreria no inferno, eu só queria saber de vingança... E, cara... A pessoa que disse que a vingança não faz bem a ninguém, nunca teve uma vingança como a minha.
- Fico impressionado que você diga isso.
- Pois é, eu também. A família faz isso com a gente, você sabe...
- E como sei... Bobby sabia? – Ele me olhou e eu neguei com a cabeça. – E ele não sentiu a sua falta, nesses meses todos que você estava morta?
- Não sei... Nós não falamos sobre esse tempo que eu fiquei sumida. Ele deve achar que eu estava numa caçada, sei lá...
- Quanto tempo você demorou para ceder? – ele perguntou, depois de algum tempo em silêncio.
- Quase quarenta anos. – Eu disse, chutando uma pedra. – E você? – Olhei de volta para ele.
- Você aguentou mais do que eu... – Ele suspirou. – Trinta anos.
- Não se culpe por isso... – falei. – Você sabe que não é culpa sua.
- Ah, claro... Eu aceitei torturar aquelas almas, ! – Ele se alterou. – Fui eu, ninguém mais!
- Dean... Ficar se culpando pelo o que houve lá não vai fazer um DeLorean se materializar na sua frente para você poder consertar tudo o que fez de errado. Principalmente se o que você fez não foi por vontade sua. – Ele deu uma risada sarcástica e eu resolvi continuar com a minha história. – Depois de mais vinte anos torturando as pessoas, eu estava começando a gostar... Eu estava perdendo minha humanidade. Mas Jeremiah veio e me tirou de lá. Ele me explicou algumas coisas, apenas o que eu precisava saber, mas não me explicou por que eu havia voltado... Mas ele sempre estava lá quando eu precisava. Além de você e Sam, que eu não vejo com tanta frequência quanto eu gostaria, principalmente para repetir algumas noites que tivemos juntos... – Eu o olhei e o vi sorrir. – Tio John estava morto, tio Bobby e Jeremiah são o mais próximo que eu tenho de uma família... – falei.
- O que aconteceu com Jeremiah?
- Eu não sei... Mas ele desapareceu. Ele não aparecia mais para me tirar dos apuros. Ele simplesmente parou de me proteger... E eu acho que ele está morto. – Suspirei.
- Como você sabe?
- Eu não sei... E é isso que me deixa louca. Mas, se ele estivesse vivo, mesmo que no céu, eu saberia.
- Como? – Ele me olhou.
- Ele estaria aqui. – Apontei para a minha cabeça. – E agora eu não sei mais o que fazer.
- Você pode vir caçar conosco por algum tempo.
- Eu tenho alguns trabalhos a fazer. Mas não me deixe só, Dean. Por favor. – O encarei, sentindo as lágrimas voltarem aos meus olhos. – Mantenha contato, sim?
- Tudo bem. Atenda o telefone quando eu te ligar e não faça como das outras vezes. – ele reclamou.
- Certo. E eu sei que você vai achar isso muito mulherzinha, mas eu quero um abraço. – falei ainda chorando.
- Você tem razão. – Ele riu e me abraçou. - Você é bem mulherzinha às vezes.
Levantei-me para ir embora, quando Dean me chamou mais uma vez:
- Pergunte, Dean. – Sorri.
- Como você sabia que eu ia perguntar algo? – Ele perguntou e eu arqueei minha sobrancelha, quando ele percebeu o que tinha dito e se enrolou com as palavras, me fazendo rir: – Aquilo sobre o que você disse sobre o Cas... Que super pegaria ele... É verdade?
- Vai agir como irmão ciumento ou ex-namorado mané agora, Dean? – Ri, deixando a resposta meio que implícita e saí de lá.
Dean ficou no parque por mais alguns minutos, por certo pensando na nossa conversa e nos acontecimentos recentes e eu voltei até o motel deles, para encontrar com Sam. Eu não queria falar de novo sobre o inferno, eu queria saber o que estava acontecendo com ele. Bati a porta e esperei até que ele a abrisse.
- Oi, . – Ele disse e beijou minha bochecha.
- Precisamos conversar.
- Eu sei... Por onde você quer começar?
- Pelo início, talvez... – respondi, me sentando na cama.
- Me desculpe.
- Pelo quê? – Fiquei confusa.
- Por ter te feito passar por tudo aquilo no portão do inferno... Principalmente depois de perder o Ash...
- Está tudo bem, Sammy. Eu e ele sempre tivemos uma relação meio complicada.
- É, mas você gostava dele. E não me parecia muito complicado...
- Era complicado e também não era... Às vezes era ele quem complicava tudo, querendo que eu ficasse com ele pelo Roadhouse. Às vezes era eu quem complicava tudo, sem poder ficar lá por muito tempo... – Suspirei. – Eu gostava dele, mas não gostava. E depois gostava de novo. Mas isso não nos impedia de ficarmos com outras pessoas.
- Mas você sente a falta dele.
- Claro que sinto... Você sabe como é difícil arrumar alguém que queira dar uns pegas com uma mulher com uma cicatriz tão grande no rosto? – Brinquei e, sem esperar a resposta, disse: – Muito difícil. Mas, me fale sobre essa história de estar com demônios e fazer exorcismos sem nem precisar pronunciar uma única palavra.
- O demônio de olhos amarelos me fez beber o sangue dele quando eu só tinha seis meses e disse que tinha planos para mim. Então eu tinha visões de coisas que ainda iam acontecer e descobri que poderia ter outros poderes. Um dia, logo depois de abrirmos o portão do inferno, eu conheci esse demônio... Ruby... E ela começou a nos ajudar. Quando Dean morreu, ela salvou minha vida e me ensinou a fazer essas coisas.
- Sam, provavelmente você já ouviu isso várias vezes e de várias pessoas, mas... Por favor, tome cuidado. Você, Dean e tio Bobby são a família que me resta. – Pedi. – E eu não tenho certeza que posso aguentar mais um Winchester morrendo.
- Você vai me contar como conseguiu essa cicatriz? – Ele mudou de assunto, fazendo o caminho com o dedo do canto do meu lábio até o meu ombro, que estava descoberto.
- Depois que Jeremiah me tirou do inferno, eu continuei com as caçadas, obviamente. Ele era tudo o que eu tinha... Mas ele é um anjo e eu não era sua única preocupação. Então, quando eu estava caçando três demônios que estavam tocando terror numa cidade do Kansas, eles me pegaram, me amarraram e me torturaram durante três dias. – Contei, olhando para o chão. – Ironicamente, esses demônios mataram pessoas que eu amava, e eu passei um bom tempo torturando todos eles. Quando eu voltei do inferno, eles fizeram isso comigo.
- Foi disso o que Uriel falou ontem?
- Sim... E um deles foi mais esperto que os outros. Ele pegou uma faca de três lâminas e fez esse corte. Eu fiquei sangrando e, toda vez que eu ia perder a consciência, ele jogava limão em cima da ferida. Não sei por quanto tempo fiquei lá até que Jeremiah me salvou.
- Então não foi um dragão? – Sam fingiu estar desapontado, o que me fez dar uma risada meio sem graça.
- Não, Sammy... Até agora, nunca me encontrei com um dragão.
- Sinto muito, . – Senti seu olhar pesar em mim.
- Tudo bem... Você não foi o demônio que me pegou. – Olhei para ele e percebi a proximidade dos nossos rostos.
- Até porque, se fosse, eu não estaria aqui nesse momento. – ele disse, com a voz meio falha e aproximando mais ainda nossos rostos.
Passamos alguns segundos nos encarando até que ele aproximou nossos lábios e me beijou. O tempo passava e a intensidade dos beijos aumentava, até que Sam me puxou para si, me colocando em seu colo. Aos poucos nos deitávamos na cama e, calmamente tirávamos as peças de nossas roupas, aproveitando o momento, cada um passando as mãos pelo corpo do outro. Minutos depois, eu caía na cama ao lado de Sam, os dois ofegantes. Vesti minha roupa, dei um último beijo em Sam e voltei ao meu hotel para pegar minhas coisas e partir.
Enquanto dirigia, pensava em tudo o que havia acontecido ali, em tudo o que eu havia falado para Sam e Dean, em tudo o que ainda havia para contá-los, no que eu ainda não sabia e viria a descobrir, em Jeremiah, Castiel, Ash... Pela primeira vez em muito tempo, me dei ao privilégio de pensar em Ash por um bom tempo... Normalmente, sempre que eu pensava nele, assim que a imagem dele me vinha à cabeça, eu o afastava. Mas, parando para pensar nele, ri sozinha, porque era engraçado parar para pensar que um nerd bêbado como Ash atraía uma pessoa como eu. Aliás, era engraçado pensar que ele atrairia qualquer pessoa. Mas esse não era o tipo de pensamento que ficava muito tempo comigo quando nós dois estávamos juntos. A simplicidade de estar com ele já era boa o suficiente, nós não tínhamos frescuras, estávamos sempre um confortável na presença do outro, de qualquer jeito, com ou sem roupa, e ele me fazia esquecer toda essa podridão do mundo, todos os meus problemas, acho que era isso o que me atraía nele. Era por isso que eu sempre fugia para ele. Sempre. Mas agora que ele se foi, eu estava sozinha, e a saudade que eu sentia dele era uma dor tão grande que nem três garrafas de tequila inteiras poderiam amenizar. E a certeza de que nunca mais nos encontraremos me deprime ainda mais. Nem o fato de saber que o inferno é uma merda me machucava tanto quanto saber que o único Ash que eu vou encontrar quando chegar onde estou indo é, na verdade, um demônio. E me machucava eu não poder agradecer tudo o que ele fez por mim, sem nem ao menos saber o que estava fazendo. Me machucava não termos tido uma última noite juntos. Pensar nele me machucava demais. E com essa loucura toda de demônios na Terra, eu não tive tempo nem de chorar a morte dele. Nem isso eu pude fazer! Não pude chorar a morte de uma pessoa que foi tão importante para mim. Pelo menos, não do jeito certo... Ouvindo música de roedeira e ficando bêbada. Não tive tempo de procurar Jeremiah. A verdade é que essa profissão te mata aos poucos, porque ela te consome. Ela te faz perder os entes queridos e você não tem tempo nem para sentir saudade deles... É uma vida louca e instável. Meus relacionamentos... Os caras que eu considero minha família são os com quem eu transo casualmente. Talvez haja esperança que um dia poderemos ser todos felizes, vivermos como uma família, sermos normais... Mas talvez a minha vida tenha que se resumir a sangue, morrer cedo, ir para o inferno e não ter nenhum legado a deixar. Porque não há espaço para amor na minha vida. Decidi que estava na hora de fazer o que eu vinha adiando desde a morte dele: alugar um quarto, comprar umas garrafas de tequila e me embriagar. Foi isso o que eu fiz logo depois de deixar os Winchester.
Fim.
N/A:: Bem, brotos, essa é a minha primeira fic de Supernatural, espero que vocês tenham gostado! (Ela foi reeescrita, digo, acrescentei alguns pequenos detalhes, umas falas e descrições, quem leu da primeira vez e leu agora deve ter notado, apesar de as coisas acrescentadas terem sido meio sutis). A fic é meio confusa porque a storyline da minha cabeça está meio estranha, então a primeira fic de todas é equivalente ao "It's The Great Pumpkin, Sam Winchester", na quarta temporada, como vocês obviamente notaram. Por isso eles já se conhecem... Enfim, mesmo que ninguém leia essa fic, ou que ninguém comente (o que acontece muito nas minhas fics), eu mandarei a história "seguinte" para o site. De todo jeito, se você chegou a ler isso, você merece mil beijos dos Winchester E de Castiel, e doses de tequila! Obrigada. :D
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