Upon Death – The Angel of Crime






Então eu senti a escuridão tomar conta de mim, senti todos os calmantes fazerem efeito, eu senti os primeiros vestígios de morte no meu corpo, estava ali. Era minha sina.

- Não entendo o que leva as pessoas a se suicidarem, se eu fosse um humano, iria aproveitar tanto... – Foi a primeira coisa que eu ouvi ao recobrar meus sentidos. Abri meus olhos e logo eles arderam com uma forte luz. Incomodei-me com meu corpo dormente, tudo doía. – E uma jovem moça como você, tanta vida pela frente, lamentável. – A voz continuou, tentei focar minha visão, porém a única coisa que eu via era a luz. – Às vezes eu odeio meu trabalho. – Foi então que a luz diminuiu e eu vi uma figura alta e máscula na minha frente, mas o que me chamou mais atenção foi... Asas. Grandes asas que ocupavam quase o quarto todo, asas que iam até o teto, douradas que emitiam, agora, uma luz fraca.
- Você é algum tipo de Anjo que veio me buscar? Finalmente encontrarei a paz? – Senti a dormência diminuir, senti apenas pontadas em todo meu corpo.
- Você que acha. Sua jornada só começa agora, querida. – O anjo soltou uma risada sarcástica.
- Como? Não irei para o céu, paraíso, nirvana...?
- Você se suicidou, sua real hora não chegou. O seu espaço não está pronto.
- Então... O que acontece? – Meu corpo se arrepiou, senti uma grande aflição preencher-me.
- Calma, querida, você está morta, não precisa ter pressa. – O anjo ironizou, e comecei a sentir raiva dele. – Tudo bem, deixe-me começar. – Ele encolheu suas asas e se sentou no chão. – Já discursei isso milhões de vezes. Estou ficando enjoado. – Rolei meus olhos e respirei fundo para não me estressar, resolvi tomar a iniciativa. - Você é algum tipo de anjo da guarda a que vem conversar dando lição de moral? - Ei, não me ofenda, anjos da guarda são muito mariquinhas, se eles fizessem o trabalho direito, eu não precisaria trabalhar tanto. Enfim, eu sou o Anjo do Delito, minha função é punir suicidas, como você, mostrando-a tudo que poderia ter acontecido e dar a sua maldição final, que será vagar pela terra até o dia real de sua morte. Mas antes te mostrarei como seria sua vida, apenas amostras do futuro, se você não tivesse desistido.
- Isso é horrível! Não quero ver nada, não quero receber maldição nenhuma. Até mesmo depois de morta eu não tenho direito a ter paz? – Gritei e tentei me levantar, porém, não consegui me mexer, meu corpo estava imóvel.
- Não estou te dando escolhas, estou apenas avisando com antecedência para não ficar tudo confuso. Sua alma ainda está presa ao seu corpo, tem todo um ritual para liberar.
- E que ritual é esse? – Perguntei quase implorando para ser solta.
- Aceitação, aceite sua maldição. – Ele se levantou e foi até a janela, suas asas, agora abertas novamente, já reluziam e passeavam pelo teto do quarto.
- E quais as outras opções? — O anjo riu e me mandou um olhar que me fez acreditar que, naquele momento, ele me achava a maior idiota do século.
- Não tem outras opções, ou aceita, ou viverá para sempre com sua alma presa ao corpo, passará dias e noites dentro do caixão, apenas olhando o estofado, até o dia da sua real morte. É uma opção bem chata, não tem volta, assim como sua vida não tem volta. – Considerei as possibilidades. Na minha vida inteira eu tive claustrofobia, me deixava agoniada só de considerar a segunda possibilidade.
- Tudo bem, tudo bem, eu aceito. – A forte luz invadiu o quarto novamente, fechei os olhos, não ouvi o anjo falar mais nada. O formigamento que até a pouco me incomodava, parou.
Quando voltei a abrir os olhos, percebi que já não estava no meu quarto. Reparei que o anjo estava ao meu lado olhando o cômodo admirado.
- Onde estamos? – Perguntei, reparando na grande sala com vista para uma praia. Era um lugar bem aconchegante.
- Estamos em um futuro paralelo, onde sua morte nunca existiu, estamos em 2018 se não me engano. Aqui é a casa da sua família, onde você, seu marido e seus filhos moram.
- Marido, filhos? – Perguntei, confusa, não assimilando as notícias.
- Sim, quando você se mudou para Califórnia, conheceu um garoto que estagiava na sua faculdade, se envolveram e casaram, você engravidou um ano depois e deu no que deu. – Ele ficou quieto quando um homem alto, de olhos castanhos claros e cabelos ruivos entrou no cômodo, ele deixou um sorriso brincar em seu rosto e foi até as escadas. Soltei um ofego ao ver sua atraente beleza.
- ? – Ele gritou meu nome do pé das escadas, senti meu corpo tremer com aquela voz doce e aveludada.
Logo uma mulher apareceu correndo pelas escadas com um gato.
- Oi, amor. – Naquele momento, demorei a perceber que aquela era eu. Meus cabelos castanhos estavam cheios de vidas, meus olhos brilhavam de felicidade, meu corpo estava saudável, não magro e esquelético como esteve até agora. A mulher, eu, soltou o gato que correu até perto de mim e se deitou perto do meu pé. Voltei minha atenção para a eu do futuro e vi que ela abraçava o homem com um sorriso lindo nos lábios. Um sorriso que fez meu estômago se encolher e dar algumas voltas.
Meu olhar se dirigiu até a estante, ali, um porta-retratos me chamou a atenção, na foto havia eu e mais três pessoas, uma delas reconheci como o ruivo que acabara de ver.
- O garoto se chama e a garota é . Seus filhos. – O Anjo informou-me. - E ele se chama , seu marido.
- Eu tenho uma família mesmo? Eu não acabei sozinha. – Falei mais para mim mesma do que para o anjo, os dias nebulosos de minha vida voltaram à minha cabeça e aquela agonia que eu vivia sentindo, achando que eu seria eternamente sozinha evaporaram da minha cabeça. Olhei em volta e sorri admirada para tudo.
- Você teria uma família, pelo que li nos meus relatórios, uma família maravilhosa e unida. E devo dizer que você também se deu muito bem no trabalho, depois de sair da faculdade conseguiu um emprego em uma agência de publicidade, o salário era ruim no início, mas seu chefe te promoveu e foi aí que as coisas começaram a ir de bom a melhor, conseguiu seu casamento dos sonhos, comprou essa casa, teve seus filhos... – Ele olhou seu relógio e arregalou os olhos. – Meu tempo com você já está acabando, temos que voltar. – Foi então que minha ficha caiu... Eu tinha uma maldição a cumprir.
- Espera! – Gritei para o anjo que já estava sumindo e me levando junto. – Não tenho como refazer? Desistir, voltar atrás? – Implorei. – Posso ter uma segunda chance?
O anjo somente riu.
- Não existe segunda chance após a morte, querida. Nunca escutou o ditado? "Só para a morte não há remédio.” Depois de feita sua escolha, não existe conserto. Fim da linha.
Então senti uma tontura e quando voltei a mim, estávamos novamente no quarto.
- Meu trabalho aqui acabou, tenho um garoto marcado para as 22h00min, ele vai se jogar do quinto andar só porque a noiva o traiu. – O anjo se encaminhou para a janela.
- Posso saber mais uma coisa antes de você partir?
- Vá rápido. – Ele disse já abrindo as asas.
- Quanto tempo até a minha real morte? Quanto tempo eu ficarei vagando aqui? – O anjo, pela primeira vez, mostrou-me pena.
- Você teria o que todos desejariam... Anos e anos de felicidade ao lado de pessoas que ama e que amariam você, porém, agora, anos e anos vagando pelas ruas levando a escuridão para onde for.
Então ele partiu, deixando rastros do seu brilho para trás, que aos poucos, foi sumindo até o quarto ficar escuro novamente.

Então era essa minha verdadeira sina: Uma maldição. Tudo que sobrou em mim era remorso de ter desistido, de ter aberto mão da minha vida, de tantos erros e acertos a serem cometidos.
Não tinha volta, eu havia feito minha escolha e o erro era irreversível, um erro que levaria pelo resto da minha passagem pela terra, até que alguém tenha piedade da minha alma vazia e me dê a paz que eu tanto almejei.
Poderei, então, sonhar pelo resto dos dias e noites com a vida que eu teria, com as metas que eu realizaria, com as pessoas que eu conheceria e amaria, mas que eu nunca conheceria, momentos que nunca virão a acontecer.
Tudo por um simples erro: Eu brincara com a morte.

Fim



Nota da Autora: Upon Death é a minha xodó! Além dessa fanfic ter me ajudado muito em tempos difíceis, ela sempre foi uma das melhores coisas que eu já pude escrever. Espero que vocês tirem alguma lição ou aprendizado dela. Lembre-se de comentar, me ajuda muito na hora de escrever ver que estou tendo algum retorno de leitores. Muito obrigada pela atenção!
Ass: Cass W.

Grupo de Fics da autora (https://www.facebook.com/groups/795030047177202/)


comments powered by Disqus

Qualquer erro nessa atualização são apenas meus, portanto para avisos e reclamações somente no e-mail.
Para saber quando essa linda fic vai atualizar, acompanhe aqui.



TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AO SITE FANFIC OBSESSION.