How to save a life



A pouca luz de sol que as nuvens escuras deixavam escapar, incidia na grande janela, que mais parecia uma vitrine, da sala de estar de . Tudo ali era tão familiar e reconfortante, como um lar deveria ser. Todos os cantos lhe traziam lembranças doces, que se tornavam amargas quando se forçava a lembrar que aquele era o fim. prometera voltar em cinco minutos, mas ela sentia que não podia mais segurar as lágrimas por nem um segundo a mais sequer.

Ela estava encostada ao batente da grande janela, observando o movimento na rua, do nono andar. Ouviu o som dos os sapatos de ecoar pelo grande apartamento, fazendo a madeira velha ranger. Enxugou a única lágrima teimosa que escorria pela maçã esquerda do rosto e sentou-se no sofá assim que sentiu as pernas trêmulas. "Talvez seja só uma conversa", ela tentou se enganar, mas suas esperanças se foram ao ver uma caixa preta na mão de , cheia de coisas, com um ursinho marrom e o LP dos Beatles que ela havia lhe dado de presente no último aniversário. Talvez ela não devesse ter dito tudo o que disse a ele.

sorriu educadamente, mesmo que soubesse que aquilo que sentia estava longe de ser felicidade. Ele só queria que ela pensasse que ele não precisava dela para ser feliz, quando na verdade, ela era tudo que ele precisava. Ela o encara de volta, no mesmo tom. E o mundo de desabou ao perceber que talvez ela não precisasse mais dele. Mas se realmente precisasse, por que teria terminado? Ele ainda tinha tanto para aprender... Como, por exemplo, que mesmo que alguém o amasse a cima de tudo, ela não estaria disposta a perdoar todo o tipo de besteira que fizesse. E também teria que aprender que as pessoas erram e nos machucam, e a nós só cabe perdoar ou não.
A luz que atravessa a janela deixa tudo tão claro, de uma forma tão fria, que não conseguia ver a tristeza disfarçada no rosto de . Ele deixou a caixa sobre a mesa de centro, afastando-se cada vez mais da janela, enquanto ela se sentava cada vez mais perto. sentiu como se estivesse tentando se equilibrar entre a linha de medo e culpa. Enquanto tinha a sensação de andar sobre uma corda bamba. Ele sabia que estava errado.

E então ela começou a imaginar onde havia errado, onde o havia perdido, o que os havia separado. Se não era a falta de amor, então o que seria? Talvez fosse exatamente o amor que tivesse sufocado os dois. Ela não se perdoava mais por cada erro que havia cometido com ele, e também não. Se ela tivesse se dedicado mais, e compreendido mais... Eles poderiam ter continuado se soubessem se entender, mas agora era tarde demais.

o encarava daquele jeito que ela sempre fazia quando queria ter certeza de alguma coisa. sabia que ela já tinha mais que certeza. Seus olhos escuros se encontravam com os azuis tão vívidos dele, mas ela não se permitia sentir pena. Ele não merecia isso.

Doía tanto, era como se lhe arrancassem o coração. Ela se sentia cansada e fraca, queria tanto , mas tinha que deixá-lo, por mais que doesse. Se ele a amasse tanto como sempre dizia, não a decepcionaria tanto.

Ela estava tão acostumada com os erros e acertos de , que até seus defeitos haviam se tornado virtudes. Se ele ao menos não tivesse ultrapassado os limites. Se eles soubessem se entender... Ela queria que tudo aquilo acabasse de uma vez. Reze pra Deus que ele te escuta. Apenas reze pra Deus que ele te escuta.

imagina onde havia se perdido no meio do caminho. E por que percebera tão tarde que o amor é sim o suficiente.

Ela soluça de chorar, e sente um aperto no coração tão grande e uma repulsa de si mesmo. Pois sabia que era ele que a fazia chorar, mesmo quando ele já tivera tantas chances de fazê-la parar.

- Eu não sei por que fiz isso! Eu não to pedindo pra você me entender, eu só quero que você me perdoe. - gritou, explodindo, quebrando o silêncio que tanto incomodava. Seus olhos brilhavam tanto, e doíam como nunca, um nó na garganta. Ele não agüentava mais segurar sua dor. - Eu sentia tanto a sua falta, eu... Eu ainda sinto! Que porra! Nós íamos nos casar, ! Eu sei que eu fiz tudo errado, mas eu tava apavorado. Isso não significa que eu não te amo. Por que eu te amo cada dia mais e mais... Te amo tanto que as vezes dói! Você não consegue me perdoar por uma pisada na bola? - gritava tão alto, que talvez até as pessoas que passavam na rua poderiam estar ouvindo. - Eu só quero você de volta! - ele passava a mão na cabeça, repetidas vezes em sinal de um nervosismo incontido. não conseguia juntar as informações e fazer com que tudo fizesse sentido. Ele simplesmente ficava gritando tão alto, que ela não conseguia entende-lo. Eram lágrimas e soluços, gritos e apelos, dores e lembranças, o passado e o futuro... Tudo se misturava.

Ela continuava assustada com todos os gritos, mas não sabia se queria abraçá-lo ou simplesmente deixá-lo para sempre.

- ... Você não errou uma vez só. Você só não enxerga seus erros. - ela disse o mais tranquilamente que pôde, ainda assim soluçando ao final e cessando o choro. Ele continuava gritando... Talvez eles não fossem feitos um para o outro como haviam pensado.

Por que ela havia vindo? Por uma droga de ursinho e um maldito LP? Pra que ela se submetia a vê-lo de novo, se ele só lhe trazia tristeza agora?

- Não dificulte as coisas. - ela disse friamente levantando-se do sofá e pegando a caixa preta, batendo a porta ao sair.

correu até a porta e a esmurrou com força, odiando-se por tudo. Chutou a porta repetidas vezes, ofegava tanto. Fechou os olhos e se ajoelhou diante a porta de madeira escura, chorando. Ele a havia perdido.

Ela encostava-se à porta e escorregando até o chão, deixando a caixa cair num baque surdo. Ela sabia que ele estava do outro lado. Ele a ouvia chorar, cada soluço parecia uma facada.

O Sol não exibia mais toda a sua elegância no topo do céu. O canto dos pássaros anunciava o início da tarde. ainda podia ouvir a respiração de do outro lado da porta... Ela tinha medo que ele escutasse as batidas aceleradas de seu coração.

Era tudo tão calmo naquele momento. As brigas e traições já não importavam mais. Por que não conseguia sair de lá?

- Eu te amo. - ele sussurrou baixinho.

- Eu também te amo. - ela respondeu traindo a razão e deixando-se levar pelo coração.

Talvez eles tivessem sido feitos um para outro... Só precisavam de tempo para descobrir isso.


Fim

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