abria seus olhos lentamente. Sentia-se pesado, como se toneladas fizessem pressão sobre seu corpo, o impedindo de se mover. Uma dor de cabeça infernal vinha como ondas, tomando espaço em sua consciência. Aos poucos, ia despertando e percebendo que não se encontrava em boas condições. Um calafrio percorreu sua espinha e, concentrando-se na boca de seu estômago, ele pôde reconhecer o legítimo medo pairando sobre ele. Não sabia onde estava e o que tinha acontecido para estar ali...
“Isso é um hospital? Mas que porra é essa?!” pensou enquanto tocava sua cabeça com certa dificuldade e a descobria enfaixada. “O que aconteceu?! O que eu tô fazendo aqui?!”
Essas eram as perguntas que surgiam em sua mente conforme ele ia se situando. Mas não encontrava ninguém que pudesse respondê-las. Então, ele se lembrou de sua namorada, . Quem sabe ela poderia responder essas perguntas? Mas ele não a via ali, nenhum rosto familiar, amigos. Ninguém. Resolveu esperar por ela ou por alguém que pudesse tirar todas essas dúvidas que faziam com que sua cabeça doesse ainda mais.
Procurando reconhecer o ambiente ao qual se encontrava, passeou com seus olhos por todo o cômodo, esperando que algum detalhe pudesse lhe fazer entender o que estava acontecendo. Até que, por cima de seu ombro, bem ao lado de seu travesseiro, entre os vários tubos de soro e medicação, um fio diferente lhe chamou atenção; não soube dizer se ele era branco ou cinza, por causa de sua visão um tanto turva. Tateando ainda com dificuldade, seguiu toda extensão do fio, a fim de saber onde aquilo terminaria. Por fim, acabou achando um botão no final do mesmo, que terminava bem ao lado do braço da cama hospitalar. Graças à sua curiosidade, descobriu um meio de pedir socorro. O tal fio era ligado a um sistema de campainha eletrônica. Torceu para que a campainha estivesse funcionando e apertou com toda força que tinha inúmeras vezes o pequeno botão. Alguns poucos minutos de silêncio se passaram e o rapaz já estava desacreditado que alguém viria vê-lo, quando a porta se abriu e ele pode ver uma enfermeira adentrar com uma bandeja de medicamentos. Ela, por sua vez, levou um susto e derrubou a tal bandeja e, num movimento rápido, saiu do quarto sem ao menos falar com o rapaz que estava dentro dele. ficou assustado, não sabia o que estava acontecendo e a atitude da enfermeira não ajudou muito, a não ser assustá-lo ainda mais. Pensou que ela estivesse ali por causa de seu chamado, mas, aparentemente, estava enganado. Dentro de poucos minutos a mesma enfermeira estava de volta. Mas ela não estava sozinha. Estava acompanhada de um senhor – semblante simpático, baixinho e barrigudo. Fazia se lembrar do Papai Noel e dos natais que passou com sua namorada.
“Mas onde será que se meteu?!” Perguntava-se . Até então, ele não tinha aberto a boca para falar uma sílaba sequer... Precisava falar com alguém urgentemente.
- Olá, como está se sentindo, Sr. ? — perguntou-lhe o senhor simpático.
- Eu estou bem, mas minha cabeça está doendo muito... O que aconteceu comigo?
- É normal que o senhor sinta essas dores, e será assim por mais alguns dias. Mas vai ficar tudo bem, eu garanto. A enfermeira vai lhe medicar agora, e dentro de alguns minutos essa dor vai passar. - disse-lhe sorridente e mostrando bochechas grandes e avermelhadas.
- Sim, isso não importa agora. Eu quero saber o que aconteceu comigo pra eu estar aqui, nessa cama de hospital e com essa dor que o senhor mesmo disse que daqui a pouco irá passar... Como é mesmo seu nome, doutor?
- Desculpe, esqueci de me apresentar. Meu nome é Sellenger, Dr. Richard Sellenger. Eu sou neurologista.
- Prazer em conhecer o senhor. Eu acho...
- Tudo bem, filho, acho que todos nós sabemos que um hospital não é bom lugar pra se conhecer pessoas. Enfim, sinto muito em lhe informar, mas o senhor sofreu um acidente de carro. Por sorte não lhe aconteceu nada de muito grave. Foi um milagre ter sobrevivido, e com apenas algumas costelas quebradas e um leve traumatismo craniano.
- E quanto tempo eu fiquei desacordado, Dr. Sellenger? E quando vou poder sair daqui? — foi preciso um esforço da parte de para digerir as últimas informações, e em seguida enumerar suas próximas dúvidas cruciais.
- Você estava em coma induzido. Ficou assim por duas semanas. Foi preciso fazer esse procedimento para que a sua pressão craniana se estabelecesse. Você que se adiantou e acordou antes da hora, mocinho! Por acaso tem algum compromisso inadiável? - o médico disse em tom de piada. – Mas, com essa sua demonstração de garra, creio que estará de alta daqui alguns dias! - o Dr. Sellenger tentou fazer sua voz animadora, mas não adiantou. ficou perplexo.
Não sabia o que falar agora, que pequenos "flashes" de memória passavam pela sua cabeça. Ele só conseguia ver um carro derrapando e batendo em outro automóvel que estava no meio de uma estrada. Era de noite, estava muito escuro e não tinha nenhum tipo de sinalização. ficou tão confuso e desnorteado que nem ouviu o Dr. Sellenger dizer que ia chamar seus amigos, que estavam na sala de espera do hospital, em busca de notícia do estado de saúde dele. Quando viu, estava sozinho de novo naquele quarto claro e com as janelas abertas, que mostravam um lindo céu azul. Com raios de sol que adentravam bem na direção de sua cama, fazendo com que se sentisse aquecido e iluminado, como se alguém estivesse abraçando-o. Por um momento, se sentiu confortável naquele quarto, mas novamente as lembranças do acidente passaram pela sua cabeça e ele só conseguia pensar em uma pessoa... .
We were out on a date in my daddy's car,
(Certo dia, saímos no carro do meu pai)
We hadn't driven very far.
(Não tínhamos ido muito longe)
There in the road, straight ahead,
(Lá na estrada, bem no meio)
a car was stalled, the engine was dead.
(Um carro estava afogado, com o motor fundido)
I couldn't stop, so I swerved to the right.
(Eu não podia parar, então desviei para a direita)
já não aguentava mais. Precisava de respostas, pois a memória dele não estava ajudando. Ele só conseguia lembrar-se de dirigir numa estrada e depois uma bagunça de sons e imagens distorcidas embaralhavam sua cabeça. Mas ele pôde sentir que tinha alguém com ele. Ele não conseguia ver de quem era o rosto da pessoa. Estava tudo muito escuro nas suas lembranças. De repente, a porta do quarto novamente se abriu, porém, dessa vez, eram rostos conhecidos. , e vieram em sua direção e rodearam a cama do amigo. Por sua vez, não sabia se ficava feliz ou triste, pois seus amigos estavam ali, mas ele queria ver mais que tudo naquela hora. Só ela saberia dar conforto num momento de desespero como esse. foi tirado de seus pensamentos pela voz de , que o chamava:
- , você tá bem, cara? - falou com o semblante preocupado.
- Err... Ah, oi, , estou bem melhor agora. Já estava pensando que tinham me abandonado aqui! - disse, na tentativa de descontrair o ambiente, já que os meninos pareciam estar com medo de tocá-lo. Talvez, se não fosse pelo monte de tubos e fios que tinha em seu corpo, os amigos já teriam se jogado em cima dele. Como era de costume em suas brincadeiras, na maioria das vezes, brutas.
- Pelo visto o já tá melhor. Já tá até fazendo drama! - , que estava mais perto de , falou, fazendo uma espécie de cafuné no amigo, que não pode deixar de rir com sua piada.
- E pelo visto você não perde esse seu humor patético, hein, ? - disse arrancando mais risos de e , e deixando um com uma cara nada amigável.
- Seus gays, é bom ver vocês, rir das piadas sem graça do ... - disse enquanto lançava um olhar pro amigo, ainda frustrado. - Mas eu preciso falar sobre uma coisa séria com vocês. - disse pedindo a atenção dos amigos. - O que aconteceu comigo? Não, melhor... Como aconteceu isso comigo? - não sabia quais perguntas fazer, nem sabia o que tinha acontecido com ele naquela noite. Só tinha leves lembranças.
- Bom, , você teve traumatismo craniano e algumas fraturas na costela e na perna. Mas do quê, basicamente, você se lembra? - queria encontrar a melhor maneira de contar o ocorrido para o amigo.
- Ah, , eu só tenho uma vaga lembrança de um carro parado no meio da estrada e eu tentando desviar dele... E, se eu não me engano, acho que tinha uma pessoa comigo dentro do carro. - nesse momento, percebeu que seus amigos mudaram completamente. Ficaram sérios e tristes. - O que foi? Por que ficaram com essas caras?! Por favor... Me contem o que aconteceu comigo na noite do acidente. Eu imploro!
, vendo que o amigo não conseguiria contar nada pra , tomou a frente da situação e disse:
- , não sei se você se lembra, mas na noite do acidente nós estávamos numa festa. Todos nós: eu, você, , e... A . - ia contando tudo direitinho, mas quando chegou ao nome da namorada do amigo fez uma pausa, como se estivesse com medo de mencioná-la. - Você e a resolveram sair mais cedo da festa. Nós não fomos com vocês. Então, como você estava com o carro do seu pai emprestado, foram na frente. O Travis, um cara que a gente conheceu há pouco tempo e dono da festa, ensinou um atalho pra vocês, já que estava um pouco tarde e as estradas da região não eram muito bem iluminadas. — ia contando tudo muito bem explicado, com medo de que o amigo deixasse de entender alguma parte e ele tivesse que voltar atrás e repetir. Aquilo era difícil para ele, não sabia como falar sobre o que aconteceu naquela noite. Muito menos sabia como o amigo reagiria assim que ele terminasse de contar tudo. Só imaginava que não seria nada bom.
- , estou me lembrando! - o interrompeu num tom eufórico, como se tivesse conseguindo algo extraordinário. Para aquilo era algo magnífico, finalmente ia se lembrar do que aconteceu com ele. - Eu me lembro de que peguei o carro do meu pai e fui embora com a da festa. Nós não tínhamos ido muito longe, foi quando chegamos ao meio da estrada e eu vi um carro parado. Parecia ter algum problema com ele, mas eu não tive tempo pra parar! Então, desviei pra direita, causando um capotamento e... - o silêncio tomou conta do recinto. Dos quatro rapazes, três sabiam o que aquilo significava. O quarto temia que soubesse também. - , onde está a ? Onde está minha namorada?!
finalmente se lembrou da noite do acidente, de tudo, menos do que aconteceu à sua namorada. Agora a curiosidade de saber onde ela estava se tornava cada vez maior. Era agonizante cada segundo o qual ele esperava pela resposta do amigo, que estava com os olhos cheios de lágrimas e de cabeça baixa. Era impressão de ou seu amigo estava evitando encará-lo? já estava ficando desesperado, precisava mais do que nunca saber onde estava . Onde estava sua amada. Vendo que não conseguiria obter mais nenhuma resposta de , virou-se para os outros dois, que estavam muito tristes e assustados com a agressividade que começou a aparecer no tom de voz do amigo.
- ... ... Me digam, aconteceu alguma coisa com a ? Fala, qualquer coisa é melhor do que esse maldito silêncio! - ele dizia já impaciente com aquilo tudo. Suas narinas infladas, os dentes à mostra, eram indícios de que estava perdendo o controle. Pensou se doeria muito arrancar os cateteres e sair dali. Era o que ele faria, se fosse preciso. Iria bater de quarto em quarto até achar sua namorada. Precisava vê-la o mais rápido possível. Precisava saber se ela estava bem.
I'll never forget, the sound that night
(Eu nunca vou esquecer o som daquela noite)
The screamin’ tires, the bustin’ glass,
(Pneus cantando, os vidros estourando)
The painful scream that I heard last.
(O grito de dor que eu ouvi, por último)
Oh where, oh where can my baby be?
(Oh, onde? Onde estará o meu amor?)
The Lord took her away from me.
(O senhor tirou-a de mim)
She's gone to heaven, so I've got to be good.
(Ela foi pro céu então, eu tenho que ser bonzinho)
So I can see my baby when I leave this world.
(Assim, verei meu amor, quando deixar este mundo)
- , se acalma, cara! - era a vez de contar o ocorrido.
“Eu sempre fico com a pior parte. Droga!” Pensou ele, antes de tomar fôlego e prosseguir.
- Eu vou te contar o que aconteceu com a . Com a sua ... Como você mesmo se lembrou, o carro capotou bem do lado onde a estava, ela também foi socorrida e internada. Mas a situação dela era bem diferente da sua, . Ela se feriu gravemente, perdeu muito sangue... Ela estava entre a vida e a morte. — com o que disse, se lembrou de tudo. Agora, tudo detalhadamente. Podendo lembrar os sons daquela noite, pareciam cenas tiradas de um filme. Um filme onde tinha pneus cantando, vidros estourando e gritos no final. Era inevitável, ele estava apavorado. Com medo de perguntar em que estado sua joia preciosa se encontrava. As lágrimas, ele já não conseguia conter. Seus amigos estavam chorando também, e num misto de coragem e medo ele fez a pergunta que queria fazer há tanto tempo:
- Onde ela está? Ela sobreviveu, não é?
- ... Desculpe, mas eu não posso dizer que isso é verdade. Eu estaria mentindo, ela perdeu muito sangue, teve muitas fraturas... - foi interrompido por um grito de nesse momento, fazendo com que as tímidas lágrimas que caiam do seu rosto se tornassem um choro parecido com o de uma criança amedrontada.
- Porra, , não enrola! Eu só quero saber se ela está viva, se a verei de novo... Isso é tudo que eu mais quero. - estava pior que seu amigo. Gritava com toda a força do seu pulmão, deixando-o ofegante. Estava em prantos, desesperado.
- Calma, ! Você não pode se alterar, ainda não está em boas condições de se irritar assim. - , que até então tinha falado pouco, se manifestou. Mostrando preocupação com o amigo, ele o alertou. - Você acabou de sair de um coma, cara!
- , eu não estou nem aí pro meu estado. Eu só quero saber se ela resistiu ao acidente... Resistiu porra?! - , ao perceber que assim não conseguiria obter as respostas que queria, tentou abaixar o tom de voz. Mas o choro, o choro era incontrolável. Só de pensar que não teria mais sua amada em seus braços, desejou que estivesse morto. - , me diz, ela está em qual quarto desse maldito hospital?! — disse tentando se levantar.
- Não! Não faça isso, fique aí onde está. , termine de contar tudo pra ele. - disse com rispidez na voz.
- , ela não está em quarto nenhum. Ela não resistiu aos ferimentos, faleceu no segundo dia de internação. Os médicos tentaram de tudo, mas... Eu sinto muito. - então terminou de contar tudo o que tinha acontecido com . Ele sentia muito a morte da namorada do amigo, que também era muito sua amiga. Não tinha ideia do que seria a vida de todos eles sem a garota que perturbava todos os ensaios da banda a qual eles formavam. Seria muito difícil se acostumar com uma perda dessas.
- NÃO! NÃO PODE SER... NÃO COM A MINHA ! — dizia se debatendo, pois seus amigos o impediam de se levantar. - Me larga, , me larga! Eu quero ver a agora! Eu quero ver a minha namorada!
- , para! Se não eu vou ter que chamar a enfermeira pra te dar um sossega-leão! — falava em meio de socos e empurrões que levava de a cada vez que tentava se aproximar dele.
- Então me solta, eu vou ver a minha namorada. Onde ela está? — disse, tentando se acalmar e não querendo acreditar no que seus amigos tinham acabado de lhe falar.
- , veja bem, a não foi enterrada ainda. Os pais delas ainda não chegaram do Brasil. Eles devem estar chegando hoje de noite, ou amanhã de manhã. Nós só conseguimos avisá-los ontem de noite. Como você sabe, ela queria viver e morrer aqui, na Inglaterra. Era o sonho dela viver aqui, e você fez parte disso. O desejo dela vai ser realizado. Ela vai ser enterrada aqui. — disse visivelmente triste com tudo aquilo que estava acontecendo ao seu amigo. Ele queria de alguma forma confortá-lo, queria que ele soubesse que sempre poderia contar com seu apoio. — Você sabe que pode sempre contar comigo, né? Quer dizer... Com todos nós. Nós não vamos te deixar sozinho nessa, irmão. — dizendo isso, chamou os outros dois pra darem um abraço em .
O rapaz em seu leito chorava copiosamente. Sentia dor. Dor física e emocional. Sentia medo também. Estava perdido e apavorado. Em sua mente, estava implorando a Deus que aquilo fosse um pesadelo. Que fosse só o pior dos seus medos em forma de um terrível sonho.
- Eu não sei se vou conseguir suportar isso, eu não sei se quero viver num mundo onde a não esteja. Eu preciso dela! — disse com lágrimas nos olhos. Lágrimas de tristeza e emoção, pois sabia que seus amigos eram umas das coisas mais preciosas na sua vida. Mas o seu verdadeiro tesouro... Esse tinha se perdido para sempre.
When I woke up, the rain was pourin down.
(Quando acordei, a chuva caía)
There were people standin all around.
(Havia muita gente em volta)
Something warm flowin through my eyes,
(Uma sensação ruim passava diante de meus olhos)
but somehow I found my baby that night.
(Mas, não sei como, eu encontrei meu amor naquela noite)
I lifted her head; she looked at me and said,
(Eu apoiei sua cabeça, ela me olhou e disse:)
"Hold me darlin just a little while."
("me abrace, querido, só um pouco")
I held her close; I kissed her our last kiss.
(Eu a abracei forte e a beijei, nosso último beijo)
I'd found the love that I knew I had missed.
(Eu encontrei o amor, que sabia, que perderia)
Well now she's gone, even though I hold her tight.
(Bem, agora ela se foi, mesmo eu tendo abraçado-a com força)
I lost my love, my life that night.
(Eu perdi meu amor e minha vida naquela noite)
’s POV:
Eu acordei e vi que a chuva estava caindo. Olhei em volta e vi muitas pessoas, umas conhecidas, e outras deviam estar ali por algum motivo que eu desconhecia. Mas todas elas tinham algo em comum – todas estavam vestindo preto ou roupa escura. Não entendi muito bem, e confesso que me assustei com o visual do ambiente. “Será que isso é um velório? E quem será que morreu?” Pensei comigo mesma enquanto desviava de algumas pessoas agrupadas em minha frente. Foi quando me virei e vi . O meu . Ele estava aparentemente triste, estava com olheiras profundas e com a barba mal feita. Mas mesmo assim continuava lindo! Eu fiquei preocupada.
“O que será que aconteceu com pra ele ficar desse jeito?”
De repente, vi uma senhora abraçando-o em forma de consolo. A senhora em questão me pareceu familiar. Apertei meus olhos, tentando enxergar debaixo da chuva intensa, e quando constatei quem era, levei um susto: quem estava abraçando era minha mãe! Mas a minha mãe estava no Brasil e ela nem conhecia meu namorado pessoalmente! Fiquei mais preocupada e um nervosismo tomou conta de mim. Precisava de respostas, precisava com urgência.
Vi que eles choravam baixinho e discretamente, mas choravam. Depois vi meu pai consolando minha mãe e pude ver que se distanciou um pouco... Parecia querer fugir dali. Resolvi me aproximar das pessoas. Passei pelos meninos e eles nem me notaram. Eles também estavam diferentes, estavam sérios e de cabeças abaixadas. Normalmente eles estariam fazendo piadas e batendo uns nos outros, como fazem em qualquer lugar. Resolvi falar com eles; primeiro, cutuquei o , que por sua vez nem se moveu. Depois, fui falar com o , que nem me deu atenção. E por último me aproximei de . Ele sim era o mais inteligente de todos, talvez pudesse me explicar algo... Cheguei perto dele e coloquei minha mão sobre seu ombro tentando tirá-lo de uma espécie de transe em que se encontrava. Ele olhou para os lados e, por um momento, pensei que ia me responder, mas ele não me viu e ficou como se estivesse procurando quem o estivesse chamando. Viu que não era nenhum dos meninos, balançou a cabeça e saiu em direção a uma salinha que eu não sabia bem o que era. Eu o gritei diversas vezes e nada de ele me responder. Fui atrás dele e consegui alcançá-lo. Quando entrei na sala, tive um choque instantâneo. Dentro do cômodo havia um caixão branco com detalhes dourados. Percebi que tinha entrado ali para pegar água num bebedouro que tinha lá dentro.
Me aproximei com cautela, pois senti medo em ver de quem era o corpo da pessoa que estava dentro do caixão. Foi quando tive um choque maior ainda – Vi que o corpo que estava dentro o caixão era bastante conhecido, pois era o meu corpo que estava nele! Fiquei sem reação, e por um momento pensei que fosse cair. Também pensei que aquilo só podia ser brincadeira dos meninos, mas percebi o quanto eu era idiota em pensar isso, pois como haveria um corpo idêntico ao meu pra pôr naquele caixão? Aí fui juntando dois e dois e concluí que eu realmente estava morta: o sono pesado e aquele pesadelo de um carro batendo e capotando... Bom, aquilo não era um sonho. Aconteceu de verdade, e naquela noite eu morri. Desabei. Chorei, e chorei muito. Chorei de tristeza, medo e raiva. Seria cômico se não fosse trágico: eu, debruçada em meu próprio caixão, chorando pela minha morte. Depois que botei toda minha angústia para fora, me lembrei de e minha família. Como conseguiria ficar sem eles? Como viveria sem os melhores beijos da minha vida? Nunca mais ouviria minha mãe ao telefone. Aquilo doía como se estivessem me esfaqueando, e a verdade se tornava cada vez mais pesada de segurar cada vez que eu ia pensando nas coisas em que perderia. Mas eu tinha que ser forte, já que não havia muito o que fazer para mudar minha situação. Eu tinha que aceitar. Sequei minhas lágrimas. Se era o que tinha que ser, então assim seria. Não que eu tivesse aceitado a minha morte, mas eu não podia fazer nada, e ficar chorando não ia resolver nada também. Voltei para fora no intuito de me despedir de meus entes queridos. Passei pelos meninos novamente e dei um beijo na bochecha de cada um. Percebi que dessa vez surtiu um efeito, pois eles colocaram a mão no lugar onde eu havia beijado. Aproximei-me da minha mãe e dei um beijo nela, sussurrei perto do seu ouvido; disse pra ela não se preocupar, que eu ficaria bem. Pedi que cuidasse de por mim, que ele iria precisar dela. Não sei dizer se ela me ouviu ou sentiu a minha presença. Ela continuou lá, chorando, e aquilo me partiu o coração. Dei um beijo no meu pai e falei para ele cuidar da minha mãe, e falei que ele teria que ser forte nessa hora. Dei mais uma olhada em volta e uma sensação ruim passava diante dos meus olhos. Tive vontade de chorar mais uma vez, mas me controlei. Em seguida, veio a parte mais difícil de tudo que eu já tive que enfrentar nessa vida. Despedir-me dele, do meu amor. Respirei fundo para tomar impulso e fui. Fui procurar a pessoa mais importante de toda a minha vida, e que seria pra sempre. Até depois da morte. Achei-o perto de um jardim, encostado numa árvore, olhando para o nada. Cheguei perto dele e o olhei bem, queria gravá-lo na minha mente para nunca mais esquecê-lo. Senti que a coragem queria me abandonar naquela hora, mas me mantive firme e disposta a fazer o que tinha que fazer. Aproximei-me mais dele, colando meu corpo no dele, apoiei minha cabeça em seu ombro e, com o pouco ar que me restava, disse:
- Me abrace, , só mais um pouco. - e ele, como se atendesse meu pedido, juntou os braços para se proteger do frio. Eu fiquei feliz porque, de alguma forma, ele me abraçou. E eu pude ver que uma lágrima caiu do meu rosto. Se eu pudesse, ficava para sempre ali, nos braços do meu amado. Eu o abracei mais forte ainda e dei um beijo nele. Nosso último beijo. Eu encontrei o amor que eu sabia que estava perdendo.
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precisou sair do meio do mar de gente que foi ao velório de sua namorada para prestar uma última homenagem. Assim que viu uma passagem livre, se pôs no caminho e andou sem saber ao certo aonde iria parar. Queria fugir, ficar sozinho. Estava começando a ficar difícil respirar e manter a postura de forte no meio de tantas pessoas o cumprimentando e prestando suas condolências.
Aquilo ainda soava como um pesadelo para ele, e não via a hora de acabar. Era difícil acreditar que nunca mais sentiria o cheiro de em seus lençóis, ou que não a ouviria mais reclamando do quão bagunceiro ele era. Andou, até que chegou numa parte do cemitério onde ficavam os jazigos particulares. Por mais que o ambiente parecesse sombrio e assustador, ali ele se sentiu em paz. Recostou-se numa árvore, pois suas pernas fraquejavam e ele precisava recobrar sua energia. A pouca que lhe restava. observava o olhar compenetrado no rosto de e sabia que ele estava perdido em pensamentos. Queria saber o quê, mas sentia que não tinha muito tempo e o abraçou forte. sentiu um leve arrepio por todo o corpo e cruzou os braços sobre o peito, a mente perdida na lembrança do seu primeiro encontro com .
Recordando de como nada saiu como o esperado, sorriu, imaginando, como diversas outras vezes fizera, se ela teria gostado dele caso seus planos ocorressem perfeitamente.
tinha planejado levar para um dos restaurantes mais caros de Londres. O rapaz planejara tudo com cuidado e minimalismo. Repassava o plano pela décima primeira vez enquanto colocava a barra da camisa para dentro da calça, como se não pudesse perder nenhum detalhe. E, de certa forma, aquilo o ajudava a se tranquilizar. Estava uma pilha de nervos quando entrou no carro e checou o cabelo no espelho retrovisor pela milésima vez. Tentava sair com a garota de seus sonhos fazia quase um mês, mas como era uma moça muito comprometida com os estudos e o trabalho no acervo de música no qual fazia estágio, nunca tinha espaço na agenda dela para um possível encontro dos dois. já começava a pensar que ela não estava interessada quando finalmente aceitou o convite e resolveu deixar os estudos de lado. Era sua única chance de impressioná-la e não podia desperdiçar.
Quando parou na frente da casa dela, teve que esfregar as mãos na calça diversas vezes para secar o suor. Nunca tinha se preocupado tanto em agradar uma mulher, mas era diferente. O que tinham era diferente. Há muito não podia ser ele mesmo perto de muitas pessoas, precisava pensar cem vezes antes de falar qualquer coisa, pois poderia ser mal compreendido, e quem sabe o que acabaria nas revistas? Com , desde o primeiro momento, sentiu-se confortável, e só reparou que conversavam todas as besteiras do mundo quando estava em casa. As coisas eram naturais com ela por perto e sabia dar valor quando encontrava algo muito bom.
Ele não sabia como agiria assim que ela abrisse a porta – se faria uma reverência, beijaria sua mão, ou apenas um aceno. Ela era refinada demais. Estava sempre cercada de formalidades e cerimônias. queria dar um tratamento que estivesse à altura dela. Decidiu por apenas dar dois beijinhos na bochecha, como amigos. Também estava preocupado em não parecer afobado demais, e assim, acabar assustando .
Tentou agir como se ela estivesse apenas bonita, mas ficou sem palavras quando abriu a porta. Percebeu que estava calado tempo demais quando ouviu a risada dela. Coçou a nuca, constrangido, e sorriu de volta. Estava perfeita, e enquanto ele estava ansioso e nervoso, ela parecia apenas feliz. Novamente encarou o dilema sobre como a guiaria para o carro - se estendia o braço ou pegava na sua mão. Por fim, optou por nenhum dos dois: colocou a mão na base das costas dela e a direcionou para onde estava estacionado.
Durante o caminho para o restaurante, conseguiu fazer com que ele relaxasse, contando histórias engraçadas e arrancando dele gargalhadas altas. Ele parou o carro na frente de um dos restaurantes mais chiques de Londres, o Espelette, e um manobrista pegou a chave para estacioná-lo. "Nossa!" foi a única coisa que ela conseguiu falar. sorriu enviesado, orgulhoso de si mesmo, e satisfeito com toda a trabalheira que tivera para conseguir uma reserva, que já mostrava ter valido a pena. O maître os recepcionou e pediu o nome da reserva. Quando deu seu nome e sobrenome, e recebeu como resposta que o mesmo não constava na lista, sentiu o sangue esvair-se do rosto. Como assim não estava na lista? Ele tinha falado com uma mulher dois dias antes que lhe garantira o lugar, e agora não estava na lista?
simplesmente não teve força e coragem para olhar para a bela moça ao seu lado. Sentiu-se envergonhado. E com a vergonha, veio a ira... Que ele despejou em cima do funcionário do restaurante. Como se atrevera a submetê-lo àquele tipo de situação? Ele bem que tentou não explodir, mas ao ver que não conseguiria de forma alguma contornar o tal maître, não teve outra alternativa a não ser proferir todos os palavrões que conhecia e até os que não sabia se existiam de fato. Só parou de distribuir xingamentos porque foi interrompido por um toque sutil de em suas costas, que o fez voltar a si. Quando percebeu, metade do restaurante estava boquiaberto por causa da gritaria. Em choque, ele caiu em si. Fizera tudo ir por água abaixo, assim ele pensou. era uma mulher educada, nunca mais aceitaria outro convite dele.
Percebeu que a encarava atordoado quando ouviu sua risada aumentar dois tons. Despertou do seu momento de descontrole, constrangido, agora ainda mais, porque a garota que tentava impressionar ria dele. "Ei" disse ela. "Está tudo bem, não precisa se irritar tanto só por um jantar, a gente encontra outro lugar. Sério, não tem problema algum, eu nem gosto muito de comida francesa." ela confessou e o rapaz levantou as sobrancelhas, surpreso. Estava tão preocupado em fazer tudo sair perfeito que tinha se esquecido do mais importante: descobrir qual era seu tipo de comida favorita. Ele assentiu um pouco menos furioso e lançou um último olhar letal para o maître antes de recolocar a mão na base das costas de e guiá-la para fora. "Quer comer o quê?" perguntou ele, muito mais decidido que antes a fazer que a noite funcionasse. Principalmente depois do vexame. "Comida indiana." ela respondeu radiante.
Decidiram então ir até um restaurante de comida indiana que conhecia. Não ficava muito longe dali e pensou que, deixando-a mais à vontade para escolher o destino culinário deles, poderia distraí-la, que faria a moça se esquecer de seu pequeno deslize anteriormente. E foi isso o que aconteceu. Durante o percurso, fez piadas do comportamento do rapaz – "Eu pensei que você fosse explodir. Sua cara estava toda vermelha!", ela disse fazendo gestos exagerados.
, numa mistura de vergonha e alívio, apenas ria. Um riso nervoso. Mas depois relaxou, quando viu que estava realmente se divertindo. Afinal, era essa a intenção desde o princípio, não?
Quando chegaram ao tal restaurante que indicara, pensou que os sufocos da noite tinham terminado. E foi o que pareceu. Durante o jantar, eles conversaram, riram e fizeram piadas um sobre o outro. já tinha até esquecido do nervosismo e do estresse que tivera no início da noite, para ele foi como se não tivesse passado por nada daquilo. Com era assim, ele tinha toda liberdade para ser o que quisesse. Ele se sentia calmo e eufórico ao mesmo tempo, mas de uma forma boa. Ela se encontrava da mesma maneira, se sentia bem por finalmente ter encontrado alguém com quem pudesse apenas relaxar. Alguém que se satisfizesse apenas só com a sua simples presença. Com tanta cobrança pela perfeição que ela sofria em seu meio social, ter encontrado foi como um presente de Deus. Assim ela pensava. Sentia-se arrependida por sempre ter dito não ao rapaz antes, mas, em contrapartida, estava em paz agora que eles estavam se conhecendo.
Durante o jantar, entre uma de muitas observações que fizera sobre o comportamento de , aos risos e prestes a abocanhar mais uma garfada, foi impedida de continuar o movimento, pois algo peculiar chamou sua atenção em sua comida: um fio de cabelo negro pendia do garfo, já com uma farta quantidade de Podi. Sua curiosidade a fez com que comprovasse o que ela pensava ser, e assim que puxou o fio, só conseguiu lançar um olhar incrédulo para o rapaz à sua frente. Na mesma hora, uma súbita onda de nojo lhe invadiu, trazendo a ânsia de vômito consigo. Ela não sabia como reagir àquilo, se prendia a respiração para não vomitar ou se simplesmente deixava a coisa toda rolar. Afinal, se ela achou um fio de cabelo na comida, mantê-la dentro de si era muito mais nojento. Constatou e viu que seria muito rude de sua parte golfar logo na frente de , que se empenhou tanto para fazer da noite um sucesso.
optou por segurar, então. Não queria arruinar a noite, apesar de ter parecido que já era o fim da mesma. Aquela coisa nojenta em sua comida a fizera perder o apetite total e ainda teve que ter muita força de vontade, pois mesmo com todo esforço para não vomitar na frente de , isso ameaçou acontecer por duas vezes.
achou que aquilo só podia ser alguma peça que estava tentando pregar nele, afinal, foi ela quem indicou o restaurante. Mas ao ver que ela estava a ponto de regurgitar o próprio jantar, entendeu que não era nenhum tipo de piada. Mentalmente, enquanto se levantava para acudir a moça, praguejou seu karma, pois mal as coisas estavam começando a melhorar e o inferno astral voltou com tudo para destruir o que estava se tornando um ótimo encontro.
Conforme ele abanava com o guardanapo na tentativa de fazê-la respirar melhor e não vomitar, girava a cabeça de um lado para o outro à procura do gerente ou de qualquer outro funcionário que pudesse lhe dar uma satisfação. Assim que viu o primeiro homem com o uniforme do restaurante, disparou um monte de impropérios e exclamações, enquanto gesticulava para mostrar que sua acompanhante não se encontrava bem. O garçom tentou acalmá-los, mais precisamente , que gritava, causando uma certa tensão entre os outros clientes. Vendo sobre o que se tratava, o garçom pediu que ele tentasse se acalmar, pois chamaria o gerente. E assim o fez. O gerente tentou de todas as formas remediar a situação: ofereceu uma refeição nova, isenção da conta e até vales de desconto para futuras refeições do casal. Mas nada adiantava para , nada do que ele pudesse oferecer resolveria o estrago. estava passando mal, aquilo significava o fim do encontro. E, pelo jeito, seria o primeiro e último deles. O rapaz ficava cada vez mais irritado ao pensar em todos os fatos que contribuíram para o fracasso da noite. Como ele não quis dar ouvidos ao gerente, este, por sua vez, também se enfezou e decidiu que não ia mais perder tempo com aqueles dois baderneiros. Antes que pudesse causar um alvoroço com os outros clientes, o gerente estalou os dedos, e em questão de segundos um homem com proporções gigantescas apareceu em seu encalço, e o gerente só precisou dizer duas palavras para que ele entendesse o que significava. De imediato o homem gigante, que era o segurança do estabelecimento, pôs-se a empurrar , que agora tentava inutilmente medir forças com ele. Pegou , que ainda estava meio mareada, pelo braço, e os encaminhou até a saída do restaurante, se posicionando na frente da mesma em seguida. Com um sorriso cínico no canto dos lábios, ele quis passar a mensagem de que não conseguiriam voltar para dentro do recinto, um aviso para desistirem de fazer cena. Ou pelo menos para , que continuava sem sucesso tentando empurrar o brutamontes à sua frente, afim de voltar lá e dar uns bons socos no gerente sem escrúpulos. Novamente, o toque suave em suas costas o tirou do transe hipnótico raivoso. Era , só podia ser ela. Ela já estava mais corada, com a postura firme e, mesmo que a confusão tivesse lhe deixado atordoada, ela mantinha um sorriso no rosto para . "Vamos, , deixe isso pra lá!" ela disse mostrando o sorriso que ele tanto admirava. Ela já estava melhor, pelo menos, queria aparentar. Ele lançou um último olhar ao segurança, que ainda estava parado, encarando-o, e pode sentir um leve puxão em seu braço, seguido de uma risada. Será que ela não perdia o bom humor nunca?! Ele se perguntou, enquanto deixava conduzi-lo, sentindo o riso dela contagiá-lo.
Não entendeu o movimento brusco que fizera, o fazendo parar de caminhar de imediato. Pensou que o enjoo tinha atingindo-a novamente, e que estava prestes a golfar, de fato. A dúvida em seu rosto brotou assim que olhou para a menina ao seu lado, que apertava sua mão e mantinha o olhar compenetrado em algo a sua frente. "Oh-oh" foi tudo o que ela conseguiu dizer, estática. Sem entender nada, girou o rosto em direção para o que fosse que mantinha a atenção de , e foi quando o choque lhe atingiu também.
Não era possível! Não podia estar acontecendo com ele, mais uma vez. Não! O que ele tinha feito para merecer aquilo?! Todas essas exclamações passaram pela mente de em uma fração de segundos. Só podia ser alguma miragem ou o efeito do estresse com o segurança, somado ao tempero forte da comida indiana que tinha lhe arrebatado. Percebeu que não poderia ser, pois estava tão petrificada quanto ele. Então era verdade... Seu carro estava sendo rebocado, bem na sua frente. Xingou seu karma novamente, não quis xingar Deus, pois achou que seria mais prudente de sua parte. Se sem ter feito nada Ele deixara todas essas coisas ruins acontecerem logo num dia importante, o que aconteceria se ele pecasse contra o Senhor? Decidiu culpar o destino, preferiu acreditar que era seu inferno astral. E como um reflexo - um pouco atrasado, por sinal -, o rapaz saiu em disparate atrás de seu carro, que estava sendo guinchado. Aos berros para o motorista do guincho, tentou chamar sua atenção, e por um momento pensou que tivesse conseguido, pois o motorista o viu pelo retrovisor. Mas sua esperança de não ter seu automóvel rebocado foi por água abaixo quando viu também pelo reflexo do retrovisor que tudo o que conseguiria do motorista seria um sorriso cínico no cantos dos lábios. "Por que todo mundo tem que dar esse maldito sorriso?!" pensou , ofegante, enquanto dava os últimos passos largos de sua corrida. Levou as mãos aos joelhos numa tentativa de descanso. Mas sobressaiu-se novamente assim que ouviu os saltos do sapato de estalando no concreto úmido pelo sereno. Ergueu-se, tentando manter a postura, agora teria que encarar o desfecho de seu encontro completamente arruinado. Provavelmente, ela riria da cara dele e diria o quanto ele é fracassado. Ou para tentar ter mais compaixão dele, diria que ele se esforçou, mas que ela não poderia continuar saindo com ele; já não tinha tempo para namoros, e um namoro tão conturbado assim estava fora de cogitação. Mas, para sua surpresa, não foi isso o que aconteceu. Ele deveria ter imaginando que a moça apenas lhe mostraria mais um de seus lindos sorrisos, já que ela não fugiu logo na primeira chance que tivera, logo depois do desentendimento com o maître do restaurante francês. E foi o que o fez; sorriu e, como quem quer deixar uma dica solta no ar, ela disse "Está uma bela noite para caminhar, não acha, ?" e deu um riso feliz que só ela sabia fazer. Por um momento, pensou que estava sonhando, não era possível alguém ser sempre tão doce e alegre assim, o tempo todo. Ou ela estava sob o uso de alguma medicação forte. A verdade é que ele poderia ficar ali, pensando sobre várias hipóteses sobre o porquê não perdia o bom humor e estava sempre sorridente, mas ele achou mais vantajoso apenas sorrir para a moça. E como quem entende o recado, estendeu o braço para a mesma se apoiar e, assim, começaram uma caminhada sob a luz do luar.
deixou propositalmente a mão de escorregar pelo seu braço e a agarrou com a sua, firme, entrelaçando os dedos. Ela olhou para ele carinhosamente, um sorriso enviesado dançando em seus lábios, e voltou a narrar a história. O rapaz sorriu satisfeito, porque apesar da noite arruinada e humilhante, a garota ainda estava ali, dando-lhe a mão e sorrindo para ele. Confirmou o que já sabia — ela era a mulher certa para ele. Gostava de por quem ele era e não pelo que tinha a oferecer. Afinal, naquela noite, não pôde oferecer nada. Ele não conseguia se preocupar com nada ao lado dela. O carro nem passava pela sua cabeça, nem a falta de respeito que se deparou em ambos os restaurantes. Se encontrava tão compenetrado no que a garota falava que o mundo inteiro parecia secundário. sentia-se do mesmo jeito. O clima entre eles era tão intenso que não ouviram o ronco da caminhonete se aproximando. virou o pescoço para trás quando a mesma encontrava-se três metros de distância. Tudo aconteceu extremamente rápido. Olhou para a enorme poça ao lado dele e da garota ao seu lado, então, para os sorrisos maliciosos dos passageiros da 4x4. Todos vestiam camisas do Manchester United, tinham os rostos pintados de vermelho – que deduziu ser sangue, já que hooligans sempre estavam metidos em brigas –, e gritavam coisas desconexas. A toda velocidade, o carro passou pela água e encharcou os dois com a água suja da chuva. gritou surpresa, mas já estava correndo atrás deles, xingando-os quando seu fôlego permitia, ameaçando-os de morte, ignorando a roupa suja e molhada. Alguns colocaram a cabeça para fora, outros quase o corpo inteiro, todos fazendo gestos obscenos e rindo da situação dos dois. estava ensandecido, mas parou quando o carro tomou uma distância considerável.
Derrotado, voltou bufando de encontro a , que esfregava a roupa tentando secá-la minimamente, e olhava para o rapaz com visível confusão. Agora era oficial: a noite estava estragada, sem retornos. Extremamente furioso e mal humorado, guiou a garota até sua casa, que não estava muito longe, sob um silêncio fúnebre desconfortável. Gostava de e era bem claro seu esforço para fazer com que tudo desse certo, mas o destino queria ver os dois separados, e quando isso acontecia, não havia nada que ninguém pudesse fazer. Ainda inconformado, mas resignado, parou ao lado dela quando chegaram à porta da garota e a encarou sem saber o que falar. Não adiantava pedir desculpas, e até o sorriso alegre que ela manteve a noite inteira havia sumido.
“Então... Boa noite.” Disse ele desanimado. o encarou com a testa franzida, um pouco chocada, e abaixou a cabeça.
“Não gostou do encontro?” a encarou sem entender. Ela sorriu. “Porque foi o melhor encontro da minha vida.” Então, como se fosse a coisa mais normal do mundo, caiu na gargalhada, recordando os melhores momentos da noite e deixando um bem confuso. O beijo que ele roubou dela foi intenso. estava tão feliz por não tê-la decepcionado que nem pensou em ser cauteloso, apenas expressou tudo o que sentia no momento. correspondeu ainda mais eufórica que ele, e os dois se separaram com os olhos brilhando e as bocas inchadas. Depois daquilo, resolveu escolher todos os locais que se encontrariam nas próximas vezes, e em todas elas dizia que tinha sido o melhor encontro de sua vida. Porque os melhores momentos eram sempre ao lado dele.
’s POV
Senti um raio de luz enorme pairar sobre mim e . Um clarão que me fez sentir aquecida e fez com que ele se afastasse de mim, desfazendo o nosso “abraço”. Foi quando percebi que estava na minha hora, eu precisava ir. E aquele clarão era a direção que deveria tomar para chegar ao meu destino. Olhei pela última vez o meu e percebi que ele abria um sorriso fraco e tocava os lábios. Sorri também, é quase que automático. Se vejo feliz, fico feliz também. Peguei a direção do clarão, estava pronta para o que viria, mas, antes, pude ouvir o amor da minha vida dizer:
- Onde? Onde será que você está, hein, meu amor? O Senhor te tirou de mim e por isso vou ter que me comportar. Porque só assim a verei de novo, um dia. Lá no céu. É pra lá que vão os anjos, então esse é o seu lugar... Meu anjo.
Oh where, oh where can my baby be?
(Oh, onde? Onde estará o meu amor?)
The Lord took her away from me.
(O senhor tirou-a de mim)
She's gone to heaven, so I've got to be good,
(Ela foi pro céu então, eu tenho que ser bonzinho,)
So I can see my baby when I leave this world.
(Assim, verei meu amor, quando deixar este mundo).
FIM
Nota da autora: Eu gostaria de agradecer à Daniela Coutinho, que me ajudou muito e me incentivou a reescrever a fic. Ela é foderosa, escreve bem pra cacete e eu me orgulho demais em dizer que ela é minha amiga. Sério gente, vocês não tem noção do quanto eu amo essa woman! <3
Eu gostaria de agradecer também à minha baixinha predileta; Thainá Coelho. Pois sem ela, eu nem teria conhecido McFly, quanto mais o mundo das fanfictions. Obrigada Nina, por tudo!
E um agradecimento muito especial pra Danie, que mesmo ocupada, se dipôs a betar LK. Obrigada mesmo!
Agora eu quero agradecer a vocês, leitoras que tiveram paciência pra ler a minha humilde fic. Muito obrigada! Caso vocês tenham lido a versão original, e acabaram de ler essa nova agora; saibam que vocês tem um lugar reservado no céu. HUAHUAHUAUHA Na moral, eu deveria ter sido banida da face da terra, quando cismei de publicar a primeira versão de LK! UHAUHAUHAHUAUAH Enfim, eu tinha 16 anos e muito tempo livre. Deu no que deu. Espero que tenham gostado. Ela significa muito pra mim, pois marcou um momento muito importante da minha vida. E se não gostarem, também não tem problema.
Bom, agora o resto é com vocês. Caixinha de comentários tá ali em baixo, vocês já sabem o que fazer né?! Obrigada novamente. Fiquem na paz e sejam gentis umas com as outras, suas lindas!
Beijo grande, Nathami.