01. Intro: What Am I To You?

Finalizada em: 03/03/2022

Capítulo Único

Furioso.
Era assim que ele se sentia.
Eles passaram meses juntos, quase um ano, e ela o jogava fora daquela maneira.
null se recusava a colocar um terno arrumado como o evento pedia: ele era quem era, aquela premiação juntaria vários nomes da música e socialites em geral, então não tinha a obrigação de se arrumar.
Um terno desalinhado, mostrando algumas de suas tatuagens nos braços e no peito, era a melhor opção que tinha. Os cabelos estavam perfeitamente bagunçados e ele fizera questão de levar a guitarra que tocaria na premiação em um case apoiado nos ombros.
Quando null viu null com outro cara na televisão – e mais: descobriu que estavam noivos – seu coração se estraçalhou e desabou no chão. Ele sentiu como se o próprio peito estivesse aberto e sangrando, enquanto seus olhos sangravam lágrimas. Não conseguia parar de chorar ao ver aquela cena – e não sabia se era de tristeza, amargor, raiva ou rancor.
Ela sumira da sua vida da mesma maneira que aparecera: como um relâmpago, dizimando tudo pelo caminho. Quando se conheceram, ele tinha certeza que aquele não podia ser um sentimento ruim – mas, ao perdê-la e vê-la com aquele cara, soube como algo bom podia se alterar de maneira tão repentina.
Portanto, naquela noite, ele não se importava quantas pessoas estariam assistindo, quem estaria presente ou se aquele relacionamento que tiveram durante meses fosse um segredo: null merecia satisfações e as tiraria na frente de todos, se necessário.
Respirando fundo de maneira resoluta, ele pegou o paletó, jogou-o sobre o ombro e correu até a limusine que o aguardava do lado de fora.

Dia 1
Dizer que a encontrou entre os fãs – com todas aquelas luzes, vozes e solos de guitarra estrondosos feitos por ninguém menos que ele – seria exagero. null mal conseguia enxergar a plateia, além de aproveitar as pausas para beber vários goles de água.
Então como ele conheceu null no meio do show?
Tudo fora programado, como sempre. Lá estava null descansando alguns segundos entre músicas e estava na hora e tentar algo novo com um lugar decididamente menor do que os outros nos quais ele se apresentara.
- Tenho uma pergunta pra fazer pra vocês...! – Ele anunciou no microfone, as mãos na cintura e um sorriso convencido, enquanto o suor escorria por seu pescoço e para dentro da camisa branca. – Alguém aqui sabe tocar uma das minhas músicas na guitarra?
Aquilo foi como um clique na cabeça de null.
Ela mal acreditava que ele perguntara aquilo. Trocou olhares com a amiga que se disponibilizou a ir ao show com ela e, em seguida, estendeu o braço no ar e começou a gritar.
- Eu! Sei quase todas! – null tentava gritar mais alto que o resto da plateia, mas não surtiu muito efeito.
- Ela! Você tem que chamar ela! – A amiga da moça apontava furiosamente, tentando chamar a atenção de null.
O que foi efetivo. No momento em que seus olhares se cruzaram, ambos imediatamente começaram a sorrir. A partir daquele momento, tudo que fizessem jamais teria volta.
- Você! – null apontou para null. – Sabe tocar quais?
- Praticamente todas! – Ela piscou de volta, fazendo-o sorrir abertamente.
Em seguida, null se abaixou na beira do palco e estendeu a mão para ela, segurando a guitarra na outra.
- Então vem cá! Quero que você toque uma comigo! – Ele a chamou com um gesto da mão, percebendo que ela precisava de um incentivo maior do que palavras para entender que precisava subir no palco.
- Qualquer uma que você quiser! – null respondeu sorrindo e segurando a mão de null.
Era incrível como a mão dela podia ser macia entre os dedos calejados e ásperos dele.
Com um impulso e gritos dos fãs, null subiu com dificuldades no palco. Uma das guitarras da coleção dele foi trazida, perfeitamente afinada para a música, e entregue a ela. null a observava com curiosidade e um sorriso um tanto convencido estampado nos lábios.
- Qualquer uma? Mesmo? – Ele quis se assegurar, fazendo-a lançar um olhar um tanto impaciente. Aquilo o fez rir.
- O quê? Você acha que eu não consigo?
Com essa pergunta, null mal esperou a resposta. Simplesmente achou que atitudes valiam mais do que palavras: testou as cordas da guitarra e começou a tocar um dos solos de null.
A plateia começou a gritar imediatamente. Os olhos dele a observavam, incrédulos, completamente em choque com a habilidade daquela mulher. A amiga de null começou a gritar como nunca, sabendo exatamente do que a amiga era capaz.
null tinha um brilho próprio e fogo na ponta dos dedos. Incrível como uma estrela cadente, com a presença de palco de um guitarrista das melhores bandas de rock. Um brilho repentino, queimando rápido e que logo ia se esvair.
null não demorou muito em começar a tocar junto com null. Aquilo a fez levantar os olhos da própria guitarra e sorrir ao encontrar os dele.
E aquilo foi o suficiente para fazer o coração de null bater mais rápido.
Quem era aquela mulher? Conforme as notas eram tocadas de maneira complementar – a banda fazendo de tudo para acompanhá-los no improviso, sendo que aquilo não estava nem um pouco programado – null se encontrava cada vez mais interessado em conhecê-la.
O que era para ser um simples momento de tocar com um dos fãs, virou algo completamente diferente. Ele nunca se sentira daquela maneira – podia dizer que estava enfeitiçado. Tinha certeza que ela valia o tempo dele.
- Vamos tocar de verdade agora? – null perguntou repentinamente, parando a música no meio do caminho.
E ela riu. Ele simplesmente adorou aquele som.
- Estava esperando você perguntar isso desde que subi aqui! – E null podia dizer que ela era tão convencida quanto ele. – Vai me dizer o que quer ou me pegar de surpresa, null?
- Acho que te avisar o que quero seria um insulto. – Piscando para ela, null imediatamente começou a tocar.
Estava testando null. Na cara dura.
Logo que ela ouviu a primeira nota, já procurou as seguintes no cabo da guitarra e, em poucos segundos, engatou a música e tocava como se fizessem aquilo todo dia.
null abriu um enorme sorriso, sem conseguir acreditar.
Conseguia se lembrar claramente de quando estava conversando com um amigo, uma semana antes, sobre amor.
"Você nunca vai namorar seriamente com alguém, null?" o amigo perguntara, bebendo um gole da terceira cerveja da noite. "A vida não pode esperar para sempre. Ter alguém ao seu lado ajuda em muita coisa".
"Ok. Sabe quando eu vou namorar?" null respondeu com uma risada de escárnio, mas não tinha nada além da mais pura verdade escorrendo das próprias palavras regadas a álcool. "Quando encontrar uma mulher que seja tão boa quanto eu, à minha altura. Que não fique me seguindo e pensando em me servir, sempre à minha sombra. Mas que caminhe comigo, lado a lado".
"E que saiba tocar guitarra que nem você?" o amigo perguntou de brincadeira, com uma boa risada.
"Seria algo ótimo" null riu de volta.
"Então você vai ficar sozinho para sempre!" o amigo respondera e ambos começaram a rir escandalosamente de volta, sentindo as pernas formigando com o álcool.
E lá estava null, ao lado dele, sem ser ofuscada pela personalidade naturalmente forte de null e tocando guitarra tão bem quanto ele – sem errar uma nota sequer.
Foi naquele momento, observando-a com os dedos correndo pelas cordas de metal da guitarra e a luz do palco beijando sua pele que null decidira conhecer melhor aquela mulher tão misteriosa para ele naquele momento.
E jamais viria a se arrepender daquela decisão.

- Você costuma chamar todas as mulheres que tocam guitarra com você para jantar?
null tomou um susto com aquela voz atrás dele que quase derrubou o celular no chão. Teve que fazer um malabarismo extremamente habilidoso para que o aparelho quase caísse dentro da taça de vinho branco e se estatelasse sobre a mesa – por sorte não quebrando nem derrubando nada.
Quando olhou para null, a mulher somente ria de maneira controlada, claramente tentando ser educada.
Após o show, quando foi pegar a guitarra de volta, null pediu para que ela jantasse no hotel com ele. Sendo quem era, null conseguiu que fechassem o restaurante do lugar após o show – para que eles pudessem ter toda a privacidade que quisessem para conversar e se conhecer melhor.
E, claro, não tinha como ele ser mais desengonçado.
- Desculpe por isso. – null comentou com uma risada um tanto sem jeito. – E você é a primeira que toca comigo em um show, então a resposta pra sua pergunta é não.
Ele sorriu, fazendo com que as bochechas de null corassem levemente. Tentando esconder entre os cabelos, ela aproveitou o momento para se acomodar na cadeira que a aguardava do outro lado da mesa. Ele não demorou em se sentar à frente dela.
- Seu nome é null, não?
- Isso. – A moça deu um sorriso sagaz. – Ainda bem que você se lembrou antes do jantar.
- Nós acabamos de nos conhecer, dá um desconto! – Ele levou a taça de vinho aos lábios. Por algum motivo, ela o estava fazendo se comportar que nem um desengonçado que nunca vira uma mulher na frente.
Ele. null. Músico mundialmente conhecido. Com estilo de tocar guitarra estudado por diversos músicos. Comportando-se como um pastel na frente daquela mulher especificamente.
- Eu fiquei muito feliz que você me chamou para tocar no palco hoje! – null mudou de assunto, claramente dando o desconto que ele pedira. – Aprendi a tocar guitarra com as suas músicas, então foi uma satisfação pessoal muito grande.
- Ah, sim, você toca muito bem! Está fazendo aula há quanto tempo?
- Nunca fiz aula. – null deu de ombros, fazendo-o ficar boquiaberto imediatamente. – Música não é muito bem vista na minha família. Então eu comprei uma guitarra e aprendi a tocar sozinha.
- Nossa! Isso é incrível. – null teve que admitir. De fato, null ficava cada vez mais intrigante. – Aprendeu assistindo Youtube?
- Isso e também amando as suas músicas. – Ela deu um pequeno sorriso envergonhado, fazendo-o rir de uma maneira um tanto desconcertada.
O que estava acontecendo com ele naquela noite?!
- Sinceramente, fico lisonjeado... Mas como pode música não ser bem vista?
- É a minha vida. Há várias coisas que você irá perguntar "como pode"? – null riu brevemente, tomando um gole de vinho. – Não é possível que a sua vida seja tão fácil assim.
- Claro que não. Nunca foi. – null respondeu com uma risada seca enquanto um garçom silencioso deixava uma seleção de frutas sobre a mesa, retirando-se de maneira igualmente silenciosa. Quando ele viu a sobrancelha erguida de null, quase bateu na própria testa. – Ah, me desculpe por isso! Normalmente não consigo comer muito depois dos shows, vou chamar o garçom para que...
- Não precisa! – E null repousou a mão sobre a de null. – Essas frutas são ótimas, também não estou com muita fome.
Ele se sentiu besta por pensar consigo mesmo que parecia que havia faíscas nos dedos dela.
- Certeza? Eu te convidei para jantar...
- E esse será o nosso jantar. Qual o problema disso? – A moça perguntou com uma piscadela e jogou uma pequena uva dentro da boca, saboreando a fruta como nunca.
- Então... – null sorriu, claramente tentando focar em outro assunto. – Ainda vai se esquivar de mim se eu perguntar novamente sobre a sua vida?
- Depende... – null suspirou fingindo desinteresse, porém lançou um olhar significativo para ele. – Por que você teria tanto interesse assim em saber sobre a minha vida?
- Porque você é diferente de tudo que eu já vi antes.
Nem eles entenderam direito o que aconteceu em seguida.
Só sabiam que em poucos segundos estavam no quarto de null, desesperadamente tentando arrancar as roupas do outro entre beijos famintos como o próprio fogo. null não era frágil, mas tão forte quanto ele – e não de força física, mas de vontade interna. Aquilo o deixava cada vez mais interessado, cada vez com mais vontade de fazê-la gemer entre os lábios dele. null fora com a plena consciência de que aquela chama duraria somente aquela noite e os dois nunca mais iriam se ver.
E, sinceramente, aquilo até a consolava. Era exatamente o que ela queria e precisava.
Mas algo de errado aconteceu. Talvez a maneira como ele a abraçara na manhã do dia seguinte, ou como se acomodaram na banheira juntos e null ficou cantarolando uma música qualquer. null nunca soube exatamente o momento em que a fez baixar a guarda e passar seu número de celular para ele.

Dia 27
- Você já tentou essa escala, mas em um tom abaixo?
A voz de null ecoou do banheiro. null continuou tocando e sorriu, sabendo que deveria esperar um comentário do tipo.
- Não. Acha que ficaria bom?
- Acho que vale a pena tentar. – Dizendo isso, ela surgiu do banheiro, secando os cabelos com a toalha felpuda do hotel e vestindo somente a lingerie preta daquela noite.
null teve que se concentrar bastante para manter o foco na própria música e fazer o que null sugerira.
Aquele era um dia comum para eles: a fim de evitar os fãs e as polêmicas com a mídia, passavam o tempo em um quarto de hotel caro o suficiente para assegurar discrição e momentos reservados. Era o mais próximo que poderiam ter de um relacionamento normal.
Não esperavam que aquilo fosse se tornar algo a mais, porém foi exatamente o que ocorreu. Após se encontrarem por volta de sete vezes, resolveram parar de contar: referiam-se somente "àquela da chuva", "àquela da lanchonete", "àquela da maçã" e assim por diante.
null parou em frente à null, as mãos na cintura. Ele tocou o que ela sugerira, porém os dois imediatamente torceram os narizes: a teoria soava muito melhor do que a prática.
- Espera. Acho que sei o que tá errado...! – Dizendo isso, null vasculhou rapidamente o quarto, encontrou uma das guitarras de null e se sentou em uma poltrona próxima, começando a dedilhar a própria sugestão. – Agora faz o que você estava fazendo antes!
Esperando alguns segundos para entrar no momento certo, null começou a tocar. E a conjunção de sons fez com que ambos se encarassem e começassem a sorrir.
- Você tem um ouvido incrível, eu já disse isso? – Ele perguntou rindo e deixando a guitarra em cima da cama. As bochechas de null coravam levemente enquanto ela somente abraçava o próprio instrumento.
- Umas dez vezes, provavelmente. – Mas, apesar de tudo, ela sorria.
- Tenho certeza que vou compor minhas melhores músicas com você, minha musa.
null nem deu tempo para que null respondesse: segurou com uma mão em cada apoio de braço da poltrona e procurou os lábios dela com os próprios.
Uma pequena luz vermelha se acendeu no fundo da mente de null. Mas aqueles lábios, aquele sorriso, aquela genuinidade... null era bom demais para que ela pedisse que ele parasse. Aceitando o próprio destino com um suspiro, null largou a guitarra no próprio colo e puxou null para mais perto, intensificando o beijo. Separaram-se somente quando precisaram recobrar o ar.
- Tenho mais três músicas para concluir para o próximo álbum... Você me ajuda? – Ele sussurrou como se aquelas palavras fossem as mais preciosas do mundo.
- Sempre que você quiser.
null sabia que aquelas eram as palavras erradas para se dizer. Mas aquele beijo era bom demais para ser evitado.

Dia 53
- null, onde estamos indo? – null perguntou suspirando enquanto ele segurava a mão dela e a guiava por uma rua escura.
- Em um lugar que você vai amar. Tenha paciência, querida. – Ele pediu pela décima quinta vez, mas rindo da impaciência dela.
- Do jeito que você está sendo cuidadoso, acho que é o lugar em que vai me matar e revelar ser um serial killer sem coração. – Ela respondeu de maneira entediada, fazendo-o rir mais ainda.
- Só estou evitando problemas com a mídia, algo que sei que você entende. – Com isso, null abriu o que claramente era a porta de trás de uma construção.
null observou com uma sobrancelha erguida, mas entrou em seguida: era melhor do que esperar na rua.
E só aí viu o logotipo da gravadora dele.
O que a fez ficar boquiaberta.
- Jonnie, você me trouxe...?!
- Sim. Vamos! – Mas ele não a deixou terminar de surtar: simplesmente segurou a mão dela novamente e praticamente saiu correndo para onde era o estúdio dele.
- Você tá louco?! – Apesar da pergunta, null não conseguia conter as risadas. – Estamos tentando evitar a mídia a todo custo e você me dá uma dessas?!
- Eu preciso que você escute uma coisa, aqui é o melhor lugar! – E null pouco se importava. Afinal, estava apaixonado demais para voltar atrás.
Não demorou muito para encontrarem o tal estúdio e se trancarem lá dentro. Quando null se virou novamente para null, viu como ela estava deslumbrada com todos os aparelhos de mixagem e gravação, além dos instrumentos.
- Gostou? – Ele cruzou os braços e deu um sorriso convencido, mas adorava a expressão no rosto dela.
- Se eu gostei? null, eu amei! – null começou a rir consigo mesma. – Você é a melhor pessoa do mundo!
Aquilo foi suficiente para desarmar todo o lado convencido e metido dele, fazendo uma onda vermelha colorir as bochechas dele e um sorriso levemente sem graça pintar seus lábios.
- Então, eu te trouxe aqui, porque preciso de uma ajuda... – null resolveu mudar de assunto antes que ela percebesse. Mas obviamente null já tinha notado. – Tem uma música que estou escrevendo para o próximo álbum...
Ele nem terminou a frase, somente se sentou na cadeira de rodinhas e ligou o computador, procurando a faixa e colocando para tocar. Ela imediatamente se conectou na música, apoiando à mesa e prestando atenção à melodia.
- É muito boa, null. Ela é ótima... – null ainda estava pensando, mas precisava dizer que tinha adorado, pois realmente era uma música ótima.
- Então, mas tá faltando alguma coisa...
- Sim, tá mesmo, mas não sei...
- Falta a sua voz.
A declaração de null fez com que ela desligasse e finalmente voltasse a prestar atenção nele, encarando-o de maneira meio perplexa.
- Realmente, uma voz feminina ficaria muito boa, mas não acho que...
- Não é uma voz feminina qualquer, null. É a sua. – E ele largou o mouse do computador para segurar as mãos dela. – Essa música só vai funcionar do jeito que quero que funcione com a sua voz. Conheço muitas cantoras boas, mas nenhuma com o seu timbre e esse seu jeito de cantar.
- Não sei se é uma boa idéia...
- Porque a música não é bem vista na sua família, é isso? – null, até aquele momento, não tinha entendido aquilo. null tinha um dom absurdo para música, um ouvido que ele não vira em nenhum outro músico antes. Mas lá estava ela, tendo que reprimir tudo e se soltando somente com ele. – Se você quiser, deixo todos os créditos de lado. Você vai ser uma mulher misteriosa na minha música, que ninguém nunca vai saber a identidade. Eu posso falar que a sua voz veio de um banco de som e é isso. Mas preciso que você cante pra mim, null. Por favor.
A moça passou alguns momentos em silêncio. Aquilo era perigoso demais. Aquele relacionamento todo era perigoso para ela, mas estar presente em uma das músicas de null era realmente um passo a mais. Era um caminho completamente sem volta, algo que ela não poderia esconder. A voz dela estaria junto com a dele em todas as rádios do país...
E ninguém ia saber quem ela era.
Algo sobre aquilo a fez sorrir. Era como se estivessem admitindo ao mundo o que viveram nos últimos dias, mas sem que ninguém soubesse. Era perfeito.
- Ok. Mas você tem que me prometer que não vai me creditar.
null a puxou para um beijo rápido e forte.
- Eu te amo, null. – Ele sorriu em seguida à declaração e pôs-se a arrumar o estúdio para gravarem.
As pernas dela formigaram. Ouvir null admitindo aquilo em alto e bom som fez com que algo nela se acendesse. O peito de null foi tomado por um calor que ela nunca sentira antes. A mulher sentiu como se nada no mundo pudesse derrubá-los, como se pudesse passar o restante da eternidade ao lado dele.
- Pronto, a sala está preparada! Vamos lá? – null estendeu a mão para ela, no que null segurou com um sorriso.
Ele explicou como tudo funcionava, colocou o fone de ouvido cuidadosamente na cabeça dela e cantou a música algumas vezes. null, com o auxílio da letra no celular dele, pegou a melodia rapidamente e, após três passagens, já sabia exatamente o que tinha que fazer. null deixou a salinha e se manteve do outro lado do vidro, dando o ok para que ela começasse a cantar.
Ele nem tinha percebido que falara em alto e bom som que a amava. Somente quando começou a arrumar as coisas e viu null em seu cantinho, sorrindo como se fosse uma adolescente envergonhada, era que percebera o que tinha feito. No momento, queria bater em si mesmo, mas, depois de analisar a reação dela com mais calma, viu que não tinha feito nenhum mal. E lá, observando-a cantando a música que pedira, tinha mais certeza de que a amava.
- Hmmm, null, pode tentar de novo? – null perguntou logo que ela terminou, apertando o botão que possibilitava a comunicação entre os dois. – Já ficou assim, mas acho que você ainda não se soltou o suficiente.
- Não estou acostumada a cantar assim, null, você sabe. – null deu uma breve risada. – A primeira vez que cantei livremente foi na sua frente outro dia e, pra ser bem sincera, não sei por que fiz aquilo.
- E eu fico muito feliz que você tenha se sentido confortável o suficiente para cantar daquele jeito. – Ela podia ouvir o sorriso na voz dele. – Preciso que você cante daquela maneira de novo. Quero guardar a sua voz, deixa eu fazer isso, por favor?
null deu um pequeno sorriso antes de confirmar com a cabeça e voltar a cantar. Tentou mais uma, duas, três vezes, mas ela mesma não estava contente com o resultado. Até um momento que fechou os olhos e tentou se lembrar do que sentiu quando cantou na frente de null sem se importar com mais nada. E isso fez com que a gravação ficasse simplesmente excelente.
- E aí? – Ela perguntou logo que deixou a sala e o encontrou já mixando na faixa da música que estivera trabalhando nos últimos dias. – Como ficou?
- Sinceramente? Perfeita. – null respondeu sorrindo, fazendo os últimos ajustes enquanto null o abraçava por trás e se debruçava na cadeira para que o rosto de ambos ficasse da mesma altura. – Posso saber no que a senhorita pensou para se soltar desse jeito?
- No quanto eu te amo, null.
Nenhum dos dois falou mais nada. Simplesmente sorriram e terminaram de mixar a melhor música que null já tinha feito.

Dia 85
null sumira.
Não era a primeira vez que fazia aquilo e null já começava a ficar incomodado com aquele costume dela.
Fazia uma semana que ela não entrava em contato e, da vez anterior, desaparecera por quase duas semanas e meia.
Ele não sabia se ela tinha sofrido um acidente, se algo acontecera com algum parente, se estava doente ou simplesmente não queria mais a companhia dele. null simplesmente desaparecia do mapa e retornava, dias depois, com um sorriso no rosto e conversando como se nada tivesse acontecido.
Ele não entendia.
Mas ela nunca tocava no assunto. Simplesmente continuava a vida normalmente com null, mas sempre parecia que os sentimentos de ambos ficavam cada vez mais fortes após esses períodos de hiato.
Porém, durante tais períodos, null ficava exatamente da maneira como se encontrava: desolado em um mundo cinza de sons monótonos.

Dia 102
- null, a sua mulher é um gênio. Vou roubá-la para mim.
null ficara fora da sala de gravação por, literalmente, quinze minutos.
Antes disso, ele tivera a brilhante idéia de apresentar null – que reapareceu como se nada tivesse acontecido – a um de seus amigos e produtores de quase todas as suas músicas, JP.
Sim. Era assim que o amigo se autonomeava e ai de quem não o chamasse daquela maneira.
- Não estou brincando, o ouvido dela é de outro mundo... – JP estava realmente impressionado, apesar da expressão impassível de sempre. – Ela compôs um acompanhamento para a sua guitarra solo na faixa 5724P, quer ouvir?
- Sabe que sempre fico me perguntando de onde vocês tiram os nomes para as faixas demos... – null cruzou os braços, observando o computador.
- Não é nada pessoal. – JP deu de ombros, procurando a música. – Eu normalmente digito qualquer coisa.
- Eu coloco em ordem. – null se aproximou dos dois, quase se colocando entre null e JP. – Sou mais organizado.
Mas conseguiu se controlar: aquilo seria muito infantil de se fazer.
- E passa mais tempo sem fazer nada também... – JP resmungou, fazendo-os rir.
- Mas não teria uma maneira melhor de fazer isso? Já com um nome provisório, talvez?
- Eu sei o que você está fazendo. – null anunciou repentinamente, observando-a com os olhos semicerrados. JP e null somente olharam para ele, as sobrancelhas erguidas. – Você tá tentando nos distrair pra que o JP esqueça de me mostrar a música. Que feio, null.
- Nossa. Eu estou me sentindo tapeado. – JP complementou com a mesma expressão de sempre. Na verdade, null achava que o amigo não tinha outra expressão a não ser aquela de paisagem.
- E se eu estiver? Qual o problema? – null cruzou os braços, tentando não parecer incomodada que null percebera aquilo.
Mas claramente estava incomodada.
- A sua música é muito maior do que essa vergonha toda. Esquece isso, mulher. – null balançou a cabeça, dando um beijo rápido na testa dela e voltando a atenção para o computador. JP deu uma breve risada antes de voltar à missão anterior. – O que foi?
- Ela é música. – JP finalmente tinha um esboço de sorriso no canto do lábio. – É por isso que você se apaixonou por ela.
Dizendo isso, a música que queriam ouvir começou a ecoar pelo estúdio, tocada por meio do computador. A parte que null escrevera aparecia claramente, porém combinava tão bem com a parte de null que, se apagasse a dela, agora a dele não teria mais tanto impacto.
- E por que eu me apaixonei por ele, JP? – null perguntou com um breve sorriso nos lábios, pronta para já não levar a resposta dele a sério.
- Porque ele é liberdade. – JP deu de ombros e lá estavam null e null completamente pasmos com a facilidade que o amigo tinha para lê-los tão bem.

Dia 141
Um. Mês.
Nenhuma mensagem.
Nenhum sinal de vida.
null lançou o álbum, fez as promoções, respondeu às perguntas dos fãs. Enviou mensagens para null. Foi em programas de televisão, apresentou as novas músicas em rede nacional, não revelou a identidade da guitarra de apoio e segunda voz. Não obteve nenhuma resposta. Começou a delinear clipes, escolheu as músicas que seriam gravadas, discutiu ideias e mais ideias com os times responsáveis.
null: nenhuma mensagem nova.
Ele encarava o aparelho de celular, incrédulo.
A luz azul da tela brilhava na noite negra e vazia do quarto de hotel.
A cama era mais fria sem a presença dela, as noites mais insuportáveis, o barulho dentro da cabeça dele era incessante. null lhe dava mais paz de espírito, conversava, enchia a vida dele de música. Ela era toda a felicidade e inspiração de null, todas as cores e sons noite adentro.
Sem ela, tudo era cinza.
Por que null fazia aquilo com ele? Onde estaria? Podia estar machucada, precisando de ajuda, ou traindo-o com outro. O relacionamento deles ficara muito mais sério para não se cobrarem daquela maneira – apesar de que null sempre sentia uma pontada de culpa e raiva ao pensar sobre ela daquele jeito. Acreditava dentro de si que null merecia mais confiança, ainda mais depois do tempo que passaram juntos...
Mas null era humano. Não conseguia deixar sentimentos mundanos como ciúmes de lado.
Transtornado pelos próprios pensamentos e sentindo-se um ser humano horrível, null se levantou da cama, bagunçando os próprios cabelos, em um claro gesto de desespero. O que fazer com aquele aperto em seu coração? Com aquela agonia que o corroia por dentro e fazia com que ele não conseguisse respirar direito?
Ele tinha plena noção do que null significava em sua vida. Mas o que null significava na vida dela?
- Ah, mas que merda! – E o celular foi atirado na parede mais próxima, estilhaçando-se em pedaços de diversos tamanhos.
Perturbado demais para qualquer tipo de atitude normal, null fez o que para ela era o mais lógico no momento: pegou a guitarra, um pedaço de papel, uma caneta, sentou-se na cama e começou a compor.
Incessantemente.

Dia 178
As visitas de null eram cada vez mais escassas.
Portanto, quando ela estava de volta no quarto de hotel, null dava prioridade para passar seu tempo com null. Não importava o que estivesse acontecendo ou qual responsabilidade tinha: nesses dias, seu único objetivo era aproveitar a presença dela.
- Desculpa. – A voz da moça ecoou pelo quarto como uma nota cristalina de piano.
Os dois já estavam aconchegados debaixo das cobertas, a luz da lua tocando a pele nua das costas de null e das pernas de null. Ela se encontrava com a cabeça no peito dele, sentindo o calor dele contra o rosto enquanto null afagava seus cabelos. Ele simplesmente ergueu uma sobrancelha, tentando ver a expressão no rosto de null apesar das luzes apagadas.
- Por quê?
- Por sumir desse jeito... – E null suspirou, fechando os olhos. – Minha vida é muito mais complicada do que parece. Não gosto de falar dela quando estou com você, porque gosto de esquecer... Não quero atrapalhar nossos momentos com coisas conflitantes, pois são meus dias de alegria em meio ao caos que tudo normalmente é. Você me conhece como eu sou de verdade, não como sou obrigada a ser... E pouca gente me conhece assim, acho... Se as pessoas que tenho que lidar no meu dia a dia nos vissem juntos, já iríamos gerar todo tipo de fofoca. Seríamos dois hereges contra a sociedade...
- Ei... Relaxa, null. – Dizendo isso, ele bateu de leve no nariz dela com o dedo indicador. – Não precisa se desculpar de mim. Eu também tenho uma vida complicada com a fama e a mídia. Sei que não sou o homem ideal para muitas famílias ou para muitas pessoas da sociedade em geral. Mas, se precisar, eu sempre serei seu monstrinho de bolso que vai sair mordendo todo mundo que resolver falar mal da gente, então não se preocupe.
null imediatamente começou a rir do comentário de null, fazendo-o sorrir ao vê-la tão feliz. Ele até conseguia esquecer toda a agonia que sentira dias antes.
- Você é o meu homem ideal... – Dizendo isso, null deu um beijo demorado nos lábios de null, separando-se o suficiente para continuar tocando a boca dele enquanto falava. – E isso já é mais que suficiente, meu monstrinho de bolso.
Abraçando-a, null esperava que null nunca saísse de seus braços.

Dia 211
null já sentia falta de null ao seu lado, mas decidira se controlar.
Nada de quebrar celulares daquela vez. Ele até deixara o aparelho longe enquanto tirava a blusa e se preparava para tomar banho. Ligou a televisão para ver se conseguia se distrair de seus pensamentos e não se ocupar em contar quando foi a última vez que a vira.
Dezessete dias.
Sim, ele estava contando. Por isso a televisão ligada. null precisava se distrair.
Enquanto tirava o cinto, uma notícia inútil captou a atenção dele: o filho de um dos maiores empresários do país anunciara o noivado com a filha de outro grande empresário nacional. null não conseguia ver a novidade e nem entender a animação das pessoas, afinal todos sabiam que aquela era uma jogada estratégica para aumentar o valor das ações das empresas no mercado e deixá-los cada vez mais ricos. Aqueles dois provavelmente nem se amavam...
null.
A mulher na televisão, de braços dados com o filho do empresário, a filha que se casaria e anunciou noivado com aquele cara... Era ela. A sua null.
null não conseguia acreditar.
Sem reação alguma, ele ficou encarando a televisão.
Segundo por segundo.
Minuto por minuto.
Quando o torpor passou, chegou a dor.
Parecia que null tinha enfiado mão dentro do peito de null e arrancado seu coração fora, deixando-o para sangrar sozinho no chão gelado da sua enorme casa silenciosa e vazia.
As lágrimas começaram a escorrer.
null se ajoelhou, mal podendo definir os sentimentos em uma coisa só.
Acometido por uma dor de cabeça incessante, ele ficou lá, somente chorando até que suas lágrimas se secassem sozinhas – pois não havia mais ninguém junto com ele.
null perdeu a noção de tempo e se limitou a passar o resto da noite chorando a morte do amor que ele achara que poderia durar toda a vida.

Dia 232
- null...?
A voz de null soou tentativa no quarto de hotel enquanto ela entrava cuidadosamente.
Aquele lugar estava uma bagunça.
Havia folhas e folhas de papel rabiscado com letras e composições musicais por todos os lados – lisas, em pilhas, amassadas em bolinhas, aviões, picotadas, em cima de móveis, no chão... A maior variedade de músicas interminadas que poderia existir no mundo.
null se levantou da cama e parou em frente a null, apoiando a guitarra no chão.
Os dois se encararam sem palavras durante um bom minuto – o olhar repreensivo de ele era o suficiente para que ela entendesse o que null estava sentindo.
- Eu ia te contar...
- Ia? – Ele perguntou em seguida com uma risada de escárnio, mal deixando que ela completasse a frase. – Teria sido melhor. Poderíamos ter terminado para que eu não atrapalhasse a sua vidinha perfeita.
- Você não atrapalhou nada, null. – null suspirou, erguendo a cabeça. Ele tinha todo o direito de estar bravo, mas não podia descontar nela enquanto não ouvisse a história completa. – Vai me deixar falar?
- E se eu não quiser? Afinal, tudo que você fez até agora foi não me contar nada da sua vida! Eu não sei nada sobre você!
- Você não sabe o que é inútil! Já disse milhões de vezes que você me conhece como sou de verdade! Antes de me julgar, deveria sentar e ouvir o que tenho para dizer!
- Você devia ter feito isso antes de anunciar seu casamento para o país todo com um cara que não sou eu! Por um acaso ele...
- Se você for perguntar se ele beija tão bem quanto você ou é tão bom de cama, nem termine de falar. Se não for me deixar falar, não pode me fazer uma pergunta dessas.
- Mas você pode me descartar que nem lixo então?
- Eu não te descartei, null. Nunca descartaria.
- Ah, é? Então me diz, null: o que eu sou para você? – null apoiou a guitarra no móvel mais próximo e cuspia as palavras, finalmente liberando toda a raiva que sentira dentro de si nos últimos dias. – Hein? O seu romance de livrinho de romance para contar pra todas as suas amigas ricas?! O músico rebelde que você passa noites em segredo?! O que eu sou para você, null?!
- Você é a minha vida real, seu idiota! – E finalmente a moça começou a derramar lágrimas. null até ficou um pouco chocado com aquela reação. – Mas você está tão absorto no seu próprio sofrimento que não abre os olhos para o que está acontecendo com os outros! Se quer acreditar nas próprias mentiras que inventou para se consolar, à vontade... Você tem meu número de celular. Quando quiser conversar como dois adultos e não como um casal de adolescentes chateados com o outro, me avise. Você sempre foi a minha vida real e eu queria que fosse para sempre, mas pelo visto estamos em páginas diferentes.
null nem deu tempo para que ele pensasse: simplesmente virou as costas e foi embora.
null ficou encarando a porta do quarto sem entender nada. Como assim ele era a vida real dela? Aquilo não fazia o menor sentido.

Atualmente
Dentro da limusine, a mão de null coçava para enviar uma mensagem para null.
Desde aquela briga, não falara mais com ela.
null continuou com os preparativos do casamento e dentro de três meses, teria outro sobrenome. Ela aparecia nas revistas de fofoca com um grande sorriso no rosto, sempre acompanhada do charmoso noivo que a carregava para lá e para cá como um chaveiro.
Aquilo fazia com que null sentisse fogo dentro do próprio estômago prestes a escapar pela boca: null não era o tipo de mulher troféu, um chaveirinho bonito para o cara ficar esfregando na cara dos amigos. Ela era o tipo de mulher para se orgulhar, para se caminhar lado a lado, como igual. Ela era independente e frágil ao mesmo tempo, delicada e forte, com a determinação de um exército.
null era a Música no corpo de uma pessoa.
E lá estava ela, submetendo-se a ser um simples troféu, por motivos que escapavam a compreensão de null. Aquilo o irritava em um nível quase inimaginável.
Logo que a porta do carro se abriu ele teve que guardar o celular e sorrir para os flashes. null acenou simpaticamente, carregando a guitarra no ombro e entrando no teatro da premiação o mais rápido possível.
Conversou com alguns conhecidos, bebeu alguns copos de whisky e aguardou. Quando notou um burburinho e a ação intensificada dos fotógrafos, sabia que ela tinha chegado.
E, de fato, null estava maravilhosa. Usava um vestido branco, longo, decorado por diversos cristais. Parecia um diamante, claramente ofuscando o noivo que a ostentava como um prêmio.
null aguardou até que a ação dos fotógrafos e pessoas interessadas no casamento diminuísse. Perdeu os dois durante um tempo, porém logo os encontrou novamente, em um canto que podia dizer que era até mais escondido do resto da multidão.
- Me. Solta. – null ouviu null dizendo de maneira seca e categórica. Ao ouvir essa frase, tomou cuidado para que eles não notassem que ele estava por perto. – Você está me machucando. Seria um escândalo para a mídia ter hematomas dos seus dedos no meu braço.
- Então você trate de não sair por aí sem mim. Temos que fazer a nossa parte para fazer com que acreditem que o casamento é de verdade. – O noivo respondeu de maneira ríspida, largando o braço de null. null tinha vontade de ir até lá dar um soco na cara daquele infeliz. – Você vai ficar comigo durante a premiação.
- Primeiro: você não manda em mim. Eu não sou sua propriedade e, por mais que acredite o contrário, você não me comprou em uma feira. – E ela começou a ajeitar o vestido enquanto falava, fazendo null sorrir com aquelas palavras. – Segundo: eu faço o que eu quiser, converso com quem eu quiser e vou para onde quiser. Isso não indica que nosso "belo casamento" não é real: indica que somos pessoas normais que conseguem conviver bem entre si. Vê se cresce.
- Ah, chega... Você fala demais. – Ele rolou os olhos, já começando a andar. – Faz o que quiser. Mas vem me encontrar em cinco minutos ou nós vamos embora pra resolver isso em casa. Talvez eu possa chamar nossos pais para ver o que eles acham disso.
Sendo assim, o homem voltou para a concentração de pessoas, já sorrindo e conversando com algumas que encontrou no caminho.
- Aprendiz de Draco Malfoy... – null rolou os olhos e se pôs em direção ao local em que as pessoas conversavam, voltando para os lugares menos reservados da premiação. – "Vou contar tudo para o meu pai"!
null riu, lembrando-se de como sentira falta do humor de null.
Com as memórias de tudo que passaram nos últimos meses e a comprovação de que ela estava prestes a se casar com um idiota que não a respeitava e a via como uma simples mercadoria, null resolveu jogar toda a lógica pra o alto e fazer o que o coração pedia – ignorando todas as pessoas que estavam em volta.
Assim que se aproximou de null, segurou a mão dela e a fez virar para que ficasse frente a frente com ele.
Logo que sentiu aquele toque entre seus dedos, null sentiu todas as lágrimas do mundo formando em seus olhos. Ela conhecia aquela mão, sentira saudades daquele toque. Quando encontrou o rosto de null, quase começou a chorar.
- Você tá maluco? Os fotógrafos já vão começar...
- Dane-se.
Aquela simples palavra fez o coração de null acelerar com um sentimento que ela não tinha há muito tempo: esperança.
- O quê? – Ela precisava se certificar.
- Dane-se, null! Eu não quero mais saber o que as pessoas pensam ou deixam de pensar! Fiquei todo esse tempo achando que você estava me usando quando agora percebi que você é só uma marionete nas mãos dos interesses das empresas. Aquele cara não te trata nem com um décimo do respeito e da admiração que você merece. Ele vai pegar toda a sua música e estraçalhar até não sobrar nada... E aí sim eu vou perder uma das coisas mais importantes da minha vida.
- Você devia ter me escutado... – Ela murmurou, já ignorando toda a atenção e olhares chocados que estavam recebendo. Estar de volta nos braços de null era reconfortante e null jamais pediria para que ele a largasse.
- Devia! E fui um idiota por não te deixar falar, mas é exatamente isso que é o amor! É idiota e sem sentido, faz com que a gente sinta agonia e felicidade, quase tudo ao mesmo tempo. Mas se for para eu ficar desnorteado dessa maneira, que seja para perder meu norte com você. Você não é só a Música, mas a minha música. Eu quero você ao meu lado me ajudando a compor e me esquentando nas noites solitárias. Eu quero que tudo que nós vivemos juntos em segredo nos últimos meses seja a nossa vida normal e a nossa vida real. Eu te amo, null. Você não pode se casar com aquele cara por obrigação e sei que você não quer, porque consigo perceber nos seus olhos que você sente saudades de quando estávamos juntos. Dane-se e que todo mundo vá para o meio do inferno. Se você ainda me ama, vem comigo.
Todos os olhares do evento estavam voltados para eles. Os repórteres já escreviam palavra por palavra do que null dissera em fúria contra seus caderninhos, celulares e tablets. Flashes já eram disparados incessantemente. Sussurros, suspiros e comentários de pura surpresa rodopiavam no ar. E, no meio de tudo isso, ergueu-se a voz do noivo dela.
- null? O que significa isso? – Em seguida, uma voz de escárnio. – O que esse cara está falando só pode ser maluquice!
Algumas risadas se seguiram, enquanto null e null simplesmente ignoravam o caos a sua volta para olhar nos olhos um do outro. Lá estava toda a força de vontade de null refletida no olhar de null: o que o fizera se apaixonar por ela em primeiro lugar, desde quando aquela moça incrível subira no palco por um mero acaso para tocarem juntos.
A expectativa era que null negasse tudo – afinal, estava noiva e jamais poderia confirmar um relacionamento que não fosse o outro. Se o fizesse, arriscaria demais, jogaria fora muita coisa e teria que enfrentar não só a família dele em fúria, como a própria – o que a assustava bem mais.
Com isso, null respirou fundo para dizer a null as palavras que precisava, selando a própria decisão.
- Eu te amo. – Ela declarou em alto e bom som, causando exclamações de puro choque e um barulho infindável de flashes. – Quando disse que você é a minha vida, real, não estava mentindo. Era a mais pura verdade, pois quando estou com você, posso ser quem realmente sou. Na minha vida do dia a dia, sempre mantive uma mentira para satisfazer os outros. Mas é o que você disse... Dane-se. Eu me recuso a casar com alguém que não amo e não me respeita. Quero ficar com você e somente você, null.
Ele não esperou mais uma palavra sequer: puxou null para si e a beijou, selando o destino de ambos na frente de todos. O casamento estava definitivamente cancelado, a ira das duas famílias comprada. O escândalo foi gerado, assim como a balbúrdia que assolou a premiação. Durante a noite toda, não se falou de outra coisa: foram feitas piadas no palco, outros apresentadores apoiaram de maneira enérgica o romance de ambos e até houve um discurso sobre como o amor supera tudo e basta em si mesmo por mais secreto e proibido que seja.
Mas, durante aquele beijo, nenhum dos dois pensou muito naquilo. Já conseguiam ignorar perfeitamente o barulho dos comentários e fotógrafos – principalmente do noivo de null tentando conter a própria crise e realmente iniciar um escândalo, que envolveria uma briga diretamente com null.
Os braços de null permaneceram em volta do pescoço de null enquanto as mãos dele não deixaram a cintura dela. Em momento algum pensaram em distanciar os corpos mais do que o suficiente para se falarem.
- Você vai ter que me proteger muito nessa, null. Estou arriscando tudo que tenho, minha vida toda para podermos ficar juntos.
null somente sorriu para ela, aquele sorriso de lado que null tanto amava e sentira falta nos últimos dias que seu coração sofrera sem ele.
- Não se preocupe, null. Eu sou seu monstrinho de bolso, lembra? Se alguém chegar perto, eu mordo.
null somente sorriu. Não havia lugar no mundo que se sentisse mais segura do que nos braços de null. E, naquele momento, finalmente podia dizer com toda a certeza: ele era a vida real dela.





FIM



Nota da autora: Mais uma fic rápida para alegrar nossos corações! Estou com essa daqui empacada desde a primeira vez que tentaram agitar esse ficstape – uns 2 anos talvez. Mas ela voltou hahahaha
What Am I To You é uma das minhas músicas favoritas do BTS. Isso porque, a primeira vez que eu escutei, foi em um show que assisti deles em que o RM cantou de um jeito que, admito, me fez chorar. Dá pra perceber claramente todo o amor e devoção dele pela música, como ele se sente por ter chegado aonde chegou. E quis dar um pouco desse feeling com o fato de que o pp se apaixona, basicamente, pela personificação da Música.
Além disso, queria fazer uma pp forte e maravilhosa que simplesmente mandasse todo mundo pro meio do inferno, então juntei o útil ao agradável.
Espero que tenham gostado dessa história curtinha! Além disso, me inspirei um pouco no Miyavi para o pp, por isso a guitarra e afins. Quem não conhece, recomendo fortemente jogar lá no Youtube e ouvir, vocês não vão se arrepender.
Obrigada pela leitura e me digam o que acharam! Respondo os comentários assim que puder!
XX

PS: Ah, e segue meu grupo no facebook pra que vocês fiquem de olho nos meus próximos projetos – tenho mais alguns ficstapes para entregar e sempre atualizo por lá! Tem espaço pra todo mundo, sempre procuro conversar bastante com o pessoal que faz parte e realmente vou ficar feliz de vê-los por lá: https://www.facebook.com/groups/558784227519925/?ref=bookmarks.
Também tenho um instagram, no @autora.kahfly !
Disclaimer: Essa história é protegida pela Lei de Direitos Autorais e o Marco Civil da Internet. Postar em outro lugar sem a minha permissão é crime.
Não gosto de falar essas coisas, mas como já tive problemas antes, acho bom deixar avisado. Nem tudo que tá na internet é do mundo, minha gente. Quer postar em outro site? Fala comigo! Eu não mordo! Hahaha a gente vê de me dar o crédito e linkar para o original aqui no FFObs! Só me mandar um e-mail ou pedir aí nos comentários!



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