Capítulo Único
I used to bite my tongue and hold my breath
Scared to rock the boat and make a mess
So I sat quietly, agreed politely
Nova York, 23 de Abril de 2015.
09:13 A.M. - Uma manhã comum na vida de Miller
- Não vai dar certo, você viu o que aconteceu da última vez. – reclamou para a sua amiga que insistia em repetir o mesmo erro. Será que ela não tinha notado que não tinha o menor jogo de cintura pra lidar com rapazes?
- Você saiu no meio do jantar, queria que o cara fizesse o quê? – Jennifer retrucou. Ela já havia perdido as contas de quantos amigos ela e seu noivo já tinham apresentando para , que havia arruinado todos os encontros.
- Mas eu voltei. – se defendeu.
- Depois de quarenta minutos! Você disse que ia ao banheiro e sumiu por quarenta minutos! – Jenn revirou os olhos. – Só mais dessa vez, eu te garanto que esse é um cara legal!
- Encontro duplo, Jenn? Você e o Leo devem estar mesmo desesperados para que eu não fique mais segurando a vela de vocês!
- Você vai adorar ele, eu prometo! Esse cara é diferente de todos os outros!
- Tudo bem. – deu de ombros por fim. Ela sabia que nada consegue impedir Jennifer quando ela toma uma decisão e atualmente ela havia decidido que precisava de um namorado.
bem que queria explicar que não poderia viver um relacionamento agora, mas mordeu a língua. Poxa, um único encontro não poderia ser tão problemático assim, poderia?
I guess that I forgot I had a choice I let you push me past the breaking point I stood for nothing, so I fell for everything
Nova York, 23 de Abril de 2015.
09:15 A.M. - Uma manhã comum na vida de Claremont
- Você sabe que horas são, garoto? – o chefe de , senhor Jameson, disse irritado.
- Hnnn... 09:15, senhor? – disse ofegante enquanto passava pela porta da redação. Sabia que estava atrasado e sabia que o chefe não deixaria barato.
- E esse vai ser o horário em que você vai ficar desempregado se não levar a sua bunda gorda até aquela cadeira e me trazer a crítica daquela porcaria de filme logo!
- Sim, senhor.
considerava que o Senhor Jameson era uma espécie de ditador do mundo da crítica, mas em vez de torturas físicas ele punia os seus frequentes atrasos com filmes ruins. Se tivesse que escrever sobre mais uma comédia romântica água com açúcar, ele poderia matar alguém!
A sua profissão não era tão divertida quanto parecia, mas, apesar dos atrasos, era um crítico de cinema exemplar. Ele merecia coisas melhores do que o novo romance meloso adaptado do livro mais meloso ainda do Nicholas Sparks, ele merecia a viagem para cobrir o festival de cinema de Berlim, mas o senhor Jameson tinha que ter dado a oportunidade para o outro crítico que, aliás, era o sobrinho dele. Quanta justiça.
bem que queria mandar o chefe à merda, pedir demissão e começar a escrever seus próprios roteiros, como planejou no inicio da faculdade de cinema. Mas não havia como ele se sustentar fazendo isso, teria?
You hear my voice, you hear that sound
Like thunder, gonna shake your ground
Nova York, 23 de Abril de 2015.
12:36 P.M. – O inicio de uma tarde incomum no BNY Mellon
revirava os olhos, impaciente. Perderam todo o respeito com o seu diploma mesmo, podia imaginar o pedaço de papel pulando da moldura em seu quarto e se atirando da janela em suicídio gritando “não foi pra isso que fui impresso”. queria fazer a mesma coisa com o cheque do patrão, mas como já estava em péssimos lençóis com o chefe, acabou respondendo um “Sim, sem problemas, Senhor Jameson” quando o homem pediu que ele entregasse um cheque no banco da empresa. Um crítico de cinema entregando cheques! E de pensar que ficou todo empolgado no começo do emprego, achando que suas críticas sendo publicadas em um dos maiores jornais da cidade seria um trampolim direto para os roteiros. Besteira pura.
Mesmo assim, estava lá, esperando na fila para depositar o cheque, pensando que ele devia estar saindo para o almoço agora, quando ouviu uma pequena explosão aguda seguida de gritos ecoando pelo banco.
Homens com máscaras de palhaços invadiam o lugar, carregando armas de fogo grandes e assustadoras. Um assalto.
- Todo mundo pro chão! - ficou apavorado e se deitou, obedecendo ao grito de um dos assaltantes. O BNY Mellon estava tomado pelo grupo de seis assaltantes. Cinco vestidos com mascaras de palhaços comuns, enquanto o líder usava uma fantasia completa de Pierrot.
não conseguia ver muito, mas ouvia algumas pessoas rezando baixinho, os passos dos bandidos e uma voz que gritava com os funcionários para que o levasse até o cofre. Além do som dos próprios dentes batendo porque ele tremia de medo, mas ele queria ignorar isso. Se sobrevivesse ao assalto colocaria mais algumas doses de valentia ao seu personagem. Claro que isso seria mentira, porque sentiu o sangue gelar quando finalmente percebeu que aquela explosão aguda era o barulho de um tiro.
Os bandidos acertaram o segurança do banco para poderem tomar controle da situação. Três dos palhaços mantinham as pessoas ali dentro abaixadas como reféns, dois vigiavam os seguranças que haviam sido desarmados, um desses seguranças sangrava pela perna esquerda, local onde o tiro havia atingido. Ao menos ninguém tinha sido morto. Ainda.
Uma figura encapuzada corria naquela direção, correndo rápido como um guepardo e saltando como uma rã. Uma figura feminina que vestia uma roupa inteiramente preta, de um tecido maleável que permitia todos os movimentos do seu corpo magro e forte. A sua audição, sempre apurada como a de um morcego, ouviu o tiro. Seu instinto natural gritava avisando que havia problemas a serem resolvidos.
Em Nova York, a cidade mais densamente povoada dos Estados Unidos, não é de se admirar que existam vários problemas diários. Mas em tempos onde todos estão correndo de um lado para o outro, lutando contra suas rotinas apressadas, é de se admirar também que ainda existam pessoas que se importam o suficiente para tentar ajudar os outros, mesmo que isso colocasse suas vidas em risco. A figura feminina encapuzada era uma dessas exceções, por isso às vezes ela ganhava algumas manchetes no The new York times. Bem, pelo seu altruísmo e pelo fato dela conseguir invocar qualidades animalescas para o seu corpo e ser mais forte, mais rápida e mais resistente do que as pessoas normais. Roar, esse era o apelido que o jornal tinha dado à ela.
Ninguém sabia nada sobre Roar, além daquilo o que saía nas notícias. Ninguém sabia sua origem ou suas motivações, e se dependesse dela, seria assim para sempre. Havia uma frase que conhecia que se encaixava bem na personalidade de Roar: Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. era apaixonado por filmes de super-heróis, apesar de valorizar toda a arte do cinema, ele adorava um blockbuster com pancadaria para relaxar no final de semana. Já Roar nem se lembrava da última vez que entrou em um cinema.
e Roar eram figuras completamente opostas.
Ela tinha o elemento surpresa. Quando chegou ao banco, arrebentou a grade do duto de ventilação e se enfiou lá dentro, usando sua super audição para chegar até onde os assaltantes mantinham os reféns. Roar agia no automático, estava acostumada a lidar com situações de perigo, sabia bater muito bem quando necessário. Quando estava bem acima do assaltante usou a força de um elefante para chutar o duto e quebrar o chão – que no caso, era o teto do banco - e cair no meio da cena do crime, acertando um chute na nuca do primeiro assaltando que caiu desacordado, de forma ágil, Roar puxou o corpo do homem para proteger o seu e evitar que os comparsas atirassem, o usando de escudo com uma mão e o desarmando com outra. Invocando sua velocidade de guepardo novamente, jogou o homem no chão e correu para acertar um forte soco no rosto de outro palhaço assaltante, agarrou a mão que segurava a arma e torceu para trás, ouviu um estalo alto do pulso sendo quebrado. Esse homem gritou de dor e tentou acertar golpes com a sua mão que anda estava inteira. Sem soltar o braço torcido, Roar acertou um chute no estômago do homem e ele caiu gemendo no chão. Então, ela firmou os braços no chão e suas pernas foram para o ar, como uma criança brincando de virar estrelinha, e as encaixou em volta do pescoço do terceiro homem, usando sua super força para puxá-lo para o chão e o prender em uma posição parecida com o golpe triângulo do jiu jitsu e desferiu vários socos no seu rosto, até o homem ficar desnorteado. Havia incapacitado os três primeiros, faltavam os outros três.
Os homens que rendiam os seguranças vieram correndo em sua direção, atirando, e Roar usou seu radar de morcego para desviar das balas, correu e saltou acertando um chute no queixo de um dos atiradores que deixou a arma cair. A mulher pousou elegante e apoiou a mão no chão, passando uma rasteira no outro homem, usou seus reflexos aguçados para pegar as armas do chão e tirar a munição dela. Gostava de lutas limpas, mão à mão. O primeiro homem á cair já estava se recuperando e conseguiu envolver o pescoço da em uma chave de braço, o outro percebeu a chance e acertou um soco no rosto dela. Então Roar usou uma tática não muito bonita, mas bem eficaz: Pisou no pé com força do agressor que segurava seu pescoço. Quando o apertão se afrouxou, ela tomou impulso de um super salto e chutou aquele que havia acertado o soco em seu rosto, um estalo alto ecoou e sangue escorreu do nariz do homem, maxilar e queixo quebrados. Aproveitando do mesmo impulso, seu corpo foi içado para o ar e ela caiu atrás do homem que antes tinha conseguido segurá-la e inverteu a situação. Desferiu um chute forte na parte interior do joelho e ouviu mais um estalo de ossos se partindo.
Roar verificou se a máscara fina e preta que ficava ao redor de seus olhos ainda estava no lugar e ajeitou o capuz. Alguns reféns a olhavam assustados enquanto alguns mais espertos corriam para as portas.
não era um dos espertos. Ele olhava embasbacado para a sua super heroína, veja bem, quando menino, aprendeu a ler com as aventuras do Quarteto Fantástico, não era de se admirar que ele tivesse um amor platônico pela garota misteriosa que sempre aparecia nos jornais, a Super heroína real de Nova York, ele estava extasiado em ver Roar de perto, não eram muitas pessoas quem tinham essa chance, a maioria só via as fotos borradas do New York Times, a mulher sabia ser discreta.
Ele não ficava empolgado assim desde que anunciaram que o acordo entre a Sony e a Disney para o Homem Aranha aparecer no filme da Guerra Civil, e ele julgava aquele dia um marco da sua vida. Talvez tenha sido a lembrança daquele sentimento, ou a certeza que ele seria o novo Robin e ela o seu Batman, que o fez seguir a garota que ia à direção do último ladrão dentro do cofre do banco.
Pierrot ajeitava os babados de sua roupa enquanto a funcionaria abria o cofre do banco. Ele era uma figura excêntrica, podia jurar que ouvia seu fuzil M16 reclamar de tédio então resolveu pegá-lo, chamar uns palhaços e fazer um assalto só por diversão. Esperava que a garota fosse tentar prendê-lo de novo, ele estava doido pra ver o circo pegar fogo mais uma vez. Ele sorria debilmente em ver a funcionaria morrer de medo. Pierrot era triste e melancólico, com um olhar permanentemente choroso, precisava fazer coisas assim para ter algum prazer, por que ser tão sério, não é? A vida é curta demais sem um pouco de caos.
E o caos havia acabado de chegar.
- Roar! Roar! Pensei que não viria! – Ele disse rindo. – Diga oi para o meu amiguinho! – E atirou com o fuzil. Na direção da mulher e em todas as direções. A funcionária gritou e se jogou no chão chorando, pulou e se encolheu atrás da porta principal que separava o cofre da área administrativa do banco. Roar assumiu uma posição ameaçadora, como se fosse uma leoa pronta para o bote. Pierrot não havia atirada para acertá-la, se ela morresse assim tão fácil com quem ele se divertiria?
- E eu pensei que você tinha levado a sério a ideia de ir a um psiquiatra. – A voz veio da figura encapuzada como um rugido.
Não era a primeira vez que se encontravam, Roar vivia tentando capturar e fazer Pierrot pagar pelos seus crimes, mas apesar de louco, o palhaço era um gênio e viva escorrendo por entre seus dedos.
Roar atacou, o palhaço jogou o saco cheio de dinheiro em sua direção e aproveitou os segundos que Roar levou para desviar para criar vantagem e socar a mulher no estômago, desequilibrando a heroína de . Pierrot girou e tentou atingir um chute na mulher, que usando seus reflexos avançados conseguiu pegar o pé de seu inimigo e torcê-lo.
estava vidrado, o que antes era um amontoado de covardia agora era um amontoado de hormônios. Roar era incrível, ele não acreditava no amor à primeira vista que aquelas porcarias de comédias românticas nojentas pregavam, mas assim que ela tomou o fuzil das mãos de Pierrot e entortou o cano com sua força sobre humana, ele teve a certeza que havia encontrado o sangue do seu Tarantino, o Johnny Depp de seu Tim Burton, ou melhor, a Angelina Jolie do seu Brad Pitt. O cinéfilo pegou o celular do bolso e tentou filmar, poxa, ele não planejava divulgar nem nada, só queria ter uma lembrança da super heroína de nova York, mas escondido atrás da porta ele não ia conseguir mais que dois borrões se atracando, então tomando um gole de coragem e um porre de estupidez, começou a andar devagarinho tentando se aproximar da luta.
Roar girava em seus calcanhares para desviar dos socos frenéticos de Pierrot, o ladrão ria e cantarolava enquanto eles brigavam. Roar tinha de por aquele lunático atrás das grades, dessa vez não podia falhar. Ela finalmente estava tomando vantagem, Pierrot era um ótimo lutador, mas já mostrava sinais de cansaço, enquanto o super corpo de Roar poderia lutar o dia inteiro.
Ela acertou um chute no rosto do meliante, que o desarmou do soco que preparava e possibilitou que ela torcesse seu braço para trás, usando a força de um gorila, ela jogou o bandido no chão e conseguiu rendê-lo. A funcionaria, que ainda estava ali, soluçou e começou a caminhar trôpega quando percebeu que o homem estava momentaneamente incapacitado.
- Vou chamar a policia. – Disse entre lágrimas. Até que enfim, Roar pensou.
Mas Roar cometeu um erro, acreditou que o fuzil era a única arma que Pierrot tinha, e não percebeu a faca escondida na manga do palhaço. Ele conseguiu acertar o rosto da mulher com uma cabeçada, e aproveitou que o golpe surpresa fez com que ela afrouxasse o aperto por um segundo para acertar uma facada na lateral de sua perna esquerda. Ela reprimiu o murmúrio de dor e o palhaço conseguiu ficar em pé mais uma vez.
, que estava tendo o seu momento paparazzi, no entendo, não conseguiu reprimir um grito de horror quando viu a mulher ferida, chamando a atenção para si. Pierrot conhecia sua inimiga, sabia que ela prezava mais pela vida dos civis do que qualquer outra coisa. Era a oportunidade perfeita.
O palhaço agarrou pelo pescoço e mirou a faca, suja com o sangue de Roar, em sua jugular. O homem, assustado, deixou o celular cair no chão ao ser pego de surpresa. Roar encarou a cena atônita, sabia que o palhaço descartaria a vida daquele rapaz facilmente se tivesse vontade. De onde ele tinha vindo, aliás, quando usou seu radar só havia percebido a funcionário e Pierrot na sala do cofre. Será que ele tinha entrado depois da luta começar? Que tipo de doido faria isso?
- Roar, Roar, querida, vá para dentro do cofre ou o garotinho aqui vai virar um chafariz vermelho.
- Não consegue me vencer de formas justas, Pierrot? Você sabe que assim que eu sair de lá vou te procurar até no inferno.
- Selvagem, se você quiser me morder agora vai sacrificar a vida desse rapaz aqui, você sabe que eu não dou à mínima, mas imagine a família do coitadinho? Vão ter que usar uma super cola pra cabeça ficar no lugar quando eu terminar com ele.
- Que garantia eu tenho de que você vai poupá-lo? – Ela estava odiando cada segundo, odiava negociar com o bandido, mas seu juramento era de sempre proteger a vida dos civis, ela já havia provado o quanto aquela faca era afiada, a dor em sua perna não a deixava esquecer, não haveria velocidade o suficiente para impedir Pierrot.
- Eu o deixo no cofre com você. – O vilão sorriu.
Roar começou a recuar devagar, andando de costas na direção do cofre, se perguntando quantos minutos levaria para quebrar aquela porta de ferro enorme para ir atrás do palhaço e garantir que ele nunca mais machucaria ninguém. Tempo o suficiente para ele matar várias outras pessoas, ela esperava que ao menos a polícia estivesse chegando.
estava se sentindo prestes a urinar nas calças, mas dizem que em nos momentos de perigo algumas pessoas tem rompentes de adrenalina e lutam mesmo sem coragem, quando estavam na entrada do cofre, agarrou a mão que segurava a faca em seu pescoço e começou a se debater, tentando se livrar do apertão. Roar aproveitou a deixa e a falta de concentração de Pierrot para acertar uma cotovelada em seu rosto e livrar o civil da ameaça, o jogando para dentro do cofre para tirá-lo da confusão, ela estava torcendo o braço em que o palhaço trazia a faca quando ele golpeou o seu ferimento e a desestabilizou, chutando para dentro do cofre também.
- Roar, Roar, querida, você devia ter mantido sua palavra. – Aparentemente, Pierrot sempre tinha uma carta na manga, porque puxou um explosivo e sorriu. – Vou fazer um truque de magica! Agora você vê...
Ele fechou a porta do cofre e os trancou lá dentro. Roar correu trôpega pela dor na perna. Podia ouvir o tique e taque dos explosivos.
-... Agora você não vê! – Ouviu a voz do palhaço ao longe.
Pierrot armou os explosivos na sala do cofre e correu, tinha um minuto para fugir e aquilo seria tempo mais do que o suficiente. Mais uma vez escapou pelos dedos de Roar. Tinha sido divertido para ele, já Roar estava bufando de raiva dentro do cofre.
- Droga, Droga... – Ela socou a porta do cofre. Porcaria de banco, aquela porta era um inferno de pesada. Seus socos afundaram e deixaram marcas no ferro, mas eles não conseguiriam passar pela bomba em tempo, os bips ficavam cada vez mais rápidos...
- Droga! – Ela correu na direção do civil que ainda estava aturdido no fundo do cofre e o abraçou para que o corpo dela fosse um escudo para ele.
O chão tremeu com o som de um trovão. O banco explodiu.
se sentiria realizando aquele sonho infantil de ser salvo pela Mulher maravilha, se não visse que a coisa estava séria demais pra sentir qualquer outra coisa que não fosse medo. Ele nunca tinha ouvido um estrondo tão alto, seus ouvidos zuniam e ele jurava que o chão continuava tremendo, ou era seu corpo? Ou era o corpo de Roar?
- Tudo bem? Feriu-se? – A mulher perguntou se afastando dele. Ela ajeitou o capuz, tirando a poeira da explosão. não conseguia ver mais que lábios carnudos e a ponta de um nariz saindo da máscara.
- Estou bem. – Ele respondeu. O cofre era realmente de segurança máxima, as paredes tremeram e soltaram poeira, mas não cederam. A prisão improvisada continuava intacta.
Roar assentiu positivamente e foi tentando se colocar de pé, mancou levemente com a perna que havia levado a facada.
- Você está ferida. – disse segurando o braço dela de forma carinhosa para que ela não se levantasse, por baixo da mascara as sobrancelhas de Roar se franziram. Era só um cortezinho, nada com o que ela não estivesse acostumada.
- Vai curar rápido, posso me regenerar feito uma lagartixa.
- Vai crescer uma cauda em você? - riu da piada boba e Roar olhou feio.
- hnn... quando as lagartixas perdem a cauda, ela nasce de novo, sabe.... – Ele tentou explicar.
- Preciso sair daqui e ir atrás do Pierrot, não tenho tempo para piadinhas.
- Ele já deve estar bem longe daqui e você ainda sangra!
- O que você sugere? – Roar perguntou impaciente. Não acreditava que tinha deixando Pierrot escapar mais uma vez! Quantas vezes ele conseguiria ser mais esperto que ela? Mais quantas vítimas ele faria se não fosse detido logo? E ela ali jogando conversa fora com um civil!
Um civil que estava desajeitadamente tentando rasgar a barra da camisa.
- O que você esta fazendo? – Roar perguntou olhando o rapaz que parecia ficar nervoso.
- Nos filmes parece ser tão fácil! Caramba... AH CONSEGUI! – Ele disse puxando a barra que se descosturava com um som estridente, deixando parte da barriga – que era até bem definida para um civil normal – à mostra.
- Com licença. – disse e envolveu a perna de Roar com o pedaço de pano rasgado, pressionando o ferimento para estancar o sangramento, e amarrou. Ela ficou olhando, achando graça do rapaz, a facada não doía e estaria completamente cicatrizada em algumas horas, mas deixou que ele fizesse o curativo. Ele estava certo dizendo que Pierrot já havia fugido, de qualquer forma.
- Viu só? Fiz um curativo em você, isso prova que sou o mocinho. – Ele disse ameaçando um sorriso.
- Claro. Será que agora posso nos tirar daqui agora? – Roar respondeu e se levantou.
O cofre parecia intacto por dentro, mas os dois não podiam ver a quantidade dos escombros que caíram em cima dele. Estavam praticamente soterrados pelas paredes do banco, a polícia chegava ao local e conversava com as testemunhas, por sorte não houveram vitimas, quer dizer, um dos ladrões que ficou desacordado morreu no meio da explosão, os outros fugiram em tempo junto de Pierrot, que havia desaparecido.
Dentro do cofre, Roar invocava a força de um Gorila e, ao invés de socar de forma aleatória, focou os golpes na fechadura. Apesar das luvas protetora que usava, ela sentia os dedos arderem. A porta do cofre era muito pesada e espessa, foi difícil, mas a fechadura cedeu e se arrebentou. Roar começou a empurrar e descobriu que o caminho estava bloqueado pelas paredes destruídas do banco, não conseguia forçar o suficiente para que pudessem abrir a porta.
- Acho que temos um problema. – Roar disse vendo as pedras pela festa da porta, o máximo que sua força conseguiu empurrar. Estava alheia ao fato de que estava mentalmente comparando a garota com a Mulher Maravilha
- Qual problema? – Ele perguntou.
- Os escombros estão bloqueando a porta, não vai ser tão fácil assim sair daqui.
- Você não consegue removê-las? – Ele perguntou. Bem que gostaria de ser o Super Homem e poder ajudar, mas ele podia no máximo ser um Steve Trevor, e sejamos francos, ninguém liga para o Steve Trevor.
- É o que estou tentando fazer, não percebeu?
Talvez Roar fosse mais simpática nas notas dos jornais.
I got the eye of the tiger, a fighter, dancing through the fire
'cause I am a champion and you're gonna hear me ROAR
Nova York, 23 de Abril de 2015.
14:53 P.M. – A tarde nos destroços do BNY Mellon
Os bombeiros e os policiais trabalhavam procurando alguma vítima nos escombros. A funcionária que havia chamado a policia havia dito que Roar estava no cofre lutando com o palhaço quando tudo explodiu. Aquela mulher havia sido a última civil a sair antes da explosão, ou ao menos era o que pensavam. Ninguém tinha visto Pierrot e os comparsas saírem sorrateiramente antes do banco vir à baixo. Mas quando acharam o corpo do capanga que ficou para trás, uma pequena esperança se acendeu no coração dos policiais. Eles queriam pegar Pierrot tanto quanto Roar, de fato, alguns deles queriam inclusive pegar Roar. Nem todos aprovavam a ideia de uma mulher se disfarçar e fazer o trabalho da polícia, por isso era tão importante Roar se manter em segredo. Ela só esperava que quando conseguisse sair do cofre fosse capaz de se esconder antes que algo pior acontecesse.
Mas para sair de lá ela precisava remover as pedras que prendiam a porta do cofre, por isso Roar invocava todos os animais possíveis para forçar passagem.
- Acho que isso não deve fazer muito o seu estilo. – dizia as costas de uma Roar que lutava contra o peso da porta. – Mas e só nós ligássemos para alguém e pedíssemos ajuda?
- E você sugere que liguemos para quem? – A mulher retrucou.
- Não sei, você não tem algum tipo de celular especial? Para chamar reforços quando a coisa fica feia, sabe, uma linha direta com a sua Bat Caverna? – sugeriu, Roar revirou os olhos. Porcaria de quadrinhos! Bem que ela queria ter uma Bat Caverna no lugar de uma Bat prestação de aluguel atrasada.
- Seria mais fácil você ligar para alguém, eu trabalho sozinha.
- Eu perdi meu celular. Caiu quando eu estava tentando filmar você. – disse pesaroso.
- Quando você estava tentando o que? – Roar parou de fazer força contra a porta e se virou para encarar o rapaz.
- Ah – sentiu suas bochechas esquentarem. – Eu queria uma recordação, sabe...
- Não acredito! – Roar exclamou alto – Eu perdi a chance de capturar o Pierrot por causa de um jornalista doido? Que droga você tem na sua cabeça? Não acha que prender um louco assassino é mais importante que a porcaria da materiazinha de fofoca de vocês? – Roar deu alguns passos pesados na direção de , e ele teve a certeza de que ela tinha os olhos de um tigre prestes a capturar uma presa.
- E-e-eu não sou jornalista, não queria fazer fofoca nenhuma! Desculpe, eu só sou um fã.
- Um o que? – Roar parou, o encarando confusa. Quando ele disse que queria filmar ela teve a certeza de que ele era mais um dos paparazzi doidos que se metiam em perigo para tentar descobrir como era o rosto que o capuz escondia. – Você é maluco ou bateu a cabeça na explosão? Se enfiou na minha batalha porque queria uma recordação?
- Você é uma super heroína real! Você salva pessoas e tem super poderes! – O homem disse gesticulando com as mãos, para mostrar a grande dimensão daquelas palavras. Ele achava que ela era uma heroína dos filmes, ela achava que não fazia nada além da sua obrigação.
- Isso é maluquice demais até para mim, você se botou em perigo!
- Eu achava que a sua vida era um filme de ação! – Ele deu de ombros.
- Achava é? Não acha mais? – Roar arqueou as sobrancelhas. Ela ainda não confiava plenamente no garoto, mas as imagens do celular haviam se perdido na explosão de qualquer forma.
- Bem, desde que estamos presos aqui você agiu meio mal humorada, me chamando de maluco! Quer dizer, antes eu tinha uma teoria de que você era uma divindade vinda de algum planeta distante com uma raça superior aos mortais, mas agora acho que você é só humana mesmo.
Roar não pode evitar cair na gargalhada. Ela? Uma divindade?
- Achou que eu tinha vindo de Krypton, é? – Essas porcarias de quadrinhos de novo! Porcarias de adaptações que fizeram todos acharem que Roar nunca falharia. Já estava perdendo as contas de quantas vezes havia falhado e deixando Pierrot escapar.
- Sabe o que dizem, você só ganha sua carteirinha de nerd quando monta uma teoria e posta na internet.
- Por favor, não me diga que você e dono de algum fã clube meu, ou eu vou pensar seriamente em te deixar preso aqui.
- Bom, se eu te conhecesse na época da minha adolescência eu provavelmente teria feito um, mas agora eu já estou velho demais pra isso. – e Roar riram. Era engraçado como a cada segundo a super heroína misteriosa se parecia mais com uma mulher comum. Bem, não exatamente comum, mas uma mulher real.
- Agora eu estou começando a considerar mordidas de animais radioativos.
- Eu provavelmente morreria de câncer com a quantidade de mordidas e picadas que ia ter que levar. – Roar sorriu entrando no clima das piadas. Ele nunca acertaria sua origem, e ela nunca contaria, mas era divertido ouvi-lo teorizar tantas bobeiras.
Mais determinada a salvar o garoto e a si mesma, Roar tomou fôlego e voltou a forçar a porta. As rochas estalavam alto e se partiam com a sua força sobre humana.
- Algum acessório mágico, tipo um anel verde? Ou quem sabe você foi voluntária para um teste do governo?
- Quem sabe, não é? Talvez eu seja uma mutante. – Mais rochas se partiram fazendo uma nova camada fina de poeira entrar no cofre.
- Bem possível, mas aí teríamos mais heróis e você é a única. Mas você pode ser uma milionária com alguma história trágica?
- Bem que eu gostaria da parte milionária.
- Então vou ter que continuar enraizado na minha teoria de que você é uma alienígena.
- Quem sabe, não é? Eu não disse que esses palpites estão errados.
- Bem, o que eu sei é que você é um mistério.
As mãos de Roar doíam de tanto forçar a porta. Lá fora, os policiais e o resgate também começavam a sentir suas esperanças murcharem a medida que não encontravam nada nos escombros. deveria estar preocupado com o seu trabalho, mas na verdade não estava se importando com o que o senhor Jameson ia dizer quando ele voltasse depois de perder uma tarde toda de expediente. Não era culpa dele, o assalto e a explosão com certeza foram anunciados nas mídias, então talvez ele não fosse demitido. Ele só começou a se perguntar se ser demitido seria tão ruim assim. Ele nunca gostou do emprego, mas não podia negar que gostava da estabilidade e do salário fixo. Era covarde demais para arriscar tudo e investir nos seus sonhados roteiros. Mas, caramba, como ele podia ter medo de ter que passar algumas dificuldades financeiras enquanto havia uma mulher destruindo pedras com as próprias mãos para salvá-los?
Quem liga para o senhor Jameson? Pro inferno ele e as comédias românticas sem graça. Quem liga para as contas? Ele queria ser roteirista desde criança, então ele seria roteirista! Chega de inventar desculpas! Roar salvou sua vida, então ele ia vivê-la!
Quando Roar conseguiu abrir a porta o suficiente para que pudessem passar, começou a abrir passagem pelos destroços, criando uma espécie de túnel rápido. Ela guiava e o protegia das pedras maiores, embora em segundos eles já estivessem cobertos de sujeira e poeira, estavam conseguindo sair sem ferimentos graves. Não demorou muito até que eles pudessem ver os feixes de luz dentre as pedras. A mulher checou sua máscara e seu capuz quando ouviu uma voz.
- Tem algo se mexendo naquela direção! – Um dos bombeiros gritou chamando a atenção dos policiais e dos curiosos. Roar teria de ser rápida para se esconder de todos aqueles olhares.
Bem, Roar se sentiu estranha. Claro que ela não queria ficar soterrada para sempre, mas era difícil relaxar na presença de alguém. Aquele civil desconhecido tinha, com suas piadinhas, se aproximado mais da verdadeira personalidade de Roar do que qualquer outro. Ele não sabia nada sobre ela, mas ele havia feito a mulher se sentir à vontade, o que era um grande feito Isso já o tornava uma pessoa diferente daquelas que ela conhecia.
Usando o seu corpo mais forte para proteger o humano quando os bombeiros começaram a remover e revirar os restos do banco destruído de cima dos dois. Roar olhou bem no roso do homem, que estava coberto de poeira e sorriu.
- Bom conhecer você, espero que não se meta em encrenca de novo. E nunca mais tente tirar filmar pessoas sem a permissão delas, deixe isso para as fãs de boybands.
- Uma faca no pescoço e uma explosão me ensinaram a lição, não se preocupe.
- Sobreviventes! Sobreviventes! – A voz do bombeiro gritou e Roar usou a força para impulsionar para cima, eles estavam livres.
- Ei, meu nome é ! – Ele disse olhando a garota assustado. De alguma forma ele sabia que logo não ouviria mais a sua voz.
- Desculpe, você não pode saber o meu.
- Foi um prazer te conhecer. – respondeu com um sorriso. Ele não precisava de um nome para conhecê-la.
E foi içado pelos bombeiros.
Ele ouvia várias vozes ao seu redor. Vozes nervosas de policiais gritando, vozes preocupadas de paramédicos o examinando, vozes curiosas que especulavam quem era ele. Ele sabia que ela precisava sair fugir de lá, havia se mantido em segredo por tanto tempo, não poderia trazer tudo ao público agora. Como uma forma de agradecimento e redenção pela sua tentativa idiota de filmá-la, começou a armar um enorme teatro, fingindo dores que não sentia e confusões mentais que não tinha para chamar a atenção do maior número de pessoas que podia.
- Tudo explodiu em cima de mim! Feito uma luz, acho que bati a cabeça! Minhas costelas doem! Aquele bandido louco apontou uma faca para mim! – Ele gritava e gesticulava, vários paramédicos vieram segurá-lo para que conseguissem deitá-lo em uma maca e vários policiais apareceram sedentos por depoimentos.
Mas, gradativamente, as vozes curiosas se transformaram em um grito que ele não queria ouvir, a multidão chamava por Roar.
Roar queria olhar para de novo, mas não pode, assim que teve uma brecha deu um de seus super saltos, correu como um guepardo até o prédio mais próximo e o escalou como um esquilo.
Roar desapareceu de novo.
Oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh You're gonna hear me roar
Nova York, 24 de Abril de 2015.
20:14 P.M. – A temida noite do encontro de Miller
- Ela esta atrasada de novo. – Jenn revirou os olhos para seu noivo, Leo, quando a amiga dela, , ia deixar de ser tão paranoica? Ela não entendia porque ela fugia tanto de relacionamentos e pessoas novas.
Será que ia fugir do compromisso de novo? O coração de Jenn gelou quando o amigo do namorado se aproximou sorrindo da mesa deles.
- Eu ainda não sei como vocês me convenceram a fazer isso. – sorriu, ele também não estava acostumado com um encontro às cegas.
- Como vai, cara? – Leo riu. – está um pouco atrasada, sente-se com a gente. Tenho certeza que você tem uma boa história para nos contar.
revirou os olhos como se estivesse entediado. Claro que todos sabiam que ele adorava aproveitar seus 15 minutinhos de fama.
- Bem, pedi demissão hoje e estou decidido a investir nos meus roteiros. Fora isso, só estou nos jornais porque fui parte de um assalto a banco e resgatado por uma super heroína real, nada demais. – sorriu.
- Realmente, Jenn, esse é um cara realmente diferente dos outros.
deu um pulo na cadeira quando ouviu uma voz feminina atrás de si. Era ela? O seu encontro?
- , finalmente! – Jenn sorriu genuinamente feliz em ver a amiga, apesar dos apesares, ela se importava verdadeiramente com .
- Esse é o , amigo de faculdade do Léo e futuro roteirista de sucesso. – Jenn sorriu e se levantou para cumprimentar a mulher. Ela era inegavelmente bonita e surpreendentemente familiar.
- É um prazer conhecer você, .
- O prazer é meu. – A garota respondeu sentindo algo novo agitar no seu peito. Relacionamentos sempre seriam complicados para uma pessoa como ela, mas pela primeira vez ela sentia que valia a pena tentar.
I went from zero, to my own hero
Nova York, horário desconhecido.
O prazer de Pierrot
O palhaço Pierrot sorriu. Seu sorriso maníaco e psicótico, ele estava dois passos na frente dela agora, agora sim ele teria diversão de verdade. Aquele civil idiota, como ele foi útil!
Na tela do celular, um vídeo rodava, ele não podia ter certeza ainda mas logo teria, logo a encontraria. Aquela fração de segundos em que o capuz se mechia e revelava um pouco mais das suas feições seria o suficiente, ele sabia que seria, sentia que seria.
- Roar, Roar, nós vamos brincar de novo...
Scared to rock the boat and make a mess
So I sat quietly, agreed politely
Nova York, 23 de Abril de 2015.
09:13 A.M. - Uma manhã comum na vida de Miller
- Não vai dar certo, você viu o que aconteceu da última vez. – reclamou para a sua amiga que insistia em repetir o mesmo erro. Será que ela não tinha notado que não tinha o menor jogo de cintura pra lidar com rapazes?
- Você saiu no meio do jantar, queria que o cara fizesse o quê? – Jennifer retrucou. Ela já havia perdido as contas de quantos amigos ela e seu noivo já tinham apresentando para , que havia arruinado todos os encontros.
- Mas eu voltei. – se defendeu.
- Depois de quarenta minutos! Você disse que ia ao banheiro e sumiu por quarenta minutos! – Jenn revirou os olhos. – Só mais dessa vez, eu te garanto que esse é um cara legal!
- Encontro duplo, Jenn? Você e o Leo devem estar mesmo desesperados para que eu não fique mais segurando a vela de vocês!
- Você vai adorar ele, eu prometo! Esse cara é diferente de todos os outros!
- Tudo bem. – deu de ombros por fim. Ela sabia que nada consegue impedir Jennifer quando ela toma uma decisão e atualmente ela havia decidido que precisava de um namorado.
bem que queria explicar que não poderia viver um relacionamento agora, mas mordeu a língua. Poxa, um único encontro não poderia ser tão problemático assim, poderia?
I guess that I forgot I had a choice I let you push me past the breaking point I stood for nothing, so I fell for everything
Nova York, 23 de Abril de 2015.
09:15 A.M. - Uma manhã comum na vida de Claremont
- Você sabe que horas são, garoto? – o chefe de , senhor Jameson, disse irritado.
- Hnnn... 09:15, senhor? – disse ofegante enquanto passava pela porta da redação. Sabia que estava atrasado e sabia que o chefe não deixaria barato.
- E esse vai ser o horário em que você vai ficar desempregado se não levar a sua bunda gorda até aquela cadeira e me trazer a crítica daquela porcaria de filme logo!
- Sim, senhor.
considerava que o Senhor Jameson era uma espécie de ditador do mundo da crítica, mas em vez de torturas físicas ele punia os seus frequentes atrasos com filmes ruins. Se tivesse que escrever sobre mais uma comédia romântica água com açúcar, ele poderia matar alguém!
A sua profissão não era tão divertida quanto parecia, mas, apesar dos atrasos, era um crítico de cinema exemplar. Ele merecia coisas melhores do que o novo romance meloso adaptado do livro mais meloso ainda do Nicholas Sparks, ele merecia a viagem para cobrir o festival de cinema de Berlim, mas o senhor Jameson tinha que ter dado a oportunidade para o outro crítico que, aliás, era o sobrinho dele. Quanta justiça.
bem que queria mandar o chefe à merda, pedir demissão e começar a escrever seus próprios roteiros, como planejou no inicio da faculdade de cinema. Mas não havia como ele se sustentar fazendo isso, teria?
You hear my voice, you hear that sound
Like thunder, gonna shake your ground
Nova York, 23 de Abril de 2015.
12:36 P.M. – O inicio de uma tarde incomum no BNY Mellon
revirava os olhos, impaciente. Perderam todo o respeito com o seu diploma mesmo, podia imaginar o pedaço de papel pulando da moldura em seu quarto e se atirando da janela em suicídio gritando “não foi pra isso que fui impresso”. queria fazer a mesma coisa com o cheque do patrão, mas como já estava em péssimos lençóis com o chefe, acabou respondendo um “Sim, sem problemas, Senhor Jameson” quando o homem pediu que ele entregasse um cheque no banco da empresa. Um crítico de cinema entregando cheques! E de pensar que ficou todo empolgado no começo do emprego, achando que suas críticas sendo publicadas em um dos maiores jornais da cidade seria um trampolim direto para os roteiros. Besteira pura.
Mesmo assim, estava lá, esperando na fila para depositar o cheque, pensando que ele devia estar saindo para o almoço agora, quando ouviu uma pequena explosão aguda seguida de gritos ecoando pelo banco.
Homens com máscaras de palhaços invadiam o lugar, carregando armas de fogo grandes e assustadoras. Um assalto.
- Todo mundo pro chão! - ficou apavorado e se deitou, obedecendo ao grito de um dos assaltantes. O BNY Mellon estava tomado pelo grupo de seis assaltantes. Cinco vestidos com mascaras de palhaços comuns, enquanto o líder usava uma fantasia completa de Pierrot.
não conseguia ver muito, mas ouvia algumas pessoas rezando baixinho, os passos dos bandidos e uma voz que gritava com os funcionários para que o levasse até o cofre. Além do som dos próprios dentes batendo porque ele tremia de medo, mas ele queria ignorar isso. Se sobrevivesse ao assalto colocaria mais algumas doses de valentia ao seu personagem. Claro que isso seria mentira, porque sentiu o sangue gelar quando finalmente percebeu que aquela explosão aguda era o barulho de um tiro.
Os bandidos acertaram o segurança do banco para poderem tomar controle da situação. Três dos palhaços mantinham as pessoas ali dentro abaixadas como reféns, dois vigiavam os seguranças que haviam sido desarmados, um desses seguranças sangrava pela perna esquerda, local onde o tiro havia atingido. Ao menos ninguém tinha sido morto. Ainda.
Uma figura encapuzada corria naquela direção, correndo rápido como um guepardo e saltando como uma rã. Uma figura feminina que vestia uma roupa inteiramente preta, de um tecido maleável que permitia todos os movimentos do seu corpo magro e forte. A sua audição, sempre apurada como a de um morcego, ouviu o tiro. Seu instinto natural gritava avisando que havia problemas a serem resolvidos.
Em Nova York, a cidade mais densamente povoada dos Estados Unidos, não é de se admirar que existam vários problemas diários. Mas em tempos onde todos estão correndo de um lado para o outro, lutando contra suas rotinas apressadas, é de se admirar também que ainda existam pessoas que se importam o suficiente para tentar ajudar os outros, mesmo que isso colocasse suas vidas em risco. A figura feminina encapuzada era uma dessas exceções, por isso às vezes ela ganhava algumas manchetes no The new York times. Bem, pelo seu altruísmo e pelo fato dela conseguir invocar qualidades animalescas para o seu corpo e ser mais forte, mais rápida e mais resistente do que as pessoas normais. Roar, esse era o apelido que o jornal tinha dado à ela.
Ninguém sabia nada sobre Roar, além daquilo o que saía nas notícias. Ninguém sabia sua origem ou suas motivações, e se dependesse dela, seria assim para sempre. Havia uma frase que conhecia que se encaixava bem na personalidade de Roar: Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. era apaixonado por filmes de super-heróis, apesar de valorizar toda a arte do cinema, ele adorava um blockbuster com pancadaria para relaxar no final de semana. Já Roar nem se lembrava da última vez que entrou em um cinema.
e Roar eram figuras completamente opostas.
Ela tinha o elemento surpresa. Quando chegou ao banco, arrebentou a grade do duto de ventilação e se enfiou lá dentro, usando sua super audição para chegar até onde os assaltantes mantinham os reféns. Roar agia no automático, estava acostumada a lidar com situações de perigo, sabia bater muito bem quando necessário. Quando estava bem acima do assaltante usou a força de um elefante para chutar o duto e quebrar o chão – que no caso, era o teto do banco - e cair no meio da cena do crime, acertando um chute na nuca do primeiro assaltando que caiu desacordado, de forma ágil, Roar puxou o corpo do homem para proteger o seu e evitar que os comparsas atirassem, o usando de escudo com uma mão e o desarmando com outra. Invocando sua velocidade de guepardo novamente, jogou o homem no chão e correu para acertar um forte soco no rosto de outro palhaço assaltante, agarrou a mão que segurava a arma e torceu para trás, ouviu um estalo alto do pulso sendo quebrado. Esse homem gritou de dor e tentou acertar golpes com a sua mão que anda estava inteira. Sem soltar o braço torcido, Roar acertou um chute no estômago do homem e ele caiu gemendo no chão. Então, ela firmou os braços no chão e suas pernas foram para o ar, como uma criança brincando de virar estrelinha, e as encaixou em volta do pescoço do terceiro homem, usando sua super força para puxá-lo para o chão e o prender em uma posição parecida com o golpe triângulo do jiu jitsu e desferiu vários socos no seu rosto, até o homem ficar desnorteado. Havia incapacitado os três primeiros, faltavam os outros três.
Os homens que rendiam os seguranças vieram correndo em sua direção, atirando, e Roar usou seu radar de morcego para desviar das balas, correu e saltou acertando um chute no queixo de um dos atiradores que deixou a arma cair. A mulher pousou elegante e apoiou a mão no chão, passando uma rasteira no outro homem, usou seus reflexos aguçados para pegar as armas do chão e tirar a munição dela. Gostava de lutas limpas, mão à mão. O primeiro homem á cair já estava se recuperando e conseguiu envolver o pescoço da em uma chave de braço, o outro percebeu a chance e acertou um soco no rosto dela. Então Roar usou uma tática não muito bonita, mas bem eficaz: Pisou no pé com força do agressor que segurava seu pescoço. Quando o apertão se afrouxou, ela tomou impulso de um super salto e chutou aquele que havia acertado o soco em seu rosto, um estalo alto ecoou e sangue escorreu do nariz do homem, maxilar e queixo quebrados. Aproveitando do mesmo impulso, seu corpo foi içado para o ar e ela caiu atrás do homem que antes tinha conseguido segurá-la e inverteu a situação. Desferiu um chute forte na parte interior do joelho e ouviu mais um estalo de ossos se partindo.
Roar verificou se a máscara fina e preta que ficava ao redor de seus olhos ainda estava no lugar e ajeitou o capuz. Alguns reféns a olhavam assustados enquanto alguns mais espertos corriam para as portas.
não era um dos espertos. Ele olhava embasbacado para a sua super heroína, veja bem, quando menino, aprendeu a ler com as aventuras do Quarteto Fantástico, não era de se admirar que ele tivesse um amor platônico pela garota misteriosa que sempre aparecia nos jornais, a Super heroína real de Nova York, ele estava extasiado em ver Roar de perto, não eram muitas pessoas quem tinham essa chance, a maioria só via as fotos borradas do New York Times, a mulher sabia ser discreta.
Ele não ficava empolgado assim desde que anunciaram que o acordo entre a Sony e a Disney para o Homem Aranha aparecer no filme da Guerra Civil, e ele julgava aquele dia um marco da sua vida. Talvez tenha sido a lembrança daquele sentimento, ou a certeza que ele seria o novo Robin e ela o seu Batman, que o fez seguir a garota que ia à direção do último ladrão dentro do cofre do banco.
Pierrot ajeitava os babados de sua roupa enquanto a funcionaria abria o cofre do banco. Ele era uma figura excêntrica, podia jurar que ouvia seu fuzil M16 reclamar de tédio então resolveu pegá-lo, chamar uns palhaços e fazer um assalto só por diversão. Esperava que a garota fosse tentar prendê-lo de novo, ele estava doido pra ver o circo pegar fogo mais uma vez. Ele sorria debilmente em ver a funcionaria morrer de medo. Pierrot era triste e melancólico, com um olhar permanentemente choroso, precisava fazer coisas assim para ter algum prazer, por que ser tão sério, não é? A vida é curta demais sem um pouco de caos.
E o caos havia acabado de chegar.
- Roar! Roar! Pensei que não viria! – Ele disse rindo. – Diga oi para o meu amiguinho! – E atirou com o fuzil. Na direção da mulher e em todas as direções. A funcionária gritou e se jogou no chão chorando, pulou e se encolheu atrás da porta principal que separava o cofre da área administrativa do banco. Roar assumiu uma posição ameaçadora, como se fosse uma leoa pronta para o bote. Pierrot não havia atirada para acertá-la, se ela morresse assim tão fácil com quem ele se divertiria?
- E eu pensei que você tinha levado a sério a ideia de ir a um psiquiatra. – A voz veio da figura encapuzada como um rugido.
Não era a primeira vez que se encontravam, Roar vivia tentando capturar e fazer Pierrot pagar pelos seus crimes, mas apesar de louco, o palhaço era um gênio e viva escorrendo por entre seus dedos.
Roar atacou, o palhaço jogou o saco cheio de dinheiro em sua direção e aproveitou os segundos que Roar levou para desviar para criar vantagem e socar a mulher no estômago, desequilibrando a heroína de . Pierrot girou e tentou atingir um chute na mulher, que usando seus reflexos avançados conseguiu pegar o pé de seu inimigo e torcê-lo.
estava vidrado, o que antes era um amontoado de covardia agora era um amontoado de hormônios. Roar era incrível, ele não acreditava no amor à primeira vista que aquelas porcarias de comédias românticas nojentas pregavam, mas assim que ela tomou o fuzil das mãos de Pierrot e entortou o cano com sua força sobre humana, ele teve a certeza que havia encontrado o sangue do seu Tarantino, o Johnny Depp de seu Tim Burton, ou melhor, a Angelina Jolie do seu Brad Pitt. O cinéfilo pegou o celular do bolso e tentou filmar, poxa, ele não planejava divulgar nem nada, só queria ter uma lembrança da super heroína de nova York, mas escondido atrás da porta ele não ia conseguir mais que dois borrões se atracando, então tomando um gole de coragem e um porre de estupidez, começou a andar devagarinho tentando se aproximar da luta.
Roar girava em seus calcanhares para desviar dos socos frenéticos de Pierrot, o ladrão ria e cantarolava enquanto eles brigavam. Roar tinha de por aquele lunático atrás das grades, dessa vez não podia falhar. Ela finalmente estava tomando vantagem, Pierrot era um ótimo lutador, mas já mostrava sinais de cansaço, enquanto o super corpo de Roar poderia lutar o dia inteiro.
Ela acertou um chute no rosto do meliante, que o desarmou do soco que preparava e possibilitou que ela torcesse seu braço para trás, usando a força de um gorila, ela jogou o bandido no chão e conseguiu rendê-lo. A funcionaria, que ainda estava ali, soluçou e começou a caminhar trôpega quando percebeu que o homem estava momentaneamente incapacitado.
- Vou chamar a policia. – Disse entre lágrimas. Até que enfim, Roar pensou.
Mas Roar cometeu um erro, acreditou que o fuzil era a única arma que Pierrot tinha, e não percebeu a faca escondida na manga do palhaço. Ele conseguiu acertar o rosto da mulher com uma cabeçada, e aproveitou que o golpe surpresa fez com que ela afrouxasse o aperto por um segundo para acertar uma facada na lateral de sua perna esquerda. Ela reprimiu o murmúrio de dor e o palhaço conseguiu ficar em pé mais uma vez.
, que estava tendo o seu momento paparazzi, no entendo, não conseguiu reprimir um grito de horror quando viu a mulher ferida, chamando a atenção para si. Pierrot conhecia sua inimiga, sabia que ela prezava mais pela vida dos civis do que qualquer outra coisa. Era a oportunidade perfeita.
O palhaço agarrou pelo pescoço e mirou a faca, suja com o sangue de Roar, em sua jugular. O homem, assustado, deixou o celular cair no chão ao ser pego de surpresa. Roar encarou a cena atônita, sabia que o palhaço descartaria a vida daquele rapaz facilmente se tivesse vontade. De onde ele tinha vindo, aliás, quando usou seu radar só havia percebido a funcionário e Pierrot na sala do cofre. Será que ele tinha entrado depois da luta começar? Que tipo de doido faria isso?
- Roar, Roar, querida, vá para dentro do cofre ou o garotinho aqui vai virar um chafariz vermelho.
- Não consegue me vencer de formas justas, Pierrot? Você sabe que assim que eu sair de lá vou te procurar até no inferno.
- Selvagem, se você quiser me morder agora vai sacrificar a vida desse rapaz aqui, você sabe que eu não dou à mínima, mas imagine a família do coitadinho? Vão ter que usar uma super cola pra cabeça ficar no lugar quando eu terminar com ele.
- Que garantia eu tenho de que você vai poupá-lo? – Ela estava odiando cada segundo, odiava negociar com o bandido, mas seu juramento era de sempre proteger a vida dos civis, ela já havia provado o quanto aquela faca era afiada, a dor em sua perna não a deixava esquecer, não haveria velocidade o suficiente para impedir Pierrot.
- Eu o deixo no cofre com você. – O vilão sorriu.
Roar começou a recuar devagar, andando de costas na direção do cofre, se perguntando quantos minutos levaria para quebrar aquela porta de ferro enorme para ir atrás do palhaço e garantir que ele nunca mais machucaria ninguém. Tempo o suficiente para ele matar várias outras pessoas, ela esperava que ao menos a polícia estivesse chegando.
estava se sentindo prestes a urinar nas calças, mas dizem que em nos momentos de perigo algumas pessoas tem rompentes de adrenalina e lutam mesmo sem coragem, quando estavam na entrada do cofre, agarrou a mão que segurava a faca em seu pescoço e começou a se debater, tentando se livrar do apertão. Roar aproveitou a deixa e a falta de concentração de Pierrot para acertar uma cotovelada em seu rosto e livrar o civil da ameaça, o jogando para dentro do cofre para tirá-lo da confusão, ela estava torcendo o braço em que o palhaço trazia a faca quando ele golpeou o seu ferimento e a desestabilizou, chutando para dentro do cofre também.
- Roar, Roar, querida, você devia ter mantido sua palavra. – Aparentemente, Pierrot sempre tinha uma carta na manga, porque puxou um explosivo e sorriu. – Vou fazer um truque de magica! Agora você vê...
Ele fechou a porta do cofre e os trancou lá dentro. Roar correu trôpega pela dor na perna. Podia ouvir o tique e taque dos explosivos.
-... Agora você não vê! – Ouviu a voz do palhaço ao longe.
Pierrot armou os explosivos na sala do cofre e correu, tinha um minuto para fugir e aquilo seria tempo mais do que o suficiente. Mais uma vez escapou pelos dedos de Roar. Tinha sido divertido para ele, já Roar estava bufando de raiva dentro do cofre.
- Droga, Droga... – Ela socou a porta do cofre. Porcaria de banco, aquela porta era um inferno de pesada. Seus socos afundaram e deixaram marcas no ferro, mas eles não conseguiriam passar pela bomba em tempo, os bips ficavam cada vez mais rápidos...
- Droga! – Ela correu na direção do civil que ainda estava aturdido no fundo do cofre e o abraçou para que o corpo dela fosse um escudo para ele.
O chão tremeu com o som de um trovão. O banco explodiu.
se sentiria realizando aquele sonho infantil de ser salvo pela Mulher maravilha, se não visse que a coisa estava séria demais pra sentir qualquer outra coisa que não fosse medo. Ele nunca tinha ouvido um estrondo tão alto, seus ouvidos zuniam e ele jurava que o chão continuava tremendo, ou era seu corpo? Ou era o corpo de Roar?
- Tudo bem? Feriu-se? – A mulher perguntou se afastando dele. Ela ajeitou o capuz, tirando a poeira da explosão. não conseguia ver mais que lábios carnudos e a ponta de um nariz saindo da máscara.
- Estou bem. – Ele respondeu. O cofre era realmente de segurança máxima, as paredes tremeram e soltaram poeira, mas não cederam. A prisão improvisada continuava intacta.
Roar assentiu positivamente e foi tentando se colocar de pé, mancou levemente com a perna que havia levado a facada.
- Você está ferida. – disse segurando o braço dela de forma carinhosa para que ela não se levantasse, por baixo da mascara as sobrancelhas de Roar se franziram. Era só um cortezinho, nada com o que ela não estivesse acostumada.
- Vai curar rápido, posso me regenerar feito uma lagartixa.
- Vai crescer uma cauda em você? - riu da piada boba e Roar olhou feio.
- hnn... quando as lagartixas perdem a cauda, ela nasce de novo, sabe.... – Ele tentou explicar.
- Preciso sair daqui e ir atrás do Pierrot, não tenho tempo para piadinhas.
- Ele já deve estar bem longe daqui e você ainda sangra!
- O que você sugere? – Roar perguntou impaciente. Não acreditava que tinha deixando Pierrot escapar mais uma vez! Quantas vezes ele conseguiria ser mais esperto que ela? Mais quantas vítimas ele faria se não fosse detido logo? E ela ali jogando conversa fora com um civil!
Um civil que estava desajeitadamente tentando rasgar a barra da camisa.
- O que você esta fazendo? – Roar perguntou olhando o rapaz que parecia ficar nervoso.
- Nos filmes parece ser tão fácil! Caramba... AH CONSEGUI! – Ele disse puxando a barra que se descosturava com um som estridente, deixando parte da barriga – que era até bem definida para um civil normal – à mostra.
- Com licença. – disse e envolveu a perna de Roar com o pedaço de pano rasgado, pressionando o ferimento para estancar o sangramento, e amarrou. Ela ficou olhando, achando graça do rapaz, a facada não doía e estaria completamente cicatrizada em algumas horas, mas deixou que ele fizesse o curativo. Ele estava certo dizendo que Pierrot já havia fugido, de qualquer forma.
- Viu só? Fiz um curativo em você, isso prova que sou o mocinho. – Ele disse ameaçando um sorriso.
- Claro. Será que agora posso nos tirar daqui agora? – Roar respondeu e se levantou.
O cofre parecia intacto por dentro, mas os dois não podiam ver a quantidade dos escombros que caíram em cima dele. Estavam praticamente soterrados pelas paredes do banco, a polícia chegava ao local e conversava com as testemunhas, por sorte não houveram vitimas, quer dizer, um dos ladrões que ficou desacordado morreu no meio da explosão, os outros fugiram em tempo junto de Pierrot, que havia desaparecido.
Dentro do cofre, Roar invocava a força de um Gorila e, ao invés de socar de forma aleatória, focou os golpes na fechadura. Apesar das luvas protetora que usava, ela sentia os dedos arderem. A porta do cofre era muito pesada e espessa, foi difícil, mas a fechadura cedeu e se arrebentou. Roar começou a empurrar e descobriu que o caminho estava bloqueado pelas paredes destruídas do banco, não conseguia forçar o suficiente para que pudessem abrir a porta.
- Acho que temos um problema. – Roar disse vendo as pedras pela festa da porta, o máximo que sua força conseguiu empurrar. Estava alheia ao fato de que estava mentalmente comparando a garota com a Mulher Maravilha
- Qual problema? – Ele perguntou.
- Os escombros estão bloqueando a porta, não vai ser tão fácil assim sair daqui.
- Você não consegue removê-las? – Ele perguntou. Bem que gostaria de ser o Super Homem e poder ajudar, mas ele podia no máximo ser um Steve Trevor, e sejamos francos, ninguém liga para o Steve Trevor.
- É o que estou tentando fazer, não percebeu?
Talvez Roar fosse mais simpática nas notas dos jornais.
I got the eye of the tiger, a fighter, dancing through the fire
'cause I am a champion and you're gonna hear me ROAR
Nova York, 23 de Abril de 2015.
14:53 P.M. – A tarde nos destroços do BNY Mellon
Os bombeiros e os policiais trabalhavam procurando alguma vítima nos escombros. A funcionária que havia chamado a policia havia dito que Roar estava no cofre lutando com o palhaço quando tudo explodiu. Aquela mulher havia sido a última civil a sair antes da explosão, ou ao menos era o que pensavam. Ninguém tinha visto Pierrot e os comparsas saírem sorrateiramente antes do banco vir à baixo. Mas quando acharam o corpo do capanga que ficou para trás, uma pequena esperança se acendeu no coração dos policiais. Eles queriam pegar Pierrot tanto quanto Roar, de fato, alguns deles queriam inclusive pegar Roar. Nem todos aprovavam a ideia de uma mulher se disfarçar e fazer o trabalho da polícia, por isso era tão importante Roar se manter em segredo. Ela só esperava que quando conseguisse sair do cofre fosse capaz de se esconder antes que algo pior acontecesse.
Mas para sair de lá ela precisava remover as pedras que prendiam a porta do cofre, por isso Roar invocava todos os animais possíveis para forçar passagem.
- Acho que isso não deve fazer muito o seu estilo. – dizia as costas de uma Roar que lutava contra o peso da porta. – Mas e só nós ligássemos para alguém e pedíssemos ajuda?
- E você sugere que liguemos para quem? – A mulher retrucou.
- Não sei, você não tem algum tipo de celular especial? Para chamar reforços quando a coisa fica feia, sabe, uma linha direta com a sua Bat Caverna? – sugeriu, Roar revirou os olhos. Porcaria de quadrinhos! Bem que ela queria ter uma Bat Caverna no lugar de uma Bat prestação de aluguel atrasada.
- Seria mais fácil você ligar para alguém, eu trabalho sozinha.
- Eu perdi meu celular. Caiu quando eu estava tentando filmar você. – disse pesaroso.
- Quando você estava tentando o que? – Roar parou de fazer força contra a porta e se virou para encarar o rapaz.
- Ah – sentiu suas bochechas esquentarem. – Eu queria uma recordação, sabe...
- Não acredito! – Roar exclamou alto – Eu perdi a chance de capturar o Pierrot por causa de um jornalista doido? Que droga você tem na sua cabeça? Não acha que prender um louco assassino é mais importante que a porcaria da materiazinha de fofoca de vocês? – Roar deu alguns passos pesados na direção de , e ele teve a certeza de que ela tinha os olhos de um tigre prestes a capturar uma presa.
- E-e-eu não sou jornalista, não queria fazer fofoca nenhuma! Desculpe, eu só sou um fã.
- Um o que? – Roar parou, o encarando confusa. Quando ele disse que queria filmar ela teve a certeza de que ele era mais um dos paparazzi doidos que se metiam em perigo para tentar descobrir como era o rosto que o capuz escondia. – Você é maluco ou bateu a cabeça na explosão? Se enfiou na minha batalha porque queria uma recordação?
- Você é uma super heroína real! Você salva pessoas e tem super poderes! – O homem disse gesticulando com as mãos, para mostrar a grande dimensão daquelas palavras. Ele achava que ela era uma heroína dos filmes, ela achava que não fazia nada além da sua obrigação.
- Isso é maluquice demais até para mim, você se botou em perigo!
- Eu achava que a sua vida era um filme de ação! – Ele deu de ombros.
- Achava é? Não acha mais? – Roar arqueou as sobrancelhas. Ela ainda não confiava plenamente no garoto, mas as imagens do celular haviam se perdido na explosão de qualquer forma.
- Bem, desde que estamos presos aqui você agiu meio mal humorada, me chamando de maluco! Quer dizer, antes eu tinha uma teoria de que você era uma divindade vinda de algum planeta distante com uma raça superior aos mortais, mas agora acho que você é só humana mesmo.
Roar não pode evitar cair na gargalhada. Ela? Uma divindade?
- Achou que eu tinha vindo de Krypton, é? – Essas porcarias de quadrinhos de novo! Porcarias de adaptações que fizeram todos acharem que Roar nunca falharia. Já estava perdendo as contas de quantas vezes havia falhado e deixando Pierrot escapar.
- Sabe o que dizem, você só ganha sua carteirinha de nerd quando monta uma teoria e posta na internet.
- Por favor, não me diga que você e dono de algum fã clube meu, ou eu vou pensar seriamente em te deixar preso aqui.
- Bom, se eu te conhecesse na época da minha adolescência eu provavelmente teria feito um, mas agora eu já estou velho demais pra isso. – e Roar riram. Era engraçado como a cada segundo a super heroína misteriosa se parecia mais com uma mulher comum. Bem, não exatamente comum, mas uma mulher real.
- Agora eu estou começando a considerar mordidas de animais radioativos.
- Eu provavelmente morreria de câncer com a quantidade de mordidas e picadas que ia ter que levar. – Roar sorriu entrando no clima das piadas. Ele nunca acertaria sua origem, e ela nunca contaria, mas era divertido ouvi-lo teorizar tantas bobeiras.
Mais determinada a salvar o garoto e a si mesma, Roar tomou fôlego e voltou a forçar a porta. As rochas estalavam alto e se partiam com a sua força sobre humana.
- Algum acessório mágico, tipo um anel verde? Ou quem sabe você foi voluntária para um teste do governo?
- Quem sabe, não é? Talvez eu seja uma mutante. – Mais rochas se partiram fazendo uma nova camada fina de poeira entrar no cofre.
- Bem possível, mas aí teríamos mais heróis e você é a única. Mas você pode ser uma milionária com alguma história trágica?
- Bem que eu gostaria da parte milionária.
- Então vou ter que continuar enraizado na minha teoria de que você é uma alienígena.
- Quem sabe, não é? Eu não disse que esses palpites estão errados.
- Bem, o que eu sei é que você é um mistério.
As mãos de Roar doíam de tanto forçar a porta. Lá fora, os policiais e o resgate também começavam a sentir suas esperanças murcharem a medida que não encontravam nada nos escombros. deveria estar preocupado com o seu trabalho, mas na verdade não estava se importando com o que o senhor Jameson ia dizer quando ele voltasse depois de perder uma tarde toda de expediente. Não era culpa dele, o assalto e a explosão com certeza foram anunciados nas mídias, então talvez ele não fosse demitido. Ele só começou a se perguntar se ser demitido seria tão ruim assim. Ele nunca gostou do emprego, mas não podia negar que gostava da estabilidade e do salário fixo. Era covarde demais para arriscar tudo e investir nos seus sonhados roteiros. Mas, caramba, como ele podia ter medo de ter que passar algumas dificuldades financeiras enquanto havia uma mulher destruindo pedras com as próprias mãos para salvá-los?
Quem liga para o senhor Jameson? Pro inferno ele e as comédias românticas sem graça. Quem liga para as contas? Ele queria ser roteirista desde criança, então ele seria roteirista! Chega de inventar desculpas! Roar salvou sua vida, então ele ia vivê-la!
Quando Roar conseguiu abrir a porta o suficiente para que pudessem passar, começou a abrir passagem pelos destroços, criando uma espécie de túnel rápido. Ela guiava e o protegia das pedras maiores, embora em segundos eles já estivessem cobertos de sujeira e poeira, estavam conseguindo sair sem ferimentos graves. Não demorou muito até que eles pudessem ver os feixes de luz dentre as pedras. A mulher checou sua máscara e seu capuz quando ouviu uma voz.
- Tem algo se mexendo naquela direção! – Um dos bombeiros gritou chamando a atenção dos policiais e dos curiosos. Roar teria de ser rápida para se esconder de todos aqueles olhares.
Bem, Roar se sentiu estranha. Claro que ela não queria ficar soterrada para sempre, mas era difícil relaxar na presença de alguém. Aquele civil desconhecido tinha, com suas piadinhas, se aproximado mais da verdadeira personalidade de Roar do que qualquer outro. Ele não sabia nada sobre ela, mas ele havia feito a mulher se sentir à vontade, o que era um grande feito Isso já o tornava uma pessoa diferente daquelas que ela conhecia.
Usando o seu corpo mais forte para proteger o humano quando os bombeiros começaram a remover e revirar os restos do banco destruído de cima dos dois. Roar olhou bem no roso do homem, que estava coberto de poeira e sorriu.
- Bom conhecer você, espero que não se meta em encrenca de novo. E nunca mais tente tirar filmar pessoas sem a permissão delas, deixe isso para as fãs de boybands.
- Uma faca no pescoço e uma explosão me ensinaram a lição, não se preocupe.
- Sobreviventes! Sobreviventes! – A voz do bombeiro gritou e Roar usou a força para impulsionar para cima, eles estavam livres.
- Ei, meu nome é ! – Ele disse olhando a garota assustado. De alguma forma ele sabia que logo não ouviria mais a sua voz.
- Desculpe, você não pode saber o meu.
- Foi um prazer te conhecer. – respondeu com um sorriso. Ele não precisava de um nome para conhecê-la.
E foi içado pelos bombeiros.
Ele ouvia várias vozes ao seu redor. Vozes nervosas de policiais gritando, vozes preocupadas de paramédicos o examinando, vozes curiosas que especulavam quem era ele. Ele sabia que ela precisava sair fugir de lá, havia se mantido em segredo por tanto tempo, não poderia trazer tudo ao público agora. Como uma forma de agradecimento e redenção pela sua tentativa idiota de filmá-la, começou a armar um enorme teatro, fingindo dores que não sentia e confusões mentais que não tinha para chamar a atenção do maior número de pessoas que podia.
- Tudo explodiu em cima de mim! Feito uma luz, acho que bati a cabeça! Minhas costelas doem! Aquele bandido louco apontou uma faca para mim! – Ele gritava e gesticulava, vários paramédicos vieram segurá-lo para que conseguissem deitá-lo em uma maca e vários policiais apareceram sedentos por depoimentos.
Mas, gradativamente, as vozes curiosas se transformaram em um grito que ele não queria ouvir, a multidão chamava por Roar.
Roar queria olhar para de novo, mas não pode, assim que teve uma brecha deu um de seus super saltos, correu como um guepardo até o prédio mais próximo e o escalou como um esquilo.
Roar desapareceu de novo.
Oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh You're gonna hear me roar
Nova York, 24 de Abril de 2015.
20:14 P.M. – A temida noite do encontro de Miller
- Ela esta atrasada de novo. – Jenn revirou os olhos para seu noivo, Leo, quando a amiga dela, , ia deixar de ser tão paranoica? Ela não entendia porque ela fugia tanto de relacionamentos e pessoas novas.
Será que ia fugir do compromisso de novo? O coração de Jenn gelou quando o amigo do namorado se aproximou sorrindo da mesa deles.
- Eu ainda não sei como vocês me convenceram a fazer isso. – sorriu, ele também não estava acostumado com um encontro às cegas.
- Como vai, cara? – Leo riu. – está um pouco atrasada, sente-se com a gente. Tenho certeza que você tem uma boa história para nos contar.
revirou os olhos como se estivesse entediado. Claro que todos sabiam que ele adorava aproveitar seus 15 minutinhos de fama.
- Bem, pedi demissão hoje e estou decidido a investir nos meus roteiros. Fora isso, só estou nos jornais porque fui parte de um assalto a banco e resgatado por uma super heroína real, nada demais. – sorriu.
- Realmente, Jenn, esse é um cara realmente diferente dos outros.
deu um pulo na cadeira quando ouviu uma voz feminina atrás de si. Era ela? O seu encontro?
- , finalmente! – Jenn sorriu genuinamente feliz em ver a amiga, apesar dos apesares, ela se importava verdadeiramente com .
- Esse é o , amigo de faculdade do Léo e futuro roteirista de sucesso. – Jenn sorriu e se levantou para cumprimentar a mulher. Ela era inegavelmente bonita e surpreendentemente familiar.
- É um prazer conhecer você, .
- O prazer é meu. – A garota respondeu sentindo algo novo agitar no seu peito. Relacionamentos sempre seriam complicados para uma pessoa como ela, mas pela primeira vez ela sentia que valia a pena tentar.
I went from zero, to my own hero
Nova York, horário desconhecido.
O prazer de Pierrot
O palhaço Pierrot sorriu. Seu sorriso maníaco e psicótico, ele estava dois passos na frente dela agora, agora sim ele teria diversão de verdade. Aquele civil idiota, como ele foi útil!
Na tela do celular, um vídeo rodava, ele não podia ter certeza ainda mas logo teria, logo a encontraria. Aquela fração de segundos em que o capuz se mechia e revelava um pouco mais das suas feições seria o suficiente, ele sabia que seria, sentia que seria.
- Roar, Roar, nós vamos brincar de novo...
FIM?
Nota da autora: Que fic difícil! Meu Deus, não tinha muita experiência com cenas de ação e pancadaria, espero que tenham gostado. Bem, se quiser me encontrar, entre no grupo do Facebook ou mande um tweet ou uma ask. Leia também Radioativo e Úrsula aqui no FFOBS!
Epa, você já esta de saída? Não aprendeu que filmes de heróis sempre têm uma surpresa depois dos créditos?
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Epa, você já esta de saída? Não aprendeu que filmes de heróis sempre têm uma surpresa depois dos créditos?
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