Capítulo Único
Um barulho ensurdecedor soava pela catedral, no meio da cerimônia. Era um som macabro, como se viesse do inferno, como se as portas do inferno estivessem se abrindo. Aquele barulho podia ser ouvido por toda a cidade. Todos sentiam aquele frio na espinha, mas não sabiam o que estava por vir.
apertou a mão de seu pai, que a abraçou.
— Irmãos, Deus é o único que pode… — antes que o Padre pudesse terminar a frase, todos os vidros da igreja se partiram em mil pedaços.
Aquilo era mau presságio, todos se abaixaram e Charlie protegeu com seu corpo.
— , você está bem? — Perguntou ele.
— S-sim, o que foi isso, pai?
— Isso foi sinal de mau presságio, filha.
Parece que quanto menor a cidade, maiores eram as suas superstições. Mas ele estava certo, aquele barulho e os vidros se quebrando eram um sinal: as portas do inferno se abriram e o mal andaria sobre a terra.
A cidade parecia um caos, alguns gritavam que era o apocalipse, enquanto Charlie dirigia a viatura da polícia, tentando levar para casa. O lindo dia ensolarado, havia se transformado em um céu escuro, trazendo a escuridão para o dia.
Do outro lado da cidade, saindo do cemitério, estava o príncipe do inferno, . Com uma jaqueta preta e pose de bad boy, ele andava tranquilamente pela cidade, em meio ao caos.
Despertando a atenção de todos, ele era o mal que andava sobre a terra, mas parecia um anjo que havia pousado dos céus.
— Fala sério! Essas portas tinham que ser no cemitério? Que clichê, talvez eu precise arrumar outro lugar para os portões do inferno, isso estragou minha entrada deslumbrante. — Disse ele, pensando alto.
Analisando a cidade, não era bem aquilo que ele esperava, mas ia servir, ninguém aguentava tanto tempo no inferno torturando almas. Nem mesmo Lúcifer aguentava, a prova disso era , fruto de suas aventuras pela terra.
A análise da cidade fez ele concluir que deveria ser mais sutil em suas atitudes, senão o papai ficaria zangado.
Enquanto todos se protegiam dos ventos e da tempestade que estava para começar, andava tranquilamente pela cidade, até que pisou em algo que parecia ser um colar e despertou sua atenção.
— ! — Disse o homem que estava parado na viatura, enquanto uma menina de vestido branco corria em sua direção.
— Isso é seu? — Perguntou , olhando para a menina, que parecia em choque.
— S-sim, obrigada. — Respondeu ela, pegando o colar da mão do homem.
— , o que estava pensando? — Perguntou Charlie, aproximando-se dos dois.
— O colar da mamãe, caiu pela janela da viatura. — Respondeu ela, cabisbaixa.
— Ah… — Charlie mudou a expressão, mas voltou para a cara de bravo quando pousou os olhos em . — E você quem é? É novo na cidade?
— Ah, sim! Eu vim para montar uma banda, soube que existem várias pessoas talentosas aqui, dispostas a venderem suas almas para obter sucesso. — Respondeu ele.
— Bom, isso é verdade. — Disse Charlie. — Mas você escolheu um péssimo dia para chegar, a sensação que temos é que as portas do inferno se abriram.
quis rir disso, mas apenas pousou seus olhos em , que o encarava curiosa.
— É um belo colar. — Disse ele, segurando o colar.
— Era da minha mãe. — Respondeu , ele olhou fixo para o colar e lançou uma pequena maldição. E sorriu, entregando o colar novamente para a garota.
— Você sabe para onde ir? — Perguntou Charlie.
— Sim, eu vou encontrar um conhecido. — Ele sorriu, não entendia aquele misto de sentimentos que aquele sorriso e aquele olhar traziam, mas aquele garoto parecia uma obra divina.
Ele acenou para e Charlie, e seguiu seu caminho — o conhecido que ele iria encontrar, era o demônio que fazia acordos de alma.
ficou em transe por um bom tempo, até que Charlie a despertou.
— Rapaz esquisito. — Disse ele, puxando a filha pelo braço.
ficou hipnotizada, mas entrou na viatura para seguir o caminho de casa.
era uma menina doce, que havia perdido sua mãe muito cedo. Seu pai, Charlie, era xerife da pequena cidade Silvertown.
Ela estava deitada em sua cama, encarando o colar de sua mãe e lembrando daquele rapaz estranho, até que ela notou algo diferente, mas achou que era apenas um arranhão, por ter caído de sua mão pela janela do carro. Ela olhava as fotos na cabeceira da sua cama, suspirou e se sentou, entrando no Instagram, e começou a ver fotos de seus amigos, a noite caiu e ela continuou olhando, estava com preguiça de levantar para ligar a luz.
Quando viu uma foto de Ashley com Nick, seu ex-namorado e sua melhor amiga, que estava ruiva, para combinar com o cabelo do namorado, ela se jogou na cama e bufou.
— Queria que esse cabelo caísse na frente de todo mundo, ia ser épico! — Ela imaginou a cena acontecendo, e naquele momento o colar da sua mãe começou a brilhar.
Do outro lado da pequena cidade, ouvia seu desejo e sorria, ele já estava começando a se apossar da alma dela aos poucos.
— Cuidado em fazer pedidos no escuro, querida. — Disse, estalando os dedos e concedendo o pedido.
, que encarava curiosamente o colar, sentia uma dor no seu pulso e de repente, apareceu um ponto preto, ela passou o dedo em cima e parecia uma tatuagem — o que era muito curioso. Ela estava confusa, mas apenas desceu para comer com seu pai.
— Hey. — Disse ela, chegando na sala de jantar e colocando as mãos nos ombros do pai, que estava tenso. — O que foi? — Perguntou ela, preocupada, sentando-se ao lado do pai.
— Vamos ter que vender a casa. — Ele suspirou, segurando uns papéis. — As contas do hospital, não tenho como pagar.
Ela fez uma expressão triste.
— Depois pensamos nisso, não devemos trazer problemas à mesa na hora da refeição. — Disse ela, imitando sua mãe.
Seu pai sorriu, lembrou-se da falecida esposa e assentiu.
Depois do jantar, tirou a mesa e lavou a louça. Foi para o quarto dormir, no dia seguinte teria escola.
Antes de dormir, ela analisou a marca no seu pulso, mas como não tinha nenhuma explicação, ela ignorou e se deitou.
⸸ ⸸ ⸸
No dia seguinte, o dia foi como todos os outros, enquanto almoçava na cantina da escola, ela via Ashley desfilando com Nick, achou curioso o fato dela estar deixando um rastro de bolos de cabelo enquanto andava.
— Ashley, seu cabelo... — disse Nick, olhando para o chão e passando a mão no cabelo da garota, que colocou a mão para ver o que estava acontecendo e uma boa parte do seu cabelo caiu.
Ela começou a gritar e quanto mais suas amigas passavam a mão para tentar arrumar, mais cabelo caía.
se assustou e encarou o colar, ela se lembrava da pedra vermelha nele ter começado a brilhar quando ela disse aquilo. Será que a herança de sua mãe para ela era um colar mágico que concedia desejos? Aquilo era incrível, ela não via a hora de chegar em casa e tentar de novo.
O dia inteiro passou depressa, tanto a escola quanto o trabalho na cafeteria. No caminho para casa, via cartazes de pessoas desaparecidas, de um dia para o outro cinco pessoas desapareceram. Por isso Charlie não pôde ir buscá-la, ela aproveitaria para testar o colar.
Após fazer o jantar, para quando seu pai chegasse estar tudo pronto, ela subiu para o seu quarto, fechou a porta e pegou o colar nas mãos.
— Eu desejo ter dinheiro para pagar as contas do hospital e não precisar vender a casa. — Disse, esperando o colar brilhar.
tinha acabado de escutar aquilo e ele estava feliz, agora que ela pediu sabendo que poderia se realizar, ela havia feito um contrato com ele. Que apareceu na frente dela, fazendo-a se assustar.
— O-o que você tá fazendo aqui?
— Seu desejo foi concedido. — Ele se aproximou e beijou a garota. — Tome cuidado ao fazer desejos no escuro, nunca se sabe quando eles podem atingir sua meta. — Ele sorriu, malicioso.
— Foi você? — Perguntou, incrédula, com os olhos arregalados.
— Sim, e agora eu só preciso te tirar da jaula. É como eu sempre digo, eu sou a raiva das jovens amantes, que só precisam de uma faísca para se incendiar. — Ele segurou o braço dela, onde o ponto no pulso havia se transformado em um símbolo. — Não tenha medo, agora você pode ter tudo que quiser. — Disse ele, antes de desaparecer.
A garota encarava a marca em seu braço e não sabia o que fazer. Ouviu seu pai chegando, parecia estar falando no telefone. Ela correu para colocar uma blusa de manga e esconder aquilo no seu pulso, e desceu para o jantar.
— ! — Disse Charlie, parado em frente à escada. — Você não vai acreditar, parece que um tio distante da sua mãe morreu e deixou todo o dinheiro para você!
Ela arregalou os olhos, o desejo tinha se realizado, mas alguém tinha morrido.
— “T-tudo” quer dizer quanto? — Perguntou ela, indo em direção à sala de jantar.
— É suficiente para pagarmos as contas do hospital e ainda sobra.
Ela sorriu ao ouvir aquilo, apesar de saber que talvez houvesse consequências, ela sabia que a última coisa que seu pai queria era vender aquela casa, com tantas memórias e momentos bons.
Ela passou o jantar todo em silêncio, pensando no que teria que fazer para recompensar aquilo. Ela queria perguntar do que esse parente havia morrido, mas tinha medo de carregar uma morte nas costas.
Ela sentia o que deveria fazer. Após terminar de lavar as louças, ela saiu pela porta dos fundos e por algum motivo estranho, ela sabia exatamente para onde ir.
— , você se arriscou com essa garota. — Disse Brad.
— Não se preocupe, ela virá até nós. — Respondeu ele, enquanto terminava de arrumar o cabelo.
O barulho da porta rangendo ao se abrir tomou conta do camarim escuro.
— Não disse? — sorriu e se virou para , que pela expressão, estava sentindo um mix de emoções.
— O que você fez comigo? O que você quer de mim? — Perguntou , e Brad gargalharam.
— Você fez isso com você mesma, eu não te obriguei a fazer desejos. — Respondeu, ainda rindo.
— Mas foi só uma coisa boba de adolescente. — Ela abaixou a cabeça.
— Os cabelos caindo? — Ele riu. — Sim, foi, mas fez mal a alguém, não fez? E depois, você foi gananciosa e pediu dinheiro.
— Era para pagar as contas do hospital de quando minha mãe estava doente!
Ele notou que seus olhos estavam cheios de água e se aproximou dela, colocando o polegar em sua bochecha.
— Você está com medo? — Ele sussurrou em seu ouvido e ela assentiu.
— … — Brad tentou interrompê-lo.
— E é bom ter medo… — Ela sentiu um frio na espinha. — Porque nesse meio tempo, eu estou apenas sonhando em acabar com você. — Os olhos dele mudaram de cor e ela ficou mais assustada ainda. — Você está presa a mim.
— E o que você quer que eu faça? — Perguntou com determinação.
— Você vai se juntar aos outros e participar da colheita.
— Que colheita? — Ela estava confusa.
— Conseguimos reunir uma boa parte de pessoas nesse show de hoje e queremos o máximo de almas possíveis. — Explicou Brad, entregando uma adaga, que parecia ser de ossos para ela. — Só precisamos de um corte, caso alguém se negue, pode usar a faca sem dó. — Brad e se entreolharam e ela encarou a faca.
— Usar sem dó? E matar pessoas? — Perguntou, assustada.
— Tecnicamente enviá-las para o meu pai. — Respondeu .
— Seu pai?
— Sim, querida, Lúcifer. — Ele sorriu. — Eu não te disse que estou em detalhes com o diabo? Me perdoe, você vendeu sua alma para o príncipe do inferno.
Ela não conseguia processar a quantidade de informação que havia recebido em tão pouco tempo.
— Chega de papo, o show vai começar, pega a faca e vai! — Ordenou Brad e assim ela fez.
Ela estava assustada e queria dizer para as pessoas correrem dali, mas ela tinha medo do que poderia acontecer com seu pai, então ia obedecer.
O show começou e ela riu quando viu que era o cantor.
— Ei, garota nova? — Perguntou um garoto, mais ou menos da sua idade, que ela não se recordava se conhecia ou não. — Você deve perguntar o que eles mais desejam na vida e cortar a mão deles, para o desejo ser concebido. — Ele deu uma piscadela e voltou a posição que lhe havia sido dada.
Ela andava livremente pelo show, a observava, andando por aí como um anjo bom, ela havia sido a escolha perfeita. Concedendo desejos, afundando as pessoas junto com ela e tão assustada que não pensou sequer em orar ao Deus que ela orava todo domingo. Talvez porque ela havia perdido a fé quando sua mãe morreu e era grato por isso, porque Ele viria, se ela chamasse.
As chamas dos efeitos especiais brilhavam no palco, quando ele sentiu, ela realmente parecia um anjo bom e isso fez com que um grupo de homens quisesse se aproveitar dela, e ela fez exatamente o que Brad tinha mandado.
Após matar o primeiro, ela estava assustada, mas ela tinha a faca e a marca, ela iria querer mais. Era sobre isso que ele estava falando quando disse que a tiraria da jaula. Sua alma não estava mais apenas em suas mãos, se aquilo acabasse, ela iria com ele.
Após o show, todos se reuniram no camarim, estava com um sorriso malicioso.
— E então, meu anjo? Como foi seu primeiro dia? — Ele perguntou, com o polegar na bochecha de , que agora tinha o olhar diferente de antes.
Um olhar que antes era de medo, parecia bem mais obscuro.
— O que você quer que eu diga? — Respondeu.
— Você quer mais? — Ele sussurrou no ouvido dela e, de repente, aquela sensação estranha tomou conta da cidade de novo.
O barulho de portas rangendo era ensurdecedor. Um homem de terno preto e aparência tão bonita, que, diga-se de passagem, parecia angelical.
virou os olhos e todos ficaram abismados.
— Senhor! — Brad se curvou.
— , o que você fez aqui? — Perguntou o homem.
— Não se meta nos meus negócios, pai. — Retrucou.
— Pai? — Questionou .
— Lúcifer Morningstar, e você é o motivo de eu estar aqui. — Ele fez uma cara feia e encarou . — Você deu um golpe para roubar a alma dessa garota, você acha mesmo que ele não mandaria nenhum anjo atrás dela? Devolva já a alma dessa garota e volte para o inferno! — Ele tocou na testa de todos os que estavam ali de pé e seus corpos pareciam ter incendiado de dentro para fora.
Quando ele foi tocar nela, ela segurou sua mão, o que fez todos abrirem a boca, chocados.
— Não.
Lúcifer virou a cabeça, analisando a atitude da garota.
— Eu não quero ir.
— Eu disse. — riu.
— Você não entende, ! — Exclamou Lúcifer.
— Ela é o antídoto para tudo, eu sei, menos para mim. Ela quer mais, não quer?
— Sim.
De repente, uma luz tão forte que quase cegou a todos tomou conta do lugar, Lúcifer sabia o que estava acontecendo, aquela garota e a ambição de provocaram isso.
Fim!
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