Finalizada em: 16/09/2021

Parte um

Aplicar para as universidades mais cedo havia sido algo que pesou nas costas durante todo seu último ano do ensino médio. sempre foi inteligente e amigável, e, com isso, sempre teve muitas pessoas com expectativas atrás dele. Mas ele nunca ligou.
Queria estudar medicina, mas também pensava em não tentar entrar em uma universidade de primeira. Ele sempre teve vontade de viajar pelo mundo, comer em restaurantes que via quando rolava pela timeline de suas redes sociais e, principalmente, queria encontrá-la. Mas não podia simplesmente sair por aí sem dinheiro algum... ou melhor, e se a encontrasse? O que ele teria a lhe oferecer?
Por isso, seguiu com o plano de seus pais e professores de entrar na faculdade um período antes que todos, que estariam enviando suas documentações apenas depois de duas formaturas. Seus pais até que aceitavam suas decisões, mesmo que não estivessem de acordo, todos ao redor dele sabiam sobre sua personalidade.
— É melhor você desistir...
ouviu o sussurro vindo um pouco de mais longe, assim que tirou os fones de ouvido e se sentou na cadeira.
— Os rumores dele em nossa antiga escola é de que ele tem alguém... — ela disse, sentando-se ao lado da garota que encarava ele de longe.
— Ah! — Ela exclamou, triste. — Ele tem uma namorada? Vocês estudavam juntos?
— Não necessariamente... — ela respondeu sem graça. — O que eu ouvi, é que ele sempre foi apaixonado por uma amiga de infância, que mesmo eles perdendo contato, ele nunca a esqueceu.
— Ele nunca namorou ninguém? — Ela perguntou, surpresa.
— Ele tentou... — a outra riu. — Mas digamos que as candidatas não eram boas opções.
Ele soltou uma risada abafada e ambas escutaram.
— Aí está você falando da minha vida outra vez para pessoas que acabou de conhecer... — ele disse sem se virar.
— É divertido. — Ela respondeu, rindo. — Quem sabe você não a encontra comigo falando sobre sua triste história?
! — Ele a repreendeu de brincadeira, virando-se e fazendo com que a outra ao seu lado arregalasse os olhos.
! — Ela repetiu no mesmo tom, rindo.
— O que faz aqui? — Ele perguntou curioso, já havia dito à garota inúmeras vezes que sua história não poderia ser com ela, mesmo que ele tentasse.
Mas ela insistia.
— Eu... — ela começou a falar, mas de repente se sentiu nervosa. — Eu apliquei mais cedo para não perder tempo.
— Certo! — Ele disse sem graça, aquela resposta havia mostrado que, mais uma vez, ela não havia desistido.
— Você quer…
Sua fala foi cortada pelo professor, que entrou na sala dando as notícias de que suas primeiras três horas do dia seriam pura anatomia humana.
Doutor Park era muito famoso em sua área e ele soube que seria um prodígio assim que pediu para que seus alunos fizessem suturas nos corpos separados para estudos universitários. Os métodos dele nunca haviam sido tão bem interpretados por um aluno iniciante, já que ele era conhecido como um dos mais ultrajantes doutores da grade curricular da universidade. Ele realmente gostava de dar seus privilégios aos alunos que podiam suportá-lo. Por isso, prestava atenção em cada um deles e fez de seu pupilo desde o primeiro semestre.

•••

Passaram-se mais de quatro semestres. De alguma forma, ele e haviam se tornado amigos. Doutor Park desde o início pensou que ele e a garota — que vivia atrás dele pela universidade — tinham algum tipo de relacionamento, pelo menos até o dia em que realmente viu o garoto devastado pelas ruas de Seoul e soube o motivo mais tarde; ele estava em uma longa jornada de busca por alguém que nunca conseguiu esquecer, doutor Park achou aquilo perturbadoramente admirável. A forma que o mais novo explicou o surpreendeu.
, como todos nesse mundo, tinha seus altos e baixos, principalmente nos dias em que pensava nela. Ele nunca havia tido problema algum nos plantões que pegava para aprender durante a noite, quando doutor Park os oferecia. Ele gostava muito de estar perto dos residentes, mesmo que alguns definitivamente odiassem seus privilégios e o respeito que recebia ali dentro, ele gostava de aprender mais sobre como sobreviver naquele mundo em si e de realmente poder treinar sua mente para aquele tipo de “trabalho” que praticaria para o resto de sua vida, afinal, salvar vidas não era algo simples. Mas, ainda assim, carregava um certo temor de qualquer dia ter que enfrentar uma situação no qual não estaria preparado e foi essa a primeira vez, que em seu terceiro ano de faculdade, doutor Park quase viu colapsar por meros minutos de choque.

Terceiro ano, Hospital SNUH:
ㅤ ㅤ Guarda, emergências...

— Você parece cansado... — ele ouviu dizer assim que ela entrou no quarto reservado para descanso dos doutores, internos e aqueles que faziam guardas durante os finais de semana. — Professor Park não está aqui, por que continua em seu turno extra?
— Porque eu não tenho nada para fazer em casa... — ele respondeu em tom engraçado e ela revirou os olhos. — Porque eu prefiro ficar aqui na emergência do que estar em casa sozinho.
— Você sonhou com ela outra vez. — disse de repente, com o tom mais certeiro que ele já havia escutado em sua voz.
Isso acabou tirando a concentração dele, que amarrava seus sapatos naquele momento.
— É, sua expressão acabou de confirmar. O que você sonhou? Quer me contar?
— Eu não... — ele começou falando. — Não sonhei com ela.
— Então esse é o problema! — Ela disse, sentando-se na cadeira que estava na direção oposta dele, rindo.
— Você nunca vai deixar de me atormentar por uma conversa que eu tive em uma única vez com o doutor Park, não é? — Ele disse rindo e ela balançou a cabeça negativamente. — Que no caso era particular.
— Não enquanto você ainda for dono dos meus mais profundos sentimentos. — Ela disse rindo e ele mais uma vez ficou incomodado com o assunto. — Relaxa, eu já acostumei que fui trocada por uma garota que você não vê há anos, mas insiste que aparece em seus sonhos.
... — ele disse com um tom ressentido.
— Você deveria parar de cobrir turnos ou vai ficar doente e eu serei obrigada a cuidar de você. — Ela disse, dando tapinhas nas costas do amigo. — Deveria usar seu tempo de folga para poder procurá-la melhor. Afinal, não foi esse o motivo de querer virar médico?
E, definitivamente, aquilo ele não esperava. Ela havia realmente escutado toda a conversa com professor Park.
O mais velho já havia notado algo diferente nele desde o primeiro ano e, com o passar dos anos, eles se aproximaram, criando uma relação de pai e filho. Mesmo que tivesse seu pai presente, ter alguém que cuidasse dele quando estava sozinho, foi algo bom para sua mente. Por isso, confiava a ele detalhes sobre seu grande amor que nem mesmo saberia, pelo menos, se não escutasse atrás da porta.
se levantou e se retirou, ajeitando seu uniforme cirúrgico que estava um pouco desarrumado. Pensava nas palavras da garota que pareciam um pouco severas. Ele realmente havia começado tudo aquilo por uma razão específica — —, mas não significava que não tinha o seu amor por ajudar as pessoas e, principalmente, por aquela profissão. Ele sempre teve orgulho do sentimento que sentia com as mínimas coisas que fazia desde seu primeiro ano.
Aquilo o incomodou.
— Doutor ... — ele ouviu ser chamado.
Mesmo que não fosse permitido aquele tipo de tratamento com um simples aluno que fazia suas guardas, todos no hospital o respeitavam muito, mesmo que não fosse um interno ou médico formado ainda, já que ele tinha muita responsabilidade e quem certificasse sua competência, então, tinha o título de “doutor” desde seu quinto mês fazendo turnos no primeiro ano.
— Precisamos do senhor no EM.
— Certo! — Ele disse, tomando o último gole de seu café. — Qual o histórico?
— Acidente de carro. Jovem mulher de vinte e um anos estava com os pais, quando um motorista bêbado bateu contra o carro deles. — Ela disse, lendo o histórico do ocorrido. — Bateu a cabeça com força no vidro que estilhaçou sobre ela e desmaiou, o carro capotou e sua perna ficou presa por conta do impacto que foi do lado esquerdo em que estava, o que fez com que a porta fosse danificada ao redor de suas pernas. Eles tiveram que cortar a porta aos poucos para resgatá-la.
— E os pais? — Ele perguntou, pegando uma bala da mesa da enfermeira-chefe para poder subir um pouco seu nível de açúcar, que sentiu ficar mais baixo mesmo depois do café que havia tomado.
não obteve uma resposta da enfermeira que o colocava a par da situação, então a olhou curioso por seu silêncio e ela apenas o respondeu com um balanço de cabeça negativo. Aquilo indicava que seus pais não haviam resistido ao impacto, o que tornaria uma situação mais difícil ainda para todos.
— Certo! — Ele disse, respirando fundo. — Pelo que você me disse, suas pernas provavelmente precisarão de cirurgia. Ligue para o doutor Park, ele é o único que pode realmente fazer essa cirurgia no momento, já que doutor apenas estará chegando de sua conferência em Atlanta pela manhã... faça isso o mais rápido possível e peça para que a sala de cirurgia seja preparada.
Ela assentiu.
— Quantos minutos até a chegada da ambulância?
— Dez minutos. O acidente aconteceu em uma parte um pouco distante e perto do hospital Sky, mas, por algum motivo, os socorristas disseram que eles precisariam ser encaminhados para este hospital. — Ela explicou, pegando o telefone e discando o número do outro doutor, enquanto achava aquela situação estranha.
— Certo... — ele respondeu. — Vou esperar a chegada dela com um grupo do lado de fora, me atualize sobre o doutor Park.
foi falando com aqueles que sabia que poderiam cuidar da situação com ele pelo caminho. Ainda tinha um tempo de espera, então checou alguns pacientes que estavam esperando para serem liberados.
Foi quando foi chamado pela enfermeira outra vez:
— Doutor , a ambulância está a três minutos de distância e o Doutor Park a dois, ele já estava a caminho do hospital por já ter sido avisado sobre esse acidente pelo diretor. — Ela disse, fazendo com que ele franzisse as sobrancelhas.
— Certo, você tem algum nome da paciente ou algo do tipo? Acho que estamos perdendo alguma informação aqui... — ele perguntou, olhando o histórico em suas mãos.
— Isso foi tudo que me foi passado com antecedência pelos socorristas, doutor. — Ela respondeu tão confusa quanto ele.
não respondeu, apenas respirou fundo, tentando juntar as peças, mas nada além da informação dela ser alguém com nível de importância grande, veio em sua mente.
— Doutor Park! — Escutou algum dos internos dizer e ele sequer respondeu.
! — Ele chamou, enquanto tirava seu casaco e colocava sua bata com a ajuda da enfermeira-chefe. — Quantos minutos para chegada? — Ele perguntou assim que se aproximou o cumprimentando de forma respeitosa.
— A ambulância chega em um minuto! — Ele disse, enquanto saiam para fora, avistando as luzes um pouco afastadas. — De quem estamos falando aqui, doutor? Por que o diretor o avisaria assim?
— Não fique chocado, está bem? — Ele disse, dando tapinhas nas costas do rapaz, que tensionou. — Está bem, todos atentos: — disse, chamando a todos que estavam naquela equipe. — Estamos falando da filha do vice-diretor internacional do hospital. — Ele disse, pegando o histórico que trazia em seu celular. — Seu nome é , seu pai é coreano e sua mãe americana, ambos faleceram e ela está em um caso critico, por isso, temos prioridade com seu bem-estar.
parecia ter ficado surdo depois de ouvir aquele nome, não escutou nenhuma outra informação sobre a paciente, apenas acordou de seu transe depois que doutor Park o chamou de forma mais brusca.
— A ambulância está aqui! — Ele disse, olhando para o mais novo. — Elas não são a mesma pessoa, apenas compartem o mesmo nome, não se distraia com seus próprios sentimentos.
sabia que ele estava certo, então tomou seu foco no mesmo momento, mesmo que sentisse seu coração sair pela boca, porque, afinal, e se elas fossem a mesma pessoa?
Seus fios de cabelos castanhos ensanguentados, que viu assim que a maca foi retirada da ambulância às pressas, não ajudavam na ansiedade que sentia no momento.
— Não havíamos visto antes de passarmos as informações, mas uma parte do metal entrou em sua perna. — Um dos socorristas disse de forma apressada, fazendo pressão na perna da garota.
se apressou para ver o ferimento e sangue voou sobre ele e sua roupa, e ele travou por alguma razão.
— Sala de cirurgia já está preparada como doutor já havia pedido. — A enfermeira disse, olhando preocupada para , que parecia apavorado.
Não era como se ele não tivesse lidado com situações como aquela, ele já havia passado por coisas piores, mas, naquele momento, ele realmente parecia aterrorizado. Seu rosto mostrava o terror, sua testa suava e suas mãos tremiam com a sensação de que parecia que seu coração sairia pela boca a qualquer minuto.
— Doutor ... — ela o chamou. — O senhor está bem?
— S-Sim — Ele gaguejou, olhando para ela. — Preciso de gaze, vou pressionar a ferida até chegarmos à sala de cirurgia. — Disse, limpando o sangue de seu rosto.
Ela foi com rapidez onde as gazes ficavam e trouxe casas dela.
— Nós vamos trocar de lugar... — ele parou o socorrista que seguia estancando o sangue da garota, enquanto subia na maca para poderem chegar à sala de cirurgia sem nenhum acidente no caminho. — Ela não pode sangrar mais que isso.
O socorrista assentiu e eles contaram até três para trocar as gazes cheias de sangue pelas novas, com fazendo a pressão agora.
— Vamos, para a sala de cirurgia! — Doutor Park disse, analisando a expressão no rosto do pupilo.
Ele notou como ele realmente seria um bom médico, profissional, que priorizava o bem-estar das pessoas, mesmo que o dele não estivesse cem por cento.
Na sala de cirurgia, o ar parecia mais calmo, mas, ainda assim, Park sentiu necessidade de falar com o pupilo que o auxiliava.
— Sucção. — Ele disse, olhando o monitor e pedindo para que sugasse o sangue acumulado no local.
Foi o que ele fez imediatamente, com cuidado, mas trêmulo.
— Não é ela. — Doutor Park disse, seguro. — Não deixe com que isso te afete, você a encontrará e não será em uma situação como essa.
— Mas e se ela…— ele não completou a frase, porque odiava pensar no pior.
— Se ela, por acaso, estiver precisando de você quando você a encontrar, você estará pronto para ajudá-la, eu sei disso. — Ele assegurou o mais novo, que assentiu, sentindo seu coração mais leve. — Ela é importante para você, mas você deveria tentar viver um pouco mais, você não vai ter vinte e um anos para sempre.
A questão era que ele realmente não conseguia seguir adiante emocionalmente, ele era ligado à , ele era ligado à sua amiga de infância que foi embora e nunca mais apareceu em sua frente. Apenas em seus sonhos. Ele era ligado a ela de uma forma que não havia sido com ninguém por toda sua vida, por isso prometeu a si mesmo encontrá-la.
Não que não tivesse seus dias pensativos em que realmente se questionava se, no final, tudo sairia da forma que ele creia ser a melhor, mas, ainda assim, algo dentro de si não permitia que ele deixasse tudo aquilo para trás.

Podia não parecer muito, mas você deixar seu “eu” não te afetar em uma situação como essa, definitivamente não era algo importante naquela carreira, coisas assim podiam trazem grande danos à vida de outras pessoas. Por isso, depois de um tempo, ele e doutor Park passaram a procurar pela garota juntos. O mais velho, por alguma razão, entendia as coisas que explicava para ele sobre como se sentia e que mesmo que ela estivesse bem, com uma família e feliz, ele gostaria de ver aquilo, gostaria de acalmar seu coração, de ter certeza que não desistiu de algo que realmente devia ter insistido em si mesmo. Afinal, se ele soubesse que desistiu de algo que realmente deveria ter lutado, ele sentia que seria triste e infeliz para sempre.
Porém, eles não a encontraram.
Não até o dia em que, por acaso, ele a encontrou na ponte.
Seus pensamentos de início foram que era apenas uma garota normal que estava aproveitando a intrigante e bonita noite naquele dia, que não dava indícios de chuva ou qualquer outro fenômeno natural. Esse havia sido o motivo dele ter escolhido caminhar de volta para o hospital naquela noite, algo dizia que ele deveria fazer aquilo, respirar um pouco de ar fresco faria bem. Por isso, observou de longe, mas, vendo suas mãos nervosas alcançarem o telefone de urgências na ponte, seu coração pesou, principalmente quando seus dedos passaram por seus fios de cabelo, mostrando seu perfil muito mais que reconhecível.
Ele sentiu seu estômago embrulhar naquele momento, não sabia se era por finalmente ter a encontrado ou por ter a confirmação do que ele mais temia: ela precisava dele e, ainda assim, ele demorou para encontrá-la. Por isso, caminhou até ela com rapidez, mas seus passos pareciam lentos.
Conforme ele se aproximava, as gotas de chuva caíam, indicando que aquele era um momento crucial na vida de ambos. Seu plano inicial era realmente não deixar com que ela fizesse nada daquilo, pensou em chamar seu nome e apressou seus passos, mas quando a viu desabar no chão, ele realmente sentiu o aperto em seu peito.
Aproximou-se com rapidez e a segurou em seus braços, chamando uma ambulância em seguida. Usava roupas pretas e seu boné escondia seu rosto, então não sabia se ela o reconheceria mais tarde, mas, mesmo assim, segurou sua mão com afinco e naquela chuva de gostas geladas, ele tentou passar sua energia e o “finalmente te encontrei” através de seu calor. Ele queria que ela sentisse que agora tudo ficaria bem.
— Você consegue, eu estou aqui agora! — Foi o que ele disse antes de ela desmaiar.
Não suportou a espera pela ambulância, agarrou-a em seus braços e passou todo o restante da ponte em direção ao hospital — que ele agradeceu não estar longe —, no meio daquela chuva que se intensificava cada vez mais.
Parecia que as coisas se tornavam mais difíceis quando não deveriam ser.
Ele entrou pela porta de emergências com ela em seus braços e sequer disse algo, uma das enfermeiras se aproximou, vendo a cena e tentando impedi-lo, porque não havia reconhecido, foi então que ele levantou a cabeça e a olhou sério; ela, pela primeira vez o via daquela maneira, então se assustou de imediato, deixando com que ele passasse e a colocassem na primeira maca disponível que via.
Ficou ao lado da garota até poder comprovar que realmente estava bem, ninguém ousou se intrometer vendo o estado em que ele se encontrava, nem mesmo doutor Park, vendo a cena desde o começo, apenas o auxiliou com o que necessitava e esperou com que ele se acalmasse para que pudesse sugerir que ele mudasse as roupas úmidas ou ficaria doente.
— É ela! — Ele disse, olhando-a dormir de forma tranquila, enquanto tomava o soro antes de subir para um quarto.
— Você a encontrou! — O mais velho disse. — E ela precisou de você e você estava pronto para ajudá-la. Agora vá se trocar, ficarei de olho nela por você.
O mais novo assentiu com um sorriso indescritível no rosto, agradecendo em seguida.

•••

, mesmo cansado — ou melhor, exausto —, ficou todos os dias que ela esteve no hospital dia e noite, dormindo poucas horas no dia apenas para se certificar que não a perderia de vista nunca mais. Mas, ainda assim, não havia contado a ela quem ele era, ela sabia que algum doutor a havia ajudado a tempo, mas não quem, especificamente, ele era.
Teve noites em que ele a viu chorar e aquilo cortava seu coração de uma forma insuportavelmente dolorosa, ele não imaginava que alguém tão brilhante como ela poderia estar com uma vida tão miserável. E a verdade era que todas as perdas que já havia tido a fizeram dessa forma, fizeram com que ela tivesse medo e se diminuísse a ser uma pessoa comum, mesmo que achasse estar tentando, as pessoas que restaram ao seu redor não lhe deram suporte como deveria.
Ele realmente sentia que era a única peça do quebra-cabeça dela que havia restado, por isso, usava o mesmo colar há tantos anos: a pequena peça de quebra-cabeça que carregava em seu pescoço significava a importância dele para ela desde que eram pequenos.
Ela ainda o usava também, não o reconheceu, o que fez com que ele quase desistisse de realmente entrar na vida dela mais uma vez. Ele chegou a pensar que talvez mais uma pessoa para lidar não fosse bom para ela e, por isso, assistiria e cuidaria dela de longe se precisasse.
— Me desculpe perguntar isso, mas...— ele a viu se virar outra vez, ficando de frente para ele alguns passos mais afastados. — Existe alguma chance de já nos conhecermos?
Aquela pergunta realmente estremeceu todos os pensamentos que teve em relação a realmente deixar com que ela fosse. Ele queria mesmo era abraçá-la e dizer que tudo ficaria bem.
— Já faz um tempo, ... — ele disse, olhando para ela com os olhos cheios de emoções que nunca se foram, enquanto ela o olhava com os olhos vazios que nunca imaginava ver.
Dessa vez, ele tinha certeza que tudo que seu peito sentiu emocionalmente em relação a ela todos esses anos era algum tipo de sentimento forte e conexão que eles tinham, ele definitivamente podia sentir a dor do vazio que ela carregava dentro de si apenas de olhar em seus olhos.
— É realmente você! — Sua voz denunciava uma emoção curiosa, não sabendo decifrar se era tristeza ou alegria. — Minha peça de quebra-cabeça... — ela respirou fundo. — A única que me restou.
Ele sabia, era a única pessoa que havia restado.
E, ainda assim, depois de receber sua rejeição por defesa e insegurança, que ele sabia que ela carregava em seu peito, sua mente e seu coração estavam em acordo: ele não deveria ter deixado com que ela partisse, deveria ter corrido atrás dela.
— Por que você não foi atrás dela? — disse extasiada, saindo pela porta, juntando-se à chuva com ele.
— O quê? — Ele disse, confuso.
— Por que não foi atrás dela? — Ela disse, nervosa. — Você procurou por ela todos esses anos, eu escuto falar dela desde que nos conhecemos e você simplesmente a deixa ir assim? Sabendo que não foi coincidência o encontro de vocês? — Ela soltou uma risada irônica. — Eu sabia que você era um pouco lerdo, mas, sinceramente, não achei que você fosse tanto assim... vai amarelar justo agora?! — Ela disse, aproximando-se dele. — Vocês precisam um do outro e... — ela fez uma pausa. — É mais visível e verdadeiro do que eu queria que fosse. Agora vai, doutor Park está na sala dele e o prontuário dela está lá.
Foi quando ele notou, até mesmo o mais velho sabia que ele agiria daquela maneira. E, por isso, foi correndo à sala de doutor Park, que já o esperava.
Vê-la partir daquela forma em meio à chuva foi como uma dor física para ele. Ele não suportou e mesmo todo molhado da chuva que caía lá fora, escutou a e se direcionou à recepção do hospital.
Todos o olhavam curiosos, seus cabelos encharcados caíam em seus olhos, sua respiração estava ofegante e seus passos apressados não deixavam passar despercebidos. Ele pensou em parar na recepção, mas sabiam que elas não dariam o que ele precisava, então foi diretamente ao escritório do doutor Park, que descansava naquele momento.
Abriu a porta sem nenhum ritual e deu um passo à frente naquele carpete vermelho, molhando-o com seus pingos d’água. Doutor Park apenas abriu seus olhos lentamente e sorriu por entender a situação, apontando para a prancheta em cima da mesa de centro. Ele sabia exatamente o que estava acontecendo, na realidade, já estava esperando por aquilo, não deixaria com que ele a perdesse outra vez, sabendo que a encontrou sem aviso prévio.

E partiu, trocou suas roupas ensopadas colocou seu jaleco para secar em algum lugar e partiu com pressa em seu carro para o endereço anotado em um pedaço de papel.
Seus pensamentos realmente eram extremos. Ele não queria perdê-la mais uma vez, ao menos tinha que tentar e se ela recusasse, ele ficaria feliz de acompanhá-la de longe, de a menos poder ser amigo dela e quando ela não tivesse ninguém para conversar, ser a primeira pessoa a quem ela correria.
Ele queria ser seu apoio, seu suporte, seu porto seguro.
Subiu os degraus do sobrado, lá informava que sua casa era no terraço e se aproximando podia ouvir uma conversa alta e entendeu imediatamente o que estava acontecendo. Ele não se importava se era impulsivo ou se era repentino e cedo demais para fazer algo daquilo, ele apenas fez.
— Ela tem para onde ir!
Os três na cena ouviram a voz dele surgir dos degraus finais da escada, onde estava lá, parado, vestido casualmente, já sem seu uniforme como ela havia visto antes, que foi substituído por um jeans claro, uma blusa branca junto de uma jaqueta e um boné preto, mostrando que, mesmo casual, estava mais do que apresentável.
— Uma casa. — Ele respirou fundo, olhando para a garota.
Os três olhavam para ele, estava surpresa e os outros dois, a idosa de boca aberta e seu filho, que antes brigava com a mãe por querer despejar a colega, analisavam a cena de forma curiosa.
— Uma casa que sempre esperou pela chegada dela. — Ele disse diretamente a ela.
Era realmente aquilo que sentia, ele era o lar que esperava por ela todos esses anos, ela completava o seu vazio e ele esperava que pudesse fazer o mesmo por ela, mesmo que levasse tempo, não importava se ela era uma bagunça ou não — ela tentou avisar, ele ouviu com atenção, mas, ainda assim, não se importou. Se ela fizesse dele parte de sua bagunça, já se sentiria mais do que bem.
Ele queria cuidar dela, preencher esse vazio que ela vinha sentindo há anos, ser sua família ou pelo menos alguém que ela pudesse contar, ser o seu contato de emergência.
— Case-se comigo, se for preciso! — Ele disse de repente, mas nada impulsivo.
Sabia que se ela pedisse, ou melhor, se ela aceitasse seu pedido, não pensaria duas vezes, fugiria com ela para uma igreja ali mesmo e se casaria com ela, depois fazendo tudo que fosse necessário, daria a ela a festa que sempre quis, o vestido que sempre quis e, principalmente, a vida que sempre quis. A priorizaria em sua vida como jamais havia feito com outra pessoa ou coisa.
— Ou não, você escolhe seu destino, eu posso ser seu mesmo sem que tenhamos nada oficial. Apenas venha comigo, coma algo que te deixe feliz por ser bom e porque pode, tenha seu próprio quarto, sua própria cama, sua própria casa. Você não precisa passar por tudo que está passando! — Ele disse, suspirando e apertando ela contra si. — Eu queria ter te encontrado antes, ter ido com você para a faculdade, te dado ânimo para continuar e nunca ter pensamentos como aquele.
Ele realmente não queria ter perdido todos os momentos de sua vida, queria ter visto e incentivado sua ida à faculdade, queria tê-la apoiado para que nunca perdesse a esperança, queria ter tirado seus pesos de seus ombros dizendo que tudo ficaria bem, livrado ela de suas frustrações — ou pelo menos tentado. Queria ter sido o responsável por seu sorriso e bons pensamentos todos esses anos, não queria que ela se sentisse sozinha ao ponto de realmente pensar em deixar sua vida para traz.
Então ele agradeceu mentalmente a Deus ou qualquer força do universo, agradeceu por tê-lo colocado naquele caminho aquele dia e por tê-la encontrado. Seria grato pelo resto de sua vida por ter encontrado seu destino.



Epílogo

— Nabi-ah! — chamou a garotinha que se encontrava na mesa de centro pintando algo em seu caderno.
— Sim, mamãe? — Ela respondeu, correndo até a mãe.
— Você pode pegar aquele pontinho verde na terceira fileira do armário de baixo para a mamãe, por favor? — A mulher pediu com carinho. — Mamãe não consegue abaixar direito e preciso para terminar de arrumar o almoço antes que o papai chegue. — Disse, dando uma risadinha baixa.
— Meu irmão está gigante! — Ela disse, soltando uma risadinha e se abaixando em seguida para pegar o que a mãe pediu.
Oh! — Ela exclamou, sentindo um chute do bebê. — Ele está agitado hoje também.
— Posso sentir, mamãe? — A garotinha pediu e a mãe assentiu, sorrindo para a mesma.
— Claro que sim, meu amor! — Ela disse, colocando a pequena mão sobre sua barriga de oito meses. — Você sabe que ele ama ouvir você e o papai.
As duas estavam tão distraídas, que sequer notaram a entrada do homem pela porta, que observava a cena admirado. Ver as duas mulheres da sua vida e aquele que viria para alegrar ainda mais dali um mês, definitivamente o fazia se sentir completo.
— Se ele gosta tanto da voz do papai, então ele também iria gostar que o papai cantasse, enquanto faz massagem nos pés da mamãe, não é? — Ele disse, quebrando o silêncio.
As duas abriram um sorriso enorme quando viram que ele estava ali, a pequena desatou a correr em sua direção com um sorriso alegre no rosto.
— Papai! — Ela disse, animada. — Acho que Jay vai ser jogador de futebol. — Ela disse, deixando confuso. — Ele chuta a mamãe muito forte, parece que quer chutar uma bola de futebol. — Ela disse, rindo, fazendo com que os dois também dessem risada.
Ele se aproximou com a pequena em seu colo e depositou um beijo nos lábios da mulher, que a esse ponto já havia voltado a arrumar o almoço.
— Eu já disse que você deveria descansar... — ele disse. — Nós podemos pedir comida, seus pés devem estar inchados e doloridos.
— Eu ainda posso fazer esse tipo de coisa, amor! — Ela disse manhosa, sempre que ele a via fazendo tarefas de casa ou andando muito, preocupava-se com a mulher. — Eu tenho uma ajudante e tanto aqui, certo, borboletinha?
— Certo! — A pequena respondeu, sorridente.
— Vamos, sente-se no sofá! — Ele disse. — Vou colocar Nabi para fazer suas lições da escolinha e faço uma massagem em você, depois eu esquento meu almoço.
Ele sabia que ela estava pronta para contestar, mas ele saiu com Nabi para seu quarto e ela não pôde dizer mais nada, guiando-se até o sofá, onde era seu local favorito para tirar um cochilo na parte da tarde. Deitou-se em uma posição confortável, dando espaço para ele quando voltasse, o que não demorou nem três minutos.
— Como estamos hoje? — Ele perguntou, deixando um beijinho na enorme barriga de sua esposa.
— Agitados! — Ela respondeu, sorrindo fraco.
— Meu menino é esperto... — ele disse, deixando um carinho na barriga. — Mas você precisa dar uma folga para a mamãe ou ela fica agitada também! — Deixou um beijo apaixonado nos lábios da mulher.
Ele esticou as pernas levemente inchadas de e começou uma massagem leve e tranquila, cantando uma música qualquer que vinha em sua mente, fazendo com que os olhos dela se fechassem aos poucos. Mesmo ela dizendo que fecharia os olhos por cinco minutos, ele sabia que na realidade ela entraria em um sono bem profundo e gostoso. É isso que ele queria, que ela pudesse descansar sem se preocupar com nada, ele faria por ela o que fosse necessário.
— Bom sono, meus amores! — Ele disse, levantando-se com cuidado do sofá, colocando uma manta sobre ela, mas antes deixando um beijo amoroso em sua barriga e outro em sua testa. — Bons sonhos!
Ele disse, porque sabia que ela teria bons sonhos como ele tinha desde que ela se uniu a ele.



FIM!



Nota da autora: Para ser sincera essa história aqui é o ponto de vista do pp em uma outra fanfic. So Far Away entra no site provavelmente bem perto de quando esse entrar, então vocês podem ler em seguida ou primeiro se preferirem. A música se encaixava muito nos sentimentos dele então eu decidi fazer o lado dele da história e me deixou muito feliz! (Alô biba, obrigado pela ajuda como sempre).

Espero que vocês tenham gostado! Muito obrigado por terem lido <3

Xoxo Caleonis

O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer.
Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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