Capítulo Único
22 DE OUTUBRO DE 2014, 5:32PM
A rua estava praticamente vazia ao entardecer, um vento frio soprava e, a julgar pelas nuvens cinzentas no céu, choveria em breve. Mas aquilo não impedira de sair de casa e ir até a periferia de Chicago, para conseguir mais algumas fotos para a exposição que estava montando e pretendia realizar em breve. Ainda precisava encontrar um local onde expor a série de fotos que estava juntando, mas naquilo ela pensaria depois.
No momento, estava mais preocupada em conseguir encontrar a construção que procurava e conseguir as fotos antes que a chuva resolvesse cair de vez.
Caminhou por mais alguns quarteirões, os dedos apertados em volta da alça da bolsa onde carregava a câmera, sentindo-se um pouco apreensiva e reprovando-se mentalmente por não ter levado ninguém consigo; agora via com clareza que sua melhor amiga estava certa: aquela vizinhança não era das mais amigáveis.
Finalmente avistou, ao final de uma rua estreita, a antiga escola do bairro. Ela já não funcionava mais há anos, sua fundação havia sido comprometida em uma forte nevasca e a construção havia sido condenada, mas continuava ali, agora tomada por ervas daninhas e folhagens, que cresciam livremente sobre as paredes externas.
A maioria das janelas tinha os vidros quebrados e, mesmo olhando-se de longe, já era possível ver claramente que a estrutura estava comprometida.
não sabia exatamente o porquê, e também não conseguia explicar, mas via uma certa beleza na deterioração – natural ou não – que ocorria naquelas construções abandonadas que ela vinha fotografando, em vários estados e cidades diferentes, nos últimos dois meses. Se seu projeto desse certo, conforme ela planejava, seria sua primeira grande exposição e ela queria causar certo impacto com suas imagens.
Antes mesmo de se aproximar mais da construção, ajoelhou-se na calçada e abriu a bolsa onde carregava seus instrumentos de trabalho. Para não correr o risco de se perder no tempo depois que entrasse na antiga escola, queria aproveitar a iluminação natural fornecida pelo sol, que se punha naquele horário, perfeita para a imagem que ela tinha em mente.
Escolheu a lente certa entre as várias que trouxera até ali e conectou-a a câmera. Tirou várias fotos, de vários ângulos diferentes, para que pudesse selecionar a que mais lhe agradasse depois. Aproximou-se mais, atravessando o que costumava ser o pátio da escola, e passou a tirar fotos de alguns detalhes ainda externos da construção. O portão enferrujado; uma janela parcialmente quebrada; a maçaneta pendendo torta na porta, ainda presa à madeira por apenas um parafuso; os tijolos expostos, não mais cobertos pela camada de tinta, que parecia ter sido amarela um dia.
Quando terminou com as fotos externas, finalmente adentrou o prédio, sempre olhando com muito cuidado onde pisava e rezando para que não acabasse encontrando nada muito assustador ali dentro. Nas outras construções em que havia entrado nos últimos tempos, tinha encontrado um bom número de ratos, baratas e outros animais nojentos, mas ainda não havia se acostumado com eles.
Com cuidado, seguiu tirando suas fotos, tanto de cômodos inteiros quanto de pequenos detalhes que encontrava. Entrou em inúmeras salas, caminhou pelos corredores, que lhe pareciam sombrios até demais, e então alcançou as escadarias.
No segundo andar, a primeira sala que encontrou foi um antigo laboratório de ciências. Podia ver dezenas de objetos de vidro quebrados pelo chão, algumas bancadas e cadeiras viradas e armários caindo aos pedaços. Tinha certeza que conseguiria imagens perfeitas para sua exposição naquela sala.
Porém, quando deu mais alguns passos em direção ao centro do cômodo, ouviu um estalo alto.
E então, o chão cedeu.
22 DE OUTUBRO DE 2014, 5:48PM
A sirene tocou, fazendo-se ouvida em todo o quartel. Enquanto toda a equipe corria para entrar no caminhão e os paramédicos alcançavam a ambulância, o endereço para onde deveriam ir era informado.
Assim que chegaram ao local indicado, saltou do caminhão, aproximando-se de um senhor de idade que esperava por eles na rua, logo em frente a uma antiga escola, já abandonada havia alguns anos.
- Parece que algo desmoronou dentro da escola. – Ele informou, antes mesmo que o bombeiro perguntasse. – Ouvi um grito logo antes do estrondo, mas depois disso chamei várias vezes e ninguém respondeu.
assentiu com a cabeça e voltou-se para sua equipe, que esperava por suas ordens, prontos para entrar na construção.
- Harvey, vem comigo no primeiro piso. Parker e Spector, segundo andar. – Ordenou e viu todos assentirem, seguindo-o assim que ele começou a andar em direção à escola. Ao entrar, pediu que Harvey verificasse as salas à esquerda do corredor principal, enquanto ele se encaminhou para o lado direito. Enquanto abria as portas uma por uma, ouviu os passos de seus outros colegas subindo as escadas. A cada porta que abria, chamava, esperando que alguém respondesse, mas não ouviu nada até abrir a sexta porta. A voz de quem quer que fosse que estivesse ali não era mais do que um murmúrio e, ao perceber que apenas as pernas dela estavam visíveis, ele se apressou, correndo na que, obviamente, haviam caído do andar superior – havia um buraco com quase dois metros de largura logo acima.
- Encontrei a vítima. Sexta sala à direita. – Informou aos outros, pelo rádio. – Parker e Spector, cuidado. O piso superior pode acabar cedendo em outros lugares.
Enquanto esperava que seus colegas terminassem a busca por mais vítimas e depois viessem até o local onde ele estava, começou a retirar parte dos entulhos – pedaços de concreto, tábuas de madeira e até cadeiras e mesas quebradas – da pilha, logo descobrindo uma mulher por baixo dela.
- Ei. Consegue me ouvir? – Perguntou, quando conseguiu tirar parte dos entulhos que antes a cobriam completamente. O rosto dela estava manchado de sangue, que escorria de um pequeno corte em sua testa. Ela assentiu fracamente com um movimento de cabeça. – Qual seu nome?
- . – Ela conseguiu murmurar, a voz extremamente fraca e a respiração rasa e acelerada, como se tivesse dificuldades para respirar.
- Certo, , eu sou . Vou tirá-la daqui, tudo bem? – Garantiu a ela. Retirou mais alguns pedaços de madeira que estavam sobre ela e então percebeu por que a mulher não respirava direito. Ela estava presa sob um grande bloco de concreto, que havia caído sobre seu peito. Pelo rádio, pediu que os paramédicos entrassem.
Harvey chegou à sala em seguida e observou a situação, abaixando-se ao lado do colega.
- Vamos precisar de alguma coisa para levantar o concreto e tirá-la daí. – Disse, logo em seguida. assentiu com a cabeça e pediu pelo rádio que alguém trouxesse as ferramentas de que precisariam para resgatar a mulher. Ele levantou assim que os paramédicos chegaram, já trazendo também as ferramentas que pedira, mas estendeu o braço para segurar a mão dele.
- Fica. – Pediu, em mais um sussurro. Ele virou-se para encarar Preston, o paramédico que estava logo atrás, como se perguntasse se podia permanecer ali sem atrapalhar o atendimento. Preston assentiu com a cabeça, em seguida fazendo outro gesto para que se afastasse pelo menos um pouco para o lado, abrindo mais espaço para que ele trabalhasse. Mantendo-se perto de , para que ela permanecesse calma, pediu que os outros bombeiros de sua equipe, que já haviam chegado ali, terminassem o resgate, levantando o bloco que mantinha a mulher presa.
Quando ela finalmente pôde ser retirada, se afastou e deixou que os paramédicos terminassem seu trabalho e a levassem para a ambulância, voltando para o caminhão e seguindo de volta para o quartel, enquanto era levada para o hospital.
Trabalho feito. Havia atendido a mais uma chamada normal em um dia normal de trabalho.
Ou não.
22 DE OUTUBRO DE 2014, 9:02PM
entrava no quartel pela quinta vez naquele dia, voltando de mais uma chamada, enquanto retirava o casaco pesado do uniforme que vestia. Deixou-o dentro do caminhão e desceu, observando o relógio em seu pulso. Era nove da noite, o que significava que seu turno naquele dia já havia acabado.
Foi rapidamente até o vestiário, trocou o restante do uniforme por roupas normais e depois passou no dormitório para pegar algumas coisas que havia deixado lá. Sentiu a mochila mais pesada do que o normal e franziu o cenho, tentando lembrar o que estava lá. Não demorou para que se lembrasse da câmera que um de seus colegas havia encontrado embaixo dos escombros da escola, na chamada que haviam atendido algumas horas antes.
Provavelmente pertencia à mulher que ele encontrara e que, por algum motivo, continuava em seus pensamentos desde então. Balançou a cabeça, dispersando seus pensamentos, jogou a mochila nas costas e saiu do quartel, despedindo-se de seus colegas no caminho.
Entrou no carro, apoiou as mãos no volante e parou por alguns segundos, pensando no que faria a seguir. Abriu a mochila e pegou a câmera nas mãos.
Será que encontraria ali o motivo para a mulher estar naquela construção abandonada?
Tomado pela curiosidade, ligou a câmera e pressionou alguns botões até conseguir fazer com que as fotos fossem exibidas. Passando uma por uma, impressionou-se com a forma com que os detalhes e objetos mais simples eram expostos nas imagens; não entendia muito sobre fotografia, mas com certeza aquela mulher havia feito um ótimo trabalho.
Desligou a câmera e deixou-a de lado, decidido a ir até o hospital, esperando que ainda estivesse lá, para que pudesse devolvê-la.
Não levou mais de vinte minutos para estacionar o carro em frente ao hospital. Perguntou à moça da recepção se poderia visitar e, em pouco tempo, uma enfermeira lhe acompanhou até o quarto dela.
Ele bateu de leve na porta com os nós dos dedos antes de abri-la devagar e colocar a cabeça para dentro do quarto.
- ? – Chamou, em voz baixa, e a viu desviar os olhos da pequena televisão no canto do cômodo para observá-lo. Ela esboçou um sorriso e se sentou melhor na cama enquanto ele entrava e se aproximava dela.
- , né? – Perguntou, e ele assentiu com a cabeça, sentando na cadeira próxima da cama.
- Nós encontramos sua câmera depois que te trouxeram pra cá. – Ele levantou a mão que segurava a câmera, depois a colocou sobre a mesa de cabeceira. – Achei que você ia querer de volta.
- Com certeza. – Ela riu baixo, assentindo. – Obrigada.
- Imagina. Eu não entendo de fotografia, mas... Você faz um belo trabalho. – Elogiou, vendo as bochechas um tanto pálidas de corarem de leve enquanto ela sorria em agradecimento. – Como você está?
- Foi só um susto. Só preciso ficar em observação essa noite. – Ela disse, e logo depois um silêncio constrangedor se instalou no quarto. voltou os olhos para a televisão, que passava uma comédia romântica qualquer, e nem percebeu que a observava com um meio sorriso nos lábios.
Ele não sabia bem por que havia ele mesmo ido devolver a câmera. Podia simplesmente ter pedido para que um de seus colegas o fizesse, ou apenas tê-la deixado no balcão de informações do hospital, para que entregassem a . Mas algo o fazia sentir que devia vê-la outra vez, e ali estava ele, mas sequer sabia o que dizer. Só sabia que algo nela o encantava.
- Por que estava fotografando aquela escola hoje? – Ele perguntou, de repente, querendo manter a conversa.
- Eu estou organizando uma exposição. – A mulher explicou, voltando a olhá-lo. – É a primeira grande exposição que vou fazer sozinha, sabe. E queria fazer algo... Diferente. – Fez uma pausa, buscando uma forma de explicar o conceito que tinha em mente e que a havia levado até a escola. – Sempre achei que lugares abandonados têm uma beleza singular, e queria mostrar isso nas minhas imagens. Já viajei por vários estados, visitando lugares diferentes para fotografar. Mais algumas semanas e a exposição estará pronta, eu espero.
sorria enquanto ela explicava tudo aquilo. Sorria porque conseguia ver em seus olhos o quanto ela gostava do que fazia e quão importante era, para ela, mostrar para os outros como ela via aquelas construções abandonadas e em ruínas, que muita gente sequer notava, de forma tão diferente.
- Não se esqueça de me avisar quando a exposição começar, então. – Ele sorriu de lado, realmente esperando que ela o convidasse, mas ao mesmo tempo desejando que pudesse vê-la antes daquilo.
- Não esquecerei. – Ela assentiu com a cabeça, um sorriso tímido curvando seus lábios, como se dissesse “Como poderia esquecer do cara que salvou minha vida?”
- Bom... Tá na minha hora. – disse, ao se levantar da cadeira, quando percebeu que a conversa ia morrendo outra vez e querendo evitar um novo silêncio desagradável entre os dois. – Se cuide, sim? Não quero ter que salvá-la outra vez.
Ele deu uma piscadela com o olho direito e ela riu e agradeceu enquanto ele deixava o quarto de hospital.
31 DE OUTUBRO DE 2014, 3:27PM
A campainha de seu apartamento tocou poucos minutos depois dela ter chegado em casa. Suspirou, esperando que, por um milagre, fosse algum entregador que tocara a campainha errada. Tinha acabado de chegar de mais de uma de suas viagens, onde tinha fotografado mais algumas casas e prédios para sua exposição, e só queria descansar por algumas horas.
Levantou preguiçosamente do sofá e parou em frente à porta, aproximando o rosto do olho mágico, vendo Julie, sua melhor amiga, do outro lado, parecendo impaciente. não conseguiu segurar uma risadinha. Tinha certeza de que a amiga estaria extremamente irritada com ela – apenas uma semana tinha se passado depois de seu acidente, e ela já havia saído para outra viagem, ficado fora da cidade por quatro dias e sequer tinha avisado Julie. Oopsie.
- Adianta eu pedir para você me poupar do sermão? – Perguntou assim que abriu a porta, antes mesmo que a amiga conseguisse vê-la.
- Boa tarde pra você também, . – Julie resmungou, entrando mesmo sem ser convidada. riu e fechou a porta, balançando a cabeça. Não, não adiantaria. – Onde você esteve?
- Hmm... Detroit. Fotografando. – Deu de ombros, como se aquilo não fosse nada.
- Sério? Droga, , você quase morre e três dias depois já tá se enfiando em mais prédios caindo aos pedaços? – Julie rolou os olhos, claramente irritada com a melhor amiga.
- Eu não quase morri, Julie, sua exagerada. – Foi a vez de resmungar, largando-se novamente sobre o sofá. – De qualquer forma, já fui, já fotografei e já voltei. Inteira. Nem adianta você vir bancar minha mãe agora.
- Juro que dou graças a Deus por não ser realmente sua mãe. Caralho, como você é teimosa. – Julie sentou em um dos banquinhos que combinavam com o balcão, que separava a sala de estar da cozinha do apartamento. não respondeu e Julie manteve o silêncio, como se esperasse que a amiga falasse algo. Porém, conhecia-a bem demais e a tempo demais para acreditar naquilo. tinha decidido não discutir, então não importava o que ela dissesse, não teria uma resposta.
- Certo. Vamos falar sobre algo mais agradável. – Julie falou, quando se deu por vencida. Finalmente, voltou seu olhar para a amiga. – E o bombeiro, lá? Alguma notícia?
riu alto antes de responder.
- Julie, eu sei o primeiro nome dele. E só. – Ela balançou a cabeça, sem acreditar que a melhor amiga ainda estava insistindo naquilo. – E por que ele daria “alguma notícia”? Ele salva pelo menos umas dez pessoas por dia, acha que ele vai atrás de todas elas?
- Por isso mesmo! – A loira exclamou. – Ele não precisava ter ido te visitar no hospital. E não me diga que ele foi só devolver sua câmera. Ele podia ter deixado na recepção do hospital. Podia ter mandado outra pessoa levar. Mas ele foi pessoalmente.
- E daí?! O que você quer que eu faça? Vá bater lá no quartel e o chamar pra um encontro?
sentiu o arrependimento tomar conta de si assim que as palavras deixaram sua boca. Tinha que parar de dar ideias para sua melhor amiga. Agora, tinha certeza, apenas pelo olhar e pelo sorriso que surgiram no rosto dela, que Julie não a deixaria em paz até que ela fizesse exatamente o que tinha dito.
03 DE NOVEMBRO DE 2014, 2:35PM
Julie estacionou o carro em frente ao quartel mais próximo da escola onde havia sofrido o acidente onde conhecera – pelo menos, era o que uma rápida pesquisa no Google as tinha dito. Tinham se passado alguns dias desde que Julie havia tomado como sua missão fazer com que fosse atrás do tal bombeiro, e ela finalmente tinha conseguido. Olhou para a melhor amiga, sentada no banco do passageiro, que não parecia que ia sair do carro tão cedo. Ela deu um empurrão de leve no ombro de .
- Nós não temos o dia todo. – Disse, sua voz em um tom brincalhão, como se estivesse se divertindo com aquela situação.
- Mas nem sabemos se é aqui mesmo que ele trabalha. – Ela respondeu, emburrada como uma criança que não queria ir para o primeiro dia de aula em uma nova escola.
- Se não for aqui, o máximo que vai acontecer é falarem que não tem nenhum nesse quartel. – A loira deu de ombros, sem tirar os olhos da outra. – Vai logo, , ou vou ter que te puxar pra fora do carro e te arrastar até lá dentro?
rolou os olhos, mas tirou o cinto de segurança e abriu a porta, descendo do veículo em seguida.
- Você ainda vai me pagar por isso. – Disse e bateu a porta sem nem esperar uma resposta de Julie, que apenas riu enquanto a assistia ir em direção ao quartel, em passos hesitantes.
entrou e olhou em volta, esperando que estivesse logo por ali e a poupasse de perguntar por ele a um estranho. Por algum motivo, parecia muito menos constrangedor encontrá-lo logo do que ter que procurar por ele.
Porém, não o viu em lugar nenhum – de fato, não viu ninguém por ali –, então se dirigiu até o fundo da sala, onde havia uma pequena cozinha e um homem com o uniforme dos bombeiros mexia em uma panela sobre o fogão, de costas para ela.
- Hm. Olá. – Disse, anunciando sua presença, pois ele parecia não ter percebido ainda que tinha companhia. Ele virou-se para olhá-la, parecendo surpreso.
- Oh. Não vi você entrar, desculpa. Posso ajudar? – Ele sorriu, simpático. Aquilo a tranquilizou um pouco. Não sabia bem por que, mas sentia-se como se todos fossem julgá-la por ir atrás de . Sabia que provavelmente todos eles tinham várias garotas em seus pés – afinal, bombeiros eram, querendo ou não, um fetiche bastante comum entre as mulheres –, mas ainda assim não queria parecer mais uma daquelas. Lógico, tinha se interessado por , mas, naquele momento, queria apenas realmente agradecê-lo pelo o que tinha feito e pela consideração de devolver pessoalmente sua câmera. E então, quem sabe, conhecê-lo melhor.
- Meu nome é . Queria falar com . Ou . Acho que este é o quartel dele. – Disse, o tom incerto de sua voz fazendo sua frase soar quase como uma pergunta, por não ter certeza de que ele realmente trabalhava ali.
- Sim, é aqui sim. – O homem assentiu, limpando as mãos em um pano de prato enquanto saía de trás do balcão que separava a pequena cozinha do restante do cômodo. – Vou chamá-lo, só um minuto.
Ela o observou sair por um corredor lateral e depois olhou em volta pelo cômodo. Seus olhos se fixaram em uma das paredes, onde havia um painel com várias fotos. Algumas com crianças que haviam visitado o quartel, todas parecendo muito animadas por poderem entrar nos caminhões e ver como era realmente o dia de um bombeiro. Parou em uma foto em especial, onde reconheceu com uma das crianças no colo, e admirou o sorriso genuíno que ele tinha no rosto naquele momento; reparou, então, que em todas as fotos que ele aparecia, aquele mesmo sorriso estava presente. Não era como se aquilo fosse uma obrigação para ele – realmente gostava de dar atenção às crianças e proporcionar aquela experiência a elas, e isso era visível. Perceber aquilo só fez encantar-se ainda mais por ele.
ouviu uma batida na porta de sua sala. Tirou os olhos do relatório que estava escrevendo e girou a cadeira para ver Scott parado do outro lado da porta de vidro. Fez um sinal para que ele entrasse e ele a abriu, colocando apenas a cabeça para dentro da sala.
- , tem alguém aqui querendo falar com você.
- Pede pra esperar um pouquinho, tô meio ocupado. – Ele pediu, já girando na cadeira, ficando de frente para a escrivaninha outra vez. – Disseram o nome? Ou o que queriam?
Ele ouviu Scott rir baixo antes de responder.
- Ela disse que se chama . Não disse o que queria. – Ele respondeu, rindo mais alto quando viu girar a cadeira pela terceira vez, as sobrancelhas arqueadas, surpreso.
Aquilo, certamente, não esperava.
- Pode trazer ela até aqui, por favor? – Disse, afinal, ao se recuperar da surpresa. Scott balançou a cabeça de um lado para o outro, rindo e murmurando algo como "engraçado você mudar de ideia assim tão rápido", ao que respondeu, rindo, levantando o dedo do meio na direção do amigo.
Não mais do que dois minutos depois, Scott voltou e abriu a porta da sala, fazendo um gesto para que entrasse. A mulher parecia tímida, as mãos entrelaçadas uma na outra em frente ao corpo, como se não soubesse bem o que fazer com elas.
- . – sorriu, quando Scott fechou a porta e saiu dali. Apontou para a cadeira próxima a ele e ela se sentou. – Que surpresa.
- É, eu... – Ela fez uma pausa, como se precisasse organizar as palavras em sua cabeça antes de falar. – Bom, eu nunca realmente agradeci pelo o que você fez por mim. E achei que, não sei, a gente pudesse sair para um café qualquer dia. Se você quiser, é claro, mas...
não conseguiu não rir ao ver como ela se embaralhava com as palavras, visivelmente nervosa e até um pouco envergonhada. Contudo, ele não ria por querer deixá-la ainda mais sem jeito; ria porque achava tudo aquilo extremamente adorável.
- Claro que podemos. Eu adoraria. – Ele a interrompeu, e ela pareceu genuinamente agradecida por isso. – Meu turno vai até amanhã de manhã. Posso te ligar na quarta-feira?
concordou e ele lhe passou seu celular, para que ela salvasse o próprio número nele.
a observava encantado. Apesar de estar tão nervosa por apenas convidá-lo para um café, ela tinha, afinal, tido a coragem de ir até ali e procurá-lo, pois ele obviamente não tinha como encontrá-la – inclusive, tinha se sentido um idiota por vários dias após visitá-la no hospital e ter ido embora sem sequer ter pedido o número dela ou qualquer coisa que o ajudasse a vê-la novamente.
Ela devolveu o celular para ele e pareceu pensar no que dizer a seguir. Tudo o que tinha pensado em falar e ensaiado em sua cabeça no caminho até ali tinha desaparecido quando o vira. A sirene tocando a poupou de ter que dizer qualquer coisa. Ele levantou de repente, inclinou-se na direção dela e beijou-lhe o rosto.
- Desculpe não poder ficar. O dever me chama. – Ele disse, sorrindo de lado. – Mas nos vemos na quarta-feira, sim?
Ele piscou enquanto se afastava em direção à garagem e ela assentiu com a cabeça, sorrindo. ficou ali por mais alguns minutos depois de perdê-lo de vista, tentando acalmar seu coração, que havia acelerado com o simples toque dele em seu rosto.
Mas o que diabos aquele bombeiro estava fazendo com ela?
05 DE NOVEMBRO DE 2014, 4:24PM
Nem mesmo o clima frio daquele dia impediu que saísse de casa, algumas horas depois de ter ligado para e combinado de encontrá-la em uma cafeteria perto de onde ele morava.
Ele entrou na cafeteria e seus olhos esquadrinharam o lugar, procurando pela mulher, mas não a encontrou. Sentou-se em uma das mesas próximas à janela, tirando o cachecol que usava e deixando-o na cadeira ao seu lado. Não demorou mais de dez minutos para que ele avistasse, pela janela, a garota se aproximando da cafeteria. Ela não o tinha visto, mas ele não conteve um sorriso enquanto a observava caminhando, os braços cruzados à frente do corpo, abraçando a si mesma para manter o sobretudo vermelho o mais fechado possível e proteger-se no vento gelado. Ela logo saiu de seu campo de vista e, poucos segundos depois, entrou pela porta, fazendo o sininho sobre ela tocar.
parou por alguns segundos, olhando à sua volta, e ela deixou um sorriso surgir em seu rosto ao vê-lo sentado ali. Ela se aproximou e sentou na cadeira à frente dele depois de inclinar-se sobre a mesa para cumprimentá-lo com um beijo no rosto.
- Então, posso deduzir que sua exposição vai começar em breve e você quis sair hoje pra me convidar? – perguntou em um tom divertido, após os dois fazerem seus pedidos.
- Ainda não. – respondeu, feliz por ele ter lembrado daquilo e ainda mostrar interesse de ver seu trabalho. – Ainda preciso fazer mais algumas fotos e encontrar uma galeria.
- Mais fotos? – Ele arqueou uma das sobrancelhas. – Já falei, hein, não vai despencar de outra escola por aí.
Ele riu junto ao ouvi-la rir em resposta ao comentário dele. Os dois foram interrompidos pela garçonete, que trazia duas xícaras nas mãos, uma contendo o cappuccino de e a outra com o chocolate quente de , e a conversa, diferentemente daquela conversa no hospital, fluiu facilmente. Não houve nenhum silêncio constrangedor e ambos se pegaram tão envolvidos na conversa que suas bebidas acabaram esfriando antes que terminassem.
Aquilo agradou – e muito – aos dois.
05 DE NOVEMBRO DE 2014, 5:12PM
Os dois nem perceberam o tempo passar durante a conversa e, quando viram, o sol já havia se posto e as luzes nos postes da rua tinham começado a se acender.
e saíram juntos da cafeteria, ainda conversando.
- Você mora aqui perto? – Ele perguntou, mas continuou a acompanhando na direção em que ela andava, agradecido por ser a mesma direção que ele pegaria para voltar para casa.
- Moro, são só algumas quadras de distância. – Ela respondeu, parando no lugar em que estava, prestes a se despedir, mas ele a interrompeu.
- Eu moro pra cá também. Te acompanho até em casa. Você não devia andar sozinha à noite. – deu uma piscadela, rindo, e ela rolou os olhos com o que ele dizia.
- Não precisa, , mesmo. – disse, sem querer incomodá-lo.
- Faço questão. E não se fala mais nisso. – Ele fez um gesto para que ela continuasse andando e a acompanhou. Minutos depois, quando estavam a duas quadras do prédio onde morava, as nuvens que tomavam conta do céu da cidade naquele dia resolveram que era hora da chuva finalmente cair.
Os dois apressaram o passo, logo começando a correr, em meio a risadas e comentários de "não acredito que está chovendo logo agora", até alcançarem a portaria do prédio.
- Você não pode ir embora molhado desse jeito e nessa chuva, . – Ela disse, quando já estavam seguros dentro do prédio.
- Bom, não tenho muitas opções, tenho? – Ele deu de ombros de um jeito divertido, que a fez rir.
- Claro que tem. Entre, eu devo ter algumas roupas do meu irmão que servem em você. Você se seca, colocamos sua roupa na secadora e esperamos a chuva pelo menos diminuir um pouco. – sugeriu e levantou os braços, como se estivesse se rendendo.
- Já que você insiste. – Disse, rindo. Ela balançou a cabeça, divertindo-se com o jeito infantil dele, e o puxou pelo braço em direção ao elevador.
Enquanto ela abria a porta do apartamento, parou, torcendo os lábios como se estivesse pensando em algo muito sério. Ela segurou a porta aberta e esperou que ele entrasse, mas, quando ele não o fez, virou-se para encará-lo com o cenho franzido, pedindo uma explicação.
- Seu irmão não mora com você, né? – Perguntou, torcendo os lábios. Ele voltou a falar quando a viu abrir a boca para responder. – Não, sério. Porque vai que ele tá aí e, sei lá, não vai gostar de um cara chegando com a irmã dele. Juro. Eu tenho uma irmã mais nova e ficaria muito puto.
o olhou em silêncio por alguns segundos e então começou a rir alto, escorando-se no batente da porta, e ele apenas a encarava com um misto de confusão e diversão no rosto.
- Vinte e tantos anos na cara e ainda tem medo assim, ? – Ela disse, quando finalmente conseguiu parar de rir e recuperar o fôlego. – Mas, não, meu irmão não mora comigo. Pode entrar sem medo.
Ele assentiu com a cabeça, rindo da situação, e os dois finalmente entraram. Ela o guiou até o banheiro e lhe entregou uma toalha, pedindo que ele esperasse enquanto ela ia buscar algumas roupas.
encostou a porta do banheiro e tirou as roupas molhadas, deixando-as no canto do cômodo, perto da porta, e usou a toalha para se secar.
Poucos minutos depois, voltou com as roupas secas para e, como a porta estava entreaberta, simplesmente a abriu de repente, sem bater, e parou no mesmo momento.
Ele estava de costas e a única peça de roupa cobrindo seu corpo era a cueca preta que ainda vestia. Ela sentiu o sangue se acumular nas bochechas, a área ficando extremamente quente de uma hora para a outra. Deu um passo para trás e puxou a porta consigo, no mesmo momento em que percebeu sua presença e se virou.
Ele sorriu de lado, percebendo a vergonha dela, mas não comentou nada; apenas estendeu a mão na direção dela, em um pedido mudo para que ela lhe entregasse as roupas, e então ela o fez, murmurando um pedido de desculpas quase inaudível e fechando de vez a porta logo em seguida.
- Não precisa se desculpar. – Ele falou, elevando a voz para que ela escutasse através da porta fechada. – Só se não gostou do que viu.
não conseguiu segurar o comentário, rindo sozinho dentro do banheiro enquanto vestia as roupas do irmão de que, felizmente, serviam razoavelmente bem nele.
- Cale a boca, . – Ela gritou de volta, aparentemente de algum lugar já afastado do banheiro. Ele balançou a cabeça e, já vestido, abriu a porta novamente. Saiu andando pelo apartamento à procura dela e a encontrou em uma pequena área de serviço, colocando as roupas dele na secadora. Escorou-se na parede e cruzou os braços na frente do peito, observando-a.
Seu rosto ainda estava vermelho, mas ele não conseguia conter a vontade de continuar a provocá-la. Era divertido e ele sabia que, no fundo, ela não se importava. Aquilo só acabaria aumentando a tensão entre os dois, que faria com que ele acabasse a beijando antes que a chuva parasse e ele fosse embora. E ele queria aquilo. Ah, como queria. E sabia muito bem que ela também queria. Durante todo o tempo que passaram juntos naquele dia, os dois haviam trocado algumas indiretas e provocações leves, e ele sabia que provavelmente ela não o convidara para entrar por uma simples preocupação com sua saúde.
- Quer dizer que gostou, então? – perguntou e virou-se para ele surpresa, pois ainda não tinha percebido que ele estava ali. Ela franziu o cenho, sem entender, e ele completou a pergunta com mais um de seus sorrisos de lado que a faziam querer socá-lo e beijá-lo ao mesmo tempo. – Do que viu.
- Eu devia ter mandado você para casa debaixo dessa chuva. – resmungou, aproximando-se dele, também sorrindo de lado. Parou logo à frente dele, perto até demais, ele diria, antes de responder à pergunta dele. – Mas já que não mandei, fique sabendo que não vi nada demais. – Ela sussurrou as palavras lentamente, entrando no jogo de provocações que havia começado, e riu de leve quando percebeu o olhar incrédulo no rosto dele.
- Ah, é? Não viu nada demais? – Ele arqueou as sobrancelhas e inclinou o rosto para aproximá-lo ainda mais do dela. prendeu o lábio inferior entre os dentes, ainda com um meio sorriso no rosto, e balançou com a cabeça, negando. não conseguia entender como ela conseguia parecer tão adorável com aquele sorriso infantil, como se fosse uma criança que sabia que estava passando dos limites e continuava arriscando, ao mesmo tempo em que parecia estupidamente sedutora com os dentes prendendo o lábio e o olhar fixo no dele.
Ele deu um passo à frente, fazendo-a cambalear para trás, e fez o mesmo mais algumas vezes, até que ela estivesse presa entre seu corpo e a bancada que havia atrás dela. usou os braços para se apoiar à bancada quando inclinou o corpo na direção do dela, fazendo com que ela tivesse que inclinar o seu para trás. Não que ela não quisesse aquela proximidade – queria, sim; de fato, tinha esperado por ela desde o dia em que fora até o quartel atrás dele –, mas era divertido provocá-lo aos poucos, como fazia, vendo-o chegar cada vez mais perto de seu limite.
se aproveitou do fato daquela posição deixá-la com o pescoço à mostra e deixou seus lábios deslizarem bem de leve por ele, satisfeito ao ver sua pele totalmente arrepiada em resposta a ele. não mostrou resistência nenhuma quando ele a segurou com as duas mãos pela cintura, puxando-a contra si e acabando com qualquer distância entre os dois. Ele deixou que seus lábios fizessem o caminho por todo o pescoço da mulher e então parou próximo à boca dela, os lábios quase se tocando, mantendo, de propósito, uma distância mínima, em uma última provocação.
- Sabe de uma coisa? – Ele sussurrou baixinho, vendo-a fechar os olhos de frustração por ele resolver falar algo em vez de beijá-la, o que o fez rir. Ela resmungou algo que ele não entendeu, mas que provavelmente era um pedido para que ele terminasse a frase. – Que bom que seu irmão não mora com você. Sério.
E antes que ela pudesse respondê-lo de qualquer forma – provavelmente rolando os olhos –, ele finalmente a beijou.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 10:27AM
A neve caía do lado de fora e se acumulava nas janelas do apartamento de quando acordou naquela manhã de natal e saiu da cama silenciosamente, querendo evitar acordá-lo. Ela parou à porta do quarto e virou-se, observando-o dormindo calmamente, o peito subindo e descendo continuamente por baixo do edredom que o cobria.
Pensou, mais uma vez, como fazia quase todos os dias, em quanto as chances dos dois não terem se conhecido era grande.
Talvez se ela não tivesse sofrido o acidente ou se ele tivesse ocorrido em outro lugar, se um dos colegas de a tivesse encontrado em vez dele, se ele não estivesse trabalhando naquele dia... Talvez suas vidas nunca tivessem se encontrado. E ela não queria nem pensar nessa possibilidade.
Os dois estavam juntos desde o dia do primeiro encontro, e é óbvio que passara dias ouvindo as frases “Eu avisei” e “O que seria de você sem mim, hein” saindo da boca de Julie. Mas não se importava. As coisas iam tão bem entre ela e que nem o ego inflado de sua melhor amiga por ser a “responsável” por juntá-los a irritava.
Ela deixou o quarto, indo até a cozinha. Teve que abrir e fechar alguns armários até encontrar tudo o que precisava, mas, em pouco mais de meia hora, tinha terminado o chocolate quente e as panquecas. Derramou um pouco de melaço sobre elas e ainda encontrou na geladeira alguns morangos e framboesas para enfeitá-las.
acordou com o barulho de algo batendo em algum lugar do apartamento. Rolou na cama e esticou o braço até o outro lado do colchão, procurando pelo corpo de , que devia estar ali. Abriu os olhos quando sua mão encontrou apenas os lençóis e cobertores amassados. Ele deixou o corpo rolar novamente e ficou deitado de barriga para cima, encarando o teto. Ouviu mais barulhos vindos de fora do quarto. O chiado de algo sendo colocado sobre uma frigideira quente o fez deduzir que estava na cozinha, provavelmente fazendo algo para o café da manhã.
Será que aquela mulher tinha algum defeito?, ele se perguntou, rindo sozinho.
Virou-se para olhar o relógio e se assustou ao ver a hora que ele marcava. Tinham ficado até tarde na casa de sua família, que comemorava o Natal na véspera do feriado, e o combinado era passarem o dia de Natal com a família de . Era engraçado como ele nem se sentia tão nervoso com a perspectiva de conhecer a família dela. Como ela mesma havia dito, ele já tinha passado pela pior parte algumas semanas antes, quando conhecera Julie. Segundo , sua família era “tranquila até demais” e ele acreditava.
Os pais dela moravam fora da cidade e os dois levariam pelo menos uma hora para chegarem até lá. Ele rapidamente fez as contas e percebeu que já estavam atrasados de qualquer forma, então decidiu que podia aproveitar sua preguiça mais alguns minutinhos.
Quando pensou em levantar e ir até a cozinha, ouviu os passos de se aproximando do quarto, e logo em seguida a viu passar pela porta carregando uma bandeja de café da manhã.
Ele sorriu quando ela se sentou na beirada da cama, colocando a bandeja ao lado dele. se sentou, ajeitou o travesseiro às suas costas para poder se escorar e esticou o braço para alcançar um dos copos de suco.
- Sério mesmo, muito obrigado por ter tido a ideia idiota de entrar numa escola caindo aos pedaços. E por ter ido me procurar aquele dia no quartel. – Ele falou, em tom sério, depois de dar um gole na bebida.
- Eu me agradeço todos os dias por isso também. – Ela sorriu, lançando uma piscadela na direção dele. – Mas coma logo, porque já estamos atrasados, pra variar.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 1:39PM
De fato, a família de tinha sido, de longe, a mais tranquila que já tinha conhecido – e, levando em conta que ele já tinha sido apresentado a uma quantidade razoável de famílias, aquilo realmente significava algo.
Eles estavam sentados à mesa após o almoço e todos tinham recebido muito bem, fazendo questão de envolvê-los nas conversas. E , é claro, tinha feito questão de fazê-lo passar vergonha também.
- Você sabia, Jay, que na primeira vez que ele foi ao meu apartamento, quase não entrou por medo de que você morasse comigo? – Ela contou, rindo, e seu irmão gargalhou, virando-se na direção de com um olhar divertido.
- Eu já disse, tenho uma irmã mais nova também, sei como funcionam as coisas. – se defendeu e Jay assentiu com a cabeça, ainda rindo.
- Ele sabe das coisas, . – Ele disse, dando uma piscadela para a irmã. O resto da família, por outro lado, ainda ria de , que olhou para e moveu a boca, formando as palavras “você me paga”, ainda que sem emitir som algum.
- E como vocês se conheceram, mesmo? – A irmã mais nova de , Crystal, perguntou, revezando seu olhar entre os dois.
olhou para ela, sem saber bem como contar, pois não sabia o quanto ela tinha contado à família sobre o acidente que sofrera, então deixou que ela falasse.
- Eu... Sofri um pequeno acidente enquanto fazia algumas fotos pra minha exposição e foi quem me salvou. – Ela explicou, sem entrar em muitos detalhes. Crystal parecia encantada, como se estivesse fantasiando um conto de fadas perfeito em sua cabecinha pré-adolescente, enquanto a mãe de a olhava de cenho franzido.
- Você ainda não parou de se enfiar nesses lugares caindo aos pedaços? – A mulher mais velha falou em tom de repreensão e rolou os olhos discretamente. virou-se para ela com um olhar que dizia “Viu como não sou só eu?” e ela desviou o olhar.
- Eu sempre digo o mesmo, Sra. , mas quem disse que ela me ouve? – Ele deu de ombros, sorrindo. – Mas ela já terminou as fotos, não é mesmo? – Lançou um olhar significativo para a namorada, pois eles já tinham tido algumas discussões sobre aquele assunto, nas quais ele sempre insistia que ela devia parar de se colocar em risco daquele jeito quando já tinha imagens suficientes para sua exposição.
Na última, ela havia cedido e dito que sim, aquela exposição estava completa – ou talvez simplesmente quisesse encerrar a discussão.
- Hm... Mais ou menos, na verdade. – Ela disse, com cuidado, sabendo que aquele era um assunto complicado com e querendo evitar discuti-lo naquele momento. Ela não deu mais muitos detalhes daquilo e agradeceu quando sua tia voltou à mesa com a sobremesa e já mudando de assunto, mas sabia que, no momento em que voltassem para casa, ia querer continuar a conversa.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 6:12PM
tinha ficado meio calado pelo resto da tarde, falando apenas quando alguém falava diretamente com ele, mas disfarçou bem o suficiente para que apenas notasse o quanto ele estava incomodado com o fato de que ela ainda estava pensando em visitar alguns lugares para novas fotos. Ela estava agradecida por ele evitar um conflito na casa de seus pais, mas também não estava nem um pouco ansiosa para voltar para casa e iniciar aquela conversa.
O homem tinha o olhar fixo na estrada, com mais atenção do que o normal, já que a neve voltara a cair no final daquela tarde. O rádio era a única coisa que quebrava o silêncio dentro do carro, mas mal ouvia a música que tocava – estava ocupado demais em seus pensamentos, tentando entender por que nunca o escutava.
- Então, onde está pensando em ir dessa vez? – Ele finalmente perguntou, tentando manter sua voz neutra, quando já estavam entrando novamente em Chicago.
- São alguns lugares diferentes, na verdade. – Ela fez uma pausa curta, voltando a falar antes que interrompesse sua explicação de por que ela tinha pensado naquilo. – Eu fiz algumas pesquisas na semana passada, e encontrei alguns lugares que renderiam umas fotografias maravilhosas no inverno, com neve e tudo o mais. E não quero perder a oportunidade.
- Você sabe o que eu penso disso. – Ele disse, simplesmente, suspirando. Estava cansado daquela mania dela de nunca estar satisfeita com o que já tinha e de não entender o quanto se arriscava.
Ele entendia. Ele já tinha visto um número suficiente de acidentes de todos os tipos para entender todos os riscos que ela corria. Sentia-se como se tivesse acabado de levar um soco no estômago só de pensar em em todas as situações que poderiam acabar acontecendo com ela.
- , você precisa parar de se preocupar tanto com isso. Não é porque aconteceu uma vez, que vai acontecer de novo. Eu vou e volto em no máximo uma semana. – Ela disse, virando-se para olhá-lo, sem saber mais o que dizer para convencê-lo. Entendia que ele se preocupava com ela, mas também sabia se cuidar sozinha. – E eu já comprei as passagens.
parou em um sinal vermelho e abaixou a cabeça antes de virar o rosto para ela, uma certa decepção expressa em seus olhos.
- E pretendia me contar isso quando? – Sua voz saiu muito mais fria do que ele esperava, mas ele não se importou com aquilo no momento. Esperou uma resposta, mas o olhava com os lábios pressionados um contra o outro em uma linha fina, sabendo que, mais do que o fato dela continuar visitando aqueles lugares para mais fotos, o fato de não ter contado a ele o que estava planejando era o que o incomodava de verdade.
- Droga, ! – Ele exclamou, batendo com as mãos no volante e finalmente deixando sua irritação ser expressa em sua voz. O sinal abriu e ele acelerou o carro outra vez. Não era como se quisesse mandar nela e impedi-la de completar sua exposição. Mas esse era o problema: sua exposição já estava completa, ela mesma tinha dito isso alguns dias antes. Sim, talvez as novas fotos fossem uma boa adição a ela, mas não eram necessárias. Ele não se importaria tanto se ela fosse tirar as fotos por perto e ele pudesse acompanhá-la, como já tinha feito algumas vezes desde que a conhecera. Mas como ela mesma já tinha dito que tinha comprado as passagens, ele sabia que provavelmente iria até outro estado. – Eu não vou estar lá para poder te ajudar.
- Eu não preciso de você pra me salvar o tempo todo, ! – Ela acabou explodindo, irritada, mas se arrependeu no momento em que as palavras deixaram sua boca. Sabia que o que tinha dito machucaria , e aquilo não era o que queria, por mais incomodada que estivesse com a superproteção dele naquele assunto.
O homem crispou os lábios e apenas assentiu com a cabeça e permaneceu em silêncio pelo resto do percurso, sem tirar os olhos da estrada em nenhum momento.
- Me deixe no meu apartamento. – pediu dez minutos depois, quando se aproximaram da região onde os dois moravam.
virou o rosto para olhá-la incrédulo, como se não acreditasse que era assim que ela terminaria a discussão: indo para casa e fingindo que eles já não tinham planejado nada para aquela noite. Mas não disse nada, simplesmente deu de ombros e, cinco minutos depois, parou o carro em frente ao prédio dela. Ela abriu a porta e desceu do carro sem dizer uma palavra sequer.
- Boa noite. – falou, em um tom irônico e elevando a voz, para que ela o ouvisse mesmo com o barulho da porta fechando. Ele não esperou uma resposta, nem esperou que ela entrasse no prédio antes de ir embora, como sempre fazia; nem mesmo esperou que ela desse a volta no carro e chegasse até a calçada.
Pelo lado bom, pelo menos a garrafa de vinho que tinham separado para o jantar daquela noite seria toda dele, então.
31 DE DEZEMBRO DE 2014, 11:57PM
A música tocava alta, Julie tinha sumido alguns minutos atrás para buscar mais taças de champagne, e estava apoiada ao parapeito da sacada da casa de algum amigo de Julie, que as tinha convidado para sua festa de Ano Novo. Ela tinha voltado de sua última viagem naquela tarde e, agora sim, estava finalmente satisfeita com sua exposição. Já tinha entrado em contato com algumas galerias e só lhe faltava acertar com uma delas para, finalmente, marcar a data. Na hora em que chegara em casa mais cedo, tinha pego o celular e digitado uma mensagem para , avisando-o que tinha voltado, como tinha se acostumado a fazer no tempo que os dois tinham passado juntos, mas lembrou-se no último momento que não havia recebido notícias dele desde a última discussão no dia de Natal, então simplesmente a deletou e deixou aquilo de lado, por mais que a incomodasse.
Naquele momento, porém, sentiu que devia engolir o orgulho pelo menos um pouquinho. Quem sabe assim, no próximo ano seu orgulho não a impediria de fazer tantas coisas quanto no último. Pegou o celular na bolsa que carregava pendurada no braço e digitou rapidamente uma mensagem para , antes que Julie voltasse.
A sala do quartel estava decorada, eles tinham uma grande refeição feita e todos tinham as taças de plástico cheias de champagne sem álcool, prontas para o brinde da virada.
estava de serviço naquela noite e aquilo não o incomodava tanto assim, pela primeira vez. Pelo menos, não acabaria com dominando seus pensamentos outra vez. Ouviu seus colegas fazendo a contagem regressiva e se juntou a eles, rindo alto com as caretas e palhaçadas que alguns deles faziam.
Dez.
Nove.
Oito.
Sete.
Seis.
Cinco.
Ele sentiu o celular vibrar no bolso e o tirou rapidamente, curioso. A mensagem era tão curta que nem precisou abrir para lê-la totalmente.
“Feliz ano novo. Xx. .”
Quatro.
Três.
Dois.
Um.
Ele sentiu o champagne das taças dos amigos respingar nele – e provavelmente em todos à sua volta – quando as ergueram para o brinde, enquanto desejavam uns aos outros um feliz ano novo.
Deu um gole na bebida e tirou o celular do bolso, pensando em como responder à mensagem, mas a sirene do quartel tocou e ele o guardou, largou a taça no primeiro lugar que encontrou, e correu para o caminhão.
15 DE JANEIRO DE 2015, 7:13PM
O dormitório do quartel de bombeiros estava envolvido num breu total, mas ele não havia feito questão de esticar o braço e acender a luminária sobre a mesinha ao lado da cama. Seus olhos continuavam fixos no teto e seus ouvidos atentos ao tic-tac irritante do relógio, como se tentasse marcar o tempo.
Até então, estava funcionando.
Sabia que eram sete e treze da noite, e também sabia que, dentro de pouco mais de meia hora, a mulher de sua vida estaria dando um enorme passo em sua carreira e ele não estaria presente.
Não estaria ao lado dela porque era um imbecil que tentara impedir que ela finalizasse a exposição, que seria inaugurada naquela noite.
E óbvio que ela sequer lhe mandara uma mensagem com a data e o horário. Ele ficara sabendo por que um de seus colegas lhe trouxera um panfleto de divulgação da exposição naquela tarde. Panfleto que, por sinal, continuava em suas mãos, mesmo que não conseguisse mais ler as palavras nele, devido à escuridão.
Respirou fundo mais uma vez e levantou da cama, amassando o papel em suas mãos. Pro inferno com aquele orgulho, que o instigava a deixar toda aquela história de lado. Ele ia, sim, estar do lado dela naquele dia tão importante em sua vida profissional, quisesse ela ou não.
Assim que deixou o dormitório, com a intenção de ir até a sala do Coronel pedir permissão para deixar o quartel por algumas horas naquela noite, a sirene tocou, fazendo-se ser ouvida em todo o quartel.
fechou os olhos, na esperança de que a chamada fosse apenas para os paramédicos, mas não. A sorte não estava com ele naquele dia.
Bufou irritado e mudou a direção para onde andava, correndo para o caminhão, assim como seus colegas.
Sentou emburrado no banco dianteiro, ao lado do motorista, e viu o loiro atrás do volante observá-lo por alguns segundos, enquanto tirava o caminhão da garagem. Antes mesmo que qualquer piadinha sobre seu humor pudesse ser feita, resmungou:
- Hoje não, Harvey.
A equipe de tinha levado quase uma hora para resgatar as vítimas do incêndio para que foram chamados e finalmente apagar totalmente o fogo.
- Harvey. Antes de voltarmos pro quartel... Pode me levar até a galeria? – Pediu, enquanto tirava as roupas pesadas à prova de fogo que tinha usado. Sequer precisou dizer qual era a galeria; os colegas estavam bem familiarizados com a situação dele e de . não se importava com o fato do lugar ser quase do outro lado da cidade. Precisava estar lá, mesmo atrasado, suado, de uniforme e com o rosto sujo de fuligem do incêndio anterior.
Com a sirene do caminhão ligada para que abrissem caminho, chegaram à galeria em menos de meia hora. desceu, agradeceu aos amigos pela carona e disse que voltassem para o quartel. Assim que saíram, ele virou-se para a entrada da galeria e a observou por alguns minutos, respirando fundo e criando coragem para entrar e encontrá-la.
Riu sozinho da situação. Poderia entrar sem hesitar em um prédio em chamas, mas não conseguia engolir o orgulho e entrar logo na galeria onde a mulher que amava estava realizando a primeira grande exposição de sua vida.
Ele levantou o olhar até uma janela do andar superior e a viu. também o tinha visto e tinha os olhos fixos nele; a expressão dela era uma mistura de alegria e ressentimento e ele imaginava que a sua devia ser algo do tipo.
fez menção de avançar em direção à construção, mas só então percebeu que algumas pessoas se apressavam em direção à saída e outras gritavam ainda lá de dentro.
Franziu o cenho e então sentiu o cheiro ao qual já estava tão acostumado.
Fumaça.
olhava o relógio a todo momento e, sempre que podia, ia até uma janela, esperando que, por algum milagre, ele aparecesse. Sentia-se ridícula, observando cada carro que passava em alta velocidade pela avenida e desejando que estivesse dentro de um deles.
Mas ele não estava.
Ela voltou-se para o salão onde acontecia sua exposição, trazendo de volta um sorriso largo ao seu rosto. Era seu grande dia, afinal. Não podia deixar que o fato dele não estar ali estragasse aquilo. Fez o melhor que pôde para tirá-lo de sua cabeça, conversou com as pessoas presentes, até mesmo recebeu propostas de pessoas que gostariam de conhecer mais de seu trabalho, mas sempre acabava voltando para a janela.
Até o momento em que o viu parado ali em frente à galeria. Parecia estar tentando se convencer a entrar. Ela o observou até que ele olhasse para cima.
Seus olhares se cruzaram e ela soube: aquele tempo todo sem se falarem tinha sido tão difícil para ele quanto para ela.
Os segundos se passaram e ela se esforçou para não gritar, mandando-o entrar e subir de uma vez até o salão onde ela estava.
Porém, quando ele parecia ter finalmente se decidido, algo chamou a atenção dele no andar de baixo da galeria. Ela olhou ao seu redor e viu um dos seguranças na entrada do salão, gesticulando para que as pessoas saíssem. conseguiu ouvir as pessoas no andar de baixo gritando, mas não conseguia entender o motivo. Então, quando chegou à porta, viu o fogo que lhe bloqueava o caminho.
não pensou duas vezes antes de correr para dentro da galeria. Sentiu os seguranças tentando segurá-lo e impedi-lo de entrar, mas desvencilhou-se deles, resmungando e apontando para a insígnia em sua camiseta do uniforme. Ele conseguia ouvir as sirenes de um caminhão de bombeiros ao longe, mas não conseguiria esperar do lado de fora sabendo que estava ali. O fogo parecia ter se iniciado no fundo, mas ele não parou para descobrir como, pois seu coração acelerou ao perceber que a única escada levando ao segundo andar estava parcialmente bloqueada pelas chamas. Xingou alto e olhou ao seu redor, procurando por algo que pudesse ajudá-lo a chegar ao andar de cima.
Correu até uma das janelas e arrancou uma das cortinas de seu suporte, agradecendo por elas serem feitas de um tecido relativamente grosso. Foi até uma mesa de canto e jogou fora as flores que estavam dentro de um vaso. Despejou a água de dentro dele sobre a cortina, encharcando-a o máximo que pode.
Ele jogou o tecido sobre si mesmo e respirou fundo antes de correr em direção à escada em chamas, mas não hesitou. O calor o incomodava enquanto passava pelos primeiros degraus, mas sua proteção improvisada tinha sido o suficiente para permiti-lo chegar à parte da escada que ainda estava intacta.
Ao chegar ao segundo andar, viu que não só estava presa ali, mas também algumas outras pessoas que não haviam chego até a escada a tempo.
correu até ele e jogou os braços ao redor de seu pescoço, esquecendo de qualquer briga, rancor ou orgulho. Ele estava ali, de novo, para salvá-la. Nenhum dos dois precisava de sequer uma palavra para ter certeza de que estavam perdoados.
- Você é louco. – Ela murmurou e ele riu, beijando-a rapidamente nos lábios antes de soltá-la do abraço e afastá-la de si.
- Eu sei. – Disse, com pressa. – E você pode me xingar o quanto quiser mais tarde, mas primeiro preciso tirar você daqui.
assentiu enquanto ele olhava preocupado ao redor, tentando encontrar algum lugar por onde todos pudessem sair, além da escada que, agora, já estava quase totalmente em chamas.
xingou outra vez, correu até a porta e a fechou, esperando que aquilo pelo menos atrasasse o fogo, caso ele chegasse até o topo das escadas. Ele foi até a janela e olhou para baixo, ponderando a possibilidade de sair por ali, mas era alto demais. Balançou a cabeça, irritado. Onde estavam os malditos bombeiros?
Finalmente, pouco depois, ele viu o caminhão virando a esquina ao lado da galeria. Agradeceu internamente quando viu Scott descer do veículo – era o caminhão de seu quartel, que provavelmente recebera a chamada por estar nas imediações.
- SCOTT. – Gritou, da janela, e viu o amigo levantar o olhar, assustado. – O fogo bloqueou a escada e continua subindo. Tem oito pessoas aqui em cima e nenhuma outra saída.
Scott assentiu com a cabeça e ordenou que os outros levantassem a escada até a janela onde estava. Assim que ela foi colocada à frente do parapeito e outro de seus colegas se aproximou, fez um sinal para que passasse pela janela. Ela quis discutir, mas ele não a deu chance nenhuma, lançando um olhar sério na direção dela. Seria a primeira a descer e ele iria logo depois que todos os outros estivessem a salvo. Ela assentiu e passou.
a viu esperar agoniada próxima do caminhão enquanto ele ajudava todos os outros a saírem da galeria.
Ele ouviu os ruídos que a porta fazia conforme o fogo começava a consumi-la e sabia que ela não aguentaria mais muito tempo. Apressou as duas últimas mulheres que estavam ali e, quando a última delas estava passando pela janela, a porta cedeu.
Um estalo alto foi ouvido quando ela se abriu e, com a explosão causada pelas chamas, que aumentaram rapidamente adentrando o salão, parte do teto cedeu.
lançou um olhar alarmado para Spector, que ajudava a mulher a sair o mais rápido possível, e jogou-se contra o chão, protegendo a cabeça com os braços, mas não viu mais nada depois disso.
15 DE JANEIRO DE 2015, 9:55PM
não conseguia controlar as lágrimas, que ainda caíam de seus olhos continuamente desde que saíra da galeria dentro da ambulância que levara para o hospital. Não conseguia deixar de pensar que, se o tivesse convencido a descer junto dela, ele não estaria agora inconsciente na cama de um hospital. Os médicos tinham dito que ele provavelmente ficaria bem e acordaria dentro de algumas horas, mas ela não se acalmaria até vê-lo abrir os olhos outra vez.
Ela andava de um lado para o outro dentro do quarto, olhando na direção dele a cada trinta segundos. Sentava de vez em quando ao lado da cama, mas estava inquieta demais para ficar parada por mais de dois minutos.
Finalmente, ela o ouviu se mexer de leve sobre a cama e foi até ele rapidamente, sentando-se ao seu lado e segurando a mão dele entre as suas.
- ? – Chamou baixinho, vendo-o abrir os olhos devagar. Ele virou o rosto para olhá-la e abriu um pequeno sorriso.
- Estou vivo, . – Ele disse, com a voz fraca e rouca. – Pode tirar esse olhar desesperado do rosto.
- Você é louco. – Ela respondeu, mesmo sabendo que já tinha dito aquilo antes. assentiu minimamente com a cabeça, rindo. Ou tentando rir, já que sua sonolência não lhe permitia muito. – E um idiota. E pare de rir!
- Você fica linda irritada assim. – comentou, como se ela não estivesse brigando com ele.
balançou a cabeça de um lado para o outro, cedendo e soltando uma risada fraca. Ela ficou em silêncio alguns minutos antes de voltar a falar.
- Eu só espero que a gente não precise de um incêndio para resolver cada briga que tivermos, porque eu não quero passar por isso tudo de novo. – Falou, sua voz em um sussurro, fazendo com que sua fala soasse quase como uma confissão. Ele crispou os lábios antes de responder.
- Não vai. Prometo. – Disse, acariciando a mão dela com o polegar, reconfortando-a. – Mas se precisarmos, eu vou estar lá para te salvar. De novo.
17 DE JANEIRO DE 2015, 2:37PM
tinha os braços esticados à sua frente, tateando, pois não conseguia ver nada devido à venda que tinha colocado em seus olhos. Sua curiosidade só aumentava enquanto ela o guiava para Deus-sabe-onde, principalmente quando ela gargalhava cada vez que ele insistia para que ela o contasse o que estava acontecendo.
Finalmente, ele ouviu as portas de um elevador se abrir e ela o deu um empurrãozinho de leve nas costas para que ele entrasse. Não demorou muito para que as portas se abrissem outra vez e ela o encaminhasse para uma das portas. Ela a abriu, deixou que ele entrasse e, então, retirou a venda.
Era o apartamento de , disso tinha certeza. Mas os móveis em sua sala de estar tinham sido todos afastados para que alguns cavaletes pudessem ser colocados naquele espaço. Em cada um deles, havia uma fotografia emoldurada. A primeira, ele reconheceu, era da escola onde ele tinha salvado pela primeira vez.
- Você acabou não indo à inauguração da exposição. – A mulher explicou, quando ele se virou para ela, sorrindo. – E ainda estão reformando a galeria depois de tudo. Então, eu... Fiz a exposição pra você.
Ele riu, maravilhado, andando pela sala e observando todas as imagens. tinha um único pensamento em sua mente, enquanto observava o trabalho de sua namorada: Como ele pôde querer impedi-la de continuar a tirar aquelas fotos? Admitiu para si mesmo, naquele momento, que as fotografias que tinham sido o motivo de sua briga com eram algumas das mais bonitas da coleção.
Ele parou em frente ao último cavalete e franziu o cenho. A fotografia nele não mostrava um lugar em ruínas nem nada do tipo. Era uma foto da área de serviço do apartamento de . Era o lugar exato onde tinham dado o primeiro beijo, ele lembrou, mas ainda assim... Não fazia sentido. Virou-se para ela, sem entender.
- Acho que não sou artístico o suficiente para entender essa foto aqui. – Disse, a confusão claramente expressa em seu rosto, e aquilo parecia divertir , que obviamente tinha feito aquilo de propósito e tinha, inclusive, ensaiado as palavras que usaria para explicar aquela imagem em particular.
- Essa é especial da sua exposição. – Falou, andando na direção dele e parando a poucos centímetros de distância. Ele a encarou ainda confuso, apoiando os braços na cintura da mulher.
- Mas não tem nada em ruínas ali. – Sua frase soou quase como uma pergunta, ainda pedindo uma explicação. Ela baixou o olhar, observando seus próprios dedos contornarem os desenhos da camiseta que ele usava.
- Tem, sim. – prendeu o lábio inferior entre os dentes, um pouco nervosa com o que estava prestes a confessar, e voltou a olhar nos olhos dele. – Porque cada vez que eu olhava pra ela, eu caía aos pedaços.
a encarou surpreso, a boca entreaberta com o que tinha acabado de ouvir. Céus, definitivamente, ele amava aquela mulher.
Ele tomou a boca dela com a sua, não de forma voraz ou apressada, mas do jeito mais terno que conseguiu. Logo em seguida, afastou-se o mínimo possível, apenas o suficiente para conseguir falar.
- Problema resolvido, então. Porque agora nós dois estamos inteiros outra vez.
A rua estava praticamente vazia ao entardecer, um vento frio soprava e, a julgar pelas nuvens cinzentas no céu, choveria em breve. Mas aquilo não impedira de sair de casa e ir até a periferia de Chicago, para conseguir mais algumas fotos para a exposição que estava montando e pretendia realizar em breve. Ainda precisava encontrar um local onde expor a série de fotos que estava juntando, mas naquilo ela pensaria depois.
No momento, estava mais preocupada em conseguir encontrar a construção que procurava e conseguir as fotos antes que a chuva resolvesse cair de vez.
Caminhou por mais alguns quarteirões, os dedos apertados em volta da alça da bolsa onde carregava a câmera, sentindo-se um pouco apreensiva e reprovando-se mentalmente por não ter levado ninguém consigo; agora via com clareza que sua melhor amiga estava certa: aquela vizinhança não era das mais amigáveis.
Finalmente avistou, ao final de uma rua estreita, a antiga escola do bairro. Ela já não funcionava mais há anos, sua fundação havia sido comprometida em uma forte nevasca e a construção havia sido condenada, mas continuava ali, agora tomada por ervas daninhas e folhagens, que cresciam livremente sobre as paredes externas.
A maioria das janelas tinha os vidros quebrados e, mesmo olhando-se de longe, já era possível ver claramente que a estrutura estava comprometida.
não sabia exatamente o porquê, e também não conseguia explicar, mas via uma certa beleza na deterioração – natural ou não – que ocorria naquelas construções abandonadas que ela vinha fotografando, em vários estados e cidades diferentes, nos últimos dois meses. Se seu projeto desse certo, conforme ela planejava, seria sua primeira grande exposição e ela queria causar certo impacto com suas imagens.
Antes mesmo de se aproximar mais da construção, ajoelhou-se na calçada e abriu a bolsa onde carregava seus instrumentos de trabalho. Para não correr o risco de se perder no tempo depois que entrasse na antiga escola, queria aproveitar a iluminação natural fornecida pelo sol, que se punha naquele horário, perfeita para a imagem que ela tinha em mente.
Escolheu a lente certa entre as várias que trouxera até ali e conectou-a a câmera. Tirou várias fotos, de vários ângulos diferentes, para que pudesse selecionar a que mais lhe agradasse depois. Aproximou-se mais, atravessando o que costumava ser o pátio da escola, e passou a tirar fotos de alguns detalhes ainda externos da construção. O portão enferrujado; uma janela parcialmente quebrada; a maçaneta pendendo torta na porta, ainda presa à madeira por apenas um parafuso; os tijolos expostos, não mais cobertos pela camada de tinta, que parecia ter sido amarela um dia.
Quando terminou com as fotos externas, finalmente adentrou o prédio, sempre olhando com muito cuidado onde pisava e rezando para que não acabasse encontrando nada muito assustador ali dentro. Nas outras construções em que havia entrado nos últimos tempos, tinha encontrado um bom número de ratos, baratas e outros animais nojentos, mas ainda não havia se acostumado com eles.
Com cuidado, seguiu tirando suas fotos, tanto de cômodos inteiros quanto de pequenos detalhes que encontrava. Entrou em inúmeras salas, caminhou pelos corredores, que lhe pareciam sombrios até demais, e então alcançou as escadarias.
No segundo andar, a primeira sala que encontrou foi um antigo laboratório de ciências. Podia ver dezenas de objetos de vidro quebrados pelo chão, algumas bancadas e cadeiras viradas e armários caindo aos pedaços. Tinha certeza que conseguiria imagens perfeitas para sua exposição naquela sala.
Porém, quando deu mais alguns passos em direção ao centro do cômodo, ouviu um estalo alto.
E então, o chão cedeu.
22 DE OUTUBRO DE 2014, 5:48PM
A sirene tocou, fazendo-se ouvida em todo o quartel. Enquanto toda a equipe corria para entrar no caminhão e os paramédicos alcançavam a ambulância, o endereço para onde deveriam ir era informado.
Assim que chegaram ao local indicado, saltou do caminhão, aproximando-se de um senhor de idade que esperava por eles na rua, logo em frente a uma antiga escola, já abandonada havia alguns anos.
- Parece que algo desmoronou dentro da escola. – Ele informou, antes mesmo que o bombeiro perguntasse. – Ouvi um grito logo antes do estrondo, mas depois disso chamei várias vezes e ninguém respondeu.
assentiu com a cabeça e voltou-se para sua equipe, que esperava por suas ordens, prontos para entrar na construção.
- Harvey, vem comigo no primeiro piso. Parker e Spector, segundo andar. – Ordenou e viu todos assentirem, seguindo-o assim que ele começou a andar em direção à escola. Ao entrar, pediu que Harvey verificasse as salas à esquerda do corredor principal, enquanto ele se encaminhou para o lado direito. Enquanto abria as portas uma por uma, ouviu os passos de seus outros colegas subindo as escadas. A cada porta que abria, chamava, esperando que alguém respondesse, mas não ouviu nada até abrir a sexta porta. A voz de quem quer que fosse que estivesse ali não era mais do que um murmúrio e, ao perceber que apenas as pernas dela estavam visíveis, ele se apressou, correndo na que, obviamente, haviam caído do andar superior – havia um buraco com quase dois metros de largura logo acima.
- Encontrei a vítima. Sexta sala à direita. – Informou aos outros, pelo rádio. – Parker e Spector, cuidado. O piso superior pode acabar cedendo em outros lugares.
Enquanto esperava que seus colegas terminassem a busca por mais vítimas e depois viessem até o local onde ele estava, começou a retirar parte dos entulhos – pedaços de concreto, tábuas de madeira e até cadeiras e mesas quebradas – da pilha, logo descobrindo uma mulher por baixo dela.
- Ei. Consegue me ouvir? – Perguntou, quando conseguiu tirar parte dos entulhos que antes a cobriam completamente. O rosto dela estava manchado de sangue, que escorria de um pequeno corte em sua testa. Ela assentiu fracamente com um movimento de cabeça. – Qual seu nome?
- . – Ela conseguiu murmurar, a voz extremamente fraca e a respiração rasa e acelerada, como se tivesse dificuldades para respirar.
- Certo, , eu sou . Vou tirá-la daqui, tudo bem? – Garantiu a ela. Retirou mais alguns pedaços de madeira que estavam sobre ela e então percebeu por que a mulher não respirava direito. Ela estava presa sob um grande bloco de concreto, que havia caído sobre seu peito. Pelo rádio, pediu que os paramédicos entrassem.
Harvey chegou à sala em seguida e observou a situação, abaixando-se ao lado do colega.
- Vamos precisar de alguma coisa para levantar o concreto e tirá-la daí. – Disse, logo em seguida. assentiu com a cabeça e pediu pelo rádio que alguém trouxesse as ferramentas de que precisariam para resgatar a mulher. Ele levantou assim que os paramédicos chegaram, já trazendo também as ferramentas que pedira, mas estendeu o braço para segurar a mão dele.
- Fica. – Pediu, em mais um sussurro. Ele virou-se para encarar Preston, o paramédico que estava logo atrás, como se perguntasse se podia permanecer ali sem atrapalhar o atendimento. Preston assentiu com a cabeça, em seguida fazendo outro gesto para que se afastasse pelo menos um pouco para o lado, abrindo mais espaço para que ele trabalhasse. Mantendo-se perto de , para que ela permanecesse calma, pediu que os outros bombeiros de sua equipe, que já haviam chegado ali, terminassem o resgate, levantando o bloco que mantinha a mulher presa.
Quando ela finalmente pôde ser retirada, se afastou e deixou que os paramédicos terminassem seu trabalho e a levassem para a ambulância, voltando para o caminhão e seguindo de volta para o quartel, enquanto era levada para o hospital.
Trabalho feito. Havia atendido a mais uma chamada normal em um dia normal de trabalho.
Ou não.
22 DE OUTUBRO DE 2014, 9:02PM
entrava no quartel pela quinta vez naquele dia, voltando de mais uma chamada, enquanto retirava o casaco pesado do uniforme que vestia. Deixou-o dentro do caminhão e desceu, observando o relógio em seu pulso. Era nove da noite, o que significava que seu turno naquele dia já havia acabado.
Foi rapidamente até o vestiário, trocou o restante do uniforme por roupas normais e depois passou no dormitório para pegar algumas coisas que havia deixado lá. Sentiu a mochila mais pesada do que o normal e franziu o cenho, tentando lembrar o que estava lá. Não demorou para que se lembrasse da câmera que um de seus colegas havia encontrado embaixo dos escombros da escola, na chamada que haviam atendido algumas horas antes.
Provavelmente pertencia à mulher que ele encontrara e que, por algum motivo, continuava em seus pensamentos desde então. Balançou a cabeça, dispersando seus pensamentos, jogou a mochila nas costas e saiu do quartel, despedindo-se de seus colegas no caminho.
Entrou no carro, apoiou as mãos no volante e parou por alguns segundos, pensando no que faria a seguir. Abriu a mochila e pegou a câmera nas mãos.
Será que encontraria ali o motivo para a mulher estar naquela construção abandonada?
Tomado pela curiosidade, ligou a câmera e pressionou alguns botões até conseguir fazer com que as fotos fossem exibidas. Passando uma por uma, impressionou-se com a forma com que os detalhes e objetos mais simples eram expostos nas imagens; não entendia muito sobre fotografia, mas com certeza aquela mulher havia feito um ótimo trabalho.
Desligou a câmera e deixou-a de lado, decidido a ir até o hospital, esperando que ainda estivesse lá, para que pudesse devolvê-la.
Não levou mais de vinte minutos para estacionar o carro em frente ao hospital. Perguntou à moça da recepção se poderia visitar e, em pouco tempo, uma enfermeira lhe acompanhou até o quarto dela.
Ele bateu de leve na porta com os nós dos dedos antes de abri-la devagar e colocar a cabeça para dentro do quarto.
- ? – Chamou, em voz baixa, e a viu desviar os olhos da pequena televisão no canto do cômodo para observá-lo. Ela esboçou um sorriso e se sentou melhor na cama enquanto ele entrava e se aproximava dela.
- , né? – Perguntou, e ele assentiu com a cabeça, sentando na cadeira próxima da cama.
- Nós encontramos sua câmera depois que te trouxeram pra cá. – Ele levantou a mão que segurava a câmera, depois a colocou sobre a mesa de cabeceira. – Achei que você ia querer de volta.
- Com certeza. – Ela riu baixo, assentindo. – Obrigada.
- Imagina. Eu não entendo de fotografia, mas... Você faz um belo trabalho. – Elogiou, vendo as bochechas um tanto pálidas de corarem de leve enquanto ela sorria em agradecimento. – Como você está?
- Foi só um susto. Só preciso ficar em observação essa noite. – Ela disse, e logo depois um silêncio constrangedor se instalou no quarto. voltou os olhos para a televisão, que passava uma comédia romântica qualquer, e nem percebeu que a observava com um meio sorriso nos lábios.
Ele não sabia bem por que havia ele mesmo ido devolver a câmera. Podia simplesmente ter pedido para que um de seus colegas o fizesse, ou apenas tê-la deixado no balcão de informações do hospital, para que entregassem a . Mas algo o fazia sentir que devia vê-la outra vez, e ali estava ele, mas sequer sabia o que dizer. Só sabia que algo nela o encantava.
- Por que estava fotografando aquela escola hoje? – Ele perguntou, de repente, querendo manter a conversa.
- Eu estou organizando uma exposição. – A mulher explicou, voltando a olhá-lo. – É a primeira grande exposição que vou fazer sozinha, sabe. E queria fazer algo... Diferente. – Fez uma pausa, buscando uma forma de explicar o conceito que tinha em mente e que a havia levado até a escola. – Sempre achei que lugares abandonados têm uma beleza singular, e queria mostrar isso nas minhas imagens. Já viajei por vários estados, visitando lugares diferentes para fotografar. Mais algumas semanas e a exposição estará pronta, eu espero.
sorria enquanto ela explicava tudo aquilo. Sorria porque conseguia ver em seus olhos o quanto ela gostava do que fazia e quão importante era, para ela, mostrar para os outros como ela via aquelas construções abandonadas e em ruínas, que muita gente sequer notava, de forma tão diferente.
- Não se esqueça de me avisar quando a exposição começar, então. – Ele sorriu de lado, realmente esperando que ela o convidasse, mas ao mesmo tempo desejando que pudesse vê-la antes daquilo.
- Não esquecerei. – Ela assentiu com a cabeça, um sorriso tímido curvando seus lábios, como se dissesse “Como poderia esquecer do cara que salvou minha vida?”
- Bom... Tá na minha hora. – disse, ao se levantar da cadeira, quando percebeu que a conversa ia morrendo outra vez e querendo evitar um novo silêncio desagradável entre os dois. – Se cuide, sim? Não quero ter que salvá-la outra vez.
Ele deu uma piscadela com o olho direito e ela riu e agradeceu enquanto ele deixava o quarto de hospital.
31 DE OUTUBRO DE 2014, 3:27PM
A campainha de seu apartamento tocou poucos minutos depois dela ter chegado em casa. Suspirou, esperando que, por um milagre, fosse algum entregador que tocara a campainha errada. Tinha acabado de chegar de mais de uma de suas viagens, onde tinha fotografado mais algumas casas e prédios para sua exposição, e só queria descansar por algumas horas.
Levantou preguiçosamente do sofá e parou em frente à porta, aproximando o rosto do olho mágico, vendo Julie, sua melhor amiga, do outro lado, parecendo impaciente. não conseguiu segurar uma risadinha. Tinha certeza de que a amiga estaria extremamente irritada com ela – apenas uma semana tinha se passado depois de seu acidente, e ela já havia saído para outra viagem, ficado fora da cidade por quatro dias e sequer tinha avisado Julie. Oopsie.
- Adianta eu pedir para você me poupar do sermão? – Perguntou assim que abriu a porta, antes mesmo que a amiga conseguisse vê-la.
- Boa tarde pra você também, . – Julie resmungou, entrando mesmo sem ser convidada. riu e fechou a porta, balançando a cabeça. Não, não adiantaria. – Onde você esteve?
- Hmm... Detroit. Fotografando. – Deu de ombros, como se aquilo não fosse nada.
- Sério? Droga, , você quase morre e três dias depois já tá se enfiando em mais prédios caindo aos pedaços? – Julie rolou os olhos, claramente irritada com a melhor amiga.
- Eu não quase morri, Julie, sua exagerada. – Foi a vez de resmungar, largando-se novamente sobre o sofá. – De qualquer forma, já fui, já fotografei e já voltei. Inteira. Nem adianta você vir bancar minha mãe agora.
- Juro que dou graças a Deus por não ser realmente sua mãe. Caralho, como você é teimosa. – Julie sentou em um dos banquinhos que combinavam com o balcão, que separava a sala de estar da cozinha do apartamento. não respondeu e Julie manteve o silêncio, como se esperasse que a amiga falasse algo. Porém, conhecia-a bem demais e a tempo demais para acreditar naquilo. tinha decidido não discutir, então não importava o que ela dissesse, não teria uma resposta.
- Certo. Vamos falar sobre algo mais agradável. – Julie falou, quando se deu por vencida. Finalmente, voltou seu olhar para a amiga. – E o bombeiro, lá? Alguma notícia?
riu alto antes de responder.
- Julie, eu sei o primeiro nome dele. E só. – Ela balançou a cabeça, sem acreditar que a melhor amiga ainda estava insistindo naquilo. – E por que ele daria “alguma notícia”? Ele salva pelo menos umas dez pessoas por dia, acha que ele vai atrás de todas elas?
- Por isso mesmo! – A loira exclamou. – Ele não precisava ter ido te visitar no hospital. E não me diga que ele foi só devolver sua câmera. Ele podia ter deixado na recepção do hospital. Podia ter mandado outra pessoa levar. Mas ele foi pessoalmente.
- E daí?! O que você quer que eu faça? Vá bater lá no quartel e o chamar pra um encontro?
sentiu o arrependimento tomar conta de si assim que as palavras deixaram sua boca. Tinha que parar de dar ideias para sua melhor amiga. Agora, tinha certeza, apenas pelo olhar e pelo sorriso que surgiram no rosto dela, que Julie não a deixaria em paz até que ela fizesse exatamente o que tinha dito.
03 DE NOVEMBRO DE 2014, 2:35PM
Julie estacionou o carro em frente ao quartel mais próximo da escola onde havia sofrido o acidente onde conhecera – pelo menos, era o que uma rápida pesquisa no Google as tinha dito. Tinham se passado alguns dias desde que Julie havia tomado como sua missão fazer com que fosse atrás do tal bombeiro, e ela finalmente tinha conseguido. Olhou para a melhor amiga, sentada no banco do passageiro, que não parecia que ia sair do carro tão cedo. Ela deu um empurrão de leve no ombro de .
- Nós não temos o dia todo. – Disse, sua voz em um tom brincalhão, como se estivesse se divertindo com aquela situação.
- Mas nem sabemos se é aqui mesmo que ele trabalha. – Ela respondeu, emburrada como uma criança que não queria ir para o primeiro dia de aula em uma nova escola.
- Se não for aqui, o máximo que vai acontecer é falarem que não tem nenhum nesse quartel. – A loira deu de ombros, sem tirar os olhos da outra. – Vai logo, , ou vou ter que te puxar pra fora do carro e te arrastar até lá dentro?
rolou os olhos, mas tirou o cinto de segurança e abriu a porta, descendo do veículo em seguida.
- Você ainda vai me pagar por isso. – Disse e bateu a porta sem nem esperar uma resposta de Julie, que apenas riu enquanto a assistia ir em direção ao quartel, em passos hesitantes.
entrou e olhou em volta, esperando que estivesse logo por ali e a poupasse de perguntar por ele a um estranho. Por algum motivo, parecia muito menos constrangedor encontrá-lo logo do que ter que procurar por ele.
Porém, não o viu em lugar nenhum – de fato, não viu ninguém por ali –, então se dirigiu até o fundo da sala, onde havia uma pequena cozinha e um homem com o uniforme dos bombeiros mexia em uma panela sobre o fogão, de costas para ela.
- Hm. Olá. – Disse, anunciando sua presença, pois ele parecia não ter percebido ainda que tinha companhia. Ele virou-se para olhá-la, parecendo surpreso.
- Oh. Não vi você entrar, desculpa. Posso ajudar? – Ele sorriu, simpático. Aquilo a tranquilizou um pouco. Não sabia bem por que, mas sentia-se como se todos fossem julgá-la por ir atrás de . Sabia que provavelmente todos eles tinham várias garotas em seus pés – afinal, bombeiros eram, querendo ou não, um fetiche bastante comum entre as mulheres –, mas ainda assim não queria parecer mais uma daquelas. Lógico, tinha se interessado por , mas, naquele momento, queria apenas realmente agradecê-lo pelo o que tinha feito e pela consideração de devolver pessoalmente sua câmera. E então, quem sabe, conhecê-lo melhor.
- Meu nome é . Queria falar com . Ou . Acho que este é o quartel dele. – Disse, o tom incerto de sua voz fazendo sua frase soar quase como uma pergunta, por não ter certeza de que ele realmente trabalhava ali.
- Sim, é aqui sim. – O homem assentiu, limpando as mãos em um pano de prato enquanto saía de trás do balcão que separava a pequena cozinha do restante do cômodo. – Vou chamá-lo, só um minuto.
Ela o observou sair por um corredor lateral e depois olhou em volta pelo cômodo. Seus olhos se fixaram em uma das paredes, onde havia um painel com várias fotos. Algumas com crianças que haviam visitado o quartel, todas parecendo muito animadas por poderem entrar nos caminhões e ver como era realmente o dia de um bombeiro. Parou em uma foto em especial, onde reconheceu com uma das crianças no colo, e admirou o sorriso genuíno que ele tinha no rosto naquele momento; reparou, então, que em todas as fotos que ele aparecia, aquele mesmo sorriso estava presente. Não era como se aquilo fosse uma obrigação para ele – realmente gostava de dar atenção às crianças e proporcionar aquela experiência a elas, e isso era visível. Perceber aquilo só fez encantar-se ainda mais por ele.
ouviu uma batida na porta de sua sala. Tirou os olhos do relatório que estava escrevendo e girou a cadeira para ver Scott parado do outro lado da porta de vidro. Fez um sinal para que ele entrasse e ele a abriu, colocando apenas a cabeça para dentro da sala.
- , tem alguém aqui querendo falar com você.
- Pede pra esperar um pouquinho, tô meio ocupado. – Ele pediu, já girando na cadeira, ficando de frente para a escrivaninha outra vez. – Disseram o nome? Ou o que queriam?
Ele ouviu Scott rir baixo antes de responder.
- Ela disse que se chama . Não disse o que queria. – Ele respondeu, rindo mais alto quando viu girar a cadeira pela terceira vez, as sobrancelhas arqueadas, surpreso.
Aquilo, certamente, não esperava.
- Pode trazer ela até aqui, por favor? – Disse, afinal, ao se recuperar da surpresa. Scott balançou a cabeça de um lado para o outro, rindo e murmurando algo como "engraçado você mudar de ideia assim tão rápido", ao que respondeu, rindo, levantando o dedo do meio na direção do amigo.
Não mais do que dois minutos depois, Scott voltou e abriu a porta da sala, fazendo um gesto para que entrasse. A mulher parecia tímida, as mãos entrelaçadas uma na outra em frente ao corpo, como se não soubesse bem o que fazer com elas.
- . – sorriu, quando Scott fechou a porta e saiu dali. Apontou para a cadeira próxima a ele e ela se sentou. – Que surpresa.
- É, eu... – Ela fez uma pausa, como se precisasse organizar as palavras em sua cabeça antes de falar. – Bom, eu nunca realmente agradeci pelo o que você fez por mim. E achei que, não sei, a gente pudesse sair para um café qualquer dia. Se você quiser, é claro, mas...
não conseguiu não rir ao ver como ela se embaralhava com as palavras, visivelmente nervosa e até um pouco envergonhada. Contudo, ele não ria por querer deixá-la ainda mais sem jeito; ria porque achava tudo aquilo extremamente adorável.
- Claro que podemos. Eu adoraria. – Ele a interrompeu, e ela pareceu genuinamente agradecida por isso. – Meu turno vai até amanhã de manhã. Posso te ligar na quarta-feira?
concordou e ele lhe passou seu celular, para que ela salvasse o próprio número nele.
a observava encantado. Apesar de estar tão nervosa por apenas convidá-lo para um café, ela tinha, afinal, tido a coragem de ir até ali e procurá-lo, pois ele obviamente não tinha como encontrá-la – inclusive, tinha se sentido um idiota por vários dias após visitá-la no hospital e ter ido embora sem sequer ter pedido o número dela ou qualquer coisa que o ajudasse a vê-la novamente.
Ela devolveu o celular para ele e pareceu pensar no que dizer a seguir. Tudo o que tinha pensado em falar e ensaiado em sua cabeça no caminho até ali tinha desaparecido quando o vira. A sirene tocando a poupou de ter que dizer qualquer coisa. Ele levantou de repente, inclinou-se na direção dela e beijou-lhe o rosto.
- Desculpe não poder ficar. O dever me chama. – Ele disse, sorrindo de lado. – Mas nos vemos na quarta-feira, sim?
Ele piscou enquanto se afastava em direção à garagem e ela assentiu com a cabeça, sorrindo. ficou ali por mais alguns minutos depois de perdê-lo de vista, tentando acalmar seu coração, que havia acelerado com o simples toque dele em seu rosto.
Mas o que diabos aquele bombeiro estava fazendo com ela?
05 DE NOVEMBRO DE 2014, 4:24PM
Nem mesmo o clima frio daquele dia impediu que saísse de casa, algumas horas depois de ter ligado para e combinado de encontrá-la em uma cafeteria perto de onde ele morava.
Ele entrou na cafeteria e seus olhos esquadrinharam o lugar, procurando pela mulher, mas não a encontrou. Sentou-se em uma das mesas próximas à janela, tirando o cachecol que usava e deixando-o na cadeira ao seu lado. Não demorou mais de dez minutos para que ele avistasse, pela janela, a garota se aproximando da cafeteria. Ela não o tinha visto, mas ele não conteve um sorriso enquanto a observava caminhando, os braços cruzados à frente do corpo, abraçando a si mesma para manter o sobretudo vermelho o mais fechado possível e proteger-se no vento gelado. Ela logo saiu de seu campo de vista e, poucos segundos depois, entrou pela porta, fazendo o sininho sobre ela tocar.
parou por alguns segundos, olhando à sua volta, e ela deixou um sorriso surgir em seu rosto ao vê-lo sentado ali. Ela se aproximou e sentou na cadeira à frente dele depois de inclinar-se sobre a mesa para cumprimentá-lo com um beijo no rosto.
- Então, posso deduzir que sua exposição vai começar em breve e você quis sair hoje pra me convidar? – perguntou em um tom divertido, após os dois fazerem seus pedidos.
- Ainda não. – respondeu, feliz por ele ter lembrado daquilo e ainda mostrar interesse de ver seu trabalho. – Ainda preciso fazer mais algumas fotos e encontrar uma galeria.
- Mais fotos? – Ele arqueou uma das sobrancelhas. – Já falei, hein, não vai despencar de outra escola por aí.
Ele riu junto ao ouvi-la rir em resposta ao comentário dele. Os dois foram interrompidos pela garçonete, que trazia duas xícaras nas mãos, uma contendo o cappuccino de e a outra com o chocolate quente de , e a conversa, diferentemente daquela conversa no hospital, fluiu facilmente. Não houve nenhum silêncio constrangedor e ambos se pegaram tão envolvidos na conversa que suas bebidas acabaram esfriando antes que terminassem.
Aquilo agradou – e muito – aos dois.
05 DE NOVEMBRO DE 2014, 5:12PM
Os dois nem perceberam o tempo passar durante a conversa e, quando viram, o sol já havia se posto e as luzes nos postes da rua tinham começado a se acender.
e saíram juntos da cafeteria, ainda conversando.
- Você mora aqui perto? – Ele perguntou, mas continuou a acompanhando na direção em que ela andava, agradecido por ser a mesma direção que ele pegaria para voltar para casa.
- Moro, são só algumas quadras de distância. – Ela respondeu, parando no lugar em que estava, prestes a se despedir, mas ele a interrompeu.
- Eu moro pra cá também. Te acompanho até em casa. Você não devia andar sozinha à noite. – deu uma piscadela, rindo, e ela rolou os olhos com o que ele dizia.
- Não precisa, , mesmo. – disse, sem querer incomodá-lo.
- Faço questão. E não se fala mais nisso. – Ele fez um gesto para que ela continuasse andando e a acompanhou. Minutos depois, quando estavam a duas quadras do prédio onde morava, as nuvens que tomavam conta do céu da cidade naquele dia resolveram que era hora da chuva finalmente cair.
Os dois apressaram o passo, logo começando a correr, em meio a risadas e comentários de "não acredito que está chovendo logo agora", até alcançarem a portaria do prédio.
- Você não pode ir embora molhado desse jeito e nessa chuva, . – Ela disse, quando já estavam seguros dentro do prédio.
- Bom, não tenho muitas opções, tenho? – Ele deu de ombros de um jeito divertido, que a fez rir.
- Claro que tem. Entre, eu devo ter algumas roupas do meu irmão que servem em você. Você se seca, colocamos sua roupa na secadora e esperamos a chuva pelo menos diminuir um pouco. – sugeriu e levantou os braços, como se estivesse se rendendo.
- Já que você insiste. – Disse, rindo. Ela balançou a cabeça, divertindo-se com o jeito infantil dele, e o puxou pelo braço em direção ao elevador.
Enquanto ela abria a porta do apartamento, parou, torcendo os lábios como se estivesse pensando em algo muito sério. Ela segurou a porta aberta e esperou que ele entrasse, mas, quando ele não o fez, virou-se para encará-lo com o cenho franzido, pedindo uma explicação.
- Seu irmão não mora com você, né? – Perguntou, torcendo os lábios. Ele voltou a falar quando a viu abrir a boca para responder. – Não, sério. Porque vai que ele tá aí e, sei lá, não vai gostar de um cara chegando com a irmã dele. Juro. Eu tenho uma irmã mais nova e ficaria muito puto.
o olhou em silêncio por alguns segundos e então começou a rir alto, escorando-se no batente da porta, e ele apenas a encarava com um misto de confusão e diversão no rosto.
- Vinte e tantos anos na cara e ainda tem medo assim, ? – Ela disse, quando finalmente conseguiu parar de rir e recuperar o fôlego. – Mas, não, meu irmão não mora comigo. Pode entrar sem medo.
Ele assentiu com a cabeça, rindo da situação, e os dois finalmente entraram. Ela o guiou até o banheiro e lhe entregou uma toalha, pedindo que ele esperasse enquanto ela ia buscar algumas roupas.
encostou a porta do banheiro e tirou as roupas molhadas, deixando-as no canto do cômodo, perto da porta, e usou a toalha para se secar.
Poucos minutos depois, voltou com as roupas secas para e, como a porta estava entreaberta, simplesmente a abriu de repente, sem bater, e parou no mesmo momento.
Ele estava de costas e a única peça de roupa cobrindo seu corpo era a cueca preta que ainda vestia. Ela sentiu o sangue se acumular nas bochechas, a área ficando extremamente quente de uma hora para a outra. Deu um passo para trás e puxou a porta consigo, no mesmo momento em que percebeu sua presença e se virou.
Ele sorriu de lado, percebendo a vergonha dela, mas não comentou nada; apenas estendeu a mão na direção dela, em um pedido mudo para que ela lhe entregasse as roupas, e então ela o fez, murmurando um pedido de desculpas quase inaudível e fechando de vez a porta logo em seguida.
- Não precisa se desculpar. – Ele falou, elevando a voz para que ela escutasse através da porta fechada. – Só se não gostou do que viu.
não conseguiu segurar o comentário, rindo sozinho dentro do banheiro enquanto vestia as roupas do irmão de que, felizmente, serviam razoavelmente bem nele.
- Cale a boca, . – Ela gritou de volta, aparentemente de algum lugar já afastado do banheiro. Ele balançou a cabeça e, já vestido, abriu a porta novamente. Saiu andando pelo apartamento à procura dela e a encontrou em uma pequena área de serviço, colocando as roupas dele na secadora. Escorou-se na parede e cruzou os braços na frente do peito, observando-a.
Seu rosto ainda estava vermelho, mas ele não conseguia conter a vontade de continuar a provocá-la. Era divertido e ele sabia que, no fundo, ela não se importava. Aquilo só acabaria aumentando a tensão entre os dois, que faria com que ele acabasse a beijando antes que a chuva parasse e ele fosse embora. E ele queria aquilo. Ah, como queria. E sabia muito bem que ela também queria. Durante todo o tempo que passaram juntos naquele dia, os dois haviam trocado algumas indiretas e provocações leves, e ele sabia que provavelmente ela não o convidara para entrar por uma simples preocupação com sua saúde.
- Quer dizer que gostou, então? – perguntou e virou-se para ele surpresa, pois ainda não tinha percebido que ele estava ali. Ela franziu o cenho, sem entender, e ele completou a pergunta com mais um de seus sorrisos de lado que a faziam querer socá-lo e beijá-lo ao mesmo tempo. – Do que viu.
- Eu devia ter mandado você para casa debaixo dessa chuva. – resmungou, aproximando-se dele, também sorrindo de lado. Parou logo à frente dele, perto até demais, ele diria, antes de responder à pergunta dele. – Mas já que não mandei, fique sabendo que não vi nada demais. – Ela sussurrou as palavras lentamente, entrando no jogo de provocações que havia começado, e riu de leve quando percebeu o olhar incrédulo no rosto dele.
- Ah, é? Não viu nada demais? – Ele arqueou as sobrancelhas e inclinou o rosto para aproximá-lo ainda mais do dela. prendeu o lábio inferior entre os dentes, ainda com um meio sorriso no rosto, e balançou com a cabeça, negando. não conseguia entender como ela conseguia parecer tão adorável com aquele sorriso infantil, como se fosse uma criança que sabia que estava passando dos limites e continuava arriscando, ao mesmo tempo em que parecia estupidamente sedutora com os dentes prendendo o lábio e o olhar fixo no dele.
Ele deu um passo à frente, fazendo-a cambalear para trás, e fez o mesmo mais algumas vezes, até que ela estivesse presa entre seu corpo e a bancada que havia atrás dela. usou os braços para se apoiar à bancada quando inclinou o corpo na direção do dela, fazendo com que ela tivesse que inclinar o seu para trás. Não que ela não quisesse aquela proximidade – queria, sim; de fato, tinha esperado por ela desde o dia em que fora até o quartel atrás dele –, mas era divertido provocá-lo aos poucos, como fazia, vendo-o chegar cada vez mais perto de seu limite.
se aproveitou do fato daquela posição deixá-la com o pescoço à mostra e deixou seus lábios deslizarem bem de leve por ele, satisfeito ao ver sua pele totalmente arrepiada em resposta a ele. não mostrou resistência nenhuma quando ele a segurou com as duas mãos pela cintura, puxando-a contra si e acabando com qualquer distância entre os dois. Ele deixou que seus lábios fizessem o caminho por todo o pescoço da mulher e então parou próximo à boca dela, os lábios quase se tocando, mantendo, de propósito, uma distância mínima, em uma última provocação.
- Sabe de uma coisa? – Ele sussurrou baixinho, vendo-a fechar os olhos de frustração por ele resolver falar algo em vez de beijá-la, o que o fez rir. Ela resmungou algo que ele não entendeu, mas que provavelmente era um pedido para que ele terminasse a frase. – Que bom que seu irmão não mora com você. Sério.
E antes que ela pudesse respondê-lo de qualquer forma – provavelmente rolando os olhos –, ele finalmente a beijou.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 10:27AM
A neve caía do lado de fora e se acumulava nas janelas do apartamento de quando acordou naquela manhã de natal e saiu da cama silenciosamente, querendo evitar acordá-lo. Ela parou à porta do quarto e virou-se, observando-o dormindo calmamente, o peito subindo e descendo continuamente por baixo do edredom que o cobria.
Pensou, mais uma vez, como fazia quase todos os dias, em quanto as chances dos dois não terem se conhecido era grande.
Talvez se ela não tivesse sofrido o acidente ou se ele tivesse ocorrido em outro lugar, se um dos colegas de a tivesse encontrado em vez dele, se ele não estivesse trabalhando naquele dia... Talvez suas vidas nunca tivessem se encontrado. E ela não queria nem pensar nessa possibilidade.
Os dois estavam juntos desde o dia do primeiro encontro, e é óbvio que passara dias ouvindo as frases “Eu avisei” e “O que seria de você sem mim, hein” saindo da boca de Julie. Mas não se importava. As coisas iam tão bem entre ela e que nem o ego inflado de sua melhor amiga por ser a “responsável” por juntá-los a irritava.
Ela deixou o quarto, indo até a cozinha. Teve que abrir e fechar alguns armários até encontrar tudo o que precisava, mas, em pouco mais de meia hora, tinha terminado o chocolate quente e as panquecas. Derramou um pouco de melaço sobre elas e ainda encontrou na geladeira alguns morangos e framboesas para enfeitá-las.
acordou com o barulho de algo batendo em algum lugar do apartamento. Rolou na cama e esticou o braço até o outro lado do colchão, procurando pelo corpo de , que devia estar ali. Abriu os olhos quando sua mão encontrou apenas os lençóis e cobertores amassados. Ele deixou o corpo rolar novamente e ficou deitado de barriga para cima, encarando o teto. Ouviu mais barulhos vindos de fora do quarto. O chiado de algo sendo colocado sobre uma frigideira quente o fez deduzir que estava na cozinha, provavelmente fazendo algo para o café da manhã.
Será que aquela mulher tinha algum defeito?, ele se perguntou, rindo sozinho.
Virou-se para olhar o relógio e se assustou ao ver a hora que ele marcava. Tinham ficado até tarde na casa de sua família, que comemorava o Natal na véspera do feriado, e o combinado era passarem o dia de Natal com a família de . Era engraçado como ele nem se sentia tão nervoso com a perspectiva de conhecer a família dela. Como ela mesma havia dito, ele já tinha passado pela pior parte algumas semanas antes, quando conhecera Julie. Segundo , sua família era “tranquila até demais” e ele acreditava.
Os pais dela moravam fora da cidade e os dois levariam pelo menos uma hora para chegarem até lá. Ele rapidamente fez as contas e percebeu que já estavam atrasados de qualquer forma, então decidiu que podia aproveitar sua preguiça mais alguns minutinhos.
Quando pensou em levantar e ir até a cozinha, ouviu os passos de se aproximando do quarto, e logo em seguida a viu passar pela porta carregando uma bandeja de café da manhã.
Ele sorriu quando ela se sentou na beirada da cama, colocando a bandeja ao lado dele. se sentou, ajeitou o travesseiro às suas costas para poder se escorar e esticou o braço para alcançar um dos copos de suco.
- Sério mesmo, muito obrigado por ter tido a ideia idiota de entrar numa escola caindo aos pedaços. E por ter ido me procurar aquele dia no quartel. – Ele falou, em tom sério, depois de dar um gole na bebida.
- Eu me agradeço todos os dias por isso também. – Ela sorriu, lançando uma piscadela na direção dele. – Mas coma logo, porque já estamos atrasados, pra variar.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 1:39PM
De fato, a família de tinha sido, de longe, a mais tranquila que já tinha conhecido – e, levando em conta que ele já tinha sido apresentado a uma quantidade razoável de famílias, aquilo realmente significava algo.
Eles estavam sentados à mesa após o almoço e todos tinham recebido muito bem, fazendo questão de envolvê-los nas conversas. E , é claro, tinha feito questão de fazê-lo passar vergonha também.
- Você sabia, Jay, que na primeira vez que ele foi ao meu apartamento, quase não entrou por medo de que você morasse comigo? – Ela contou, rindo, e seu irmão gargalhou, virando-se na direção de com um olhar divertido.
- Eu já disse, tenho uma irmã mais nova também, sei como funcionam as coisas. – se defendeu e Jay assentiu com a cabeça, ainda rindo.
- Ele sabe das coisas, . – Ele disse, dando uma piscadela para a irmã. O resto da família, por outro lado, ainda ria de , que olhou para e moveu a boca, formando as palavras “você me paga”, ainda que sem emitir som algum.
- E como vocês se conheceram, mesmo? – A irmã mais nova de , Crystal, perguntou, revezando seu olhar entre os dois.
olhou para ela, sem saber bem como contar, pois não sabia o quanto ela tinha contado à família sobre o acidente que sofrera, então deixou que ela falasse.
- Eu... Sofri um pequeno acidente enquanto fazia algumas fotos pra minha exposição e foi quem me salvou. – Ela explicou, sem entrar em muitos detalhes. Crystal parecia encantada, como se estivesse fantasiando um conto de fadas perfeito em sua cabecinha pré-adolescente, enquanto a mãe de a olhava de cenho franzido.
- Você ainda não parou de se enfiar nesses lugares caindo aos pedaços? – A mulher mais velha falou em tom de repreensão e rolou os olhos discretamente. virou-se para ela com um olhar que dizia “Viu como não sou só eu?” e ela desviou o olhar.
- Eu sempre digo o mesmo, Sra. , mas quem disse que ela me ouve? – Ele deu de ombros, sorrindo. – Mas ela já terminou as fotos, não é mesmo? – Lançou um olhar significativo para a namorada, pois eles já tinham tido algumas discussões sobre aquele assunto, nas quais ele sempre insistia que ela devia parar de se colocar em risco daquele jeito quando já tinha imagens suficientes para sua exposição.
Na última, ela havia cedido e dito que sim, aquela exposição estava completa – ou talvez simplesmente quisesse encerrar a discussão.
- Hm... Mais ou menos, na verdade. – Ela disse, com cuidado, sabendo que aquele era um assunto complicado com e querendo evitar discuti-lo naquele momento. Ela não deu mais muitos detalhes daquilo e agradeceu quando sua tia voltou à mesa com a sobremesa e já mudando de assunto, mas sabia que, no momento em que voltassem para casa, ia querer continuar a conversa.
25 DE DEZEMBRO DE 2014, 6:12PM
tinha ficado meio calado pelo resto da tarde, falando apenas quando alguém falava diretamente com ele, mas disfarçou bem o suficiente para que apenas notasse o quanto ele estava incomodado com o fato de que ela ainda estava pensando em visitar alguns lugares para novas fotos. Ela estava agradecida por ele evitar um conflito na casa de seus pais, mas também não estava nem um pouco ansiosa para voltar para casa e iniciar aquela conversa.
O homem tinha o olhar fixo na estrada, com mais atenção do que o normal, já que a neve voltara a cair no final daquela tarde. O rádio era a única coisa que quebrava o silêncio dentro do carro, mas mal ouvia a música que tocava – estava ocupado demais em seus pensamentos, tentando entender por que nunca o escutava.
- Então, onde está pensando em ir dessa vez? – Ele finalmente perguntou, tentando manter sua voz neutra, quando já estavam entrando novamente em Chicago.
- São alguns lugares diferentes, na verdade. – Ela fez uma pausa curta, voltando a falar antes que interrompesse sua explicação de por que ela tinha pensado naquilo. – Eu fiz algumas pesquisas na semana passada, e encontrei alguns lugares que renderiam umas fotografias maravilhosas no inverno, com neve e tudo o mais. E não quero perder a oportunidade.
- Você sabe o que eu penso disso. – Ele disse, simplesmente, suspirando. Estava cansado daquela mania dela de nunca estar satisfeita com o que já tinha e de não entender o quanto se arriscava.
Ele entendia. Ele já tinha visto um número suficiente de acidentes de todos os tipos para entender todos os riscos que ela corria. Sentia-se como se tivesse acabado de levar um soco no estômago só de pensar em em todas as situações que poderiam acabar acontecendo com ela.
- , você precisa parar de se preocupar tanto com isso. Não é porque aconteceu uma vez, que vai acontecer de novo. Eu vou e volto em no máximo uma semana. – Ela disse, virando-se para olhá-lo, sem saber mais o que dizer para convencê-lo. Entendia que ele se preocupava com ela, mas também sabia se cuidar sozinha. – E eu já comprei as passagens.
parou em um sinal vermelho e abaixou a cabeça antes de virar o rosto para ela, uma certa decepção expressa em seus olhos.
- E pretendia me contar isso quando? – Sua voz saiu muito mais fria do que ele esperava, mas ele não se importou com aquilo no momento. Esperou uma resposta, mas o olhava com os lábios pressionados um contra o outro em uma linha fina, sabendo que, mais do que o fato dela continuar visitando aqueles lugares para mais fotos, o fato de não ter contado a ele o que estava planejando era o que o incomodava de verdade.
- Droga, ! – Ele exclamou, batendo com as mãos no volante e finalmente deixando sua irritação ser expressa em sua voz. O sinal abriu e ele acelerou o carro outra vez. Não era como se quisesse mandar nela e impedi-la de completar sua exposição. Mas esse era o problema: sua exposição já estava completa, ela mesma tinha dito isso alguns dias antes. Sim, talvez as novas fotos fossem uma boa adição a ela, mas não eram necessárias. Ele não se importaria tanto se ela fosse tirar as fotos por perto e ele pudesse acompanhá-la, como já tinha feito algumas vezes desde que a conhecera. Mas como ela mesma já tinha dito que tinha comprado as passagens, ele sabia que provavelmente iria até outro estado. – Eu não vou estar lá para poder te ajudar.
- Eu não preciso de você pra me salvar o tempo todo, ! – Ela acabou explodindo, irritada, mas se arrependeu no momento em que as palavras deixaram sua boca. Sabia que o que tinha dito machucaria , e aquilo não era o que queria, por mais incomodada que estivesse com a superproteção dele naquele assunto.
O homem crispou os lábios e apenas assentiu com a cabeça e permaneceu em silêncio pelo resto do percurso, sem tirar os olhos da estrada em nenhum momento.
- Me deixe no meu apartamento. – pediu dez minutos depois, quando se aproximaram da região onde os dois moravam.
virou o rosto para olhá-la incrédulo, como se não acreditasse que era assim que ela terminaria a discussão: indo para casa e fingindo que eles já não tinham planejado nada para aquela noite. Mas não disse nada, simplesmente deu de ombros e, cinco minutos depois, parou o carro em frente ao prédio dela. Ela abriu a porta e desceu do carro sem dizer uma palavra sequer.
- Boa noite. – falou, em um tom irônico e elevando a voz, para que ela o ouvisse mesmo com o barulho da porta fechando. Ele não esperou uma resposta, nem esperou que ela entrasse no prédio antes de ir embora, como sempre fazia; nem mesmo esperou que ela desse a volta no carro e chegasse até a calçada.
Pelo lado bom, pelo menos a garrafa de vinho que tinham separado para o jantar daquela noite seria toda dele, então.
31 DE DEZEMBRO DE 2014, 11:57PM
A música tocava alta, Julie tinha sumido alguns minutos atrás para buscar mais taças de champagne, e estava apoiada ao parapeito da sacada da casa de algum amigo de Julie, que as tinha convidado para sua festa de Ano Novo. Ela tinha voltado de sua última viagem naquela tarde e, agora sim, estava finalmente satisfeita com sua exposição. Já tinha entrado em contato com algumas galerias e só lhe faltava acertar com uma delas para, finalmente, marcar a data. Na hora em que chegara em casa mais cedo, tinha pego o celular e digitado uma mensagem para , avisando-o que tinha voltado, como tinha se acostumado a fazer no tempo que os dois tinham passado juntos, mas lembrou-se no último momento que não havia recebido notícias dele desde a última discussão no dia de Natal, então simplesmente a deletou e deixou aquilo de lado, por mais que a incomodasse.
Naquele momento, porém, sentiu que devia engolir o orgulho pelo menos um pouquinho. Quem sabe assim, no próximo ano seu orgulho não a impediria de fazer tantas coisas quanto no último. Pegou o celular na bolsa que carregava pendurada no braço e digitou rapidamente uma mensagem para , antes que Julie voltasse.
A sala do quartel estava decorada, eles tinham uma grande refeição feita e todos tinham as taças de plástico cheias de champagne sem álcool, prontas para o brinde da virada.
estava de serviço naquela noite e aquilo não o incomodava tanto assim, pela primeira vez. Pelo menos, não acabaria com dominando seus pensamentos outra vez. Ouviu seus colegas fazendo a contagem regressiva e se juntou a eles, rindo alto com as caretas e palhaçadas que alguns deles faziam.
Dez.
Nove.
Oito.
Sete.
Seis.
Cinco.
Ele sentiu o celular vibrar no bolso e o tirou rapidamente, curioso. A mensagem era tão curta que nem precisou abrir para lê-la totalmente.
“Feliz ano novo. Xx. .”
Quatro.
Três.
Dois.
Um.
Ele sentiu o champagne das taças dos amigos respingar nele – e provavelmente em todos à sua volta – quando as ergueram para o brinde, enquanto desejavam uns aos outros um feliz ano novo.
Deu um gole na bebida e tirou o celular do bolso, pensando em como responder à mensagem, mas a sirene do quartel tocou e ele o guardou, largou a taça no primeiro lugar que encontrou, e correu para o caminhão.
15 DE JANEIRO DE 2015, 7:13PM
O dormitório do quartel de bombeiros estava envolvido num breu total, mas ele não havia feito questão de esticar o braço e acender a luminária sobre a mesinha ao lado da cama. Seus olhos continuavam fixos no teto e seus ouvidos atentos ao tic-tac irritante do relógio, como se tentasse marcar o tempo.
Até então, estava funcionando.
Sabia que eram sete e treze da noite, e também sabia que, dentro de pouco mais de meia hora, a mulher de sua vida estaria dando um enorme passo em sua carreira e ele não estaria presente.
Não estaria ao lado dela porque era um imbecil que tentara impedir que ela finalizasse a exposição, que seria inaugurada naquela noite.
E óbvio que ela sequer lhe mandara uma mensagem com a data e o horário. Ele ficara sabendo por que um de seus colegas lhe trouxera um panfleto de divulgação da exposição naquela tarde. Panfleto que, por sinal, continuava em suas mãos, mesmo que não conseguisse mais ler as palavras nele, devido à escuridão.
Respirou fundo mais uma vez e levantou da cama, amassando o papel em suas mãos. Pro inferno com aquele orgulho, que o instigava a deixar toda aquela história de lado. Ele ia, sim, estar do lado dela naquele dia tão importante em sua vida profissional, quisesse ela ou não.
Assim que deixou o dormitório, com a intenção de ir até a sala do Coronel pedir permissão para deixar o quartel por algumas horas naquela noite, a sirene tocou, fazendo-se ser ouvida em todo o quartel.
fechou os olhos, na esperança de que a chamada fosse apenas para os paramédicos, mas não. A sorte não estava com ele naquele dia.
Bufou irritado e mudou a direção para onde andava, correndo para o caminhão, assim como seus colegas.
Sentou emburrado no banco dianteiro, ao lado do motorista, e viu o loiro atrás do volante observá-lo por alguns segundos, enquanto tirava o caminhão da garagem. Antes mesmo que qualquer piadinha sobre seu humor pudesse ser feita, resmungou:
- Hoje não, Harvey.
A equipe de tinha levado quase uma hora para resgatar as vítimas do incêndio para que foram chamados e finalmente apagar totalmente o fogo.
- Harvey. Antes de voltarmos pro quartel... Pode me levar até a galeria? – Pediu, enquanto tirava as roupas pesadas à prova de fogo que tinha usado. Sequer precisou dizer qual era a galeria; os colegas estavam bem familiarizados com a situação dele e de . não se importava com o fato do lugar ser quase do outro lado da cidade. Precisava estar lá, mesmo atrasado, suado, de uniforme e com o rosto sujo de fuligem do incêndio anterior.
Com a sirene do caminhão ligada para que abrissem caminho, chegaram à galeria em menos de meia hora. desceu, agradeceu aos amigos pela carona e disse que voltassem para o quartel. Assim que saíram, ele virou-se para a entrada da galeria e a observou por alguns minutos, respirando fundo e criando coragem para entrar e encontrá-la.
Riu sozinho da situação. Poderia entrar sem hesitar em um prédio em chamas, mas não conseguia engolir o orgulho e entrar logo na galeria onde a mulher que amava estava realizando a primeira grande exposição de sua vida.
Ele levantou o olhar até uma janela do andar superior e a viu. também o tinha visto e tinha os olhos fixos nele; a expressão dela era uma mistura de alegria e ressentimento e ele imaginava que a sua devia ser algo do tipo.
fez menção de avançar em direção à construção, mas só então percebeu que algumas pessoas se apressavam em direção à saída e outras gritavam ainda lá de dentro.
Franziu o cenho e então sentiu o cheiro ao qual já estava tão acostumado.
Fumaça.
olhava o relógio a todo momento e, sempre que podia, ia até uma janela, esperando que, por algum milagre, ele aparecesse. Sentia-se ridícula, observando cada carro que passava em alta velocidade pela avenida e desejando que estivesse dentro de um deles.
Mas ele não estava.
Ela voltou-se para o salão onde acontecia sua exposição, trazendo de volta um sorriso largo ao seu rosto. Era seu grande dia, afinal. Não podia deixar que o fato dele não estar ali estragasse aquilo. Fez o melhor que pôde para tirá-lo de sua cabeça, conversou com as pessoas presentes, até mesmo recebeu propostas de pessoas que gostariam de conhecer mais de seu trabalho, mas sempre acabava voltando para a janela.
Até o momento em que o viu parado ali em frente à galeria. Parecia estar tentando se convencer a entrar. Ela o observou até que ele olhasse para cima.
Seus olhares se cruzaram e ela soube: aquele tempo todo sem se falarem tinha sido tão difícil para ele quanto para ela.
Os segundos se passaram e ela se esforçou para não gritar, mandando-o entrar e subir de uma vez até o salão onde ela estava.
Porém, quando ele parecia ter finalmente se decidido, algo chamou a atenção dele no andar de baixo da galeria. Ela olhou ao seu redor e viu um dos seguranças na entrada do salão, gesticulando para que as pessoas saíssem. conseguiu ouvir as pessoas no andar de baixo gritando, mas não conseguia entender o motivo. Então, quando chegou à porta, viu o fogo que lhe bloqueava o caminho.
não pensou duas vezes antes de correr para dentro da galeria. Sentiu os seguranças tentando segurá-lo e impedi-lo de entrar, mas desvencilhou-se deles, resmungando e apontando para a insígnia em sua camiseta do uniforme. Ele conseguia ouvir as sirenes de um caminhão de bombeiros ao longe, mas não conseguiria esperar do lado de fora sabendo que estava ali. O fogo parecia ter se iniciado no fundo, mas ele não parou para descobrir como, pois seu coração acelerou ao perceber que a única escada levando ao segundo andar estava parcialmente bloqueada pelas chamas. Xingou alto e olhou ao seu redor, procurando por algo que pudesse ajudá-lo a chegar ao andar de cima.
Correu até uma das janelas e arrancou uma das cortinas de seu suporte, agradecendo por elas serem feitas de um tecido relativamente grosso. Foi até uma mesa de canto e jogou fora as flores que estavam dentro de um vaso. Despejou a água de dentro dele sobre a cortina, encharcando-a o máximo que pode.
Ele jogou o tecido sobre si mesmo e respirou fundo antes de correr em direção à escada em chamas, mas não hesitou. O calor o incomodava enquanto passava pelos primeiros degraus, mas sua proteção improvisada tinha sido o suficiente para permiti-lo chegar à parte da escada que ainda estava intacta.
Ao chegar ao segundo andar, viu que não só estava presa ali, mas também algumas outras pessoas que não haviam chego até a escada a tempo.
correu até ele e jogou os braços ao redor de seu pescoço, esquecendo de qualquer briga, rancor ou orgulho. Ele estava ali, de novo, para salvá-la. Nenhum dos dois precisava de sequer uma palavra para ter certeza de que estavam perdoados.
- Você é louco. – Ela murmurou e ele riu, beijando-a rapidamente nos lábios antes de soltá-la do abraço e afastá-la de si.
- Eu sei. – Disse, com pressa. – E você pode me xingar o quanto quiser mais tarde, mas primeiro preciso tirar você daqui.
assentiu enquanto ele olhava preocupado ao redor, tentando encontrar algum lugar por onde todos pudessem sair, além da escada que, agora, já estava quase totalmente em chamas.
xingou outra vez, correu até a porta e a fechou, esperando que aquilo pelo menos atrasasse o fogo, caso ele chegasse até o topo das escadas. Ele foi até a janela e olhou para baixo, ponderando a possibilidade de sair por ali, mas era alto demais. Balançou a cabeça, irritado. Onde estavam os malditos bombeiros?
Finalmente, pouco depois, ele viu o caminhão virando a esquina ao lado da galeria. Agradeceu internamente quando viu Scott descer do veículo – era o caminhão de seu quartel, que provavelmente recebera a chamada por estar nas imediações.
- SCOTT. – Gritou, da janela, e viu o amigo levantar o olhar, assustado. – O fogo bloqueou a escada e continua subindo. Tem oito pessoas aqui em cima e nenhuma outra saída.
Scott assentiu com a cabeça e ordenou que os outros levantassem a escada até a janela onde estava. Assim que ela foi colocada à frente do parapeito e outro de seus colegas se aproximou, fez um sinal para que passasse pela janela. Ela quis discutir, mas ele não a deu chance nenhuma, lançando um olhar sério na direção dela. Seria a primeira a descer e ele iria logo depois que todos os outros estivessem a salvo. Ela assentiu e passou.
a viu esperar agoniada próxima do caminhão enquanto ele ajudava todos os outros a saírem da galeria.
Ele ouviu os ruídos que a porta fazia conforme o fogo começava a consumi-la e sabia que ela não aguentaria mais muito tempo. Apressou as duas últimas mulheres que estavam ali e, quando a última delas estava passando pela janela, a porta cedeu.
Um estalo alto foi ouvido quando ela se abriu e, com a explosão causada pelas chamas, que aumentaram rapidamente adentrando o salão, parte do teto cedeu.
lançou um olhar alarmado para Spector, que ajudava a mulher a sair o mais rápido possível, e jogou-se contra o chão, protegendo a cabeça com os braços, mas não viu mais nada depois disso.
15 DE JANEIRO DE 2015, 9:55PM
não conseguia controlar as lágrimas, que ainda caíam de seus olhos continuamente desde que saíra da galeria dentro da ambulância que levara para o hospital. Não conseguia deixar de pensar que, se o tivesse convencido a descer junto dela, ele não estaria agora inconsciente na cama de um hospital. Os médicos tinham dito que ele provavelmente ficaria bem e acordaria dentro de algumas horas, mas ela não se acalmaria até vê-lo abrir os olhos outra vez.
Ela andava de um lado para o outro dentro do quarto, olhando na direção dele a cada trinta segundos. Sentava de vez em quando ao lado da cama, mas estava inquieta demais para ficar parada por mais de dois minutos.
Finalmente, ela o ouviu se mexer de leve sobre a cama e foi até ele rapidamente, sentando-se ao seu lado e segurando a mão dele entre as suas.
- ? – Chamou baixinho, vendo-o abrir os olhos devagar. Ele virou o rosto para olhá-la e abriu um pequeno sorriso.
- Estou vivo, . – Ele disse, com a voz fraca e rouca. – Pode tirar esse olhar desesperado do rosto.
- Você é louco. – Ela respondeu, mesmo sabendo que já tinha dito aquilo antes. assentiu minimamente com a cabeça, rindo. Ou tentando rir, já que sua sonolência não lhe permitia muito. – E um idiota. E pare de rir!
- Você fica linda irritada assim. – comentou, como se ela não estivesse brigando com ele.
balançou a cabeça de um lado para o outro, cedendo e soltando uma risada fraca. Ela ficou em silêncio alguns minutos antes de voltar a falar.
- Eu só espero que a gente não precise de um incêndio para resolver cada briga que tivermos, porque eu não quero passar por isso tudo de novo. – Falou, sua voz em um sussurro, fazendo com que sua fala soasse quase como uma confissão. Ele crispou os lábios antes de responder.
- Não vai. Prometo. – Disse, acariciando a mão dela com o polegar, reconfortando-a. – Mas se precisarmos, eu vou estar lá para te salvar. De novo.
17 DE JANEIRO DE 2015, 2:37PM
tinha os braços esticados à sua frente, tateando, pois não conseguia ver nada devido à venda que tinha colocado em seus olhos. Sua curiosidade só aumentava enquanto ela o guiava para Deus-sabe-onde, principalmente quando ela gargalhava cada vez que ele insistia para que ela o contasse o que estava acontecendo.
Finalmente, ele ouviu as portas de um elevador se abrir e ela o deu um empurrãozinho de leve nas costas para que ele entrasse. Não demorou muito para que as portas se abrissem outra vez e ela o encaminhasse para uma das portas. Ela a abriu, deixou que ele entrasse e, então, retirou a venda.
Era o apartamento de , disso tinha certeza. Mas os móveis em sua sala de estar tinham sido todos afastados para que alguns cavaletes pudessem ser colocados naquele espaço. Em cada um deles, havia uma fotografia emoldurada. A primeira, ele reconheceu, era da escola onde ele tinha salvado pela primeira vez.
- Você acabou não indo à inauguração da exposição. – A mulher explicou, quando ele se virou para ela, sorrindo. – E ainda estão reformando a galeria depois de tudo. Então, eu... Fiz a exposição pra você.
Ele riu, maravilhado, andando pela sala e observando todas as imagens. tinha um único pensamento em sua mente, enquanto observava o trabalho de sua namorada: Como ele pôde querer impedi-la de continuar a tirar aquelas fotos? Admitiu para si mesmo, naquele momento, que as fotografias que tinham sido o motivo de sua briga com eram algumas das mais bonitas da coleção.
Ele parou em frente ao último cavalete e franziu o cenho. A fotografia nele não mostrava um lugar em ruínas nem nada do tipo. Era uma foto da área de serviço do apartamento de . Era o lugar exato onde tinham dado o primeiro beijo, ele lembrou, mas ainda assim... Não fazia sentido. Virou-se para ela, sem entender.
- Acho que não sou artístico o suficiente para entender essa foto aqui. – Disse, a confusão claramente expressa em seu rosto, e aquilo parecia divertir , que obviamente tinha feito aquilo de propósito e tinha, inclusive, ensaiado as palavras que usaria para explicar aquela imagem em particular.
- Essa é especial da sua exposição. – Falou, andando na direção dele e parando a poucos centímetros de distância. Ele a encarou ainda confuso, apoiando os braços na cintura da mulher.
- Mas não tem nada em ruínas ali. – Sua frase soou quase como uma pergunta, ainda pedindo uma explicação. Ela baixou o olhar, observando seus próprios dedos contornarem os desenhos da camiseta que ele usava.
- Tem, sim. – prendeu o lábio inferior entre os dentes, um pouco nervosa com o que estava prestes a confessar, e voltou a olhar nos olhos dele. – Porque cada vez que eu olhava pra ela, eu caía aos pedaços.
a encarou surpreso, a boca entreaberta com o que tinha acabado de ouvir. Céus, definitivamente, ele amava aquela mulher.
Ele tomou a boca dela com a sua, não de forma voraz ou apressada, mas do jeito mais terno que conseguiu. Logo em seguida, afastou-se o mínimo possível, apenas o suficiente para conseguir falar.
- Problema resolvido, então. Porque agora nós dois estamos inteiros outra vez.
Fim
Nota da autora: Alô, voltei com mais uma short!
Fazia tempo que eu tava querendo escrever essa história, aí quando o site criou os ficstapes, pensei: por que não fazer fics com as outras músicas do álbum também? E aí eu tinha um prazo pra terminar a fic e parar de procrastinar. HAHAHAH Funcionou, né? Desenferrujei e finalmente consegui finalizar algo e mandar pro site.
Enfim, eu gostei bastante de escrever essa fic, espero que vocês gostem também! Me contem o que acharam nos comentários :)
xx,
Lara.
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Nota da Beta: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Fazia tempo que eu tava querendo escrever essa história, aí quando o site criou os ficstapes, pensei: por que não fazer fics com as outras músicas do álbum também? E aí eu tinha um prazo pra terminar a fic e parar de procrastinar. HAHAHAH Funcionou, né? Desenferrujei e finalmente consegui finalizar algo e mandar pro site.
Enfim, eu gostei bastante de escrever essa fic, espero que vocês gostem também! Me contem o que acharam nos comentários :)
xx,
Lara.
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