Última atualização: 15/12/2017

Meu sangue, suor e lágrimas...

E lá estava eu, na minha primeira sessão com o psicólogo.

Ainda não entendia o motivo de estar ali, nem mesmo meus sentimentos entendia naquele momento, minha mente cheia de pensamentos vagos e conversas aleatórias, só me perguntava o que eu havia feito de errado

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Meu namoro havia terminado há seis meses, há seis meses eu estava lutando contra o sentimento que ainda me prendia a ele, não só pelo nosso namoro de cinco anos, mas também porque éramos amigos de infância, o que me deixava ainda mais ligada ao James. Nossos momentos juntos, as tardes de maratona de Harry Potter, até mesmo nos seus jogos de basquete dos finais de semana, ele me levava com a desculpa de que era sua torcida especial.

Olhando como estou agora, o achei que não conseguiria sobreviver ao início, principalmente por não conseguir aceitar as duas críticas da minha mãe e de Nalla, sobre como James me tratava. Eu só o via como um superprotetor, desde quando nos conhecemos quando tínhamos oito anos, ele sempre teve um pouco de ciúmes quando eu fazia amizade com alunos novos.

Talvez, por que ele era tímido naquela época, e só tinha a minha amizade, pelo menos era o que eu pensava. De alguma forma, ao longo do nosso crescimento, eu me sentia protegida perto dele, uma proteção que não me fazia ver sua obsessão por mim, um sentimento que eu só comecei a perceber quando ele rasgou o convite que havia recebido para ser madrinha do casamento de Nalla. O motivo?! Ele não seria o padrinho ao meu lado.

A discussão que se iniciou depois disso, havia despertado algo dentro de mim, que me fez lembrar de todas as vezes que minha mãe dizia que meu namoro estava de deixando afastada de todos, das vezes que Nalla brigava comigo por eu deixar de usar algumas roupas ou não ir a lugares sem James. Foi preciso isso acontecer para que eu acordasse e me fizesse a mesma pergunta todos os dias.

O quão verdadeiro era o amor de James por mim? Para muitos, não era mais amor, e sim uma obsessão, algo que me sufocava de forma silenciosa.

— Está mais pensativa que o normal. — disse o doutor Park ao me chamar para realidade — Algum questionamento novo?!
— Não. — dei um sorriso fechado e olhei para a janela do consultório, era a primeira vez que estava me sentindo relaxada em seis meses de consulta, nem sabia mais quantas vezes já havia me sentado naquela cadeira — Só estava percebendo o quanto muita coisa mudou dentro de mim em seis meses.
— E você se lembra de como chegou aqui da primeira vez? — perguntou ele com seu jeito tranquilo.
— Um pouco, ainda me sentia culpada por ter terminado meu namoro, encerrado uma amizade de muitos anos. — respirei fundo ao me lembrar das muitas lágrimas que rolaram pelo meu rosto em muitas das consultas — Percebo que minhas lágrimas começaram a secar.
— E você sabe o que isso significa? — indagou ele.
— Minha liberdade?! — a resposta saiu num tom de pergunta, enquanto voltava meu olhar para ele.
— Não somente a liberdade, mas estar em paz consigo mesma é nosso maior objetivo. — seu olhar continuava fixo em mim, havia uma certa complexidade nele que me fazia querer saber o que ele pensava sobre sua paciente mais observadora — Então, como se sente sobre isso?
— Foi difícil, mas não me culpo mais. — suspirei fraco enquanto mantinha meu olhar no bloco de anotações dele que vivia vazio — Aos poucos, não estou mais sentindo falta dos momentos que passava com James, consigo até mesmo dizer seu nome sem chorar.

Olhar para aquele bloco, me fazia pensar em como ele conseguia gravar toda a nossa conversa, se ele agia assim somente comigo ou com os outros pacientes. Ficamos um longo tempo em silêncio, isso sempre fazia parte das nossas conversas que de semanais no início, se tornavam quase diárias, o vínculo de confiança que ele havia criado entre nós, me fascinava.

Outro ponto positivo, o doutor Park havia cursado um ano de engenharia da computação com , o noivo de Nalla, até que trocou de curso e se formou em psicologia anos depois. Uma mudança radical, ainda mais pelo fato dele ter um talento peculiar para a tecnologia, ao longo desses seis meses de consulta eu já havia me feito vários questionamentos internos, era curioso o fato dele ter trocado de curso. Mas, o fato de o conhecer, foi o fator decisivo para que eu aceitasse a ajuda de um profissional, admito que estava relutante até mesmo em me abrir com as pessoas que mais amava.

Minto, não era exatamente por o conhecer, por ele ser um profissional confiável, eu estava mesmo era curiosa para saber quem seria o padrinho junto comigo, no lugar de James. Afinal, seis meses atrás eu ainda estava agarrada aquele sentimento que me matava, eu ainda achava que poderia ficar chateada por Nalla não ter escolhido meu ex-namorado.

Seis meses atrás meus olhos ainda estavam fechados.

— A maioria das pessoas pensam que um relacionamento abusivo, consiste somente em uma relação amorosa, mas existem algumas ocasiões em que a amizade obsessiva também se torna abusiva. — seu olhar suave continuava voltado para mim — Você acabou experimentando as duas formas com a mesma pessoa, o que me faz ficar ainda mais orgulhoso de você, de como está agora.
— Ainda não acredito em tudo que vivi nesses últimos seis meses. — acompanhei com o olhar, seus movimentos, se levantando da cadeira — Nas superações e quase recaídas, tenho muito a agradecer a Deus, por sua paciência doutor Park, ainda mais quando te ligava as três da manhã em lágrimas.
— Já disse que pode me chamar de , se for mais confortável para você. — ele não era muito de sorrir, mas sempre que o fazia, seu sorriso era tão gentil que transmitia paz e serenidade sempre.
— Bem, acho que enquanto estivermos nesta sala, prefiro te chamar de doutor Park. — me contive em retribuir o sorriso, permanecendo com minha face estática.
— Sempre a mesma resposta consistente. — ele se virou e pegou uma pequena caixa que estava na bancada atrás de sua cadeira — Você se lembra disso? — perguntou erguendo um pouco a caixa, que pelos detalhes em sua borda, me fez lembrar o que tinha dentro.
— Sim, pertence ao dia do desapego. — aquilo me de sorrir de canto, o dia em que o doutor Park havia me feito rir até minha barriga doer.

O dia do desapego foi marcado pelo fogo.

Havia acontecido há quatro meses atrás, quando definitivamente havia me convencido que seria bom, continuar minhas consultas de três vezes na semana com ele. Era madrugada fria quando liguei para ele às três da manhã pela primeira vez, eu estava em prantos olhando para as fotos que ainda persistia em guardar de James. Pelo telefone, o doutor Park me pediu para juntar todas as recordações que ainda tinha de James, fotos, cartas, presentes, tudo que me fazia lembrar dele.

Inocente, eu assenti e juntei tudo dentro de um saco preto de lixo, estava curiosa para saber o que aconteceria depois, então em plena madrugada fiz minha mãe me emprestar as chaves do seu carro e segui até o consultório. Foi no terraço que ainda estava em obras que o doutor Park, me fez tomar a mais importante decisão.

Eu estava ou não decidida a seguir em frente?

— Foi a madrugada mais dolorosa, porém a manhã mais divertida que tive até o momento. — admiti num tom mais baixo, tentado deixar o comentário para mim.
— Fico feliz que esteja conseguindo superar a cada dia suas lembranças, mesmo que parte delas estejam ligadas a sua infância. — sua voz sempre transmitia sinceridade, quando comentava algo expressando sentimentos próprios — Mas…
— Mas?! — o olhei confusa.
— O dia do desapego ainda não foi finalizado. — explicou ele saindo de trás da cadeira e dando alguns passos até mim.
— Como assim? Achei que tínhamos finalizado tudo, afinal não sobrou nada para ser enterrado.

A filosofia do doutor Park era simples, todo o passado que enterramos podemos desenterrar, mas se for queimado e virar cinzas…

— Eu sei, mas existe uma exceção para isso também.
— Qual?! — eu me levantei da cadeira.
— Dizem que a fênix renasce das cinzas. — explicou ele estendendo sua mão para mim — Então, não vamos dar essa oportunidade e finalizar de uma vez.
— Como?!

Ele continuou com sua mão estendida e sorriu gentilmente, era o sinal de que mais uma vez faríamos um daqueles passeios repentinos, passeios que me faziam refletir e dar mais um passo à frente. Assim que eu segurei em sua mão, o doutor Park me guiou até a porta, seguindo pelo corredor e mesmo sob os olhares de algumas pessoas, com cochichos baixos, ele não deu importante ao que estava ao nosso redor.

Ousadia, era algo que não tinha a muito tempo.

Após passar pela porta de saída de emergência, subimos algumas lanças de escada até o terraço verde da clínica, ele havia comentado comigo há tempo que a direção da clínica tinha proposto um espaço de lazer sustentável no terraço. Ao ver o lugar pronto e totalmente encantador, me fazia lembrar da primeira vez que subi naquele lugar, ao longo dos meses, o doutor Park me levava uma vez por semana de madrugada para ver como estavam as obras.

Segundo ele, meus sentimentos estavam como aquele terraço, em obras e aos poucos eu colocaria tudo no seu lugar.

— Chegamos, e agora? — o olhei um pouco curiosa.
— Agora é sua vez. — ele esticou a caixa que havia levado conosco — Jogue ao vento, para que não possa mais renascer, é o seu último passo.

Senti meu coração pulsar um pouco mais forte, assim que peguei a caixa, não imaginava que tudo terminava ali.

— Tem certeza?! — o olhei um pouco receosa.
— Você sabe como eu trabalho. — ele sorriu de canto.
— Como pode ter a certeza de que este é meu último passo? — retruquei não aceitando muito, indiretamente ele queria me dar alta — Que não vou mais precisar das suas consultas?!
— Está com medo de eu não te atender mais de madrugada?! — ele deu um riso espontâneo, era a primeira vez que falava de forma natural comigo — Hoje faz seis meses, sabe disso.

Sim, eu sabia, aquela era a forma dele de trabalhar, só consultava um paciente durante seis meses, segundo ele era tempo suficiente para ajudar uma pessoa a se sentir em paz consigo mesma. E aquele dia completava o meu período, era meu último passo.

— Ainda vou poder te ligar de madrugada doutor? — perguntei inocentemente.
— Não. — ele sorriu — A partir de agora, não serei mais seu doutor, mas tenho certeza que não irá mais precisar.
— Eu vou te ligar, se precisar. — me virei em direção o beiral do telhado, ouvindo uma risada baixa vindo dele.

Meu coração ainda estava acelerado por causa daquele momento, eu pensava que demoraria a chegar, mas estava ali diante de mim. Respirei fundo e abri a caixa, passei alguns segundos revivendo cada passo que havia dado durante esses seis meses, cada lágrima que havia caído de meus olhos, cada ligação na madrugada.

— Acho que está na hora. — sussurrei para mim mesma revirando as cinzas da caixa, assim que a brisa tocou em minha pele — Adeus, velha e bem-vinda nova eu.

Fechei meus olhos, continuei sentindo a brisa passar por mim.

 

“Meu sangue, suor e lágrimas, minha última dança,
Leve-os todos…
[...]
Também ele era uma tentação,
Também ele era uma conexão para uma existência além,
O mundo maligno do qual eu não queria mais fazer parte.”
- Blood Sweat & Tears / BTS

 

 

LIBERDADE: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará. (João 8:32)” - by: Pâms



The End!



Nota da autora:
Aquele momento que eu passei quase os seis meses de tempo, sem saber o que ia escrever nessa música, sem brincadeira, mas como eu queria entregar felizmente Deus enviou uma pessoa linda pra me dar uma ideia.
Deixo aqui meu komaweyo a Vivis, que me deu uma direção no enredo da fic. Aí veio outro problema, como escrever um assunto sério e polêmico, queria fazer de uma forma suave e libertadora, espero ter conseguido.
Queria agradecer também a Nicki Snowns, a sinopse dessa fic foi a mais impactante de todas as minhas fics e foi ela quem fez para mim!!! Te amo minha mana carioca!!!!
Críticas e sugestões são bem vindas... Bjinhos...
By: Pâms!!!!
Jesus bless you!!!




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*as outras fics vocês encontram na minha página da autora!!


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