Capítulo Único ★
Atualmente
“ está tentando voltar ao mundo do entretenimento! Prova disso é o lançamento do seu novo single, Cool, depois de dois anos sem subir nos palcos.”
“O novo vídeo clipe de atingiu a marca de nove milhões de visualizações em menos de 24 horas após o lançamento. Basta sabermos se a quantidade de visualizações é sinônimo de qualidade ou apenas curiosidade pelo seu retorno.”
colocou a carteira dentro da bolsa e os óculos escuros no rosto. Procurou pela jaqueta em cima do sofá e pelo controle remoto que estava perdido em algum lugar da sala, suspirando pela bagunça deixada na noite anterior.
Apesar de estar com fome, e de se arrepender por não ter abastecido sua dispensa naquele mês, parou em frente à televisão e passou a prestar atenção no que era dito pelos jornalistas.
— Se é que eles podem ser chamados assim. — ela comentou em tom de voz baixo. De fato, os apresentadores de programas matinais não passavam disso: apresentadores contratados por causa de seu carisma e falta de papas na língua. Apresentadores que não veem problemas em inventar mentiras ou tirar conclusões errôneas apenas para aumentar a audiência do programa.
— Você assistiu, Clint? — a apresentadora perguntou ao seu companheiro de programa.
— Ah, sim. A curiosidade foi grande, você deve imaginar. — ele respondeu rindo.
— E o que você achou?
Clint, o apresentador, fez uma longa pausa antes de responder, e sabia que a pausa era proposital, afinal, Clint já tinha sua opinião sobre muito bem formada antes mesmo de ouvir sua nova música.
— Bem, se levarmos em consideração que ficou dois anos sem produzir nada e já não é a mesma estrela de antes, nem possui os mesmos patrocinadores de outrora, o vídeo clipe é razoável.
A apresentadora deu uma longa risada ao lado de Clint.
— Ora, Clint, razoável? Esta é a nota que você vai dar para a nossa querida estrela, .
Clint deu de ombros e levantou as mãos como se disse que não poderia fazer nada quanto a isso. Colocou uma falsa expressão de pesar, e explicou:
— Você e eu sabemos que já não é a mesma estrela de dois anos atrás.
Dois anos atrás
aceitou a mão estendida a ela para descer as escadas do palco. Se a cantora já ficava exausta ao final de cada show, aquele final de semana tinha lhe deixado duplamente esgotada: além do show que fizera sexta-feira à noite, e do já programado para sábado, no mesmo horário, havia aceitado realizar uma apresentação extra em um evento da Casa Branca naquela tarde, mesmo sabendo que à noite teria que dar tudo de si para realizar todas as performances do seu show.
— Obrigada. — ela agradeceu a Bob, seu empresário e um dos seus melhores amigos.
Aceitou a garrafinha de água estendida para ela, e logo tratou de tentar secar o suor da testa, afinal, apesar de ter realizado dois shows naquele sábado, o dia ainda não tinha acabado.
— As meninas já estão esperando por mim? — ela perguntou a Bob.
— Sim, estão no camarim. — ele respondeu. — Você vai querer trocar de roupa antes de se encontrar com as suas fãs?
pensou por alguns segundos.
— Vou apenas colocar a minha jaqueta por cima dessa roupa. Vou tomar banho quando chegar em casa.
Bob concordou com a indicação da cantora pop e passou a andar do seu lado. Enquanto estavam a caminho do camarim, Bob abriu a agenda no celular e passou a conversar com .
— Sei que você não gosta de conversar sobre assuntos sérios logo depois dos shows…
— Eu estou muito cansada, Bob… Provavelmente não vou me lembrar de nada amanhã…
— Mas é um assunto meio urgente, então vou falar mesmo assim. — ele continuou sua frase como se não tivesse sido interrompido por . — A produção do seu novo vídeo clipe vai acabar atrasando mais do que imaginamos. — ele disse suspirando.
Apressou o passo para acompanhar , que tinha dois objetivos: encontrar suas fãs e ir embora, e fugir da conversa sobre trabalho que Bob queria ter com ela. Bob não deixou que a cantora fugisse dele, contudo.
— Os produtores estão com a agenda cheia com o novo álbum da Miley Cyrus, e já haviam fechado contrato com a Demi Lovato antes de assinarem com a gente. Mas não se preocupe, o produtor executivo me prometeu que irá passar você na frente da Taylor Swift.
apenas concordou com o que lhe foi dito. Ela sabia que se fosse um assunto sério, um que realmente precisasse da sua total atenção, Bob teria marcado uma reunião com ela na agência. E como não era aquele o caso, apenas fez uma nota mental de conversar com o amigo no dia seguinte e pedir para que ele lhe explicasse melhor a situação do atraso da sua gravação. Aquele momento não era hora de falarem sobre a agenda dela.
Dez fãs esperavam no camarim da cantora. As dez garotas, junto com outras milhares, participaram de um sorteio feito no Instagram da artista. Infelizmente, somente dez ganhadoras tiveram a chance de viajar para a capital para assistirem a um show de com tudo pago, entrada para o show, hotel e passagens de ida e volta, além de terem a chance de tirar uma foto com a sua ídola.
Mas isso não significava que era o tipo de famosa que se recusava a posar para fotos ao lado de fãs nas ruas, muito pelo contrário. E era exatamente por isso que, ao sair da casa de shows, tantos fãs esperavam a cantora ao lado da sua van, no estacionamento.
— Você sabe que os seguranças podem afastar eles, se você quiser. — Bob ofereceu.
suspirou, estava realmente cansada. Seus olhos pesavam, e suas pernas doíam. Sua garganta ardia, e ela tinha certeza de que se tentasse sorrir para mais alguma foto, sairia com uma careta horrível.
— Você sabe que eu jamais faria isso. — ela respondeu.
E então, com um sorriso no rosto, movimentou as mãos, indicando que gostaria que seus seguranças se afastassem, a fim de que ela pudesse se aproximar das pessoas que a esperavam do lado de fora, pessoas estas, que ela não fazia ideia de há quanto tempo estavam a aguardando.
Ela jamais abandonaria um fã, afinal, sempre fora leal a todos eles.
Atualmente
ligou o rádio no instante em que entrou no carro.
Sua vontade de ouvir notícias a respeito de si mesma estava dividida: por um lado, queria saber como o público estava a recebendo de volta; de outro lado, tinha receio dos comentários maldosos que sabia que receberia.
— Como os comentários de mais cedo. — pensou alto.
Decidiu, então, escolher uma estação que estivesse tocando uma música qualquer.
No momento que parou no primeiro semáforo, a música que ouvia anteriormente foi substituída pelo seu novo single, Cool, e ela sabia que, ao final da música, o intervalo ocorreria. Não porque a cantora acompanhasse a programação daquela estação, mas porque ela tinha certeza de que os radialistas não perderiam oportunidade de falar sobre ela e sobre a sua nova música. Aparentemente, a sua volta havia causado um grande alvoroço no meio do entretenimento, e tinha dividido muitas opiniões: enquanto algumas pessoas apostavam no seu fracasso, sem nem mesmo lhe darem uma chance de retornar ao mundo da música, outras pessoas apostavam no seu fracasso após o lançamento de suas novas músicas.
— E vocês acabaram de ouvir Cool, o novo single da cantora , a mesma cantora que ficou dois anos sem produzir absolutamente nada!
revirou os olhos ao ouvir aquilo, simplesmente porque o comentário feito pelo radialista foi o mais previsível possível.
— Pois é… Era de se esperar que tendo dois anos para preparar algo para os fãs, a cantora fosse produzir algo mais significativo, não é mesmo? — outro radialista perguntou.
Uma terceira voz passou a falar, no entanto.
— Sim, é verdade, Chris. Mas acho que valeria a pena relembrarmos a trajetória dessa artista que já foi tão querida uma vez.
— De fato, já foi considerada A Estrela da América. Infelizmente sabemos que essa estrela já está apagada há bastante tempo. — a primeira voz comentou de novo.
E aquele comentário foi o bastante para que sentisse como se seu estômago tivesse um nó prendendo suas entranhas.
Por que as pessoas tinham que ser tão maldosas na escolha das palavras?
— Vamos relembrar foi lançada pela Disney, na mesma época que Miley Cyrus, Demi Lovato e Selena Gomes. Elas, inclusive, eram muito amigas.
— Sim, é verdade. — outra pessoa disse. — Elas chegaram a fazer um seriado juntas, mas a série não decolou. , então, começou sua carreira solo como cantora teen, mas rapidamente mudou o estilo de música quando atingiu a maioridade. Ela chegou a ser muito criticada na época, pois a mudança no estilo musical foi realmente muito brusca.
— A cantora deixou de falar sobre assuntos banais e comédias românticas, e passou a cantar sobre emoções de uma forma… Digamos que… Revoltada.
Nesse momento, todos os radialistas riram, como se a escolha da palavra não fosse a correta.
revirou os olhos. Lembrava-se perfeitamente bem do momento que eles falavam. Recordava-se do momento que ela rompeu com a imagem de garota perfeita, criada pela Disney e vendida pela indústria do entretenimento, e passou a ser ela mesma. Lembrou-se do momento que cansou de interpretar uma personagem, e passou a agir, a cantar e a se vestir como ela realmente era: uma adulta com pensamentos e vontades próprias.
Obviamente a mídia não aceitou muito bem a sua mudança de tom.
— Teve uma época que fez algumas músicas de cunho político, e muitos fãs não gostaram, porque não era o estilo dela. A mídia tinha certeza de que, naquele momento, a Estrela da América havia se revoltado com a vida.
Mais risadas.
— Mas quando as coisas pareciam estar saindo do controle de , Jake Phillips entrou na sua vida, um cantor pop romântico, que estava em ascensão, e acabou atingindo o topo de todas as paradas musicais depois que começou a namorar a Estrela da América.
— Algumas pessoas dizem que ele usou para alavancar a sua carreira.
— Hoje nós sabemos que isso é verdade, não é? Afinal, após os boatos de que Jake havia traído , e da confirmação do fim do namoro deles, Jake fez várias publicações intrigantes nas suas redes sociais, admitindo a traição, além de outras coisas que havia feito com a cantora durante o tempo que estavam juntos.
— Isso é verdade. Parecia que isso seria o fim da carreira de Jake, mas ele logo se reergueu e voltou a aparecer na mídia com uma nova namorada, uma modelo internacional. As coisas para , infelizmente, não seguiram pelo mesmo caminho, uma vez que ela não conseguiu se reerguer como Jake.
sentia o estômago dar voltas. E ela sabia que as voltas eram de raiva, uma vez que a mídia parecia adorar falar sobre ela e sobre seu relacionamento com Jake Phillips, mas não faziam ideia do que, de fato, havia acontecido.
E por mais que ela já houvesse superado o fim do relacionamento, lembrar de como ficou foi ferida, e de como foi difícil se curar, ainda doía.
— Quem sabe esse novo álbum de não seja a chave que ela precisava para abrir as portas do mundo pop de novo?
Dois anos atrás
chorava e tremia ao mesmo tempo. Já não sabia se a reação era devido à raiva, à decepção, ou ao cansaço. Provavelmente aos três. Um misto de emoções conflitantes que a dominavam ao mesmo tempo.
— Eu quero terminar. — ela disse baixinho, mas não porque estava envergonha do que dizia, mas simplesmente porque já não tinha forças para falar mais alto. Sua garganta doía por conta do choro, e sua mente estava exausta por causa da discussão. — Chega. Não dá mais.
Jake, em vez de se mostrar surpreso com a fala da garota, ou até mesmo chateado, apresentou-se quase entediado. Ou, pelo menos, foi isso que o revirar dos seus olhos demonstrou.
— De novo com esse papo, ? — sua voz tinha tom de deboche. — Pensei que já tivéssemos falado sobre isso.
— Eu disse que essa chance seria a última. E eu falei sério.
precisou manter os dentes cerrados. As lágrimas ainda escorriam, mas o sentimento de ira estava cada vez mais forte. Quanto mais olhava para o noivo, mais repulsa ela sentia.
Há pouco mais de um ano, logo antes de e Jake noivarem, surgiram boatos de que Jake Phillips estaria saindo com uma atriz. Os boatos, contudo, nunca foram confirmados, e preferiu acreditar na palavra de Jake, que jurou, de pés juntos, que jamais trairia o amor de sua vida.
Alguns meses depois, contudo, não foi preciso que revistas publicassem boatos sobre a traição de Jake. presenciou a infidelidade de seu noivo, o que a fez questionar se os boatos de tempos atrás não eram verdadeiros.
Daquela vez, Jake chorara nos pés da noiva, e implorou pelo seu perdão, alegando que havia sido fraco ao não recusar a aproximação repentina da mulher com quem ele tinha sido flagrado. Mais uma vez, acreditou nas palavras de Jake, o qual jurou que aquilo jamais se repetiria. “É a sua segunda e última chance. Não me decepcione, por favor”, ela dissera.
E lá estava ele, novamente flagrado nos braços de uma mulher que não era ela. Dessa vez, contudo, um fotógrafo de uma revista de fofoca havia publicado algumas fotos. Era bem verdade que Jake não aparecia nitidamente nas fotos, mas sabia. Ela sabia que era o seu noivo mentiroso o homem daquelas fotos.
A pior parte? Ele nem mesmo tentou negar.
— Você não pode estar falando sério. — ele disse passando a mão na testa.
— Pois eu estou.
se esforçou para manter o tom da voz decidido, enquanto Jake não escondia o tom irritadiço da sua.
— Você sabe que se terminar comigo, é o seu fim, não é? É o fim da sua carreira. — ele disse apontando o dedo para ela. E antes que pudesse o interromper para dizer o quão absurdo aquilo soava, ele continuou. — Você sabe, ou deveria saber, que os seus fãs não compraram muito essa sua mudança de estilo musical. Sou eu quem mantenho você nas graças do público, meu amor.
E foi naquele momento que as lágrimas, ainda que tímidas, secaram. A dor da traição foi completamente substituída pela indignação daquelas palavras e o que elas significavam.
Jake Phillips estava dizendo a ela, que ela dependia dele para se manter na carreira de artista? Aquilo era realmente sério?
— Acredito que as pessoas continuarão ouvindo qualquer coisa que eu compor, não importando o teor da música… Afinal, o sucesso das suas músicas são prova vivo disso.
Jake queria jogar? Queria jogar coisas na cara dela? Pois muito bem. também tinha algumas verdades difíceis de engolir, como, por exemplo, que Jake era um grande compositor de merda, e que suas últimas músicas apenas fizeram sucesso porque escrevera as letras e compôs as melodias.
Jake ficou parado na frente da garota, com a boca aberta, pronto para responder ao que ouviu, mas ficou sem palavras. Definitivamente, ele não tinha como se defender.
O cantor, então, olhou para cima, como se pedisse uma orientação divina, deu as costas para a noiva, andou pelo recinto, e voltou a se postar de frente para .
— Quer saber de uma coisa? Não vamos mais discutir sobre isso, está bem? Você, obviamente, está muito emotiva, provavelmente está de TPM, e está dizendo coisas que eu sei que você vai se arrepender mais tarde.
estreitou os olhos. Não, ela não estava de TPM. Mas sim, estava muito emotiva. Emotiva pelo fato de ter sido traída, de novo, pela pessoa que ela mais confiava e amava. Emotiva por ter sido chamada de insuficiente, ainda que indiretamente, para manter o interesse dos fãs na sua música. E, principalmente, estava emotiva por ter seus sentimentos menosprezados daquela forma.
— Acho melhor deixar você esfriar a cabeça. Vou dormir na casa de um amigo, e volto amanhã, quando os ânimos estiverem menos aflorados.
Jake ainda ficou alguns instantes olhando para , esperando uma reação da garota, qualquer movimento que indicasse que a noiva fosse o impedir de ir embora, mas ele não recebeu nada disso. mantinha os olhos fixos nele, desejando, com todas as suas forças, que aquele dia nunca tivesse acontecido.
— Tudo bem, então. — Jake foi rapidamente até o quarto e pegou uma jaqueta, as chaves do carro, a carteira e o celular. — Vou deixar a minha chave com você, está bem? — ele disse se referindo à chave do apartamento que eles dividiam há mais de um ano. — Para você ter certeza de que não tentarei voltar no meio da noite. Assim você pode dormir tranquila.
Ah, , definitivamente, dormiria mais tranquila naquela noite.
Mas não ali.
A passos decididos, ela foi até o quarto que, até então, dividia com Jake, e colocou dentro da mala o maior número de roupas e calçados que conseguiu. Enquanto fechava a sua segunda mala de viagem, Bob, seu empresário e melhor amigo, chegou.
Ele não precisou perguntar o que tinha acontecido. Bob nunca gostou realmente de Jake Phillips, tampouco tinha apreço pela influência que o cantor tinha na carreira de .
— Se quiser pode me esperar no carro. Vou terminar de empacotar os seus objetos pessoais.
não questionou a sugestão. Pegou ambas as malas cheias de roupas e calçados, a mochila que acabara de encher com seus itens de higiene pessoal, e a bolsa que carregava sempre consigo. O restante de suas roupas já se encontrava em cima da cama, apenas esperando pelas malas que Bob ficara de trazer. Os livros, CDs e DVDs de já tinham sido colocados dentro de uma caixa de papelão, ao lado dos seus prêmios de música. Bob também se encarregaria de levar o restante até o carro.
A verdade é que sua mente estava tão cheia de informações, tão confusa por conta dos últimos acontecimentos, que o fato dela ter terminado o seu noivado, estar indo embora do apartamento que vivia com o amor da sua vida e todas as implicações que consistiam naquelas aquelas decisões, fizeram com que o tempo voasse diante dos olhos de . Ela mal percebeu os minutos passando e as horas chegando.
— Podemos ir embora. Já tranquei o apartamento. — Bob garantiu.
somente concordou com a cabeça, incapaz de falar qualquer coisa.
Pegou a chave que Jake havia lhe entregado e, com a outra mão, pegou sua chave do apartamento, usada por Bob para trancar a porta.
— Espere por mim no carro.
Ela seguiu até o apartamento do síndico, no primeiro andar. Tocou a campainha duas vezes antes de ser atendida.
— Boa tarde, Sr. Fausto, desculpe chamá-lo a essa hora. — ela disse com o tom de voz mais doce que pôde encontrar. — Mas estou me mudando do apartamento, e acabei deixando as chaves com Jake.
— Oh, não me diga que terminaram… — o Sr. Fausto perguntou com pesar.
— Acho que não nascemos para ficarmos juntos como o Sr. e Sra. Carolynne. — ela deu um sorriso triste. — Só queria informar o Sr., tudo bem?
— Claro, minha filha, eu entendo. Fique bem. — ele, então, estendeu os braços para e lhe deu um abraço caloroso, como se soubesse pelo que a garota estava passando no momento.
Ela se despediu do síndico do prédio que costumava morar, e seguiu até o carro de Bob, na garagem.
— Está pronta para ir?
Em resposta, apenas abriu a janela do carro e jogou as chaves do apartamento fora. Aquilo não impediria que Jake adentrasse no apartamento, mas iria lhe causar uma pequena dor de cabeça por algum tempo, especialmente porque o Sr. Fausto não iria ficar nada satisfeito com o fato de Jake ter perdido as duas chaves principais de um dos apartamentos mais caros do prédio.
— Estou pronta. Vamos.
Atualmente
estacionou o carro na rua e foi até a cafeteria. Estava muito tarde para tomar o café da manhã, mas cedo para procurar um lugar para almoçar.
Por conta do seu comeback, estava trabalhando incansavelmente, dia e noite, para dar entrevistas, tirar fotos e, principalmente, ensaiar para o show do final de semana, quando ela teria a chance de subir no palco pela primeira vez em dois anos.
Pediu um chocolate quente para viagem e, enquanto esperava seu pedido ficar pronto, decidiu que não iria voltar para casa sem passar em um supermercado e comprar ingredientes para preparar uma boa refeição para si mesma.
— . — a atendente chamou.
A cantora se aproximou do balcão e estendeu a mão para pegar seu pedido, agradecendo à atendente. E foi nesse momento que ela foi reconhecida.
— Ei, você é ? — uma das funcionárias perguntou receosa, afinal, quais eram as chances de uma cantora pop aparecer na cafeteria do bairro?
— Eu mesma. — ela respondeu com um sorriso.
No mesmo instante, mais três funcionárias foram até ela, e pelo menos quatro pessoas que estavam na fila do caixa, esperando para fazerem seu pedido, se aproximaram da cantora.
— Podemos tirar uma foto com você? — uma das funcionárias perguntou.
— É claro que sim.
Ao longo dos últimos anos, tentou se fazer presente, ao menos, nas redes sociais. Com o tempo, deixou de ser convidada a participar dos eventos sociais voltados à premiação de artistas, o que acabou a deixando em menor evidência. Mas, apesar de dos ocorridos, conseguiu manter sua base de fãs que, aparentemente, nunca deixaram de acreditar na sua volta, e lá estavam alguns desses fãs.
— A sua nova música é incrível. — uma delas comentou.
— Fiquei surpresa com o vídeo clipe. — outra falou.
— Que bom que você está de volta. — uma terceira pessoa disse.
E aquilo foi o suficiente para fazer com que o dia de ficasse melhor. As nuvens, trazidas pelas palavras maldosas dos apresentadores de televisão e pelos radialistas, logo se dissiparam e sentia como se o sol brilhasse mais forte a cada passo que dava em direção ao seu carro, pronta para passar no supermercado próximo à sua casa.
Perto de onde havia estacionado, contudo, havia uma banca de revista que tinha passado despercebida mais cedo. Contrariando seus instintos, se aproximou da banca, e passou a ler os títulos de algumas das revistas de fofocas mais vendidas.
As três primeiras revistas falavam do corpo de , e as outras duas falavam sobre suas músicas.
“Acima do peso e em cima do palco: como será a volta de na indústria do entretenimento?”
“Gordura excessiva e saúde: saiba o que aconteceu com a Estrela da América, e como evitar o sobrepeso”
“Por que não consegue voltar a ter o corpo de quando era mais jovem? - especialistas explicam”
“A volta de traz músicas melancólicas, políticas e revoltadas. Nada de novo sob o sol”.
“Cool, de , representa a tentativa patética, da Estrela da América, em cair nas graças do público teen?”
Nenhuma daquelas manchetes, contudo, se aproximavam da verdade. E como poderiam? Revistas de fofocas não se preocupam com o bem-estar do noticiado, mas apenas em apresentar um conteúdo exclusivo, ainda que mentiroso, para o seu público.
E decidindo que não deixaria que aquelas revistas trouxessem de volta a nuvem cinzenta sobre ela, foi para o seu carro, passando a dirigir rumo ao supermercado.
★
— Hey!
se deparou com ele, deitado no sofá de sua sala, antes mesmo de ter a chance de fechar a porta do apartamento.
— Hey… — respondeu com a voz arrastada e os olhos ainda fechados. — Se importa em apagar a luz de novo?
revirou os olhos. Não podia dizer que estava surpresa em encontrá-lo dormindo no seu sofá.
— Não me diga que você está se escondendo de novo das garotas que leva para a sua casa.
fez uma careta. Abriu os olhos, se espreguiçou, mas não fez menção de que iria se levantar.
— Eu não faço mais isso.
riu fraquinho, como se não acreditasse em uma só palavra do amigo.
— Então, o que você está fazendo aqui? — ela perguntou.
— O encanador está no meu apartamento arrumando os encanamentos que o seu cabelo entupiu.
pegou a primeira almofada que viu e jogou no rosto de .
— Eu só tomei banho lá por uma semana! — se defendeu. Duas semanas atrás o chuveiro do seu apartamento tinha queimado, e Bob não estava disponível para trocar o disjuntor, tampouco parecia interessado em ajudá-la nessa empreitada. E para não passar uma semana tomando banho de água fria, decidiu que aceitaria a oferta de seu vizinho de frente, e atual melhor amigo, e passaria a tomar banho no apartamento dele.
— E misteriosamente já não posso escovar os dentes sem que a pia fique com água parada. — ele disse irônico.
grunhiu, pois sabia que seria inútil discutir com .
— Fique dormindo aí então, tanto faz. — ela disse enquanto se dirigia à cozinha, pensando no que iria cozinhar para comer. — Você deveria mudar de apartamento e ir para um que os encanamentos não deem tanto problema. — ela comentou já da cozinha, lembrando-se de quando conheceu .
Dois anos atrás
, a Estrela da América, encontrava-se chorando, pateticamente, escorada na porta do seu mais novo apartamento. A pior parte? Ela estava chorando no corredor, do lado de fora do apartamento, simplesmente porque não sabia onde havia colocado as chaves.
Coisas pequenas sempre foram um grande problema para , ela facilmente as perdia.
Quando morava no outro apartamento, com o ex-noivo (aquilo fez com que o volume de suas lágrimas aumentasse), sempre podia contar com as chaves de Jake, além da chave extra que o cantor costumava deixar escondida embaixo do carpete de “boas vindas”, pois sabia que as chances de ficar trancada do lado de fora eram grandes. Além disso, sempre podia contar com o Sr. Fausto, o síndico do prédio, que também já estava muito acostumado com as batidas em sua porta, tarde da noite, e com uma completamente envergonhada pedindo pela chave extra dele.
Naquele prédio novo, contudo, ela não conhecia ninguém. Como iria pedir ajuda? não queria dormir no chão frio, e pensar nessa possibilidade apenas fez com que ela chorasse ainda mais.
Talvez fosse pelo volume com que soluçava, ou simplesmente pelo dramalhão que estava fazendo, mas não havia percebido um estranho a observando. E ao notar isso, foi impossível não dar um pulo, mesmo que estivesse sentada no chão, escorada na porta do seu apartamento sem chave.
— Ei, vizinha. — ele disse em tom descontraído, como se fosse comum encontrar garotas aos prantos pelos corredores do prédio. — Está tudo bem?
precisou piscar os olhos algumas vezes. Qualquer pessoa que a observasse de longe perceberia claramente que não, ela não estava nada bem. Qual era o problema daquele cara, afinal?
— Hm… Não sei onde coloquei as chaves do meu apartamento. — ela respondeu com a voz rouca por conta do choro.
O vizinho apenas balançou a cabeça, como se entendesse perfeitamente o motivo das lágrimas de . Desencostou o próprio corpo que estava escorado e descruzou as pernas, dizendo em um tom muito tranquilo:
— Eu tenho a cópia de todas as chaves do prédio. Vou pegar para você.
E sem esperar que ela lhe respondesse alguma coisa, deu as costas à garota, entrou no próprio apartamento (o qual, coincidentemente, ficava de frente para o de ), voltando em menos de um minuto.
se levantou rapidamente, passando as mãos pela calça, sendo que suas lágrimas já haviam secado.
— Como você tem isso? — ela perguntou olhando para o molho de chaves nas mãos do seu recém-descoberto vizinho gato.
Espera, de onde tinha saído aquilo? Quem disse que ele é gato?, perguntou-se, enquanto se repreendia por ficar reparando nos traços e corpo (e que corpo!) do cara que a estava ajudando. Não é como se alguém precisasse dizer o óbvio, , ela respondeu a si mesma, da pergunta que havia feito anteriormente.
Chacoalhou a cabeça para voltar a atenção no que ele falava.
— Estou dando uma força ao síndico essa semana. Ele precisou viajar para o casamento da filha, ou algo assim. — comentou despretensiosamente.
nem mesmo sabia que aquele prédio tinha um síndico.
A garota aproveitou o fato de que seu vizinho (que ela ainda não sabia o nome) estava muito ocupado procurando a chave do seu apartamento, para observar seus traços. Sua atenção logo foi para os olhos claros, os cabelos rebeldes e a barba rala, que estava por fazer. E então seus olhos desceram, e seu foco passou a ser os ombros largos do seu vizinho e os braços bem torneados que, infelizmente, estavam cobertos por uma camiseta de alguma banda que ela desconhecia, e com uma camisa xadrez, aberta. Seu vizinho gato também usava uma bermuda que o fazia parecer dez anos mais novo do que ele provavelmente era, e teve certeza de que se ele aprendesse a se vestir melhor, seria um pedaço de mal caminho. Não que ele já não fosse, mesmo usando aquele tipo de roupa brega.
— Hey, eu conheço você? — ele perguntou.
teve um sobressalto, envergonhada por ter sido pega secando-o daquele jeito.
— Digo… Você já apareceu na televisão? — ele perguntou curioso, com a testa franzida. — Acho que já te vi na televisão.
Seu vizinho, então, comemorou ter encontrado a chave certa, e prontamente destrancou a porta de , fazendo-a suspirar de alívio.
— Obrigada. — ela agradeceu suspirando.
Pensou em convidá-lo para entrar, oferecer-lhe um café ou algo do tipo (ela não era muito boa com vizinhos, nunca havia interagido muito com os seus quando morava no outro prédio, pois Jake achava desnecessário), mas não teve tempo de formular uma frase.
— Caramba, você definitivamente é famosa. — ele comentou com um assovio no final. — Ah, aliás, eu sou .
havia se convidado para entrar no apartamento de , e encontrava-se com a mão estendida para ela, ao mesmo tempo que analisava a estante de prêmios da cantora. Ela nem sabia como reagir àquilo.
— Você quer um caf…
— Qual o seu nome mesmo? — ele perguntou curioso. — Não lembro de você ter dito.
— É porque eu não disse… — ela comentou baixinho. O que estava acontecendo ali, afinal? — Meu nome é , muito prazer, .
continuou segurando a mão de por alguns segundos, mantendo os olhos estreitos em direção à ela, pensando onde já ouvira aquele nome. E num estalo, ele se lembrou.
— Ah! A cantora pop que se rebelou contra a Disney, não é? — ele perguntou em tom animado por tê-la reconhecido. nem mesmo percebeu a expressão desgostosa de . — Minha irmã mais nova adora as suas músicas.
E aquilo foi o suficiente para mudar a expressão chateada.
— É mesmo? Qual o nome dela? — perguntou interessa.
— Clara. — ele respondeu.
E quando o silêncio se instalou no ambiente, e pensou se iria oferecer uma bebida ao seu vizinho, ou simplesmente insinuar que ele devesse ir embora, continuou.
— Acho que li alguma coisa sobre o término de um relacionamento… Seu noivo te traiu, não foi?
não respondeu àquilo. Em vez disso, preferiu abaixar os olhos para evitar chorar de novo. Tudo ainda era muito recente, e seu coração ainda pesava ao se lembrar da discussão que tiveram na noite em que ela foi embora.
— Eu não conhecia o cara, mas minha irmã diz que ele era um babaca. — comentou.
— Sua irmã está certíssima. — ela disse baixinho.
Ficaram em silêncio de novo, dessa vez por mais tempo. E quando pensou que iria se despedir dela para deixá-la sofrer por sua vida patética, ele disse:
— Sabe, se eu estivesse no seu lugar, não deixaria isso barato. Quero dizer, o cara foi infiel, mas a única que saiu com a imagem manchada foi você, não é?
concordou com a cabeça, sem conseguir proferir qualquer palavra.
— Se eu fosse você, também destruiria a imagem de cara perfeito dele. As pessoas precisam saber quem ele é, sabe.
A cantora pensou por alguns segundos. Sim, as pessoas precisavam saber. Estava cansada de ser massacrada pela mídia por ter rompido o relacionamento duradouro com Jake Phillips quando, na verdade, ele tinha dado causa àquilo. As pessoas não se importavam com o fato dele tê-la traído. Enquanto diziam que Jake havia cometido um erro e merecia uma segunda chance, diziam que estava sendo uma mulher sem coração e que não sabia perdoar as pessoas.
O problema é que Jake não era o cara perfeito que todo mundo acreditava. E ela queria que houvesse uma forma de provar isso, mas…
— Como? — ela perguntou.
levou o indicador ao queixo, e passou a pensar por alguns segundos. E quando voltou a encarar a cantora à sua frente, ele tinha um sorriso de lado.
— Me espere aqui.
E esperou. Quando voltou, segundos depois, levava em suas mãos seu notebook.
— Tudo bem, o que vamos fazer pode não ser, exatamente, legal, mas garanto que você vai gostar.
chegou a questionar, assustada, o que ele quis dizer com aquilo, mas ao ver o vizinho digitar freneticamente no teclado, igual aos filmes de espionagem que Jake adorava assistir, preferiu deixá-lo trabalhar. Ela estava curiosa demais para impedi-lo de cometer um crime, ou qualquer coisa do tipo.
— O que você está fazendo?
— Hm… Digamos que eu venha de uma família de policiais, e que investigar esteja no meu sangue. — ele respondeu, muito concentrado na tela à sua frente. — Digamos também que eu seja bom em… Hm… Acessar sites e redes sociais sem a autorização do usuário.
pensou no que ouvira.
— Você é um hacker?
— Não, sou gerente de telemarketing. — ele respondeu prontamente.
A garota ficou confusa. Tinha quase certeza de que gerentes de telemarketing não sabiam invadir contas em redes sociais.
— Pronto. Estou logado no Twitter, Facebook e Instagram de Jake Phillips. O que você quer escrever?
Enquanto mantinha sua expressão extremamente pacífica, como se invadir perfis de celebridades fosse algo rotineiro, não podia esconder sua surpresa. De fato, o que estavam fazendo poderia ser considerado um crime… Mas apenas se fossem pegos.
— Que tal começarmos com… “A cada dia que passa, mais percebo o quão inseguro e patético sou”, o que acha? — perguntou.
gostou. Ela gostou muito. Tanto, que depois da primeira publicação no Twitter, passou a fazer algumas sugestões, tais como “Sinto-me envergonhado por ter enganado meu público por tantos anos… Mas vocês merecem saber que sempre escreveu todas as minhas músicas”, e como “Sim, eu fui infiel nos últimos anos, e sim, eu recebi várias chances antes… Mas vocês não acham que o ser humano merece uma quinta chance? Ou sexta? Dizem que sete é um número da sorte!”.
realmente quis se arrepender do que estava fazendo. Aquilo poderia arruinar, para sempre, a imagem do seu ex-noivo, mas não conseguia se sentir culpada. Afinal, sabia que Jake, por ser tão querido pela mídia e, principalmente, por ser homem, logo seria esquecido pelas (várias) publicações controversas em suas redes sociais.
No final, e passaram a noite rindo dos comentários dos fãs, enquanto bebiam a cerveja trazida pelo seu vizinho e novo amigo. E em meio a conversas totalmente aleatórias, perguntou:
— Ei, você se importaria se eu tomasse banho aqui? O meu encanamento está com problemas. — ele disse dando de ombros.
Um ano e seis meses atrás
“Você precisa me ajudar!”, era o que dizia a mensagem enviada por .
, ao ler aquilo, começou a rir. Deixou o celular em cima da cômoda do seu quarto enquanto escolhia uma roupa e secava os cabelos. Precisou esperar apenas 30 segundos para que lhe mandasse outra mensagem:
“Eu tô falando sério, ”.
, então, revirou os olhos. Desistiu de vestir uma calça que não lhe servia há alguns meses, e resolveu colocar um vestido. A escolha de vestuário, contudo, também não lhe moldou o corpo como antigamente, o que acabou fazendo com que a cantora colocasse uma camiseta qualquer e uma calça de moletom.
E enquanto seguia para a saída de seu apartamento, pensando que deveria separar todas as roupas que já não lhe serviam mais, a fim de doá-las para uma instituição de caridade, ouviu o celular tocar, informando ter recebido outra mensagem. Ela não precisou ler o conteúdo, entretanto. Sabia que só poderia ser novamente, desesperado para se livrar de alguma garota com quem dormira noite passada e que se recusava a ir embora pela manhã.
Não era a primeira vez que ajudava o vizinho, e agora amigo, a fazer algo do tipo.
— , você está pronto para ir à reunião? — ela disse em tom de voz alto, entrando na casa do vizinho sem bater na porta ou informar a sua chegada. — Oh, me desculpe, mas quem é você? — perguntou se dirigindo à mulher deitada no sofá de seu vizinho, fingindo uma falsa confusão.
A história combinada por eles era muito simples: fingia estar atrasada para uma reunião de negócios muito importante, enquanto fingia ser alguém cuja presença se fazia necessária.
— Sou… Uma amiga de … — a mulher respondeu relutante. — E quem é você?
não se surpreendeu, realmente, por não ter sido reconhecida. Ela já vinha passando pela mesma situação há alguns meses, desde que perdera as curvas bem definidas da cintura, ganhara um rosto mais redondo, e deixara de se preocupar em lavar os cabelos todos os dias. Na última sessão que tivera com sua psicóloga, elas haviam conversado sobre a importância de cuidar da aparência como forma de combater a depressão, mas era difícil cuidar do seu corpo quando não conseguia reconhecer a pessoa que a encarava de volta quando ficava de frente para o espelho.
— Também sou uma amiga. — ela respondeu apressadamente, apenas desejando poder voltar para o refúgio que era seu apartamento. — Escuta, sinto muito por precisar levar tão cedo em um sábado de manhã, tenho certeza de que ele preferiria passar o dia com você, mas nós temos uma reunião da empresa agora cedo, e eu realmente preciso que ele compareça.
A história já havia até perdido a graça, tamanho o número de vezes que já foi contada. era exatamente o tipo de homem que nenhuma mulher deveria se envolver romanticamente.
— Ah, sim, claro. Eu entendo. — a mulher, que não se importou em perguntar o nome, apressou-se em recolher suas coisas e caminhar em direção à saída. — Diga para ele que deixei meu número em um bilhete na geladeira, tudo bem?
— Pode deixar. — garantiu. E por mais que sentisse pena das mulheres que nunca recebiam uma ligação de , não conseguia deixar de pensar que todas aquelas mulheres sabiam exatamente onde estavam se metendo quando aceitaram dormir com seu vizinho mulherengo.
Ao ouvir a porta da frente fechar, apareceu com um sorriso de gratidão nos lábios e os braços abertos, prontos para abraçarem pelo excelente trabalho, como sempre.
— Você deveria ser atriz. — ele disse quando ela afastou seu abraço rotineiro.
— Eu fui atriz. — disse dando as costas a e seguindo para seu apartamento.
— Certo… Disney e tal, não é? — ele disse quando ambos já estavam na sala de .
A cantora foi para a cozinha preparar o seu café da manhã, sendo acompanhada de perto por .
— O leite acabou. — ele comentou com a cabeça dentro da geladeira. — Você precisa comprar mais. Um café da manhã sem cereal com leite não é um verdadeiro café da manhã.
não pôde evitar revirar os olhos.
— E quem será que tomou todo o leite que tinha na geladeira?
— Ei, não precisa jogar na cara. — ele se defendeu. Foi até onde a cantora estava separando algumas fatias de pão para colocar na torradeira, e encostou-se na pia, cruzando os braços, enquanto prestava atenção nela. — Sabe, você deveria me dar uma chave do seu apartamento.
— E por que eu faria isso? — ela perguntou rindo da proposta inesperada.
— Porque aí eu não precisaria te acordar cedo aos finais de semana para ir me resgatar. — falou em tom divertido.
— Bem, eu acho que você precisa crescer e assumir as suas responsabilidades, e isso implica em ser maduro o suficiente para falar para uma mulher que você não quer compromisso sério, em vez de deixá-las esperando por uma ligação que nunca vai acontecer.
ficou em silêncio por alguns minutos, reflexivo sobre o que acabara de ouvir. Não é como se já não tivesse tido aquele tipo de conversa outras vezes.
— Certo… Mas isso significa que vou ter uma chave do seu apartamento?
— Isso significa que, definitivamente, você não vai ter uma chave do meu apartamento, !
Um ano atrás
— Não, Bob, eu ainda não estou pronta para voltar. — disse no celular. — Nós já conversamos sobre isso.
destrancou seu apartamento e jogou as chaves em cima de qualquer lugar. Mal havia fechado a porta quando se deparou com um deitado no sofá de sua sala abraçando uma de suas almofadas coloridas decorativas.
— , já faz mais de um ano… — Bob dizia do outro lado da ligação.
A cantora tentou responder seu empresário, ao mesmo tempo que gesticulava para questionando o que o rapaz fazia ali.
Em resposta, seu vizinho folgado apontou para as sacolas em cima da mesa, indicando que havia comprado itens suficientes para abastecer a dispensa de , como forma de pagamento pelas muitas refeições que vinha tendo na casa da amiga.
A cantora rolou os olhos, vendo se acomodar melhor no seu sofá, enquanto procurava algum canal interessante para assistir na televisão.
Ela nunca deveria ter dado uma chave do seu apartamento para ele.
— Eu sei, Bob, mas eu não tenho condições de voltar agora… Condições físicas, Bob, eu não tenho condições físicas, muito menos psicológicas. — ela explicava ao telefone.
A garota colocou a bolsa ao lado das sacolas e tratou de tirar a blusa de frio que usava. Graças a , seu apartamento estava quentinho por conta do aquecedor elétrico.
— Não, eu não quero um personal trainer. — ela disse cansada de ter que repetir aquela conversa toda semana. — Tudo bem, vou pensar no assunto. Obrigada.
apoiou as mãos em cima da mesa e suspirou. Apertou os olhos e respirou fundo, decidida a não deixar as lágrimas caírem. Ela não queria chorar por aquilo de novo. Havia feito um grande progresso nas suas últimas sessões com a psicóloga, e não queria colocar tudo a perder naquele momento. Isso não vai me afetar, isso não vai me afetar…, ela repetia para si mesma.
Jogou os cabelos para trás e começou a mexer nas compras feitas por .
— Hey, obrigada por isso. — ela disse se dirigindo a ele.
— Claro, sem problemas… — ele respondeu. — Hey, isso significa que você vai cozinhar para mim hoje à noite? — ele perguntou com um sorriso de lado.
estreitou os olhos para o amigo.
— Só se você lavar a louça e guardar tudo nos armários.
— Feito!
Rindo, a cantora levou as sacolas para a cozinha. Em instantes, seu humor melhorou um bocado. O assunto sobre sua carreira mexia demais com o seu emocional, especialmente porque as manchetes de revistas, e chamadas dos programas de televisão, sempre vinham à sua mente quando Bob lhe perguntava sobre o momento do seu retorno aos palcos.
é vista saindo de uma loja de roupas voltada para pessoas plus size, uma das manchetes dizia. E logo em baixo, uma pergunta, Será que isso significa que a Estrela da América terá que contratar um novo estilista antes de voltar aos palcos?
Aquela matéria, junto com várias outras, a deixavam extremamente insegura sobre a possibilidade de voltar à ativa. Quer dizer, as pessoas esperavam ver , a Estrela da América, em cima dos palcos, e não… Essa pessoa que ela havia se transformado.
— Hey, você estava falando com Bob?
se surpreendeu ao ouvir a voz do amigo atrás de si. estava escorado no batente da porta de sua cozinha, com os braços cruzados e prestando atenção no que a garota fazia.
— Pois é… — ela respondeu. — Já virou rotina ele me ligar aos finais de semana.
— E aí, vai aceitar a proposta dele?
A garota fez uma careta. Não queria responder àquela pergunta, porque a resposta seria “não”, mesmo que no seu íntimo quisesse dizer “sim”.
— Não sei.
— Pensei que cantar fosse o que você mais ama fazer.
— E é! — ela respondeu automaticamente. E então pensando melhor no que dissera, emendou — Ou era…
não disse nada, pois sabia que ainda não havia acabado de responder à sua pergunta. Ela estava apenas procurando as palavras certas.
— O problema é que eu já não me pareço com uma artista pop.
Foi a vez de fazer uma careta.
— O que quer dizer com isso?
suspirou mais uma vez. Sabia que não era a intenção de , mas o rapaz a estava deixando nervosa.
— Quero dizer que estou gorda, . Muito gorda. Pelo menos para os padrões que a indústria do entretenimento exige. — ela disse rápido com os dentes cerrados. — Com esse corpo, eu já não sei se consigo ficar uma hora e meia em cima do palco cantando e dançando ao mesmo tempo. Além disso, estou parada há tanto tempo, que já nem sei se conseguiria compor qualquer coisa. E mesmo se conseguisse, não acredito que tenha fãs suficientes para comprar qualquer coisa minha.
Aquilo havia sido um desabafo. Um longo e necessário desabafo, que, até então, ela só havia feito com a sua psicóloga. E dizer todas aquelas palavras ali, fora do consultório, fazia todas elas parecerem ainda mais reais.
— Espera aí, espera aí. — se aproximou da cantora. — Está me dizendo que o que te impede de voltar para o palco é o seu corpo?
Após o término do seu relacionamento, entrou em uma tristeza profunda. Mas ela já havia passado por outras decepções antes e conseguira se reerguer de todas elas. O diferencial, dessa vez, foi a forma com que a mídia tratou o assunto, e as palavras que os jornalistas escolheram usar para descrever a pequena pausa feita pela cantora. Sim, ela havia feito uma pausa. Mas as duas semanas que ela escolhera tirar para ela, lhe renderam alguns quilinhos a mais, e isso não passou despercebido aos olhos dos paparazzi. E os paparazzis nunca foram simpáticos com ela.
O que começou como uma tristeza proveniente do fim de um relacionamento de três anos, acabou se tornando uma depressão profunda da qual, a muito custo, ela lutava para sair. Se não fosse por sua psicóloga, o apoio de Bob e a amizade de … nem mesmo gostava de pensar no assunto.
— , você sabe que eu estou certa. — disse ressentida.
— Tudo bem, você não tem o corpo da Camila Cabello, e nem a altura da Taylor Swift, mas isso não te faz pior do que elas. Na verdade, acho que as suas músicas são as únicas que realmente valem a pena serem ouvidas, quando o assunto é música pop.
entendeu aquilo como um elogio. Nunca se esqueceria da primeira noite que saiu com , no dia seguinte em que se conheceram e haviam hackeado as redes sociais de Jake Phillips.
— Não sou muito fã de música, pop, sabe. — ele dissera. — Prefiro música eletrônica.
— Daquelas que ninguém canta nada? — perguntou.
— Essas mesmo. Ou então rock. Gosto de rock.
— Do tipo que ninguém entende nada por que os cantores só gritam?
— Exatamente!
— … — ela começou, mas acabou sendo interrompida pelo amigo.
— Não, , me escuta. — e então, quando estava na frente da garota, segurou em seus ombros. — Você é incrível. Realmente incrível. Você é criativa, é talentosa e tem um fã-clube enorme que está apenas esperando a sua volta. Não deixe que um detalhe pequeno, como 20 quilos a mais, a impeça de rebolar até o chão e voltar a ser a estrela que você sempre foi.
poderia dizer que estava emocionada. Poderia, também, dizer que estava surpresa. As conversas que tinha com não costumavam ser profundas, tampouco envolver sermões, ou frases de efeito. Quer dizer, não era esse tipo de cara… E ainda assim, aqui estava ele, dizendo exatamente o que eu precisava ouvir, ela pensou.
Como resposta ao que acabara de ouvir, jogou um pano de prato em .
Com os olhos arregalados, sem entender o que poderia ter dito para receber aquilo, ele ouviu se justificar:
— Estou 18 quilos acima do meu peso. Não 20.
E com um sorriso maroto, ele respondeu:
— Ei, estou apenas arredondando as contas.
Atualmente
decidiu preparar ovos mexidos e algumas torradas para comer naquele dia. Sabia que se encontraria mais tarde com Bob para resolverem algumas pendências do seu show de estreia no próximo sábado, e poderia sugerir que o encontro se desse em algum restaurante próximo à casa de shows. Faria, então, uma refeição leve por ora.
— E aí, você assistiu televisão hoje? — perguntou ao adentrar na cozinha.
— Sim. — ela respondeu. — E ouvi rádio, e li algumas manchetes de revistas…
suspirou, não questionando o que a amiga havia encontrado. Ele sabia, afinal, ele mesmo havia lido algumas coisas sobre ela em sites de fofocas.
— Fodam-se todos eles. — ele disse. — São as mesmas pessoas que vão implorar por uma entrevista sua quando você estiver no topo novamente.
sentiu um calorzinho tomar conta do seu peito. tinha um jeito muito peculiar, próprio dele, de mostrar apoio a ela - coisa que ele fez desde que se conheceram, mas que acabou se intensificando no último ano, quando decidiu que, finalmente, estava pronta para colocar a cara no sol e voltar aos palcos. Afinal, depois de tanto tempo, ela conseguia se sentir bem consigo mesma.
— Obrigada, . Se não fosse por você do meu lado nesses últimos anos…
— Você apenas teria demorado um pouco mais para voltar para onde nunca deveria ter saído. — ele disse dando de ombros.
fez menção de se aproximar, mas acabou parando a poucos passos de , sem saber como agir na frente da garota. Eles, então, sorriram meio envergonhados por alguma razão e , a fim de amenizar o constrangimento que veio de lugar nenhum, roubou uma torrada que acabara de ficar pronta.
— Está gostosa. — ele disse de boca cheia.
, por sua vez, apenas lhe deu um sorriso sem dentes, voltando a atenção para os ovos mexidos.
Seis meses atrás
estava suada, cansada, com os cabelos fora do lugar e com a uma grande marca de suor embaixo dos braços. Era fato, precisava, urgentemente, de um banho. E mesmo torcendo o nariz pelo cheiro forte de suor que emanava de sua pele, há muito tempo não se sentia tão bem consigo mesma. Sim, o suor excessivo era um incômodo, mas também era bom, pois era resultado de um dia inteiro de ensaios ávidos, os quais renderiam novas coreografias. Coreografias estas, que estava ansiosa para colocar em prática.
O seu primeiro vídeo clipe já tinha data de estreia, e Bob estava negociando as produções do segundo e do terceiro. Seu novo álbum seria lançado em pouco menos de dois meses, e Bob estava ficando louco com a quantidade de cidades que já manifestaram interesse em sediar um show que representava o retorno da Estrela da América.
Assim que parou o carro na vaga reservada a ela, recebeu uma ligação de . Estranhou o horário, afinal, costumava manter suas noites de sexta-feira movimentadas o bastante para não ter tempo para ligações.
— Hey. — ela atendeu.
— Ei, onde está o seu cortador de pizza?
franziu a testa, confusa pela pergunta.
— Como é?
— Não podemos comer a pizza que fiz se eu não encontrar o seu cortador de pizza.
estava de férias há menos de uma semana, e havia decidido que iria testar seus dotes culinários em busca de uma nova profissão, já que estava insatisfeito com seu posto de gerente de telemarketing.
— Desista, , você não vai se tornar um chef de cozinha em duas semanas. — ela respondeu rindo, enquanto caminhava em direção ao elevador.
— Ei, você gostou da omelete que eu fiz ontem!
— Mas isso é porque qualquer pessoa sabe cozinhar uma omelete…
★
Após o jantar preparado por , afastou os pratos da mesa e colocou o notebook em cima dela.
— Saiba que você está tendo acesso a um conteúdo mais do que exclusivo. — ela disse apreensiva. — Na verdade, eu não deveria nem mesmo estar te mostrando isso, mas como sei que você nunca vai ter coragem de contar para os seus amigos que andou vendo vídeos de uma cantora pop, você vai ter a honra de ser a segunda pessoa a assistir a edição final do meu primeiro vídeo clipe, depois de dois anos sem pisar em um estúdio.
— Ei, por que segunda pessoa? Quem foi a primeira?
— Eu, é claro. — ela respondeu como se fosse óbvio. E então voltou a atenção para a tela na sua frente. — Está preparado?
Em resposta à sua pergunta, aproximou mais a sua cadeira da de . Nesse momento, a cantora deu play no vídeo.
Nos três minutos e 47 segundos que seguiram, não tirou os olhos da tela, enquanto não tirou os olhos dele. Estava ansiosa, estava insegura e, se fosse sincera consigo mesma, estava com medo. era a pessoa mais sincera que ela já conhecera. não era do tipo que mentia ou inventava desculpas - a não ser, talvez, quando o assunto fosse fugir de mulheres. sabia que seria mais do que sincero com ela com relação à sua performance.
E quando o vídeo chegou ao fim, cruzou um dos braços, apoiando a mão embaixo do queixo, fingindo-se pensativo. O rapaz já tinha uma opinião formada sobre o que acabara de assistir, mas queria poder fazer suspense na expectativa de .
— E então? Acha que as pessoas vão gostar?
E com um suspiro, ele respondeu:
— É claro, não tem por que não gostarem. Quer dizer, para uma música pop, e considerando que você é uma cantora que está afastada da mídia a bom tempo, até que a música e o vídeo são legaizinhos… Ai, é uma brincadeira! — ele reclamou depois de levar uma cotovelada da amiga. — Está incrível, , exatamente como eu disse que ficaria.
— Obrigada. — ela disse sentindo as bochechas corarem.
— Espera, o que é isso?
estava fechando a tela do notebook quando foi impedida por . O rapaz apontava para uma pasta de fotos, intitulada “Ensaio Cosmopolitan”, ao lado do vídeo que ele acabara de assistir.
— Ah… São algumas das fotos que tirei semana passada, nada demais.
Novamente ela tentou fechar o notebook, mas tinha outros planos. Tomando a frente da amiga, ele abriu a pasta de fotos e, soltando um assovio de surpresa, abriu cada uma das 12 fotos que a cantora havia tirado há alguns dias. havia sido convidada para participar de um ensaio sensual, e pensou que seria uma boa forma de promover seu retorno ao mundo do entretenimento.
— Caramba, … — ele falou sem tentar esconder a surpresa. — Eu não sabia que você usava essas lingeries tão sensuais.
olhava cada uma das fotos atentamente, e quando chegou ao fim, apenas passou a ver cada uma novamente. , por mais envergonhada que estivesse, não impediu o amigo, afinal, ao longo do tempo, haviam desenvolvido intimidade suficiente para terem a liberdade de fazer comentários daquele tipo. Além do mais, aquela não era a primeira vez que seu vizinho, e melhor amigo, a elogiava. A diferença das outras vezes, talvez, seja o fato de que não tinha um bocado de fotos dela seminua.
— Por que eu não soube antes da existência dessas fotos? — ele perguntou interessado.
— Porque eu sabia que você iria reagir exatamente da forma com que está reagindo agora. — ela respondeu revirando os olhos.
— Quando essas fotos sairão na revista?
pensou por alguns segundos.
— Acredito que a próxima edição chegue nas bancas na semana que vem.
— Cara, vou ter que passar na banca de jornal perto do trabalho… Você costuma usar todas essas rendas mesmo?
estreitou os olhos e deu um sorriso irônico. Homens… Sempre tão previsíveis nas suas curiosidades femininas.
— Para falar a verdade, sim. Quer dizer, eu não usava, mas agora uso.
Aquilo era bem verdade. Por muito tempo não conseguiu usar roupas consideradas sexy, simplesmente por não gostar de como as peças se encaixavam no seu novo corpo. Mais de um ano depois, contudo, a garota não só aceitava suas novas curvas, como também as apreciava de uma forma diferente de quando tinha o corpo perfeitamente dentro dos padrões de beleza da indústria do entretenimento.
— Para falar a verdade, eu ando gostando muito do rumo que a minha carreira e vida pessoal vem tomando… Gosto das minhas novas músicas, e do novo conceito dos vídeo clipes. Gosto também das novas coreografias, e do estilo que passei a adotar, e isso inclui as roupas que uso.
— Ou as roupas que você não usa. — ele disse em tom divertido.
— Sim, isso também. — ela riu.
tinha o corpo curvado para frente, a cabeça virada para , próximo demais para que as respirações deles não se misturassem. E foi naquele momento que o clima mudou. Uma densidade, vinda de lugar nenhum, recaiu sobre eles, e sentiu como se seu estômago estivesse despencando. O que está acontecendo?, ela se perguntou. Ali no seu lado não estava mais o seu vizinho folgado, tampouco seu melhor amigo desbocado, mas um homem extremamente charmoso que a olhava intensamente.
Se os olhos de pudessem falar, tinha certeza de que a conversa seria completamente inapropriada para menores de idade. Mais do que isso, emanava algum tipo de magnetismo impossível de resistir. E foi por esse motivo, por esse magnetismo inexplicável, e pelas palavras não ditas por seus olhos, que se aproximou.
Tudo aconteceu rápido demais. Tão rápido, que nenhum dos dois teve a chance de pensar no que estavam fazendo. Não tiveram tempo de se surpreender pelo choque dos lábios, nem de se censurar pelo beijo molhado, o qual começou intenso, mas logo passou a ser algo frenético, a ponto de ambos se levantarem, ao mesmo tempo, e seguirem, aos tropeços, para o quarto da cantora.
★
Com os olhos presos no teto do quarto, finalmente pôde pensar no que acontecera na cozinha. E depois no corredor para o seu quarto. E, então, no seu próprio quarto, na sua cama. Mas por mais que ela se esforçasse para tentar encontrar uma lógica naquilo, seu cérebro continuava lhe dizendo que dormir com seu vizinho, e melhor amigo, era algo impossível de explicação, afinal, nunca havia dado sinais de que se sentia atraído por ela. Ou havia? já não sabia. E por estar confusa, ela se perguntou:
— O que acabou de acontecer?
Estava tão imersa em seus pensamentos, que não se deu conta do quão ofegante sua voz saíra. Tampouco percebeu a respiração descompassada ao lado da sua.
— Eu só queria ver se a sua lingerie era tão sexy, pessoalmente, quanto nas fotos.
A primeira reação da mulher foi esconder o rosto entre as mãos.
Caramba, era quem estava do seu lado. Seu vizinho safado, seu melhor amigo folgado… Fala sério! Como poderiam continuar sendo amigos dali para frente?
Mas então, ao rir da piadinha que fizera, ela percebeu que quem estava ali, do seu lado, era ele, , o cara que não tem relacionamentos, e que vê no sexo apenas como algo estritamente casual, com difíceis chances de repetição.
Então, teve certeza de que eles ficariam bem, e que eles nunca mais precisariam falar sobre o que acabara de acontecer. E só para deixar claro, ela disse:
— , nós somos amigos, o que significa que isso nunca, nunca, poderá se repetir.
O silêncio que se seguiu foi quase ensurdecedor. poderia pensar que teria caído no sono, se ele não estivesse com os olhos abertos.
— Tecnicamente ainda estamos na cama, e as nossas roupas estão no chão. Então…
E por mais que não concordasse com a lógica de , a mulher não se afastou quando ele se aproximou novamente dela.
★
As coisas realmente voltaram ao normal depois daquele final de semana. e continuaram a se tratar como os velhos amigos que eram, uma vez que ele não perdeu o costume de aparecer de surpresa no apartamento dela, e a cantora, mesmo com sua agenda extremamente cheia de compromissos, não parou de dividir o seu café da manhã com o seu vizinho.
A única coisa que não seguiu como o planejado, contudo, foi a promessa de que nunca mais dormiriam juntos. Quer dizer, em um momento estavam tomando vinho e falando das cidades que visitaria ainda aquele ano para fazer seus shows, e no instante seguinte ela estava sentada em cima dele, com o vestido perdido em algum lugar, com um muito ansioso em desabotoar o seu sutiã.
— Tudo bem, isso não pode…
— Acontecer de novo. — ele terminou a frase dela. — Eu sei.
e também prometeram nunca mais dormir juntos na terceira vez que acordaram um ao lado do outro, e na quarta vez… Até que chegaram ao ponto de não fazerem promessas que eles sabiam que não iriam cumprir.
chegou a mandar uma mensagem, tarde da noite, para , e ele chegou a passar um final de semana inteiro com , alegando que o encanamento do seu apartamento estava com problemas, e que precisaria tomar banho no dela.
— Acho que deveríamos tomar banho juntos. — ele sugeriu certo momento.
olhou para ele com o canto dos olhos, uma vez que estava muito concentrada lendo alguns e-mails importantes enviados por Bob.
— Ei, você é quem fez uma propaganda falando que devemos economizar água. Estou apenas pensando no bem do meio ambiente!
E por mais que soubesse que poderia estar pensando em qualquer coisa, menos no bem-estar do meio ambiente, ela não recusou a sua oferta.
A amizade entre eles continuou a mesma de antes, com exceção, talvez, de que eles haviam acrescentado alguns benefícios à relação que tinham. Não oficializaram nada, contudo. não era esse tipo de cara.
E prova disso foi uma conversa de tiveram alguns meses depois, quando apareceu na cozinha da amiga brigando com o celular.
— O que foi? — ela perguntou, mesmo que já soubesse a resposta. deu de ombros.
— Acho que vou mudar o número do meu celular. — ele comentou.
balançou a cabeça, sabendo que estaria certa quanto às suas suspeitas.
— Isso não vai dificultar a vida das várias mulheres que estão te ligando? — ela perguntou em tom provocativo.
soltou uma risada baixa, mas não disse nada. Por alguns minutos, os únicos sons que podiam ser ouvidos eram os dos ovos sendo fritos e o bater da colher nas xícaras. Até que , receoso, perguntou:
— Você, hum… Não se importaria se eu saísse com outras mulheres?
parou a xícara no ar, a caminho da boca.
Se ela se importava com o fato de seu vizinho folgado e melhor amigo mulherengo continuar saindo com outras mulheres, enquanto eles dois tinham algo indefinido, sem rótulos e sem cobranças? É claro que sim. É claro que ela se importava, mas não iria dizer aquilo a . Em vez disso, preferiu responder:
— Claro que não, por que eu me importaria? — ela perguntou, sentindo a voz falhar no final da frase. — Somos amigos, não somos?
a encarou por alguns segundos antes de responder.
— Sim, somos amigos.
Atualmente
— Esqueci de perguntar mais cedo. — ela disse enquanto levava os ovos mexidos para a mesa já posta por . — Você tem planos para o final de semana? Para sábado à noite, quero dizer.
parou de se servir, com a testa franzida, confuso com a pergunta de .
— O seu comeback não é sábado à noite?
— É sim, e é por isso que estou perguntando se você tem algum compromisso nesse dia ou se pretende ir ao show.
tinha o lábio inferior preso entre os dentes, apreensiva. Ela sabia que não era o tipo de cara que ia a shows de música pop, afinal, ele nem mesmo gostava desse estilo de música. E mesmo que desejasse que estivesse lá para lhe dar apoio, ela não insistiria caso o amigo falasse que não poderia comparecer.
— Na verdade, eu tenho um compromisso sim. Um muito importante, aliás. — ele respondeu voltando a se servir.
deixou os ombros caírem.
— Mas não sei se vou conseguir comparecer a ele se você continuar enrolando e não entregar a minha credencial de acesso ao seu super show. Quer dizer, falta menos de uma semana, não é? Eu já não deveria ter recebido, sei lá, um passe livre, ou qualquer coisa do tipo?
voltou a olhar , que tinha um sorriso maroto nos lábios.
— Isso se eu estiver vivo até lá, né… Com esses seus cafés da manhã com cada vez menos opção de comida, não sei dou conta de aguentar até sábado à noite.
segurou a risada e jogou uma fatia de torrada em , que prontamente a pegou e passou a comer junto com os ovos mexidos.
— Se está insatisfeito, então comece a comer no seu próprio apartamento.
O amigo deu de ombros antes de responder:
— E perder a chance de poder falar para as pessoas que a Estrela da América cozinha todos os dias para mim? Não, obrigado.
E entre risos e mais piadinhas, passou a tomar o seu próprio café da manhã completamente esquecida das matérias que leu mais cedo, e dos comentários jornalísticos que ouvira antes de sair de casa.
★
A semana passou incrivelmente rápido. acordava muito cedo, passava o dia fora de casa, e voltava tarde da noite, algumas vezes encontrando um dormindo no seu sofá e uma caixa de pizza em cima da mesinha de centro da sua sala.
— Ei, não quer ir para o seu apartamento? — ela perguntou na primeira vez que o encontrou lá.
— Prefiro dormir aqui, se você não se importar. — ele respondeu mantendo os olhos fechados.
Bem, ela não se importou.
e tinham desenvolvido um sentimento recíproco de parceria e confiança, e ela gostava da ideia de ter próximo a ela. Isso porque a mulher se encontrava terrivelmente ansiosa e nervosa, além de ter desenvolvido insônia quando faltavam apenas três dias para o seu grande retorno aos palcos.
Contudo, se pegou pensando que mesmo estando com um turbilhão de emoções dominando sua mente, ela nunca havia se sentido tão bem. Nunca. podia estar apreensiva com os próximos dias e com a recepção que teria, mas também tinha a certeza de que se sentia segura o bastante para continuar seguindo em frente, independentemente do que a imprensa falaria dela. Quer dizer, sabia o que ela estava fazendo. Sabia que cada música composta havia sido feita por ela e para ela. Cada coreografia nova carregava dias de dedicação e superação de .
sentia que, pela primeira vez, desde que começara sua carreira de artista, estava fazendo algo por ela, sem se preocupar com a aprovação das pessoas. Mais do que isso, sua mudança, sua volta, seu recomeço… Tudo isso estava dando certo. Tudo na vida de voltou a dar certo, cada pequena coisinha, cada decisão, por mais insignificante que parecesse… Tudo estava dando certo, e isso se devia à mudança de perspectiva que tinha dela própria e de sua vida.
E foi com essa mistura de ansiedade e confiança nas suas escolhas, que ela subiu no palco naquele sábado à noite.
sentia as pernas moles como gelatina. Os pelos dos braços mais arrepiados do que em um dia de inverno. A roupa colada não escondia metade das suas novas curvas, e ela tinha certeza de que as celulites nas suas pernas dariam boas imagens para as revistas de fofoca nos próximos dias. Seu cabelo estava solto e voava por suas costas e rosto por causa do vento direcionado a ela. Aquilo também renderia algumas belas imagens, ela tinha certeza.
Com um microfone em uma das mãos, e uma garrafinha de água em outra, após performar a primeira música da noite, ela foi até a ponta do palco e falou com o seu público, o qual gritava pelo seu nome, expressando toda a saudade que sentiram por ficar tanto tempo sem ter sua ídola em cima dos palcos.
— Eu voltei, América! — ela disse, ouvindo vários gritos em resposta. — Eu voltei para ficar, e sabem por quê? Porque aqui, em cima dos palcos, cantando para vocês, é o meu lugar. E não vou deixar ninguém, nunca, dizer o contrário.
Mais gritos foram ouvidos, algumas pessoas no público choravam, outras carregavam cartazes com mensagens de apoio à cantora.
— Por muito tempo eu acreditei que nunca mais poderia fazer o que amava, simplesmente por não me encaixar em um padrão criado pela mídia. Minhas músicas, minhas danças, minhas lutas, meu corpo… Tudo parecia errado. Eu parecia errada, de alguma forma. Mas hoje eu vejo que eu não estou errada. Ser quem você é, fazer o que você ama, lutar pelo que você acredita, isso não é errado! Errado é você se sentir mal por ser quem é. Errado é você sentir mal porque alguém disse que você não pode ser quem é. E sabem de uma coisa? Eu quero que todas essas pessoas erradas se fodam!
Os gritos do público foram tão altos, que quase conseguiram abafar a melodia da próxima música da Estrela da América.
— A próxima música se chama Cool, e representa o meu estado de espírito atual. Também representa o meu desejo a todos vocês: que vocês se amem, que se aceitem, que se sintam bem e confiantes em toda e qualquer pequena coisinha que fizerem. Vocês são incríveis! Nunca deixem que alguém os faça pensar o contrário!
continuou o seu show com toda a disposição que seu corpo lhe permitiu. Fez pequenas pausas, bebeu água, se alongou disfarçadamente e, mesmo ofegante, continuou dando tudo de si.
E ao final da noite, quando anunciou que cantaria a última música, teve certeza de que sua volta não havia sido um equívoco. Quer dizer, mesmo cansada, suada e exausta, a cantora descobriu que poderia continuar fazendo exatamente tudo o que sempre fez antes: os shows longos, as performances ousadas, as letras polêmicas… Simplesmente porque ela era uma mulher talentosa.
Depois de anos longe dos palcos e longe da mídia, ela finalmente pôde ter algum tempo para conhecer si mesma, para apreciar cada defeito seu, para aceitar cada falha sua, simplesmente porque isso não a deixava menos mulher, menos artista, ou menos cantora. Pelo contrário. A aceitação lhe trouxesse a certeza que ela sempre buscou: de que é um ser humano, e que como qualquer ser humano, possui defeitos e qualidades igualmente apreciáveis. conseguiu se livrar de um namorado péssimo, que em nada lhe acrescentava, e ainda conseguiu se livrar dos estereótipos que uma mídia suja criou para ela. nunca havia se sentindo tão bem consigo mesma como naquela noite.
★
A caminho do camarim, pegou seu celular das mãos de Bob.
— Alguma coisa interessante? — ela perguntou apreensiva.
— Veja por si mesma.
E ela viu.
“ , a Estrela da América, faz grande show de comeback e mostra que voltou para ficar!”
“Com roupas mais curtas que o recomendado para o seu novo padrão corporal, subiu aos palcos com a confiança de antigamente e se mostrou satisfeita com o alvoroço do público.”
“Fãs de afirmam terem aprovado o novo visual da cantora. Outros disseram, ainda, se sentirem representados ao ver uma artista pop, do calibre da Estrela da América, em cima dos palcos cantando músicas sobre bem-estar, autoestima e amor próprio.”
“A nova fase de : novo padrão visual, novas músicas, novas coreografias, novas lutas - o que esperar da queridinha Estrela da América?”
— Não preciso nem dizer que o telefone não parou de tocar desde que você subiu ao palco, não é? — Bob comentou, enquanto via a cantora ler cada uma das manchetes dos jornais e revistas online.
— Alguma ligação dos mesmos jornalistas que desdenharam a minha volta, semanas atrás? — ela perguntou.
— Várias. — Bob respondeu com os olhos cerrados, já imaginando onde aquela conversa chegaria.
, então, devolveu o celular ao amigo e empresário, arrumou o cabelo atrás da orelha e vestiu a blusa de frio que lhe foi oferecida por um dos staffs.
— Ótimo. Diga a eles que não tenho horário na agenda para perder com eles. E se eles reclamarem, diga para fazerem outra matéria falando da minha saúde mental, do meu corpo ou das minhas músicas novas. Vai ser um prazer rebater cada uma das suas matérias podres.
A passos firmes, deixou o empresário para trás, sabendo que ele jamais falaria isso aos jornalistas, mas que recusaria seus pedidos de entrevistas com classe e educação.
estava tão eufórica com os gritos que ainda podiam ser ouvidos, que mal percebeu que não estava sozinha ao entrar em seu camarim.
— Para um show de música pop, até que não foi tão ruim…
A cantora levou um susto ao ouvir a voz de , mas isso não tirou o sorriso que ela tinha nos lábios. Pelo contrário, ao ver escorado na sua mesa de maquiagem, os braços cruzados na frente do peito, a mulher não conteve o gritinho de excitação.
— Caramba, você viu como estava cheio?! — ela perguntou indo até ele aos pulos. — E as pessoas sabiam cantar todas as músicas! Puta merda, !
riu da forma como falava. Se fosse sincero consigo mesmo, poderia afirmar que nunca vira a mulher tão radiante como agora.
— Estou surpresa que você tenha ficado até o final do show… Pensei que não gostasse de música pop. — ela provocou.
deu de ombros.
— Fazer o quê, né… É o que a minha namorada faz.
estava prestes a se jogar no sofá, mas parou no caminho. O que ela tinha acabado de ouvir?
— Como é que é? — ela perguntou surpresa.
— Pensei que estava na hora de você parar de me enrolar e assumir o nosso namoro. — disse dando de ombros novamente, como se o que disse não passasse de uma conversa usual entre os dois.
substituiu a expressão de surpresa por um sorriso de lado, quase irônico.
— Então quer dizer que estamos namorando? — ela perguntou lentamente, prestando atenção no significado daquela frase.
Foi a vez de fingir fazer uma careta de surpresa antes de falar:
— Vai me dizer que os nossos momentos quentes foram só diversão para você?
E então os dois riram, de nervoso e de surpresa.
Deus, o que estava acontecendo ali?
— Falando sério agora, , eu apenas achei que poderíamos oficializar o que temos… Mesmo que o meu gosto musical seja muito melhor do que o seu.
— Você não pode estar falando sério, ! — disse, surpreendendo seu vizinho mulherengo e melhor amigo folgado. — O seu gosto musical é tão ruim quanto as roupas que você usa!
— Ei! Qual o problema com as minhas roupas? Pensei que você gostasse das minhas camisas xadrez. — ele se defendeu, aproximando-se de sua vizinha barulhenta e melhor amiga.
— E eu gosto mesmo delas… Quando estão jogadas no chão.
tinha um sorriso sapeca nos lábios, e tinha um sorriso totalmente inapropriado para menores de 18 anos.
Em instantes, estava de frente para sua vizinha, melhor amiga e, agora, namorada. Com os dedos das mãos entrelaçados, aproximaram seus rostos. O beijo, contudo, não teve chance de evoluir para algo mais profundo porque foram interrompidos com algumas batidas na porta.
— ? — Bob abriu a porta lentamente. — Estamos prontos para ir. Seus fãs estão te esperando no estacionamento.
olhou para , ainda com os dedos entrelaçados e os rostos próximos demais.
— Vai lá. — ele disse. — Seus fãs estão te esperando.
— Você vai me esperar? — ela perguntou antes de chegar à porta.
— É claro que sim. Eu sou o seu maior fã, esqueceu?
pensou em corrigir a fala de , mas não o fez. Sabia que o namorado acabara se tornando amante do trabalho de , além de ter se apaixonado pela mulher que ela se tornou.
Mas a verdade é que , por mais que amasse a mulher, jamais poderia ser seu maior fã. Isso porque aprendera a ser a fã número um de si mesma.
“ está tentando voltar ao mundo do entretenimento! Prova disso é o lançamento do seu novo single, Cool, depois de dois anos sem subir nos palcos.”
“O novo vídeo clipe de atingiu a marca de nove milhões de visualizações em menos de 24 horas após o lançamento. Basta sabermos se a quantidade de visualizações é sinônimo de qualidade ou apenas curiosidade pelo seu retorno.”
colocou a carteira dentro da bolsa e os óculos escuros no rosto. Procurou pela jaqueta em cima do sofá e pelo controle remoto que estava perdido em algum lugar da sala, suspirando pela bagunça deixada na noite anterior.
Apesar de estar com fome, e de se arrepender por não ter abastecido sua dispensa naquele mês, parou em frente à televisão e passou a prestar atenção no que era dito pelos jornalistas.
— Se é que eles podem ser chamados assim. — ela comentou em tom de voz baixo. De fato, os apresentadores de programas matinais não passavam disso: apresentadores contratados por causa de seu carisma e falta de papas na língua. Apresentadores que não veem problemas em inventar mentiras ou tirar conclusões errôneas apenas para aumentar a audiência do programa.
— Você assistiu, Clint? — a apresentadora perguntou ao seu companheiro de programa.
— Ah, sim. A curiosidade foi grande, você deve imaginar. — ele respondeu rindo.
— E o que você achou?
Clint, o apresentador, fez uma longa pausa antes de responder, e sabia que a pausa era proposital, afinal, Clint já tinha sua opinião sobre muito bem formada antes mesmo de ouvir sua nova música.
— Bem, se levarmos em consideração que ficou dois anos sem produzir nada e já não é a mesma estrela de antes, nem possui os mesmos patrocinadores de outrora, o vídeo clipe é razoável.
A apresentadora deu uma longa risada ao lado de Clint.
— Ora, Clint, razoável? Esta é a nota que você vai dar para a nossa querida estrela, .
Clint deu de ombros e levantou as mãos como se disse que não poderia fazer nada quanto a isso. Colocou uma falsa expressão de pesar, e explicou:
— Você e eu sabemos que já não é a mesma estrela de dois anos atrás.
Dois anos atrás
aceitou a mão estendida a ela para descer as escadas do palco. Se a cantora já ficava exausta ao final de cada show, aquele final de semana tinha lhe deixado duplamente esgotada: além do show que fizera sexta-feira à noite, e do já programado para sábado, no mesmo horário, havia aceitado realizar uma apresentação extra em um evento da Casa Branca naquela tarde, mesmo sabendo que à noite teria que dar tudo de si para realizar todas as performances do seu show.
— Obrigada. — ela agradeceu a Bob, seu empresário e um dos seus melhores amigos.
Aceitou a garrafinha de água estendida para ela, e logo tratou de tentar secar o suor da testa, afinal, apesar de ter realizado dois shows naquele sábado, o dia ainda não tinha acabado.
— As meninas já estão esperando por mim? — ela perguntou a Bob.
— Sim, estão no camarim. — ele respondeu. — Você vai querer trocar de roupa antes de se encontrar com as suas fãs?
pensou por alguns segundos.
— Vou apenas colocar a minha jaqueta por cima dessa roupa. Vou tomar banho quando chegar em casa.
Bob concordou com a indicação da cantora pop e passou a andar do seu lado. Enquanto estavam a caminho do camarim, Bob abriu a agenda no celular e passou a conversar com .
— Sei que você não gosta de conversar sobre assuntos sérios logo depois dos shows…
— Eu estou muito cansada, Bob… Provavelmente não vou me lembrar de nada amanhã…
— Mas é um assunto meio urgente, então vou falar mesmo assim. — ele continuou sua frase como se não tivesse sido interrompido por . — A produção do seu novo vídeo clipe vai acabar atrasando mais do que imaginamos. — ele disse suspirando.
Apressou o passo para acompanhar , que tinha dois objetivos: encontrar suas fãs e ir embora, e fugir da conversa sobre trabalho que Bob queria ter com ela. Bob não deixou que a cantora fugisse dele, contudo.
— Os produtores estão com a agenda cheia com o novo álbum da Miley Cyrus, e já haviam fechado contrato com a Demi Lovato antes de assinarem com a gente. Mas não se preocupe, o produtor executivo me prometeu que irá passar você na frente da Taylor Swift.
apenas concordou com o que lhe foi dito. Ela sabia que se fosse um assunto sério, um que realmente precisasse da sua total atenção, Bob teria marcado uma reunião com ela na agência. E como não era aquele o caso, apenas fez uma nota mental de conversar com o amigo no dia seguinte e pedir para que ele lhe explicasse melhor a situação do atraso da sua gravação. Aquele momento não era hora de falarem sobre a agenda dela.
Dez fãs esperavam no camarim da cantora. As dez garotas, junto com outras milhares, participaram de um sorteio feito no Instagram da artista. Infelizmente, somente dez ganhadoras tiveram a chance de viajar para a capital para assistirem a um show de com tudo pago, entrada para o show, hotel e passagens de ida e volta, além de terem a chance de tirar uma foto com a sua ídola.
Mas isso não significava que era o tipo de famosa que se recusava a posar para fotos ao lado de fãs nas ruas, muito pelo contrário. E era exatamente por isso que, ao sair da casa de shows, tantos fãs esperavam a cantora ao lado da sua van, no estacionamento.
— Você sabe que os seguranças podem afastar eles, se você quiser. — Bob ofereceu.
suspirou, estava realmente cansada. Seus olhos pesavam, e suas pernas doíam. Sua garganta ardia, e ela tinha certeza de que se tentasse sorrir para mais alguma foto, sairia com uma careta horrível.
— Você sabe que eu jamais faria isso. — ela respondeu.
E então, com um sorriso no rosto, movimentou as mãos, indicando que gostaria que seus seguranças se afastassem, a fim de que ela pudesse se aproximar das pessoas que a esperavam do lado de fora, pessoas estas, que ela não fazia ideia de há quanto tempo estavam a aguardando.
Ela jamais abandonaria um fã, afinal, sempre fora leal a todos eles.
Atualmente
ligou o rádio no instante em que entrou no carro.
Sua vontade de ouvir notícias a respeito de si mesma estava dividida: por um lado, queria saber como o público estava a recebendo de volta; de outro lado, tinha receio dos comentários maldosos que sabia que receberia.
— Como os comentários de mais cedo. — pensou alto.
Decidiu, então, escolher uma estação que estivesse tocando uma música qualquer.
No momento que parou no primeiro semáforo, a música que ouvia anteriormente foi substituída pelo seu novo single, Cool, e ela sabia que, ao final da música, o intervalo ocorreria. Não porque a cantora acompanhasse a programação daquela estação, mas porque ela tinha certeza de que os radialistas não perderiam oportunidade de falar sobre ela e sobre a sua nova música. Aparentemente, a sua volta havia causado um grande alvoroço no meio do entretenimento, e tinha dividido muitas opiniões: enquanto algumas pessoas apostavam no seu fracasso, sem nem mesmo lhe darem uma chance de retornar ao mundo da música, outras pessoas apostavam no seu fracasso após o lançamento de suas novas músicas.
— E vocês acabaram de ouvir Cool, o novo single da cantora , a mesma cantora que ficou dois anos sem produzir absolutamente nada!
revirou os olhos ao ouvir aquilo, simplesmente porque o comentário feito pelo radialista foi o mais previsível possível.
— Pois é… Era de se esperar que tendo dois anos para preparar algo para os fãs, a cantora fosse produzir algo mais significativo, não é mesmo? — outro radialista perguntou.
Uma terceira voz passou a falar, no entanto.
— Sim, é verdade, Chris. Mas acho que valeria a pena relembrarmos a trajetória dessa artista que já foi tão querida uma vez.
— De fato, já foi considerada A Estrela da América. Infelizmente sabemos que essa estrela já está apagada há bastante tempo. — a primeira voz comentou de novo.
E aquele comentário foi o bastante para que sentisse como se seu estômago tivesse um nó prendendo suas entranhas.
Por que as pessoas tinham que ser tão maldosas na escolha das palavras?
— Vamos relembrar foi lançada pela Disney, na mesma época que Miley Cyrus, Demi Lovato e Selena Gomes. Elas, inclusive, eram muito amigas.
— Sim, é verdade. — outra pessoa disse. — Elas chegaram a fazer um seriado juntas, mas a série não decolou. , então, começou sua carreira solo como cantora teen, mas rapidamente mudou o estilo de música quando atingiu a maioridade. Ela chegou a ser muito criticada na época, pois a mudança no estilo musical foi realmente muito brusca.
— A cantora deixou de falar sobre assuntos banais e comédias românticas, e passou a cantar sobre emoções de uma forma… Digamos que… Revoltada.
Nesse momento, todos os radialistas riram, como se a escolha da palavra não fosse a correta.
revirou os olhos. Lembrava-se perfeitamente bem do momento que eles falavam. Recordava-se do momento que ela rompeu com a imagem de garota perfeita, criada pela Disney e vendida pela indústria do entretenimento, e passou a ser ela mesma. Lembrou-se do momento que cansou de interpretar uma personagem, e passou a agir, a cantar e a se vestir como ela realmente era: uma adulta com pensamentos e vontades próprias.
Obviamente a mídia não aceitou muito bem a sua mudança de tom.
— Teve uma época que fez algumas músicas de cunho político, e muitos fãs não gostaram, porque não era o estilo dela. A mídia tinha certeza de que, naquele momento, a Estrela da América havia se revoltado com a vida.
Mais risadas.
— Mas quando as coisas pareciam estar saindo do controle de , Jake Phillips entrou na sua vida, um cantor pop romântico, que estava em ascensão, e acabou atingindo o topo de todas as paradas musicais depois que começou a namorar a Estrela da América.
— Algumas pessoas dizem que ele usou para alavancar a sua carreira.
— Hoje nós sabemos que isso é verdade, não é? Afinal, após os boatos de que Jake havia traído , e da confirmação do fim do namoro deles, Jake fez várias publicações intrigantes nas suas redes sociais, admitindo a traição, além de outras coisas que havia feito com a cantora durante o tempo que estavam juntos.
— Isso é verdade. Parecia que isso seria o fim da carreira de Jake, mas ele logo se reergueu e voltou a aparecer na mídia com uma nova namorada, uma modelo internacional. As coisas para , infelizmente, não seguiram pelo mesmo caminho, uma vez que ela não conseguiu se reerguer como Jake.
sentia o estômago dar voltas. E ela sabia que as voltas eram de raiva, uma vez que a mídia parecia adorar falar sobre ela e sobre seu relacionamento com Jake Phillips, mas não faziam ideia do que, de fato, havia acontecido.
E por mais que ela já houvesse superado o fim do relacionamento, lembrar de como ficou foi ferida, e de como foi difícil se curar, ainda doía.
— Quem sabe esse novo álbum de não seja a chave que ela precisava para abrir as portas do mundo pop de novo?
Dois anos atrás
chorava e tremia ao mesmo tempo. Já não sabia se a reação era devido à raiva, à decepção, ou ao cansaço. Provavelmente aos três. Um misto de emoções conflitantes que a dominavam ao mesmo tempo.
— Eu quero terminar. — ela disse baixinho, mas não porque estava envergonha do que dizia, mas simplesmente porque já não tinha forças para falar mais alto. Sua garganta doía por conta do choro, e sua mente estava exausta por causa da discussão. — Chega. Não dá mais.
Jake, em vez de se mostrar surpreso com a fala da garota, ou até mesmo chateado, apresentou-se quase entediado. Ou, pelo menos, foi isso que o revirar dos seus olhos demonstrou.
— De novo com esse papo, ? — sua voz tinha tom de deboche. — Pensei que já tivéssemos falado sobre isso.
— Eu disse que essa chance seria a última. E eu falei sério.
precisou manter os dentes cerrados. As lágrimas ainda escorriam, mas o sentimento de ira estava cada vez mais forte. Quanto mais olhava para o noivo, mais repulsa ela sentia.
Há pouco mais de um ano, logo antes de e Jake noivarem, surgiram boatos de que Jake Phillips estaria saindo com uma atriz. Os boatos, contudo, nunca foram confirmados, e preferiu acreditar na palavra de Jake, que jurou, de pés juntos, que jamais trairia o amor de sua vida.
Alguns meses depois, contudo, não foi preciso que revistas publicassem boatos sobre a traição de Jake. presenciou a infidelidade de seu noivo, o que a fez questionar se os boatos de tempos atrás não eram verdadeiros.
Daquela vez, Jake chorara nos pés da noiva, e implorou pelo seu perdão, alegando que havia sido fraco ao não recusar a aproximação repentina da mulher com quem ele tinha sido flagrado. Mais uma vez, acreditou nas palavras de Jake, o qual jurou que aquilo jamais se repetiria. “É a sua segunda e última chance. Não me decepcione, por favor”, ela dissera.
E lá estava ele, novamente flagrado nos braços de uma mulher que não era ela. Dessa vez, contudo, um fotógrafo de uma revista de fofoca havia publicado algumas fotos. Era bem verdade que Jake não aparecia nitidamente nas fotos, mas sabia. Ela sabia que era o seu noivo mentiroso o homem daquelas fotos.
A pior parte? Ele nem mesmo tentou negar.
— Você não pode estar falando sério. — ele disse passando a mão na testa.
— Pois eu estou.
se esforçou para manter o tom da voz decidido, enquanto Jake não escondia o tom irritadiço da sua.
— Você sabe que se terminar comigo, é o seu fim, não é? É o fim da sua carreira. — ele disse apontando o dedo para ela. E antes que pudesse o interromper para dizer o quão absurdo aquilo soava, ele continuou. — Você sabe, ou deveria saber, que os seus fãs não compraram muito essa sua mudança de estilo musical. Sou eu quem mantenho você nas graças do público, meu amor.
E foi naquele momento que as lágrimas, ainda que tímidas, secaram. A dor da traição foi completamente substituída pela indignação daquelas palavras e o que elas significavam.
Jake Phillips estava dizendo a ela, que ela dependia dele para se manter na carreira de artista? Aquilo era realmente sério?
— Acredito que as pessoas continuarão ouvindo qualquer coisa que eu compor, não importando o teor da música… Afinal, o sucesso das suas músicas são prova vivo disso.
Jake queria jogar? Queria jogar coisas na cara dela? Pois muito bem. também tinha algumas verdades difíceis de engolir, como, por exemplo, que Jake era um grande compositor de merda, e que suas últimas músicas apenas fizeram sucesso porque escrevera as letras e compôs as melodias.
Jake ficou parado na frente da garota, com a boca aberta, pronto para responder ao que ouviu, mas ficou sem palavras. Definitivamente, ele não tinha como se defender.
O cantor, então, olhou para cima, como se pedisse uma orientação divina, deu as costas para a noiva, andou pelo recinto, e voltou a se postar de frente para .
— Quer saber de uma coisa? Não vamos mais discutir sobre isso, está bem? Você, obviamente, está muito emotiva, provavelmente está de TPM, e está dizendo coisas que eu sei que você vai se arrepender mais tarde.
estreitou os olhos. Não, ela não estava de TPM. Mas sim, estava muito emotiva. Emotiva pelo fato de ter sido traída, de novo, pela pessoa que ela mais confiava e amava. Emotiva por ter sido chamada de insuficiente, ainda que indiretamente, para manter o interesse dos fãs na sua música. E, principalmente, estava emotiva por ter seus sentimentos menosprezados daquela forma.
— Acho melhor deixar você esfriar a cabeça. Vou dormir na casa de um amigo, e volto amanhã, quando os ânimos estiverem menos aflorados.
Jake ainda ficou alguns instantes olhando para , esperando uma reação da garota, qualquer movimento que indicasse que a noiva fosse o impedir de ir embora, mas ele não recebeu nada disso. mantinha os olhos fixos nele, desejando, com todas as suas forças, que aquele dia nunca tivesse acontecido.
— Tudo bem, então. — Jake foi rapidamente até o quarto e pegou uma jaqueta, as chaves do carro, a carteira e o celular. — Vou deixar a minha chave com você, está bem? — ele disse se referindo à chave do apartamento que eles dividiam há mais de um ano. — Para você ter certeza de que não tentarei voltar no meio da noite. Assim você pode dormir tranquila.
Ah, , definitivamente, dormiria mais tranquila naquela noite.
Mas não ali.
A passos decididos, ela foi até o quarto que, até então, dividia com Jake, e colocou dentro da mala o maior número de roupas e calçados que conseguiu. Enquanto fechava a sua segunda mala de viagem, Bob, seu empresário e melhor amigo, chegou.
Ele não precisou perguntar o que tinha acontecido. Bob nunca gostou realmente de Jake Phillips, tampouco tinha apreço pela influência que o cantor tinha na carreira de .
— Se quiser pode me esperar no carro. Vou terminar de empacotar os seus objetos pessoais.
não questionou a sugestão. Pegou ambas as malas cheias de roupas e calçados, a mochila que acabara de encher com seus itens de higiene pessoal, e a bolsa que carregava sempre consigo. O restante de suas roupas já se encontrava em cima da cama, apenas esperando pelas malas que Bob ficara de trazer. Os livros, CDs e DVDs de já tinham sido colocados dentro de uma caixa de papelão, ao lado dos seus prêmios de música. Bob também se encarregaria de levar o restante até o carro.
A verdade é que sua mente estava tão cheia de informações, tão confusa por conta dos últimos acontecimentos, que o fato dela ter terminado o seu noivado, estar indo embora do apartamento que vivia com o amor da sua vida e todas as implicações que consistiam naquelas aquelas decisões, fizeram com que o tempo voasse diante dos olhos de . Ela mal percebeu os minutos passando e as horas chegando.
— Podemos ir embora. Já tranquei o apartamento. — Bob garantiu.
somente concordou com a cabeça, incapaz de falar qualquer coisa.
Pegou a chave que Jake havia lhe entregado e, com a outra mão, pegou sua chave do apartamento, usada por Bob para trancar a porta.
— Espere por mim no carro.
Ela seguiu até o apartamento do síndico, no primeiro andar. Tocou a campainha duas vezes antes de ser atendida.
— Boa tarde, Sr. Fausto, desculpe chamá-lo a essa hora. — ela disse com o tom de voz mais doce que pôde encontrar. — Mas estou me mudando do apartamento, e acabei deixando as chaves com Jake.
— Oh, não me diga que terminaram… — o Sr. Fausto perguntou com pesar.
— Acho que não nascemos para ficarmos juntos como o Sr. e Sra. Carolynne. — ela deu um sorriso triste. — Só queria informar o Sr., tudo bem?
— Claro, minha filha, eu entendo. Fique bem. — ele, então, estendeu os braços para e lhe deu um abraço caloroso, como se soubesse pelo que a garota estava passando no momento.
Ela se despediu do síndico do prédio que costumava morar, e seguiu até o carro de Bob, na garagem.
— Está pronta para ir?
Em resposta, apenas abriu a janela do carro e jogou as chaves do apartamento fora. Aquilo não impediria que Jake adentrasse no apartamento, mas iria lhe causar uma pequena dor de cabeça por algum tempo, especialmente porque o Sr. Fausto não iria ficar nada satisfeito com o fato de Jake ter perdido as duas chaves principais de um dos apartamentos mais caros do prédio.
— Estou pronta. Vamos.
Atualmente
estacionou o carro na rua e foi até a cafeteria. Estava muito tarde para tomar o café da manhã, mas cedo para procurar um lugar para almoçar.
Por conta do seu comeback, estava trabalhando incansavelmente, dia e noite, para dar entrevistas, tirar fotos e, principalmente, ensaiar para o show do final de semana, quando ela teria a chance de subir no palco pela primeira vez em dois anos.
Pediu um chocolate quente para viagem e, enquanto esperava seu pedido ficar pronto, decidiu que não iria voltar para casa sem passar em um supermercado e comprar ingredientes para preparar uma boa refeição para si mesma.
— . — a atendente chamou.
A cantora se aproximou do balcão e estendeu a mão para pegar seu pedido, agradecendo à atendente. E foi nesse momento que ela foi reconhecida.
— Ei, você é ? — uma das funcionárias perguntou receosa, afinal, quais eram as chances de uma cantora pop aparecer na cafeteria do bairro?
— Eu mesma. — ela respondeu com um sorriso.
No mesmo instante, mais três funcionárias foram até ela, e pelo menos quatro pessoas que estavam na fila do caixa, esperando para fazerem seu pedido, se aproximaram da cantora.
— Podemos tirar uma foto com você? — uma das funcionárias perguntou.
— É claro que sim.
Ao longo dos últimos anos, tentou se fazer presente, ao menos, nas redes sociais. Com o tempo, deixou de ser convidada a participar dos eventos sociais voltados à premiação de artistas, o que acabou a deixando em menor evidência. Mas, apesar de dos ocorridos, conseguiu manter sua base de fãs que, aparentemente, nunca deixaram de acreditar na sua volta, e lá estavam alguns desses fãs.
— A sua nova música é incrível. — uma delas comentou.
— Fiquei surpresa com o vídeo clipe. — outra falou.
— Que bom que você está de volta. — uma terceira pessoa disse.
E aquilo foi o suficiente para fazer com que o dia de ficasse melhor. As nuvens, trazidas pelas palavras maldosas dos apresentadores de televisão e pelos radialistas, logo se dissiparam e sentia como se o sol brilhasse mais forte a cada passo que dava em direção ao seu carro, pronta para passar no supermercado próximo à sua casa.
Perto de onde havia estacionado, contudo, havia uma banca de revista que tinha passado despercebida mais cedo. Contrariando seus instintos, se aproximou da banca, e passou a ler os títulos de algumas das revistas de fofocas mais vendidas.
As três primeiras revistas falavam do corpo de , e as outras duas falavam sobre suas músicas.
“Acima do peso e em cima do palco: como será a volta de na indústria do entretenimento?”
“Gordura excessiva e saúde: saiba o que aconteceu com a Estrela da América, e como evitar o sobrepeso”
“Por que não consegue voltar a ter o corpo de quando era mais jovem? - especialistas explicam”
“A volta de traz músicas melancólicas, políticas e revoltadas. Nada de novo sob o sol”.
“Cool, de , representa a tentativa patética, da Estrela da América, em cair nas graças do público teen?”
Nenhuma daquelas manchetes, contudo, se aproximavam da verdade. E como poderiam? Revistas de fofocas não se preocupam com o bem-estar do noticiado, mas apenas em apresentar um conteúdo exclusivo, ainda que mentiroso, para o seu público.
E decidindo que não deixaria que aquelas revistas trouxessem de volta a nuvem cinzenta sobre ela, foi para o seu carro, passando a dirigir rumo ao supermercado.
— Hey!
se deparou com ele, deitado no sofá de sua sala, antes mesmo de ter a chance de fechar a porta do apartamento.
— Hey… — respondeu com a voz arrastada e os olhos ainda fechados. — Se importa em apagar a luz de novo?
revirou os olhos. Não podia dizer que estava surpresa em encontrá-lo dormindo no seu sofá.
— Não me diga que você está se escondendo de novo das garotas que leva para a sua casa.
fez uma careta. Abriu os olhos, se espreguiçou, mas não fez menção de que iria se levantar.
— Eu não faço mais isso.
riu fraquinho, como se não acreditasse em uma só palavra do amigo.
— Então, o que você está fazendo aqui? — ela perguntou.
— O encanador está no meu apartamento arrumando os encanamentos que o seu cabelo entupiu.
pegou a primeira almofada que viu e jogou no rosto de .
— Eu só tomei banho lá por uma semana! — se defendeu. Duas semanas atrás o chuveiro do seu apartamento tinha queimado, e Bob não estava disponível para trocar o disjuntor, tampouco parecia interessado em ajudá-la nessa empreitada. E para não passar uma semana tomando banho de água fria, decidiu que aceitaria a oferta de seu vizinho de frente, e atual melhor amigo, e passaria a tomar banho no apartamento dele.
— E misteriosamente já não posso escovar os dentes sem que a pia fique com água parada. — ele disse irônico.
grunhiu, pois sabia que seria inútil discutir com .
— Fique dormindo aí então, tanto faz. — ela disse enquanto se dirigia à cozinha, pensando no que iria cozinhar para comer. — Você deveria mudar de apartamento e ir para um que os encanamentos não deem tanto problema. — ela comentou já da cozinha, lembrando-se de quando conheceu .
Dois anos atrás
, a Estrela da América, encontrava-se chorando, pateticamente, escorada na porta do seu mais novo apartamento. A pior parte? Ela estava chorando no corredor, do lado de fora do apartamento, simplesmente porque não sabia onde havia colocado as chaves.
Coisas pequenas sempre foram um grande problema para , ela facilmente as perdia.
Quando morava no outro apartamento, com o ex-noivo (aquilo fez com que o volume de suas lágrimas aumentasse), sempre podia contar com as chaves de Jake, além da chave extra que o cantor costumava deixar escondida embaixo do carpete de “boas vindas”, pois sabia que as chances de ficar trancada do lado de fora eram grandes. Além disso, sempre podia contar com o Sr. Fausto, o síndico do prédio, que também já estava muito acostumado com as batidas em sua porta, tarde da noite, e com uma completamente envergonhada pedindo pela chave extra dele.
Naquele prédio novo, contudo, ela não conhecia ninguém. Como iria pedir ajuda? não queria dormir no chão frio, e pensar nessa possibilidade apenas fez com que ela chorasse ainda mais.
Talvez fosse pelo volume com que soluçava, ou simplesmente pelo dramalhão que estava fazendo, mas não havia percebido um estranho a observando. E ao notar isso, foi impossível não dar um pulo, mesmo que estivesse sentada no chão, escorada na porta do seu apartamento sem chave.
— Ei, vizinha. — ele disse em tom descontraído, como se fosse comum encontrar garotas aos prantos pelos corredores do prédio. — Está tudo bem?
precisou piscar os olhos algumas vezes. Qualquer pessoa que a observasse de longe perceberia claramente que não, ela não estava nada bem. Qual era o problema daquele cara, afinal?
— Hm… Não sei onde coloquei as chaves do meu apartamento. — ela respondeu com a voz rouca por conta do choro.
O vizinho apenas balançou a cabeça, como se entendesse perfeitamente o motivo das lágrimas de . Desencostou o próprio corpo que estava escorado e descruzou as pernas, dizendo em um tom muito tranquilo:
— Eu tenho a cópia de todas as chaves do prédio. Vou pegar para você.
E sem esperar que ela lhe respondesse alguma coisa, deu as costas à garota, entrou no próprio apartamento (o qual, coincidentemente, ficava de frente para o de ), voltando em menos de um minuto.
se levantou rapidamente, passando as mãos pela calça, sendo que suas lágrimas já haviam secado.
— Como você tem isso? — ela perguntou olhando para o molho de chaves nas mãos do seu recém-descoberto vizinho gato.
Espera, de onde tinha saído aquilo? Quem disse que ele é gato?, perguntou-se, enquanto se repreendia por ficar reparando nos traços e corpo (e que corpo!) do cara que a estava ajudando. Não é como se alguém precisasse dizer o óbvio, , ela respondeu a si mesma, da pergunta que havia feito anteriormente.
Chacoalhou a cabeça para voltar a atenção no que ele falava.
— Estou dando uma força ao síndico essa semana. Ele precisou viajar para o casamento da filha, ou algo assim. — comentou despretensiosamente.
nem mesmo sabia que aquele prédio tinha um síndico.
A garota aproveitou o fato de que seu vizinho (que ela ainda não sabia o nome) estava muito ocupado procurando a chave do seu apartamento, para observar seus traços. Sua atenção logo foi para os olhos claros, os cabelos rebeldes e a barba rala, que estava por fazer. E então seus olhos desceram, e seu foco passou a ser os ombros largos do seu vizinho e os braços bem torneados que, infelizmente, estavam cobertos por uma camiseta de alguma banda que ela desconhecia, e com uma camisa xadrez, aberta. Seu vizinho gato também usava uma bermuda que o fazia parecer dez anos mais novo do que ele provavelmente era, e teve certeza de que se ele aprendesse a se vestir melhor, seria um pedaço de mal caminho. Não que ele já não fosse, mesmo usando aquele tipo de roupa brega.
— Hey, eu conheço você? — ele perguntou.
teve um sobressalto, envergonhada por ter sido pega secando-o daquele jeito.
— Digo… Você já apareceu na televisão? — ele perguntou curioso, com a testa franzida. — Acho que já te vi na televisão.
Seu vizinho, então, comemorou ter encontrado a chave certa, e prontamente destrancou a porta de , fazendo-a suspirar de alívio.
— Obrigada. — ela agradeceu suspirando.
Pensou em convidá-lo para entrar, oferecer-lhe um café ou algo do tipo (ela não era muito boa com vizinhos, nunca havia interagido muito com os seus quando morava no outro prédio, pois Jake achava desnecessário), mas não teve tempo de formular uma frase.
— Caramba, você definitivamente é famosa. — ele comentou com um assovio no final. — Ah, aliás, eu sou .
havia se convidado para entrar no apartamento de , e encontrava-se com a mão estendida para ela, ao mesmo tempo que analisava a estante de prêmios da cantora. Ela nem sabia como reagir àquilo.
— Você quer um caf…
— Qual o seu nome mesmo? — ele perguntou curioso. — Não lembro de você ter dito.
— É porque eu não disse… — ela comentou baixinho. O que estava acontecendo ali, afinal? — Meu nome é , muito prazer, .
continuou segurando a mão de por alguns segundos, mantendo os olhos estreitos em direção à ela, pensando onde já ouvira aquele nome. E num estalo, ele se lembrou.
— Ah! A cantora pop que se rebelou contra a Disney, não é? — ele perguntou em tom animado por tê-la reconhecido. nem mesmo percebeu a expressão desgostosa de . — Minha irmã mais nova adora as suas músicas.
E aquilo foi o suficiente para mudar a expressão chateada.
— É mesmo? Qual o nome dela? — perguntou interessa.
— Clara. — ele respondeu.
E quando o silêncio se instalou no ambiente, e pensou se iria oferecer uma bebida ao seu vizinho, ou simplesmente insinuar que ele devesse ir embora, continuou.
— Acho que li alguma coisa sobre o término de um relacionamento… Seu noivo te traiu, não foi?
não respondeu àquilo. Em vez disso, preferiu abaixar os olhos para evitar chorar de novo. Tudo ainda era muito recente, e seu coração ainda pesava ao se lembrar da discussão que tiveram na noite em que ela foi embora.
— Eu não conhecia o cara, mas minha irmã diz que ele era um babaca. — comentou.
— Sua irmã está certíssima. — ela disse baixinho.
Ficaram em silêncio de novo, dessa vez por mais tempo. E quando pensou que iria se despedir dela para deixá-la sofrer por sua vida patética, ele disse:
— Sabe, se eu estivesse no seu lugar, não deixaria isso barato. Quero dizer, o cara foi infiel, mas a única que saiu com a imagem manchada foi você, não é?
concordou com a cabeça, sem conseguir proferir qualquer palavra.
— Se eu fosse você, também destruiria a imagem de cara perfeito dele. As pessoas precisam saber quem ele é, sabe.
A cantora pensou por alguns segundos. Sim, as pessoas precisavam saber. Estava cansada de ser massacrada pela mídia por ter rompido o relacionamento duradouro com Jake Phillips quando, na verdade, ele tinha dado causa àquilo. As pessoas não se importavam com o fato dele tê-la traído. Enquanto diziam que Jake havia cometido um erro e merecia uma segunda chance, diziam que estava sendo uma mulher sem coração e que não sabia perdoar as pessoas.
O problema é que Jake não era o cara perfeito que todo mundo acreditava. E ela queria que houvesse uma forma de provar isso, mas…
— Como? — ela perguntou.
levou o indicador ao queixo, e passou a pensar por alguns segundos. E quando voltou a encarar a cantora à sua frente, ele tinha um sorriso de lado.
— Me espere aqui.
E esperou. Quando voltou, segundos depois, levava em suas mãos seu notebook.
— Tudo bem, o que vamos fazer pode não ser, exatamente, legal, mas garanto que você vai gostar.
chegou a questionar, assustada, o que ele quis dizer com aquilo, mas ao ver o vizinho digitar freneticamente no teclado, igual aos filmes de espionagem que Jake adorava assistir, preferiu deixá-lo trabalhar. Ela estava curiosa demais para impedi-lo de cometer um crime, ou qualquer coisa do tipo.
— O que você está fazendo?
— Hm… Digamos que eu venha de uma família de policiais, e que investigar esteja no meu sangue. — ele respondeu, muito concentrado na tela à sua frente. — Digamos também que eu seja bom em… Hm… Acessar sites e redes sociais sem a autorização do usuário.
pensou no que ouvira.
— Você é um hacker?
— Não, sou gerente de telemarketing. — ele respondeu prontamente.
A garota ficou confusa. Tinha quase certeza de que gerentes de telemarketing não sabiam invadir contas em redes sociais.
— Pronto. Estou logado no Twitter, Facebook e Instagram de Jake Phillips. O que você quer escrever?
Enquanto mantinha sua expressão extremamente pacífica, como se invadir perfis de celebridades fosse algo rotineiro, não podia esconder sua surpresa. De fato, o que estavam fazendo poderia ser considerado um crime… Mas apenas se fossem pegos.
— Que tal começarmos com… “A cada dia que passa, mais percebo o quão inseguro e patético sou”, o que acha? — perguntou.
gostou. Ela gostou muito. Tanto, que depois da primeira publicação no Twitter, passou a fazer algumas sugestões, tais como “Sinto-me envergonhado por ter enganado meu público por tantos anos… Mas vocês merecem saber que sempre escreveu todas as minhas músicas”, e como “Sim, eu fui infiel nos últimos anos, e sim, eu recebi várias chances antes… Mas vocês não acham que o ser humano merece uma quinta chance? Ou sexta? Dizem que sete é um número da sorte!”.
realmente quis se arrepender do que estava fazendo. Aquilo poderia arruinar, para sempre, a imagem do seu ex-noivo, mas não conseguia se sentir culpada. Afinal, sabia que Jake, por ser tão querido pela mídia e, principalmente, por ser homem, logo seria esquecido pelas (várias) publicações controversas em suas redes sociais.
No final, e passaram a noite rindo dos comentários dos fãs, enquanto bebiam a cerveja trazida pelo seu vizinho e novo amigo. E em meio a conversas totalmente aleatórias, perguntou:
— Ei, você se importaria se eu tomasse banho aqui? O meu encanamento está com problemas. — ele disse dando de ombros.
Um ano e seis meses atrás
“Você precisa me ajudar!”, era o que dizia a mensagem enviada por .
, ao ler aquilo, começou a rir. Deixou o celular em cima da cômoda do seu quarto enquanto escolhia uma roupa e secava os cabelos. Precisou esperar apenas 30 segundos para que lhe mandasse outra mensagem:
“Eu tô falando sério, ”.
, então, revirou os olhos. Desistiu de vestir uma calça que não lhe servia há alguns meses, e resolveu colocar um vestido. A escolha de vestuário, contudo, também não lhe moldou o corpo como antigamente, o que acabou fazendo com que a cantora colocasse uma camiseta qualquer e uma calça de moletom.
E enquanto seguia para a saída de seu apartamento, pensando que deveria separar todas as roupas que já não lhe serviam mais, a fim de doá-las para uma instituição de caridade, ouviu o celular tocar, informando ter recebido outra mensagem. Ela não precisou ler o conteúdo, entretanto. Sabia que só poderia ser novamente, desesperado para se livrar de alguma garota com quem dormira noite passada e que se recusava a ir embora pela manhã.
Não era a primeira vez que ajudava o vizinho, e agora amigo, a fazer algo do tipo.
— , você está pronto para ir à reunião? — ela disse em tom de voz alto, entrando na casa do vizinho sem bater na porta ou informar a sua chegada. — Oh, me desculpe, mas quem é você? — perguntou se dirigindo à mulher deitada no sofá de seu vizinho, fingindo uma falsa confusão.
A história combinada por eles era muito simples: fingia estar atrasada para uma reunião de negócios muito importante, enquanto fingia ser alguém cuja presença se fazia necessária.
— Sou… Uma amiga de … — a mulher respondeu relutante. — E quem é você?
não se surpreendeu, realmente, por não ter sido reconhecida. Ela já vinha passando pela mesma situação há alguns meses, desde que perdera as curvas bem definidas da cintura, ganhara um rosto mais redondo, e deixara de se preocupar em lavar os cabelos todos os dias. Na última sessão que tivera com sua psicóloga, elas haviam conversado sobre a importância de cuidar da aparência como forma de combater a depressão, mas era difícil cuidar do seu corpo quando não conseguia reconhecer a pessoa que a encarava de volta quando ficava de frente para o espelho.
— Também sou uma amiga. — ela respondeu apressadamente, apenas desejando poder voltar para o refúgio que era seu apartamento. — Escuta, sinto muito por precisar levar tão cedo em um sábado de manhã, tenho certeza de que ele preferiria passar o dia com você, mas nós temos uma reunião da empresa agora cedo, e eu realmente preciso que ele compareça.
A história já havia até perdido a graça, tamanho o número de vezes que já foi contada. era exatamente o tipo de homem que nenhuma mulher deveria se envolver romanticamente.
— Ah, sim, claro. Eu entendo. — a mulher, que não se importou em perguntar o nome, apressou-se em recolher suas coisas e caminhar em direção à saída. — Diga para ele que deixei meu número em um bilhete na geladeira, tudo bem?
— Pode deixar. — garantiu. E por mais que sentisse pena das mulheres que nunca recebiam uma ligação de , não conseguia deixar de pensar que todas aquelas mulheres sabiam exatamente onde estavam se metendo quando aceitaram dormir com seu vizinho mulherengo.
Ao ouvir a porta da frente fechar, apareceu com um sorriso de gratidão nos lábios e os braços abertos, prontos para abraçarem pelo excelente trabalho, como sempre.
— Você deveria ser atriz. — ele disse quando ela afastou seu abraço rotineiro.
— Eu fui atriz. — disse dando as costas a e seguindo para seu apartamento.
— Certo… Disney e tal, não é? — ele disse quando ambos já estavam na sala de .
A cantora foi para a cozinha preparar o seu café da manhã, sendo acompanhada de perto por .
— O leite acabou. — ele comentou com a cabeça dentro da geladeira. — Você precisa comprar mais. Um café da manhã sem cereal com leite não é um verdadeiro café da manhã.
não pôde evitar revirar os olhos.
— E quem será que tomou todo o leite que tinha na geladeira?
— Ei, não precisa jogar na cara. — ele se defendeu. Foi até onde a cantora estava separando algumas fatias de pão para colocar na torradeira, e encostou-se na pia, cruzando os braços, enquanto prestava atenção nela. — Sabe, você deveria me dar uma chave do seu apartamento.
— E por que eu faria isso? — ela perguntou rindo da proposta inesperada.
— Porque aí eu não precisaria te acordar cedo aos finais de semana para ir me resgatar. — falou em tom divertido.
— Bem, eu acho que você precisa crescer e assumir as suas responsabilidades, e isso implica em ser maduro o suficiente para falar para uma mulher que você não quer compromisso sério, em vez de deixá-las esperando por uma ligação que nunca vai acontecer.
ficou em silêncio por alguns minutos, reflexivo sobre o que acabara de ouvir. Não é como se já não tivesse tido aquele tipo de conversa outras vezes.
— Certo… Mas isso significa que vou ter uma chave do seu apartamento?
— Isso significa que, definitivamente, você não vai ter uma chave do meu apartamento, !
Um ano atrás
— Não, Bob, eu ainda não estou pronta para voltar. — disse no celular. — Nós já conversamos sobre isso.
destrancou seu apartamento e jogou as chaves em cima de qualquer lugar. Mal havia fechado a porta quando se deparou com um deitado no sofá de sua sala abraçando uma de suas almofadas coloridas decorativas.
— , já faz mais de um ano… — Bob dizia do outro lado da ligação.
A cantora tentou responder seu empresário, ao mesmo tempo que gesticulava para questionando o que o rapaz fazia ali.
Em resposta, seu vizinho folgado apontou para as sacolas em cima da mesa, indicando que havia comprado itens suficientes para abastecer a dispensa de , como forma de pagamento pelas muitas refeições que vinha tendo na casa da amiga.
A cantora rolou os olhos, vendo se acomodar melhor no seu sofá, enquanto procurava algum canal interessante para assistir na televisão.
Ela nunca deveria ter dado uma chave do seu apartamento para ele.
— Eu sei, Bob, mas eu não tenho condições de voltar agora… Condições físicas, Bob, eu não tenho condições físicas, muito menos psicológicas. — ela explicava ao telefone.
A garota colocou a bolsa ao lado das sacolas e tratou de tirar a blusa de frio que usava. Graças a , seu apartamento estava quentinho por conta do aquecedor elétrico.
— Não, eu não quero um personal trainer. — ela disse cansada de ter que repetir aquela conversa toda semana. — Tudo bem, vou pensar no assunto. Obrigada.
apoiou as mãos em cima da mesa e suspirou. Apertou os olhos e respirou fundo, decidida a não deixar as lágrimas caírem. Ela não queria chorar por aquilo de novo. Havia feito um grande progresso nas suas últimas sessões com a psicóloga, e não queria colocar tudo a perder naquele momento. Isso não vai me afetar, isso não vai me afetar…, ela repetia para si mesma.
Jogou os cabelos para trás e começou a mexer nas compras feitas por .
— Hey, obrigada por isso. — ela disse se dirigindo a ele.
— Claro, sem problemas… — ele respondeu. — Hey, isso significa que você vai cozinhar para mim hoje à noite? — ele perguntou com um sorriso de lado.
estreitou os olhos para o amigo.
— Só se você lavar a louça e guardar tudo nos armários.
— Feito!
Rindo, a cantora levou as sacolas para a cozinha. Em instantes, seu humor melhorou um bocado. O assunto sobre sua carreira mexia demais com o seu emocional, especialmente porque as manchetes de revistas, e chamadas dos programas de televisão, sempre vinham à sua mente quando Bob lhe perguntava sobre o momento do seu retorno aos palcos.
é vista saindo de uma loja de roupas voltada para pessoas plus size, uma das manchetes dizia. E logo em baixo, uma pergunta, Será que isso significa que a Estrela da América terá que contratar um novo estilista antes de voltar aos palcos?
Aquela matéria, junto com várias outras, a deixavam extremamente insegura sobre a possibilidade de voltar à ativa. Quer dizer, as pessoas esperavam ver , a Estrela da América, em cima dos palcos, e não… Essa pessoa que ela havia se transformado.
— Hey, você estava falando com Bob?
se surpreendeu ao ouvir a voz do amigo atrás de si. estava escorado no batente da porta de sua cozinha, com os braços cruzados e prestando atenção no que a garota fazia.
— Pois é… — ela respondeu. — Já virou rotina ele me ligar aos finais de semana.
— E aí, vai aceitar a proposta dele?
A garota fez uma careta. Não queria responder àquela pergunta, porque a resposta seria “não”, mesmo que no seu íntimo quisesse dizer “sim”.
— Não sei.
— Pensei que cantar fosse o que você mais ama fazer.
— E é! — ela respondeu automaticamente. E então pensando melhor no que dissera, emendou — Ou era…
não disse nada, pois sabia que ainda não havia acabado de responder à sua pergunta. Ela estava apenas procurando as palavras certas.
— O problema é que eu já não me pareço com uma artista pop.
Foi a vez de fazer uma careta.
— O que quer dizer com isso?
suspirou mais uma vez. Sabia que não era a intenção de , mas o rapaz a estava deixando nervosa.
— Quero dizer que estou gorda, . Muito gorda. Pelo menos para os padrões que a indústria do entretenimento exige. — ela disse rápido com os dentes cerrados. — Com esse corpo, eu já não sei se consigo ficar uma hora e meia em cima do palco cantando e dançando ao mesmo tempo. Além disso, estou parada há tanto tempo, que já nem sei se conseguiria compor qualquer coisa. E mesmo se conseguisse, não acredito que tenha fãs suficientes para comprar qualquer coisa minha.
Aquilo havia sido um desabafo. Um longo e necessário desabafo, que, até então, ela só havia feito com a sua psicóloga. E dizer todas aquelas palavras ali, fora do consultório, fazia todas elas parecerem ainda mais reais.
— Espera aí, espera aí. — se aproximou da cantora. — Está me dizendo que o que te impede de voltar para o palco é o seu corpo?
Após o término do seu relacionamento, entrou em uma tristeza profunda. Mas ela já havia passado por outras decepções antes e conseguira se reerguer de todas elas. O diferencial, dessa vez, foi a forma com que a mídia tratou o assunto, e as palavras que os jornalistas escolheram usar para descrever a pequena pausa feita pela cantora. Sim, ela havia feito uma pausa. Mas as duas semanas que ela escolhera tirar para ela, lhe renderam alguns quilinhos a mais, e isso não passou despercebido aos olhos dos paparazzi. E os paparazzis nunca foram simpáticos com ela.
O que começou como uma tristeza proveniente do fim de um relacionamento de três anos, acabou se tornando uma depressão profunda da qual, a muito custo, ela lutava para sair. Se não fosse por sua psicóloga, o apoio de Bob e a amizade de … nem mesmo gostava de pensar no assunto.
— , você sabe que eu estou certa. — disse ressentida.
— Tudo bem, você não tem o corpo da Camila Cabello, e nem a altura da Taylor Swift, mas isso não te faz pior do que elas. Na verdade, acho que as suas músicas são as únicas que realmente valem a pena serem ouvidas, quando o assunto é música pop.
entendeu aquilo como um elogio. Nunca se esqueceria da primeira noite que saiu com , no dia seguinte em que se conheceram e haviam hackeado as redes sociais de Jake Phillips.
— Não sou muito fã de música, pop, sabe. — ele dissera. — Prefiro música eletrônica.
— Daquelas que ninguém canta nada? — perguntou.
— Essas mesmo. Ou então rock. Gosto de rock.
— Do tipo que ninguém entende nada por que os cantores só gritam?
— Exatamente!
— … — ela começou, mas acabou sendo interrompida pelo amigo.
— Não, , me escuta. — e então, quando estava na frente da garota, segurou em seus ombros. — Você é incrível. Realmente incrível. Você é criativa, é talentosa e tem um fã-clube enorme que está apenas esperando a sua volta. Não deixe que um detalhe pequeno, como 20 quilos a mais, a impeça de rebolar até o chão e voltar a ser a estrela que você sempre foi.
poderia dizer que estava emocionada. Poderia, também, dizer que estava surpresa. As conversas que tinha com não costumavam ser profundas, tampouco envolver sermões, ou frases de efeito. Quer dizer, não era esse tipo de cara… E ainda assim, aqui estava ele, dizendo exatamente o que eu precisava ouvir, ela pensou.
Como resposta ao que acabara de ouvir, jogou um pano de prato em .
Com os olhos arregalados, sem entender o que poderia ter dito para receber aquilo, ele ouviu se justificar:
— Estou 18 quilos acima do meu peso. Não 20.
E com um sorriso maroto, ele respondeu:
— Ei, estou apenas arredondando as contas.
Atualmente
decidiu preparar ovos mexidos e algumas torradas para comer naquele dia. Sabia que se encontraria mais tarde com Bob para resolverem algumas pendências do seu show de estreia no próximo sábado, e poderia sugerir que o encontro se desse em algum restaurante próximo à casa de shows. Faria, então, uma refeição leve por ora.
— E aí, você assistiu televisão hoje? — perguntou ao adentrar na cozinha.
— Sim. — ela respondeu. — E ouvi rádio, e li algumas manchetes de revistas…
suspirou, não questionando o que a amiga havia encontrado. Ele sabia, afinal, ele mesmo havia lido algumas coisas sobre ela em sites de fofocas.
— Fodam-se todos eles. — ele disse. — São as mesmas pessoas que vão implorar por uma entrevista sua quando você estiver no topo novamente.
sentiu um calorzinho tomar conta do seu peito. tinha um jeito muito peculiar, próprio dele, de mostrar apoio a ela - coisa que ele fez desde que se conheceram, mas que acabou se intensificando no último ano, quando decidiu que, finalmente, estava pronta para colocar a cara no sol e voltar aos palcos. Afinal, depois de tanto tempo, ela conseguia se sentir bem consigo mesma.
— Obrigada, . Se não fosse por você do meu lado nesses últimos anos…
— Você apenas teria demorado um pouco mais para voltar para onde nunca deveria ter saído. — ele disse dando de ombros.
fez menção de se aproximar, mas acabou parando a poucos passos de , sem saber como agir na frente da garota. Eles, então, sorriram meio envergonhados por alguma razão e , a fim de amenizar o constrangimento que veio de lugar nenhum, roubou uma torrada que acabara de ficar pronta.
— Está gostosa. — ele disse de boca cheia.
, por sua vez, apenas lhe deu um sorriso sem dentes, voltando a atenção para os ovos mexidos.
Seis meses atrás
estava suada, cansada, com os cabelos fora do lugar e com a uma grande marca de suor embaixo dos braços. Era fato, precisava, urgentemente, de um banho. E mesmo torcendo o nariz pelo cheiro forte de suor que emanava de sua pele, há muito tempo não se sentia tão bem consigo mesma. Sim, o suor excessivo era um incômodo, mas também era bom, pois era resultado de um dia inteiro de ensaios ávidos, os quais renderiam novas coreografias. Coreografias estas, que estava ansiosa para colocar em prática.
O seu primeiro vídeo clipe já tinha data de estreia, e Bob estava negociando as produções do segundo e do terceiro. Seu novo álbum seria lançado em pouco menos de dois meses, e Bob estava ficando louco com a quantidade de cidades que já manifestaram interesse em sediar um show que representava o retorno da Estrela da América.
Assim que parou o carro na vaga reservada a ela, recebeu uma ligação de . Estranhou o horário, afinal, costumava manter suas noites de sexta-feira movimentadas o bastante para não ter tempo para ligações.
— Hey. — ela atendeu.
— Ei, onde está o seu cortador de pizza?
franziu a testa, confusa pela pergunta.
— Como é?
— Não podemos comer a pizza que fiz se eu não encontrar o seu cortador de pizza.
estava de férias há menos de uma semana, e havia decidido que iria testar seus dotes culinários em busca de uma nova profissão, já que estava insatisfeito com seu posto de gerente de telemarketing.
— Desista, , você não vai se tornar um chef de cozinha em duas semanas. — ela respondeu rindo, enquanto caminhava em direção ao elevador.
— Ei, você gostou da omelete que eu fiz ontem!
— Mas isso é porque qualquer pessoa sabe cozinhar uma omelete…
Após o jantar preparado por , afastou os pratos da mesa e colocou o notebook em cima dela.
— Saiba que você está tendo acesso a um conteúdo mais do que exclusivo. — ela disse apreensiva. — Na verdade, eu não deveria nem mesmo estar te mostrando isso, mas como sei que você nunca vai ter coragem de contar para os seus amigos que andou vendo vídeos de uma cantora pop, você vai ter a honra de ser a segunda pessoa a assistir a edição final do meu primeiro vídeo clipe, depois de dois anos sem pisar em um estúdio.
— Ei, por que segunda pessoa? Quem foi a primeira?
— Eu, é claro. — ela respondeu como se fosse óbvio. E então voltou a atenção para a tela na sua frente. — Está preparado?
Em resposta à sua pergunta, aproximou mais a sua cadeira da de . Nesse momento, a cantora deu play no vídeo.
Nos três minutos e 47 segundos que seguiram, não tirou os olhos da tela, enquanto não tirou os olhos dele. Estava ansiosa, estava insegura e, se fosse sincera consigo mesma, estava com medo. era a pessoa mais sincera que ela já conhecera. não era do tipo que mentia ou inventava desculpas - a não ser, talvez, quando o assunto fosse fugir de mulheres. sabia que seria mais do que sincero com ela com relação à sua performance.
E quando o vídeo chegou ao fim, cruzou um dos braços, apoiando a mão embaixo do queixo, fingindo-se pensativo. O rapaz já tinha uma opinião formada sobre o que acabara de assistir, mas queria poder fazer suspense na expectativa de .
— E então? Acha que as pessoas vão gostar?
E com um suspiro, ele respondeu:
— É claro, não tem por que não gostarem. Quer dizer, para uma música pop, e considerando que você é uma cantora que está afastada da mídia a bom tempo, até que a música e o vídeo são legaizinhos… Ai, é uma brincadeira! — ele reclamou depois de levar uma cotovelada da amiga. — Está incrível, , exatamente como eu disse que ficaria.
— Obrigada. — ela disse sentindo as bochechas corarem.
— Espera, o que é isso?
estava fechando a tela do notebook quando foi impedida por . O rapaz apontava para uma pasta de fotos, intitulada “Ensaio Cosmopolitan”, ao lado do vídeo que ele acabara de assistir.
— Ah… São algumas das fotos que tirei semana passada, nada demais.
Novamente ela tentou fechar o notebook, mas tinha outros planos. Tomando a frente da amiga, ele abriu a pasta de fotos e, soltando um assovio de surpresa, abriu cada uma das 12 fotos que a cantora havia tirado há alguns dias. havia sido convidada para participar de um ensaio sensual, e pensou que seria uma boa forma de promover seu retorno ao mundo do entretenimento.
— Caramba, … — ele falou sem tentar esconder a surpresa. — Eu não sabia que você usava essas lingeries tão sensuais.
olhava cada uma das fotos atentamente, e quando chegou ao fim, apenas passou a ver cada uma novamente. , por mais envergonhada que estivesse, não impediu o amigo, afinal, ao longo do tempo, haviam desenvolvido intimidade suficiente para terem a liberdade de fazer comentários daquele tipo. Além do mais, aquela não era a primeira vez que seu vizinho, e melhor amigo, a elogiava. A diferença das outras vezes, talvez, seja o fato de que não tinha um bocado de fotos dela seminua.
— Por que eu não soube antes da existência dessas fotos? — ele perguntou interessado.
— Porque eu sabia que você iria reagir exatamente da forma com que está reagindo agora. — ela respondeu revirando os olhos.
— Quando essas fotos sairão na revista?
pensou por alguns segundos.
— Acredito que a próxima edição chegue nas bancas na semana que vem.
— Cara, vou ter que passar na banca de jornal perto do trabalho… Você costuma usar todas essas rendas mesmo?
estreitou os olhos e deu um sorriso irônico. Homens… Sempre tão previsíveis nas suas curiosidades femininas.
— Para falar a verdade, sim. Quer dizer, eu não usava, mas agora uso.
Aquilo era bem verdade. Por muito tempo não conseguiu usar roupas consideradas sexy, simplesmente por não gostar de como as peças se encaixavam no seu novo corpo. Mais de um ano depois, contudo, a garota não só aceitava suas novas curvas, como também as apreciava de uma forma diferente de quando tinha o corpo perfeitamente dentro dos padrões de beleza da indústria do entretenimento.
— Para falar a verdade, eu ando gostando muito do rumo que a minha carreira e vida pessoal vem tomando… Gosto das minhas novas músicas, e do novo conceito dos vídeo clipes. Gosto também das novas coreografias, e do estilo que passei a adotar, e isso inclui as roupas que uso.
— Ou as roupas que você não usa. — ele disse em tom divertido.
— Sim, isso também. — ela riu.
tinha o corpo curvado para frente, a cabeça virada para , próximo demais para que as respirações deles não se misturassem. E foi naquele momento que o clima mudou. Uma densidade, vinda de lugar nenhum, recaiu sobre eles, e sentiu como se seu estômago estivesse despencando. O que está acontecendo?, ela se perguntou. Ali no seu lado não estava mais o seu vizinho folgado, tampouco seu melhor amigo desbocado, mas um homem extremamente charmoso que a olhava intensamente.
Se os olhos de pudessem falar, tinha certeza de que a conversa seria completamente inapropriada para menores de idade. Mais do que isso, emanava algum tipo de magnetismo impossível de resistir. E foi por esse motivo, por esse magnetismo inexplicável, e pelas palavras não ditas por seus olhos, que se aproximou.
Tudo aconteceu rápido demais. Tão rápido, que nenhum dos dois teve a chance de pensar no que estavam fazendo. Não tiveram tempo de se surpreender pelo choque dos lábios, nem de se censurar pelo beijo molhado, o qual começou intenso, mas logo passou a ser algo frenético, a ponto de ambos se levantarem, ao mesmo tempo, e seguirem, aos tropeços, para o quarto da cantora.
Com os olhos presos no teto do quarto, finalmente pôde pensar no que acontecera na cozinha. E depois no corredor para o seu quarto. E, então, no seu próprio quarto, na sua cama. Mas por mais que ela se esforçasse para tentar encontrar uma lógica naquilo, seu cérebro continuava lhe dizendo que dormir com seu vizinho, e melhor amigo, era algo impossível de explicação, afinal, nunca havia dado sinais de que se sentia atraído por ela. Ou havia? já não sabia. E por estar confusa, ela se perguntou:
— O que acabou de acontecer?
Estava tão imersa em seus pensamentos, que não se deu conta do quão ofegante sua voz saíra. Tampouco percebeu a respiração descompassada ao lado da sua.
— Eu só queria ver se a sua lingerie era tão sexy, pessoalmente, quanto nas fotos.
A primeira reação da mulher foi esconder o rosto entre as mãos.
Caramba, era quem estava do seu lado. Seu vizinho safado, seu melhor amigo folgado… Fala sério! Como poderiam continuar sendo amigos dali para frente?
Mas então, ao rir da piadinha que fizera, ela percebeu que quem estava ali, do seu lado, era ele, , o cara que não tem relacionamentos, e que vê no sexo apenas como algo estritamente casual, com difíceis chances de repetição.
Então, teve certeza de que eles ficariam bem, e que eles nunca mais precisariam falar sobre o que acabara de acontecer. E só para deixar claro, ela disse:
— , nós somos amigos, o que significa que isso nunca, nunca, poderá se repetir.
O silêncio que se seguiu foi quase ensurdecedor. poderia pensar que teria caído no sono, se ele não estivesse com os olhos abertos.
— Tecnicamente ainda estamos na cama, e as nossas roupas estão no chão. Então…
E por mais que não concordasse com a lógica de , a mulher não se afastou quando ele se aproximou novamente dela.
As coisas realmente voltaram ao normal depois daquele final de semana. e continuaram a se tratar como os velhos amigos que eram, uma vez que ele não perdeu o costume de aparecer de surpresa no apartamento dela, e a cantora, mesmo com sua agenda extremamente cheia de compromissos, não parou de dividir o seu café da manhã com o seu vizinho.
A única coisa que não seguiu como o planejado, contudo, foi a promessa de que nunca mais dormiriam juntos. Quer dizer, em um momento estavam tomando vinho e falando das cidades que visitaria ainda aquele ano para fazer seus shows, e no instante seguinte ela estava sentada em cima dele, com o vestido perdido em algum lugar, com um muito ansioso em desabotoar o seu sutiã.
— Tudo bem, isso não pode…
— Acontecer de novo. — ele terminou a frase dela. — Eu sei.
e também prometeram nunca mais dormir juntos na terceira vez que acordaram um ao lado do outro, e na quarta vez… Até que chegaram ao ponto de não fazerem promessas que eles sabiam que não iriam cumprir.
chegou a mandar uma mensagem, tarde da noite, para , e ele chegou a passar um final de semana inteiro com , alegando que o encanamento do seu apartamento estava com problemas, e que precisaria tomar banho no dela.
— Acho que deveríamos tomar banho juntos. — ele sugeriu certo momento.
olhou para ele com o canto dos olhos, uma vez que estava muito concentrada lendo alguns e-mails importantes enviados por Bob.
— Ei, você é quem fez uma propaganda falando que devemos economizar água. Estou apenas pensando no bem do meio ambiente!
E por mais que soubesse que poderia estar pensando em qualquer coisa, menos no bem-estar do meio ambiente, ela não recusou a sua oferta.
A amizade entre eles continuou a mesma de antes, com exceção, talvez, de que eles haviam acrescentado alguns benefícios à relação que tinham. Não oficializaram nada, contudo. não era esse tipo de cara.
E prova disso foi uma conversa de tiveram alguns meses depois, quando apareceu na cozinha da amiga brigando com o celular.
— O que foi? — ela perguntou, mesmo que já soubesse a resposta. deu de ombros.
— Acho que vou mudar o número do meu celular. — ele comentou.
balançou a cabeça, sabendo que estaria certa quanto às suas suspeitas.
— Isso não vai dificultar a vida das várias mulheres que estão te ligando? — ela perguntou em tom provocativo.
soltou uma risada baixa, mas não disse nada. Por alguns minutos, os únicos sons que podiam ser ouvidos eram os dos ovos sendo fritos e o bater da colher nas xícaras. Até que , receoso, perguntou:
— Você, hum… Não se importaria se eu saísse com outras mulheres?
parou a xícara no ar, a caminho da boca.
Se ela se importava com o fato de seu vizinho folgado e melhor amigo mulherengo continuar saindo com outras mulheres, enquanto eles dois tinham algo indefinido, sem rótulos e sem cobranças? É claro que sim. É claro que ela se importava, mas não iria dizer aquilo a . Em vez disso, preferiu responder:
— Claro que não, por que eu me importaria? — ela perguntou, sentindo a voz falhar no final da frase. — Somos amigos, não somos?
a encarou por alguns segundos antes de responder.
— Sim, somos amigos.
Atualmente
— Esqueci de perguntar mais cedo. — ela disse enquanto levava os ovos mexidos para a mesa já posta por . — Você tem planos para o final de semana? Para sábado à noite, quero dizer.
parou de se servir, com a testa franzida, confuso com a pergunta de .
— O seu comeback não é sábado à noite?
— É sim, e é por isso que estou perguntando se você tem algum compromisso nesse dia ou se pretende ir ao show.
tinha o lábio inferior preso entre os dentes, apreensiva. Ela sabia que não era o tipo de cara que ia a shows de música pop, afinal, ele nem mesmo gostava desse estilo de música. E mesmo que desejasse que estivesse lá para lhe dar apoio, ela não insistiria caso o amigo falasse que não poderia comparecer.
— Na verdade, eu tenho um compromisso sim. Um muito importante, aliás. — ele respondeu voltando a se servir.
deixou os ombros caírem.
— Mas não sei se vou conseguir comparecer a ele se você continuar enrolando e não entregar a minha credencial de acesso ao seu super show. Quer dizer, falta menos de uma semana, não é? Eu já não deveria ter recebido, sei lá, um passe livre, ou qualquer coisa do tipo?
voltou a olhar , que tinha um sorriso maroto nos lábios.
— Isso se eu estiver vivo até lá, né… Com esses seus cafés da manhã com cada vez menos opção de comida, não sei dou conta de aguentar até sábado à noite.
segurou a risada e jogou uma fatia de torrada em , que prontamente a pegou e passou a comer junto com os ovos mexidos.
— Se está insatisfeito, então comece a comer no seu próprio apartamento.
O amigo deu de ombros antes de responder:
— E perder a chance de poder falar para as pessoas que a Estrela da América cozinha todos os dias para mim? Não, obrigado.
E entre risos e mais piadinhas, passou a tomar o seu próprio café da manhã completamente esquecida das matérias que leu mais cedo, e dos comentários jornalísticos que ouvira antes de sair de casa.
A semana passou incrivelmente rápido. acordava muito cedo, passava o dia fora de casa, e voltava tarde da noite, algumas vezes encontrando um dormindo no seu sofá e uma caixa de pizza em cima da mesinha de centro da sua sala.
— Ei, não quer ir para o seu apartamento? — ela perguntou na primeira vez que o encontrou lá.
— Prefiro dormir aqui, se você não se importar. — ele respondeu mantendo os olhos fechados.
Bem, ela não se importou.
e tinham desenvolvido um sentimento recíproco de parceria e confiança, e ela gostava da ideia de ter próximo a ela. Isso porque a mulher se encontrava terrivelmente ansiosa e nervosa, além de ter desenvolvido insônia quando faltavam apenas três dias para o seu grande retorno aos palcos.
Contudo, se pegou pensando que mesmo estando com um turbilhão de emoções dominando sua mente, ela nunca havia se sentido tão bem. Nunca. podia estar apreensiva com os próximos dias e com a recepção que teria, mas também tinha a certeza de que se sentia segura o bastante para continuar seguindo em frente, independentemente do que a imprensa falaria dela. Quer dizer, sabia o que ela estava fazendo. Sabia que cada música composta havia sido feita por ela e para ela. Cada coreografia nova carregava dias de dedicação e superação de .
sentia que, pela primeira vez, desde que começara sua carreira de artista, estava fazendo algo por ela, sem se preocupar com a aprovação das pessoas. Mais do que isso, sua mudança, sua volta, seu recomeço… Tudo isso estava dando certo. Tudo na vida de voltou a dar certo, cada pequena coisinha, cada decisão, por mais insignificante que parecesse… Tudo estava dando certo, e isso se devia à mudança de perspectiva que tinha dela própria e de sua vida.
E foi com essa mistura de ansiedade e confiança nas suas escolhas, que ela subiu no palco naquele sábado à noite.
sentia as pernas moles como gelatina. Os pelos dos braços mais arrepiados do que em um dia de inverno. A roupa colada não escondia metade das suas novas curvas, e ela tinha certeza de que as celulites nas suas pernas dariam boas imagens para as revistas de fofoca nos próximos dias. Seu cabelo estava solto e voava por suas costas e rosto por causa do vento direcionado a ela. Aquilo também renderia algumas belas imagens, ela tinha certeza.
Com um microfone em uma das mãos, e uma garrafinha de água em outra, após performar a primeira música da noite, ela foi até a ponta do palco e falou com o seu público, o qual gritava pelo seu nome, expressando toda a saudade que sentiram por ficar tanto tempo sem ter sua ídola em cima dos palcos.
— Eu voltei, América! — ela disse, ouvindo vários gritos em resposta. — Eu voltei para ficar, e sabem por quê? Porque aqui, em cima dos palcos, cantando para vocês, é o meu lugar. E não vou deixar ninguém, nunca, dizer o contrário.
Mais gritos foram ouvidos, algumas pessoas no público choravam, outras carregavam cartazes com mensagens de apoio à cantora.
— Por muito tempo eu acreditei que nunca mais poderia fazer o que amava, simplesmente por não me encaixar em um padrão criado pela mídia. Minhas músicas, minhas danças, minhas lutas, meu corpo… Tudo parecia errado. Eu parecia errada, de alguma forma. Mas hoje eu vejo que eu não estou errada. Ser quem você é, fazer o que você ama, lutar pelo que você acredita, isso não é errado! Errado é você se sentir mal por ser quem é. Errado é você sentir mal porque alguém disse que você não pode ser quem é. E sabem de uma coisa? Eu quero que todas essas pessoas erradas se fodam!
Os gritos do público foram tão altos, que quase conseguiram abafar a melodia da próxima música da Estrela da América.
— A próxima música se chama Cool, e representa o meu estado de espírito atual. Também representa o meu desejo a todos vocês: que vocês se amem, que se aceitem, que se sintam bem e confiantes em toda e qualquer pequena coisinha que fizerem. Vocês são incríveis! Nunca deixem que alguém os faça pensar o contrário!
continuou o seu show com toda a disposição que seu corpo lhe permitiu. Fez pequenas pausas, bebeu água, se alongou disfarçadamente e, mesmo ofegante, continuou dando tudo de si.
E ao final da noite, quando anunciou que cantaria a última música, teve certeza de que sua volta não havia sido um equívoco. Quer dizer, mesmo cansada, suada e exausta, a cantora descobriu que poderia continuar fazendo exatamente tudo o que sempre fez antes: os shows longos, as performances ousadas, as letras polêmicas… Simplesmente porque ela era uma mulher talentosa.
Depois de anos longe dos palcos e longe da mídia, ela finalmente pôde ter algum tempo para conhecer si mesma, para apreciar cada defeito seu, para aceitar cada falha sua, simplesmente porque isso não a deixava menos mulher, menos artista, ou menos cantora. Pelo contrário. A aceitação lhe trouxesse a certeza que ela sempre buscou: de que é um ser humano, e que como qualquer ser humano, possui defeitos e qualidades igualmente apreciáveis. conseguiu se livrar de um namorado péssimo, que em nada lhe acrescentava, e ainda conseguiu se livrar dos estereótipos que uma mídia suja criou para ela. nunca havia se sentindo tão bem consigo mesma como naquela noite.
A caminho do camarim, pegou seu celular das mãos de Bob.
— Alguma coisa interessante? — ela perguntou apreensiva.
— Veja por si mesma.
E ela viu.
“ , a Estrela da América, faz grande show de comeback e mostra que voltou para ficar!”
“Com roupas mais curtas que o recomendado para o seu novo padrão corporal, subiu aos palcos com a confiança de antigamente e se mostrou satisfeita com o alvoroço do público.”
“Fãs de afirmam terem aprovado o novo visual da cantora. Outros disseram, ainda, se sentirem representados ao ver uma artista pop, do calibre da Estrela da América, em cima dos palcos cantando músicas sobre bem-estar, autoestima e amor próprio.”
“A nova fase de : novo padrão visual, novas músicas, novas coreografias, novas lutas - o que esperar da queridinha Estrela da América?”
— Não preciso nem dizer que o telefone não parou de tocar desde que você subiu ao palco, não é? — Bob comentou, enquanto via a cantora ler cada uma das manchetes dos jornais e revistas online.
— Alguma ligação dos mesmos jornalistas que desdenharam a minha volta, semanas atrás? — ela perguntou.
— Várias. — Bob respondeu com os olhos cerrados, já imaginando onde aquela conversa chegaria.
, então, devolveu o celular ao amigo e empresário, arrumou o cabelo atrás da orelha e vestiu a blusa de frio que lhe foi oferecida por um dos staffs.
— Ótimo. Diga a eles que não tenho horário na agenda para perder com eles. E se eles reclamarem, diga para fazerem outra matéria falando da minha saúde mental, do meu corpo ou das minhas músicas novas. Vai ser um prazer rebater cada uma das suas matérias podres.
A passos firmes, deixou o empresário para trás, sabendo que ele jamais falaria isso aos jornalistas, mas que recusaria seus pedidos de entrevistas com classe e educação.
estava tão eufórica com os gritos que ainda podiam ser ouvidos, que mal percebeu que não estava sozinha ao entrar em seu camarim.
— Para um show de música pop, até que não foi tão ruim…
A cantora levou um susto ao ouvir a voz de , mas isso não tirou o sorriso que ela tinha nos lábios. Pelo contrário, ao ver escorado na sua mesa de maquiagem, os braços cruzados na frente do peito, a mulher não conteve o gritinho de excitação.
— Caramba, você viu como estava cheio?! — ela perguntou indo até ele aos pulos. — E as pessoas sabiam cantar todas as músicas! Puta merda, !
riu da forma como falava. Se fosse sincero consigo mesmo, poderia afirmar que nunca vira a mulher tão radiante como agora.
— Estou surpresa que você tenha ficado até o final do show… Pensei que não gostasse de música pop. — ela provocou.
deu de ombros.
— Fazer o quê, né… É o que a minha namorada faz.
estava prestes a se jogar no sofá, mas parou no caminho. O que ela tinha acabado de ouvir?
— Como é que é? — ela perguntou surpresa.
— Pensei que estava na hora de você parar de me enrolar e assumir o nosso namoro. — disse dando de ombros novamente, como se o que disse não passasse de uma conversa usual entre os dois.
substituiu a expressão de surpresa por um sorriso de lado, quase irônico.
— Então quer dizer que estamos namorando? — ela perguntou lentamente, prestando atenção no significado daquela frase.
Foi a vez de fingir fazer uma careta de surpresa antes de falar:
— Vai me dizer que os nossos momentos quentes foram só diversão para você?
E então os dois riram, de nervoso e de surpresa.
Deus, o que estava acontecendo ali?
— Falando sério agora, , eu apenas achei que poderíamos oficializar o que temos… Mesmo que o meu gosto musical seja muito melhor do que o seu.
— Você não pode estar falando sério, ! — disse, surpreendendo seu vizinho mulherengo e melhor amigo folgado. — O seu gosto musical é tão ruim quanto as roupas que você usa!
— Ei! Qual o problema com as minhas roupas? Pensei que você gostasse das minhas camisas xadrez. — ele se defendeu, aproximando-se de sua vizinha barulhenta e melhor amiga.
— E eu gosto mesmo delas… Quando estão jogadas no chão.
tinha um sorriso sapeca nos lábios, e tinha um sorriso totalmente inapropriado para menores de 18 anos.
Em instantes, estava de frente para sua vizinha, melhor amiga e, agora, namorada. Com os dedos das mãos entrelaçados, aproximaram seus rostos. O beijo, contudo, não teve chance de evoluir para algo mais profundo porque foram interrompidos com algumas batidas na porta.
— ? — Bob abriu a porta lentamente. — Estamos prontos para ir. Seus fãs estão te esperando no estacionamento.
olhou para , ainda com os dedos entrelaçados e os rostos próximos demais.
— Vai lá. — ele disse. — Seus fãs estão te esperando.
— Você vai me esperar? — ela perguntou antes de chegar à porta.
— É claro que sim. Eu sou o seu maior fã, esqueceu?
pensou em corrigir a fala de , mas não o fez. Sabia que o namorado acabara se tornando amante do trabalho de , além de ter se apaixonado pela mulher que ela se tornou.
Mas a verdade é que , por mais que amasse a mulher, jamais poderia ser seu maior fã. Isso porque aprendera a ser a fã número um de si mesma.
Fim.
Nota da autora: Oi, oi, menines! Mais um ficstape no ar, e esse é pra lá de especial porque foi todinho feito pela equipe do FFOBS! ❤️
Quando vi a letra da música, essa foi a primeira ideia que me veio em mente: uma mulher que está 100% feliz com a vida dela e com as suas conquistas. Mas daí eu pensei, se ela está feliz agora, é porque, em algum momento, ela não estava. E daí me veio essa ideia de fanfic, toda trabalhada na superação, apenas para mostrar que todas somos lindas, perfeitas, cheirosas e maravilhosas, não importando mais nada.
Espero que vocês tenham gostado de ler, como gostei de escrever! Deixem um comentário cheio de amor, e recomendem a fanfic para todas as suas amigas que também são lindas e perfeitas. ❤️
Beijos de luz.
Angel.
Outras Fanfics:
Longfic:
Ainda Lembro de Você ● It’s Always Been You
Shortfics:
21 Months ● Ainda Lembro de Nós ● Babá Temporária ● Beautifuly Delicious ● Because of the War ● Café com Chocolate ● Elemental ● O Conto da Sereia ● O Garoto do Metrô ● Rumor ● She Was Pretty ● Sorry Sorry ● Welcome to a New World ● When We Met
Ficstapes:
05. Paradise ● 06. Every Road ● 07. Face ● 10. What If I ● 12. Epilogue: Young Forever ● 15. Does Your Mother Know
MVs:
MV: Change ● MV: Run & Run ● MV: Hola Hola
Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Quando vi a letra da música, essa foi a primeira ideia que me veio em mente: uma mulher que está 100% feliz com a vida dela e com as suas conquistas. Mas daí eu pensei, se ela está feliz agora, é porque, em algum momento, ela não estava. E daí me veio essa ideia de fanfic, toda trabalhada na superação, apenas para mostrar que todas somos lindas, perfeitas, cheirosas e maravilhosas, não importando mais nada.
Espero que vocês tenham gostado de ler, como gostei de escrever! Deixem um comentário cheio de amor, e recomendem a fanfic para todas as suas amigas que também são lindas e perfeitas. ❤️
Beijos de luz.
Angel.
Outras Fanfics:
Longfic:
Ainda Lembro de Você ● It’s Always Been You
Shortfics:
21 Months ● Ainda Lembro de Nós ● Babá Temporária ● Beautifuly Delicious ● Because of the War ● Café com Chocolate ● Elemental ● O Conto da Sereia ● O Garoto do Metrô ● Rumor ● She Was Pretty ● Sorry Sorry ● Welcome to a New World ● When We Met
Ficstapes:
05. Paradise ● 06. Every Road ● 07. Face ● 10. What If I ● 12. Epilogue: Young Forever ● 15. Does Your Mother Know
MVs:
MV: Change ● MV: Run & Run ● MV: Hola Hola