Prólogo
Suspirei fundo enquanto olhava pela janela do veículo as ruas da cidade… Hoje eu tinha que depor contra e aquilo era tão incômodo, não me sentia preparada para relembrar tudo o que tínhamos vivido, tinha sido tão intenso e, ao mesmo tempo, tão dolorido. Eu não era mais a mesma devido aquilo.
Eu salvaria minha pele, mas ferraria ainda mais a dele, seria no mínimo uns 15 anos de pena, enquanto eu continuaria a perambular pelas ruas como se não houvesse amanhã, como a inocente que eu era, mas dentro de mim eu não me sentia tão inocente assim, era tudo muito bizarro e complexo. O fato é que as coisas foram perdendo total controle, minhas emoções não faziam nenhum sentido para mim, mas eu me entreguei a elas, e esse foi o meu erro.
Vi o carro estacionar em frente ao fórum de justiça, e despertei de meus devaneios. Esperei pacientemente que meu pai descesse do carro e abrisse a porta para a mim, e assim ele o fez, agarrei-me nele, enquanto ele me abraçava e tentava cobrir minha face, para me ajudar a escapar daqueles abutres que queriam alguma declaração ou uma foto. Eu não tinha o que falar…
Havia tantos fotógrafos e jornalistas ali que, mesmo com o rosto protegido pelo peito do meu pai, sentia-me cegar com os flashes, porém era mesmo de se esperar, afinal, o crime havia estampado manchetes do Brasil inteiro, e a impressa estaria ali em peso para cobrir minha chegada. Já podia ver as notícias que estariam em todos os meios de comunicação: A filha doente mental da prefeita de Guararema era mesmo inocente ou usava a influência da mãe para não ser culpada? Senti a bile vir a boca ao imaginar, entretanto era assim como eu era conhecida pela mídia brasileira. Aquilo doía, mas infelizmente tinha sua verdade. Entramos no fórum e eu suspirei fundo, havia chegado a hora...
Eu salvaria minha pele, mas ferraria ainda mais a dele, seria no mínimo uns 15 anos de pena, enquanto eu continuaria a perambular pelas ruas como se não houvesse amanhã, como a inocente que eu era, mas dentro de mim eu não me sentia tão inocente assim, era tudo muito bizarro e complexo. O fato é que as coisas foram perdendo total controle, minhas emoções não faziam nenhum sentido para mim, mas eu me entreguei a elas, e esse foi o meu erro.
Vi o carro estacionar em frente ao fórum de justiça, e despertei de meus devaneios. Esperei pacientemente que meu pai descesse do carro e abrisse a porta para a mim, e assim ele o fez, agarrei-me nele, enquanto ele me abraçava e tentava cobrir minha face, para me ajudar a escapar daqueles abutres que queriam alguma declaração ou uma foto. Eu não tinha o que falar…
Havia tantos fotógrafos e jornalistas ali que, mesmo com o rosto protegido pelo peito do meu pai, sentia-me cegar com os flashes, porém era mesmo de se esperar, afinal, o crime havia estampado manchetes do Brasil inteiro, e a impressa estaria ali em peso para cobrir minha chegada. Já podia ver as notícias que estariam em todos os meios de comunicação: A filha doente mental da prefeita de Guararema era mesmo inocente ou usava a influência da mãe para não ser culpada? Senti a bile vir a boca ao imaginar, entretanto era assim como eu era conhecida pela mídia brasileira. Aquilo doía, mas infelizmente tinha sua verdade. Entramos no fórum e eu suspirei fundo, havia chegado a hora...
Capítulo Único
Dois anos e meio antes...
Se tinha algo que eu mais detestava na vida era ir a bancos para resolver qualquer coisa, eram sempre muito cheios, e você demorava muito para ser atendida. Eu poderia usar meus privilégios de ser filha de quem eu era, mas era algo que também abominava, então preferia ser tratada como todos.
Atravessei a rua e entrei no local, e nenhuma novidade, estava cheio mesmo como eu imaginava que estaria. Minha mãe poderia ter aberto minha conta em um banco particular, mas seu cargo não permitira no final. Mas dessa vez a culpa também era minha, havia trocado de celular e precisava de autorização do banco para fazer minhas transações através do aplicativo.
Retirei uma senha e me sentei. Peguei meu celular e vi que tinha mensagem de Bruce, suspirei, eu o amava. Bruce e eu era algo tão mágico, quando ficávamos juntos era tudo tão perfeito e, mesmo com três anos de relacionamento, a chama entre nós não havia se apagado. Eu queria me casar, já estava pronta para isso, mas o sentia hesitante quando eu tocava no assunto...
Respondi sua mensagem rapidamente, dizendo que estava no banco e perguntando se nos veríamos hoje à noite. Escutei o barulho do painel de senhas e olhei automaticamente, mas era claro que minha senha ainda não havia sido chamada, faltava ao menos umas 10 pessoas na minha frente.
Escutei um barulho de tiros, levei minhas mãos aos ouvidos em reflexo, assustada, olhei para a entrada e vi cerca de quatro pessoas armadas. Ah, meu Deus, eu não posso acreditar que isso esteja acontecendo, aquilo era um assalto, e o pior era saber que os assaltantes estavam vestidos com macacões vermelhos e máscaras de palhaços. Eu tenho pavor a palhaços!
— Para o chão, agora começa a festa! – Pude escutar um dos bandidos falarem.
Sem que eu pudesse controlar, senti minha pulsação disparada. Tentei inspirar e expirar, mas não estava conseguindo, o ar não estava chegando aos meus pulmões, senti meu peito comprimir, passei a mão no meu rosto e percebi que suava frio. Merda, merda, merda, eu não tinha mais domínio do meu corpo, eu estava tendo um ataque de pânico.
Tentei tirar o colarinho da blusa de meu pescoço, entretanto não obtive sucesso. Eu precisava respirar, todavia eu não conseguia, o ar simplesmente não vinha. Eu escutava vozes exaltadas, mas eu não conseguia entender o que falavam. Umedeci meus lábios, tentando focalizar em algo, porém a minha visão foi ficando turva, fui perdendo os sentidos, a última coisa que senti foi meu corpo mole indo direto ao chão.
***
— Merda, merda, merda. — Escutei alguém falando, meu corpo ainda estava dormente. — Isso tudo é uma grande merda. — Pisquei meus olhos, conseguindo os focalizar em um par de pernas que andavam de um lado para o outro. A pessoa parou os movimentos, e suspirou. — Você acordou.
— O que aconteceu? — Senti a minha voz sair como um sopro. Umedeci meus lábios que estavam bem secos.
— Você desmaiou. Toma. — Me deu uma garrafinha com água, a peguei e bebi rapidamente.
— Obrigada. — Sussurrei. Olhei para sua vestimenta e percebi que ele era um dos assaltantes e ainda usava a maldita máscara de palhaço, desviei meu olhar rapidamente de sua face. Pude visualizar que em seus ombros ele carregava uma arma grande, e me senti estremecer olhando aquilo. Senti minhas mãos suarem novamente e minha respiração falhar.
— Ei, calma aí, calma aí. — Se aproximou de mim. — A gente não está interessado em matar ninguém, só queremos o dinheiro.
— A sua máscara está me aterrorizando… Tenho medo de palhaços. — Murmurei, me virando para o lado contrário ao dele. Reconheci que estava em um banheiro, me levantei, ainda com as pernas bambas e abri a torneira molhando meu rosto continuamente.
— Ah. — Sussurrou. — Eu… Preciso te levar com os outros reféns. Veste isso. — Jogou um macacão vermelho em minha direção. Suspirei, mordendo os lábios. Decidi que não estava em opção de contestar, qualquer passo em falso e ele poderia atirar na minha cabeça e eu não queria morrer.
— Você pode só... — Fiz um gesto com as mãos, olhando para baixo, eu não tinha condições de olhar aquela máscara de novo. — Virar-se de costas.
— Que besteira... — Murmurou, mas se virou de costas. Certo, eu podia lidar com aquilo, eu podia. Vesti aquele macacão horrível o mais rápido que eu consegui. O informei que estava pronta, ele se aproximou de mim e tocou minha cintura de forma gentil até demais, me guiando. Direcionei meu olhar ao chão durante todo o percurso, até sentir um leve empurrão indicando que eu deveria me sentar ao lado de uma moça. Me sentei sem pestanejar. Percebi que apenas eu utilizava aquele macacão vermelho igual aos criminosos. O que eles pretendiam?
— Você está bem? — Assenti para a moça que estava ao meu lado.
— Eu tenho pavor de palhaços. — Sussurrei de volta. Ela pareceu me compreender.
Aquela fobia se iniciou desde quando tinha meus quatro ou cinco anos, não sei ao certo, as únicas lembranças nítidas que eu tinha daquela época eram de Gustavo, um primo mais velho por parte de pai, que me assustava sempre que podia com uma máscara, me ameaçava dizendo ser um palhaço mal e que me mataria assim que pudesse, aquilo me marcou de um jeito terrível e, desde aquele momento, eu nunca mais consegui desvincular um palhaço de algo ruim. Claro que ele ria e até hoje ri, dizendo que eram brincadeiras, mas o estrago já estava feito. A gente precisa sempre ter cuidado com o que diz ou faz com uma criança, são traumas para uma vida toda.
Eu fazia tratamento psicológico para superar, mas não era algo que se apagava assim da mente. Tinha conseguido um enorme avanço nas terapias, mas aqui havia caído tudo por terra quando vi aqueles assaltantes com as máscaras, me senti novamente a garotinha de cinco anos. Nem todo mundo compreende e acha que é frescura, mas não é.
— Silêncio, eu quero todo mundo quieto e cooperando! — Ouvi a voz de um dos homens falando, mas estava mais distante. Pelo o que eu pude perceber, haviam apenas dois assaltantes contendo os reféns. Suspirei fundo, tentando não surtar de novo, mas eu tinha tanto medo.
Escutei uma movimentação brusca e direcionei meu olhar para cima e me arrependi no mesmo momento, aquelas máscaras… E como um click minha cabeça começou a trabalhar e se eles soubessem quem eu sou? Isso com certeza daria muito problema, já estava com as mãos suando novamente, a adrenalina corria por minhas veias. Me encolhi, escondendo meu rosto entre as minhas pernas, temendo um novo surto.
— Se essa menina passar mal de novo, eu dou um tiro na cara dela. — Escutei uma mulher falar próxima a mim. – Não estou com um pingo de paciência para frescurite.
— Ela tem medo de palhaços… Não é frescura. — Escutei o rapaz de minutos atrás murmurar.
— Foda-se, eu não estou nem aí para ela. — Suspirei fundo, eu precisava me controlar, senão eu seria a primeira a morrer. Ela chutou minha perna e eu grunhi. Ela puxou meu cabelo com força, fazendo com que eu levantasse minha cabeça com lágrimas nos olhos. Eu não sabia desde quando eu havia começado, mas eu chorava copiosamente. — Você pode ir parando com esses ataques fajutos, senão eu dou um tiro na sua cabeça, você está entendendo, princesinha? — Balancei a cabeça rapidamente, concordando.
— ... — Sussurrou no meu ouvido. Fechei meus olhos com pesar, enquanto grossas lágrimas ainda desciam por meus olhos. Eles sabiam sim quem eu era. A filha da prefeita da cidade, nunca pesou tanto ser quem eu era. Como descobriram? Deve ter sido no momento que eu desmaiei, eu não sabia.
— Por favor… — Sussurrei, fechando meus olhos enquanto mais lágrimas desciam.
— Chega, deixe-a. — Ela me largou com brusquidão e respirei fundo, tentando regular minha respiração.
— Olha, olha, hein. — Ouvi adverti-lo e sumir do meu campo de visão. Abaixei minha cabeça novamente, era tudo o que eu conseguia fazer, chorar e tentar não surtar de novo.
— Você tem que tentar se controlar, eles não estão para brincadeira. — A moça que estava ao meu lado sussurrou.
— Eu sei, eu estou tentando, mas é muito difícil. — Mordi meus lábios trêmulos, tentando conter um choro alto.
— Vem. — Senti meu braço ser pego, olhei e percebi que era aquele rapaz de novo. Me levantei e o segui. — Só fica aqui, você do jeito que está deixa as coisas bem instáveis para o lado da… — Se deteve. Visualizei que estava novamente no banheiro. Ele andava de um lado para o outro, pude perceber porque conseguia ver seus pés, ele me parecia tão nervoso com tudo aquilo, não conseguia parar quieto. Fiquei muda. — Isso não vai demorar mais do que alguns minutos. — Assenti. — Eu não deveria, mas minha irmã mais nova também tem fobia de palhaços, então eu entendo. Pode olhar para mim. — Levantei meus olhos e pude vê-lo sem a maldita máscara e ele era extremamente lindo, parecia um anjo.
— Obrigada.
— Está tudo bem. — Sorriu, e seu sorriso era lindo… E estava reparando demais no assaltante, mas ele era tão gentil. — A gente está terminando, e já vamos embora, você vai junto. A gente não vai te matar, mas você é nossa garantia, .
— Então foi tudo planejado? — Mordi meus lábios ainda trêmulos.
— Na verdade, não foi, mas a gente deu sorte de você estar aqui. Íamos pegar um refém qualquer para que pudéssemos fugir, mas você é perfeita, você é alguém importante. — Suspirou. — É aquela velha história do dia errado e da hora errada. Sinto muito.
— ‘Bora, já está na hora, , já fizemos a limpa e a polícia chegou, a gente tem que sair agora. Ei, o que você está fazendo sem a porra da máscara, imbecil?
— Ela tem medo, eu decidi tirar para tranquilizá-la. — Escutei um barulho com a boca vindo da mulher à frente.
— Você é a merda de um amador mesmo, põe essa porra. — A moça gritou com ele, que rapidamente a obedeceu.
— Vamos, você vem com a gente. — Neguei com a cabeça, ela me puxou bruscamente e eu não tive escolha senão segui-los. Ela me acomodou à sua frente, colocou a mão livre na minha cintura e a outra apontou a arma na minha cabeça. Meu corpo tremia, qualquer sinal de loucura ou insegurança da parte dela, e eu veria minha vida ir embora em um sopro.
— Não atirem, a gente está com a filha da prefeita. Repito, não atirem! — Escutei algum dos caras dizendo. Eu chorava, pedindo que eles abaixassem as armas.
— Sou , por favor, não atirem. — Minha voz saiu trêmula. — Não os sigam, se não eles vão me matar, por favor…
— Muito bom, princesinha. — A mulher sussurrou no meu ouvido. Eu gelei. — Está saindo melhor que a encomenda…
— Deixem-na e a gente não segue vocês… — Algum dos policiais gritou, tentando barganhar por minha vida.
— Resposta errada, meu caro. Vamos levá-la e quando tudo estiver seguro, nós a soltamos. Ninguém está a fim de sequestro, só queremos ir embora com segurança.
— Façam o que eles querem, por favor. — Grossas lágrimas desciam de meus olhos, eu estava desesperada para que ela tirasse aquela arma da minha cabeça, ela a empurrava com força e me machucava. — Por favor…
— Isso não está certo, senhorita . — O homem suspirou. — Não podemos concordar com isso. Vamos, larguem-na. — Escutei o barulho de click, ela tinha ativado a arma. Eu ia morrer, eles não tinham nada a perder. Ouvi um barulho de tiro muito alto, era provável que haviam acertado algo e eu fechei meus olhos, sentindo meu rosto ainda mais úmido, eu suava frio e se misturava com minhas lágrimas.
— Nós não estamos brincando, nós vamos presos de qualquer jeito, não perdemos nada se a matarmos, mas vocês perdem, afinal é a filha da prefeita. E então? Nos dê cinco minutos de vantagem ou a gente resolve isso agora. — A arma foi empurrada com violência em minha cabeça novamente.
— Abaixem as armas e deixe que eles vão. — Senti meu corpo ser empurrado para frente. — Vocês têm três minutos de vantagem.
— Nós vamos contar, se vocês nos seguirem antes do prazo combinado, nós a matamos, ficou entendido? — Descemos as escadas aos tropeços. Vi que ela me direcionava a um carro velho, escutei o barulho de alarme e as portas estavam destravadas. A mulher abaixou minha cabeça com brusquidão e eu entrei no automóvel, meu corpo tremia tanto… Eu tentava chorar baixo, mas eu não conseguia. — Pisa fundo. Não vai demorar para a polícia seguir a gente. — Já estávamos em movimento.
— Aja paciência para ter que aturar essa mina. — Fechei meus olhos, ainda chorando copiosamente, aquela maldita máscara. Encará-los usando aquilo estava me aterrorizando.
— Se vocês quiserem que eu sobreviva, deveriam tirar... — sussurrei nervosa, olhando meus próprios pés.
— Primeiro lugar, as máscaras servem para esconder nossas identidades, princesa, já basta a anta aqui ter mostrado o rosto para você. — Apontou em direção a . Ela não estava em posição de ralhar com ele, havia entregado a identidade dele quando o havia chamado pelo nome no banco. Preferi me calar, eu ainda não estava louca de responder.
— O quê? — O motorista gritou, exacerbado. — Eu sabia que era uma péssima ideia trazer a porra desse garoto, não tem malícia, ele ainda vai foder a gente.
— Se eu foder alguém vai ser eu mesmo, ela viu apenas o meu rosto. — Mordi meus lábios, tentando controlar as minhas lágrimas.
Senti braços passarem por meus ombros suavemente e travei, percebi que era me abraçando de lado para que eu pudesse esconder meu rosto na curvatura do pescoço dele e não olhar para aquelas máscaras, e assim o fiz, ele estava tentando ajudar para que eu me acalmasse, eu apreciei e muito seu gesto. Inspirei e tudo o que eu senti foi o perfume amadeirado que ele usava. Me senti bem pela primeira vez naquela tarde e parei de chorar.
— ! — Escutei alguém ralhar. — Se o chefe ver algo assim você está fodido.
— Qual é, ela está com medo, não tem nada demais. — O abracei pela cintura, me aconchegando ainda mais nele, era estranho, mas eu me sentia segura em seus braços.
Andamos mais um pouco de automóvel, eles averiguaram que ninguém os seguia e trocamos de carro, tinha um outro estacionado na estradinha de terra, eles tinham pensado em tudo para despistar a polícia, que não demoraria muito para nos alcançar. Tentei andar devagar até o próximo veículo para retardá-los, mas não foi uma boa ideia quando aquela arma foi apontada novamente em minha direção.
Fiquei dentro daquele outro carro por mais ou menos uma hora até chegarmos em um determinado trecho e eles cobriram minha cabeça com um capuz, andamos mais um pouco, até o automóvel ir perdendo velocidade e parar. Escutei o barulho da porta se abrindo e meu corpo foi empurrado até que eu saísse. Fui andando aos tropeços por mais um tempo, descemos algumas escadas, até que paramos, e o capuz foi tirado da minha face de forma violenta. Tive que piscar os olhos várias e várias vezes até que minha visão acostumasse.
Vi que era um quarto pequeno, havia uma janela apenas, só que ela era bem pequena, eu não conseguiria passar por ali caso tentasse fugir e uma cama. Senti um empurrão em minha costela e cai desajeitadamente lá. Pegaram uma corda e amarraram minhas mãos na cabeceira da mesma com força e aquele aperto doeu, segurei o grito que queria soltar. Fecharam a porta e me deixaram ali, completamente sozinha com meus demônios. Eu sentia fome, sede e dores no corpo devido ao ataque de pânico de mais cedo. Escutei um soluço alto escapar de minha boca, e eu chorava como uma garotinha de novo, eu não tinha mais forças para nada, se não chorar. Não sei por quanto tempo eu chorei, mas em algum momento eu adormeci.
*
— Ei, acorda, você precisa comer alguma coisa. — Escutei uma voz, tentei abrir meus olhos, mas eles ardiam, eu havia chorado demais naquele dia. Os forcei e finalmente consegui abrir, visualizando parado em minha frente. Suspirei aliviada por ser ele e não estar de máscara. — Toma. — Me estendeu um copo de água e eu bebi metade do conteúdo de uma vez.
— Obrigada. — Agradeci. — Que horas são?
— Deve ter passado das 22 horas, desculpa a demora em te trazer algo para comer, eu queria ter vindo antes, mas não deixaram. — Coçou a nuca.
— Me desamarra, por favor, está doendo. — Choramiguei. Ele suspirou, enquanto pensava sobre aquilo. — Por favor, eu juro que não vou tentar fugir, eu só quero comer devidamente.
— Está bem, mas, por favor, não tente nada, senão eu vou ser obrigado a te machucar, e eu não quero fazer isso. — Concordei veemente. Senti ele mexer nas cordas até que se afrouxassem e por fim estar com as mãos completamente livres. Massageei-as sentindo o sangue voltar a circular normalmente. Ele colocou a bandeja em cima do meu colo. Eu comecei a comer e percebi que se tratava de pão com mortadela.
— Obrigada. — Agradeci de boca cheia. Ele fez um gesto, como se dizendo que não era nada. – Você não é igual aos outros, por que se meteu nisso? — Me encarou.
— Você não entenderia os meus motivos, não quando não te falta nada na vida. — Deu de ombros.
— Você não sabe... Por que não tenta me contar? — O encarei e o senti ficar desconfortável, desviando os olhos.
— O dinheiro é para a minha mãe, preciso pagar o tratamento dela com câncer. — Quem estava desconfortável era eu naquele momento, entendendo seus motivos mais do que eu gostaria.
— Se eu estivesse na sua posição, faria as mesmas coisas. – Dei mais uma generosa mordida em meu lanche. — Família é família.
— Não esperava escutar isso de você. — Suspirei, tomando mais um pouco de água que despunha no copo.
— Você não me conhece, só sabe o que as pessoas dizem de mim. – Assentiu. — Sabe quanto tempo eu vou ficar trancafiada aqui?
— No máximo cinco dias, é o tempo de a gente partir e fugir os mais depressa da cidade, eu vou depositar a grana na conta da minha irmã. — Concordei. — A gente vai te soltar antes de chegarmos à divisa da cidade. Aguente firme.
— Aguento firme se me disser que só você vai entrar aqui, não quero ver aquelas máscaras na minha frente.
— Vou fazer o possível para que só eu entre aqui. — Mordi os lábios, concordando.
— Se nos conhecêssemos em outro momento, eu com certeza teria me interessado em você. — Não sei porquê, nem como, mas aquelas palavras pularam da minha boca. Onde eu estava com a cabeça para flertar com um dos meus sequestradores? Eu namorava!
— Você não sabe o que diz, . — o rapaz negou com a cabeça, mas pude visualizar um sorrisinho de lado surgir. — Bom, você já terminou. — Direcionou seus olhos a corda, e eu neguei com a cabeça.
— Por favor, não me amarra de novo, dói muito e a posição é desconfortável. — Respirou fundo.
— Se alguém entra aqui e ver que você está desamarrada, sobra para mim.
— , eu juro que não vou tentar nada, você está sendo sincero comigo desde o início e eu estou sendo sincera com você. — Me encarou profundamente, senti me exposta como nunca antes, aqueles olhos me examinavam de um jeito tão… Íntimo. Balbuciou algo que eu não entendi, provavelmente surpreso por eu saber seu nome.
— Não vou te amarrar, só não tente nada, . — Concordei. — E bom, se a gente estivesse em outra situação, eu já teria tentado te beijar, você é muito gata… — Pegou a bandeja e saiu e eu senti meu coração disparar, eu havia gostado de escutar aquilo.
Escutei a porta ranger alto, dessa vez meu sono estava mais leve e eu despertei com o barulho, mas fiquei quieta, e se não fosse ? Ontem tínhamos passado boa parte do dia conversando trivialidades, ele era um cara diferente, era tão fácil manter um diálogo com ele, parecia que nós conhecíamos há muito tempo. Que fosse ele, eu não podia lidar com nenhum daqueles caras e àquela mulher? Ela era tão cruel...
Senti dedos alisarem meus cabelos e soltei o ar que eu prendia ser solto aos poucos, só seria tão delicado naquele gesto. Fingi que dormia por mais um tempo para sentir o carinho por um pouco mais de tempo. Ele parou o movimento e balançou meu braço para me acordar, eu fingi surpresa quando o vi e cocei meus olhos.
— Oi. — Sorriu desajeitado, com a bandeja em seu colo. — O cardápio não é dos melhores, será pão com mortadela de novo.
— Oi! Eu como qualquer coisa, estou morta de fome, você nem tem noção. — Sorri agradecida. — Eu gosto de pão com mortadela, mas antes de comer, eu preciso ir ao banheiro, estou muito apertada.
— Claro. – Pegou o capuz do bolso da calça e me deu. — Coloca, e a gente sai para você usar o banheiro, mas não tente nenhuma gracinha, eu não quero te machucar, . — Concordei com a cabeça, toda vez que eu pedia para ir ao banheiro ele fazia aquela recomendação.
Eu queria tanto fugir, mas, ao mesmo tempo, ele estava sendo muito legal comigo. Suspirei fundo, colocando a porcaria daquele capuz. Eu iria ao banheiro e traçaria as minhas variáveis de fuga novamente, era assim desde que eu havia descoberto aquele cômodo. Ele segurou meu braço e saímos dali, seguimos por uma reta até ele parar, percebi que havíamos chegado. Ele tirou o capuz da minha cabeça e suspirei aliviada, sentia me sufocando com aquilo.
— Vou ficar de costas, sou um cavalheiro, eu juro. — Rolei meus olhos, entrando no cubículo, que não tinha porta para completar.
Uma janela pequena, apenas, mas definitivamente aquela era maior que a do meu quarto, estudei, pensando se caberia ou não ali. Talvez sim, era uma possibilidade, mas se eu conseguisse passar ali, eu me feriria. Usei o banheiro enquanto estudava o ambiente calada. Peguei o sabonete e tentei me higienizar da melhor forma que eu poderia e quando estava tudo ok, disse a que ele poderia se virar. Ele colocou a porcaria do capuz na minha cabeça, apurei minha audição para escutar qualquer coisa, mas nada, era provável que ao menos naquele andar do local éramos somente os dois, mas duvidava que ele estivesse sozinho comigo naquele lugar, era provável que seus companheiros estivessem em algum andar acima de nós. Quando eu cheguei, me lembro de ter descido alguns lances de escadas, então era provável que fosse o porão de uma casa, eu não saberia dizer com precisão... Chegamos ao quarto, ele tirou o capuz e eu voltei a respirar normalmente.
— Certo, talvez você também tenha fobia a esse capuz. — Acabei sorrindo.
— Não é fobia, eu só me sinto sufocada. — Mordi os lábios, sentando-me na cama e bebendo um gole de água. — E você é muito observador, .
— Seu corpo… Ele fica muito tenso. — Suspirei fundo, concordando. Peguei o pão e dei uma mordida. — Inclusive, conversamos tanto ontem e anteontem e eu realmente me esqueci de perguntar, como sabe meu nome?
— A moça falou seu nome no banheiro do banco. — Dei de ombros, voltando a comer.
— Ainda bem que foi só no banheiro, se algum refém tivesse escutado, eu poderia me dar mal. — Bufou. — Depois ela fala sobre amadorismo…
— Sabe do que eu mais preciso nessa vida? De um chuveiro. — Ele fez uma careta. — É, eu sei que isso não vai rolar, por isso me virei do jeito que eu consegui no banheiro.
— O chuveiro eu não vou poder providenciar, mas, bom, eu vi que seus ombros estão cheios de nós, eu poderia fazer uma massagem para aliviar a tensão, mas é claro, é só uma ideia. — Fiquei tensa, mas não senti seu gesto desrespeitoso, ou nem nada do tipo, e de repente ter suas mãos em meus ombros não me pareceu uma má ideia.
— Eu quero. — Desabotoei o macacão, desci as duas mangas do mesmo, tirei a blusa que utilizava e fiquei apenas de sutiã, afastei meus cabelos de meus ombros e senti suas mãos geladas tocarem minha pele, involuntariamente me arrepiei. Suspirei quando ele começou com movimentos, apertando a carne com delicadeza e a cada aperto eu guardava um gemido prazeroso. Definitivamente tudo o que eu precisava era uma massagem. — Uau, você sabe bem o que está fazendo.
— Não é querendo me gabar, mas eu já escutei isso algumas vezes. — Sorri. Eu já não tinha mais vontade de comer, aquela massagem estava me deixando extremamente bem.
— As milhares de garotas que devem ter dormido com você...
— Na verdade, não foram milhares, queria inclusive. — Pude escutar sua risada. Ele foi descendo as mãos pelas minhas costas e eu automaticamente as arqueei.
— Claro, sei... — Sussurrei, enquanto ainda recebia a massagem. Ele chegou no fim da minha coluna, foi subindo os movimentos até alcançar meus ombros novamente. Ele depositou um beijo ali e eu me arrepiei. Ele parou.
— Sua pele é tão macia, não pude resistir. — Molhei meus lábios que haviam ficado secos.
— Eu gostei. — Sem qualquer filtro eu soltei.
Eu não sabia o que estava acontecendo, meus sentimentos estavam tão bagunçados, deveria sentir repulsa, nojo, certo? Olha as condições que eu estava, presa em um quartinho imundo, com uma cama horrível, sem conseguir ver a luz do sol direito, nem sequer tomar um banho descente eu podia... Mas não, me sentia cada vez mais atraída por ele, eu não podia controlar, era muito forte. Me sentia tão viva por estar sentindo aqueles beijos que agora eram vários em minhas costas, minha frase foi só um pedido mudo para que ele continuasse, ele havia entendido bem a mensagem. A massagem já tinha parado, agora eram só os beijos cada vez mais intensos em meu pescoço, virei-me para trás o surpreendendo. O vi com os olhos nublados, pingavam desejo, ele me queria, ele precisava de mim, e eu mesmo sem saber como ou porquê, precisava ainda mais dele.
Contrariando qualquer sanidade que eu ainda poderia ter, o beijei. E Deus, não me arrependi, ele beijava muito bem, e eu o queria mais do que tudo. Sentei em seu colo, sentindo-me cada vez mais excitada, era muito intenso, enfiei minhas mãos dentro da blusa dele, a levantando. Partimos o beijo e comecei a distribuir beijos pelo seu pescoço e o senti cada vez mais excitado, eu rebolava em seu colo, o vendo reagir a aquilo.
Eu precisava que a gente fizesse amor, precisava sentir dentro de mim, e tinha que ser agora. Minhas mãos nervosas desceram para os botões do macacão que ele utilizava, macacão aberto, desci as mangas desesperadamente, o beijei novamente. Não demorou muito para que nossos corpos estivessem nus e suados naquele cubículo e gemidos fossem soltos por nós.
Quatro dias, seriam os piores dias da minha vida, não é? Errado, depois que eu havia ficado com , as coisas tomaram rumos inexplicáveis, eu estava gostando de estar com ele, de ter momentos com ele, que a ideia de fugir era tão absurda, eu não queria mais fugir, eu queria estar ali com ele. vinha mais vezes durante o dia e a maioria delas a gente se amava como nunca, e eu me sentia cada vez mais completa. Como agora, ele alisava meu cabelo depois de termos feito amor há alguns minutos.
— Amanhã você estará finalmente livre, está feliz? — Escutei ele sussurrar em meu ouvido, me arrepiei. Era tão bom estar em seus braços, eu não queria me afastar dele nunca mais.
— Não, porque vou ficar longe de você. — Escutei seu riso baixo. — Sabe o que eu queria de verdade?
— Não, o quê? — Me virei em sua direção e o encarei.
— Fugir com você, não tenho vontade nenhuma de voltar para a minha rotina, para minha casa sem graça.
— Você está louca, , é brincadeira, não? — Fechei minha face, bem séria. — Você está disposta a largar tudo por mim?
— Sim, eu estou apaixonada, eu não me vejo mais sem você. — Suspirei, incrédula, as palavras simplesmente saíam da minha boca e eram tão verdadeiras que me assustava tanto. — Eu quero ir com você, , por favor?
— Porra, , você tem certeza mesmo disso? — O joguei na cama, me deitei por cima dele e comecei a distribuir beijos por todo o seu rosto.
— Tenho, não quero nunca mais me separar de você, , nunca, nunca. — Ele trocou nossas posições e beijos quentes se iniciaram no meu pescoço, ele subiu os beijos e chegou na minha orelha. — Repete… — Mordeu o lóbulo da minha orelha.
— O quê? — Suspirei fundo, sentindo meu corpo em brasa.
— Aquele lance lá de paixão. — Soltou um risinho sensual, enquanto o sentia segurar meus cabelos com força.
— Que eu estou apaixonada? — Senti uma mordida na minha orelha. — Ah, eu estou mesmo apaixonada por você… — Mordi meus lábios e mais uma sessão de beijos quentes e corpos suados foi iniciada naquela tarde.
O dia que eu finalmente iria ver o Sol de novo, eu estava contente, finalmente tomaria um banho decente, e ainda tinha , o homem a qual eu nutria sentimentos, antes minha vida não tinha nenhum sentido, porque com certeza faltava ele comigo. Eu sei que a partir do momento que eu saísse daquele lugar com , muitas portas seriam fechadas e eu seria uma fugitiva da polícia, meus pais ficariam para trás e Bruce, Deus, meu namorado, coitado, eu com certeza o magoaria, mas eu tinha que ser egoísta.
Escutei o barulho da porta abrindo, e me mexi na cama com um pequeno sorriso, era , mas não estava sozinho, então eu me contive e apenas me sentei na cama.
— Você tem certeza, ? Tem certeza que você quer levar esse traste com você? Ela é chave de cadeia, a gente vai se separar e, a partir de agora, e é cada um por si. — Ele suspirou. Aquela mulher sabia bem jogar um balde água fria em qualquer pessoa. Desviei meu olhar, ela usava a porcaria da máscara.
— Nós já conversamos sobre isso, eu já te disse que ela quer ir comigo e ela vai, chega de contestar minhas decisões, como você mesmo disse, ela é minha responsabilidade à partir de agora. Nem o chefe ficou no meu pé! — Esbravejou, eu fiquei surpresa, nunca tinha o visto tão autoritário.
— Ok, , ok, não falo mais nada. — Suspirei fundo. — Só não diga que não avisei, ok? Vamos, patricinha, chegou seu momento de liberdade. — tinha a mão estendida em minha direção e eu a entrelacei com a minha.
Pelo que eu entendi, cada um iria para um canto após o roubo. O que me deixou extremamente intrigada foi eu estar no cativeiro por cinco dias, o ideal não seria que eles fugissem logo após o assalto? Como eles fariam para sair da cidade? Era meio óbvio que estariam procurando-os, mas então me toquei, não, não era óbvio, ninguém sabia a identidade deles. Me parecia o crime perfeito, mas não era, estava cheio de pontas soltas que eu viria a descobrir depois.
— Boa sorte, caras, e se um de nós for pego, não abre a boca, entendido? — Eles assentiram, e cada um foi para um veículo, segui , meio desacreditada ainda.
— Para onde vamos? — O questionei, curiosa.
— Eu ainda não faço ideia, mas não acho que seja bom que saiamos da cidade assim de imediato. — Suspirei. — Vamos ter que mudar seu visual, sua carinha é muito visada, . – Alisou meu rosto com um pequeno sorriso.
— Faço qualquer coisa, se essa coisa significar estar com você. — Eu estava tão louca por ele, meu Deus, eu nunca pensei que mudaria a cor do meu cabelo ou o cortasse por alguém. Meu cabelo sempre foi algo sagrado, sempre fui muito rígida a mudanças a ele, mas eu faria por , eu faria qualquer coisa por ele. Deus, eu faria mesmo.
— Eu sei que faz… E eu aprecio e muito isso. — Alisou meu rosto, e não demorou para que eu estivesse em seus braços novamente e compartilhássemos um longo beijo.
***
Havíamos saído de Guararema, em São Paulo, eu não sabia se estava mesmo lá, há umas duas semanas, e estávamos em uma cidade vizinha, não era 100% seguro, mas era o que havíamos conseguido. Eu havia descolorido meus cabelos e estavam bem curtos, tinha furado meu nariz no septo, e agora usava uma maquiagem mais pesada, deixando para trás aquela de antes. Eu até gostava da imagem refletida no espelho, era uma versão bem melhor de mim, no fim das contas.
Seria insensível se não dissesse que todas as vezes que eu ligava a televisão me sentia extremamente angustiada ao ver o desespero de minha mãe à minha procura, meu pai com olheiras profundas na face, eu era a merda de uma filha ingrata no fim das contas. Bruce… Pobre, Bruce. No início foi fácil virar as costas a tudo e seguir cegamente a , mas agora não, eu sentia saudade da minha família, dos meus amigos, do meu cachorro…
Da gangue, somente haviam pego Pablo e Damian, ainda restavam , Paola e Carlos. É, eu já sabia o nome de todos. E eu ainda tinha achado que era o crime perfeito, mas não era, a polícia havia feito seu trabalho direito, e pegado bem os rastros de todos. Não era só a minha imagem que flutuava pelos noticiários, a de , Paola e Carlos também.
Havia um adendo, um dos dois havia aberto a boca, provavelmente por um acordo com a promotoria, e agora todos sabiam que eu havia ido com ele porque eu quis e eu também responderia para a justiça, eu não podia voltar mais atrás.
cada vez mais se mostrava diferente do rapaz que eu havia conhecido no banco, ele havia mudado sua aparência, mas não era só aquilo, ele estava mesmo diferente, e eu não gostava tanto daquela sua versão. Escutei o barulho da porta do quarto que estávamos abrir e o vi entrar bravo por ela.
— Toma, come. — Me estendeu uma sacola, lá havia algumas besteiras, salgadinhos, chocolates, refrigerante, cerveja, cigarro, peguei um salgadinho Fandangos e o abri. Era assim que a gente se alimentava, não sabia o que era uma refeição descente há tempos. — A polícia está cada vez mais no nosso rastro, porra. Você não pode sair desse quarto de jeito nenhum, . Pegaram o Carlos, porra, o Carlos!
— Eu não liguei a televisão hoje. — Murmurei, enquanto comia. começou a derrubar as coisas no chão.
— Para, por favor, se controla, o cara vai reclamar. — Me referia ao dono daquela espelunca que estávamos hospedados. Tentei me aproximar dele, para acalmá-lo, mas levei um empurrão e, com sua força, acabei caindo na cama e parando do outro lado dela. Havia batido meu braço no percurso e havia doído.
— Merda, me desculpa. — Se aproximou de mim, me tocou, e eu o repeli. — É tudo uma grande merda.
— Está tudo bem, não foi nada. – Suspirei me levantando da cama. — Precisamos sair daqui, não é mais seguro.
— E para onde vamos, inteligência? Se a gente cruzar essa fronteira agora seremos pegos, precisamos de novos documentos falsos. — Andava de um lado para o outro. Uma mania terrível que ele tinha quando ficava nervoso. — Um dos filhos da puta nos entregou, agora a minha foto também está estampada em todos os lugares, se eu tivesse sozinho, mas não, tive que ceder aos seus caprichos e te trazer atrás de mim, agora é um peso. — Mordi os lábios, tentando segurar as lágrimas, aquilo havia me magoado.
— Nossa, agora eu sou um peso… Obrigada, , eu amei saber disso. — Exasperei. Ele sentou-se na cama.
— É a mais pura verdade, mas não se sinta magoada, baby. Merda, não deveria descontar as coisas em você, me desculpa, vem, senta aqui. — Me levantei e me sentei na cama ao seu lado, cedendo. – Tudo que eu preciso agora é de uma boa dose de você, minha droguinha. — Senti seus beijos quentes em meu pescoço e esqueci por alguns momentos tudo o que havia acontecido há minutos, agarrando sua cintura com força. No fim, era o meu ali, ele só estava nervoso e quem podia culpá-lo, não é?
Olhei no relógio, eram duas e 37, e nada de voltar, será que eles haviam o pegado? Deus, se ele foi preso eu me entregaria sem pestanejar, nem via mais sentido em fugir. Escutei a porta ser aberta e suspirei fundo quando percebi pela silhueta que era ele, mas senti meu estômago embrulhar, ele fedia a cigarro e a cachaça barata. Encostei minha cabeça no travesseiro e fiquei quieta, não queria discutir com ele, não naquele estado em que ele estava. Sabe-se Deus o que poderia acontecer.
Três semanas que estávamos fugindo e era a primeira vez que ele havia parecido bêbado desse jeito, era provável que tenha sido porque Paola foi capturada naquela tarde. Fiquei imóvel e quando ele se deitou na cama, senti o cheiro de perfume barato de mulher também impregnado na sua blusa, pressionei meus olhos com força, ele havia me traído. Eu não podia reclamar, certo? Eu havia feito o mesmo com Brian, eu merecia, no fim. Mas doía, e como doía. passou o braço em minha cintura e eu prendi a respiração quando ele começou a beijar meu pescoço.
— Não, , eu não quero. — O empurrei, voltando a ficar de costas para ele, ele bufou alto e me abraçou novamente, agora com mais força.
— Eu só quero dormir abraçadinho com a minha droguinha, só isso, porra. Para de frescura, .
Suspirei, me deixando ser abraçada por ele, não tinha chances de empurrá-lo, ele era infinitamente mais forte que eu, e ele não me deixaria em paz, teria que aguentar aquele cheiro forte que vinha dele. Sua respiração pesada em minha nuca indicava que ele já havia dormido. Por um momento eu senti medo que ele tentasse algo a mais, mas não, ele já tinha transado aquela noite e aquilo foi um alívio, eu não sabia dizer não a , e agora eu percebia nitidamente que era um enorme problema.
Aquela devoção toda, eu não me sentia mais dona de mim, ele de alguma forma exercia um poder tão grande sobre mim, e era tão louco… O que era aquilo, meu Deus?! Eu não sabia explicar, só me sentia intimamente ligada a ele. Pisquei meus olhos e mais lágrimas saíram deles.
Pela primeira vez naquela jornada louca em que eu me encontrava, eu percebi meu conto de fadas ir morrendo aos poucos e a realidade me tomando de forma avassaladora. Mas agora já era tarde demais… Eu já estava perdida.
— De novo você vai se embebedar, ? Sério mesmo? E vai ficar com qualquer mulher que ver pela frente! — Mordi os lábios enquanto o olhava bem séria. Um mês e 10 dias que estávamos naquela loucura, fugindo feito loucos da polícia. Havíamos mudado de hotel e de cidade, tínhamos conseguido documentos falsos e, devido ao tempo de fuga, ficou mais fácil para conseguirmos entrar em Poço de Caldas, em Minas Gerais, sem sermos reconhecidos.
— Ah, por favor, , não seja louca, eu só bebo e pronto, preciso afogar as mágoas dessa vida de merda que a gente está tendo! Não tem mulher nenhuma! — Ralhou comigo.
— Só não bebe, você fica tão diferente e eu não gosto.
— Você não tem que gostar de nada, tem que ficar calada e na sua. Nunca te obriguei a vir atrás de mim, você que quis. — Mordi meus lábios, mais palavras duras direcionadas a mim, aquilo se tornava uma rotina...
— Eu estava apaixonada, não via sentido minha vida sem você, ! Quando você fala essas coisas, me magoa e muito! — O encarei chateada. Ficamos calados por um tempo, enquanto o via colocando a blusa, ele ia sair mesmo eu pedindo para que ele não o fizesse. Merda!
— Desculpa, droguinha, eu prometo que não falo mais, é só que eu fico puto quando você me fala essas coisas e eu acabo jogando tudo no ventilador. — Me olhou, e deu uma piscadinha.
Ele sempre pedia desculpas, e prometia não fazer, mas em todas as oportunidades que tinha esfregava aquilo na minha cara, me sentia relativamente mal com aquele pouco caso que ele fazia de mim, se eu estivesse ali ou não, talvez nem fizesse diferença para ele. Suspirei fundo, decidindo mudar de assunto, ele ia sair, e eu não ia conseguir impedi-lo.
— E sua mãe? — Perguntei de repente.
— Hum? — Me encarou com o cenho franzido pela mudança brusca de assunto.
— Sua mãe, como ela está? Você nunca tocou no assunto do lance do câncer dela. — Ele explodiu em risadas altas e eu o encarei de cenho franzido, qual era a porra da graça?
— Eu sou órfão, , fui criado em um orfanato. — Foi recuperando-se de seu riso.
— Você mentiu para mim, eu não acredito que você fez isso, , com esse tipo de coisa a gente nem brinca.
— Eu diria qualquer coisa para entrar no meio das suas pernas, . Eu menti mesmo, disse o que você queria ouvir, você queria um cara com motivos nobres para assaltar um banco e eu te dei. Mas, na verdade, eu assaltei porque eu quis. Você é ingênua demais. — Senti como se golpeassem meu estômago, estava boquiaberta, eu não acredito que ele havia feito isso comigo.
— Que mais você mentiu para mim? Seja sincero comigo pelo menos uma vez na sua merda de vida. — O encarei prestes a desmoronar.
— Não tenho irmã com medo de palhaços, eu nem tenho irmã, pelo menos que eu saiba. — Soltou uma risadinha debochada. — Ah, eu nunca fiz massagem em ninguém, só queria um motivo para enfiar minhas mãos em você, fiquei surpreso porque você gostou… No fundo você é uma bela safada, nem foi difícil.
— Cala a boca, chega, eu não quero mais ouvir nada. — Coloquei as minhas mãos sobre a boca, segurando-a. Ele deu de ombros, com um pequeno sorriso na face, eu diria que era zombeteiro. — Alguma coisa foi real naquele cativeiro? — Perguntei com um fio de voz.
— Eu gosto de você, , gostei de você desde que coloquei meus olhos em ti naquele banco. Isso é verdade. — Suspirei fundo.
— Você me ama? — O escutei respirar fundo. — Você nunca disse que me ama…
— Não estou aqui com você ainda? — Não era a resposta que eu queria ouvir, e me senti um lixo ainda maior. — Eu estou indo, não me espere acordada, senão vai se cansar. — Gargalhou, me deu um selinho e saiu.
Esperei uns segundos, dei uma rápida checada em minha roupa, peguei a chave reserva e saí atrás dele, eu não ia ficar sozinha naquele quarto hoje à noite.
O vi entrar no carro e sumir de minhas vistas, provavelmente ia encher a cara onde estava acostumado a ir e comer alguma mulher por aí, eu já não sentia mais nada diante daquilo, o que estava me doendo mais era saber que ele não me amava.
Eu fui andando sem rumo pelas ruas de Poço de Caldas, minha respiração estava descompassada, eu tentava respirar corretamente, mas eu não conseguia. Minhas mãos estavam suando frio, não, eu estava a ponto de surtar novamente. Vi um bar e corri até lá, chequei meus bolsos e percebi que tinha algum dinheiro. Eu precisava beber, aquilo ia me ajudar a lidar com tudo e eu ia beber como nunca havia bebido na minha vida, aquilo me ajudaria naquela crise de ansiedade ou ataque de pânico, eu já não sabia o que estava tendo.
Me aproximei do balcão, vi que havia dois velhos bebendo, e que me encararam de um jeito nojento. Os ignorei e me sentei no balcão.
Pedi um uísque, precisava de algo bem forte diante das malditas revelações daquela noite, suas palavras me acertaram como facadas no peito. Ele não podia ter feito aquilo comigo, não podia ter me enganado daquele jeito, me sentia tão... Desolada e muito, muito sozinha, como nunca me senti na vida. Grossas lágrimas descerem por minha face.
O rapaz me serviu novamente e eu o engoli de uma vez, pedindo por mais, enquanto ainda chorava copiosamente. Que merda de vida! Bebi em uma golada, e mais uma vez meu copo foi cheio naquela noite. Coloquei as mãos na boca, tentando conter o choro alto que queria escapar, eu já tinha olhares demais sobre mim, então eu precisava chorar calada. Bebi em um só gole, eu já não fazia mais careta, minha garganta estava se acostumando ao gosto do uísque. Pedi mais uma dose, minha cabeça já estava tonta, mas a bebida de alguma forma estava me acalmando, ficar bêbada era a minha melhor opção. Balancei o copo mais uma vez, clamando por mais álcool no meu organismo.
— Moça, você já bebeu demais, chega.
— Eu só preciso de mais, por favor? — Implorei para o senhor que me olhou com uma cara de pena. E eu quis rir, eu era digna de pena mesmo, havia largado tudo por um tremendo babaca! Na verdade a babaca era mesmo eu, ele nunca pediu para que eu o fizesse, eu fiz porque quis.
— Eu posso ligar para alguém te buscar aqui? — Escutei a voz dele e fechei meus olhos, de repente os abrir estava tornando-se uma tarefa difícil. O álcool fazendo seu efeito em mim.
— Me empresta o seu celular, por favor? Deixa que eu mesmo ligo. — Consegui falar. Ele sacou o celular e eu disquei os números que eu sabia de cor.
— Alô? — Suspirei fundo quando escutei a voz do outro lado da linha, e eu já não conseguia controlar meu choro. — Filha? Filha, meu Deus, é você! — Escutar sua voz era a coisa que eu mais precisava ouvir, e eu nem imaginava. — Meu amor, estou com tantas saudades! — Solucei alto. — Não chore, , eu estou aqui, querida, estou aqui. Volta para casa! — Pressionei meus olhos, doía tanto escutar sua voz chorosa, eu tinha feito aquilo nela. Eu fiz a minha mãe sofrer desse jeito, eu era um monstro.
— Mãe! — Consegui proferir. – Me ajuda! Eu preciso de ajuda. — Sussurrei derrotada. Eu só queria ir para casa, eu só queria minha mãe.
Eu estava tão confusa, tão bagunçada, já não sabia mais o que era certo, o que era errado, eu só queria estar com a minha mãe, eu só queria que ela me ajudasse, eu precisava de ajuda.
Eu só queria que as coisas fizessem algum sentido na minha cabeça e no meu coração, elas precisavam fazer sentido dentro de mim. Eu estava destruída e sabia que as próximas palavras que eu proferisse seriam a minha ruína e a de , mas eu não conseguia mais… Eu não podia mais viver daquele jeito, eu não podia mais viver aquele verão cruel, aquilo precisava acabar.
Se tinha algo que eu mais detestava na vida era ir a bancos para resolver qualquer coisa, eram sempre muito cheios, e você demorava muito para ser atendida. Eu poderia usar meus privilégios de ser filha de quem eu era, mas era algo que também abominava, então preferia ser tratada como todos.
Atravessei a rua e entrei no local, e nenhuma novidade, estava cheio mesmo como eu imaginava que estaria. Minha mãe poderia ter aberto minha conta em um banco particular, mas seu cargo não permitira no final. Mas dessa vez a culpa também era minha, havia trocado de celular e precisava de autorização do banco para fazer minhas transações através do aplicativo.
Retirei uma senha e me sentei. Peguei meu celular e vi que tinha mensagem de Bruce, suspirei, eu o amava. Bruce e eu era algo tão mágico, quando ficávamos juntos era tudo tão perfeito e, mesmo com três anos de relacionamento, a chama entre nós não havia se apagado. Eu queria me casar, já estava pronta para isso, mas o sentia hesitante quando eu tocava no assunto...
Respondi sua mensagem rapidamente, dizendo que estava no banco e perguntando se nos veríamos hoje à noite. Escutei o barulho do painel de senhas e olhei automaticamente, mas era claro que minha senha ainda não havia sido chamada, faltava ao menos umas 10 pessoas na minha frente.
Escutei um barulho de tiros, levei minhas mãos aos ouvidos em reflexo, assustada, olhei para a entrada e vi cerca de quatro pessoas armadas. Ah, meu Deus, eu não posso acreditar que isso esteja acontecendo, aquilo era um assalto, e o pior era saber que os assaltantes estavam vestidos com macacões vermelhos e máscaras de palhaços. Eu tenho pavor a palhaços!
— Para o chão, agora começa a festa! – Pude escutar um dos bandidos falarem.
Sem que eu pudesse controlar, senti minha pulsação disparada. Tentei inspirar e expirar, mas não estava conseguindo, o ar não estava chegando aos meus pulmões, senti meu peito comprimir, passei a mão no meu rosto e percebi que suava frio. Merda, merda, merda, eu não tinha mais domínio do meu corpo, eu estava tendo um ataque de pânico.
Tentei tirar o colarinho da blusa de meu pescoço, entretanto não obtive sucesso. Eu precisava respirar, todavia eu não conseguia, o ar simplesmente não vinha. Eu escutava vozes exaltadas, mas eu não conseguia entender o que falavam. Umedeci meus lábios, tentando focalizar em algo, porém a minha visão foi ficando turva, fui perdendo os sentidos, a última coisa que senti foi meu corpo mole indo direto ao chão.
— O que aconteceu? — Senti a minha voz sair como um sopro. Umedeci meus lábios que estavam bem secos.
— Você desmaiou. Toma. — Me deu uma garrafinha com água, a peguei e bebi rapidamente.
— Obrigada. — Sussurrei. Olhei para sua vestimenta e percebi que ele era um dos assaltantes e ainda usava a maldita máscara de palhaço, desviei meu olhar rapidamente de sua face. Pude visualizar que em seus ombros ele carregava uma arma grande, e me senti estremecer olhando aquilo. Senti minhas mãos suarem novamente e minha respiração falhar.
— Ei, calma aí, calma aí. — Se aproximou de mim. — A gente não está interessado em matar ninguém, só queremos o dinheiro.
— A sua máscara está me aterrorizando… Tenho medo de palhaços. — Murmurei, me virando para o lado contrário ao dele. Reconheci que estava em um banheiro, me levantei, ainda com as pernas bambas e abri a torneira molhando meu rosto continuamente.
— Ah. — Sussurrou. — Eu… Preciso te levar com os outros reféns. Veste isso. — Jogou um macacão vermelho em minha direção. Suspirei, mordendo os lábios. Decidi que não estava em opção de contestar, qualquer passo em falso e ele poderia atirar na minha cabeça e eu não queria morrer.
— Você pode só... — Fiz um gesto com as mãos, olhando para baixo, eu não tinha condições de olhar aquela máscara de novo. — Virar-se de costas.
— Que besteira... — Murmurou, mas se virou de costas. Certo, eu podia lidar com aquilo, eu podia. Vesti aquele macacão horrível o mais rápido que eu consegui. O informei que estava pronta, ele se aproximou de mim e tocou minha cintura de forma gentil até demais, me guiando. Direcionei meu olhar ao chão durante todo o percurso, até sentir um leve empurrão indicando que eu deveria me sentar ao lado de uma moça. Me sentei sem pestanejar. Percebi que apenas eu utilizava aquele macacão vermelho igual aos criminosos. O que eles pretendiam?
— Você está bem? — Assenti para a moça que estava ao meu lado.
— Eu tenho pavor de palhaços. — Sussurrei de volta. Ela pareceu me compreender.
Aquela fobia se iniciou desde quando tinha meus quatro ou cinco anos, não sei ao certo, as únicas lembranças nítidas que eu tinha daquela época eram de Gustavo, um primo mais velho por parte de pai, que me assustava sempre que podia com uma máscara, me ameaçava dizendo ser um palhaço mal e que me mataria assim que pudesse, aquilo me marcou de um jeito terrível e, desde aquele momento, eu nunca mais consegui desvincular um palhaço de algo ruim. Claro que ele ria e até hoje ri, dizendo que eram brincadeiras, mas o estrago já estava feito. A gente precisa sempre ter cuidado com o que diz ou faz com uma criança, são traumas para uma vida toda.
Eu fazia tratamento psicológico para superar, mas não era algo que se apagava assim da mente. Tinha conseguido um enorme avanço nas terapias, mas aqui havia caído tudo por terra quando vi aqueles assaltantes com as máscaras, me senti novamente a garotinha de cinco anos. Nem todo mundo compreende e acha que é frescura, mas não é.
— Silêncio, eu quero todo mundo quieto e cooperando! — Ouvi a voz de um dos homens falando, mas estava mais distante. Pelo o que eu pude perceber, haviam apenas dois assaltantes contendo os reféns. Suspirei fundo, tentando não surtar de novo, mas eu tinha tanto medo.
Escutei uma movimentação brusca e direcionei meu olhar para cima e me arrependi no mesmo momento, aquelas máscaras… E como um click minha cabeça começou a trabalhar e se eles soubessem quem eu sou? Isso com certeza daria muito problema, já estava com as mãos suando novamente, a adrenalina corria por minhas veias. Me encolhi, escondendo meu rosto entre as minhas pernas, temendo um novo surto.
— Se essa menina passar mal de novo, eu dou um tiro na cara dela. — Escutei uma mulher falar próxima a mim. – Não estou com um pingo de paciência para frescurite.
— Ela tem medo de palhaços… Não é frescura. — Escutei o rapaz de minutos atrás murmurar.
— Foda-se, eu não estou nem aí para ela. — Suspirei fundo, eu precisava me controlar, senão eu seria a primeira a morrer. Ela chutou minha perna e eu grunhi. Ela puxou meu cabelo com força, fazendo com que eu levantasse minha cabeça com lágrimas nos olhos. Eu não sabia desde quando eu havia começado, mas eu chorava copiosamente. — Você pode ir parando com esses ataques fajutos, senão eu dou um tiro na sua cabeça, você está entendendo, princesinha? — Balancei a cabeça rapidamente, concordando.
— ... — Sussurrou no meu ouvido. Fechei meus olhos com pesar, enquanto grossas lágrimas ainda desciam por meus olhos. Eles sabiam sim quem eu era. A filha da prefeita da cidade, nunca pesou tanto ser quem eu era. Como descobriram? Deve ter sido no momento que eu desmaiei, eu não sabia.
— Por favor… — Sussurrei, fechando meus olhos enquanto mais lágrimas desciam.
— Chega, deixe-a. — Ela me largou com brusquidão e respirei fundo, tentando regular minha respiração.
— Olha, olha, hein. — Ouvi adverti-lo e sumir do meu campo de visão. Abaixei minha cabeça novamente, era tudo o que eu conseguia fazer, chorar e tentar não surtar de novo.
— Você tem que tentar se controlar, eles não estão para brincadeira. — A moça que estava ao meu lado sussurrou.
— Eu sei, eu estou tentando, mas é muito difícil. — Mordi meus lábios trêmulos, tentando conter um choro alto.
— Vem. — Senti meu braço ser pego, olhei e percebi que era aquele rapaz de novo. Me levantei e o segui. — Só fica aqui, você do jeito que está deixa as coisas bem instáveis para o lado da… — Se deteve. Visualizei que estava novamente no banheiro. Ele andava de um lado para o outro, pude perceber porque conseguia ver seus pés, ele me parecia tão nervoso com tudo aquilo, não conseguia parar quieto. Fiquei muda. — Isso não vai demorar mais do que alguns minutos. — Assenti. — Eu não deveria, mas minha irmã mais nova também tem fobia de palhaços, então eu entendo. Pode olhar para mim. — Levantei meus olhos e pude vê-lo sem a maldita máscara e ele era extremamente lindo, parecia um anjo.
— Obrigada.
— Está tudo bem. — Sorriu, e seu sorriso era lindo… E estava reparando demais no assaltante, mas ele era tão gentil. — A gente está terminando, e já vamos embora, você vai junto. A gente não vai te matar, mas você é nossa garantia, .
— Então foi tudo planejado? — Mordi meus lábios ainda trêmulos.
— Na verdade, não foi, mas a gente deu sorte de você estar aqui. Íamos pegar um refém qualquer para que pudéssemos fugir, mas você é perfeita, você é alguém importante. — Suspirou. — É aquela velha história do dia errado e da hora errada. Sinto muito.
— ‘Bora, já está na hora, , já fizemos a limpa e a polícia chegou, a gente tem que sair agora. Ei, o que você está fazendo sem a porra da máscara, imbecil?
— Ela tem medo, eu decidi tirar para tranquilizá-la. — Escutei um barulho com a boca vindo da mulher à frente.
— Você é a merda de um amador mesmo, põe essa porra. — A moça gritou com ele, que rapidamente a obedeceu.
— Vamos, você vem com a gente. — Neguei com a cabeça, ela me puxou bruscamente e eu não tive escolha senão segui-los. Ela me acomodou à sua frente, colocou a mão livre na minha cintura e a outra apontou a arma na minha cabeça. Meu corpo tremia, qualquer sinal de loucura ou insegurança da parte dela, e eu veria minha vida ir embora em um sopro.
— Não atirem, a gente está com a filha da prefeita. Repito, não atirem! — Escutei algum dos caras dizendo. Eu chorava, pedindo que eles abaixassem as armas.
— Sou , por favor, não atirem. — Minha voz saiu trêmula. — Não os sigam, se não eles vão me matar, por favor…
— Muito bom, princesinha. — A mulher sussurrou no meu ouvido. Eu gelei. — Está saindo melhor que a encomenda…
— Deixem-na e a gente não segue vocês… — Algum dos policiais gritou, tentando barganhar por minha vida.
— Resposta errada, meu caro. Vamos levá-la e quando tudo estiver seguro, nós a soltamos. Ninguém está a fim de sequestro, só queremos ir embora com segurança.
— Façam o que eles querem, por favor. — Grossas lágrimas desciam de meus olhos, eu estava desesperada para que ela tirasse aquela arma da minha cabeça, ela a empurrava com força e me machucava. — Por favor…
— Isso não está certo, senhorita . — O homem suspirou. — Não podemos concordar com isso. Vamos, larguem-na. — Escutei o barulho de click, ela tinha ativado a arma. Eu ia morrer, eles não tinham nada a perder. Ouvi um barulho de tiro muito alto, era provável que haviam acertado algo e eu fechei meus olhos, sentindo meu rosto ainda mais úmido, eu suava frio e se misturava com minhas lágrimas.
— Nós não estamos brincando, nós vamos presos de qualquer jeito, não perdemos nada se a matarmos, mas vocês perdem, afinal é a filha da prefeita. E então? Nos dê cinco minutos de vantagem ou a gente resolve isso agora. — A arma foi empurrada com violência em minha cabeça novamente.
— Abaixem as armas e deixe que eles vão. — Senti meu corpo ser empurrado para frente. — Vocês têm três minutos de vantagem.
— Nós vamos contar, se vocês nos seguirem antes do prazo combinado, nós a matamos, ficou entendido? — Descemos as escadas aos tropeços. Vi que ela me direcionava a um carro velho, escutei o barulho de alarme e as portas estavam destravadas. A mulher abaixou minha cabeça com brusquidão e eu entrei no automóvel, meu corpo tremia tanto… Eu tentava chorar baixo, mas eu não conseguia. — Pisa fundo. Não vai demorar para a polícia seguir a gente. — Já estávamos em movimento.
— Aja paciência para ter que aturar essa mina. — Fechei meus olhos, ainda chorando copiosamente, aquela maldita máscara. Encará-los usando aquilo estava me aterrorizando.
— Se vocês quiserem que eu sobreviva, deveriam tirar... — sussurrei nervosa, olhando meus próprios pés.
— Primeiro lugar, as máscaras servem para esconder nossas identidades, princesa, já basta a anta aqui ter mostrado o rosto para você. — Apontou em direção a . Ela não estava em posição de ralhar com ele, havia entregado a identidade dele quando o havia chamado pelo nome no banco. Preferi me calar, eu ainda não estava louca de responder.
— O quê? — O motorista gritou, exacerbado. — Eu sabia que era uma péssima ideia trazer a porra desse garoto, não tem malícia, ele ainda vai foder a gente.
— Se eu foder alguém vai ser eu mesmo, ela viu apenas o meu rosto. — Mordi meus lábios, tentando controlar as minhas lágrimas.
Senti braços passarem por meus ombros suavemente e travei, percebi que era me abraçando de lado para que eu pudesse esconder meu rosto na curvatura do pescoço dele e não olhar para aquelas máscaras, e assim o fiz, ele estava tentando ajudar para que eu me acalmasse, eu apreciei e muito seu gesto. Inspirei e tudo o que eu senti foi o perfume amadeirado que ele usava. Me senti bem pela primeira vez naquela tarde e parei de chorar.
— ! — Escutei alguém ralhar. — Se o chefe ver algo assim você está fodido.
— Qual é, ela está com medo, não tem nada demais. — O abracei pela cintura, me aconchegando ainda mais nele, era estranho, mas eu me sentia segura em seus braços.
Andamos mais um pouco de automóvel, eles averiguaram que ninguém os seguia e trocamos de carro, tinha um outro estacionado na estradinha de terra, eles tinham pensado em tudo para despistar a polícia, que não demoraria muito para nos alcançar. Tentei andar devagar até o próximo veículo para retardá-los, mas não foi uma boa ideia quando aquela arma foi apontada novamente em minha direção.
Fiquei dentro daquele outro carro por mais ou menos uma hora até chegarmos em um determinado trecho e eles cobriram minha cabeça com um capuz, andamos mais um pouco, até o automóvel ir perdendo velocidade e parar. Escutei o barulho da porta se abrindo e meu corpo foi empurrado até que eu saísse. Fui andando aos tropeços por mais um tempo, descemos algumas escadas, até que paramos, e o capuz foi tirado da minha face de forma violenta. Tive que piscar os olhos várias e várias vezes até que minha visão acostumasse.
Vi que era um quarto pequeno, havia uma janela apenas, só que ela era bem pequena, eu não conseguiria passar por ali caso tentasse fugir e uma cama. Senti um empurrão em minha costela e cai desajeitadamente lá. Pegaram uma corda e amarraram minhas mãos na cabeceira da mesma com força e aquele aperto doeu, segurei o grito que queria soltar. Fecharam a porta e me deixaram ali, completamente sozinha com meus demônios. Eu sentia fome, sede e dores no corpo devido ao ataque de pânico de mais cedo. Escutei um soluço alto escapar de minha boca, e eu chorava como uma garotinha de novo, eu não tinha mais forças para nada, se não chorar. Não sei por quanto tempo eu chorei, mas em algum momento eu adormeci.
— Obrigada. — Agradeci. — Que horas são?
— Deve ter passado das 22 horas, desculpa a demora em te trazer algo para comer, eu queria ter vindo antes, mas não deixaram. — Coçou a nuca.
— Me desamarra, por favor, está doendo. — Choramiguei. Ele suspirou, enquanto pensava sobre aquilo. — Por favor, eu juro que não vou tentar fugir, eu só quero comer devidamente.
— Está bem, mas, por favor, não tente nada, senão eu vou ser obrigado a te machucar, e eu não quero fazer isso. — Concordei veemente. Senti ele mexer nas cordas até que se afrouxassem e por fim estar com as mãos completamente livres. Massageei-as sentindo o sangue voltar a circular normalmente. Ele colocou a bandeja em cima do meu colo. Eu comecei a comer e percebi que se tratava de pão com mortadela.
— Obrigada. — Agradeci de boca cheia. Ele fez um gesto, como se dizendo que não era nada. – Você não é igual aos outros, por que se meteu nisso? — Me encarou.
— Você não entenderia os meus motivos, não quando não te falta nada na vida. — Deu de ombros.
— Você não sabe... Por que não tenta me contar? — O encarei e o senti ficar desconfortável, desviando os olhos.
— O dinheiro é para a minha mãe, preciso pagar o tratamento dela com câncer. — Quem estava desconfortável era eu naquele momento, entendendo seus motivos mais do que eu gostaria.
— Se eu estivesse na sua posição, faria as mesmas coisas. – Dei mais uma generosa mordida em meu lanche. — Família é família.
— Não esperava escutar isso de você. — Suspirei, tomando mais um pouco de água que despunha no copo.
— Você não me conhece, só sabe o que as pessoas dizem de mim. – Assentiu. — Sabe quanto tempo eu vou ficar trancafiada aqui?
— No máximo cinco dias, é o tempo de a gente partir e fugir os mais depressa da cidade, eu vou depositar a grana na conta da minha irmã. — Concordei. — A gente vai te soltar antes de chegarmos à divisa da cidade. Aguente firme.
— Aguento firme se me disser que só você vai entrar aqui, não quero ver aquelas máscaras na minha frente.
— Vou fazer o possível para que só eu entre aqui. — Mordi os lábios, concordando.
— Se nos conhecêssemos em outro momento, eu com certeza teria me interessado em você. — Não sei porquê, nem como, mas aquelas palavras pularam da minha boca. Onde eu estava com a cabeça para flertar com um dos meus sequestradores? Eu namorava!
— Você não sabe o que diz, . — o rapaz negou com a cabeça, mas pude visualizar um sorrisinho de lado surgir. — Bom, você já terminou. — Direcionou seus olhos a corda, e eu neguei com a cabeça.
— Por favor, não me amarra de novo, dói muito e a posição é desconfortável. — Respirou fundo.
— Se alguém entra aqui e ver que você está desamarrada, sobra para mim.
— , eu juro que não vou tentar nada, você está sendo sincero comigo desde o início e eu estou sendo sincera com você. — Me encarou profundamente, senti me exposta como nunca antes, aqueles olhos me examinavam de um jeito tão… Íntimo. Balbuciou algo que eu não entendi, provavelmente surpreso por eu saber seu nome.
— Não vou te amarrar, só não tente nada, . — Concordei. — E bom, se a gente estivesse em outra situação, eu já teria tentado te beijar, você é muito gata… — Pegou a bandeja e saiu e eu senti meu coração disparar, eu havia gostado de escutar aquilo.
Escutei a porta ranger alto, dessa vez meu sono estava mais leve e eu despertei com o barulho, mas fiquei quieta, e se não fosse ? Ontem tínhamos passado boa parte do dia conversando trivialidades, ele era um cara diferente, era tão fácil manter um diálogo com ele, parecia que nós conhecíamos há muito tempo. Que fosse ele, eu não podia lidar com nenhum daqueles caras e àquela mulher? Ela era tão cruel...
Senti dedos alisarem meus cabelos e soltei o ar que eu prendia ser solto aos poucos, só seria tão delicado naquele gesto. Fingi que dormia por mais um tempo para sentir o carinho por um pouco mais de tempo. Ele parou o movimento e balançou meu braço para me acordar, eu fingi surpresa quando o vi e cocei meus olhos.
— Oi. — Sorriu desajeitado, com a bandeja em seu colo. — O cardápio não é dos melhores, será pão com mortadela de novo.
— Oi! Eu como qualquer coisa, estou morta de fome, você nem tem noção. — Sorri agradecida. — Eu gosto de pão com mortadela, mas antes de comer, eu preciso ir ao banheiro, estou muito apertada.
— Claro. – Pegou o capuz do bolso da calça e me deu. — Coloca, e a gente sai para você usar o banheiro, mas não tente nenhuma gracinha, eu não quero te machucar, . — Concordei com a cabeça, toda vez que eu pedia para ir ao banheiro ele fazia aquela recomendação.
Eu queria tanto fugir, mas, ao mesmo tempo, ele estava sendo muito legal comigo. Suspirei fundo, colocando a porcaria daquele capuz. Eu iria ao banheiro e traçaria as minhas variáveis de fuga novamente, era assim desde que eu havia descoberto aquele cômodo. Ele segurou meu braço e saímos dali, seguimos por uma reta até ele parar, percebi que havíamos chegado. Ele tirou o capuz da minha cabeça e suspirei aliviada, sentia me sufocando com aquilo.
— Vou ficar de costas, sou um cavalheiro, eu juro. — Rolei meus olhos, entrando no cubículo, que não tinha porta para completar.
Uma janela pequena, apenas, mas definitivamente aquela era maior que a do meu quarto, estudei, pensando se caberia ou não ali. Talvez sim, era uma possibilidade, mas se eu conseguisse passar ali, eu me feriria. Usei o banheiro enquanto estudava o ambiente calada. Peguei o sabonete e tentei me higienizar da melhor forma que eu poderia e quando estava tudo ok, disse a que ele poderia se virar. Ele colocou a porcaria do capuz na minha cabeça, apurei minha audição para escutar qualquer coisa, mas nada, era provável que ao menos naquele andar do local éramos somente os dois, mas duvidava que ele estivesse sozinho comigo naquele lugar, era provável que seus companheiros estivessem em algum andar acima de nós. Quando eu cheguei, me lembro de ter descido alguns lances de escadas, então era provável que fosse o porão de uma casa, eu não saberia dizer com precisão... Chegamos ao quarto, ele tirou o capuz e eu voltei a respirar normalmente.
— Certo, talvez você também tenha fobia a esse capuz. — Acabei sorrindo.
— Não é fobia, eu só me sinto sufocada. — Mordi os lábios, sentando-me na cama e bebendo um gole de água. — E você é muito observador, .
— Seu corpo… Ele fica muito tenso. — Suspirei fundo, concordando. Peguei o pão e dei uma mordida. — Inclusive, conversamos tanto ontem e anteontem e eu realmente me esqueci de perguntar, como sabe meu nome?
— A moça falou seu nome no banheiro do banco. — Dei de ombros, voltando a comer.
— Ainda bem que foi só no banheiro, se algum refém tivesse escutado, eu poderia me dar mal. — Bufou. — Depois ela fala sobre amadorismo…
— Sabe do que eu mais preciso nessa vida? De um chuveiro. — Ele fez uma careta. — É, eu sei que isso não vai rolar, por isso me virei do jeito que eu consegui no banheiro.
— O chuveiro eu não vou poder providenciar, mas, bom, eu vi que seus ombros estão cheios de nós, eu poderia fazer uma massagem para aliviar a tensão, mas é claro, é só uma ideia. — Fiquei tensa, mas não senti seu gesto desrespeitoso, ou nem nada do tipo, e de repente ter suas mãos em meus ombros não me pareceu uma má ideia.
— Eu quero. — Desabotoei o macacão, desci as duas mangas do mesmo, tirei a blusa que utilizava e fiquei apenas de sutiã, afastei meus cabelos de meus ombros e senti suas mãos geladas tocarem minha pele, involuntariamente me arrepiei. Suspirei quando ele começou com movimentos, apertando a carne com delicadeza e a cada aperto eu guardava um gemido prazeroso. Definitivamente tudo o que eu precisava era uma massagem. — Uau, você sabe bem o que está fazendo.
— Não é querendo me gabar, mas eu já escutei isso algumas vezes. — Sorri. Eu já não tinha mais vontade de comer, aquela massagem estava me deixando extremamente bem.
— As milhares de garotas que devem ter dormido com você...
— Na verdade, não foram milhares, queria inclusive. — Pude escutar sua risada. Ele foi descendo as mãos pelas minhas costas e eu automaticamente as arqueei.
— Claro, sei... — Sussurrei, enquanto ainda recebia a massagem. Ele chegou no fim da minha coluna, foi subindo os movimentos até alcançar meus ombros novamente. Ele depositou um beijo ali e eu me arrepiei. Ele parou.
— Sua pele é tão macia, não pude resistir. — Molhei meus lábios que haviam ficado secos.
— Eu gostei. — Sem qualquer filtro eu soltei.
Eu não sabia o que estava acontecendo, meus sentimentos estavam tão bagunçados, deveria sentir repulsa, nojo, certo? Olha as condições que eu estava, presa em um quartinho imundo, com uma cama horrível, sem conseguir ver a luz do sol direito, nem sequer tomar um banho descente eu podia... Mas não, me sentia cada vez mais atraída por ele, eu não podia controlar, era muito forte. Me sentia tão viva por estar sentindo aqueles beijos que agora eram vários em minhas costas, minha frase foi só um pedido mudo para que ele continuasse, ele havia entendido bem a mensagem. A massagem já tinha parado, agora eram só os beijos cada vez mais intensos em meu pescoço, virei-me para trás o surpreendendo. O vi com os olhos nublados, pingavam desejo, ele me queria, ele precisava de mim, e eu mesmo sem saber como ou porquê, precisava ainda mais dele.
Contrariando qualquer sanidade que eu ainda poderia ter, o beijei. E Deus, não me arrependi, ele beijava muito bem, e eu o queria mais do que tudo. Sentei em seu colo, sentindo-me cada vez mais excitada, era muito intenso, enfiei minhas mãos dentro da blusa dele, a levantando. Partimos o beijo e comecei a distribuir beijos pelo seu pescoço e o senti cada vez mais excitado, eu rebolava em seu colo, o vendo reagir a aquilo.
Eu precisava que a gente fizesse amor, precisava sentir dentro de mim, e tinha que ser agora. Minhas mãos nervosas desceram para os botões do macacão que ele utilizava, macacão aberto, desci as mangas desesperadamente, o beijei novamente. Não demorou muito para que nossos corpos estivessem nus e suados naquele cubículo e gemidos fossem soltos por nós.
Quatro dias, seriam os piores dias da minha vida, não é? Errado, depois que eu havia ficado com , as coisas tomaram rumos inexplicáveis, eu estava gostando de estar com ele, de ter momentos com ele, que a ideia de fugir era tão absurda, eu não queria mais fugir, eu queria estar ali com ele. vinha mais vezes durante o dia e a maioria delas a gente se amava como nunca, e eu me sentia cada vez mais completa. Como agora, ele alisava meu cabelo depois de termos feito amor há alguns minutos.
— Amanhã você estará finalmente livre, está feliz? — Escutei ele sussurrar em meu ouvido, me arrepiei. Era tão bom estar em seus braços, eu não queria me afastar dele nunca mais.
— Não, porque vou ficar longe de você. — Escutei seu riso baixo. — Sabe o que eu queria de verdade?
— Não, o quê? — Me virei em sua direção e o encarei.
— Fugir com você, não tenho vontade nenhuma de voltar para a minha rotina, para minha casa sem graça.
— Você está louca, , é brincadeira, não? — Fechei minha face, bem séria. — Você está disposta a largar tudo por mim?
— Sim, eu estou apaixonada, eu não me vejo mais sem você. — Suspirei, incrédula, as palavras simplesmente saíam da minha boca e eram tão verdadeiras que me assustava tanto. — Eu quero ir com você, , por favor?
— Porra, , você tem certeza mesmo disso? — O joguei na cama, me deitei por cima dele e comecei a distribuir beijos por todo o seu rosto.
— Tenho, não quero nunca mais me separar de você, , nunca, nunca. — Ele trocou nossas posições e beijos quentes se iniciaram no meu pescoço, ele subiu os beijos e chegou na minha orelha. — Repete… — Mordeu o lóbulo da minha orelha.
— O quê? — Suspirei fundo, sentindo meu corpo em brasa.
— Aquele lance lá de paixão. — Soltou um risinho sensual, enquanto o sentia segurar meus cabelos com força.
— Que eu estou apaixonada? — Senti uma mordida na minha orelha. — Ah, eu estou mesmo apaixonada por você… — Mordi meus lábios e mais uma sessão de beijos quentes e corpos suados foi iniciada naquela tarde.
O dia que eu finalmente iria ver o Sol de novo, eu estava contente, finalmente tomaria um banho decente, e ainda tinha , o homem a qual eu nutria sentimentos, antes minha vida não tinha nenhum sentido, porque com certeza faltava ele comigo. Eu sei que a partir do momento que eu saísse daquele lugar com , muitas portas seriam fechadas e eu seria uma fugitiva da polícia, meus pais ficariam para trás e Bruce, Deus, meu namorado, coitado, eu com certeza o magoaria, mas eu tinha que ser egoísta.
Escutei o barulho da porta abrindo, e me mexi na cama com um pequeno sorriso, era , mas não estava sozinho, então eu me contive e apenas me sentei na cama.
— Você tem certeza, ? Tem certeza que você quer levar esse traste com você? Ela é chave de cadeia, a gente vai se separar e, a partir de agora, e é cada um por si. — Ele suspirou. Aquela mulher sabia bem jogar um balde água fria em qualquer pessoa. Desviei meu olhar, ela usava a porcaria da máscara.
— Nós já conversamos sobre isso, eu já te disse que ela quer ir comigo e ela vai, chega de contestar minhas decisões, como você mesmo disse, ela é minha responsabilidade à partir de agora. Nem o chefe ficou no meu pé! — Esbravejou, eu fiquei surpresa, nunca tinha o visto tão autoritário.
— Ok, , ok, não falo mais nada. — Suspirei fundo. — Só não diga que não avisei, ok? Vamos, patricinha, chegou seu momento de liberdade. — tinha a mão estendida em minha direção e eu a entrelacei com a minha.
Pelo que eu entendi, cada um iria para um canto após o roubo. O que me deixou extremamente intrigada foi eu estar no cativeiro por cinco dias, o ideal não seria que eles fugissem logo após o assalto? Como eles fariam para sair da cidade? Era meio óbvio que estariam procurando-os, mas então me toquei, não, não era óbvio, ninguém sabia a identidade deles. Me parecia o crime perfeito, mas não era, estava cheio de pontas soltas que eu viria a descobrir depois.
— Boa sorte, caras, e se um de nós for pego, não abre a boca, entendido? — Eles assentiram, e cada um foi para um veículo, segui , meio desacreditada ainda.
— Para onde vamos? — O questionei, curiosa.
— Eu ainda não faço ideia, mas não acho que seja bom que saiamos da cidade assim de imediato. — Suspirei. — Vamos ter que mudar seu visual, sua carinha é muito visada, . – Alisou meu rosto com um pequeno sorriso.
— Faço qualquer coisa, se essa coisa significar estar com você. — Eu estava tão louca por ele, meu Deus, eu nunca pensei que mudaria a cor do meu cabelo ou o cortasse por alguém. Meu cabelo sempre foi algo sagrado, sempre fui muito rígida a mudanças a ele, mas eu faria por , eu faria qualquer coisa por ele. Deus, eu faria mesmo.
— Eu sei que faz… E eu aprecio e muito isso. — Alisou meu rosto, e não demorou para que eu estivesse em seus braços novamente e compartilhássemos um longo beijo.
Seria insensível se não dissesse que todas as vezes que eu ligava a televisão me sentia extremamente angustiada ao ver o desespero de minha mãe à minha procura, meu pai com olheiras profundas na face, eu era a merda de uma filha ingrata no fim das contas. Bruce… Pobre, Bruce. No início foi fácil virar as costas a tudo e seguir cegamente a , mas agora não, eu sentia saudade da minha família, dos meus amigos, do meu cachorro…
Da gangue, somente haviam pego Pablo e Damian, ainda restavam , Paola e Carlos. É, eu já sabia o nome de todos. E eu ainda tinha achado que era o crime perfeito, mas não era, a polícia havia feito seu trabalho direito, e pegado bem os rastros de todos. Não era só a minha imagem que flutuava pelos noticiários, a de , Paola e Carlos também.
Havia um adendo, um dos dois havia aberto a boca, provavelmente por um acordo com a promotoria, e agora todos sabiam que eu havia ido com ele porque eu quis e eu também responderia para a justiça, eu não podia voltar mais atrás.
cada vez mais se mostrava diferente do rapaz que eu havia conhecido no banco, ele havia mudado sua aparência, mas não era só aquilo, ele estava mesmo diferente, e eu não gostava tanto daquela sua versão. Escutei o barulho da porta do quarto que estávamos abrir e o vi entrar bravo por ela.
— Toma, come. — Me estendeu uma sacola, lá havia algumas besteiras, salgadinhos, chocolates, refrigerante, cerveja, cigarro, peguei um salgadinho Fandangos e o abri. Era assim que a gente se alimentava, não sabia o que era uma refeição descente há tempos. — A polícia está cada vez mais no nosso rastro, porra. Você não pode sair desse quarto de jeito nenhum, . Pegaram o Carlos, porra, o Carlos!
— Eu não liguei a televisão hoje. — Murmurei, enquanto comia. começou a derrubar as coisas no chão.
— Para, por favor, se controla, o cara vai reclamar. — Me referia ao dono daquela espelunca que estávamos hospedados. Tentei me aproximar dele, para acalmá-lo, mas levei um empurrão e, com sua força, acabei caindo na cama e parando do outro lado dela. Havia batido meu braço no percurso e havia doído.
— Merda, me desculpa. — Se aproximou de mim, me tocou, e eu o repeli. — É tudo uma grande merda.
— Está tudo bem, não foi nada. – Suspirei me levantando da cama. — Precisamos sair daqui, não é mais seguro.
— E para onde vamos, inteligência? Se a gente cruzar essa fronteira agora seremos pegos, precisamos de novos documentos falsos. — Andava de um lado para o outro. Uma mania terrível que ele tinha quando ficava nervoso. — Um dos filhos da puta nos entregou, agora a minha foto também está estampada em todos os lugares, se eu tivesse sozinho, mas não, tive que ceder aos seus caprichos e te trazer atrás de mim, agora é um peso. — Mordi os lábios, tentando segurar as lágrimas, aquilo havia me magoado.
— Nossa, agora eu sou um peso… Obrigada, , eu amei saber disso. — Exasperei. Ele sentou-se na cama.
— É a mais pura verdade, mas não se sinta magoada, baby. Merda, não deveria descontar as coisas em você, me desculpa, vem, senta aqui. — Me levantei e me sentei na cama ao seu lado, cedendo. – Tudo que eu preciso agora é de uma boa dose de você, minha droguinha. — Senti seus beijos quentes em meu pescoço e esqueci por alguns momentos tudo o que havia acontecido há minutos, agarrando sua cintura com força. No fim, era o meu ali, ele só estava nervoso e quem podia culpá-lo, não é?
Olhei no relógio, eram duas e 37, e nada de voltar, será que eles haviam o pegado? Deus, se ele foi preso eu me entregaria sem pestanejar, nem via mais sentido em fugir. Escutei a porta ser aberta e suspirei fundo quando percebi pela silhueta que era ele, mas senti meu estômago embrulhar, ele fedia a cigarro e a cachaça barata. Encostei minha cabeça no travesseiro e fiquei quieta, não queria discutir com ele, não naquele estado em que ele estava. Sabe-se Deus o que poderia acontecer.
Três semanas que estávamos fugindo e era a primeira vez que ele havia parecido bêbado desse jeito, era provável que tenha sido porque Paola foi capturada naquela tarde. Fiquei imóvel e quando ele se deitou na cama, senti o cheiro de perfume barato de mulher também impregnado na sua blusa, pressionei meus olhos com força, ele havia me traído. Eu não podia reclamar, certo? Eu havia feito o mesmo com Brian, eu merecia, no fim. Mas doía, e como doía. passou o braço em minha cintura e eu prendi a respiração quando ele começou a beijar meu pescoço.
— Não, , eu não quero. — O empurrei, voltando a ficar de costas para ele, ele bufou alto e me abraçou novamente, agora com mais força.
— Eu só quero dormir abraçadinho com a minha droguinha, só isso, porra. Para de frescura, .
Suspirei, me deixando ser abraçada por ele, não tinha chances de empurrá-lo, ele era infinitamente mais forte que eu, e ele não me deixaria em paz, teria que aguentar aquele cheiro forte que vinha dele. Sua respiração pesada em minha nuca indicava que ele já havia dormido. Por um momento eu senti medo que ele tentasse algo a mais, mas não, ele já tinha transado aquela noite e aquilo foi um alívio, eu não sabia dizer não a , e agora eu percebia nitidamente que era um enorme problema.
Aquela devoção toda, eu não me sentia mais dona de mim, ele de alguma forma exercia um poder tão grande sobre mim, e era tão louco… O que era aquilo, meu Deus?! Eu não sabia explicar, só me sentia intimamente ligada a ele. Pisquei meus olhos e mais lágrimas saíram deles.
Pela primeira vez naquela jornada louca em que eu me encontrava, eu percebi meu conto de fadas ir morrendo aos poucos e a realidade me tomando de forma avassaladora. Mas agora já era tarde demais… Eu já estava perdida.
— De novo você vai se embebedar, ? Sério mesmo? E vai ficar com qualquer mulher que ver pela frente! — Mordi os lábios enquanto o olhava bem séria. Um mês e 10 dias que estávamos naquela loucura, fugindo feito loucos da polícia. Havíamos mudado de hotel e de cidade, tínhamos conseguido documentos falsos e, devido ao tempo de fuga, ficou mais fácil para conseguirmos entrar em Poço de Caldas, em Minas Gerais, sem sermos reconhecidos.
— Ah, por favor, , não seja louca, eu só bebo e pronto, preciso afogar as mágoas dessa vida de merda que a gente está tendo! Não tem mulher nenhuma! — Ralhou comigo.
— Só não bebe, você fica tão diferente e eu não gosto.
— Você não tem que gostar de nada, tem que ficar calada e na sua. Nunca te obriguei a vir atrás de mim, você que quis. — Mordi meus lábios, mais palavras duras direcionadas a mim, aquilo se tornava uma rotina...
— Eu estava apaixonada, não via sentido minha vida sem você, ! Quando você fala essas coisas, me magoa e muito! — O encarei chateada. Ficamos calados por um tempo, enquanto o via colocando a blusa, ele ia sair mesmo eu pedindo para que ele não o fizesse. Merda!
— Desculpa, droguinha, eu prometo que não falo mais, é só que eu fico puto quando você me fala essas coisas e eu acabo jogando tudo no ventilador. — Me olhou, e deu uma piscadinha.
Ele sempre pedia desculpas, e prometia não fazer, mas em todas as oportunidades que tinha esfregava aquilo na minha cara, me sentia relativamente mal com aquele pouco caso que ele fazia de mim, se eu estivesse ali ou não, talvez nem fizesse diferença para ele. Suspirei fundo, decidindo mudar de assunto, ele ia sair, e eu não ia conseguir impedi-lo.
— E sua mãe? — Perguntei de repente.
— Hum? — Me encarou com o cenho franzido pela mudança brusca de assunto.
— Sua mãe, como ela está? Você nunca tocou no assunto do lance do câncer dela. — Ele explodiu em risadas altas e eu o encarei de cenho franzido, qual era a porra da graça?
— Eu sou órfão, , fui criado em um orfanato. — Foi recuperando-se de seu riso.
— Você mentiu para mim, eu não acredito que você fez isso, , com esse tipo de coisa a gente nem brinca.
— Eu diria qualquer coisa para entrar no meio das suas pernas, . Eu menti mesmo, disse o que você queria ouvir, você queria um cara com motivos nobres para assaltar um banco e eu te dei. Mas, na verdade, eu assaltei porque eu quis. Você é ingênua demais. — Senti como se golpeassem meu estômago, estava boquiaberta, eu não acredito que ele havia feito isso comigo.
— Que mais você mentiu para mim? Seja sincero comigo pelo menos uma vez na sua merda de vida. — O encarei prestes a desmoronar.
— Não tenho irmã com medo de palhaços, eu nem tenho irmã, pelo menos que eu saiba. — Soltou uma risadinha debochada. — Ah, eu nunca fiz massagem em ninguém, só queria um motivo para enfiar minhas mãos em você, fiquei surpreso porque você gostou… No fundo você é uma bela safada, nem foi difícil.
— Cala a boca, chega, eu não quero mais ouvir nada. — Coloquei as minhas mãos sobre a boca, segurando-a. Ele deu de ombros, com um pequeno sorriso na face, eu diria que era zombeteiro. — Alguma coisa foi real naquele cativeiro? — Perguntei com um fio de voz.
— Eu gosto de você, , gostei de você desde que coloquei meus olhos em ti naquele banco. Isso é verdade. — Suspirei fundo.
— Você me ama? — O escutei respirar fundo. — Você nunca disse que me ama…
— Não estou aqui com você ainda? — Não era a resposta que eu queria ouvir, e me senti um lixo ainda maior. — Eu estou indo, não me espere acordada, senão vai se cansar. — Gargalhou, me deu um selinho e saiu.
Esperei uns segundos, dei uma rápida checada em minha roupa, peguei a chave reserva e saí atrás dele, eu não ia ficar sozinha naquele quarto hoje à noite.
O vi entrar no carro e sumir de minhas vistas, provavelmente ia encher a cara onde estava acostumado a ir e comer alguma mulher por aí, eu já não sentia mais nada diante daquilo, o que estava me doendo mais era saber que ele não me amava.
Eu fui andando sem rumo pelas ruas de Poço de Caldas, minha respiração estava descompassada, eu tentava respirar corretamente, mas eu não conseguia. Minhas mãos estavam suando frio, não, eu estava a ponto de surtar novamente. Vi um bar e corri até lá, chequei meus bolsos e percebi que tinha algum dinheiro. Eu precisava beber, aquilo ia me ajudar a lidar com tudo e eu ia beber como nunca havia bebido na minha vida, aquilo me ajudaria naquela crise de ansiedade ou ataque de pânico, eu já não sabia o que estava tendo.
Me aproximei do balcão, vi que havia dois velhos bebendo, e que me encararam de um jeito nojento. Os ignorei e me sentei no balcão.
Pedi um uísque, precisava de algo bem forte diante das malditas revelações daquela noite, suas palavras me acertaram como facadas no peito. Ele não podia ter feito aquilo comigo, não podia ter me enganado daquele jeito, me sentia tão... Desolada e muito, muito sozinha, como nunca me senti na vida. Grossas lágrimas descerem por minha face.
O rapaz me serviu novamente e eu o engoli de uma vez, pedindo por mais, enquanto ainda chorava copiosamente. Que merda de vida! Bebi em uma golada, e mais uma vez meu copo foi cheio naquela noite. Coloquei as mãos na boca, tentando conter o choro alto que queria escapar, eu já tinha olhares demais sobre mim, então eu precisava chorar calada. Bebi em um só gole, eu já não fazia mais careta, minha garganta estava se acostumando ao gosto do uísque. Pedi mais uma dose, minha cabeça já estava tonta, mas a bebida de alguma forma estava me acalmando, ficar bêbada era a minha melhor opção. Balancei o copo mais uma vez, clamando por mais álcool no meu organismo.
— Moça, você já bebeu demais, chega.
— Eu só preciso de mais, por favor? — Implorei para o senhor que me olhou com uma cara de pena. E eu quis rir, eu era digna de pena mesmo, havia largado tudo por um tremendo babaca! Na verdade a babaca era mesmo eu, ele nunca pediu para que eu o fizesse, eu fiz porque quis.
— Eu posso ligar para alguém te buscar aqui? — Escutei a voz dele e fechei meus olhos, de repente os abrir estava tornando-se uma tarefa difícil. O álcool fazendo seu efeito em mim.
— Me empresta o seu celular, por favor? Deixa que eu mesmo ligo. — Consegui falar. Ele sacou o celular e eu disquei os números que eu sabia de cor.
— Alô? — Suspirei fundo quando escutei a voz do outro lado da linha, e eu já não conseguia controlar meu choro. — Filha? Filha, meu Deus, é você! — Escutar sua voz era a coisa que eu mais precisava ouvir, e eu nem imaginava. — Meu amor, estou com tantas saudades! — Solucei alto. — Não chore, , eu estou aqui, querida, estou aqui. Volta para casa! — Pressionei meus olhos, doía tanto escutar sua voz chorosa, eu tinha feito aquilo nela. Eu fiz a minha mãe sofrer desse jeito, eu era um monstro.
— Mãe! — Consegui proferir. – Me ajuda! Eu preciso de ajuda. — Sussurrei derrotada. Eu só queria ir para casa, eu só queria minha mãe.
Eu estava tão confusa, tão bagunçada, já não sabia mais o que era certo, o que era errado, eu só queria estar com a minha mãe, eu só queria que ela me ajudasse, eu precisava de ajuda.
Eu só queria que as coisas fizessem algum sentido na minha cabeça e no meu coração, elas precisavam fazer sentido dentro de mim. Eu estava destruída e sabia que as próximas palavras que eu proferisse seriam a minha ruína e a de , mas eu não conseguia mais… Eu não podia mais viver daquele jeito, eu não podia mais viver aquele verão cruel, aquilo precisava acabar.
Epílogo
Me revirei na cama, suspirando fundo, já fazia quase quatro anos depois de todo aquele verão cruel. Eu havia passado seis meses em uma clínica de reabilitação, foi preciso me internar, afinal, eu estava doente mesmo. Síndrome de Estocolmo, mas uma doença para o meu extenso histórico médico... Foi com aquele laudo da psiquiatra e do psicólogo forense que eu consegui ser inocentada das minhas acusações, ser filha da prefeita também pesava e muito, isso era um fato.
Meu ex-namorado não quis olhar na minha cara, eu o havia traído em rede nacional, sendo doença ou não, ele tinha total razão. Desde então eu havia dado um tempo para mim, eu estava muito bem sozinha, a gente tem que saber quando é o momento de estar só.
Decidi levantar da minha cama, fui ao banheiro fazer minha higiene matinal e pegar meus dois remédios controlados de tarja preta que eu bebia desde então, as minhas crises de pânico ficaram constantes depois que eu havia voltado para casa, eu não podia mais parar de tomar aquilo, e toda semana tinha minhas consultas com psicólogo e psiquiatra. Sequelas de tudo no fim das contas, mas tudo bem, eu estava conseguindo lidar com aquilo.
Desci as escadas, pronta para tomar café da manhã com meus pais que já o faziam naquele momento, mas tudo o que eu encontrei na sala foi um entra e sai de pessoas, e minha mãe conversando impaciente ao telefone. Franzi o cenho, o que estava acontecendo?
— Mãe? O que houve? — Me aproximei dela assim que ela desligou o telefone. Ela me abraçou apertado, e eu retribui com a mesma fervura.
— Meu amor, presta atenção em mim. — Me encarou séria. — fugiu da cadeia ontem à noite. — Arfei, sentindo uma tontura forte, me segurei em minha mãe com força, ela me direcionou até o sofá e eu me sentei. Meu Deus, meu Deus!
— Ele vai vir atrás de mim, mãe, eu estou ferrada, ele vai me matar… — Segurei as mãos na boca, apavorada.
— Eu sei, querida, ele vem atrás de você, e eu não quero que aconteça nada contigo, ok? É por isso que a partir de agora você vai ter um segurança particular. — A abracei apertadamente. — Antônio, traga-o por favor. Vi o assessor da minha mãe sumir das minhas vistas, abaixei meu olhar ao chão, eu tremia dos pés à cabeça.
— Filha. — Chamou minha atenção para si. — Esse é o , ele será seu segurança pessoal. — Suspirei fundo, o encarando, ele balançou a cabeça positivamente, me cumprimentando, e eu só consegui olhá-lo, sem qualquer reação. Desviei meus olhos dele, e senti meu rosto molhado, eu já chorava sem nem perceber. Eu não estava pronta para rever . Eu nunca estaria.
Meu ex-namorado não quis olhar na minha cara, eu o havia traído em rede nacional, sendo doença ou não, ele tinha total razão. Desde então eu havia dado um tempo para mim, eu estava muito bem sozinha, a gente tem que saber quando é o momento de estar só.
Decidi levantar da minha cama, fui ao banheiro fazer minha higiene matinal e pegar meus dois remédios controlados de tarja preta que eu bebia desde então, as minhas crises de pânico ficaram constantes depois que eu havia voltado para casa, eu não podia mais parar de tomar aquilo, e toda semana tinha minhas consultas com psicólogo e psiquiatra. Sequelas de tudo no fim das contas, mas tudo bem, eu estava conseguindo lidar com aquilo.
Desci as escadas, pronta para tomar café da manhã com meus pais que já o faziam naquele momento, mas tudo o que eu encontrei na sala foi um entra e sai de pessoas, e minha mãe conversando impaciente ao telefone. Franzi o cenho, o que estava acontecendo?
— Mãe? O que houve? — Me aproximei dela assim que ela desligou o telefone. Ela me abraçou apertado, e eu retribui com a mesma fervura.
— Meu amor, presta atenção em mim. — Me encarou séria. — fugiu da cadeia ontem à noite. — Arfei, sentindo uma tontura forte, me segurei em minha mãe com força, ela me direcionou até o sofá e eu me sentei. Meu Deus, meu Deus!
— Ele vai vir atrás de mim, mãe, eu estou ferrada, ele vai me matar… — Segurei as mãos na boca, apavorada.
— Eu sei, querida, ele vem atrás de você, e eu não quero que aconteça nada contigo, ok? É por isso que a partir de agora você vai ter um segurança particular. — A abracei apertadamente. — Antônio, traga-o por favor. Vi o assessor da minha mãe sumir das minhas vistas, abaixei meu olhar ao chão, eu tremia dos pés à cabeça.
— Filha. — Chamou minha atenção para si. — Esse é o , ele será seu segurança pessoal. — Suspirei fundo, o encarando, ele balançou a cabeça positivamente, me cumprimentando, e eu só consegui olhá-lo, sem qualquer reação. Desviei meus olhos dele, e senti meu rosto molhado, eu já chorava sem nem perceber. Eu não estava pronta para rever . Eu nunca estaria.
Fim.
Nota da autora: Eu nunca penei tanto para desenvolver uma história como nessa, meu Deus! Minhas amigas que me aguentaram e muito com o surto que eu tive quando peguei a música mais complexa desse álbum (Obrigada Lari, Lê e Flá), fiquei sem ideia do que fazer com ela… Até surgir uma luzinha no fim do túnel.
Li bastante coisas sobre a doença, tentei mostrar em cada momento ela mudando sua visão com relação ao sequestrador e romantizando o seu comportamento e suas ações, inclusive a fic está cheia de itálicos para frisar mesmo, (por isso foi tão importante ter sido narrado por ela) ela confundido todos os seus sentimentos, sentindo-se pertencer a ele, as intensas emoções, enfim… Mas só para deixar claro, o que ela sentia por ele é uma doença, por Deus, não shipem os dois!!!!
Enquanto eu a escrevia, resolvi que lhe daria uma continuação, afinal, depois de tanto sofrimento, essa pp merece ter um final feliz, por isso somente no epílogo eu cito o nome do pp. Anotem aí, caso tiverem interesse, a continuação vem na música 05. Ensenãme do ficstape do RBD.
Nossa, já ficou muito grande isso aqui, quero agradecer muito a quem leu a história, obrigada mesmo. Se gostou, deixa ai nos comentários sua opinião. Entra no grupo do Facebook que eu vou avisar por lá quando a continuação entrar no site. Um beijo!
Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Li bastante coisas sobre a doença, tentei mostrar em cada momento ela mudando sua visão com relação ao sequestrador e romantizando o seu comportamento e suas ações, inclusive a fic está cheia de itálicos para frisar mesmo, (por isso foi tão importante ter sido narrado por ela) ela confundido todos os seus sentimentos, sentindo-se pertencer a ele, as intensas emoções, enfim… Mas só para deixar claro, o que ela sentia por ele é uma doença, por Deus, não shipem os dois!!!!
Enquanto eu a escrevia, resolvi que lhe daria uma continuação, afinal, depois de tanto sofrimento, essa pp merece ter um final feliz, por isso somente no epílogo eu cito o nome do pp. Anotem aí, caso tiverem interesse, a continuação vem na música 05. Ensenãme do ficstape do RBD.
Nossa, já ficou muito grande isso aqui, quero agradecer muito a quem leu a história, obrigada mesmo. Se gostou, deixa ai nos comentários sua opinião. Entra no grupo do Facebook que eu vou avisar por lá quando a continuação entrar no site. Um beijo!