Capítulo Único
Eram 22h15 quando o garçom do White Hart, em Stoke Newington, entregou mais dois pints a um rapaz e uma moça que se acabavam de rir e se engraçavam à sua frente, do outro lado do balcão. Haviam brevemente se desmembrado do grupo com quem sentavam para fumarem do lado de fora, antes de voltarem até ele, o guardião da fonte da alegria.
O relógio virou para as 22h17 e, ao tirar outra dose, reparou na garota para quem entregara um dos pints dois minutos atrás, largando-o na mesa onde se agrupavam os amigos, puxando seu par pela mão, após berrar de entusiasmo assim que o responsável pela mesa do karaokê anunciou:
- e , o palco é de vocês!
O pessoal que se aglomerava ao redor do palco (que na verdade era um carpete sob dois pedestais de microfone em frente a uma TV) pirou quando a introdução de “Wasn’t Me”, do Shaggy, um clássico dos anos 2000, começou a rolar. Parte da turma dos dois que ficara na mesa se aproximou para acompanhar.
- Yo man - ela começou a cantar primeiro.
- Yo - ele a seguiu.
- Open up, man!
- What do you want, man?
Mal haviam iniciado seu número e , a garota de blusa listrada e jeans preto que protagonizava o espetáculo, já se segurava para conseguir continuar a cantar sem rir. Seguia com sua parte recorrendo ao auxílio das palavras que mudavam de cor assim que deviam ser entoadas, tomando cuidado para se manter no ritmo.
Seu esforço valeu por pouco tempo: foi impossível conter a gargalhada quando , o rapaz alto com quem dividia o show, entrou com a parte de Shaggy, imitando o sotaque jamaicano do intérprete original. Ao redor, algumas pessoas foram automaticamente contagiadas pelo mesmo espírito de e desabaram a rir.
Tropeçando nas palavras - que obviamente não sabia de cor, apesar do sucesso do tema que ele mesmo havia escolhido -, emendava qualquer som parecido na frase ou rimava qualquer outra palavra que lhe vinha à cabeça, quase deixando-a sem ar para cantar sua metade quando chegou sua vez.
Influenciada pela palhaçada que ele botava em ação, começou a imitar trejeitos de rapper e interpretar cada frase que entoava com a expressão equivalente a de um cara que havia sido flagrado com a amante pela mulher, assim como dizia a letra.
- But she caught me on the counter!
- It wasn’t me!
- Saw me bangin' on the sofa! - Ela tentava assemelhar a voz à do cantor oficial, assim como , enquanto o via arriscar uns passos de dança caricatos, repetindo “It wasn’t me” a cada verso do pré-refrão que ela terminava.
Era difícil se concentrar na letra com tanto alarde acontecendo e ambos terminavam por se atrasar na cadência da música, mas eram apoiados pelos amigos que faziam a maior algazarra com berros e assobios.
Quem sabia, cantava junto. Acontece que ninguém sabia direito, então todo mundo só interagia com o famigerado “embromation”. Havia gente filmando e tirando foto, mas não se incomodou com isso. No máximo, acordaria no dia seguinte na companhia de sua ressaca e um vídeo do momento circulando no Youtube para divertir os fãs mais aficionados, além de uma manchete inútil no Daily Mail ou The Sun, provavelmente dizendo “Mudança de estilo? Vocalista do The Bloody Cheeky é flagrado cantando rap dos anos 2000 em pub de Stoke Newington na companhia de apresentadora da Absolute Radio”. Puro entretenimento barato.
Assim que ela finalizou a última estrofe da canção, durante as últimas notas da melodia, as palmas vieram e os assobios dobraram. a puxou para si pelo ombro, prendeu-a em um meio abraço e beijou sua bochecha antes de se curvar para agradecer os outros bêbados do local.
Seus rostos eram pura euforia e pileque, combinação que estava presente na expressão de quase todo mundo ali, e permaneceu na dos dois o resto de tempo em que se mantiveram no bar.
Ao terminarem o pint que haviam deixado na mesa, deram vez a outro. Uma vez vazios os copos, saíram com a desculpa de que iriam fumar novamente, mas decidiram por ir embora à francesa.
Garoava fino, como de praxe na capital Inglesa. Cobrindo a cabeça com o gorro do casaco impermeável, o item mais indispensável na vida de qualquer cidadão londrino que havia negligenciado e substituído por uma jaqueta de couro, eles caminharam, com cigarros pendendo na boca, em direção ao kebab shop mais próximo, deixando os amigos de para trás.
No meio do caminho, teve de acender o seu cigarro mais uma vez, porque fumar debaixo de água caindo do céu e ventos revoltos é sempre uma ideia burra, mas essa é a vida de quem insiste em sustentar o vício do tabaco em Londres.
- Eu realmente preciso ir logo - disse já com a boca preenchida pelo último pedaço de seu kebab, caçando um guardanapo para esfregar os dedos engordurados.
- Pra minha casa? - arqueou as sobrancelhas e mordeu um pedaço do seu. - Também acho.
rolou os olhos, jogando o papel em que limpara os dedos no balcão e chutou por baixo desse.
- Já disse que tenho reunião amanhã de manhã, não posso ir dormir muito tarde. - Ela bebeu um gole de sua Coca-Cola.
- E quem disse que se você for pra minha casa vai dormir tarde?
- E alguma vez em que dormimos juntos a gente não dorme tarde?
Ele roubou a lata de refrigerante da mão dela e o tomou, antes de responder:
- Sim, quando a gente dorme cedo.
- Meu Deus, como você é besta! - Ela riu sem muita emoção. - E quando isso aconteceu?
- Não sei, não lembro. - Ele deu de ombros. - Mas pode ser hoje, que tal?
Ela moveu a cabeça em negação, roubou a lata de volta, deu mais um gole e a estendeu novamente a ele.
- Toma, quer matar?
Ele aceitou e derramou o que restava do líquido na boca, ao passo em que ela se levantava.
a seguiu para o lado de fora, ambos tentando relevar o aperto e as pequenas colisões com quem fazia pedidos no caixa, comia em pé ou se esforçava para entrar no lugar abarrotado. Alguns olhos paravam nele mais tempo do que o normal, quando o reconheciam por conta da banda, mas ninguém o abordou ali.
- Vai de metrô? - ele perguntou, cruzando os dedos nos dela folgadamente.
- Nah, vou pegar um táxi, tô com preguiça. - Ela estreitou o enlace das mãos e levou-as às costas, aproximando-se para um selinho.
- Tá - concordou, sem entusiasmo, quase mórbido e contraditoriamente ao que seu rosto transmitia, beijou-a com uma profundidade que a pegou de surpresa, amassando um lado de seus cabelos.
Soltaram-se. viu um táxi vindo em sua direção no mesmo instante, o sinal amarelo aceso. Chacoalhou a mão no ar para chamar o motorista.
- Me avisa quando chegar? - pediu assim que o carro parou ao lado deles.
Ela assentiu, sorrindo com os lábios. Ele lhe deu outro selinho e num gesto de cavalheirismo tão ensaiado que a fez rir pelo nariz, abriu a porta para que ela entrasse. Estava pronta para fazer uma piada quando escutou o baque da porta, viu-o correr para o outro lado do carro e entrar pelo lado oposto, esbaforido. Sua língua afiada nem precisou se preparar para protestar, mas ele foi mais rápido:
- 37, Camden Road - disse ao motorista seu endereço.
- ! - Ela lhe deu um tapa no ombro, sem muita força. - Moço, por favor…
- 37, Camden Road, senhor, por favor - Ele repetiu.
- Senhorita, este homem está te assediando? - O motorista de táxi indagou preocupado.
- O quê? - reagiu, repentinamente indignado, ao mesmo tempo em que emendava uma resposta:
- Não, senhor, é só que…
- Tem certeza? - Ela via os olhos do taxista encarando-a pelo retrovisor.
- Tenho - suspirou. - 37, Camden Road, por favor.
Ao ter a informação reforçada, o senhorzinho indiano e atarracado saiu do lugar com o carro. ficou um pouco bravo por ter sido confundido com Jack, o Estripador, mas deixou para lá. Se bem que, pela idade do homem ao volante, o que não esperava mesmo era ser reconhecido pelo seu trabalho.
- Não fica brava! - Ele olhava para , que via a cidade passar pela janela com um leve bico. - Quero te mostrar uma coisa!
- Acho bom valer a pena - Ela retrucou, irritada.
- Vou deixar você dormir cedo, juro - ele prometeu. Ela lhe lançou um olhar enviesado, repleto de desdém e logo depois voltou a atenção para a paisagem borrada.
Afetado pelo humor desgostoso da passageira ao seu lado, preferiu se calar durante o resto da viagem para não deixá-la ainda mais emburrada. Do jeito que era um rojão, era capaz de ela sair do carro em movimento se ele ousasse emitir mais um piu.
e não programaram sair naquela noite. Ele havia ligado para ela mencionando que estava indo ao pub com uns amigos, perguntando se ela gostaria de se juntar. foi sincera, dizendo que não podia, sem dar detalhes do porquê. Sem temer o frio na barriga ao supor o motivo, ele insistiu, já por mensagem. Sem esconder o mínimo sinal de irritabilidade, ela lhe deu um não definitivo, antes de parar de responder. Ele merecia.
Mais tarde, já conformado, a viu aparecer no bar como uma visão em câmera lenta - para ele, foi equivalente ao ver Pamela Anderson correndo de maiô vermelho na TV, em Baywatch quando era criança: sentiu a mesma pontada no peito. Mas era só cortando espaço entre as pessoas no bar para chegar onde ele estava, destilando um papinho safado de que decidira que estava precisando beber um pouco.
A verdade que a cara-de-pau dela omitia era que fora até lá porque estava meio que sentindo falta dele, embora tivesse outras coisas para fazer da vida. Perto de completar uma semana e meia que não se viam, esse era um recorde dos últimos tempos e ela achou que seria mais forte, mas se tinha uma coisa que ela dificilmente conseguia resistir era um convite repentino para beber. Ultimamente, era ainda mais difícil se vinha incluído no pacote.
Mas é claro que ela não daria o braço a torcer.
No elevador para o quinto andar, ele pousou as mãos sobre a cintura dela, que se escorava em uma das paredes.
- Vem aqui, que eu vou desmanchar esse bico - disse, subindo os dedos para algum ponto sensível perto de sua axila, o que a fez rir instantaneamente.
- Sai! - Empurrou-o assim que a porta do elevador deslizou para a direita. - Inferno de homem! - xingou, rindo contra a própria vontade.
Ele voltou a tocá-la no mesmo lugar e a risada se tornou mais escandalosa enquanto ela lutava para se desvencilhar de suas garras.
- Sai, diabo! Abre a porta logo!
Assim que a passagem foi liberada, entrou na frente e teve sua tentativa de colocar o casaco no gancho perto da entrada frustrada ao ser prontamente agarrada por trás por que, sem nem girar o trinco, saiu tropeçando nela sala afora até pararem no sofá que havia ali, fungando em seu pescoço.
- Então, o que você quer me mostrar? - ela questionou ao se jogar de costas no móvel, largando o celular de canto em uma mesa ao lado e pegando uma caixinha de metal que estava ali.
A cabeça de agora repousava em seu peito e ele respirava tranquilo, os olhos fechados, parecia um bebê cansado, ela pensou. De vez em quando, dependendo do ângulo que olhasse e da posição de seu cabelo, sua fisionomia adquiria um ar juvenil que lhe dava vontade de esmiuçá-lo de tão lindo.
- Fiquei com preguiça - ele murmurou.
- Ah, pelo amor de Deus! - ralhou, elevando o tronco e ficando sentada, obrigando-o a fazer o mesmo.
se levantou num pulo e foi até a geladeira.
- Quer beber algo? - perguntou, já a vendo começar a desintegrar na mão a bolota verde e disforme que havia tirado do recipiente de metal.
- Quero um dichavador! - ela reclamou.
- Perdi, desculpa - ele disse, tirando duas latas de cerveja da geladeira. - Acho que deixei na casa do Craig. Quer? - Ofereceu a ela uma, chegando mais perto.
- Quero, obrigada - ela aceitou aquela que ele já havia aberto e ele a colocou na mesa próxima dela. - E aí, cadê?
- Então… - alongou a última sílaba e se deslocou para pegar o violão jogado em outro canto do cômodo. - Eu fiz uma música nova, queria te mostrar.
- Mas olha! - ela exclamou, surpresa. Estava esperando que fosse qualquer outra coisa, como algum pedal novo de guitarra que havia comprado, algum item de decoração temático de filme, um lagarto de estimação recém adquirido, uma planta carnívora, um tamagochi desenterrado dos anos 90, qualquer coisa, menos aquilo. - Que legal! Me mostra, sim!
Com o violão apoiado na perna, sentado na ponta do sofá, ele começou a bater nas cordas a introdução. Ela continuou a dichavar a planta, mas se esforçou para manter a visão nele na maior parte do tempo.
Junk of the heart is junk in my mind
So hard to leave you all alone
We get so drunk that we can hardly see
What use is that to you and me baby?
Assim que ele abriu a boca, ela sentiu como se estivesse despencando de uma altura de cem metros, amarrada a um desses brinquedos de elevador dos parques de diversão. E nem havia puxado um ainda! Era ele começar a cantar (a sério, e não imitando o Shaggy no karaokê) para que ela se sentisse totalmente desarmada, fraca, como se não comesse há dias. Quando ele imitava o Shaggy no karaokê, ela também sentia coisas, mas eram mais do tipo querer ter um controle remoto de cenas da vida real para voltar o momento quantas vezes quisesse revivê-lo, e não vontade de tirar a roupa e sentar em cima dele até não ter mais forças para mover o dedo mindinho.
(...)
We sink to be sunk, life is no race
When, I'm not happy, I'm in disgrace
So I spend time guessing on you oh
You're a lover of the wild and a joker of the heart
But are you mine?
Na segunda parte, após o primeiro refrão, um alerta acendeu na cabeça de , lhe avisando de que aquela música não era só mais uma música sobre uma relação qualquer com uma fulana que ele trombara na esquina. Era sobre a convivência entre os dois seres humanos que ocupavam a sala do apartamento 51B do número 37 da Camden Road naquele momento.
E o que diabos ele queria dizer com “Mas você é minha?”. Essa frase lhe dava arrepios! Estava entrando em pânico. Se ele não parasse, criaria asas e sairia voando pela janela.
I wanna make you happy
I wanna make you feel alive
Let me make you happy
I wanna make you feel alive at night
I wanna make you happy
If you're a good girl tonight
Sem contar a parte em que falava que queria fazê-la feliz. fechava os olhos no trecho mais agudo em que cantava isso. Puta que pariu, como é que ela ia conseguir correr com ele fazendo essas coisas? Era só ele se mexer de um jeito mais particular e as raízes que sua bunda criava no sofá se alimentavam e se fortaleciam.
Ele já a fazia feliz, será que ela não deixava isso claro? Por que mais ela continuaria na companhia dele esse tempo todo? Como ele achava que poderia fazê-la mais feliz? Porque ela sinceramente não via como.
Fazia onze meses que haviam ficado pela primeira vez em uma festa de um amigo em comum. Nesse meio tempo, haviam se trombado em premiações, shows, mil outras house parties. Na maior parte dessas ocasiões, acabavam a noite emaranhados um no outro. Em outras poucas, acabaram enroscados em corpos diferentes. No final das contas, sempre deixava uma sensação de desperdício. Não era ruim, apenas não era tão divertido quanto quando iam para casa juntos.
Era inegável que havia uma troca de energia diferente ali, não perceptível apenas entre eles, mas por quem lhes fazia companhia nessas ocasiões também.
Era incrível como suas bocas se encaixavam como se fossem peças pré-fabricadas para isso, como seus corpos pareciam se deformar para tomarem a forma do outro e especialmente raro o quanto entendiam exatamente o que cada um queria na cama, sem precisar ficar ensinando muito, falando ou pilotando mãos e movimentos em demasia.
Se havia uma coisa que não podia dizer era que não havia pulado de cama em cama (e outros lugares mais desconfortáveis) nos últimos três anos solteira. E, nesse tempo, ele era o único com quem havia experienciado tamanha troca. Essa era a palavra-chave: troca. Havia topado com caras bons no sexo, bons de papo, bons em entretê-la. Dentre esses, uns pareciam uma capa de revista ambulante e outros que pareciam ter acabado de sair de uma centrífuga, mas com nenhum deles havia experienciado tanta comuta.
Do outro lado, havia , vocalista de uma das bandas mais em alta no Reino Unido. Enquanto sua música rendesse, garotas nunca seriam um problema. Ele tinha uma guitarra na mão, uma voz de fazer cair a calcinha, tinha dinheiro e, acima de tudo, era um cara legal. Mulheres estavam para ele como baratas estavam para bueiros.
Esse era o fator que mais colaborava para que soubessem, cada um em seu mundinho, que qualquer coisa que estivessem vivendo não carregava um nível de congruência normal. Só de olhar um para a cara do outro sentiam uma espécie de eletricidade, um dinamismo, como se houvessem fios transparentes de uma energia deliciosa os conectando. Havia ainda o fato de fazerem rir um ao outro tanto que, por vezes, chegava a ser irritante pra quem acompanhava.
, no entanto, sempre havia sido o mais pró-ativo. Corria muito mais atrás dela do que o contrário. Era quase sempre ele que iniciava as conversas por mensagem, que a chamava para sair, que dava um jeito de estar nos lugares que sabia que ela estaria também. Havia ficado meio que obcecado por desde a noite em que a beijara pela primeira vez. Esse não era um comportamento que se lembrava de ter tido antes.
Still I notice nothing makes you shatter no no
You're a lover of the wild and a joker of the heart
But are you mine?
Ah, porra. Estavam de novo beirando uma conversa da qual ela tinha pavor e adorava evitar. já tentara abordar o assunto em mil e um momentos no último mês: depois de darem uma - ofegantes e fumantes -, em jantares, assistindo a algum filme e até quando ela estava vomitando na privada dele depois de encher o rabo de gin, com ele tolamente tentando segurar seu cabelo quando mal conseguia parar em pé.
Sempre fazia uso de indiretas para ver se acendia nela alguma fagulha de incentivo para conversarem sobre o que tinham, mas ela nunca havia caído em sua armadilha. Não porque via um problema no ato de discutir relações em si, entendia que isso era praticamente intrínseco a uma vida adulta a dois. Seu verdadeiro receio tinha a ver com possivelmente estragar a sua com ele ao se renderem a isso.
E, agora, ele estava lá, praticamente lhe fazendo uma serenata, implorando para saber se ela queria ficar com ele de verdade. Só com ele. Como diabos ela ia fugir da conversa e continuar sendo considerada uma pessoa com coração pela sociedade diante de um derrame sentimental daquele?
Como sempre: fazendo a sonsa e fingindo que não era consigo. Ao mesmo tempo em que se sentia morta de lisonjeada e não via a hora de poder dizer para os outros que tinha sido musa inspiradora de uma música que tocava mundo afora para seus amigos e, mais pra frente, netos, queria sair correndo dali chutando a porta e tudo só para não ter de encarar o que vinha no combo.
- I wanna make you happy if you're a good girl tonight - cantou o último verso e se recostou de volta no estofado, esperando por alguma reação da dona dos globos oculares vidrados à sua frente, lhe encarando como se ele fosse uma alma penada.
- É isso! - ele forçou uma brecha, apoiando o braço do violão na beirada do sofá.
- Ficou ótima! - ela comentou, de repente voltando à vida, ainda um pouco zonza com a singela quantidade de informação que a canção havia lhe presenteado. Acabara de perceber que tinha parado de enrolar o baseado no meio do processo, largando o que havia feito na mesa de canto ao lado da caixinha e de seu celular. Tinha praticamente bebido quase toda a cerveja enquanto ele se apresentava, a sala tinha virado um forno de uma hora para a outra, ele tinha de dar um jeito no aquecedor daquele apartamento! - Fala de um assunto delicado, mas não é uma música triste, sabe? Acho que o que mais amei foi a introdução - ela viu a testa de se franzir numa tentativa de dar conta de processar sua dissimulação. - Definitivamente merece um lugar no próximo disco.
E ele merecia um lugar no céu por se propor a lidar com aquela mulher.
O rapaz ficou em silêncio por alguns segundos, tentando absorver o comentário ordinário de quem andava ocupando seus pensamentos mais do que trabalho nos últimos tempos. Ordinário não porque não fazia sentido, mas porque esperava muito mais.
- É sério isso? - ele soou levemente indignado, após um breve momento a encarando. - Você tá falando sério?
- É claro que eu tô! - Ela sentia o calor estranho crescer, mas agora percebia que ele vinha de seu corpo, e não de aquecedores desregulados. Não sabia se era de constrangimento pela situação ou de ansiedade em não querer estar passando por ela, mas meio que não ter por onde fugir. - Por que eu mentiria? Uma puta música dessas tem de estar no álbum com certeza!
- Eu não tô falando disso, - ele foi direto e reto. - Você entendeu que...
- Eu preciso ir ao banheiro - interrompeu-o, levantando-se do nada, e viu o rosto dele despencar em frustração. - Tô apertadíssima, espera aí.
a viu se retirar para o corredor à sua esquerda, deixando-o sozinho no sofá, afogado em desilusão. Não era daquele jeito que havia imaginado a cena quando a planejara minuciosamente em sua cabeça. Que roteiristas sua vida andava contratando? Francamente! Ela tinha de ceder em algum momento!
Passou as mãos pelo rosto, bufando antes de enfiar a cara com vontade nas almofadas e grunhir.
Sempre que tentava conversar com sobre o que sentia, ela dava um jeito de escapar e encerrar o assunto, deixando-o literalmente do jeito que ele descrevia na música: se perguntando sobre o que ela queria dele e da vida que levavam. Mas ele não ia deixar que ela escapasse deslizando feito cobra pelo mato mais uma vez. Não hoje.
Tinha a impressão de que estava se desgastando e se desrespeitando cada vez mais por causa dela. A liberdade para ficar com quem quisesse, que ela tinha todo o direito de ter, estava testando sua saúde mental e ele não conseguia mais fingir normalidade ao sequer sentir no ar que ela estava saindo com outros caras.
Esporádico era uma palavra que recentemente perdera espaço entre os dois. Estavam sempre batendo ponto um na casa do outro, colavam juntos nos rolês dos amigos em comum, e esses já os consideravam um casal, tanto que eram alvo de altas piadinhas sempre que apareciam nas festas de mãos dadas.
Além disso, passaram a conhecer os amigos um do outro que antes não conheciam e estavam sempre indo jantar ou beber de última hora. Acordavam entrelaçados mais de uma vez por semana, o único limite eram suas vontades, que andava meio relutante em cessar. No entanto, isso não significava que a história de acordar com outros havia chegado ao fim.
E era exatamente isso que vinha incomodando . Ele não estava satisfeito que fosse só mais um caso qualquer rolando ali, já não era só mais uma foda para ele fazia tempo. Queria dar uma configuração maior ao seu relacionamento com ela, enquanto não via a mínima necessidade, ou se mostrava muito mais desinteressada na possibilidade de iniciar uma nova fase em comparação a si.
Foi pensar nisso e o celular dela vibrou, fazendo-o se sobressaltar ao indício de uma nova mensagem. Mais dois toques rápidos se seguiram e ele não resistiu: esticou-se no sofá para bisbilhotar o aparelho por cima, sem tocá-lo
Sentiu seu coração ir parar nas costas ao ver piscando ali o nome de Nolan.
Nolan era um cara com quem saía bastante. Ele já o vira uma vez no backstage de um festival, no dia em que transaram no camarim da banda que tocava no palco. Só descobriu que aquele era o tal do Nolan meses depois, quando curtiu uma foto dela no Instagram em que ele aparecia marcado em meio a um monte de rostos.
11:30pm
“Saio daqui em 30. Quer ir, já?”
“Acho que conseguimos chegar juntos!” 11:31pm
“E, linda, por favor, pensa no sabor da pizza que vai querer já no caminho ok? <3”
tinha em sua vida inúmeras versões femininas de um Nolan: garotas com quem saía sempre que dava na telha. O problema era: não fazia mais questão delas. Era legal ser desejado? Era. Era o máximo ter a mulher que quisesse já pelada na cama dele quando mal havia dito o “tudo bem?” depois do “oi”? Era um privilégio. Mas, no final das contas, que tipo de privilégio? Criaria um hábito tão horroroso de comparar todas à que lhe revirava o estômago de tão injusto. Entediava-se fácil com as outras. Uma a uma, elas iam se tornando nada mais do que uma razão de ele ter menos espaço na cama para esticar as pernas para dormir. O que era um belo de um saco, porque não conseguia ser canalha o suficiente para dizer “Hey, fulana, vai embora porque eu preciso de espaço aqui!”.
No mais, ele não precisava saber que ela tinha de ir embora porque iria encontrar o merda do Nolan. Tarde demais, porque o gato já estava morto pela curiosidade do tamanho de uma bigorna em seu peito.
Assim que ouviu a descarga do banheiro soar, rapidamente endireitou as costas e pegou o próprio celular no bolso da jaqueta que usava. Fingiu que checava o Facebook ou qualquer outra coisa.
Na verdade, tentava apagar o pavio do explosivo pulsando dentro de si à base de saliva para não explodi-lo na cara dela.
Havia feito uma música para . Havia cantado essa música para . E ela estava o quê? Recebendo a porra de um emoji de coração de outro cara, dentro da sua casa. Aquilo era um desacato tão grande que deveria estar previsto no código penal! Será que ela não tinha, ele pensava, um pingo de vergonha ou consideração na cara?
Conforme o laço entre eles se apertava, ficava estabelecido que a linha limítrofe do respeito era não aparecer com outro alguém em ocasiões em que tinham chances de se encontrar ou ficar com esses outros alguéns quando o encontro acontecia de fato. E também não comentar o que faziam com ou quando viam terceiros. Não haviam precisado discutir isso, estava implícito. Era o mínimo do bom senso, apesar de uns papos desses terem escapado acidentalmente.
levava numa boa se falava sem querer das meninas dele. Por outro lado, se deixava algo escapar, ele sentia seu estômago se debater no mesmo instante e tinha vontade de botar fogo em tudo, não sem antes pedir o mais educadamente possível que ela se calasse. Não fazia nenhuma das duas coisas: por fora, mantinha a expressão tranquila de quem a escutava dizer que havia ido comprar morango no Tesco e a caixa estava mais cara do que na semana passada.
- . - Ele a escutou sair do banheiro.
Ele amava quando ela o chamava no plural, mas estava tão irado que nem teve espaço neural para se lembrar disso. Fervia de raiva. Sabia que não podia cobrar dela uma atitude condizente com a de um relacionamento, que era uma ideia que existia só em sua cabeça, mas se sentia estranhamente usado por . Sentia-se também idiota por ter xeretado o que não lhe dizia respeito e agora ter de lidar com o monstro ansioso crescendo em sua barriga, louco para bater de frente com ela.
- Eu tenho que ir - Ela pegou o celular rapidamente para ver a hora e checou as notificações na tela trancada. Checou a droga do emoji de coração. - Desculpa deixar essa bagunça - referiu-se ao baseado não terminado e à lata de cerveja.
- É, que seja. - Ele não conseguiu disfarçar a amargura que se espalhava corrosivamente por baixo de sua pele, embora estivesse se esforçando para manter um tom controlado.
- A gente se fala, ok? - ignorou sua língua repentinamente ferina, pegou a bolsa que havia largado em um dos ganchos perto da porta e girou a maçaneta.
- Claro. - Ele engoliu em seco. - Enquanto isso não acontece, boa foda com o Nolan!
virou-se para ele assim que a frase a atingiu, estarrecida. A boca entreaberta esperava receber ordens do seu cérebro sobre o que dizer. Os ombros se encolheram como se ela já tivesse sido pega pelo frio lá fora.
- Como você sabe?
- Da próxima vez que você for sair com um outro cara e comigo na mesma noite - ele embebia as palavras em sarcasmo. - Vê se não deixa seu celular vacilando por aí pra esfregar isso na minha cara!
- ! Eu não acredito que você olhou meu telefone! - Ela gesticulava, exasperada.
- Eu não olhei! - Ele tentava achar uma brecha para que saísse com a razão de qualquer maneira. - Você o largou em qualquer lugar! A tela simplesmente piscou, eu olhei pro lado e acabei lendo sem querer!
- Mesmo assim! - Ela não entregaria o primeiro lugar para ele de bandeja. - Você não tinha que ter lido nada!
- Foi automático! - ele replicou. - Não é como se eu pudesse controlar meus instintos, achei que era o meu celular!
O aparelho dele nem estava ao lado do dela, mas não tinha certeza se ela se lembraria disso. Havia de se ter muita malícia para sair por cima pelo menos uma vez contra .
Ela suspirou e seus ombros caíram. Bingo!
- Desculpa - ela soou mais branda. - Eu não gosto quando você fica sabendo dessas coisas, mas eu e o Nolan, você já tinha conhecimento de que a gente se pe… se vê também - bambeou com as palavras.
- Você falou a coisa certa: eu odeio ficar sabendo que vocês se pegam! E que você pega quem quer que seja. Eu sei e não quero mais saber. - Ele foi direto e reto. - Não quero mais ficar com você assim.
- , não fale como se eu fizesse essas coisas simplesmente pra te chatear! Eu tô vivendo a minha vida, é só isso! E você, a sua! Eu pensei que estava tudo certo!
Não tinha do que se queixar, não a podava por nada. Não reclamava de nada. Ela sabia que ele havia desenvolvido sentimentos por ela nos últimos meses e claramente mais do que ela por ele, mas nunca havia tentado impor isso. Antes de certos limites começarem a ficar implícitos, todas as vezes que ele a vira com outros caras, não reclamara, mesmo que isso só houvesse acontecido no começo de tudo. E, nessas ocasiões, ele também estava com alguém a tiracolo. Se não estava, arranjava.
A parte que ele havia omitido dela era que a cada vez que isso ocorria, ficava ofendido, mesmo que um pouquinho. E, nos últimos tempos, ao saber, ainda que sem querer, que ela deixaria de estar com ele para estar com outro, ou quando ficava com essa sensação ao escutar alguma resposta restritiva vinda dela, suas têmporas latejavam como se estivessem batendo sua cabeça contra a parede.
, ao vê-lo com outras garotas, sentia uma leve estranheza, mas nada que a fizesse perder o sono. O contrário dele, que pensava nela e ruminava o que ela estaria fazendo nos braços de seus amantes mais do que era saudável.
- Não é que está errado, . - Ele se levantou, subindo a voz, exaltado. - É um direito seu. Eu só tô gostando demais de você pra continuar aguentando isso. Não consigo mais levar isso pra frente se for pra ser assim, sabe?
Ela o viu caminhar até o maço de cigarros, na bancada que dividia a sala da cozinha.
- Saber que você sai com Nolan ou com quem quer que seja me deixa bem mal. - Ele completou e acendeu um. - Não consigo suportar a ideia de que tem outro cara ocupando o mesmo espaço que eu.
- Como assim? - Ele ficou surpreso por ela querer saber mais.
- Meio que tudo bem se você pega qualquer zé lelé na noite. Mas eu fico puto em saber que tem outro cara que vai na sua casa, passa o dia com você, te leva para os lugares bacanas que talvez a gente já tenha ido junto, frita bacon nas suas panelas… Ficou demais pra mim, saca?
- Por que você nunca disse que sentia ciúme? - Ela continuava parada no mesmo lugar, apenas seguindo-o com o olhar.
- Porque eu queria levar isso como fosse melhor pra você! - Ele tragou. - Mas eu tô me dando conta de que a melhor maneira pra você não é necessariamente a melhor maneira pra mim. - Encostou a cintura na bancada. - Eu acho que gosto de você mais do que você gosta de mim e tenho noção disso, então queria ir no seu ritmo, para não ter de abrir mão de ter você de alguma forma. Mas não consigo mais fazer isso sem me desrespeitar, sem me machucar, dá pra entender?
Ela largou a bolsa no chão. Caminhou em passos largos até ele e o abraçou.
- Eu sinto muito mesmo que você tenha visto essas mensagens. Você sabe que não fiz por mal.
- Eu sei, mas eu também não consigo evitar ficar mal. - Ele não retribuiu o abraço e continuou a fumar por cima do ombro dela - Isso tá me machucando mais do que eu consegui prever e eu não tenho mais condições, nem quero mais esconder isso de você.
- Eu gosto muito de você. E você sabe disso - ela dizia afundada na curva confortável entre seu pescoço e seu ombro. - Mas eu não sei se quero de verdade assumir um relacionamento sério e…
- , pelo amor de Deus! Assumir o quê? O que a gente praticamente já tem? - Ele se desvencilhou dela. - Nesse último ano, quase toda vez que eu voltei pra Londres a gente se viu. Desde que a tour acabou, você não sai da minha casa ou eu não saio da sua.
Era só o que faltava, ela pensou, ele ficar enumerando todas as coisas que vinham vivendo, como se ela não tivesse plena consciência do que estava fazendo com ele, porque queria fazer, nesse tempo todo!
- Você dormiu aqui a semana retrasada inteirinha. No mês passado, teve outra dessas. A gente conversa praticamente todo dia. Eu não consigo mais fingir que não sinto saudade no momento em que você diz que vai embora. Ou que tá tudo bem quando você não pode me encontrar - e as vezes dessas que, de alguma forma, eu sei que é porque você vai dar pra outro cara. - Ele voltou a se jogar no sofá. Bateu o cigarro no cinzeiro. - Era claro que ia acabar nisso pra um de nós dois, é a coisa mais óbvia que existe na história da humanidade! Ninguém aqui é ingênuo. Eu teria de ser muito frio, e você também, pra gente curtir tudo nesse nível e não dar bosta uma hora.
Agora era ela quem se apoiava no balcão, sem coragem de mirá-lo. Mas não tinha necessariamente dado bosta ainda, tinha? Ela se perguntava.
- Eu tô por aí, transando também? Tô. - continuava. - Mas tá vazio pra mim, sabe? Desde que a gente começou a se ver mais, eu tenho saído com outras, nada de novo sob o sol ou diferente de você, mas ultimamente eu tenho me sentido um perfeito saco de porra toda vez que vou pra cama com uma mulher que não é você.
- , você tem uma banda! - ela entrou no meio do raciocínio dele de sopetão, finalmente se manifestando, revoltada. - Tem milhões de garotas se arrastando por você. Se você pedir, elas lambem até seu pé suado! Você não devia nem querer falar de namorar sério, de exclusividade!
- Desculpa? - Ele liberou a fumaça em seus pulmões. - O que você tá querendo dizer com isso?
- , pra ser bem franca - ela mudou seu tom para um explicativo. - Você não é o primeiro cara de banda com quem eu me envolvo, isso sempre esteve bem claro. E se tem uma coisa que nenhum desses caras conseguiu me dar foi fidelidade. O exemplo mais recente disso é aquele bosta do meu ex. - Ela teve vontade de vomitar só de lembrar do quanto havia ficado na merda por causa de Landon, baterista de uma banda um pouco menos famosa que a de , mesmo que fizesse três anos do término. - Eu só assumi que você nunca ia me cobrar disso e a gente ia levando assim. Eu prometi para mim mesma não me comprometer com mais ninguém que eu não confie que terá o mesmo nível de comprometimento que eu. Tá tudo tão bom, sabe? O que tem de errado aqui?
- Você é a pior, - ele deu uma risada seca, incrédulo, e apagou o cigarro. - Sou eu que tô pedindo comprometimento aqui, por que porra eu faria isso se não estivesse disposto a ser fiel a você? Só porque eu sou de uma banda quer dizer que eu não tenho sentimentos? Que caralho de lógica é essa? Todo cara de banda é parte de uma casta fabricada pra exercer esse papel, então? É Aldous Huxley, agora? - fez uma referência ao mais célebre livro do autor mencionado, que ela pegou no ato.
- , olha... - Ela sentou-se ao seu lado. - Pra mim é como se fosse, porque…
- Eu tô apaixonado por você, porra! - ele finalmente explodiu, bracejando veementemente, saindo do sofá de volta para perto da bancada. Ela viu até cuspe voar de sua boca. - Eu acabei de te cantar uma porra de uma música sobre isso! O que mais eu preciso fazer pra você entender?
virou o rosto para o lado oposto ao dele, suspirando pesadamente. Onde é que estava a droga do botão de SOS para alguém tirá-la dali?
Tudo começara com ele pedindo para ela não ir embora quando dormia lá. Depois, insistia para ela voltar quando saía para trabalhar ou ficar mais um dia se não havia nada para fazer no seguinte. E, assim, passaram a se ver com uma frequência muito maior. Não se cruzavam mais por acaso, era sempre por vontade. Vinha sendo assim pelo menos nos últimos dois meses.
Com toda essa frequência afetiva, seria inevitável que não chegassem a um ponto no qual acabariam por discutir para onde estavam caminhando, ou que não começassem a brigar por pouca bosta e tudo se encerrasse de maneira brusca.
As comédias românticas de Hollywood eram a coisa mais clichê que existia, mas, como havia dito, levando em conta esse tipo de situação, o clichê era quase sempre uma cópia da vida real. Ela tinha consciência de que a relação enveredaria por esse rumo que a incomodava ao se entregar como vinha fazendo, mas havia preferido não pensar nisso: apenas foi porque a vida era uma só.
Por que o ato de ficar com alguém com frequência não podia permanecer nessa simplicidade quando estava tudo indo bem demais para ser verdade? Estava tudo indo tão bem para ela do jeito que estava, que ter de passar aquele processo a deixava dividida. Não queria partir o coração de , mas também não queria perder sua liberdade.
- Eu não tenho certeza sobre o que sinto - foi franca. - Eu amo a sua companhia, mas não sei se posso dizer que estou apaixonada.
Não era que ela não gostasse dele, ela gostava. E muito. Mais do que havia gostado de alguém desde que havia terminado seu último namoro. E era isso que a deixava louca. Sentira falta de uma companhia como aquela e amava passar horas a fio com , se sentindo uma máquina de palpitações. Ma não lhe apetecia a ideia de ter de entrar numa relação séria novamente, com um cara de banda novamente, e todo o peso e responsabilidade que isso trazia. Gostava demais de ser solteira. Tinha muito tempo para se descobrir (e pra descobrir muitas bocas e genitálias diferentes), para se permitir não ter um dia ruim de trabalho porque brigou com o companheiro, para fazer o que quisesse na hora em que quisesse. Adorava essa agitação. Estava curtindo o momento e meio que não queria abrir mão disso para apostar num relacionamento com um cara de quem gostava muito, mas não sabia se gostava o suficiente a ponto de se esforçar para que algo mais contratual desse certo. A ideia de perder até a amizade de por resolver “regularizar” as coisas e depois acabar moribunda de desilusão pelos cantos a deixava inquieta. Sabia qual era a sensação e não sentia nenhuma falta dela.
- Foda-se que você não esteja, eu estou! - ele ficou um pouco doido em escutar aquilo. Foi dolorido, mas não esperava mais. - E isso me deixa frágil em relação ao que você sente, ou melhor: não sente por mim!
- Eu sei, mas você tem a mulher que você quiser, você não precisa disso! - Os olhos de saltavam. - Não precisa de mim!
- Você tá certa. Eu não preciso de você. - Ele lhe apontava o indicador quase na fuça. - Mas eu quero você. - Fez uma pausa, olhando no fundo de suas pupilas e ela sentiu como se, de repente, ele fosse capaz de sugar sua alma. - E não é nada pouco. - Soltou o ar. - Mas eu não consigo mais ficar com você assim. Desculpa. Ou a gente deixa isso… Exclusivo - demorou a escolher a palavra certa. - Ou não dá mais para mim.
Uma realidade em que não existia mais em seus dias se projetou instantaneamente no seu cérebro e pareceu puxá-la pela raiz dos cabelos. As cenas pareciam insossas demais. Foi um tanto… Desesperador.
- . - Ela chegou mais perto dele, pronta para bombardeá-lo com alternativas. - E se a gente tentasse...
- Pra mim é isso ou acabou, - ele deu um ultimato. - Não me vem com essas histórias de relacionamento a três, ou sei lá o que você ia dizer.
- Eu não quero que acabe - disse antes de começar a carimbar beijos por seu pescoço, descendo a mão para a parte frontal de sua calça. - Mas eu também não sei bem dizer o que quero...
- Tira a mão daí - disse sem tocá-la, tentando manter a compostura ao sentir que ela abria sua braguilha. - Eu já disse que, pra mim, já deu se a gente não for se levar a sério e, principalmente, se você não começar a me levar a sério quando digo que estou apaixonado por você.
Ela arriou as calças dele até onde deu, levando junto a cueca, e se ajoelhou.
- Mas eu levo você a sério - ela afirmou e, sem demora, colocou o pau dele na boca, botando em prática sua estratégia agressiva para dissuadi-lo para fora daquela conversa.
- Se você me levasse a sério, não estaria tentando me chupar enquanto eu tento dizer que quero ter uma relação séria com você! - ele tentava não deixar a voz vacilar. - Meu pau não vai subir, eu tô puto da cara! Você pode parar com isso agora e ir lá resolver o que você tem pra resolver com o Nolan se for pra fazer as coisas dessa sua maneira mimada…
- Shhh - ela estendeu o braço e botou o que seus dedos alcançaram sobre os lábios dele. - Fica quietinho, fica? - disse, antes de voltar a envolvê-lo com a boca.
Ele nem percebeu como, mas obedeceu-a por alguns minutos, feito o paspalho que ela fazia dele.
- Que porra! - Espremeu os olhos e não conseguiu evitar agarrar os cabelos dela quando ela passou a sugá-lo com mais pressão. - Eu vou interpretar isso como um sim pra o que a gente estava falando - foi coercivo.
Ela retirou a boca dele com um leve estampido. Puxando o ar, se desfez da regata cinza que vestia, jogando-a no chão.
se sentiu os joelhos fraquejarem ao filmar seus movimentos. Sempre sem a porra do sutiã! Parecia que fazia de propósito para tirá-lo de si. Se havia uma coisa com a qual ele não podia brigar contra, eram aqueles peitos. Provavelmente seria capaz de matar um se tivesse um revólver ao alcance e ela lhe pedisse com eles de fora.
- Isso já é um problema seu, não meu - foi curta e grossa, mas de uma maneira insolente, o que deveria tê-lo deixado ainda mais enfurecido, mas só fez com que seu sangue se concentrasse ainda mais no que passava a ficar ereto abaixo de sua cintura e ela voltava a segurar.
Soltou o ar de uma vez pela boca assim que começou a deslizar a mão para cima e para baixo com o compasso e intensidade exatos que sabia que ele aprovava.
- Eu não acredito que eu tô deixando isso acontecer - ele disse baixinho, mais para si mesmo do que para ela, ao sentir o quão duro estava. - Foda, ! - ele encheu a boca para pronunciar as sílabas. - Você. É. Foda!
- Eu sei - ela concordou, dando uma resposta que distorcia o sentido das palavras dele, e voltou a chupá-lo com o olhar mais depravado do mundo estampado em seu rosto. notou o abuso e sentiu seu pau quase ganhar vida própria.
Quebrou o pescoço para trás, antes de voltar a mirá-la no ato, se livrando pela boca de todo o ar que respirara.
E lá ia ele, se esfolando desfiladeiro abaixo. Mais uma vez dando a ela um grande outdoor com seu rosto para que ela pichasse a palavra “IMBECIL”, bem assim, em letras garrafais, e botasse pra rodar na Picadilly Circus em horário comercial.
Antes que ficasse mais excitado do que conseguisse segurar, ele puxou para cima.
Bruscamente, posicionou-a de costas para ele e de frente para a bancada. Afastou seus cabelos e, segurando-os com força, praticamente atacou seu pescoço, sem conseguir decidir se o beijava, se absorvia o cheiro narcótico impregnado ali ou os dois. Ao mesmo tempo, sua mão desceu para dentro das calças dela e passou a estimular o que havia escondido ali.
- Por que você tem que ser tão gostosa? - perguntou retoricamente e mordiscou o lóbulo de uma das orelhas dela. Deslizou a mão que antes segurava o cabelo até seus seios, mantendo a outra no mesmo lugar, enquanto forçava seu quadril contra a bunda dela.
começou a abrir própria calça e se afastou para se livrar da sua, juntamente com os sapatos e o resto da roupa, largando tudo em qualquer lugar. Assim que terminou, sua figura nua já estava nua e sentada sobre o balcão, as pernas apelativamente afastadas, convidando-o para se deleitar.
Sem hesitar, ele a beijou com força, puxando seu corpo mais para a beirada do móvel. Parando para sugar seus mamilos no meio do caminho, o que a fez perder o fôlego, ele se abaixou até que sua cabeça estivesse na altura das coxas dela, aceitando o convite para degustar o que havia entre elas.
Não demorou muito e o celular de começou a tocar dentro da bolsa. se esforçou para não se distrair com o barulho.
Ela tinha certeza de que era Nolan querendo saber de seu paradeiro. Por um segundo se preocupou em atender para dizer a ele que, àquela altura do campeonato, teria de furar, mas se esqueceu disso no momento seguinte, quando encontrou com a língua um ponto tão certeiro que a teria feito cair de cima da superfície gelada se não tivesse segurado firme nas duas faces.
Quando o celular tocou pela terceira vez, parou o que fazia e olhou para ela, os cabelos despenteados por seus redemoinhos manuais, dizendo:
- Eu vou atender essa merda e mandar esse cara tomar no cu, bicho! - Ele sabia que era Nolan tanto quanto ela.
- Foco, - ela o advertiu, guiando a cabeça dele para onde estava antes. - Foco!
Algum tempo depois, quando a levava para o quarto com as pernas enroscadas em sua cintura e tendo a visão dos peitos mais bem formulados do universo balançando à sua frente, ele a escutou afrontá-lo:
- Pensei ter ouvido você dizer que não ia ficar de pau duro porque estava pê da vida…
- Cala a boca! - Ele disse, rindo pelo nariz um tanto contrariado, antes de jogá-la na cama.
Naquela noite, descobriu no sexo uma ótima ferramenta para extravasar sua frustração na própria pessoa que a causava. Provocou-a de todas as maneiras possíveis até deixá-la agonizando a ponto de implorar para que a fizesse gozar.
Quando se sentiu suficientemente convencido, seu corpo endureceu ao senti-la tremer em seus braços e ele se permitiu chegar lá um pouco depois, abraçando-a de uma forma que a sufocava ligeiramente.
Voltando a si, afrouxou o enlace, dando espaço para que ela pudesse usufruir novamente de oxigênio em quantidade. Esperou alguns segundos para sair de cima de e se levantou da cama ao som de sua respiração, que custava a se normalizar.
Deixou-a lá, estirada, e foi se desfazer do preservativo. Seu coração parecia que ia pular da boca e suas pernas pareciam mais pesadas do que o resto de seu corpo, fazendo com que cambaleasse ao caminhar. Aproveitando o embalo, enfiou-se debaixo da água mais para fria do que para quente do chuveiro.
Havia deixado a porta entre o banheiro e o quarto aberta. Finalizada a ducha, ao passo em que se enxugava, dirigiu-se a falando um pouco mais alto, para que a alcançasse no outro cômodo:
- Escuta! - Enrolava a toalha na cintura depois de secar a cabeça. - Isso tudo, agora, foi um sim, não foi? Eu estava falando sério quando disse que ia considerar como um sim, você tá ferrada.
Sendo recebido pelo barulho do vácuo, saiu para o recinto adjacente e deu de cara com encolhida debaixo de seu lençol cinza, os olhos fechados e o ritmo da respiração agora tranquila como a de uma criança que descansava depois de tocar o terror o dia inteiro.
Repentinamente tomado pelo cansaço, ele suspirou, resolvendo se entregar ao conforto de sua cama, que sempre parecia mais acolhedora quando dividida com ela (ele não tinha vontade de expulsá-la para ter mais espaço para as pernas). Largou a toalha de lado e dormiu quase que instantaneamente ao se deitar de bruços, não sem antes esticar um braço para enganchá-la.
***
Ao despertar, na manhã seguinte, estava em uma posição totalmente diferente da qual havia adormecido. Umedecendo a boca seca e piscando vagarosamente, ficou empolgado ao se lembrar de quem deitava ao seu lado e virou-se, pronto para puxá-la para perto e voltar a dormir.
Encontrou o vazio.
- ?! - ele berrou, na esperança de escutá-la gritar de volta de algum canto do apartamento. - ! - tentou de novo, mais alto.
Nada.
Não era a primeira vez que ela ia embora sem avisá-lo ou sem dizer tchau, então não estava surpreso. Só sentia uma dorzinha estranha no peito, que surgia todas as vezes que isso acontecia.
estendeu o braço, tateando o criado mudo ao seu lado em busca do celular e do maço de cigarros que sempre deixava ao lado da cama. Achou o primeiro item, o segundo não estava ali.
Na hora teve certeza de que ela havia o levado. era especialista em não lembrar de comprar cigarros e roubar os seus quando os dela acabavam, o que acontecia tipo sempre. Mais do que viciada em fumar, ela parecia especialmente viciada nos cigarros dele. Geralmente não se importava, mas roubar um maço quase cheio e justamente aquele, que ficava estrategicamente posicionado para ele matar a vontade de quando acordava, o fez querer sair atrás dela para estrangulá-la.
Sentiu seus olhos latejarem ao ser atingido pela luz do aparelho em sua mão. Era uma e três da tarde. Havia capotado.
Na tela, via-se duas mensagens de , de duas horas atrás, esperando por sua visualização:
11:10 am
“A parte da reunião cedo era verdade! Desculpa ir embora sem falar tchau, não quis te acordar.”
O que veio a seguir lhe causou uma pontada de regozijo no coração. Abriu um sorriso tão largo que teve certeza de que poderia entrar no Guiness Book com o maior sorriso do mundo.
11:12 am
“Sim. A resposta pra sua pergunta é que aquilo foi um sim.”
Filha da mãe! Tinha fingido estar dormindo para se livrar de responder, aquela falsa, sem-vergonha!
Tomado por uma agitação súbita, ele se esqueceu de que poderia adicionar essa canalhice como o segundo motivo em sua lista de razões para ficar puto com em um só minuto. Ansiosamente, inseriu sua senha de desbloqueio e digitou:
1:05pm
“O Big Ben vai tocar o sino como se a rainha tivesse morrido, depois dessa resposta!”
Gargalhando sozinho, ligou a caixa de som pelo aplicativo e selecionou “Hots On For Nowhere”, do Led Zeppelin, que vazou pelo ambiente os riffs pausados da introdução. No segundo em que começou a bradar a letra junto de Robert Plant, escutou o sinal de novas mensagens se sobressair à música e as palavras de pularam na tela mais uma vez:
1:06pm
“HAHAHAHAHAHAHAHA”
“Você mereceu, se esforçou bastante. Tive de reconhecer <3.”
Ficou feliz ao notar o emoji de coração. Isso porque se deu conta de que, agora, nem Nolan, nem qualquer um dos outros imbecis receberia mais um daqueles com aquela conotação. O cara mais sortudo de todos era, enfim, só ele.
1:07pm
“Tô a fim de ir jantar naquele lugar novo que te falei, em Old Street. Vamos hoje?”, ela enviou.
Levantando-se da cama, aumentou o volume da música e passou a competir com o sistema de som para ver quem conseguia soar mais alto. Explodindo de alegria e querendo acordar todos os vizinhos para contar o quanto viver era fabuloso, respondeu à sua, então, namorada:
1:08pm
“Me fala o número? Te vejo lá às oito!”
O relógio virou para as 22h17 e, ao tirar outra dose, reparou na garota para quem entregara um dos pints dois minutos atrás, largando-o na mesa onde se agrupavam os amigos, puxando seu par pela mão, após berrar de entusiasmo assim que o responsável pela mesa do karaokê anunciou:
- e , o palco é de vocês!
O pessoal que se aglomerava ao redor do palco (que na verdade era um carpete sob dois pedestais de microfone em frente a uma TV) pirou quando a introdução de “Wasn’t Me”, do Shaggy, um clássico dos anos 2000, começou a rolar. Parte da turma dos dois que ficara na mesa se aproximou para acompanhar.
- Yo man - ela começou a cantar primeiro.
- Yo - ele a seguiu.
- Open up, man!
- What do you want, man?
Mal haviam iniciado seu número e , a garota de blusa listrada e jeans preto que protagonizava o espetáculo, já se segurava para conseguir continuar a cantar sem rir. Seguia com sua parte recorrendo ao auxílio das palavras que mudavam de cor assim que deviam ser entoadas, tomando cuidado para se manter no ritmo.
Seu esforço valeu por pouco tempo: foi impossível conter a gargalhada quando , o rapaz alto com quem dividia o show, entrou com a parte de Shaggy, imitando o sotaque jamaicano do intérprete original. Ao redor, algumas pessoas foram automaticamente contagiadas pelo mesmo espírito de e desabaram a rir.
Tropeçando nas palavras - que obviamente não sabia de cor, apesar do sucesso do tema que ele mesmo havia escolhido -, emendava qualquer som parecido na frase ou rimava qualquer outra palavra que lhe vinha à cabeça, quase deixando-a sem ar para cantar sua metade quando chegou sua vez.
Influenciada pela palhaçada que ele botava em ação, começou a imitar trejeitos de rapper e interpretar cada frase que entoava com a expressão equivalente a de um cara que havia sido flagrado com a amante pela mulher, assim como dizia a letra.
- But she caught me on the counter!
- It wasn’t me!
- Saw me bangin' on the sofa! - Ela tentava assemelhar a voz à do cantor oficial, assim como , enquanto o via arriscar uns passos de dança caricatos, repetindo “It wasn’t me” a cada verso do pré-refrão que ela terminava.
Era difícil se concentrar na letra com tanto alarde acontecendo e ambos terminavam por se atrasar na cadência da música, mas eram apoiados pelos amigos que faziam a maior algazarra com berros e assobios.
Quem sabia, cantava junto. Acontece que ninguém sabia direito, então todo mundo só interagia com o famigerado “embromation”. Havia gente filmando e tirando foto, mas não se incomodou com isso. No máximo, acordaria no dia seguinte na companhia de sua ressaca e um vídeo do momento circulando no Youtube para divertir os fãs mais aficionados, além de uma manchete inútil no Daily Mail ou The Sun, provavelmente dizendo “Mudança de estilo? Vocalista do The Bloody Cheeky é flagrado cantando rap dos anos 2000 em pub de Stoke Newington na companhia de apresentadora da Absolute Radio”. Puro entretenimento barato.
Assim que ela finalizou a última estrofe da canção, durante as últimas notas da melodia, as palmas vieram e os assobios dobraram. a puxou para si pelo ombro, prendeu-a em um meio abraço e beijou sua bochecha antes de se curvar para agradecer os outros bêbados do local.
Seus rostos eram pura euforia e pileque, combinação que estava presente na expressão de quase todo mundo ali, e permaneceu na dos dois o resto de tempo em que se mantiveram no bar.
Ao terminarem o pint que haviam deixado na mesa, deram vez a outro. Uma vez vazios os copos, saíram com a desculpa de que iriam fumar novamente, mas decidiram por ir embora à francesa.
Garoava fino, como de praxe na capital Inglesa. Cobrindo a cabeça com o gorro do casaco impermeável, o item mais indispensável na vida de qualquer cidadão londrino que havia negligenciado e substituído por uma jaqueta de couro, eles caminharam, com cigarros pendendo na boca, em direção ao kebab shop mais próximo, deixando os amigos de para trás.
No meio do caminho, teve de acender o seu cigarro mais uma vez, porque fumar debaixo de água caindo do céu e ventos revoltos é sempre uma ideia burra, mas essa é a vida de quem insiste em sustentar o vício do tabaco em Londres.
- Eu realmente preciso ir logo - disse já com a boca preenchida pelo último pedaço de seu kebab, caçando um guardanapo para esfregar os dedos engordurados.
- Pra minha casa? - arqueou as sobrancelhas e mordeu um pedaço do seu. - Também acho.
rolou os olhos, jogando o papel em que limpara os dedos no balcão e chutou por baixo desse.
- Já disse que tenho reunião amanhã de manhã, não posso ir dormir muito tarde. - Ela bebeu um gole de sua Coca-Cola.
- E quem disse que se você for pra minha casa vai dormir tarde?
- E alguma vez em que dormimos juntos a gente não dorme tarde?
Ele roubou a lata de refrigerante da mão dela e o tomou, antes de responder:
- Sim, quando a gente dorme cedo.
- Meu Deus, como você é besta! - Ela riu sem muita emoção. - E quando isso aconteceu?
- Não sei, não lembro. - Ele deu de ombros. - Mas pode ser hoje, que tal?
Ela moveu a cabeça em negação, roubou a lata de volta, deu mais um gole e a estendeu novamente a ele.
- Toma, quer matar?
Ele aceitou e derramou o que restava do líquido na boca, ao passo em que ela se levantava.
a seguiu para o lado de fora, ambos tentando relevar o aperto e as pequenas colisões com quem fazia pedidos no caixa, comia em pé ou se esforçava para entrar no lugar abarrotado. Alguns olhos paravam nele mais tempo do que o normal, quando o reconheciam por conta da banda, mas ninguém o abordou ali.
- Vai de metrô? - ele perguntou, cruzando os dedos nos dela folgadamente.
- Nah, vou pegar um táxi, tô com preguiça. - Ela estreitou o enlace das mãos e levou-as às costas, aproximando-se para um selinho.
- Tá - concordou, sem entusiasmo, quase mórbido e contraditoriamente ao que seu rosto transmitia, beijou-a com uma profundidade que a pegou de surpresa, amassando um lado de seus cabelos.
Soltaram-se. viu um táxi vindo em sua direção no mesmo instante, o sinal amarelo aceso. Chacoalhou a mão no ar para chamar o motorista.
- Me avisa quando chegar? - pediu assim que o carro parou ao lado deles.
Ela assentiu, sorrindo com os lábios. Ele lhe deu outro selinho e num gesto de cavalheirismo tão ensaiado que a fez rir pelo nariz, abriu a porta para que ela entrasse. Estava pronta para fazer uma piada quando escutou o baque da porta, viu-o correr para o outro lado do carro e entrar pelo lado oposto, esbaforido. Sua língua afiada nem precisou se preparar para protestar, mas ele foi mais rápido:
- 37, Camden Road - disse ao motorista seu endereço.
- ! - Ela lhe deu um tapa no ombro, sem muita força. - Moço, por favor…
- 37, Camden Road, senhor, por favor - Ele repetiu.
- Senhorita, este homem está te assediando? - O motorista de táxi indagou preocupado.
- O quê? - reagiu, repentinamente indignado, ao mesmo tempo em que emendava uma resposta:
- Não, senhor, é só que…
- Tem certeza? - Ela via os olhos do taxista encarando-a pelo retrovisor.
- Tenho - suspirou. - 37, Camden Road, por favor.
Ao ter a informação reforçada, o senhorzinho indiano e atarracado saiu do lugar com o carro. ficou um pouco bravo por ter sido confundido com Jack, o Estripador, mas deixou para lá. Se bem que, pela idade do homem ao volante, o que não esperava mesmo era ser reconhecido pelo seu trabalho.
- Não fica brava! - Ele olhava para , que via a cidade passar pela janela com um leve bico. - Quero te mostrar uma coisa!
- Acho bom valer a pena - Ela retrucou, irritada.
- Vou deixar você dormir cedo, juro - ele prometeu. Ela lhe lançou um olhar enviesado, repleto de desdém e logo depois voltou a atenção para a paisagem borrada.
Afetado pelo humor desgostoso da passageira ao seu lado, preferiu se calar durante o resto da viagem para não deixá-la ainda mais emburrada. Do jeito que era um rojão, era capaz de ela sair do carro em movimento se ele ousasse emitir mais um piu.
e não programaram sair naquela noite. Ele havia ligado para ela mencionando que estava indo ao pub com uns amigos, perguntando se ela gostaria de se juntar. foi sincera, dizendo que não podia, sem dar detalhes do porquê. Sem temer o frio na barriga ao supor o motivo, ele insistiu, já por mensagem. Sem esconder o mínimo sinal de irritabilidade, ela lhe deu um não definitivo, antes de parar de responder. Ele merecia.
Mais tarde, já conformado, a viu aparecer no bar como uma visão em câmera lenta - para ele, foi equivalente ao ver Pamela Anderson correndo de maiô vermelho na TV, em Baywatch quando era criança: sentiu a mesma pontada no peito. Mas era só cortando espaço entre as pessoas no bar para chegar onde ele estava, destilando um papinho safado de que decidira que estava precisando beber um pouco.
A verdade que a cara-de-pau dela omitia era que fora até lá porque estava meio que sentindo falta dele, embora tivesse outras coisas para fazer da vida. Perto de completar uma semana e meia que não se viam, esse era um recorde dos últimos tempos e ela achou que seria mais forte, mas se tinha uma coisa que ela dificilmente conseguia resistir era um convite repentino para beber. Ultimamente, era ainda mais difícil se vinha incluído no pacote.
Mas é claro que ela não daria o braço a torcer.
No elevador para o quinto andar, ele pousou as mãos sobre a cintura dela, que se escorava em uma das paredes.
- Vem aqui, que eu vou desmanchar esse bico - disse, subindo os dedos para algum ponto sensível perto de sua axila, o que a fez rir instantaneamente.
- Sai! - Empurrou-o assim que a porta do elevador deslizou para a direita. - Inferno de homem! - xingou, rindo contra a própria vontade.
Ele voltou a tocá-la no mesmo lugar e a risada se tornou mais escandalosa enquanto ela lutava para se desvencilhar de suas garras.
- Sai, diabo! Abre a porta logo!
Assim que a passagem foi liberada, entrou na frente e teve sua tentativa de colocar o casaco no gancho perto da entrada frustrada ao ser prontamente agarrada por trás por que, sem nem girar o trinco, saiu tropeçando nela sala afora até pararem no sofá que havia ali, fungando em seu pescoço.
- Então, o que você quer me mostrar? - ela questionou ao se jogar de costas no móvel, largando o celular de canto em uma mesa ao lado e pegando uma caixinha de metal que estava ali.
A cabeça de agora repousava em seu peito e ele respirava tranquilo, os olhos fechados, parecia um bebê cansado, ela pensou. De vez em quando, dependendo do ângulo que olhasse e da posição de seu cabelo, sua fisionomia adquiria um ar juvenil que lhe dava vontade de esmiuçá-lo de tão lindo.
- Fiquei com preguiça - ele murmurou.
- Ah, pelo amor de Deus! - ralhou, elevando o tronco e ficando sentada, obrigando-o a fazer o mesmo.
se levantou num pulo e foi até a geladeira.
- Quer beber algo? - perguntou, já a vendo começar a desintegrar na mão a bolota verde e disforme que havia tirado do recipiente de metal.
- Quero um dichavador! - ela reclamou.
- Perdi, desculpa - ele disse, tirando duas latas de cerveja da geladeira. - Acho que deixei na casa do Craig. Quer? - Ofereceu a ela uma, chegando mais perto.
- Quero, obrigada - ela aceitou aquela que ele já havia aberto e ele a colocou na mesa próxima dela. - E aí, cadê?
- Então… - alongou a última sílaba e se deslocou para pegar o violão jogado em outro canto do cômodo. - Eu fiz uma música nova, queria te mostrar.
- Mas olha! - ela exclamou, surpresa. Estava esperando que fosse qualquer outra coisa, como algum pedal novo de guitarra que havia comprado, algum item de decoração temático de filme, um lagarto de estimação recém adquirido, uma planta carnívora, um tamagochi desenterrado dos anos 90, qualquer coisa, menos aquilo. - Que legal! Me mostra, sim!
Com o violão apoiado na perna, sentado na ponta do sofá, ele começou a bater nas cordas a introdução. Ela continuou a dichavar a planta, mas se esforçou para manter a visão nele na maior parte do tempo.
Junk of the heart is junk in my mind
So hard to leave you all alone
We get so drunk that we can hardly see
What use is that to you and me baby?
Assim que ele abriu a boca, ela sentiu como se estivesse despencando de uma altura de cem metros, amarrada a um desses brinquedos de elevador dos parques de diversão. E nem havia puxado um ainda! Era ele começar a cantar (a sério, e não imitando o Shaggy no karaokê) para que ela se sentisse totalmente desarmada, fraca, como se não comesse há dias. Quando ele imitava o Shaggy no karaokê, ela também sentia coisas, mas eram mais do tipo querer ter um controle remoto de cenas da vida real para voltar o momento quantas vezes quisesse revivê-lo, e não vontade de tirar a roupa e sentar em cima dele até não ter mais forças para mover o dedo mindinho.
(...)
We sink to be sunk, life is no race
When, I'm not happy, I'm in disgrace
So I spend time guessing on you oh
You're a lover of the wild and a joker of the heart
But are you mine?
Na segunda parte, após o primeiro refrão, um alerta acendeu na cabeça de , lhe avisando de que aquela música não era só mais uma música sobre uma relação qualquer com uma fulana que ele trombara na esquina. Era sobre a convivência entre os dois seres humanos que ocupavam a sala do apartamento 51B do número 37 da Camden Road naquele momento.
E o que diabos ele queria dizer com “Mas você é minha?”. Essa frase lhe dava arrepios! Estava entrando em pânico. Se ele não parasse, criaria asas e sairia voando pela janela.
I wanna make you happy
I wanna make you feel alive
Let me make you happy
I wanna make you feel alive at night
I wanna make you happy
If you're a good girl tonight
Sem contar a parte em que falava que queria fazê-la feliz. fechava os olhos no trecho mais agudo em que cantava isso. Puta que pariu, como é que ela ia conseguir correr com ele fazendo essas coisas? Era só ele se mexer de um jeito mais particular e as raízes que sua bunda criava no sofá se alimentavam e se fortaleciam.
Ele já a fazia feliz, será que ela não deixava isso claro? Por que mais ela continuaria na companhia dele esse tempo todo? Como ele achava que poderia fazê-la mais feliz? Porque ela sinceramente não via como.
Fazia onze meses que haviam ficado pela primeira vez em uma festa de um amigo em comum. Nesse meio tempo, haviam se trombado em premiações, shows, mil outras house parties. Na maior parte dessas ocasiões, acabavam a noite emaranhados um no outro. Em outras poucas, acabaram enroscados em corpos diferentes. No final das contas, sempre deixava uma sensação de desperdício. Não era ruim, apenas não era tão divertido quanto quando iam para casa juntos.
Era inegável que havia uma troca de energia diferente ali, não perceptível apenas entre eles, mas por quem lhes fazia companhia nessas ocasiões também.
Era incrível como suas bocas se encaixavam como se fossem peças pré-fabricadas para isso, como seus corpos pareciam se deformar para tomarem a forma do outro e especialmente raro o quanto entendiam exatamente o que cada um queria na cama, sem precisar ficar ensinando muito, falando ou pilotando mãos e movimentos em demasia.
Se havia uma coisa que não podia dizer era que não havia pulado de cama em cama (e outros lugares mais desconfortáveis) nos últimos três anos solteira. E, nesse tempo, ele era o único com quem havia experienciado tamanha troca. Essa era a palavra-chave: troca. Havia topado com caras bons no sexo, bons de papo, bons em entretê-la. Dentre esses, uns pareciam uma capa de revista ambulante e outros que pareciam ter acabado de sair de uma centrífuga, mas com nenhum deles havia experienciado tanta comuta.
Do outro lado, havia , vocalista de uma das bandas mais em alta no Reino Unido. Enquanto sua música rendesse, garotas nunca seriam um problema. Ele tinha uma guitarra na mão, uma voz de fazer cair a calcinha, tinha dinheiro e, acima de tudo, era um cara legal. Mulheres estavam para ele como baratas estavam para bueiros.
Esse era o fator que mais colaborava para que soubessem, cada um em seu mundinho, que qualquer coisa que estivessem vivendo não carregava um nível de congruência normal. Só de olhar um para a cara do outro sentiam uma espécie de eletricidade, um dinamismo, como se houvessem fios transparentes de uma energia deliciosa os conectando. Havia ainda o fato de fazerem rir um ao outro tanto que, por vezes, chegava a ser irritante pra quem acompanhava.
, no entanto, sempre havia sido o mais pró-ativo. Corria muito mais atrás dela do que o contrário. Era quase sempre ele que iniciava as conversas por mensagem, que a chamava para sair, que dava um jeito de estar nos lugares que sabia que ela estaria também. Havia ficado meio que obcecado por desde a noite em que a beijara pela primeira vez. Esse não era um comportamento que se lembrava de ter tido antes.
Still I notice nothing makes you shatter no no
You're a lover of the wild and a joker of the heart
But are you mine?
Ah, porra. Estavam de novo beirando uma conversa da qual ela tinha pavor e adorava evitar. já tentara abordar o assunto em mil e um momentos no último mês: depois de darem uma - ofegantes e fumantes -, em jantares, assistindo a algum filme e até quando ela estava vomitando na privada dele depois de encher o rabo de gin, com ele tolamente tentando segurar seu cabelo quando mal conseguia parar em pé.
Sempre fazia uso de indiretas para ver se acendia nela alguma fagulha de incentivo para conversarem sobre o que tinham, mas ela nunca havia caído em sua armadilha. Não porque via um problema no ato de discutir relações em si, entendia que isso era praticamente intrínseco a uma vida adulta a dois. Seu verdadeiro receio tinha a ver com possivelmente estragar a sua com ele ao se renderem a isso.
E, agora, ele estava lá, praticamente lhe fazendo uma serenata, implorando para saber se ela queria ficar com ele de verdade. Só com ele. Como diabos ela ia fugir da conversa e continuar sendo considerada uma pessoa com coração pela sociedade diante de um derrame sentimental daquele?
Como sempre: fazendo a sonsa e fingindo que não era consigo. Ao mesmo tempo em que se sentia morta de lisonjeada e não via a hora de poder dizer para os outros que tinha sido musa inspiradora de uma música que tocava mundo afora para seus amigos e, mais pra frente, netos, queria sair correndo dali chutando a porta e tudo só para não ter de encarar o que vinha no combo.
- I wanna make you happy if you're a good girl tonight - cantou o último verso e se recostou de volta no estofado, esperando por alguma reação da dona dos globos oculares vidrados à sua frente, lhe encarando como se ele fosse uma alma penada.
- É isso! - ele forçou uma brecha, apoiando o braço do violão na beirada do sofá.
- Ficou ótima! - ela comentou, de repente voltando à vida, ainda um pouco zonza com a singela quantidade de informação que a canção havia lhe presenteado. Acabara de perceber que tinha parado de enrolar o baseado no meio do processo, largando o que havia feito na mesa de canto ao lado da caixinha e de seu celular. Tinha praticamente bebido quase toda a cerveja enquanto ele se apresentava, a sala tinha virado um forno de uma hora para a outra, ele tinha de dar um jeito no aquecedor daquele apartamento! - Fala de um assunto delicado, mas não é uma música triste, sabe? Acho que o que mais amei foi a introdução - ela viu a testa de se franzir numa tentativa de dar conta de processar sua dissimulação. - Definitivamente merece um lugar no próximo disco.
E ele merecia um lugar no céu por se propor a lidar com aquela mulher.
O rapaz ficou em silêncio por alguns segundos, tentando absorver o comentário ordinário de quem andava ocupando seus pensamentos mais do que trabalho nos últimos tempos. Ordinário não porque não fazia sentido, mas porque esperava muito mais.
- É sério isso? - ele soou levemente indignado, após um breve momento a encarando. - Você tá falando sério?
- É claro que eu tô! - Ela sentia o calor estranho crescer, mas agora percebia que ele vinha de seu corpo, e não de aquecedores desregulados. Não sabia se era de constrangimento pela situação ou de ansiedade em não querer estar passando por ela, mas meio que não ter por onde fugir. - Por que eu mentiria? Uma puta música dessas tem de estar no álbum com certeza!
- Eu não tô falando disso, - ele foi direto e reto. - Você entendeu que...
- Eu preciso ir ao banheiro - interrompeu-o, levantando-se do nada, e viu o rosto dele despencar em frustração. - Tô apertadíssima, espera aí.
a viu se retirar para o corredor à sua esquerda, deixando-o sozinho no sofá, afogado em desilusão. Não era daquele jeito que havia imaginado a cena quando a planejara minuciosamente em sua cabeça. Que roteiristas sua vida andava contratando? Francamente! Ela tinha de ceder em algum momento!
Passou as mãos pelo rosto, bufando antes de enfiar a cara com vontade nas almofadas e grunhir.
Sempre que tentava conversar com sobre o que sentia, ela dava um jeito de escapar e encerrar o assunto, deixando-o literalmente do jeito que ele descrevia na música: se perguntando sobre o que ela queria dele e da vida que levavam. Mas ele não ia deixar que ela escapasse deslizando feito cobra pelo mato mais uma vez. Não hoje.
Tinha a impressão de que estava se desgastando e se desrespeitando cada vez mais por causa dela. A liberdade para ficar com quem quisesse, que ela tinha todo o direito de ter, estava testando sua saúde mental e ele não conseguia mais fingir normalidade ao sequer sentir no ar que ela estava saindo com outros caras.
Esporádico era uma palavra que recentemente perdera espaço entre os dois. Estavam sempre batendo ponto um na casa do outro, colavam juntos nos rolês dos amigos em comum, e esses já os consideravam um casal, tanto que eram alvo de altas piadinhas sempre que apareciam nas festas de mãos dadas.
Além disso, passaram a conhecer os amigos um do outro que antes não conheciam e estavam sempre indo jantar ou beber de última hora. Acordavam entrelaçados mais de uma vez por semana, o único limite eram suas vontades, que andava meio relutante em cessar. No entanto, isso não significava que a história de acordar com outros havia chegado ao fim.
E era exatamente isso que vinha incomodando . Ele não estava satisfeito que fosse só mais um caso qualquer rolando ali, já não era só mais uma foda para ele fazia tempo. Queria dar uma configuração maior ao seu relacionamento com ela, enquanto não via a mínima necessidade, ou se mostrava muito mais desinteressada na possibilidade de iniciar uma nova fase em comparação a si.
Foi pensar nisso e o celular dela vibrou, fazendo-o se sobressaltar ao indício de uma nova mensagem. Mais dois toques rápidos se seguiram e ele não resistiu: esticou-se no sofá para bisbilhotar o aparelho por cima, sem tocá-lo
Sentiu seu coração ir parar nas costas ao ver piscando ali o nome de Nolan.
Nolan era um cara com quem saía bastante. Ele já o vira uma vez no backstage de um festival, no dia em que transaram no camarim da banda que tocava no palco. Só descobriu que aquele era o tal do Nolan meses depois, quando curtiu uma foto dela no Instagram em que ele aparecia marcado em meio a um monte de rostos.
11:30pm
“Saio daqui em 30. Quer ir, já?”
“Acho que conseguimos chegar juntos!” 11:31pm
“E, linda, por favor, pensa no sabor da pizza que vai querer já no caminho ok? <3”
tinha em sua vida inúmeras versões femininas de um Nolan: garotas com quem saía sempre que dava na telha. O problema era: não fazia mais questão delas. Era legal ser desejado? Era. Era o máximo ter a mulher que quisesse já pelada na cama dele quando mal havia dito o “tudo bem?” depois do “oi”? Era um privilégio. Mas, no final das contas, que tipo de privilégio? Criaria um hábito tão horroroso de comparar todas à que lhe revirava o estômago de tão injusto. Entediava-se fácil com as outras. Uma a uma, elas iam se tornando nada mais do que uma razão de ele ter menos espaço na cama para esticar as pernas para dormir. O que era um belo de um saco, porque não conseguia ser canalha o suficiente para dizer “Hey, fulana, vai embora porque eu preciso de espaço aqui!”.
No mais, ele não precisava saber que ela tinha de ir embora porque iria encontrar o merda do Nolan. Tarde demais, porque o gato já estava morto pela curiosidade do tamanho de uma bigorna em seu peito.
Assim que ouviu a descarga do banheiro soar, rapidamente endireitou as costas e pegou o próprio celular no bolso da jaqueta que usava. Fingiu que checava o Facebook ou qualquer outra coisa.
Na verdade, tentava apagar o pavio do explosivo pulsando dentro de si à base de saliva para não explodi-lo na cara dela.
Havia feito uma música para . Havia cantado essa música para . E ela estava o quê? Recebendo a porra de um emoji de coração de outro cara, dentro da sua casa. Aquilo era um desacato tão grande que deveria estar previsto no código penal! Será que ela não tinha, ele pensava, um pingo de vergonha ou consideração na cara?
Conforme o laço entre eles se apertava, ficava estabelecido que a linha limítrofe do respeito era não aparecer com outro alguém em ocasiões em que tinham chances de se encontrar ou ficar com esses outros alguéns quando o encontro acontecia de fato. E também não comentar o que faziam com ou quando viam terceiros. Não haviam precisado discutir isso, estava implícito. Era o mínimo do bom senso, apesar de uns papos desses terem escapado acidentalmente.
levava numa boa se falava sem querer das meninas dele. Por outro lado, se deixava algo escapar, ele sentia seu estômago se debater no mesmo instante e tinha vontade de botar fogo em tudo, não sem antes pedir o mais educadamente possível que ela se calasse. Não fazia nenhuma das duas coisas: por fora, mantinha a expressão tranquila de quem a escutava dizer que havia ido comprar morango no Tesco e a caixa estava mais cara do que na semana passada.
- . - Ele a escutou sair do banheiro.
Ele amava quando ela o chamava no plural, mas estava tão irado que nem teve espaço neural para se lembrar disso. Fervia de raiva. Sabia que não podia cobrar dela uma atitude condizente com a de um relacionamento, que era uma ideia que existia só em sua cabeça, mas se sentia estranhamente usado por . Sentia-se também idiota por ter xeretado o que não lhe dizia respeito e agora ter de lidar com o monstro ansioso crescendo em sua barriga, louco para bater de frente com ela.
- Eu tenho que ir - Ela pegou o celular rapidamente para ver a hora e checou as notificações na tela trancada. Checou a droga do emoji de coração. - Desculpa deixar essa bagunça - referiu-se ao baseado não terminado e à lata de cerveja.
- É, que seja. - Ele não conseguiu disfarçar a amargura que se espalhava corrosivamente por baixo de sua pele, embora estivesse se esforçando para manter um tom controlado.
- A gente se fala, ok? - ignorou sua língua repentinamente ferina, pegou a bolsa que havia largado em um dos ganchos perto da porta e girou a maçaneta.
- Claro. - Ele engoliu em seco. - Enquanto isso não acontece, boa foda com o Nolan!
virou-se para ele assim que a frase a atingiu, estarrecida. A boca entreaberta esperava receber ordens do seu cérebro sobre o que dizer. Os ombros se encolheram como se ela já tivesse sido pega pelo frio lá fora.
- Como você sabe?
- Da próxima vez que você for sair com um outro cara e comigo na mesma noite - ele embebia as palavras em sarcasmo. - Vê se não deixa seu celular vacilando por aí pra esfregar isso na minha cara!
- ! Eu não acredito que você olhou meu telefone! - Ela gesticulava, exasperada.
- Eu não olhei! - Ele tentava achar uma brecha para que saísse com a razão de qualquer maneira. - Você o largou em qualquer lugar! A tela simplesmente piscou, eu olhei pro lado e acabei lendo sem querer!
- Mesmo assim! - Ela não entregaria o primeiro lugar para ele de bandeja. - Você não tinha que ter lido nada!
- Foi automático! - ele replicou. - Não é como se eu pudesse controlar meus instintos, achei que era o meu celular!
O aparelho dele nem estava ao lado do dela, mas não tinha certeza se ela se lembraria disso. Havia de se ter muita malícia para sair por cima pelo menos uma vez contra .
Ela suspirou e seus ombros caíram. Bingo!
- Desculpa - ela soou mais branda. - Eu não gosto quando você fica sabendo dessas coisas, mas eu e o Nolan, você já tinha conhecimento de que a gente se pe… se vê também - bambeou com as palavras.
- Você falou a coisa certa: eu odeio ficar sabendo que vocês se pegam! E que você pega quem quer que seja. Eu sei e não quero mais saber. - Ele foi direto e reto. - Não quero mais ficar com você assim.
- , não fale como se eu fizesse essas coisas simplesmente pra te chatear! Eu tô vivendo a minha vida, é só isso! E você, a sua! Eu pensei que estava tudo certo!
Não tinha do que se queixar, não a podava por nada. Não reclamava de nada. Ela sabia que ele havia desenvolvido sentimentos por ela nos últimos meses e claramente mais do que ela por ele, mas nunca havia tentado impor isso. Antes de certos limites começarem a ficar implícitos, todas as vezes que ele a vira com outros caras, não reclamara, mesmo que isso só houvesse acontecido no começo de tudo. E, nessas ocasiões, ele também estava com alguém a tiracolo. Se não estava, arranjava.
A parte que ele havia omitido dela era que a cada vez que isso ocorria, ficava ofendido, mesmo que um pouquinho. E, nos últimos tempos, ao saber, ainda que sem querer, que ela deixaria de estar com ele para estar com outro, ou quando ficava com essa sensação ao escutar alguma resposta restritiva vinda dela, suas têmporas latejavam como se estivessem batendo sua cabeça contra a parede.
, ao vê-lo com outras garotas, sentia uma leve estranheza, mas nada que a fizesse perder o sono. O contrário dele, que pensava nela e ruminava o que ela estaria fazendo nos braços de seus amantes mais do que era saudável.
- Não é que está errado, . - Ele se levantou, subindo a voz, exaltado. - É um direito seu. Eu só tô gostando demais de você pra continuar aguentando isso. Não consigo mais levar isso pra frente se for pra ser assim, sabe?
Ela o viu caminhar até o maço de cigarros, na bancada que dividia a sala da cozinha.
- Saber que você sai com Nolan ou com quem quer que seja me deixa bem mal. - Ele completou e acendeu um. - Não consigo suportar a ideia de que tem outro cara ocupando o mesmo espaço que eu.
- Como assim? - Ele ficou surpreso por ela querer saber mais.
- Meio que tudo bem se você pega qualquer zé lelé na noite. Mas eu fico puto em saber que tem outro cara que vai na sua casa, passa o dia com você, te leva para os lugares bacanas que talvez a gente já tenha ido junto, frita bacon nas suas panelas… Ficou demais pra mim, saca?
- Por que você nunca disse que sentia ciúme? - Ela continuava parada no mesmo lugar, apenas seguindo-o com o olhar.
- Porque eu queria levar isso como fosse melhor pra você! - Ele tragou. - Mas eu tô me dando conta de que a melhor maneira pra você não é necessariamente a melhor maneira pra mim. - Encostou a cintura na bancada. - Eu acho que gosto de você mais do que você gosta de mim e tenho noção disso, então queria ir no seu ritmo, para não ter de abrir mão de ter você de alguma forma. Mas não consigo mais fazer isso sem me desrespeitar, sem me machucar, dá pra entender?
Ela largou a bolsa no chão. Caminhou em passos largos até ele e o abraçou.
- Eu sinto muito mesmo que você tenha visto essas mensagens. Você sabe que não fiz por mal.
- Eu sei, mas eu também não consigo evitar ficar mal. - Ele não retribuiu o abraço e continuou a fumar por cima do ombro dela - Isso tá me machucando mais do que eu consegui prever e eu não tenho mais condições, nem quero mais esconder isso de você.
- Eu gosto muito de você. E você sabe disso - ela dizia afundada na curva confortável entre seu pescoço e seu ombro. - Mas eu não sei se quero de verdade assumir um relacionamento sério e…
- , pelo amor de Deus! Assumir o quê? O que a gente praticamente já tem? - Ele se desvencilhou dela. - Nesse último ano, quase toda vez que eu voltei pra Londres a gente se viu. Desde que a tour acabou, você não sai da minha casa ou eu não saio da sua.
Era só o que faltava, ela pensou, ele ficar enumerando todas as coisas que vinham vivendo, como se ela não tivesse plena consciência do que estava fazendo com ele, porque queria fazer, nesse tempo todo!
- Você dormiu aqui a semana retrasada inteirinha. No mês passado, teve outra dessas. A gente conversa praticamente todo dia. Eu não consigo mais fingir que não sinto saudade no momento em que você diz que vai embora. Ou que tá tudo bem quando você não pode me encontrar - e as vezes dessas que, de alguma forma, eu sei que é porque você vai dar pra outro cara. - Ele voltou a se jogar no sofá. Bateu o cigarro no cinzeiro. - Era claro que ia acabar nisso pra um de nós dois, é a coisa mais óbvia que existe na história da humanidade! Ninguém aqui é ingênuo. Eu teria de ser muito frio, e você também, pra gente curtir tudo nesse nível e não dar bosta uma hora.
Agora era ela quem se apoiava no balcão, sem coragem de mirá-lo. Mas não tinha necessariamente dado bosta ainda, tinha? Ela se perguntava.
- Eu tô por aí, transando também? Tô. - continuava. - Mas tá vazio pra mim, sabe? Desde que a gente começou a se ver mais, eu tenho saído com outras, nada de novo sob o sol ou diferente de você, mas ultimamente eu tenho me sentido um perfeito saco de porra toda vez que vou pra cama com uma mulher que não é você.
- , você tem uma banda! - ela entrou no meio do raciocínio dele de sopetão, finalmente se manifestando, revoltada. - Tem milhões de garotas se arrastando por você. Se você pedir, elas lambem até seu pé suado! Você não devia nem querer falar de namorar sério, de exclusividade!
- Desculpa? - Ele liberou a fumaça em seus pulmões. - O que você tá querendo dizer com isso?
- , pra ser bem franca - ela mudou seu tom para um explicativo. - Você não é o primeiro cara de banda com quem eu me envolvo, isso sempre esteve bem claro. E se tem uma coisa que nenhum desses caras conseguiu me dar foi fidelidade. O exemplo mais recente disso é aquele bosta do meu ex. - Ela teve vontade de vomitar só de lembrar do quanto havia ficado na merda por causa de Landon, baterista de uma banda um pouco menos famosa que a de , mesmo que fizesse três anos do término. - Eu só assumi que você nunca ia me cobrar disso e a gente ia levando assim. Eu prometi para mim mesma não me comprometer com mais ninguém que eu não confie que terá o mesmo nível de comprometimento que eu. Tá tudo tão bom, sabe? O que tem de errado aqui?
- Você é a pior, - ele deu uma risada seca, incrédulo, e apagou o cigarro. - Sou eu que tô pedindo comprometimento aqui, por que porra eu faria isso se não estivesse disposto a ser fiel a você? Só porque eu sou de uma banda quer dizer que eu não tenho sentimentos? Que caralho de lógica é essa? Todo cara de banda é parte de uma casta fabricada pra exercer esse papel, então? É Aldous Huxley, agora? - fez uma referência ao mais célebre livro do autor mencionado, que ela pegou no ato.
- , olha... - Ela sentou-se ao seu lado. - Pra mim é como se fosse, porque…
- Eu tô apaixonado por você, porra! - ele finalmente explodiu, bracejando veementemente, saindo do sofá de volta para perto da bancada. Ela viu até cuspe voar de sua boca. - Eu acabei de te cantar uma porra de uma música sobre isso! O que mais eu preciso fazer pra você entender?
virou o rosto para o lado oposto ao dele, suspirando pesadamente. Onde é que estava a droga do botão de SOS para alguém tirá-la dali?
Tudo começara com ele pedindo para ela não ir embora quando dormia lá. Depois, insistia para ela voltar quando saía para trabalhar ou ficar mais um dia se não havia nada para fazer no seguinte. E, assim, passaram a se ver com uma frequência muito maior. Não se cruzavam mais por acaso, era sempre por vontade. Vinha sendo assim pelo menos nos últimos dois meses.
Com toda essa frequência afetiva, seria inevitável que não chegassem a um ponto no qual acabariam por discutir para onde estavam caminhando, ou que não começassem a brigar por pouca bosta e tudo se encerrasse de maneira brusca.
As comédias românticas de Hollywood eram a coisa mais clichê que existia, mas, como havia dito, levando em conta esse tipo de situação, o clichê era quase sempre uma cópia da vida real. Ela tinha consciência de que a relação enveredaria por esse rumo que a incomodava ao se entregar como vinha fazendo, mas havia preferido não pensar nisso: apenas foi porque a vida era uma só.
Por que o ato de ficar com alguém com frequência não podia permanecer nessa simplicidade quando estava tudo indo bem demais para ser verdade? Estava tudo indo tão bem para ela do jeito que estava, que ter de passar aquele processo a deixava dividida. Não queria partir o coração de , mas também não queria perder sua liberdade.
- Eu não tenho certeza sobre o que sinto - foi franca. - Eu amo a sua companhia, mas não sei se posso dizer que estou apaixonada.
Não era que ela não gostasse dele, ela gostava. E muito. Mais do que havia gostado de alguém desde que havia terminado seu último namoro. E era isso que a deixava louca. Sentira falta de uma companhia como aquela e amava passar horas a fio com , se sentindo uma máquina de palpitações. Ma não lhe apetecia a ideia de ter de entrar numa relação séria novamente, com um cara de banda novamente, e todo o peso e responsabilidade que isso trazia. Gostava demais de ser solteira. Tinha muito tempo para se descobrir (e pra descobrir muitas bocas e genitálias diferentes), para se permitir não ter um dia ruim de trabalho porque brigou com o companheiro, para fazer o que quisesse na hora em que quisesse. Adorava essa agitação. Estava curtindo o momento e meio que não queria abrir mão disso para apostar num relacionamento com um cara de quem gostava muito, mas não sabia se gostava o suficiente a ponto de se esforçar para que algo mais contratual desse certo. A ideia de perder até a amizade de por resolver “regularizar” as coisas e depois acabar moribunda de desilusão pelos cantos a deixava inquieta. Sabia qual era a sensação e não sentia nenhuma falta dela.
- Foda-se que você não esteja, eu estou! - ele ficou um pouco doido em escutar aquilo. Foi dolorido, mas não esperava mais. - E isso me deixa frágil em relação ao que você sente, ou melhor: não sente por mim!
- Eu sei, mas você tem a mulher que você quiser, você não precisa disso! - Os olhos de saltavam. - Não precisa de mim!
- Você tá certa. Eu não preciso de você. - Ele lhe apontava o indicador quase na fuça. - Mas eu quero você. - Fez uma pausa, olhando no fundo de suas pupilas e ela sentiu como se, de repente, ele fosse capaz de sugar sua alma. - E não é nada pouco. - Soltou o ar. - Mas eu não consigo mais ficar com você assim. Desculpa. Ou a gente deixa isso… Exclusivo - demorou a escolher a palavra certa. - Ou não dá mais para mim.
Uma realidade em que não existia mais em seus dias se projetou instantaneamente no seu cérebro e pareceu puxá-la pela raiz dos cabelos. As cenas pareciam insossas demais. Foi um tanto… Desesperador.
- . - Ela chegou mais perto dele, pronta para bombardeá-lo com alternativas. - E se a gente tentasse...
- Pra mim é isso ou acabou, - ele deu um ultimato. - Não me vem com essas histórias de relacionamento a três, ou sei lá o que você ia dizer.
- Eu não quero que acabe - disse antes de começar a carimbar beijos por seu pescoço, descendo a mão para a parte frontal de sua calça. - Mas eu também não sei bem dizer o que quero...
- Tira a mão daí - disse sem tocá-la, tentando manter a compostura ao sentir que ela abria sua braguilha. - Eu já disse que, pra mim, já deu se a gente não for se levar a sério e, principalmente, se você não começar a me levar a sério quando digo que estou apaixonado por você.
Ela arriou as calças dele até onde deu, levando junto a cueca, e se ajoelhou.
- Mas eu levo você a sério - ela afirmou e, sem demora, colocou o pau dele na boca, botando em prática sua estratégia agressiva para dissuadi-lo para fora daquela conversa.
- Se você me levasse a sério, não estaria tentando me chupar enquanto eu tento dizer que quero ter uma relação séria com você! - ele tentava não deixar a voz vacilar. - Meu pau não vai subir, eu tô puto da cara! Você pode parar com isso agora e ir lá resolver o que você tem pra resolver com o Nolan se for pra fazer as coisas dessa sua maneira mimada…
- Shhh - ela estendeu o braço e botou o que seus dedos alcançaram sobre os lábios dele. - Fica quietinho, fica? - disse, antes de voltar a envolvê-lo com a boca.
Ele nem percebeu como, mas obedeceu-a por alguns minutos, feito o paspalho que ela fazia dele.
- Que porra! - Espremeu os olhos e não conseguiu evitar agarrar os cabelos dela quando ela passou a sugá-lo com mais pressão. - Eu vou interpretar isso como um sim pra o que a gente estava falando - foi coercivo.
Ela retirou a boca dele com um leve estampido. Puxando o ar, se desfez da regata cinza que vestia, jogando-a no chão.
se sentiu os joelhos fraquejarem ao filmar seus movimentos. Sempre sem a porra do sutiã! Parecia que fazia de propósito para tirá-lo de si. Se havia uma coisa com a qual ele não podia brigar contra, eram aqueles peitos. Provavelmente seria capaz de matar um se tivesse um revólver ao alcance e ela lhe pedisse com eles de fora.
- Isso já é um problema seu, não meu - foi curta e grossa, mas de uma maneira insolente, o que deveria tê-lo deixado ainda mais enfurecido, mas só fez com que seu sangue se concentrasse ainda mais no que passava a ficar ereto abaixo de sua cintura e ela voltava a segurar.
Soltou o ar de uma vez pela boca assim que começou a deslizar a mão para cima e para baixo com o compasso e intensidade exatos que sabia que ele aprovava.
- Eu não acredito que eu tô deixando isso acontecer - ele disse baixinho, mais para si mesmo do que para ela, ao sentir o quão duro estava. - Foda, ! - ele encheu a boca para pronunciar as sílabas. - Você. É. Foda!
- Eu sei - ela concordou, dando uma resposta que distorcia o sentido das palavras dele, e voltou a chupá-lo com o olhar mais depravado do mundo estampado em seu rosto. notou o abuso e sentiu seu pau quase ganhar vida própria.
Quebrou o pescoço para trás, antes de voltar a mirá-la no ato, se livrando pela boca de todo o ar que respirara.
E lá ia ele, se esfolando desfiladeiro abaixo. Mais uma vez dando a ela um grande outdoor com seu rosto para que ela pichasse a palavra “IMBECIL”, bem assim, em letras garrafais, e botasse pra rodar na Picadilly Circus em horário comercial.
Antes que ficasse mais excitado do que conseguisse segurar, ele puxou para cima.
Bruscamente, posicionou-a de costas para ele e de frente para a bancada. Afastou seus cabelos e, segurando-os com força, praticamente atacou seu pescoço, sem conseguir decidir se o beijava, se absorvia o cheiro narcótico impregnado ali ou os dois. Ao mesmo tempo, sua mão desceu para dentro das calças dela e passou a estimular o que havia escondido ali.
- Por que você tem que ser tão gostosa? - perguntou retoricamente e mordiscou o lóbulo de uma das orelhas dela. Deslizou a mão que antes segurava o cabelo até seus seios, mantendo a outra no mesmo lugar, enquanto forçava seu quadril contra a bunda dela.
começou a abrir própria calça e se afastou para se livrar da sua, juntamente com os sapatos e o resto da roupa, largando tudo em qualquer lugar. Assim que terminou, sua figura nua já estava nua e sentada sobre o balcão, as pernas apelativamente afastadas, convidando-o para se deleitar.
Sem hesitar, ele a beijou com força, puxando seu corpo mais para a beirada do móvel. Parando para sugar seus mamilos no meio do caminho, o que a fez perder o fôlego, ele se abaixou até que sua cabeça estivesse na altura das coxas dela, aceitando o convite para degustar o que havia entre elas.
Não demorou muito e o celular de começou a tocar dentro da bolsa. se esforçou para não se distrair com o barulho.
Ela tinha certeza de que era Nolan querendo saber de seu paradeiro. Por um segundo se preocupou em atender para dizer a ele que, àquela altura do campeonato, teria de furar, mas se esqueceu disso no momento seguinte, quando encontrou com a língua um ponto tão certeiro que a teria feito cair de cima da superfície gelada se não tivesse segurado firme nas duas faces.
Quando o celular tocou pela terceira vez, parou o que fazia e olhou para ela, os cabelos despenteados por seus redemoinhos manuais, dizendo:
- Eu vou atender essa merda e mandar esse cara tomar no cu, bicho! - Ele sabia que era Nolan tanto quanto ela.
- Foco, - ela o advertiu, guiando a cabeça dele para onde estava antes. - Foco!
Algum tempo depois, quando a levava para o quarto com as pernas enroscadas em sua cintura e tendo a visão dos peitos mais bem formulados do universo balançando à sua frente, ele a escutou afrontá-lo:
- Pensei ter ouvido você dizer que não ia ficar de pau duro porque estava pê da vida…
- Cala a boca! - Ele disse, rindo pelo nariz um tanto contrariado, antes de jogá-la na cama.
Naquela noite, descobriu no sexo uma ótima ferramenta para extravasar sua frustração na própria pessoa que a causava. Provocou-a de todas as maneiras possíveis até deixá-la agonizando a ponto de implorar para que a fizesse gozar.
Quando se sentiu suficientemente convencido, seu corpo endureceu ao senti-la tremer em seus braços e ele se permitiu chegar lá um pouco depois, abraçando-a de uma forma que a sufocava ligeiramente.
Voltando a si, afrouxou o enlace, dando espaço para que ela pudesse usufruir novamente de oxigênio em quantidade. Esperou alguns segundos para sair de cima de e se levantou da cama ao som de sua respiração, que custava a se normalizar.
Deixou-a lá, estirada, e foi se desfazer do preservativo. Seu coração parecia que ia pular da boca e suas pernas pareciam mais pesadas do que o resto de seu corpo, fazendo com que cambaleasse ao caminhar. Aproveitando o embalo, enfiou-se debaixo da água mais para fria do que para quente do chuveiro.
Havia deixado a porta entre o banheiro e o quarto aberta. Finalizada a ducha, ao passo em que se enxugava, dirigiu-se a falando um pouco mais alto, para que a alcançasse no outro cômodo:
- Escuta! - Enrolava a toalha na cintura depois de secar a cabeça. - Isso tudo, agora, foi um sim, não foi? Eu estava falando sério quando disse que ia considerar como um sim, você tá ferrada.
Sendo recebido pelo barulho do vácuo, saiu para o recinto adjacente e deu de cara com encolhida debaixo de seu lençol cinza, os olhos fechados e o ritmo da respiração agora tranquila como a de uma criança que descansava depois de tocar o terror o dia inteiro.
Repentinamente tomado pelo cansaço, ele suspirou, resolvendo se entregar ao conforto de sua cama, que sempre parecia mais acolhedora quando dividida com ela (ele não tinha vontade de expulsá-la para ter mais espaço para as pernas). Largou a toalha de lado e dormiu quase que instantaneamente ao se deitar de bruços, não sem antes esticar um braço para enganchá-la.
Ao despertar, na manhã seguinte, estava em uma posição totalmente diferente da qual havia adormecido. Umedecendo a boca seca e piscando vagarosamente, ficou empolgado ao se lembrar de quem deitava ao seu lado e virou-se, pronto para puxá-la para perto e voltar a dormir.
Encontrou o vazio.
- ?! - ele berrou, na esperança de escutá-la gritar de volta de algum canto do apartamento. - ! - tentou de novo, mais alto.
Nada.
Não era a primeira vez que ela ia embora sem avisá-lo ou sem dizer tchau, então não estava surpreso. Só sentia uma dorzinha estranha no peito, que surgia todas as vezes que isso acontecia.
estendeu o braço, tateando o criado mudo ao seu lado em busca do celular e do maço de cigarros que sempre deixava ao lado da cama. Achou o primeiro item, o segundo não estava ali.
Na hora teve certeza de que ela havia o levado. era especialista em não lembrar de comprar cigarros e roubar os seus quando os dela acabavam, o que acontecia tipo sempre. Mais do que viciada em fumar, ela parecia especialmente viciada nos cigarros dele. Geralmente não se importava, mas roubar um maço quase cheio e justamente aquele, que ficava estrategicamente posicionado para ele matar a vontade de quando acordava, o fez querer sair atrás dela para estrangulá-la.
Sentiu seus olhos latejarem ao ser atingido pela luz do aparelho em sua mão. Era uma e três da tarde. Havia capotado.
Na tela, via-se duas mensagens de , de duas horas atrás, esperando por sua visualização:
11:10 am
“A parte da reunião cedo era verdade! Desculpa ir embora sem falar tchau, não quis te acordar.”
O que veio a seguir lhe causou uma pontada de regozijo no coração. Abriu um sorriso tão largo que teve certeza de que poderia entrar no Guiness Book com o maior sorriso do mundo.
11:12 am
“Sim. A resposta pra sua pergunta é que aquilo foi um sim.”
Filha da mãe! Tinha fingido estar dormindo para se livrar de responder, aquela falsa, sem-vergonha!
Tomado por uma agitação súbita, ele se esqueceu de que poderia adicionar essa canalhice como o segundo motivo em sua lista de razões para ficar puto com em um só minuto. Ansiosamente, inseriu sua senha de desbloqueio e digitou:
1:05pm
“O Big Ben vai tocar o sino como se a rainha tivesse morrido, depois dessa resposta!”
Gargalhando sozinho, ligou a caixa de som pelo aplicativo e selecionou “Hots On For Nowhere”, do Led Zeppelin, que vazou pelo ambiente os riffs pausados da introdução. No segundo em que começou a bradar a letra junto de Robert Plant, escutou o sinal de novas mensagens se sobressair à música e as palavras de pularam na tela mais uma vez:
1:06pm
“HAHAHAHAHAHAHAHA”
“Você mereceu, se esforçou bastante. Tive de reconhecer <3.”
Ficou feliz ao notar o emoji de coração. Isso porque se deu conta de que, agora, nem Nolan, nem qualquer um dos outros imbecis receberia mais um daqueles com aquela conotação. O cara mais sortudo de todos era, enfim, só ele.
1:07pm
“Tô a fim de ir jantar naquele lugar novo que te falei, em Old Street. Vamos hoje?”, ela enviou.
Levantando-se da cama, aumentou o volume da música e passou a competir com o sistema de som para ver quem conseguia soar mais alto. Explodindo de alegria e querendo acordar todos os vizinhos para contar o quanto viver era fabuloso, respondeu à sua, então, namorada:
1:08pm
“Me fala o número? Te vejo lá às oito!”
F I M
Nota da autora: Gente do céu! Nem eu tô acreditando que essa fic saiu! Eu tinha pensado inicialmente em uma outra história, que acabou ficando grande demais para ser parte de um ficstape. Depois de dia após dia quebrando a cabeça em como ia fazer para não ter de abandonar o "desafio", pensei em desenvolver uma cena que eu apenas mencionava nessa outra história, que deve ser publicada em breve, também aqui, sob o título de "Only a Heartbeat Away".
Acho que, no entanto, o desafio maior foi voltar a escrever histórias depois de quatro anos sem escrever nadinha. Tanta coisa aconteceu nesse meio tempo e acabei deixando essa paixão de lado. A última fic que publiquei no FFOBS já deve ter uns oito anos e bastante coisa mudou no meu jeito de escrever e pensar de lá para cá.
Agradeço à Thami por ter vindo com a ideia de um ficstape de uma das bandas que eu mais amo e escuto e por eu estar no grupo do FFOBS nesse dia, pra sair do caminho sem graça que é a vida sem escrever ficção! Eu amo demais desenvolver esse tipo de história e espero que vocês gostem de JOTH tanto quanto eu me deliciei escrevendo! Para quem gostou, corram para ler mais desse casal, que eu amo com força, em " Only a Heartbeat Away" assim que for publicada!
Espero voltar para vocês em breve com muitas outras histórias. Se alguém quiser falar comigo, meu Twitter é @devilishgrin.
Com carinho,
Annie Archer
Nota da beta: Ah que casal interessantíssimo!!! Eu adorei que nosso pp realmente se esforçou pra fazer a pp entender que ele gostava dela e nossa pp realmente foi sincera com ele e o tempo todo eu ficava abismada com esse casal super legal. Mas confesso que jurei que ele ia sair do banho e ela ia ter ido embora. Ou que depois, de manhã, ela ia sumir dele. Mas que bom que essa querida e super resolvida pp decidiu dar uma chance pros dois.
Adorei a fic, Annie, meus parabéns!! xx
Nota da beta: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Acho que, no entanto, o desafio maior foi voltar a escrever histórias depois de quatro anos sem escrever nadinha. Tanta coisa aconteceu nesse meio tempo e acabei deixando essa paixão de lado. A última fic que publiquei no FFOBS já deve ter uns oito anos e bastante coisa mudou no meu jeito de escrever e pensar de lá para cá.
Agradeço à Thami por ter vindo com a ideia de um ficstape de uma das bandas que eu mais amo e escuto e por eu estar no grupo do FFOBS nesse dia, pra sair do caminho sem graça que é a vida sem escrever ficção! Eu amo demais desenvolver esse tipo de história e espero que vocês gostem de JOTH tanto quanto eu me deliciei escrevendo! Para quem gostou, corram para ler mais desse casal, que eu amo com força, em " Only a Heartbeat Away" assim que for publicada!
Espero voltar para vocês em breve com muitas outras histórias. Se alguém quiser falar comigo, meu Twitter é @devilishgrin.
Com carinho,
Annie Archer
Nota da beta: Ah que casal interessantíssimo!!! Eu adorei que nosso pp realmente se esforçou pra fazer a pp entender que ele gostava dela e nossa pp realmente foi sincera com ele e o tempo todo eu ficava abismada com esse casal super legal. Mas confesso que jurei que ele ia sair do banho e ela ia ter ido embora. Ou que depois, de manhã, ela ia sumir dele. Mas que bom que essa querida e super resolvida pp decidiu dar uma chance pros dois.
Adorei a fic, Annie, meus parabéns!! xx
Nota da beta: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.