Finalizada em: 04/07/2020


Aviso: Caso você tenha sensibilidade com assuntos como abuso de drogas, álcool e suicídio, não leia. Não incentivo o uso de drogas e não quero influenciar ninguém, é apenas uma história.
Ainda, acho importante dizer que não tenho conhecimentos técnicos ou práticos sobre transtornos mentais, remédios controlados ou acompanhamento psicológico. Estou usando das ferramentas de pesquisa — google — para conhecer sobre a principal droga citada na história, o xanax (chamada de xanny por conta da música). Não tenho a intenção de ofender, desmerecer ou supor qualquer coisa sobre a classe dos profissionais da saúde, sejam médicos, enfermeiros, psicólogos ou psiquiatras. Caso alguém sinta que tratei o assunto de forma incorreta, peço desculpas antecipadamente e quero que tentem usar o bom senso de que é só uma história e que eu tentei ser a mais respeitosa possível, além de me basear em filmes como Garota, Interrompida, meu conhecimento sobre clínicas psiquiátricas é puramente ficcional e usei de liberdade criativa para tratar do assunto.

Capítulo Único


A noite da morte de Jason foi a mais quente do verão de Bel Air. Os jovens ricos se aglomeravam na casa de Megan Park, filha do grande empresário do meio musical Garth Park, para comemorar o início das férias antes do último ano do ensino médio. A estrela da noite era Jason, ele completara dezoito anos há uma semana e ganhara dos pais um modelo exclusivo de Land Rover.
Quando Nicole chegou na festa, com seus longos cabelos loiros caindo em grandes e rebeldes cachos em seus ombros, seus olhos castanhos observaram o local à procura do namorado e dos amigos. Não demorou muito para notar que o rapaz alto, sem camisa, gritando de cima de uma mesa de mármore era Jason. Ele já estava mais chapado do que ela previa e ela sentiu toda sua animação se esvair. Megan, sua melhor amiga, apareceu ao seu lado a abraçando.
— Nic! Você está maravilhosa. Vem beber algo. — A voz arrastada indicava que a morena não estava apenas bêbada. Nicole era provavelmente a pessoa mais certinha do local, mas ela estava acostumada a esse posto. Sendo filha de Louise, a princesinha das comédias românticas, ela cresceu sabendo comportar-se como uma perfeita herdeira que não deveria dar munição para tabloides. Mas, sendo sincera sobre o real motivo dela não beber ou usar drogas, era porque não gostava de perder o controle de seus pensamentos e de seu corpo. Apesar disso, seu grupo de melhores amigos tinha um grande histórico de envolvimento com drogas e confusão. Enquanto acompanhava Megan até a cozinha, Nicole se lembrou de um ocorrido no mês passado.

Era uma sexta feira, ela estava no carro de Jason e eles ouviam música, animados. Pensando agora, Nicole lembrou-se que não notou que Jason estava alterado, apesar de presenciar seus momentos há anos. Quando o namorado dirigiu para o centro, Nicole questionou o motivo de estarem indo pra uma área conhecida por ser pertencente a gangues. Jason ficou calado dirigindo e ela sentia seu coração ficar cada vez mais angustiado.
— Você fica aqui dentro. Eu volto logo. — Jason disse enquanto piscava duas vezes as luzes do carro e descia, batendo à porta. Eles estavam estacionados em uma rua escura, com pichações escrito “Malo Santo” pelos muros ao redor, um pouco mais à frente havia quatro homens e Nicole viu o namorado se aproximar deles andando rápido. Todos tinham tatuagens, pele morena e traços latinos. O mais novo e que agora se dirigia para Jason tinha cabelos lisos e longos, olhos esverdeados e uma bandana vermelha amarrada no pulso. Ele era mais alto que Jason e Nicole percebeu que algo estava errado quando Jason jogou um maço de dinheiro no peito dele e o rapaz colocou a mão esquerda nas costas para sacar uma arma. A garota não pensou, caso contrário não teria descido correndo do carro em direção ao namorado. Jason gritou pra ela ficar longe e o rapaz armado grudou os olhos nela. Nicole sentiu seu estomago embrulhar com a possibilidade de morrer, mas o rapaz guardou a arma e se dirigiu a Jason. Com um soco no estômago, o mais novo estava no chão se contorcendo. O moreno voltou a olhar para Nicole e por fim se afastou com os outros, dando espaço para a garota socorrer o namorado e o puxar com dificuldade até o carro.
Naquela noite o casal teve a pior briga de todo o relacionamento deles. O loiro se recusou a contar o motivo da discussão com o outro rapaz e porque tinham ido até o centro.


Já na cozinha de Megan, as amigas bebiam. Nicole achou uma lata de Coca-Cola perdida no meio de um mar de cervejas caras. Todos que passavam por ela a cumprimentavam, a garota era uma estrela. Distraída conversando, a loira se assustou ao sentir as mãos quentes de Jason em sua cintura. O mais velho puxou-a em direção a um beijo e Nicole sentiu o gosto amargo que os comprimidos deixavam na boca dele. Como a perfeita atriz que ela foi criada para ser, quando se olharam não havia vestígios de que ela notou o sabor na boca dele.
— Vamos lá fora? — Jason perguntou já a puxando pela mão. O jardim da casa era composto por flores e uma piscina que estava lotada de jovens bêbados. Nicole se sentou na grama e Jason deitou ao seu lado acendendo um cigarro. Ela tomou um longo gole do refrigerante e o garoto tragou o cigarro, jogou a fumaça para o alto e cantarolou uma parte da música que tocava na festa ao fundo. Nicole não conseguia tirar da cabeça a lembrança do ocorrido com a gangue. E se o rapaz tivesse atirado nela? A garota era acostumada a reprimir seus pensamentos, mas nos últimos meses as atitudes destrutivas do namorado estavam pesando em sua consciência.
— Quer um trago? — Jason perguntou já sabendo a resposta. Nicole apenas balançou a cabeça negando, ela estava acostumada a ser a fumante passiva. Alcançando o celular no bolso da saia de couro cara ela olhou a hora, já era quase meia noite.
Jason apagou o cigarro no chão e chegou mais perto da garota. Ele colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha dela e se curvou para beijá-la nos lábios. Nicole virou o rosto.
— Não me beija na sua pausa pra fumar. Nós não nos vimos durante a noite toda e agora você está completamente chapado. — Era surpreendente que as palavras tivessem saído tão rápido de seus lábios. Respirando fundo e aproveitando o momento de coragem, ela continuou. — Acho que não consigo mais fazer isso, Jason.
Ele sentiu seus dedos dormentes formigarem. Tinha usado metanfetamina pela primeira vez e era difícil sentir qualquer coisa, mas ouvir aquelas palavras saindo dos lábios carnudos da namorada o fez sentir uma dor no fundo do peito, seu mundo inteiro voltou pra órbita.
— O que você quer dizer? — Jason conseguiu verbalizar.
— Não quero amar alguém que está morrendo.
Uma parte de Jason morreu naquele instante, mas a noite só estava começando.

***

Branco.
Nicole jamais gostou de cores fortes, mas naquele momento a cor branca parecia a cor mais forte de todo o catálogo existente. Era tudo branco. Aquele tom de hospital em que um simples risco de poeira pode ser visto a distância. Foi após pensar na palavra hospital que conseguiu ter um flash de memória.
Ela estava em casa quando os enfermeiros chegaram, uma picada forte no braço e segundos depois tudo se apagou. Tentando sentar-se e olhar ao redor, ela viu pela primeira vez o que seria seu quarto pelos próximos meses. Era um cômodo grande, uma cama de casal, armário para roupas, um sofá ao lado da cama, uma porta onde deveria ser o banheiro, a porta principal e uma janela enorme com grades. Grades. Nicole entendeu que não era um hospital comum no exato instante que seus olhos atingiram as grades.
Quando conseguiu se levantar, percebeu que vestia uma roupa azul claro, meias e um par de chinelos estavam ao lado da cama. Os cachos loiros estavam emaranhados, mas ela conseguiu prender no alto com o próprio cabelo.
Andando até a porta principal do quarto, Nicole forçou a fechadura e se surpreendeu ao perceber que estava aberta. Mas antes que pudesse dar dois passos para fora, um enfermeiro alto e forte lhe alcançou.
— Senhorita DeLacourt! O Dr. Kurt está à sua espera. Seu café da manhã está na sala dele, vou te acompanhar. — O rapaz tinha um sotaque forte da Inglaterra e Nicole ainda estava fraca para titubear e não o acompanhar.
Doutor Kurt era um homem de meia idade com rugas emoldurando seus olhos e seus grossos lábios. A pele negra ainda vívida escondia sua verdadeira idade e seu sorriso grande capturou a atenção da loira fazendo com que ela se sentasse na cadeira em sua frente.
— Obrigado, Frank. — O médico agradeceu o enfermeiro, que se retirou em seguida. Sentando-se atrás da grande mesa de madeira, ele empurrou a bandeja de comida para Nicole. — Está com fome, Nicole?
Ela não sabia ao certo se a dor que sentia do estômago era fome ou medo do que estava acontecendo. Mas preferiu alcançar uma maçã para manter as mãos ocupadas. Seus dedos tremiam quando mordeu a fruta.
— Você deve estar confusa. Meu nome é Kurt. Sou psiquiatra e responsável pela ala Coral, a que você está. A Clínica Mind Hope tem como objetivo acompanhar jovens que passam por traumas e precisam de ajuda para se recuperar. Você se lembra do que aconteceu?
Nicole parou de mastigar. A maçã parecia concreto descendo por sua garganta.
— Jason morreu. — As palavras saíram e sua voz parecia com a de um fantasma.
Dr. Kurt esperou que ela continuasse, mas a garota não entendeu o que o médico queria saber.
— Sim, Jason morreu. Mas não vamos tratar disso ainda. Quero saber se você lembra o que aconteceu com você.
A loira estava confusa, então deu de ombros e continuou comendo a maçã.
— Você tomou um frasco de aspirina com whisky, Nicole. — Dr. Kurt respondeu.
— Eu estava com dor de cabeça.
O médico escreveu algo em um bloco de papel. Só então a garota percebeu que estava sendo analisada. Ela se lembrava da noite em que tomou os comprimidos. Tinha acabado de retornar da missa de sétimo dia de Jason, estava dirigindo pra casa quando virou em direção ao centro da cidade, indo pelo mesmo caminho que o namorado tinha dirigido no mês anterior. Quando a paisagem das ruas começou a mudar, as lojas caras foram tomadas por grafites coloridos e pichações, ela então se lembrou que sua mãe não compareceu a missa pois tinha uma reunião com um produtor interessado em filmar um reality show dela. Nicole riu amargurada ao imaginar a casa cheia de câmeras e ela sendo obrigada a sorrir e fingir que tudo dentro dela ainda estava bem, quando cada pedaço doía. Pisando mais no acelerador, as luzes passavam depressa pelo espelho do retrovisor. Ela pensava que finalmente a dor iria parar, iria parar de sentir, a avalanche de pensamentos que tomava sua mente todos os dias era inexplicável. Com uma mão, Nicole alcançou o frasco de comprimidos e engoliu com a ajuda de longos goles do whisky, a garota sentia seu corpo flutuar, finalmente perdendo o controle de suas ações e silenciando as vozes que tomavam sua cabeça.
O resto da noite era um borrão, mas antes de apagar ela tinha visto o garoto latino que bateu em Jason. Talvez tenha sido seu subconsciente problemático que criou a ilusão, mas a loira tinha a imagem do rosto do rapaz em sua mente.
Retornando sua atenção para a sala do médico, Nicole sorriu e tentou parecer controlada. Ela havia crescido sabendo esconder suas emoções, além de manipular as pessoas ao redor a seu favor e, naquele momento, a mais nova queria receber alta o mais rápido possível.
— Eu não estava bem, Dr. Kurt. Entendo que minhas atitudes foram inconsequentes e que perder o Jason mexeu com minhas emoções, meu equilíbrio, mas sejamos sinceros... Uma clínica psiquiátrica? Isso é um pouco demais. — Nicole colocou toda sua habilidade encantadora, mas sua voz ainda saiu fraca e instável.
O médico assentiu com a cabeça levemente e juntou as mãos no colo.
— Que bom que você percebe que seu emocional precisa de atenção, Nicole. Nosso programa é baseado em sinceridade, respeito, confiança e perseverança. Seus pais permitiram sua internação até que você mostre resultados satisfatórios. Teremos consultas três vezes na semana, além disso você fará parte de um grupo de conversas duas vezes por semana. Temos aulas de yoga, música e artesanato. Acredito que você não está vendo esse local da forma correta, Nicole, só queremos te ajudar.
A loira estava atônita. A cereja daquele bolo de desespero foi a palavra “artesanato”. Respirando mais rápido, parecia que o ar não entrava o suficiente em seus pulmões. Ela estava morrendo. A sala estava girando, seu estômago embrulhou e suas mãos estavam muito geladas. O médico dizia algo, mas parecia que ela estava surda. Quando sentiu sua cabeça ser empurrada para baixo, entre suas pernas, começou a respirar melhor. Foram minutos, mas pareciam horas perdidas no meio daquele ataque. Nicole jamais havia se sentido daquela maneira.
Quando alcançou o copo de água e um comprimido que o médico segurava, mal quis saber o que era, se a fizesse parar de sentir aquilo, ela tomaria qualquer coisa. Se existisse algo que aniquilasse seus sentimentos, ela venderia a alma para ter.
— Xanax. — Dr. Kurt disse explicando o que era o comprimido. — Vai ajudar com suas crises de ansiedade e pânico.
Nicole não sabia ainda, mas havia acabado de conhecer seu melhor amigo — e nem precisara vender a alma.

***

Na primeira noite que passou na clínica, Nicole escreveu a frase “Eu sinto” no caderno que o psiquiatra havia dado a ela no fim da consulta. E ela realmente sentia. Sentia saudades de Jason, sentia frustração por não o ter salvo e sentia raiva por ainda estar ali sentindo tudo. Seu corpo e sua mente eram como uma engrenagem que funcionava sem parar, sem um mísero segundo de silêncio interno. Era estranho estar longe de casa, mas ao mesmo tempo reconfortante não ver o rosto perfeito dos pais.
Quando o enfermeiro Frank bateu na porta, ela se assustou. As luzes se acenderam no momento em que se sentou na cama.
— Com licença, hora dos remédios. — Ele disse aproximando-se com um copinho de plástico que tinha três comprimidos dentro. Nicole engoliu com a ajuda de um copo de água e abriu a boca mostrando que não havia escondido nenhum embaixo da língua. Ele se retirou logo, apagando a luz e fechando a porta. Em pouco tempo a mente da garota parou de zunir com as memórias e tudo se tornou um silêncio gostoso, assim como seu corpo foi ficando leve e dormente. Ela não fazia ideia do que eram os remédios, mas pela primeira vez na vida ela se questionou porque nunca havia usado drogas. Perder o controle do corpo e da mente era tudo o que ela mais desejava.

***

O segundo dia não existiu. Nicole dormiu quase que o dia todo, dopada demais para querer ver a luz do sol. Mas na terceira manhã na clínica ela foi obrigada a se aprontar e comparecer ao grupo de conversas que o Dr. Kurt havia mencionado. Já vestida com suas próprias roupas, ela se sentia um pouco mais confortável na própria pele. Era uma sala grande cheia de cadeiras estofadas organizadas em círculo. A maior parte dos participantes eram jovens e ela reconheceu alguns rostos de festas famosas que frequentou com a família ou com Jason. Hollywood era um prato cheio para problemáticos. Um homem jovem, apenas alguns anos mais velho que ela, acenou para que se juntasse ao grupo. Ela deduziu que ele era o médico responsável pelo grupo e, assim que se sentou em uma das cadeiras, eles começaram a reunião. Era como um desabafo e todos ouviam calados enquanto cada um falava o que sentia, pensava ou como estava sendo estar ali. Quando restou apenas Nicole que não havia se pronunciado, a garota sentiu uma ansiedade e desconforto. Ela não sabia o que falar.
— Você pode dizer o que quiser, Nicole. — O médico instigou.
Respirando fundo, a loira levantou os olhos observando os rostos que a encaravam. A única pessoa que vinha à sua mente era Jason.
— Namorei com Jason por três anos. Nós nos conhecemos quando tínhamos seis anos e ele roubou uma florzinha amarela e me deu enquanto brincávamos na escolinha. Ele dizia que eu era o sol da vida dele, a luz que guiava todos os seus caminhos. — As palavras vinham de dentro de sua alma e ela nunca havia se mostrado tanto quanto naquele momento. — Mas acho que em algum momento eu apaguei e ele se perdeu. Eu o via se afogando cada dia um pouco mais e a vida ia se esvaindo a cada droga nova que ele usava. Acho que Jason já estava morto antes de... Morrer realmente.
A frase que Nicole não falou em voz alta, mas completou mentalmente foi de que Jason havia levado a parte pura e boa dela com ele.

***

— O meu preferido é o xanax. — Vincent disse enquanto dedilhava o violão em seu colo. Nicole riu brincando com a grama e olhando para o céu azul acima de suas cabeças. Os dois estavam no jardim da clínica e, naquela manhã de sol, Nicole completava cinco meses de internação.
— Você sabe que o meu também. — A loira respondeu. Vincent era o único amigo que havia feito durante os meses que se seguiram. O músico estava internado para tratar uma crise depressiva e vício em álcool. Em um mundo paralelo, Nicole jamais imaginou se ver sentada conversando sobre qual era seu remédio preferido, mas ali estava ela.
— Nicole, sua consulta com o Dr. Kurt é agora. — O enfermeiro Frank os interrompeu.
Levantando-se do gramado, a garota bagunçou o cabelo ruivo do amigo e combinou de encontrá-lo à noite.
Enquanto caminhava pelos corredores até a sala do psiquiatra, Nicole conversava com Frank sobre o pedido de noivado que o enfermeiro havia feito à sua noiva. Ela o ajudara a pensar em uma surpresa. Já na sala do Dr. Kurt, a garota se sentou sorrindo na cadeira e esperou pelos comentários do médico.
— Você parece feliz, Nicole. — Ele observou.
— Sim! Estou em um ponto alto, os sentimentos estão alinhados dentro de mim.
O médico a observou calmo, como se quisesse ver traços de mentira em suas palavras. A verdade era que Nicole havia aprendido a elaborar muito bem suas palavras e, apesar de estar totalmente quebrada por dentro, ainda queria receber alta.
— Chegou o momento de falarmos sobre o Jason.
Sobre a morte de Jason, era isso que ele queria dizer. Depois de dezenas de consultas, esse era o único assunto que não havia sido tratado com afinco. A última tentativa resultou na pior crise de pânico que Nicole já havia tido.
— Jason. — Foi necessário todo seu autocontrole para permanecer sã. — Nós não conversamos muito naquela noite e eu disse que não conseguia amar alguém que estava morrendo. — Sua mente se projetou pra noite em que o namorado fumava no jardim ao lado dela.

— O que você quer dizer? — Jason conseguiu verbalizar.
— Não quero amar alguém que está morrendo.
O loiro cambaleou ao se levantar, as palavras da namorada o magoaram e ele não entendia como ela podia querer jogar fora todo o amor que eles compartilhavam entre si. Quando Jason alcançou a chave do carro no bolso da calça e foi andando lento até onde o carro estava estacionado, Nicole o seguiu preocupada.
— Jason, onde você vai? — Alguns curiosos olharam quando ela falou alto. Ninguém imaginava a complexidade dos problemas do relacionamento deles.
— Sai de perto de mim, Nicole. — O garoto já estava no meio da rua quando se virou e gritou. — Por que você está desistindo de nós? Eu te amo tanto, Nicole. Nós temos algo raro, cada parte de mim te admira, se sente completa só quando você está comigo. Eu não preciso disso. — Ele disse jogando no chão os pacotinhos de drogas e os frascos de comprimidos que estavam no bolso da calça. Nesse momento a calçada estava repleta de pessoas assistindo ao show dos dois. — Eu só preciso de você. Você é a melhor droga que esse mundo criou, a droga feita sob medida pra mim. Eu só preciso de você comigo. — Lágrimas brilhavam enquanto escorriam pelo rosto branco dele. Jason estava desolado, desesperado para que Nicole lhe desse uma chance. A garota sentiu que ele estava sendo sincero, lembrou-se do garoto loiro de grandes olhos azuis que se declarou pra ela aos quinze anos, quando começaram a namorar. Ela o amava. Quando a loira balançou a cabeça positivamente, Jason deu um sorriso de alívio, mas sua expressão foi cortada pelo carro que o atingiu em alta velocidade.
Nicole gritou. O grito mais alto que dera em sua vida toda. O corpo de Jason estava atirado no asfalto a alguns metros de distância. Cada passo que ela deu em direção a ele parecia durar uma eternidade. Alguém gritou para chamarem a ambulância e, em meio ao caos que se instalou na rua, Nicole se ajoelhou ao lado do corpo do namorado. Tinha vidro por todos os lados, ela sentiu os cacos nos joelhos descobertos, mas a dor era irrelevante. O mundo todo parecia em silêncio quando ela tocou a pele pálida de Jason coberta de sangue. Ele ainda respirava com dificuldade, parecia com medo quando seus olhos alcançaram os dela. Ele tinha grandes olhos claros quase sempre vidrados por conta de alguma droga, mas naquele instante seus olhos pareciam opacos e completamente inocentes.
— Eu só preciso de você, por favor, fica comigo. — Nicole implorou em desespero.
Jason tentou falar, mas só balbuciou palavras desconexas enquanto sangue saía de seus lábios. Alguém gritou pra checarem se ele estava respirando. Nicole segurava o corpo do loiro quando ele apertou sua mão pela última vez. O mundo ainda estava em câmera lenta quando a ambulância chegou e constataram a morte de Jason.


Quando Nicole terminou de contar o que se lembrava do ocorrido para o médico, sua respiração estava acelerada, como se tivesse corrido uma maratona. Ela esperou pelo ataque de pânico, mas permaneceu firme sentada na cadeira. Era mais fácil falar sobre seus sentimentos quando se estava sob o efeito de calmantes, a dor não a atingia realmente. Era como um fantasma.
— Acho que chegamos no ponto que precisávamos. Você consegue entender que não teve culpa sobre a morte de Jason? — Dr. Kurt perguntou anotando algo no bloco.
Nicole sabia o que deveria dizer. “Sim, não tive culpa, foi um acidente. O motorista bêbado perdeu o controle do carro.” Essa frase seria sua libertação. Mas, no fundo de sua alma, a imagem do namorado chorando no meio da rua e implorando pra ela ficar assombrava seus pensamentos. Ela era a culpada.
— Sim, não tive culpa, foi um acidente. O motorista bêbado perdeu o controle do carro.

***

Quando Nicole recebeu alta da clínica no mês seguinte, ela parecia com a garota que era seis meses antes. Seus loiros cabelos cacheados vibravam com o vento como se comemorassem sua liberdade. Ela sorria quando Megan e os pais lhe receberam na porta da clínica. Ninguém notou a tristeza em seus olhos. Ninguém citou o nome de Jason ou as notícias que saíram nos jornais enquanto ela estava internada.
Enquanto caminhava até o carro segurando a bolsa cara nas mãos, Megan brincou perguntando:
— O que te deram de bom aí, heim? — Referindo-se aos remédios.
— Nada que eu precise aqui fora. — Nicole riu.
Em seu bolso da jaqueta estava um frasco de xanax. Seu novo e único amigo.


Fim.



Nota da autora: Oi gente, espero que alguém tenha lido! Se você quer saber mais sobre o que vai acontecer com a Nicole, quem é o rapaz misterioso e acompanhar mais a vida de todos eles, irei postar em breve uma fanfic que será uma espécie de continuação dessa. Quando sair coloco o link dela aqui, mas fiquem de olho nas atualizações do site.
Obrigada a quem leu e até breve. Beijos, Babi. @bamontteiro

Nota da beta: Estou apaixonada pela sua escrita, Babi! A história e a personagem principal foram super bem trabalhadas em apenas 10 páginas, não é qualquer um que consegue fazer isso! E que personagem principal, hein? Fiquei super tensa com esse final, ótima atriz ela. Eu amei de verdade e estou louca para ler a continuação!!! Parabéns!! <3

Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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