Capítulo Único
null encarava a tela do celular sem saber ao certo o que sentir. Achava graça do que a amiga tinha dito? Sentia-se perturbada? Pensava que Julia estava lhe dando um golpe baixo? Tudo não deveria ter passado de um desabafo sobre o quanto queria um contatinho para aquele momento. A outra não precisava pegar pesado ao aconselhá-la a trazer null pra dentro do apartamento!
“Tá maluca?!”, digitou em resposta para a amiga.
“Não, ué”, Julia enviou. “Sempre existiu uma tensão sexual gigantesca entre vocês. Seu irmão viajou a trabalho, o sofá que vocês compraram é um conforto só e a casa é toda sua até domingo. O cenário me parece bastante favorável.”
Julia estava maluca, concluiu.
De fato, era verdade que o clima ganhava outros moldes quando null estava por perto. E isso é desde o início, pensou, lembrando-se de quando haviam se conhecido: a festa de boas-vindas aos calouros do ano de 2018. A boate fervia em meio à música alta, luz negra e tinta neon. O único dia em que null era apenas o cara gato com quem ficou quase que a festa inteira; no dia seguinte, o rapaz foi-lhe apresentado oficialmente. O desconhecido era, então, um dos grandes amigos que null , seu irmão, havia feito na cidade. null deixou de ser uma opção de contatinho no mesmo instante.
“Você sabe que se null descobre que um amigo dele tá me pegando, a casa cai.” Julia sabia qual era o nível de ciúmes que seu irmão mais velho sentia. Já havia escutado muitos desabafos à cerca daquilo.
“null é um bosta”, a amiga mandou no mesmo segundo. Ei!, null pensou. Estava prestes a digitar uma mensagem repreendendo a amiga por ter falado daquele jeito, quando o restante do ponto de vista da outra apareceu na tela. “Desculpa. Sei que ele é seu irmão e que você o ama, mas vamos combinar, amiga, ele não tem o direito de interferir nos seus relacionamentos. Se você tá afim de um amigo dele, que que tem?!”
null soltou um suspiro pesado. Nem ela entendia porque null ficava tão fora de si quando algum de seus amigos demonstrava interesse nela; era assim desde a adolescência. A única coisa que null fazia, então, era evitar qualquer rapaz que fosse minimamente próximo do irmão, para evitar discussões e até mesmo quebra de amizades.
Mas null ... ah, null ela tinha que admitir que era um pouco complicado. null sequer sonhava com o que havia acontecido na boate, no início do ano anterior, mas ela dificilmente esqueceria a primeira aventura vivida na cidade grande. Não esqueceria, também, a decepção por saber que havia se envolvido justamente com alguém que o irmão gostava tanto. Soube, no momento em que foram apresentados, que não teria chance alguma de haver um repeteco.
“Prefiro não contrariar. Evitar confusão é o melhor que pode ser feito”, concluiu. “Amiga, vou deitar. Boa noite!”
“Nhé. Vai se resolver com seus dedinhos, então!”
null bloqueou a tela do celular, ciente de que não conseguiria dormir tão cedo. O período fértil era um dos mais difíceis para seu calendário hormonal. Tinha a sensação de que seria capaz de dar até para o poste, tamanha a vontade, e receber o conselho de que deveria chamar null para seu apartamento naquelas condições apenas fez com que o sangue corresse mais rápido por suas veias.
Sabia de onde vinha aquele desejo pelo amigo do irmão. Há um ano, ela era a menina do interior que se mudou para a cidade grande para estudar. A festa dos calouros foi um divisor de águas em sua vida. Não era nenhuma santa imaculada – havia até terminado um relacionamento de quase dois anos quando passou no vestibular –, mas foi a primeira vez em que se permitiu ir tão longe com alguém que sequer sabia o nome. Não recusou quando null perguntou se podia leva-la para o banheiro da boate. Muito pelo contrário, achou ótimo! Gostou mais ainda do que aconteceu dentro da cabine. Lembrava-se da força dos braços de null em torno de seu corpo, e do quanto seus dedos eram longos e ágeis. O hálito quente, língua passeando sobre a pele, barba por fazer arranhando o pescoço. ARGH.
Enterrou o rosto em uma almofada, contorcendo-se no sofá.
— Foda-se o null — grunhiu, tornando a pegar o celular e abrindo o whatsapp. Julia estava mais do que certa.
***
— Trouxe cerveja! — null exclamou assim que a porta do apartamento foi aberta, erguendo a sacola com algumas garrafas verde escuro.
— E eu preparei a pizza — null completou, permitindo a passagem do rapaz.
O convite foi feito de última hora, via whatsapp. Pizza congelada comprada em supermercado acompanhada de episódios aleatórios de Game of Thrones pareceu um programa bastante apropriado para se fazer às 23h de um sábado qualquer. Era tudo o que null tinha para oferecer, pelo menos.
— null tá no banheiro? — a visita perguntou, jogando-se no sofá. null achou que teria mais tempo antes de null dar a falta do amigo.
— Ah, não te contei? — fez-se de desentendida. — O null foi pro interior ontem à noite. A turma de Biologia foi fazer uma visita técnica no Pantanal e só voltam na quarta.
Viu o espanto tomar conta da feição de null , bem semelhante à reação do ano anterior, quando soube que a menina com quem ficou era a irmã mais nova de um de seus melhores amigos.
— Olha... – null limpou a garganta, sem saber ao certo o que dizer. – Não sei se devemos ficar aqui sozinhos, sem seu irmão.
As suspeitas de null se confirmaram: provavelmente ele não teria aceitado o convite se soubesse daquele detalhe desde o início. Nunca tinham ficado sozinhos desde a boate, e ao que tudo indicava, null queria que as coisas continuassem assim.
— Por quê?
Não era burra. Sabia muito bem a resposta, mas queria que null tivesse peito para dizer em voz alta.
— Ah, null ... – hesitou. – Você sabe como o null é quando se trata de você.
null . Sempre null . Aquela conversa definitivamente não estava levando o rumo que ela gostaria.
— Sei, e acho um completo absurdo – depois daquilo ela com certeza sentaria para conversar com o irmão a respeito de seu comportamento super protetor. As atitudes do irmão não poderiam continuar atrapalhando sua vida desse jeito. Como assim um rapaz estava se recusando a ficar sozinho com ela por conta daquilo? Ele não hesitou nem um segundo em entrar com ela na cabine do banheiro de uma boate, antes de saber que era a caçula de um de seus melhores amigos.
— Tudo bem achar. Eu acredito que ele é um pouco exagerado, mas... – tomou fôlego. – Isso não muda o fato de que, agora, seu irmão é assim e ele é meu amigo. Não quero conflitos.
null estava pronto para se levantar, quando a menina tomou ar.
— Você se lembra?
O rapaz congelou.
— Você se lembra? – repetiu.
— E tem como esquecer? – retrucou, após alguns segundos de silêncio. Se fez de desentendido esse tempo todo... – null , eu preciso ir.
— Você conhece o caminho até a porta.
Não ficou na sala para ver null se retirar. Foi até a cozinha, onde um cheiro leve de queimado começava a sair de dentro do fogão. Daria tempo de salvar a pizza.
No final das contas, seria ela e a comida naquela noite. Tomara que null fosse descente o suficiente e deixasse as cervejas na sala.
“Tá maluca?!”, digitou em resposta para a amiga.
“Não, ué”, Julia enviou. “Sempre existiu uma tensão sexual gigantesca entre vocês. Seu irmão viajou a trabalho, o sofá que vocês compraram é um conforto só e a casa é toda sua até domingo. O cenário me parece bastante favorável.”
Julia estava maluca, concluiu.
De fato, era verdade que o clima ganhava outros moldes quando null estava por perto. E isso é desde o início, pensou, lembrando-se de quando haviam se conhecido: a festa de boas-vindas aos calouros do ano de 2018. A boate fervia em meio à música alta, luz negra e tinta neon. O único dia em que null era apenas o cara gato com quem ficou quase que a festa inteira; no dia seguinte, o rapaz foi-lhe apresentado oficialmente. O desconhecido era, então, um dos grandes amigos que null , seu irmão, havia feito na cidade. null deixou de ser uma opção de contatinho no mesmo instante.
“Você sabe que se null descobre que um amigo dele tá me pegando, a casa cai.” Julia sabia qual era o nível de ciúmes que seu irmão mais velho sentia. Já havia escutado muitos desabafos à cerca daquilo.
“null é um bosta”, a amiga mandou no mesmo segundo. Ei!, null pensou. Estava prestes a digitar uma mensagem repreendendo a amiga por ter falado daquele jeito, quando o restante do ponto de vista da outra apareceu na tela. “Desculpa. Sei que ele é seu irmão e que você o ama, mas vamos combinar, amiga, ele não tem o direito de interferir nos seus relacionamentos. Se você tá afim de um amigo dele, que que tem?!”
null soltou um suspiro pesado. Nem ela entendia porque null ficava tão fora de si quando algum de seus amigos demonstrava interesse nela; era assim desde a adolescência. A única coisa que null fazia, então, era evitar qualquer rapaz que fosse minimamente próximo do irmão, para evitar discussões e até mesmo quebra de amizades.
Mas null ... ah, null ela tinha que admitir que era um pouco complicado. null sequer sonhava com o que havia acontecido na boate, no início do ano anterior, mas ela dificilmente esqueceria a primeira aventura vivida na cidade grande. Não esqueceria, também, a decepção por saber que havia se envolvido justamente com alguém que o irmão gostava tanto. Soube, no momento em que foram apresentados, que não teria chance alguma de haver um repeteco.
“Prefiro não contrariar. Evitar confusão é o melhor que pode ser feito”, concluiu. “Amiga, vou deitar. Boa noite!”
“Nhé. Vai se resolver com seus dedinhos, então!”
null bloqueou a tela do celular, ciente de que não conseguiria dormir tão cedo. O período fértil era um dos mais difíceis para seu calendário hormonal. Tinha a sensação de que seria capaz de dar até para o poste, tamanha a vontade, e receber o conselho de que deveria chamar null para seu apartamento naquelas condições apenas fez com que o sangue corresse mais rápido por suas veias.
Sabia de onde vinha aquele desejo pelo amigo do irmão. Há um ano, ela era a menina do interior que se mudou para a cidade grande para estudar. A festa dos calouros foi um divisor de águas em sua vida. Não era nenhuma santa imaculada – havia até terminado um relacionamento de quase dois anos quando passou no vestibular –, mas foi a primeira vez em que se permitiu ir tão longe com alguém que sequer sabia o nome. Não recusou quando null perguntou se podia leva-la para o banheiro da boate. Muito pelo contrário, achou ótimo! Gostou mais ainda do que aconteceu dentro da cabine. Lembrava-se da força dos braços de null em torno de seu corpo, e do quanto seus dedos eram longos e ágeis. O hálito quente, língua passeando sobre a pele, barba por fazer arranhando o pescoço. ARGH.
Enterrou o rosto em uma almofada, contorcendo-se no sofá.
— Foda-se o null — grunhiu, tornando a pegar o celular e abrindo o whatsapp. Julia estava mais do que certa.
***
— Trouxe cerveja! — null exclamou assim que a porta do apartamento foi aberta, erguendo a sacola com algumas garrafas verde escuro.
— E eu preparei a pizza — null completou, permitindo a passagem do rapaz.
O convite foi feito de última hora, via whatsapp. Pizza congelada comprada em supermercado acompanhada de episódios aleatórios de Game of Thrones pareceu um programa bastante apropriado para se fazer às 23h de um sábado qualquer. Era tudo o que null tinha para oferecer, pelo menos.
— null tá no banheiro? — a visita perguntou, jogando-se no sofá. null achou que teria mais tempo antes de null dar a falta do amigo.
— Ah, não te contei? — fez-se de desentendida. — O null foi pro interior ontem à noite. A turma de Biologia foi fazer uma visita técnica no Pantanal e só voltam na quarta.
Viu o espanto tomar conta da feição de null , bem semelhante à reação do ano anterior, quando soube que a menina com quem ficou era a irmã mais nova de um de seus melhores amigos.
— Olha... – null limpou a garganta, sem saber ao certo o que dizer. – Não sei se devemos ficar aqui sozinhos, sem seu irmão.
As suspeitas de null se confirmaram: provavelmente ele não teria aceitado o convite se soubesse daquele detalhe desde o início. Nunca tinham ficado sozinhos desde a boate, e ao que tudo indicava, null queria que as coisas continuassem assim.
— Por quê?
Não era burra. Sabia muito bem a resposta, mas queria que null tivesse peito para dizer em voz alta.
— Ah, null ... – hesitou. – Você sabe como o null é quando se trata de você.
null . Sempre null . Aquela conversa definitivamente não estava levando o rumo que ela gostaria.
— Sei, e acho um completo absurdo – depois daquilo ela com certeza sentaria para conversar com o irmão a respeito de seu comportamento super protetor. As atitudes do irmão não poderiam continuar atrapalhando sua vida desse jeito. Como assim um rapaz estava se recusando a ficar sozinho com ela por conta daquilo? Ele não hesitou nem um segundo em entrar com ela na cabine do banheiro de uma boate, antes de saber que era a caçula de um de seus melhores amigos.
— Tudo bem achar. Eu acredito que ele é um pouco exagerado, mas... – tomou fôlego. – Isso não muda o fato de que, agora, seu irmão é assim e ele é meu amigo. Não quero conflitos.
null estava pronto para se levantar, quando a menina tomou ar.
— Você se lembra?
O rapaz congelou.
— Você se lembra? – repetiu.
— E tem como esquecer? – retrucou, após alguns segundos de silêncio. Se fez de desentendido esse tempo todo... – null , eu preciso ir.
— Você conhece o caminho até a porta.
Não ficou na sala para ver null se retirar. Foi até a cozinha, onde um cheiro leve de queimado começava a sair de dentro do fogão. Daria tempo de salvar a pizza.
No final das contas, seria ela e a comida naquela noite. Tomara que null fosse descente o suficiente e deixasse as cervejas na sala.
Fim?
Nota da autora: Mais um ficstape pra conta. Obrigada por ler! <3