Prólogo - Waking up in blood
Uma tempestade caía do lado de fora da minha casa, as gotas açoitando a janela do meu quarto como cubos de gelo caindo dentro de um copo de vidro. O tempo, para uma noite de verão, parecia punitivo, como se um crime tivesse sido cometido. Ou talvez fosse a minha culpa, que sangrava pelos cortes não fechados da minha dor.
Sessenta e quatro dias, dezesseis horas e vinte e cinco minutos. Era o tempo exato que fazia desde que eu o tinha visto pela última vez. Desde o último abraço. Desde que eu o deixei escapar por entre os meus dedos.
A gravadora tinha me dado um prazo para terminar o meu novo álbum e eu estava tentando terminar a última música. Em comparação com os outros três álbuns que eu tinha escrito, esse era de longe o mais sombrio. Mas eu não conseguia produzir nada alegre. Não saiam palavras de amor, ou de conforto. Cada palavra era uma expressão do meu anseio, da minha saudade.
Abandonei o piano.
Pensei em ligar para Bella, mas, quando olhei pro relógio, vi que já passavam das duas da manhã, então desisti da ideia e procurei pelo meu violão. Ela provavelmente ia me dizer que estava tudo bem eu me sentir mal, que tudo era muito recente, só que eu tinha de deixar o sentimento ir embora. Não podia continuar escrevendo músicas, poemas, cartas. Era só uma forma de me sentir ligada a ele. De alimentar esse amor que mais parecia um capricho adolescente meu.
– Quite possibly, – Testei a melodia no violão, parecia melhor do que a minha tentativa no piano. – I weaved the end of us from the start, stitching it to the fabric of existence. I traced the steps of our foreseen break.
Eu não conseguia suprimir as lágrimas que caíram e o soluço que cortou minha voz. Essa era uma das que eu nunca ia conseguir cantar ao vivo porque eu sabia que não ia conseguir manter a fachada de que estava tudo bem. De que quando null foi embora, ele não levou um pedaço de mim junto. Que eu ainda estava tentando colar os pedacinhos de mim de volta, tentando fazer sentido desse jogo.
O pior de tudo é que eu sentia como se fosse culpa minha.
Eu deveria ter sido mais compreensiva, deveria ter me aberto mais para ele. Só que eu tinha tanto medo, nunca em toda a minha vida eu tinha sentido metade das coisas que eu sentia por ele. No fim, o pior cenário se tornou realidade e eu o tinha perdido. Eu tinha de dormir todas as noites sozinha, numa cama enorme que ele tinha insistido em comprar porque eu gostava de dormir bem no meio e ele acabava sem espaço. O nó na minha garganta apertou ainda mais.
Fechei os olhos, tentei respirar profundamente. Acalmar a fila de soluços seguidos que faziam o meu corpo tremer. Eu queria acreditar que ia melhorar. Que eu ia ficar bem de novo, que tudo acontece por uma razão.
A verdade é que nem sempre existe razão nas coisas más que acontecem.
Às vezes elas só são ruins.
Capítulo 1 - See you in the dark, all eyes on you, my magician
Eu não contava com encontrar ninguém depois do fim do meu espetáculo em Liverpool.
A minha rotina durante as turnês mudou muito com os anos. No início, quando ainda estava eufórica com a fama recém encontrada, eu adorava ir para as festas, beber um pouco mais do que devia, e me maravilhar com a ideia de que pessoas famosas realmente queriam conhecer a garota que ganhou vários prêmios por escrever músicas sobre um coração partido. Mas hoje, eu só queria me esconder no hotel. Talvez exagerar um pouco no jantar depois de 1 hora fazendo coreografias ultra elaboradas no palco.
O que eu não contava era que Bella Andrews, mais conhecida também como minha melhor amiga, estava no país para um desfile e decidiu que hoje era a noite em que íamos sair como nos velhos tempos. E, depois de tantos anos, eu já sabia que dizer não para ela era a mesma coisa que travar uma batalha cujo fim já estava escrito em pedra: perda total. Então eu me deixei levar pelo entusiasmo dela. Além de que eu também precisava de uma distração.
Após o meu término bastante público com James Scott, a mídia circulava à minha volta como abutres, tentando encontrar uma razão, uma falha, qualquer coisa que eles pudessem usar contra mim. E eu fazia um bom trabalho ignorando toda a porcaria que saia nos tabloides, mas eu também precisava de um momento para extravasar. Uma razão para não pensar no real motivo pelo qual nós tínhamos terminado.
Até então eu nunca tinha namorado ninguém relevante. Ninguém que despertasse o interesse de alguém além dos fiéis fãs que procuravam em cada palavra que eu escrevia um sinal, um indicativo que desse face à pessoa que tinha inspirado a música. Claro que tudo mudou quando Oliver apareceu num dos meus shows. Eu sabia quem ele era. Todo mundo sabia quem ele era.
De um dia para o outro, minha publicista recebeu 15 ligações diferentes à procura de informações oficiais sobre o “romance fluorescente”. E eu nem sabia direito como, mas ele conseguiu meu número. Conseguiu minha atenção. Em apenas meses, conseguiu meu amor.
Até tudo mudar.
Na frente das câmeras, ele era um cavalheiro. O homem que trazia à vida os sonhos mais selvagens dos olhos de quem acompanhava a série em que ele interpretava o personagem principal. Mas comigo, na casa em que nós morávamos juntos, eu conhecia uma outra versão. Uma que não tinha nada a ver com os olhos verdes cativantes, ou a voz aveludada.
Apertei os olhos com força, minha mão fechando ao redor do gargalo da cerveja que eu tinha pedido.
– Eu conheço essa cara. – Bella disse, fazendo uma careta em minha direção. – Você tem que parar de se preocupar com esse filho da puta.
– Eu não estou preocupada com ele, - Rolei os olhos. – Só foi uma noite insana. Eu estava contando em ligar a televisão, ver Friends, tomar champanhe e dormir.
– É muito fofo você achar que me engana.
– Bella…
Ela colocou a mão na minha cintura, deu um aperto brincalhão e sumiu no meio da multidão de corpos que dançava um remix de alguma música que tocava 60 vezes durante o dia na rádio. O ar dentro do cômodo parecia me sufocar, o calor intenso só me fazia vontade de fugir daquele ambiente e fumar um cigarro. Ou dois. Teoricamente eu não me era permitido. Não podia beber em excesso, não podia fumar, tudo em nome da fonte de renda da minha gravadora: a voz da sequência de hits que vencia qualquer prêmio que entrava, que vendia qualquer CD que tivesse seu nome.
No início, era refrescante. Subir num palco, cantar as músicas, dançar no ritmo das melodias que eu criava enquanto deitava no chão do meu quarto e sonhava como seria se eu fosse uma super estrela. É engraçado o quanto as coisas pareciam muito mais bonitas quando vistas do lado oposto, quando não é você que lida com as consequências que os desejos mais ínfimos podem provocar. E eu continuava a amar os meus momentos no palco, mas quando eu descia dele, quando a adrenalina caia como um carrinho de montanha russa, eu me sentia como mais um produto que as pessoas podiam dissecar e analisar. Qualquer homem que aparecia do meu lado, qualquer amiga nova que eu fizesse.
Bebi o resto da minha cerveja de uma vez, esperando que a rapidez me deixasse em um momentâneo estado de torpor. Depois, procurei pela saída mais próxima. O bar era próximo ao rio Mersey, e, com alguns pauzinhos, Bella tinha conseguido que o ambiente fosse um pouco mais privado, só com os nossos amigos mais próximos. Só que a definição de amigos próximos dela era muito diferente da minha, então o ambiente estava lotado de pessoas que eu sequer tinha trocado duas palavras na vida.
Como habitual, o ar livre era frio e úmido. Algumas pessoas, possivelmente muito mais inebriadas do que eu, estavam encostadas contra a parede, as pontas de cigarros acesos iluminando a noite. Tive que suprimir a vontade de ir até eles pedir por um. Não era o momento. E não ia ajudar. Não no fim das contas.
Me encostei no corrimão, olhando para as ruas da cidade que iluminavam as águas calmas do rio. Em um milésimo de segundo, eu me senti aliviada. Livre. Um pouco menos como o pássaro enjaulado que eu me sentia praticamente todo dia. E talvez eu estivesse exagerando, não podia ser tão ruim como eu via as coisas na minha mente. Ou talvez fosse.
– É lindo, não é? – A voz rouca, profunda, me fez arrepiar, e eu encolhi dentro do casaco de couro que eu estava vestindo. – Desculpa, eu não consegui evitar.
– Evitar o quê? – Ouvi minha própria voz questionar sem registrar bem de onde veio essa espontaneidade para falar com um completo estranho.
– Falar com a garota mais bonita que eu já vi em Liverpool.
Continuei prestando atenção ao movimento suave das águas do Mersey. Era uma cantada tão brega que eu nem conseguia acreditar que eu a estava ouvindo.
– Foi a Bella, não foi? Ela que te mandou até aqui. Você deve ser um dos amigos modelos dela que ela consegue controlar como marionetes.
– Quem é Bella?
– Quem é você?
Ele riu. E eu podia jurar que até as pontinhas dos meus dedos ficaram dormentes, mas nada se comparava com a imagem do homem cuja voz cortou o breve silêncio que eu tinha conquistado naquela noite. O cabelo loiro jogado para trás, longo o suficiente para roçar contra o tecido preto da camisa de uma banda de heavy metal na qual ele estava vestido, os olhos azuis, claros como piscinas de águas cristalinas, a barba por fazer que deixava o rosto angular ainda mais bonito. Eu não conseguia acreditar que aquele homem tinha prestado atenção em mim. Que não suprimiu a vontade de vir até a minha direção, falar comigo. Eu só podia estar completamente embriagada.
– null null. - Ele estendeu a mão na minha direção. – E você?
Caralho. Não podia ser.
– Puta merda. – Segurei a mão dele, o calor irradiando da ponta dos meus dedos até as minhas bochechas. – null null.
– Era uma brincadeira. – null null, o null null, piscou para mim. – Eu sei quem você é, null null.
– null null sabe quem eu sou. Meu Deus.
null jogou a cabeça para trás em uma gargalhada, e então fez a oferta que mudou todos os planos que eu tinha para o resto da noite:
– O null null pode te pagar uma cerveja?
Capítulo 2 - The delicate beginning rush, a feeling you can know so much
Se alguém voltasse no tempo e dissesse para mim que eu ia passar as duas semanas da minha tour no Reino Unido vivendo um romance proibido com esse homem, eu com certeza ia achar que era uma loucura completa. Bem, eu nem sequer conseguia acreditar ainda que isso tudo não era uma peça muito elaborada que Avery e Bella acharam por bem pregar em mim. De qualquer forma, aqui estava eu sentada na bancada da cozinha vestida em nada mais do que a camiseta do Led Zeppelin dele.
Era pouco mais do que seis da manhã. Normalmente eu estaria completamente enrolada nos meus lençóis para dormir até Jill bater na porta do meu quarto de hotel para avisar que eu precisava começar a me preparar. E talvez comer alguma coisa. Nunca imaginei que ia assistir null null, preciso adicionar que sem camisa, preparar café da manhã.
Ele precisava ir para a gravadora em duas horas, então eu fui arrastada para fora da cama neste horário indecente.
Etéreo.
Eu continuava procurando os defeitos, um problema. Qualquer coisa que justificasse a minha fuga deste momento. Dessa… coisa que a cada hora parecia menos um passatempo e mais com sentimentos de verdade. Não conseguia explicar como diabos isso aconteceu tão rápido.
Claro, nós tínhamos muitas coisas em comum. Todas as nossas conversas giraram em torno de assuntos que traziam à tona outros, como se nós não conseguíssemos pôr um ponto final, só uma vírgula.
Nós adormecemos por poucos minutos antes que o despertador dele das cinco da manhã tocasse. Por alguns instantes, nós só ficamos ali, deitados. A minha cabeça aninhada em um dos braços dele, o calor dos nossos corpos se misturando. Era um torpor que eu não queria sair.
Quando finalmente nos levantamos, pude ver o estrago que a noite anterior causou. Nossas roupas estavam espalhadas por todo o quarto: o meu vestido preto pendurado na televisão, as jeans skinny dele jogadas de qualquer jeito sobre o abajur que eu tinha na minha mesinha de cabeceira, meias, sapatos, todos em lugares diferentes e inusitados. A única peça que prendeu meu interesse foi a camisa preta. Ele me olhou por um momento, na meia luz, os olhos verdes atentos, e disse com o sotaque mais lindo que “fica melhor em você”.
Nós nos conhecemos por um acidente. E eu odiava acidentes, exceto esse. Quando por alguma razão, null decidiu ir até o rio Mersey e me abordou como um stalker esquisito. O que foi compensado com a noite incrível que ele me proporcionou. As cervejas, os beijos indecentes que deixaram o meu batom vermelho borrado. Não me lembrava a última vez que tinha feito algo tão espontâneo.
Não era fácil para mim me abrir para outra pessoa, mesmo que de forma breve. Eu já contava que aquilo ia acabar em chamas, as ruínas de mais um amor que os tabloides iam adorar comentar e descrever como eu não era capaz de fazer ninguém ficar comigo. Talvez eles tivessem razão. null, pelo contrário, não parecia ligar muito sobre o que os outros tinham a dizer sobre mim. Era novo. Refrescante. Como o primeiro arfar de ar depois de um mergulho longo no mar.
Tinha sido a razão por trás da minha decisão de o convidar para sair de novo. E de novo. E de novo. Enrolados às escondidas. Aproveitando cada segundo livre para ficarmos juntos. Antes que todo o mundo descobrisse. Que eu finalmente descobrisse o defeito que me faria escapar. Ainda que cada momento com ele me fizesse sentir viva.
A noite anterior tinha sido diferente do que eu estava acostumada, esse encontro não teve nada de luxuoso. Ele me enviou uma mensagem pedindo para eu o encontrar na casa que ele tinha em Ann Street, depois que eu pousasse em Edimburgo. Ok, tinha sido um pouco luxuoso. Aquela casa era incrível.
A comida, porém, tinha encomendada do restaurante que eu tinha mencionado ser o meu favorito do país. O entretenimento era uma televisão ligada com a Netflix aberta, o que eu pensei, quando coloquei a minha bolsa no centro de vidro da sala, que geraria uma discussão engraçada. Não foi, descobri naquela noite que null era um grande fã dos clássicos e nós acabamos assistindo Titanic. Quando os créditos finais do filme começaram a rolar, eu já estava deitada entre os braços dele, o queixo dele tocando o topo da minha cabeça. Tive de me mexer um pouco para poder olhar para ele. Olhar para aquela cara tão linda, mesmo na pouca luz da lua que se esgueirava por entre as minhas cortinas.
Lembro de deslizar a ponta dos meus dedos por cada pedacinho de pele naquele rosto como se quisesse memorizar tudo. As sobrancelhas com uma adorável ruguinha entre elas. A barba áspera sob os meus dedos. Nada se compara àqueles olhos. Os malditos olhos de oceano que me puxam para perto como se tivessem gravidade própria.
Então eu o beijei, enterrando minhas mãos no cabelo loiro e o puxando um pouco. Ele me deixava assim. Descontrolada. É insano, impensável. Eu estava viciada. No segredo do nosso quarto, minhas inseguranças desapareciam. Não existia mais ninguém, mais nada, além de nós dois naquele momento.
Sorri involuntariamente.
– O que é que é tão engraçado? – A voz rouca dele quebrou o silêncio, e as palavras só me fizeram alargar o meu sorriso. – Você fica tão linda assim, sabe, quando não tá usando nenhuma máscara ou tentando se esconder.
– Para. – Ri baixinho, olhando para baixo. – Assim você me deixa encabulada.
Ele veio até mim, se encaixando perfeitamente entre as minhas pernas. Eu enrolei meus braços ao redor do pescoço dele, me arrepiando quando senti o quão quente ele estava. Ainda mais quando as mãos dele se esgueiram para debaixo da camisa, dando um aperto na minha cintura. Algo tão mundano mas que fez o meu coração acelerar. Me inclinei para frente, escondendo meu rosto no pescoço dele, pressionando os meus lábios contra a pele macia.
– É muito estranha essa sua maneira de deixar as pessoas de fora.
– Do que é que você tá falando?
null suspirou, segurando o meu queixo de forma a me fazer olhar diretamente para aquele olhar verde que eu tinha me acostumado a ver tão bem nos últimos dias. E se eu me pegasse olhando muito para eles… Bem, eu ia acabar sentindo as famosas borboletas no estômago.
Nunca fui uma pessoa muito romântica, não importava quantas pilhas de romance eu já tivesse lido. Sempre achei que não passava daquilo, palavras escritas em papel. A vida real era diferente, ninguém ia se apaixonar tão perdidamente por outra pessoa, sentir as mãos tremer de ansiedade apenas com a possibilidade de ver a pessoa amada. Pelo menos eu achava que não. Não comigo.
E aqui estava ele. null null era o homem mais doce que eu já tinha conhecido e mais corajoso também. Ele era o tipo de pessoa que tinha dificuldade de segurar a língua, sempre falava o que vinha na cabeça. Não conseguia negar que isso me atraía bastante, essa confiança inata. Ele era o dono de todos os cômodos que entrava.
– Eu sei que você tem medo… – Saiu em um sussurro e eu voltei a esconder o meu rosto, me apertando mais contra ele. – Não sei de que. Eu gosto de você, null. De verdade.
– Também gosto de você, null.
Senti ele beijar o topo da minha cabeça, as mãos descendo para apertar as minhas coxas. Respirei fundo, inalando e me intoxicando com o perfume dele - era cítrico, forte. Sabia perfeitamente que ia ficar impregnado nas minhas roupas, na minha mente, no tecido de realidade que me envolvia. E eu também sabia que ia sentir falta de não o ter esquentando a minha cama quando ele fosse embora.
Só que não queria dizer em voz alta, não queria admitir que talvez gostasse dele mais do que deixava transparecer.
– Me diz. – Ele pressionou, a voz suave no meu ouvido. – Por que você tem tanto medo?
– Não quero te dizer. – Suspirei. – A gente deveria só aproveitar o momento antes de você ir embora.
– Parece até que eu vou embora para outro planeta.
– Os Estados Unidos parece um mundo distante. – Suspirei, e tomei coragem para sair do embalo quente que era aquele abraço. – De qualquer forma, a gente deveria tomar um pouquinho de café antes de sair para correr.
– Mulher! – null sorriu, o olhar doce em minha direção. Eu me estiquei para pegar uma xícara grande de café com o quadrinho típico de Friends com “the one where i drink coffee” escrito. – Como você pode falar sobre correr quando não são nem sete horas da manhã direito?
Deixei uma gargalhada escapar, enquanto tomava um gole generoso do café. Surpreendentemente, ele era mesmo bom nisso - não era forte demais, nem fraco. Na medida perfeita.
Ele pegou uma outra caneca, se servindo também. Era engraçado o ar de familiaridade - não sabia se o conhecia a 20 segundos ou há 20 anos.
– Sabe… Se você se desse a oportunidade de me conhecer, não ia precisar ficar assustada sobre o que nós estamos vivendo.
– Você está dizendo que eu não te conheço?
– É.
Olhei para o relógio na parede, evitando o olhar pregado em mim e querendo escapar da resposta. Eu o conhecia. Biblicamente. Conhecia detalhes da vida dele. Mas eu me recusava, ou queria evitar a todo custo, deixar ele entrar. Como eu odiava Oliver por ter feito tanto dano. Se eu já não era romântica, depois dele… Piorou tudo. Não conseguia confiar 100% em alguém. Não conseguia confiar que não sairia destroçada.
Um suspiro escapou e eu pousei a xícara na bancada, terminando o conteúdo em apenas um gole. Caminhei na direção dele, ficando na ponta dos pés para roubar um beijo com o gosto amargo da bebida na minha boca. Os lábios macios. Não imaginava um dia em que eu não iria querê-los, colados aos meus.
Eu era um paradoxo andante.
– Isso foi pra quê?
– Tudo precisa ter uma razão para você, Sr. null?
– Esquisita. – Ele disse, com um ar de brincadeira.
Senti os braços dele ao redor da minha cintura, me puxando com uma ligeira brutalidade. Os nossos corpos grudados o suficiente para que eu pudesse sentir o calor que ele emanava. Eu tive uma certeza naquele momento. Era uma sensação que eu conhecia bem, porque ela não aparecia com frequência.
Se ele me pedisse, eu sabia que iria ficar, não importava as consequências. Não importava se eu tivesse de baixar a guarda e admitir que eu estava apaixonada. Eu faria, se significasse que eu nunca ia ter que sentir saudades daquele abraço que me engolia por inteiro.
Capítulo 3 - I think there’s been a glitch
Eu estava escrevendo como uma maluca.
Entre os shows, as viagens e me encontrar em segredo com null, tudo o que eu fazia era escrever. Palavras de amor em letra cursiva no caderninho que estava sempre dentro da minha bolsa. Eu tinha plena consciência que eu parecia uma adolescente.
Os nossos momentos roubados eram tudo que eu imaginei que um namoro pudesse ser. Cheio de romance. Paixão. Desejo. E uma leveza, que embora eu gostasse muito, era inesperada. Tudo que eu conhecia era tempestade, caos. E null null era o oposto. Ele me ofereceu uma calmaria tão grande que, às vezes, eu achava que o pior estava bem ali. Quase batendo na minha porta.
Quando dividíamos um fuso horário, ele arranjava uma desculpa para me encontrar. Nos poucos dias que tínhamos juntos, nós criamos uma rotina engraçada. Ele me puxava pelo tornozelo para sair da cama cedo e eu o convencia a correr comigo. Uma troca que para ambos parecia justa, já que os fins da manhã eram sempre os mesmos: sob os jatos mornos do chuveiro, a gente transava. Gostoso e lento.
Cada vez eu tomava o meu tempo para conhecer cada detalhe, marcas e imperfeições daquele corpo. Me deleitando com as reações que eu ganhava em resposta aos meus toques. Os sons que escapavam quando a minha mão ou a minha boca passavam perto de um lugar sensível. Puta merda. Aquele homem ia me arruinar. Se eu imaginava ter um efeito intenso sobre ele, eu tinha absoluta certeza do domínio que ele exercia em mim. Dominando os meus desejos com as mãos grandes e experientes. Com a diligência e a voz rouca sussurrando “é assim que você gosta, neném?” que deixa as minhas pernas bambas.
E ainda que o aspecto sexual fosse incrível, não era só sobre isso. Era muito mais. Eram as noites que a gente passava enrolado debaixo dos lençóis com um filme de comédia pastelão passando no fundo. Eram as vezes em que ele me encontrava encolhida numa cadeira rabiscando palavras que eu esperava fazer algum sentido juntas e tentava investigar se eram sobre ele. Era o jeito que ele lembrava os detalhes bobos de coisas que eu gostava. Um amor fácil que eu nunca tinha encontrado antes.
Era como se ele fizesse todo o mundo desaparecer.
O melhor de tudo é que ninguém sabia sobre nós dois além de um círculo restrito de pessoas. Eu não tinha que lidar com a opinião alheia sobre o meu relacionamento e tinha dado sorte que ele também parecia gostar dessa privacidade. Por mais que eu soubesse que uma hora ou outra aquilo ia acabar, eu não queria lidar com aquela ideia ainda. Queria continuar nessa neblina rosa onde só nós sabíamos da verdade.
– null? – Ele me chamou. – Você ainda está aqui?
– Sim. Desculpa. – Bebi um gole do milkshake de baunilha que tinha pedido e finalmente o encarei. – Você parece feliz.
– E eu estou, de verdade.
– Por alguma razão em especial ou só porque você acha a minha companhia incrível? Mesmo quando eu reclamo sobre como a rotina de uma turnê é intensa. Aliás, você sabia que uma das minhas dançarinas infelizmente torceu o pé na primeira noite e eu tive de encontrar alguém que a conseguisse substituir enquanto ela se recupera? Foi um completo caos. – Reclamei, suspirando em seguida. – Desculpa, me empolguei.
null puxa as minhas mãos para as dele, o polegar fazendo um carinho despretensioso no dorso de uma delas.
– A sua companhia é sim incrível. Cada segundo que eu passo contigo me faz querer o próximo. – Os lábios dele tocam brevemente os nós dos dedos da minha mão que ele estava segurando. – E sim. Eu quero falar sobre duas coisas. A primeira é que o meu novo álbum finalmente está pronto.
– Sério? Isso é incrível! Eu estou ansiosa para ouvir todas e tentar especular quais é que são sobre mim. – Mordi o meu lábio inferior. – Se é que tem alguma para mim.
– Você é uma boboca. – A palavra me faz rir. – Todas são sobre você. Tudo é sobre você.
– Para com isso, null.
– Eu estou falando sério. De uma forma ou de outra, todas as músicas que eu escrevi são sobre você.
– A gente se conhece faz cinco meses, eu não posso ter virado a sua musa assim. Quer dizer, nós nem conversamos sobre ser exclusivos um com o outro. Não precisa falar esse tipo de coisa para me fazer ficar com você, acho que os seus dedos no início da manhã já provaram o suficiente.
A garçonete que passou pela nossa mesa deu uma olhada de lado constrangida.
– Você pode ficar em silêncio por dois segundos para eu falar ou quer continuar explicando para todo mundo no restaurante como você gosta de levar dedadas? – Ele riu. – Eu não fiquei com mais ninguém e se isso for o seu jeito de me dizer que você consegue encontrar tempo para se encontrar com outras pessoas, eu vou ficar muito surpreso.
– Não. Ninguém, só você.
– Ainda bem. – null exala, exagerando a feição de alívio. – Imagina que constrangedor se a minha namorada não sabe que é minha namorada.
– Eu sou?
– Boba. – A mão calejada acariciando a minha bochecha. – Claro que é. E esse é o segundo ponto. Acho que está na hora da gente parar de se esconder.
Senti minha respiração falhar.
– O quê?
– É. Não quero ter que me esgueirar para os hotéis para te ver e sair antes do amanhecer. Estou preparado para anunciar para o mundo que a melhor mulher é minha.
– null… – Engoli a seco, sem saber ao certo o que é que eu podia dizer. – É complicado.
– Não é complicado. Você acha que a partir do momento que todo mundo souber, eu vou descobrir algo sobre você ou você vai descobrir algo sobre mim que vai fazer isso acabar. E não vai.
Arfei em um claro desespero.
– Você vai começar a sua turnê daqui a pouco e a minha ainda tem mais um ano. Nós vamos ter menos tempo um para o outro. Se todo mundo souber, pode infiltrar dúvidas, isso tudo pode acabar.
Ele enfiou os dedos pelo cabelo, frustrado. E de certa forma eu entendia a frustração. Sabia que todos os meus medos eram difíceis de lidar. Sabia que mais cedo ou mais tarde ele ia se cansar de me consolar, de atender as necessidades que a minha natureza ansiosa requer.
– Para com isso. – A voz sai daquela boca linda um tom inferior ao habitual, quase como uma ordem. – Se você acha que eu vou me dar por vencido só porque o seu ex-namorado era um filho da puta e te fez acreditar que você não valia a pena lutar por, você está completamente enganada.
– Ok.
– Ok?
– Sim. Você tem razão. É por causa do Oliver que eu tenho medo. Foi por pressão da mídia que eu passei tanto tempo com ele. Tanto tempo miserável porque tinha medo do que iam dizer quando soubessem da verdade.
– Eu vou te dizer uma coisa pela primeira vez e você não está autorizada a ficar assustada.
– Ai meu Deus, você vai dizer que matou alguém, não vai?
– Eu te amo.
null não me deixou raciocinar por muito tempo. Ele saiu de onde estava para sentar ao meu lado, uma mão no meu pescoço para me dar um beijo que me rendeu incapaz de lembrar que nós estávamos num lugar ligeiramente público, que qualquer pessoa podia passar e tirar uma foto do nosso momento privado. E naquele momento, eu desejei que ele tivesse razão. Que essa decisão não afetasse o nosso destino.
No dia seguinte, quando ele me deu um último beijo e embarcou no jatinho particular que o ia levar de volta para Los Angeles, eu não consegui segurar as lágrimas. Só então que eu consegui retribuir, só então que as palavras saíram de mim, enquanto eu agarrava o colarinho da camisa dele e olhava no fundo da piscina cristalina que eram aqueles olhos azuis.
Eu estava fodida.
–
A distância era algo a que eu estava habituada. Mas agora que eu admiti para mim própria que era amor, eu não conseguia mais reprimir a falta que eu sentia da barba roçando o meio das minhas costas. Ali era o lugar preferido dele, com um braço ao redor do meu quadril - me doía quase fisicamente a ausência dos beijos delicados, a voz grave intensificada pelo sono que me dizia um bom dia em seguida. Sentia falta de tudo, se estou sendo sincera. Do café preto sem açúcar. Ele fazia do jeitinho que eu gostava. Também das despedidas breves quando eu tinha que começar a preparar para algum show. De tudo.
Passei tanto tempo querendo negar para mim que isso era amor, mas era. Dourado, como o brilho do sol.
Só que a vida não era um livro de romance com um final feliz garantido. Eu sentia que essa distância mais prolongada estava a começar a afetar a forma que eu o enxergava. Talvez fosse o meu ego. Ou as fotos que saíam dele com a companheira de banda. O que é que seja, as paredes que ele derrubou voltaram a se erguer.
Então eu fiz o que eu sempre faço, fugi.
Capítulo 4 - Hope i never lose you, hope it never ends
As folhas amareladas no outono começaram a cair enquanto eu caminhava em direção ao apartamento em que eu estava morando durante a pausa antes de começar a parte americana da turnê. O ar gelado queimava as minhas bochechas, mal via a hora de preparar um chá quente, me enrolar nos lençóis e pegar o livro que estava abandonado na minha mesinha de cabeceira. Um plano perfeito para relaxar depois de um dia tão caótico no estúdio de gravação.
Suspirei, já procurando a minha chave antes de entrar.
Dentro do prédio estava substancialmente mais quente, então eu tirei o casaco, colocando-o no meu ombro enquanto subia as escadas. Passei por algumas crianças, que desciam correndo, e também pela senhora Smith que colocava comida para os meus gatos quando eu não conseguia voltar do estúdio em horas decentes. Era mesmo muito simpática, sempre me deixava biscoitos de canela no dia que eu voltava para casa.
Tudo dentro da normalidade, exceto o homem parado na minha porta, com um buquê de lírios. Minha flor favorita. Não estava esperando que ele fosse voltar para Londres tão cedo, ou que fosse me procurar, se estava sendo honesta. As pessoas que eu amava tinham a tendência a me deixar para trás, mesmo quando afirmavam, veementes, que o sentimento era recíproco. Então eu estava surpresa.
– Ei. – A voz rouca continuava a mesma, e o meu corpo reconheceu, um familiar arrepio me percorrendo. – Finalmente consegui escapar por uns dias da sequência de shows e precisava te ver.
– null… Eu…
– Por que a gente não entra primeiro? Eu te faço um chá e a gente conversa. Posso colocar esses lírios naquele jarro que você gosta tanto.
Mesmo com o pouco tempo, ele me conhecia como a palma da própria mão dele. Era impressionante. Só balancei a cabeça, tentando não tremer tanto enquanto encaixava a chave para abrir a porta. Ele me seguiu silenciosamente, fechando-a atrás de si. Não precisei olhar para saber que ele tinha ido até a cozinha como se ele conhecesse o lugar. Como se não fizesse semanas desde a última vez que nós tínhamos nos visto.
Eu coloquei a minha bolsa e o casaco sobre o sofá, tirando os tênis pretos que eu usava com os pés, sem desfazer o nó dos cadarços e abandonando-os ali mesmo. Todo o processo parecia uma experiência extracorpórea ou mesmo um sonho vívido. Mas o que diabo eu estava esperando que acontecesse? É óbvio que as ligações perdidas e as respostas de ‘desculpa, tô com muito trabalho’ não iam colar. Ele ia querer algum tipo de explicação por eu agir como uma completa maluca.
Fui para a cozinha, na bancada já estavam duas xícaras brancas, com pacotinhos de chá já dentro. Só conseguia ver as costas largas em frente ao meu fogão, muito provavelmente olhando a água que estava no fogo. A camisa branca realçava bem os músculos das costas dele, minha boca secou. Era injusto o quão bonito ele era, o corpo esculpido como uma estátua grega.
– Não é educado ficar encarando assim, anjo. – Não suprimi a risada. – Senti saudade desse som. Como é que você está?
– Cansada. – Disse baixinho, cruzando os braços na frente do meu peito. Ele então tirou a panela com água quente, despejando um pouco em cada xícara. – Não enche demais, por favor.
– Eu sei. – null respondeu. – Vai colocar um pouquinho de leite, né?
Assenti.
Quando ele me entregou meu chá tive a oportunidade de o inspecionar mais de perto. O cheiro de sabão estava fresco, os cabelos molhados, jogados para trás displicentes, estavam ainda mais compridos. E a barba ainda mais longa. Quase um deus nórdico. Lindo. Claro que o mais impressionante eram aqueles olhos. Azuis como nunca antes, transbordando sentimento. Carinho, paixão, amor. Que saco, null null. Nem quando eu quero te odiar por agir como um completo idiota, eu consigo.
Um sorrisinho repuxa os lábios dele. Um filho da puta arrogante, era o que ele era. Especialmente quando ele me pegava encarando assim. Desviei o olhar, tomando um gole da minha xícara, um som de satisfação acabou por escapar. Adorava aquela sensação, do calor lentamente se espalhando pelo meu corpo quando bebia chá, ou café.
– Agora que você tá mais relaxada a gente pode conversar? – Suspirei, concordando com um movimento de cabeça. – Ok. Pode me explicar o que aconteceu? Por que é que você simplesmente passou a fugir das minhas ligações e das mensagens que eu te mandava igual o diabo foge da cruz?
Não tinha acusação no seu tom de voz, era uma genuína curiosidade, que se estendia às suas feições, as sobrancelhas espremidas e a cabeça inclinada para o lado.
– Eu… Eu não sou boa com isso, null. – Admiti, encarando os meus pés. – Você parece estar tão feliz sem mim. E eu sentia a distância quando a gente falava. Achei que seria, bem, que é a decisão mais saudável ir me afastando, pra você não ter que fazer essa escolha.
null pousou a xícara na bancada e se posicionou na minha frente. As mãos que eu estava tão habituada a sentir contra a minha pele segurou os meus braços delicadamente.
– null null, eu quero que escute bem o que eu vou te dizer. – A voz rouca está suave, sedosa. – Os nossos trabalhos grande parte das vezes vão nos separar. Fisicamente, eu quero dizer.
– O que é que-
– Sh. Me deixa terminar. – O dedo indicador e do meio pressionaram meus lábios, interrompendo a minha fala. – Não fiquei distante de você, em nenhum momento. Esse tempo longe só me fez perceber o quanto eu te amo. E que eu não aguento quando você me pune com o silêncio, quando você insiste em me trancar do lado de fora.
– null… – As lágrimas escorrem antes que eu as possa interromper. – Você não deveria gostar de mim assim. Eu só sou uma garota fodida procurando por um bocado de paz.
– Pare com isso. – Ele se inclinou, beijando as minhas bochechas salgadas. – Eu sou completamente apaixonado por você. Mesmo sendo uma garota fodida. Te amo com o seu passado, com a sua bagagem. Com tudo.
Abracei-o pelo pescoço, tão cheia de felicidade que eu não consegui evitar. null gargalhou, como uma criança recebendo presentes de Natal, e me apertou contra ele. Puxando-me para cima sem muito esforço e permitindo o enlace das minhas pernas ao redor do torso definido. Ele não era um cara viciado em músculos, mas sabia os cultivar para ficar do tamanho ideal. Meu corpo acende inteiro só de pensar naquele corpo. De pensar nele.
A boca quente e molhada encontrou a minha em um beijo lento, preenchido com todo o desejo silencioso, o ardor que nós tínhamos um pelo outro. Ele apertou a minha bunda com força, pressionando o meu corpo contra a primeira parede que conseguiu encontrar, descendo as carícias pelo meu pescoço - mordidinhas espalhadas pelos lugares que ele sabia que eram os meus pontos fracos.
Um gemido de satisfação me escapou, minha respiração começando a ficar falhada, ainda mais com ele se apertando contra mim, a rigidez escondida pelos jeans escuros esfregando o lugar certo. Aquele homem ia me acabar, tinha certeza disso. Não conseguia nem formular uma frase coerente. Minhas unhas fincaram nos ombros largos enquanto ele, muito provavelmente, deixou uma marca no pedacinho de pele entre minhas clavículas.
– Deixa eu tirar isso. – Suspirei. – Quero sentir você na minha pele.
– null… – A voz rouca me fez tremer. – Vai. Rápido.
null deixou eu escapar de seus braços com delicadeza e eu sorri pra ele, tirando o suéter amarelo que eu estava vestindo e revelando o sutiã rosa bebê de renda que eu tinha por baixo. Vi os olhos azuis acenderem olhando pros meus seios, que estavam constrangidos pela peça, e mordi o lábio inferior. Desabotoei os meus jeans, mas não os tirei de imediato, decidindo ir até a minha sala.
– Vem. – Disse, sem olhar para trás. Sentei no sofá. – Eu quero que você tire pra mim.
Nem tive resposta, ele já estava ajoelhado à minha frente, puxando a peça pra baixo com força e arrastando-me, no processo, em direção ao corpo dele. Uma risadinha escapou. Aquela força magnética de homem afoito. E por minha causa. Não conseguia negar, era intoxicante. Me fazia sentir a mulher mais linda. Na verdade, a mais gostosa do planeta. E era apenas o começo. Conhecia ele bem demais para saber que ia fazer as coisas da maneira dele, demoradas, detalhadas.
Os beijos começaram nos meus pés, as mãos habilidosas esfregando a pele das minhas canelas. A boca quente fez um caminho molhado até o interior da minha coxa, mordendo a carne forte o suficiente para deixar a marca dos dentes quando soltou. Eu arfei quando ele soprou a região sensível, os lábios rápidos em roubar um breve sabor da umidade que encharcou a minha calcinha.
Ele se afastou, a súbita perda do calor me fez soltar um gemido de frustração. Com um dedo apenas, ele afastou para o lado o tecido fino que o impedia de me sentir por completo. Pele na pele. E a antecipação fez algo no meu ventre contorcer, apenas para apertar ainda mais quando ele cuspiu na mão e esfregou a saliva quente na minha entrada que por si só já estava uma bagunça. O primeiro dedo foi lento e preciso, entrando e saindo ritmicamente.
– Tão molhada, neném. – null suspirou, se curvando em minha direção e beijando a curva da minha barriga. – Você é tão fodidamente responsiva. Me deixa maluco.
– Por favor, null… – Pedi, implorei, num fiapo de voz enquanto apertava as almofadas com força.
– Por favor, o quê?
– Por favor, me chupa.
null deu um sorrisinho matreiro antes de posicionar minhas coxas em seus ombros, beijando meu sexo com força, a língua circulando o nervo sensível. Puta merda como eu senti falta disso. De como ele me chupava com uma fome que nunca antes tinha visto um homem ter. E o desejo transbordava daqueles olhos. Eu não conseguia conter a sequência de gemidos que preenchiam o cômodo. A cada investida, a minha noção de realidade se esvaia.
Ele era lindo, de todas as formas, mas assim, no meio das minhas pernas, dando o máximo para me quebrar inteira. Experienciar o topo e cair. Porra. Deveria ser um crime. Aquela bagunça, saliva quente escorrendo e os sons que preenchiam o lugar em ressonância com os que escapavam da minha boca.
— Caralho. — Ele mordiscou o interior da minha coxa, as bochechas coradas com o empenho. — Essa buceta me deixa maluco. Você me deixa maluco.
— Quero você dentro de mim, null. — O pedido era patético, a minha voz estrangulada com a tensão e a frustração que a ausência breve do estímulo causou. — Por favor. Por favor. Por favor.
— Shhh. — Eu consigo escutar o barulho do zíper, de quando ele puxou as roupas pra baixo. — Você tem camisinha em algum lugar aqui?
— Não. — Puxei ele em minha direção, roubando um beijo e gemendo contra os lábios dele quando senti o calor que ele emanava. O quão próximo ele estava de mim. — Eu tenho DIU.
— Você… Mas a gente nunca…
O beijo que veio a seguir era pura urgência. Senti as mãos dele tateando as minhas costas para procurar o fecho do sutiã e gemi de satisfação quando ele me liberou daquela peça, atirando-a para algum lugar da sala. A minha calcinha foi em seguida. O meu corpo arrepiou com o ar que circulava pelo cômodo ou talvez fosse a boca dele num dos meus mamilos. Ou talvez fosse a sensação de retornar pra casa.
Ninguém acreditaria que ele era real. Eu não acreditava que ele era real 90% do tempo.
— null, por favor… — A súplica escorregou quando uma das mãos encontrou o meio das minhas pernas.
— Tem certeza? A gente não precisa se você não quiser-
— Cala a boca, null null, e me fode gostoso.
O pau dele entrou aos poucos, paciente como sempre para que eu o aceitasse com o mínimo de incômodo possível. Por um breve momento, ele apenas olhou para mim, aquele olho azul que eu amava tanto quase me queimando viva enquanto eu deitava ali, saboreando o quão bom era estar unida a ele assim. Quão bem ele me fazia sentir.
Eu poderia ficar ali para sempre. Enredar minhas pernas ao redor da cintura dele e impedir que efeitos externos alterassem a perfeição que era estar com ele. Sentir as mãos calejadas apertar a curva da minha cintura, o volume do meu seio, o pulsar do meu clitóris. Como ele arrancava suspiro atrás de suspiro.
Nunca demorava muito com ele, mas hoje ele tinha se superado. Já conseguia sentir o prazer aquecendo a ponta dos meus dedos. A sensação destruindo por completo a minha ligação com a realidade. Senti uma montanha de sentimentos, todos eles colidindo contra mim de uma vez só. E quando finalmente o meu corpo cedeu ao estímulo, eu tremi. Meu corpo balançando a cada movimento dele contra mim.
Entre ele me acompanhar no estado de torpor que a felicidade estúpida de um orgasmo trazia e depois me levar para o meu quarto, eu registrei pouca coisa do que ele estava me dizendo. Compreendia as palavras doces e de ternura, mas pouco mais.
Enrolados nos meus cobertores, eu me sentia em casa. Encaixada com a minha outra metade. Nem conseguia lembrar do porquê eu tinha ficado com raiva. E nem queria lembrar. Queria aproveitar esse momento em que só nós dois existiamos
Capítulo 5 - Cause fuck it i was in love
Bella Andrews estava atrasada. Nós combinamos um café às 16h e claro que ela já tinha três mensagens avisando que não ia conseguir chegar no horário mas que estava no caminho. Típico.
Aproveitei para ver se null tinha deixado alguma mensagem.
Ainda estava processando a noite anterior. Finalmente nós dois acertamos e conseguimos estar no mesmo país e na mesma cidade ao mesmo tempo, então decidimos comemorar. Pela primeira vez desde que tudo isso começou, eu não fiquei com medo da bagunça dos fotógrafos nos esperando fora de cada lugar que a gente visitou. Com as menções do twitter explodindo com comentários sobre a nossa saída. Pela primeira vez, eu estava animada.
Seis meses. Parecia uma vida inteira e nada ao mesmo tempo. Como era possível alguém entrar assim na minha vida e causar tanto caos? E pior, o caos me causar felicidade. Nunca achei que ia viver isso.
Kitnull ;)
offline
offline
anjo, ontem foi incrível
mal posso esperar para te ver
te amo da lua até saturno
Sorri, tocando a tela do meu celular como se fosse o rosto dele. Ugh. Eu odiava como eu parecia uma adolescente. As minhas falas, as minhas reclamações. E foi no meio dos meus sonhos acordados, pensando no que faríamos nessa noite, que eu recebi a ligação que mudaria tudo.
–
Dois meses desde que uma ligação de três minutos fez o meu mundo inteiro desmoronar. Sessenta e quatro dias desde que eu não sabia mais o que fazer, como fazer. Era injusto, um ser divino tinha que me odiar muito para arrancar o amor da minha vida assim. Em uma coincidência médica depois de um acidente.
Eu queria odiar ele por fazer isso comigo. Por me abandonar aqui embaixo, presa na terra sem ele. Como se eu fosse estar mais segura. Mas sem ele, eu nunca ia estar bem de novo. Não totalmente. A dor sempre estaria aqui. Aninhada em uma ferida que nunca ia cicatrizar. As lágrimas a única coisa que me fazia dormir. Porra, eu o amava. Com tudo em mim.
Sai do quarto. A última música estava terminada. Eu ia para o estúdio amanhã de manhã e finalmente finalizar isso. O trabalho tinha sido a única coisa que me dava algum propósito. E agora eu podia olhar para o que iria vir. Mais uma série de shows onde eu seguraria a minha respiração e daria o melhor de mim para entreter. Mas por agora, eu já sabia os meus próximos passos.
Na minha mesinha de cabeceira estava uma carta. A última coisa que ele tinha me deixado. Não tinha nenhum tom de despedida, era simplesmente a declaração mais linda que eu já tinha recebido. Era o conforto e a punição que eu me dava todas as noites. Reler, reler e reler. Memorizar cada curva da letra desleixada dele.
Não existiria um dia em que eu não amaria null null.
Capítulo 6 - You were more than a short time
Querida null,
Eu decidi que eu não ia conseguir expressar todos os meus sentimentos sem chorar como um garotinho e eu sei que quando qualquer pessoa chora, você também chora. Então eu vou te escrever uma carta. Também porque eu sei que você adora guardar papéis sem nenhuma razão específica.
Você está dormindo na nossa cama. É muito cedo para a princesa estar acordada. E eu sei que vai parecer um pouco preocupante e esquisito, mas eu adoro ver você dormindo. Assistir você chutar todos os cobertores e travesseiros é a minha maior diversão. Você também me chuta. É adorável.
Ok. Sem distrações.
Eu vou te pedir em casamento. Na verdade, quando você ler essa carta, eu já vou ter pedido. E não vou fazer essas declarações porque, como eu já disse, iria me fazer chorar. null null, você é a minha melhor amiga. De uma forma completamente não estranha, as vezes eu sinto que a nossa sincronia é tão intensa que você podia ser minha gêmea. Não que eu te veja como irmã. Claro que não. Eu vejo você como a mulher com quem eu quero passar o resto dos meus dias.
Você é a pessoa que me faz rir, que cuida de mim quando eu estou doente e, portanto, insuportável. Que escuta as melodias estúpidas que eu crio e faz as piadas mais engraçadas que eu já ouvi.
Eu te amo mais do que eu achava que iria quando eu decidi, numa noite aleatória, que queria pagar uma cerveja para a mulher mais bonita que eu já tinha visto. E eu espero que em nenhum momento você se esqueça disso.
Merda, você está acordando. Tenho que ir.
Seu para sempre,
null null.