Capítulo Único
Parei na porta do bar, com meu violão nas costas e me permitindo sentir tudo que era possível com as lembranças que me atacavam sem dó, , eu já nem tentava mais me livrar de todas essas lembranças, na verdade queria guardá-las comigo de forma especial, por isso decidi fazer uma música para o nosso amor.
- E aí ? Vai ficar para aí? – Arthur, o dono do bar, apareceu.
- Ah, desculpa, me distrai um pouco. – Eu disse um pouco sem jeito coçando a nuca.
- E aí cara, como você está se sentindo? Um pouco melhor?
- Sim, acho que estou pronto para tentar retomar minha rotina, mesmo que ainda me lembre dela às vezes.
- Está certo, você sabe onde está tudo, se precisar de alguma coisa, me chama. – Ele dizia voltando para dentro do bar.
E então eu adentrei logo em seguida, ainda faltava um pouco para o bar abrir, então permiti arrumar minhas coisas com calma, seria meu primeiro show desde a partida de , por mais que ela insistisse tanto que eu voltasse logo para essa vida, talvez porque ela sabia do quanto ia me magoar e queria que eu já estivesse nos trilhos para fazê-lo.
Enquanto organizava o palco, meus olhos vagaram pelo bar e pararam na mesa, a nossa mesa, a mesa que sempre nos sentávamos quando vínhamos aqui, inclusive na primeira vez, quando havia acabado de chegar ao país, a minha universidade, e fomos apresentados e arrastados para o barzinho logo após a aula e então o flashback daquele dia me atingiu.
FLASHBACK
- , vem cá conhecer a nova aluna de intercâmbio. – Alana gritou para mim da porta da sala enquanto eu estava jogado no fim do corredor com alguns colegas.
- Ah Alana, não sei não, eu topei participar do comitê de intercâmbio só porque precisava das horas, não posso ficar só com a burocracia não? – Eu devolvi mal humorado.
- Deixa de ser ranzinza, ela é linda, gente boa e norueguesa, você não queria ter contato com outras culturas?
Após esse discurso de Alana eu me levantei, afinal, ninguém tinha culpa do meu mal humor, todos sabiam que eu havia passado por um término de relacionamento um tanto quanto pesado, mas de fato, nenhuma das pessoas a minha volta tinham culpa disso, caminhei lentamente até Alana que me encarava com um sorriso muito empolgado, levemente irritante de acordo com o meu estado de espírito, e assim que me aproximei o suficiente, ela segurou minha mão e saiu me puxando até a tal garota nova.
- , esse é o , ele também faz parte do nosso comitê de intercâmbio. – Alana disse me apresentando.
- Prazer , . – Ela teve um pouco de dificuldade ao dizer meu nome, e eu achei fofo.
- Prazer , de onde você é? – Falar inglês era um dos meus pontos fortes, por isso o comitê de intercâmbio ficou tão contente com meu interesse.
- Eu nasci na Noruega, mas moro atualmente em New Jersey. – Ela disse e sorriu.
- Huuuum New Jersey, legal, quanto tempo você vai ficar conosco?
- Acredito que 6 meses.
- 6 meses? Bastante tempo, está preparada para os choques de cultura que virão? – Eu disse e ela deu uma risada tímida.
- Bom, quem está na chuva é para se molhar não é mesmo?
- , não liga muito para o mal humor dele, ele é ranzinza, mas tem o coração bom, bom até demais. – Alana nos interrompeu e Krisitine pareceu olhar no mais profundo dos meus olhos quando Alana disse que eu tinha um coração bom, o que eu particularmente considerava uma maldição.
Nos amontoamos em duas mesas com várias porções diferentes de comida de boteco e vários tipos de cervejas e drinks, todos estavam muito empolgados para que provasse da nossa comida e bebida, mas esqueceram que ela era só uma e não uma máquina e nem que quisesse, conseguiria comer de tudo e beber de tudo.
- Pessoal, vocês vão fazê-la passar mal desse jeito, vamos com calma, ela tem 6 meses pra comer de tudo e beber de tudo. – Eu disse tirando o copo da mão de que parecia pedir socorro com os olhos.
- Obrigada. – Ela disse baixinho.
- Olha , sabia que você é a primeira pessoa que consegue convencer o a sair com a gente depois da aula? Ele sempre diz que não pode, que está ocupado e até mesmo que não quer.
- É mesmo? – Ela me encarou e eu senti meu rosto quente.
- Bobeira, eu só estava a fim hoje, nada demais, não vim por ninguém, vim por mim. – E meus olhos foram parar no dela, que tinham algo que parecia hipnotizante.
FIM DO FLASHBACK
- E aaaaaai , quanto tempo. – Fui tirado dos meus devaneios com Silas me chamando.
- Ah, e aí Silas, tudo bem? – Eu me levantei batendo na mão dele em um cumprimento.
- Tudo ótimo, e você? Faz tempo que não te vejo.
- É, eu só tenho saído de casa para aula, da aula para casa.
- E você vai tocar hoje? – Ele perguntou observando o palco atrás de mim.
- Vou sim, e aceito pedidos de cover, ok?
- Aaaah maravilha cara, bom te ver, vou me sentar aqui por perto então, o restante do pessoal está chegando aí.
- Beleza, aproveitem.
E após chegar mais algumas pessoas ao bar, incluindo o restante do pessoal da faculdade, nos cumprimentamos, conversamos um pouco e eu tinha a sensação de que todo mundo estava com pena de mim ao me ver, como se eu fosse um filhotinho abandonado, aparentemente era mais fácil do que eu imaginava manter minha fama de sofredor. Iniciei meu show com alguns covers de MPB como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tim Maia e companhia e então decidi arriscar minha música autoral.
- Boa noite pessoal. – Eu disse ao microfone e recebi vários boas noites de volta. – Para quem não me conhece, eu sou o , e agora eu vou cantar uma música autoral, que se chama, “Essa eu fiz pro nosso amor”.
Essa seria a primeira vez que eu mostraria essa música para alguém, ou para muitos alguéns né, é uma música totalmente escrita sobre minha situação com , que voltou para o seu país e agora 2 meses depois não temos nenhum tipo de contato, mesmo depois de prometermos que manteríamos, acho que é o erro de todo jovem que acredita que relacionamentos a longa distância funcionam, a realidade nos atinge uma vez e sem piedade.
Comecei a dedilhar as primeiras notas no violão e as lembranças do nosso curto tempo juntos começaram a aparecer.
“Essa eu fiz pra nós dois bêbados Dançando numa festa de gente rica e sem graça”
E então o flashback da festa universidade que tivemos que ir para arrecadar fundos, eles queriam um aluno de intercâmbio e um representante do comitê presentes, e nós dois fomos os escolhidos, mas não nos encaixávamos ali, era um coquetel com todo mundo vestido à caráter e com as contas bancárias tão recheadas que provavelmente eu nem teria noção de quanto dinheiro era, esse foi meu primeiro contato com fora da universidade e à sós.
- Eu acho que eles estão bravos com a gente. – dizia com a fala arrastada devido ao álcool e com um sorriso sapeca no rosto.
- Por que estamos nos divertindo? Eles que são chatos e não sabem aproveitar a vida, de que adianta fazer uma festona cara dessa e ficar todo mundo preocupado com a postura. E outro ponto, não sabemos quando vamos beber algo tão caro assim de novo. – Eu pisquei pra ela enquanto enchia nossos copos com um vinho caro.
“Essa eu fiz pra toda letra do Cazuza Que eu decorei porque cê disse que gostava”
- Quem é esse artista? – perguntava com a boca cheia.
- Cazuza o nome dele, mas ele já morreu. – Eu expliquei limpando o canto da boca dela com guardanapo.
Era nosso primeiro encontro, assumidamente um encontro e tínhamos escolhido ir a esse mesmo bar que estou cantando para ela hoje.
- Cazuza? – Ela tentou repetir e saiu da forma mais engraçada e fofa possível.
- Sim, essa música se chama exagerado, e por você eu largo tudo, carreira, dinheiro, canudo, até nas coisas mais banais pra mim é tudo ou nunca mais.
Eu cantei baixinho acompanhando a música e decidiu procurar a letra da música para ver a tradução para entender o que de fato a música falava e após ler por alguns minutos, ela abriu um sorriso em minha direção.
- Cazuza, é meu artista brasileiro preferido então.
- Mas já, você ainda nem ouviu os outros? – Eu brinquei.
- Não importa, essa é minha música preferida agora. – Ela me lançou uma piscadela.
“Essa eu fiz pra sua mãe só porque ela é tão linda E sempre sabe o que dizer”
- Minha mãe está me ligando. – dizia pegando o celular no bolso.
- Pode atender, juro que não vou prestar atenção na conversa. – Eu dizia caminhando ao seu lado.
Estávamos a caminho da casa onde estava hospedada com uma host Family, tínhamos ido ao barzinho próximo a faculdade para o nosso primeiro encontro oficial, e as coisas estavam fluindo melhor do que eu imaginei, foram semanas negando que mexia comigo, até eu aceitar a situação e chama-la pra sair, estava fazendo sucesso pela universidade, mas nenhum cara parecia chamar a atenção dela o suficiente.
- Ela quer falar com você. – direcionou o celular a mim.
- Comigo? Por quê? – Eu disse arregalando os olhos.
- Fica tranquilo, ela é legal, você vai gostar. – Ela balançou o celular na minha frente que o peguei.
- Boa noite senhora . – Eu disse formal.
- Boa noite querido, pode me chamar de Amelia, como vai?
- Tudo bem e com a senhora? Prometo que estou levando a para casa em segurança.
- Tudo bem por aqui também querido, ela me falou sobre você, ela gosta bastante de você.
- Ah falou? Que bom, ela fala bastante da senhora também.
- Querido, cuide bem da minha , ela é uma menina boa, só está um pouco perdida, e não tenha medo de viver tudo que vocês dois tem para viver juntos ok? Vou estar aqui para o que precisarem, divirtam-se, com juízo.
Era a confirmação que precisava para tentar beijá-la aquela noite.
“Essa eu fiz pras tuas quedas na calçada, tua risada alta Essa eu fiz pra você”
- Como você consegue se fazer de sóbria tão rápido só com a ligação da sua mãe? – Eu perguntava rindo enquanto voltávamos a caminhar depois que a mãe de desligou o telefone.
- Bom, prática, mas eu nem estou bêbada assim vai, consigo fazer o 4 olha só.
Nesse momento parou e tentou fazer o número 4 com as pernas, e após algumas tentativas falhas de levantar a perna, ela finalmente conseguiu, porém não conseguiu manter a posição por mais que 3 segundos e logo estava totalmente no chão com uma risada que ecoava por todo o quarteirão, eu entrei numa crise de riso que me fez sentar no chão com ela antes de ajuda-la a levantar, o que fez alguns moradores daquela rua saírem no portão preocupados com o barulho, e após isso eu me levantei ajudando a mesma.
- Eu acabei de prometer para sua mãe que ia cuidar bem de você e olha só pra gente. – Eu dizia segurando seus braços a ajudando a levantar.
- Mas você está cuidando, até me levantou do chão. – Ela dizia batendo as mãos na roupa para tirar as poeiras.
- Não vou te deixar cair mais. – Eu me atrevi a envolver meu braço em seus ombros e ela entrelaçou seus dedos aos meus.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim (é) Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém (shh)
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
Durante o refrão, consegui sair da série de flashbacks e prestar atenção na reação das pessoas que estavam no bar, eles pareciam gostar da minha música, e isso me fazia me sentir vivo novamente.
“Essa eu fiz pra Alameda Três Pra Avenida São João, cada lugar que a gente se beijou”
- Alameda Três? – tentava ler a placa da rua escrita em português.
- Sim, Alameda Três, você está melhorando no português. – Eu sorria para ela.
- Não mereço um prêmio? – Ela questionou parando de andar.
- Que tipo de prêmio?
Eu a encarei de frente para ela e em questões de segundos, ela se aproximou e colou seus lábios aos meus, não aprofundou o beijo, não moveu mais nenhum músculo, somente um selinho demorado e saiu andando.
- Você não vem? – Ela dizia parada na esquina me olhando enquanto eu estava imóvel.
- Vou. – Eu gargalhei e corri em sua direção.
Mais alguns quarteirões e minha vontade de beijá-la só aumentava, eu nem sequer conseguia prestar atenção na história que ela estava me contando, só conseguia prestar atenção em seus lábios e então decidi entrar no seu jogo.
- Se você conseguir ler aquela placa, aí eu te dou um prêmio, Alameda três era muito fácil. – Eu dizia apontando para a placa na rua.
- Avenida Sao Joao? – Ela leu e me encarou.
- Huuuuum, quase, o som correto é São João, está vendo aquele acento em cima do A, ele faz esse som mais fechado.
- São João. – Ela disse devagar. – Avenida São João. – Ela disse e me olhou empolgada.
- É, vou considerar vou considerar, foi uma boa tentativa. – Eu desdenhei.
- Então quero meu prêmio. – Ela disse se virando de frente para mim.
Eu envolvi um braço em sua cintura a trazendo pra perto de mim e com a outra mão passei uma mecha de cabelo que estava caindo em seu rosto para trás de sua orelha, aproveitei para segurar a nuca dela e então colei nossos lábios, ficamos naquele selinho por alguns minutos até que eu pedi passagem com a língua para aprofundar o beijo, a mesma não relutou e então iniciamos um beijo lento, suas mãos percorreram minhas costas subindo e ela abraçou meu pescoço acariciando levemente meus cabelos, a boca dela tinha um sabor único, doce, quente, e nossas línguas pareciam dançar em perfeita sintonia, quando eu senti que podia faltar o ar, selei nossos lábios novamente e abri os olhos devagar e a encontrei de olhos fechados ainda, beijei a pontinha do seu nariz e ela sorriu e finalmente me olhou.
- Qual será meu prêmio se eu conseguir falar um trava-línguas em português? – Ela perguntou com aquele sorriso sapeca.
- Só na hora para saber, pode começar a treinar. – Eu pisquei para ela, entrelacei nossas mãos e a puxei para voltarmos a andar.
“Essa eu fiz pra minha jaqueta jeans Pra minha blusa do Taz, toda roupa que você tirou”
- Qual é o nome desse personagem em português? – perguntava usando minha blusa e conferindo a estampa.
- Acredito que o mesmo nome em inglês, só muda a pronúncia um pouco, aqui dizemos Taz Mania.
- Taz Mania. – Ela repetiu fofa. – É mais fácil do nosso jeito, Taz Mania.
- É engraçado do jeito de vocês. – Eu disse e a puxei para se deitar no meu peito novamente.
Estávamos oficialmente juntos há 1 mês, ontem havíamos saído para comer com os amigos e finalmente tivemos nossa primeira noite juntos, não foi fácil convencer a host Family de a deixar ela dormir em minha casa, mas fez valer ainda mais a pena.
- Quero dormir com você todos os dias. – Ela dizia fazendo desenhos com o dedo em meu peitoral.
- Sua host Family vai adorar saber o que você anda falando por aí. – Eu ri e acariciei os cabelos dela.
- Eu gosto de lá, mas gosto mais de você.
Ela disse e selou nossos lábios, o que foi suficiente para aprofundarmos o beijo e começarmos tudo novamente, afinal, não sabíamos quando conseguiríamos passar outra noite juntos.
“Essa eu fiz pra todo show lotado em que eu perdi a letra Porque eu pensei em você”
- Ó me pediram para cantar por onde andei, vocês querem mesmo? – Eu dizia ao microfone com o violão no colo.
- Siiiiim. – Os colegas de faculdade sentados próximos gritaram em uníssono.
- Tá bom então lá vai. – Eu comecei a tocar a música no violão então me coloquei a cantar.
“Desculpe estou um pouco atrasado Mas espero que ainda dê tempo De dizer que andei errado E eu entendo”
me olhava como se eu fosse sua pessoa preferida no mundo e isso me desconcentrava levemente, mas era uma sensação maravilhosa.
“Desculpe estou um pouco atrasado Mas espero que ainda dê tempo De dizer que andei errado E eu entendo”
As pessoas do bar se preparam para cantar junto comigo o refrão em uma só voz, colocando todo o coração naquele momento.
“Por onde andei Enquanto você me procurava? E o que eu te dei? Foi muito pouco ou quase nada E o que eu deixei? Algumas roupas penduradas Será que eu sei Que você é mesmo Tudo aquilo que me faltava?”
pegou o celular e colocou para buscar a música que eu cantava, provavelmente ela queria ler a letra pra entender o que dizia e porque as pessoas gostavam tanto.
“Amor, eu sinto a sua falta E a falta é a morte da esperança Como um dia que roubaram o seu carro Deixou uma lembrança”
pareceu encontrar a letra da música e se preparava pra cantar comigo o próximo verso, e nesse momento eu não enxergava mais ninguém, apenas ela.
“Que a vida é mesmo Coisa muito frágil Uma bobagem”
- Iiiih esqueci gente. – Eu dizia apenas tocando o violão. – Olha a cara da , não consigo me concentrar.
Todos ao redor riram, outros achavam fofo, mas a verdade era uma só, estávamos perdidamente apaixonados.
“Essa eu fiz pra cada estrela linda Que por baixo da língua você me fez ver”
Estávamos em mais uma festa da faculdade, estava totalmente habituada com a cidade, com a universidade e principalmente com as pessoas, até arriscava falar um pouco de português com as pessoas, ela estava com algumas garotas em algum outro local, e eu estava com o pessoal da minha turma, sentados próximos ao som, falando sobre música.
- está te chamando. – Amanda passou por mim colocando a mão sob meu ombro.
- Onde ela está? – Eu perguntei e Amanda apontou para fora do local, eu assenti e sai.
- Aconteceu alguma coisa? – Eu disse chegando até ela.
- Não, só queria que você provasse uma coisa.
Após dizer isso, me beijou, o mais profundo que ela poderia beijar, e sua boca tinha um gosto estranho, amargo, diferente, mas me permiti me envolver aquele beijo e colar o corpo dela ao meu, ela mordiscou meu lábio inferior e então cortamos o beijo.
- O que foi isso? – Eu perguntei passando a mão sobre meus lábios.
Ela tirou um lsd da bolsa e colocou na boca me encarando.
- Era isso que você estava na boca? - Ela só assentiu.
- , você já usou isso antes? Está acostumada? É muito forte.
- Relaxa babe, tudo sob controle, relaxa e curte a brisa. – Ela me abraçou.
- Então vem, vamos pelo menos nos sentar num lugar mais seguro.
E assim o fizemos, sentamo-nos no sofá no meio das pessoas, eu avisei um colega próximo que tínhamos usado lsd para que ele pudesse ajudar qualquer coisa. Cerca de 40 minutos depois, lá estava o efeito, era algo que eu não fazia há tempos e parecia estar habituada, será que era isso que a mãe dela quis dizer com estar meio perdida? Fixei meus olhos na parede à minha frente e era como se ela virasse uma galáxia inteira com as estrelas mais lindas que eu já havia visto, mas junto com isso vieram os calafrios, a sensação de boca seca, definitivamente eu não queria usar aquilo nunca mais.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém (shh)
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
O pessoal da faculdade balançava as mãos de acordo com a música, alguns até com o isqueiro aceso, o que me fez sorrir de ver o apoio.
“Essa eu fiz pra cada passo nosso Cada dia lindo da nossa história E sendo essa sobre o nosso amor Há também de ser do dia em que cê foi embora”
Nós passamos a última noite de juntos na minha casa, e desde que acordamos, não tivemos coragem de falar um com o outro, como se um choro estivesse preso na garganta a ponto de sair desespero na primeira palavra. Nos arruamos em silêncio, fomos até o aeroporto em silêncio, lá encontramos com a host Family dela, que foram se despedir, e então finalmente deixou suas lágrimas rolarem, mas eu ainda tentava me manter forte, pelo menos até o momento que anunciaram o embarque do voo dela, quando ela me abraçou eu não era mais capaz de segurar nenhum sentimento ou lágrima, era como se meu coração estivesse sendo dilacerado dentro do peito e eu me permiti chorar junto com ela.
- Você vai ficar bem? – Ela perguntou enxugando minhas lágrimas e colando nossas testas.
- Vou, e você? – Eu beijei a testa dela enquanto ela assentia que sim. – Tenta dormir durante a viagem para você não chegar muito cansada.
- E você tenta dormir um pouco agora, não dormimos nada a noite. – Ela aninhou a cabeça em meu peitoral e eu acariciei o cabelo dela enquanto sentia o cheiro de seu xampu exalando.
Última chamada para embarque do voo 379 para Nova Iorque.
Ouvimos o que tanto não queríamos ouvir.
- Eu preciso ir. – Ela me olhou e começou a chorar novamente e eu decidi que era hora de me mostrar forte para que ela tivesse forças para ir.
- Para de chorar, você fica feia assim, prefiro sorrisos, o que acha de um último sorriso para mim? – Eu me forcei a sorrir para ela que riu sem forças.
Nos soltamos e começou a andar para o portão de embarque.
- Por favor não olha para trás, por favor não olha para trás. – Eu murmurava para mim mesmo.
parou e olhou para trás, num rompante ela voltou correndo e se atirou em meus braços e beijou meus lábios, era isso, esse seria nosso último beijo, o mais amargo e triste beijo que nós dois já demos.
- Amor da minha vida, daqui até a eternidade, nossos destinos foram traçados na maternidade. – disse baixinho ao cortar nosso beijo num português perfeito, que me deixou boquiaberto e após isso, ela finalmente foi, ao passar pela fila e antes de sumir pela última porta, ela acenou e limpou uma última lágrima e ali eu sabia que nunca mais veria .
Alana me lançou um olhar terno, de quem entendia tudo que eu estava dizendo na canção, de quem entendeu que ela foi totalmente escrita para , que nem sequer iria ouvir.
“Sobre minha blusa do Taz desbotada”
Por uma infeliz coincidência do destino, eu estava com a blusa do Taz essa noite, e olhei para a estampa desbotada ao cantar esse verso.
“Sobre sua mãe tão muda quando eu ligava”
Me lembrei da última vez que liguei para , que não me atendeu, então tentei ligar para sua mãe, que nada me disse, apenas coisas vagas.
“Sobre eu bebendo sem você do meu lado”
Me veio a imagem de todas as vezes que eu vim para este bar desde que ela foi embora, sozinho, me sentando na nossa mesa.
“Sobre eu chorando quando toca Exagerado”
Havia passado 1 semana desde que tinha voltado para seu país, sua família, sua vida, nós nos falávamos o tempo todo e não sabíamos o que seria da nossa relação dali pra frente, eu havia combinado com os amigos da faculdade de irmos conhecer um barzinho novo que abrira por ali, o ambiente era agradável, aconchegante e os preços eram bons, não tinha música ao vivo, os próprios funcionário comandavam uma playlist qualquer e então começou a tocar aquela, a que dizia ser sua música preferida brasileira, Exagerado, do Cazuza, as lembranças daquele dia vieram fortes, então meu único instinto foi abaixar minha touca cobrindo meu rosto para esconder as lágrimas teimosas que insistiam em cair.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim (é) Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
Essa eu fiz pro nosso amor , mesmo que você nunca ouça, mesmo que eu nunca mais ouça falar de você, essa eu fiz pro nosso amor.
- E aí ? Vai ficar para aí? – Arthur, o dono do bar, apareceu.
- Ah, desculpa, me distrai um pouco. – Eu disse um pouco sem jeito coçando a nuca.
- E aí cara, como você está se sentindo? Um pouco melhor?
- Sim, acho que estou pronto para tentar retomar minha rotina, mesmo que ainda me lembre dela às vezes.
- Está certo, você sabe onde está tudo, se precisar de alguma coisa, me chama. – Ele dizia voltando para dentro do bar.
E então eu adentrei logo em seguida, ainda faltava um pouco para o bar abrir, então permiti arrumar minhas coisas com calma, seria meu primeiro show desde a partida de , por mais que ela insistisse tanto que eu voltasse logo para essa vida, talvez porque ela sabia do quanto ia me magoar e queria que eu já estivesse nos trilhos para fazê-lo.
Enquanto organizava o palco, meus olhos vagaram pelo bar e pararam na mesa, a nossa mesa, a mesa que sempre nos sentávamos quando vínhamos aqui, inclusive na primeira vez, quando havia acabado de chegar ao país, a minha universidade, e fomos apresentados e arrastados para o barzinho logo após a aula e então o flashback daquele dia me atingiu.
FLASHBACK
- , vem cá conhecer a nova aluna de intercâmbio. – Alana gritou para mim da porta da sala enquanto eu estava jogado no fim do corredor com alguns colegas.
- Ah Alana, não sei não, eu topei participar do comitê de intercâmbio só porque precisava das horas, não posso ficar só com a burocracia não? – Eu devolvi mal humorado.
- Deixa de ser ranzinza, ela é linda, gente boa e norueguesa, você não queria ter contato com outras culturas?
Após esse discurso de Alana eu me levantei, afinal, ninguém tinha culpa do meu mal humor, todos sabiam que eu havia passado por um término de relacionamento um tanto quanto pesado, mas de fato, nenhuma das pessoas a minha volta tinham culpa disso, caminhei lentamente até Alana que me encarava com um sorriso muito empolgado, levemente irritante de acordo com o meu estado de espírito, e assim que me aproximei o suficiente, ela segurou minha mão e saiu me puxando até a tal garota nova.
- , esse é o , ele também faz parte do nosso comitê de intercâmbio. – Alana disse me apresentando.
- Prazer , . – Ela teve um pouco de dificuldade ao dizer meu nome, e eu achei fofo.
- Prazer , de onde você é? – Falar inglês era um dos meus pontos fortes, por isso o comitê de intercâmbio ficou tão contente com meu interesse.
- Eu nasci na Noruega, mas moro atualmente em New Jersey. – Ela disse e sorriu.
- Huuuum New Jersey, legal, quanto tempo você vai ficar conosco?
- Acredito que 6 meses.
- 6 meses? Bastante tempo, está preparada para os choques de cultura que virão? – Eu disse e ela deu uma risada tímida.
- Bom, quem está na chuva é para se molhar não é mesmo?
- , não liga muito para o mal humor dele, ele é ranzinza, mas tem o coração bom, bom até demais. – Alana nos interrompeu e Krisitine pareceu olhar no mais profundo dos meus olhos quando Alana disse que eu tinha um coração bom, o que eu particularmente considerava uma maldição.
Nos amontoamos em duas mesas com várias porções diferentes de comida de boteco e vários tipos de cervejas e drinks, todos estavam muito empolgados para que provasse da nossa comida e bebida, mas esqueceram que ela era só uma e não uma máquina e nem que quisesse, conseguiria comer de tudo e beber de tudo.
- Pessoal, vocês vão fazê-la passar mal desse jeito, vamos com calma, ela tem 6 meses pra comer de tudo e beber de tudo. – Eu disse tirando o copo da mão de que parecia pedir socorro com os olhos.
- Obrigada. – Ela disse baixinho.
- Olha , sabia que você é a primeira pessoa que consegue convencer o a sair com a gente depois da aula? Ele sempre diz que não pode, que está ocupado e até mesmo que não quer.
- É mesmo? – Ela me encarou e eu senti meu rosto quente.
- Bobeira, eu só estava a fim hoje, nada demais, não vim por ninguém, vim por mim. – E meus olhos foram parar no dela, que tinham algo que parecia hipnotizante.
FIM DO FLASHBACK
- E aaaaaai , quanto tempo. – Fui tirado dos meus devaneios com Silas me chamando.
- Ah, e aí Silas, tudo bem? – Eu me levantei batendo na mão dele em um cumprimento.
- Tudo ótimo, e você? Faz tempo que não te vejo.
- É, eu só tenho saído de casa para aula, da aula para casa.
- E você vai tocar hoje? – Ele perguntou observando o palco atrás de mim.
- Vou sim, e aceito pedidos de cover, ok?
- Aaaah maravilha cara, bom te ver, vou me sentar aqui por perto então, o restante do pessoal está chegando aí.
- Beleza, aproveitem.
E após chegar mais algumas pessoas ao bar, incluindo o restante do pessoal da faculdade, nos cumprimentamos, conversamos um pouco e eu tinha a sensação de que todo mundo estava com pena de mim ao me ver, como se eu fosse um filhotinho abandonado, aparentemente era mais fácil do que eu imaginava manter minha fama de sofredor. Iniciei meu show com alguns covers de MPB como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tim Maia e companhia e então decidi arriscar minha música autoral.
- Boa noite pessoal. – Eu disse ao microfone e recebi vários boas noites de volta. – Para quem não me conhece, eu sou o , e agora eu vou cantar uma música autoral, que se chama, “Essa eu fiz pro nosso amor”.
Essa seria a primeira vez que eu mostraria essa música para alguém, ou para muitos alguéns né, é uma música totalmente escrita sobre minha situação com , que voltou para o seu país e agora 2 meses depois não temos nenhum tipo de contato, mesmo depois de prometermos que manteríamos, acho que é o erro de todo jovem que acredita que relacionamentos a longa distância funcionam, a realidade nos atinge uma vez e sem piedade.
Comecei a dedilhar as primeiras notas no violão e as lembranças do nosso curto tempo juntos começaram a aparecer.
“Essa eu fiz pra nós dois bêbados Dançando numa festa de gente rica e sem graça”
E então o flashback da festa universidade que tivemos que ir para arrecadar fundos, eles queriam um aluno de intercâmbio e um representante do comitê presentes, e nós dois fomos os escolhidos, mas não nos encaixávamos ali, era um coquetel com todo mundo vestido à caráter e com as contas bancárias tão recheadas que provavelmente eu nem teria noção de quanto dinheiro era, esse foi meu primeiro contato com fora da universidade e à sós.
- Eu acho que eles estão bravos com a gente. – dizia com a fala arrastada devido ao álcool e com um sorriso sapeca no rosto.
- Por que estamos nos divertindo? Eles que são chatos e não sabem aproveitar a vida, de que adianta fazer uma festona cara dessa e ficar todo mundo preocupado com a postura. E outro ponto, não sabemos quando vamos beber algo tão caro assim de novo. – Eu pisquei pra ela enquanto enchia nossos copos com um vinho caro.
“Essa eu fiz pra toda letra do Cazuza Que eu decorei porque cê disse que gostava”
- Quem é esse artista? – perguntava com a boca cheia.
- Cazuza o nome dele, mas ele já morreu. – Eu expliquei limpando o canto da boca dela com guardanapo.
Era nosso primeiro encontro, assumidamente um encontro e tínhamos escolhido ir a esse mesmo bar que estou cantando para ela hoje.
- Cazuza? – Ela tentou repetir e saiu da forma mais engraçada e fofa possível.
- Sim, essa música se chama exagerado, e por você eu largo tudo, carreira, dinheiro, canudo, até nas coisas mais banais pra mim é tudo ou nunca mais.
Eu cantei baixinho acompanhando a música e decidiu procurar a letra da música para ver a tradução para entender o que de fato a música falava e após ler por alguns minutos, ela abriu um sorriso em minha direção.
- Cazuza, é meu artista brasileiro preferido então.
- Mas já, você ainda nem ouviu os outros? – Eu brinquei.
- Não importa, essa é minha música preferida agora. – Ela me lançou uma piscadela.
“Essa eu fiz pra sua mãe só porque ela é tão linda E sempre sabe o que dizer”
- Minha mãe está me ligando. – dizia pegando o celular no bolso.
- Pode atender, juro que não vou prestar atenção na conversa. – Eu dizia caminhando ao seu lado.
Estávamos a caminho da casa onde estava hospedada com uma host Family, tínhamos ido ao barzinho próximo a faculdade para o nosso primeiro encontro oficial, e as coisas estavam fluindo melhor do que eu imaginei, foram semanas negando que mexia comigo, até eu aceitar a situação e chama-la pra sair, estava fazendo sucesso pela universidade, mas nenhum cara parecia chamar a atenção dela o suficiente.
- Ela quer falar com você. – direcionou o celular a mim.
- Comigo? Por quê? – Eu disse arregalando os olhos.
- Fica tranquilo, ela é legal, você vai gostar. – Ela balançou o celular na minha frente que o peguei.
- Boa noite senhora . – Eu disse formal.
- Boa noite querido, pode me chamar de Amelia, como vai?
- Tudo bem e com a senhora? Prometo que estou levando a para casa em segurança.
- Tudo bem por aqui também querido, ela me falou sobre você, ela gosta bastante de você.
- Ah falou? Que bom, ela fala bastante da senhora também.
- Querido, cuide bem da minha , ela é uma menina boa, só está um pouco perdida, e não tenha medo de viver tudo que vocês dois tem para viver juntos ok? Vou estar aqui para o que precisarem, divirtam-se, com juízo.
Era a confirmação que precisava para tentar beijá-la aquela noite.
“Essa eu fiz pras tuas quedas na calçada, tua risada alta Essa eu fiz pra você”
- Como você consegue se fazer de sóbria tão rápido só com a ligação da sua mãe? – Eu perguntava rindo enquanto voltávamos a caminhar depois que a mãe de desligou o telefone.
- Bom, prática, mas eu nem estou bêbada assim vai, consigo fazer o 4 olha só.
Nesse momento parou e tentou fazer o número 4 com as pernas, e após algumas tentativas falhas de levantar a perna, ela finalmente conseguiu, porém não conseguiu manter a posição por mais que 3 segundos e logo estava totalmente no chão com uma risada que ecoava por todo o quarteirão, eu entrei numa crise de riso que me fez sentar no chão com ela antes de ajuda-la a levantar, o que fez alguns moradores daquela rua saírem no portão preocupados com o barulho, e após isso eu me levantei ajudando a mesma.
- Eu acabei de prometer para sua mãe que ia cuidar bem de você e olha só pra gente. – Eu dizia segurando seus braços a ajudando a levantar.
- Mas você está cuidando, até me levantou do chão. – Ela dizia batendo as mãos na roupa para tirar as poeiras.
- Não vou te deixar cair mais. – Eu me atrevi a envolver meu braço em seus ombros e ela entrelaçou seus dedos aos meus.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim (é) Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém (shh)
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
Durante o refrão, consegui sair da série de flashbacks e prestar atenção na reação das pessoas que estavam no bar, eles pareciam gostar da minha música, e isso me fazia me sentir vivo novamente.
“Essa eu fiz pra Alameda Três Pra Avenida São João, cada lugar que a gente se beijou”
- Alameda Três? – tentava ler a placa da rua escrita em português.
- Sim, Alameda Três, você está melhorando no português. – Eu sorria para ela.
- Não mereço um prêmio? – Ela questionou parando de andar.
- Que tipo de prêmio?
Eu a encarei de frente para ela e em questões de segundos, ela se aproximou e colou seus lábios aos meus, não aprofundou o beijo, não moveu mais nenhum músculo, somente um selinho demorado e saiu andando.
- Você não vem? – Ela dizia parada na esquina me olhando enquanto eu estava imóvel.
- Vou. – Eu gargalhei e corri em sua direção.
Mais alguns quarteirões e minha vontade de beijá-la só aumentava, eu nem sequer conseguia prestar atenção na história que ela estava me contando, só conseguia prestar atenção em seus lábios e então decidi entrar no seu jogo.
- Se você conseguir ler aquela placa, aí eu te dou um prêmio, Alameda três era muito fácil. – Eu dizia apontando para a placa na rua.
- Avenida Sao Joao? – Ela leu e me encarou.
- Huuuuum, quase, o som correto é São João, está vendo aquele acento em cima do A, ele faz esse som mais fechado.
- São João. – Ela disse devagar. – Avenida São João. – Ela disse e me olhou empolgada.
- É, vou considerar vou considerar, foi uma boa tentativa. – Eu desdenhei.
- Então quero meu prêmio. – Ela disse se virando de frente para mim.
Eu envolvi um braço em sua cintura a trazendo pra perto de mim e com a outra mão passei uma mecha de cabelo que estava caindo em seu rosto para trás de sua orelha, aproveitei para segurar a nuca dela e então colei nossos lábios, ficamos naquele selinho por alguns minutos até que eu pedi passagem com a língua para aprofundar o beijo, a mesma não relutou e então iniciamos um beijo lento, suas mãos percorreram minhas costas subindo e ela abraçou meu pescoço acariciando levemente meus cabelos, a boca dela tinha um sabor único, doce, quente, e nossas línguas pareciam dançar em perfeita sintonia, quando eu senti que podia faltar o ar, selei nossos lábios novamente e abri os olhos devagar e a encontrei de olhos fechados ainda, beijei a pontinha do seu nariz e ela sorriu e finalmente me olhou.
- Qual será meu prêmio se eu conseguir falar um trava-línguas em português? – Ela perguntou com aquele sorriso sapeca.
- Só na hora para saber, pode começar a treinar. – Eu pisquei para ela, entrelacei nossas mãos e a puxei para voltarmos a andar.
“Essa eu fiz pra minha jaqueta jeans Pra minha blusa do Taz, toda roupa que você tirou”
- Qual é o nome desse personagem em português? – perguntava usando minha blusa e conferindo a estampa.
- Acredito que o mesmo nome em inglês, só muda a pronúncia um pouco, aqui dizemos Taz Mania.
- Taz Mania. – Ela repetiu fofa. – É mais fácil do nosso jeito, Taz Mania.
- É engraçado do jeito de vocês. – Eu disse e a puxei para se deitar no meu peito novamente.
Estávamos oficialmente juntos há 1 mês, ontem havíamos saído para comer com os amigos e finalmente tivemos nossa primeira noite juntos, não foi fácil convencer a host Family de a deixar ela dormir em minha casa, mas fez valer ainda mais a pena.
- Quero dormir com você todos os dias. – Ela dizia fazendo desenhos com o dedo em meu peitoral.
- Sua host Family vai adorar saber o que você anda falando por aí. – Eu ri e acariciei os cabelos dela.
- Eu gosto de lá, mas gosto mais de você.
Ela disse e selou nossos lábios, o que foi suficiente para aprofundarmos o beijo e começarmos tudo novamente, afinal, não sabíamos quando conseguiríamos passar outra noite juntos.
“Essa eu fiz pra todo show lotado em que eu perdi a letra Porque eu pensei em você”
- Ó me pediram para cantar por onde andei, vocês querem mesmo? – Eu dizia ao microfone com o violão no colo.
- Siiiiim. – Os colegas de faculdade sentados próximos gritaram em uníssono.
- Tá bom então lá vai. – Eu comecei a tocar a música no violão então me coloquei a cantar.
“Desculpe estou um pouco atrasado Mas espero que ainda dê tempo De dizer que andei errado E eu entendo”
me olhava como se eu fosse sua pessoa preferida no mundo e isso me desconcentrava levemente, mas era uma sensação maravilhosa.
“Desculpe estou um pouco atrasado Mas espero que ainda dê tempo De dizer que andei errado E eu entendo”
As pessoas do bar se preparam para cantar junto comigo o refrão em uma só voz, colocando todo o coração naquele momento.
“Por onde andei Enquanto você me procurava? E o que eu te dei? Foi muito pouco ou quase nada E o que eu deixei? Algumas roupas penduradas Será que eu sei Que você é mesmo Tudo aquilo que me faltava?”
pegou o celular e colocou para buscar a música que eu cantava, provavelmente ela queria ler a letra pra entender o que dizia e porque as pessoas gostavam tanto.
“Amor, eu sinto a sua falta E a falta é a morte da esperança Como um dia que roubaram o seu carro Deixou uma lembrança”
pareceu encontrar a letra da música e se preparava pra cantar comigo o próximo verso, e nesse momento eu não enxergava mais ninguém, apenas ela.
“Que a vida é mesmo Coisa muito frágil Uma bobagem”
- Iiiih esqueci gente. – Eu dizia apenas tocando o violão. – Olha a cara da , não consigo me concentrar.
Todos ao redor riram, outros achavam fofo, mas a verdade era uma só, estávamos perdidamente apaixonados.
“Essa eu fiz pra cada estrela linda Que por baixo da língua você me fez ver”
Estávamos em mais uma festa da faculdade, estava totalmente habituada com a cidade, com a universidade e principalmente com as pessoas, até arriscava falar um pouco de português com as pessoas, ela estava com algumas garotas em algum outro local, e eu estava com o pessoal da minha turma, sentados próximos ao som, falando sobre música.
- está te chamando. – Amanda passou por mim colocando a mão sob meu ombro.
- Onde ela está? – Eu perguntei e Amanda apontou para fora do local, eu assenti e sai.
- Aconteceu alguma coisa? – Eu disse chegando até ela.
- Não, só queria que você provasse uma coisa.
Após dizer isso, me beijou, o mais profundo que ela poderia beijar, e sua boca tinha um gosto estranho, amargo, diferente, mas me permiti me envolver aquele beijo e colar o corpo dela ao meu, ela mordiscou meu lábio inferior e então cortamos o beijo.
- O que foi isso? – Eu perguntei passando a mão sobre meus lábios.
Ela tirou um lsd da bolsa e colocou na boca me encarando.
- Era isso que você estava na boca? - Ela só assentiu.
- , você já usou isso antes? Está acostumada? É muito forte.
- Relaxa babe, tudo sob controle, relaxa e curte a brisa. – Ela me abraçou.
- Então vem, vamos pelo menos nos sentar num lugar mais seguro.
E assim o fizemos, sentamo-nos no sofá no meio das pessoas, eu avisei um colega próximo que tínhamos usado lsd para que ele pudesse ajudar qualquer coisa. Cerca de 40 minutos depois, lá estava o efeito, era algo que eu não fazia há tempos e parecia estar habituada, será que era isso que a mãe dela quis dizer com estar meio perdida? Fixei meus olhos na parede à minha frente e era como se ela virasse uma galáxia inteira com as estrelas mais lindas que eu já havia visto, mas junto com isso vieram os calafrios, a sensação de boca seca, definitivamente eu não queria usar aquilo nunca mais.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém (shh)
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
O pessoal da faculdade balançava as mãos de acordo com a música, alguns até com o isqueiro aceso, o que me fez sorrir de ver o apoio.
“Essa eu fiz pra cada passo nosso Cada dia lindo da nossa história E sendo essa sobre o nosso amor Há também de ser do dia em que cê foi embora”
Nós passamos a última noite de juntos na minha casa, e desde que acordamos, não tivemos coragem de falar um com o outro, como se um choro estivesse preso na garganta a ponto de sair desespero na primeira palavra. Nos arruamos em silêncio, fomos até o aeroporto em silêncio, lá encontramos com a host Family dela, que foram se despedir, e então finalmente deixou suas lágrimas rolarem, mas eu ainda tentava me manter forte, pelo menos até o momento que anunciaram o embarque do voo dela, quando ela me abraçou eu não era mais capaz de segurar nenhum sentimento ou lágrima, era como se meu coração estivesse sendo dilacerado dentro do peito e eu me permiti chorar junto com ela.
- Você vai ficar bem? – Ela perguntou enxugando minhas lágrimas e colando nossas testas.
- Vou, e você? – Eu beijei a testa dela enquanto ela assentia que sim. – Tenta dormir durante a viagem para você não chegar muito cansada.
- E você tenta dormir um pouco agora, não dormimos nada a noite. – Ela aninhou a cabeça em meu peitoral e eu acariciei o cabelo dela enquanto sentia o cheiro de seu xampu exalando.
Última chamada para embarque do voo 379 para Nova Iorque.
Ouvimos o que tanto não queríamos ouvir.
- Eu preciso ir. – Ela me olhou e começou a chorar novamente e eu decidi que era hora de me mostrar forte para que ela tivesse forças para ir.
- Para de chorar, você fica feia assim, prefiro sorrisos, o que acha de um último sorriso para mim? – Eu me forcei a sorrir para ela que riu sem forças.
Nos soltamos e começou a andar para o portão de embarque.
- Por favor não olha para trás, por favor não olha para trás. – Eu murmurava para mim mesmo.
parou e olhou para trás, num rompante ela voltou correndo e se atirou em meus braços e beijou meus lábios, era isso, esse seria nosso último beijo, o mais amargo e triste beijo que nós dois já demos.
- Amor da minha vida, daqui até a eternidade, nossos destinos foram traçados na maternidade. – disse baixinho ao cortar nosso beijo num português perfeito, que me deixou boquiaberto e após isso, ela finalmente foi, ao passar pela fila e antes de sumir pela última porta, ela acenou e limpou uma última lágrima e ali eu sabia que nunca mais veria .
Alana me lançou um olhar terno, de quem entendia tudo que eu estava dizendo na canção, de quem entendeu que ela foi totalmente escrita para , que nem sequer iria ouvir.
“Sobre minha blusa do Taz desbotada”
Por uma infeliz coincidência do destino, eu estava com a blusa do Taz essa noite, e olhei para a estampa desbotada ao cantar esse verso.
“Sobre sua mãe tão muda quando eu ligava”
Me lembrei da última vez que liguei para , que não me atendeu, então tentei ligar para sua mãe, que nada me disse, apenas coisas vagas.
“Sobre eu bebendo sem você do meu lado”
Me veio a imagem de todas as vezes que eu vim para este bar desde que ela foi embora, sozinho, me sentando na nossa mesa.
“Sobre eu chorando quando toca Exagerado”
Havia passado 1 semana desde que tinha voltado para seu país, sua família, sua vida, nós nos falávamos o tempo todo e não sabíamos o que seria da nossa relação dali pra frente, eu havia combinado com os amigos da faculdade de irmos conhecer um barzinho novo que abrira por ali, o ambiente era agradável, aconchegante e os preços eram bons, não tinha música ao vivo, os próprios funcionário comandavam uma playlist qualquer e então começou a tocar aquela, a que dizia ser sua música preferida brasileira, Exagerado, do Cazuza, as lembranças daquele dia vieram fortes, então meu único instinto foi abaixar minha touca cobrindo meu rosto para esconder as lágrimas teimosas que insistiam em cair.
“Eu já tinha desistido de mim Minha vida é sempre assim (é) Eu tenho a minha fama de sofredor Então não conta pra ninguém
Mas essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor, oh, oh, oh Oh, oh, oh Essa eu fiz pro nosso amor”
Essa eu fiz pro nosso amor , mesmo que você nunca ouça, mesmo que eu nunca mais ouça falar de você, essa eu fiz pro nosso amor.