I. O início da canção
Pela janela do quarto bagunçado era possível ver o lindo dia que fazia do lado de fora. A luz do sol era forte e adentrava o imóvel sem restrição. O vento também ricocheteava as cortinas brancas e azuis, fazendo-as esvoaçarem pelo ar numa dança desconhecida, porém muito interessante para . O garoto de grandes olhos estava deitado em sua cama e seu pensamento divagava para muito longe da vida real. Talvez um mundo paralelo fosse a escapatória que ele tinha para aqueles dias tão sombrios. “Nada na vida é perfeito”, ele pensava e podia ter a grande certeza disso quando viu dois de seus melhores amigos irem embora e deixá-lo sozinho. Seu irmão mais velho, Willian , havia ido para a Itália por um tempo indeterminado para uma obra cuja presença do rapaz era indispensável. Willian era um dos maiores engenheiros da construtora da cidade e se orgulhava de ter um irmão tão importante e eficaz como Will. Além de irmãos, eles eram melhores amigos, amigos/irmãos do qual poderiam contar sempre um com o outro para cobrir alguma travessura de ambos ou simplesmente para conversar e viver a vida como dois garotos sem medo do amanhã. Assim que o garoto teve de partir a trabalho, ficara sozinho dentro de casa apenas na companhia de seu pai e sua mãe. Joanne também era bastante importante no meio trabalhista. A mulher de quase cinquenta anos tinha seus talentos direcionados à música, algo que com certeza herdara dela. Joanne era produtora musical de uma gravadora renomada dos Estados Unidos, localizada na cidade onde eles moravam: a famosa Washington. No momento, a mulher estava produzindo álbuns importantes para o meio musical do Pop Rock, o qual prometia muitas vantagens para ela em sua carreira como produtora. Com isso, ela mal ficava em casa, tendo que se reunir com a banda e até por muitas vezes viajar com os integrantes para acompanhá-los em turnês e eventos similares. sentia falta da mãe e queria muito que a mulher se aposentasse logo para, pelo menos, fazê-lo companhia já que ele já havia terminado a escola e a faculdade não havia o chamado ainda. Tudo estava muito monótono e tedioso naquele ano. Com seu pai nada era diferente. Peter tinha seu emprego de valor e desde sempre foi muito ocupado com o trabalho. Ser chef do restaurante mais movimentado do centro de Washington era bem trabalhoso e reconhecia isso. O homem saia de casa antes do almoço e sempre chegava depois das duas horas da manhã e isso resultava à dura realidade: seu pai também não tinha tanto tempo para ele. Ambos conversavam sempre, principalmente quando era somente uma criança, mas depois de crescer e ver como seu pai ficava cansado pelo trabalho, o menino resolveu dar uma trégua e se direcionar para Will e Thomas Bennett, seu amigo de infância. Mas assim como Will, Thomas também se foi. Os pais do garoto se separaram e enquanto o pai foi procurar uma nova mulher, a mãe quis se mudar de Washington para a Califórnia, o que dificultou o encontro dos amigos para noites e noites de azaração e bebidas sem fim na cidade. Alterou também os planos dos garotos de, aos vinte e um anos, se esbaldarem em Las Vegas com tudo o que eles tinham direito, afinal, faria vinte e um anos em poucos dias. Parecia que tudo estava dando errado naqueles últimos quatro meses. Agora ele estava ali, sozinho dentro de um quarto apenas observando como os dias pareciam passar lentos e torturantes.
E, de repente, tomando um ímpeto de coragem, ele resolveu que iria fazer daquele dia um dia diferente. Fazia tempo que não saía para distrair a mente, para pensar, para refletir ou apenas para sair de dentro de casa e de toda aquela solidão que a ausência das pessoas lhe causava. No fundo de sua mente, parecia que ele era o último no mundo inteiro, o único deixado de lado na vida enquanto todos tinham o que fazer. Nunca gostara de estudar, mas ele preferia mil vezes estar cheio de coisas da faculdade do que ficar em casa naquela solidão terrível. Muitas vezes era até bom para pensar, mas havia outras vezes, como aquela, em que ele queria parar tudo e desistir das coisas.
- Você não pode fazer isso. – falou para si mesmo, sua voz grossa reverberando pelo quarto silencioso.
E como isso fosse mais que o suficiente, ele resolveu: iria sair aquela tarde e distrair a mente. Automaticamente, seu olhar se voltou para a capa que cobria e guardava seu violão há muito tempo não tocado. Lembrava-se com nitidez de quando frequentava o colegial e todos adoravam vê-lo cantar e tocar. Era um de seus meios de conseguir sair com muitas garotas e se tornar um dos populares que movimentavam o prédio escolar. O violão preto era tão limpo que poderia servir até como um espelho. A palheta azul marinho transparente o ajudava a dedilhar as cordas com mais rapidez e volúpia, deixando a melodia tocada ainda mais perfeita a quem ouvia. Mas o grande contraste em toda aquela sintonia de tons, notas e acordes era a sua voz. A voz do garoto, grossa e vibrante, trazia a entonação perfeita para tornar uma música simplesmente maravilhosa. Ele sentia falta de cantar e pra quem cantar. Suas músicas sempre tinham um motivo e ele, há muito tempo, não via motivos para cantar como antes. Lembrava-se dos shows na escola que por várias vezes participou. Ali, sim, sua vida estava muito boa. Agora, ele se via sozinho dentro de casa, completamente enfurnado sem ter o que fazer. Seus amigos antigos haviam ido cada um para o seu lado. Havia sobrado apenas Thomas e ainda assim o garoto se foi.
Então, tudo bem. Se ele teria que viver seus próximos meses sozinho, teria de se acostumar. Quatro meses se passaram e ele não poderia ficar naquela solidão terrível e por isso resolveu que sair seria a melhor alternativa.
Não demorou a tomar um banho rápido e em seguida arrumar qualquer roupa para sair. Não queria uma roupa muito trabalhada, pois iria apenas ao parque central sentar-se na grama e tentar compor alguma música com sua melodia. O violão e o caderno de música de cifras/partituras estavam em cantos diferentes e isso o aborrecia um pouco. Cansou de pedir à sua mãe para não separar suas coisas, pois sempre que a mulher arrumava o quarto do menino, muita coisa sumia misteriosamente. Pediu aos céus para seu caderno não ter sumido e sentiu-se aliviado ao encontrá-lo junto com seus cadernos antigos de escola. Contra a sua vontade, não se desfez dos cadernos por um motivo idiota, mas ao mesmo tempo verdadeiro: precisaria daquelas porcarias se quisesse passar numa faculdade boa, afinal, vestibular se conquista com sacrifício, certo? “Certo”.
Sem delongas, puxou a alça da capa do violão e colocou-a em seu ombro ao mesmo tempo em que ajeitava o caderno embaixo do braço e colocava uma caneta azul no bolso da calça. Mesmo com sua mente lhe alertando para levar uma lapiseira, ele não quis ouvir. Apenas queria sentir o ar do dia novamente, com toda a vontade que havia dentro de si.
Assim que saiu porta afora, o vento da tarde bateu em seu rosto e ele pôde respirar bem novamente. Um sorriso desenhou seus lábios finos e os dentes brancos e alinhados fizeram-se presente em sua face. Ao dar o primeiro passo em direção à rua, sentiu como se correntes estivessem caindo de seu corpo e libertando-o para viver novamente. Ali, andando pela rua com o violão em suas costas e o caderno seguro firmemente por suas mãos fortes, ele percebeu o quanto foi ruim ficar em casa sozinho. Pelo menos na rua ele não estaria tão sozinho. Várias pessoas caminhavam felizes, cada qual com a sua vida, talvez até mais chata que a dele. Muitas pessoas poderiam estar por ali sem saúde, escondendo uma doença ou poderiam simplesmente estar passando por problemas com familiares, problemas financeiros e ele não estava passando por nada disso. Estava enfurnado no quarto por pura opção dele mesmo. “Como fui tolo”, um sorriso de escárnio se passou por seus lábios enquanto ele continuava a caminhar em direção ao parque.
As árvores pareciam estar mais verdes aquele dia, a grama estava mais chamativa e provavelmente muito macia. Se tudo corresse da maneira como ele estava pensando, passaria a tarde inteira ali somente se dedicando à música que certamente iria compor aquele dia. Procurou com os olhos o lugar mais apropriado para se sentar e não demorou muito a encontrar um lugar defronte ao lago verde oliva que enfeitava o parque. Preferiu manter-se longe da água, pois muitas crianças insistiam em lançar alimentos para os patos e provavelmente os peixes que ali havia. A cena era bonita e, assim que se sentou, passou a olhar para todas aquelas pessoas, conseguindo sentir a liberdade que envolvia cada uma delas. Balançando a cabeça, depois de minutos distraído, ele pegou a capa do violão, retirando-o de dentro e o posicionou em seu colo passando o dedo pelas cordas para conferir a afinação. Mesmo depois de tempos sem uso, o violão continuava afinado e bem cuidado, porém alguma poeira também fazia parte da aparência do instrumento. Com a manga da blusa, o garoto passou a limpar o violão, deixando-o brilhando novamente e não tardou a pegar a caneta e o caderno, abrindo-o na primeira folha em branco que encontrou. A primeira coisa a escrever na folha, depois de muito tempo sem compor nada, foi: “por ”. Sua mente divagava para todos aqueles momentos de solidão que ele viveu quando seu irmão e seu amigo foram embora, quando seus pais respiravam trabalho e ele se sentia inútil por não ter conseguido entrar na faculdade que tanto quis.
Antes que uma letra sequer passasse por sua mente, sua atenção foi distraída por uma movimentação perto de onde ele estava sentado. Seus olhos automaticamente viraram na direção do som e ele pôde sentir com nitidez o vento trazer uma fragrância diferente. Mas o que ele achava estranho era que a fragrância feminina combinava muito com a garota que havia acabado de sentar há alguns metros de distância dele. Talvez uns quinze metros, ele não saberia dizer. Apenas sabia dizer que aquela menina era muito cheirosa.
“Idiota”, sua mente zombou. Ele sorriu pequeno e voltou a atenção ao caderno, desligando-se da garota. Mas assim que fechou os olhos para poder pensar numa frase que comportasse todos os seus sentimentos, a imagem de cabelos brilhantes tomou conta de sua mente e ele abriu os olhos abruptamente. Sua cabeça virou em direção à menina ao seu lado e pôde ver com nitidez a cor dos cabelos dela. Eram , grandes, lisos e muito brilhantes refletidos à luz do sol. A pele alva contrastava fortemente com a escuridão de seus cabelos e logo seus olhos passaram a se movimentar pelo corpo dela. A regata com uma das alças caídas em seu ombro era preta e customizada nas laterais por rasgos propositais que mostravam sua pele por baixo da roupa. O short jeans claro desenhava as curvas do quadril dela com perfeição e as pernas aparentavam ser extremamente lisas e não havia nenhuma mancha em sua pele.
Ele voltou o olhar lentamente por sobre o corpo da menina e viu que os cabelos cobriam o rosto dela. As pernas dela estavam apoiadas no queixo, mas o cabelo ainda atrapalhava a visão de seu rosto e ele não gostou. Queria ver o rosto dela. “Ela com certeza deve parecer um anjo”, ele pensou. Ajeitou seu corpo e encurvou a cabeça para os dois lados e para frente na intenção de tentar ver o rosto dela de alguma forma, mas a garota permanecia parada certamente entretida em uma bolha particular. mordeu o lábio inferior, ansioso. Não se importaria de ficar ali esperando a menina mostrar o rosto, não mesmo. Vendo que a garota estava realmente distraída, ele decidiu que não iria perder a atenção dela, mas também não iria deixar de aproveitar e brincar um pouco com as cordas do violão. Puxou a palheta e a deslizou pelas cordas tocando o acorde G (sol) com todo o cuidado, no final da nota arriscou brincar um pouco com as mais agudas. E isso foi o bastante para a garota olhar em sua direção, completamente interessada. Como se sentisse o peso do olhar, se virou também e conseguiu enxergar com nitidez o rosto da menina.
Enquanto o som do acorde C9 (dó com nona) era produzido lentamente, ele aproveitou para analisar o rosto da garota com atenção. Os cabelos desenhavam a forma redonda e pequena de seu rosto que era tão belo quanto o de qualquer outra garota que ele havia conhecido. Os olhos dela estavam vermelhos e o encaravam com tristeza, ao mesmo tempo em que havia interesse neles, principalmente quando ela olhava o violão. O nariz era pequeno e arrebitado, parecendo mais um botão de rosa e os lábios rosados estavam crispados, como se ela estivesse segurando o choro. O olhar dos dois estava preso um no outro e quando tocou a nota D (ré) na sequência, uma melodia veio em sua cabeça junto com a frase que ele tanto queria.
A imagem daquela menina era tão intrigante que ele não conseguia desviar o olhar dela nem por um segundo. A face entristecida da menina era algo realmente curioso, pois no fundo ele queria saber o porquê de ela estar daquela forma. Uma menina tão linda não deveria estar com lágrimas nos olhos. Ah, como ele queria saber o porquê da tristeza dela. E ali, observando-a com seu olhar minucioso, ele percebeu que o seu problema de solidão era muito menos grave do que o problema que aquela menina provavelmente estaria passando. Ou pelo menos aparentava ser. Ele não era o único no mundo com problemas, afinal, todos têm uma vida conturbada e cheia de altos e baixos. Mas aquela garota parecia ter mais baixos do que altos. E isso coincidia muito com o que ele estava pensando em escrever aquela tarde.
Como se recebesse um choque, largou o violão e puxou o caderno em sua direção, ansioso para escrever a primeira linha de sua mais nova canção. Não iria escrever uma canção sobre a sua solidão. Iria escrever uma canção sobre a garota do parque. Ela, sim, tinha roubado toda e qualquer direção da sua atenção. Então, ele escreveu a primeira linha:
She was looking kinda sad and lonely
(Ela estava parecendo um pouco triste e solitária)
E então ele a encarou mais uma vez. A menina tinha o rosto virado para o lago e seu perfil estava sério. O queixo continuava apoiado nos joelhos e os braços abraçando as pernas, juntando-as mais para seu corpo. “O que está acontecendo com ela?” ele se perguntava. “Por que ela está quase chorando? Por que ela não sorri? Ela é tão linda... Merecia ter um sorriso no rosto”.
Então frases vieram em sua mente e ele não tardou a registrá-las.
And I was thinking to myself if only
(Eu estava pensando comigo mesmo se apenas)
She’d give me a smile, but
(Ela me desse um sorriso, mas)
Ele a olhou novamente e vendo a expressão triste da menina, viu que não seria fácil fazê-la sorrir sem ao menos falar com ela.
It’s not gonna happen that way
(Não vai acontecer desse jeito)
“Falar com ela...”.
Talvez seria uma boa falar com a garota. Ela estava chateada e provavelmente precisava de um ombro amigo, uma... Companhia quem sabe? Se ele ao menos tivesse coragem para chegar à menina e perguntar alguma coisa a ela. Não queria ser inconveniente, ainda mais quando não a conhecia, não sabia os problemas que a menina estava passando. Mas... A vida é para se arriscar, certo? Então, qual o problema? Por que ele não poderia se levantar, trazer seu violão e sentar ao lado dela como quem não quer nada?
Tomando a coragem necessária para se achegar à garota, ele deixou o violão de lado, mas assim que quase se levantou para ir em direção a ela, suas pernas paralisaram. Ele não teria essa coragem. Não queria ser intrometido e nem muito menos inconveniente.
Mesmo sentindo-se um perdedor, mais frases se formaram em sua mente por sua súbita falta de encorajamento e ele pensou. Música expressavam diversos sentimentos e mesmo ele se achando meio idiota por não ter coragem de se aproximar de uma garota, ele resolveu que aquilo poderia expressar o que ele estava sentindo naquele momento. Ah, ele teria tantas lembranças para quando voltasse para casa.
So I took it upon myself to ask her
(Então eu me pus na posição de ir perguntar a ela)
Would you like company and maybe after
(Você gostaria de companhia e talvez depois)
We could talk a while but
(Nós poderíamos conversar um pouco, mas)
I just don’t know what to say
(Eu simplesmente não sei o que dizer)
E isso era verdade. Ele não sabia como iria chegar nela e muito menos o que iria dizer. Perguntar se estava tudo bem poderia ser meio irônico, pois se ela estava triste e chateada, certamente não estaria bem. Perguntar se queria companhia poderia ser um pouco atrevido e correria sério risco de ser enxotado dali e perguntar se ela queria conversar poderia ser fatal e, como não conhecia a garota, ela poderia chorar de repente ou simplesmente negar. Ele não queria vê-la chorar.
Mais uma vez seu olhar se pôs sobre ela e ele pôde ver o quanto ela era bonita. Talvez por sua beleza exótica, mas diferente de tudo, ela parecia ter uma beleza interior tão mais forte quanto a exterior... E isso era tudo o que ele admirava numa garota. Mas... Por que estava se sentindo daquele jeito então? E frases e frases rondavam sua cabeça e sentimentos se confundiam em relação à garota desconhecida do parque que o interessou tanto. E ele não tardou a escrever os versos.
Coz you’ve got all the things that I want
(Porque você tem tudo o que eu quero)
And I just can’t explain so
(E eu apenas não sei como explicar, então)
Então, antes que pudesse escrever a próxima frase, a menina se levantou e com um último olhar direcionado a ele, se afastou para a saída do parque. a acompanhou com os olhos, a caneta ainda na posição de escrita, o caderno apoiado no joelho e o violão repousado sobre a grama. Ele viu a silhueta desenhada da menina ficar cada vez mais longe e um aperto em seu coração fez com que seus olhos se fechassem e a imagem bela e delicada da menina pairasse por seus pensamentos. Com um sorriso nos lábios, ele olhou para as frases escritas na folha vendo que a composição ficou melhor do que ele imaginava. Olhou mais uma vez para a saída do parque na intenção de ver a garota ao longe, mas ela já estava fora de seu campo de visão. Sentindo uma pequena tristeza por isso, voltou-se à letra da música lendo e relendo várias vezes para tentar arrumar uma continuação, mas não conseguiu. Nem com a lembrança da garota. Dentro de sua mente, pairava a hipótese de que ele precisava vê-la novamente para poder continuar a canção. E ele queria vê-la de novo.
- Pode parecer loucura... – ele falou para si mesmo. – Mas eu preciso vê-la novamente.
E ele estaria ali, naquele mesmo horário, no mesmo lugar, apenas aguardando a garota triste que tanto lhe intrigou. A inspiração de sua mais nova canção.
11h00min PM – Sexta-feira
Querido diário,
O dia hoje foi muito confuso. Eu tenho certeza que chorei tanto, mas tanto que todas as minhas lágrimas já devem ter se esgotado. Eu não conseguia me preparar para receber aquela notícia do Dr. Moore. Eu pensava que tudo não passava de um grande alarme falso, que era somente uma coincidência. Eu achava que eu estava com alguma gripe forte ou com qualquer outra coisa, menos isso que eu soube hoje. Eu acho que ninguém está preparado para descobrir que está com câncer. Ninguém está preparado para saber que seu pulmão está sendo comido pela doença maligna que é a metástase. E é por isso que estou chorando sem parar. Eu não sei se vou resistir a essa luta contra o câncer. Eu cansei se sentir falta de ar todos os dias, cansei de sentir dores fortes no peito e cansei de preocupar minha mãe com isso. A realidade caiu como uma bomba para mim. Eu realmente estou com câncer e o Dr. Moore não me pareceu muito otimista quanto ao meu quadro de saúde.
Eu não aguentava mais ver minha mãe chorando pelos cantos porque descobriu a doença que me afligia. Não aguentava ver meu pai paralisado toda vez que eu entrava na sala. Eu não aguentava mais chorar na frente deles, então eu resolvi sair. Foi muito bom, até. Respirar o ar fresco do parque era tudo o que eu precisava para pelo menos sentir um pouco de paz dentro de mim. Paz espiritual e carnal, afinal, minha respiração está ficando por um fio. Eu me encontrei sozinha ali, sentada de frente ao lago do parque quando ouvi o som de um violão sendo tocado ao meu lado. Poxa, como eu amo músicas acústicas. Eu estava com meu coração tão dolorido por ter descoberto que portava câncer em estado avançado, quando vejo um garoto dedilhando as cordas do instrumento que mais me acalmava em meio aos dias maus. Ele era bem bonito, devo acrescentar. Bonito e provavelmente escritor, um poeta, compositor talvez, já que escrevia com tanta desenvoltura em um caderno. Por um momento fiquei curiosa em saber o que ele estava fazendo, mas antes que eu demonstrasse algum interesse, percebi que estaria fazendo a coisa errada. Sei que vou morrer e não vai demorar muito tempo. Talvez eu devesse ficar sozinha com meus problemas do que fazer amizades que podem sofrer depois que eu partir.
Sim. É isso. Não posso me enturmar com ninguém. Já basta meus pais sofrendo por mim. Não quero outra pessoa tendo o mesmo sentimento mau. E agora eu irei dormir. Estou muito cansada e a falta de ar deu uma trégua. Queria ter uma boa noite de sono sem ter que ficar procurando ar para respirar. Amanhã é um novo dia e quero estar preparada para enfrentá-lo, venha o que vier.
Com amor, .
E, de repente, tomando um ímpeto de coragem, ele resolveu que iria fazer daquele dia um dia diferente. Fazia tempo que não saía para distrair a mente, para pensar, para refletir ou apenas para sair de dentro de casa e de toda aquela solidão que a ausência das pessoas lhe causava. No fundo de sua mente, parecia que ele era o último no mundo inteiro, o único deixado de lado na vida enquanto todos tinham o que fazer. Nunca gostara de estudar, mas ele preferia mil vezes estar cheio de coisas da faculdade do que ficar em casa naquela solidão terrível. Muitas vezes era até bom para pensar, mas havia outras vezes, como aquela, em que ele queria parar tudo e desistir das coisas.
- Você não pode fazer isso. – falou para si mesmo, sua voz grossa reverberando pelo quarto silencioso.
E como isso fosse mais que o suficiente, ele resolveu: iria sair aquela tarde e distrair a mente. Automaticamente, seu olhar se voltou para a capa que cobria e guardava seu violão há muito tempo não tocado. Lembrava-se com nitidez de quando frequentava o colegial e todos adoravam vê-lo cantar e tocar. Era um de seus meios de conseguir sair com muitas garotas e se tornar um dos populares que movimentavam o prédio escolar. O violão preto era tão limpo que poderia servir até como um espelho. A palheta azul marinho transparente o ajudava a dedilhar as cordas com mais rapidez e volúpia, deixando a melodia tocada ainda mais perfeita a quem ouvia. Mas o grande contraste em toda aquela sintonia de tons, notas e acordes era a sua voz. A voz do garoto, grossa e vibrante, trazia a entonação perfeita para tornar uma música simplesmente maravilhosa. Ele sentia falta de cantar e pra quem cantar. Suas músicas sempre tinham um motivo e ele, há muito tempo, não via motivos para cantar como antes. Lembrava-se dos shows na escola que por várias vezes participou. Ali, sim, sua vida estava muito boa. Agora, ele se via sozinho dentro de casa, completamente enfurnado sem ter o que fazer. Seus amigos antigos haviam ido cada um para o seu lado. Havia sobrado apenas Thomas e ainda assim o garoto se foi.
Então, tudo bem. Se ele teria que viver seus próximos meses sozinho, teria de se acostumar. Quatro meses se passaram e ele não poderia ficar naquela solidão terrível e por isso resolveu que sair seria a melhor alternativa.
Não demorou a tomar um banho rápido e em seguida arrumar qualquer roupa para sair. Não queria uma roupa muito trabalhada, pois iria apenas ao parque central sentar-se na grama e tentar compor alguma música com sua melodia. O violão e o caderno de música de cifras/partituras estavam em cantos diferentes e isso o aborrecia um pouco. Cansou de pedir à sua mãe para não separar suas coisas, pois sempre que a mulher arrumava o quarto do menino, muita coisa sumia misteriosamente. Pediu aos céus para seu caderno não ter sumido e sentiu-se aliviado ao encontrá-lo junto com seus cadernos antigos de escola. Contra a sua vontade, não se desfez dos cadernos por um motivo idiota, mas ao mesmo tempo verdadeiro: precisaria daquelas porcarias se quisesse passar numa faculdade boa, afinal, vestibular se conquista com sacrifício, certo? “Certo”.
Sem delongas, puxou a alça da capa do violão e colocou-a em seu ombro ao mesmo tempo em que ajeitava o caderno embaixo do braço e colocava uma caneta azul no bolso da calça. Mesmo com sua mente lhe alertando para levar uma lapiseira, ele não quis ouvir. Apenas queria sentir o ar do dia novamente, com toda a vontade que havia dentro de si.
Assim que saiu porta afora, o vento da tarde bateu em seu rosto e ele pôde respirar bem novamente. Um sorriso desenhou seus lábios finos e os dentes brancos e alinhados fizeram-se presente em sua face. Ao dar o primeiro passo em direção à rua, sentiu como se correntes estivessem caindo de seu corpo e libertando-o para viver novamente. Ali, andando pela rua com o violão em suas costas e o caderno seguro firmemente por suas mãos fortes, ele percebeu o quanto foi ruim ficar em casa sozinho. Pelo menos na rua ele não estaria tão sozinho. Várias pessoas caminhavam felizes, cada qual com a sua vida, talvez até mais chata que a dele. Muitas pessoas poderiam estar por ali sem saúde, escondendo uma doença ou poderiam simplesmente estar passando por problemas com familiares, problemas financeiros e ele não estava passando por nada disso. Estava enfurnado no quarto por pura opção dele mesmo. “Como fui tolo”, um sorriso de escárnio se passou por seus lábios enquanto ele continuava a caminhar em direção ao parque.
As árvores pareciam estar mais verdes aquele dia, a grama estava mais chamativa e provavelmente muito macia. Se tudo corresse da maneira como ele estava pensando, passaria a tarde inteira ali somente se dedicando à música que certamente iria compor aquele dia. Procurou com os olhos o lugar mais apropriado para se sentar e não demorou muito a encontrar um lugar defronte ao lago verde oliva que enfeitava o parque. Preferiu manter-se longe da água, pois muitas crianças insistiam em lançar alimentos para os patos e provavelmente os peixes que ali havia. A cena era bonita e, assim que se sentou, passou a olhar para todas aquelas pessoas, conseguindo sentir a liberdade que envolvia cada uma delas. Balançando a cabeça, depois de minutos distraído, ele pegou a capa do violão, retirando-o de dentro e o posicionou em seu colo passando o dedo pelas cordas para conferir a afinação. Mesmo depois de tempos sem uso, o violão continuava afinado e bem cuidado, porém alguma poeira também fazia parte da aparência do instrumento. Com a manga da blusa, o garoto passou a limpar o violão, deixando-o brilhando novamente e não tardou a pegar a caneta e o caderno, abrindo-o na primeira folha em branco que encontrou. A primeira coisa a escrever na folha, depois de muito tempo sem compor nada, foi: “por ”. Sua mente divagava para todos aqueles momentos de solidão que ele viveu quando seu irmão e seu amigo foram embora, quando seus pais respiravam trabalho e ele se sentia inútil por não ter conseguido entrar na faculdade que tanto quis.
Antes que uma letra sequer passasse por sua mente, sua atenção foi distraída por uma movimentação perto de onde ele estava sentado. Seus olhos automaticamente viraram na direção do som e ele pôde sentir com nitidez o vento trazer uma fragrância diferente. Mas o que ele achava estranho era que a fragrância feminina combinava muito com a garota que havia acabado de sentar há alguns metros de distância dele. Talvez uns quinze metros, ele não saberia dizer. Apenas sabia dizer que aquela menina era muito cheirosa.
“Idiota”, sua mente zombou. Ele sorriu pequeno e voltou a atenção ao caderno, desligando-se da garota. Mas assim que fechou os olhos para poder pensar numa frase que comportasse todos os seus sentimentos, a imagem de cabelos brilhantes tomou conta de sua mente e ele abriu os olhos abruptamente. Sua cabeça virou em direção à menina ao seu lado e pôde ver com nitidez a cor dos cabelos dela. Eram , grandes, lisos e muito brilhantes refletidos à luz do sol. A pele alva contrastava fortemente com a escuridão de seus cabelos e logo seus olhos passaram a se movimentar pelo corpo dela. A regata com uma das alças caídas em seu ombro era preta e customizada nas laterais por rasgos propositais que mostravam sua pele por baixo da roupa. O short jeans claro desenhava as curvas do quadril dela com perfeição e as pernas aparentavam ser extremamente lisas e não havia nenhuma mancha em sua pele.
Ele voltou o olhar lentamente por sobre o corpo da menina e viu que os cabelos cobriam o rosto dela. As pernas dela estavam apoiadas no queixo, mas o cabelo ainda atrapalhava a visão de seu rosto e ele não gostou. Queria ver o rosto dela. “Ela com certeza deve parecer um anjo”, ele pensou. Ajeitou seu corpo e encurvou a cabeça para os dois lados e para frente na intenção de tentar ver o rosto dela de alguma forma, mas a garota permanecia parada certamente entretida em uma bolha particular. mordeu o lábio inferior, ansioso. Não se importaria de ficar ali esperando a menina mostrar o rosto, não mesmo. Vendo que a garota estava realmente distraída, ele decidiu que não iria perder a atenção dela, mas também não iria deixar de aproveitar e brincar um pouco com as cordas do violão. Puxou a palheta e a deslizou pelas cordas tocando o acorde G (sol) com todo o cuidado, no final da nota arriscou brincar um pouco com as mais agudas. E isso foi o bastante para a garota olhar em sua direção, completamente interessada. Como se sentisse o peso do olhar, se virou também e conseguiu enxergar com nitidez o rosto da menina.
Enquanto o som do acorde C9 (dó com nona) era produzido lentamente, ele aproveitou para analisar o rosto da garota com atenção. Os cabelos desenhavam a forma redonda e pequena de seu rosto que era tão belo quanto o de qualquer outra garota que ele havia conhecido. Os olhos dela estavam vermelhos e o encaravam com tristeza, ao mesmo tempo em que havia interesse neles, principalmente quando ela olhava o violão. O nariz era pequeno e arrebitado, parecendo mais um botão de rosa e os lábios rosados estavam crispados, como se ela estivesse segurando o choro. O olhar dos dois estava preso um no outro e quando tocou a nota D (ré) na sequência, uma melodia veio em sua cabeça junto com a frase que ele tanto queria.
A imagem daquela menina era tão intrigante que ele não conseguia desviar o olhar dela nem por um segundo. A face entristecida da menina era algo realmente curioso, pois no fundo ele queria saber o porquê de ela estar daquela forma. Uma menina tão linda não deveria estar com lágrimas nos olhos. Ah, como ele queria saber o porquê da tristeza dela. E ali, observando-a com seu olhar minucioso, ele percebeu que o seu problema de solidão era muito menos grave do que o problema que aquela menina provavelmente estaria passando. Ou pelo menos aparentava ser. Ele não era o único no mundo com problemas, afinal, todos têm uma vida conturbada e cheia de altos e baixos. Mas aquela garota parecia ter mais baixos do que altos. E isso coincidia muito com o que ele estava pensando em escrever aquela tarde.
Como se recebesse um choque, largou o violão e puxou o caderno em sua direção, ansioso para escrever a primeira linha de sua mais nova canção. Não iria escrever uma canção sobre a sua solidão. Iria escrever uma canção sobre a garota do parque. Ela, sim, tinha roubado toda e qualquer direção da sua atenção. Então, ele escreveu a primeira linha:
She was looking kinda sad and lonely
(Ela estava parecendo um pouco triste e solitária)
E então ele a encarou mais uma vez. A menina tinha o rosto virado para o lago e seu perfil estava sério. O queixo continuava apoiado nos joelhos e os braços abraçando as pernas, juntando-as mais para seu corpo. “O que está acontecendo com ela?” ele se perguntava. “Por que ela está quase chorando? Por que ela não sorri? Ela é tão linda... Merecia ter um sorriso no rosto”.
Então frases vieram em sua mente e ele não tardou a registrá-las.
And I was thinking to myself if only
(Eu estava pensando comigo mesmo se apenas)
She’d give me a smile, but
(Ela me desse um sorriso, mas)
Ele a olhou novamente e vendo a expressão triste da menina, viu que não seria fácil fazê-la sorrir sem ao menos falar com ela.
It’s not gonna happen that way
(Não vai acontecer desse jeito)
“Falar com ela...”.
Talvez seria uma boa falar com a garota. Ela estava chateada e provavelmente precisava de um ombro amigo, uma... Companhia quem sabe? Se ele ao menos tivesse coragem para chegar à menina e perguntar alguma coisa a ela. Não queria ser inconveniente, ainda mais quando não a conhecia, não sabia os problemas que a menina estava passando. Mas... A vida é para se arriscar, certo? Então, qual o problema? Por que ele não poderia se levantar, trazer seu violão e sentar ao lado dela como quem não quer nada?
Tomando a coragem necessária para se achegar à garota, ele deixou o violão de lado, mas assim que quase se levantou para ir em direção a ela, suas pernas paralisaram. Ele não teria essa coragem. Não queria ser intrometido e nem muito menos inconveniente.
Mesmo sentindo-se um perdedor, mais frases se formaram em sua mente por sua súbita falta de encorajamento e ele pensou. Música expressavam diversos sentimentos e mesmo ele se achando meio idiota por não ter coragem de se aproximar de uma garota, ele resolveu que aquilo poderia expressar o que ele estava sentindo naquele momento. Ah, ele teria tantas lembranças para quando voltasse para casa.
So I took it upon myself to ask her
(Então eu me pus na posição de ir perguntar a ela)
Would you like company and maybe after
(Você gostaria de companhia e talvez depois)
We could talk a while but
(Nós poderíamos conversar um pouco, mas)
I just don’t know what to say
(Eu simplesmente não sei o que dizer)
E isso era verdade. Ele não sabia como iria chegar nela e muito menos o que iria dizer. Perguntar se estava tudo bem poderia ser meio irônico, pois se ela estava triste e chateada, certamente não estaria bem. Perguntar se queria companhia poderia ser um pouco atrevido e correria sério risco de ser enxotado dali e perguntar se ela queria conversar poderia ser fatal e, como não conhecia a garota, ela poderia chorar de repente ou simplesmente negar. Ele não queria vê-la chorar.
Mais uma vez seu olhar se pôs sobre ela e ele pôde ver o quanto ela era bonita. Talvez por sua beleza exótica, mas diferente de tudo, ela parecia ter uma beleza interior tão mais forte quanto a exterior... E isso era tudo o que ele admirava numa garota. Mas... Por que estava se sentindo daquele jeito então? E frases e frases rondavam sua cabeça e sentimentos se confundiam em relação à garota desconhecida do parque que o interessou tanto. E ele não tardou a escrever os versos.
Coz you’ve got all the things that I want
(Porque você tem tudo o que eu quero)
And I just can’t explain so
(E eu apenas não sei como explicar, então)
Então, antes que pudesse escrever a próxima frase, a menina se levantou e com um último olhar direcionado a ele, se afastou para a saída do parque. a acompanhou com os olhos, a caneta ainda na posição de escrita, o caderno apoiado no joelho e o violão repousado sobre a grama. Ele viu a silhueta desenhada da menina ficar cada vez mais longe e um aperto em seu coração fez com que seus olhos se fechassem e a imagem bela e delicada da menina pairasse por seus pensamentos. Com um sorriso nos lábios, ele olhou para as frases escritas na folha vendo que a composição ficou melhor do que ele imaginava. Olhou mais uma vez para a saída do parque na intenção de ver a garota ao longe, mas ela já estava fora de seu campo de visão. Sentindo uma pequena tristeza por isso, voltou-se à letra da música lendo e relendo várias vezes para tentar arrumar uma continuação, mas não conseguiu. Nem com a lembrança da garota. Dentro de sua mente, pairava a hipótese de que ele precisava vê-la novamente para poder continuar a canção. E ele queria vê-la de novo.
- Pode parecer loucura... – ele falou para si mesmo. – Mas eu preciso vê-la novamente.
E ele estaria ali, naquele mesmo horário, no mesmo lugar, apenas aguardando a garota triste que tanto lhe intrigou. A inspiração de sua mais nova canção.
11h00min PM – Sexta-feira
Querido diário,
O dia hoje foi muito confuso. Eu tenho certeza que chorei tanto, mas tanto que todas as minhas lágrimas já devem ter se esgotado. Eu não conseguia me preparar para receber aquela notícia do Dr. Moore. Eu pensava que tudo não passava de um grande alarme falso, que era somente uma coincidência. Eu achava que eu estava com alguma gripe forte ou com qualquer outra coisa, menos isso que eu soube hoje. Eu acho que ninguém está preparado para descobrir que está com câncer. Ninguém está preparado para saber que seu pulmão está sendo comido pela doença maligna que é a metástase. E é por isso que estou chorando sem parar. Eu não sei se vou resistir a essa luta contra o câncer. Eu cansei se sentir falta de ar todos os dias, cansei de sentir dores fortes no peito e cansei de preocupar minha mãe com isso. A realidade caiu como uma bomba para mim. Eu realmente estou com câncer e o Dr. Moore não me pareceu muito otimista quanto ao meu quadro de saúde.
Eu não aguentava mais ver minha mãe chorando pelos cantos porque descobriu a doença que me afligia. Não aguentava ver meu pai paralisado toda vez que eu entrava na sala. Eu não aguentava mais chorar na frente deles, então eu resolvi sair. Foi muito bom, até. Respirar o ar fresco do parque era tudo o que eu precisava para pelo menos sentir um pouco de paz dentro de mim. Paz espiritual e carnal, afinal, minha respiração está ficando por um fio. Eu me encontrei sozinha ali, sentada de frente ao lago do parque quando ouvi o som de um violão sendo tocado ao meu lado. Poxa, como eu amo músicas acústicas. Eu estava com meu coração tão dolorido por ter descoberto que portava câncer em estado avançado, quando vejo um garoto dedilhando as cordas do instrumento que mais me acalmava em meio aos dias maus. Ele era bem bonito, devo acrescentar. Bonito e provavelmente escritor, um poeta, compositor talvez, já que escrevia com tanta desenvoltura em um caderno. Por um momento fiquei curiosa em saber o que ele estava fazendo, mas antes que eu demonstrasse algum interesse, percebi que estaria fazendo a coisa errada. Sei que vou morrer e não vai demorar muito tempo. Talvez eu devesse ficar sozinha com meus problemas do que fazer amizades que podem sofrer depois que eu partir.
Sim. É isso. Não posso me enturmar com ninguém. Já basta meus pais sofrendo por mim. Não quero outra pessoa tendo o mesmo sentimento mau. E agora eu irei dormir. Estou muito cansada e a falta de ar deu uma trégua. Queria ter uma boa noite de sono sem ter que ficar procurando ar para respirar. Amanhã é um novo dia e quero estar preparada para enfrentá-lo, venha o que vier.
Com amor, .
II. Suficiente para se apaixonar
Ao acordar na manhã de segunda, ele se sentiu elétrico. A música que compunha na sexta-feira pairava em sua mente fortemente e tudo o que ele queria era continuar aquela escrita, ou seja, teria de ir ao parque no mesmo horário que foi e torcer com toda a sua alma que a garota estivesse lá. Não fora ao parque no final de semana porque seus pais estariam em casa e ele queria desfrutar a companhia mais do que proveitosa dos progenitores, já que não as tinha com frequência. Mas ao mesmo tempo em que estava ali com seus pais, sua mente estava na garota do parque. Ele não a tirou da cabeça por um segundo. Não pensaria em nada mais se a visse de novo. Iria falar com ela.
Passou uma parte do dia meditando no que havia escrito e pegou o violão tentando arranjar uma melodia que encaixasse com o perfil daquela menina. Ela estava triste, realmente, mas ele não poderia negar que vê-la alegre seria bem incentivador para ele. Então, por que não fazer uma melodia alegre para a música? Ao contrário de tudo, ele achava que um ritmo alegre poderia fazer a menina sorrir para ele e tudo o que ele queria ver o sorriso formar nos lábios dela, principalmente porque a expressão chateada dela o intrigou de forma sobrenatural. E com uma batida no acorde G, ele passou a pegar a melodia da canção conciliando as batidas e dedilhados. As notas se basearam em G, C, D, B, Em e A (respectivamente sol, dó, ré, si, mi menor e lá). Poderia até mesmo finalizar a música se quisesse, mas ele sentia que algo estava faltando... A música estava incompleta e isso não era somente um pretexto para ver a garota novamente.
Assim que anotou as notas em seu caderno, pegou o violão e saiu na direção da porta de casa em rumo ao parque central. O dia estava ensolarado e o vento trazia a brisa necessária para que o clima estivesse bom para sair de casa. Arrumou a alça do violão em seu ombro, ajeitando o corpo e andou com firmeza pela rua, observando tudo e todos com os olhos contentes. Dentro de si a certeza de que a menina estaria lá era realmente forte, mas ao mesmo tempo em que chegava ao parque, sua certeza ruía aos poucos. E se ela não estivesse? Era uma chance em mil de não ela estar ali. Quem sabia sobre a garota do parque? Ele nem sabia o nome dela, nem sabia de onde ela vinha ou se ela morava na mesma cidade ou se estava ali somente de passagem... Pela forma que ela estava triste poderia ser por outros mil e um motivos como, por exemplo, uma mudança? Ah, ela não poderia ter mudado, não. Mas quem sabe ele não dava sorte e a encontrava por lá?
Com o pensamento firme e a posição ainda intacta, ele andou até o parque rumando na direção do lago, onde ele havia se sentado da última vez. O parque estava mais vazio que da outra vez, mas era possível ver algumas crianças brincando por ali, jovens casais namorando e famílias espalhadas em pontos distantes do parque. soltou um suspiro quando seus olhos grudaram em um casal de junto a uma árvore que se beijavam com paixão. Fazia muito tempo que ele não ficava com uma garota e sentia muita falta disso. Na verdade, era bem difícil e irônico para um garoto como ele que tanto saía quando Willian e Thomas estavam na cidade para serem a companhia perfeita em noitadas de festas múltiplas. Mas nem isso ele tinha mais, muito menos vontade de sair sozinho. Nada seria como era antes.
Ergueu os olhos para toda a extensão do parque tentando captar longos cabelos perto ou longe dele. A silhueta da garota do parque ainda pairava em sua mente como se ele a estivesse vendo naquele momento, mas o ruim era que eram apenas lembranças. Com mais um olhar minucioso pelo parque, ele concluiu que a garota não estava ali e isso o entristeceu bastante. Antes que pudesse ter sua alegria abalada, ele decidiu parar de besteira e dedicar-se à sua nova composição. “Eu não posso ficar triste toda vez que eu me vir sozinho no mundo, afinal, o mundo está aí para trilharmos caminhos sozinhos, não é mesmo?”, ele pensava. E com esse pensamento, não tardou a sentar-se defronte ao lago, abrir o caderno em sua mais nova composição e pegar o violão repousando-o em seu colo, dedilhando as cordas para conferir a afinação. Uns ajustes aqui e ali e ele pôde continuar com o seu mais novo passatempo divertido: a música da garota do parque.
Enquanto lia os versos compostos, ele se lembrava do dia em que ela estava ali, triste, sozinha e presa em pensamentos muito provavelmente perturbadores. E lendo o verso “and I was thinking to myself in only, she’d give me a smile”, um pensamento tomou conta de sua mente e ele tremeu. Ela poderia ter terminado com um namorado e estar ali chorando, certo? Mas... Mas quem seria louco de terminar algum namoro com aquela garota extremamente linda? “Qualquer um, afinal de contas, eu não conheço a garota para achar alguma coisa”, mas então ele pensou melhor. “Mas ela é tão linda que não tem como eu sequer pensar em algum garoto são da mente terminando algo com ela”. E seus olhos se passaram pela estrofe seguinte. Ele queria tanto falar com ela, tanto saber o que acontecia, queria tanto entender o porquê de ela estar sofrendo daquele jeito, mas infelizmente sua coragem o fizera fracassar. Algo que ele não podia se dar ao luxo, mas mesmo assim falhou no ato.
Se ele ao menos tivesse a chance de vê-la de novo...
Assim que pegou o violão e passou a tocar a primeira música que veio em sua mente, ele percebeu que ficara muito tempo sem treinar os acordes e as passagens de solos. Talvez tenha ficado tanto tempo sem tocar algo que simplesmente se esqueceu da introdução mais famosa do Guns N’Roses, Knockin’ On Heaven’s Door. Prometendo a si mesmo que não iria ficar tanto tempo sem tocar em seu violão, passou a tirar o solo da música novamente e sua atenção se voltou completamente para a música e, com um mantra de coragem, ele decidiu que iria pegar aquele solo completamente perfeito como tocara em outrora.
Vinte minutos foram o suficiente para que ele conseguisse tocar o solo, mais a música inteira e ainda arriscava em cantar algumas frases que sempre cantava na escola quando lhe era pedido. Seus dedos corriam pelo braço do violão e pressionavam as cordas com avidez enquanto seus dedos direitos dedilhavam as cordas mais embaixo com empolgação. O som lhe causava torpor e ele ousou fechar os olhos enquanto a emoção o guiava naquela melodia em que todo o parque prestava atenção.
Inclusive certa garota de longos cabelos e pele alva como leite.
Assim que finalizou a música, ele pôde respirar com alívio novamente e sentir o sangue nas veias correrem pela emoção da música. Um sorriso sincero brotou em seus lábios pela primeira vez naqueles tempos e então ele abriu os olhos. Enquanto penteava bagunçava os cabelos para trás, seu rosto virou para o lado esquerdo e ele conseguiu vê-la nitidamente por entre os raios solares que banhavam aquela área do parque. Os olhos dela, hoje não tão vermelhos, estavam voltados para ele num misto de interesse e curiosidade. Os cabelos estavam presos em um coque alto, mas vários fios longos desenhavam seu rosto, deixando-o mais arredondado e formado na geometria perfeita que sempre admirava numa garota. Os lábios pequenos estavam mais corados do que da outra vez e as bochechas eram grandes, destacando a imagem bonita do rosto dela.
E ele não podia deixar de escrever aquele momento, certo?
E observando-a por mais alguns segundos, viu a menina virar o rosto com a face corada e olhar para o lago. Em nenhum momento ousou fazer um movimento que fosse fora da visão dela e continuou a olhá-la. Ali ele via o quanto ela era bonita e diferente e o quanto ele, estranhamente, ficava mais alegre por ver que ela não tinha lágrimas nos olhos, mas mesmo assim, ele percebia a face perturbada da menina, quase beirando à expressão de sexta-feira. Logo, ele viu a menina olhá-lo de novo e a sombra de um sorriso moldar os lábios dela. E isso foi o bastante para ele relatar o momento no papel da composição.
Now and then she looks in my direction
(Agora e depois ela olha na minha direção)
Se ela olhou para ele e até mesmo sorriu, por que não se arriscar e falar com ela? Afinal, ele poderia ter feito isso na semana passada, mas hoje era o dia mais ideal... Não é? Ela não estava chorando, estava mais alegre, então... Valia a pena arriscar.
Decidindo falar com a garota nem que fosse a última que tivesse de fazer na vida, arrumou as coisas, encapou o violão, guardou a caneta e colocou o caderno embaixo do braço saindo em seguida na direção da garota. Ele viu os olhos dela se arregalarem por um segundo, encolhendo as pernas, mas permaneceu sentada no mesmo lugar. Ele apenas sorria pequeno na direção dela e dez passos foram o suficiente para chegar de junto à menina. Enquanto ele colocava o violão perto dela e deixava o caderno em cima da capa, ele a via analisá-lo com os olhos grandes e interessados, porém curiosos. Talvez ela estaria se perguntando “o que esse garoto faz aqui?”, mas isso era irrelevante para ele agora. Sentou-se ao lado dela e pôde sentir com nitidez o mesmo perfume que havia sentido a metros de distância na sexta-feira e isso foi o bastante para ele olhar pela primeira vez para a garota e enxergar de perto os traços de seus olhos.
Os olhos dela tinham os cílios grandes e as íris continham um verde oliva refletido na luz solar, mas ainda reverberava o castanho. O nariz era realmente pequeno e fazia uma bela combinação do desenho dos lábios rosados e finos que ela tinha. Sim, ela era uma das garotas mais bonitas que ele já tinha visto na vida e ele não conseguia tirar os olhos dela por um segundo que fosse.
Perdeu a conta de quanto tempo passou olhando-a e viu a menina encará-lo com o olhar interessado mudando o rumo para um desconfiado e essa foi a deixa para que ele falasse com ela pela primeira vez.
- Espero que eu não esteja sendo inconveniente por sentar aqui ao seu lado. – ele sorriu e a menina o observou por um momento até abrir o sorriso que o tirou da realidade por vários momentos. Os lábios faziam contraste com dentes alinhados e brancos, todos em seu tamanho certo, e ele percebeu que ela tinha o sorriso que ele procurava em tantas garotas e nunca achava. Mesmo conhecendo muitas garotas em suas noites de festas e em sua escola, nenhuma se encaixava com o perfil único que aquela menina tinha. Assim como descreveu em sua música, ela tinha todos os quesitos que ele queria.
- Imagina. – a voz calma falou e ele ergueu uma sobrancelha, interessado em escutar a voz dela. – Fique a vontade. – e antes que ele pudesse falar algo para ela, viu os olhos dela direcionarem para o violão e o caderno fechado. – Desde sexta eu te vi tocando... Acho lindo.
- Mesmo? – ele perguntou e virou o corpo mais para ela. – Eu sou apaixonado por música.
- Então somos dois. – ela sorriu. – Embora eu ame violão de paixão, nunca soube tocar. Prefiro entoar a melodia.
- Você canta? – ele se surpreendeu. – Quero dizer, sempre quis achar alguém que cante bem. Cante para mim! – ele exclamou.
Mesmo vendo a face da menina ruborizada e surpresa, ele não pôde deixar de disfarçar seu interesse em ouvi-la cantando. Seria possível ela ser tão encantadora daquela forma e ainda por cima saber cantar? Seria possível ela enfeitiçá-lo somente com seu sorriso e aprisioná-lo com sua voz doce e calma entoando, porventura, a composição que ele fez para ela?
Não.
Ele queria ouvir a voz dela, mas não teria coragem de mostrar sua composição, principalmente quando não havia terminado a música e porque falava dela. Imagine a reação da garota quando ele falasse que havia composto uma canção para ela?
- Eu não acho uma boa ideia. – a menina baixou os olhos. – Eu não estou em dias muito bons para cantar.
- Mas por quê? Em dias ruins nós temos que cantar... Qual o seu nome? – ele não aguentou. Tinha que saber o nome dela.
- . – ela sorriu e ele retribuiu. – E o seu?
- , mas pode me chamar de . é muito formal para mim.
- . – ela repetiu, feliz. – Pode me chamar de . Acho que também é formal demais. – ele assentiu e tornou a insistir na conversa.
- Me conte , porque não canta? Cantar pode ser muito útil quando estamos tristes, sabia?
- Eu concordo, mas... Estou passando por uma fase horrível da minha vida, acho que quando cantamos é necessário estarmos de bem com as coisas e nesse momento tudo o que eu quero é sumir. – o rosto dela se desfez numa expressão triste e mordeu o lábio inferior, nervoso.
- Posso saber o que acontece? Desculpe se eu estou sendo muito indiscreto, mas... – antes de falar, ele pensou umas duas vezes, mas ele era muito sincero no que achava e não poderia deixar de dizer aquilo a ela. – Uma garota linda como você não deveria ficar triste.
A menina deu um sorriso pequeno e baixou a cabeça, claramente envergonhada. Com o lábio inferior preso nos dentes, ela voltou a olhar para o garoto e seu olhar brilhava. se sentiu aquecido por dentro ao vê-la daquela forma.
- Não quero encher ninguém com meus problemas, . Acho que muitas vezes é necessário carregar a cruz calada. Algumas pessoas não merecem sofrer conosco.
- Mas eu quero te ajudar, . – a menina o fitou. – Eu... Eu não te conheço, mas eu queria entender... Não gosto de ver ninguém triste, principalmente quando a pessoa em questão é você, alguém que eu sequer conheço, mas adoraria conhecer.
- Acho que é melhor deixarmos esse assunto de lado. – ela decretou. – Eu realmente estou com problemas, mas... Em breve superarei essa barreira.
- Quando quiser se abrir comigo, não precisa nem pensar, ok? – ele falou e ela sorriu, logo passando os olhos pelo lago.
- Contarei com você. – ela mordeu o lábio e olhou novamente para o menino. – Eu preciso ir. Está um pouco tarde e não posso ficar muito tempo fora de casa.
- Eu queria que ficasse mais um pouco, conversar com você é bom. – a menina sorriu mais alto e ele não pôde deixar de sorrir junto.
- Outro dia quem sabe. – ela piscou o olho e uma chama de acendeu no peito do garoto.
- Isso é um “, vamos nos ver novamente”? – ela sorriu e assentiu.
- Todas as tardes eu costumo vir aqui para pensar. Sua companhia com certeza será mais do que bem-vinda.
- Estarei aqui amanhã esse mesmo horário. – ele falou rapidamente e ela assentiu.
- Nos vemos amanhã, . Foi um prazer conhecê-lo. – e aproximando-se do menino, depositou um beijo molhado na bochecha dele, que fechou os olhos.
Assim que a menina se levantou, ele se pôs de pé e a puxou para um abraço, completamente desprevenido. A menina endureceu o corpo inicialmente, mas depois enlaçou os braços ao redor do corpo dele. O perfume da menina inundou seu olfato e o cheiro dos cabelos dela o fez entorpecer por um momento, mas não apenas pelo prazer de tocá-la, ele queria dar aquele abraço nela. Ele conseguia sentir que ela estava sofrendo com alguma coisa muito diferente que o término de um namoro, mudança de cidade ou algo irrelevante do tipo. Era algo sério que ela não queria contar, mas ele esperaria no tempo dela, afinal, eles iriam se ver novamente.
- Tchau. – ele falou apertando-a mais uma vez em contra seu corpo. – Amanhã estarei aqui te esperando. Quero que fique bem.
Ela o olhou e sorriu, as lágrimas salgadas começando a nascer pelos olhos bonitos dela.
- Eu ficarei.
E com um último aceno, ela se distanciou dele, olhando uma vez para trás enquanto sorria pequeno. a acompanhava com os olhos até que a menina estava invisível pelo fim de tarde as árvores do parque.
Aquele foi um dos melhores momentos que ele passou com uma garota e precisava ser registrado naquela composição.
I’m hoping for a sing of her affection,
(Eu estou esperançoso por um sinal de sua afeição)
But she’s in denial and,
(Mas ela está negando e,)
She’s got some worries today…
(Ela tem algumas preocupações hoje…)
...
Ele iria encontrá-la no dia seguinte com certeza e tentaria de todas as formas descobrir o segredo que ela escondia.
Poderia parecer loucura, mas ele não suportaria que nada acontecesse àquela garota sem que ele fizesse alguma coisa para ajudar.
Ela era a mais nova inspiração de suas canções e faria de tudo para tê-la por perto.
11h00min PM – Segunda-feira
Querido diário,
Hoje o dia amanheceu bem ensolarado e isso foi o suficiente para me animar um pouco. Mas mesmo assim eu não consigo sequer viver a vida em paz. Todo momento a lembrança da doença me atinge e tudo o que eu quero é que isso não passe de um pesadelo. Eu ainda não aceitei a ideia de que posso morrer. Na verdade, o Dr. Moore não disse isso com todas as letras, mas pela expressão dele ao falar da metástase tudo me levava a concluir que eu não estava com o quadro muito bom nos exames. Em vários casos de câncer no pulmão, uma operação poderia ajudar, mas no meu caso Moore não marcou nada, apenas quimioterapias foram agendadas e mesmo assim não aparenta otimismo nos exames. Acho que meu cerco está se fechando aos poucos e tudo o que eu quero é que o câncer simplesmente se cure, simplesmente evapore.
Se fosse por mim, eu entrava dentro do quarto e dormia o tempo inteiro somente para não ter que sentir tanta falta de ar e tanta dor no peito, mas minha mãe nunca iria deixar que eu ficasse em casa, em depressão, deixando a vida passar enquanto o câncer tomava conta de mim. Ela queria que eu saísse de casa, que eu aproveitasse a vida e não ficasse pensando que iria morrer a qualquer momento. Eu gostaria muito de acreditar dessa mesma forma, mas eu também não era cega para não ver que ela chorava pelos cantos escondido e por muitas vezes gritava enquanto tomava banho. E isso me matava. Eu sei que meu tempo está curto, mas mesmo assim minha mãe está esperançosa de que nada no mundo possa ser maior que o poder de Deus para me salvar dessa doença maldita. E eu acreditava nisso. Mas toda vez que eu passava mal e precisava ser levada as pressas para o hospital ou quando sentia muita falta de ar a ponto de quase morrer, eu não conseguia acreditar muito que Deus me salvaria. Mas independente do que viesse acontecer, eu estava apta a aceitar. Se eu fosse morrer, que seja, se eu fosse viver, eu também aceito. Meu destino não está em minhas mãos.
Minha mãe me obrigou a sair. Eu não queria, mas ela me obrigou e eu posso dizer que foi a melhor coisa que fiz hoje. Sair para o parque novamente foi realmente bom e qual a minha surpresa ao chegar lá e encontrar o mesmo menino de sexta-feira com seu violão, tocando alegremente para todos ouvirem. Sim, todos estavam o olhando e eu não pude deixar de fazer o mesmo. Violão é um instrumento que eu sou apaixonada desde pequena e aquele garoto realmente tocava bem e isso era tão bom de se ver. E além de tocar bem, ele ainda cantava... Sempre tive um fraco por garotos cantores e... Bonitos. Mesmo sabendo que não poderia sequer pensar em namoros, eu não podia negar que aquele garoto me interessaria muito se eu pudesse ter um relacionamento com alguém.
Mas nada me deixou mais surpresa quando ele se sentou ao meu lado e passou a conversar comigo. era o nome dele. Ou simplesmente . Ele estava tão interessado em me conhecer melhor, tão interessado em me ouvir cantar, mas... Eu não podia. Como cantar quando eu sei que a fase negra da minha vida só está começando? E o pior... Como deixar saber disso? Ele não precisava saber dos meus problemas e não precisava se envolver num poço sem fundo que era a minha vida atualmente, mas eu não conseguia repeli-lo. Apenas queria conversar com ele novamente, pois com as palavras e o abraço que ele me deu, pareceu que o câncer não era mais forte que o amor e carinho que uma pessoa pode oferecer. E isso foi mais o suficiente para que eu visse em o garoto com os predicados necessários para que eu me entregasse. Eu estaria correndo um grande risco em me entregar, mas... Nunca é tarde para um amor. Nunca é tarde para sonhar. Mesmo que a morte esteja tão perto quanto eu menos imagino.
Com amor,
Passou uma parte do dia meditando no que havia escrito e pegou o violão tentando arranjar uma melodia que encaixasse com o perfil daquela menina. Ela estava triste, realmente, mas ele não poderia negar que vê-la alegre seria bem incentivador para ele. Então, por que não fazer uma melodia alegre para a música? Ao contrário de tudo, ele achava que um ritmo alegre poderia fazer a menina sorrir para ele e tudo o que ele queria ver o sorriso formar nos lábios dela, principalmente porque a expressão chateada dela o intrigou de forma sobrenatural. E com uma batida no acorde G, ele passou a pegar a melodia da canção conciliando as batidas e dedilhados. As notas se basearam em G, C, D, B, Em e A (respectivamente sol, dó, ré, si, mi menor e lá). Poderia até mesmo finalizar a música se quisesse, mas ele sentia que algo estava faltando... A música estava incompleta e isso não era somente um pretexto para ver a garota novamente.
Assim que anotou as notas em seu caderno, pegou o violão e saiu na direção da porta de casa em rumo ao parque central. O dia estava ensolarado e o vento trazia a brisa necessária para que o clima estivesse bom para sair de casa. Arrumou a alça do violão em seu ombro, ajeitando o corpo e andou com firmeza pela rua, observando tudo e todos com os olhos contentes. Dentro de si a certeza de que a menina estaria lá era realmente forte, mas ao mesmo tempo em que chegava ao parque, sua certeza ruía aos poucos. E se ela não estivesse? Era uma chance em mil de não ela estar ali. Quem sabia sobre a garota do parque? Ele nem sabia o nome dela, nem sabia de onde ela vinha ou se ela morava na mesma cidade ou se estava ali somente de passagem... Pela forma que ela estava triste poderia ser por outros mil e um motivos como, por exemplo, uma mudança? Ah, ela não poderia ter mudado, não. Mas quem sabe ele não dava sorte e a encontrava por lá?
Com o pensamento firme e a posição ainda intacta, ele andou até o parque rumando na direção do lago, onde ele havia se sentado da última vez. O parque estava mais vazio que da outra vez, mas era possível ver algumas crianças brincando por ali, jovens casais namorando e famílias espalhadas em pontos distantes do parque. soltou um suspiro quando seus olhos grudaram em um casal de junto a uma árvore que se beijavam com paixão. Fazia muito tempo que ele não ficava com uma garota e sentia muita falta disso. Na verdade, era bem difícil e irônico para um garoto como ele que tanto saía quando Willian e Thomas estavam na cidade para serem a companhia perfeita em noitadas de festas múltiplas. Mas nem isso ele tinha mais, muito menos vontade de sair sozinho. Nada seria como era antes.
Ergueu os olhos para toda a extensão do parque tentando captar longos cabelos perto ou longe dele. A silhueta da garota do parque ainda pairava em sua mente como se ele a estivesse vendo naquele momento, mas o ruim era que eram apenas lembranças. Com mais um olhar minucioso pelo parque, ele concluiu que a garota não estava ali e isso o entristeceu bastante. Antes que pudesse ter sua alegria abalada, ele decidiu parar de besteira e dedicar-se à sua nova composição. “Eu não posso ficar triste toda vez que eu me vir sozinho no mundo, afinal, o mundo está aí para trilharmos caminhos sozinhos, não é mesmo?”, ele pensava. E com esse pensamento, não tardou a sentar-se defronte ao lago, abrir o caderno em sua mais nova composição e pegar o violão repousando-o em seu colo, dedilhando as cordas para conferir a afinação. Uns ajustes aqui e ali e ele pôde continuar com o seu mais novo passatempo divertido: a música da garota do parque.
Enquanto lia os versos compostos, ele se lembrava do dia em que ela estava ali, triste, sozinha e presa em pensamentos muito provavelmente perturbadores. E lendo o verso “and I was thinking to myself in only, she’d give me a smile”, um pensamento tomou conta de sua mente e ele tremeu. Ela poderia ter terminado com um namorado e estar ali chorando, certo? Mas... Mas quem seria louco de terminar algum namoro com aquela garota extremamente linda? “Qualquer um, afinal de contas, eu não conheço a garota para achar alguma coisa”, mas então ele pensou melhor. “Mas ela é tão linda que não tem como eu sequer pensar em algum garoto são da mente terminando algo com ela”. E seus olhos se passaram pela estrofe seguinte. Ele queria tanto falar com ela, tanto saber o que acontecia, queria tanto entender o porquê de ela estar sofrendo daquele jeito, mas infelizmente sua coragem o fizera fracassar. Algo que ele não podia se dar ao luxo, mas mesmo assim falhou no ato.
Se ele ao menos tivesse a chance de vê-la de novo...
Assim que pegou o violão e passou a tocar a primeira música que veio em sua mente, ele percebeu que ficara muito tempo sem treinar os acordes e as passagens de solos. Talvez tenha ficado tanto tempo sem tocar algo que simplesmente se esqueceu da introdução mais famosa do Guns N’Roses, Knockin’ On Heaven’s Door. Prometendo a si mesmo que não iria ficar tanto tempo sem tocar em seu violão, passou a tirar o solo da música novamente e sua atenção se voltou completamente para a música e, com um mantra de coragem, ele decidiu que iria pegar aquele solo completamente perfeito como tocara em outrora.
Vinte minutos foram o suficiente para que ele conseguisse tocar o solo, mais a música inteira e ainda arriscava em cantar algumas frases que sempre cantava na escola quando lhe era pedido. Seus dedos corriam pelo braço do violão e pressionavam as cordas com avidez enquanto seus dedos direitos dedilhavam as cordas mais embaixo com empolgação. O som lhe causava torpor e ele ousou fechar os olhos enquanto a emoção o guiava naquela melodia em que todo o parque prestava atenção.
Inclusive certa garota de longos cabelos e pele alva como leite.
Assim que finalizou a música, ele pôde respirar com alívio novamente e sentir o sangue nas veias correrem pela emoção da música. Um sorriso sincero brotou em seus lábios pela primeira vez naqueles tempos e então ele abriu os olhos. Enquanto penteava bagunçava os cabelos para trás, seu rosto virou para o lado esquerdo e ele conseguiu vê-la nitidamente por entre os raios solares que banhavam aquela área do parque. Os olhos dela, hoje não tão vermelhos, estavam voltados para ele num misto de interesse e curiosidade. Os cabelos estavam presos em um coque alto, mas vários fios longos desenhavam seu rosto, deixando-o mais arredondado e formado na geometria perfeita que sempre admirava numa garota. Os lábios pequenos estavam mais corados do que da outra vez e as bochechas eram grandes, destacando a imagem bonita do rosto dela.
E ele não podia deixar de escrever aquele momento, certo?
E observando-a por mais alguns segundos, viu a menina virar o rosto com a face corada e olhar para o lago. Em nenhum momento ousou fazer um movimento que fosse fora da visão dela e continuou a olhá-la. Ali ele via o quanto ela era bonita e diferente e o quanto ele, estranhamente, ficava mais alegre por ver que ela não tinha lágrimas nos olhos, mas mesmo assim, ele percebia a face perturbada da menina, quase beirando à expressão de sexta-feira. Logo, ele viu a menina olhá-lo de novo e a sombra de um sorriso moldar os lábios dela. E isso foi o bastante para ele relatar o momento no papel da composição.
Now and then she looks in my direction
(Agora e depois ela olha na minha direção)
Se ela olhou para ele e até mesmo sorriu, por que não se arriscar e falar com ela? Afinal, ele poderia ter feito isso na semana passada, mas hoje era o dia mais ideal... Não é? Ela não estava chorando, estava mais alegre, então... Valia a pena arriscar.
Decidindo falar com a garota nem que fosse a última que tivesse de fazer na vida, arrumou as coisas, encapou o violão, guardou a caneta e colocou o caderno embaixo do braço saindo em seguida na direção da garota. Ele viu os olhos dela se arregalarem por um segundo, encolhendo as pernas, mas permaneceu sentada no mesmo lugar. Ele apenas sorria pequeno na direção dela e dez passos foram o suficiente para chegar de junto à menina. Enquanto ele colocava o violão perto dela e deixava o caderno em cima da capa, ele a via analisá-lo com os olhos grandes e interessados, porém curiosos. Talvez ela estaria se perguntando “o que esse garoto faz aqui?”, mas isso era irrelevante para ele agora. Sentou-se ao lado dela e pôde sentir com nitidez o mesmo perfume que havia sentido a metros de distância na sexta-feira e isso foi o bastante para ele olhar pela primeira vez para a garota e enxergar de perto os traços de seus olhos.
Os olhos dela tinham os cílios grandes e as íris continham um verde oliva refletido na luz solar, mas ainda reverberava o castanho. O nariz era realmente pequeno e fazia uma bela combinação do desenho dos lábios rosados e finos que ela tinha. Sim, ela era uma das garotas mais bonitas que ele já tinha visto na vida e ele não conseguia tirar os olhos dela por um segundo que fosse.
Perdeu a conta de quanto tempo passou olhando-a e viu a menina encará-lo com o olhar interessado mudando o rumo para um desconfiado e essa foi a deixa para que ele falasse com ela pela primeira vez.
- Espero que eu não esteja sendo inconveniente por sentar aqui ao seu lado. – ele sorriu e a menina o observou por um momento até abrir o sorriso que o tirou da realidade por vários momentos. Os lábios faziam contraste com dentes alinhados e brancos, todos em seu tamanho certo, e ele percebeu que ela tinha o sorriso que ele procurava em tantas garotas e nunca achava. Mesmo conhecendo muitas garotas em suas noites de festas e em sua escola, nenhuma se encaixava com o perfil único que aquela menina tinha. Assim como descreveu em sua música, ela tinha todos os quesitos que ele queria.
- Imagina. – a voz calma falou e ele ergueu uma sobrancelha, interessado em escutar a voz dela. – Fique a vontade. – e antes que ele pudesse falar algo para ela, viu os olhos dela direcionarem para o violão e o caderno fechado. – Desde sexta eu te vi tocando... Acho lindo.
- Mesmo? – ele perguntou e virou o corpo mais para ela. – Eu sou apaixonado por música.
- Então somos dois. – ela sorriu. – Embora eu ame violão de paixão, nunca soube tocar. Prefiro entoar a melodia.
- Você canta? – ele se surpreendeu. – Quero dizer, sempre quis achar alguém que cante bem. Cante para mim! – ele exclamou.
Mesmo vendo a face da menina ruborizada e surpresa, ele não pôde deixar de disfarçar seu interesse em ouvi-la cantando. Seria possível ela ser tão encantadora daquela forma e ainda por cima saber cantar? Seria possível ela enfeitiçá-lo somente com seu sorriso e aprisioná-lo com sua voz doce e calma entoando, porventura, a composição que ele fez para ela?
Não.
Ele queria ouvir a voz dela, mas não teria coragem de mostrar sua composição, principalmente quando não havia terminado a música e porque falava dela. Imagine a reação da garota quando ele falasse que havia composto uma canção para ela?
- Eu não acho uma boa ideia. – a menina baixou os olhos. – Eu não estou em dias muito bons para cantar.
- Mas por quê? Em dias ruins nós temos que cantar... Qual o seu nome? – ele não aguentou. Tinha que saber o nome dela.
- . – ela sorriu e ele retribuiu. – E o seu?
- , mas pode me chamar de . é muito formal para mim.
- . – ela repetiu, feliz. – Pode me chamar de . Acho que também é formal demais. – ele assentiu e tornou a insistir na conversa.
- Me conte , porque não canta? Cantar pode ser muito útil quando estamos tristes, sabia?
- Eu concordo, mas... Estou passando por uma fase horrível da minha vida, acho que quando cantamos é necessário estarmos de bem com as coisas e nesse momento tudo o que eu quero é sumir. – o rosto dela se desfez numa expressão triste e mordeu o lábio inferior, nervoso.
- Posso saber o que acontece? Desculpe se eu estou sendo muito indiscreto, mas... – antes de falar, ele pensou umas duas vezes, mas ele era muito sincero no que achava e não poderia deixar de dizer aquilo a ela. – Uma garota linda como você não deveria ficar triste.
A menina deu um sorriso pequeno e baixou a cabeça, claramente envergonhada. Com o lábio inferior preso nos dentes, ela voltou a olhar para o garoto e seu olhar brilhava. se sentiu aquecido por dentro ao vê-la daquela forma.
- Não quero encher ninguém com meus problemas, . Acho que muitas vezes é necessário carregar a cruz calada. Algumas pessoas não merecem sofrer conosco.
- Mas eu quero te ajudar, . – a menina o fitou. – Eu... Eu não te conheço, mas eu queria entender... Não gosto de ver ninguém triste, principalmente quando a pessoa em questão é você, alguém que eu sequer conheço, mas adoraria conhecer.
- Acho que é melhor deixarmos esse assunto de lado. – ela decretou. – Eu realmente estou com problemas, mas... Em breve superarei essa barreira.
- Quando quiser se abrir comigo, não precisa nem pensar, ok? – ele falou e ela sorriu, logo passando os olhos pelo lago.
- Contarei com você. – ela mordeu o lábio e olhou novamente para o menino. – Eu preciso ir. Está um pouco tarde e não posso ficar muito tempo fora de casa.
- Eu queria que ficasse mais um pouco, conversar com você é bom. – a menina sorriu mais alto e ele não pôde deixar de sorrir junto.
- Outro dia quem sabe. – ela piscou o olho e uma chama de acendeu no peito do garoto.
- Isso é um “, vamos nos ver novamente”? – ela sorriu e assentiu.
- Todas as tardes eu costumo vir aqui para pensar. Sua companhia com certeza será mais do que bem-vinda.
- Estarei aqui amanhã esse mesmo horário. – ele falou rapidamente e ela assentiu.
- Nos vemos amanhã, . Foi um prazer conhecê-lo. – e aproximando-se do menino, depositou um beijo molhado na bochecha dele, que fechou os olhos.
Assim que a menina se levantou, ele se pôs de pé e a puxou para um abraço, completamente desprevenido. A menina endureceu o corpo inicialmente, mas depois enlaçou os braços ao redor do corpo dele. O perfume da menina inundou seu olfato e o cheiro dos cabelos dela o fez entorpecer por um momento, mas não apenas pelo prazer de tocá-la, ele queria dar aquele abraço nela. Ele conseguia sentir que ela estava sofrendo com alguma coisa muito diferente que o término de um namoro, mudança de cidade ou algo irrelevante do tipo. Era algo sério que ela não queria contar, mas ele esperaria no tempo dela, afinal, eles iriam se ver novamente.
- Tchau. – ele falou apertando-a mais uma vez em contra seu corpo. – Amanhã estarei aqui te esperando. Quero que fique bem.
Ela o olhou e sorriu, as lágrimas salgadas começando a nascer pelos olhos bonitos dela.
- Eu ficarei.
E com um último aceno, ela se distanciou dele, olhando uma vez para trás enquanto sorria pequeno. a acompanhava com os olhos até que a menina estava invisível pelo fim de tarde as árvores do parque.
Aquele foi um dos melhores momentos que ele passou com uma garota e precisava ser registrado naquela composição.
I’m hoping for a sing of her affection,
(Eu estou esperançoso por um sinal de sua afeição)
But she’s in denial and,
(Mas ela está negando e,)
She’s got some worries today…
(Ela tem algumas preocupações hoje…)
...
Ele iria encontrá-la no dia seguinte com certeza e tentaria de todas as formas descobrir o segredo que ela escondia.
Poderia parecer loucura, mas ele não suportaria que nada acontecesse àquela garota sem que ele fizesse alguma coisa para ajudar.
Ela era a mais nova inspiração de suas canções e faria de tudo para tê-la por perto.
11h00min PM – Segunda-feira
Querido diário,
Hoje o dia amanheceu bem ensolarado e isso foi o suficiente para me animar um pouco. Mas mesmo assim eu não consigo sequer viver a vida em paz. Todo momento a lembrança da doença me atinge e tudo o que eu quero é que isso não passe de um pesadelo. Eu ainda não aceitei a ideia de que posso morrer. Na verdade, o Dr. Moore não disse isso com todas as letras, mas pela expressão dele ao falar da metástase tudo me levava a concluir que eu não estava com o quadro muito bom nos exames. Em vários casos de câncer no pulmão, uma operação poderia ajudar, mas no meu caso Moore não marcou nada, apenas quimioterapias foram agendadas e mesmo assim não aparenta otimismo nos exames. Acho que meu cerco está se fechando aos poucos e tudo o que eu quero é que o câncer simplesmente se cure, simplesmente evapore.
Se fosse por mim, eu entrava dentro do quarto e dormia o tempo inteiro somente para não ter que sentir tanta falta de ar e tanta dor no peito, mas minha mãe nunca iria deixar que eu ficasse em casa, em depressão, deixando a vida passar enquanto o câncer tomava conta de mim. Ela queria que eu saísse de casa, que eu aproveitasse a vida e não ficasse pensando que iria morrer a qualquer momento. Eu gostaria muito de acreditar dessa mesma forma, mas eu também não era cega para não ver que ela chorava pelos cantos escondido e por muitas vezes gritava enquanto tomava banho. E isso me matava. Eu sei que meu tempo está curto, mas mesmo assim minha mãe está esperançosa de que nada no mundo possa ser maior que o poder de Deus para me salvar dessa doença maldita. E eu acreditava nisso. Mas toda vez que eu passava mal e precisava ser levada as pressas para o hospital ou quando sentia muita falta de ar a ponto de quase morrer, eu não conseguia acreditar muito que Deus me salvaria. Mas independente do que viesse acontecer, eu estava apta a aceitar. Se eu fosse morrer, que seja, se eu fosse viver, eu também aceito. Meu destino não está em minhas mãos.
Minha mãe me obrigou a sair. Eu não queria, mas ela me obrigou e eu posso dizer que foi a melhor coisa que fiz hoje. Sair para o parque novamente foi realmente bom e qual a minha surpresa ao chegar lá e encontrar o mesmo menino de sexta-feira com seu violão, tocando alegremente para todos ouvirem. Sim, todos estavam o olhando e eu não pude deixar de fazer o mesmo. Violão é um instrumento que eu sou apaixonada desde pequena e aquele garoto realmente tocava bem e isso era tão bom de se ver. E além de tocar bem, ele ainda cantava... Sempre tive um fraco por garotos cantores e... Bonitos. Mesmo sabendo que não poderia sequer pensar em namoros, eu não podia negar que aquele garoto me interessaria muito se eu pudesse ter um relacionamento com alguém.
Mas nada me deixou mais surpresa quando ele se sentou ao meu lado e passou a conversar comigo. era o nome dele. Ou simplesmente . Ele estava tão interessado em me conhecer melhor, tão interessado em me ouvir cantar, mas... Eu não podia. Como cantar quando eu sei que a fase negra da minha vida só está começando? E o pior... Como deixar saber disso? Ele não precisava saber dos meus problemas e não precisava se envolver num poço sem fundo que era a minha vida atualmente, mas eu não conseguia repeli-lo. Apenas queria conversar com ele novamente, pois com as palavras e o abraço que ele me deu, pareceu que o câncer não era mais forte que o amor e carinho que uma pessoa pode oferecer. E isso foi mais o suficiente para que eu visse em o garoto com os predicados necessários para que eu me entregasse. Eu estaria correndo um grande risco em me entregar, mas... Nunca é tarde para um amor. Nunca é tarde para sonhar. Mesmo que a morte esteja tão perto quanto eu menos imagino.
Com amor,
III. Conhecendo
Duas semanas depois...
Havia duas semanas que não conseguia tirar o sorriso do rosto nem por um decreto. Como poderia tirar o sorriso do rosto e a satisfação se estava se encontrando com todos os dias depois da primeira conversa entre eles? Descobriu o quanto aquela menina era encantadora e sempre contava as horas para vê-la novamente. Ele sabia que não poderia se apaixonar tão facilmente por experiências passadas, mas a diferença era que daquela vez ele queria se apaixonar. Pior seria não querer se apaixonar e acabar se apaixonando mesmo assim, mas o caso era o contrário. era tão maravilhosa e sonhadora da forma como ele sempre quis.
As conversas entre os dois fluíam entre música, filmes e seriados e somente com esses assuntos era fácil o tempo passar rápido quando estavam juntos. O parque central tinha outro ar quando eles se sentavam defronte ao lago e conversavam sobre música. sempre levava seu violão para o parque no intuito de tentar, pelo menos, escutar a voz da menina. Demorara exatos cinco dias para que ela ficasse na bolha escura e triste de desde quando ele a tinha visto pela primeira vez e isso o deixava sem graça. Sim, havia muito pouco tempo que eles começaram a conversar e mesmo assim ele queria desvendar os segredos mais íntimos da menina, conhecê-la no profundo e transpassar todas as mágoas que provavelmente a cercava. Mas a garota era muito reservada e mantinha a descrição quando se tratava de seu verdadeiro eu.
Flashback on
“A tarde estava caindo e o céu já adquiria as nuvens escuras da noite. O parque estava se esvaziando aos poucos e o lago estava tomando a forma negra, fazendo com que as águas perdessem um pouco da cor oliva que ficava perfeita em meio à luz do sol. Depois de horas tocando e cantando músicas para ouvir e até mesmo arriscando ensiná-la algumas notas fáceis no violão, o garoto se sentia realmente perturbado. Ele tinha a maior curiosidade do mundo em conhecer aquela garota, em saber o que ela fazia da vida, de onde ela era, o porquê de tanta tristeza. Era inegável que ela se soltava aos poucos enquanto estava com ele, mas era perceptível que ela ainda continuava triste, assim como na sexta-feira em que ele a viu.
- ? – perguntou e a menina, que estava distraída com o violão, murmurou em sinal que estava ouvindo. – Posso te pedir uma coisa?
- O que? – ela olhou interessada para e ele mordeu o lábio inferior, hesitante. Não queria ser intrometido.
- Eu... Eu gostaria de saber mais sobre você. Estou muito curioso em te conhecer melhor.
Ele conseguiu distinguir a hesitação no olhar da menina principalmente quando ela mordeu o lábio inferior, desviando o olhar para qualquer lugar que não tivesse em seu campo de visão. Ao analisá-la, ele pôde perceber que a menina estava tendo uma luta interna contra ela mesma e independente de quem ela fosse, seria um sacrifício pessoal para ela comentar algo com ele. E, como sempre, ela fugia.
- Acho que está tarde, . – a respiração dela acelerou por um momento. – Preciso ir para casa. Nos vemos amanhã, certo?
- Espera, . – ele segurou a mão dela, impedindo-a de levantar. – Quer que eu te acompanhe em casa? – ela sorriu, negando.
- Não é necessário, . Agradeço a importância, mas não moro muito longe daqui. Apenas alguns quarteirões. – ela se levantou e depositou um beijo na bochecha do menino, que fechou os olhos, os lábios repuxados num sorriso singelo. – Até amanhã.
E depois de um sussurro breve, ela tomou o caminho para a saída do parque, perdendo-se pela quase escuridão da noite.”
Flashback off
poderia se sentir realmente triste por ela não querer se abrir, mas não poderia julgar nada, pois ainda não conhecia a menina. E isso era o que o matava por dentro. Em alguns minutos, ele iria até o parque encontrar-se com novamente, mas faria diferente de todos aqueles dias naquelas duas semanas. Ele estava decidido a tentar conhecê-la da forma que mais queria desde a primeira vez em que colocou os olhos nela.
Naquele dia ele não levaria o violão, pois de acordo com seus planos, iria levar para passear aos arredores do parque e pagaria algo para eles lancharem e tentaria retirar alguma coisa sobre ela. As duas semanas em que passaram juntos foram o suficiente para provar o quanto ele queria ser amigo dela e além de tudo, demonstrar o afeto que passou a sentir. Ela era tão diferente, tão amável, frágil e ele colocou em sua mente que nada poderia acontecer com ela sem que ele soubesse do que se tratava. Queria estar presente na vida de para ser não somente um amigo, mas um companheiro, quem sabe, um namorado.
Antes de conhecer , pensava seriamente em pedir um cachorro para seus pais, mas ultimamente estava passando mais tempo na rua ao lado de que um cachorro não seria uma boa ideia, afinal, quem iria ficar sozinho era o bicho. Enquanto andava pela rua na direção do parque, ele se encorajava em ultrapassar a barreira que a menina sempre colocava diante deles. Era justamente por não a conhecer que ele queria tanto desvendar a pessoa que ela era, queria tanto saber o porquê de tanto mistério, queria entender qual a razão para ela estar sempre triste e solitária, queria ser a pessoa a quem ela poderia compartilhar suas dores, medos e desesperos. Era isso que ele queria e naquele dia estava disposto a tentar.
Não demorou tempo algum para chegar ao parque e caminhou sem delongas até o centro onde ficava o lago e onde passou a ser o ponto de encontro dos dois a duas semanas atrás. Ao se aproximar, ele não a viu, mas decidiu esperar até que ela chegasse. O parque central era enorme e tinha vários pontos de lazer espalhados por ali como um playground para crianças, árvores que traziam sombras aconchegantes para os dias calorentos, o lago com peixes para levar minutos distraídos olhando-os nadar pela corrente da água e bancos em lugares estratégicos e não muito afastados. Alguns continham mesas para as famílias fazerem algum lanche, até mesmo um casal de namorados ou simplesmente para leituras diurnas. sempre preferiu sentar na grama e relaxar a mente enquanto observava o lago e as pessoas caminhando ali perto. Era muito melhor para relaxar e curtir um pouco a parte natureza da cidade.
Em meio aos pensamentos, ele foi surpreendido quando um par de mãos fechou seus olhos, cegando-o por um minuto. Antes que pudesse se perguntar alguma coisa, o perfume invadiu seu olfato e ele sorriu, levando suas mãos as dela também enquanto ria alto e animado. Assim que a menina se pôs em sua frente, ele não pôde deixar de olhá-la de cima abaixo e ver como ela estava bonita aquele dia. O short jeans escuro desenhava perfeitamente os quadris dela, o tênis branco preto contrastava com as pernas brancas, a blusa preta caída com o letreiro dos Beatles estampado defronte aos seios empinados. Os cabelos dela caíam como uma cascata lisa sob o rosto, ombros, busto até as pontas chegarem à cintura. Mas nada era mais bonito que seu rosto, alvo e pálido, porém com o brilho de uma garota realmente interessante. Isso matava .
- Era para você adivinhar, seu chato. Estragou a surpresa. – ela puxou um bico e sorriu, puxando-a para perto dele.
- Tenho certeza que haverá outros dias para você chegar do nada e me surpreender. – ele piscou e a menina sorriu pequeno, baixando os olhos.
- Queria muito que a vida fosse longa para vivermos ela da maneira certa.
franziu o cenho por um momento conseguindo captar a tristeza na voz da menina e o súbito desânimo que tomou suas expressões.
- O que quer dizer com isso? – perguntou, tentando de alguma forma entender o porque daquilo, de repente.
- Experiências, . Apenas. – ela voltou a olhar para ele e sorriu. – Cadê o violão? Achei que iríamos cantar algo hoje.
- Não. – ele falou, animado. – Iremos fazer algo diferente do que sentarmos aqui a tarde toda. Topa lanchar comigo?
A menina arregalou os olhos por um segundo e suas bochechas coraram. quis apertá-la contra seu corpo e colocar a ponta do nariz nos cabelos dela, mas segurou a vontade se contentando em apenas apreciá-la.
- Eu não trouxe dinheiro algum, . Acho que deveríamos deixar para outro dia...
- Hey! – ele a interrompeu, ousando erguer o queixo da menina com a ponta do dedo indicador até que conseguisse ver com nitidez os olhos . – Eu quem estou te convidando. Óbvio que fica por minha conta.
- Eu não gosto assim, ...
- E eu vou gostar menos ainda se você não aceitar. Por favor, me acompanhe em pelo menos um pacote de pipoca?
Ele até considerou a possibilidade de se beliscar ao ver o brilho no olhar da menina, que era sempre triste, se transformar num brilho diferente de tudo o que ele havia visto naqueles anos em que aprendera a prestar atenção nas coisas à sua volta. E isso foi o bastante para ele pegar a mão direita da garota e entrelaçá-la entre seus dedos, ainda com os olhos fixos na menina. Ela mordeu o lábio inferior, revezando o olhar entre os olhos do garoto e as mãos juntas como uma só. Acenou positivamente essa foi a deixa para sorrir e puxá-la para caminhar pelo parque em direção à algum vendedor de pipocas ou até mesmo sorvete.
Em nenhum momento ele desgrudou sua mão da dela e apertava levemente os dedos frágeis dela por entre os seus fortes. O vento batia no rosto de ambos e com isso o cabelo da menina encostava de leve em seu braço fazendo com que ele conseguisse sentir a maciez dos fios . Vez ou outra ele ousava sorrir para a menina e se sentia aquecido enquanto via a menina sorrir também. Por um momento ele viu a garota hesitante naquele primeiro momento de afeto, mas não ousou fazer mais perguntas, apenas aproveitar o máximo que podia. Ao avistar um vendedor de pipocas salgadas e doces, a puxou na direção do homem e enquanto caminhava preparava-se para tentar descobrir mais sobre a garota que mexeu com seu coração, com seus pensamentos.
- Você vai querer qual? Doce ou salgada? – ele perguntou enquanto se posicionavam na frente do vendedor. – Hey, como vai? – ele cumprimentou o homem que sorriu, cumprimentando-o também.
- Acho que doce. – a menina falou e sorriu. – E você?
- O mesmo. Por favor, pode me ver dois pacotes de pipoca doce?
O vendedor assentiu e voltou seu olhar para a menina, que tinha a face corada e fitava o parque ao redor. Ao perceber o olhar do garoto, ela também o retribuiu, mas desviou rapidamente, claramente sem jeito. sorriu pequeno e agradeceu quando o vendedor o entregou os pacotes com a pipoca. Depois de pagar, entregou um dos pacotes para , que agradeceu.
- Quer andar? Temos um parque inteiro para descobrir. – o garoto falou e ela assentiu.
- Ótima ideia.
Mais uma vez agradecendo o vendedor, ambos passaram a caminhar por entre as árvores e viu ali o momento perfeito para conhecer , saber sobre ela, conhecê-la e entender seus conflitos. Tudo poderia começar da maneira mais casual, certo?
- Quantos anos você tem, ? – ele perguntou enquanto jogava uma pipoca dentro da boca.
- Tenho dezenove. E você?
- Sábado farei vinte e um. – a menina olhou para ele com os olhos felizes.
- Sério? Preciso pensar no que te dar de presente. – ele sorriu.
- Se você prometer que irá me ver sábado a tarde já vai ser um grande presente.
- Mas você terá tempo para me ver? – ela perguntou fitando-o com o olhar atravessado. – Afinal, é seu aniversário, acredito que você irá comemorar com seus amigos, seus pais, não? – o garoto colocou mais uma pipoca na boca e fitou a menina, os olhos faiscando.
- Sim, mas eu prezo em manter as pessoas que eu gosto por perto, principalmente no meu aniversário. Quero passar meu aniversário com você. Você aceita?
O sorriso de poderia ser um dos maiores que já havia visto, pois em meio àquela demonstração de afeto, ele conseguia ver o quanto ela ficara feliz pelo convite.
- Mas é claro que sim! Nada me deixaria mais feliz! – ela falou com sinceridade e sorriu, feliz.
- Então está combinado. Sábado estarei aqui no parte ao meio-dia te esperando, pode ser? – ela assentiu. – Vai ser um dos melhores aniversários, tenho certeza.
- Ah, você vai entrar na maioridade. Já vai ter que tomar responsabilidades, algo que você parece não ter. – ela prendeu um riso.
- É mesmo? – ele se fingiu de ofendido e a garota não aguentou, se entregou ao riso. – E por que acha isso? Tenho cara de arteiro ou é só implicância sua?
- Não, você realmente tem cara de quem faz muita bobagem por aí. Você não me engana, Sr. . – ela falou, convencida, e se perguntou como ela reagiria se ele também a desafiasse, mas de outra forma.
- E você tem cara de quem esconde muitos segredos, principalmente quando está comigo. – ele falou e a menina parou de sorrir na hora. Os olhos dela pareceram ficar um pouco mais negros e temeu que todo aquele bom relacionamento deles tivesse ruído com sua insistência em saber mais de . Saber o que ela tanto escondia para sempre ter um traço de tristeza em seu rosto.
- Não é verdade. – ela falou, firme, mas não olhava para o rosto do garoto. – Eu... – ela hesitou, mordendo o lábio inferior, e podia ver a forma como ela apertava o pacote de pipoca já quase vazio. – Eu apenas tenho muitos problemas, . Nada que eu ache que deva te envolver ou te preocupar também.
- Mas eu quero, . Eu quero que você me fale o porquê você é tão triste. Desde o primeiro dia que eu te vi, você carrega uma aparência cansada, parece que está de luto por alguma coisa, sempre tem lágrimas nos olhos, vê a vida de uma forma diferente das outras pessoas... – há essas horas a menina estava ereta e o corpo estava enrijecido, como se ela estivesse realmente desconfortável. – Eu tenho a impressão de que você sofre por alguma coisa... Alguma coisa que está te desgastando, está te consumindo... Tem certeza que não quer me contar o que há?
De repente, ela parou de andar e desviou o olhar, focando sua visão no parque e nas pessoas que ali estavam e somente depois de alguns segundos que ela voltou o olhar à para fitá-lo. Seus olhos tinham a tristeza exposta, tinham um misto de sentimentos confusos que teve que franzir o cenho enquanto tentava entender a garota por quem seu coração estava batendo mais forte aqueles dias.
- Eu... – ela hesitou, mas deu um suspiro forte enquanto mordia o lábio inferior. – Acho que por muitas vezes devemos deixar as coisas ruins de lado e tentar ver algo bom no meio de tudo. Acho que, por mais que eu esteja triste, infeliz e até mesmo preocupada com problemas que não têm solução, eu tenho que ver o lado bom dessas coisas, caso contrário eu simplesmente tenho vontade de morrer. – arregalou os olhos para a menina e abriu a boca para retrucar, mas a menina foi mais ágil. – Há muito tempo eu não vejo o lado bom de nada, . Para falar a verdade, o mundo não é bom, mas podemos enfatizar o lado bom da vida, mesmo que ela seja difícil. Eu fico triste constantemente, sim, mas eu simplesmente esqueço-me de tudo quando venho a esse parque passar o tempo com você. Eu esqueço de todos os problemas que eu enfrento, todo o diagnóstico que eu recebo somente porque com você eu vejo o lado bom das coisas. Eu estou passando a amar a sua companhia e não quero estragar esse conforto que sinto com você por causa de problemas. Não insista em ver o lado ruim da vida, . Insista em ver o lado bom. Você me entende?
O garoto a encarou por longos minutos enquanto assentia, pausadamente. Então realmente tinha problemas, mas com ele ela se esquecia de tudo? Apenas via a vida como algo bom que deve ser aproveitado e o melhor... Ela estava amando ficar na companhia dele?
Isso era mais do que ele precisava ouvir.
- Eu entendo. – ele falou e não pensou duas vezes em colocar uma de suas mãos no rosto dela, acariciando a pele macia com o dedão. – Eu fico muito feliz que você se sinta assim comigo. Eu também quero que você se esqueça de tudo, quero ver você bem, por isso não suporto ver a tristeza no seu olhar.
- Com você eu fico bem. Acredite em mim, tudo piora quando eu volto para casa. Apenas melhora quando estou aqui com você, pensando em tudo menos em sofrimento.
E então ele a abraçou. Seus braços circularam o corpo da menina, trazendo-a mais para perto enquanto a cabeça dela repousava em seu peito forte. Não resistiu e enfiou a ponta do nariz por entre os cabelos macios e cheirosos dela inalando o perfume que emanava dali e se empenhou em guardar na mente. O que mais o irritava era a maldita curiosidade e a repentina sensação de morte que ele sentiu quando ouvia a menina falar tudo aquilo. Será que ela havia perdido alguém que amava muito, sua mãe ou seu pai, por exemplo? Afinal de contas, ela sofria quando chegava em casa, talvez a lembrança de um ente querido a machucasse muito... Mas ele tinha que respeitar os limites impostos. Não poderia simplesmente questioná-la novamente quando a menina havia dito que com ele, ela conseguia enxergar o lado bom das coisas, da forma como ela queria enxergar em meio às calamidades que rodeavam o mundo. E isso foi o bastante para ele querer mais do que tudo carregar no colo, querer mais do que tudo que ela fosse em seu aniversário e querer mais do que tudo mostrar o quanto ele iria amá-la quando ela desse a chance.
- Quero você bem linda no sábado. – ele falou enquanto ainda inspirava o perfume dela. – Você terá o melhor dia da sua vida, eu garanto.
E desfazendo do abraço, ele pôde se aproximar do rosto dela, tão próximo que a garota fechou os olhos. Ele queria tanto beijá-la, queria tanto satisfazer seu desejo de tocar os lábios dela, mas... Ela precisava daquele carinho que só aquele momento poderia proporcionar. Levou os lábios até o canto da boca dela depositando ali um selinho demorado e molhado, no qual a menina recebeu de bom grado.
E isso foi o bastante para ele perceber que conhecer foi uma das melhores coisas que havia acontecido em sua vida até então.
11h00min PM – Quinta-feira
Querido diário,
Hoje eu amanheci com uma falta de ar um pouco forte demais. Foi necessário que eu tomasse inalação por bons trinta minutos até que o ar voltasse aos poucos, demasiado dolorido. A inalação não era uma fonte de escape muito eficiente, mas me ajudava a, pelo menos, não perder o ar ou simplesmente cortar o fio de vida que ainda tinha dentro de mim. Talvez a inalação tenha melhorado minha respiração porque me lembrei de que mais tarde iria encontrar no parque. Sim, ele se tornou uma pessoa realmente essencial nessas duas últimas semanas. Ele se mostrou um amigo tão diferente, tão prestativo que eu não conseguia mais pensar em ficar longe dele. O que me preocupava era o tamanho da consideração que eu estava tendo por . Ele é exatamente o tipo de garoto para quem eu entregaria o meu coração e isso me dá certo medo. Eu não queria me apaixonar por ninguém, não queria que ninguém se apaixonasse por mim, principalmente quando estou ciente de que tudo irá terminar o mais breve o possível. A cada vez que sinto falta de ar, que sinto dores fortes no peito, eu tenho menos esperança de que possa conseguir lutar contra o câncer. A cada dia mais eu sinto que o estágio da doença piora e tudo o que eu queria era passar essa fase sozinha, sem ter ninguém por perto para chorar quando eu partir. Odeio fazer as pessoas sofrerem por minha causa e vejo que toda a minha família está mobilizada a sofrer comigo até o último segundo enquanto que provavelmente sofreria também quando descobrisse que tenho câncer e não tenho escapatória.
O único momento em que a doença não pesava em minha mente era quando eu me encontrava com e no nosso encontro de hoje ele me surpreendeu. Eu não gosto de aceitar nada das pessoas sem ter como devolver o favor, mas eu não poderia fazer uma desfeita com quando ele me chamou para comer com ele. O bom é que poderei retribuir com o presente de aniversário dele no sábado. Nada me deixou mais feliz do que ser convidada para passar o dia com ele em seu aniversário de vinte e um anos. Eu também iria gostar de passar meu aniversário com ele, mas eu não sei nem sei chego aos vinte anos. Aproveitarei o aniversário de como se fosse o meu, talvez o último que eu participaria na vida, pois meus pais já fizeram aniversário e vários amigos meus se afastaram quando descobriram a minha doença. parece ser o único que não se afastaria, mas mesmo assim eu tenho medo de contá-lo sobre. Prefiro passar meus dias com ele pensando em coisas boas sem ter que lembrar que meu pulmão a cada dia é mais enegrecido pela metástase.
Estou empolgada em participar do aniversário de e tenho que pensar em alguma coisa para dá-lo de presente. Talvez mamãe possa me ajudar.
Espero que eu não fique muito ansiosa para sábado... A ideia de não ver amanhã não me agrada, mas tenho que ir ao exame e tentar pelo menos me convencer de que possa ter alguma salvação. E como consolo, lembrarei-me de todo segundo de todo o tempo. Ele é a única lembrança que me traz algo bom.
Com amor, .
Havia duas semanas que não conseguia tirar o sorriso do rosto nem por um decreto. Como poderia tirar o sorriso do rosto e a satisfação se estava se encontrando com todos os dias depois da primeira conversa entre eles? Descobriu o quanto aquela menina era encantadora e sempre contava as horas para vê-la novamente. Ele sabia que não poderia se apaixonar tão facilmente por experiências passadas, mas a diferença era que daquela vez ele queria se apaixonar. Pior seria não querer se apaixonar e acabar se apaixonando mesmo assim, mas o caso era o contrário. era tão maravilhosa e sonhadora da forma como ele sempre quis.
As conversas entre os dois fluíam entre música, filmes e seriados e somente com esses assuntos era fácil o tempo passar rápido quando estavam juntos. O parque central tinha outro ar quando eles se sentavam defronte ao lago e conversavam sobre música. sempre levava seu violão para o parque no intuito de tentar, pelo menos, escutar a voz da menina. Demorara exatos cinco dias para que ela ficasse na bolha escura e triste de desde quando ele a tinha visto pela primeira vez e isso o deixava sem graça. Sim, havia muito pouco tempo que eles começaram a conversar e mesmo assim ele queria desvendar os segredos mais íntimos da menina, conhecê-la no profundo e transpassar todas as mágoas que provavelmente a cercava. Mas a garota era muito reservada e mantinha a descrição quando se tratava de seu verdadeiro eu.
Flashback on
“A tarde estava caindo e o céu já adquiria as nuvens escuras da noite. O parque estava se esvaziando aos poucos e o lago estava tomando a forma negra, fazendo com que as águas perdessem um pouco da cor oliva que ficava perfeita em meio à luz do sol. Depois de horas tocando e cantando músicas para ouvir e até mesmo arriscando ensiná-la algumas notas fáceis no violão, o garoto se sentia realmente perturbado. Ele tinha a maior curiosidade do mundo em conhecer aquela garota, em saber o que ela fazia da vida, de onde ela era, o porquê de tanta tristeza. Era inegável que ela se soltava aos poucos enquanto estava com ele, mas era perceptível que ela ainda continuava triste, assim como na sexta-feira em que ele a viu.
- ? – perguntou e a menina, que estava distraída com o violão, murmurou em sinal que estava ouvindo. – Posso te pedir uma coisa?
- O que? – ela olhou interessada para e ele mordeu o lábio inferior, hesitante. Não queria ser intrometido.
- Eu... Eu gostaria de saber mais sobre você. Estou muito curioso em te conhecer melhor.
Ele conseguiu distinguir a hesitação no olhar da menina principalmente quando ela mordeu o lábio inferior, desviando o olhar para qualquer lugar que não tivesse em seu campo de visão. Ao analisá-la, ele pôde perceber que a menina estava tendo uma luta interna contra ela mesma e independente de quem ela fosse, seria um sacrifício pessoal para ela comentar algo com ele. E, como sempre, ela fugia.
- Acho que está tarde, . – a respiração dela acelerou por um momento. – Preciso ir para casa. Nos vemos amanhã, certo?
- Espera, . – ele segurou a mão dela, impedindo-a de levantar. – Quer que eu te acompanhe em casa? – ela sorriu, negando.
- Não é necessário, . Agradeço a importância, mas não moro muito longe daqui. Apenas alguns quarteirões. – ela se levantou e depositou um beijo na bochecha do menino, que fechou os olhos, os lábios repuxados num sorriso singelo. – Até amanhã.
E depois de um sussurro breve, ela tomou o caminho para a saída do parque, perdendo-se pela quase escuridão da noite.”
Flashback off
poderia se sentir realmente triste por ela não querer se abrir, mas não poderia julgar nada, pois ainda não conhecia a menina. E isso era o que o matava por dentro. Em alguns minutos, ele iria até o parque encontrar-se com novamente, mas faria diferente de todos aqueles dias naquelas duas semanas. Ele estava decidido a tentar conhecê-la da forma que mais queria desde a primeira vez em que colocou os olhos nela.
Naquele dia ele não levaria o violão, pois de acordo com seus planos, iria levar para passear aos arredores do parque e pagaria algo para eles lancharem e tentaria retirar alguma coisa sobre ela. As duas semanas em que passaram juntos foram o suficiente para provar o quanto ele queria ser amigo dela e além de tudo, demonstrar o afeto que passou a sentir. Ela era tão diferente, tão amável, frágil e ele colocou em sua mente que nada poderia acontecer com ela sem que ele soubesse do que se tratava. Queria estar presente na vida de para ser não somente um amigo, mas um companheiro, quem sabe, um namorado.
Antes de conhecer , pensava seriamente em pedir um cachorro para seus pais, mas ultimamente estava passando mais tempo na rua ao lado de que um cachorro não seria uma boa ideia, afinal, quem iria ficar sozinho era o bicho. Enquanto andava pela rua na direção do parque, ele se encorajava em ultrapassar a barreira que a menina sempre colocava diante deles. Era justamente por não a conhecer que ele queria tanto desvendar a pessoa que ela era, queria tanto saber o porquê de tanto mistério, queria entender qual a razão para ela estar sempre triste e solitária, queria ser a pessoa a quem ela poderia compartilhar suas dores, medos e desesperos. Era isso que ele queria e naquele dia estava disposto a tentar.
Não demorou tempo algum para chegar ao parque e caminhou sem delongas até o centro onde ficava o lago e onde passou a ser o ponto de encontro dos dois a duas semanas atrás. Ao se aproximar, ele não a viu, mas decidiu esperar até que ela chegasse. O parque central era enorme e tinha vários pontos de lazer espalhados por ali como um playground para crianças, árvores que traziam sombras aconchegantes para os dias calorentos, o lago com peixes para levar minutos distraídos olhando-os nadar pela corrente da água e bancos em lugares estratégicos e não muito afastados. Alguns continham mesas para as famílias fazerem algum lanche, até mesmo um casal de namorados ou simplesmente para leituras diurnas. sempre preferiu sentar na grama e relaxar a mente enquanto observava o lago e as pessoas caminhando ali perto. Era muito melhor para relaxar e curtir um pouco a parte natureza da cidade.
Em meio aos pensamentos, ele foi surpreendido quando um par de mãos fechou seus olhos, cegando-o por um minuto. Antes que pudesse se perguntar alguma coisa, o perfume invadiu seu olfato e ele sorriu, levando suas mãos as dela também enquanto ria alto e animado. Assim que a menina se pôs em sua frente, ele não pôde deixar de olhá-la de cima abaixo e ver como ela estava bonita aquele dia. O short jeans escuro desenhava perfeitamente os quadris dela, o tênis branco preto contrastava com as pernas brancas, a blusa preta caída com o letreiro dos Beatles estampado defronte aos seios empinados. Os cabelos dela caíam como uma cascata lisa sob o rosto, ombros, busto até as pontas chegarem à cintura. Mas nada era mais bonito que seu rosto, alvo e pálido, porém com o brilho de uma garota realmente interessante. Isso matava .
- Era para você adivinhar, seu chato. Estragou a surpresa. – ela puxou um bico e sorriu, puxando-a para perto dele.
- Tenho certeza que haverá outros dias para você chegar do nada e me surpreender. – ele piscou e a menina sorriu pequeno, baixando os olhos.
- Queria muito que a vida fosse longa para vivermos ela da maneira certa.
franziu o cenho por um momento conseguindo captar a tristeza na voz da menina e o súbito desânimo que tomou suas expressões.
- O que quer dizer com isso? – perguntou, tentando de alguma forma entender o porque daquilo, de repente.
- Experiências, . Apenas. – ela voltou a olhar para ele e sorriu. – Cadê o violão? Achei que iríamos cantar algo hoje.
- Não. – ele falou, animado. – Iremos fazer algo diferente do que sentarmos aqui a tarde toda. Topa lanchar comigo?
A menina arregalou os olhos por um segundo e suas bochechas coraram. quis apertá-la contra seu corpo e colocar a ponta do nariz nos cabelos dela, mas segurou a vontade se contentando em apenas apreciá-la.
- Eu não trouxe dinheiro algum, . Acho que deveríamos deixar para outro dia...
- Hey! – ele a interrompeu, ousando erguer o queixo da menina com a ponta do dedo indicador até que conseguisse ver com nitidez os olhos . – Eu quem estou te convidando. Óbvio que fica por minha conta.
- Eu não gosto assim, ...
- E eu vou gostar menos ainda se você não aceitar. Por favor, me acompanhe em pelo menos um pacote de pipoca?
Ele até considerou a possibilidade de se beliscar ao ver o brilho no olhar da menina, que era sempre triste, se transformar num brilho diferente de tudo o que ele havia visto naqueles anos em que aprendera a prestar atenção nas coisas à sua volta. E isso foi o bastante para ele pegar a mão direita da garota e entrelaçá-la entre seus dedos, ainda com os olhos fixos na menina. Ela mordeu o lábio inferior, revezando o olhar entre os olhos do garoto e as mãos juntas como uma só. Acenou positivamente essa foi a deixa para sorrir e puxá-la para caminhar pelo parque em direção à algum vendedor de pipocas ou até mesmo sorvete.
Em nenhum momento ele desgrudou sua mão da dela e apertava levemente os dedos frágeis dela por entre os seus fortes. O vento batia no rosto de ambos e com isso o cabelo da menina encostava de leve em seu braço fazendo com que ele conseguisse sentir a maciez dos fios . Vez ou outra ele ousava sorrir para a menina e se sentia aquecido enquanto via a menina sorrir também. Por um momento ele viu a garota hesitante naquele primeiro momento de afeto, mas não ousou fazer mais perguntas, apenas aproveitar o máximo que podia. Ao avistar um vendedor de pipocas salgadas e doces, a puxou na direção do homem e enquanto caminhava preparava-se para tentar descobrir mais sobre a garota que mexeu com seu coração, com seus pensamentos.
- Você vai querer qual? Doce ou salgada? – ele perguntou enquanto se posicionavam na frente do vendedor. – Hey, como vai? – ele cumprimentou o homem que sorriu, cumprimentando-o também.
- Acho que doce. – a menina falou e sorriu. – E você?
- O mesmo. Por favor, pode me ver dois pacotes de pipoca doce?
O vendedor assentiu e voltou seu olhar para a menina, que tinha a face corada e fitava o parque ao redor. Ao perceber o olhar do garoto, ela também o retribuiu, mas desviou rapidamente, claramente sem jeito. sorriu pequeno e agradeceu quando o vendedor o entregou os pacotes com a pipoca. Depois de pagar, entregou um dos pacotes para , que agradeceu.
- Quer andar? Temos um parque inteiro para descobrir. – o garoto falou e ela assentiu.
- Ótima ideia.
Mais uma vez agradecendo o vendedor, ambos passaram a caminhar por entre as árvores e viu ali o momento perfeito para conhecer , saber sobre ela, conhecê-la e entender seus conflitos. Tudo poderia começar da maneira mais casual, certo?
- Quantos anos você tem, ? – ele perguntou enquanto jogava uma pipoca dentro da boca.
- Tenho dezenove. E você?
- Sábado farei vinte e um. – a menina olhou para ele com os olhos felizes.
- Sério? Preciso pensar no que te dar de presente. – ele sorriu.
- Se você prometer que irá me ver sábado a tarde já vai ser um grande presente.
- Mas você terá tempo para me ver? – ela perguntou fitando-o com o olhar atravessado. – Afinal, é seu aniversário, acredito que você irá comemorar com seus amigos, seus pais, não? – o garoto colocou mais uma pipoca na boca e fitou a menina, os olhos faiscando.
- Sim, mas eu prezo em manter as pessoas que eu gosto por perto, principalmente no meu aniversário. Quero passar meu aniversário com você. Você aceita?
O sorriso de poderia ser um dos maiores que já havia visto, pois em meio àquela demonstração de afeto, ele conseguia ver o quanto ela ficara feliz pelo convite.
- Mas é claro que sim! Nada me deixaria mais feliz! – ela falou com sinceridade e sorriu, feliz.
- Então está combinado. Sábado estarei aqui no parte ao meio-dia te esperando, pode ser? – ela assentiu. – Vai ser um dos melhores aniversários, tenho certeza.
- Ah, você vai entrar na maioridade. Já vai ter que tomar responsabilidades, algo que você parece não ter. – ela prendeu um riso.
- É mesmo? – ele se fingiu de ofendido e a garota não aguentou, se entregou ao riso. – E por que acha isso? Tenho cara de arteiro ou é só implicância sua?
- Não, você realmente tem cara de quem faz muita bobagem por aí. Você não me engana, Sr. . – ela falou, convencida, e se perguntou como ela reagiria se ele também a desafiasse, mas de outra forma.
- E você tem cara de quem esconde muitos segredos, principalmente quando está comigo. – ele falou e a menina parou de sorrir na hora. Os olhos dela pareceram ficar um pouco mais negros e temeu que todo aquele bom relacionamento deles tivesse ruído com sua insistência em saber mais de . Saber o que ela tanto escondia para sempre ter um traço de tristeza em seu rosto.
- Não é verdade. – ela falou, firme, mas não olhava para o rosto do garoto. – Eu... – ela hesitou, mordendo o lábio inferior, e podia ver a forma como ela apertava o pacote de pipoca já quase vazio. – Eu apenas tenho muitos problemas, . Nada que eu ache que deva te envolver ou te preocupar também.
- Mas eu quero, . Eu quero que você me fale o porquê você é tão triste. Desde o primeiro dia que eu te vi, você carrega uma aparência cansada, parece que está de luto por alguma coisa, sempre tem lágrimas nos olhos, vê a vida de uma forma diferente das outras pessoas... – há essas horas a menina estava ereta e o corpo estava enrijecido, como se ela estivesse realmente desconfortável. – Eu tenho a impressão de que você sofre por alguma coisa... Alguma coisa que está te desgastando, está te consumindo... Tem certeza que não quer me contar o que há?
De repente, ela parou de andar e desviou o olhar, focando sua visão no parque e nas pessoas que ali estavam e somente depois de alguns segundos que ela voltou o olhar à para fitá-lo. Seus olhos tinham a tristeza exposta, tinham um misto de sentimentos confusos que teve que franzir o cenho enquanto tentava entender a garota por quem seu coração estava batendo mais forte aqueles dias.
- Eu... – ela hesitou, mas deu um suspiro forte enquanto mordia o lábio inferior. – Acho que por muitas vezes devemos deixar as coisas ruins de lado e tentar ver algo bom no meio de tudo. Acho que, por mais que eu esteja triste, infeliz e até mesmo preocupada com problemas que não têm solução, eu tenho que ver o lado bom dessas coisas, caso contrário eu simplesmente tenho vontade de morrer. – arregalou os olhos para a menina e abriu a boca para retrucar, mas a menina foi mais ágil. – Há muito tempo eu não vejo o lado bom de nada, . Para falar a verdade, o mundo não é bom, mas podemos enfatizar o lado bom da vida, mesmo que ela seja difícil. Eu fico triste constantemente, sim, mas eu simplesmente esqueço-me de tudo quando venho a esse parque passar o tempo com você. Eu esqueço de todos os problemas que eu enfrento, todo o diagnóstico que eu recebo somente porque com você eu vejo o lado bom das coisas. Eu estou passando a amar a sua companhia e não quero estragar esse conforto que sinto com você por causa de problemas. Não insista em ver o lado ruim da vida, . Insista em ver o lado bom. Você me entende?
O garoto a encarou por longos minutos enquanto assentia, pausadamente. Então realmente tinha problemas, mas com ele ela se esquecia de tudo? Apenas via a vida como algo bom que deve ser aproveitado e o melhor... Ela estava amando ficar na companhia dele?
Isso era mais do que ele precisava ouvir.
- Eu entendo. – ele falou e não pensou duas vezes em colocar uma de suas mãos no rosto dela, acariciando a pele macia com o dedão. – Eu fico muito feliz que você se sinta assim comigo. Eu também quero que você se esqueça de tudo, quero ver você bem, por isso não suporto ver a tristeza no seu olhar.
- Com você eu fico bem. Acredite em mim, tudo piora quando eu volto para casa. Apenas melhora quando estou aqui com você, pensando em tudo menos em sofrimento.
E então ele a abraçou. Seus braços circularam o corpo da menina, trazendo-a mais para perto enquanto a cabeça dela repousava em seu peito forte. Não resistiu e enfiou a ponta do nariz por entre os cabelos macios e cheirosos dela inalando o perfume que emanava dali e se empenhou em guardar na mente. O que mais o irritava era a maldita curiosidade e a repentina sensação de morte que ele sentiu quando ouvia a menina falar tudo aquilo. Será que ela havia perdido alguém que amava muito, sua mãe ou seu pai, por exemplo? Afinal de contas, ela sofria quando chegava em casa, talvez a lembrança de um ente querido a machucasse muito... Mas ele tinha que respeitar os limites impostos. Não poderia simplesmente questioná-la novamente quando a menina havia dito que com ele, ela conseguia enxergar o lado bom das coisas, da forma como ela queria enxergar em meio às calamidades que rodeavam o mundo. E isso foi o bastante para ele querer mais do que tudo carregar no colo, querer mais do que tudo que ela fosse em seu aniversário e querer mais do que tudo mostrar o quanto ele iria amá-la quando ela desse a chance.
- Quero você bem linda no sábado. – ele falou enquanto ainda inspirava o perfume dela. – Você terá o melhor dia da sua vida, eu garanto.
E desfazendo do abraço, ele pôde se aproximar do rosto dela, tão próximo que a garota fechou os olhos. Ele queria tanto beijá-la, queria tanto satisfazer seu desejo de tocar os lábios dela, mas... Ela precisava daquele carinho que só aquele momento poderia proporcionar. Levou os lábios até o canto da boca dela depositando ali um selinho demorado e molhado, no qual a menina recebeu de bom grado.
E isso foi o bastante para ele perceber que conhecer foi uma das melhores coisas que havia acontecido em sua vida até então.
11h00min PM – Quinta-feira
Querido diário,
Hoje eu amanheci com uma falta de ar um pouco forte demais. Foi necessário que eu tomasse inalação por bons trinta minutos até que o ar voltasse aos poucos, demasiado dolorido. A inalação não era uma fonte de escape muito eficiente, mas me ajudava a, pelo menos, não perder o ar ou simplesmente cortar o fio de vida que ainda tinha dentro de mim. Talvez a inalação tenha melhorado minha respiração porque me lembrei de que mais tarde iria encontrar no parque. Sim, ele se tornou uma pessoa realmente essencial nessas duas últimas semanas. Ele se mostrou um amigo tão diferente, tão prestativo que eu não conseguia mais pensar em ficar longe dele. O que me preocupava era o tamanho da consideração que eu estava tendo por . Ele é exatamente o tipo de garoto para quem eu entregaria o meu coração e isso me dá certo medo. Eu não queria me apaixonar por ninguém, não queria que ninguém se apaixonasse por mim, principalmente quando estou ciente de que tudo irá terminar o mais breve o possível. A cada vez que sinto falta de ar, que sinto dores fortes no peito, eu tenho menos esperança de que possa conseguir lutar contra o câncer. A cada dia mais eu sinto que o estágio da doença piora e tudo o que eu queria era passar essa fase sozinha, sem ter ninguém por perto para chorar quando eu partir. Odeio fazer as pessoas sofrerem por minha causa e vejo que toda a minha família está mobilizada a sofrer comigo até o último segundo enquanto que provavelmente sofreria também quando descobrisse que tenho câncer e não tenho escapatória.
O único momento em que a doença não pesava em minha mente era quando eu me encontrava com e no nosso encontro de hoje ele me surpreendeu. Eu não gosto de aceitar nada das pessoas sem ter como devolver o favor, mas eu não poderia fazer uma desfeita com quando ele me chamou para comer com ele. O bom é que poderei retribuir com o presente de aniversário dele no sábado. Nada me deixou mais feliz do que ser convidada para passar o dia com ele em seu aniversário de vinte e um anos. Eu também iria gostar de passar meu aniversário com ele, mas eu não sei nem sei chego aos vinte anos. Aproveitarei o aniversário de como se fosse o meu, talvez o último que eu participaria na vida, pois meus pais já fizeram aniversário e vários amigos meus se afastaram quando descobriram a minha doença. parece ser o único que não se afastaria, mas mesmo assim eu tenho medo de contá-lo sobre. Prefiro passar meus dias com ele pensando em coisas boas sem ter que lembrar que meu pulmão a cada dia é mais enegrecido pela metástase.
Estou empolgada em participar do aniversário de e tenho que pensar em alguma coisa para dá-lo de presente. Talvez mamãe possa me ajudar.
Espero que eu não fique muito ansiosa para sábado... A ideia de não ver amanhã não me agrada, mas tenho que ir ao exame e tentar pelo menos me convencer de que possa ter alguma salvação. E como consolo, lembrarei-me de todo segundo de todo o tempo. Ele é a única lembrança que me traz algo bom.
Com amor, .
IV. Quando o amor fala mais alto
Não havia nada além do que sua família naquele sábado. Seus pais junto de alguns primos e tios vieram comemorar o aniversário de vinte e um anos de pirraçando-o com piadas, mas ao mesmo tempo deixando-o feliz por ver que vários dos familiares, muitas vezes ausentes, se importavam com ele. Naquela manhã foi acordado por seus pais que cantavam “parabéns pra você” e lhe mostravam o presente que o deixou realmente feliz. O melhor presente do mundo. Se lembrava vagamente de ter pedido para sua mãe o instrumento que mais tinha anseio em aprender e sua mãe ficou de encontrar um dos melhores para comprar. Demorou tanto tempo que ele até tinha se esquecido que queria aprender a tocar piano. Foi quando acordou em meio aos parabéns e conseguiu enxergar de relance um grande piano de cauda posto em um canto da sala de estar. Parecia que nada poderia ser mais surreal que aquilo. Ou real, afinal o enorme piano estava ali. Perdeu a conta de quantas vezes abraçou os pais, morrendo de felicidade e também perdeu a conta de quantas vezes se sentou defronte ao piano arriscando dedilhar as poucas notas que sabia. Precisava começar a estudar piano urgente, afinal, tinha um inteiro somente para ele e não suportaria vê-lo deixado de lado sem utilidade.
Não demorou muito tempo e logo os familiares chegaram para o almoço de comemoração. se sentia feliz, pois finalmente estava completando vinte e um anos e mesmo que não estivesse fazendo diferença alguma naquele momento, era a idade que ele mais queria alcançar. Mas o que mais o deixava feliz naquele momento, algo que realmente aguçava alguma alegria dentro de si, era pensar que dentro de poucos minutos estaria ali também. Ora, era quase meio-dia e essa era a hora que a menina estaria ali o esperando para passar o dia com ele. Ele não havia dito que a levaria em sua casa, mas ela não negaria isso a ele, principalmente quando ele era o aniversariante do dia.
Assim que o relógio marcava cinco para o meio-dia, pediu licença aos familiares dizendo que iria buscar alguém. O olhar de seu pai foi bem sugestivo e o de sua mãe tinha um quê de curiosidade, mas em meio a mais piadas de seus tios e primos, ele concluiu que com certeza seria motivo de muito falar ali. A menina era linda, isso era algo inegável, e seus tios não perderiam tempo de elogiá-la ou fazer piadinhas sobre ela e .
Não que não gostasse disso, afinal, as piadas seriam justamente o título da vontade de naquele momento: namorar .
Não demorou muito tempo para chegar ao parque e enxergar a silhueta esbelta de ao longe. Ele sorriu enquanto caminhava na direção dela, aproveitando para analisar a roupa que ela usava. O vestido de tecido leve e branco caía perfeitamente em seu corpo e a fita lilás amarrada à cintura deixava-a ainda mais angelical que nunca. Em seus cabelos uma fita também lilás formava um laço, fazendo com que os cabelos tivessem o movimento mais comportado e em suas mãos segurava uma bolsa branca. O perfil da menina estava sereno, porém a forma como ela batia o pé no chão demonstrava como ela estava nervosa.
“Por que não a surpreender por um minuto?” pensava. Deu uma pequena meia volta e se colocou a chegar por trás das costas de . Tentava ser o mais silencioso possível até que chegou perto da menina, conseguindo sentir o perfume que ela usava. Ousou inspirar por um segundo, até que resolveu manifestar sua presença ali.
- Bu! – falou baixinho perto do ouvido dela. A menina tomou um pequeno susto, mas sorriu quando se virou e viu a imagem de .
- Olha, pensei que havia me esquecido! – ela falou e ele balançou a cabeça, negando.
- Nunca iria me esquecer de você.
Ela sorriu, colocando uma de suas mãos no pescoço do menino, fazendo um carinho bom enquanto puxava de leve alguns fios da nuca dele. Ela mordeu o lábio inferior se aproximando do rosto dele e depositou um beijo em sua bochecha. O garoto fechou os olhos, colocando uma das mãos na cintura da menina trazendo-a mais para perto de seu corpo forte. Ela deixou que sua respiração batesse na pele do pescoço do garoto enquanto sussurrava em seu ouvido:
- Feliz aniversário.
Ele a apertou mais e não resistindo, deu um beijo na pele de seu ombro subindo aos poucos até beijar-lhe o pescoço. No início foram apenas alguns selinhos distribuídos pela pele da garota, mas assim que ela entrelaçou os braços no pescoço do garoto, ele ousou chupar de leve a área perfumada. Sua língua e seus dentes trabalhavam com maestria e ele arriscaria dizer que a garota tinha os olhos fechados, completamente entregue aos seus carinhos íntimos. O perfume e o gosto da pele dela invadiam sua boca e se ele passasse mais algum minuto sugando o pescoço da menina, teria de esperar alguns minutos antes de voltar para casa. Seu primeiro impulso era beijá-la, mas teria muito tempo para fazer isso aquele dia. Primeiro, ele queria curtir o dia ao lado de , aproveitar a companhia que mais abrilhantaria seu dia de mais um ano.
Desgrudou os lábios do pescoço dela e a encarou por um segundo. Ela tinha os olhos fechados e abria-os lentamente enquanto ele ainda apertava sua cintura. Um sorriso se apossou do rosto dela e com a leveza da ponta dos dedos, ela dedilhou os lábios do menino, que fez questão de beijá-los.
- Vamos? – ele segurou a mão dela com a sua e ela assentiu. – Tem muita gente querendo te conhecer.
- Quem? – ela perguntou interessada, mas ao mesmo tempo assustada. – Pensei que íamos passar seu aniversário sozinhos...
- E íamos. Mas meus familiares resolveram fazer surpresa. Todos estão ansiosos para te conhecer.
- Não acredito que você falou de mim. – ela deu um tapinha no ombro dele, que sorriu alto. – , é sério. Com que cara eu vou entrar na sua casa? Seus pais, sua família?
- Com a mesma cara que você tem. Só que com a diferença de que minha família vai te conhecer como minha. Apenas minha.
E novamente o brilho voltara nos olhos de e isso foi o suficiente para que ele segurasse a mão dela e fosse em direção à sua casa. Dentro de seu peito ele tinha a certeza de que estava sentindo algo realmente forte por e queria continuar com aquele sentimento, pois era algo muito bom, inexplicavelmente bom e ainda tinha certeza de que aquele dia seria um dos melhores de sua vida.
Em assuntos diversos entre música e aniversários passados, eles chegaram até a casa de e o garoto não se surpreendeu ao encontrar seu tio, Richard , esperando na porta de casa. Richard era o tio que mais gostava porque ele era o mais divertido de todos e vê-lo ali só comprovava o fato de o homem ser extremamente curioso quando se tratava dos relacionamentos de .
- Vai me dizer que essa é a sua garota? – o homem falou, caminhando na direção do casal e apertou a mão de , mostrando-se um tanto quanto hesitante pela reação do tio do garoto. – Mas que menina mais linda, onde você encontrou? Na minha época não tinha garotas tão lindas assim.
- Deixa a tia Rose descobrir que você anda falando essas coisas. Ela te enxota da vida dela. – falou tirando um riso alto do tio e um riso baixo de . – , este é o meu tio, Richard.
- O melhor tio, diga-se de passagem. – 0 homem interrompeu.
- Corrigindo. , este é o melhor tio do mundo, Richard . E tio, esta é a melhor garota do mundo, .
- Vejo que é sim. – o homem falou enquanto pegava a mão da garota e dava um beijo no dorso.
- Eu que agradeço a gentileza, Sr. .
- Nah, Sr. é meu irmão. – “meu pai”, completou. – Pode me chamar de Ricky.
- Ricky. – falou, sorrindo, fazendo continência.
Não demorou muito para a garota entrar na grande casa de e se enturmar com seus familiares, incluindo a mãe de que não cansava com os elogios à garota dizendo que ela era a mais bonita de todas as garotas que saíra um dia. O garoto ficava encafifado com tantas histórias que seus familiares contavam sobre ele para a garota, mas ao ver a expressão de felicidade nos olhos dela, o modo como ela se sentia a vontade, tudo não passou de alegria para ele.
Estava tão distraído em sua bolha particular quando sua mãe anunciou que era a hora de cantar os parabéns. sempre ficava sem graça quando todos se voltavam para ele na intenção de parabenizá-lo e ao ver ao lado de sua família, feliz, foi o bastante para ele quase explodir. Não demorou muito até que cortaram o enorme bolo de chocolate e começassem a distribuir os presentes.
- Eu poderia lhe dar várias camisinhas de presente, mas resolvi que um afinador importado para o seu violão seria o bastante. – Ricky falou e só não achou ruim porque o tio realmente havia adivinhado. Ele precisava de um afinador urgente, pois sua audição estava começando a falhar na hora de arrumar as cordas do violão.
- Acho que foi uma boa, Richard. – disse o outro tio de , que conheceu por Adam. – Mas nada pode superar o melhor videogame que eu já vi: o GTA! Somos bons parceiros em games hein, ?
- Faz tempo que não dou um grande xeque-mate em você, cara. – falou e todos sorriram. – Iremos nos enfrentar em breve.
E os presentes não pararam por aí. Os primos e tias também trouxeram várias coisas para o garoto, sendo muitas delas roupas, algo que ele não precisava, mas aceitou de bom grado. Demorou vários minutos até que seus olhos se voltassem para a garota sem graça que estava sentada no sofá da sala de estar enquanto era minuciosamente observada por seus primos adolescentes maldosos. Assim que ele se sentou ao lado dela, trazendo-a para mais junto dele, a voz dela era a única coisa que ele conseguia ouvir por sobre todos que falavam.
- Acho que agora é a minha vez de entregar o seu presente. – ela disse e ele franziu o cenho.
- Imagina. Você não deveria ter se preocupado com isso. Sua presença já é o suficiente. – ele disse com firmeza, mas a menina negou enquanto abria a bolsa e tirava de lá um objeto retangular embrulhado em um papel de presente azul escuro.
- Eu não sabia ao certo o que lhe dar, mas como nós dois temos alguns gostos em comum, eu optei pelo mais óbvio. – ela sorriu entregando o objeto para ele. – Eu vi esse livro e imediatamente me lembrei de você. Acho que nada te definiria melhor do que o livro Música: O Acorde Essencial Para Ser Feliz* e um caderno especial de partituras e cifras para as vezes que você precisar compor algo ou não esquecer nenhuma nota.
O garoto abriu o embrulho com cuidado enquanto sentia sua mão formigar e seu coração bater numa velocidade alucinante. O livro tinha a imagem de mãos dedilhando um piano em preto e branco e os dizeres em fontes scripts traziam uma essência diferente ao livro. Assim como a música trazia a essência perfeita para a vida de uma pessoa, o livro parecia conter a teoria daquela filosofia, a teoria de como a música pode conquistar gerações e gerações de pessoas apenas com ressoar de acordes, tons e melodias. E isso era tudo o que ele queria para conseguir encontrar a razão de fazer a vida mais alegre. Antes ele não tinha ninguém ao seu lado, agora ele tinha a música e . Duas coisas completamente insubstituíveis. O caderno de partituras e cifras era dourado e preto, as folhas tão brancas que chegavam a brilhar e na metade do caderno havia uma caneta dourada que provavelmente fazia parte do kit.
Ao terminar de analisar o presente melhor que o afinador, videogame, roupas e tão bom quanto o piano que havia ganhado, seus olhos se voltaram para a menina e ele pôde ver que um sorriso nervoso moldava o rosto dela.
- Hm... Você gostou? – ela perguntou, incerta, e ele não se importou com mais nada a não ser a vontade de beijá-la.
Suas mãos ganharam vida própria e logo uma delas estavam na cintura da menina, apertando-a com vontade puxando-a mais para perto dele e a outra estava embrenhada nos cabelos lisos da garota, tecnicamente na nuca e foram levados apenas alguns segundo até que ele estava frente a frente com ela, suas respirações se confundindo e o perfume de ambos se misturando trazendo torpor que sempre amavam sentir. Olhando todos os traços do rosto dela, marcando a aparência bonita da menina em sua mente, tratou de fechar os olhos lentamente enquanto a distância era vencida por um selinho pequeno e os lábios se encaixavam um no outro com perfeição. Assim que sentiu os lábios macios dela moldarem aos seus, ele apertou um pouco o selinho conseguindo sentir ainda mais a maciez que vinha daquela área do corpo dela e isso foi o bastante para ele tocar os lábios dela com sua língua, pincelando a entrada que era cedida aos poucos pela menina, que não tardou a fechar os olhos.
Suas mãos na nuca dela tomaram um pouco mais de força trazendo o rosto dela para mais perto do seu, consequentemente fazendo o encontro de suas línguas serem ainda mais rápido. Logo, ambos os lábios se movimentavam um sobre o outro com avidez e as línguas dançavam entrelaçadas por entre a junção das bocas que tinham o encaixe perfeito para se conhecerem pelo íntimo que o beijo trazia. As cabeças moviam-se uma de encontro a outra em uma velocidade que aos poucos era aumentada e tornava tudo ainda mais intenso. O beijo se iniciou com apenas raspadas entre as línguas e os lábios úmidos deslizando um sobre o outro, mas aos poucos o movimento alternava para algumas chupadas nos lábios, língua e até mesmo ao redor dos lábios quando o beijo era quebrado, mas outra vez reiniciado.
E ficaram ali por vários minutos se beijando, provando o quanto o gosto da primeira vez era um dos melhores que haviam provado em toda aquela vida de vinte e um anos recém-completados e dezenove anos que, provavelmente, nunca chegariam aos vinte.
11h00min – Sábado
Querido diário,
A noite foi difícil. Acordei várias e várias vezes com falta de ar e nem a inalação estava ajudando mais. Minha mãe quase ligou para o Dr. Moore, pois achávamos que esse seria o fim de tudo. Foi o tempo em que meu peito doeu tanto que eu achei que o fio de vida que me segurava aqui nesse mundo ia se romper, mas inexplicavelmente a falta de ar pareceu dar uma trégua me dando pelo menos a chance de tentar dormir do final da madrugada até às oito horas da manhã. Toda vez que tenho essas crises acordo com dores fortes pelo corpo inteiro, inclusive no peito. Mamãe não queria que eu fosse ao aniversário de por medo que eu passasse mal, mas eu não poderia fazer essa desfeita com ele principalmente quando eu também estava querendo passar o dia com ele. Nada iria me fazer mais feliz e esquecer um pouco da doença e até mesmo me livrar do peso negro que se tornou a minha casa depois que comecei a fazer o tratamento.
Depois de muito insistir ela me permitiu apenas me assegurando de que eu chegasse antes das cinco da tarde, caso contrário ela ficaria realmente preocupada. Eu tinha escolhido usar o vestido que eu mais gostava junto aos acessórios que eu mais prezava entre todos os que eu tinha. Sim, o vestido branco tinha um significado enorme para mim ainda mais depois de ter descoberto o câncer. E eu também queria estar bonita para . No fundo da minha mente, eu sabia que estava expondo-a a uma tristeza provavelmente muito grande, mas eu não poderia deixar de tentar ser feliz enquanto o mundo estava perdendo todo o significado para mim. As cores vivas voltaram com toda a força apagando a noite difícil da minha mente quando eu o vi. Ele estava tão bonito. Tão mais bonito do que eu havia visto em todas aquelas vezes. Os beijos depositados em meu pescoço me fez ter a certeza que sabia o que fazer com os lábios, me mostrou o quanto eu estive entregue à simples carícias e o quanto aquele garoto estava balançando o meu coração. Eu não tinha como lutar contra esse sentimento que estava nascendo e a cada dia se tornava mais forte.
A minha surpresa foi chegar até a casa de e ver o quanto a família dele me esperava. O que será que ele havia falado de mim? Me deixou ainda mais feliz ver que todos me trataram tão bem quanto jamais fui tratada, me enturmaram e eu me senti como se realmente fosse da família, como se realmente tivesse um lugar no meio daquelas pessoas. Cantar parabéns para foi emocionante, pois na hora eu me senti feliz por ele, mas logo veio na minha mente que provavelmente eu não teria outra chance de estar na companhia de pessoas em uma festa tão solene como aniversários. Se essa fosse a minha última festa, eu morreria feliz, pois passá-la com foi a melhor coisa.
A hora dos presentes também foi um dos momentos que eu mais esperei. Eu havia ido ontem à biblioteca central procurar um livro para me distrair e em seguida comprar algo para e foi lá que encontrei o livro que provavelmente ele gostaria muito de obter. Depois de muito folhear o livro, percebi que nada poderia ser melhor do que aquele presente junto a um caderno para que ele anotasse suas composições, já que ele havia mencionado que sabia compor. O que eu não imaginava era que ao entregar aquele presente, eu iria receber outro em troca: O beijo que eu tanto esperei. Sim, me beijou e foi o melhor beijo que eu experimentei em toda a minha vida. Tudo na medida certa, do modo certo. Exatamente do jeito que eu gostava, sem tirar nem pôr. Sim, eu tinha conhecido a paixão quando conheci . E não posso negar que o que estou sentindo por ele é mais forte do que qualquer outra coisa.
Se eu tenho pouco tempo de vida, o que em resta é aproveitá-lo da melhor forma possível. E era isso que eu ia fazer. Iria me entregar à enquanto ainda não era tarde demais.
Com amor, .
*Música: O Acorde Essencial Para Ser Feliz: é imprescindível avisar que esse livro NÃO EXISTE. Foi criação da autora para a história.
Não demorou muito tempo e logo os familiares chegaram para o almoço de comemoração. se sentia feliz, pois finalmente estava completando vinte e um anos e mesmo que não estivesse fazendo diferença alguma naquele momento, era a idade que ele mais queria alcançar. Mas o que mais o deixava feliz naquele momento, algo que realmente aguçava alguma alegria dentro de si, era pensar que dentro de poucos minutos estaria ali também. Ora, era quase meio-dia e essa era a hora que a menina estaria ali o esperando para passar o dia com ele. Ele não havia dito que a levaria em sua casa, mas ela não negaria isso a ele, principalmente quando ele era o aniversariante do dia.
Assim que o relógio marcava cinco para o meio-dia, pediu licença aos familiares dizendo que iria buscar alguém. O olhar de seu pai foi bem sugestivo e o de sua mãe tinha um quê de curiosidade, mas em meio a mais piadas de seus tios e primos, ele concluiu que com certeza seria motivo de muito falar ali. A menina era linda, isso era algo inegável, e seus tios não perderiam tempo de elogiá-la ou fazer piadinhas sobre ela e .
Não que não gostasse disso, afinal, as piadas seriam justamente o título da vontade de naquele momento: namorar .
Não demorou muito tempo para chegar ao parque e enxergar a silhueta esbelta de ao longe. Ele sorriu enquanto caminhava na direção dela, aproveitando para analisar a roupa que ela usava. O vestido de tecido leve e branco caía perfeitamente em seu corpo e a fita lilás amarrada à cintura deixava-a ainda mais angelical que nunca. Em seus cabelos uma fita também lilás formava um laço, fazendo com que os cabelos tivessem o movimento mais comportado e em suas mãos segurava uma bolsa branca. O perfil da menina estava sereno, porém a forma como ela batia o pé no chão demonstrava como ela estava nervosa.
“Por que não a surpreender por um minuto?” pensava. Deu uma pequena meia volta e se colocou a chegar por trás das costas de . Tentava ser o mais silencioso possível até que chegou perto da menina, conseguindo sentir o perfume que ela usava. Ousou inspirar por um segundo, até que resolveu manifestar sua presença ali.
- Bu! – falou baixinho perto do ouvido dela. A menina tomou um pequeno susto, mas sorriu quando se virou e viu a imagem de .
- Olha, pensei que havia me esquecido! – ela falou e ele balançou a cabeça, negando.
- Nunca iria me esquecer de você.
Ela sorriu, colocando uma de suas mãos no pescoço do menino, fazendo um carinho bom enquanto puxava de leve alguns fios da nuca dele. Ela mordeu o lábio inferior se aproximando do rosto dele e depositou um beijo em sua bochecha. O garoto fechou os olhos, colocando uma das mãos na cintura da menina trazendo-a mais para perto de seu corpo forte. Ela deixou que sua respiração batesse na pele do pescoço do garoto enquanto sussurrava em seu ouvido:
- Feliz aniversário.
Ele a apertou mais e não resistindo, deu um beijo na pele de seu ombro subindo aos poucos até beijar-lhe o pescoço. No início foram apenas alguns selinhos distribuídos pela pele da garota, mas assim que ela entrelaçou os braços no pescoço do garoto, ele ousou chupar de leve a área perfumada. Sua língua e seus dentes trabalhavam com maestria e ele arriscaria dizer que a garota tinha os olhos fechados, completamente entregue aos seus carinhos íntimos. O perfume e o gosto da pele dela invadiam sua boca e se ele passasse mais algum minuto sugando o pescoço da menina, teria de esperar alguns minutos antes de voltar para casa. Seu primeiro impulso era beijá-la, mas teria muito tempo para fazer isso aquele dia. Primeiro, ele queria curtir o dia ao lado de , aproveitar a companhia que mais abrilhantaria seu dia de mais um ano.
Desgrudou os lábios do pescoço dela e a encarou por um segundo. Ela tinha os olhos fechados e abria-os lentamente enquanto ele ainda apertava sua cintura. Um sorriso se apossou do rosto dela e com a leveza da ponta dos dedos, ela dedilhou os lábios do menino, que fez questão de beijá-los.
- Vamos? – ele segurou a mão dela com a sua e ela assentiu. – Tem muita gente querendo te conhecer.
- Quem? – ela perguntou interessada, mas ao mesmo tempo assustada. – Pensei que íamos passar seu aniversário sozinhos...
- E íamos. Mas meus familiares resolveram fazer surpresa. Todos estão ansiosos para te conhecer.
- Não acredito que você falou de mim. – ela deu um tapinha no ombro dele, que sorriu alto. – , é sério. Com que cara eu vou entrar na sua casa? Seus pais, sua família?
- Com a mesma cara que você tem. Só que com a diferença de que minha família vai te conhecer como minha. Apenas minha.
E novamente o brilho voltara nos olhos de e isso foi o suficiente para que ele segurasse a mão dela e fosse em direção à sua casa. Dentro de seu peito ele tinha a certeza de que estava sentindo algo realmente forte por e queria continuar com aquele sentimento, pois era algo muito bom, inexplicavelmente bom e ainda tinha certeza de que aquele dia seria um dos melhores de sua vida.
Em assuntos diversos entre música e aniversários passados, eles chegaram até a casa de e o garoto não se surpreendeu ao encontrar seu tio, Richard , esperando na porta de casa. Richard era o tio que mais gostava porque ele era o mais divertido de todos e vê-lo ali só comprovava o fato de o homem ser extremamente curioso quando se tratava dos relacionamentos de .
- Vai me dizer que essa é a sua garota? – o homem falou, caminhando na direção do casal e apertou a mão de , mostrando-se um tanto quanto hesitante pela reação do tio do garoto. – Mas que menina mais linda, onde você encontrou? Na minha época não tinha garotas tão lindas assim.
- Deixa a tia Rose descobrir que você anda falando essas coisas. Ela te enxota da vida dela. – falou tirando um riso alto do tio e um riso baixo de . – , este é o meu tio, Richard.
- O melhor tio, diga-se de passagem. – 0 homem interrompeu.
- Corrigindo. , este é o melhor tio do mundo, Richard . E tio, esta é a melhor garota do mundo, .
- Vejo que é sim. – o homem falou enquanto pegava a mão da garota e dava um beijo no dorso.
- Eu que agradeço a gentileza, Sr. .
- Nah, Sr. é meu irmão. – “meu pai”, completou. – Pode me chamar de Ricky.
- Ricky. – falou, sorrindo, fazendo continência.
Não demorou muito para a garota entrar na grande casa de e se enturmar com seus familiares, incluindo a mãe de que não cansava com os elogios à garota dizendo que ela era a mais bonita de todas as garotas que saíra um dia. O garoto ficava encafifado com tantas histórias que seus familiares contavam sobre ele para a garota, mas ao ver a expressão de felicidade nos olhos dela, o modo como ela se sentia a vontade, tudo não passou de alegria para ele.
Estava tão distraído em sua bolha particular quando sua mãe anunciou que era a hora de cantar os parabéns. sempre ficava sem graça quando todos se voltavam para ele na intenção de parabenizá-lo e ao ver ao lado de sua família, feliz, foi o bastante para ele quase explodir. Não demorou muito até que cortaram o enorme bolo de chocolate e começassem a distribuir os presentes.
- Eu poderia lhe dar várias camisinhas de presente, mas resolvi que um afinador importado para o seu violão seria o bastante. – Ricky falou e só não achou ruim porque o tio realmente havia adivinhado. Ele precisava de um afinador urgente, pois sua audição estava começando a falhar na hora de arrumar as cordas do violão.
- Acho que foi uma boa, Richard. – disse o outro tio de , que conheceu por Adam. – Mas nada pode superar o melhor videogame que eu já vi: o GTA! Somos bons parceiros em games hein, ?
- Faz tempo que não dou um grande xeque-mate em você, cara. – falou e todos sorriram. – Iremos nos enfrentar em breve.
E os presentes não pararam por aí. Os primos e tias também trouxeram várias coisas para o garoto, sendo muitas delas roupas, algo que ele não precisava, mas aceitou de bom grado. Demorou vários minutos até que seus olhos se voltassem para a garota sem graça que estava sentada no sofá da sala de estar enquanto era minuciosamente observada por seus primos adolescentes maldosos. Assim que ele se sentou ao lado dela, trazendo-a para mais junto dele, a voz dela era a única coisa que ele conseguia ouvir por sobre todos que falavam.
- Acho que agora é a minha vez de entregar o seu presente. – ela disse e ele franziu o cenho.
- Imagina. Você não deveria ter se preocupado com isso. Sua presença já é o suficiente. – ele disse com firmeza, mas a menina negou enquanto abria a bolsa e tirava de lá um objeto retangular embrulhado em um papel de presente azul escuro.
- Eu não sabia ao certo o que lhe dar, mas como nós dois temos alguns gostos em comum, eu optei pelo mais óbvio. – ela sorriu entregando o objeto para ele. – Eu vi esse livro e imediatamente me lembrei de você. Acho que nada te definiria melhor do que o livro Música: O Acorde Essencial Para Ser Feliz* e um caderno especial de partituras e cifras para as vezes que você precisar compor algo ou não esquecer nenhuma nota.
O garoto abriu o embrulho com cuidado enquanto sentia sua mão formigar e seu coração bater numa velocidade alucinante. O livro tinha a imagem de mãos dedilhando um piano em preto e branco e os dizeres em fontes scripts traziam uma essência diferente ao livro. Assim como a música trazia a essência perfeita para a vida de uma pessoa, o livro parecia conter a teoria daquela filosofia, a teoria de como a música pode conquistar gerações e gerações de pessoas apenas com ressoar de acordes, tons e melodias. E isso era tudo o que ele queria para conseguir encontrar a razão de fazer a vida mais alegre. Antes ele não tinha ninguém ao seu lado, agora ele tinha a música e . Duas coisas completamente insubstituíveis. O caderno de partituras e cifras era dourado e preto, as folhas tão brancas que chegavam a brilhar e na metade do caderno havia uma caneta dourada que provavelmente fazia parte do kit.
Ao terminar de analisar o presente melhor que o afinador, videogame, roupas e tão bom quanto o piano que havia ganhado, seus olhos se voltaram para a menina e ele pôde ver que um sorriso nervoso moldava o rosto dela.
- Hm... Você gostou? – ela perguntou, incerta, e ele não se importou com mais nada a não ser a vontade de beijá-la.
Suas mãos ganharam vida própria e logo uma delas estavam na cintura da menina, apertando-a com vontade puxando-a mais para perto dele e a outra estava embrenhada nos cabelos lisos da garota, tecnicamente na nuca e foram levados apenas alguns segundo até que ele estava frente a frente com ela, suas respirações se confundindo e o perfume de ambos se misturando trazendo torpor que sempre amavam sentir. Olhando todos os traços do rosto dela, marcando a aparência bonita da menina em sua mente, tratou de fechar os olhos lentamente enquanto a distância era vencida por um selinho pequeno e os lábios se encaixavam um no outro com perfeição. Assim que sentiu os lábios macios dela moldarem aos seus, ele apertou um pouco o selinho conseguindo sentir ainda mais a maciez que vinha daquela área do corpo dela e isso foi o bastante para ele tocar os lábios dela com sua língua, pincelando a entrada que era cedida aos poucos pela menina, que não tardou a fechar os olhos.
Suas mãos na nuca dela tomaram um pouco mais de força trazendo o rosto dela para mais perto do seu, consequentemente fazendo o encontro de suas línguas serem ainda mais rápido. Logo, ambos os lábios se movimentavam um sobre o outro com avidez e as línguas dançavam entrelaçadas por entre a junção das bocas que tinham o encaixe perfeito para se conhecerem pelo íntimo que o beijo trazia. As cabeças moviam-se uma de encontro a outra em uma velocidade que aos poucos era aumentada e tornava tudo ainda mais intenso. O beijo se iniciou com apenas raspadas entre as línguas e os lábios úmidos deslizando um sobre o outro, mas aos poucos o movimento alternava para algumas chupadas nos lábios, língua e até mesmo ao redor dos lábios quando o beijo era quebrado, mas outra vez reiniciado.
E ficaram ali por vários minutos se beijando, provando o quanto o gosto da primeira vez era um dos melhores que haviam provado em toda aquela vida de vinte e um anos recém-completados e dezenove anos que, provavelmente, nunca chegariam aos vinte.
11h00min – Sábado
Querido diário,
A noite foi difícil. Acordei várias e várias vezes com falta de ar e nem a inalação estava ajudando mais. Minha mãe quase ligou para o Dr. Moore, pois achávamos que esse seria o fim de tudo. Foi o tempo em que meu peito doeu tanto que eu achei que o fio de vida que me segurava aqui nesse mundo ia se romper, mas inexplicavelmente a falta de ar pareceu dar uma trégua me dando pelo menos a chance de tentar dormir do final da madrugada até às oito horas da manhã. Toda vez que tenho essas crises acordo com dores fortes pelo corpo inteiro, inclusive no peito. Mamãe não queria que eu fosse ao aniversário de por medo que eu passasse mal, mas eu não poderia fazer essa desfeita com ele principalmente quando eu também estava querendo passar o dia com ele. Nada iria me fazer mais feliz e esquecer um pouco da doença e até mesmo me livrar do peso negro que se tornou a minha casa depois que comecei a fazer o tratamento.
Depois de muito insistir ela me permitiu apenas me assegurando de que eu chegasse antes das cinco da tarde, caso contrário ela ficaria realmente preocupada. Eu tinha escolhido usar o vestido que eu mais gostava junto aos acessórios que eu mais prezava entre todos os que eu tinha. Sim, o vestido branco tinha um significado enorme para mim ainda mais depois de ter descoberto o câncer. E eu também queria estar bonita para . No fundo da minha mente, eu sabia que estava expondo-a a uma tristeza provavelmente muito grande, mas eu não poderia deixar de tentar ser feliz enquanto o mundo estava perdendo todo o significado para mim. As cores vivas voltaram com toda a força apagando a noite difícil da minha mente quando eu o vi. Ele estava tão bonito. Tão mais bonito do que eu havia visto em todas aquelas vezes. Os beijos depositados em meu pescoço me fez ter a certeza que sabia o que fazer com os lábios, me mostrou o quanto eu estive entregue à simples carícias e o quanto aquele garoto estava balançando o meu coração. Eu não tinha como lutar contra esse sentimento que estava nascendo e a cada dia se tornava mais forte.
A minha surpresa foi chegar até a casa de e ver o quanto a família dele me esperava. O que será que ele havia falado de mim? Me deixou ainda mais feliz ver que todos me trataram tão bem quanto jamais fui tratada, me enturmaram e eu me senti como se realmente fosse da família, como se realmente tivesse um lugar no meio daquelas pessoas. Cantar parabéns para foi emocionante, pois na hora eu me senti feliz por ele, mas logo veio na minha mente que provavelmente eu não teria outra chance de estar na companhia de pessoas em uma festa tão solene como aniversários. Se essa fosse a minha última festa, eu morreria feliz, pois passá-la com foi a melhor coisa.
A hora dos presentes também foi um dos momentos que eu mais esperei. Eu havia ido ontem à biblioteca central procurar um livro para me distrair e em seguida comprar algo para e foi lá que encontrei o livro que provavelmente ele gostaria muito de obter. Depois de muito folhear o livro, percebi que nada poderia ser melhor do que aquele presente junto a um caderno para que ele anotasse suas composições, já que ele havia mencionado que sabia compor. O que eu não imaginava era que ao entregar aquele presente, eu iria receber outro em troca: O beijo que eu tanto esperei. Sim, me beijou e foi o melhor beijo que eu experimentei em toda a minha vida. Tudo na medida certa, do modo certo. Exatamente do jeito que eu gostava, sem tirar nem pôr. Sim, eu tinha conhecido a paixão quando conheci . E não posso negar que o que estou sentindo por ele é mais forte do que qualquer outra coisa.
Se eu tenho pouco tempo de vida, o que em resta é aproveitá-lo da melhor forma possível. E era isso que eu ia fazer. Iria me entregar à enquanto ainda não era tarde demais.
Com amor, .
*Música: O Acorde Essencial Para Ser Feliz: é imprescindível avisar que esse livro NÃO EXISTE. Foi criação da autora para a história.
V. O pedido que transforma um sentimento em verdade: Consumação do início de um amor
Um mês depois...
Se amar fosse crime, talvez ele vivesse para sempre fora da lei. *
Seu sentimento em relação à havia aumentado gradativamente depois da primeira vez que os dois se beijaram. Fazia exatamente um mês que ambos se encontravam quase sempre e mantinham um relacionamento aproximado ao de um casal de namorados. Sempre que se viam, sentavam defronte ao lago, entre as pernas de enquanto o garoto cantarolava músicas ao ouvido da menina, que por muitas vezes arriscava acompanhá-lo em algumas frases. não entendia o porquê ela não gostava de cantar, o porquê de ela não investir sendo que a voz dela era realmente boa e uma das coisas que mais o encantava eram garotas que sabiam cantar. Mas ao tocar nesse assunto com a menina, ele percebia que estava atingindo a mesma ferida aberta de quando a conheceu. E ele não seria o responsável por desmanchar a visão da garota sobre um mundo bom e oportuno.
Em poucos minutos iria encontrar a garota de frente a casa dela e faria o pedido que mais o atormentou aqueles dias. Iria pedi-la em namoro. Não aguentava mais sentir o que sentia por ela sem ao menos oficializar com um namoro, uma forma de expressar o quanto ele a queria. Esse tempo em que conheceu foi o suficiente para acreditar que o mundo não estava de todo perdido, que havia alguém a quem um dia iria amar, iria entregar o seu viver. E esse alguém parecia ser em todos os sentidos. Há tempos trabalhava em cima de sua composição para arrumando detalhes aqui e ali e pensava seriamente em cantar a música para ela, mas... Faltava alguma coisa para que tudo ficasse mais completo do que estava até ali.
Enquanto olhava a composição, sua confiança vacilava por alguns momentos. Ele percebia que também gostava dele assim como ele gostava dela, mas e se ela não aceitasse? Era normal esse medo de receber um “não” da garota que está gostando, mas o que mais contrastava naquilo era que fazia parte do misto de sentimentos que ele passou a sentir por ela desde quando a conheceu. era imprevisível e podia se esperar tudo dela. Inclusive um “não”.
Por mais que sua certeza em pedi-la em namoro fosse forte o bastante conseguir superar a insegurança, ele sentiu que deveria aprimorar a composição colocando mais detalhes referentes a toda a reviravolta que foi conhecer a menina.
But I think if she’d give me a chance
(Mas eu penso que se ela me desse uma chance)
Ah, ela iria se surpreender e muito. não era um garoto inexperiente e nem seria capaz de machucá-la. Iria protegê-la contra todos os males que tentasse atingi-la e iria ser o melhor homem que ela já teve... Em todos os sentidos.
I’ll pleasantly surprise
(Eu a iria surpreender com prazer)
E isso foi o bastante para que ele deixasse de lado toda a insegurança e corresse atrás de algo que realmente o fazia feliz. Não poderia desperdiçar a chance.
---
Diferente de quanto iam ao parque passar o tempo juntos, preferiu levar para um lugar muito especial para ele. Desde a infância o bosque afastado da cidade era um bom lugar para brincar, esconder dos amigos e, para os adultos como eles, pensar um pouco. Tirando as várias utilidades que o lugar oferecia, a paisagem era extremamente maravilhosa. O verde escuro das plantas e as cores diversas das flores traziam a paz que ambas as pessoas necessitavam sentir e até mesmo servia para ser cenário de um pedido como o que faria à dentro de poucos minutos.
Enquanto caminhavam para mais dentro da floresta de árvores altas e bem cuidadas, conversava animado com a menina enquanto segurava a mão dela balançando para lá e para cá conforme andavam. Por mais que sua atenção estivesse imposta na conversa com a garota, ele se lembrava perfeitamente de quando contou de para Willian e Thomas. Ambos os rapazes ficaram ansiosos por saber mais detalhes da garota e conhecê-la pessoalmente, afinal, gostariam de conhecer a garota que tinha roubado o coração de , o cara que nunca parava sozinho com uma garota. Não perderiam a chance de azucrinar quando finalmente conhecessem a linda menina que o encantou.
E lembrando-se do quanto havia realmente o encantado, tudo o que ele queria era oficializar aquele sentimento com o máximo de amor que ele estava sentindo pela menina. Não suportaria perdê-la mais, por nada no mundo.
- Esse lugar é maravilhoso, ! – a menina falava olhando tudo ao redor. – Eu não fazia noção que tinha um lugar desses por aqui. – o garoto sorriu.
- Poucas pessoas conhecem. Desde quando eu vinha aqui quando era pequeno nunca vi esse lugar com muita gente. Eu mesmo só revelei esse lugar a quatro pessoas.
- É mesmo? – ela perguntou, interessada. – Quem são?
- Minha mãe, Willian, meu irmão, e você. – ele mordeu o lábio inferior. – Acho que são as únicas pessoas que merecem saber onde eu costumo parar para pensar.
- Estou me sentindo importante agora. – ela falou brincando e ele permaneceu sério, respirando fundo para concluir o seu plano. Aquela era a hora perfeita para pedir em namoro e não aceitaria que ela negasse. Ela precisava ser amada e a pessoa que a amaria seria ele, somente ele.
- Você é uma das pessoas mais importantes que passaram na minha vida, . – ele segurou as mãos dela entre as suas enquanto os olhos se postavam nele. – Você apareceu em um momento em que eu me vi sozinho, que eu me vi deixado para trás, pois meus pais estavam cheios com trabalho, meu irmão e meu melhor amigo viajaram para longe e eu... Eu fiquei apenas pelas sombras escuras da minha casa. Nem mesmo tinha vontade de pegar o violão e tocar alguma coisa para distrair a mente. Tudo estava tão... Monótono. – ele suspirou e mordeu o lábio inferior, apertando ainda mais as mãos da menina. – Foi quando eu resolvi viver um pouco e ir ao parque para pelo menos recuperar o meu ânimo de antes. Foi quando eu te vi... Eu te vi chorando aquele dia. Não sei o porquê você chorava, mas aquilo me incomodou profundamente.
E então ele se lembrou da música que escreveu para a garota. Poderia falar sobre a música para ela naquele momento, mas ele ainda nem havia arranjado os acordes essenciais para aquela música e queria deixá-la perfeita para , porém em outra ocasião. Deixaria essa surpresa para outro dia.
- Eu quis muito falar com você, - ele continuou – mas algo dentro de mim me parou. Eu apenas tinha a certeza de que queria te ver de novo e conhecer o seu sorriso, o seu lado alegre e feliz. E então eu fui falar com você e aconteceu todo aquele misto de sentimentos que eu sei que você consegue distinguir. – nessas horas a face da menina estava corada e as mãos dela suavam com força e era capaz de imaginar o quanto o coração dela estava batendo forte no peito, mas não tanto quanto o dele. – Nenhuma garota mexeu comigo da forma como você mexeu. Eu não me vejo mais longe de você, não me vejo te deixando à mercê do perigo, da solidão, das tristezas... Eu me vejo como seu protetor, o seu herói. Não quero desperdiçar um segundo do meu tempo longe de você. – ele respirou fundo, satisfeito por ter colocado em poucas palavras tantos sentimentos que estava guardando todo aquele tempo. – Portanto, eu quero te fazer um pedido. – ele levou os dedos dela aos lábios e distribuiu beijos pelas pontas compostas de unhas médias. – Aceita namorar comigo? – ele voltou os olhos para ela que paralisou com os olhos brilhantes pelo pedido inesperado. – Aceita que eu te proteja de todo o mal do mundo, de toda tristeza, aceita que eu seja o seu namorado, amigo e irmão? – a menina ficou paralisada, calada por vários minutos enquanto o menino ficava agonizado naquela espera. Tudo bem que ela precisava de um tempo pra pensar, mas ele não aguentava ficar esperando por aquela resposta por muito tempo. – ? Fala alguma coisa. – ele sacudia as mãos dela, tentando ver se a menina acordava do transe.
Diferente do que ele imaginava, um par de braços malucos puxou sua nuca com violência e o encontro entre os lábios foi inevitável. Enquanto a língua da menina percorria todos os cantos de sua boca, ele teve a certeza ali naquele momento que estava namorando oficialmente com . Não era necessário a garota explicitar um “sim”, apenas aquele beijo tinha a capacidade de mostrar o quanto ela aceitava o pedido. Não demorou muito tempo até que o beijo acelerasse e todo o calor do momento trouxesse outro tipo de sentimento: o prazer. Enquanto os lábios se movimentavam com avidez e as línguas dançavam apressadas e enclausuradas no pouco espaço da junção de suas bocas, as mãos e ousaram adentrar a blusa que usava e tocaram pela primeira vez na pele de sua barriga, conseguindo senti-la por baixo das roupas que naquele momento eram mais do que inúteis. O beijo ainda era mantido por vários segundos que pareciam cada vez mais rápidos e ao receber a carícia do garoto em seu corpo, também não demorou a manifestar sua excitação arranhando as costas do menino por sobre o tecido, fazendo com que ele mordesse o lábio inferior dela e sugasse, soltando-o com um estralo.
- Mas é lógico que eu aceito. – ela disse distribuindo selinhos pela boca do garoto. – Eu não teria coragem de recusar um pedido desses quando nem eu aguento ficar longe de você.
- Me deixa cuidar de você, pequena? – ela assentiu e pôde ver que algumas lágrimas escorriam pelos olhos dela. – Confia em mim, ?
Ela o encarou por um momento, os olhos pingando lágrimas e o lábio preso entre os dentes. estava tão feliz que não conseguia distinguir o que ela sentia naquele momento, mas ao ver a menina moldar um sorriso foi o suficiente para que ele acreditasse que nada no mundo pudesse superar o início de um namoro com amor.
---
Dias depois...
A casa de estava completamente vazia e o vento frio da tarde adentrava as janelas sem restrição e mesmo que os vidros estivessem protegendo o interior, não era suficiente para fazer o frio diminuir. A única coisa que deixava mais feliz naquela hora era que estava ali com ele, completamente enrolada em um cobertor, sentada entre suas pernas. Ambos assistiam um filme qualquer na televisão do quarto de e tentavam esquentar-se em meio a todo aquele gelo, mas o que mais alegrava era que a menina estava ali com ele desde o almoço.
O garoto não era idiota, conseguia perceber como a menina estava diferente não somente pelo jeito, mas também pela aparência. estava cada dia mais pálida, os lábios estavam começando a ficar ressecados e os cabelos não tinham mais o brilho de antes. Por algumas vezes em que acariciava os cabelos da menina, vários fios caíam em suas mãos e ele achou esquisito. Pensou em falar com a garota sobre os cabelos, mas não queria preocupá-la com coisa a toa, afinal, cabelo de mulher caía sempre, muitas vezes sem motivo, não é? Ainda tinha o discurso de em sua mente sobre como ela se sentia bem com ele e não queria que ela ficasse chateada ou com vergonha por ele ter visto o cabelo dela cair. Mas em alguns momentos em que se pegava pensando na mudança repentina da aparência da menina, ele chegava a cogitar a possibilidade de estar doente. A garota pelo menos não demonstrava em suas ações algo que denunciasse um mal estar ou coisas do tipo. Mas por simplesmente não querer que o momento bom se dissipasse com perguntas ruins, ele não perguntou nada a ela. Porém, não poderia simplesmente ignorar que aquilo estava cutucando sua mente.
- ? – ele chamou em meio ao silêncio confortável entre eles. A menina murmurou algo em resposta. – Você está bem? Parece meio cansada...
A menina se mexeu desconfortavelmente sobre o colo dele, mas soltou um riso baixo disfarçando e percebeu que ela iria mudar de assunto.
- Estou bem. – a voz dela continha uma falha e franziu o cenho.
- Eu pensei que você confiava em mim. – ele tinha um tom ligeiramente ofendido, mas em parte era somente para incentivá-la a contar de vez o que é que ela andava escondendo desde o início. Ele não suportava saber que a garota mantinha segredos dele enquanto ele havia disposto sua confiança nela.
- E eu confio, . Quando te mostrei o contrário?
- A partir do momento que sei que tem algo errado. Você anda me escondendo coisas que eu tenho a impressão que eu deveria saber, . Desde quando eu te conheci você traz isso com você e nem com a gente namorando você conta.
A menina suspirou saindo do colo do garoto e num movimento extremamente ágil, sentou defronte ao rosto dele, seu quadril encaixando no colo forte. Passou os olhos por todo o rosto dele enquanto uma de suas mãos desenhava os lábios perfeitos dele com a ponta da unha.
- Eu quero que você entenda que... – ela sussurrava. – Tudo o que eu faço é pensando em você. Tudo o que eu decido é somente pensando em não te fazer sofrer, . Eu apenas quero que continue confiando em mim, independente do que aconteça.
- É difícil quando sei que você tem segredos comigo, . – ele falou e logo um pensamento absurdo passou por sua cabeça e o medo cresceu em seu peito. – Você não está com outro cara, não é ? Você não teria essa coragem.
- NÃO! – ela quase gritou. – Mas é claro que não, de onde você tirou isso? A única pessoa que eu tenho é você e eu não quero mais ninguém!
- Se é assim porque não me conta nada? , eu já disse que quero te proteger. – a menina baixou os olhos e sua face se contorceu numa dor extremamente visível para . Era como se ele também pudesse sentir aquela mesma dor que ela transparecia.
- Eu quero que você me ame, . Como nunca amou outra na sua vida. – os olhos dela estavam sérios, porém ainda carregados pela dor torturante.
- Mas eu te amo, . Eu nunca amei uma garota na vida. Você foi a única que me conquistou totalmente.
- Então confia em mim. – ela sussurrou, se aproximando do namorado, os olhos fixos nos lábios finos. – Esquece tudo e me ame. Vamos experimentar o primeiro amor agora... Esquecer do mundo inteiro. Somos só eu e você e nada mais.
E, sem delongas, a garota encostou seus lábios aos de e ali o garoto entendeu o pedido da menina. Ela queria ser amada, ela queria que ele a amasse, estava dando a chance que ele tanto queria. A música veio em sua cabeça como um grande peso e ali, enquanto suas mãos se perdiam por dentro da roupa da namorada, ele percebeu que precisaria trabalhar em sua composição, pois teria lembranças muito vívidas sobre o amor que estava vivendo com . E isso foi o bastante para ele aprofundar o beijo e deitá-la em sua cama enquanto suas mãos levantavam a camisa que ela usava até que ele pudesse contemplar a beleza da garota não somente de rosto. E ali ele a amou com toda a força que ele sentia, entregando todo o seu coração nas mãos dela, a garota que mudou a sua vida em tão pouco tempo, a garota por quem ele ousou sentir algo.
11h00min PM – Sábado
Querido diário,
Esses dias que se sucederam foram bons e ao mesmo tempo péssimos. me pediu em namoro e eu aceitei. Como não aceitar quando eu estava apaixonada? Foi a melhor coisa que eu havia feito na vida e não me arrependia disso. A única coisa que me preocupava era que eu estava piorando a cada dia que passava. Até para escrever eu não estou conseguindo encontrar forças. A quimioterapia está acabando comigo, não consigo comer mais nada, não consigo respirar direito, sem falar que consigo perceber que a cada dia estou definhando um pouco. Hoje, ao pentear o cabelo, eu vi vários fios de cabelo caindo e percebi o quanto a quimioterapia ainda me maltrataria durante aquele tempo de tratamento. Há dois dias eu recebi a confirmação de todo aquele alarde: eu não tinha mais salvação. O câncer já estava avançado por demais e o Dr. Moore confirmou para mim e para meus pais que eu teria pouco tempo de vida. Eu já esperava por aquela notícia, mas aceitar aquilo na prática era muito mais complicado, principalmente quando todos tinham alguma esperança e no fundo de minha alma eu também tinha. Passei dias chorando, lembrando-me da vida que eu vivia, dos meus pais, da minha família... De . Ah, . Eu queria tanto que você me perdoasse. Eu vou partir em breve e tudo o que você terá será sofrimento, mas terá tantas lembranças boas do tempo em que passamos juntos. E isso era o mais importante. Exatamente por esse motivo que eu simplesmente tentei parecer normal para hoje à tarde, mas mesmo assim ele percebeu que algo estava errado. Cortava o meu coração não contar nada para ele, mas eu não queria fazê-lo sofrer de forma alguma. Eu queria aproveitar o pouco tempo que me restava para viver momentos felizes com , momentos em que eu teria, pelo menos, alguma felicidade quando a morte me levasse. E isso me renderia mais felicidade, pois me entreguei de todo o coração à . Foi a melhor coisa que eu havia feito em todas as decisões da minha vida e ali eu pude sentir o quanto me amava. E essa era a única certeza que eu tinha para que eu pudesse esperar o meu tempo final sabendo que a minha vida não havia sido de todo ruim. Se eu tivesse a oportunidade, eu viveria tudo novamente, porém viveria com mais avidez, com mais prazer pela vida. O que eu mais quero é aproveitar os meus dias com e curtir a minha família enquanto ainda tenho algum tempo, pois sinto que não demorarei nada.
Com amor, .
*Frase da música “Crime”.
Se amar fosse crime, talvez ele vivesse para sempre fora da lei. *
Seu sentimento em relação à havia aumentado gradativamente depois da primeira vez que os dois se beijaram. Fazia exatamente um mês que ambos se encontravam quase sempre e mantinham um relacionamento aproximado ao de um casal de namorados. Sempre que se viam, sentavam defronte ao lago, entre as pernas de enquanto o garoto cantarolava músicas ao ouvido da menina, que por muitas vezes arriscava acompanhá-lo em algumas frases. não entendia o porquê ela não gostava de cantar, o porquê de ela não investir sendo que a voz dela era realmente boa e uma das coisas que mais o encantava eram garotas que sabiam cantar. Mas ao tocar nesse assunto com a menina, ele percebia que estava atingindo a mesma ferida aberta de quando a conheceu. E ele não seria o responsável por desmanchar a visão da garota sobre um mundo bom e oportuno.
Em poucos minutos iria encontrar a garota de frente a casa dela e faria o pedido que mais o atormentou aqueles dias. Iria pedi-la em namoro. Não aguentava mais sentir o que sentia por ela sem ao menos oficializar com um namoro, uma forma de expressar o quanto ele a queria. Esse tempo em que conheceu foi o suficiente para acreditar que o mundo não estava de todo perdido, que havia alguém a quem um dia iria amar, iria entregar o seu viver. E esse alguém parecia ser em todos os sentidos. Há tempos trabalhava em cima de sua composição para arrumando detalhes aqui e ali e pensava seriamente em cantar a música para ela, mas... Faltava alguma coisa para que tudo ficasse mais completo do que estava até ali.
Enquanto olhava a composição, sua confiança vacilava por alguns momentos. Ele percebia que também gostava dele assim como ele gostava dela, mas e se ela não aceitasse? Era normal esse medo de receber um “não” da garota que está gostando, mas o que mais contrastava naquilo era que fazia parte do misto de sentimentos que ele passou a sentir por ela desde quando a conheceu. era imprevisível e podia se esperar tudo dela. Inclusive um “não”.
Por mais que sua certeza em pedi-la em namoro fosse forte o bastante conseguir superar a insegurança, ele sentiu que deveria aprimorar a composição colocando mais detalhes referentes a toda a reviravolta que foi conhecer a menina.
But I think if she’d give me a chance
(Mas eu penso que se ela me desse uma chance)
Ah, ela iria se surpreender e muito. não era um garoto inexperiente e nem seria capaz de machucá-la. Iria protegê-la contra todos os males que tentasse atingi-la e iria ser o melhor homem que ela já teve... Em todos os sentidos.
I’ll pleasantly surprise
(Eu a iria surpreender com prazer)
E isso foi o bastante para que ele deixasse de lado toda a insegurança e corresse atrás de algo que realmente o fazia feliz. Não poderia desperdiçar a chance.
---
Diferente de quanto iam ao parque passar o tempo juntos, preferiu levar para um lugar muito especial para ele. Desde a infância o bosque afastado da cidade era um bom lugar para brincar, esconder dos amigos e, para os adultos como eles, pensar um pouco. Tirando as várias utilidades que o lugar oferecia, a paisagem era extremamente maravilhosa. O verde escuro das plantas e as cores diversas das flores traziam a paz que ambas as pessoas necessitavam sentir e até mesmo servia para ser cenário de um pedido como o que faria à dentro de poucos minutos.
Enquanto caminhavam para mais dentro da floresta de árvores altas e bem cuidadas, conversava animado com a menina enquanto segurava a mão dela balançando para lá e para cá conforme andavam. Por mais que sua atenção estivesse imposta na conversa com a garota, ele se lembrava perfeitamente de quando contou de para Willian e Thomas. Ambos os rapazes ficaram ansiosos por saber mais detalhes da garota e conhecê-la pessoalmente, afinal, gostariam de conhecer a garota que tinha roubado o coração de , o cara que nunca parava sozinho com uma garota. Não perderiam a chance de azucrinar quando finalmente conhecessem a linda menina que o encantou.
E lembrando-se do quanto havia realmente o encantado, tudo o que ele queria era oficializar aquele sentimento com o máximo de amor que ele estava sentindo pela menina. Não suportaria perdê-la mais, por nada no mundo.
- Esse lugar é maravilhoso, ! – a menina falava olhando tudo ao redor. – Eu não fazia noção que tinha um lugar desses por aqui. – o garoto sorriu.
- Poucas pessoas conhecem. Desde quando eu vinha aqui quando era pequeno nunca vi esse lugar com muita gente. Eu mesmo só revelei esse lugar a quatro pessoas.
- É mesmo? – ela perguntou, interessada. – Quem são?
- Minha mãe, Willian, meu irmão, e você. – ele mordeu o lábio inferior. – Acho que são as únicas pessoas que merecem saber onde eu costumo parar para pensar.
- Estou me sentindo importante agora. – ela falou brincando e ele permaneceu sério, respirando fundo para concluir o seu plano. Aquela era a hora perfeita para pedir em namoro e não aceitaria que ela negasse. Ela precisava ser amada e a pessoa que a amaria seria ele, somente ele.
- Você é uma das pessoas mais importantes que passaram na minha vida, . – ele segurou as mãos dela entre as suas enquanto os olhos se postavam nele. – Você apareceu em um momento em que eu me vi sozinho, que eu me vi deixado para trás, pois meus pais estavam cheios com trabalho, meu irmão e meu melhor amigo viajaram para longe e eu... Eu fiquei apenas pelas sombras escuras da minha casa. Nem mesmo tinha vontade de pegar o violão e tocar alguma coisa para distrair a mente. Tudo estava tão... Monótono. – ele suspirou e mordeu o lábio inferior, apertando ainda mais as mãos da menina. – Foi quando eu resolvi viver um pouco e ir ao parque para pelo menos recuperar o meu ânimo de antes. Foi quando eu te vi... Eu te vi chorando aquele dia. Não sei o porquê você chorava, mas aquilo me incomodou profundamente.
E então ele se lembrou da música que escreveu para a garota. Poderia falar sobre a música para ela naquele momento, mas ele ainda nem havia arranjado os acordes essenciais para aquela música e queria deixá-la perfeita para , porém em outra ocasião. Deixaria essa surpresa para outro dia.
- Eu quis muito falar com você, - ele continuou – mas algo dentro de mim me parou. Eu apenas tinha a certeza de que queria te ver de novo e conhecer o seu sorriso, o seu lado alegre e feliz. E então eu fui falar com você e aconteceu todo aquele misto de sentimentos que eu sei que você consegue distinguir. – nessas horas a face da menina estava corada e as mãos dela suavam com força e era capaz de imaginar o quanto o coração dela estava batendo forte no peito, mas não tanto quanto o dele. – Nenhuma garota mexeu comigo da forma como você mexeu. Eu não me vejo mais longe de você, não me vejo te deixando à mercê do perigo, da solidão, das tristezas... Eu me vejo como seu protetor, o seu herói. Não quero desperdiçar um segundo do meu tempo longe de você. – ele respirou fundo, satisfeito por ter colocado em poucas palavras tantos sentimentos que estava guardando todo aquele tempo. – Portanto, eu quero te fazer um pedido. – ele levou os dedos dela aos lábios e distribuiu beijos pelas pontas compostas de unhas médias. – Aceita namorar comigo? – ele voltou os olhos para ela que paralisou com os olhos brilhantes pelo pedido inesperado. – Aceita que eu te proteja de todo o mal do mundo, de toda tristeza, aceita que eu seja o seu namorado, amigo e irmão? – a menina ficou paralisada, calada por vários minutos enquanto o menino ficava agonizado naquela espera. Tudo bem que ela precisava de um tempo pra pensar, mas ele não aguentava ficar esperando por aquela resposta por muito tempo. – ? Fala alguma coisa. – ele sacudia as mãos dela, tentando ver se a menina acordava do transe.
Diferente do que ele imaginava, um par de braços malucos puxou sua nuca com violência e o encontro entre os lábios foi inevitável. Enquanto a língua da menina percorria todos os cantos de sua boca, ele teve a certeza ali naquele momento que estava namorando oficialmente com . Não era necessário a garota explicitar um “sim”, apenas aquele beijo tinha a capacidade de mostrar o quanto ela aceitava o pedido. Não demorou muito tempo até que o beijo acelerasse e todo o calor do momento trouxesse outro tipo de sentimento: o prazer. Enquanto os lábios se movimentavam com avidez e as línguas dançavam apressadas e enclausuradas no pouco espaço da junção de suas bocas, as mãos e ousaram adentrar a blusa que usava e tocaram pela primeira vez na pele de sua barriga, conseguindo senti-la por baixo das roupas que naquele momento eram mais do que inúteis. O beijo ainda era mantido por vários segundos que pareciam cada vez mais rápidos e ao receber a carícia do garoto em seu corpo, também não demorou a manifestar sua excitação arranhando as costas do menino por sobre o tecido, fazendo com que ele mordesse o lábio inferior dela e sugasse, soltando-o com um estralo.
- Mas é lógico que eu aceito. – ela disse distribuindo selinhos pela boca do garoto. – Eu não teria coragem de recusar um pedido desses quando nem eu aguento ficar longe de você.
- Me deixa cuidar de você, pequena? – ela assentiu e pôde ver que algumas lágrimas escorriam pelos olhos dela. – Confia em mim, ?
Ela o encarou por um momento, os olhos pingando lágrimas e o lábio preso entre os dentes. estava tão feliz que não conseguia distinguir o que ela sentia naquele momento, mas ao ver a menina moldar um sorriso foi o suficiente para que ele acreditasse que nada no mundo pudesse superar o início de um namoro com amor.
---
Dias depois...
A casa de estava completamente vazia e o vento frio da tarde adentrava as janelas sem restrição e mesmo que os vidros estivessem protegendo o interior, não era suficiente para fazer o frio diminuir. A única coisa que deixava mais feliz naquela hora era que estava ali com ele, completamente enrolada em um cobertor, sentada entre suas pernas. Ambos assistiam um filme qualquer na televisão do quarto de e tentavam esquentar-se em meio a todo aquele gelo, mas o que mais alegrava era que a menina estava ali com ele desde o almoço.
O garoto não era idiota, conseguia perceber como a menina estava diferente não somente pelo jeito, mas também pela aparência. estava cada dia mais pálida, os lábios estavam começando a ficar ressecados e os cabelos não tinham mais o brilho de antes. Por algumas vezes em que acariciava os cabelos da menina, vários fios caíam em suas mãos e ele achou esquisito. Pensou em falar com a garota sobre os cabelos, mas não queria preocupá-la com coisa a toa, afinal, cabelo de mulher caía sempre, muitas vezes sem motivo, não é? Ainda tinha o discurso de em sua mente sobre como ela se sentia bem com ele e não queria que ela ficasse chateada ou com vergonha por ele ter visto o cabelo dela cair. Mas em alguns momentos em que se pegava pensando na mudança repentina da aparência da menina, ele chegava a cogitar a possibilidade de estar doente. A garota pelo menos não demonstrava em suas ações algo que denunciasse um mal estar ou coisas do tipo. Mas por simplesmente não querer que o momento bom se dissipasse com perguntas ruins, ele não perguntou nada a ela. Porém, não poderia simplesmente ignorar que aquilo estava cutucando sua mente.
- ? – ele chamou em meio ao silêncio confortável entre eles. A menina murmurou algo em resposta. – Você está bem? Parece meio cansada...
A menina se mexeu desconfortavelmente sobre o colo dele, mas soltou um riso baixo disfarçando e percebeu que ela iria mudar de assunto.
- Estou bem. – a voz dela continha uma falha e franziu o cenho.
- Eu pensei que você confiava em mim. – ele tinha um tom ligeiramente ofendido, mas em parte era somente para incentivá-la a contar de vez o que é que ela andava escondendo desde o início. Ele não suportava saber que a garota mantinha segredos dele enquanto ele havia disposto sua confiança nela.
- E eu confio, . Quando te mostrei o contrário?
- A partir do momento que sei que tem algo errado. Você anda me escondendo coisas que eu tenho a impressão que eu deveria saber, . Desde quando eu te conheci você traz isso com você e nem com a gente namorando você conta.
A menina suspirou saindo do colo do garoto e num movimento extremamente ágil, sentou defronte ao rosto dele, seu quadril encaixando no colo forte. Passou os olhos por todo o rosto dele enquanto uma de suas mãos desenhava os lábios perfeitos dele com a ponta da unha.
- Eu quero que você entenda que... – ela sussurrava. – Tudo o que eu faço é pensando em você. Tudo o que eu decido é somente pensando em não te fazer sofrer, . Eu apenas quero que continue confiando em mim, independente do que aconteça.
- É difícil quando sei que você tem segredos comigo, . – ele falou e logo um pensamento absurdo passou por sua cabeça e o medo cresceu em seu peito. – Você não está com outro cara, não é ? Você não teria essa coragem.
- NÃO! – ela quase gritou. – Mas é claro que não, de onde você tirou isso? A única pessoa que eu tenho é você e eu não quero mais ninguém!
- Se é assim porque não me conta nada? , eu já disse que quero te proteger. – a menina baixou os olhos e sua face se contorceu numa dor extremamente visível para . Era como se ele também pudesse sentir aquela mesma dor que ela transparecia.
- Eu quero que você me ame, . Como nunca amou outra na sua vida. – os olhos dela estavam sérios, porém ainda carregados pela dor torturante.
- Mas eu te amo, . Eu nunca amei uma garota na vida. Você foi a única que me conquistou totalmente.
- Então confia em mim. – ela sussurrou, se aproximando do namorado, os olhos fixos nos lábios finos. – Esquece tudo e me ame. Vamos experimentar o primeiro amor agora... Esquecer do mundo inteiro. Somos só eu e você e nada mais.
E, sem delongas, a garota encostou seus lábios aos de e ali o garoto entendeu o pedido da menina. Ela queria ser amada, ela queria que ele a amasse, estava dando a chance que ele tanto queria. A música veio em sua cabeça como um grande peso e ali, enquanto suas mãos se perdiam por dentro da roupa da namorada, ele percebeu que precisaria trabalhar em sua composição, pois teria lembranças muito vívidas sobre o amor que estava vivendo com . E isso foi o bastante para ele aprofundar o beijo e deitá-la em sua cama enquanto suas mãos levantavam a camisa que ela usava até que ele pudesse contemplar a beleza da garota não somente de rosto. E ali ele a amou com toda a força que ele sentia, entregando todo o seu coração nas mãos dela, a garota que mudou a sua vida em tão pouco tempo, a garota por quem ele ousou sentir algo.
11h00min PM – Sábado
Querido diário,
Esses dias que se sucederam foram bons e ao mesmo tempo péssimos. me pediu em namoro e eu aceitei. Como não aceitar quando eu estava apaixonada? Foi a melhor coisa que eu havia feito na vida e não me arrependia disso. A única coisa que me preocupava era que eu estava piorando a cada dia que passava. Até para escrever eu não estou conseguindo encontrar forças. A quimioterapia está acabando comigo, não consigo comer mais nada, não consigo respirar direito, sem falar que consigo perceber que a cada dia estou definhando um pouco. Hoje, ao pentear o cabelo, eu vi vários fios de cabelo caindo e percebi o quanto a quimioterapia ainda me maltrataria durante aquele tempo de tratamento. Há dois dias eu recebi a confirmação de todo aquele alarde: eu não tinha mais salvação. O câncer já estava avançado por demais e o Dr. Moore confirmou para mim e para meus pais que eu teria pouco tempo de vida. Eu já esperava por aquela notícia, mas aceitar aquilo na prática era muito mais complicado, principalmente quando todos tinham alguma esperança e no fundo de minha alma eu também tinha. Passei dias chorando, lembrando-me da vida que eu vivia, dos meus pais, da minha família... De . Ah, . Eu queria tanto que você me perdoasse. Eu vou partir em breve e tudo o que você terá será sofrimento, mas terá tantas lembranças boas do tempo em que passamos juntos. E isso era o mais importante. Exatamente por esse motivo que eu simplesmente tentei parecer normal para hoje à tarde, mas mesmo assim ele percebeu que algo estava errado. Cortava o meu coração não contar nada para ele, mas eu não queria fazê-lo sofrer de forma alguma. Eu queria aproveitar o pouco tempo que me restava para viver momentos felizes com , momentos em que eu teria, pelo menos, alguma felicidade quando a morte me levasse. E isso me renderia mais felicidade, pois me entreguei de todo o coração à . Foi a melhor coisa que eu havia feito em todas as decisões da minha vida e ali eu pude sentir o quanto me amava. E essa era a única certeza que eu tinha para que eu pudesse esperar o meu tempo final sabendo que a minha vida não havia sido de todo ruim. Se eu tivesse a oportunidade, eu viveria tudo novamente, porém viveria com mais avidez, com mais prazer pela vida. O que eu mais quero é aproveitar os meus dias com e curtir a minha família enquanto ainda tenho algum tempo, pois sinto que não demorarei nada.
Com amor, .
*Frase da música “Crime”.
VI. O segredo de
Três meses depois...
O celular em suas mãos era utilizado de cinco em cinco minutos no intuito de pelo menos tentar se comunicar com . Há duas semanas completas a garota não lhe dava notícias, não atendia o celular, não respondia suas mensagens e isso preocupava seriamente o garoto alvo de grandes olhos . Por muitas vezes se pegava recapitulando as atitudes com a menina, tentando ver se havia feito alguma coisa errada, alguma coisa que poderia magoá-la, mas nada lhe denunciava uma atitude drástica de sua parte, afinal, na última vez que havia se encontrado com , os dois passaram a tarde inteira agarrados se amando como nunca antes. Se lembrava perfeitamente de como ficara confuso com a declaração suspeita da menina.
Flashback on
O quarto de estava abafado por conta do calor que envolvia os dois corpos repousados na cama de solteiro no meio do cômodo e o casal tentava procurar a respiração que estava perdida por entre os gemidos do prazer que acabaram de sentir um com o outro. Os cabelos de estavam grudados em suas costas e os de moldavam sua testa, cravando na pele alva. Os lábios do garoto eram esmagados constantemente por seus dentes e a garota, repousada em seu peito, respirava ruidosamente. Era possível ouvir o barulho que o peito da garota fazia, buscando o ar com força para dentro do corpo.
-Está bem, ? Está conseguindo respirar direito? – ele perguntou estranhando a falta de ar da menina. Estavam ali há uns cinco minutos enquanto tentavam acalmar seus corpos e ele achava estranho a garota ainda estar suando e respirando com dificuldade.
- Eu... – ela ofegava com força. – Estou bem. Eu... Tô bem. – ela respirou fundo, ficando parada em seu colo por um momento até soltar o ar novamente.
- Está suando frio. O que está sentindo, me diga! Eu te machuquei? – ela negou, prontamente. – Então o que está acontecendo?
Demorou alguns segundos até ela erguer a cabeça na direção dele e ele conseguir enxergar os olhos vermelhos pelas lágrimas que corriam velozes por seu rosto. Tomou um susto ao ver a menina chorando.
- Mas o que foi? Por que está chorando, meu amor? – ele perguntou desesperado, secando as lágrimas dela com precisão. Ela mordeu o lábio inferior com força, ainda respirando com dificuldade e o encarou com as lágrimas escorrendo por seu rosto pequeno.
- Eu te amo mais do que tudo. – ela sussurrou, a força em sua voz estava pouca, mas não conseguiu pensar em mais nada além das palavras dela.
- Eu também te amo. Mais do que jamais amei alguém na vida. - ele depositou um selinho seguido de uma mordida nos lábios dela. – Mas eu não entendi o por que de você estar chorando, amor. Se tudo foi bom pra você, por que está chorando?
- Eu quero que você saiba... – a voz dela falhava um pouco, mas ainda assim era audível. – Que independente do que aconteça... – ela se esforçava para dizer aquelas palavras, o choro já começando a ficar mais forte. – Você foi a única pessoa que eu amei de verdade. Se algo acontecer comigo, quero que saiba que eu sempre vou te amar. – e então ela chorou. A força do choro surpreendeu por um momento, mas ele viu ali que a garota estava com algum problema e mais do que tudo queria descobrir o que era. Mas mudando completamente o rumo de suas preocupações, ele viu que o que ele poderia fazer de melhor àquela hora ela amar da forma como ele sempre quis amar alguém: com sentimento verdadeiro e único.
- Não importa o que aconteça. Eu sempre vou te amar, . Uma das coisas que mais vale a pena é amar e eu escolhi te amar. – ele olhava no fundo dos olhos dela, contemplando a garota ainda chorar com força enquanto assentia.
Palavras não precisavam ser ditas, muito menos elaboradas. O que reinava ali era o sentimento, o sentimento mais puro que há no mundo. O amor verdadeiro entre duas pessoas que escolheram o destino certo: amar sem receber nada em troca além de... Amor.
Flashback off
não podia deixar de assumir que aquela súbita crise de choro de fora no mínimo... Estranho. Foi a primeira vez que ele apareceu na casa da menina e logo depois desse dia a garota sumiu. Conheceu a mãe da garota, o pai e ambos foram realmente simpáticos com ele, tratando-o bem como nunca. Mas mesmo assim a garota sumiu e por mais que tentasse ligar não conseguia. Não queria aparecer na casa da garota de surpresa, mas tudo o levava à essa opção. Tendo o apoio de sua mãe naquela decisão, ele viu que não poderia esperar mais tempo algum se quisesse realmente saber o que havia acontecido com sua garota.
Não demorou muito a colocar uma roupa qualquer naquela manhã de segunda-feira e sair em direção à casa de . O dia estava frio e provavelmente a semana inteira seria nublada e sombria, pois o inverno estava se aproximando cada vez mais. O vento batia com força contra sua pele e ele se arrependeu de não ter colocado uma jaqueta mais grossa. Caminhava em passos firmes até chegar ao quarto quarteirão de distância de sua casa e avistar a casa amarelo bebê onde morava com seus pais. A rua estava deserta, pois eram apenas sete horas da manhã e muita gente provavelmente estaria dormindo ou até mesmo trabalhando. Temia chegar muito cedo à casa da garota e acabar acordando alguém, mas sempre acordava esse horário, então estava tudo bem.
Parou em frente à porta, respirou fundo, contou até três e bateu na porta torcendo que alguém estivesse acordado. Os pés tamborilavam o chão em ansiedade e ele sentia seu coração bater com força. Não iria aguentar se a menina terminasse com ele. Poderia ser isso, afinal, ela havia sumido há tempos e não dava nenhuma notícia. Ele não via outra alternativa a não ser a que ela simplesmente queria terminar com ele.
- Pois não? – uma mulher de cabelos castanhos abriu a porta e encarou com os olhos curiosos, porém muito inchados. não conhecia aquela mulher e por um momento pensou que, em sua afobação, havia errado de casa.
- Ahn... Eu... – ele se esquivou para ver o número da casa e concluiu que era mesmo a casa de , afinal, o número era o mesmo e a cor das paredes também. – Eu estou procurando por . Ela mora aqui, não mora?
- ? – a mulher tomou um espanto. – Mora sim, mas... Quem é você?
- Eu? Eu sou o namorado dela, . – nessa hora batia o pé insistentemente no chão tentando disfarçar sua ansiedade. – E a senhora? Não a conheço.
- Namorado? – a mulher arregalou os olhos. – Eu... Eu... – ela gaguejava e uma de suas mãos coçou a cabeça, em claro sinal de nervosismo. – Eu não sei o que...
- Dyana! – uma voz conhecida falou pelas costas de e o garoto se virou reconhecendo a silhueta de Jamie, a mãe de , e Alexander , o pai da garota. Ambos os adultos estavam cansados, bolsas roxas grandes abaixo dos olhos e o corpo curvado para frente, em sinal de extremo cansaço. A beleza da mãe de estava desgastada, os cabelos sem vida e a pele pálida, junto aos olhos vermelhos de lágrimas. O pai da garota tinha a posição mais firme, porém era denunciável a forma como ele estava perturbado com algo. – ?
- Ahn... Olá, Sra. . Eu... A senhora está bem? – ele virou o olhar para o pai de . – Sr. .
- . – ele cumprimentou e sua voz saiu menos grossa, dando lugar a claro embargo.
- Ah, . – Jamie se aproximou do menino, os lábios presos aos dentes e os olhos vermelhos tomando uma tonalidade mais potente, o que denunciava um possível choro. – , eu... Eu nem sei como olhar para você...
- O que houve, Sra. ? – o garoto perguntou confuso. – Onde está ? Eu vim aqui atrás dela, há tempos ela não me retorna uma ligação, não me dá uma notícia... Estou preocupado.
A mulher deu um suspiro forte, olhando para o marido, para a mulher desconhecida chamada Dyana e, enfim, olhou . Uma lágrima desceu pelo rosto da mulher e a expressão se contorceu numa tortura visível.
- Nós precisamos conversar, . Você precisa saber de umas coisas.
Pareceu que alguma coisa entrou por sua garganta e se alojou ali, dificultando sua respiração. não sabia explicar, mas o que ele sentia naquele momento era completamente diferente do que ele já havia sentido em seus vinte e um anos de vida. Era como se o mundo fosse explodir no momento em que a mãe de falasse o que tinha pra falar. Ora, a mulher estava claramente perturbada e com certeza se relacionava com .
- Que coisas? – ele perguntou, engolindo em seco.
A mulher suspirou, tocando as costas do menino fazendo com que ele a acompanhasse e entrasse na casa. A mulher de cabelos castanhos saiu disparada na frente, se postando ao lado do sofá enquanto Jamie se aproximava com e o marido em seu encalço. Sem delongas, fez o menino se sentar enquanto seu marido sentava na poltrona em frente ao sofá e ela se sentava ao lado do garoto atônito e nervoso.
- Dyana, prepare um chá de camomila, por favor. Traga-o bem quente. – a mulher assentiu correndo até a cozinha e a fitou até virar-se para a mãe de . – Dyana é minha irmã, tia de .
- Desculpe Sra. , mas eu gostaria de saber o que está acontecendo. – o garoto falou, nervoso. – Eu estou percebendo algo muito estranho aqui e sinto que estou por fora. – a mulher suspirou, engolindo o choro. Respirou e inspirou várias vezes, os olhos fechados, até tomar coragem e encarar o menino.
- Querido, o que eu vou te falar aqui não vai ser fácil. – ela segurou a mão do menino entre suas mãos frias e suadas. – Eu não sei nem como e por onde começar.
- Sra. , eu não quero ser indelicado, mas eu não estou aguentando mais. – ele falou um pouco mais alto, o desespero tomando conta de suas veias. – Eu quero saber o que aconteceu com ! Por que ela não está aqui? Que diabos está acontecendo que eu não estou sabendo?
Vendo que não teria mais alternativa senão contar a verdade, a mulher apenas fechou os olhos proferindo a realidade atual:
- está com câncer.
Parecia que o mundo inteiro havia caído em suas costas. Parecia que o ar que respirava havia sumido de seus pulmões, esvaindo-se para longe de seu corpo. Parecia que, por um momento, o sentimento de morte que havia sentido quando se afogou na praia quando era pequeno o tomou por completo naquela hora e poderia até arriscar dizer que goles de água salgada entravam por sua boca trancando toda a corrente de ar que deveria sair para mantê-lo vivo. Parecia que toda a cor do mundo havia se dissipado no preto que tornou sua visão a partir do momento em que ele ouviu aquelas quatro palavras saírem da boca de Jamie.
com câncer?
Mas isso só podia ser uma brincadeira de muito mau gosto, não é? Como assim com câncer? Ele ficou com a garota há mais de cinco meses, a conhecia, olhava tudo por ela e nunca percebeu nada. Mas como ela poderia estar com câncer?
- A senhora está de brincadeira, não é mesmo? – ele perguntou assim que encontrou sua voz. Aquilo só podia ser pegadinha. Não pode deixar de sorrir em ironia. – Isso é impossível. Não! Tenho certeza que está brincando com a minha cara. – ele sorria forçado tentando procurar alguma expressão de graça no rosto de Jamie, mas a mulher permanecia séria, as lágrimas descendo pelo rosto. – está aqui, certo? Aposto que ela está no quarto e está querendo me fazer uma surpresa! É bem a cara dela! – ele riu, mas mesmo assim a expressão de Jamie permanecia séria, triste e piorava a cada minuto, pois sua respiração estava por um fio, o que denunciava que iria chorar em breve.
Nessa hora, Dyana entrou na sala de estar com três xícaras fumegantes de chá, entregando uma para , a outra para Jamie e a última para Alexander. Sentou-se na outra poltrona, encolhendo as pernas e passou a fitar com o olhar também sério. O garoto não sabia o que sentia naquele momento, pois tudo parecia um sonho. Aquelas pessoas o fitando com o olhar sério e triste, a falta da presença de naquela casa, os retratos de fotos da garota amontoados num canto ao lado de uma bíblia – algo diferente, pois da última vez as fotos estavam espalhadas por todos os cantos da sala – e a mesma sensação de morte que o tomava por completo.
Aquilo não podia ser verdade.
- Não... – ele sussurrou e logo suas mãos começaram a tremer, fazendo com que o líquido quente do chá caísse em sua calça e queimasse sua pele por baixo do tecido, mas isso pouco o importou. – Não! NÃO! – ele gritou. – NÃO É POSSÍVEL!
Logo, suas mãos tremiam por completo e a xícara de chá já não tinha firmeza sob seus dedos. Dyana correu para acudir o garoto, mas o menino sentia o descontrole tomá-lo por completo. O coração estava sendo esmagado por várias mãos fortes e ele podia até sentir o sangue escorrer, como se fossem faíscas dolorosas do fogo mais ardente. Seus olhos ardiam com força e as lágrimas logo tomaram conta de suas pálpebras e sua cabeça girou em uma rota de trezentos e sessenta graus. Logo, sua visão estava fadada ao breu e gritos tomaram conta de sua audição. Sombras afobadas foram para perto dele e de Jamie e mesmo enxergando mal, ele pôde vera silhueta volumosa do pai de afastar Jamie da sala e as mãos delicadas de Dyana afastarem seu cabelo da testa. Ali ele pôde ver o quanto suava frio e o quanto queria colocar para fora o pouco que havia ingerido naquela manhã. O enjoo que sentia era tão forte que ele teve que segurar firme para não vomitar na sala dos .
Não demorou mais que dois minutos e um pano frio molhava sua testa no intuito de trazê-lo de volta à consciência. Mesmo recobrando a noção das coisas aos poucos, sua mente queria ficar no lugar escuro onde havia se alojado. Ele não queria acordar nunca mais. A realidade agora o atingia como socos, tapas e murros fortes e ele conseguia enxergar a notícia que Jamie havia lhe dado: sua namorada, a única garota a quem se atreveu entregar seu coração, estava com câncer.
Um desespero sem explicação tomou conta dele novamente e ele não conseguia pensar em mais nada a não ser que poderia estar morta aquele momento.
- ELA MORREU? – ele gritou, assustando a mulher que passava um pouco de álcool em suas narinas. – ELA MORREU? ME DIGAM!
- Não. – a voz forte de Alexander falou e ele abriu os olhos, recebendo a claridade da manhã como se agulhas perfurassem seus globos oculares. O homem se aproximou do garoto, ajudando-a se sentar. Mesmo com dificuldade e com a vontade de vomitar ainda presente, sentou-se e respirou fundo, tentando parar com a dor de cabeça e o enjoo infernal. – Mas está por um fio. – o homem falou e baixou a cabeça, olhando o chão.
- Mas que porra é essa, afinal? Eu não consigo acreditar. – as lágrimas tomavam conta de sua face e tudo o que ele queria era acordar daquele pesadelo. – Como assim câncer? Como por um fio?
- Eu vou lhe contar. – o homem falou, respirando fundo. – Mas preciso que fique calmo, . Temos que ser fortes por ela. Ela não quer nos ver sofrendo. – o garoto assentiu, inspirando fundo e soltando o ar aos poucos. – tem câncer de pulmão há um ano. Na família de Jamie há vários casos cancerígenos, é algo hereditário. Viemos descobrir isso quando minha sogra faleceu de câncer intestinal e os médicos fizeram um heredograma constatando o mal. Jamie sempre fez exames importantes e exigia que os fizesse da medida correta para uma adolescente, justamente para prevenir esses tipos de males, mas... acabou contraindo o câncer por conta de células que fizeram muitas divisões e isso ocasionou o alojamento do tumor no pulmão. Não pudemos fazer nada mediante a isso.
O garoto respirava com dificuldade, o tremor um pouco melhor, mas ainda assim insistente. Mas como aquilo?
- Ela pegou o câncer do nada? Somente por conta de células mal divididas?
- Por isso e por outros fatores como agrotóxicos. O câncer é uma doença terrível, . Quando ele é hereditário, a coisa geralmente piora.
- Ela... Ela está no hospital? – ele engoliu em seco.
- Sim. Tivemos de levá-la e ela está lá desde a semana retrasada. No dia seguinte em que vocês se viram, ela passou muito mal. Não tivemos alternativa a não ser levá-la.
mordeu o lábio inferior e mais lágrimas desceram por seu rosto. Foi um dia depois que eles se amaram, que ela lhe prometeu amor eterno. Foi um aviso. A falta de ar era o câncer alojado em seu pulmão, as lágrimas eram a despedida e o amor... Um selo eterno de verdade. Tudo foi uma permissão do destino para que eles se amassem pela... Pela última vez.
- E... E tem alguma chance de ela... Sobreviver? – ele não conseguia pensar na ideia de morrer. Isso estava fora de questão. O pai da garota jogou as costas no encosto do sofá e não conseguiu segurar a emoção. O grande homem deixou que lágrimas seguidas uma da outra banhassem seu rosto e balançou a cabeça negativamente.
- O diagnóstico do médico foi fatal. – ele respirava com dificuldade, certamente conseguindo enxergar a realidade dali para frente. – Ela não tem mais que uma semana de vida.
E isso foi o bastante para o mundo inteiro de desmoronar em milhões de pedaços pequenos. O chão passou a ser um breu sombrio e foi como se ele tivesse caído dentro de um buraco sem fundo. O frio em sua barriga fez com que seu estômago revirasse novamente e tudo o que ele queria era gritar muito alto. A dor física e psicológica o atingia como se várias facas estivessem lhe golpeando com força e seu sangue estivesse jorrando para fora de seu corpo em velocidade alucinante. Sua garganta estava fechada, mas ele não podia deixar de perguntar. Ele precisava saber se não era tarde demais para vê-la.
- Eu... Eu posso vê-la? – a voz estava trêmula e ele sentiu o medo começar a tomá-lo. – Sr. , eu preciso vê-la novamente. Eu não posso deixar que ela... Que ela... Morra... Sem que pelo menos eu a veja novamente. Por favor. – ele implorava.
O rosto vermelho do homem se virou para e o garoto pôde ver o sorriso sincero que o homem deu em sua direção.
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O hospital do centro de Washington era um dos maiores e mais caros da cidade. O prédio era enorme e janelas azuis compunham sua estrutura. Era um lugar bonito, mas toda beleza era dissipada apenas pelo fato de que várias pessoas morriam ali dentro. E isso incluía sua namorada, . A garota estava internada na UTI avançada do hospital e, segundo os médicos, a garota estava em sua fase final. Aquela sala de espera estava o consumindo e não aguentava mais esperar um segundo que fosse. Sua mãe e seu pai estavam junto com ele, lhe dando força e também sentindo a dor de ver uma garota tão nova como sofrer a fase final de sua vida numa cama de hospital enquanto o câncer tomava conta de seu pulmão, lhe impossibilitando de encontrar o ar.
As mãos do garoto eram acariciadas pelas mãos de sua mãe e a mulher fazia um carinho no cabelo do garoto enquanto as lágrimas banhavam seu rosto. Palavras de conforto eram sussurradas e nem com isso se sentia melhor. Não demorou muito tempo até um médico chegar à sala de visitas com os pais de em seu encalço.
- Uma ou duas pessoas de cada vez, tudo bem? – o homem falou e ambos assentiram.
- , vá. – a mãe falou acariciando os cabelos do filho. – Eu e seu pai vamos logo em seguida.
- Não. – o menino decretou e ambos o olharam em confusão. – Eu quero vê-la por último. Vão na frente.
- Mas ...
- Mãe! – ele falou mais alto. – Por favor.
A mulher assentiu e o médico acompanhou os pais do menino até o quarto de UTI onde estava. Foi o tempo que Jamie sentou ao lado de , chorando forte e os gritos da mulher chamavam a atenção das poucas pessoas que estavam ali, atraindo a pena.
- Ela se despediu de nós, . – a mulher falava entre soluços e Alexander tinha a expressão séria, como se fosse capaz de matar alguém. – Ela se despediu! Ela vai nos deixar, ! – a mulher gritava e Alexander saiu de perto, enfurecido. entendia o sogro, afinal, era filha única e eles estavam prestes a perdê-la. O homem andava para lá e para cá enquanto a mulher era abraçada pelo garoto que não sabia o que dizer. O que ele poderia dizer? Também estava perdendo a pessoa que mais amou, a pessoa por quem queria se apaixonar todos os dias, por quem fez a composição mais marcante de sua vida...
A COMPOSIÇÃO!
Como fora se esquecer da música de ? Como não terminou a composição a tempo de mostrar para a garota? A menina estava morrendo e ele ainda nem tinha arranjado a melodia da música e nem sequer terminado de escrevê-la. Era nessas horas que queria se bater e se matar. Porra, como ele esqueceu?
Uma súbita dor em seu peito fez com que a respiração do garoto falhasse e as lágrimas tomassem conta de seus olhos. Ele teria que terminar a música antes que fosse embora! Ele não poderia deixar de mostrá-la a prova de que ele a amaria para sempre, não podia!
- ... – a voz de sua mãe lhe despertou de seu desespero. A mulher chorava forte e ele também podia ver a emoção nos olhos de seu pai. – Ela quer te ver. Vá, meu filho. Se despeça dela.
- ELA. NÃO. VAI. MORRER. HOJE! – ele rosnou e se levantou com raiva, seguindo médico em passos firmes enquanto ouvia as mulheres atrás chorarem.
Foi caminhando pelos corredores até que o médico lhe falou.
- Você tem que ser forte, garoto. Ela está muito mal, não sei quanto tempo pode aguentar. – ele alertou, mas o garoto pouco se importou.
- Eu não acredito nisso. Eu tenho certeza que ela não vai morrer. Eu tenho! – ele falou mais alto e o médico o silenciou.
- Não a deixe nervosa, isso pode piorar o quadro.
- Doutor! Você vai me prometer que vai fazer o impossível pra ela ficar boa. Promete? – ele fitou o homem com os olhos arregalados em nervoso. O homem assentiu, sem pensar duas vezes.
- Esse é o nosso trabalho, menino. Lutar pela vida de um paciente até o fim. Mas se for da vontade de Deus que ela se vá, não podemos fazer mais nada. – o homem colocou a mão na maçaneta da porta. – Entre. De qualquer forma, se despeça dela. Não deixe para amanhã, não sabemos o que pode acontecer quando você for embora.
O garoto suspirou e fitou a porta sendo aberta pelo médico. O homem entrou na frente e de repente sua voz mudou para um tom claramente mais calmo, mais apaziguador.
- ? – ele a chamou. – Tenho uma surpresa para você, meu bem. – o médico sorriu e segurou o braço de colocando-o em frente da garota. O coração do menino batia com tanta força que chegava a doer. – Seu namorado veio lhe ver. Ele estava morrendo de saudades.
E então ele a viu.
O rosto da menina estava pálido, muito pálido. Seus lábios estavam sem cor e machucados, porém as rachaduras também estavam sem cor. Os cabelos estavam poucos, o que denunciava que eles haviam caído muito no tempo em que eles ficaram sem se ver. Isso o fez lembrar-se das vezes em que o cabelo da menina caía em suas mãos e ele achava estranho. Então tudo estava explicado. Viu também a magreza excessiva da menina e concluiu que a garota estava com a pele grudada ao osso, o que doeu muito em seu coração. A mangueira abaixo de seu nariz era transparente e vários fios estavam grudados no peito da garota e em suas veias ela recebia algum tipo de remédio. O quarto recebia apenas a luz do dia, mas ele conseguia enxergar as lágrimas que banhavam o rosto da menina e o estado debilitado dela. Nunca pensara que iria viver para ver daquela forma.
- Vou deixá-los à vontade. – o médico falou. – Não passe nervoso Dona . Você tem que se cuidar para sair dessa situação, ok? – o médico sorriu e olhou sugestivamente para .
Assim que a porta se fechou, voltou seu olhar para a garota e ela baixou os olhos, as lágrimas caindo pelo rosto pálido. Ele se aproximou dela em passos lentos até parar em frente à menina e ali ele pôde perceber como ela se esforçava para respirar. A força que ela aplicava para procurar ar era tanta que chegava a causar desespero nele. O peito da menina chiava com força e estufava para frente como se o coração estivesse quase explodindo dentro do peito. A dor que ele sentiu ao vê-la daquele jeito era forte demais, tanto que ele teve que se esforçar para dizer alguma coisa.
- Então esse é o segredo que você me escondia desde quando nos conhecemos. – ele falou enquanto prendia o choro. Ele não podia chorar na frente da menina. Ele não podia emocioná-la. Ele teria que cooperar para que ela melhorasse. Os médicos não sabiam de nada, ele acreditava na cura.
- Me desculpe. – a voz dela estava rouca e quase não se podia escutá-la. Ela tossiu um pouco, mas isso dificultou ainda mais a respiração dela, o que causou um desespero em ambos, pois a menina passou a puxar o ar com muito mais força.
- Hey! – o garoto se aproximou segurando uma das mãos dela. Estavam geladas como nunca. – Não faça nenhum esforço, meu amor. Respire comigo, olha. – ele mostrou para ela uma forma em como tentar acalmar a respiração. – Puxa o ar com calma, assim... – ele demonstrava e a menina copiava. – Agora solte com calma. Consegue encontrar o ar? Apenas acene com a cabeça. – ela acenou positivamente e voltou a inspirar da forma como havia mostrado. – Isso, minha linda. Não deixe de respirar assim, bem calma. Se você se afobar, pode piorar.
- Mas... – ela voltou a falar e o garoto a impediu.
- Não fale nada. Você vai ficar boa. Eu te entendo, . Eu... Eu não vou sair daqui de perto de você, meu amor. Vou vir todos os dias para lhe ver, todos os dias para te fazer sorrir. E você vai sorrir tanto, tanto que essa doença vai ter que sumir de você, ok? – ela assentiu, respirando com calma, porém ainda forçava muito. – Você é mais forte que essa coisa, . Não deixe que essa doença vença você.
- Não vai. – ela disse e o garoto mordeu o lábio inferior. – Eu... Eu não... Posso. – agora ela respirava com mais dificuldade.
- Shhh, não fale nada. Hey, pare!
- Não. – ela voltou a falar. – Eu quero que saiba... – ela respirava mais forte. – Saiba que... Independente do que... Aconteça aqui... – ela falava pausadamente, tentando buscar o ar. – Sempre veja... O lado bom... Assim como lhe falei... A vida... – ela tossiu. – A vida é muito curta... Meu amor... – ela tossiu mais forte e seu peito chiava com mais força, o grito no fundo de sua garganta sem forças para sair. tremia e as lágrimas o cegavam, mas em nenhum momento ele desgrudou suas mãos da garota. – Eu sempre... Vou te amar... Por toda... Eternidade... Onde quer que eu esteja... Eu te amo. – ela finalizou e passou a respirar com mais força, buscando o ar que parecia não querer chegar. começou a se desesperar.
- Hey!!! – ele chorava, a voz trêmula e entrecortada. – Olhe para mim, , olhe agora! Não faça isso comigo! – ele faltou alto e a garota tinha os olhos se fechando por vários espaços de segundos. As mãos dele seguravam o rosto frio dela com força. – Não durma, olhe para mim, agora! – ele falou e a menina arregalou os olhos, tentando manter o olhar em foco. – Eu te amo! Não se atreva a me deixar para trás, . Você não tem o direito!
E então ele a beijou. Os lábios da menina pareciam pedras de gelo, mas mesmo assim ele não se importou com nada mais, apenas entreabriu os lábios dela com sua língua e tratou de beijá-la. O ar que ele respirava era jogado para dentro da boca da menina e ele achava que com isso poderia fazê-la melhorar da falta de ar, mas foi quando os lábios dela se moveram e um suspiro alto tomou conta do quarto, o aparelho apitou.
Os batimentos da garota se reduziram a uma linha verde fina e reta e o número zero passou a aparecer na tela em grande destaque. O barulho infernal do aparelho denunciava que a garota estava morrendo.
- ! – ele gritou, mas antes que pudesse fazer outro movimento, uma leva de médicos entrou com pressa dentro do quarto, empurrando-o para longe.
- Com licença, rapaz. – o médico falou afobado afastando o garoto histérico da cama de . O menino chorava, mas via a movimentação dos médicos ao redor da cama da menina.
Um dos médicos começou a fazer uma massagem cardíaca em , mas a garota permanecia mole e desacordada. Ambos faziam outros processos para ressuscitá-la, mas tudo piorou quando o médico ordenou que trouxessem o aparelho de choque. arregalou os olhos para a cena e tudo parecia girar. Ele não conseguia acreditar que estava morrendo. AQUELES MÉDICOS PRECISAVAM TRAZÊ-LA DE VOLTA.
- Você! – o médico apontou para o menino. – Vá para a sala de espera. Não pode ficar aqui.
- EU NÃO VOU SAIR DAQUI! – ele gritou desviando-se do enfermeiro que se aproximou dele. – ELA É MINHA VIDA, EU NÃO POSSO FICAR LONGE DELA.
- Não temos tempo! – uma médica falou e não se pôde fazer mais nada além de preparar o aparelho e tentar ressuscitar . – Carga, se afastem! – a média exclamou e viu o corpo de levantar e bater na cama com força. O aparelho era forte e tinha uma carga potente por demais. – Outra vez! Carga! – a mulher exclamou e fez mais uma vez o processo, o corpo de batendo com mais força. – Não podemos perdê-la, pessoal. Vamos novamente. Carga! – e com outro pulo, tudo foi feito.
não voltou.
A doutora passou a mão pela testa e suspirou, balançando a cabeça negativamente e todos os médicos se calaram.
- Ela se foi. – decretou e os médicos se aproximaram do corpo morto da menina, ambos formando um círculo em volta. – A perdemos para este mundo, mas a ganhamos para o céu. Hoje, segunda-feira, às 14h45min da tarde o céu recebeu uma nova flor. . – todos os médicos depositaram um carinho nos poucos cabelos da menina e olharam para . – Venha se despedir dela. – a médica lhe estendeu a mão.
O garoto estava paralisado, estático. Não conseguia mover-se nem um centímetro. Foi necessário que os médicos o ajudassem a se aproximar da cama. Ali, olhando a única garota de sua vida morta, ele não aguentou. Um grito rasgou sua garganta e seu corpo desabou por sobre o corpo gelado de . A dor em seu peito era mais forte do que qualquer coisa que ele havia sentido na vida e ali ele pôde ver o quanto a dor de perder alguém que se ama era forte. Suas lágrimas caíam pela pele da menina e seu choro aumentava conforme ele percebia que ela não estava mais ali.
- Não... – ele falava e podia sentir um afago em suas costas provindo de algum médico. – Você não pode me deixar. VOCÊ NÃO PODE! , NÃO PODE! – ele segurava o rosto da menina em suas mãos, apertando, achando que aquilo a faria voltar. – OLHA PRA MIM, VOCÊ NÃO MORREU, EU NÃO ACREDITO NISSO!
Mas a garota não se mexeu. O peito não mexia mais, os olhos estavam fechados, os lábios maltratados estavam fechados e o nariz não inflava respiração. Ela havia mesmo morrido.
- Avise os parentes. Teremos de preparar os papéis do óbito. – a médica falou para o mesmo médico de antes e se virou para . – Vamos, querido. Nada pode ser feito.
- EU NÃO QUERO ME AFASTAR DELA!
E foi com mais um puxão que ele se descontrolou. Porra, ele queria ficar ao lado de , será que eles não entendiam isso? Foi quando ele relutou mais uma vez, causando estardalhaço nos aparelhos do hospital que vibraram com sua raiva que sentiu uma agulha espetar seu braço e sua consciência falhar.
A última coisa que ele viu foi o corpo morto de ser coberto com o lençol azul do hospital e toda a realidade passar diante de si: ela havia ido embora.
O celular em suas mãos era utilizado de cinco em cinco minutos no intuito de pelo menos tentar se comunicar com . Há duas semanas completas a garota não lhe dava notícias, não atendia o celular, não respondia suas mensagens e isso preocupava seriamente o garoto alvo de grandes olhos . Por muitas vezes se pegava recapitulando as atitudes com a menina, tentando ver se havia feito alguma coisa errada, alguma coisa que poderia magoá-la, mas nada lhe denunciava uma atitude drástica de sua parte, afinal, na última vez que havia se encontrado com , os dois passaram a tarde inteira agarrados se amando como nunca antes. Se lembrava perfeitamente de como ficara confuso com a declaração suspeita da menina.
Flashback on
O quarto de estava abafado por conta do calor que envolvia os dois corpos repousados na cama de solteiro no meio do cômodo e o casal tentava procurar a respiração que estava perdida por entre os gemidos do prazer que acabaram de sentir um com o outro. Os cabelos de estavam grudados em suas costas e os de moldavam sua testa, cravando na pele alva. Os lábios do garoto eram esmagados constantemente por seus dentes e a garota, repousada em seu peito, respirava ruidosamente. Era possível ouvir o barulho que o peito da garota fazia, buscando o ar com força para dentro do corpo.
-Está bem, ? Está conseguindo respirar direito? – ele perguntou estranhando a falta de ar da menina. Estavam ali há uns cinco minutos enquanto tentavam acalmar seus corpos e ele achava estranho a garota ainda estar suando e respirando com dificuldade.
- Eu... – ela ofegava com força. – Estou bem. Eu... Tô bem. – ela respirou fundo, ficando parada em seu colo por um momento até soltar o ar novamente.
- Está suando frio. O que está sentindo, me diga! Eu te machuquei? – ela negou, prontamente. – Então o que está acontecendo?
Demorou alguns segundos até ela erguer a cabeça na direção dele e ele conseguir enxergar os olhos vermelhos pelas lágrimas que corriam velozes por seu rosto. Tomou um susto ao ver a menina chorando.
- Mas o que foi? Por que está chorando, meu amor? – ele perguntou desesperado, secando as lágrimas dela com precisão. Ela mordeu o lábio inferior com força, ainda respirando com dificuldade e o encarou com as lágrimas escorrendo por seu rosto pequeno.
- Eu te amo mais do que tudo. – ela sussurrou, a força em sua voz estava pouca, mas não conseguiu pensar em mais nada além das palavras dela.
- Eu também te amo. Mais do que jamais amei alguém na vida. - ele depositou um selinho seguido de uma mordida nos lábios dela. – Mas eu não entendi o por que de você estar chorando, amor. Se tudo foi bom pra você, por que está chorando?
- Eu quero que você saiba... – a voz dela falhava um pouco, mas ainda assim era audível. – Que independente do que aconteça... – ela se esforçava para dizer aquelas palavras, o choro já começando a ficar mais forte. – Você foi a única pessoa que eu amei de verdade. Se algo acontecer comigo, quero que saiba que eu sempre vou te amar. – e então ela chorou. A força do choro surpreendeu por um momento, mas ele viu ali que a garota estava com algum problema e mais do que tudo queria descobrir o que era. Mas mudando completamente o rumo de suas preocupações, ele viu que o que ele poderia fazer de melhor àquela hora ela amar da forma como ele sempre quis amar alguém: com sentimento verdadeiro e único.
- Não importa o que aconteça. Eu sempre vou te amar, . Uma das coisas que mais vale a pena é amar e eu escolhi te amar. – ele olhava no fundo dos olhos dela, contemplando a garota ainda chorar com força enquanto assentia.
Palavras não precisavam ser ditas, muito menos elaboradas. O que reinava ali era o sentimento, o sentimento mais puro que há no mundo. O amor verdadeiro entre duas pessoas que escolheram o destino certo: amar sem receber nada em troca além de... Amor.
Flashback off
não podia deixar de assumir que aquela súbita crise de choro de fora no mínimo... Estranho. Foi a primeira vez que ele apareceu na casa da menina e logo depois desse dia a garota sumiu. Conheceu a mãe da garota, o pai e ambos foram realmente simpáticos com ele, tratando-o bem como nunca. Mas mesmo assim a garota sumiu e por mais que tentasse ligar não conseguia. Não queria aparecer na casa da garota de surpresa, mas tudo o levava à essa opção. Tendo o apoio de sua mãe naquela decisão, ele viu que não poderia esperar mais tempo algum se quisesse realmente saber o que havia acontecido com sua garota.
Não demorou muito a colocar uma roupa qualquer naquela manhã de segunda-feira e sair em direção à casa de . O dia estava frio e provavelmente a semana inteira seria nublada e sombria, pois o inverno estava se aproximando cada vez mais. O vento batia com força contra sua pele e ele se arrependeu de não ter colocado uma jaqueta mais grossa. Caminhava em passos firmes até chegar ao quarto quarteirão de distância de sua casa e avistar a casa amarelo bebê onde morava com seus pais. A rua estava deserta, pois eram apenas sete horas da manhã e muita gente provavelmente estaria dormindo ou até mesmo trabalhando. Temia chegar muito cedo à casa da garota e acabar acordando alguém, mas sempre acordava esse horário, então estava tudo bem.
Parou em frente à porta, respirou fundo, contou até três e bateu na porta torcendo que alguém estivesse acordado. Os pés tamborilavam o chão em ansiedade e ele sentia seu coração bater com força. Não iria aguentar se a menina terminasse com ele. Poderia ser isso, afinal, ela havia sumido há tempos e não dava nenhuma notícia. Ele não via outra alternativa a não ser a que ela simplesmente queria terminar com ele.
- Pois não? – uma mulher de cabelos castanhos abriu a porta e encarou com os olhos curiosos, porém muito inchados. não conhecia aquela mulher e por um momento pensou que, em sua afobação, havia errado de casa.
- Ahn... Eu... – ele se esquivou para ver o número da casa e concluiu que era mesmo a casa de , afinal, o número era o mesmo e a cor das paredes também. – Eu estou procurando por . Ela mora aqui, não mora?
- ? – a mulher tomou um espanto. – Mora sim, mas... Quem é você?
- Eu? Eu sou o namorado dela, . – nessa hora batia o pé insistentemente no chão tentando disfarçar sua ansiedade. – E a senhora? Não a conheço.
- Namorado? – a mulher arregalou os olhos. – Eu... Eu... – ela gaguejava e uma de suas mãos coçou a cabeça, em claro sinal de nervosismo. – Eu não sei o que...
- Dyana! – uma voz conhecida falou pelas costas de e o garoto se virou reconhecendo a silhueta de Jamie, a mãe de , e Alexander , o pai da garota. Ambos os adultos estavam cansados, bolsas roxas grandes abaixo dos olhos e o corpo curvado para frente, em sinal de extremo cansaço. A beleza da mãe de estava desgastada, os cabelos sem vida e a pele pálida, junto aos olhos vermelhos de lágrimas. O pai da garota tinha a posição mais firme, porém era denunciável a forma como ele estava perturbado com algo. – ?
- Ahn... Olá, Sra. . Eu... A senhora está bem? – ele virou o olhar para o pai de . – Sr. .
- . – ele cumprimentou e sua voz saiu menos grossa, dando lugar a claro embargo.
- Ah, . – Jamie se aproximou do menino, os lábios presos aos dentes e os olhos vermelhos tomando uma tonalidade mais potente, o que denunciava um possível choro. – , eu... Eu nem sei como olhar para você...
- O que houve, Sra. ? – o garoto perguntou confuso. – Onde está ? Eu vim aqui atrás dela, há tempos ela não me retorna uma ligação, não me dá uma notícia... Estou preocupado.
A mulher deu um suspiro forte, olhando para o marido, para a mulher desconhecida chamada Dyana e, enfim, olhou . Uma lágrima desceu pelo rosto da mulher e a expressão se contorceu numa tortura visível.
- Nós precisamos conversar, . Você precisa saber de umas coisas.
Pareceu que alguma coisa entrou por sua garganta e se alojou ali, dificultando sua respiração. não sabia explicar, mas o que ele sentia naquele momento era completamente diferente do que ele já havia sentido em seus vinte e um anos de vida. Era como se o mundo fosse explodir no momento em que a mãe de falasse o que tinha pra falar. Ora, a mulher estava claramente perturbada e com certeza se relacionava com .
- Que coisas? – ele perguntou, engolindo em seco.
A mulher suspirou, tocando as costas do menino fazendo com que ele a acompanhasse e entrasse na casa. A mulher de cabelos castanhos saiu disparada na frente, se postando ao lado do sofá enquanto Jamie se aproximava com e o marido em seu encalço. Sem delongas, fez o menino se sentar enquanto seu marido sentava na poltrona em frente ao sofá e ela se sentava ao lado do garoto atônito e nervoso.
- Dyana, prepare um chá de camomila, por favor. Traga-o bem quente. – a mulher assentiu correndo até a cozinha e a fitou até virar-se para a mãe de . – Dyana é minha irmã, tia de .
- Desculpe Sra. , mas eu gostaria de saber o que está acontecendo. – o garoto falou, nervoso. – Eu estou percebendo algo muito estranho aqui e sinto que estou por fora. – a mulher suspirou, engolindo o choro. Respirou e inspirou várias vezes, os olhos fechados, até tomar coragem e encarar o menino.
- Querido, o que eu vou te falar aqui não vai ser fácil. – ela segurou a mão do menino entre suas mãos frias e suadas. – Eu não sei nem como e por onde começar.
- Sra. , eu não quero ser indelicado, mas eu não estou aguentando mais. – ele falou um pouco mais alto, o desespero tomando conta de suas veias. – Eu quero saber o que aconteceu com ! Por que ela não está aqui? Que diabos está acontecendo que eu não estou sabendo?
Vendo que não teria mais alternativa senão contar a verdade, a mulher apenas fechou os olhos proferindo a realidade atual:
- está com câncer.
Parecia que o mundo inteiro havia caído em suas costas. Parecia que o ar que respirava havia sumido de seus pulmões, esvaindo-se para longe de seu corpo. Parecia que, por um momento, o sentimento de morte que havia sentido quando se afogou na praia quando era pequeno o tomou por completo naquela hora e poderia até arriscar dizer que goles de água salgada entravam por sua boca trancando toda a corrente de ar que deveria sair para mantê-lo vivo. Parecia que toda a cor do mundo havia se dissipado no preto que tornou sua visão a partir do momento em que ele ouviu aquelas quatro palavras saírem da boca de Jamie.
com câncer?
Mas isso só podia ser uma brincadeira de muito mau gosto, não é? Como assim com câncer? Ele ficou com a garota há mais de cinco meses, a conhecia, olhava tudo por ela e nunca percebeu nada. Mas como ela poderia estar com câncer?
- A senhora está de brincadeira, não é mesmo? – ele perguntou assim que encontrou sua voz. Aquilo só podia ser pegadinha. Não pode deixar de sorrir em ironia. – Isso é impossível. Não! Tenho certeza que está brincando com a minha cara. – ele sorria forçado tentando procurar alguma expressão de graça no rosto de Jamie, mas a mulher permanecia séria, as lágrimas descendo pelo rosto. – está aqui, certo? Aposto que ela está no quarto e está querendo me fazer uma surpresa! É bem a cara dela! – ele riu, mas mesmo assim a expressão de Jamie permanecia séria, triste e piorava a cada minuto, pois sua respiração estava por um fio, o que denunciava que iria chorar em breve.
Nessa hora, Dyana entrou na sala de estar com três xícaras fumegantes de chá, entregando uma para , a outra para Jamie e a última para Alexander. Sentou-se na outra poltrona, encolhendo as pernas e passou a fitar com o olhar também sério. O garoto não sabia o que sentia naquele momento, pois tudo parecia um sonho. Aquelas pessoas o fitando com o olhar sério e triste, a falta da presença de naquela casa, os retratos de fotos da garota amontoados num canto ao lado de uma bíblia – algo diferente, pois da última vez as fotos estavam espalhadas por todos os cantos da sala – e a mesma sensação de morte que o tomava por completo.
Aquilo não podia ser verdade.
- Não... – ele sussurrou e logo suas mãos começaram a tremer, fazendo com que o líquido quente do chá caísse em sua calça e queimasse sua pele por baixo do tecido, mas isso pouco o importou. – Não! NÃO! – ele gritou. – NÃO É POSSÍVEL!
Logo, suas mãos tremiam por completo e a xícara de chá já não tinha firmeza sob seus dedos. Dyana correu para acudir o garoto, mas o menino sentia o descontrole tomá-lo por completo. O coração estava sendo esmagado por várias mãos fortes e ele podia até sentir o sangue escorrer, como se fossem faíscas dolorosas do fogo mais ardente. Seus olhos ardiam com força e as lágrimas logo tomaram conta de suas pálpebras e sua cabeça girou em uma rota de trezentos e sessenta graus. Logo, sua visão estava fadada ao breu e gritos tomaram conta de sua audição. Sombras afobadas foram para perto dele e de Jamie e mesmo enxergando mal, ele pôde vera silhueta volumosa do pai de afastar Jamie da sala e as mãos delicadas de Dyana afastarem seu cabelo da testa. Ali ele pôde ver o quanto suava frio e o quanto queria colocar para fora o pouco que havia ingerido naquela manhã. O enjoo que sentia era tão forte que ele teve que segurar firme para não vomitar na sala dos .
Não demorou mais que dois minutos e um pano frio molhava sua testa no intuito de trazê-lo de volta à consciência. Mesmo recobrando a noção das coisas aos poucos, sua mente queria ficar no lugar escuro onde havia se alojado. Ele não queria acordar nunca mais. A realidade agora o atingia como socos, tapas e murros fortes e ele conseguia enxergar a notícia que Jamie havia lhe dado: sua namorada, a única garota a quem se atreveu entregar seu coração, estava com câncer.
Um desespero sem explicação tomou conta dele novamente e ele não conseguia pensar em mais nada a não ser que poderia estar morta aquele momento.
- ELA MORREU? – ele gritou, assustando a mulher que passava um pouco de álcool em suas narinas. – ELA MORREU? ME DIGAM!
- Não. – a voz forte de Alexander falou e ele abriu os olhos, recebendo a claridade da manhã como se agulhas perfurassem seus globos oculares. O homem se aproximou do garoto, ajudando-a se sentar. Mesmo com dificuldade e com a vontade de vomitar ainda presente, sentou-se e respirou fundo, tentando parar com a dor de cabeça e o enjoo infernal. – Mas está por um fio. – o homem falou e baixou a cabeça, olhando o chão.
- Mas que porra é essa, afinal? Eu não consigo acreditar. – as lágrimas tomavam conta de sua face e tudo o que ele queria era acordar daquele pesadelo. – Como assim câncer? Como por um fio?
- Eu vou lhe contar. – o homem falou, respirando fundo. – Mas preciso que fique calmo, . Temos que ser fortes por ela. Ela não quer nos ver sofrendo. – o garoto assentiu, inspirando fundo e soltando o ar aos poucos. – tem câncer de pulmão há um ano. Na família de Jamie há vários casos cancerígenos, é algo hereditário. Viemos descobrir isso quando minha sogra faleceu de câncer intestinal e os médicos fizeram um heredograma constatando o mal. Jamie sempre fez exames importantes e exigia que os fizesse da medida correta para uma adolescente, justamente para prevenir esses tipos de males, mas... acabou contraindo o câncer por conta de células que fizeram muitas divisões e isso ocasionou o alojamento do tumor no pulmão. Não pudemos fazer nada mediante a isso.
O garoto respirava com dificuldade, o tremor um pouco melhor, mas ainda assim insistente. Mas como aquilo?
- Ela pegou o câncer do nada? Somente por conta de células mal divididas?
- Por isso e por outros fatores como agrotóxicos. O câncer é uma doença terrível, . Quando ele é hereditário, a coisa geralmente piora.
- Ela... Ela está no hospital? – ele engoliu em seco.
- Sim. Tivemos de levá-la e ela está lá desde a semana retrasada. No dia seguinte em que vocês se viram, ela passou muito mal. Não tivemos alternativa a não ser levá-la.
mordeu o lábio inferior e mais lágrimas desceram por seu rosto. Foi um dia depois que eles se amaram, que ela lhe prometeu amor eterno. Foi um aviso. A falta de ar era o câncer alojado em seu pulmão, as lágrimas eram a despedida e o amor... Um selo eterno de verdade. Tudo foi uma permissão do destino para que eles se amassem pela... Pela última vez.
- E... E tem alguma chance de ela... Sobreviver? – ele não conseguia pensar na ideia de morrer. Isso estava fora de questão. O pai da garota jogou as costas no encosto do sofá e não conseguiu segurar a emoção. O grande homem deixou que lágrimas seguidas uma da outra banhassem seu rosto e balançou a cabeça negativamente.
- O diagnóstico do médico foi fatal. – ele respirava com dificuldade, certamente conseguindo enxergar a realidade dali para frente. – Ela não tem mais que uma semana de vida.
E isso foi o bastante para o mundo inteiro de desmoronar em milhões de pedaços pequenos. O chão passou a ser um breu sombrio e foi como se ele tivesse caído dentro de um buraco sem fundo. O frio em sua barriga fez com que seu estômago revirasse novamente e tudo o que ele queria era gritar muito alto. A dor física e psicológica o atingia como se várias facas estivessem lhe golpeando com força e seu sangue estivesse jorrando para fora de seu corpo em velocidade alucinante. Sua garganta estava fechada, mas ele não podia deixar de perguntar. Ele precisava saber se não era tarde demais para vê-la.
- Eu... Eu posso vê-la? – a voz estava trêmula e ele sentiu o medo começar a tomá-lo. – Sr. , eu preciso vê-la novamente. Eu não posso deixar que ela... Que ela... Morra... Sem que pelo menos eu a veja novamente. Por favor. – ele implorava.
O rosto vermelho do homem se virou para e o garoto pôde ver o sorriso sincero que o homem deu em sua direção.
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O hospital do centro de Washington era um dos maiores e mais caros da cidade. O prédio era enorme e janelas azuis compunham sua estrutura. Era um lugar bonito, mas toda beleza era dissipada apenas pelo fato de que várias pessoas morriam ali dentro. E isso incluía sua namorada, . A garota estava internada na UTI avançada do hospital e, segundo os médicos, a garota estava em sua fase final. Aquela sala de espera estava o consumindo e não aguentava mais esperar um segundo que fosse. Sua mãe e seu pai estavam junto com ele, lhe dando força e também sentindo a dor de ver uma garota tão nova como sofrer a fase final de sua vida numa cama de hospital enquanto o câncer tomava conta de seu pulmão, lhe impossibilitando de encontrar o ar.
As mãos do garoto eram acariciadas pelas mãos de sua mãe e a mulher fazia um carinho no cabelo do garoto enquanto as lágrimas banhavam seu rosto. Palavras de conforto eram sussurradas e nem com isso se sentia melhor. Não demorou muito tempo até um médico chegar à sala de visitas com os pais de em seu encalço.
- Uma ou duas pessoas de cada vez, tudo bem? – o homem falou e ambos assentiram.
- , vá. – a mãe falou acariciando os cabelos do filho. – Eu e seu pai vamos logo em seguida.
- Não. – o menino decretou e ambos o olharam em confusão. – Eu quero vê-la por último. Vão na frente.
- Mas ...
- Mãe! – ele falou mais alto. – Por favor.
A mulher assentiu e o médico acompanhou os pais do menino até o quarto de UTI onde estava. Foi o tempo que Jamie sentou ao lado de , chorando forte e os gritos da mulher chamavam a atenção das poucas pessoas que estavam ali, atraindo a pena.
- Ela se despediu de nós, . – a mulher falava entre soluços e Alexander tinha a expressão séria, como se fosse capaz de matar alguém. – Ela se despediu! Ela vai nos deixar, ! – a mulher gritava e Alexander saiu de perto, enfurecido. entendia o sogro, afinal, era filha única e eles estavam prestes a perdê-la. O homem andava para lá e para cá enquanto a mulher era abraçada pelo garoto que não sabia o que dizer. O que ele poderia dizer? Também estava perdendo a pessoa que mais amou, a pessoa por quem queria se apaixonar todos os dias, por quem fez a composição mais marcante de sua vida...
A COMPOSIÇÃO!
Como fora se esquecer da música de ? Como não terminou a composição a tempo de mostrar para a garota? A menina estava morrendo e ele ainda nem tinha arranjado a melodia da música e nem sequer terminado de escrevê-la. Era nessas horas que queria se bater e se matar. Porra, como ele esqueceu?
Uma súbita dor em seu peito fez com que a respiração do garoto falhasse e as lágrimas tomassem conta de seus olhos. Ele teria que terminar a música antes que fosse embora! Ele não poderia deixar de mostrá-la a prova de que ele a amaria para sempre, não podia!
- ... – a voz de sua mãe lhe despertou de seu desespero. A mulher chorava forte e ele também podia ver a emoção nos olhos de seu pai. – Ela quer te ver. Vá, meu filho. Se despeça dela.
- ELA. NÃO. VAI. MORRER. HOJE! – ele rosnou e se levantou com raiva, seguindo médico em passos firmes enquanto ouvia as mulheres atrás chorarem.
Foi caminhando pelos corredores até que o médico lhe falou.
- Você tem que ser forte, garoto. Ela está muito mal, não sei quanto tempo pode aguentar. – ele alertou, mas o garoto pouco se importou.
- Eu não acredito nisso. Eu tenho certeza que ela não vai morrer. Eu tenho! – ele falou mais alto e o médico o silenciou.
- Não a deixe nervosa, isso pode piorar o quadro.
- Doutor! Você vai me prometer que vai fazer o impossível pra ela ficar boa. Promete? – ele fitou o homem com os olhos arregalados em nervoso. O homem assentiu, sem pensar duas vezes.
- Esse é o nosso trabalho, menino. Lutar pela vida de um paciente até o fim. Mas se for da vontade de Deus que ela se vá, não podemos fazer mais nada. – o homem colocou a mão na maçaneta da porta. – Entre. De qualquer forma, se despeça dela. Não deixe para amanhã, não sabemos o que pode acontecer quando você for embora.
O garoto suspirou e fitou a porta sendo aberta pelo médico. O homem entrou na frente e de repente sua voz mudou para um tom claramente mais calmo, mais apaziguador.
- ? – ele a chamou. – Tenho uma surpresa para você, meu bem. – o médico sorriu e segurou o braço de colocando-o em frente da garota. O coração do menino batia com tanta força que chegava a doer. – Seu namorado veio lhe ver. Ele estava morrendo de saudades.
E então ele a viu.
O rosto da menina estava pálido, muito pálido. Seus lábios estavam sem cor e machucados, porém as rachaduras também estavam sem cor. Os cabelos estavam poucos, o que denunciava que eles haviam caído muito no tempo em que eles ficaram sem se ver. Isso o fez lembrar-se das vezes em que o cabelo da menina caía em suas mãos e ele achava estranho. Então tudo estava explicado. Viu também a magreza excessiva da menina e concluiu que a garota estava com a pele grudada ao osso, o que doeu muito em seu coração. A mangueira abaixo de seu nariz era transparente e vários fios estavam grudados no peito da garota e em suas veias ela recebia algum tipo de remédio. O quarto recebia apenas a luz do dia, mas ele conseguia enxergar as lágrimas que banhavam o rosto da menina e o estado debilitado dela. Nunca pensara que iria viver para ver daquela forma.
- Vou deixá-los à vontade. – o médico falou. – Não passe nervoso Dona . Você tem que se cuidar para sair dessa situação, ok? – o médico sorriu e olhou sugestivamente para .
Assim que a porta se fechou, voltou seu olhar para a garota e ela baixou os olhos, as lágrimas caindo pelo rosto pálido. Ele se aproximou dela em passos lentos até parar em frente à menina e ali ele pôde perceber como ela se esforçava para respirar. A força que ela aplicava para procurar ar era tanta que chegava a causar desespero nele. O peito da menina chiava com força e estufava para frente como se o coração estivesse quase explodindo dentro do peito. A dor que ele sentiu ao vê-la daquele jeito era forte demais, tanto que ele teve que se esforçar para dizer alguma coisa.
- Então esse é o segredo que você me escondia desde quando nos conhecemos. – ele falou enquanto prendia o choro. Ele não podia chorar na frente da menina. Ele não podia emocioná-la. Ele teria que cooperar para que ela melhorasse. Os médicos não sabiam de nada, ele acreditava na cura.
- Me desculpe. – a voz dela estava rouca e quase não se podia escutá-la. Ela tossiu um pouco, mas isso dificultou ainda mais a respiração dela, o que causou um desespero em ambos, pois a menina passou a puxar o ar com muito mais força.
- Hey! – o garoto se aproximou segurando uma das mãos dela. Estavam geladas como nunca. – Não faça nenhum esforço, meu amor. Respire comigo, olha. – ele mostrou para ela uma forma em como tentar acalmar a respiração. – Puxa o ar com calma, assim... – ele demonstrava e a menina copiava. – Agora solte com calma. Consegue encontrar o ar? Apenas acene com a cabeça. – ela acenou positivamente e voltou a inspirar da forma como havia mostrado. – Isso, minha linda. Não deixe de respirar assim, bem calma. Se você se afobar, pode piorar.
- Mas... – ela voltou a falar e o garoto a impediu.
- Não fale nada. Você vai ficar boa. Eu te entendo, . Eu... Eu não vou sair daqui de perto de você, meu amor. Vou vir todos os dias para lhe ver, todos os dias para te fazer sorrir. E você vai sorrir tanto, tanto que essa doença vai ter que sumir de você, ok? – ela assentiu, respirando com calma, porém ainda forçava muito. – Você é mais forte que essa coisa, . Não deixe que essa doença vença você.
- Não vai. – ela disse e o garoto mordeu o lábio inferior. – Eu... Eu não... Posso. – agora ela respirava com mais dificuldade.
- Shhh, não fale nada. Hey, pare!
- Não. – ela voltou a falar. – Eu quero que saiba... – ela respirava mais forte. – Saiba que... Independente do que... Aconteça aqui... – ela falava pausadamente, tentando buscar o ar. – Sempre veja... O lado bom... Assim como lhe falei... A vida... – ela tossiu. – A vida é muito curta... Meu amor... – ela tossiu mais forte e seu peito chiava com mais força, o grito no fundo de sua garganta sem forças para sair. tremia e as lágrimas o cegavam, mas em nenhum momento ele desgrudou suas mãos da garota. – Eu sempre... Vou te amar... Por toda... Eternidade... Onde quer que eu esteja... Eu te amo. – ela finalizou e passou a respirar com mais força, buscando o ar que parecia não querer chegar. começou a se desesperar.
- Hey!!! – ele chorava, a voz trêmula e entrecortada. – Olhe para mim, , olhe agora! Não faça isso comigo! – ele faltou alto e a garota tinha os olhos se fechando por vários espaços de segundos. As mãos dele seguravam o rosto frio dela com força. – Não durma, olhe para mim, agora! – ele falou e a menina arregalou os olhos, tentando manter o olhar em foco. – Eu te amo! Não se atreva a me deixar para trás, . Você não tem o direito!
E então ele a beijou. Os lábios da menina pareciam pedras de gelo, mas mesmo assim ele não se importou com nada mais, apenas entreabriu os lábios dela com sua língua e tratou de beijá-la. O ar que ele respirava era jogado para dentro da boca da menina e ele achava que com isso poderia fazê-la melhorar da falta de ar, mas foi quando os lábios dela se moveram e um suspiro alto tomou conta do quarto, o aparelho apitou.
Os batimentos da garota se reduziram a uma linha verde fina e reta e o número zero passou a aparecer na tela em grande destaque. O barulho infernal do aparelho denunciava que a garota estava morrendo.
- ! – ele gritou, mas antes que pudesse fazer outro movimento, uma leva de médicos entrou com pressa dentro do quarto, empurrando-o para longe.
- Com licença, rapaz. – o médico falou afobado afastando o garoto histérico da cama de . O menino chorava, mas via a movimentação dos médicos ao redor da cama da menina.
Um dos médicos começou a fazer uma massagem cardíaca em , mas a garota permanecia mole e desacordada. Ambos faziam outros processos para ressuscitá-la, mas tudo piorou quando o médico ordenou que trouxessem o aparelho de choque. arregalou os olhos para a cena e tudo parecia girar. Ele não conseguia acreditar que estava morrendo. AQUELES MÉDICOS PRECISAVAM TRAZÊ-LA DE VOLTA.
- Você! – o médico apontou para o menino. – Vá para a sala de espera. Não pode ficar aqui.
- EU NÃO VOU SAIR DAQUI! – ele gritou desviando-se do enfermeiro que se aproximou dele. – ELA É MINHA VIDA, EU NÃO POSSO FICAR LONGE DELA.
- Não temos tempo! – uma médica falou e não se pôde fazer mais nada além de preparar o aparelho e tentar ressuscitar . – Carga, se afastem! – a média exclamou e viu o corpo de levantar e bater na cama com força. O aparelho era forte e tinha uma carga potente por demais. – Outra vez! Carga! – a mulher exclamou e fez mais uma vez o processo, o corpo de batendo com mais força. – Não podemos perdê-la, pessoal. Vamos novamente. Carga! – e com outro pulo, tudo foi feito.
não voltou.
A doutora passou a mão pela testa e suspirou, balançando a cabeça negativamente e todos os médicos se calaram.
- Ela se foi. – decretou e os médicos se aproximaram do corpo morto da menina, ambos formando um círculo em volta. – A perdemos para este mundo, mas a ganhamos para o céu. Hoje, segunda-feira, às 14h45min da tarde o céu recebeu uma nova flor. . – todos os médicos depositaram um carinho nos poucos cabelos da menina e olharam para . – Venha se despedir dela. – a médica lhe estendeu a mão.
O garoto estava paralisado, estático. Não conseguia mover-se nem um centímetro. Foi necessário que os médicos o ajudassem a se aproximar da cama. Ali, olhando a única garota de sua vida morta, ele não aguentou. Um grito rasgou sua garganta e seu corpo desabou por sobre o corpo gelado de . A dor em seu peito era mais forte do que qualquer coisa que ele havia sentido na vida e ali ele pôde ver o quanto a dor de perder alguém que se ama era forte. Suas lágrimas caíam pela pele da menina e seu choro aumentava conforme ele percebia que ela não estava mais ali.
- Não... – ele falava e podia sentir um afago em suas costas provindo de algum médico. – Você não pode me deixar. VOCÊ NÃO PODE! , NÃO PODE! – ele segurava o rosto da menina em suas mãos, apertando, achando que aquilo a faria voltar. – OLHA PRA MIM, VOCÊ NÃO MORREU, EU NÃO ACREDITO NISSO!
Mas a garota não se mexeu. O peito não mexia mais, os olhos estavam fechados, os lábios maltratados estavam fechados e o nariz não inflava respiração. Ela havia mesmo morrido.
- Avise os parentes. Teremos de preparar os papéis do óbito. – a médica falou para o mesmo médico de antes e se virou para . – Vamos, querido. Nada pode ser feito.
- EU NÃO QUERO ME AFASTAR DELA!
E foi com mais um puxão que ele se descontrolou. Porra, ele queria ficar ao lado de , será que eles não entendiam isso? Foi quando ele relutou mais uma vez, causando estardalhaço nos aparelhos do hospital que vibraram com sua raiva que sentiu uma agulha espetar seu braço e sua consciência falhar.
A última coisa que ele viu foi o corpo morto de ser coberto com o lençol azul do hospital e toda a realidade passar diante de si: ela havia ido embora.
Epílogo
Meu amado ,
Certamente não estarei aqui enquanto está lendo isso. Essa letra não é minha, minha mãe quem está escrevendo para mim. Eu não estou com forças nem para segurar uma caneta, meu amor. Estou sentindo tanta falta de ar e tanta dor que não consigo mais pensar em nada a não ser quando que eu irei embora. Eu não queria te deixar. Eu não queria que nosso tempo juntos se acabasse nem por um decreto, mas... Eu, infelizmente, estou morrendo.
Quero que me desculpe por não ter te contado antes, mas eu não queria estragar nossos momentos de felicidade e amor com tristezas e preocupações como essa doença. Quero que saiba que todos os momentos que eu passei com você foram os melhores, os mais belos e proveitosos momentos que vivi em todos esses dezenove anos de vida. Como eu sempre lhe disse, você me fazia enxergar o lado bom da vida. E eu quero que aplique isso a si mesmo. Eu não estarei pessoalmente com você, mas estarei todo o tempo ao seu lado, te protegendo, como um anjo. Estarei cuidado de você dia e noite e sei que estarei viva dentro do seu coração. Viva a sua vida como nunca, ame, beije, tenha filhos, não se prive de nada. Sei que sempre vai me amar como eu estou te amando daqui de cima.
Você foi uma das melhores coisas que aconteceram na minha vida. Pense em minha morte como algo irrelevante, como se não tivesse acontecido... Como se eu estivesse viajando. Quero que viva a vida sempre vendo o lado bom das coisas, pois foi isso que eu aprendi quando vivemos juntos.
Leve este diário como uma lembrança minha para você e tenha certeza de que eu não morri. O amor é algo que nunca morre, permanece para todo o sempre e até a eternidade. E é essa a dimensão do sentimento que eu sinto por você. Além do infinito.
Da sempre sua primeira em todos os sentidos, .
Era a milésima vez que ele lia aquela carta e relia o diário pessoal de que foi entregue por Jamie. Um mês da morte de haviam se passado e tudo o que ele queria era morrer também. Apenas se sentia bem quando lia as coisas escritas naquele caderno e tudo parecia mudar, pelo menos um pouco, de cor. A ausência de machucava seu peito e ele sentia vontade de gritar. Willian e Thomas lhe davam muito apoio. Logo após da morte de , os garotos vieram para apoia-lo, para reerguê-lo. E isso era tudo o que ele precisava.
Enquanto relia a carta de , ele finalmente havia conseguido terminar a composição. E usou o conselho de como tática para finalizar a canção mais bonita e a melodia mais suave que ele arranjou para a canção.
E ele iria cantá-la para , pois nada era tarde demais para ele.
---
O cemitério estava bem florido e bem cuidado. As flores cheiravam à morte, mas ele não se importava. O seu objetivo era a grande lápide que residia ao alto do monte. O violão estava sendo carregado em suas costas e seus passos estavam firmes e confiantes. Era quase a décima vez que ele ia visitar o túmulo de , mas aquele dia era uma causa especial. Ele iria, finalmente, cantar para ela a música que tanto quis.
Ao chegar, olhou imediatamente a foto de e viu ali como sorriso da menina estaria eternizado em sua mente.
- Hey, meu amor! – ele falou. – Eu voltei e como disse da última vez, trouxe uma surpresa para você! – ele sorriu e se sentou defronte à foto sorridente da menina. – Eu não tive tempo de te mostrar esse presente. Você foi muito apressada e quis me deixar antes de ouvir essa música, mas não seja por isso, minha linda. Eu vim aqui trazê-la para você. – ele tirou o violão da capa. – Eu ia cantar essa música quando completássemos um ano de namoro, mas infelizmente... – uma lágrima desceu pelo rosto dele. – Você se foi. – ele pausou por um momento. – Mas hoje vamos trazer um pouco de alegria para você. Você sabe como eu sempre amei ver você sorrindo, não é verdade? E eu estou disposto a aceitar o desafio que você me impôs. Estou vendo o lado bom das coisas agora e finalizei minha canção com uma letra especial. – ele sorriu. – Eu, finalmente, me convenci de que você não morreu. Você está bem viva dentro de mim. Eu quero esquecer que você morreu, meu amor. Eu quero somente lembrar das coisas boas, do que nós passamos juntos, dos momentos em que nos amamos... Então... Espero que goste dessa canção. Eu a compus com muito amor para você. – ele dedilhou o acorde G (sol) e passou a cantar a música que se eternizaria para todo o sempre em sua vida:
Get Over You (Esquecer Você)
She was looking kinda sad and lonely,
(Ela estava parecendo um pouco triste e solitária,)
And I was thinking to myself if only,
(E eu estava pensando comigo mesmo se apenas,)
She’d give me a smile but,
(Ela me desse um sorriso, mas,)
It’s not gonna happen that way
(Não vai acontecer desse jeito)
So I took it upon myself to ask her
(Então eu me pus na posição de ir perguntar a ela)
Would you like company and maybe after
(Você gostaria de companhia e talvez depois)
We could talk a while but,
(Nós poderíamos conversar um pouco, mas,)
I just don’t know what to say…
(Eu simplesmente não sei o que dizer...)
Coz you’ve got all the things that I want,
(Porque você tem tudo o que eu quero,)
And I just can’t explain so,
(E eu apenas não sei como explicar, então,)
Help me babe, I gotta get over you!
(Ajude-me babe, eu preciso te esquecer!)
Now and then she look in my direction
(Agora e depois ela olha na minha direção)
I’m hoping for a sign of her affection
(Eu estou esperançoso por um sinal de sua afeição)
But she’s in denial and,
(Mas ela está negando e,)
She’s got some worries today…
(Ela tem algumas preocupações hoje…)
But I think if shed’s give me a chance,
(Mas eu penso que se ela me desse uma chance,)
I’ll pleasantly surprise but,
(Eu a iria surpreender com prazer mas,)
Help me babe I gotta get over you…
(Ajude-me babe eu preciso te esquecer…)
She has everything that she wants and,
(Ela tem tudo o que ela quer e,)
I just can’t explain so
(E eu apenas não sei como explicar então,)
Help me babe I gotta get over,
(Ajude-me babe eu preciso esquecer)
Help me babe I gotta get over
(Ajude-me babe eu preciso esquecer)
Help me babe I gotta get over you
(Ajude-me babe eu preciso esquecer você)
Nessas horas as lágrimas invadiam seu rosto e sua voz morreu no último acorde. A foto da menina sorrindo lhe deu a sensação de que ela estava bem ali perto dele. Um vento forte trouxe o aroma das flores para suas narinas, porém um aroma diferente misturado também invadiu seu olfato.
Era o perfume de .
Ali, ele pôde sorrir e ter a certeza de que a garota estava ali ao lado dele e dentro dele assim que o vento tocou seu rosto de leve em uma brisa carinhosa.
- Eu te amo para todo sempre, meu amor. Obrigada por me ensinar a ser feliz. – ele se levantou. – Amanhã eu volto e quem sabe trago alguma música nova para você, ham? – ele acariciou a foto da garota na lápide. – Meu único e verdadeiro amor.
UMA MENSAGEM PARA TODA A VIDA: Muitas vezes a vida nos prega peças e somos obrigados a passar por cima. Mesmo em meio à solidão, temos que ser fortes para seguir em frente e conquistar algo que realmente valha a pena. A tristeza de ficar sozinho em dias difíceis machuca, mas machuca ainda mais quando entregamos o nosso amor a alguém e esse alguém se vai. Mas a lição mais importante que devemos aprender é que nunca é tarde para amar, nunca é tarde para entregar o seu coração àquela pessoa que foi a escolhida para cuidá-lo como o mais puro ouro de ofir.
Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje, pois o tempo passa tão depressa que, quando enxergarmos, pode ser tarde demais. A vida é curta, mas pode ser longa quando é vivida da maneira certa.
S.
Certamente não estarei aqui enquanto está lendo isso. Essa letra não é minha, minha mãe quem está escrevendo para mim. Eu não estou com forças nem para segurar uma caneta, meu amor. Estou sentindo tanta falta de ar e tanta dor que não consigo mais pensar em nada a não ser quando que eu irei embora. Eu não queria te deixar. Eu não queria que nosso tempo juntos se acabasse nem por um decreto, mas... Eu, infelizmente, estou morrendo.
Quero que me desculpe por não ter te contado antes, mas eu não queria estragar nossos momentos de felicidade e amor com tristezas e preocupações como essa doença. Quero que saiba que todos os momentos que eu passei com você foram os melhores, os mais belos e proveitosos momentos que vivi em todos esses dezenove anos de vida. Como eu sempre lhe disse, você me fazia enxergar o lado bom da vida. E eu quero que aplique isso a si mesmo. Eu não estarei pessoalmente com você, mas estarei todo o tempo ao seu lado, te protegendo, como um anjo. Estarei cuidado de você dia e noite e sei que estarei viva dentro do seu coração. Viva a sua vida como nunca, ame, beije, tenha filhos, não se prive de nada. Sei que sempre vai me amar como eu estou te amando daqui de cima.
Você foi uma das melhores coisas que aconteceram na minha vida. Pense em minha morte como algo irrelevante, como se não tivesse acontecido... Como se eu estivesse viajando. Quero que viva a vida sempre vendo o lado bom das coisas, pois foi isso que eu aprendi quando vivemos juntos.
Leve este diário como uma lembrança minha para você e tenha certeza de que eu não morri. O amor é algo que nunca morre, permanece para todo o sempre e até a eternidade. E é essa a dimensão do sentimento que eu sinto por você. Além do infinito.
Da sempre sua primeira em todos os sentidos, .
Era a milésima vez que ele lia aquela carta e relia o diário pessoal de que foi entregue por Jamie. Um mês da morte de haviam se passado e tudo o que ele queria era morrer também. Apenas se sentia bem quando lia as coisas escritas naquele caderno e tudo parecia mudar, pelo menos um pouco, de cor. A ausência de machucava seu peito e ele sentia vontade de gritar. Willian e Thomas lhe davam muito apoio. Logo após da morte de , os garotos vieram para apoia-lo, para reerguê-lo. E isso era tudo o que ele precisava.
Enquanto relia a carta de , ele finalmente havia conseguido terminar a composição. E usou o conselho de como tática para finalizar a canção mais bonita e a melodia mais suave que ele arranjou para a canção.
E ele iria cantá-la para , pois nada era tarde demais para ele.
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O cemitério estava bem florido e bem cuidado. As flores cheiravam à morte, mas ele não se importava. O seu objetivo era a grande lápide que residia ao alto do monte. O violão estava sendo carregado em suas costas e seus passos estavam firmes e confiantes. Era quase a décima vez que ele ia visitar o túmulo de , mas aquele dia era uma causa especial. Ele iria, finalmente, cantar para ela a música que tanto quis.
Ao chegar, olhou imediatamente a foto de e viu ali como sorriso da menina estaria eternizado em sua mente.
- Hey, meu amor! – ele falou. – Eu voltei e como disse da última vez, trouxe uma surpresa para você! – ele sorriu e se sentou defronte à foto sorridente da menina. – Eu não tive tempo de te mostrar esse presente. Você foi muito apressada e quis me deixar antes de ouvir essa música, mas não seja por isso, minha linda. Eu vim aqui trazê-la para você. – ele tirou o violão da capa. – Eu ia cantar essa música quando completássemos um ano de namoro, mas infelizmente... – uma lágrima desceu pelo rosto dele. – Você se foi. – ele pausou por um momento. – Mas hoje vamos trazer um pouco de alegria para você. Você sabe como eu sempre amei ver você sorrindo, não é verdade? E eu estou disposto a aceitar o desafio que você me impôs. Estou vendo o lado bom das coisas agora e finalizei minha canção com uma letra especial. – ele sorriu. – Eu, finalmente, me convenci de que você não morreu. Você está bem viva dentro de mim. Eu quero esquecer que você morreu, meu amor. Eu quero somente lembrar das coisas boas, do que nós passamos juntos, dos momentos em que nos amamos... Então... Espero que goste dessa canção. Eu a compus com muito amor para você. – ele dedilhou o acorde G (sol) e passou a cantar a música que se eternizaria para todo o sempre em sua vida:
Get Over You (Esquecer Você)
She was looking kinda sad and lonely,
(Ela estava parecendo um pouco triste e solitária,)
And I was thinking to myself if only,
(E eu estava pensando comigo mesmo se apenas,)
She’d give me a smile but,
(Ela me desse um sorriso, mas,)
It’s not gonna happen that way
(Não vai acontecer desse jeito)
So I took it upon myself to ask her
(Então eu me pus na posição de ir perguntar a ela)
Would you like company and maybe after
(Você gostaria de companhia e talvez depois)
We could talk a while but,
(Nós poderíamos conversar um pouco, mas,)
I just don’t know what to say…
(Eu simplesmente não sei o que dizer...)
Coz you’ve got all the things that I want,
(Porque você tem tudo o que eu quero,)
And I just can’t explain so,
(E eu apenas não sei como explicar, então,)
Help me babe, I gotta get over you!
(Ajude-me babe, eu preciso te esquecer!)
Now and then she look in my direction
(Agora e depois ela olha na minha direção)
I’m hoping for a sign of her affection
(Eu estou esperançoso por um sinal de sua afeição)
But she’s in denial and,
(Mas ela está negando e,)
She’s got some worries today…
(Ela tem algumas preocupações hoje…)
But I think if shed’s give me a chance,
(Mas eu penso que se ela me desse uma chance,)
I’ll pleasantly surprise but,
(Eu a iria surpreender com prazer mas,)
Help me babe I gotta get over you…
(Ajude-me babe eu preciso te esquecer…)
She has everything that she wants and,
(Ela tem tudo o que ela quer e,)
I just can’t explain so
(E eu apenas não sei como explicar então,)
Help me babe I gotta get over,
(Ajude-me babe eu preciso esquecer)
Help me babe I gotta get over
(Ajude-me babe eu preciso esquecer)
Help me babe I gotta get over you
(Ajude-me babe eu preciso esquecer você)
Nessas horas as lágrimas invadiam seu rosto e sua voz morreu no último acorde. A foto da menina sorrindo lhe deu a sensação de que ela estava bem ali perto dele. Um vento forte trouxe o aroma das flores para suas narinas, porém um aroma diferente misturado também invadiu seu olfato.
Era o perfume de .
Ali, ele pôde sorrir e ter a certeza de que a garota estava ali ao lado dele e dentro dele assim que o vento tocou seu rosto de leve em uma brisa carinhosa.
- Eu te amo para todo sempre, meu amor. Obrigada por me ensinar a ser feliz. – ele se levantou. – Amanhã eu volto e quem sabe trago alguma música nova para você, ham? – ele acariciou a foto da garota na lápide. – Meu único e verdadeiro amor.
UMA MENSAGEM PARA TODA A VIDA: Muitas vezes a vida nos prega peças e somos obrigados a passar por cima. Mesmo em meio à solidão, temos que ser fortes para seguir em frente e conquistar algo que realmente valha a pena. A tristeza de ficar sozinho em dias difíceis machuca, mas machuca ainda mais quando entregamos o nosso amor a alguém e esse alguém se vai. Mas a lição mais importante que devemos aprender é que nunca é tarde para amar, nunca é tarde para entregar o seu coração àquela pessoa que foi a escolhida para cuidá-lo como o mais puro ouro de ofir.
Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje, pois o tempo passa tão depressa que, quando enxergarmos, pode ser tarde demais. A vida é curta, mas pode ser longa quando é vivida da maneira certa.
S.
FIM!
Nota da autora: eu tenho coragem de apostar que muita gente quer me matar agora, não é mesmo? HAHAHAAH eu aposto que simmmm! Cara, eu tenho que dizer que essa fic acabou comigo também! Eu chorei rios de lágrimas escrevendo essa história e tenham certeza de que doeu muito. Não é fácil matar um personagem em uma história, justamente alguém tão bonitinha como a PP dessa história. Mas o que é a vida sem emoção, não é mesmo? Espero que me perdoem por esse final, mas pensem: eles continuaram se amando para sempre, gente! Tem coisa mais bonita do que um amor de verdade? Mesmo que a morte venha para alguém, o amor permanece vivo, pois o amor é a coisa mais importante. Não levem para o lado ruim a temática da fic, apenas sintam a essência do amor como algo importante para se viver bem, okay? Okay!
Quero deixar aqui um obrigada à Mari Monte que aceitou betar essa fic com todo o amor e carinho. Minha beta estava ausente do site e mesmo assim a Mari se ofereceu com toda a dedicação possível. Mari, sucesso para você, obrigada por me ouvir em meus momento de “quero desistir desse ficstape”, obrigada por me apoiar e ser uma amiga que eu descobri ser uma das melhores!!! Um obrigada também às minhas queridas amigas que leram Get Over You enquanto eu estava desesperada hahahaah Malu, Vanessa B., Luana N., vocês são demais! Não sei como viveria sem vocês! Quero também deixar especial um beijo enorme para a Kals (I’ll Be Okay) que fizemos essa fic em parceria. Mas como assim em parceria? A fic dela tem quase a mesma temática da minha, uma história se superação, de amor além da vida e isso tornou Get Over You e I’ll Be Okay parceiras hahahaha obrigada por tudo Karinão, você é demais!!!!
Quero agradecer brevemente também aos organizadores desse ficstape por terem permitido que eu participasse. Uma grande honra fazer parte desse cast maravilhosos de autoras geniais! Obrigada também à todos os membros do grupo Histórias da Jullya Silva que fazem a diferença com todo o carinho e também agradecer por todos que acompanham minha longfic, Just Like Animals! Isso é mais do que eu sonhei!
Um beijo grande e até o próximo ficstape/att de JLA!
Me contem tudo o que acharam dessa short <3
Outras Fanfics:
Just Like Animals (Longfic/Em Andamento) – Restrita
Psychology of Sex I (Shortfic) – Restrita
Psychology of Sex II (Shortfic) – Restrita
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