Capítulo Único
Coluna de Contos
Novembro de 2027
Me chamo, Eva Beatriz de Souza, tenho 36 anos e vou lhes contar a história de Marcos e Amália.
Seria um dia comum como todos os outros na vida de Marcos, pegaria o ônibus até o centro de Fortaleza, caminharia algumas quadras para então começar seu dia de trabalho, em uma lojinha que vendia quadros, no verão em época de férias o trabalho dobrava, pois a loja ficava movimentada por procura de quadros com as paisagens locais, itens de decoração. Mas aquele dia, estava marcado para ser diferente. Marcos como sempre, entrou no ônibus, pagou sua passagem e procurou um lugar para se sentar ou um lugar que fosse o mais confortável possível para permanecer o caminho em pé. Foi passando seus olhos pelos lugares e pessoas que ele, a viu. Seu cabelo era castanho e ondulado, vestia uma blusa de renda, e uma saia de crepe rodada, foi o que ele conseguiu ver. Fez um esforço para passar entre as pessoas para chegar mais perto daquela garota que ele não conseguia desviar sua atenção, conseguiu ficar mais perto, havia duas pessoas entre eles, ela olhava para janela fixamente, parecia que estava em outro mundo, às vezes sorria pequeno, o que será que passava em sua mente? O ônibus parou no sinal e ela olhou para o seu lado direito, onde Marcos se encontrava. Marcos sustentou o olhar em direção a ela, que envergonhada o desviou, mas algo em Marcos havia despertado sua curiosidade, fazendo a olhar em sua direção novamente, sorriu e voltou a olhar para a janela. Marcos estava a perceber que sua estação estava próxima, mas ele queria saber quem era aquela garota dos olhos cor de mel, e quando o olhou corou levemente. Daria um jeito com o patrão depois, iria segui-la e ver aonde ela ia, o que faria. Ela acabou descendo quatro estações depois e Marcos desceu também. Observou ela de longe, não queria assustá-la e a viu sentar em um dos bancos da pracinha. Será que esperava alguém? Um namorado, talvez? Resolveu se aproximar discretamente, disfarçando coincidência e sentou-se ao seu lado.
- Oi. – Marcos disse e rapidamente procurou algo para olhar, achou o pipoqueiro mais adiante e o observou servir algumas pessoas.
- Falou comigo? Ah, é... Olá. – a garota respondeu.
- Perdoe-me o atrevimento, mas te achei linda! – Marcos não costumava ser assim tão direto, mas aquela garota o havia despertado algo especial.
- Obrigada. – a garota de cabelos castanhos agradeceu o elogio e se acomodou melhor no banco, parecendo nervosa.
- Me chamo Marcos Antônio e você?
- Amália. – ela sorriu.
- Acho que estou parecendo um maluco, não? – perguntei e virei em sua direção, seus olhos eram encantadores.
- Talvez um pouco. – ela disse.
- Seria muito intrometido de minha parte perguntar o que uma moça tão bonita faz aqui sozinha? – Marcos perguntou e sorriu na tentativa de ganhar mais a confiança de Amália.
- Seria sim, pois não o conheço. – Amália respondeu, receosa. Seu rosto angelical escondia uma personalidade forte. – Mas, respondendo sua pergunta, estou esperando uma amiga, iremos ver um emprego em uma loja de artesanatos.
- Uma garota decidida, gostei. Seria atrevido se te convidasse para sair? Ir ao cinema, passear no parque?
- Sim, seria. Como disse não o conheço, Marcos Antônio.
- Posso te oferecer uma pipoca?
- Sim.
- Doce ou salgada?
- Salgada, por favor. – e lá estava aquele sorriso em seus lábios, Marcos amou o sorriso de Amália.
- A propósito, me chame só de Marcos. – ele disse ao se levantar para ir até o pipoqueiro.
- Bom dia! Por gentileza, quero dois pacotinhos de pipoca salgada. – Marcos pediu ao chegar à carrocinha.
- Claro, meu jovem. Tentando conquistar a bela moça? – o pipoqueiro simpático perguntou enquanto enchia o primeiro saquinho de pipoca.
- Sim. Mas acho que meu charme e simpatia não estão a convencendo a me dar uma chance. – Marcos disse e olhou para Amália que mexia em sua bolsa.
- Acredite, meu rapaz. Ela gostou de você. – o pipoqueiro sorriu e terminou de encher o segundo saquinho e estendeu os mesmos para que Marcos os pegasse.
- Escute. – Marcos virou-se para o pipoqueiro e dando dois passos em direção a ele. – Como sabe que ela gostou de mim?
- Experiência de um velho pipoqueiro que constantemente vê casais apaixonados sentarem nesses bancos. Vocês têm algo em especial. Boa sorte, filho.
Marcos assentiu e voltou para onde Amália estava o esperando.
- Chegou à pipoca quentinha! – Marcos disse ao se sentar ao lado de Amália.
- Hm, parece boa! Obrigada. – Amália pegou a pipoca e a provou fazendo uma careta engraçada ao provar. – Que foi? – perguntou ela ao perceber que Marcos a observava.
- Nada, só estou admirando a vista. Acabou de fazer uma careta engraçada e adorável. – Marcos disse em um tom completamente encantado.
- Isso foi um elogio?
- Acho que sim. – Marcos respondeu e Amália gargalhou. Marcos achou o som adorável, como a careta que ela havia feito segundos atrás.
Estavam conversando quando outra garota chegou do outro lado da rua, colocou as mãos na cintura e chamou por Amália.
- Tenho que ir, minha amiga chegou. Obrigada pela pipoca e pela companhia. – Amália sorriu e levantou-se do banco.
- Espere! – Marcos a puxou pelo pulso a fazendo o olhar para ele. – Vou te ver outra vez?
- Quem sabe? Talvez. – Amália disse e sorriu novamente.
Marcos ficou olhando a se distanciar com a amiga, quando iam virar a rua Amália virou o rosto para atrás e sorriu para ele, seu coração se aqueceu imediatamente. Marcos olhou no relógio e se deu conta que precisava ir correndo pro trabalho e dar uma ótima desculpa ao seu chefe pelo imenso atraso.
Marcos havia descido no mesmo ponto que Amália naquele dia, se deparou com a praça, com o pipoqueiro e sorriu ao relembrar do sorriso de Amália. Decidiu se apressar e achar a tal loja de artesanato. Perguntou para o pipoqueiro, mas ele não soube lhe dizer, perguntou algumas pessoas, até que uma lhe indicou uma que ficava a duas quadras dali. Marcos agradeceu a informação e com o coração batendo um pouco mais rápido de ansiedade seguiu caminho até a tal loja. Procurando por cada parte das ruas ele encontrou uma lojinha, na faixada estava o nome: Dona Bernê Artes, riu do nome, mas achou bem criativo, talvez a dona se chamasse Bernadete. Marcos respirou fundo e atravessou à rua, seu coração agora sim batia descompassado e ele torcia fielmente que Amália estivesse trabalhando ali. Ao entrar na pequena loja viu muitas coisas artesanais e materiais para os trabalhos manuais. Olhou para os lados para encontrar a íris cor de mel que o tanto intrigavam, mas nada.
- Boa tarde, posso lhe ajudar? – perguntou uma mocinha que ele reconheceu na hora. Era a amiga de Amália.
- Só estou dando uma olhada. Obrigado. – Marcos respondeu educadamente.
- Se precisar, estarei ali no balcão. – ela apontou em direção ao móvel e se retirou.
Antes mesmo que Marcos pudesse perguntar sobre Amália, ele escutou um resmungo atrás do utensilio que hospedava as toalhas de mesa enroladas por metros. Deu um passo para espiar e então ele a viu. Estava tentando cortar um tecido. Marcos achou adorável ver aquela careta surgir no rosto dela, talvez essa seja uma característica dela, uma forma de expressar.
- Precisa de ajuda? – Marcos disse e Amália deu um passo para trás de surpresa. – Oi.
- Você? Como me encontrou? Está me seguindo ou quê? – Amália perguntou ao se recompor do breve susto.
- Ei, calma. Eu só queria te ver e lembrei que disse que tentaria uma vaga em uma lojinha de artesanato e como desceu na praça, deduzi que a loja ficaria nos arredores e então achei, te achei. – Marcos se aproximou sem desviar seu olhar de Amália, pegou sua mão, levou até seus lábios e no dorso de sua mão depositou um beijo suave e logo depois sorriu. Amália o olhava com admiração e aquilo o aqueceu por dentro.
- Parabéns por sua esperteza, Marcos Antônio. – Amália disse e voltou para sua posição ereta e impermeável.
- Então... Pode sair para um café? Tem uma cafeteria perto daqui. E me chame só de Marcos, já lhe disse.
- Porque eu deveria aceitar tomar um café com um cara que mal conheço? Aliás, não conheço. E qual o seu problema com seu nome? – Amália disse e ergueu uma sobrancelha em indagação.
- Deveria aceitar para me conhecer e assim não seria mais um estranho. E não tem problema nenhum com meu nome. – Marcos abriu seu melhor sorriso em tentativa de fazer Amália aceitar seu convite.
- Boa resposta, Marcos Antônio. Está bem, tenho meia-hora. – Amália sorriu e se encaminhou para o balcão para avisar a amiga que iria sair, mas logo voltaria.
A cafeteria ficava pertinho, em cinco minutos eles chegaram. Marcos escolheu uma mesa que ficasse bem visível, nunca permitiria que pensassem mal dos dois, estavam ali como amigos e com sorte se tornariam mais que isso.
- Café extra forte? – Marcos perguntou assim que os pedidos foram entregues na mesa.
- Sim. Café pra mim tem quer assim, forte e docinho. – Amália sorriu e desviou a atenção para o açucareiro e assim adoçar o café. – E com acompanhamento de um prato com quatro bolinhos de chuva? Quer melhor que isso? – ela tomou um gole de seu café. – Delicioso. Café com leite? – perguntou a Marcos que também adoçava o seu café.
- Mais leite que café, nada forte, nada escuro, igual o seu. – Marcos deu uma piscadela e fez Amélia rir. – Me conte de você, o que gosta, o que assiste....
- Hm... – ela fez outra de suas expressões engraçadas ao pensar no que responder. – Agora trabalho oito horas por dia, com algumas horas extras, claro. E no meu tempo vago, leio. E você? Costuma perseguir garotas que não conhece sempre ou..?
- Seu senso de humor é maravilhoso, sabia? – ele disse e riu, Amália permaneceu com a mesma expressão, esperando sua resposta. – Trabalho assim como você, com a diferença que a loja onde trabalho vende quadros e não artesanatos. Nas horas vagas ouço programas no rádio.
- Rádio novelas? – Amália tinha um riso contido ao perguntar.
- Talvez. – ele respondeu e ela sorriu balançando a cabeça negativamente achando ele engraçado.
- Não me respondeu.
- O quê?
- Segue sempre garotas por aí?
- Não. Mas tem três dias que eu adotei esse hobby. Conheci a mais bela moça dessa cidade e não consigo esquecer ela por nada. – Marcos disse e pegou a mão de Amália.
- Boa resposta, Marcos Antônio. – e lá estava Amália com aquele olhar admirado que aquecia o coração de Marcos de um jeito tão bom que ele queria sentir aquela sensação para sempre, se possível.
- Você sabe que eu te amo? – Marcos perguntou para Amália que estava com a cabeça baixa, ele ergueu seu rosto segurando seu queixo com o dedo indicador para que ela tornasse a olhá-lo nos olhos como segundos atrás.
- Sim. – Amália disse baixinho, seus olhos estavam mais lindos ainda, como se um brilho novo passasse por eles. Marcos sorriu ao imaginar que ele seria o causador disto.
Marcos se aproximou devagar do rosto de Amália que fechou os olhos no mesmo instante. Por um segundo Marcos parou para olhar o rosto de sua amada, gravar cada detalhe em sua memória, seria sua mais bela memória na velhice. Delicadamente, para não assustá-la, tocou seus lábios com os seus, e aquela conhecida sensação de se sentir completo e renovado tomou seu ser por completo. Era um beijo doce, o primeiro beijo dos dois, a primeira vez que Marcos sentia o gosto de sua doce e impaciente Amália. O beijo não durou muito, pois poderiam ser pegos e aquilo daria uma dor de cabeça danada, mas durou o tempo exato para ser inesquecível.
- Sabia que eu te amo também? – ela disse ainda com os olhos fechados. Estavam com as testas coladas, sentindo o amor pairar no ar, envolvendo cada parte daquele jardim.
- Meu amor o que faz aí? Trouxe para você! Suas preferidas. – Marcos correu de encontro a Amália e lhe deu o buque. – Está tudo bem?
- São lindas, obrigada. Vem, vamos sentar ali. – Amália apontou um banquinho que era um balanço. Marcos sorriu ao lembrar-se dos beijos que havia roubado dela quando Pedro se distraia de vigiá-los.
- O que está acontecendo? Onde estão seus pais? E Pedro? Não entendo. – Marcos tinha o cenho franzido, o semblante confuso.
- No aeroporto, me esperado.
- No aeroporto? Te esperando? Como? Por quê? – Marcos da aflição passou a sentir um desespero com o que aquela situação podia representar.
- É isso que está pensando. Vamos embora. Lembra da minha tia que mora fora? – Marcos assentiu. – Então, ela conseguiu um emprego para papai onde meu tio trabalha. E como você sabe, papai é de origem inglesa e sabe o idioma perfeitamente. Vamos morar lá. – Amália disse e seus olhos marejaram.
- Mas assim de repente? E seu emprego aqui? Seus estudos? Por Deus, Amália! – Marcos levantou-se nervoso.
- Minha vida será lá, agora. O voo sai em três horas. – Amália deixou escapar uma lágrima solitária que dilacerou o coração de Marcos.
- Está me deixando, é isso? Acabando do nada? – o silêncio de Amália eram as respostas. As quais lhe doíam cada parte de seu corpo. – Eu tinha te comprado isso. – Marcos tirou a caixinha do bolso e quando Amália colocou os olhos nela, mais uma lágrima se fez presente em seu lindo rosto. – Ia pedi-la em casamento. – Marcos que nunca foi de chorar, estava cedendo ao seu coração em pedaços e ali em frente de sua amada lágrimas molhavam seu rosto.
- Marcos, meu Marcos. – Amália dizia enquanto com o dedo polegar fazia um carinho na bochecha dele. – Me perdoe, mas é melhor assim. Do que estragarmos esse amor tão rico, tão bonito, com a distância, com futuras desconfianças, ciúmes.
- Por que às vezes é tão negativa? Podemos dar um jeito, meu amor! Sempre há um jeito. – ele a pegou nos braços e apertou em um abraço carregado de medo de perdê-la.
- Nem sempre, me desculpe. – Amália o abraçou de volta com força. – Desde que eu te vi, mesmo com toda essa pose de durona, eu sabia, era você. Era quem chegaria e bagunçaria toda minha vida planejada, viraria um mundo certinho do avesso. Eu te amei desde o primeiro instante, eu te amo a cada segundo e vou te amar pra sempre. E é por tudo isso que quero parar por aqui, enquanto somos nós dois, enquanto o amor é sólido, enquanto há o nosso infinito. – Amália se desvencilhou dos braços de Marcos e o olhou nos olhos. – Em nossos corações, nunca terá fim.
- Você já sabia que iria embora? – Marcos perguntou quase em sussurro.
- Não, mas ouvia conversas de meus pais sobre isso. Mas preferi me fazer de desentendida, porque sabia que isso significaria, me separar de você. Mesmo te amando com todas as forças do meu coração.
- Eu vou com você, a gente casa e depois vai embora. Por favor, temos que tentar! – havia um tom de súplica na voz de Marcos, mas Amália estava decidida que seria melhor para os dois.
- Não. Acha que não sei de seus planos de ser pintor? Trabalhar na loja de quadros despertou seu dom. E sei também que foi aceito na faculdade de artes plásticas, não pode jogar as coisas para o alto por mim.
- Posso sim! Amália, eu te amo, eu preciso de você. – Marcos a olhou profundamente nos olhos e a beijou. Queria poder convencê-la naquele beijo, um beijo com todo amor que possuía no peito por aquela mulher.
- Sabíamos que nossas vidas eram diferentes, Marcos. E enquanto pudemos fizemos de nossas diferenças, nossas semelhanças. Vai achar alguém que possa dividir todos esses sonhos com você, vai te amar como eu gostaria de amar e cuidar. – Amália tinha a expressão mais triste que ele já havia presenciado dela. Sua doce Amália.
- Mas eu quero você. – Marcos a abraçou novamente. Mas enfim compreendendo que tinha que respeitar a decisão dela, por mais que aquilo doesse. – Fica com o anel. Fique com um pedaço do nosso infinito. De alguma maneira eu estarei ao seu lado. – Amália assentiu, fungando.
- Tome, é o meu pedacinho de infinito pra você. – Amália tirou do bolso do casaco um colar que ela costumava usar, tinha um pingente de uma gota d’agua.
- Você sabia que eu te amo? – ela perguntou.
- Sim. E eu te amo mais do que eu sequer possa explicar um terço. – Marcos respondeu.
- Boa resposta, Marcos Antônio. – Amália ficou nas pontas dos pés e beijou Marcos, o último beijo antes de cada um seguir com suas vidas. Eles se separaram ao ouvirem o som de uma buzina, era um táxi. Era chegada a hora. - O meu coração estará pra sempre atado ao seu. E nossa história será lembrada até o fim de meus dias. – Amália apertou a mão de Marcos e lhe deu um beijo pequeno nos lábios.
- Um infinito dentro nós. Minha doce Amália. – Marcos fechou os olhos como se aquilo fosse desfazer a dor que o consumia. Ao abrir os olhos viu sua mão se soltar da mão de Amália, que virou-se e seguiu para o táxi. Sua última lembrança foram os olhos cor de mel de Amália se afastando.
O infinito é para sempre, independente do rumo das coisas.
Eva Beatriz de Souza, para coluna de contos.
Até o próximo conto, leitores.