Última atualização: 30/11/2018

Capítulo Único

Três batidas na madeira escura e um arfar cansado de ha parte, mas eu não podia ir embora sem falar com ele.
, abre a porta — pedi pela décima vez. — Por favor.
Pela mesma quantidade de vezes o escutei dizer do outro lado da porta que nos separava:
— Vá embora, , eu não quero te ver agora.
Isso estava me machucando, nunca ele havia se recusado a isso, mas hoje eu sei o porquê, sei porque de sua voz me atender alegre quando ligava para ele e o chamava para ir comigo em qualquer lugar que fosse, sei porque de quando o flagrava me olhando, ele desviava o olhar rapidamente para qualquer outro local, envergonhado por ser visto. Eu não podia ir embora e o deixar ali, porque agora eu sei qual o motivo dele abrir aquela maldita porta e me receber com um sorriso acolhedor todas as vezes que eu resolvia passar em sua casa depois do trabalho.
Agora eu sei de tudo; eu gostava da companhia dele e ele gostava de mim.
, por favor, vamos conversar ― forcei a maçaneta, inutilmente, sabia que ele deveria ter passado dos os trincos existentes do outro lado.
Eu gosto de você.
Ele havia dito isso com um sorriso tímido em seus lábios horas atrás. Seu olhar cheio de expectativa por ha resposta e eu apenas consegui rebater com um sorriso de deboche que ele estava louco, mas era que estava a ha frente.
Eu estava saindo do trabalho quando o vi sentado na recepção do edifício, me aproximei perguntando se algo grave havia acontecido, porque eram raras as vezes que ele ia me encontrar no escritório, sempre com a desculpa de que não queria incomodar com coisas bobas ou me prejudicar, já que a empresa era linha dura com algumas regras, então, se estava ali, devia ser um assunto sério, e era, para ele, mas eu não tratei como deveria e depois percebi, era sério para mim também.
, eu realmente gosto de você, muito. Suas bochechas estavam vermelhas.
Esmurrei a porta.
, estou implorando ― falei com a voz alterada, tanto pela raiva, quanto pelo nó em ha garganta que clamava para ser liberto e eu o segurava, me recusava a chorar e fazer uma cena patética no corredor do apartamento dele. ― Por favor.
Eu achei que tudo era uma brincadeira do mais novo, porque nos tratávamos como apenas amigos, não haviam nada de insinuações e nem algo que desse indicio de tal sentimento, mesmo depois de saber da orientação sexual de cada um, nada tinha mudado entre nós.
Ou era o que eu achava.
se confessou para mim e eu não acreditei, ele insistiu e quando percebi que ele estava sendo sincero em suas palavras, se abrindo como nunca antes, confiando no ser medíocre que eu era e querendo ficar comigo, ele queria ficar comigo.
O que mais eu poderia pedir da vida depois disso? Absolutamente nada.
Perguntas de por que ele achava que vou ia relacionar com um cara igual a ele saíram de meus lábios, vi seus olhos escurecendo e prossegui dizendo que não poderia arriscar tudo o que tinha por causa dele, meu emprego dependia de um status que eu tinha que manter. Meus pais esperavam um filho que os orgulhasse, que fosse estável e resolvido, mas também esperava por algo e o único que não merecia o pior de mim foi quem o recebeu.
Qual o seu problema?. Questionei me afastando de seu toque.
Eu devia perguntar qual é o meu problema, que merda eu tenho no lugar de meu cérebro para agir como um completo idiota. Ele se confessou e eu o humilhei.
O vi respirar fundo, limpando a única lágrima que transbordou por seus olhos tomado pela tristeza.
Parabéns a mim por conseguir afastar o único que se importava comigo de verdade, o único que me escutava reclamar de tudo e de nada, meu melhor amigo, o único que confiava em mim o bastante para contar seus segredos e que guardava meus sonhos mais loucos. O único que teve coragem de se aproximar do verdadeiro eu.
, eu vou por essa porta a baixo se não a abrir ― ameacei e bati com vigor sobre a madeira algumas vezes com o punho fechado.
Só notei que o meu sentimento em relação a ele era reciproco quando o vi se distanciar e sumir por entre as pessoas que transitavam pela avenida que nos encontrávamos.
Eu superei os limites dos limites de ser um imbecil.
Dei dois passos para onde ele havia ido, eu iria atrás dele, mas meus pés paralisaram sobre o concreto da calçada, meu lado racional me paralisou no lugar e me levou a refletir sobre o que eu perderia e o que eu ganharia essa noite, tudo dependia se eu o seguia ou se eu voltava ao meu plano original que, consistia em rumar para ha casa, tomar um banho e me isolar do mundo, afim de esquecer o dia exaustivo que tive. O bom cargo que eu ocupada pedia por um excelente funcionário e eu me empenhava para ser o merecedor de tal, mas agora, vendo ir embora e a última memória que eu tinha dele e era seu semblante doloroso, tudo perdia a cor, o interesse...
Era por ele que eu conseguia me manter firme e focado no que eu deveria fazer? Percebi nesse momento que sim, era por causa dele.
A excelente empresa também era extremamente tradicional, com regras arcaicas, avaliavam o funcionário por suas atitudes e não o profissionalismo. O sim para ele, era o não para ha carreira, sorri triste, ele não sabia disso e eu julguei desnecessário o contar, se soubesse, jamais teria feito o que fez e eu nunca sairia da zona de conforto que entrei.
O dia estava quase cedendo sua claridade para a noite, as luzes da rua se acendiam e eu permanecia no mesmo lugar, preso em meus pensamentos que seguiam em uma única linha. Eu tinha que ir até ele. E eu fui.
― Eu estou querendo dormir, , vá embora ― sua voz abafada respondeu do outro lado.
...
Não concluí ha frase, engoli o restante de has palavras ao ouvir algum objeto, provavelmente de vidro, se estilhaçar dentro do apartamento. Encostei ha testa na porta que me separava dele e no silencio de um início de madrugada, o escutei chorando; meu coração se desfez em dor e angustia, eu era o culpado por cada lágrima que ele derramava, eu era o ser, infeliz e rabugento, que debilmente recusou o remédio para suas feridas. Eu era o responsável por tirar o sorriso dos lábios de .
― o chamei, os soluços dele foram a resposta de que estava me escutando. ― Eu... Eu sinto, sinto muito.
O ar a ha volta foi ficando tenso, pesado e o que eu puxava para meus pulmões não era o bastante, me agachei, meus olhos não conseguiam mais controlar a ha frustração e elas vertiam em lágrimas arrependidas por eu ser um monstro.
― Você é meu melhor amigo e eu falhei com você ― prossegui, incerto do que dizer, porém, sentia a necessidade de continuar, talvez no final fizesse algum sentido tanto para ele, quanto para mim. ― Essa não foi a primeira vez e eu sei que não será a última que vou acabar ferrando com tudo, eu estou perdido aqui, porque em todas as outras vezes que fiz alguma merda, você estava comigo, mesmo com meu péssimo humor, as vezes me irritando com seu falatório de que eu estava errado, mas você estava lá, com um sorriso compreensível, você não é só meu amigo.
Me via como uma pessoa sem emoções, por que quem se importava com elas? Não havia ninguém que se preocupava em como eu me sentia em relação a algo.
— Eu sei que nunca fui muito útil para a vida de ninguém — disse confessando algo que nunca havia dito em voz alta, mas ele sabia como eu me sentia. — Mas você fazia parecer que eu era necessário.
O choro do moreno havia cessado, eu respirei fundo, eu queria di uir aquela dor, que eu também sentia, mas não me importava com meu estado, ele poderia nunca mais falar comigo que eu entenderia depois de hoje, eu merecia estar quase sufocando em meu próprio padecimento, entretanto, não, então, de alguma forma, eu iria a fazer isso desaparecer.
― Eu estou mal, , mas não é pelo que falou, mas por ha atitude com você, a dor que vi em seus olhos mais cedo, eu tive a chance de a impedir, mas não a usei, disse coisas horríveis a você, posso dizer que foi pelo susto do momento inesperado de sua confissão, eu fiquei surpreso, contudo, não justifica como eu agi... ― eu comecei a me atropelar nas palavras, fechei os olhos, uma prece silenciosa para que ele entendesse o significado de tudo isso. ― Agora, pensando, talvez fosse meu inconsciente tomando o controle te defendendo de mim, de alguma forma, eu mesmo te protegendo do horror que sou, , eu não mereço alguém igual a você.
A porta se abriu de uma só vez, o encarei com os olhos inchados, tanto quanto os meus deveriam estar. Me ergui rápido e ignorando a tontura do ato, o abracei, firme e tentando me convencer que não estava delirando.
...
― Eu gosto de você também ― disse, atrelado em volta de meu pescoço.
Era um ótimo emprego, mas pesando tudo o que eu deveria priorizar, não tinha discussão, era mais importante para mim que qualquer cargo, status ou expectativas de terceiros, eu me sentia evoluído ao ter ciência do quanto sentimentos são valiosos, os meus e de quem eu desejo que seja feliz.




Fim.



Nota da autora: Eu não sou de escrever muito slash, yaoi e afins, mas como estava com essa ideia guardada e pouco tempo para escrever, resolvi aproveitar essa lindeza!





Outras Fanfics:
06. Run
01. Singularity
18. A Supplementary Story: You Never Walk Alone
Dependente
Garoto de aluguel


comments powered by Disqus