Capítulo Único
- Então é verdade que você ainda está aqui? - null falou assustando null que saia do grande prédio comercial.
- E onde mais eu estaria, null? - null a cumprimentou com um beijo no rosto e caminhou com ela até o carro, eles tinham o costume de ir juntos para a universidade.
- Consigo listar alguns. - ela respondeu deixando claro que sua opinião sobre ele continuar trabalhando na sociedade de advogados do pai dele.
- Eu não tenho escolha… - ele respondeu num tom visivelmente frustrado.
- Sempre tem, null. Você só precisa ser corajoso o suficiente. - null provocou o melhor amigo e riu. - Você cursa música, null! Ser estagiário do seu pai não faz o menor sentido.
- Talvez eu devesse mudar de curso e fazer direito assim como meus irmãos. - ele devolveu e embora fosse em tom de brincadeira, null levou a sério.
- Talvez você deva pensar mais antes de falar uma asneira dessa! - ela deu um tapa na coxa dele. - Só não bato mais porque corro o risco de bater o carro! - disse quando ele riu do tapa dela.
- Eu estou só brincando, null. É temporário, só até eu conseguir algo para me manter melhor e lá eu consigo o dinheiro.
- Sua mãe não queria isso para você, null… - os dois ficaram em silêncio por algum tempo e logo ela estacionou na porta da universidade e se virou para ele, que continuava olhando fixamente para frente. - Eu sei que seu pai não entende isso, não vê um futuro na música e que seus irmãos foram moldados para seguir o caminho dele, mas você respira música e é ótimo nisso e eu não vou deixar você desistir.
Vendo que ele não ia dizer nada, pegou sua mochila e saiu do carro. null fez o mesmo e os dois caminharam em silêncio até a lanchonete, sempre comiam algo antes da aula.
- Se eu soubesse que ia ficar com esse clima de velório, nem teria falado nada. - null deu uma mordida no seu sanduíche natural.
- Claro que teria. Me diga uma vez que você conseguiu ficar com essa língua dentro da boca e guardou seus pensamentos só para você. - null a desafiou com um sorriso esperto no rosto e ela riu.
- É, eu teria falado mesmo. - deu de ombros. - De qualquer forma eu tenho uma surpresa pra você. - ele a olhou desconfiado. - Queria te falar só no final de semana, mas como você acabou de dizer, eu não consigo não falar. - ela riu e entregou um envelope a ele.
Ainda desconfiado null abriu o envelope e retirou o papel lá de dentro.
“Parabéns, null Forster!
Você foi aprovado na pré-seleção da primeira temporada de ROCKSTAR, e está convocado para a audição que será realizada no próximo dia 20, no endereço abaixo, em Las Vegas. Estamos ansiosos para tê-lo no programa…”
- O que é isso? Eu nem mesmo me inscrevi, como posso ter sido aprovado? - null revezava o olhar entre o papel em suas mãos e a amiga.
- Talvez eu tenha feito a sua inscrição e mandado um vídeo seu se apresentando… - ela sorriu.
- E aí, galera? O que é isso? - null pegou o papel das mãos de null e leu. - Que maneiro, cara! Por que não me contou que ia se inscrever? - se sentou junto com os amigos na mesa.
- Porque eu não me inscrevi, foi a null. - deu de ombros sem pensar exatamente como se sentia sobre isso.
- Eu ia justamente conversar com vocês sobre isso. - null abriu a mochila e tirou uma ficha de inscrição para um programa de competição de dança. - Estou pensando em participar. A inscrição é até amanhã.
- Já imaginei vocês voltando para cá como campeões! - null bateu palmas animada.
- Não acho que consiga vencer, mas o prêmio é bem tentador. - null fez um high five com a amiga. - E de qualquer forma acho que já seria algo bom para colocar no currículo, uma experiência única.
- Com certeza! - null se levantou pegando sua mochila. - Já estou atrasada! - resmungou conferindo as horas no celular. - Boa aula para vocês. - e saiu apressada pelos corredores.
- Ela deve ser a única aluna desta universidade que faz questão de chegar na hora da sala de aula. - null pegou o resto do sanduíche que null tinha deixado na embalagem e mordeu.
- null gosta de ser a preferida dos professores, acho que ela quer conseguir estágio com algum deles. - null terminou o seu lanche.
- É, não sei porque ela foi escolher arquitetura! Podia ter escolhido algo legal como música ou educação física. - null deu um empurrãozinho no amigo enquanto andavam até as respectivas salas de aula.
- null, você vai mesmo se inscrever? - null questionou antes que ele subisse mais um lance de escadas.
- Acho que sim, não tenho nada a perder. - deu de ombros e subiu correndo.
…
- null, eu não quis te pressionar a nada te mostrando a carta, tá? - null voltou ao assunto assim que estacionou na garagem de sua casa. - Eu sei que não devia ter feito sua inscrição sem falar com você, eu só queria saber se você seria aceito e quando foi eu achei que não seria justo não te mostrar. - eles tinham voltado num silêncio totalmente estranho. null com seu jeito estabanado sequer tinha percebido que o clima não era de comemoração quando se encontrou com eles na universidade.
null já tinha passado pelo portão e null o acompanhava para trancá-lo.
- Você iria comigo? - foram as palavras que saíram da boca de null, acompanhadas de um sorriso verdadeiramente feliz que foi acompanhado por um ainda maior por parte de null.
- Achei que nunca ia me convidar! - passou pelo portão e deu um abraço extremamente apertado nele.
- Você iria até sem convite. - ele declarou indo para a casa ao lado.
- Com toda certeza! - e então os dois entraram em suas casas.
null e null eram vizinhos desde crianças, estudavam na mesma escola e por isso se tornaram amigos. Haviam conhecido null no ensino médio e mesmo com personalidades totalmente diferentes, os três se davam superbem.
null morava com os pais, mas desde que seu irmão mais velho havia se casado, mudado e tido gêmeos, os pais, agora aposentados, passavam mais tempo lá do que na própria casa. null era o filho mais novo de três e o único que não tinha interesse em seguir a profissão do pai, o que causava certo estresse pelo menos uma vez por semana.
- Las Vegas, aí vamos nós! - null comemorou empolgada assim que null fechou o porta-malas depois de colocar todas as suas coisas lá e entrou no carro.
Como a audição seria realizada no sábado, decidiram por ir na sexta-feira, contornando qualquer imprevisto que pudesse surgir. De Phoenix a Las Vegas levariam cerca de cinco horas de carro e ela preferia que null pudesse descansar bem antes de se apresentar.
null também havia sido selecionado para a competição e depois da aula de quinta eles saíram para comemorar, a partir daquele momento os dois só se encontrariam depois que os programas acabassem ou que fossem eliminados, e ambos tinham feito uma promessa de saírem campeões, mesmo achando improvável.
…
null estacionou o carro a algumas quadras de distância, pois a quantidade de pessoas ocupando a rua era enorme. Estavam um pouco adiantados e então caminharam tranquilamente enquanto null fazia alguns exercícios vocais com seu violão em suas costas.
Logo que dobraram a esquina já puderam avistar toda a estrutura montada para as audições, vários profissionais com suas câmeras e organizadores separando as pessoas em filas. null pegou o papel de aprovação na etapa anterior e entregou para a moça em sua frente quando sua vez na primeira fila chegou. Após chegar alguns dados no computador e complementar com outras informações ele voltou a ao local onde null o aguardava.
- Comprou um livro no caminho? - ela o zoou vendo a quantidade de páginas que ele tinha nas mãos. - Nunca imaginei que tinha um contrato tão grande… E tem umas partes bem bizarras. - null olhou tentando achar o que ele falava. - Olha essa parte aqui! - ele falou um tom mais alto. - O programa pode inventar histórias sobre você ou te colocar em situações constrangedoras.
- Que estranho…
- Você abre o mão do direito de processá-los por qualquer das coisas inventadas. - null continuou lendo.
- Eu não fazia ideia que tinha isso. - null comentou.
- E para finalizar, ninguém deve saber sobre esse contrato. - ele virou a última página.
- Vai assinar? - null perguntou um tanto incerta.
- Já estamos aqui, não pode ser tão ruim, pode? - deu de ombros pegando uma caneta e assinando o contrato, devolvendo-o em seguida.
A outra fila andava mais rápido, era basicamente para dar o número de inscrição que deveria ser colocado na roupa e explicar que, caso fosse sorteado teria uma filmagem inicial onde ele contaria um pouco sobre sua vida. No entanto, para seu alívio, ele não foi um dos escolhidos.
As audições estavam previstas para durar o dia todo e não seguia a ordem do número da inscrição. Um pouco entediado depois de quase três horas ali, null estava dedilhando coisas aleatórias no violão quando chamaram um grupo de dez pessoas, que o incluía. Seriam os próximos a se apresentarem.
- Os acompanhantes podem esperar nessa próxima sala. - o mesmo rapaz que anunciara os nomes apontou a porta à direita.
- Boa sorte! - null desejou e beijou o rosto do amigo antes de entrar na sala. Era bem simples, algumas cadeiras colocadas em filas e três televisões grandes nas paredes para que pudessem acompanhar o que se passava na sala com os jurados.
- null Forster, você é o próximo. - um outro homem da equipe técnica avisou e ele assentiu. Ajeitou o violão e entrou por onde havia sido indicado, indo logo para a marcação no palco que indicava o lugar em que deveria ficar. Oliver, Richard e Penélope o encaravam.
- Olá! - null disse animado e sorriu, mexendo de leve no cabelo. Não acreditava que estava, de fato, nervoso.
- Oi, querido. Qual o seu nome? - Penélope perguntou de forma amigável. Ela era uma artista impecável na opinião dele, porém torceria para seu mentor ser Oliver se ele fosse escolhido para continuar na competição.
- null Forster. Tenho 23 anos e sou de Phoenix. - respondeu.
- E o qual a sua ocupação? - foi Richard quem perguntou num tom cansado.
- Curso música na universidade estadual e trabalho na firma de advocacia do meu pai.
- Combinação estranha. - Richard falou baixo, mas todos puderam ouvir.
- E por que você quer ser um rockstar? - Penélope voltou a falar.
- Porque música é o que mais faz sentido na minha vida e poder viver disso seria um sonho realizado.
- E qual música você escolheu? - ela questionou.
- Use somebody do Kings of Leon.
- Boa sorte. - ela desejou e null assentiu, começando os primeiros acordes logo em seguida.
Aqueles foram, provavelmente, os quatro minutos mais longos da vida dele, no entanto ele estava satisfeito e terminou com um sorriso no rosto. null tinha o mesmo sorriso ao vê-lo na tela, ela sabia, assim como a mãe dele, que o futuro dele era na música. E o fato de os três jurados estarem aplaudindo só confirmava isso.
- Oliver. - Penélope indicou que ele deveria ser o primeiro a falar e votar.
- Gostei bastante da versão que fez. Adoraria trabalhar com você. Meu voto é sim. - sorriu de volta para null que agradeceu.
- Você tem um vocal forte, porém não deu para saber, por essa música, o seu alcance vocal. - Richard falou e ficou com a expressão pensativa enquanto o encarava. - Acho que só tem uma forma de descobrir, meu voto é sim.
- Parabéns, null! Você tem o meu sim também. - Penélope encerrou a votação. - Nos vemos na próxima fase.
- Obrigado! - ele caminhou até a mesa e apertou, uma a uma, as mãos dos jurados, saindo do local em seguida e encontrando uma null extremamente eufórica e dando pulinhos.
- Eu sabia! Eu sabia! - ela correu e o abraçou.
- Com licença. - uma moça se aproximou juntamente com um câmera. - null, certo? - ele concordou com a cabeça. - Vocês são namorados?
- Não, ela é minha melhor amiga. Por quê? - questionou.
- Ela é sua única acompanhante? - fez outra pergunta ao invés de respondê-lo.
- Sim. - null apenas observava.
- Vamos fazer algumas imagens de vocês então. - a mulher disse simplesmente.
- Agora? - null não via sentido.
- Sim, faremos como se ele ainda não tivesse se apresentado e você mostra seu apoio. - disse simplesmente, guiando os dois para o lado de fora.
- Achei isso uma babaquice! - null reclamou enquanto dirigia a caminho do hotel. - Aposto que vão editar tudo que me fizeram falar e vai parecer que sou apaixonadinha por você. Isso se não colocarem que sou sua namorada, né? - freou no semáforo que acabara de fechar.
- Ah, você bem que queria, pode admitir. - ele a provocou e ela acelerou fazendo com que ele batesse a cabeça no encosto do banco.
- Nos seus sonhos, null. - ela sorriu vitoriosa enquanto ele passava a mão na parte de trás da cabeça.
…
Quinze dias haviam se passado e dessa vez null estava sozinho em Las Vegas. Era a segunda fase e todos os selecionados voltariam a se apresentar duas vezes, primeiramente em um grupo com outros quatro competidores escolhidos pelos jurados e depois sozinho.
O grupo de null era formado por ele, mais um homem e três mulheres, e o primeiro problema veio com a escolha da música. Demoraram um tempo para entrar num consenso e quando finalmente foram ensaiar não ficou bom. Todas as vozes não conseguiam se adequar em um tom e foi preciso repetir o processo algumas vezes até que todos ficassem minimamente satisfeitos.
Foram ousados e escolheram Bohemian Rhapsody do Queen, editando para que ela ficasse mais curta, porém de tamanho suficiente para que cada um mostrasse o seu potencial. null estava ainda mais satisfeito, pois Richard tinha colocado seu alcance vocal em cheque e com essa apresentação ele deixaria claro do que era capaz.
…
null: Hey, eu vou te ligar para contar que fui aprovado. Eles estão filmando, então faça uma voz bastante surpresa!
null: Parabéns! Pode deixar! Hahaha
null: Segundo eles você deve esperar uns três ou quatro toques para dar um suspense…
null: Até isso é controlado?
E então como esperado null atendeu o telefone depois de algum tempo chamando.
- null, eu passei! - contou falsamente empolgado e por alguns segundos tudo que se ouviu foi a gritaria dela pelo viva voz. Ela era boa nisso.
- Não acredito! Parabéns! Estou tão empolgada por você! - continuou num tom de surpresa.
- Corta! - um dos homens falou e pararam de filmar.
- Pronto, já tirei do viva voz. - null falou e riu.
- Sou muito boa atriz mesmo. - se gabou. - Mas me conta, como foi essa etapa.
null contou sobre as duas apresentações, como anunciaram que ele iria para a próxima fase, dos shows ao vivo e que ao contrário do que ele esperava o produtor Richard seria o seu mentor na competição. null ouvia a tudo, atenta, emitindo opiniões a todo instante.
- E quando eu preciso estar aí?
- Você não precisa estar aqui, null. Você tem suas provas… - ela o interrompeu.
- Imagina só você sendo o único participante sem ninguém torcendo por você nos shows, eles com certeza criariam um drama sobre você. Eu vou. Só me fala quando! - e ele sabia que qualquer argumento seria em vão.
- Daqui a 15 dias, mas eu te aviso direitinho depois. Mudando de assunto, teve alguma notícia do null? Ele não respondeu nenhuma mensagem minha.
- Ah, ele teve que deixar o celular! Eu esqueci de te contar, mas é isso. Ele só pode usar o telefone por tempo determinado com supervisão e sei lá mais o quê. - null explicou.
- E eu achando que não devia ter contrato mais estranho do que esse aqui…
- null, você sabe que eu amo falar com você, mas eu realmente preciso continuar estudando.
- Tudo bem, null. Te mando mensagem depois. - ele reforçou.
- Ok. E treine bastante nesses 15 dias porque quero ver um show da sua parte. Beijos.
Durante as duas semanas que se passaram null se recusou a dar qualquer informação sobre sua apresentação o que deixava null ainda mais curiosa. Estava quase pulando sentada no auditório esperando a vez de ele se apresentar. A produção a havia conduzida para o local exato onde ela deveria se sentar durante a apresentação dele e então após uma vinheta que mostrava como havia sido as semanas de treinamento antes daquela apresentação ele estava no palco.
null não conseguiu disfarçar a expressão surpresa e talvez até de desapontamento com a apresentação. Não que null não estivesse fazendo uma boa apresentação, muito pelo contrário, sua voz parecia ainda melhor do que ela estava acostumada, mas aquele não era o estilo de música dele, como também não era o de roupas. Ela não saberia dizer se a música era de Justin Bieber ou Justin Timberlake, mas ela sabia que não era um rock, e mesmo que estivesse com seu violão durante toda a apresentação, aquele não era ele.
Incrivelmente os dois não puderam se encontrar e conversar pessoalmente e tiveram que se contentar em trocar mensagens. No entanto, nenhum dos dois teve coragem de dizer o que realmente havia achado da apresentação. null continuava repetindo para si que aquela era uma oportunidade em um milhão e que ele não podia desistir de cara só porque algo não saiu conforme ele pretendia.
No dia seguinte null já tinha retornado para casa, era o dia dos resultados e ela conseguia enumerar pelo menos três apresentações que com certeza foram ruins e por isso sabia que null estaria a salvo nessa primeira semana. Assistiu pela televisão quando Goo Goo Dolls foi anunciado e cantaram duas das suas músicas favoritas e deram algumas dicas para os participantes da competição antes de o apresentador retornar anunciando que já tinha os resultados da noite anterior.
null estava mordendo o lado interno da boca de nervoso. Imaginava como o amigo estaria. Primeiro foi anunciada a garota que deveria deixar a competição imediatamente. Era uma das que null não tinha gostado e ela deixou o palco aos prantos. Agora, um a um eram anunciados os que passariam para a próxima semana. null foi o terceiro nome a ser chamado, e apesar de não serem chamados em nenhuma ordem de classificação, os dois sentiam um misto de felicidade e alívio.
A preparação para o próximo dia de shows ao vivo começou cedo para null e todos os outros competidores que estavam no grupo de Richard. Ele entregou um envelope para cada um dos participantes com a música que havia escolhido e null não conseguiu disfarçar a expressão de insatisfação. Ele conhecia a música, mas novamente aquilo não tinha nada a ver com o tipo de artista que ele era e com o tipo de música que ele queria fazer.
Ele tinha a segunda-feira para ensaiar sozinho e no dia seguinte se reuniria com seu mentor para os primeiros conselhos e adaptações. Voltou para o quarto e pegou seu violão, abriu novamente o envelope e leu She moves in her own way do The Kooks. Ele conhecia a música, podia alterar a batida e deixá-la com mais cara de rock como havia feito para a primeira semana, mas um pensamento de que estava sendo sabotado começou a rondar sua mente. Aquela música não era famosa, não era o estilo dele e todos os outros sob a supervisão de Richard pareciam satisfeitos com a escolha feita para eles.
- Bom dia, Richard. - o cumprimentou fechando a porta atrás dele.
- Bom dia. Vamos ver como está sua apresentação até agora. - falou sem humor e permaneceu sentado no sofá com uma cara de poucos amigos.
- Richard, eu queria conversar com você sobre a escolha da minha música. - tinha chegado a conclusão na noite anterior que podia até mesmo fazer parte de um teste e que ele não perderia nada em expor seus pensamentos. - Eu entendo que você deve ter escolhido essa música por um motivo, mas… - foi interrompido.
- Se entende que eu tive um motivo por que está questionando? - Richard devolveu com a mesma expressão de antes.
- Porque não tem a ver com o null artista que está nessa competição. Nickelback, Daughtry ou Creed se encaixariam bem melhor.
- Acho que entre nós dois eu tenho infinitamente mais experiência nesse ramo do que você. Você acabou de citar três bandas com exatamente a mesma sonoridade, ser só mais um não fará de você campeão. É preciso mostrar versatilidade.
Pelo silêncio que se seguiu, null entendeu que não teria outra música e ajeitando o violão tocou por duas vezes seguidas a música.
- Faça uma vez sem violão. - Richard pediu e embora relutante, entregou o violão para a produção.
Era estranho ter somente o microfone no pedestal, era como se faltasse alguma roupa, mas null cantou novamente.
- Certo, a sua voz e o arranjo ficaram bons. Fez um bom trabalho. Nos próximos dias quero que trabalhe com os coreógrafos. Chame o próximo quando sair. - Richard despejou todas as informações e só voltou a olhá-lo quando viu que null continuava parado em sua frente.
- Coreógrafos? - perguntou um tanto confuso. Ele não dançava.
- Sim, você ficou parecendo uma estátua parado aí. - explicou num tom cansado. - Vamos tirar esse pedestal e sem o violão você vai precisar se mexer pelo palco, interagir um pouco.
null pegou seu violão antes de deixar a sala e foi direto para o gramado de fora da casa que estavam. Pegou seu telefone e ligou para null, esperando que ela não estivesse ocupada.
- Hey, que surpresa! - ela atendeu feliz.
- Oi, null. - pelo tom de voz dele, ela percebeu que algo não estava certo.
- O que foi, null? Está tudo bem? - perguntou preocupada.
- Não exatamente. - suspirou andando o mais longe que podia para ninguém o ouvir. - Acho que não pertenço aqui. - a frustração era clara na voz dele.
- Como assim? O que aconteceu? - ela odiava quando ele não ia direto ao ponto, dava tempo de ela pensar mil coisas só de ansiedade.
- Você gostou da minha apresentação no fim de semana? - ela foi pega de surpresa com aquela pergunta, afinal tinha ficado feliz de não precisar respondê-la com medo de ferir os sentimentos dele. - Seja honesta, por favor.
- Eu gostei, null. Não era nada do que eu esperava, eu confesso. Mas não quer dizer que tenha sido ruim.
- Eu não gostei. - null confessou. - Nem mesmo assisti para ver como tinha sido. Não teve nada a ver com o meu som, não teve nada a ver comigo.
- E você tentou falar com eles?
- Sim, é por isso que estou te ligando. Fui completamente ignorado. A dessa semana é uma escolha tão estranha quanto a anterior. - suspirou frustrado. - Não sei até que ponto vale a pena.
- Eu não vou dizer para você desistir, null. Da mesma forma que não pedi para você ir. São escolhas que tem que partir de você, e eu te apoiarei independente de qual seja ela. - null amava a calma que o invadia sempre que conversava com ela.
- Me sinto mal por estar considerando a hipótese de dispensar uma oportunidade dessas. - sua mente tinha dois pensamentos contrastantes, e mesmo distante era como se null pudesse lê-los.
- Mas ser quem você não é também te faz mal, null. - ele riu fraco.
- Você estará aqui na próxima apresentação?
- É o meu plano. A menos que você mude de ideia. - deixou claro que o apoiava totalmente.
- Vou esperar até a próxima semana, aproveito para amadurecer os pensamentos. - era uma decisão que seu cérebro aprovava.
- Então te vejo em quatro dias. - despediram e desligaram.
Imediatamente null correu para o guarda-roupa e pegou uma caixa de papel na última prateleira. Pegou o envelope que estava por cima, a carta que a mãe de null havia deixado com ela para que ela entregasse quando achasse necessário. Para ela esse era o momento.
O ensaio com os coreógrafos não era um pesadelo como null tinha imaginado, ele não iria dançar. Como Richard tinha falado, era só para se soltar e ter uma presença de palco maior, se movimentar mais e criar uma intimidade maior com o público. Praticou durante todos os dias dando o seu máximo, estava satisfeito, tinha feito um bom trabalho com o que lhe fora dado.
Sábado chegou, o dia de apresentações. null foi o último a subir ao palco, o que fez com que a sensação de sabotagem voltasse a ocupar sua mente. Pela reação da plateia, sabia que não tinha sido ruim, só esperava que fosse o bastante para não ser eliminado na segunda semana.
Com a proibição de contato com parentes e amigos, null conseguiu escapar para encontrar a amiga mesmo que por alguns segundos, já que ela havia dito que precisava entregar uma coisa para ele que não poderia esperar.
- Achei que não saberia o momento de te entregar, mas esse parece ser o certo. - e com um abraço apertado eles se despediram e null voltou para a sala onde os outros estavam.
Só então ele olhou bem o envelope que continha apenas o nome dele, mas ele reconheceria aquela letra em qualquer lugar, era da sua mãe. Assim que foi possível ele foi para o quarto e se sentou na cama, sentia muita falta dela. Respirou fundo antes de abrir o envelope e tirar o papel de dentro.
Querido null,
Deixei essa carta com a null por ter certeza que você precisaria de algum conselho meu mesmo que eu não estivesse mais presente. E se esse é o caso, o que tenho para dizer é que você lute para conquistar o seu maior sonho.
Não ligue para o que te disserem, reescreva a sua história quantas vezes for necessário, ilumine seus sonhos, seja eles quais forem.
Você sempre sonhou com música, mesmo que pareça difícil ou complicado, não desista disso. Tenho certeza que você criará o seu próprio legado, independente do seu pai ou seus irmãos.
Crie sim expectativas, mesmo que te digam o contrário. Mire sim nas estrelas e faça o possível para alcançá-las. Procure melhorar sempre!
Mesmo que pareça que você é só mais um, você é um em um milhão!
Tenha esperança e siga seu coração!
Com amor,
Mamãe.
Enxugou o canto do olho quando terminou de ler. Pode ouvir a voz dela em cada uma daquelas palavras, ela sempre esteve ali com ele. Era a força que talvez faltasse para ele tomar a decisão de continuar ou sair dali.
null não estava entre os três piores e por se sentir esperançoso aguardou a nova semana de ensaios. Talvez Richard finalmente o ouvisse e ele pudesse trabalhar com uma música que ele escolhesse.
Estava errado, sua esperança foi por água abaixo com menos de 24 horas. A nova música escolhida para ele era Shape of You do Ed Sheeran. Era uma música ótima, famosa, dava para mostrar sua habilidade no violão, porém continuava não sendo o som dele e ele só conseguia pensar que estavam fazendo de propósito.
Pensou pelo resto do dia e também a noite toda sobre a decisão que estava prestes a tomar, e a cada instante ele parecia mais certo de que era o melhor a se fazer. Ele não estaria desistindo, e sim correndo atrás do seu sonho de verdade. Na manhã seguinte esperou que a produção confirmasse que os três jurados estivessem na sala de reunião e entrou antes que alguém o parasse.
- Bom dia, null. Algum problema? - Penélope questionou com a testa enrugada.
- Nenhum. - respondeu com alívio. - Vim avisá-los que estou deixando o programa.
- No meio da competição? - ela continuava espantada. - É algum problema de família?
- Não, eu só não consigo continuar me forçando a ser um artista que eu não sou. - Richard o interrompeu.
- Se você não aguenta a competição, é melhor sair mesmo. - a acidez nas palavras era perceptível.
- Eu aguento, mas não quero ser reconhecido por algo totalmente diferente do que pretendo fazer. Se por acaso eu ganhasse, não conseguiria me manter com as músicas que você vem escolhendo para mim. - explicou mesmo que não precisasse.
- É realmente uma pena. - Oliver se manifestou. - Penso que poderia ter alcançado grandes feitos na competição. No entanto, compreendo perfeitamente o seu ponto de vista, e te desejo o melhor.
- Obrigado pelas palavras e por essa oportunidade.
O alívio que sentiu foi quase imediato, estava deixando a sala quando sentiu seu celular vibrar e antes de fechar a porta viu que Oliver estava com o aparelho dele em mãos. Era só uma coincidência, não era? Oliver então deu um sorriso discreto e guardou o aparelho.
É preciso muita coragem para fazer o que fez. Se posso dar algum conselho, grave e poste vídeos no Youtube.
null retornou para casa no mesmo dia, durante todo o trajeto de ônibus releu a mensagem várias vezes. Gostava de acreditar que Oliver havia mandado e até fazia sentido. Se ele tivesse sido seu mentor, provavelmente ele ainda estaria na competição, mas não havia arrependimento da parte dele.
No dia seguinte ele postou seu primeiro vídeo e ficou surpreso com as reações positivas que recebeu, o que o incentivou a ser cada vez mais frequente nas postagens. Acatava algumas sugestões nos comentários de outros covers que deveria fazer, e na medida em que sua confiança ia aumentando ele começou a postar vídeos com músicas de própria autoria. Coisa que Richard sequer tinha tido disposição de ouvir.
- Finalmente você apareceu! - null abraçou null que tinha voltado de sua competição quase um mês depois da desistência de null.
- Soube que você desistiu, cara. - foram as primeiras palavras dele a null, enquanto trocaram um cumprimento.
- É, não era pra mim. E você cadê seu troféu? - null devolveu.
- Não ganhei, fui eliminado uma semana antes do top 3. - deu de ombros. - Muita gente talentosa.
- Eu imagino. - null bebeu um pouco do seu milkshake.
- Eu quase saí de lá namorando, pelo menos. - ele contou com um sorriso maior que o próprio rosto.
- Mentira! - null acabou engasgando. - Conta isso direito, null!
- Ela ainda está na competição, mas o contrato idiota não permite esse tipo de interação entre participantes. - explicou.
- Nem me fale em contrato idiota. - null rolou os olhos. - Acredita que ele inventaram o maior drama familiar para justificar minha desistência?
- Pelo menos não inventaram que você teve que ir para reabilitação.
- Não diga uma coisa dessas nem de brincadeira. - null a olhou sério. Isso acabaria com sua carreira antes mesmo que ela começasse de fato.
- Mas por que você desistiu? - null perguntou puxando o milkshake da mão de null.
- Porque o tal do Richard é o maior babaca, que só pensa em vender um artista. - null despejou com raiva.
- Eu não tive liberdade nenhuma, eles montaram o null que eles queriam mostrar. Depois assiste para você ver.
- Pode deixar. - null concordou. - Lá já foi diferente, nós tínhamos que criar tudo e treinar para ficar o mais perfeito possível. Nem achei que chegaria tão longe.
- Eu só quero ver a cara dessa namoradinha que você arrumou, hein… - null bancou a ciumenta.
…
Quase seis meses depois, null acabou se convencendo a também postar trechos das músicas do Instagram, já que muitas pessoas pediam nos comentários para que ele divulgasse a conta. Recebeu muitas DMs logo de cara e era estranho receber tantos elogios de gente de lugares diferentes, mas uma mensagem chamou sua atenção.
“Precisamos de um vocalista para nossa banda.”
A mensagem havia sido enviada por um cara chamado Zach, que era baterista em uma banda de rock que estava a procura de alguém como ele. Tinham acompanhado os vídeos dele por um tempo e gostariam de tentar tocar juntos.
O Instagram de Zach continha vários links para vídeos da banda, eles eram bons, exatamente com a sonoridade que ele sempre sonhara, mas em cada vídeo havia um vocalista diferente. Sem pensar demais, null combinou de encontrá-los em Las Vegas, num estúdio que eles tinham contato, no final de semana seguinte.
A secretária caminhou à frente de null, mostrando para ele o caminho até o estúdio. Bateu na porta duas vezes antes de abri-la e dar passagem a ele. null não acreditou no que seus olhos viam, a banda estava toda ali, mas Oliver também e com um sorriso no rosto falou:
- Eu sabia que isso ia dar certo.
- E onde mais eu estaria, null? - null a cumprimentou com um beijo no rosto e caminhou com ela até o carro, eles tinham o costume de ir juntos para a universidade.
- Consigo listar alguns. - ela respondeu deixando claro que sua opinião sobre ele continuar trabalhando na sociedade de advogados do pai dele.
- Eu não tenho escolha… - ele respondeu num tom visivelmente frustrado.
- Sempre tem, null. Você só precisa ser corajoso o suficiente. - null provocou o melhor amigo e riu. - Você cursa música, null! Ser estagiário do seu pai não faz o menor sentido.
- Talvez eu devesse mudar de curso e fazer direito assim como meus irmãos. - ele devolveu e embora fosse em tom de brincadeira, null levou a sério.
- Talvez você deva pensar mais antes de falar uma asneira dessa! - ela deu um tapa na coxa dele. - Só não bato mais porque corro o risco de bater o carro! - disse quando ele riu do tapa dela.
- Eu estou só brincando, null. É temporário, só até eu conseguir algo para me manter melhor e lá eu consigo o dinheiro.
- Sua mãe não queria isso para você, null… - os dois ficaram em silêncio por algum tempo e logo ela estacionou na porta da universidade e se virou para ele, que continuava olhando fixamente para frente. - Eu sei que seu pai não entende isso, não vê um futuro na música e que seus irmãos foram moldados para seguir o caminho dele, mas você respira música e é ótimo nisso e eu não vou deixar você desistir.
Vendo que ele não ia dizer nada, pegou sua mochila e saiu do carro. null fez o mesmo e os dois caminharam em silêncio até a lanchonete, sempre comiam algo antes da aula.
- Se eu soubesse que ia ficar com esse clima de velório, nem teria falado nada. - null deu uma mordida no seu sanduíche natural.
- Claro que teria. Me diga uma vez que você conseguiu ficar com essa língua dentro da boca e guardou seus pensamentos só para você. - null a desafiou com um sorriso esperto no rosto e ela riu.
- É, eu teria falado mesmo. - deu de ombros. - De qualquer forma eu tenho uma surpresa pra você. - ele a olhou desconfiado. - Queria te falar só no final de semana, mas como você acabou de dizer, eu não consigo não falar. - ela riu e entregou um envelope a ele.
Ainda desconfiado null abriu o envelope e retirou o papel lá de dentro.
“Parabéns, null Forster!
Você foi aprovado na pré-seleção da primeira temporada de ROCKSTAR, e está convocado para a audição que será realizada no próximo dia 20, no endereço abaixo, em Las Vegas. Estamos ansiosos para tê-lo no programa…”
- O que é isso? Eu nem mesmo me inscrevi, como posso ter sido aprovado? - null revezava o olhar entre o papel em suas mãos e a amiga.
- Talvez eu tenha feito a sua inscrição e mandado um vídeo seu se apresentando… - ela sorriu.
- E aí, galera? O que é isso? - null pegou o papel das mãos de null e leu. - Que maneiro, cara! Por que não me contou que ia se inscrever? - se sentou junto com os amigos na mesa.
- Porque eu não me inscrevi, foi a null. - deu de ombros sem pensar exatamente como se sentia sobre isso.
- Eu ia justamente conversar com vocês sobre isso. - null abriu a mochila e tirou uma ficha de inscrição para um programa de competição de dança. - Estou pensando em participar. A inscrição é até amanhã.
- Já imaginei vocês voltando para cá como campeões! - null bateu palmas animada.
- Não acho que consiga vencer, mas o prêmio é bem tentador. - null fez um high five com a amiga. - E de qualquer forma acho que já seria algo bom para colocar no currículo, uma experiência única.
- Com certeza! - null se levantou pegando sua mochila. - Já estou atrasada! - resmungou conferindo as horas no celular. - Boa aula para vocês. - e saiu apressada pelos corredores.
- Ela deve ser a única aluna desta universidade que faz questão de chegar na hora da sala de aula. - null pegou o resto do sanduíche que null tinha deixado na embalagem e mordeu.
- null gosta de ser a preferida dos professores, acho que ela quer conseguir estágio com algum deles. - null terminou o seu lanche.
- É, não sei porque ela foi escolher arquitetura! Podia ter escolhido algo legal como música ou educação física. - null deu um empurrãozinho no amigo enquanto andavam até as respectivas salas de aula.
- null, você vai mesmo se inscrever? - null questionou antes que ele subisse mais um lance de escadas.
- Acho que sim, não tenho nada a perder. - deu de ombros e subiu correndo.
null já tinha passado pelo portão e null o acompanhava para trancá-lo.
- Você iria comigo? - foram as palavras que saíram da boca de null, acompanhadas de um sorriso verdadeiramente feliz que foi acompanhado por um ainda maior por parte de null.
- Achei que nunca ia me convidar! - passou pelo portão e deu um abraço extremamente apertado nele.
- Você iria até sem convite. - ele declarou indo para a casa ao lado.
- Com toda certeza! - e então os dois entraram em suas casas.
null e null eram vizinhos desde crianças, estudavam na mesma escola e por isso se tornaram amigos. Haviam conhecido null no ensino médio e mesmo com personalidades totalmente diferentes, os três se davam superbem.
null morava com os pais, mas desde que seu irmão mais velho havia se casado, mudado e tido gêmeos, os pais, agora aposentados, passavam mais tempo lá do que na própria casa. null era o filho mais novo de três e o único que não tinha interesse em seguir a profissão do pai, o que causava certo estresse pelo menos uma vez por semana.
- Las Vegas, aí vamos nós! - null comemorou empolgada assim que null fechou o porta-malas depois de colocar todas as suas coisas lá e entrou no carro.
Como a audição seria realizada no sábado, decidiram por ir na sexta-feira, contornando qualquer imprevisto que pudesse surgir. De Phoenix a Las Vegas levariam cerca de cinco horas de carro e ela preferia que null pudesse descansar bem antes de se apresentar.
null também havia sido selecionado para a competição e depois da aula de quinta eles saíram para comemorar, a partir daquele momento os dois só se encontrariam depois que os programas acabassem ou que fossem eliminados, e ambos tinham feito uma promessa de saírem campeões, mesmo achando improvável.
Logo que dobraram a esquina já puderam avistar toda a estrutura montada para as audições, vários profissionais com suas câmeras e organizadores separando as pessoas em filas. null pegou o papel de aprovação na etapa anterior e entregou para a moça em sua frente quando sua vez na primeira fila chegou. Após chegar alguns dados no computador e complementar com outras informações ele voltou a ao local onde null o aguardava.
- Comprou um livro no caminho? - ela o zoou vendo a quantidade de páginas que ele tinha nas mãos. - Nunca imaginei que tinha um contrato tão grande… E tem umas partes bem bizarras. - null olhou tentando achar o que ele falava. - Olha essa parte aqui! - ele falou um tom mais alto. - O programa pode inventar histórias sobre você ou te colocar em situações constrangedoras.
- Que estranho…
- Você abre o mão do direito de processá-los por qualquer das coisas inventadas. - null continuou lendo.
- Eu não fazia ideia que tinha isso. - null comentou.
- E para finalizar, ninguém deve saber sobre esse contrato. - ele virou a última página.
- Vai assinar? - null perguntou um tanto incerta.
- Já estamos aqui, não pode ser tão ruim, pode? - deu de ombros pegando uma caneta e assinando o contrato, devolvendo-o em seguida.
A outra fila andava mais rápido, era basicamente para dar o número de inscrição que deveria ser colocado na roupa e explicar que, caso fosse sorteado teria uma filmagem inicial onde ele contaria um pouco sobre sua vida. No entanto, para seu alívio, ele não foi um dos escolhidos.
As audições estavam previstas para durar o dia todo e não seguia a ordem do número da inscrição. Um pouco entediado depois de quase três horas ali, null estava dedilhando coisas aleatórias no violão quando chamaram um grupo de dez pessoas, que o incluía. Seriam os próximos a se apresentarem.
- Os acompanhantes podem esperar nessa próxima sala. - o mesmo rapaz que anunciara os nomes apontou a porta à direita.
- Boa sorte! - null desejou e beijou o rosto do amigo antes de entrar na sala. Era bem simples, algumas cadeiras colocadas em filas e três televisões grandes nas paredes para que pudessem acompanhar o que se passava na sala com os jurados.
- null Forster, você é o próximo. - um outro homem da equipe técnica avisou e ele assentiu. Ajeitou o violão e entrou por onde havia sido indicado, indo logo para a marcação no palco que indicava o lugar em que deveria ficar. Oliver, Richard e Penélope o encaravam.
- Olá! - null disse animado e sorriu, mexendo de leve no cabelo. Não acreditava que estava, de fato, nervoso.
- Oi, querido. Qual o seu nome? - Penélope perguntou de forma amigável. Ela era uma artista impecável na opinião dele, porém torceria para seu mentor ser Oliver se ele fosse escolhido para continuar na competição.
- null Forster. Tenho 23 anos e sou de Phoenix. - respondeu.
- E o qual a sua ocupação? - foi Richard quem perguntou num tom cansado.
- Curso música na universidade estadual e trabalho na firma de advocacia do meu pai.
- Combinação estranha. - Richard falou baixo, mas todos puderam ouvir.
- E por que você quer ser um rockstar? - Penélope voltou a falar.
- Porque música é o que mais faz sentido na minha vida e poder viver disso seria um sonho realizado.
- E qual música você escolheu? - ela questionou.
- Use somebody do Kings of Leon.
- Boa sorte. - ela desejou e null assentiu, começando os primeiros acordes logo em seguida.
Aqueles foram, provavelmente, os quatro minutos mais longos da vida dele, no entanto ele estava satisfeito e terminou com um sorriso no rosto. null tinha o mesmo sorriso ao vê-lo na tela, ela sabia, assim como a mãe dele, que o futuro dele era na música. E o fato de os três jurados estarem aplaudindo só confirmava isso.
- Oliver. - Penélope indicou que ele deveria ser o primeiro a falar e votar.
- Gostei bastante da versão que fez. Adoraria trabalhar com você. Meu voto é sim. - sorriu de volta para null que agradeceu.
- Você tem um vocal forte, porém não deu para saber, por essa música, o seu alcance vocal. - Richard falou e ficou com a expressão pensativa enquanto o encarava. - Acho que só tem uma forma de descobrir, meu voto é sim.
- Parabéns, null! Você tem o meu sim também. - Penélope encerrou a votação. - Nos vemos na próxima fase.
- Obrigado! - ele caminhou até a mesa e apertou, uma a uma, as mãos dos jurados, saindo do local em seguida e encontrando uma null extremamente eufórica e dando pulinhos.
- Eu sabia! Eu sabia! - ela correu e o abraçou.
- Com licença. - uma moça se aproximou juntamente com um câmera. - null, certo? - ele concordou com a cabeça. - Vocês são namorados?
- Não, ela é minha melhor amiga. Por quê? - questionou.
- Ela é sua única acompanhante? - fez outra pergunta ao invés de respondê-lo.
- Sim. - null apenas observava.
- Vamos fazer algumas imagens de vocês então. - a mulher disse simplesmente.
- Agora? - null não via sentido.
- Sim, faremos como se ele ainda não tivesse se apresentado e você mostra seu apoio. - disse simplesmente, guiando os dois para o lado de fora.
- Achei isso uma babaquice! - null reclamou enquanto dirigia a caminho do hotel. - Aposto que vão editar tudo que me fizeram falar e vai parecer que sou apaixonadinha por você. Isso se não colocarem que sou sua namorada, né? - freou no semáforo que acabara de fechar.
- Ah, você bem que queria, pode admitir. - ele a provocou e ela acelerou fazendo com que ele batesse a cabeça no encosto do banco.
- Nos seus sonhos, null. - ela sorriu vitoriosa enquanto ele passava a mão na parte de trás da cabeça.
O grupo de null era formado por ele, mais um homem e três mulheres, e o primeiro problema veio com a escolha da música. Demoraram um tempo para entrar num consenso e quando finalmente foram ensaiar não ficou bom. Todas as vozes não conseguiam se adequar em um tom e foi preciso repetir o processo algumas vezes até que todos ficassem minimamente satisfeitos.
Foram ousados e escolheram Bohemian Rhapsody do Queen, editando para que ela ficasse mais curta, porém de tamanho suficiente para que cada um mostrasse o seu potencial. null estava ainda mais satisfeito, pois Richard tinha colocado seu alcance vocal em cheque e com essa apresentação ele deixaria claro do que era capaz.
null: Parabéns! Pode deixar! Hahaha
null: Segundo eles você deve esperar uns três ou quatro toques para dar um suspense…
null: Até isso é controlado?
E então como esperado null atendeu o telefone depois de algum tempo chamando.
- null, eu passei! - contou falsamente empolgado e por alguns segundos tudo que se ouviu foi a gritaria dela pelo viva voz. Ela era boa nisso.
- Não acredito! Parabéns! Estou tão empolgada por você! - continuou num tom de surpresa.
- Corta! - um dos homens falou e pararam de filmar.
- Pronto, já tirei do viva voz. - null falou e riu.
- Sou muito boa atriz mesmo. - se gabou. - Mas me conta, como foi essa etapa.
null contou sobre as duas apresentações, como anunciaram que ele iria para a próxima fase, dos shows ao vivo e que ao contrário do que ele esperava o produtor Richard seria o seu mentor na competição. null ouvia a tudo, atenta, emitindo opiniões a todo instante.
- E quando eu preciso estar aí?
- Você não precisa estar aqui, null. Você tem suas provas… - ela o interrompeu.
- Imagina só você sendo o único participante sem ninguém torcendo por você nos shows, eles com certeza criariam um drama sobre você. Eu vou. Só me fala quando! - e ele sabia que qualquer argumento seria em vão.
- Daqui a 15 dias, mas eu te aviso direitinho depois. Mudando de assunto, teve alguma notícia do null? Ele não respondeu nenhuma mensagem minha.
- Ah, ele teve que deixar o celular! Eu esqueci de te contar, mas é isso. Ele só pode usar o telefone por tempo determinado com supervisão e sei lá mais o quê. - null explicou.
- E eu achando que não devia ter contrato mais estranho do que esse aqui…
- null, você sabe que eu amo falar com você, mas eu realmente preciso continuar estudando.
- Tudo bem, null. Te mando mensagem depois. - ele reforçou.
- Ok. E treine bastante nesses 15 dias porque quero ver um show da sua parte. Beijos.
Durante as duas semanas que se passaram null se recusou a dar qualquer informação sobre sua apresentação o que deixava null ainda mais curiosa. Estava quase pulando sentada no auditório esperando a vez de ele se apresentar. A produção a havia conduzida para o local exato onde ela deveria se sentar durante a apresentação dele e então após uma vinheta que mostrava como havia sido as semanas de treinamento antes daquela apresentação ele estava no palco.
null não conseguiu disfarçar a expressão surpresa e talvez até de desapontamento com a apresentação. Não que null não estivesse fazendo uma boa apresentação, muito pelo contrário, sua voz parecia ainda melhor do que ela estava acostumada, mas aquele não era o estilo de música dele, como também não era o de roupas. Ela não saberia dizer se a música era de Justin Bieber ou Justin Timberlake, mas ela sabia que não era um rock, e mesmo que estivesse com seu violão durante toda a apresentação, aquele não era ele.
Incrivelmente os dois não puderam se encontrar e conversar pessoalmente e tiveram que se contentar em trocar mensagens. No entanto, nenhum dos dois teve coragem de dizer o que realmente havia achado da apresentação. null continuava repetindo para si que aquela era uma oportunidade em um milhão e que ele não podia desistir de cara só porque algo não saiu conforme ele pretendia.
No dia seguinte null já tinha retornado para casa, era o dia dos resultados e ela conseguia enumerar pelo menos três apresentações que com certeza foram ruins e por isso sabia que null estaria a salvo nessa primeira semana. Assistiu pela televisão quando Goo Goo Dolls foi anunciado e cantaram duas das suas músicas favoritas e deram algumas dicas para os participantes da competição antes de o apresentador retornar anunciando que já tinha os resultados da noite anterior.
null estava mordendo o lado interno da boca de nervoso. Imaginava como o amigo estaria. Primeiro foi anunciada a garota que deveria deixar a competição imediatamente. Era uma das que null não tinha gostado e ela deixou o palco aos prantos. Agora, um a um eram anunciados os que passariam para a próxima semana. null foi o terceiro nome a ser chamado, e apesar de não serem chamados em nenhuma ordem de classificação, os dois sentiam um misto de felicidade e alívio.
A preparação para o próximo dia de shows ao vivo começou cedo para null e todos os outros competidores que estavam no grupo de Richard. Ele entregou um envelope para cada um dos participantes com a música que havia escolhido e null não conseguiu disfarçar a expressão de insatisfação. Ele conhecia a música, mas novamente aquilo não tinha nada a ver com o tipo de artista que ele era e com o tipo de música que ele queria fazer.
Ele tinha a segunda-feira para ensaiar sozinho e no dia seguinte se reuniria com seu mentor para os primeiros conselhos e adaptações. Voltou para o quarto e pegou seu violão, abriu novamente o envelope e leu She moves in her own way do The Kooks. Ele conhecia a música, podia alterar a batida e deixá-la com mais cara de rock como havia feito para a primeira semana, mas um pensamento de que estava sendo sabotado começou a rondar sua mente. Aquela música não era famosa, não era o estilo dele e todos os outros sob a supervisão de Richard pareciam satisfeitos com a escolha feita para eles.
- Bom dia, Richard. - o cumprimentou fechando a porta atrás dele.
- Bom dia. Vamos ver como está sua apresentação até agora. - falou sem humor e permaneceu sentado no sofá com uma cara de poucos amigos.
- Richard, eu queria conversar com você sobre a escolha da minha música. - tinha chegado a conclusão na noite anterior que podia até mesmo fazer parte de um teste e que ele não perderia nada em expor seus pensamentos. - Eu entendo que você deve ter escolhido essa música por um motivo, mas… - foi interrompido.
- Se entende que eu tive um motivo por que está questionando? - Richard devolveu com a mesma expressão de antes.
- Porque não tem a ver com o null artista que está nessa competição. Nickelback, Daughtry ou Creed se encaixariam bem melhor.
- Acho que entre nós dois eu tenho infinitamente mais experiência nesse ramo do que você. Você acabou de citar três bandas com exatamente a mesma sonoridade, ser só mais um não fará de você campeão. É preciso mostrar versatilidade.
Pelo silêncio que se seguiu, null entendeu que não teria outra música e ajeitando o violão tocou por duas vezes seguidas a música.
- Faça uma vez sem violão. - Richard pediu e embora relutante, entregou o violão para a produção.
Era estranho ter somente o microfone no pedestal, era como se faltasse alguma roupa, mas null cantou novamente.
- Certo, a sua voz e o arranjo ficaram bons. Fez um bom trabalho. Nos próximos dias quero que trabalhe com os coreógrafos. Chame o próximo quando sair. - Richard despejou todas as informações e só voltou a olhá-lo quando viu que null continuava parado em sua frente.
- Coreógrafos? - perguntou um tanto confuso. Ele não dançava.
- Sim, você ficou parecendo uma estátua parado aí. - explicou num tom cansado. - Vamos tirar esse pedestal e sem o violão você vai precisar se mexer pelo palco, interagir um pouco.
null pegou seu violão antes de deixar a sala e foi direto para o gramado de fora da casa que estavam. Pegou seu telefone e ligou para null, esperando que ela não estivesse ocupada.
- Hey, que surpresa! - ela atendeu feliz.
- Oi, null. - pelo tom de voz dele, ela percebeu que algo não estava certo.
- O que foi, null? Está tudo bem? - perguntou preocupada.
- Não exatamente. - suspirou andando o mais longe que podia para ninguém o ouvir. - Acho que não pertenço aqui. - a frustração era clara na voz dele.
- Como assim? O que aconteceu? - ela odiava quando ele não ia direto ao ponto, dava tempo de ela pensar mil coisas só de ansiedade.
- Você gostou da minha apresentação no fim de semana? - ela foi pega de surpresa com aquela pergunta, afinal tinha ficado feliz de não precisar respondê-la com medo de ferir os sentimentos dele. - Seja honesta, por favor.
- Eu gostei, null. Não era nada do que eu esperava, eu confesso. Mas não quer dizer que tenha sido ruim.
- Eu não gostei. - null confessou. - Nem mesmo assisti para ver como tinha sido. Não teve nada a ver com o meu som, não teve nada a ver comigo.
- E você tentou falar com eles?
- Sim, é por isso que estou te ligando. Fui completamente ignorado. A dessa semana é uma escolha tão estranha quanto a anterior. - suspirou frustrado. - Não sei até que ponto vale a pena.
- Eu não vou dizer para você desistir, null. Da mesma forma que não pedi para você ir. São escolhas que tem que partir de você, e eu te apoiarei independente de qual seja ela. - null amava a calma que o invadia sempre que conversava com ela.
- Me sinto mal por estar considerando a hipótese de dispensar uma oportunidade dessas. - sua mente tinha dois pensamentos contrastantes, e mesmo distante era como se null pudesse lê-los.
- Mas ser quem você não é também te faz mal, null. - ele riu fraco.
- Você estará aqui na próxima apresentação?
- É o meu plano. A menos que você mude de ideia. - deixou claro que o apoiava totalmente.
- Vou esperar até a próxima semana, aproveito para amadurecer os pensamentos. - era uma decisão que seu cérebro aprovava.
- Então te vejo em quatro dias. - despediram e desligaram.
Imediatamente null correu para o guarda-roupa e pegou uma caixa de papel na última prateleira. Pegou o envelope que estava por cima, a carta que a mãe de null havia deixado com ela para que ela entregasse quando achasse necessário. Para ela esse era o momento.
O ensaio com os coreógrafos não era um pesadelo como null tinha imaginado, ele não iria dançar. Como Richard tinha falado, era só para se soltar e ter uma presença de palco maior, se movimentar mais e criar uma intimidade maior com o público. Praticou durante todos os dias dando o seu máximo, estava satisfeito, tinha feito um bom trabalho com o que lhe fora dado.
Sábado chegou, o dia de apresentações. null foi o último a subir ao palco, o que fez com que a sensação de sabotagem voltasse a ocupar sua mente. Pela reação da plateia, sabia que não tinha sido ruim, só esperava que fosse o bastante para não ser eliminado na segunda semana.
Com a proibição de contato com parentes e amigos, null conseguiu escapar para encontrar a amiga mesmo que por alguns segundos, já que ela havia dito que precisava entregar uma coisa para ele que não poderia esperar.
- Achei que não saberia o momento de te entregar, mas esse parece ser o certo. - e com um abraço apertado eles se despediram e null voltou para a sala onde os outros estavam.
Só então ele olhou bem o envelope que continha apenas o nome dele, mas ele reconheceria aquela letra em qualquer lugar, era da sua mãe. Assim que foi possível ele foi para o quarto e se sentou na cama, sentia muita falta dela. Respirou fundo antes de abrir o envelope e tirar o papel de dentro.
Querido null,
Deixei essa carta com a null por ter certeza que você precisaria de algum conselho meu mesmo que eu não estivesse mais presente. E se esse é o caso, o que tenho para dizer é que você lute para conquistar o seu maior sonho.
Não ligue para o que te disserem, reescreva a sua história quantas vezes for necessário, ilumine seus sonhos, seja eles quais forem.
Você sempre sonhou com música, mesmo que pareça difícil ou complicado, não desista disso. Tenho certeza que você criará o seu próprio legado, independente do seu pai ou seus irmãos.
Crie sim expectativas, mesmo que te digam o contrário. Mire sim nas estrelas e faça o possível para alcançá-las. Procure melhorar sempre!
Mesmo que pareça que você é só mais um, você é um em um milhão!
Tenha esperança e siga seu coração!
Com amor,
Mamãe.
Enxugou o canto do olho quando terminou de ler. Pode ouvir a voz dela em cada uma daquelas palavras, ela sempre esteve ali com ele. Era a força que talvez faltasse para ele tomar a decisão de continuar ou sair dali.
null não estava entre os três piores e por se sentir esperançoso aguardou a nova semana de ensaios. Talvez Richard finalmente o ouvisse e ele pudesse trabalhar com uma música que ele escolhesse.
Estava errado, sua esperança foi por água abaixo com menos de 24 horas. A nova música escolhida para ele era Shape of You do Ed Sheeran. Era uma música ótima, famosa, dava para mostrar sua habilidade no violão, porém continuava não sendo o som dele e ele só conseguia pensar que estavam fazendo de propósito.
Pensou pelo resto do dia e também a noite toda sobre a decisão que estava prestes a tomar, e a cada instante ele parecia mais certo de que era o melhor a se fazer. Ele não estaria desistindo, e sim correndo atrás do seu sonho de verdade. Na manhã seguinte esperou que a produção confirmasse que os três jurados estivessem na sala de reunião e entrou antes que alguém o parasse.
- Bom dia, null. Algum problema? - Penélope questionou com a testa enrugada.
- Nenhum. - respondeu com alívio. - Vim avisá-los que estou deixando o programa.
- No meio da competição? - ela continuava espantada. - É algum problema de família?
- Não, eu só não consigo continuar me forçando a ser um artista que eu não sou. - Richard o interrompeu.
- Se você não aguenta a competição, é melhor sair mesmo. - a acidez nas palavras era perceptível.
- Eu aguento, mas não quero ser reconhecido por algo totalmente diferente do que pretendo fazer. Se por acaso eu ganhasse, não conseguiria me manter com as músicas que você vem escolhendo para mim. - explicou mesmo que não precisasse.
- É realmente uma pena. - Oliver se manifestou. - Penso que poderia ter alcançado grandes feitos na competição. No entanto, compreendo perfeitamente o seu ponto de vista, e te desejo o melhor.
- Obrigado pelas palavras e por essa oportunidade.
O alívio que sentiu foi quase imediato, estava deixando a sala quando sentiu seu celular vibrar e antes de fechar a porta viu que Oliver estava com o aparelho dele em mãos. Era só uma coincidência, não era? Oliver então deu um sorriso discreto e guardou o aparelho.
É preciso muita coragem para fazer o que fez. Se posso dar algum conselho, grave e poste vídeos no Youtube.
null retornou para casa no mesmo dia, durante todo o trajeto de ônibus releu a mensagem várias vezes. Gostava de acreditar que Oliver havia mandado e até fazia sentido. Se ele tivesse sido seu mentor, provavelmente ele ainda estaria na competição, mas não havia arrependimento da parte dele.
No dia seguinte ele postou seu primeiro vídeo e ficou surpreso com as reações positivas que recebeu, o que o incentivou a ser cada vez mais frequente nas postagens. Acatava algumas sugestões nos comentários de outros covers que deveria fazer, e na medida em que sua confiança ia aumentando ele começou a postar vídeos com músicas de própria autoria. Coisa que Richard sequer tinha tido disposição de ouvir.
- Finalmente você apareceu! - null abraçou null que tinha voltado de sua competição quase um mês depois da desistência de null.
- Soube que você desistiu, cara. - foram as primeiras palavras dele a null, enquanto trocaram um cumprimento.
- É, não era pra mim. E você cadê seu troféu? - null devolveu.
- Não ganhei, fui eliminado uma semana antes do top 3. - deu de ombros. - Muita gente talentosa.
- Eu imagino. - null bebeu um pouco do seu milkshake.
- Eu quase saí de lá namorando, pelo menos. - ele contou com um sorriso maior que o próprio rosto.
- Mentira! - null acabou engasgando. - Conta isso direito, null!
- Ela ainda está na competição, mas o contrato idiota não permite esse tipo de interação entre participantes. - explicou.
- Nem me fale em contrato idiota. - null rolou os olhos. - Acredita que ele inventaram o maior drama familiar para justificar minha desistência?
- Pelo menos não inventaram que você teve que ir para reabilitação.
- Não diga uma coisa dessas nem de brincadeira. - null a olhou sério. Isso acabaria com sua carreira antes mesmo que ela começasse de fato.
- Mas por que você desistiu? - null perguntou puxando o milkshake da mão de null.
- Porque o tal do Richard é o maior babaca, que só pensa em vender um artista. - null despejou com raiva.
- Eu não tive liberdade nenhuma, eles montaram o null que eles queriam mostrar. Depois assiste para você ver.
- Pode deixar. - null concordou. - Lá já foi diferente, nós tínhamos que criar tudo e treinar para ficar o mais perfeito possível. Nem achei que chegaria tão longe.
- Eu só quero ver a cara dessa namoradinha que você arrumou, hein… - null bancou a ciumenta.
“Precisamos de um vocalista para nossa banda.”
A mensagem havia sido enviada por um cara chamado Zach, que era baterista em uma banda de rock que estava a procura de alguém como ele. Tinham acompanhado os vídeos dele por um tempo e gostariam de tentar tocar juntos.
O Instagram de Zach continha vários links para vídeos da banda, eles eram bons, exatamente com a sonoridade que ele sempre sonhara, mas em cada vídeo havia um vocalista diferente. Sem pensar demais, null combinou de encontrá-los em Las Vegas, num estúdio que eles tinham contato, no final de semana seguinte.
A secretária caminhou à frente de null, mostrando para ele o caminho até o estúdio. Bateu na porta duas vezes antes de abri-la e dar passagem a ele. null não acreditou no que seus olhos viam, a banda estava toda ali, mas Oliver também e com um sorriso no rosto falou:
- Eu sabia que isso ia dar certo.
Fim!
Nota da autora: Sem nota.
Nota da beta:
Lembrando que qualquer erro nessa atualização e reclamações somente no e-mail.
