Capítulo I: A Sombra Desconhecida
Arfando, levei as mãos até a barriga e tentei puxar o ar para os pulmões com dificuldade. Aquilo havia doído pra caramba.
— Isso é tudo o que sabe? – o idiota falou a certa distância. – Achei que tinha aprendido mais com a SHIELD.
— Ah... Nem de longe! – tentei esconder a dor que sentia.
— Já estamos há quase duas horas aqui. – ele abriu os braços. – Acho melhor parar de brincar e começar a lutar de verdade.
— Droga, ! – eu bufei e me desencostei da árvore. – Será que poderia calar a boca?
— Fazer o que se você me ama! – ele sorriu de canto.
Revirei os olhos, visivelmente irritada, e então avancei, desferindo vários golpes em sequência. Obrigado a se defender, ele cambaleou para trás, erguendo os punhos à frente do rosto. Com velocidade, dei um passo para trás e me concentrei. Decidi que era hora de acabar com aquela luta de uma vez por todas e abri meu punho, manipulando o fogo que provinha de mim. Logo, o moldei numa adaga alaranjada e cintilante que parecia ser feita de lava, no entanto, ela era sólida como aço.
Segurei o cabo, a empunhando com vontade, ao mesmo tempo em que sentia meus ferimentos sendo cicatrizados aos poucos graças à energia que era absorvida pelo meu corpo. ergueu as sobrancelhas e levantou a mão direita, fazendo com que uma das armas que jazia no chão a poucos metros de nós, viesse em sua direção. Avistei com atenção o momento no qual a faca prateada chegou até seus dedos. Então, meu irmão a apontou em minha direção.
— Parece que as coisas estão ficando interessantes! – ele sorriu em deboche.
— Pode apostar! – eu sorri da mesma forma.
Sem demora, fui de novo em sua direção e comecei a desferir golpes contra ele, mas sem a intenção de atacá-lo e sim de saber qual era o seu padrão de defesa. Não demorei a ver que ele era mais rápido em se defender contras os golpes que iam de encontro ao seu rosto e que seu abdômen ficava desprotegido por mais tempo. Também, seus pés mal se moviam quando ele tentava me atacar.
Quando ele ergueu o braço para proteger o rosto, aproveitei e pressionei minha adaga com força contra a sua e as mantive levantadas. Com a mão livre soquei o seu abdômen, sentindo energia sair do seu corpo no mesmo segundo e vir para o meu. Aquele movimento o desconcentrou por breves instantes, mas logo se recompôs e, usando sua força sobre-humana, segurou meu pulso e forçou minha mão, me obrigando a desfazer a faca de fogo.
Eu o fiz e ele aproveitou para torcer o meu braço, me obrigando a abaixar até estar com o rosto perto do chão. Ao me dominar, ele soltou um riso presunçoso e se abaixou, apoiando o joelho em minhas costas.
— Pare de se conter, irmã. – ele aconselhou. – Quando estivermos numa batalha de verdade, não vai ter tempo de decidir se a outra pessoa é boa ou má.
— Eu não preciso decidir, só preciso sentir. – o lembrei de meus poderes.
Sem esperar uma resposta, fechei os olhos e me concentrei mais uma vez. Não precisei de muito e meu corpo se tornou intangível, como uma chama. Na realidade, eu era literalmente fogo. Com agilidade, saí debaixo de e rodopiei ainda como fogo até estar atrás dele. Em instantes, voltei para minha forma corporal normal e agarrei sua nuca, apontando com a outra mão uma nova adaga para lá.
— Fim de jogo! – falei com ar de vitória.
— Você está ficando boa nisso. – meu irmão riu abafado.
— Tenho bons instrutores. – respondi e finalmente o soltei.
Suspirando, meu irmão se ergueu, virando-se em minha direção. À medida que seus ferimentos e cortes se curavam, em seus lábios se formava um sorriso de aprovação, o que me fez sorrir em resposta. A cada dia, eu prezava mais por minha relação com . Desde que ele havia decidido passar um tempo na base dos Vingadores para juntos treinarmos minhas habilidades, eu conseguia perceber o quão bom ele era.
Apesar de tudo o que havia feito para me encontrar, eu agora entedia que suas motivações sempre foram as melhores, ele apenas tinha sido criado num ambiente hostil. Talvez eu mesma tivesse agido como ele, ou quem sabe de uma maneira muito pior, caso tivesse sido criada pela HIDRA ou por inumanos que desejavam dominar o mundo. Mordendo os lábios ao ter aquele pensamento, resolvi que seria melhor me concentrar em outras coisas.
— E então, você vai mesmo levar a Trisha pra minha festa? – ergui as sobrancelhas com curiosidade.
— E por que essa pergunta agora? – ele imitou meu gesto e largou a adaga em um lugar qualquer, mas logo se virou, começando a caminhar pelo jardim.
— , qual é! – corri atrás dele, começando a rir. – Já faz um bom tempo que vocês estão nesse chove não molha, já está na hora de tentar algo.
— Desde quando se tornou cupido, irmãzinha? – continuou andando sem me encarar.
— Não é essa a questão. – parei em sua frente, o obrigando a parar. – É a minha festa de noivado!
— E... – cruzou os braços.
— Que ocasião poderia ser mais romântica para começar um relacionamento? – abri os braços, como se dissesse a coisa mais óbvia do mundo.
— Eu vou fazer um sanduiche, então... Se me dá licença. – sem cerimônias, passou por mim, adentrando as grandes portas de vidro.
Indignada, o segui até estarmos na enorme sala de estar. Meu irmão virou um dos corredores na direção da cozinha e eu fui à direção oposta, até as escadas que me levariam ao andar superior. Subindo os degraus com força, pensava em como as pessoas podiam ser difíceis. Eu sentia que ele queria convidá-la, mas aquele idiota simplesmente não me ouvia.
Distraída, parei subitamente ao me esbarrar em Natasha, que vinha falando ao celular. A segurei rapidamente pelo braço livre e nos equilibramos ao mesmo tempo, evitando uma queda. Nós nos encaramos assustadas e ela abaixou a aparelho assim que me reconheceu, me perguntando com os olhos o que havia acontecido. Apenas neguei com a cabeça e a larguei, voltando a caminhar até estar no largo corredor dos quartos.
Abri a porta do quarto que dividia com Bucky e me joguei na cama de casal, deixando que um suspiro saltasse de meus lábios. Fitando o teto branco, me lembrei um pouco do meu quarto na mansão Stark. Eu poderia estar lá se quisesse ou quem sabe pudesse ter a minha própria casa. Todavia, Bucky precisava estar na base dos Vingadores até tudo a seu respeito se acertar e onde quer que ele estivesse, eu também estaria.
Ainda deitada, não demorei a ouvir uma leve batida na porta, que eu havia deixado aberta, e olhei para lá.
— Posso entrar? – Nat perguntou, já adentrando o cômodo.
— E eu tenho escolha? – bufei e a ruiva riu, sentando-se ao meu lado.
— O que houve? – ela questionou sem rodeios.
— Nada... – evitei encará-la.
— Então vai mesmo continuar fingindo que não está nervosa por conta da sua festa de noivado, que será amanhã? – ela cruzou os braços, me encarando com um olhar examinador.
— Por que eu nunca consigo esconder nada de você? – choraminguei, me sentando de frente para ela.
— Então, eu estou certa. – sorriu, debochada.
— Sim, está. – admiti. – Eu estou nervosa. Na verdade, eu nunca tinha ficado tão nervosa em toda a minha vida! Agora, tente imaginar como é sentir isso e sentir que estou sentindo isso.
— Golden, é só uma festa. – minha amiga tentou me acalmar.
— Não é pela festa, é sobre tudo o que vem depois. – balancei a cabeça negativamente. – E se... se eu não for boa o suficiente pra ele?
— Que tipo de pensamento é esse? – Nat não parecia acreditar em minhas palavras. – Escuta aqui, sua pirralha... Você é mais do que suficiente para o Bucky. Vocês dois são suficientes e se completam inteiramente. E, sim, você vai fazê-lo feliz e já provou isso inúmeras vezes.
— Sabe, às vezes eu penso que você deveria ser a empata e não eu. – ri levemente, baixando a cabeça.
Apesar da piada, eu ponderava seriamente nas palavras da Romanoff. Assim que eu havia voltado da Romênia com para curar , Bucky me pediu em casamento. Em nenhum segundo hesitei em aceitar a sua proposta, pois eu sabia que o amava. Com o passar dos dias, porém, o pensamento inquietante de que não seria capaz de fazê-lo feliz martelava em minha cabeça. Mesmo que todos os dias sentisse o seu coração bater por mim, eu tinha medo de que algum dia talvez ele se cansasse.
— Não preciso ser empata para ver o que todos também veem. – a ruiva disse, chamando minha atenção. – Confie no seu coração, Potts.
Sorri para Nat, grata por suas palavras de encorajamento. Eu estava realmente contente por tê-la ouvido, afinal, não era todo dia que a Viúva Negra estava disposta a dar conselhos amorosos. Assim, apenas me apeguei a eles. Confiar em meu coração.
Ainda a encarava quando senti algumas energias se aproximando e eu reconhecia todas elas. Fitei o nada por alguns instantes, enquanto o sorriso crescia em meu rosto por detectar que ele estava entre as pessoas que haviam chegado.
— Eles estão aqui. – anunciei para a mulher ao meu lado. – O Steve também está.
Arregalando os olhos pela surpresa, ela se levantou num salto, sem saber como agir. Tentei prender o riso, pois era fofo ver como aqueles dois reagiam na presença um do outro. Steve e Natasha estavam quase namorando, mas pareciam dois adolescentes inseguros com respeito a isso.
— Parece que eu não sou a única que deve confiar em seu coração. – me levantei. – Não é mesmo, senhorita Romanoff?!
Revirando os olhos, Nat me deu as costas e caminhou para fora do quarto. A segui, rindo de sua reação e continuamos juntas até estarmos no andar inferior. Ainda sem avistá-los, conseguia saber quem estava no local e também em que parte do alojamento. Seguindo as quatro energias, nos conduzi até a sala de estar e lá estavam eles, todos jogados nos sofás e poltronas.
— Ah, aí estão elas! – Sam ergueu a mão para acenar.
Acenei em resposta, mas logo corri meus olhos para a pessoa que mais me interessava no momento. Não precisei ir até ele, pois Bucky já vinha em minha direção com um belo sorriso de canto. Suspirando, o alcancei e o abracei pelo pescoço. Surpreso, ele passou os braços pela minha cintura e riu quando o apertei mais contra mim.
— Posso saber o motivo dessa recepção tão calorosa? – perguntou, zombeteiro.
— Não é nada, só estava com saudades. – ri abafado.
— Mas nos vimos hoje pela manhã. – ele respondeu.
— Ainda assim. – insisti, sem soltá-lo.
— Pelo amor de Deus, será que poderiam ir pra um quarto? – Sam fingiu estar indignado. – Se ainda não perceberam, têm crianças na sala.
— Por acaso está falando de mim? – disse e, por cima dos ombros de Bucky, o vi cruzar os braços.
— Se a carapuça serviu... – Wilson ergueu as sobrancelhas.
se preparava para dar uma boa resposta ao mais velho, porém, Natasha os interrompeu, impedindo que uma discussão começasse. Sem dizer nada, ela se sentou ao lado de Steve e vi quando ele hesitou um pouco, mas tomou coragem e segurou sua mão.
— Agora são vocês dois? – o Falcão arregalou os olhos. – Acho melhor comer alguma coisa.
— Eu estou vazando também. – o agente o seguiu na direção da cozinha. – Isso é demais pros meus olhos.
Rindo da reação dos dois, me separei de James e o puxei para um canto mais afastado do cômodo, para que pudéssemos ter mais privacidade. Nos sentamos num largo sofá de canto e ele me abraçou pelo ombro com o braço normal, me fazendo apoiar a cabeça em seu peitoral. Me aconcheguei ali, sentindo o seu calor tão familiar, e fechei os olhos.
— Sentiu mesmo minha falta? – ele perguntou de repente.
— Eu sempre sinto. – respondi.
— Não precisa. – seus dedos frios de metal tiraram alguns fios de cabelo do meu rosto. – Eu sempre vou estar aqui.
Sorri sem mostrar os dentes diante de sua sentença e meu coração se aqueceu por ter a plena certeza de que aquelas palavras eram verdadeiras. Eu podia sentir.
— Vocês escolheram os ternos para amanhã? – perguntei.
— Sim. – ele respondeu, visivelmente contrariado. – E espero nunca mais ter que fazer isso novamente.
Rindo de sua atitude, coloquei as pernas para cima do estofado, me aninhando ainda mais contra Bucky. Ele não reclamou, pelo contrário, me abraçou mais firme. Esquecendo-me do mundo, em minha mente rondava a ideia de que, se eu pudesse, ficaria ali eternamente.
— Terra chamado agente Potts! – de repente ouvi, abrindo os olhos. – Hello!
— ... – murmurei ao ver o meu amigo ali na frente, segurando um refrigerante.
— Sim, sou eu. – ele abriu os braços, se virando para Bucky. – Cara, eu preciso dela por um segundo.
— Sem problema. – o outro deu de ombros.
A contragosto, me levantei e fui com meu melhor amigo até estarmos num corredor, sozinhos. parecia meio eufórico e até já sabia o motivo, por isso apenas cruzei os braços, esperando que ele falasse.
— É o seguinte... – ele começou, mudando o peso de uma perna para a outra, várias vezes seguidas. – Sobre o assunto que eu disse naquele dia.
— Sou toda ouvidos. – balancei os ombros.
— Eu meio que convidei a Daisy pra sua festa. – ele estava mesmo nervoso.
— Ela viria de qualquer jeito. – completei com o óbvio.
— Não é essa a questão. – ele me ignorou, continuando. – Eu perguntei se queria vir comigo.
— E... – ergui as sobrancelhas.
— Ela me chamou de pirralho. – ele disse finalmente.
— Ela te chamou de... Ela... – sem conseguir continuar, me inclinei para frente por conta da crise de risos que me acometeu. – Eu não acredito... Que perdi isso!
Enquanto eu ria até minha barriga doer, meu amigo apenas me encarava com uma cara de paisagem, demonstrando que não havia achado a menor graça da situação. Após certo tempo, me recompus e limpei as lágrimas no canto dos olhos, respirando profundamente.
— Então você me chamou aqui pra me dizer isso? – eu realmente não havia compreendido.
— Acha mesmo que eu queria ver você rindo da minha desgraça? – falou, sugestivo.
— Então o quê? – franzi o cenho.
— Se me deixar terminar, vai saber. – abriu os braços.
— Certo. – dei de ombros. – Estávamos na parte que ela te chamou de pirralho.
— Sim e ela simplesmente me deu as costas e saiu. – ele revirou os olhos quando voltei a rir. – Mas o mais confuso é que, quando eu nem tinha mais esperanças, ela parou e disse pra pegá-la às sete.
— Ai, ai, agente ... Você é o melhor em contar essas histórias... – debochei novamente, mas parei de supetão. – Espera, está me dizendo que ela aceitou vir com você?
— É isso que eu gostaria de entender. – seu nervosismo retornou. – As garotas são sempre tão enigmáticas?
— Vocês que são péssimos entendedores. – revirei os olhos. – Mas, nesse caso, não precisa ter medo. Ela aceitou mesmo seu convite.
— Se o cupido está dizendo, quem sou eu pra discordar. – fingiu se render.
— Tá legal, agora vamos voltar. – o puxei pelo braço. – Preciso comer alguma coisa.
— Se continuar comendo desse jeito, não vai entrar no vestido da festa. – o garoto se deixou ser conduzido.
— Pelo menos, eu vou ter a desculpa para usar outra roupa que não me aperte a noite toda. – brinquei e nós dois rimos, caminhando juntos para a cozinha.
O dia havia sido longo. Após a manhã de treinamento, terminei todos os preparativos que ainda faltavam para o noivado com a ajuda de Pepper e Trisha. Elas me levaram em várias lojas e minha tia resmungou por todo o caminho do motivo de eu ter deixado para experimentar meu vestido faltando um dia para a ocasião. Eu realmente deveria ter ido antes, afinal, ajustes talvez precisassem ser feitos. Entretanto, eu não tinha muita paciência para aquelas coisas.
Fizemos as unhas e fomos a um spa enquanto meu interior clamava por um saco de treinamento para que eu pudesse socar ou quem sabe algumas miras para eu atirar durante toda a tarde. Depois de muito tempo, finalmente, pude voltar para casa e então contar ao meu noivo como o dia havia sido entediante. Agora eu o entendia perfeitamente.
Me revirando no colchão, puxei o lençol mais para cima até ficar apenas com o rosto de fora, pois a noite estava gelada. Do outro lado da cama, eu podia ouvir a respiração leve de James, que dormia profundamente. Ainda sentindo muito frio, acendi um abajur e me levantei para checar o aquecedor. Coçando os olhos, cambaleei pelo quarto escuro, mas então algo me fez parar.
A porta do closet estava entreaberta, o que me deixou confusa, pois não costumávamos deixá-la assim. Suspirando, fui até lá fechá-la. Segurei a porta de correr, mas antes que fizesse qualquer movimento, ouvi um ruído vir de dentro. Imediatamente desperta, assumi minha postura de agente, tentando não chamar muita atenção para surpreender quem quer que estivesse ali.
Concentrei minha energia, mas não senti nada. Assim, não demorei a me converter numa chama discreta e suave. Passei facilmente pela porta entreaberta até estar na parte interna do closet. Quando finalmente voltei à minha forma corpórea, constatei que não havia nada nem ninguém lá. Sacudindo a cabeça de um lado para o outro, resolvi voltar para a cama, pois o dia seguinte seria muito cheio e eu precisava estar descansada.
Passando em frente ao espelho de corpo todo, vi meu reflexo meio fosco, pois meus olhos já se acostumavam com a escuridão. Todavia, notei algo diferente. Franzindo o cenho, voltei dois passos e olhei para o vidro, me aproximando mais. Foi quando eu consegui distinguir a diferença.
Apertando os olhos para enxergar sobre a escuridão, vi a mim mesma a me encarar. Ainda curiosa, fiz uma pequena chama surgir entre o vidro e eu e com isso, meus orbes antes semicerrados, se arregalaram pela surpresa.
— O que é isso? – murmurei, temerosa.
— Olá, Potts! – sem descruzar os braços, o reflexo usou uma das mãos para acenar. – Ou deveria dizer... Golden?
Capítulo II: Sua Tristeza Silenciosa
Com os braços cruzados abaixo dos seios, minha imagem refletida me encarava com um sorriso debochado. As roupas completamente negras e as luvas de dedos, assim como cabelos longos, não condiziam com a minha situação atual e isso me fez dar um passo para trás. Ao meu movimento, a outra Golden ergueu as sobrancelhas, sem deixar a expressão zombeteira morrer.
— Mas o que... – fiz uma careta quando a voz chegou aos meus ouvidos. – Que merda é essa?
— Não faz mesmo ideia de quem eu sou? – a imagem sorriu, dando um passo para mais perto do vidro que nos separava.
— Você sou eu, mas... – tentei dizer, mas ela me interrompeu.
— Eu não sou você! – sua voz saiu cheia de prepotência. – Eu sou muito mais!
— Do que está falando? – olhei para os lados e tudo continuava do mesmo jeito, a única diferença era a do meu suposto reflexo, que parecia ter vida própria.
— Estou falando sobre algo que você ainda não entendeu e creio que nunca entenderá, pois você é fraca. – descruzando os braços, apoiou um deles na cintura. – Fraca como todas essas pessoas patéticas ao seu redor.
— Isso não está acontecendo. – ri sem humor. – Eu devo estar num tipo de sonho muito bizarro.
— Acha que isso é um sonho? – ela questionou.
Aumentando ainda mais o sorriso de escárnio, começou a caminhar em minha direção. Permaneci parada para saber até onde ela iria e quando seu corpo atravessou o espelho, soltei o ar pela boca, andando para trás até sentir meu corpo se chocar contra uma arara de roupas, derrubando todas elas. Nesse meio tempo, minha chama se apagou, mas imediatamente minha outra versão acendeu outra, mantendo a claridade.
— Agora podemos conversar melhor. – riu abafado e só parou a poucos passos de distância.
— Quem é você? – continuei a fitá-la sem entender.
— Eu, querida Golden, sou quem você nunca será. – às suas palavras, seus olhos tornaram-se vermelhos.
Sem esperar qualquer resposta da minha parte, ela revestiu completamente o corpo com uma armadura de fogo, como eu costumava fazer. A última coisa que vi foi o seu punho vindo em minha direção e tive apenas tempo para me desviar, jogando meu corpo para o lado, rolando uma vez pelo chão frio. Assim que me ergui, a vi me encarrar com os olhos em chamas e, sorrindo daquela forma bizarra, ela avançou novamente.
Sem compreender o que se passava, apenas me defendi outra vez, assim como fiz com todos os outros golpes que vieram em seguida. Num outro momento, eu com certeza já teria entrado naquela briga. Porém, meu cérebro não conseguia captar a ideia de uma versão maligna de mim mesma ser o inimigo e isso me paralisava quase por completo, restando apenas a opção de me proteger.
Num determinado momento, quando tentei alcançar a porta do closet, ela criou correntes de fogo e as lançou contra meu pescoço, me puxando para trás. Urrei quando meu corpo foi de encontro ao solo e tentei me soltar, mas as estruturas eram sólidas como aço. Então, veio até mim e se abaixou em minha frente.
— Consegue perceber o que eu disse? – apertou ainda mais a corrente, me tirando o ar. – Você é fraca!
Eu tentava a todo custo me libertar do seu aperto, mas simplesmente não conseguia. Era como se eu tivesse me esquecido de todas as minhas habilidades e do treinamento de anos. A única sensação que me consumia era a de desespero, como se eu estivesse eternamente presa, sem poder escapar nunca mais.
— Essa é a grande líder dos inumanos? – sua voz carregava desprezo. – Parece que não vai ser tão difícil, afinal.
Divertindo-se com minha situação deplorável, aquela minha versão bizarra riu abafado e aproximou o rosto do meu, me olhando nos olhos.
— Mas talvez eu torne isso um pouco mais interessante. – falou, fingindo pensar. – Seria muito prazeroso dar um fim em todas essas pessoas ridículas que chama de família, começando por esse seu soldadinho inútil!
Ao ouvi-la fazer menção aos meus amigos e a Bucky, finalmente meu coração reagiu. Como se tivesse tomado uma injeção de adrenalina, senti minhas veias queimarem. Sem sequer me movimentar, fiz com que a corrente em meu pescoço se despedaçasse em pequenos fragmentos de luz que logo desapareceram. Sem demora, me ergui em posição de combate, cobrindo meu punho com fogo.
— Finalmente! – desdenhou.
Sem hesitar, mirei o golpe eu seu rosto, canalizando toda a força que conseguia nele. Entretanto, estranhei quando ela sequer se moveu, ficando parada no mesmo lugar. Como se já esperasse aquela reação da minha parte, seu sorriso de canto não morreu e logo entendi o motivo.
Assim que meu punho alcançou seu rosto, ele o atravessou, como se ela fosse apenas uma miragem. No segundo seguinte, sua imagem desapareceu diante de meus olhos e meus dedos acertaram em cheio o espelho atrás, causando um ruído estridente quando o vidro se partiu em pedaços. Perplexa, cambaleei para trás, segurando meu punho, que agora sangrava, e olhei em volta não encontrando nenhum vestígio dela.
Ainda fitava os cacos de vidro no chão, quando a porta do closet foi escancarada, então meus olhos correram para lá, encontrando um Bucky assustado e confuso. Sua expressão mudou completamente, porém, quando viu a situação do local. Seus olhos claros pareciam preocupados e aflitos diante do meu estado e mais ainda quando caí de joelhos, ofegando violentamente.
— ... – James murmurou, preocupado, correndo em minha direção.
Rapidamente, passou os braços ao meu redor, me pegando no colo e me tirou daquele lugar. Com delicadeza, me colocou sentada na cama e correu para o banheiro em busca da maleta de primeiros socorros. Eu poderia ter simplesmente absorvido a energia de qualquer coisa, mas eu não conseguia. Minha mente estava embaralhada e minha respiração pesada dificultava minha concentração.
Sem escolha, deixei que Bucky cuidasse do meu ferimento. Permanecemos calados durante todo o processo, mas eu podia sentir seu olhar me analisando vez ou outra, como se assim pudesse encontrar uma resposta. Quando terminou de limpar o lugar e remover algumas pequenas lascas de vidro, ele enrolou uma gaze para que o sangramento fosse contido. Então, ele segurou minha mão entre a sua.
— Vá em frente. – falou de forma sugestiva. – Você precisa melhorar.
— Está tudo bem... – neguei uma vez com a cabeça. – Isso pode sarar sozinho.
— Golden... – se achegou mais, passando uma das mãos em meu rosto com carinho. – Você está mesmo bem?
— Estou. – disse apenas, baixando os olhos.
— Então o que significa o que eu vi lá dentro? – apontou para o closet.
— Não foi nada. – sacudi a cabeça e me levantei, caminhando para o banheiro.
Eu deveria falar sobre o ocorrido. Eu precisava falar. Todavia, algo dentro do meu peito bloqueava as palavras e minha garganta travava só de pensar no assunto. Havia sido estranho demais, repentino demais e meu cérebro ainda digeria tudo.
Batendo a porta com força, a tranquei e corri para a pia, abrindo a torneira. Joguei a água fria várias vezes no rosto para tentar espairecer e, com as gotas pingando, olhei para o espelho com certo receio. Porém, não havia nada. Apenas eu mesma com meus cabelos cortados acima dos ombros e meus olhos assustados.
Não sei quanto tempo eu permaneci ali dentro, só sei que quando saí, encontrei Bucky sentado na beirada da cama. Sua expressão apreensiva se suavizou assim que me viu e ele se levantou, vindo até mim. Mordendo os lábios, encurtei a distância entre nós e o abracei pela cintura, afundando meu rosto em seu peitoral. James me apertou contra si, me envolvendo com seus braços fortes e carinhosos.
— Não precisa falar sobre isso agora. – sua voz saiu macia. – Mas quando quiser falar, eu estarei aqui. Eu sempre estarei aqui pra você, meu amor.
Respirei fundo, agradecendo mentalmente por sua compreensão e o apertei ainda mais. Eu sabia muito bem que deveria falar sobre o ocorrido e que deveria descobrir o máximo que pudesse. Porém, por enquanto, eu queria apenas sentir o coração de Bucky palpitar suavemente contra meu ouvido.
Dormir durante o restante da noite foi difícil. Quando eu finalmente conseguia começar a cochilar, sentia o aperto das correntes em meu pescoço, acordando assustada. Bucky me mantinha em seus braços e esse era o único refúgio que tinha naquele momento. Ele não falou mais nada, aguardando meu tempo e eu agradeci por isso, ainda que soubesse da necessidade de conversamos sobre.
Quando despertei, ele ainda estava lá, mesmo após ter acordado e meu coração se aqueceu graças ao seu cuidado. Tentando me distrair, James passou a manhã inteira ao meu lado, pois sabia que mais tarde eu iria para a mansão Stark, onde a festa aconteceria. E eu não reclamei nem um pouco. Pelo contrário, aquilo foi de grande ajuda.
— Você está mesmo pronta pra hoje? – ele perguntou, enquanto terminávamos de lavar a louça do café da manhã. – Ainda dá tempo de desistir.
— E por que eu desistiria, James Barnes? – ergui as sobrancelhas.
— Não sei. – balançou os ombros, secando alguns talheres. – Talvez encontre alguém mais interessante.
— Sério isso? – eu ri, ao perceber seu tom debochado. – Quem seria mais interessante do que o homem que veio do passado só para salvar a minha vida?
— Eu não salvei a sua vida. – ele se aproximou, segurando minha cintura, me virando em sua direção. – Você salvou a minha.
— Talvez tenhamos salvado um ao outro. – sorri e fechei os olhos quando ele me beijou.
— Jesus! – de repente ouvimos e nos separamos. – Será que vocês podem esperar até a festa pelo menos?
— Qual é, Sam! – Bucky abriu os braços e eu ri, baixando a cabeça. – Não posso nem beijar minha noiva agora?
— Poder você pode... – o outro abriu a geladeira, procurando algo para comer. – Mas poderiam deixar pelo menos para depois do almoço.
Enquanto eu ria daquela colocação hilária, Bucky apenas bufou contrariado e voltou à sua tarefa. Enquanto enxaguava um prato, ouvia os dois continuarem a discutir e me limitava apenas a rir daquela cena. Quando passava o prato para James, porém, senti uma pontada na cabeça e por um segundo minha visão ficou turva. Pega de surpresa, soltei a louça antes que ele a pegasse e esta foi ao chão, partindo-se em pedaços.
— Uou! – Sam se levantou, assustado. – Vocês estão bem?
— Golden? – Bucky me chamou, apoiando a mão normal em minhas costas.
— Estou bem, estou bem... – me apressei a responder, passando as costas da mão molhada nos olhos.
De soslaio, eu podia ver que ele me encarava meio desconfiado, ainda assim não disse nada e foi pegar uma vassoura e uma pá para limpar a sujeira. O ajudei quieta e Sam não pareceu dar muita importância ao ocorrido, pois a sensação que tive não durou muito e logo eu estava cem por cento bem. Também não me importei muito e continuei seguindo o roteiro daquele dia que seria cheio, mas inesquecível.
No entanto, eu já havia decidido que conversaria com Bucky e com os outros após a festa. Talvez eles pudessem me ajudar a descobrir o que havia sido a situação de mais cedo. Talvez um pesadelo ou uma alucinação. talvez pudesse me ajudar, pois talvez o que passei tivesse a ver com meus poderes.
Eram muitas possibilidades, assim como havia a possiblidade de não ser absolutamente nada. Mesmo assim, eu sabia que nada acontecia por acaso e que precisava resolver aquela questão de uma vez, antes que se tornasse pior.
Indignada, joguei o vestido pelos ares e o vi rodopiar suavemente até atingir o carpete acinzentado. Bufei, contrariada, e caminhei até minha cama, me sentando sobre o lençol branco, começando a remexer uma pequena bolsa repleta de maquiagens. Depois de alguns instantes, desisti daquilo também.
— Que droga... – murmurei e me joguei pra trás.
Apesar de ter planejado tudo nos mínimos detalhes para aquele dia, eu simplesmente não conseguia começar a me arrumar. Eu não fazia ideia de como fazê-lo, pois nunca fui uma garota que gostava de coisas do tipo. Vestidos, saltos e maquiagem eram palavras que estavam fora do meu vocabulário.
Eu havia voltado para a mansão de Tony, pois a festa seria lá por conta do espaço. Mesmo que apenas os mais íntimos fossem participar, minha tia havia passado semanas enlouquecida com os preparativos do meu noivado. Ela estava até mais animada do que eu. Enquanto isso, Bucky havia ficado na base e viria com os outros no horário marcado. Ainda que eu não quisesse ter me separado dele naquele momento, não havia escolha. Pelo menos, não quando Pepper Potts era responsável por tudo.
Soltei um longo suspiro e resolvi que poderia fazer aquilo sozinha. Me levantei e peguei o vestido de coloração rose feito sob medida. Se Pepper o visse naquele estado, provavelmente, me mataria. Em seguida, o vesti por cima de minhas roupas íntimas e me fitei no espelho de corpo todo.
— É... Bonitinho. – fiz uma careta para o tomara que caia marcado na cintura, que passava um pouco dos joelhos e era levemente rodado e que me fazia parecer uma princesa da Disney. – Vamos ver o que faço com essa cara.
Eu realmente estava perdida. Apesar de me esforçar o máximo para dar atenção para aquele dia tão especial, minha mente não conseguia se concentrar completamente. Vez ou outra, o episódio da noite anterior voltava aos meus pensamentos e sentia um calafrio percorrer a minha espinha. O pior de tudo era não saber se havia sido ou não real.
Passei uns vinte minutos tentando encontrar uma combinação de sombras que desse certo com o vestido, mas era praticamente impossível. Assim, quando Trisha e Dinah chegaram ao meu quarto, quase me ajoelhei para agradecer.
— Você ainda está assim? – Trisha abriu a boca, incrédula. – Mas faltam menos de vinte minutos!
— Eu sei, eu sei... – suspirei. – Será que poderiam me ajudar?
Rindo do meu desespero, as duas garotas me sentaram de frente para o espelho da penteadeira do meu antigo quarto e então começaram o procedimento. Enquanto Dinah modelava meu cabelo, Trisha fazia minha maquiagem. Quando terminamos, já podia ouvir a música tocando no andar de baixo. Soltei um riso abafado, pensando que fazia muito tempo que havia ido numa festa. A última tinha acontecido justamente aqui casa de Tony, e digamos que ele bebeu mais do que deveria, então, Pepper e eu tivemos que ficar no pé dele o tempo todo.
Dessa vez, porém, aquela festa era pra mim e eu iria aproveitar. Mas, acima de tudo, eu queria Bucky aqui ao meu lado. Se pudesse, dançaria a noite inteira com ele. Enquanto calçava os saltos, ouvi batidas em minha porta. Fitando a madeira escura, soube imediatamente que meu irmão me esperava do outro lado. Mordi os lábios e observei Trisha atendê-lo. Ao abrir, me surpreendi. vestia uma blusa preta social com as mangas dobradas até a metade, calças jeans escuras e um sapato também escuro. Estava incrivelmente lindo e a reação da loira à sua frente me fez perceber que ela achava o mesmo.
— Olha só como está bonito! – apoiei as mãos na cintura. – Até parece que é meu irmão.
— Muito engraçada. – ele revirou os olhos, mas vi o sorriso no canto de seus lábios – É melhor descermos ou a Pepper vai nos matar.
— Isso é sério? – fingi estar indignada. – Você vem até aqui me dar pressa e nem diz se estou bonita?
— Você está linda, irmãzinha. – me lançou uma piscada. – Até parece uma princesa!
— Só porque sei que está falando a verdade. – devolvi a piscada.
— Ah claro. – ele revirou os olhos. – Havia quase me esquecido de que você é um detector de mentiras ambulante.
— Ei! – cruzei os braços. – Não é minha culpa se consigo ler os sentimentos das pessoas.
— Então é melhor se preparar, pois essa noite os sentimentos das pessoas naquela sala vão ser os mais sinceros possíveis. – ele disse e eu soltei um riso abafado.
— Estou ciente. – balancei a cabeça.
Meio hesitante, olhou para a garota ao seu lado, que permanecia calada e até meio envergonhada. Arregalei os olhos, surpresa, quando meu irmão estendeu sua mão para ela e sorriu.
— Vamos? – ele disse gentil.
— Sim. – ela aceitou sua mão.
Sem acreditar, olhei para Dinah, que tentava esconder o riso diante da situação. Quando olhei para novamente, ele piscou discretamente para mim e então saiu com Trisha porta a fora.
— Eu não creio nisso! – foi a primeira coisa que disse quando eles sumiram de vista.
— Deveria crer, pois esses dois só não estão juntos porque seu irmão é muito teimoso. – a inumana deu de ombros, se olhando no espelho e ajeitando o vestido justo. – Finalmente, ele deu um passo.
Continuamos conversando mais um pouco enquanto eu terminava os últimos retoques. Após um tempo, Dinah simplesmente se teletransportou para o andar inferior e eu continuei ali, me encarando no espelho. Coloquei o anel que Bucky havia me dado no dedo anelar, sem deixar de analisar meus cabelos cacheados, que agora pareciam ainda mais curtos. Analisei minha maquiagem mais um instante e fiz uma careta para o batom nude que cobria meus lábios. Ele combinava perfeitamente com vestido claro que eu usava, mas não me importei.
Pegando um batom vermelho no nécessaire, colori meus lábios e me encarei. Mesmo assim, eu ainda sentia que faltava algo. Caminhado sobre o salto fino, abri meu closet, encontrando alguns vestidos antigos que eu praticamente não usava e por isso havia deixado ali. Meus dedos correram pelos tecidos até que um deles me chamou a atenção. Peguei o cabide, o trazendo para fora, ficando de frente para o espelho de corpo todo próximo à porta.
— Vamos dar uma animada nisso! – sorri de lado.
Colocando o vestido preto em frente ao que eu usava, sorri ao perceber que ele cairia muito melhor em mim. Eu não precisava parecer uma princesinha, pois com todo meu poder, eu estava muito mais próxima de ser uma rainha.
Capítulo III: Todos Os Dias, Um Labirinto
Após tudo que havia passado durante a minha vida, me tornei alguém que não apreciava muita exposição. Engraçado que, há alguns anos, eu estaria animado com a perspectiva de beber a noite toda na companhia de garotas bonitas. Todavia, eu era uma pessoa diferente agora. Incrivelmente, pensava do mesmo modo.
Apesar de ela falar mais do que a própria boca e ser simpática com todos, isso não fazia dela uma grande apreciadora de aglomerações. Pelo contrário, ela preferia estar apenas com os amigos e a família. Devo admitir que isso me surpreendeu, pois era um traço de sua personalidade que demorei a perceber, mas agora era muito evidente.
Nenhum de nós dois queria uma festa gigantesca, cheia de convidados ou muito chamativa e agradecemos quando Pepper concordou com nossa decisão. A ruiva relutou um pouco, obviamente, porém, ela aceitou com a condição de fazermos tudo na mansão Stark. Não vimos problema nisso, mas tudo ainda me inquietava, dizendo no meu íntimo que aquela situação não era correta.
Tentando ignorar meus pensamentos, resolvi cumprimentar mais pessoas que chegavam. Alguns dos nossos amigos já transitavam pela grande sala usando seus ternos ou vestidos sociais. Um pouco incomodado com minha própria vestimenta, ajeitei a gravata preta para ver se o sufocamento que sentia iria diminuir, sem sucesso. Quando um dos garçons passou por perto com uma badeja com algumas taças de bebidas, peguei uma delas sem muito interesse.
— Eu não sou minha irmã, mas não preciso ler sentimentos para saber que você está nervoso. – se aproximou.
— Só não gosto muito de festas. – resmunguei ao observar o ambiente.
— Relaxa! – ele riu abafado, dando um gole no champanhe que segurava. – Sabe bem que estamos lidando com a tia da .
Eu sabia exatamente do que ele falava, pois havia presenciado o entusiasmo de Pepper desde que eu resolvi pedir a mão de Golden em casamento. Ela foi a apoiadora número um e isso me deixava aliviado. De certa forma, era como se ela mostrasse que aprovava o nosso relacionamento e a mim.
Não demorei a ver mais amigos chegando, o que significava que Golden apareceria a qualquer momento. Cumprimentei todos eles da forma mais simpática que podia, o que não foi muito difícil, afinal eu já estava me adaptando a aquelas pessoas. Ainda assim, a cada segundo, eu olhava para a escada mais ao canto da grande sala de estar, esperando ver a mulher que eu amava aparecer lá.
Num determinado momento, me distraí ao conversar com Steve e Natasha e não percebi quando Golden apareceu. Apenas a manifestação de me fez olhar para lá com o coração acelerado e imediatamente a vi. Parada no topo da escada, com uma das mãos apoiadas no corrimão, fitava as pessoas abaixo. Seus cabelos curtos estavam cacheados e os lábios vermelhos, desenhados por um sorriso de lado. Quanto aos olhos delineados, eles brilhavam de um jeito diferente.
— Mas... Por que ela trocou o vestido? – Trisha, que estava próxima, questionou para Dinah.
Com o cenho franzido, voltei a fitá-la no momento que começou a descer os degraus lentamente, dando a visão completa de seu vestido preto justo. Ao lado de Tony, Pepper parecia ainda mais perplexa que as garotas e não entendia o porquê, pois Golden estava linda.
Quando chegou ao penúltimo degrau, ela voltou a olhar ao redor, aumentando ainda mais o sorriso de canto. Seus olhos correram pelo ambiente, analisando cada um dos presentes sem dizer uma palavra. Finalmente, ela me encarou e a mesma sensação estranha que tive a princípio, retornou. Seu olhar estava mesmo diferente.
Franzindo o cenho, caminhei em sua direção, parando a poucos passos. Ela continuava a me encarar e, pela ela primeira vez, não consegui dizer o que poderia estar pensando. Não que fosse fácil decifrar seus pensamentos e sentimentos, mas daquela vez era incomum.
Ignorando minha mente, estendi minha mão em sua direção e Golden a fitou por alguns instantes antes de pegá-la. Quando nossos dedos se tocaram, levei um pequeno susto ao perceber como sua pele estava quente. Não chegava a queimar, porém, foi o suficiente para me incomodar, me fazendo soltá-la de supetão. Ela estranhou meu movimento e ergueu as sobrancelhas, como se quisesse saber o que se passava.
— Algum problema? – sua voz saiu baixa.
— Você está bem? – questionei ao notar seu tom grave.
— Estou. – respondeu rapidamente, voltando a sorrir como antes. – Na realidade, eu deveria agradecer.
— Agradecer? – dei um passo em sua direção.
— Sim... – balançou a cabeça uma vez, voltando a fitar os presentes. – Veja só o que fez por mim.
— Deveria agradecer a sua tia. – falei, sem deixar de olhá-la.
— Ah, claro... – murmurou e então desceu os degraus que faltavam, ficando frente a frente comigo. – Ela também foi muito generosa.
Soltando um riso nasalado, ela inclinou a cabeça levemente para o lado, ao mesmo tempo em que encarava a ruiva a alguns metros de distância. Demorei alguns segundos para perceber, todavia, consegui recordar de onde a havia visto com aquele olhar e isso não me agradou nenhum pouco. Me aproximei novamente dela e segurei seus ombros, fazendo com que olhasse diretamente em meus olhos.
— Golden... – murmurei para que apenas ela ouvisse. – O que está acontecendo?
— Achei que não iria pergunta! – o sorriso debochado aumentou ainda mais.
Entretanto, não foi isso que me alarmou. No segundo que seus orbes se fixaram aos meus, perderam o castanho, sendo completamente tomados pelo vermelho vivo do fogo. Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, senti seus membros se esquentarem ainda mais, sendo cobertos por sua armadura de fogo. Obrigado a me afastar, ouvi o burburinho começar logo atrás, pois era perceptível que as coisas não estavam normais.
— O que está fazendo? – perguntei e ela sorriu.
— Você não queria saber o que estava acontecendo? – a armadura invisível brilhou em alguns lugares, devido à intensidade. – Então, eu vou te mostrar.
Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, ela criou duas bolas de fogo e as lançou em direções opostas, acertando alguns móveis. Automaticamente, me abaixei e rolei alguns passos para longe dela. Por sorte, os presentes conseguiram se desviar e não demorei a perceber que suas posturas mudavam. Em um segundo, todos estavam posicionados para o combate, pois haviam entendido a situação. E eu também havia compreendido.
— Você não é ela... – murmurei, recebendo um olhar mortal em resposta.
— Então, você percebeu. – um riso escarnecedor ecoou no ambiente.
— O que fez com ela?! – disse entredentes.
— Eu não fiz nada. – balançou os ombros. – Digamos que sua Golden desistiu de lutar e agora eu estou no comando.
— Quem é você? – me ergui com os punhos cerrados.
— Eu sou algo que você jamais vai entender! – sua resposta veio cheia de arrogância.
Então, sem esperar uma resposta, se concentrou mais uma vez e seus punhos ficaram cobertos de fogo. Sorrindo de forma maléfica, ela caminhou em minha direção e percebi que partiria para o combate corpo a corpo. Eu não tinha chances, mas não recuei, dando tempo dos outros tirarem do recinto os convidados civis. Não eram muitos, todavia, ninguém fazia ideia do que poderia acontecer a partir daquele momento.
Com sua habilidade, tentou chutar o meu rosto duas vezes seguidas, girando ao redor do próprio corpo, como se fosse uma bailarina. Minha reação foi a de me defender com os braços e quando ela girou uma terceira vez, usei meu braço de metal para agarrar seu tornozelo, parando seu movimento.
— Golden, eu sei que está aí! – apesar da dificuldade, eu ainda a mantinha presa. – Por favor, volte!
Erguendo as sobrancelhas, a inumana apenas me ignorou, usando meu braço como suporte para seu novo golpe. Com agilidade, usou a perna livre para acertar em cheio o meu peito, me lançando pra trás. Fomos ao chão num só baque, mas eu permaneci lá sem conseguir respirar direito, enquanto Golden se levantava e passava por mim, indo na direção dos outros.
Tentei chamar seu nome, mas foi em vão. Consegui apenas acompanhar o momento que Dinah, Trisha e Daisy se colocaram em sua frente, evitando que chegasse até os outros.
— Golden, já chega! – Daisy a repreendeu. – Não vê o que está causando?
— É claro que ela está vendo. – riu baixinho. – Qual seria a graça de destruir todos os amigos dela se isso não fosse possível?
— Essas coisas que está falando... – Trisha deu um passo em sua direção. – Eles não fazem sentido.
— E o que faz sentido pra você? – lhe lançou um olhar enigmático.
As três garotas ficaram sem resposta diante de tamanho comportamento, mas logo foram obrigadas a se defender. Voltando a sorrir de maneira cínica, ela fez com que pequenas bolas semelhantes a lava se formassem em grande quantidade e as lançou contra as amigas.
Imediatamente, Dinah se teletransportou, evitando ser atingida. Daisy usou sua vibração para dispersar os projéteis e Trisha criou um campo de força azulado em volta de si, impedindo que a esferas a acertassem.
— Vocês são rápidas! – Golden riu, como se estivesse se divertindo. – Vamos ver o quanto duram.
Sem cerimônias, correu e deu um pulo suficientemente alto para que pudesse lançar chamas de cima, na direção das outras. Elas continuaram a se defender, porém, o escudo de Trisha começou a rachar. Sem poder mais resistir, ele quebrou como vidro e os pedaços azuis voaram para todos os lados, misturando-se às faíscas alaranjadas que a acertaram em cheio e a lançaram para longe.
— Trisha! – Daisy berrou ao ver a amiga desacordada, mas não demorou a que também fosse jogada contra a parede.
Rindo ainda mais, voltou ao chão e olhou em volta em busca de novos alvos. Esse foi o tempo para que eu me levantasse e gritasse seu nome, atraindo sua atenção. Quando se virou para mim, algo surgiu às suas costas. Me surpreendi com Dinah ali, segurando uma seringa, pronta para usá-la contra a outra inumana. Porém, ela não foi rápida o suficiente e a outra se virou em sua direção, agarrando seu braço erguido, ao mesmo tempo em que usava a outra mão para enforcá-la.
— Você se acha muito esperta, não é mesmo? – debochou dela, fazendo com que o fogo cobrisse sua mão e, consequentemente, atingisse Dinah.
Ao sentir a mão queimar, a garota gritou dolorosamente e soltou a seringa, que foi ao chão num baque surdo. Alarmado com o fato de Golden estar machucando seus amigos, corri até ela disposta a pará-la, mas Daisy foi mais rápida. Sequer vi o momento em que ela se levantou e usou um tremor para jogá-la longe.
Sem esperar, atingiu uma mesa repleta de taças de vidro e garrafas de champanhe. Quando se levantou, havia inúmeros cortes por seu corpo e sangue começava a escorrer por eles. Furiosa, ela passou a mão pelo rosto, limpando o líquido vermelho e, enquanto nos encarava, os ferimentos simplesmente começaram a desaparecer. Aquele era um nível de cura que eu nunca a tinha visto usar até então.
— Precisamos pegar a seringa. – Daisy disse assim que parou ao meu lado.
Me virei para respondê-la e vi o exato momento que os outros passavam pela porta, prontos para lutar. Aquilo fez com que meu coração se apertasse, pois significava que Golden se machucaria. Eu sabia que nenhum deles desejaria enfrentá-la, mas a situação era exatamente a mesma de quando a encontramos na base da HIDRA. Ela estava fora de si e precisaríamos fazê-la voltar ao normal.
Ao também notar os novos presentes, o furor se esvaiu de seu rosto, dando lugar ao típico sorriso maléfico. Ela queria lutar. Em seus olhos vermelhos era possível ver a sede de combate.
— Parece que finalmente estão todos aqui. – caminhou mais para o meio, pisando sobre os cacos de vidro com o salto fino.
— Golden, somos sua família. – falou por todos, se aproximando dela, o que nos deixou em alerta, pois nos lembrávamos do que tinha acontecido com ele. – Basta confiar em nós e vamos ajudá-la a sair dessa.
Mais atrás, estavam Steve e Sam sem qualquer tipo de arma. Ao lado deles, Bobbi permanecia com os punhos cerrados e Natasha era a única que empunhava uma pistola que não serviria para muita coisa. Todos continuavam paralisados, esperando apenas que ela desse o primeiro passo. O agente se aproximou mais, abaixando sua arma e seu movimento me causou aflição.
— Você é realmente corajoso. – ela disse, inclinado a cabeça para o lado. – Será que consegue me acertar?
— Você sempre fala demais, não é mesmo? – ele tentou distraí-la. – Mesmo sendo uma supervilã agora, não consegue deixar de falar tudo que vem à sua mente.
— Dane-se o que você acha! – seu olhar mudou de repente.
Abrindo os braços, fez com que uma onda de calor saísse de seu corpo, nos lançando em várias direções. Havia sido tão forte, que nenhum dos que estavam sem proteções especiais, puderam se segurar. Quando me levantei, vi que uma nova batalha se iniciava.
Steve, Bobbi, Natasha e Sam estavam em volta dela e tentavam acertá-la, sem sucesso. E, por sua expressão, ela parecia se divertir com a situação, pois apenas ria ao se desviar de seus golpes sem dificuldade. Sabendo que não poderia enfrentá-la, me concentrei em pegar a seringa que jazia a poucos metros, pois ali estava o inibidor de poderes inumanos que a HIDRA havia criado e que a SHIELD aprimorou. Com isso em mente, corri até o objeto e deslizei no chão, o pegando num só movimento. Me ergui no segundo seguinte e fui até a luta. Passei pelos que ainda estavam caídos e corri ainda mais rápido.
Aproveitando de sua distração com os outros, fui pelas suas costas e aproximei o suficiente para acertá-la. Entretanto, aquela Golden era totalmente imprevisível para mim. Assim, quando ela se virou em minha direção com o golpe pronto, eu não tive tempo de me desviar. Suas chamas me acertaram e, no último segundo, usei o braço metálico como proteção. Sentindo meu corpo cair para trás, lamentei quando a seringa estourou em pedaços por conta da temperatura a que foi exposta.
— Você... – ela murmurou e veio até mim. – É o primeiro que vou matar.
Paralisado, deixei que se abaixasse e me agarrasse pela gola da camisa, aproximando nossos rostos. Seus olhos cintilantes me encaravam e eu não conseguia quebrar nossa conexão. Mas eu não a via ali. Eu não encarava a mulher que amava. Aquela era uma completa estranha e quando ela fez com que uma adaga se formasse entre seus dedos, eu tive certeza disso.
— Hora de dizer adeus, soldadinho! – seu sorriso me assustou fortemente.
Quando ergueu sua mão para desferir o golpe, um estrondo chamou a atenção de todos. O som característico dos propulsores da armadura de Tony encheu o lugar e a rajada de energia acertou as grandes janelas de vidro, desfazendo-as em grandes cacos. No segundo seguinte, o Stark adentrou o local voando como um foguete e atrás dele, se fez enxergar. O irmão de usava seus poderes para levitar e quando se jogou ao chão, rolou uma vez antes de ser erguer e correr até nós. Ao mesmo tempo, usou suas habilidades e a puxou em sua direção. Golden não esperava por isso, porém, antes que eles estivessem próximos, ela tentou reagir.
Ajudando o inumano recém-chegado, Daisy usou seus poderes contra Golden e ela não pôde mais resistir. Entretanto, ao chegar até , ela o agarrou pelo pescoço com as mãos rodeadas de fogo. Apesar do aparente sofrimento das queimaduras, o rapaz não pareceu se importar e, olhando diretamente para ela, revelou o que trazia numa das mãos. Antes que houvesse qualquer reação, ele cravou a seringa contra seu pescoço, injetando todo o líquido que havia nela.
Por um minuto nada aconteceu. O que não demorou a mudar. Soltando o irmão, ela cambaleou para trás e as chamas desaparecem aos poucos. Respirando fundo, como se resistisse ao efeito do inibidor, a garota levou as mãos ao pescoço. Mas era tarde. Ainda com a respiração pesada, se virou em minha direção e vi o exato momento em que seus orbes avermelhados voltaram a sua cor natural.
Golden tentou dizer algo, mas logo o brilho dos olhos dela se foi e suas pálpebras fecharam. Soltando um último suspiro pesado, deixou que o seu corpo pendesse e só não encontrou o chão, pois a agarrou ligeiro. Sem pensar em nada, corri até eles e também abaixei.
— Golden! – toquei em seu braço desnudo com cuidado.
— Está tudo bem. – ele me acalmou. – Ela vai ficar bem agora.
Olhei em volta e sequer consegui calcular o estrago feito. Tudo havia se transformado no mais completo caos em um piscar de olhos. Enquanto os feridos eram levados pelos que estavam em melhores condições, eu me preocupava especialmente com Golden. De certa forma, ela havia causado tudo aquilo e eu não conseguia imaginar quais seriam seus sentimentos quando soubesse de tudo.
Quando se levantou com ela nos braços, o segui e fomos direto para um dos carros da SHIELD que estavam no estacionamento da mansão. Ele entrou com ela no banco traseiro e seus movimentos demonstravam o quanto tinha cuidado. Eu me sentei no banco da frente e logo Bobbi assumiu o volante, nos levando para uma das bases secretas. Ela tinha alguns hematomas pelo corpo, mas não parecia se importar, dirigindo a toda velocidade para que chegássemos o mais rápido possível.
Aflito, não deixava de olhar para trás um segundo sequer, pois tinha a sensação de que se parasse de fazê-lo, ela iria sumir de minha vista. Em meu intimo, rezava para que estivesse realmente bem, pois não sabia o que faria se não estivesse.
Capítulo IV: Não É Coincidência
Fazia muito, muito tempo que eu havia dado o meu primeiro tiro. Eu tinha acabado de completar quatorze anos de idade e esse havia sido um período em que achava que armas não serviam para muita coisa. Ainda assim, meu pai insistiu para que eu aprendesse a atirar, alegando que aquilo serviria como proteção caso enfrentasse algo mais à frente. Nunca entendi a sua preocupação, até por que eu não andaria por aí com uma pistola escondida entre as calças.
Bem, eu achava que não andaria. Ainda que tivesse um coldre para acomodá-las, antes que me desse conta, era uma das melhores atiradoras da minha turma e esse foi um dos motivos de me tornar amiga de . Era engraçado como sabia que todas as vezes ele venceria no tiro ao alvo, mas mesma assim, sempre estava lá pra desafiá-lo. Talvez porque assim poderíamos passar tempo juntos.
Até aí, meus projéteis eram disparados apenas contra alvos demarcados do outro lado de uma sala fechada e protegida. Mas isso não demorou a mudar drasticamente quando fui jogada em campo. Não me lembrava tão bem do primeiro dia e isso não fazia diferença. A única coisa ainda notável era o fato de eu ser uma das mais jovens agentes a ser enviada para o combate. Perseguir espiões infiltrados com apenas dezessete anos não deveria ser algo que adolescentes faziam o tempo inteiro.
A partir daquele dia, minha vida nunca mais foi a mesma. Não que eu reclamasse. Pelo contrário, aventuras eram sempre bem-vindas, pois serviriam como aprendizado. De quebra, eu poderia ganhar algum lanche grátis dos agentes mais velhos que saíam comigo nas missões. As mudanças e as novidades nunca mais pararam e, com o tempo, muitas delas se tornaram dolorosas. Tão dolorosas que, se pudesse escolher, teria continuado a viver como uma adolescente comum. Quem sabe, me pouparia de ver meus amigos sendo machucados diante dos meus olhos. E o pior: por mim mesma.
Quando abri os olhos de supetão, tentei me levantar, mas algo impedia meus movimentos. Ofegante, olhei freneticamente para meus membros superiores, os encontrando algemados contra a maca na qual eu permanecia deitada. Numa outra ocasião, teria tentado me libertar, porém, imagens horríveis rondavam em minha cabeça, me impedindo de raciocinar direito.
Ainda com o peito subindo e descendo, olhei para o teto branco sem conseguir focar na lâmpada que havia bem em seu centro. Embaçando ainda mais minha visão, lágrimas se formavam abundantes, escorrendo por minha pele aquecida. Antes que me desse conta, os soluços engasgavam em minha garganta, sacudindo todo meu corpo num movimento brusco.
— Eu sinto muito... – murmurei e quase não entendi minhas próprias palavras.
Enquanto ainda olhava para cima, ouvi o som oco de uma porta automática sendo aberta. Os passos que se seguiram eram um completo contraste, batendo contra o piso como se a pessoa que se aproximava corresse para salvar sua própria vida. Apesar de meu desequilíbrio, virei minha cabeça na direção que achei ser a certa e tal movimento apenas fez com que meu pranto aumentasse.
— Eu sinto muito! – repeti mais alto, tentando me soltar das amarras.
— Ei, está tudo bem. – a voz de James chegou aos meus ouvidos e mordi os lábios com força. – Vai ficar tudo bem!
— Não... – neguei, sentindo mais lágrimas rolando por minha face. – Eu machuquei todos eles, eu machuquei você!
— Aquela não era você. – sua voz transmitia certo consolo.
Sem aviso, ele tocou meu rosto com a mão normal e o contato me fez estremecer. Um misto de alívio e mede percorreu minhas veias, pois eu o queria perto. Eu o queria ali comigo. Mas eu não queria machucá-lo outra vez.
— Não era você. – ele repetiu, enxugando minhas lágrimas.
— Não é verdade... – voltei a murmurar, pensando que talvez minha voz pudesse desaparecer a qualquer momento. – Não é verdade.
— Eu conheço você, Golden. – Bucky se inclinou em minha direção, apoiando o outro braço no colchão.
Estávamos cara-a-cara, assim como havíamos ficado na mansão de Tony, na nossa festa. Daquela vez, eu só queria mantê-lo seguro. Mas não foi assim quando tentei golpeá-lo com uma adaga de fogo. Eu me lembrava de tudo. Absolutamente tudo. E era doloroso.
— Não, você não conhece. – mordi o lábio inferior com força antes de prosseguir. – E acho que nem eu mesma me conheço.
— Por favor, não diga isso. – sua expressão demonstrou toda a angústia que eu podia sentir em seu interior.
Eu não disse mais nada. Nenhum de nós se atreveu a continuar aquela conversa mórbida. Meus lábios tremiam e meu choro, ainda que contido, parecia não ter fim. Mas foi a lágrima que James deixou escorrer, que fez meu coração se quebrar em mil pedaços.
Bucky Barnes chorava por mim. Não por pena e sim por não poder fazer nada a respeito. A culpa era minha, mas era ele quem a carregava nos ombros, como se fosse o responsável por estarmos naquela situação. Isso me fez pensar nos outros. Será que também achavam que tinham culpa pelo ocorrido? Eu não suportaria vê-los assumindo algo que deveria ser de minha responsabilidade.
— Eu deveria ter percebido. – de repente, ele disse. – Se eu tivesse visto antes, poderia ter…
— Não! – o interrompi. – Você não está envolvido nisso.
— Golden... – ele tentou falar, mas eu não permiti.
— Eu fiz tudo aquilo, Bucky. – respirei fundo, tentando não soluçar. – Eu feri os meus amigos.
— Não era você. – ele repetiu.
Daquela vez, porém, as palavras não chegaram como um acalento. Apenas serviram para acabar com o pouco de autocontrole que me restava. Como facas afiadas lançadas em minha direção, senti cada uma delas me perfurando profundamente. Pois, sim, havia sido eu a responsável e eu bem sabia disso. Não havia como negar, não havia como esconder.
Sem conseguir mais resistir, fechei os olhos com força, sentindo a dor emocional se transformar em uma dor física. Pareciam dinamites explodindo em meu interior e eu sabia muito bem onde iria chegar. Bucky logo percebeu minha mudança de humor e tentou se aproximar, mas foi tarde. Soltando um grito lamurioso, consegui anular o restante de inibidor que havia em meu corpo, sentindo o fogo novamente em minhas veias.
Sem discernir o que fazia, derreti as algemas, fazendo com que os lençóis brancos começassem a pegar fogo. Me levantei num salto e meus pés descalços tocaram o chão frio, me causando um calafrio. Arranquei a agulha que levava soro ao meu braço, dando um passo para frente. Um tremor me envolveu da cabeça até as pernas, ainda assim não me importei, rumando na direção da saída. Imediatamente, James se colocou à minha frente e eu apenas parei.
— Por favor, não faça isso. – sua voz fez meu coração derreter, mas não foi o suficiente.
— Eu sinto muito. – repeti as palavras que mais pareciam um mantra a aquela altura.
Sem o intuito de machucá-lo, fiz com que chamas crescessem ao seu redor, o impedindo de sair até que eu estivesse longe. Apressada, passei pela porta, seguindo corredor à fora, tendo a certeza de que estava numa base da SHIELD. Nesse meio tempo, o alarme de incêndio havia disparado, avisando que algo estava errado. Não demorei a ver alguns agentes vindo até mim, por isso fiz o caminho oposto, indo para a área que levaria até algumas salas de arquivos confidenciais.
Por onde eu passava, deixava um rastro de fogo sem poder controlar meus próprios poderes. De uma só vez, os sentimentos das dezenas de pessoas no local chegavam até mim, me assolando de maneira sufocante. Levando às mãos aos ouvidos, continuei correndo, sentindo o vento balançar as roupas brancas de paciente que grudavam em meu corpo.
Passei por um longo corredor, mas fui obrigada a parar. Várias pessoas, incluindo Daisy e , vinham à frente. Pensei em voltar, no entanto, mais agentes estavam às minhas costas com May e Bobbi.
— Agente Potts, parada! – um dos agentes ordenou.
Encurralada e sem conseguir dominar as minhas habilidades, voltei a agarrar as têmporas, me ajoelhando de fraqueza. Com um movimento rápido, meu irmão usou seus poderes para apagar minhas chamas ao redor, mas ele não se aproximou e logo eu soube o motivo.
Quando braços fortes me envolveram, me senti segura no mesmo instante. Em qualquer lugar do mundo, eu reconheceria o toque do homem que eu amava e ele não precisava se esforçar para isso. Sem abrir os olhos, me encolhi contra seu peitoral e seu abraço se estreitou ao meu redor, como se quisesse me proteger de tudo e de todos.
— Está segura agora. – ele sussurrou contra me ouvido. – Não precisa ter medo.
— Bucky... – agarrei sua camisa com as mãos trêmulas.
— Estou aqui. – sua mão normal acariciou meus cabeços soltos e desgrenhados. – Eu sempre vou estar aqui.
Não sei por quanto tempo permanecemos ali, parados, tendo uma plateia ao nosso redor. Apenas voltei a mim quando senti parar em nossa frente. Ao mirá-lo, encontrei seus olhos repletos de preocupação. E havia também aflição e um misto de outros sentimentos semelhantes. Ainda comigo nos braços de Bucky, ele ergueu a mão em minha direção, tocando meu ombro com carinho e não precisei entender a razão. Com sua habilidade, ele me fez adormecer e eu não relutei nem por um segundo.
— Eu disse que você era fraca. – uma voz carregada de desdém chegou aos meus ouvidos.
Em seguida, um riso que carregava o mesmo sentimento. Era como se a pessoa estivesse inclinada em minha direção, sussurrando em meu ouvido aquelas palavras. Ainda assim, eu as ouvia como se estivesse mergulhada numa banheira.
Ao abrir os olhos, até mesmo o ardor típico de se estar debaixo da água se fez presente, assim como a imagem distorcida de uma pessoa me olhando do lado de fora. Ela não tardou a se aproximar, enfiando a cabeça na banheira e à medida que o fazia, o líquido se transformava em chamas. Continuei imóvel quando seus olhos avermelhados me encararam e dessa vez a enxerguei nitidamente. Lá estava meu outro eu, cara a cara comigo.
Quando meu corpo se levantou de supetão, senti alguém me agarrar imediatamente, me fazendo parar. Assustada, olhei para lá, encontrando meu irmão me analisando com preocupação.
— Você está bem? – perguntou antes de qualquer coisa.
— Sim... – respondi sem muita convicção.
Antes que um de nós fizesse mais movimentos, senti se aproximar. apenas lhe deu espaço e meu amigo logo me pegou num abraço carinhoso, que tratei de retribuir. Agarrada em seu pescoço, olhei em volta, constatando que estava na mesma sala de antes, com diferença das amarras, que não mais me prendiam. Me encarando mais ao fundo, estavam Bucky, Trisha e o diretor Coulson. Daquela vez, porém, eu estava mais calma e apenas esperei que alguém dissesse ou fizesse algo.
— Agente Potts, espero que esteja mesmo bem, pois precisamos discutir alguns assuntos. – o diretor foi direto. – Mas se precisar de mais tempo, posso dizer à agente Simmons que cuide de você.
— Não. – balancei a cabeça uma vez, me afastando do agente . – Podemos prosseguir.
— Tem certeza? – questionou com o cenho franzido. – Acho que ela precisa de mais repouso, senhor.
— E ela terá. – Phil concordou com um aceno. – Mas antes precisamos saber o que houve.
Incomodada, me remexi um pouco na maca. Eu sabia que aquele momento chegaria, apenas queria que tivesse demorado mais um pouco. Todavia, quanto antes resolvêssemos aquele caso, menos pessoas sofreriam o risco de serem machucadas por mim.
— Potts, pode nos contar o que se lembra? – o diretor pediu com cautela.
— Sim, eu... – respirando fundo, parei de repente, buscando coragem.
Para meu alívio, segurou minha mão, se sentando ao meu lado. Se ele soubesse o quanto aquilo me acalmou, ficaria chocado. Então, prossegui com meu relato.
— Já faz alguns dias que estou tendo alguns problemas com minhas habilidades. – revelei, baixando os olhos. – Não que eu não consiga controlá-las, apenas é poder demais aumentando em pouquíssimo tempo e talvez... Talvez eu esteja sobrecarregada.
— Sobrecarregada? – Trisha deu um passo à frente. – Como isso seria possível?
— Eu não sei. – a encarei. – Eu só sinto o poder tomar conta do meu corpo e quando percebo, outra pessoa está agindo em meu lugar. Mas o mais estranho é que eu continuo a ter a sensação de ser eu. É muito... confuso. Eu…
De repente, aflita, me encolhi e levei uma mão até a testa, deixando claro minha debilidade. passou a braço em meu ombro, me puxando para deitar a cabeça em seu peito e eu o fiz.
— Vá com calma. – ele murmurou apenas para mim.
Olhando para frente, encontrei Bucky focado em meus movimentos. Ele não tinha dito nada até o momento, mas eu comecei a sentir o que se passava em seu íntimo e sua aflição me pegou de uma vez. Fechando os olhos, cortei nosso contato, deixando de ler suas emoções, pois sabia que ficaria ainda pior se continuasse.
— , o que quer dizer com outra pessoa estar agindo em seu lugar? – perguntou de repente, chamando a atenção de todos.
— É como uma força dentro de mim, uma segunda personalidade ou algo do tipo. Não sei dizer, ao certo. – disse pensativa. – Ela fala por ela mesma, mas essa... Coisa assume minha aparência e é bizarro.
continuou me encarando por longos segundos sem dizer nada. Entretanto, agora eu o conhecia bem e não precisei sentir suas emoções para ter a certeza de que havia um pensamento pairando em sua mente. Algo que ele não iria compartilha comigo, pois apenas me deu as costas e foi até Coulson.
— Senhor, vou me retirar. – ele pediu. – Preciso verificar algumas coisas que talvez nos ajudem.
— Tudo bem. – o outro concordou.
— ! – o chamei antes que saísse. – O que você descobriu?
— Nada ainda. – ele apenas me olhou por cima do ombro. – Mas espere aqui.
— Não vai mesmo me dizer? – questionei, indignada.
— Golden, nos espere, por favor. – Trisha pediu. – Só precisamos checar uma coisa.
— Então, também sabe o que é?! – a encarei com o cenho franzido. – Por que não me contam?
— Agente Potts, e Trisha vão colher informações sobre o ocorrido. – o diretor assumiu a fala. – Enquanto isso, descanse.
— Aonde vocês vão? – o ignorei, me levantando.
tentou me segurar, mas me desvencilhei do seu braço, indo até meu irmão. se virou para mim, me esperando chegar e ninguém disse nada até que estivéssemos cara-a-cara.
— Não confia em mim? – ergui as sobrancelhas.
— Sabe que não é essa a questão. – ele me imitou. – Quero que continue aqui para que esteja protegida.
— Você quer? – ri sem humor.
— Por favor, apenas fique e espere. – ele segurou meus ombros. – Não vamos demorar.
Por suas palavras, compreendi que eles iriam até a Romênia, buscar algo que estava na mansão onde os inumanos do nosso grupo ficavam. Mas não iriam em busca de algo qualquer. Se eu tinha a chance de me machucar, isso só poderia significar uma coisa.
— Vai falar com ele, não é?! – um meio sorriso surgiu em meus lábios.
Ele não respondeu, mas eu senti que sim, ele iria. Com a raiva crescente por estar sendo excluída de um assunto que se referia diretamente a mim, dei uma passo para trás e soltei ar pela boca. Cerrando os punhos, me concentrei, deixando que o poder fluísse livremente. Então, eu me transformei em fogo, sumindo diante de todos. Não sei quanto tempo durou, mas logo me vi no subsolo da mansão dos inumanos, na ala destinadas às celas para os que cometiam crimes.
Parei na frente de uma delas e olhei pela grande porta de vidro que separava o interior do exterior, tendo a visão plena do recinto. Talvez, estivesse sendo imprudente, mas incrivelmente não me importava. Quando levei a mão até o visor digital para colocar a senha, uma leve tontura me atingiu e fiquei alguns segundos parada até que ela passasse. Por fim, digitei os números e a porta automática foi aberta, me dando passagem. Quando entrei, a pessoa deitada na cama com o colchão fino ergueu a cabeça, mas não parecia estar surpresa.
— Aí está você! – ele soltou um riso abafado e então se sentou. – Achei que não viria me visitar nunca.
O encarei de cima a baixo, observando que continuava o mesmo. Apenas os cabelos loiros haviam crescido um pouco, assim como a barba rala. Seus olhos azuis quase transparentes continuavam intimidadores e ele vestia roupas brancas ao invés de pretas. A grande diferença era a cicatriz de queimadura que eu havia feito em seu rosto. Ela estava lá, em sua bochecha direita, como uma marca eterna do que havia acontecido naquele dia.
— Olá, Ash. – cruzei os braço, dando dois passos em sua direção.
Capítulo V: Nós Escolhemos Este Jogo
Assim que viu minha movimentação, Ash se levantou da cama onde estava deitado. Semicerrei meus olhos quando o vi sorrir com cinismo, tendo a vontade de socá-lo ali mesmo.
— A que devo essa visita, Golden? – ele ressaltou meu apelido, como se quisesse me provocar com isso.
— Essa visita, meu caro, Ash, tem apenas um objetivo. – me aproximei. – Espero que colabore.
— Parece que está desesperada. – ele observou com aquele sorriso irritante e me surpreendi. – Ou não estaria aqui.
— Sei que sabe de algo. – ergui o rosto, fitando-o de cima. – Então, é melhor dizer o que sabe.
— E o que eu sei? – ele ergueu as sobrancelhas.
— Sobre o líder. – falei a contragosto.
Assim que eu falei, seu sorriso se alargou. Apesar de ser extremamente bonito, aquele gesto o deixou com a aparência de um verdadeiro psicopata. Mesmo assim, não me abalei e esperei que dissesse algo.
— Finalmente. – a palavra saiu de sua boca como uma dose de veneno.
— Finalmente o quê? – franzi o cenho, irritada, e me aproximei mais.
— Ela está chegando! – Ash me olhou nos olhos. – E quando estiver aqui, você verá o que é o verdadeiro poder!
Sem paciência, ergui minha mão em sua direção e fiz com que uma corrente semelhante à lava se formasse entre meus dedos e deslizasse até se enrolar em seu pescoço. O puxei com força, obrigando-o a se ajoelhar e me inclinei em sua frente, até nossos rostos estarem próximos.
— Ela quem? – minha voz saiu ameaçadora.
O sorriso que havia sumido de seu rosto por um instante, retornou com ainda mais vigor. Ele se divertia com minha confusão, mas havia algo mais ali, eu sentia. Brava, fiz com que a corrente que apenas o segurava, esquentasse um pouco.
— Ela quem? – repeti minha pergunta.
— Logo você saberá! – ele respondeu.
Como se a dor de ser queimado não fosse nada, ele olhou bem fundo em meus olhos e decifrei o sentimento profundo que ele carregava. Veneração. E com toda certeza, ela não era direcionada a mim.
Quando o soltei, a adoração sumiu de sua face, sendo substituída por muitas emoções negativas. Desprezo, descontentamento, ódio. E o ódio era a maior delas. Ash ergueu a mão esquerda e vi a pulseira de metal em seu pulso. Deveria ser o inibidor que o impedia de manifestar seus poderes. Soltei um suspiro e ergui o rosto, pensando onde aquela conversa chegaria.
— Vocês não são bons líderes. – ele disse sem nenhum remorso. – Veja essas algemas.
— Você tentou matar pessoas inocentes. – eu respondi.
— Os outros também. – ele praticamente berrou. – Mas não vejo nenhum deles por aqui.
— Eles se arrependeram e me ajudaram. – falei com calma, ignorando sua explosão. – Você não.
— Eu não me importo! – ele se levantou e ficamos bem próximos. – Quando eu sair daqui, todos irão se arrepender.
— Você não vai sair daqui. – eu disse apenas.
— É o que você acha. – finalmente ele sorriu.
Mas não era um sorriso de alegria e sim um sorriso presunçoso. Era como se ele tivesse certeza do que dizia, o que me fez encará-lo com o cenho franzido e descruzar os braços. Por mais que Ash não tivesse seus poderes, ele continuava sendo uma ameaça.
— Saiba que nunca pedi por nada disso. – abri os braços. – Mas agora que estou aqui, vou assumir minhas responsabilidades.
— Responsabilidades... Você não tem capacidade. Nunca terá. – ele murmurou e se virou de lado, apoiando as duas mãos na pequena mesa que havia ali. – Mas quando ela chegar, nós vamos comandar essa droga de mundo!
— E como sabe que ela virá? – tentei parecer inabalável.
— Porque eu vejo em seus olhos. – Ash disse.
Me encarando fixamente com seus olhos azuis, ele veio em minha direção. Não sei em qual momento deixei que o pavor se apossasse de mim, mas apenas caminhei para trás, deixando que meu corpo se chocasse contra a porta de vidro. Intimidador, ele bateu os punhos com força contra o material transparente, causando um ruído surdo que fez meu coração saltar.
— Ela está quase chegando. – seu rosto se aproximou do meu e sua respiração pesada me estremeceu por inteiro. – Falta só um pouquinho.
— ! – de repente uma voz chamou nossa atenção.
Ao olhar para fora, vi e Dinah parados a poucos metros de nós. Meu alívio foi imediato, pois não sabia como agir com Ash tão perto. Ele era assustador e minhas pernas tremiam.
— Ah, não me diga que ainda está obcecado em proteger essa garota? – Ash riu com desdém – Porque, desde o momento que descobriu sobre ela, sua vida girava em torno de encontrá-la.
— Se afaste dela. – ouvi mais perto. – Agora!
Quando Ash se afastou, mesmo que num movimento cheio de deboche, abriu a cela e entrou. Passando diretamente por mim, foi até o prisioneiro e logo entendi seu objetivo. Tentei impedi-lo, mas ele não queria conversa. Num movimento de mão simples, ele me fez paralisar e seguiu na direção de Ash, que não parecia se preocupar. Sem pena, ele o agarrou pela gola da camisa branca e o lançou contra a parede, imprensando-o nela.
— Acha que pode encostar na minha irmã? – sua voz saiu carregada de raiva. – Que pode ameaçá-la enquanto ainda estou aqui?
Sem esperar uma resposta, socou o rosto de Ash. E continuou a socá-lo, até que vi sangue escorrer por seu nariz. Alarmada, fiz um pequeno esforço e consegui me livrar da dominação, correndo até eles.
— , já chega! – o puxei pelo ombro, fazendo-o soltá-lo.
Apoiei a mão em seu peito e o empurrei, me colocando entre eles. Ash caiu de joelhos, levando uma mão até o sangue que escorria por seu rosto. Chocada, me virei para meu irmão e lhe lancei um olhar de repreensão. Ele pareceu entender e deu dois passos para trás, mostrando que não iria mais atacar.
— Como sempre, demonstrando um grande autocontrole. – o controlador de ventos debochou.
Sentido mais uma vez o agito em meu estômago, parei e levei uma mão até a barriga. Respirei fundo e apertei os olhos com força. Pelo que parecia, os momentos anteriores foram suficientes para me deixar enjoada e ver o sangue que escorria pelo nariz de Ash não ajudou em nada. Com a respiração pesada e ainda me sentindo mal, simplesmente dei as costas a eles e saí da cela, correndo pelo largo corredor. Ainda abalada, tentei continuar meu caminho, entretanto, a tontura voltou.
Subi as escadas que me levariam ao andar superior com pressa, mas por conta da confusão, calculei mal e me desequilibrei. Sem forças para me segurar, senti meu corpo pender e caí, rolando alguns degraus. Quando parei, arfei atordoada e tentei me levantar. Porém, quanto mais eu tentava, mais difícil parecia ser, o que me deixou aflita. Instantes depois, ouvi o som de passos se aproximando.
— Vamos sair daqui. – me segurou firmemente.
Dinah se abaixou conosco e não demoramos a estar longe da mansão dos inumanos na Romênia. Reconheci a base dos Vingadores e os móveis que preenchiam o meu quarto, me arrancando um suspiro. me ergueu, me colocando sobre o colchão e Dinah se retirou depois de dizer algo, nos deixando sozinhos. Para minha supressa, meu irmão me abraçou.
— Foi por isso que pedi que ficasse. – ele murmurou. – Ash é um mestre da manipulação e foi assim que convenceu os outros a ajudá-lo.
— Ele disse algo sobre alguém chegar. – contei e seus músculos se tencionaram.
— Ele não sabe de nada. – disse entredentes.
— Mas você sabe, não é?! – deduzi.
— São coisas que os mais velhos nos ensinaram. – finalmente começou a dizer. – Que o verdadeiro líder deveria passar por uma transformação antes de assumir seu lugar.
— Transformação? – me afastei, o olhando nos olhos.
— Ninguém sabe do que se trata exatamente. – negou com a cabeça. – E os que sabiam estão mortos.
— Então, é isso. – murmurei pensativa.
Após continuarmos nossa longa conversa, chegamos a algumas conclusões e contei a meu irmão o que iria fazer a respeito. No começo, ele não concordou com minha decisão, mas o convenci de que era o melhor para todos. Agora restava saber como os outros reagiriam, em especial, Bucky.
Como se meus pensamentos o invocassem, ouvimos uma batida leve na porta de madeira escura e logo ela foi entreaberta, revelando um James apreensivo. Sorri para ele, dando a passagem para entrada e se levantou para nos deixar sozinhos.
Quando se sentou de frente para mim no colchão com lençóis brancos, a primeira coisa que Bucky Barnes fez, foi tocar o meu rosto. Seus dedos deslizaram delicadamente por minha pele e eu fechei os olhos para apreciar o momento de carinho.
— Como se sente? – perguntou.
— Acho que já perdi as contas de quantas vezes me perguntaram isso hoje. – fiz uma careta. – Será que estou tão detonada assim?
— Parece que está melhor. – ele sorriu e o imitei.
— Bucky, precisamos conversar. – cortei o clima de repente.
— Descobriu algo? – ele franziu a testa.
— Mais ou menos. – balancei os ombros. – E acho que a nossa festa de noivado precisará ser adiada.
Bucky me encarou meio confuso e eu não poderia culpá-lo. Minha única opção era explicar tudo o que precisava ser feito para que mais ninguém fosse colocado em perigo. E eu sabia que ele iria entender qualquer decisão que eu tomasse.
Eu gostaria de dizer que as coisas haviam sido resolvidas rapidamente e que tudo tinha voltado ao normal. Que eu havia melhorado e que o noivado estava remarcado para uma nova data. Porém, essa não era a realidade.
Desde o dia que causei estragos, não saí mais da base da SHIELD, sendo mantida sob supervisão. Eu continuava a ajudar meus colegas em suas tarefas internas, mas ir a campo estava fora de cogitação. Todos os dias, eu era submetida a alguns testes que tentavam diagnosticar o meu problema, todavia, nada havia sido esclarecido.
e Trisha seguiam em suas buscas por respostas sobre as histórias que envolviam o tão aguardado líder dos inumanos, mas eles também não avançaram quanto se gostaria. Me restava apenas esperar por uma resposta concreta. Assim como eles, Tony buscava uma solução que parecia cada dia mais distante.
Como uma bomba relógio que podia explodir a qualquer instante, concordei em continuar a maior parte dos meus dias numa cela especial, que bloquearia meus poderes. Daisy e , assim como os outros, se esforçaram para que ela ficasse confortável para mim e eu agradecia por se importarem tanto. Apesar disso, fitar as paredes brancas me recordava diariamente que minha mente não era confiável.
Havia dias que eu estava bem, mas em certas noites conseguia ouvir a voz do meu outro eu tentando me subjugar. E eu estava cada vez mais fraca, não só em sentido físico, mas minhas emoções e minha mente estavam completamente abaladas. Quando passava alguns momentos fora da sala de contenção, meus poderes retornavam e me debilitavam mais e mais. Eu apenas piorava. Por enquanto, eu me mantinha sob controle, mas qual seria o meu limite? Não queria descobrir e creio que os outros também não.
Suspirando, me sentei no colchão de solteiro e cruzei as pernas. Fechando os olhos, comecei a meditar. Essa era a maneira que encontrei para não perder o controle. Estar longe das pessoas que eu amava era muito difícil. Mas nada fazia meu coração apertar mais do que pensar em Bucky. A imagem de seus olhos tristonhos me encarando no dia que expliquei a ele que não poderíamos nos ver por um determinado tempo, não deixava minha mente em nenhum instante. James Barnes nunca saía dos meus pensamentos. E eu agradecia. Saber que existia um endereço certo para onde voltar me dava o gás necessário para não desistir.
Ainda concentrada, ouvi uma batida de leve na porta. Em seguida o som do metal se abrindo automaticamente me fez abrir as pálpebras, encontrando Daisy do outro lado. Eu sabia que ela estava ali como uma agente, mesmo assim vi em seu olhar o pesar, pois ela sabia o que aconteceria naquele dia. Tentando passar confiança, sorri e me levantei, vendo-a se aproximar.
— Olá. – eu disse baixinho.
— Você está bem? – foi a primeira coisa que disse.
— Eu pareço tão mal assim? – tentei amenizar a situação.
— Golden... – ela mordeu os lábios.
Em seguida, me abraçou com força. Logo retribuí seu gesto, deixando que seu calor me consolasse. Quando nos afastamos, ela colocou um pulseira inibidora em meu pulso esquerdo e me conduziu para fora do lugar. Seguimos caladas pelos corredores e as pessoas que nos viam não se atreviam a comentar nada. Eu não conseguia dizer o que sentiam, mas talvez alguns tivessem pena ou compaixão de mim e eu os entedia perfeitamente.
Virando um corredor, Daisy me levou para uma sala que se assemelhava a um local de interrogatórios e destravou a algema, me libertando por alguns instantes. Instantaneamente, meus poderes fluíram por meu corpo, como se estivessem sendo libertados de um abismo. Sem conseguir contê-los, fechei os olhos com força e baixei a cabeça para tentar me controlar. Após alguns segundos, finalmente me recompus.
— Tudo bem agora? – ela perguntou preocupada.
— Sim, sim... – balancei a cabeça.
— Certo. – imitou meu gesto. – Fique aqui só por um momento, eu volto logo.
Concordando, caminhei até uma cadeira que havia na sala e me sentei. A agente Johnson deixou o recinto a passos largos e fechou a porta. Permaneci sozinha não por muito tempo e alguém abriu a porta. No começo, pensei que veria minha amiga novamente, porém, eu consegui senti-lo antes mesmo que entrasse.
Meus olhos se encheram de lágrimas assim que vi sua figura diante de mim e minhas pernas enfraquecidas me guiaram diretamente para seus braços. Há quanto tempo não sentia seu abraço? E quando Bucky me apertou contra si, todo meu controle se foi, deixando clara a minha instabilidade. Chorei em seu peito, com sua mão afagando meus fios soltos.
— Ei, está tudo bem. – ele sussurrou apenas para mim.
— Eu sei, estou com medo. – admiti, me encolhendo. – Tudo isso é muito louco.
— Sei que está com medo. E eu também estou. – sua voz era branda. – Mas estamos jogando esse jogo juntos, lembra?
— Sim... – murmurei.
— Não importa se vamos ficar afastados por mais dez dias ou dez anos, eu ainda sou seu. – Bucky se afastou um pouco, me olhando nos olhos. – Eu vou esperar o tempo que for necessário.
— Não é justo. – mordi os lábios. – A sua vida tem que continuar.
— E ela vai. – ele sorriu. – Vou continuar a progredir, vou me tornar uma pessoa melhor, para que eu possa recebê-la quando chegar a hora.
— Bucky... – toquei rosto com carinho. – Você conseguiu autorização para entrar só pra me dizer isso?
— Eu vim porque prometi que sempre estaria com você, em qualquer momento. – respondeu com convicção.
Por um segundo, me concentrei apenas nele, em sua energia e ela era tão positiva que fui imediatamente influenciada. Como se tivesse tomado uma injeção de adrenalina, inflei o peito e sorri para ele, mostrando que estávamos juntos naquele jogo. Sem mais palavras, o beijei ternamente selando para sempre a nossa promessa de permanecermos unidos.
Não sei por quanto tempo ficamos ali, mas Daisy voltou, nos informando que tudo estava preparado para o procedimento. Segurando a mão de James, a segui para o laboratório onde a agente Simmons e outros médicos nos esperavam. Olhei para Bucky e sorri, me afastando dele e fui até a equipe.
— Olá, agente Potts, como foi o seu dia hoje? – a doutora Simmons perguntou com um belo sorriso.
— Foi como todos os outros. – ri abafado. – Mas acho que as coisas ficarão mais interessantes a partir de agora.
— Creio que sim. – ela pareceu entender que eu desejava manter o clima o mais leve possível. – Você recebeu todas as informações sobre o procedimento?
— Sim. – concordei. – E não vejo a hora de virar um picolé. Sem ofensas, é claro.
Rindo abafado, olhei para Bucky que sorriu de lado, apesar de apreensivo. Em seguida, olhei em volta, encontrando uma grande tudo transparente, ligado a vários mecanismos tecnológicos de última geração. Era ali que eu ficaria por um bom tempo.
— Apenas para relembrar, não vamos congelar completamente o seu corpo. – Simmons falou de forma gentil. – Vamos apenas mantê-lo a baixas temperaturas, suficiente para que todo o seu sistema corporal fique inativo. É assim que a criogenia funciona.
— E quando começamos? – ergui as sobrancelhas.
— Você já fez todos os testes necessários, então, podemos prosseguir. – ela respondeu.
Sem hesitar, a acompanhei até o tubo, que foi aberto após alguns comandos de computador. Entrei no pequeno espaço e os outros profissionais se aproximaram, começando a conectar o meu corpo a alguns aparelhos que mediriam os meus sinais vitais. Ao terminarem, se afastaram e apenas Simmons ficou ali. Ela me passou mais algumas instruções e então os outros dois também se aproximaram.
Daisy ficou mais atrás e parecia prender o choro. Eu sentia seu pesar em me deixar ir, ainda que fosse necessário. James também estava triste, todavia, havia muito mais. Seu grande coração tinha espaço para direcionar a mim todo o amor que podia. Como se soubesse que eu poderia senti-lo plenamente, me encarou nos olhos e permanecemos assim.
Se ele quisesse continuar a sua vida, eu não me importaria, pois sua felicidade era o mais importante. Foi por isso que lutei contra os outros quando nos encontramos pela primeira vez na minha missão. Mas se ele escolhesse esperar, eu não me oporia, pois o meu maior desejo era ser sua para sempre.
Na realidade, em meu coração a certeza de que estaríamos sempre unidos era forte. Mesmo que não fisicamente. O que havia entre nós transcendia tudo o que eu poderia explicar. E aquele não era o fim. Era apenas uma pedra em nosso caminho, como outras que já haviam surgido. Em determinado momento, ela seria removida.
Respirei fundo, ouvindo Simmons ordenar que os aparelhos fossem ligados. Uma fumaça esbranquiçada tomou lentamente o tubo de baixo para cima e meu corpo, que antes era fogo, começou a esfriar. A última visão que tive, foi dos orbes azuis de James Barnes me encarando profundamente. E eu esperava poder encará-los novamente em breve.
END
Nota da autora: Olha, eu nem sei o que dizer aqui... Sério, não dá nem pra acreditar que estou voltando pra esse universo que criei a tanto tempo. Isso me fez perceber o quanto amo esses personagens e espero que vocês também estejam com saudades, pois como perceberam, a final ficou em aberto e isso significa uma coisa. Sim, amadas, teremos continuação! Uhuuuuuu \o/\o/
Espero do fundo do coração que gostem da leitura, pois amei escrever essa fanfic, ainda mais sendo baseada numa música do BTS. Aguardo vocês nos comentários. Bjos!!
Nota da Beta: Eu tô completamente chocada com a estrutura dessa história, parece que li uma coletânea de livros inteira de tão bem estruturado que é esse enredo. Fiquei com o coração na mão, foi possível sentir na minha pele tudo que a Agente Potts sentia de tão bem escrito. Espero muito que ela e o Bucky se reencontrem e possam partilhar de uma vida mais calma juntos - quase me recusei a escrever "END" no final HAHAHA! <3
Caixinha de comentários: O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.
Espero do fundo do coração que gostem da leitura, pois amei escrever essa fanfic, ainda mais sendo baseada numa música do BTS. Aguardo vocês nos comentários. Bjos!!
Nota da Beta: Eu tô completamente chocada com a estrutura dessa história, parece que li uma coletânea de livros inteira de tão bem estruturado que é esse enredo. Fiquei com o coração na mão, foi possível sentir na minha pele tudo que a Agente Potts sentia de tão bem escrito. Espero muito que ela e o Bucky se reencontrem e possam partilhar de uma vida mais calma juntos - quase me recusei a escrever "END" no final HAHAHA! <3
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