Capítulo Único
Como esquecer o dia em que nos conhecemos
Sentada nos campos isolados de girassóis afastados do centro de Sotenperl, tirava um tempo de descanso para si antes de ter que voltar ao trabalho e ajudar os pais a entregar mais dois fardos de trigo para o condado vizinho. Os olhos miravam o horizonte, mas estavam desfocados na mesma medida que a mente estava distante.
Quanto mais tentava não pensar nele, mais a figura imponente e irritante aparecia ao primeiro fechar dos olhos. Não havia outra justificativa para os caminhos deles terem se cruzado, senão destino. Então, por que agora tudo precisava ser tão complicado?
Lembrava com exatidão o dia que se viram pela primeira vez.
Muito antes de nascer, os pais de já eram donos da mercearia da região central do reino de Sotenperl. Além das responsabilidades que lhe eram atribuídas por ser mulher e por estar na escola, achava justo carregar um pedaço do lugar que era responsável por oferecer um sustento e uma vida relativamente tranquila. Fazer as entregas da mercearia também a permitia transitar por vários cantos com uma justificativa plausível. Para os costumes da época, não era bem visto e nem quisto que uma dama perambulasse por aí. Ela não se importava tanto com essas coisas, mas pela honra dos pais conseguiu matar dois coelhos numa cajadada.
Foi num desses retornos de viagem que acabou cruzando com o príncipe na trilha do bosque que conectava os condados do norte com Sotenperl. Naquela época, nem sabia quem ele era.
tinha no corpo vestes que não o pertenciam, a numeração exagerada denunciava. Em suas costas largas, uma mochila e, na cintura, uma espada. Estava fugindo. Antes mesmo de nascer, fizeram planos para si. Cada passo que dava dentro dos castelos estava contado e era planejado. Desde que nasceu, foi treinado para se portar diante do povo e ter sangue frio para lidar com impasses dentro da corte e tomar decisões. Às vezes, como naquele dia, ficava de saco cheio. No final das contas, era só um adolescente ainda, merecia um pouco de paz e privacidade para respirar. Sabia que era difícil ir longe, afinal, o rei, seu pai, logo colocaria toda a guarda do palácio atrás de si, contudo o quanto mais conseguisse prolongar tal fuga nada premeditada, melhor.
não tinha medo de retaliações, cresceu sob a sombra dos maiores líderes e guerreiros do reino, provocado e torturado para aguentar até a mais horrenda das situações. Além de tudo, ainda era o próximo e único sucessor do trono. Não o matariam a pauladas tão fácil assim, matariam?
Foi em um desses devaneios que se descuidou durante a trilha e acabou sendo preso por uma armadilha para pegar coelhos e esquilos que caçadores tinham o costume de largar para checar os resultados da temporada dias depois.
— Droga! — Amaldiçoou de ponta cabeça logo após o susto inicial, que ainda fazia o coração bater forte. Um dos pés havia enroscado em um laço, levando-o a girar em uma volta completa num piscar de olhos, e agora estava preso em uma rede pendurada ao tronco de uma árvore.
Quão constrangedor seria se os guardas do pai o encontrassem agora. Tateou o cinturão de couro que moldava sua cintura em busca da espada e só naquele instante percebeu que ela não estava mais onde deveria estar. Desconfortável e sem jeito, foi se movendo até ver o ponto prateado no chão. Sua arma devia ter caído no breve momento em que ficou de ponta cabeça.
— Mil vezes droga! — Praguejou socando o ar.
Se a guarda real o visse, viraria chacota. Se saqueadores surgissem, ele seria presa fácil e prenda grande para arrancarem tesouros do palácio.
Era um fodido.
De todas as opções que cogitou, uma camponesa não estava nos planos.
— Que isso? — Foi a primeira coisa que ouviu enquanto se retorcia todo sobre a rede na tentativa de se libertar desamarrando o nó que firmava o saco. Girou a cabeça tão rápido quanto caíra na armadilha para olhar a fonte da fala um tanto quanto impressionada.
A expressão dela não tinha só choque, como também uma pontada de diversão, essa mal ocultada pela mão que cobria a boca. As linhas faciais e as sobrancelhas cheias e bem delineadas denunciavam.
— Está achando alguma coisa engraçada? — indagou rude, não estava no melhor dos seus humores e o motivo era óbvio.
— Sim? Acho! — A camponesa que não aparentava ser mais velha que ele replicou sem titubear enquanto andava até ficar debaixo dele, empunhando a espada caída. — Uau! É pesada! — Mirava a peça entre os dedos com admiração, todos os detalhes, e precisou forçar uma tosse para relembrá-la de que ele continuava ali. — É de prata? — Ela ignorou o ruído sem ao menos olhá-lo.
— Sim. Podemos fazer um acordo se me passar ela para que possa me libertar daqui. Posso te dar a quantia de prata que quiser.
A camponesa não conseguiu segurar a risada.
— Cuidado com o que promete. — Olhou para cima em busca dos olhos do bobão desastrado. — Posso querer mais do que sabe contar, senhor. — Caçoou. — Mas temo que seja o seu dia de sorte. Minhas ambições envolvem mais feitos meus do que qualquer tesouro. Pelos valores que cultivamos em Sotenperl, irei ajudá-lo.
— É de Sotenperl? — de repente quis saber. Ela vinha de um caminho totalmente oposto ao dele.
— Sim. . — Informou, pensativa de como deveria proceder. — E qual é o seu nome? — O príncipe crispou os lábios. Não estava em uma posição muito favorável e digna de seu título no momento.
— . — Limitou-se a ser seco, mas parecia um pouco alheia para sentir.
— O mesmo nome do príncipe?
— O conhece?
— Não muito. — Deu de ombros, se afastando alguns passos para sair debaixo de onde a armadilha estava armada. — Não consigo ver muitas alternativas de te libertar sem machucá-lo, .
— Apenas me lance a minha espada. Obviamente jamais pediria para que uma dama escalasse uma árvore para fazer por mim. Não poderia. Cortarei o nó eu mesmo. — Pediu impaciente.
— Acredite, se eu quisesse, escalaria até a mais alta das matas. — Mentiu, desgostosa com os modos do sujeito. Ela só não queria ser menos do que ele insinuava. — Apesar de não ser uma altura muito grande, irá se machucar com uma queda dessas. — Franziu a testa.
— Isso é o que menos importa agora, senhorita . Me dê a espada.
Ela não o ouviu. Ao invés disso, começou a olhar para todos os cantos, com uma ideia brilhante em mente. Com as sapatilhas já bem gastas pelas caminhadas rotineiras, começou a varrer todas as folhas do perímetro, concentrando-as sob a rede onde estava, em um montinho fofo a fim de amenizar o tombo inevitável dele.
— Está machucado?
— Não. — não entendia aonde ela queria chegar.
— Terá que se agarrar entre as linhas da rede do melhor jeito que conseguir, . Irei perfurar a parte de baixo da rede, criando um buraco para que possa passar e ir se içando até diminuir ao máximo a altura para por fim cair nessas folhas. É o melhor jeito que consegui pensar.
O príncipe pela primeira vez ficou sem palavras. Ela pensava rápido, concluiu para si mesmo bastante surpreso.
— Pode ser. Ao seu sinal.
Para não ser espetado e ferido durante as investidas sem muita técnica, estava praticamente bailando na rede. estava concentrada, sentindo o rosto esquentar pelo esforço. Ela não era a mulher mais alta de Sotenperl, a família nem tinha esses genes, isso por si só dificultava seus golpes. A espada de era pesada, fazendo com que o sangue das mãos rapidamente corresse para baixo enquanto lutava para erguer e manter o objeto no ar.
O som do corpo dele se chocando contra o solo a fez se questionar se as folhas amontoadas aliviaram o impacto em algum momento. Correu em direção para prestar socorro, agachando sem se importar com as marcas que ficariam na barra do vestido claro.
— Você está bem? — Largou a espada para puxá-lo pelo tronco.
Com os rostos agora muito próximos, os dois finalmente puderam se olhar nos olhos de verdade. A boa aparência e os traços bem cuidados não omitiam a camada de suor na testa dela pelos esforços recentes, percebeu. Com certeza, um dos pares de olhos mais bonitos com os quais já se deparou. , por outro lado, tentava não dar muita brecha para o estado atônito que se encontrava internamente. Recordava-se vagamente do sujeito ter questionado suas origens. Ele era da cidade também? Ela com certeza se lembraria de ter visto aquele rosto antes.
Totalmente o tipo dela.
Como se estivessem escondidos, aguardando pelo tempo certo, um grupo de homens do exército surgiu, assustando que rapidamente se levantou, recuando alguns passos. Engoliu seco. Apesar de serem homens do rei o qual seguia, lidar com eles quase nunca era bom sinal.
— Príncipe , parece que te encontramos. — A voz rígida e grossa de um deles disparou, fazendo os olhos da garota quase saltarem de órbita. — Disparar aviso para cessarem buscas. Senhorita… — então, as atenções se voltaram para ela e tal ato fez as pernas vacilarem. — Virá conosco.
O choque.
O grito que queria soltar em protesto não saiu.
— Eu…
— Ela é somente uma camponesa. Não tem nada a ver com o que estava prestes a fazer.
— Todos que estiverem corroborando com os planos do príncipe devem ser levados para a triagem. Ordens do rei. Vamos. — O líder deles tomou a frente e logo se viu segurada em ambos os lados pelos outros soldados.
— Não encostem nela. — ordenou furioso, pondo-se a caminhar ao lado dela. — Já me encontraram. Não irei a lugar algum. Se ousarem tratar qualquer civil de Sotenperl assim sem motivos diante de meus olhos novamente, sofrerão as consequências. — Ameaçou.
Todavia, não estava mais tranquila.
— Você é o príncipe ? — Exasperou. — ? Filho e herdeiro do trono do rei de Sotenperl? — O tom ia aumentando. — Estava se divertindo às minhas custas, cretino? — Levantou as mãos para o príncipe, sendo barrada pelos guardas. — Deveria ter me feito de cega e passado reto. — Crispou os lábios, pensando em como contaria para os pais que estava sendo levada para a Corte e nem ao menos tinha um motivo plausível.
apenas olhou feio para os homens e pediu para que os dessem mais espaço.
— Fica tranquila, está bem? Não vai te acontecer nada.
riu em deboche, cruzando os braços.
— Ah, claro. Quem está me dando a palavra? O príncipe ? Vi bem a autoridade que tem instantes atrás. — Referiu-se a quando começaram a levá-los para o palácio. — Os guardas te ouviram bastante. Realmente.
As mãos dele se fecharam em punhos. Ela não ajudava em nada disparando desaforos a todo segundo possível.
— , você estava claramente no lugar errado e na hora errada. Não podem te condenar por nada. Tem a minha palavra.
Ela riu outra vez.
— Certamente, não sabe como funciona com os menos afortunados no povoado — disse amarga, mirando os lados. — Se ao menos visse a quantidade de gente que é arrastada no centro todos os dias…
— Algum motivo os guardas devem ter, garanto. — afirmou para defender a honra das vestes que geralmente trajava, mas suas palavras saíram falhas, mostrando que talvez a convicção e os conhecimentos que tinha do povo que representava não fossem tão certeiros quanto sua postura.
— Pois é… É o que dizem, né? — A camponesa não demonstrou nenhuma emoção, não dando mais oportunidade para desenvolverem nenhuma conversa.
O primeiro beijo depois de tanto implorar
As pedras que nos atiraram para o caminho
E como tudo o pudemos superar
As pedras que nos atiraram para o caminho
E como tudo o pudemos superar
— Uma moeda de prata pelos seus pensamentos? — surgiu atrás dela. Aquele campo de flores se tornou o ponto de encontro deles ao longo dos dias. Belo e afastado o suficiente de olhares e julgamentos alheios. — Está inquieta, o que houve?
Depois do episódio no bosque, fez questão de descobrir quem era e encontrar justificativas para poder rever a brava e genial donzela que o tirou de uma enrascada e vergonha simultaneamente. Ela e os pais eram do povo, bastante conhecidos por erguer a mercearia que oferecia mantimentos para a região e vários outros condados, conforme contaram seus informantes na cidade. Sendo de idades similares, era do interesse de que mantivessem contato. Ela era uma boa pessoa e com ideais bastante nobres.
Quando relatou todo o episódio da fuga e pediu desculpas, também fez questão de oferecer uma recompensa pela ajuda e um vestido novo pelo que a fizera sujar durante o caminho. O vestido costurado sob medida foi prontamente aceito, os olhos brilhantes diante dos tecidos mais nobres não foram disfarçados em momento algum. A recompensa, por outro lado, atreveu-se a pedir para que mudassem para algo que a ajudasse, mas não deveria ser atribuído diretamente a ela. Um mês de impostos poupados na mercearia. Aquilo impactaria mais diretamente nos progenitores.
Tal desejo foi prontamente atendido e só depois disso a paz entre e voltou a reinar, marcando o fim de uma primeira má impressão e ao mesmo tempo o início de uma preciosa amizade.
— Ainda não me respondeu, . — Reiterou sério — O que está te afligindo?
— Você já beijou na boca, ? — o encarou num misto de confusão e curiosidade, fazendo-o engasgar com a própria saliva.
— Por que me pergunta isso agora? — Passou a mão nos cabelos, desalinhando todos.
— Sempre vi os casais no povoado fazendo isso. — Comentou distante. — Mas não sei por que comecei a reparar nisso agora. Meus pais dizem que é só depois que encontrar um marido. — Suspirou. — Um beijo é tão importante assim para depositarem tanto valor no casamento? Ultimamente me pego pensando em como seria e fico frustrada porque possivelmente só descobrirei muito para frente, visto que não tenho pretensão de arranjar um marido. — Franziu o cenho sem perceber, desgostosa com a ideia de precisar se prender a um homem desde cedo.
— Como você mesma diz: são coisas que guardam para o casamento. Está me perguntando isso por quê? Sou casado e não avisaram? — brincou, apesar de compreender. Havia momentos que ele sentia essa vontade, a tal curiosidade, apesar de já ter beijado. Não fazia muito sentido, nem ele se entendia, mas o ímpeto existia e ele nem queria saber o que ela acharia se descobrisse que os impulsos surgiam principalmente quando estavam juntos.
— Ha. Ha. Ha. — Fingiu achar graça, olhando para a frente enquanto abraçava as próprias pernas. — Claro que sei que não é casado, a não ser que tenha uma vida dupla e não tenha me informado, do mesmo jeito que omitiu seu título de nobreza quando nos esbarramos no bosque. — rolou os olhos, ela nunca se esqueceria daquele episódio infame. — Te perguntei, porque do mesmo jeito que sei que não é casado, sei que não cobram as regras impostas para as mulheres com a mesma intensidade para os homens. — Os olhares se encontraram.
Os lábios de secaram ao descer os olhos para a boca entreaberta dela.
— Já. Já beijei antes. — Enfim, confessou. — Não sei em que posso te ajudar mais.
— E como é? — Ela o observou com mais intensidade, causando um leve desconforto.
— Não me pareceu muita coisa para terem que guardar até o casamento. — E no mesmo instante que se deu conta do que falava, amaldiçoou-se. Quem estivesse olhando a conversa em outro ângulo poderia entender que ele estava a induzindo indiretamente a se perder nessas coisas sem ligar para as consequências e reputação que poderia sujar. — Não senti muita coisa. — Corrigiu, sendo franco.
— Hm… — mais uma vez virou a cabeça para frente, pensativa. — Será que você não beijou errado?
— O quê? Não! — O príncipe sentiu o orgulho ser ferido — Eu sei beijar, .
— Pode me mostrar como é?
era louca, ele estava certo disso.
Aquele pedido o pegou tão desprevenido que engasgou outra vez, agora mais intensamente.
— Ficou maluca? — O tom de voz subiu.
Para , era explícito que , apesar de estar sob o constante julgamento e regras da sociedade conservadora de Sotenperl, traçava os próprios caminhos e estabelecia os próprios limites. Assuntos que eram tratados como impróprios não precisavam ser para ela, necessariamente.
— Você mesmo disse que não é grande coisa. — Crispou os lábios e logo voltou a falar. — O que tem demais?
— E a coisa toda de esperar pelo casamento?
— Você mesmo não esperou para ter o primeiro beijo. Eu vou saber disfarçar quando tiver um marido. — Garantiu determinada, e aquela possibilidade não agradou . Sabe-se lá por quê, mas a ideia de ela ter um marido o incomodava mais que o ato de enganar outro homem. Deixou um suspiro involuntário escapar.
— Não está bem da cabeça, . Por acaso levou alguma pancada recentemente? Está mal da cabeça.
— ! — Ela se levantou, batendo o pé. — Por favor?
O príncipe engoliu seco, mas continuou a negar.
— Faça isso por mim, por favor. Nunca mais te peço favores. — Aquilo era uma mentira. — Só dessa vez. — Entrelaçou os dedos em frente ao peito em súplica. — Por favor? — Bateu os cílios freneticamente e o coração dele acelerou. — Se não for você, sabe que vou dar o meu jeito. Não é o único ser humano na terra…
— Está certo! Você venceu! — Ele também se ergueu, desesperado com o rumo que as coisas estavam tomando. — Qual é o seu problema, garota? Não pode sair por aí leiloando beijos… — repreendeu-a, nervoso.
— Que seja, vai me ajudar?
— Não me deu muita escolha.
Ao perceber onde havia se metido, finalmente se deu conta do que estava prestes a fazer. Então, ficou apreensiva.
— Temos um problema. — Levantou o dedo com um sorriso amarelo. — Eu não sei como fazer isso. Vai ter que me instruir.
— Apenas feche os olhos e sinta. Seu corpo irá reagir naturalmente e saberá o que fazer.
— Espero que sim — murmurou, juntando as mãos para trás do corpo, fechando os olhos logo depois.
tremeu, sentindo o peso da ação que estava prestes a concretizar. Umedeceu os lábios e se aproximou devagar. Quanto mais perto chegava, mais reparava no rosto dela. As pálpebras dela tremiam de leve, indicando expectativa. Queria fazer direito por ela. Prendeu o ar sem nem perceber. Não era porque a experiência dele não foi marcante o suficiente que a dela deveria ser assim também. Com cuidado, as mãos foram para o rosto dela, removendo algumas mechas de cabelo rebeldes no meio do caminho. Em seguida, apoiou uma palma em cada lado, acariciando as bochechas com o polegar, tal carinho arrancou um leve sorriso dela e um arrepio gostoso. aproximou o rosto até que as respirações começassem a colidir e assim percebeu que a dela começou a ficar mais agitada, assim como a própria. Fechou os olhos e inclinou um pouco a cabeça para selar as bocas. sentiu os lábios sofrerem uma leve pressão diante da outra boca, ao mesmo tempo que as respirações quentes se mesclavam. Permaneceram naquela posição por vários segundos, até que tomou a iniciativa de recuar alguns centímetros, ainda de olhos fechados.
— Então, é isso? — Sussurrou um pouco decepcionada. — Realmente, nada dem… — sem aviso prévio, sentiu um dos braços de contornar sua cintura, puxando-a para perto outra vez, arrancando um arfar. Foi com essa chance que o príncipe finalmente tomou os lábios dela de verdade para ter a sensação e o sabor que tanto ansiava.
A maneira arrastada que a língua dele se movia dentro dela causava arrepios por todo o corpo. A velocidade ideal para que ela tivesse a oportunidade de sentir tudo o que precisava e entendesse como funcionava para acompanhá-lo. As mãos que antes estavam para trás agora se apoiavam nos ombros dele, buscando por sustentação para mais contato. Sem muitos planos, os beijos começaram a se intensificar e, quando deu por si, tinha os braços entrelaçados no pescoço de , ofegante e assustadoramente ansiosa por mais.
O príncipe não se encontrava em situação muito diferente: de olhos esbugalhados e respiração entrecortada, procurava aplicar todo o treinamento de autocontrole que recebera na vida para controlar os batimentos desenfreados que retumbavam contra o peito.
Talvez ele só tivesse beijado a pessoa errada na primeira vez.
Ele estava completamente equivocado quando disse que beijos não eram nada demais.
Finalmente, cumprimos tudo o que prometemos
E foi a nossa estabilidade invejável
Sempre alegre, sempre assim e assim unidos
Nada iria nos separar
E foi a nossa estabilidade invejável
Sempre alegre, sempre assim e assim unidos
Nada iria nos separar
— Não tenho muito tempo até se darem conta de que deixei o castelo. A pobre da Hermina até tenta me acobertar. — O garoto riu balançando a cabeça em negação, referindo-se a babá que cuidava de si desde pequeno. — Mas ela não é muito boa com mentiras.
— Como tem estado, ? — o admirou todo esbaforido pela chegada às pressas, oferecendo um sorriso sereno que o aqueceu mais que a corrida que fizera até o ponto de encontro de sempre.
Desconcertado, o príncipe precisou de alguns segundos a mais para se recompor. Somente voltou a falar quando já estava sentado ao lado dela.
— Cansado. Todos os dias inventam novas atividades e mais eventos da Corte para que faça parte. — Bufou. — É impossível lidar com tudo num dia só.
absorvia o desabafo, calada. Ela sabia. Não tinha noção de como seria viver na pele dele, mas tinha algumas impressões. A frequência reduzida com que estavam se vendo ultimamente contribuía para a visão. já não tinha mais tempo para ela e mesmo assim se arriscava.
Crescer às vezes parecia um fardo.
— Sinto muito — foi tudo que saiu.
encarou a garota que estava se tornando uma bela mulher diante de seus olhos. Estavam amadurecendo.
— Não sinta. Sou eu quem deveria te dizer isso… Todas as vezes que preciso cancelar o que combinamos por causa de um compromisso de último momento.
— Eu entendo, . De verdade. Não se preocupe.
O clima da conversa estava bem para baixo, desagradando o príncipe, que não queria passar os poucos momentos que tinha com dessa forma.
— Conseguiu folhear os livros que te cedi da biblioteca real? — Mudou de assunto para um que tinha certeza que a alegraria mais.
— Sim, sim sim! — Como esperava, os olhos pareceram acender em paixão. — São incríveis, . Obrigada. — Depositou um beijo despretensioso na bochecha dele que acabou pegando no canto da boca. Alguns segundos de constrangimento.
— Não tem que agradecer. Quando quiser mais, deixe-me saber. — O herdeiro sorriu largamente, bobo com o formigamento que sentia na região onde ela encostou.
— Não devo abusar. Ainda tem algumas palavras que não entendo, mas está me ajudando bastante com o meu desejo de poder crescer mais na vida, ter mais oportunidades do que um dia os meus pais poderiam imaginar. Obrigada mesmo!
— Ei! Temos um trato, lembra? Você estuda e eu tento ser mais paciente com os assuntos reais.
— E juntos vamos conquistar o mundo! — Sorrindo cúmplices, bateram as mãos pelo bom trabalho que estavam fazendo e os ótimos resultados evidentes.
E eu não entendo
Tudo parecia tão perfeito
Nós fomos feitos um para o outro
Não havia nenhum amor como o nosso
Tudo parecia tão perfeito
Nós fomos feitos um para o outro
Não havia nenhum amor como o nosso
— Juntos até o fim? — Ela ergueu o mindinho para selar um pacto, claramente afetada emocionalmente pelo clima quente e festivo do final de ano.
— Até o fim. — entrelaçou o dedo ao dela, firmando uma promessa sob o testemunho das estrelas naquela noite especial.
E agora, de repente
— Estou saindo da cidade em breve, .
— Como é?
Você está me deixando (você está)
E você sorri para mim pedindo uma amizade (você está)
E você sorri para mim pedindo uma amizade (você está)
— Consegui uma bolsa de estudos no exterior. É importante para mim. — Forçou um sorriso trêmulo.
— Eu… Nossa… — ajustou as golas das vestes reais que repentinamente pareciam o sufocar.
— Nos veremos mais rápido do que poderá contar, . — Mais um sorriso amargo. — Continuaremos sendo amigos, certo?
Como não ser um bastardo egoísta e ficar feliz com aquela notícia da amiga?
Ir à escola e não consigo me concentrar
Meu coração quebra pela metade só de pensar que você está indo (você está)
Meu coração quebra pela metade só de pensar que você está indo (você está)
Sentada em seus aposentos, a rainha era informada de que durante as aulas de montaria, se distraiu, caindo do cavalo.
— Como é possível? É o cavalo mais manso de todo o reino. — A mulher se enfureceu. — Isso nunca havia acontecido antes. Imprestáveis. Como meu filho está?
— Um braço torcido, Majestade. Presumo que não poderá frequentar as aulas durante os próximos dias.
— E onde ele está agora? — A rainha continha a ira falhamente.
O servo tremeu, sabendo que a resposta não seria de total agrado:
— Na cidade, Majestade.
A mulher bateu contra o apoio de madeira nobre revestida com uma folhagem de ouro com tanta força que a empregada que a atendia deu um pulo de susto.
— Talvez eu não tenha sido tão incisiva com ela quanto precisava — murmurou para si, furiosa.
Você está me deixando (você está)
Sair correndo, você cede e já (você está)
Não há explicações, nenhuma chance
Meu coração quebra pela metade só de pensar que você está indo (você está)
Sair correndo, você cede e já (você está)
Não há explicações, nenhuma chance
Meu coração quebra pela metade só de pensar que você está indo (você está)
Aquele era um jantar importante que poderia firmar futuras alianças para Sotenperl. Para não ser injusto e privar quem não merecia de seu mau humor, bem que tentou escapar da ocasião alegando mal estar. Os convidados na mesa certamente iriam compreender, no entanto parecia que sua mãe estava trabalhando para o outro lado: o lado que não visava pelo seu bem. Os olhares fumegantes deixavam explícito o clima desconfortável da refeição.
O príncipe já estava ali por obrigação, não poderiam arrancar mais nada dele.
— , reparou nas vestes da senhorita Syrena? Exuberantes tal qual a beleza da mesma. Não fazem dessas aqui em Sotenperl, deveria levá-la para mostrar os trabalhos dos costureiros reais. O que acha, Syrena?
Filha de nobres influentes nas fronteiras com o leste, era claro que sua mãe estava tentando juntá-los. Seria inútil.
— Seria incrível, Vossa Majestade. — A senhorita replicou em tom educado.
— Com certeza estão a nível de sua beleza, senhorita. Temo que terei de decepcioná-las. — O herdeiro interrompeu. — Não tenho tido muito tempo livre em minha agenda. Tenho certeza de que Hermina a guiará pelo que nosso reino tem de melhor. Com vossa permissão, vou me retirar. Não me sinto bem.
Sob protestos, subiu para se trancar nos próprios aposentos.
Estava infeliz.
Do lado de fora, não demorou para que sua mãe viesse quase soltando fogo pelas narinas.
— O que há com esse meu filho? — Praguejava do outro lado da porta, esperando que abrisse as portas para si. — Onde já se viu tamanho desrespeito com convidados importantíssimos?
— Se me permite, senhora… — o braço direito da rainha tomou a palavra. — Creio que ambas saibamos a resposta para tal desânimo do príncipe: a premeditada partida da jovem . Aparentemente, era ela que o mantinha nos eixos para cumprir com todas as tarefas reais. Indo agora, meu jovem mestre está desnorteado.
— Mas de novo a ? Achei que a mandando para longe, essa relação juvenil e sem fundamentos terminaria! Ela vai estudar fora e esquecer tudo! É justo que meu filho fique assim por quem não o valoriza?
Dentro do quarto, sentado sobre o colchão, conseguiu ouvir a última fala da mãe.
Um estalo.
Em passos pesados, abriu a porta em um rompante, assustando as duas mulheres que discutiam em frente ao cômodo.
— Você fez isso? — Os olhos estavam nublados de irritação.
— Claro que fui eu. — A soberana ajustou os cabelos penteados milimetricamente — Deveria estar grato pela oportunidade que estou dando a sua amiga, filho ingrato. — Empinou o nariz. — Se não eu, quem olharia para aquela pobre coitada?
— não tem nada de coitada. — Travou o maxilar e fechou as mãos em punhos. — Ela é a mais brilhante das mulheres da idade dela.
A rainha riu com vontade.
— Está tão iludido, pobre filho. Coitada talvez ela não seja mesmo, soube aproveitar a oportunidade e está indo estudar no exterior. Esperava mesmo que ela ficaria por você, ?
Confesso que sem você eu não conseguia dormir
Seu cheiro ainda está nas minhas roupas, bebê eu te sento aqui
Quando isso não vi, eu me apaixonei por você
E agora você diz que vai embora e eu não sei o que dizer
Seu cheiro ainda está nas minhas roupas, bebê eu te sento aqui
Quando isso não vi, eu me apaixonei por você
E agora você diz que vai embora e eu não sei o que dizer
As horas passavam, a luz no ponto alto do céu ia desaparecendo para dar lugar aos primeiros raios solares. Estava amanhecendo e mais uma vez ele não pregara os olhos a noite toda. Rolando de um lado para o outro, sobre os lençóis luxuosos, o príncipe se pegava arquitetando maneiras de convencer a ficar.
Parecia injusto, pois foi um objetivo que eles trabalharam para ela alcançar indiretamente, correto? Era óbvio que a dedicação e os estudos dela resultariam em frutos. só não esperava que fosse tão rápido e a matriarca colocaria o dedo na jogada.
Disposto a encontrar outra vez, armou um plano na cabeça que seria infalível. Pobre da senhorita Syrena que precisaria ser colocada no meio da bagunça de sua mãe, mas seria o único jeito. Ultimamente, todas as vezes que encontrava uma brecha para sair do castelo, os Conselheiros vinham ao seu resgate alegando alguma decisão importante de última hora. Suspeitava que mais uma vez, a rainha estivesse envolvida. O destino parecia não conspirar por eles.
Suspirou.
Para se redimir do fiasco que fora o último jantar no palácio, fez um convite formal para que a senhorita Syrena o acompanhasse num passeio surpresa. A rainha não poderia estar mais satisfeita ao ver os dois se distanciando à cavalo com alguns guardas de posto logo atrás. Parecia que o filho estava acordando para a realidade por fim.
Mal sabia ela.
Syrena estava feliz com o passeio. Tal atitude do príncipe de Sotenperl somente provava e reforçava o bom caráter que os boatos diziam. Mantinham uma conversa cordial. Ele era educado e respondia a tudo que perguntava. Educado demais. Solícito demais. Isso a incomodou no íntimo. Era tudo calculado demais, como se estivesse movido pela obrigação. Algumas cartas estavam se fazendo bem óbvias na mesa. De repente, pararam.
— O que acha de provar algumas iguarias de nosso reino? — indagou já de pé ao lado do cavalo dela, com as mãos estendidas para ajudá-la a descer.
— Claro. Como achar melhor, Majestade.
Me diga o que aconteceu com essa promessa
Por favor, volta baby, você é a única que me interessa
Eu coloquei as cartas na mesa, eu te juro minha princesa
Você é a peça que faltava para meu quebra-cabeça
Por favor, volta baby, você é a única que me interessa
Eu coloquei as cartas na mesa, eu te juro minha princesa
Você é a peça que faltava para meu quebra-cabeça
O relacionamento dela com havia mudado. Todos estavam diferentes. Nem ela era mais a mesma, mas se havia algo que permaneceu intocado era o amor por fazer entregas e pelas oportunidades de desbravar várias terras. Voltava ao fim de mais um dia após entregar um lote inteiro de arroz. Só não contava que o dia cansativo estava longe de terminar. Quando cruzou as portas da mercearia despretensiosa, deu de cara com o príncipe acompanhado de uma bela garota.
O coração doeu.
Deveria ter suspeitado da movimentação na frente da loja.
Era bem daquele jeito que a rainha havia desenhado, não? Príncipes como ficavam com beldades da nobreza como aquela senhorita deveria ser. Mirou rapidamente para as próprias mãos imundas e gastas pelo trabalho árduo e se sentiu envergonhada. Não importava quantas vezes tentasse passar as mãos pelos cabelos, não estaria a altura.
— Independente da aparência, , que é uma coisa que tem, seu sangue continuará sempre entregando.
A fala pesada da monarca ecoava em sua cabeça. Era um tipo de terror e humilhação psicológica desnecessária. Esse era um dos motivos pelos quais ela não podia desistir dos estudos no exterior. Ela precisava provar que podia ser grande como queria. Não só pela rainha, mas por causa de pessoas como ela. ansiava por mostrar aos colegas de povoado e vizinhos que todos eles podiam alcançar as estrelas se fosse da vontade.
Se não fosse o amor de , as estrelas deveriam ter preparado alguém para amá-la no futuro como achava que merecia.
— ! — A voz tão familiar a despertou.
— Alteza. — Curvou-se levemente duas vezes em respeito.
prontamente estranhou o tratamento distante, então se lembrou que deveria ser por respeito à Syrena.
— Sabe que não precisa me chamar assim. — Informou em tom carinhoso e cuidadoso para certificar que ela entenderia o recado e que a outra moça não faria nada.
Apenas por assistir quase saltar para chegar à camponesa diante da entrada do mercadinho, Syrena finalmente compreendeu. Um coração cheio não podia ser preenchido, porque já estava completo.
O tom com que o príncipe se dirigiu à moça já foi diferente do que usara o dia inteiro com ela. Suspirou. Pelo menos, ele não estava a enganando pelo dinheiro que o sobrenome poderia trazer.
O príncipe de Sotenperl estava fora da sua lista de possíveis maridos. Definitivamente. Um pouco mais afastada, assistiu ele abraçá-la sem pudor, chocando aos presentes. Interações desse nível entre um homem e uma mulher não eram comuns. Por ser o sucessor do trono do reino, as coisas ficavam um pouco mais interessantes e chamativas.
— O que pensa que está fazendo? — desesperadamente disparava tapas contra as costas dele enquanto continuava a receber aquele abraço tão convidativo.
Quem havia dado permissão para que ele destruísse todas as barreiras que estava levantando?
Aquilo não era certo.
— Eu não entendo. — Ele repetia com o rosto afundado nos cabelos dela, inspirando o perfume que tantas vezes já sentiu deitado assistindo às estrelas. — Por que tudo tem que ser assim? Não entendo.
Não havia sido o destino que os juntou naquele bosque? estava escolhendo confiar nele mais vez para que se encontrassem outra vez. O medo de que talvez eles não sejam para ser pairava, mas precisaria pagar para ver. No momento, e ela eram uma realidade paralela que não somava.
E eu não entendo
Tudo parecia tão perfeito
Nós fomos feitos um para o outro
Não havia nenhum amor como o nosso
Tudo parecia tão perfeito
Nós fomos feitos um para o outro
Não havia nenhum amor como o nosso
FIM
Nota da autora: Oieeeee! Se você está lendo isso, foi porque tudo deu certo no final e esse ficstape chegou a tempo, bem aos trancos e barrancos, mas foi. Obrigada por ter chegado até aqui e por ter destinado um tempinho do seu dia para a história.
Agradeço dez mil vezes mais a organizadora pela oportunidade e principalmente à beta pela paciência. Depois de muito surtos e mil e uma tentativas de plots, um foi finalmente para frente nos termos de aceitável e chegamos a um aparente final, hm?
Se cuidem!
Beijos,
Hales
Nota da beta: Oi! O Disqus está um pouco instável ultimamente e, às vezes, a caixinha de comentários pode não aparecer. Então, caso você queira deixar a autora feliz com um comentário, é só clicar AQUI.
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