06. Too Close for Comfort

Última atualização: 08/01/2019

Capítulo Único

I never meant the things I said
To make you cry, can I say I'm sorry?
It's hard to forget and, yes, I regret
All these mistakes


estava chorando novamente. Era como se uma torneira se abrisse em momentos aleatórios, seja fazendo compras, assistindo TV ou cozinhando. Um choro silencioso, sem fungar ou gritar. Apenas lágrimas correndo por seu rosto pálido, como se nem percebesse. Mas naquele momento, sabia exatamente o motivo.
— Olha, me desculpe… Não tive a intenção de te magoar. Sabe que eu nunca faria nada pra te ver triste, não sabe? — suspirou, olhando para a garota sentada no chão com as costas encostadas no sofá. Seu rosto estava vermelho, e ela limpava as lágrimas que caíam com a manga do suéter vermelho. Aguardou uma resposta que sabia que não chegaria.
seguiu até a cozinha. Fechou os olhos e respirou fundo. Não queria perdê-la, mas sabia desde o início que não daria certo. era quase o oposto do garoto, mas estavam tão apaixonados que tentaram fazer dar certo. Ele a amava, mas não conseguia lidar com os surtos diários da menina, que sofria desde a infância com uma família problemática e abusadora. Ela nunca havia falado aprofundadamente sobre o assunto, sempre dizendo que não se sentia confortável, mas ele percebia pelas marcas que apareciam em seu corpo, do quanto ela parecia mais abatida a cada dia, pelo modo com que ela escondia o namoro de seu pai e tinha o maior cuidado possível ao saírem na rua, que era mais complicado do que parecia ser. Agia o mais cautelosamente possível, tomava cuidado com suas palavras e tentava convencê-la de que ele estaria ali sempre que precisasse. Sabia que não tinha condições de lidar com uma situação tão delicada quanto a dela, mas ele tentava. E tentava muito.
Ele abriu um dos armários e pegou um copo, seguindo até a geladeira. Antes de abri-la, focou em uma polaroid grudada por um pequeno ímã vermelho em forma de coração. Na imagem, os cabelos loiros de voavam com o vento. Seu sorriso iluminaria o dia de qualquer pessoa que a visse naquele momento, e o azul de seus olhos combinavam perfeitamente com o grande oceano que se estendia por trás. sorriu ao lembrar daquele dia, em que a menina esqueceu todos os seus problemas em casa e eles apenas curtiram aquele final de semana juntinhos, sem pensar em mais nada.

— Esse lugar é perfeito!
estava sentada na pequena lancha alugada para os dois, que faria um curto passeio de duas horas pelo mar de Key West. A menina observava a costa se afastar com uma expressão esquisita, arrancando sorrisos de canto de , que manuseava uma câmera polaroid e tirava fotos da imensidão azul que lhes cercava. tirou a blusa que usava, ficando apenas com a parte de cima do biquíni azul e o short jeans expostos. Sentou perto da proa e fechou os olhos, sentindo a brisa que balançava seus cabelos loiros e ondulados. aproveitou o momento e tirou uma foto da menina, que percebeu e abriu os olhos, logo mandando um sorriso, posando para a foto. O homem tirou a foto e abaixou a câmera, admirando a beleza da namorada. Sua pele estava um pouco vermelha por conta do sol, seus olhos azuis pareciam mais vibrantes e seus cabelos voavam com a brisa. Ele só conseguia pensar no quanto a garota era como uma obra de arte, e no quanto era sortudo por tê-la ao lado.
pegou seu celular e colocou na playlist que marcava grande parte de seu relacionamento com . Ao som de
Queen, a menina foi até o namorado, pegando em suas mãos e o levantando com certo esforço.
— Me concede esta dança? — fez uma pequena saudação, estendendo a mão para o homem, que gargalhou alto.
— Mas é claro, milady.
E eles dançaram. Misturando 300 estilos de dança diferentes, mas dançaram. E se sentiu completo. era tudo o que ele precisava. Ela era a pessoa perfeita para ele, mas ele não era a pessoa perfeita para ela. E ele sabia disso. O homem puxou a namorada para mais perto, encostando suas testas.
… — ele olhou nos olhos de e acariciou sua cintura, arrancando um suspiro da loira. — Eu te amo tanto, garota.
Diante da revelação de , só se escutava o barulho da água e a respiração pesada da menina. Engoliu em seco, amaldiçoando-se mentalmente por ter revelado e não ter tido a resposta que esperava. Mas seu coração se aqueceu após alguns segundos ver um sorriso se formando no rosto da amada.
— Eu te amo mais.
E diante daquela resposta, ele sentiu que era o homem mais feliz do mundo.

I don't know why you're leaving me
But I know you must have your reasons
There's tears in your eyes, I watch as you cry
But it's getting late


Ver naquele estado não era estranho para . Na verdade, já a vira em situações piores, mas naquele momento, ele não podia nem ao menos se aproximar da loira sem que sua crise piorasse. Respirou fundo e a entregou um copo com água, que pegou e colocou ao seu lado, sem beber. O homem se sentou no sofá em que a namorada estava encostada e sentiu os olhos arderem ao observar o ambiente que havia tanto dos dois, mas que naquele momento parecia sem vida. Perto da televisão, um porta-retratos com uma foto de distraída em Villa Vizcaya fazia companhia para um girassol colhido no mesmo dia da foto. Uma mancha no tapete o lembrou de quando tentaram reproduzir a clássica cena do espaguete de A Dama e o Vagabundo e acabaram fazendo uma bagunça, sujando tudo de molho. Olhou para os tantos livros amontoados da loira na pequena estante perto de uma cadeira iluminada pela luz natural da janela ao lado e lembrou de tantos momentos em que a menina adormeceu enquanto lia. Observou todas as pequenas coisas que agora não haviam mais encanto, e sentiu falta do azul brilhante dos olhos de sempre que estavam juntos. Naquele momento, era apenas como um oceano profundo durante uma tempestade na madrugada. Já estavam a horas naquela situação, e ele estava começando a se cansar. Respirou fundo antes de tentar falar algo.
— Será que a gente não pode resolver isso logo? — Viu morder os lábios e fungar. — Eu não sei porque está fazendo isso. Você deve ter seus motivos, me deixe saber. — era quase como uma súplica. apertou os olhos.
— Meu pai sabe de nós. Não podemos continuar com isso. — Ela falava com dificuldade, como se faltasse forças para qualquer coisa.
— Esqueça seu pai, já disse. — se levantou do sofá e ajoelhou ao lado da loira. — Podemos fugir juntos. Para qualquer lugar, onde você quiser. Eu prometo que seremos as pessoas mais felizes do mundo, . Não precisamos desse lugar, você nunca gostou de Miami mesmo. Eu faço de tudo por você, meu amor. Prometo te fazer a pessoa mais especial do mundo. Só precisa aceitar.
sorriu fraco.
— Você já me faz a pessoa mais especial do mundo. Mas sabe que não podemos continuar com isso. Desde o início, você sabia. Sabe que ainda dependo de meu pai pra tudo, não posso fazer isso. Você merece alguém melhor que eu. Alguém que não tenha um pai terrível, alguém que possa te proporcionar tudo o que eu não posso. Alguém que te ame na mesma intensidade. Sabe que eu te amo muito, mas não é o suficiente. Não podemos, . Não era pra termos chegado a esse ponto.

Was I invading in on your secrets?
Was I too close for comfort?
You're pushing me out
When I wanted in
What was I just about to discover
When I got too close for comfort
And driving you home?
Guess I'll never know


Já havia se passado quase 15 minutos desde a declaração de . Eles ainda estavam sentados no chão. Era uma situação torturante para os dois. só queria que ela largasse tudo e ficasse com ele. Seria uma vida incerta, mas ao menos eles estariam juntos. Já só queria que tudo aquilo acabasse. Ele a amava quase mais que a si mesmo, e ela não gostava disso. Não queria alguém que colocasse a vida acima da sua, ela só queria morrer. Só queria que todo seu sofrimento acabasse, e não queria fazer ninguém triste quando finalmente fizesse sua dor cessar para sempre.
queria saber da real situação. Queria saber o que ela passava diariamente, mas era como se todas as portas se trancassem quando ele tocava no assunto. Queria ajudá-la, mas ela não queria ser ajudada.

cantarolava uma música qualquer dos anos 80 enquanto voltavam para casa. estava determinado a saber o que acontecia com a namorada e ele iria tirar algo dela naquele momento.
— O que tem entre você e seu pai? — ele perguntou sem rodeios. Teve a reação que esperava. parou de cantarolar e suspirou, apoiando os pés no porta luvas do carro. Esperou por um momento antes de continuar. — Sabe que não pode esconder pra sempre, não é? Só tenta. Por favor.
umedeceu os lábios e colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. Permaneceu em silêncio por mais alguns segundos antes de falar.
— Meu pai me odeia.
— Por que? — Pararam em um sinal vermelho e olhou para a menina.
— Ele me culpa pela morte da minha mãe. Já faz 16 anos. 16 anos que eu sou humilhada e maltratada todos os dias e não tenho outro lugar pra correr. Ele nunca gostou de mim, nunca. Ele amava mamãe mais que tudo, perder ela foi como se toda sua vida tivesse acabado, e ele me culpa por isso. — suspirou. Suas palavras saiam rápidas e raivosas.
— O que aconteceu?
— Ela morreu no parto. Não teve condições de continuar. — o nariz de começou a ficar vermelho e seus olhos arderam. Comprimiu os lábios e respirou fundo.
Ao virarem a esquina, viu de longe seu pai parado na frente de casa. O desespero começou a tomar conta de seu corpo, e ela tirou o cinto de segurança rápido.
— Para o carro! — gritou.
freou bruscamente e olhou confuso para a menina, que olhava assustada para a rua.
— Eu te ligo.
Ela saiu do carro e fechou a porta com força, correndo até sua casa. observou o homem alto e grisalho gritar e segurar pelo braço, a empurrando para dentro de casa.
E essa foi a primeira e única vez que a menina falou sobre o assunto.

Remember when we scratched our names
Into the sand and told me you loved me?
And now that I find that you changed you mind
I'm lost for words


Com casacos pesados e um guarda-chuva que mal protegia uma pessoa, e se divertiam na chuva que caía por toda Miami Beach. Sairiam dali com uma gripe forte, mas não se importavam. Contanto que estivessem juntos, tudo valia a pena.
observou a namorada correndo pela praia como uma criancinha com um sorriso no rosto. Ela adorava praias e chuva, então era a combinação perfeita para vê-la em um de seus momentos mais felizes. se aproximou do homem e sentou na areia, dando leves batidinhas ao seu lado como um convite para ele se juntar a ela.
— Tá molhado, amor.
— Quem liga? — limpou a mão suja de areia na calça e puxou o homem pelo braço, que sentou-se ao lado da loira. Ele fechou o guarda-chuva e levou uma de suas mãos ao ombro da namorada, e depositando um beijo em sua bochecha molhada, que abriu um sorriso de canto.
— Só você mesmo pra me fazer sentar nesse lamaceiro. — ele riu.
Ficaram observando o mar agitado até que a chuva parasse por completo. O casal estava totalmente encharcado, precisavam urgente de um banho quentinho e chocolate quente.
— Eu entraria nesse mar se não tivesse chances de pegar uma pneumonia daquelas. Deve estar gelado, também. — disse , com um ar de chateação.
— Você é doida, garota. — riu — Vamos embora?
— Tá bom. Mas antes, vou deixar uma lembrancinha. — correu seus dedos pela areia molhada da praia, escrevendo o nome dos dois, seguido por um coração. — Eu te amo, . Até que a água passe por aqui ou alguém pise e apague minha obra de arte.
— Só isso? — ele riu. — Eu te amo pra sempre, meu amor.

— Você me ama, ?
A loira riu.
— É claro que eu amo.
— Então por que ir embora?
— Eu preciso ir. — ela suspirou e secou o rosto com a manga do suéter. — Só quero que saiba que o que vivi com você nunca vai morrer. Você será sempre parte da minha vida, tudo que vivi ao seu lado será eternamente lembrado com carinho. Mas me deixa ir. Eu preciso. Você vai encontrar tanta gente incrível nessa vida, e vai sentir o amor de uma forma que você nunca achou que fosse possível. — Apertou os olhos antes de continuar — Você vai viver uma vida incrível, . Vai se casar, ter filhos lindos e uma família de invejar. Vai viver sua vida intensamente ao lado de alguém que queira o mesmo e que possa fazer isso por você.

You won't understand
How much it hurts to let you go


Ele já havia aceitado o que aconteceria. não faria mais parte da vida dele. Iria sofrer, é claro. Mas aceitar diminuiria certa parte da dor. Desde o início sabia que uma hora isso acabaria acontecendo. Só não esperava que fosse tão cedo.
Juntou todas as coisas da menina que ainda estavam em sua casa em uma caixa e pôs em cima da mesa. Passou as mãos pelo cabelo e suspirou, olhando para a ex-namorada. Estava apoiada na janela observando a paisagem, ainda com algumas lágrimas rolando em seus olhos. Sentia que aquilo também estava sendo difícil para ela, ele via em seus olhos que ela não queria partir. Aproximou-se da loira e tocou seu ombro, fazendo-A dar um pequeno pulinho de susto. Ela passou as costas da mão em seu rosto úmido e olhou nos olhos de , fazendo-o estremecer. Ela nunca o olhava nos olhos.
— Juntei suas coisas. — engoliu em seco e apontou para a caixa atrás deles. — Pode continuar aqui o tempo que quiser.
— E-eu vou embora agora. — gaguejou e desviou os olhos, indo até cabideiro ao lado da porta e pegando seu casaco, logo vestindo-o. Pegou a caixa da mesa e respirou fundo. Abriu a boca algumas vezes, mas não conseguiu dizer nada. Após alguns segundos, sua voz saiu falhada. — Eu amo você, . Você me fez muito feliz, espero que um dia consiga sentir o mesmo que senti.
— Não faça isso, por favor. — ele pediu mais uma vez enquanto se aproximava da garota, que deu um passo pra trás. — A gente pode fazer isso dar certo.
— Me desculpe.
De um momento para outro, se viu sozinho. A casa estava silenciosa e ele encarou a porta, esperando que fosse se abrir novamente e corresse para seus braços. Sentou-se no sofá e esperou. Esperou que ela voltasse e aceitasse viver o resto de sua vida com ele. Mas a porta não se abriu.




FIM



Nota da autora: Sem nota.

Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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