Capítulo Único
[1º DIA]
I look into the sky and I have to ask why she'd go and leave me.
Aquela quarta-feira de agosto amanhecera acinzentada. Mesmo que fossem os últimos dias em que o Verão estaria presente, e vezes chegando a marcar 104 graus Fahrenheit, aquela era uma exceção. Cidade grande e totalmente urbanizada tinha suas desvantagens, como a poluição e a neblina. Cerca de dez horas da manhã, no entanto, um tímido sol saiu de trás das nuvens e deu as caras no céu de Nova Iorque. Aquele era o momento perfeito para tomar um ar e dar uma volta pelo Brooklin, mas as pastas de combinações de materiais abertas em cima da mesa a sua frente, a lembravam de que havia muito a ser feito ainda. Ser a única designer de interiores da WRA, World Realtors Alliance, tomava quase todo o seu tempo, já que a rede de imobiliárias contava com seus serviços para decorar todas as casas e apartamentos antes de apresentá-los aos possíveis futuros compradores e moradores.
Ao menos havia conseguido o privilégio de trabalhar em casa três vezes por semana, já que a sede de Nova Iorque estava em processo de mudanças e ela não queria ficar em Seattle enquanto isso não acontecia. Depois de horas sentada em seu próprio escritório, um cômodo grande de paredes brancas e quadros vintage, fez uma pausa em suas pesquisas de decoração para a cobertura de um dos maiores prédios de Manhattan, pois o fato de não ter almoçado estava fazendo seu estômago revirar.
O relógio do microondas marcava oito horas da noite. estava tão absorta que nem ao menos percebera que já havia escurecido e nem que estava prestes a chegar de mais um dia de trabalho.
A designer de interiores abriu a geladeira, réplica de um modelo dos anos cinquenta, e escolheu um dos tantos congelados que deixava estocado e colocando no forno, programou vinte e cinco minutos. Uma lasanha e um vinho não compunham um jantar perfeito, mas quebraria um galho na comemoração de dois anos em que estavam noivos e o um ano que dividiam o mesmo apartamento. perguntava-se se deveria ter comprado alguma coisa de presente para o noivo.
Durante a espera, a mulher aproveitou para tomar um banho e relaxar debaixo da água quente, mas ao sair do banheiro enrolada em uma toalha, o que viu lhe fez questionar as atitudes de . Ele estava totalmente eufórico, andando de um canto a outro do quarto, revirando e guardando alguns pertences em uma mala que não reconhecia.
- Oi? – chamou a atenção dele para si, já que ele não havia reparado em sua presença.
- Hey, . – saudou sem lhe dar muita atenção. – Você viu minha carteira preta que sempre deixo na última gaveta? – alguns moletons eram jogados para fora na procura incansável do advogado.
- No bolso do paletó que você usou no casamento da minha irmã. – respondeu, abrindo a porta do guarda-roupa e resgatando a carteira. – Você está indo para algum lugar? – juntou as sobrancelhas, e entregou o pequeno objeto.
se viu dividido entre explicar o que estava acontecendo para sua noiva e aproveitar os últimos minutos que tinha para pegar suas coisas. Tentou fazer os dois ao mesmo tempo.
- E-eu... eu vou ficar fora por uns dias, . – evitou olhar nos olhos da noiva. Ele era o advogado, mas ela era muito boa em ler sinais.
apertou a toalha em seu corpo e aproximou-se de , que estava recolhendo alguns papéis, pousando sua mão um pouco fria no braço de e o fazendo parar. Ela o olhou profundamente nos olhos, esperando uma resposta mais completa.
- M-meus pais, . – falou a primeira coisa que veio em sua cabeça. Não podia falar a verdade e não sabia o que inventar. Precisava que acreditasse nele, então continuou usando todo o poder de convencimento que tinha, e que era muito útil quando estava perante o juiz, defendendo seus clientes. Respirou mais tranquilamente. – , meu pai está muito doente e eu preciso ir até lá. Ser filho único é um saco, você sabe disso e minha mãe não é muito ajuizada. – Foi incrivelmente convincente.
- Mas , seus pais moram na Escócia. – Ela juntou as sobrancelhas. Queria citar que aquele dia era especial para eles, mas imaginou que seria tamanho egoísmo pensar apenas em uma data comemorativa do relacionamento deles enquanto o pai dele estava doente.
- Eu preciso ir, você entende, não entende? – apertou seus lábios um no outro em uma linha e segurou a respiração por uns segundos. Mentir doía, mas estava sendo necessário.
- Entendo. – respondeu baixo e sua voz quase não saiu. Ela sentou-se na ponta da cama, pensativa.
- Eu tenho mesmo que ir, . Consegui uma passagem de última hora e... – olhou o relógio de pulso. – Tenho menos de trinta e cinco minutos para estar no aeroporto.
deixou a mala com as coisas que pegara de canto e sentou-se ao lado de . Sua mão grande pousou em cima das delicadas da designer e, depois de alguns segundos lutando contra, ela virou seu rosto em direção ao dele. Ele ao menos se lembraria daquela data? Ou ao menos demonstraria que queria a companhia dela nessa viagem repentina?
- Não, eu não me esqueci. – disse simplesmente e envolveu uma das mãos no rosto de . – Sei que hoje faz um ano que moramos juntos e sei também que já são dois de noivado. Aliás, quanto a datas você sabe que eu sou muito bom. – ele sorriu, mas os lábios de apenas mexeram nos cantos, com um esboço de sorrisinho. – Eu não iria se não fosse importante, espero que você saiba disso.
- Eu sei. – encostou sua testa na dele. – Você vai fazer o certo. Mesmo com todas as brigas, sei que seu pai precisa de você. Eu gostaria de ir junto, mas não posso deixar Jephree na mão. – fechou os olhos e respirou profundamente. Como ele não havia pedido ou comentado, ela resolveu falar.
Era completamente saudável que um casal tivesse seus afazeres independentes um do outro, que mantivessem sua individualidade, mas, naqueles últimos dias, estava muito carente e nem ela sabia direito o motivo.
- Eu volto logo. Eu prometo. – disse antes de envolver a noiva em um beijo doce e marcante. Porém, um beijo de despedida. Era o que aquele ato significava e nem ao menos sabia. Uma despedida. Por hora.
O silêncio que fazia no quarto depois que o beijo foi interrompido era sepulcral. queria soltar um de seus discursos protetores e positivos e dizer que tudo ficaria bem, que logo ele estaria de volta, ou que tentaria uma folga para poder ajudá-lo em Glasgow, mas se calou. Por que aquilo estava parecendo como um término? Por mais que entendesse, estava triste.
- Eu te amo. – ambos sussurraram juntos ainda com as testas encostadas e sorriram pela coincidência de se declararem ao mesmo tempo.
não tinha o costume de verbalizar seus sentimentos e, naquele momento, fora pega de surpresa. Talvez para amenizar um pouco o aperto que estava sentindo, aquelas três palavras vieram na hora certa.
Já na porta do apartamento, depositou um selinho demorado nos lábios de e virou as costas. As últimas palavras que conseguira dizer fora:
- Cuide-se. Mande um beijo para os seus pais e... Seja um bom menino. – ela sempre usava o termo ‘seja um bom menino’ em tom de brincadeira quando ele ia visitar os pais ou os pais vinham até os EUA. Era como uma piada interna para os dois, pois a mãe de sempre o chantageava com essa frase quando ele era criança.
Quando as portas do espaçoso elevador se fecharam, as feições de mudaram rapidamente. Ele estava lívido, com as mãos suando e o maxilar travado. Ele precisava encarar o que estava prestes a fazer de cabeça erguida, mesmo que aquele fato magoasse momentaneamente a sua noiva e até ele mesmo. Ele havia mentido na cara dura.
Assim que chegou ao saguão do prédio que morava e encontrou dois homens muito bem vestidos, com ternos de caimento perfeito em seus corpos, ele lhes entregou documentos, celular e todas as informações que era necessária para que não existisse mais. Agora ele teria outra vida, ele seria outra pessoa. Ele estava fugindo.
[7º DIA]
She's over due for a break out. I better go she blows my brains out.
Silence is a scary sound.
Mais um dia cinzento em Nova Iorque. O outono se aproximava e os sinais da troca da estação apareciam aos poucos, como as flores de coloração mais vivas no Central Park. andava despreocupadamente pelo parque, enquanto tinha o celular em mãos, atenta a qualquer ligação ou mensagem que pudesse receber. Era exatamente assim que a designer estava vivendo os últimos sete dias, uma ansiedade incontrolável para saber aonde havia se metido.
A designer mal estava conseguindo trabalhar de preocupação e ninguém parecia levar a sério o fato de que, desde o dia em que saiu do apartamento para ir de encontro aos pais, exatos sete dias, ninguém mais ouvira uma única notícia sobre o seu paradeiro. Não sabia se estava bem, se havia chegado bem e inteiro ou qualquer coisa parecida. Exatos sete dias e todos os e-mails voltavam. As ligações nunca completavam e era como se o número jamais tivesse existido. Nenhuma das mensagens chegava a ser entregues e o fato de não saber o endereço dos pais de a impedia de mandar carta, postais ou sinal de fumaça; apesar de que era ele quem deveria tentar fazer isso. Como era possível alguém desaparecer do mapa?
Quando o relógio marcou 4 p.m., foi se encontrar com a irmã em uma cafeteria. Olivia era a única que parecia se importar com o que realmente acontecia, talvez pelo instinto maternal. Em muitos atrasos, encontraram-se e se abraçaram em um rápido cumprimento, indo ocupar uma mesa de madeira isolada da cafeteria, em seguida. Liv colocou em cima da mesa um jornal dobrado e a manchete que ficou aparente na superfície, dizia: “Menino de 15 anos é encontrado morto a tiros em beco”. sabia que mulheres grávidas ficavam mais sensíveis, mas estranhou o fato da irmã estar lendo um jornal sensacionalista e com a matéria principal sendo uma tragédia, mas ignorou o fato.
Pediram cookies e outras gostosuras que sempre apreciavam quando estavam por ali, além de chocolate quente para a mais nova e chá para a mais velha.
- Como anda o meu sobrinho? – perguntou, olhando carinhosamente para a barriga ainda nada aparente de Olivia.
- Está me dando muitos enjoos. Mal posso ouvir falar em bacon. Acredita em uma coisa dessas? Justo bacon. – seu olhar emanava decepção e não conseguiu conter o riso. As duas tinham uma teoria de que quem não gostava de bacon não era confiável e, ironicamente, não gostava.
lembrou-se dele. Tudo naqueles dias a fazia se lembrar dele, do que ele gostava, do que ele fazia e todas aquelas coisas de pessoa apaixonada. Ela não negava esse amor, mas evitara ao máximo estar em situações como aquela, em que era ‘abandonada’ ou que se sentia ‘sozinha’. Apesar de achar que o sumiço não dependia dele e sim de forças maiores, como um sequestro ou coisa pior, todo o medo que tinha de se magoar estava se concretizando.
Olivia levou seu chá até a boca e soltou um sonoro ‘hm’ em aprovação. Abaixou sua xícara e encarou a irmã por alguns segundos. Não havia mais escapatória, ela percebera o olhar de .
- E você, ? Como está sendo esses dias, sozinha? – perguntou, de forma compreensiva.
- Eu queria mesmo falar com você sobre isso, Liv. – assumiu um olhar sério. – Eu... bem, não estou muito bem e nem é pela solidão. – aproximou-se da irmã, e abaixou o tom de voz, como se o que estava prestes a dizer fosse um enorme segredo. – Desde que foi para a Escócia, eu não tenho notícias dele. Nos dois primeiros dias eu esperei, pois sabia que era uma viagem cansativa e que talvez não tivesse tido bateria ou tempo ou qualquer coisa. Mas, agora, depois de uma semana, acho que cansei de inventar desculpas. Tem alguma coisa muito estranha... – ela completou a última parte quase inaudível, como se não quisesse admitir aquilo.
- Calma, vamos por partes, . Ele não te mandou nem uma mensagem? – perguntou com as sobrancelhas unidas, estranhando a atitude do futuro cunhado.
- Não, nada. Eu tentei ligar, mas fala que o número não existe. Emails voltam e ele não está mais no whatsapp. E-eu não sei o que pensar, Liv... – admitiu, brincando com alguns torrões de açúcar no pratinho a sua frente, na tentativa de disfarçar o seu nervosismo.
- Aposto que você já tem mil teorias e que nenhuma delas é algo positivo.
realmente pensara em muitas hipóteses e das mais variadas, pois sua mente fértil não lhe deixara excluir possibilidades. Nos primeiros dias, imaginou que algum acidente poderia ter acontecido, mas mesmo não sabendo a companhia, o voo e a escala que utilizou para ir à Escócia, não haviam sido comentados nenhum problema com os aviões que saíram dos Estados Unidos rumo à Europa naquela semana. A outra teoria era que ele tinha sido sequestrado, ou que estivesse envolvido em coisas ilegais do qual precisaria se ausentar e resolver sozinho antes que as coisas complicassem. Porém, o pior pensamento que teve, talvez estivesse ligado a sua insegurança e ao seu jeito desconfiado de ser, era o que mais fazia sentido em sua cabeça no momento.
já havia estranhado o fato da despedida dias atrás ter soado como uma verdadeira despedida e aquilo martelava em sua cabeça. Seria aquela a maneira de terminar com ela? sentia que fora abandonada. Que aquele era o fim.
- Claro, né, Liv? Como eu iria ter alguma teoria positiva? Mesmo que o pai dele esteja doente e ele realmente esteja na Escócia a essa hora, por que ele fugiria de mim? De me dar notícias? Por que não iria fazer questão de me ligar pelo menos uma vez? Não consigo entender!
Frustrada, enfiou quase um cookie inteiro na boca e seus ombros relaxaram quase instantaneamente com a ingestão de açúcar. Contar aquilo para alguém aliviava seus sentimentos de alguma forma.
- O que ele disse antes de ir, exatamente? – inquiriu Liv.
- Eu já te contei. Falou que ia cuidar do pai e que voltava em poucos dias. Ele não levou quase nada de casa... – ela olhou a sua volta constatando que não haviam ouvidos e olhos curiosos próximos, debruçou um pouco sob a mesa e baixou o tom de voz, novamente, antes de prosseguir. – A calibre 38 dele não está mais no cofre.
- ... – Liv estava incerta se perguntava, mas achou melhor confirmar antes de criar suas próprias teorias também. – Vocês estavam bem antes disso acontecer? Digo, não tinham brigado, se estressado e nem nada parecido?
- Claro que não, Liv. Se tivéssemos em crise, ao menos eu teria uma ideia do motivo desse sumiço, mas não. Nós estávamos planejando o casamento, ele já havia me passado a lista de convidados dele e estava mais animado do que eu. A gente tinha acabado de escolher o bolo e os docinhos. Você sabe disso! – respondeu enérgica.
- É, eu sei. – a irmã recostou-se a cadeira e assumiu uma posição pensativa.
- Eu não sei o que pensar, sis. Sinceramente. – desabafou.
Naquele fim de tarde, decidiu que descobriria o que aconteceu com . Iria à polícia quantas vezes fossem necessárias, vasculharia cada canto da cidade, iria atrás de todos os amigos dele e talvez até dos clientes, faria plantão no escritório e, se precisasse, arriscaria ir até a Escócia e bater em casa por casa de Glasgow. Definitivamente, olharia para o noivo ao menos uma última vez. Olharia para ele mesmo se fosse para ouvir: ‘eu fugi, não quero mais compromisso com você, acabou’. Ela apenas precisava saber o que estava acontecendo.
Estacionou o carro na vaga destinada a cobertura em que morava e passou alguns minutos dentro dele olhando para o carro ao lado. O carro de . Uma BMW M135i prata. O carro que o noivo não largava por nada. Um simples objeto que era tratado como um filho, como um pedaço de algo muito frágil e precioso. Nesse momento, se arrependeu de pegar tanto no pé de insinuando que ele era materialista. Principalmente porque os cuidados com a BMW sempre foram bem maiores do que os cuidados com o próprio apartamento ou até com ela mesma. Mas era algo entendível no fim das contas, pois cada um tem sua paixão, assim como ela tinha a dela. Só não podia negar a contraditória saudade que estava de ver com uma flanelinha limpando o retrovisor antes de sair com o carro da garagem. Seus olhos se encheram de lágrimas.
Finalmente tomou coragem para se fechar mais uma noite no que deveria ser um lar feliz, e que por um bom tempo foi, mas que estava incompleto no momento. Aquele silêncio... Aquele silêncio tornava-se cada segundo mais insuportável, quase intolerante. O silêncio de e o silêncio da casa eram tão assustadores! Porém sua mente era o único lugar que não permitia nada menos do que muito barulho, muitos pensamentos desenfreados e embaralhados. Era sempre assim... pensava demais. sempre dizia isso a ela, sempre pegava no seu pé falando que ela precisava organizar sua mente da mesma forma que os sapatos estavam no closet.
Inundada pela saudade do homem que aprendera a amar tão facilmente, abriu uma das gavetas da parte do closet em que as coisas do noivo ficavam e pegou o moletom da Columbia University. A designer vestiu a peça de roupa masculina e quentinha, foi até a penteadeira, espirrou duas vezes o perfume que usava e se deitou na cama abraçando o próprio corpo. Estava pronta para depois de sete dias, se entregar a falta que o noivo fazia.
- Eu queria tanto que você mandasse ao menos uma mensagem falando que está bem... Eu preciso saber que você está bem. – sussurrou sozinha.
[20º DIA]
Funny feeling happened today
So we'll bury it in the past
Com a bolsa marrom de couro em formato de pasta pendurada em seu ombro, os óculos de grau e o cabelo bem penteado para trás com gel, Shawn Sullivan caminhava até a escola de Bath, onde estava lecionando inglês há quase um mês. Cabisbaixo, fez a sua primeira parada na sala dos professores, onde se abasteceu de café e, em seguida, foi para a sua organizada sala. Meia hora antes dos alunos chegarem, puxou uma caderneta de capa escura e uma caneta e, como sempre acontecia nas manhãs antes das aulas, se pôs a escrever.
“Oi minha menina.
Novamente estou escrevendo cartas que nunca vão chegar até você. Como eu queria que você soubesse dos meus motivos e dos meus sentimentos! Você sempre disse que não se importava com o fato de que eu sou péssimo em demonstrar carinho e nunca me cobrou atos românticos e, bem, por mais que eu seja muito grato por isso, tenho certeza que se eu tivesse lhe dado flores ou até tivesse escrito cartas antes, você poderia ter me amado mais. Não que eu duvide do seu amor, eu não duvido, mas talvez você esteja duvidando do meu agora.
Queria estar por perto para lhe ouvir pedindo mais dez minutos na cama. Ou para você me pedir para que eu passasse naquela doceria brasileira que você adora e comprar torta de limão. Aliás, nunca vou me esquecer daquele dia em que você me fez rodar quase o estado inteiro atrás da verdadeira torta de limão, a feita com leite condensado. Que bom que achamos o lugar perfeito! Mas, tenho uma boa notícia para você! Eu aprendi a fazê-la e, sério, ficou muito boa. Só não vale começar a me explorar na cozinha por causa disso, okay? Ainda tenho dificuldade com os ovos.
Desculpe-me por não ter me despedido da forma certa. Eu não sabia o que dizer.
Estou tão irritado com o fato de estar isolado aqui. Se tudo isso não fosse estritamente necessário, com certeza eu estaria dando minha cara a tapa. Até porque, por mais que você possa não acreditar, fiz isso mais por você do que por mim. Na verdade, fiz pela gente, mas se eu estivesse sozinho nessa, teria me arriscado muito mais.
Nunca fui muito religioso, mas as pessoas por aqui são. Ouvi dizer em uma pregação esses dias que “depois da tormenta vem a bonança” e quero me apegar a isso. Estar sozinho em um lugar desconhecido, sem saber em quem confiar e o que pode acontecer é horrível. Está muito ruim para mim, acredito que para você também, mas em breve teremos nossa bonança.
Estou morando com uma senhora muito simpática aqui. Ela é a única em quem eu tenho confiado. O nome dela é Lauren Lafferty. Tenho certeza que você adoraria conhecê-la. Ela também trabalha com d...”
- Bom dia, professor Shawn. – um aluno chegou à sala de aula e o cumprimentou.
Com um sorriso formal, Shawn fechou seus escritos e guardou a caderneta na pasta. Em poucos segundos o sinal tocaria e ele precisaria tirar a ponta dos dedos dos pés que já estavam prestes adentrando no mar do passado. Não que a palavra certa fosse passado, mas era uma realidade em que ele não podia mais viver por um tempo.
[25º DIA]
I better go before she blows my brains out
Silence is a scary sound
saiu da WRA por volta das duas horas da tarde. Estava pronta para reencontrar suas amigas da faculdade na sorveteria que costumavam ir juntas desde a época em que estudavam juntas, mas desviou sua rota para o Soho, especificamente na Thompson Street. Quando estacionou a BMW de na porta do escritório em que o pai havia montado para ele e dois amigos sócios, respirou com certa dificuldade. Aquela seria sua última chance.
Apertou o interfone e se anunciou. Olhou em volta, prestando atenção no movimento da rua e estranhou o fato de ter dois homens de terno dentro de um carro preto, olhando disfarçadamente para ela. Porém, prontamente, Millicent, a secretária, liberou sua entrada no prédio e a recebeu com um sorriso sincero e conhecido. As duas se abraçaram e não via mais os dois homens.
- Está com problemas tributários ou cíveis? Só não diz que é criminal porque um certo advogado precisou ir à Escócia por tempo indeterminado. – Millicent brincou.
sorriu automaticamente com a brincadeira. Bem, para todos os efeitos, também havia dito à Millicent sobre a Escócia. Talvez ele tivesse entrado em contato com eles, então. Descobriria ao falar com Drew e Austin, os amigos inseparáveis e cúmplices de desde o colégio.
- Vocês não têm nenhum detetive ou psiquiatra por aqui? – respondeu no mesmo tom de brincadeira e riu, balançando a cabeça negativamente.
- O que está acontecendo? – a secretária perguntou, com as sobrancelhas praticamente unidas, demonstrando preocupação.
respirou profundamente e olhou para o corredor em frente. Duas portas abertas, uma fechada. Algumas pessoas na sala de espera. Desistindo de esperar por uma resposta, Millicent foi até a sua mesa e avisou aos dois advogados do escritório que estava ali. Drew e Austin, surpresos com a visita, adiaram alguns clientes para atender a noiva do amigo.
Quando passou pela larga porta de madeira maciça, encontrou Drew sentado em sua cadeira atrás da mesa de vidro cheia de pastas e papéis e Austin em pé, ao lado do outro, com os braços cruzados. A garota fechou a porta imaginando que seria melhor alguma privacidade e olhou de um advogado a outro, como se quisesse lê-los e até prever alguma coisa. Talvez, se tivesse sexto sentido, poderia prever o que estava por vir.
- Pequena Howard, o que faz por aqui? – Drew foi o primeiro a se pronunciar. Os dois não se davam muito bem desde que esse tentara levar para um bordel como presente de aniversário e ela descobrira. Coisas bobas, mas que facilmente fazia com que ficasse de pé atrás o suficiente para não querer ter muita convivência.
- Oi Drew. – respondeu sem muita emoção. – Tudo bem, Austin? – perguntou, formalmente. Austin era decente, ela o admirava muito e fazia gosto da amizade dele com o noivo. Não que tivesse o direito de palpitar em algo, mas era algo que gostava de avaliar.
- Como está nosso ? – Austin perguntou depois de acenar com a cabeça, respondendo estar bem de forma silenciosa.
- Essa é realmente uma boa pergunta. – respondeu, inquieta. Sua perna direita não parava de batucar no chão.
- Você também não tem tido notícias dele? – Drew pareceu preocupado. – Muitos clientes estão ameaçando nos processar, ele deixou vários casos em aberto. – completou.
Por um momento achou que Drew realmente estivesse sentindo falta do amigo, mas logo em seguida percebeu que estava enganada. Negócios em primeiro lugar? Não podia acreditar. Em todo o caso, eles sabiam tanto quanto ela. Ou ela pelo menos imaginava que sim.
- Eu estou realmente preocupada. – a mulher desabafou.
- Eu tentei mandar mensagens, ligar e mandar email. Também não consegui contato. – Austin falou, lamentando.
Naquele momento, a ideia de que tinha lhe abandonado parecia absurda. Mesmo que ele não quisesse mais manter o relacionamento que tinham, que tivesse desistido do casamento, ele nunca largaria clientes e nem o escritório. O noivo sempre se esforçou muito para chegar a uma boa faculdade e se formar com honra e, por mais que o escritório tenha sido presente de seu pai, ele era totalmente responsável em relação a sua profissão. se sentiu uma ridícula por ser tão egoísta.
A designer se deu por vencida. Eles sabiam tanto quanto ela e dali não sairia mais nada. Sem muitas delongas, comentou sobre o fato de estranhar tal sumiço e até sobre ter ido à polícia sem obter nenhum resultado. Austin comentou ter o telefone do pai de anotado em algum lugar e prometeu que procuraria e enviaria em uma mensagem de texto para . Logo se despediam com a promessa de que se qualquer um deles conseguirem algum contato, comentar um com o outro.
Saindo do prédio, despediu-se rapidamente de Millicent e entrou na BMW mais uma vez. Estava mais uma vez de mãos atadas e completamente nervosa e irritada por não saber o que pensar e nem qual outro caminho seguir. Chateada, cerrou os punhos e bateu com as duas mãos no volante.
- , ... Aonde você se meteu? – sua voz estava mais grave que o normal.
Sem cabeça para encontrar com as amigas, desistiu do reencontro. Não seria muito fácil ouvi-las comentando de seus namorados ou suas noitadas enquanto ela tinha que se preocupar com um desaparecimento. Nem em seu emprego voltaria mais naquele dia. Compensaria no dia seguinte, já que estava preste a ir às compras e montar mais uma decoração.
Ao chegar ao apartamento, , por instinto, talvez, resolveu vasculhar o quarto e buscar principalmente nos lugares em que havia mexido no último dia ali. Toda a papelada do noivo fora vasculhada e nada. O armário também não tinha nada de suspeito ou de pista, mas na gaveta de cuecas e meias, encontrara algo. Um pequeno pedaço de papel branco amassado e com um número de telefone. A letra era definitivamente de seu noivo, porém uma escrita cansada e atrapalhada, como se tivesse sendo escrita às pressas.
Nem ao menos pensou. Com celular em mãos, discou os números e levou o aparelho ao ouvido. Mordeu o lábio inferior segurando a respiração. Poucos toques e uma senhora a atendeu.
- Alô? – congelou. Sem nenhuma resposta, a voz feminina soou novamente. – Olá, alguém aí?
juntou forças e tentou parecer tranquila. De quem seria aquela voz? De quem seria aquele telefone? Com certeza não era de Nova Iorque, mas era no território estadunidense. Depois procuraria pelo código.
- Boa tarde, com quem eu falo? – tentou.
- Com quem gostaria de falar, querida? – a senhora respondeu com outra pergunta. As pessoas andavam muito desconfiadas no século XXI. se perguntava o que custava a mulher ter dito o maldito nome, mas resolveu tentar outra abordagem.
- . – disse por fim. – Gostaria de falar com o . Você o conhece? – mordeu o lábio nervosamente.
Queria muito que a resposta fosse sim e que ele atendesse a ligação com sua voz grossa e firme e que lhe dissesse que havia perdido seu celular e que não comprara outro, que o email estava com problemas, e que ele infelizmente estava incomunicável por algum motivo convincente, mas que ele estava bem e que logo voltaria. Precisava ouvir algo positivo.
- Não, minha querida. Não tem ninguém com esse nome aqui. Acho que você discou o número errado. – a senhora disse calmamente.
- Oh, ok. Obrigada. – a voz de não passava de um sussurro sem força.
Estava ficando sem opções.
[31º DIA]
I'm torn up inside
Um mês. Exatos um mês que havia sumido do mapa.
estava completamente revoltada depois de sair, mais uma vez, da delegacia de Nova Iorque. Ela havia tentado novamente fazer com que uma busca acontecesse, mas não conseguia dar informações suficientes que caracterizasse sequestro ou qualquer coisa que merecesse a atenção de um detetive. Sempre que mencionava que havia dito que iria cuidar do pai na Escócia, os policiais pareciam não ouvir mais nada.
De acordo com o Tenente, que lhe atendeu depois de que ela quase colocou a delegacia abaixo, não havia com o que se preocupar, já que não tinham corpos não identificados nos necrotérios do estado e mais ninguém havia registrado queixa do sumiço de . Sem contar que tudo aquilo se transformara em piada ao homem com o distintivo no peito quando a resposta para a pergunta: ‘Você já tentou ligar para os pais dele?’ era: ‘Eu não tenho o telefone’. Fora inevitável entender a velada insinuação do homem de que talvez o noivo tenha apenas dado uma pausa para pensar se sua vida estava tomando um rumo certo. Uma viagem para espairecer, como o próprio tenente mencionou.
Se ao menos Austin conseguisse achar, rapidamente, o telefone dos pais de na Escócia...
Com uma pausa forçada do trabalho, encontrava-se na cama de casal, vestindo mais uma vez o moletom da faculdade em que se formou. O cheiro do perfume, as lembranças da organização do casamento... Tudo ainda estava tão vivo dentro dela. A partir daquele momento, todas as vezes que a perguntassem algo como: ‘o que você mais odeia na vida?’, responderia ser o silêncio.
- Oi... – resolveu atender o telefone que já estava tocando fazia algum tempo.
- Finalmente... – Olivia disse. A irmã estava se fazendo presente cada dia mais, vendo que não conseguia mais esconder o quanto estava acabada por conta de toda a situação. A saudade, a preocupação, seus sentimentos conflitando o tempo todo. Ela estava quase surtando. – Está tudo bem?
- Sim, Liv. – respondeu um pouco mal humorada. – Estou ótima! Estou até pensando em fazer uma viagem. Hm, acho que Escócia seria uma boa opção. – Olivia se calou. Era quase possível ver a irmã do outro lado da linha com os olhos arregalados, assustada.
Talvez não houvesse espaço para sarcasmo.
[42º DIA]
A rotina escolar não era exatamente o que Shawn queria para sua vida e mesmo sabendo que seria temporário, estava durando mais tempo do que gostaria. Um de seus pedidos era ter um emprego e ele realmente o tinha, estava se apegando aos alunos e cada dia mais aprendera coisas novas com as obras literárias que estudava juntamente com os alunos nas aulas, mas queria voltar para sua real profissão.
Ao chegar ao colégio, Shawn fez o que era de praxe. Foi até a sala dos professores para apanhar café e, em seguida, para sua sala de aula ainda vazia, devido o horário. Deu alguns goles do líquido quente e puxou sua caderneta em mais uma manhã. Os poucos minutos que faltavam para o sinal tocar e os alunos tomarem seus lugares eram o suficiente para que pudesse escrever novamente a um destinatário que nunca saberia dos seus sentimentos e pensamentos exteriorizados.
“Oi minha menina. Você sabe que eu adoro te chamar de minha menina, não sabe? Não que você seja realmente minha, mas soa tão bem! E por mais que você seja uma mulher responsável e madura, seu lado menina, se me lembro bem, ainda está tão vivo.
Preciso dizer que não estou conseguindo esquecer o fato de que você está procurando por mim. Quando Lauren me contou uma mulher ligou procurando por um ‘tal de ’, pensei que o ar não fosse voltar para meus pulmões tão cedo. Eu sabia que era você, pois deixei aquele papel com o número de telefone de propósito na minha gaveta de cuecas. Foi egoísta, eu sei, mas eu precisava disso. Precisava saber que você se importaria, que você tentaria saber de mim.
Não paro de me perguntar como você está e como você está lidando com tudo isso. Olha, nunca foi tão difícil ter que me controlar para não pegar o telefone e ligar para você! Apesar de que o ideal seria pegar um avião e voltar para Nova Iorque. Voltar para nossa casa, voltar para os seus braços.
Será que você ainda está pensando no nosso casamento?
A data está marcada para dezembro e se eu não conseguir voltar logo, acho que você vai seguir com a sua vida e isso me aterroriza. Eu demorei tanto para encontrar amor na minha vida e sei que estou prestes a perder isso por algo que não depende só de mim.
Esse período longe está me ensinando tantas coisas. Pode ter certeza que assim que eu puder te ter junto a mim, eu vou falar tudo o que sinto por você em alto e bom som, tudo o que amo em você, tudo o que imagino para o nosso futuro juntos e tudo o que fez meu coração amolecer dessa maneira.
Até um dia. Espero que seja logo.”
Quando , ou melhor, quando o professor Shawn fechou a caderneta e aguardou em sua bolsa, o sinal soou. Seus alunos do nono ano começaram a tomar os seus lugares, entrando na sala conversando com seus colegas e brincando um com os outros. Rapidamente, o homem segurou o giz branco para fazer anotações na lousa, substituindo a aula preparada por uma ideia que tivera enquanto escrevia para .
No topo do quadro negro, foi escrito: “Romance: o que é permitido fazer por amor?”.
Aquela seria uma boa reflexão para ambos naquela classe. Existia um limite do que fazer por amor? Porque no caso de , por exemplo, ele tinha mentido, sumido e estava vivendo uma outra vida, camuflado. Aquilo poderia ser considerado um ato de amor?
Eles descobririam juntos naquela aula.
[65º DIA]
I'm torn up inside. Theres a hole in my mind when you're not next to me.
So I hope you choke and die on every single lie look what you've done to me.
- Hey, Liv. – Jeff chamou pela esposa ao adentrar a casa em que moravam no Brooklin. Por conta do início de gravidez conturbada, Olivia estava passando a maior parte dos dias deitada, repousando. Desde o sangramento desesperador, o obstetra havia feito diversas recomendações. – Olha quem veio à estátua da liberdade nos visitar! – completou.
- Já chego aí... – Liv respondeu do quarto e calçou suas sapatilhas confortáveis antes de se apresentar à sala. Na sala de estar, Marlos e Vivian ocupavam o sofá de couro preto e Jeff, a poltrona. Olivia foi recebida por abraços e elogios a barriga que, discretamente, já estava aparente. Liv sorriu e se alegrou com a visita de seus cunhados. Marlos era o irmão mais velho de Jeff e Vivian, uma mulher doce e prestativa, sua esposa. Os dois haviam se mudado para o estado do Maine, especificamente em Portland, depois de uma proposta de emprego que Marlos recebera no ramo da comunicação.
- Oh, se eu soubesse que vocês viriam, teria pedido algumas pizzas. – Olivia comentou.
- Acredito que ainda dê tempo. – Vivian comentou, sorrindo, e Jeff levantou-se para alcançar o telefone.
- O mesmo de sempre? – Jeff perguntou.
- Pepperoni, com certeza! – Marlos respondeu de imediato.
Não demorou muito para que Jeff estivesse de volta e os quatro passassem a colocar o papo em dia. Olivia revelou que estava esperando uma menina e que ela e o marido ainda não haviam escolhido o nome, apesar de estar mais propícios a batizá-la de Delilah.
- Oh, falando em Delilah – Vivian começou. – Semana passada fomos visitar uma cidade do Maine que se chama Bath e conhecemos sua fã número um, Jeff.
- Fã? – Jeff juntou as sobrancelhas. – Nem meus vizinhos sabem quem eu sou, imagina alguém do Maine. – comentou.
- Com certeza Delilah era sua fã. Só uma fã sua para sair entregando panfleto sobre o desmatamento da floresta Amazônia no Brasil. – Marlos brincou com o fato de o irmão ter defendido essa tese na faculdade e proposto uma passeada para apoiar os animais em extinção. Em uma turma de publicitários, ele era o único que pensou conseguiria usar a publicidade para ajudar a salvar a floresta. Claro que aquilo havia virado piada entre os amigos e familiares.
- Muito engraçado. – Jeff resmungou.
- Mas como foi em Bath, Vivian? – Olivia perguntou. Ela adorava ouvir as histórias de viagens, principalmente por poder conhecer algumas cidades apenas pelas descrições da cunhada.
- Bath é realmente linda. Lembra a Europa, algo como a Irlanda... uma cidade encantadora. – Vivian resumiu. – Vocês deveriam conhecer um dia. Quando forem nos visitar, levaremos vocês até lá. – convidou.
- Podem contar com isso... – Jeff respondeu. – Quando nossa pequena nascer, assim que pudermos viajar, queria ficar um ano fora. – comentou.
- Jeff sempre sonhando. – Olivia revirou os olhos e sorriu em seguida de seu próprio comentário.
Um breve silêncio se fez presente na sala de estar, enquanto os três se abasteciam de cerveja e Olivia de refrigerante, até algo pareceu refrescar a memória de Vivian.
- Ah, Olivia... Sua irmã ainda está namorando aquele moreno de olhos claros? – Vivian perguntou. – Qual era o nome dele mesmo? – perguntou mais baixo, como se estivesse se perguntando a ela mesma.
Olivia e Jeff se olharam rapidamente.
- . – Olivia respondeu.
- Ow, então acho que não ele que vimos lá em Bath, querido. – Vivian disse a Marlos.
Estranhando o comentário dos dois, Olivia sentou-se na ponta do assento, como se estivesse pronta a sair correndo em qualquer instante. Qualquer pequena pista de era estritamente valiosa e ela precisava saber. Sua irmã precisava saber.
- Como assim? – Jeff e Olivia perguntaram ao mesmo tempo.
Os olhos de Liv estavam levemente arregalados. Se Vivian realmente tinha visto , ia surtar e o silêncio do sumiço finalmente seria quebrado.
- É... Quando estávamos em Bath, encontramos com um homem igual a ele. Moreno, alto e olhos claros. Mas ele se apresentou como Shawn, se não me engano. Estranho! Eu jurava que era ele. – Marlos contou.
- Nós só o vimos uma vez, amor. Acho que nos enganamos. – Vivian disse por fim.
A conversa dos quatro foi interrompida pela campainha que anunciava que a tão esperada pizza havia chegado.
Marlos e Jeff arrumavam a mesa, enquanto Vivian e Olivia ajudavam a pegar o restante das coisas que os irmãos sempre se esqueciam de por na mesa, como guardanapos. Depois de acomodados e bem alimentados, Olivia, que matutava o falo dos cunhados terem visto alguém muito parecido com o noivo sumido da irmã, voltou ao assunto. Não demorou mais do que quinze minutos para que a mulher contasse o que estava acontecendo com nos últimos dois meses e como havia desaparecido.
Marlos e Vivian acharam completamente estranho, assim como quase todos que ficavam sabendo do sumiço repentino de , e a desconfiança entre eles de que realmente o tal de Shawn poderia ser o homem sumido começou a aumentar. Olivia precisava contar a da nova teoria que estava surgindo. Sabia que poderia ser completamente maluco, mas a irmã estava precisando de um pouco de esperança.
[70º DIA]
So I hope you choke and die
On every single lie look what you've done to me
Pela primeira vez, depois de um longo tempo, levantar da cama naquela manhã fora mais fácil do que ainda imaginaria ser. Nos últimos dois meses e dez dias, , propositalmente, duplicara sua jornada de trabalho e, mesmo tornando-se raro algum tempo livre, saía sempre que podia com os amigos ou ia para a casa de sua irmã. Manter-se o máximo de tempo ocupada e sem dar chances para pensamentos e questionamentos passou a ser seu foco desde que Olivia e Jeff lhe contaram sobre /Shawn e Maine e professor de inglês e todo o resto. A designer não queria admitir, mas teve a certeza que nunca havia sido feita de trouxa como estava sendo. Ainda mais por, ainda com um fio de esperanças, ligar para a Escócia atrás do senhor e da senhora –depois de Austin finalmente ter encontrado e lhe dado o número de telefone– e constatar que o noivo não havia dado as caras por lá e muito menos dado sinal de vida. Todos estavam tão no escuro quanto ela, menos Marlos e Vivian.
Depois de um bom tempo de agonia e finalmente tudo começara a se encaixar.
havia mentido para ela. Havia enganado, manipulado e a abandonado. Todos os sonhos que tinham, todos os planos que haviam traçado e todo o possível futuro que teriam... viu tudo indo por água abaixo. Por mais que quisesse encontrá-lo para um confronto e conseguir repostas para as inúmeras perguntas que se formavam a cada momento, decidiu que deveria dar uma chance a si mesma e começar a viver sem esperar que um retorno acontecesse.
Se havia uma coisa no mundo que mais odiava no mundo era ser traída. Ou melhor, ter a sua confiança traída. Ela precisava reagir e era isso que ela faria. Aqueles seriam novos dias e por mai que julgassem ser negação, não existiria mais para . Até porque o casamento já havia sido cancelado e ela estava quase que oficialmente solteira novamente.
- Bom dia. – saldou a recepcionista de seu andar, na WRA, com um sorriso sincero, e encaminhou-se para a sua sala.
Ao adentrar seu escritório já reformado e organizado como deveria ser, deixou suas coisas em cima da mesa de vidro e foi até a janela do prédio. Olhando por aqueles grandes e limpos vidros e avistando boa parte de Nova Iorque, tomou uma decisão. Seria como se não tivesse passado por sua vida. Ela encaixotaria todas as coisas do advogado e levaria para o escritório e caso os amigos não quisessem ficar, doaria. E a BMW, ah, essa ela com certeza iria quebrar com um taco de golfe e depois incendiar.
[71º DIA]
Was it all just a sign?
Of what its meant to be
Domingo.
De segunda a sexta, conseguia ser Shawn, a maior parte do tempo, de forma convincente e sem surtar com o que estava enfrentando internamente. No geral, ele conseguia dar as aulas, ajudar Lauren, tentar manter as esperanças e até ir a um pequeno parque para ver algumas crianças inocentes brincando. Mas quando chegava o final de semana, ele estava vazio. Quando chegava o domingo, ele só conseguia pensar em tudo o que estava perdendo.
Já havia se passado mais de dois meses que fora forçado a sair do estado em que nascera e morava, que fora forçado a abandonar sua vida para não arriscar a vida de quem amava e a sua própria. O que deveria ser temporário estava virando eterno e ele não conseguia mais lidar com aquilo. Estava prestes a deixar tudo para trás, mais uma vez, mas dessa vez não para fugir e sim para encarar. Não sabia se tinha forças o suficiente para isso, mas precisava pensar em tudo. Pensar em sua noiva, em sua casa, em sua profissão, em seus pais e nele mesmo. Muitas vezes o que parece ser o melhor para os outros, não era o melhor para a própria pessoa e muitas perdas poderiam se tornar irreparáveis. sabia disso.
Estava há horas sentado no banco de madeira na varanda da casa de Lauren, olhando o horizonte. Por mais que pudesse colocar tudo a perder, decidido, buscou sua caderneta e a caneta e escreveu, pela primeira vez, uma carta com a intenção de enviar para a sua noiva e amada .
“Oi minha menina.
O quanto você deve estar me odiando nesse momento?
Encontrei o irmão do marido da sua irmã por aqui, ele e sua esposa. Tenho certeza que isso chegou até você, mas fico feliz que agora você possa saber a verdade. Aliás, que eu tenha decidido contar a verdade. Talvez isso faça seu ódio diminuir. Fico me perguntando como estão as coisas com você. Eu sei que sua independência é algo que nunca vai ser tirada de você e que por causa dela você deve estar muito bem nesse momento, considerando tudo, é claro. Acredito que esteja cada dia melhor com o seu talento e que as decorações de cada casa ou apartamento cada dia melhores e mais criativas. Você sempre foi, e tenho certeza que continuará sendo, muito aplicada e determinada.
Claro que em relação a mim as coisas não devem estar muito boas, apesar de você ter me procurado. Fico grato em saber que você não engoliu minhas mentiras e se preocupou com o meu paradeiro, mas acho que isso foi no primeiro mês, apenas, porque se eu te conheço bem, agora que já se passou tudo isso de tempo, você deve ter desistido e eu só gostaria de pedir: ‘Por favor, não desista de mim ainda’.
Você cancelou o casamento? Acredito que tenha feito isso, já que falta pouco para a data e eu não estou aí para realizarmos o nosso sonho. Sim, o nosso. Nunca falei isso para você, mas desde quando conversamos sobre o matrimônio que imagino você com um vestido branco, do Oscar de La Renta que você tanto falava, indo até o altar para me encontrar. O fato de saber que vou perder isso e talvez pra sempre me aterroriza e é por isso que estou arriscando tudo e escrevendo essa carta, para falar a verdade. Espero que você me perdoe e entenda os meus motivos.
, eu não fugi de você, não fugi de nós. Muito pelo contrário. Naquele 10 de setembro, eu juro, eu saí do escritório mais cedo e estava a caminho da doceira brasileira para pegar uma torta de limão grande que havia encomendado. Eu já havia comprado aquele brinco de diamante negro que você tanto queria e estava pronto para termos uma noite de aniversário duplo agradável. Eu, mesmo não gostando muito dessas comemorações, iria festejar contigo nosso noivado e o ano em que estávamos morando juntos. Porém, eu estraguei tudo no caminho.
Quando saí da doceira, ouvi vozes altas, uma gritaria, e resolvi ir olhar. Naquele beco que tem quase no final da rua, havia um garoto, por volta de seus quinze anos, cercado por quatro homens de descendência oriental e que vestiam roupas largas e com muito ouro. Eu logo identifiquei as tatuagens em cima da mão de cada um. Eu não tive muito tempo de me esconder quando segundos depois eles atiraram no garoto, a queima roupa. Eu fiquei horrorizado. Os quatro atiraram ao mesmo tempo. Não consigo me lembrar, exatamente, de qual foi a minha reação, mas devo ter feito algum tipo de barulho, pois eles me olharam instantaneamente. A sorte é que os disparos chamaram a atenção de quase todos na rua e muitos saíram nas calçadas, sem contar a sirene da polícia ao fundo. Abaixado e amedrontado, só consegui ver quando um dos homens apontou para mim, como se estivesse me marcando, e depois se juntou aos outros, pulando o muro e fugindo. Aquela frase que diz ‘estar no lugar errado, na hora errada’, com certeza se aplicou a mim.
Minha menina, eu não saí de casa ou de Nova Iorque porque quis. Eu testemunhei um assassinato, eu tive que depor, e ainda ajudei a montarem retrato falado. Os caras saberiam que eu estava por trás disso. Eu tive que entrar no programa de proteção a testemunhas e é por isso que estou aqui e não aí com você, sentindo o seu carinho e tentando dar o máximo do meu para você.
Não direi onde eu estou, espero que você entenda. Só posso dizer que voltarei assim que esses caras forem pegos. Achei que a polícia fosse ser mais eficiente e conseguissem os prender logo, mas está demorando mais do que imaginei. Muito mais.
Eu tenho aprendido tantas coisas aqui! Quero te contar cada detalhe. Mas, enquanto isso não acontece, espero que saiba que meu peito aperta todas as noites de saudade de você. Não consigo esquecer o seu jeito, o seu olhar, a sua voz nem um segundo sequer. Lembro-me todos os dias de manhã dos nossos cafés juntos, me lembro dos chás da tarde, lembro até de como você implicava comigo por não te deixar escolher os filmes da maratona de sexta-feira e claro, de ter ciúmes da minha queria BMW. Você está cuidando bem dela? Eu amo muito você, . Gostaria de falar pessoalmente, pois sei que não foram muitas vezes em que disse isso, mas espero logo estar por aí e repetir diversas vezes, porque eu realmente amo você. Por favor, espero que você possa me perdoar e, novamente, que não desista de mim.
Até logo, minha menina.”
achou melhor não citar a máfia japonesa e nem que o adolescente em questão era um de seus clientes que estava sendo usado como laranja para traficar droga. Aquelas informações seriam demais e talvez levassem a ir atrás de uma história que não deveria envolvê-la. Isso, claro, se ela o perdoasse, coisa que ele não estava muito convencido.
O motivo era grave e real, mas ele poderia ter resolvido de outra maneira, sem que a deixasse no completo escuro. Apesar de que tinha a certeza de o fato de ter escondido tudo de a havia poupado de que asiáticos batessem na porta do apartamento procurando por ele e até machucassem ela para tirar informação. A única coisa que consolava era que, na negociação, ele havia pedido que policiais a paisana fizessem a segurança de sua noiva. Que houvesse plantão no prédio, no trabalho e em todos os lugares em que ele fosse. O advogado esperava que seus pedidos tivessem sido atendidos.
Quando terminou de escrever, dobrou a folha em quatro partes e colocou dentro de um envelope branco. Endereçou para a cobertura do prédio em que morava com em Nova Iorque e no remetente e destinatário escreveu, respectivamente: Um bom menino e minha menina.
FIM!
Nota da autora: Hey strangers!
Bem, muito obrigada por ter lido essa fic que é uma das que eu mais gosto entre todas que escrevi até agora. Ela nasceu de uma forma tão natural e eu, dessa vez, realmente fiquei satisfeita com o resultado.
Comentem para que eu fique feliz *-*
Obrigada, folks.
xxx
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08. The City [Ficstape Ed Sheeran (+) - Finalizada]
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