Capítulo Único
Dia 1 – Sexta-feira à noite, Londres, Inglaterra. Baglioni Hotel.
O grande buffet era disposto em três partes: doces, salgados e bebidas, a última repleta de chás de diferentes sabores. O burburinho das vozes entretidas em assuntos triviais a deixava zonza, jamais gostara desses encontros, as conversas arranjadas, sorrisos forçados e pessoas falsas, ou apenas vazias, com muita superfície para mostrar e pouco conteúdo para apresentar.
Brunches em Nova Iorque, restaurantes a beira mar em Los Angeles, coquetéis em Vegas e chás em Londres: sobre esses eventos, null null gostava apenas da comida, jamais se sentira confortável com tamanha superficialidade, tentava ao máximo evitar as conversas vazias e os “sim, estou bem” como resposta a perguntas feitas por pessoas que ela sabia, não se importavam de fato sobre como ela se sentia, enquanto estivesse performando e gerando dinheiro, estava tudo bem para eles, mesmo que nada estivesse de fato bem, para ela.
Decidiu que estava satisfeita, procurou Laurel pelo grande salão para avisa-la que iria para o quarto e a avistou a alguns metros, conversando com um figurão da Radio 1, null se aproximou, implorando a qualquer que fosse a força que controlava o universo, que ela não precisasse engajar em mais uma daquelas conversas.
- Com licença, desculpem a interrupção – disse ao se aproximar dos dois, e foi imediatamente interrompida por Laurel Leminski, sua empresária:
- A interrupção é muito bem-vinda, null! Estava justamente conversando com David sobre seu interesse em participar de um dos programas da rádio, talvez uma entrevista com Grimmy ou até mesmo um Live Lounge – Laurel sugeriu e a encarou com o olhar conhecido de “concorde, fique animada e mostre interesse”.
- Claro, eu adoraria! Me sinto cativada pelo tom intimista e acústico do Live Lounge, espero poder fazer o meu um dia. – respondeu, no seu maior esforço em ser breve e poder ir para o quarto o quanto antes.
- Adoraríamos ter você na rádio, null! Conversarei melhor sobre o assunto com Laurel mais tarde, agora me deem licença, preciso resolver um problema com a grade da programação – David finalizou e se afastou, deixando Laurel e null a sós, dando a mais nova a deixa que precisava para falar com a empresária.
- Laurel, não estou me sentindo muito bem e vou para o quarto descansar, ok? – avisou, mas de uma certa forma sentiu como se estivesse pedindo permissão.
- null, você sempre tem uma desculpa para fugir dessas ocasiões, quantas vezes preciso te falar que quem não é visto não é lembrado? – disse a empresária, e null apenas a encarou, com um olhar suplicante que pareceu fazer efeito – Mas tudo bem, tome um banho e descanse, mais tarde passo para ver como está e repassar a programação, temos um grande dia pela frente amanhã.
- Eu sei que temos, por isso preciso descansar, Laurel! Estou subindo, te vejo mais tarde – concluiu null, e saiu em direção ao elevador a passos largos, antes que Laurel falasse mais alguma coisa.
Seus pés doíam, e a cabeça latejava. Haviam passado boa parte da madrugada em um longo voo, sem contar o fuso-horário, a manhã de translado e instalação em hotel, seguida pela tarde com algumas entrevistas previamente agendadas no local. A Jetlag era real e null necessitava de um banho e cama mais do que tudo no momento.
O elevador parou em seu andar, null apressou-se em direção ao quarto enquanto retirava da capinha do celular, pegando de lá o cartão de acesso. Tentou pelo menos três vezes entrar na suíte, e sem sucesso, resmungou talvez mais audivelmente do que gostaria, acabou por atrair atenção de uma simpática camareira que passava pelo corredor, a mesma se dirigiu a null, pacientemente:
- Capinha do celular, huh? Seu cartão desmagnetizou, querida. Procure mantê-lo longe do aparelho, preferencialmente guarde na sua bolsa ou carteira, ok? – dito isso, a senhora sacou do bolso do uniforme um cartão um pouco diferente, e destravou a porta para que null pudesse entrar – Ligue para a recepção e solicite um novo, eles trazem para você.
- Muito obrigada, a senhora me salvou de mais um problema, e pode deixar que vou mantê-los separados sim! Obrigada mesmo, tenha uma boa noite! – null disse, e sua gratidão era genuína e enorme, só ela sabia o quão cansada estava e a senhora havia evitado mais um problema na lista crescente dos mesmos que já havia enfrentado no dia.
Entrou no quarto, pegou uma aspirina na sua nécessaire e tomou, esperando que o efeito fosse rápido, ou corria sérios riscos do episódio tratar-se de uma crise de enxaqueca, e ela não poderia se dar ao luxo. Dirigiu-se ao banheiro espaçoso, reparou na banheira e lembrou o quanto desejou um longo banho relaxante com sais e espumas quando a viu mais cedo, porém no momento ela precisava do mais rápido e prático, acabou por contentar-se com uma ducha quente, talvez não tão relaxante quanto, mas era o suficiente.
O banho melhorou o cansaço muscular de null, mas sua mente ainda pesava muito. Estava inquieta, um sentimento estranho e forte que indicava que algo estava errado, mas não conseguia identificar o que era ou de onde tamanha angústia vinha. Sentiu fome apesar do chá recente, acionou o serviço de quarto e solicitou um chocolate quente, a bebida sempre a trazia um conforto inexplicável.
Deitou-se na cama para esperar a bebida, mas antes que a mesma chegasse, alguém bateu na sua porta e entrou em seguida, o ato anunciou ser Laurel, ela era a única que também possuía um cartão de acessou ao quarto. Ao ver null de pijama, disse:
- O que acha de trocar esse pijama por uma roupa mais... “festa”? – sugeriu a empresária, erguendo as sobrancelhas - O pessoal está combinando de ir a uma boate clássica da região, frequentada pelas maiores celebridades britânicas, e uma aparição antes do show de amanhã seria ótima, já posso ver as matérias: “null null curte a noite londrina, tanto quanto esperamos curtir seu show no Summertime Ball na tarde desse sábado” – a empresária falou talvez rápido demais, sem pausas e sem tempo para null raciocinar direito, mas desde o momento que a viu adentrar o quarto, null já sabia o que dizer caso propostas como aquela surgissem:
- Não, obrigada... vou ficar por aqui essa noite. Realmente preciso descansar Laurel, estou exausta. Pedi um chocolate quente e deve estar chegando a qualquer momento. Mas vá você e aproveite, enquanto eu aproveito Netflix e uma boa noite de sono nessa king size. – respondeu null prontamente, enquanto dirigia a mais velha até a porta do quarto, onde um rapaz estava parado, com um carrinho que trazia sua xícara mais do que merecida de chocolate quente.
- Obrigada, tenha uma boa noite! - null se dirigiu ao rapaz, e logo em seguida a Laurel – Boa festa Laurel, te vejo amanhã no café!
E mais uma vez, como era de praxe, null fechou a porta antes que a empresária pudesse intervir. Esperava não ter sido rude, mas conhecia Laurel e sabia que caso a desse espaço para continuar a sua proposta e argumentar sobre, a noite de descanso de null estaria arruinada.
Seguiu com a bebida em direção a varanda, bebeu um gole e constatou que a mesma estava muito quente, o que fez com que ela a deixasse em uma mesinha na área interna do quarto. A noite londrina apresentava um raro e surpreendentemente limpo céu, onde ao admirar o Hyde Park e direcionando seu olhar para os astros, null pôde ver a bela lua que iluminava o longo gramado do local. Sentiu falta das noites em Bassano del Grappa, na Itália, onde passava horas com os avós analisando as estrelas e “conversando com a lua” como nonno Peppe dizia.
Ao pensar no avô, null sentiu um aperto mais forte no peito, o que a fez mandar uma mensagem para a mãe perguntando como estavam as coisas na Itália, onde Sara passava uma temporada cuidando dos avós da menina e dos negócios da família. A resposta veio em seguida:
“Estamos todos bem, querida, com saudades suas! Nonno e Nonna disseram que te amam, que sabem que a estrelinha deles vai brilhar muito amanhã”
null estava com os olhos marejados, uma simples menção do carinho dos avós a confortava, mas a sensação de que algo estava errado era insistente.
null sentia-se frequentemente sozinha em locais preenchidos por multidões, não conseguia evitar sentir que algo estava errado, afinal, todos os lugares em que ela passava, por melhores que pudessem ser, não a faziam se sentir em casa. Olhou para a lua, pensou nos avós e no quanto os amava e esperava que de fato estivessem bem.
Entrou no quarto e pegou sua xícara, agora na temperatura perfeita, se aconchegou na cama enquanto se escorava na cabeceira, com uma manta leve sobre as pernas, pegou o celular, e enquanto apreciava o sabor do chocolate quente e olhava alguns InstaStories, um em especial chamou sua atenção e lhe trouxe um sentimento bom de nostalgia. O story em questão era um boomerang postado por null null, onde ele e sua mãe, Maureen, apareciam com semblantes que transmitiam conforto, segurando canecas que, provavelmente, continham a mesma bebida que a menina tomava no momento.
Prontamente, null abriu seu chat no Instagram com null e respondeu a imagem do stories com uma selfie sua e seu chocolate quente, acompanhada da legenda “@nullnull minha caneca não é tão legal, nem minha companhia é tão INCRÍVEL, mas aposto que o chocolate quente do Blaglioni é muito melhor do que qualquer coisa que você deve ter comprado em uma Starbucks” no intuito de provocar, afinal, ela sabia que a mãe do garoto provavelmente tinha feito a bebida, que ele adorava dizer ser a melhor do mundo.
Esperou a resposta, enquanto recordava do quanto sentira falta de null e da amizade que os dois compartilharam no Ensino Médio. null null era para muitos um jovem e talentoso músico em ascensão, para ela, era apenas null, um grande amigo do ensino médio e agora colega de indústria. O telefone vibrou em seu colo, a notificação do Instagram apareceu na tela, null desbloqueou o aparelho e leu a mensagem:
“@nullnull 1- Sim, minha caneca Expresso Patronum é a mais legal DE SEMPRE. 2- Sim, a mamãe é a melhor companhia que qualquer um pode desejar. 3- VOCÊ TÁ BRINCANDO COMIGO? Sabe que eu não comprei nada, como você se atreva a tamanha ofensa para o chocolate quente da Mamãe null? 4- Você já está em Londres? Pensei que grandes estrelas chegavam apenas no dia do show :p”
null estava rindo e sorrindo verdadeiramente como não o fazia há um tempo, devido ao bom humor do amigo e a constatação de que ainda o conhecia, pois a reação que obteve foi exatamente a que esperava. Enquanto digitava, recebeu mais uma mensagem:
“MAS EU SINTO TANTO A SUA FALTA, BOBÃO!!” null sentiu como se o peso que carrega houvesse diminuído o suficiente para que seu coração pudesse bater com mais plenitude e sentiu-se aquecida, respondendo:
“1- está certo. 2- Sinto tanta saudade dela!!! Sim, eu estou, lentinho! Chocalate da tia Maureen é o melhor de todos! 4- Eu estou!! Eu não sou tão famosa, Sr. Faz Adolescentes Gritar ao Redor do Mundo Todo!! TAMBÉM SINTO MUITO A SUA FALTA!!” e enviou. Logo em seguida obteve resposta:
“Estou tão feliz por estarmos conversando que vou ignorar essa provocação descarada, Srta. null! Você precisa melhorar seu jogo, garotal! Quando vai tocar amanhã? P.s: Mamãe está dizendo ‘oi’ x.”
null não demorou para responder o amigo “Vou encerrar o festival por volta das oito da noite, eu acho. Ouvi que você vai abrir, hm? E eu que sou a grande estrela?! P.s: Diga que estou mandando um oi também, e a dê um abraço bem forte por mim, por favor!!!!”
“Vamos, null, claro que você é!! Eu estou apenas engatinhando nesse mundo, enquanto você voa desde que terminamos o Ensino Médio e eu me mudei pra cá para estudar! A prova de que você é uma grande estrela é que está hospedada no Baglioni, huh? Muito eleganteeee!”
“Adoro quando você me bajula, null hahahahah! Eu sei que você é meu ‘fanboy’ número 1! Sim, eu estou. Sim, é elegante, mas eu facilmente trocaria a estadia aqui por uma casa confortável e quentinha como a da sua avó, com bastante chocolate quente da tia Maureen agora mesmo hahaha”
“Bem, não há nada que não possamos arranjar para amanhã, certo?! Eu jamais perderia a oportunidade de te ver tocar, então meu antigo medo de palco precisa perguntar: você vai estar em Wembley desde o início? Vai me ver tocar?”
“Claro que eu vou, null! E deixe de bobagem com ‘medo de palco’, você é muito talentoso e tão maior que qualquer insegurança!! Eu vou estar lá te apoiando do início, como nos ‘velhos tempos’. Só não me deixe esquecer de levar protetores auditivos para evitar surdez causada por todos os gritos de adolescentes!”
“Aqui está ela, a boa e esperta null que eu conheço! Estou tão feliz que você estará lá! Mal posso esperar para tocar, estou tão ansioso AHHHH” null entendeu o sentimento e o achou adorável, afinal, ela já havia estado lá antes. Por mais que ela sentisse sua falta e amasse converser com ele, null estava começando a sentir-se sonolenta e decidiu usar o pouco de paz e tranquilidade que o momento trouxe para sua mente e espiríto, e mandar sua última mensagem para null, pelo menos naquele dia:
“Você vai arrasar, cara! null, estou amando nossa conversa e senti muito a sua falta, mas preciso ir dormir agora, ou Laurel não ficará feliz se eu aparecer com olheiras amanhã. Boa noite bobão, durma bem xx null.”
null foi ao banheiro para escovar os dentes e pentear os cabelos, e quando voltou para a cama, null havia respondido: “Ah, a bruxa de cabelos de cobra ainda está por aí? Brincadeira… (não muito, na verdade)!! Ok, null, te vejo amanhã. Tenha bons e doces sonhos xx null.” E com aquela resposta, null caiu no sono minutos depois, e teve de fato, doces sonhos. Sonhos que mal sabiam a garota, viriam a contradizer o ditado e seriam a calmaria antes da (maior) tempestade de sua vida até então.
Dia 2 – Sábado, por volta das 9h da manhã, Londres, Inglaterra. Baglioni Hotel.
O som estridente do despertador acordou null muito antes do horário que ela gostaria de acordar, principalmente após uma boa noite de sono que não havia tido nos últimos meses. null não era uma pessoa matutina, e se a mesma não prezasse tanto por sua imagem profissional, mandaria todas as entrevistas programadas para longe e aproveitaria mais algumas horas do conforto que o hotel e seu sono lhe proporcionavam.
- Bom dia, estrela bambina! – exclamou Laurel, demasiado estridente para tal hora da manhã, ao entrar no quarto de null – temos um dia cheio, null! Levante-se, vista a roupa separada para o round de entrevistas, um lindo sorriso de acessório e te espero em meia hora para o café da manhã.
- Bom dia, Laurel! Tudo bem, te vejo no café. – null respondeu em falso ânimo, na esperança de que a mulher a deixasse sozinha o quanto antes. Laurel parecia funcionar como um robô, o que por vezes incomodava null, que sentia falta de humanidade na empresária.
A mais velha saiu do quarto, e null olhou-se no espelho, constatando que as olheiras que mencionara na noite anterior não estavam presentes, mas não podia dizer o mesmo sobre a angústia que sentira na noite anterior. “Estrela bambina” era um dos apelidos do avô materno para null, e Laurel o usava como instrumento para criar um bom clima e humor na menina.
null pegou o celular e abriu a conversa com a mãe, e prontamente enviou a mensagem parecida com a que havia mandado na noite anterior, com um importante aditivo: “Bom dia, mamma! Acabei de acordar, darei algumas entrevistas pela manhã, de tarde apenas backstage, e de noite, meu show. Estou pensando em aproveitar os dias de folga que tenho em seguida e ir à Bassano, o que acha? Como estão todos por aí?”
A resposta não tardou a chegar, null estava procurando o cabide correto com a roupa designada como Laurel havia instruído, quando o celular apitou com o nome “Mamma” em destaque na tela. A mensagem dizia “Bom dia, principessa! Boa sorte hoje, mi amore, brilhe muito! Ah, querida, venha sim! Todos sentem sua falta, seus avós precisam de você! Estamos todos bem, agora mais felizes te aguardando, bambina!”
null sentiu novamente o aperto no peito, devido ao trecho “... seus avós precisam de você” que a deixou angustiada. Algo no tom da mãe não soava bem, null podia dizer. Precisava ir a sua amada região do Veneto, visitar a cidade de Bassano del Grappa e sua família, o quanto antes.
Ao localizar a roupa, null terminou de se arrumar em minutos e desceu ao restaurante do hotel para encontrar uma Laurel robótica (como esperado) e sorridente tomando café, afinal, o hábito americano persistia, mesmo que tivessem à sua disposição os melhores chás do mundo. null dirigiu-se direto ao buffet, agradecendo pelo mesmo conter opções leves e variadas, contrariando o tradicional e gorduroso café da manhã inglês.
Serviu-se com alguns pedaços de fruta e um iogurte, apenas para não ficar em jejum, pois não sentia fome alguma. Para a surpresa e alívio de null, Laurel manteve-se ocupada entre e-mails e ligações durante o café, apenas dirigindo-se a menina quando ambas haviam terminado suas refeições:
- null, temos duas entrevistas pela manhã e possivelmente algumas nos bastidores do festival. Seu figurino da performance e outros já foram levados mais cedo pelo staff da Capital FM, e seu camarim estará equipado com tudo que possa precisar, pegue apenas o que couber em uma bolsa de mão no seu quarto, e vamos rápido, pontualidade britânica, minha querida – Laurel despejou como sempre, e null processou as informações de maneira rápida, mesmo que estivesse confusa – Alguma pergunta, null?
A menina quis olhar Laurel nos olhos e dizer “Sim, várias!! Quando você respira ou relaxa? Como você consegue ser tão automática e robótica? Sobre o festival: o camarim de null é longe do meu? Quando eu vou poder descansar? Eu posso ir para a Itália amanhã?” expressando sua exaustão física e esgotamento emocional, mas apenas negou com a cabeça e terminou o diálogo, informando:
- Te vejo no saguão em 10 minutos, não se preocupe. – null se dirigiu ao elevador, e enquanto esperava o mesmo chegar, buscou o contato de null, e na tentativa de resgatar a paz que havia sentido na noite anterior ao falar com o amigo, lhe enviou uma mensagem:
“Hey, bobão, já está em Wembley?” a mensagem foi entregue no instante em que o elevador chegou, e null aproveitou a viagem de um minuto para se olhar no espelho, respirar e tentar manter a compostura, apesar da angústia incessante em seu peito e a sensação de solidão que a assombrava, mesmo quando em lugares lotados de pessoas.
Em diversos momentos, null só queria poder falar sobre nada com alguém que significasse algo, queria amigos verdadeiros com quem pudesse contar, porque até então, todos a sua volta ostentavam sorrisos falsos e em determinado momento, quando null permitia que eles se aproximassem, mostravam quem realmente eram, de interesseiros à oportunistas, nada era real.
Entrou no quarto e seguiu para o banheiro, onde aproveitou estar sem maquiagem e lavou o rosto com água gelada, na esperança de evitar que as lágrimas saíssem, enquanto a angústia em seu peito apenas aumentava. Em seguida, correu seus olhos pelo quarto e arrecadou objetos como sua nécessaire de remédios e itens de higiene pessoal, carregador de celular e fones de ouvido, escova de cabelo, um livro, carteira e os colocou dentro da mochila pequena (a única que ela mesma havia feito) junto uma troca de roupa confortável, caso fosse necessária.
Encontrou Laurel no saguão no tempo prometido, e as duas seguiram para a Limousine que as levaria para os lugares necessários e por fim para Wembley. Foram primeiro à sede da Capital FM, onde null fora recebida por maquiadores e figurinistas, que lhe maquiaram e indicaram uma troca de roupas, para os conteúdos de mídia de imagem da rádio. As entrevistas correram do modo automático que null estava acostumada: novidades, divulgações, algumas especulações e elogios. As conversas favoritas de null com a mídia eram as que continham dinâmicas ou interação com fãs, geralmente feitas nos bastidores de eventos como o de mais tarde.
null e Laurel estavam no caminho para Wembley, por volta do meio-dia, quando o celular de null tocou e a tela exibiu a notificação da mensagem de null, que dizia “Bom dia, italianinha! Sim, estou em Wembley, acabei de fazer a passagem de som e descobri algo muito maneiro sobre os camarins...” null indagou-se sobre que horas faria a passagem de som, mas deixou o pensamento de lado para responder o amigo:
“É mesmo? E o que seria? Fontes de chocolate ou estoque infinito de muffins?” enviou, e null respondeu em seguida com uma foto encostado em uma parede, entre duas portas para as quais apontava, onde estavam escritos os nomes “null null – Show de abertura” e “null null – Show de Encerramento” , e a legenda era um “somos vizinhos!!!!” acompanhado de vários emojis desconexos. null respondeu prontamente:
“Não acredito, null!!!!! Deus salve quem quer que tenha sido que organizou esses camarins, já não estou tão triste e aparentemente menos sozinha do que imaginei que estaria hoje” e sem nem pensar, null enviou a mensagem, arrependendo-se ao perceber que a mesma era sincera e demonstrava uma vulnerabilidade com a qual null não queria lidar no momento, mas sabia que null não deixaria passar despercebida. Sem decepcionar, null respondeu em instantes:
“Triste? Sozinha? Aconteceu algo, você quer conversar? Foi aquela cobra insensível Leminski, não foi? Eu sabia, odeio aquela mulher” null sabia que ignorar null apenas faria da situação pior, então tentou remendar o estrago da melhor maneira que pôde:
“Não, null, Laurel não fez nada hahahahah. Está tudo bem, não se preocupe, daqui a pouco conversamos, chego em Wembley em 15 minutos, vizinho” esperava ser o suficiente, null o conhecia e tinha plena noção de que null não descansaria sabendo que ela não estava bem, e isso apenas prejudicaria os dois em suas respectivas performances. null se sentiria mal por não ajudar e acabaria distraindo-se, e se null começasse a falar sobre o que a afligia, (caso ela soubesse exatamente) ficaria vulnerável e propensa a uma crise de ansiedade antes da performance, o que jamais seria boa sorte.
O veículo estacionou na entrada designada em Wembley, onde null e Laurel puderam ter acesso aos camarins, sem serem percebidas e abordadas pela mídia ou fãs. O espaço de null era de um tamanho razoável, e de fato, tudo que a cantora pudesse vir a precisar estava ali. A mesa com petiscos e frutas, o frigobar com refrescos e água, a arara com as opções de roupa para a performance e um sofá grande e aparentemente confortável, onde null esperava poder descansar após a passagem de som, que ainda era uma incógnita.
- Laurel, e a passagem de som? Os portões não devem demorar muito para abrir, acho que null sobe no palco por volta das duas da tarde... – indagou null, esperando uma resposta automática de Laurel, como sempre, mas não foi exatamente o que obteve.
- Não sei, null! Acredito que a qualquer momento devem vir te chamar, mas não tenho certeza. Você deveria se preocupar com essas coisas mais cedo, estou farta de tanto drama e de ter que levar tudo nas costas. Talvez você se apresente sem passagem de som, eu realmente não ligo! – null estava atônita, jamais esperara aquela reação da empresária, principalmente sem saber o que a havia causado. Sim, a menina sabia que nos últimos dias havia sido distante e feito não mais do que sua obrigação, mas estava esgotada emocionalmente, e sentia falta da Laurel que um dia se preocupara sobre o que null sentia.
null null e Laurel Leminski formavam um time excelente no início da carreira da mais nova: a sintonia era incrível e o respeito de uma pela outra, admirável. Durante um tempo, sob o menor sinal de algum desconforto vindo da parte de null, Laurel se preocupara em sentar com a menina, conversar e esclarecer qualquer dúvida ou ajudar a mandar embora todas as angústias da iniciante null.
Laurel fora realmente uma amiga para uma pequena estrela em ascensão, mas a situação mudou quando null “estourou” na indústria fonográfica e começou a perceber que as coisas não eram como Laurel pintara, mas sim falsas e descartáveis, a partir desse ponto os desentendimentos começaram e a infelicidade de null também. Laurel aos poucos jogava fora a confiança que null havia nela depositado, e a cada dia que passava mostrava mais sobre quem realmente era: uma mulher calculista, fria e falsa, que se importava apenas com o dinheiro que null iria pôr em seu bolso, nada mais. Tendo toda a situação em mente, null tomou fôlego para responder, estava farta da situação do jeito que estava, e não deixaria que a mesma perdurasse por mais um segundo sequer.
- Você está farta de “tanto drama”, Laurel?! De carregar “tudo nas costas” quando na verdade quem precisa aguentar toda essa falsidade e situações forçadas, sou eu! Quem se apresenta para milhares mesmo estando exaurida física e emocionalmente, sou eu! Quem sente falta da família e de casa diariamente, mas não consegue um mísero dia de folga para visitar os avós, sou eu! A verdade, Laurel, é que você se importa sim, mas com o seu dinheiro e não comigo ou com a qualidade da minha performance. Você foi forjada nesse e para esse mundo, para sobreviver em meio a essas víboras, se tornando uma. Me desculpa, Laurel, mas eu não sei se consigo aguentar muito mais dessa realidade. Ou não me desculpe, eu realmente não ligo. – foi a vez de null de despejar informações, depois de tanto tempo suportando a situação que estava muito perto de sufocá-la.
Exasperada, null dirigiu-se até a saída do camarim e irrompeu para fora, encontrando um null parado em frente a porta, com um semblante chocado que indicava que ele ouvira o desabafo da menina. null apenas o olhou nos olhos por alguns segundos e abraçou o garoto, permitindo que as lágrimas rolassem pelo seu rosto, antes do seu lado racional tomar o controle e deixar todos os sentimentos que imploravam por liberação, suprimidos novamente. null passou o braço pelos ombros da garota e a conduziu para dentro do camarim vizinho, o seu, onde uma vez com a porta fechada, null abraçou null fortemente, fazendo carinho nos seus cabelos e deixando palavras de conforto como “Vai ficar tudo bem, null” no ar, e o ritual se repetiu por alguns minutos, quando null finalmente parecia mais calma, null separou o abraço e sentou no sofá, indicando o espaço ao seu lado para que null fizesse o mesmo. Uma vez confortáveis, null perguntou:
- Eu sabia pela sua mensagem mais cedo que algo estava errado, e que tinha algo a ver com a Medusa, mas não imaginei que as coisas estavam tão sérias. Vamos, null, coloque pra fora... o que aconteceu? – null podia ver a preocupação genuína no olhar do amigo, ele realmente se importava, e talvez fosse um dos poucos indivíduos verdadeiros naquela indústria. Respirou fundo algumas vezes e decidiu que poderia usar o ombro amigo que null oferecera, e respondeu:
- E-eu não sei explicar o que exatamente, null... só sei que estou farta da falsidade que me cerca, dos sorrisos falsos e conversas fiadas sem significado. Venho me sentindo tão sozinha em lugares lotados, e nos últimos dias não consigo evitar o sentimento de que algo está errado, uma angústia tomou conta de mim e eu não consigo identificar de onde ela vem, pra onde quer me levar... eu estou tão cansada, null, tão cansada...
O desabafo de null fazia sentido para null, mesmo que ele não pudesse se identificar com todas as situações enumeradas pela amiga. Viviam de fato em uma indústria sustentada por aparências e interesses, mas o garoto sempre teve sorte e buscara ser o mais honesto sobre o que sentia e o que buscava na sua carreira, o que atraiu pessoas sensacionais para seu time, pessoas sem as quais ele ainda seria um compositor vendendo suas músicas, e jamais teria pisado em um palco para expor sua verdade ao mundo. Buscando as melhores palavras para consolar null, null retomou sua atenção ao diálogo:
- null, eu nunca gostei de Laurel, você sabe disso. Sim, estamos cercados de falsidade, mas aceitamos as relações, sejam elas pessoais ou profissionais, que julgamos merecer. Você é tão maior que toda a pompa e circunstância que Laurel criou a volta da sua imagem, que cada vez mais, fica difícil de segurar as aparências de uma pessoa que você não é, null. – null esperava não ter sido rude com a menina, mas conhecia a null leve, do sorriso frouxo, que adorava fazer palhaçadas e iluminava cada cômodo que estava presente, e observara nos últimos tempos Laurel criar uma imagem que afastava a verdadeira null daquela que o público via, e isso era triste demais para null deixar acontecer – Meu ponto, null, é que você é uma pessoa incrível, que não merece ser sufocada por uma mulher que ofusca o seu verdadeiro eu e tudo que você precisa fazer, é tomar as rédeas da situação.
- Eu queria que fosse fácil como você faz parecer ser, null – null respondeu – mas Laurel tem controle de cada contrato meu, cada horário na minha agenda, cada suspiro que null null dá, passou pelo aval de Laurel Leminski, e apesar de não suportar mais a situação, eu sei que não consigo tomar conta de tudo sozinha. Eu só queria poder me reinventar, mostrar para o mundo quem realmente é null null, mas isso parece impossível de acontecer.
null teve uma ideia insana, e precisava fazer algo para acalmar a amiga antes de ter que entrar no palco, o que não deveria levar muito mais do que uma hora para acontecer.
- null, você só precisa mandar a Medusa pro raio que a parta, e a partir desse ponto a gente vê o que faz. Seus fãs te seguem porque te amam, não por causa de Laurel; sua voz não há quem tire de você, e uma vez que o público entrar em contato com todo brilho que null null tem para oferecer, não há Laurel Leminski no mundo que possa te impedir. Você poderia até fazer parte do TeamGertler, garanto que Andrew adoraria ser seu empresário – null tomou sua vez de despejar informações, e a animação e crença dele de que tudo daria certo, faziam com que null se sentisse um pouco melhor – sem contar que passaríamos muito mais tempo juntos, na Itália!!
E mais uma vez, null conseguiu trazer um pouco de paz e tranquilidade para null, em meio a tanta confusão e sentimentos ruins. null se perguntou, onde null estava se escondendo esse tempo todo? Ou era ela quem estava se escondendo, ocupada demais em meio a tantas aparências a serem mantidas? As perguntas ficaram sem respostas para a menina, enquanto ela e null conversaram mais um pouco sobre a situação e em determinado momento, uma null mais calma relaxou e conseguiu descansar no colo do amigo por alguns minutos.
Foram interrompidos pelas batidas à porta de null quando alguns dos garotos de sua banda entraram no camarim, seguidos por uma Laurel com cara de poucos amigos, chamando null para a polêmica passagem de som. null despediu-se de null e dos demais, prometendo que veria sua apresentação que tomaria espaço logo após a passagem de som de null.
Ao entrar no seu camarim para buscar uma água e seu celular, null lembrou da conversa que tivera com a mãe mais cedo, e como por enquanto ainda trabalhava com Laurel, decidiu parar de medir reações e trazer o assunto a tona:
- Laurel, vou aproveitar a agenda livre dos próximos dias e viajar a Bassano para visitar minha família, então, por favor, não marque nada novo, ok? Eu realmente preciso ver meus avós. – disse uma null decidida como há muito não se via, deixando Laurel pasma.
- E desde quando você sabe algo sobre a agenda, null?! Conversamos sobre isso mais tarde, agora vamos logo pois a passagem de som não pode atrasar o início da apresentação do seu amiguinho.
Algo no tom de Laurel ao referir-se a null desagradou null, mas a garota decidiu não prestar atenção no assunto naquele momento, precisava guardar suas energias para a batalha que aparentemente travaria com Laurel depois. A passagem de som correu bem, e null seguiu para o camarim e trocou de roupa novamente, pois assim que o show de null acabasse, daria mais algumas entrevistas nos bastidores para a própria rádio organizadora do festival.
null estava parada nos bastidores ao lado oposto do palco no qual null entrara, mas no momento que o amigo cruzou o olhar com o de null, ambos sorriram dando força um ao outro. O sorriso de null dizia “Arrase, null! Você consegue, eu tenho certeza”, já o de null era um agradecimento silencioso pela amiga estar ali, mesmo com tanto acontecendo na sua vida, e uma promessa de que tudo ficaria bem. Mesmo depois de um tempo afastados, os dois ainda sabiam ler o que cada expressão do outro dizia.
null era um verdadeiro astro em ascensão. Com um quê de John Mayer, o garoto tinha uma presença de palco que não pedia coreografias ou grandes efeitos especiais, apenas sua voz e os vários instrumentos que o garoto tocava, acompanhados do seu sorriso e da energia incrível que emanava, eram suficientes para que a performance de null null fosse algo incrível de se assistir. Ao fim da apresentação, null cantava uma das músicas favoritas de null, e durante o trecho que afirmava que “você nunca estará sozinha” null olhou para null, e a menina se emocionou com o gesto de carinho do amigo, mas tiveram seu momento interrompido por Laurel, que veio chamar null para o round de entrevistas.
Essas foram mais leves e duraram um pouco mais de duas horas, o que fez com que terminassem às seis da tarde, duas horas antes do previsto para o show de null. A cantora e sua empresária encontravam-se no camarim, sem trocar muitas palavras, até que Laurel rompeu o silêncio, retomando o assunto de mais cedo, sobre a ida de null à Itália.
- null, escute... – disse uma Laurel estranhamente doce, o que nunca era bom sinal para null – esses dias de agenda vazia podem facilmente ser preenchidos por divulgação e até mesmo aparições estratégicas em eventos badalados, agora não é o melhor momento para uma folga.
null esperava algo do tipo vindo da empresária, mas Laurel enganou-se ao pensar que a menina estava pedindo sua permissão, quando na verdade estava apenas comunicando que iria visitar os avós nos dias seguintes, e achou por bem esclarecer a situação:
- Laurel, eu não estou pedindo sua permissão, estou apenas te informando que vou a Bassano visitar meus avós, para que não marque nenhum compromisso, afinal, eu não irei comparecer. – null explicou firme, buscando tomar as rédeas da situação como null havia sugerido. A empresária não aceitou a informação, como esperado.
- null, eu não sei em que mundo você vive, mas se acha que pode apenas comunicar que vai fazer uma viagem de dias, está mui... – e Laurel foi interrompida por um garoto enfurecido que adentrou o camarim de null, e completou sua frase:
- MUITO CERTA! Se null null diz que vai fazer uma viagem de dias, a única pessoa a qual cabe a decisão, é null null. Está claro, Laurel? null precisa descansar e visitar os avós, e se ela não vai bater de frente com você, por respeito, gratidão ou sei lá o quê, fique sabendo que ela tem pelo menos um amigo de verdade que está disposto a fazer isso e muito mais por ela – null deixou ambas Laurel e null boquiabertas, a primeira estava visivelmente irritada, enquanto a segunda abriu um sorriso enorme e se juntou a null, ambos preparados para a resposta de Laurel, que não tardou a chegar:
- Quem você pensa que é, garoto? Mais um menino bonitinho enviado pelo Canadá para fazer adolescentes gritarem, mas não passa disso. Esse assunto cabe apenas a mim e a null, não seja intrometido! – dirigindo-se agora à menina, Laurel ordenou – null, diga para seu amigo ir embora, temos muito o que conversar.
Temendo uma briga maior que poderia gerar grandes consequências e repercussão midiática por estar acontecendo em um local lotado de imprensa, null olhou para null, deixando seu lado racional assumir o controle e antes que pudesse dizer qualquer coisa, o amigo a olhou nos olhos e indagou:
- Você quer mesmo que eu vá, null? Sabe muito bem que eu posso ficar, não sabe? – o olhar de null transmitia tudo que haviam conversado mais cedo, sobre assumir o controle e o desejo de null de mudar a maneira como as coisas eram feitas em sua carreira.
- null, o prédio está lotado de imprensa e não queremos um escândalo, ok? É o certo a ser feito agora, agir de acordo com a razão. – disse null, porém sem um vestígio da firmeza com a qual havia encarado Laurel anteriormente.
- Pare de ser tão racional e escute seu coração, null! Uma vez na vida faça o que é melhor pra você e apenas você, não para todos exceto você. – null suplicou a amiga, pelo seu próprio bem.
- Isso não é possível, você me conhece, null, meu nome tem “racional” por toda parte, de fato... – e mais uma vez alguém naquela discussão foi interrompido por um null null tentando concertar as coisas:
- É grego para “racional”, eu sei! Eu tenho escutado essa história desde o ensino fundamental. Eu te conheço, null, eu sei que você não é essa pessoa que se preocupa com o que os outros vão pensar, eu sei que você é muito superior a todos esses sorrisos e risadas falsas, você também sabe. Você é tão melhor com o seu coração, do que com a razão.
As lágrimas escorriam pelo rosto de null, porque ela sabia que tudo que null acabara de dizer era verdade. Ela precisava enfrentar Laurel e desmanchar a imagem que a empresária criara dela para o mundo, e se enfrentar Laurel, naquele momento significava seguir seu coração e bater pé sobre sua viagem para Bassano, ela o faria. Mas a conhecida angústia estava presente novamente, ao pensar em Bassano, o coração de null apertou.
- Laurel, algo está muito errado, eu posso sentir, eu tenho que ir a Bassano. null, obrigada por me mostrar o que estava debaixo do meu nariz o tempo todo. Agora, vocês dois podem, por favor, me deixar sozinha por alguns minutos? – null suplicou, e null apenas se aproximou depositando um beijo na testa da menina e logo em seguida se retirou do camarim, enquanto Laurel murmurou algo como “Você tem 10 minutos” e saiu, deixando null sozinha.
null pegou o celular e digitou o número de Sara, precisava muito ouvir a voz da mãe. A ligação foi atendida no quarto toque, pela voz de uma pessoa que null podia apostar, havia chorado.
“Oi, Principessa...” disse Sara, do outro lado da linha “tudo bem, querida?” null estranhou o tom na voz da mãe, mas respondeu, tentando não deixar transparecer a própria angústia.
“Sim, Mamma, tudo bem. E por aí? Estou ligando para ouvir tua voz, e confirmar minha ida a Bassano, amanhã apareço por aí, ok?”
“Que ótima notícia, minha querida!! Estamos te esperando. Nina chegou aqui hoje mais cedo, está mandando oi! Vou contar a ela que você também virá, agora preciso desligar, querida! Boa apresentação, estrelinha”
null estranhou muitas coisas sobre a ligação, desde a maneira corrida que a mãe terminara o diálogo, até a presença da prima que estudava em outra região, em Bassano. E o mais importante, não deixou de reparar que mãe não respondera se estava tudo bem na região do Veneto.
Prontamente, null abriu a conversa com a prima e lhe enviou uma mensagem: “Nina”, e partiu para outro texto, com a intenção de chamar atenção “Mamma disse que você está em Bassano” e por fim “está tudo bem por aí? Seja sincera, por favor”.
Antes de obter resposta, Laurel adentrou o camarim, dizendo a null que alguns shows haviam sido menores do que o previsto, o que significava que ela estaria no palco em aproximadamente uma hora e meia. Atrás de Laurel entraram no camarim duas maquiadoras e um hair stylist, enquanto a empresária indicava a null o cabide com a roupa correta e o espaço fechado, designado para troca de roupas. Sem perceber, null acabou deixando o celular pra trás.
Uma hora depois, um pouco antes de ter seu nome anunciado para entrar no palco, null veio desejar boa sorte a null, e disse que havia mandado alguma mensagem pra ela mais cedo, que ficou preocupado quando a amiga não respondeu. Então null se lembrou de Nina, e correu para pegar o celular. Laurel apenas disse “Vamos, null, a banda já está no palco e vão anunciar seu nome a qualquer momento”. Foi quando antes de null poder responder a Laurel, a mensagem da prima irrompeu a tela do seu celular:
“Não, null, não está tudo bem” dizia o primeiro texto, o coração de null já estava enterrado no peito, e ela bem tentou se dirigir a Laurel, mas a mesma arrancou celular da mão de null, antes que a cantora pudesse ler o conteúdo das demais mensagens, e disse:
- null, você precisa subir no palco! O que quer que esteja acontecendo, pode esperar! É um show curto, você consegue. – ouvindo, null deu-se por derrotada e desistiu da possibilidade de convencer Laurel de que não poderia se apresentar, apenas subiu no palco do modo mais automático que havia aprendido com a empresária, e deu seu melhor enquanto pôde.
No final da terceira música, quando falava sobre querer correr para algum lugar bonito onde ninguém soubesse seu nome, null lembrou da infância em Bassano, onde seu nome não importava, dizer ser neta do Sr. Giuseppe null, bastava. null parou de cantar abruptamente, e sentiu seu rosto aquecer. Olhou para a multidão de semblantes indagando o que estava acontecendo, e usou seu último vestígio de fôlego para se justificar com seus fãs:
- Desculpem, e-eu não consigo mais. Sinto que preciso me despedir, preciso dizer o quanto o amo... – null largou o microfone no chão, causando um estridente som nos alto-falantes, e saiu correndo do palco em direção ao camarim, com uma Laurel enfurecida gritando em seu encalço. null entrou no cômodo e tomou para si o smartphone que estava na mão de Laurel, ignorando o que a empresária dizia, sentou-se no sofá para ler as mensagens da prima:
Já sabia que algo estava errado, mas Nina continuou: “a tia Sara não te contou porque aquela sua empresária disse que te prejudicaria muito” Laurel havia passado dos limites, null já não poderia mais suportar, até que a próxima mensagem chegou “mas o Nonno Peppe está muito doente, null. Ele pediu para reunir a família, para poder se despedir” e a última foi a gota d’água que null precisava para desabar de vez “já perguntou de você algumas vezes, a tia Sara diz que você já está chegando, e ele está esperando, null, ele está esperando sua estrela bambina.” null chorava como não lembrava já ter feito antes, quando leu a quinta e última mensagem de Nina: “Você precisa vir pra cá”.
null se perguntava, diariamente, por que ainda tentava? Laurel mudava de lado todos os dias, dependendo do seu interesse, e null realmente acreditou que pudesse confiar nela, mas agora percebia que vinha sendo apenas ingênua demais para ler os sinais. Laurel era uma pessoa fria e patética, provavelmente jamais fora amada, para ser capaz de tamanha crueldade. null levantou-se do sofá, secou as lágrimas violentamente e dirigiu-se a Laurel:
- COMO VOCÊ PÔDE? Eu já suspeitava que Laurel Leminski não tinha escrúpulos ou sentimentos, mas meu avô está morrendo e você foi capaz de fazer minha mãe mentir para mim, por causa de uma merda de festival? – null gritava, e provavelmente atraía a atenção de todos que passavam pelo corredor, pois null entrou no camarim assim que a garota fez silêncio.
- null, você precisa entender que o contrato nessa “merda de festival” é muito alto, eu fiz o que era certo para você se apresentar, assim que saísse do palco eu mesma ia te contar e te levar a Bassano, apenas neguei mais cedo para que você não desconfiasse de nada. – disse Laurel, caindo em si sobre o que havia feito, mas sabia que precisava convencer null a se apresentar, ou seu nome estaria na lama. null dirigiu-se furiosamente à empresária:
- Quem precisa entender algo aqui é você, Laurel! Giuseppe é a pessoa que null mais ama nesse mundo, e ele está partindo sem que eles possam se despedir. Você é uma pessoa péssima, e no que depender de mim, jamais irá interferir na vida de null novamente, ouviu bem? – Laurel estava atônita, pela segunda vez no dia, null null aparecera para desautorizá-la em frente a null, e ela não gostou nada da ideia, mas antes que pudesse protestar, null dirigiu-se a ela:
- Não pense que você vai conseguir ofender null novamente, Laurel. Nem a ele, nem a mim – uma versão de null, estranhamente poderosa para o contexto, bradou contra Laurel – Eu poderia passar horas despejando informações podres suas, como você mesma gosta de fazer, mas preciso chegar na Itália a tempo de dizer adeus ao meu nonno, e tudo que eu preciso dizer a você, pode ser resumido em uma frase: você está demitida, Laurel Leminski.
null pegou a mochila que havia convenientemente organizado mais cedo no Baglioni e saiu do seu próprio camarim, entrando no de null com o garoto ainda atônito, porém enfurecido a seguindo. null desabou no sofá e perguntou a null se ele tinha alguma maneira de sair de Wembley e ir para casa de sua avó, ela precisava de um local calmo para colocar as ideias no lugar e definir seus próximos passos.
- Claro, null. Andrew pode nos levar, certo? – e agora null se dirigia ao empresário e amigo – Inclusive, Andrew, me parece que null precisa de um empresário. O que você acha de pegar o cartão de acesso dela ao Baglioni e buscar o restante dos pertences que ainda estão no hotel e levar lá pra casa? Como um empresário interino... – null sugeriu e Andrew prontamente aceitou, pegando o cartão com null. A menina por sua vez, apesar de ainda muito preocupada, estava extremamente grata a null pela ajuda.
Mais tarde no Dia 2: Sábado à noite, Londres, Inglaterra. Residência null.
Eram dez e meia da noite quando null e os três null que a faziam companhia, null, Maureen e Claire, estavam sentados no sofá da confortável sala da casa, onde os anfitriões tentavam amenizar o clima pesado que cercava a jovem cantora. Para quebrar o silêncio e tranquilizar null sobre o itinerário, Maureen perguntou ao filho:
- Querido, tudo certo com as passagens? Como as coisas vão correr? – e indicou a cabisbaixa null com as sobrancelhas, indicando ao filho que perguntava com a finalidade de entreter e acalmar a menina. null prontamente respondeu:
- Sim, mãe, tudo certo. Pegamos o avião em Gatwick às 23h45, o voo deve durar em média duas horas e quarenta até Veneza. Caso tudo corra bem, o que acontecerá, devemos chegar ao aeroporto de Veneza por volta das duas horas da manhã, onde devemos esperar até às seis pelo primeiro metrô Venezia Mestre, que nos levará até Bassano, onde vamos chegar perto das 8 da manhã. – concluiu null, vendo os olhos de null atentos sobre cada palavra que proferia, certificando-se que nada mais a atrapalharia no seu caminho até Bassano, até seu nonno.
null e null despediram-se de Maureen e Claire null e seguiram com Andrew para o aeroporto. null percebera que a tensão de null era crescente, a amiga esfregava as mãos com frequência, olhava para os lados, respirava fundo. O canadense não sabia como ajudá-la, apenas passou o braço por cima de seus ombros e fez carinho, como um gesto de conforto, no intuito de protegê-la e a encorajar por qualquer que fosse a situação que os esperava na Itália. Assim que terminaram de organizar o itinerário, null avisou Nina onde e que horas chegariam, a prima estaria os esperando para levá-los ao vinhedo Monte null, onde ficava a casa dos avós.
Após fazer o check in, já na sala de embarque, null e null esperavam a hora do voo. null pensava sobre as temporadas que passara na Itália quando criança, os passeios guiados pelo avô em meio as parreiras de vinho, o cheirinho de uva que tomava conta do local durante as épocas de colheita. Queria poder voltar no tempo, ser aquela menina leve e de sorrisos fáceis novamente, em uma época em que ela podia tranquilamente falar sobre nada com alguém que significasse algo.
Quando o embarque iniciou, null chamou null e percebeu que o amigo havia cochilado, quando o mesmo levou um susto ao ser acordado, sustentava um semblante cansado e um tanto quanto adorável, e ao observá-lo no caminho para o avião, null percebeu o quão grata era por tê-lo ao seu lado de novo, por mostrá-la que as coisas poderiam ser melhores enquanto ela tivesse pessoas verdadeiras com ela. Ele com certeza era uma delas, ela sabia.
Uma vez devidamente instalados no avião, null percebeu que null lutava contra as pálpebras pesadas e sono pálpevel a cada bocejo dado, e decidiu liberá-lo do martírio, pois o conhecia, e sabia que o mesmo tentava manter-se acordado caso ela precisasse dele.
- null... – null disse, buscando atrair sua atenção – você está com sono, quem sabe não dorme um pouco?
- Não sei – questionou o músico – você pode precisar de mim...
- Caso aconteça, eu te acordo, mas agora descanse, ok? – bastou null concluir, para que null concordasse com um aceno de cabeça, aos poucos relaxando na poltrona e deixando os olhos fecharem-se novamente.
Ali, assistindo-o novamente naquele dia, null dessa vez recordou-se do ensino médio dos dois. Eram grandes amigos do departamento de música, mas quando a carreira de null deslanchou, ela ficou seu tempo para dar atenção ao projeto da escola e acabou pedindo desligamento do clube, o que não foi suficiente para colocar um ponto final na amizade. null e null eram uma boa dupla nas matérias que faziam juntos, e musicalmente falando. Quando null estava gravado seu primeiro EP, null foi aceito na London Royal Academy of Arts* e decidiu mudar-se para Londres, onde viveria coma a sua avó. Com a agenda corrida de null e a mudança de null, os dois acabaram se afastando aos poucos, sem nem mesmo perceber.
Esporadicamente comentavam os stories um do outro e conversavam por poucos minutos, e apesar de o carinho que sentiam ser mútuo e intenso, null e null haviam se afastado, até aquele final de semana.
null, (como era chamada pela maioria das pessoas com quem convivia), ou null, (como null a chamava), desejara que jamais tivesse deixado a amizade dos dois enfraquecer, talvez com null ao seu lado ela não teria se afastado tanto de quem realmente era, e hoje não estivesse vivendo tamanho drama. Sabia que independe do que estivesse a esperando na Itália, após a hora de voo que ainda os restavam e o metrô que deveriam pegar até o ponto marcado com Nina para o vinhedo, as coisas se encaminhariam de volta para o lugar.
null null iria mostrar ao mundo quem realmente era através de sua música, e finalmente se permitiria evitar as conversas falsas e os sorrisos dissimulados que vinham a cercando. A nova null renasceria na Itália, onde aquela que ali pensava havia feito seu primeiro show, em cima de um barril de vinho cantando para os avós.
A nova null falaria com a lua até altas horas, a nova null se permitiria ir a lugares onde ninguém de fato soubesse seu nome, pois ela havia descoberto onde estava se escondendo a pessoa fundamental para apoiá-la durante toda essa mudança, a pessoa que a guiou de volta para o coração, o amigo verdadeiro que ela já possuía, mas estava de fato escondido entre tantas coisas que null havia involuntariamente deixado para trás, entre elas, sua própria identidade.
Certa vez null lera que o amigo verdadeiro é aquele de quem você pode se distanciar, mas uma vez reunidos, nada haverá mudado... null olhou para o lado e viu null null, que dormia tranquilamente na poltrona, enquanto que sua null se reencontrava dentro de si mesma, buscava forças para encarar o possível adeus ao avô, e o olá para a nova fase de sua vida.
Os últimos dias mostraram a null onde ela pretendia ficar e sempre estar, talvez não geográfica, mas emocionalmente: ao lado de null, seu verdadeiro amigo. Mas sempre e em primeiro lugar, do lado do coração, onde ela deixava o melhor de si aflorar, e era a melhor null que o mundo, os avós e todos aqueles que a amavam, mereciam: a null null de verdade.
O grande buffet era disposto em três partes: doces, salgados e bebidas, a última repleta de chás de diferentes sabores. O burburinho das vozes entretidas em assuntos triviais a deixava zonza, jamais gostara desses encontros, as conversas arranjadas, sorrisos forçados e pessoas falsas, ou apenas vazias, com muita superfície para mostrar e pouco conteúdo para apresentar.
Brunches em Nova Iorque, restaurantes a beira mar em Los Angeles, coquetéis em Vegas e chás em Londres: sobre esses eventos, null null gostava apenas da comida, jamais se sentira confortável com tamanha superficialidade, tentava ao máximo evitar as conversas vazias e os “sim, estou bem” como resposta a perguntas feitas por pessoas que ela sabia, não se importavam de fato sobre como ela se sentia, enquanto estivesse performando e gerando dinheiro, estava tudo bem para eles, mesmo que nada estivesse de fato bem, para ela.
Decidiu que estava satisfeita, procurou Laurel pelo grande salão para avisa-la que iria para o quarto e a avistou a alguns metros, conversando com um figurão da Radio 1, null se aproximou, implorando a qualquer que fosse a força que controlava o universo, que ela não precisasse engajar em mais uma daquelas conversas.
- Com licença, desculpem a interrupção – disse ao se aproximar dos dois, e foi imediatamente interrompida por Laurel Leminski, sua empresária:
- A interrupção é muito bem-vinda, null! Estava justamente conversando com David sobre seu interesse em participar de um dos programas da rádio, talvez uma entrevista com Grimmy ou até mesmo um Live Lounge – Laurel sugeriu e a encarou com o olhar conhecido de “concorde, fique animada e mostre interesse”.
- Claro, eu adoraria! Me sinto cativada pelo tom intimista e acústico do Live Lounge, espero poder fazer o meu um dia. – respondeu, no seu maior esforço em ser breve e poder ir para o quarto o quanto antes.
- Adoraríamos ter você na rádio, null! Conversarei melhor sobre o assunto com Laurel mais tarde, agora me deem licença, preciso resolver um problema com a grade da programação – David finalizou e se afastou, deixando Laurel e null a sós, dando a mais nova a deixa que precisava para falar com a empresária.
- Laurel, não estou me sentindo muito bem e vou para o quarto descansar, ok? – avisou, mas de uma certa forma sentiu como se estivesse pedindo permissão.
- null, você sempre tem uma desculpa para fugir dessas ocasiões, quantas vezes preciso te falar que quem não é visto não é lembrado? – disse a empresária, e null apenas a encarou, com um olhar suplicante que pareceu fazer efeito – Mas tudo bem, tome um banho e descanse, mais tarde passo para ver como está e repassar a programação, temos um grande dia pela frente amanhã.
- Eu sei que temos, por isso preciso descansar, Laurel! Estou subindo, te vejo mais tarde – concluiu null, e saiu em direção ao elevador a passos largos, antes que Laurel falasse mais alguma coisa.
Seus pés doíam, e a cabeça latejava. Haviam passado boa parte da madrugada em um longo voo, sem contar o fuso-horário, a manhã de translado e instalação em hotel, seguida pela tarde com algumas entrevistas previamente agendadas no local. A Jetlag era real e null necessitava de um banho e cama mais do que tudo no momento.
O elevador parou em seu andar, null apressou-se em direção ao quarto enquanto retirava da capinha do celular, pegando de lá o cartão de acesso. Tentou pelo menos três vezes entrar na suíte, e sem sucesso, resmungou talvez mais audivelmente do que gostaria, acabou por atrair atenção de uma simpática camareira que passava pelo corredor, a mesma se dirigiu a null, pacientemente:
- Capinha do celular, huh? Seu cartão desmagnetizou, querida. Procure mantê-lo longe do aparelho, preferencialmente guarde na sua bolsa ou carteira, ok? – dito isso, a senhora sacou do bolso do uniforme um cartão um pouco diferente, e destravou a porta para que null pudesse entrar – Ligue para a recepção e solicite um novo, eles trazem para você.
- Muito obrigada, a senhora me salvou de mais um problema, e pode deixar que vou mantê-los separados sim! Obrigada mesmo, tenha uma boa noite! – null disse, e sua gratidão era genuína e enorme, só ela sabia o quão cansada estava e a senhora havia evitado mais um problema na lista crescente dos mesmos que já havia enfrentado no dia.
Entrou no quarto, pegou uma aspirina na sua nécessaire e tomou, esperando que o efeito fosse rápido, ou corria sérios riscos do episódio tratar-se de uma crise de enxaqueca, e ela não poderia se dar ao luxo. Dirigiu-se ao banheiro espaçoso, reparou na banheira e lembrou o quanto desejou um longo banho relaxante com sais e espumas quando a viu mais cedo, porém no momento ela precisava do mais rápido e prático, acabou por contentar-se com uma ducha quente, talvez não tão relaxante quanto, mas era o suficiente.
O banho melhorou o cansaço muscular de null, mas sua mente ainda pesava muito. Estava inquieta, um sentimento estranho e forte que indicava que algo estava errado, mas não conseguia identificar o que era ou de onde tamanha angústia vinha. Sentiu fome apesar do chá recente, acionou o serviço de quarto e solicitou um chocolate quente, a bebida sempre a trazia um conforto inexplicável.
Deitou-se na cama para esperar a bebida, mas antes que a mesma chegasse, alguém bateu na sua porta e entrou em seguida, o ato anunciou ser Laurel, ela era a única que também possuía um cartão de acessou ao quarto. Ao ver null de pijama, disse:
- O que acha de trocar esse pijama por uma roupa mais... “festa”? – sugeriu a empresária, erguendo as sobrancelhas - O pessoal está combinando de ir a uma boate clássica da região, frequentada pelas maiores celebridades britânicas, e uma aparição antes do show de amanhã seria ótima, já posso ver as matérias: “null null curte a noite londrina, tanto quanto esperamos curtir seu show no Summertime Ball na tarde desse sábado” – a empresária falou talvez rápido demais, sem pausas e sem tempo para null raciocinar direito, mas desde o momento que a viu adentrar o quarto, null já sabia o que dizer caso propostas como aquela surgissem:
- Não, obrigada... vou ficar por aqui essa noite. Realmente preciso descansar Laurel, estou exausta. Pedi um chocolate quente e deve estar chegando a qualquer momento. Mas vá você e aproveite, enquanto eu aproveito Netflix e uma boa noite de sono nessa king size. – respondeu null prontamente, enquanto dirigia a mais velha até a porta do quarto, onde um rapaz estava parado, com um carrinho que trazia sua xícara mais do que merecida de chocolate quente.
- Obrigada, tenha uma boa noite! - null se dirigiu ao rapaz, e logo em seguida a Laurel – Boa festa Laurel, te vejo amanhã no café!
E mais uma vez, como era de praxe, null fechou a porta antes que a empresária pudesse intervir. Esperava não ter sido rude, mas conhecia Laurel e sabia que caso a desse espaço para continuar a sua proposta e argumentar sobre, a noite de descanso de null estaria arruinada.
Seguiu com a bebida em direção a varanda, bebeu um gole e constatou que a mesma estava muito quente, o que fez com que ela a deixasse em uma mesinha na área interna do quarto. A noite londrina apresentava um raro e surpreendentemente limpo céu, onde ao admirar o Hyde Park e direcionando seu olhar para os astros, null pôde ver a bela lua que iluminava o longo gramado do local. Sentiu falta das noites em Bassano del Grappa, na Itália, onde passava horas com os avós analisando as estrelas e “conversando com a lua” como nonno Peppe dizia.
Ao pensar no avô, null sentiu um aperto mais forte no peito, o que a fez mandar uma mensagem para a mãe perguntando como estavam as coisas na Itália, onde Sara passava uma temporada cuidando dos avós da menina e dos negócios da família. A resposta veio em seguida:
“Estamos todos bem, querida, com saudades suas! Nonno e Nonna disseram que te amam, que sabem que a estrelinha deles vai brilhar muito amanhã”
null estava com os olhos marejados, uma simples menção do carinho dos avós a confortava, mas a sensação de que algo estava errado era insistente.
null sentia-se frequentemente sozinha em locais preenchidos por multidões, não conseguia evitar sentir que algo estava errado, afinal, todos os lugares em que ela passava, por melhores que pudessem ser, não a faziam se sentir em casa. Olhou para a lua, pensou nos avós e no quanto os amava e esperava que de fato estivessem bem.
Entrou no quarto e pegou sua xícara, agora na temperatura perfeita, se aconchegou na cama enquanto se escorava na cabeceira, com uma manta leve sobre as pernas, pegou o celular, e enquanto apreciava o sabor do chocolate quente e olhava alguns InstaStories, um em especial chamou sua atenção e lhe trouxe um sentimento bom de nostalgia. O story em questão era um boomerang postado por null null, onde ele e sua mãe, Maureen, apareciam com semblantes que transmitiam conforto, segurando canecas que, provavelmente, continham a mesma bebida que a menina tomava no momento.
Prontamente, null abriu seu chat no Instagram com null e respondeu a imagem do stories com uma selfie sua e seu chocolate quente, acompanhada da legenda “@nullnull minha caneca não é tão legal, nem minha companhia é tão INCRÍVEL, mas aposto que o chocolate quente do Blaglioni é muito melhor do que qualquer coisa que você deve ter comprado em uma Starbucks” no intuito de provocar, afinal, ela sabia que a mãe do garoto provavelmente tinha feito a bebida, que ele adorava dizer ser a melhor do mundo.
Esperou a resposta, enquanto recordava do quanto sentira falta de null e da amizade que os dois compartilharam no Ensino Médio. null null era para muitos um jovem e talentoso músico em ascensão, para ela, era apenas null, um grande amigo do ensino médio e agora colega de indústria. O telefone vibrou em seu colo, a notificação do Instagram apareceu na tela, null desbloqueou o aparelho e leu a mensagem:
“@nullnull 1- Sim, minha caneca Expresso Patronum é a mais legal DE SEMPRE. 2- Sim, a mamãe é a melhor companhia que qualquer um pode desejar. 3- VOCÊ TÁ BRINCANDO COMIGO? Sabe que eu não comprei nada, como você se atreva a tamanha ofensa para o chocolate quente da Mamãe null? 4- Você já está em Londres? Pensei que grandes estrelas chegavam apenas no dia do show :p”
null estava rindo e sorrindo verdadeiramente como não o fazia há um tempo, devido ao bom humor do amigo e a constatação de que ainda o conhecia, pois a reação que obteve foi exatamente a que esperava. Enquanto digitava, recebeu mais uma mensagem:
“MAS EU SINTO TANTO A SUA FALTA, BOBÃO!!” null sentiu como se o peso que carrega houvesse diminuído o suficiente para que seu coração pudesse bater com mais plenitude e sentiu-se aquecida, respondendo:
“1- está certo. 2- Sinto tanta saudade dela!!! Sim, eu estou, lentinho! Chocalate da tia Maureen é o melhor de todos! 4- Eu estou!! Eu não sou tão famosa, Sr. Faz Adolescentes Gritar ao Redor do Mundo Todo!! TAMBÉM SINTO MUITO A SUA FALTA!!” e enviou. Logo em seguida obteve resposta:
“Estou tão feliz por estarmos conversando que vou ignorar essa provocação descarada, Srta. null! Você precisa melhorar seu jogo, garotal! Quando vai tocar amanhã? P.s: Mamãe está dizendo ‘oi’ x.”
null não demorou para responder o amigo “Vou encerrar o festival por volta das oito da noite, eu acho. Ouvi que você vai abrir, hm? E eu que sou a grande estrela?! P.s: Diga que estou mandando um oi também, e a dê um abraço bem forte por mim, por favor!!!!”
“Vamos, null, claro que você é!! Eu estou apenas engatinhando nesse mundo, enquanto você voa desde que terminamos o Ensino Médio e eu me mudei pra cá para estudar! A prova de que você é uma grande estrela é que está hospedada no Baglioni, huh? Muito eleganteeee!”
“Adoro quando você me bajula, null hahahahah! Eu sei que você é meu ‘fanboy’ número 1! Sim, eu estou. Sim, é elegante, mas eu facilmente trocaria a estadia aqui por uma casa confortável e quentinha como a da sua avó, com bastante chocolate quente da tia Maureen agora mesmo hahaha”
“Bem, não há nada que não possamos arranjar para amanhã, certo?! Eu jamais perderia a oportunidade de te ver tocar, então meu antigo medo de palco precisa perguntar: você vai estar em Wembley desde o início? Vai me ver tocar?”
“Claro que eu vou, null! E deixe de bobagem com ‘medo de palco’, você é muito talentoso e tão maior que qualquer insegurança!! Eu vou estar lá te apoiando do início, como nos ‘velhos tempos’. Só não me deixe esquecer de levar protetores auditivos para evitar surdez causada por todos os gritos de adolescentes!”
“Aqui está ela, a boa e esperta null que eu conheço! Estou tão feliz que você estará lá! Mal posso esperar para tocar, estou tão ansioso AHHHH” null entendeu o sentimento e o achou adorável, afinal, ela já havia estado lá antes. Por mais que ela sentisse sua falta e amasse converser com ele, null estava começando a sentir-se sonolenta e decidiu usar o pouco de paz e tranquilidade que o momento trouxe para sua mente e espiríto, e mandar sua última mensagem para null, pelo menos naquele dia:
“Você vai arrasar, cara! null, estou amando nossa conversa e senti muito a sua falta, mas preciso ir dormir agora, ou Laurel não ficará feliz se eu aparecer com olheiras amanhã. Boa noite bobão, durma bem xx null.”
null foi ao banheiro para escovar os dentes e pentear os cabelos, e quando voltou para a cama, null havia respondido: “Ah, a bruxa de cabelos de cobra ainda está por aí? Brincadeira… (não muito, na verdade)!! Ok, null, te vejo amanhã. Tenha bons e doces sonhos xx null.” E com aquela resposta, null caiu no sono minutos depois, e teve de fato, doces sonhos. Sonhos que mal sabiam a garota, viriam a contradizer o ditado e seriam a calmaria antes da (maior) tempestade de sua vida até então.
Dia 2 – Sábado, por volta das 9h da manhã, Londres, Inglaterra. Baglioni Hotel.
O som estridente do despertador acordou null muito antes do horário que ela gostaria de acordar, principalmente após uma boa noite de sono que não havia tido nos últimos meses. null não era uma pessoa matutina, e se a mesma não prezasse tanto por sua imagem profissional, mandaria todas as entrevistas programadas para longe e aproveitaria mais algumas horas do conforto que o hotel e seu sono lhe proporcionavam.
- Bom dia, estrela bambina! – exclamou Laurel, demasiado estridente para tal hora da manhã, ao entrar no quarto de null – temos um dia cheio, null! Levante-se, vista a roupa separada para o round de entrevistas, um lindo sorriso de acessório e te espero em meia hora para o café da manhã.
- Bom dia, Laurel! Tudo bem, te vejo no café. – null respondeu em falso ânimo, na esperança de que a mulher a deixasse sozinha o quanto antes. Laurel parecia funcionar como um robô, o que por vezes incomodava null, que sentia falta de humanidade na empresária.
A mais velha saiu do quarto, e null olhou-se no espelho, constatando que as olheiras que mencionara na noite anterior não estavam presentes, mas não podia dizer o mesmo sobre a angústia que sentira na noite anterior. “Estrela bambina” era um dos apelidos do avô materno para null, e Laurel o usava como instrumento para criar um bom clima e humor na menina.
null pegou o celular e abriu a conversa com a mãe, e prontamente enviou a mensagem parecida com a que havia mandado na noite anterior, com um importante aditivo: “Bom dia, mamma! Acabei de acordar, darei algumas entrevistas pela manhã, de tarde apenas backstage, e de noite, meu show. Estou pensando em aproveitar os dias de folga que tenho em seguida e ir à Bassano, o que acha? Como estão todos por aí?”
A resposta não tardou a chegar, null estava procurando o cabide correto com a roupa designada como Laurel havia instruído, quando o celular apitou com o nome “Mamma” em destaque na tela. A mensagem dizia “Bom dia, principessa! Boa sorte hoje, mi amore, brilhe muito! Ah, querida, venha sim! Todos sentem sua falta, seus avós precisam de você! Estamos todos bem, agora mais felizes te aguardando, bambina!”
null sentiu novamente o aperto no peito, devido ao trecho “... seus avós precisam de você” que a deixou angustiada. Algo no tom da mãe não soava bem, null podia dizer. Precisava ir a sua amada região do Veneto, visitar a cidade de Bassano del Grappa e sua família, o quanto antes.
Ao localizar a roupa, null terminou de se arrumar em minutos e desceu ao restaurante do hotel para encontrar uma Laurel robótica (como esperado) e sorridente tomando café, afinal, o hábito americano persistia, mesmo que tivessem à sua disposição os melhores chás do mundo. null dirigiu-se direto ao buffet, agradecendo pelo mesmo conter opções leves e variadas, contrariando o tradicional e gorduroso café da manhã inglês.
Serviu-se com alguns pedaços de fruta e um iogurte, apenas para não ficar em jejum, pois não sentia fome alguma. Para a surpresa e alívio de null, Laurel manteve-se ocupada entre e-mails e ligações durante o café, apenas dirigindo-se a menina quando ambas haviam terminado suas refeições:
- null, temos duas entrevistas pela manhã e possivelmente algumas nos bastidores do festival. Seu figurino da performance e outros já foram levados mais cedo pelo staff da Capital FM, e seu camarim estará equipado com tudo que possa precisar, pegue apenas o que couber em uma bolsa de mão no seu quarto, e vamos rápido, pontualidade britânica, minha querida – Laurel despejou como sempre, e null processou as informações de maneira rápida, mesmo que estivesse confusa – Alguma pergunta, null?
A menina quis olhar Laurel nos olhos e dizer “Sim, várias!! Quando você respira ou relaxa? Como você consegue ser tão automática e robótica? Sobre o festival: o camarim de null é longe do meu? Quando eu vou poder descansar? Eu posso ir para a Itália amanhã?” expressando sua exaustão física e esgotamento emocional, mas apenas negou com a cabeça e terminou o diálogo, informando:
- Te vejo no saguão em 10 minutos, não se preocupe. – null se dirigiu ao elevador, e enquanto esperava o mesmo chegar, buscou o contato de null, e na tentativa de resgatar a paz que havia sentido na noite anterior ao falar com o amigo, lhe enviou uma mensagem:
“Hey, bobão, já está em Wembley?” a mensagem foi entregue no instante em que o elevador chegou, e null aproveitou a viagem de um minuto para se olhar no espelho, respirar e tentar manter a compostura, apesar da angústia incessante em seu peito e a sensação de solidão que a assombrava, mesmo quando em lugares lotados de pessoas.
Em diversos momentos, null só queria poder falar sobre nada com alguém que significasse algo, queria amigos verdadeiros com quem pudesse contar, porque até então, todos a sua volta ostentavam sorrisos falsos e em determinado momento, quando null permitia que eles se aproximassem, mostravam quem realmente eram, de interesseiros à oportunistas, nada era real.
Entrou no quarto e seguiu para o banheiro, onde aproveitou estar sem maquiagem e lavou o rosto com água gelada, na esperança de evitar que as lágrimas saíssem, enquanto a angústia em seu peito apenas aumentava. Em seguida, correu seus olhos pelo quarto e arrecadou objetos como sua nécessaire de remédios e itens de higiene pessoal, carregador de celular e fones de ouvido, escova de cabelo, um livro, carteira e os colocou dentro da mochila pequena (a única que ela mesma havia feito) junto uma troca de roupa confortável, caso fosse necessária.
Encontrou Laurel no saguão no tempo prometido, e as duas seguiram para a Limousine que as levaria para os lugares necessários e por fim para Wembley. Foram primeiro à sede da Capital FM, onde null fora recebida por maquiadores e figurinistas, que lhe maquiaram e indicaram uma troca de roupas, para os conteúdos de mídia de imagem da rádio. As entrevistas correram do modo automático que null estava acostumada: novidades, divulgações, algumas especulações e elogios. As conversas favoritas de null com a mídia eram as que continham dinâmicas ou interação com fãs, geralmente feitas nos bastidores de eventos como o de mais tarde.
null e Laurel estavam no caminho para Wembley, por volta do meio-dia, quando o celular de null tocou e a tela exibiu a notificação da mensagem de null, que dizia “Bom dia, italianinha! Sim, estou em Wembley, acabei de fazer a passagem de som e descobri algo muito maneiro sobre os camarins...” null indagou-se sobre que horas faria a passagem de som, mas deixou o pensamento de lado para responder o amigo:
“É mesmo? E o que seria? Fontes de chocolate ou estoque infinito de muffins?” enviou, e null respondeu em seguida com uma foto encostado em uma parede, entre duas portas para as quais apontava, onde estavam escritos os nomes “null null – Show de abertura” e “null null – Show de Encerramento” , e a legenda era um “somos vizinhos!!!!” acompanhado de vários emojis desconexos. null respondeu prontamente:
“Não acredito, null!!!!! Deus salve quem quer que tenha sido que organizou esses camarins, já não estou tão triste e aparentemente menos sozinha do que imaginei que estaria hoje” e sem nem pensar, null enviou a mensagem, arrependendo-se ao perceber que a mesma era sincera e demonstrava uma vulnerabilidade com a qual null não queria lidar no momento, mas sabia que null não deixaria passar despercebida. Sem decepcionar, null respondeu em instantes:
“Triste? Sozinha? Aconteceu algo, você quer conversar? Foi aquela cobra insensível Leminski, não foi? Eu sabia, odeio aquela mulher” null sabia que ignorar null apenas faria da situação pior, então tentou remendar o estrago da melhor maneira que pôde:
“Não, null, Laurel não fez nada hahahahah. Está tudo bem, não se preocupe, daqui a pouco conversamos, chego em Wembley em 15 minutos, vizinho” esperava ser o suficiente, null o conhecia e tinha plena noção de que null não descansaria sabendo que ela não estava bem, e isso apenas prejudicaria os dois em suas respectivas performances. null se sentiria mal por não ajudar e acabaria distraindo-se, e se null começasse a falar sobre o que a afligia, (caso ela soubesse exatamente) ficaria vulnerável e propensa a uma crise de ansiedade antes da performance, o que jamais seria boa sorte.
O veículo estacionou na entrada designada em Wembley, onde null e Laurel puderam ter acesso aos camarins, sem serem percebidas e abordadas pela mídia ou fãs. O espaço de null era de um tamanho razoável, e de fato, tudo que a cantora pudesse vir a precisar estava ali. A mesa com petiscos e frutas, o frigobar com refrescos e água, a arara com as opções de roupa para a performance e um sofá grande e aparentemente confortável, onde null esperava poder descansar após a passagem de som, que ainda era uma incógnita.
- Laurel, e a passagem de som? Os portões não devem demorar muito para abrir, acho que null sobe no palco por volta das duas da tarde... – indagou null, esperando uma resposta automática de Laurel, como sempre, mas não foi exatamente o que obteve.
- Não sei, null! Acredito que a qualquer momento devem vir te chamar, mas não tenho certeza. Você deveria se preocupar com essas coisas mais cedo, estou farta de tanto drama e de ter que levar tudo nas costas. Talvez você se apresente sem passagem de som, eu realmente não ligo! – null estava atônita, jamais esperara aquela reação da empresária, principalmente sem saber o que a havia causado. Sim, a menina sabia que nos últimos dias havia sido distante e feito não mais do que sua obrigação, mas estava esgotada emocionalmente, e sentia falta da Laurel que um dia se preocupara sobre o que null sentia.
null null e Laurel Leminski formavam um time excelente no início da carreira da mais nova: a sintonia era incrível e o respeito de uma pela outra, admirável. Durante um tempo, sob o menor sinal de algum desconforto vindo da parte de null, Laurel se preocupara em sentar com a menina, conversar e esclarecer qualquer dúvida ou ajudar a mandar embora todas as angústias da iniciante null.
Laurel fora realmente uma amiga para uma pequena estrela em ascensão, mas a situação mudou quando null “estourou” na indústria fonográfica e começou a perceber que as coisas não eram como Laurel pintara, mas sim falsas e descartáveis, a partir desse ponto os desentendimentos começaram e a infelicidade de null também. Laurel aos poucos jogava fora a confiança que null havia nela depositado, e a cada dia que passava mostrava mais sobre quem realmente era: uma mulher calculista, fria e falsa, que se importava apenas com o dinheiro que null iria pôr em seu bolso, nada mais. Tendo toda a situação em mente, null tomou fôlego para responder, estava farta da situação do jeito que estava, e não deixaria que a mesma perdurasse por mais um segundo sequer.
- Você está farta de “tanto drama”, Laurel?! De carregar “tudo nas costas” quando na verdade quem precisa aguentar toda essa falsidade e situações forçadas, sou eu! Quem se apresenta para milhares mesmo estando exaurida física e emocionalmente, sou eu! Quem sente falta da família e de casa diariamente, mas não consegue um mísero dia de folga para visitar os avós, sou eu! A verdade, Laurel, é que você se importa sim, mas com o seu dinheiro e não comigo ou com a qualidade da minha performance. Você foi forjada nesse e para esse mundo, para sobreviver em meio a essas víboras, se tornando uma. Me desculpa, Laurel, mas eu não sei se consigo aguentar muito mais dessa realidade. Ou não me desculpe, eu realmente não ligo. – foi a vez de null de despejar informações, depois de tanto tempo suportando a situação que estava muito perto de sufocá-la.
Exasperada, null dirigiu-se até a saída do camarim e irrompeu para fora, encontrando um null parado em frente a porta, com um semblante chocado que indicava que ele ouvira o desabafo da menina. null apenas o olhou nos olhos por alguns segundos e abraçou o garoto, permitindo que as lágrimas rolassem pelo seu rosto, antes do seu lado racional tomar o controle e deixar todos os sentimentos que imploravam por liberação, suprimidos novamente. null passou o braço pelos ombros da garota e a conduziu para dentro do camarim vizinho, o seu, onde uma vez com a porta fechada, null abraçou null fortemente, fazendo carinho nos seus cabelos e deixando palavras de conforto como “Vai ficar tudo bem, null” no ar, e o ritual se repetiu por alguns minutos, quando null finalmente parecia mais calma, null separou o abraço e sentou no sofá, indicando o espaço ao seu lado para que null fizesse o mesmo. Uma vez confortáveis, null perguntou:
- Eu sabia pela sua mensagem mais cedo que algo estava errado, e que tinha algo a ver com a Medusa, mas não imaginei que as coisas estavam tão sérias. Vamos, null, coloque pra fora... o que aconteceu? – null podia ver a preocupação genuína no olhar do amigo, ele realmente se importava, e talvez fosse um dos poucos indivíduos verdadeiros naquela indústria. Respirou fundo algumas vezes e decidiu que poderia usar o ombro amigo que null oferecera, e respondeu:
- E-eu não sei explicar o que exatamente, null... só sei que estou farta da falsidade que me cerca, dos sorrisos falsos e conversas fiadas sem significado. Venho me sentindo tão sozinha em lugares lotados, e nos últimos dias não consigo evitar o sentimento de que algo está errado, uma angústia tomou conta de mim e eu não consigo identificar de onde ela vem, pra onde quer me levar... eu estou tão cansada, null, tão cansada...
O desabafo de null fazia sentido para null, mesmo que ele não pudesse se identificar com todas as situações enumeradas pela amiga. Viviam de fato em uma indústria sustentada por aparências e interesses, mas o garoto sempre teve sorte e buscara ser o mais honesto sobre o que sentia e o que buscava na sua carreira, o que atraiu pessoas sensacionais para seu time, pessoas sem as quais ele ainda seria um compositor vendendo suas músicas, e jamais teria pisado em um palco para expor sua verdade ao mundo. Buscando as melhores palavras para consolar null, null retomou sua atenção ao diálogo:
- null, eu nunca gostei de Laurel, você sabe disso. Sim, estamos cercados de falsidade, mas aceitamos as relações, sejam elas pessoais ou profissionais, que julgamos merecer. Você é tão maior que toda a pompa e circunstância que Laurel criou a volta da sua imagem, que cada vez mais, fica difícil de segurar as aparências de uma pessoa que você não é, null. – null esperava não ter sido rude com a menina, mas conhecia a null leve, do sorriso frouxo, que adorava fazer palhaçadas e iluminava cada cômodo que estava presente, e observara nos últimos tempos Laurel criar uma imagem que afastava a verdadeira null daquela que o público via, e isso era triste demais para null deixar acontecer – Meu ponto, null, é que você é uma pessoa incrível, que não merece ser sufocada por uma mulher que ofusca o seu verdadeiro eu e tudo que você precisa fazer, é tomar as rédeas da situação.
- Eu queria que fosse fácil como você faz parecer ser, null – null respondeu – mas Laurel tem controle de cada contrato meu, cada horário na minha agenda, cada suspiro que null null dá, passou pelo aval de Laurel Leminski, e apesar de não suportar mais a situação, eu sei que não consigo tomar conta de tudo sozinha. Eu só queria poder me reinventar, mostrar para o mundo quem realmente é null null, mas isso parece impossível de acontecer.
null teve uma ideia insana, e precisava fazer algo para acalmar a amiga antes de ter que entrar no palco, o que não deveria levar muito mais do que uma hora para acontecer.
- null, você só precisa mandar a Medusa pro raio que a parta, e a partir desse ponto a gente vê o que faz. Seus fãs te seguem porque te amam, não por causa de Laurel; sua voz não há quem tire de você, e uma vez que o público entrar em contato com todo brilho que null null tem para oferecer, não há Laurel Leminski no mundo que possa te impedir. Você poderia até fazer parte do TeamGertler, garanto que Andrew adoraria ser seu empresário – null tomou sua vez de despejar informações, e a animação e crença dele de que tudo daria certo, faziam com que null se sentisse um pouco melhor – sem contar que passaríamos muito mais tempo juntos, na Itália!!
E mais uma vez, null conseguiu trazer um pouco de paz e tranquilidade para null, em meio a tanta confusão e sentimentos ruins. null se perguntou, onde null estava se escondendo esse tempo todo? Ou era ela quem estava se escondendo, ocupada demais em meio a tantas aparências a serem mantidas? As perguntas ficaram sem respostas para a menina, enquanto ela e null conversaram mais um pouco sobre a situação e em determinado momento, uma null mais calma relaxou e conseguiu descansar no colo do amigo por alguns minutos.
Foram interrompidos pelas batidas à porta de null quando alguns dos garotos de sua banda entraram no camarim, seguidos por uma Laurel com cara de poucos amigos, chamando null para a polêmica passagem de som. null despediu-se de null e dos demais, prometendo que veria sua apresentação que tomaria espaço logo após a passagem de som de null.
Ao entrar no seu camarim para buscar uma água e seu celular, null lembrou da conversa que tivera com a mãe mais cedo, e como por enquanto ainda trabalhava com Laurel, decidiu parar de medir reações e trazer o assunto a tona:
- Laurel, vou aproveitar a agenda livre dos próximos dias e viajar a Bassano para visitar minha família, então, por favor, não marque nada novo, ok? Eu realmente preciso ver meus avós. – disse uma null decidida como há muito não se via, deixando Laurel pasma.
- E desde quando você sabe algo sobre a agenda, null?! Conversamos sobre isso mais tarde, agora vamos logo pois a passagem de som não pode atrasar o início da apresentação do seu amiguinho.
Algo no tom de Laurel ao referir-se a null desagradou null, mas a garota decidiu não prestar atenção no assunto naquele momento, precisava guardar suas energias para a batalha que aparentemente travaria com Laurel depois. A passagem de som correu bem, e null seguiu para o camarim e trocou de roupa novamente, pois assim que o show de null acabasse, daria mais algumas entrevistas nos bastidores para a própria rádio organizadora do festival.
null estava parada nos bastidores ao lado oposto do palco no qual null entrara, mas no momento que o amigo cruzou o olhar com o de null, ambos sorriram dando força um ao outro. O sorriso de null dizia “Arrase, null! Você consegue, eu tenho certeza”, já o de null era um agradecimento silencioso pela amiga estar ali, mesmo com tanto acontecendo na sua vida, e uma promessa de que tudo ficaria bem. Mesmo depois de um tempo afastados, os dois ainda sabiam ler o que cada expressão do outro dizia.
null era um verdadeiro astro em ascensão. Com um quê de John Mayer, o garoto tinha uma presença de palco que não pedia coreografias ou grandes efeitos especiais, apenas sua voz e os vários instrumentos que o garoto tocava, acompanhados do seu sorriso e da energia incrível que emanava, eram suficientes para que a performance de null null fosse algo incrível de se assistir. Ao fim da apresentação, null cantava uma das músicas favoritas de null, e durante o trecho que afirmava que “você nunca estará sozinha” null olhou para null, e a menina se emocionou com o gesto de carinho do amigo, mas tiveram seu momento interrompido por Laurel, que veio chamar null para o round de entrevistas.
Essas foram mais leves e duraram um pouco mais de duas horas, o que fez com que terminassem às seis da tarde, duas horas antes do previsto para o show de null. A cantora e sua empresária encontravam-se no camarim, sem trocar muitas palavras, até que Laurel rompeu o silêncio, retomando o assunto de mais cedo, sobre a ida de null à Itália.
- null, escute... – disse uma Laurel estranhamente doce, o que nunca era bom sinal para null – esses dias de agenda vazia podem facilmente ser preenchidos por divulgação e até mesmo aparições estratégicas em eventos badalados, agora não é o melhor momento para uma folga.
null esperava algo do tipo vindo da empresária, mas Laurel enganou-se ao pensar que a menina estava pedindo sua permissão, quando na verdade estava apenas comunicando que iria visitar os avós nos dias seguintes, e achou por bem esclarecer a situação:
- Laurel, eu não estou pedindo sua permissão, estou apenas te informando que vou a Bassano visitar meus avós, para que não marque nenhum compromisso, afinal, eu não irei comparecer. – null explicou firme, buscando tomar as rédeas da situação como null havia sugerido. A empresária não aceitou a informação, como esperado.
- null, eu não sei em que mundo você vive, mas se acha que pode apenas comunicar que vai fazer uma viagem de dias, está mui... – e Laurel foi interrompida por um garoto enfurecido que adentrou o camarim de null, e completou sua frase:
- MUITO CERTA! Se null null diz que vai fazer uma viagem de dias, a única pessoa a qual cabe a decisão, é null null. Está claro, Laurel? null precisa descansar e visitar os avós, e se ela não vai bater de frente com você, por respeito, gratidão ou sei lá o quê, fique sabendo que ela tem pelo menos um amigo de verdade que está disposto a fazer isso e muito mais por ela – null deixou ambas Laurel e null boquiabertas, a primeira estava visivelmente irritada, enquanto a segunda abriu um sorriso enorme e se juntou a null, ambos preparados para a resposta de Laurel, que não tardou a chegar:
- Quem você pensa que é, garoto? Mais um menino bonitinho enviado pelo Canadá para fazer adolescentes gritarem, mas não passa disso. Esse assunto cabe apenas a mim e a null, não seja intrometido! – dirigindo-se agora à menina, Laurel ordenou – null, diga para seu amigo ir embora, temos muito o que conversar.
Temendo uma briga maior que poderia gerar grandes consequências e repercussão midiática por estar acontecendo em um local lotado de imprensa, null olhou para null, deixando seu lado racional assumir o controle e antes que pudesse dizer qualquer coisa, o amigo a olhou nos olhos e indagou:
- Você quer mesmo que eu vá, null? Sabe muito bem que eu posso ficar, não sabe? – o olhar de null transmitia tudo que haviam conversado mais cedo, sobre assumir o controle e o desejo de null de mudar a maneira como as coisas eram feitas em sua carreira.
- null, o prédio está lotado de imprensa e não queremos um escândalo, ok? É o certo a ser feito agora, agir de acordo com a razão. – disse null, porém sem um vestígio da firmeza com a qual havia encarado Laurel anteriormente.
- Pare de ser tão racional e escute seu coração, null! Uma vez na vida faça o que é melhor pra você e apenas você, não para todos exceto você. – null suplicou a amiga, pelo seu próprio bem.
- Isso não é possível, você me conhece, null, meu nome tem “racional” por toda parte, de fato... – e mais uma vez alguém naquela discussão foi interrompido por um null null tentando concertar as coisas:
- É grego para “racional”, eu sei! Eu tenho escutado essa história desde o ensino fundamental. Eu te conheço, null, eu sei que você não é essa pessoa que se preocupa com o que os outros vão pensar, eu sei que você é muito superior a todos esses sorrisos e risadas falsas, você também sabe. Você é tão melhor com o seu coração, do que com a razão.
As lágrimas escorriam pelo rosto de null, porque ela sabia que tudo que null acabara de dizer era verdade. Ela precisava enfrentar Laurel e desmanchar a imagem que a empresária criara dela para o mundo, e se enfrentar Laurel, naquele momento significava seguir seu coração e bater pé sobre sua viagem para Bassano, ela o faria. Mas a conhecida angústia estava presente novamente, ao pensar em Bassano, o coração de null apertou.
- Laurel, algo está muito errado, eu posso sentir, eu tenho que ir a Bassano. null, obrigada por me mostrar o que estava debaixo do meu nariz o tempo todo. Agora, vocês dois podem, por favor, me deixar sozinha por alguns minutos? – null suplicou, e null apenas se aproximou depositando um beijo na testa da menina e logo em seguida se retirou do camarim, enquanto Laurel murmurou algo como “Você tem 10 minutos” e saiu, deixando null sozinha.
null pegou o celular e digitou o número de Sara, precisava muito ouvir a voz da mãe. A ligação foi atendida no quarto toque, pela voz de uma pessoa que null podia apostar, havia chorado.
“Oi, Principessa...” disse Sara, do outro lado da linha “tudo bem, querida?” null estranhou o tom na voz da mãe, mas respondeu, tentando não deixar transparecer a própria angústia.
“Sim, Mamma, tudo bem. E por aí? Estou ligando para ouvir tua voz, e confirmar minha ida a Bassano, amanhã apareço por aí, ok?”
“Que ótima notícia, minha querida!! Estamos te esperando. Nina chegou aqui hoje mais cedo, está mandando oi! Vou contar a ela que você também virá, agora preciso desligar, querida! Boa apresentação, estrelinha”
null estranhou muitas coisas sobre a ligação, desde a maneira corrida que a mãe terminara o diálogo, até a presença da prima que estudava em outra região, em Bassano. E o mais importante, não deixou de reparar que mãe não respondera se estava tudo bem na região do Veneto.
Prontamente, null abriu a conversa com a prima e lhe enviou uma mensagem: “Nina”, e partiu para outro texto, com a intenção de chamar atenção “Mamma disse que você está em Bassano” e por fim “está tudo bem por aí? Seja sincera, por favor”.
Antes de obter resposta, Laurel adentrou o camarim, dizendo a null que alguns shows haviam sido menores do que o previsto, o que significava que ela estaria no palco em aproximadamente uma hora e meia. Atrás de Laurel entraram no camarim duas maquiadoras e um hair stylist, enquanto a empresária indicava a null o cabide com a roupa correta e o espaço fechado, designado para troca de roupas. Sem perceber, null acabou deixando o celular pra trás.
Uma hora depois, um pouco antes de ter seu nome anunciado para entrar no palco, null veio desejar boa sorte a null, e disse que havia mandado alguma mensagem pra ela mais cedo, que ficou preocupado quando a amiga não respondeu. Então null se lembrou de Nina, e correu para pegar o celular. Laurel apenas disse “Vamos, null, a banda já está no palco e vão anunciar seu nome a qualquer momento”. Foi quando antes de null poder responder a Laurel, a mensagem da prima irrompeu a tela do seu celular:
“Não, null, não está tudo bem” dizia o primeiro texto, o coração de null já estava enterrado no peito, e ela bem tentou se dirigir a Laurel, mas a mesma arrancou celular da mão de null, antes que a cantora pudesse ler o conteúdo das demais mensagens, e disse:
- null, você precisa subir no palco! O que quer que esteja acontecendo, pode esperar! É um show curto, você consegue. – ouvindo, null deu-se por derrotada e desistiu da possibilidade de convencer Laurel de que não poderia se apresentar, apenas subiu no palco do modo mais automático que havia aprendido com a empresária, e deu seu melhor enquanto pôde.
No final da terceira música, quando falava sobre querer correr para algum lugar bonito onde ninguém soubesse seu nome, null lembrou da infância em Bassano, onde seu nome não importava, dizer ser neta do Sr. Giuseppe null, bastava. null parou de cantar abruptamente, e sentiu seu rosto aquecer. Olhou para a multidão de semblantes indagando o que estava acontecendo, e usou seu último vestígio de fôlego para se justificar com seus fãs:
- Desculpem, e-eu não consigo mais. Sinto que preciso me despedir, preciso dizer o quanto o amo... – null largou o microfone no chão, causando um estridente som nos alto-falantes, e saiu correndo do palco em direção ao camarim, com uma Laurel enfurecida gritando em seu encalço. null entrou no cômodo e tomou para si o smartphone que estava na mão de Laurel, ignorando o que a empresária dizia, sentou-se no sofá para ler as mensagens da prima:
Já sabia que algo estava errado, mas Nina continuou: “a tia Sara não te contou porque aquela sua empresária disse que te prejudicaria muito” Laurel havia passado dos limites, null já não poderia mais suportar, até que a próxima mensagem chegou “mas o Nonno Peppe está muito doente, null. Ele pediu para reunir a família, para poder se despedir” e a última foi a gota d’água que null precisava para desabar de vez “já perguntou de você algumas vezes, a tia Sara diz que você já está chegando, e ele está esperando, null, ele está esperando sua estrela bambina.” null chorava como não lembrava já ter feito antes, quando leu a quinta e última mensagem de Nina: “Você precisa vir pra cá”.
null se perguntava, diariamente, por que ainda tentava? Laurel mudava de lado todos os dias, dependendo do seu interesse, e null realmente acreditou que pudesse confiar nela, mas agora percebia que vinha sendo apenas ingênua demais para ler os sinais. Laurel era uma pessoa fria e patética, provavelmente jamais fora amada, para ser capaz de tamanha crueldade. null levantou-se do sofá, secou as lágrimas violentamente e dirigiu-se a Laurel:
- COMO VOCÊ PÔDE? Eu já suspeitava que Laurel Leminski não tinha escrúpulos ou sentimentos, mas meu avô está morrendo e você foi capaz de fazer minha mãe mentir para mim, por causa de uma merda de festival? – null gritava, e provavelmente atraía a atenção de todos que passavam pelo corredor, pois null entrou no camarim assim que a garota fez silêncio.
- null, você precisa entender que o contrato nessa “merda de festival” é muito alto, eu fiz o que era certo para você se apresentar, assim que saísse do palco eu mesma ia te contar e te levar a Bassano, apenas neguei mais cedo para que você não desconfiasse de nada. – disse Laurel, caindo em si sobre o que havia feito, mas sabia que precisava convencer null a se apresentar, ou seu nome estaria na lama. null dirigiu-se furiosamente à empresária:
- Quem precisa entender algo aqui é você, Laurel! Giuseppe é a pessoa que null mais ama nesse mundo, e ele está partindo sem que eles possam se despedir. Você é uma pessoa péssima, e no que depender de mim, jamais irá interferir na vida de null novamente, ouviu bem? – Laurel estava atônita, pela segunda vez no dia, null null aparecera para desautorizá-la em frente a null, e ela não gostou nada da ideia, mas antes que pudesse protestar, null dirigiu-se a ela:
- Não pense que você vai conseguir ofender null novamente, Laurel. Nem a ele, nem a mim – uma versão de null, estranhamente poderosa para o contexto, bradou contra Laurel – Eu poderia passar horas despejando informações podres suas, como você mesma gosta de fazer, mas preciso chegar na Itália a tempo de dizer adeus ao meu nonno, e tudo que eu preciso dizer a você, pode ser resumido em uma frase: você está demitida, Laurel Leminski.
null pegou a mochila que havia convenientemente organizado mais cedo no Baglioni e saiu do seu próprio camarim, entrando no de null com o garoto ainda atônito, porém enfurecido a seguindo. null desabou no sofá e perguntou a null se ele tinha alguma maneira de sair de Wembley e ir para casa de sua avó, ela precisava de um local calmo para colocar as ideias no lugar e definir seus próximos passos.
- Claro, null. Andrew pode nos levar, certo? – e agora null se dirigia ao empresário e amigo – Inclusive, Andrew, me parece que null precisa de um empresário. O que você acha de pegar o cartão de acesso dela ao Baglioni e buscar o restante dos pertences que ainda estão no hotel e levar lá pra casa? Como um empresário interino... – null sugeriu e Andrew prontamente aceitou, pegando o cartão com null. A menina por sua vez, apesar de ainda muito preocupada, estava extremamente grata a null pela ajuda.
Mais tarde no Dia 2: Sábado à noite, Londres, Inglaterra. Residência null.
Eram dez e meia da noite quando null e os três null que a faziam companhia, null, Maureen e Claire, estavam sentados no sofá da confortável sala da casa, onde os anfitriões tentavam amenizar o clima pesado que cercava a jovem cantora. Para quebrar o silêncio e tranquilizar null sobre o itinerário, Maureen perguntou ao filho:
- Querido, tudo certo com as passagens? Como as coisas vão correr? – e indicou a cabisbaixa null com as sobrancelhas, indicando ao filho que perguntava com a finalidade de entreter e acalmar a menina. null prontamente respondeu:
- Sim, mãe, tudo certo. Pegamos o avião em Gatwick às 23h45, o voo deve durar em média duas horas e quarenta até Veneza. Caso tudo corra bem, o que acontecerá, devemos chegar ao aeroporto de Veneza por volta das duas horas da manhã, onde devemos esperar até às seis pelo primeiro metrô Venezia Mestre, que nos levará até Bassano, onde vamos chegar perto das 8 da manhã. – concluiu null, vendo os olhos de null atentos sobre cada palavra que proferia, certificando-se que nada mais a atrapalharia no seu caminho até Bassano, até seu nonno.
null e null despediram-se de Maureen e Claire null e seguiram com Andrew para o aeroporto. null percebera que a tensão de null era crescente, a amiga esfregava as mãos com frequência, olhava para os lados, respirava fundo. O canadense não sabia como ajudá-la, apenas passou o braço por cima de seus ombros e fez carinho, como um gesto de conforto, no intuito de protegê-la e a encorajar por qualquer que fosse a situação que os esperava na Itália. Assim que terminaram de organizar o itinerário, null avisou Nina onde e que horas chegariam, a prima estaria os esperando para levá-los ao vinhedo Monte null, onde ficava a casa dos avós.
Após fazer o check in, já na sala de embarque, null e null esperavam a hora do voo. null pensava sobre as temporadas que passara na Itália quando criança, os passeios guiados pelo avô em meio as parreiras de vinho, o cheirinho de uva que tomava conta do local durante as épocas de colheita. Queria poder voltar no tempo, ser aquela menina leve e de sorrisos fáceis novamente, em uma época em que ela podia tranquilamente falar sobre nada com alguém que significasse algo.
Quando o embarque iniciou, null chamou null e percebeu que o amigo havia cochilado, quando o mesmo levou um susto ao ser acordado, sustentava um semblante cansado e um tanto quanto adorável, e ao observá-lo no caminho para o avião, null percebeu o quão grata era por tê-lo ao seu lado de novo, por mostrá-la que as coisas poderiam ser melhores enquanto ela tivesse pessoas verdadeiras com ela. Ele com certeza era uma delas, ela sabia.
Uma vez devidamente instalados no avião, null percebeu que null lutava contra as pálpebras pesadas e sono pálpevel a cada bocejo dado, e decidiu liberá-lo do martírio, pois o conhecia, e sabia que o mesmo tentava manter-se acordado caso ela precisasse dele.
- null... – null disse, buscando atrair sua atenção – você está com sono, quem sabe não dorme um pouco?
- Não sei – questionou o músico – você pode precisar de mim...
- Caso aconteça, eu te acordo, mas agora descanse, ok? – bastou null concluir, para que null concordasse com um aceno de cabeça, aos poucos relaxando na poltrona e deixando os olhos fecharem-se novamente.
Ali, assistindo-o novamente naquele dia, null dessa vez recordou-se do ensino médio dos dois. Eram grandes amigos do departamento de música, mas quando a carreira de null deslanchou, ela ficou seu tempo para dar atenção ao projeto da escola e acabou pedindo desligamento do clube, o que não foi suficiente para colocar um ponto final na amizade. null e null eram uma boa dupla nas matérias que faziam juntos, e musicalmente falando. Quando null estava gravado seu primeiro EP, null foi aceito na London Royal Academy of Arts* e decidiu mudar-se para Londres, onde viveria coma a sua avó. Com a agenda corrida de null e a mudança de null, os dois acabaram se afastando aos poucos, sem nem mesmo perceber.
Esporadicamente comentavam os stories um do outro e conversavam por poucos minutos, e apesar de o carinho que sentiam ser mútuo e intenso, null e null haviam se afastado, até aquele final de semana.
null, (como era chamada pela maioria das pessoas com quem convivia), ou null, (como null a chamava), desejara que jamais tivesse deixado a amizade dos dois enfraquecer, talvez com null ao seu lado ela não teria se afastado tanto de quem realmente era, e hoje não estivesse vivendo tamanho drama. Sabia que independe do que estivesse a esperando na Itália, após a hora de voo que ainda os restavam e o metrô que deveriam pegar até o ponto marcado com Nina para o vinhedo, as coisas se encaminhariam de volta para o lugar.
null null iria mostrar ao mundo quem realmente era através de sua música, e finalmente se permitiria evitar as conversas falsas e os sorrisos dissimulados que vinham a cercando. A nova null renasceria na Itália, onde aquela que ali pensava havia feito seu primeiro show, em cima de um barril de vinho cantando para os avós.
A nova null falaria com a lua até altas horas, a nova null se permitiria ir a lugares onde ninguém de fato soubesse seu nome, pois ela havia descoberto onde estava se escondendo a pessoa fundamental para apoiá-la durante toda essa mudança, a pessoa que a guiou de volta para o coração, o amigo verdadeiro que ela já possuía, mas estava de fato escondido entre tantas coisas que null havia involuntariamente deixado para trás, entre elas, sua própria identidade.
Certa vez null lera que o amigo verdadeiro é aquele de quem você pode se distanciar, mas uma vez reunidos, nada haverá mudado... null olhou para o lado e viu null null, que dormia tranquilamente na poltrona, enquanto que sua null se reencontrava dentro de si mesma, buscava forças para encarar o possível adeus ao avô, e o olá para a nova fase de sua vida.
Os últimos dias mostraram a null onde ela pretendia ficar e sempre estar, talvez não geográfica, mas emocionalmente: ao lado de null, seu verdadeiro amigo. Mas sempre e em primeiro lugar, do lado do coração, onde ela deixava o melhor de si aflorar, e era a melhor null que o mundo, os avós e todos aqueles que a amavam, mereciam: a null null de verdade.
Fim.
Nota da autora: Olá, leitores! 7. Real Friends é minha primeira história, espero que tenha feito jus a essa música incrível da Camila. Caso não tenham percebido, usei algumas características de Shawn e Camila para criar os pps, mas me dei liberdade para alterar algumas coisas como a nacionalidade da pp. Fazê-la italiana foi minha maneira de me aproximar dela, deixando-a mais parecida comigo. Caso vocês tenham curiosidade sobre como imagino cada um dos meus personagens, abaixo a lista com os “faceclaims” que eu usei pra cada um:
1. null null: Camila Cabello
2. null null: Shawn Mendes
3. Laurel Leminski: Katie Cassidy
4. Sara null: Demi Moore
5. Marina/Nina null: Madelaine Petsch
6. Maureen null: Mädchen Ammick
7. Claire null: Judi Dench
Enfim, espero mesmo que tenham gostado, e por favor, sintam-se à vontade para comentarem críticas construtivas, estou ansiosa para ver o que acharam!
Ass: Aurora Bianchi.
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
1. null null: Camila Cabello
2. null null: Shawn Mendes
3. Laurel Leminski: Katie Cassidy
4. Sara null: Demi Moore
5. Marina/Nina null: Madelaine Petsch
6. Maureen null: Mädchen Ammick
7. Claire null: Judi Dench
Enfim, espero mesmo que tenham gostado, e por favor, sintam-se à vontade para comentarem críticas construtivas, estou ansiosa para ver o que acharam!
Ass: Aurora Bianchi.