Finalizada em : 14/07/2024

[Capítulo Único]

Eu não queria ir, mas precisei. E, acredite, foi uma das decisões mais difíceis que já tomei na minha vida. Meu amor por sempre foi maior do que eu podia expressar e eu jamais imaginei que acabaria assim… se é que realmente acabou… mal consigo pensar bem, ando tão confusa e sensível. É um misto de sentimentos e, embora tenha se passado quase 1 ano desde a nossa - ou apenas minha -, decisão, ainda não tenho muitas certezas. Não agora. E apesar da falta que sinto dele, foi melhor assim.

Abro os meus olhos lentamente, sentindo a claridade que transpassa a janela e cortina castigar minha sensibilidade ocular, devagar vou me espreguiçando e me sento na cama. Poderia passar mais algumas horas tranquilamente ali, se não tivesse a obrigação de alimentar e cuidar do serzinho que há 3 anos eu trouxe ao mundo e que estranhamente permanece em silêncio.
— Amo quando posso passar um tempo acompanhada do silêncio, mas quando está tudo silencioso demais, me preocupo… - disse a mim mesma, enquanto me levantava da cama e mirava o relógio ao meu lado.
6h45 e eu já tentando não pensar o pior. Uma mãe não pode simplesmente descansar sem se preocupar se o filho parou de respirar no meio da noite? Ou será que é mal apenas de mãe ansiosa?
Saio do quarto a passos largos e encontro meu menino em seu quartinho, dormindo como um anjo. O observo da porta e meu coração se acalma ao ver o movimento de sobe e desce de sua barriga. Atire a primeira pedra a mãe que nunca fez isso!
Depois de tomar um banho relaxante, me arrumo para mais um dia de trabalho e terminado o meu café, já corro para acordar o meu bebezão.
- o chamei, acariciando seu cabelo e dando-lhe um beijo na bochecha, o fazendo despertar lentamente. — Bom dia, filho! Dormiu bem?
— Sim, mamãe - ele sorriu — Tô com fome.
— Ah! Como é guloso esse meu neném! - fiz cócegas em sua barriga e ele se contorceu, gargalhando.
— Mamãe, eu não sou neném - disse em meio às gargalhadas.
— Você não é mais o neném da mamãe, ? - cruzei os braços, boquiaberta e ele negou com a cabeça. — Você é o que, então?
— Sou um menino grande e forte. - ele ficou de pé na cama e me mostrou seus "grandes" bíceps.
— Nossa! Como ele é forte! - o imitei, fazendo a mesma pose — Mas, pra ficar ainda mais forte precisa comer tudo o que a mamãe colocar no prato, tá bom? - ele assentiu — Agora, vamos até a cozinha pra tomar um café da manhã bem gostoso?
— Mamãe, o papai vem me buscar?
Por mais que falar sobre me cause um certo desconforto, ele é o pai do meu filho. E por ser ainda bem pequeno e eu precisar que ele fique com o pai, pelo menos, durante o dia para que eu trabalhe, estamos sempre nos encontrando quando levo até ele ou quando o próprio vem buscá-lo. Não tenho muito o que fazer quanto a isso, além de aceitar a situação.
— Sim, filho. - respondi tentando ser o mais neutra possível e vendo a animação do garoto aumentar — Mas antes vamos comer algo e tomar um banho pra ficar bem bonito e cheiroso.
— Igual ao papai? - eu o olhei, engolindo a seco aquela pergunta e pensando mil vezes antes de dar a resposta.
— Sim - forcei um sorriso, mesmo que trincando os dentes — Igual ao papai...
Respirei fundo e agradeci aos céus por não estar por perto para ouvir isso. Já sorria largamente. É incrível como a euforia dele está sempre presente quando se trata do pai. E apesar das nossas diferenças, ele sendo o melhor pai do mundo para o nosso filho é o que realmente me importa.

16h32 e eu quase terminando mais um turno no trabalho depois de um dia cansativo ao extremo. Anotando pedidos e os atendendo desde às 8h, não é fácil. Mas, graças a Deus pelo trabalho que sustenta a mim e ao meu filho.
O SnowKind Coffee, umas das cafeterias mais movimentadas da região e uma das mais belas também, com tons pasteis de verde e rosa, o lugar recebe elogios de todos os cantos.

Estava preparando mais um dos cafés, na cozinha, quando meu chefe apareceu, de repente, me assustando, o que me fez derrubar o copo, o fazendo quebrar e sujando o chão que eu mesma limpo todos os dias.
— Por que está tão assustada? - ele perguntou, confuso.
— Não sei… eu apenas me assustei. - respondi já me abaixando para pegar alguns cacos de vidro com a mão mesmo — Me desculpe por isso, . Prometo limpar essa bagunça bem rápido e…
, assim você vai se machucar.
Sem ouvir bem o que ele havia dito, continuei reunindo os cacos de vidro e pensando que seria descontado do meu salário e que isso, no fim do mês, me prejudicaria. Tantas coisas para resolver e pagar, qualquer centavo a menos já faz falta.
Fui tirada dos meus pensamentos preocupados, sem perceber a velocidade na qual ele se abaixou para que eu soltasse os cacos.
?! - ele me olhou, ainda mais confuso e segurou minha mão — Você perdeu o juízo? Quer se machucar?
Eu até pensei em respondê-lo, mas seu olhar profundo penetrando os meus olhos me fizeram perder completamente o raciocínio. Nunca havíamos ficado tão próximos, o que me fez perceber sua beleza incomum e seu toque macio.
Por um breve momento, perdi o fôlego e tive a impressão de que o mundo havia parado. De repente, tudo ficou tão lento e eu só conseguia olhar para ele. E se não fosse loucura minha, diria que ele estava correspondendo a esse olhar.
Com o toque do meu celular, fui despertada da hipnose e ele, consequentemente, também. Mas, esquecendo que ainda havia um caco de vidro em minha mão, acabei por cortá-la e quando me dei conta, o sangue jorrava como água na fonte.
Soltei um gritinho histérico e ele se levantou, meio assustado e tentando pensar no que fazer. E eu, que ainda estava no chão, só conseguia sentir tonteira pelo tanto de sangue que eu estava vendo, até que tudo começou a girar e eu já não enxergava nada.

Abri os olhos lentamente e percebi que estava deitada em uma cama nada comum. Passei as mãos pelos olhos, tentando entender o que havia acontecido. Foi quando senti uma leve dor e olhei para o local; a mão completamente enfaixada me fez lembrar exatamente o que havia ocorrido.
— Como vim parar aqui sozinha? - perguntei a mim mesma e olhei ao meu redor, vendo que meu chefe estava conversando com o médico. — O quê?
— Olha quem acordou! - disse o médico, se aproximando da cama — Você está bem e já pode ir para casa. Apenas permaneceu aqui por observação.
— Eu ainda prefiro que você continue em observação… - se aproximou da cama — Apenas por segurança. - o médico lhe encarou — Mas se o médico disse que está tudo bem, então, está tudo bem.
— Exatamente. - o médico olhou em seu relógio e fez sinal para se retirar. — Sua namorada está bem, fique tranquilo.
— Nós não somos namo…
Antes que pudéssemos concluir a frase, o médico se retirou, nos deixando em um clima super estranho. Sem conseguir encarar , o agradeci pelo o que ele fez. Não é sempre que temos uma crise nervosa e desmaiamos perto de alguém que nos leve ao hospital, ainda mais com um corte não tão profundo na mão.
— É sério, - finalmente o olhei — Pode ficar por mais tempo. Não ligo se for necessário pagar a mais por isso.
— Imagina, ! Eu ainda preciso buscar o meu filho na casa do pai dele. - ele assentiu com a cabeça — Mas quero que saiba que sou grata por ter me trazido até aqui, não deve ter sido fácil.
— Ah! Que isso?! Foi tranquilo. - ele abriu os braços, cerrando os olhos e eu já pude imaginar o que viria a ser dito.
, não começa… - eu disse, já rindo.
— Apenas pedi para Kierra te segurar, enquanto eu tentava achar um pano limpo para enrolar na sua mão, falei para os meninos ajudarem ela a limpar todo aquele sangue na cozinha e terminar o café que você estava prestes a entregar. Além de ter que pedir a compreensão dos clientes para um problema atípico como esse, enquanto os meninos tentavam abrir a porta dos fundos para que eu pudesse te colocar no carro sem que te enxergassem lá e ninguém achasse que eu havia tentado te matar.
— Olha, eu realmente lamento pelo grande transtorno que te causei - disse em meio às gargalhadas — E te agradeço mais uma vez por ter feito isso.
Eu levantei da cama, procurando pela minha bolsa, mas não a encontrei. Provavelmente ficou no armário do trabalho e com toda a correria, jamais pensariam nisso como prioridade. De fato, não era.
— Minha bolsa ficou na cafeteria e já deve estar na hora de buscar .
— Você quer ligar para o seu filho? - ele tirou seu celular da calça e me ofereceu.
— Só preciso avisar ao pai dele que estou indo buscá-lo e solicitar o carro de aplicativo para mim. - revirei os olhos e bufei — Só agora me dei conta de além de estar sem celular, também estou sem carteira e não sei o número dele de cabeça, não mais…
— Você quer uma carona? E já adianto que não será nenhum incômodo, caso pense nisso.
— Eu adoraria dizer que não será necessário, mas agora estou realmente precisando.

Em meio às conversas aleatórias, que eu jamais imaginei ter com meu chefe, percebi o carro ensanguentado e já estava pensando na forma de pagar por aquilo, afinal, a culpa disso foi minha. E, até agora, não acredito que isso aconteceu mesmo.
Em frente à casa de , parou com o carro e ficou me esperando ali mesmo. Atravessei a rua e caminhei, de forma receosa, até a porta da casa, batendo nela em seguida.
? - me olhou confuso, enquanto secava com sua própria camisa o suor de sua testa. — O que houve? Você sempre avisa antes de vir.
— Aconteceu um pequeno acidente no trabalho, mas nada demais. - mostrei minha mão enfaixada e ele arregalou os olhos, me convidando para entrar — Na verdade, eu só vim mesmo para buscar o . Meu chefe está nos esperando, ele me deu uma carona para vir e vai nos levar pra casa também.
olhou para o outro lado da rua e franziu a testa, como sempre faz quando desconfia de algo e voltou o seu olhar para mim. Eu poderia até pensar que dessa vez seria diferente, mas o conhecendo como a mim mesma, já sabia o que estava se passando por essa mente.
— Por que o seu chefe está aqui? - apenas respirei fundo, sem dizer uma palavra — , o que o seu chefe está fazendo aqui?
, por favor, não tire a minha paz hoje, não.
— Eu só quero saber o porquê de um homem estranho, seu chefe, está fazendo aqui e, pior, querendo levar o meu filho pra casa. - ele ajeitou sua camisa suja de graxa e eu o encarei.
, o filho também é meu e eu já te falei que ele está me oferecendo uma carona.
— Mas…
foi interrompido por , que gritou histericamente por mim e veio correndo para o meu colo. Meu mau humor por encontrar com foi substituído por um sorriso largo e o coração transbordando ao ver meu pequeno. Estava suado e sujo de graxa, como o pai. Claro que o banho da noite sobraria para mim, por que seria diferente, não é mesmo?
— Oi, meu amor! - dei alguns beijinhos em sua bochecha.
— Mamãe, eu fiquei com saudade de você.
Meu coração se apertou ao ouví-lo que eu mal conseguia respirar. É tão difícil ter que deixá-lo, mas realmente preciso do emprego. Embora pague pensão e sempre fique com para que eu vá ao trabalho, quando não está em estúdio gravando suas músicas, eu não poderia arcar com todas as necessidades de , não sozinha. Se com ajuda já é difícil, imagine como seria eu estando só.
Na verdade, sou só. Não tenho família. E nem quem possa me ajudar, senão o próprio pai, cumprindo sua função.
— Eu sei, amor - o abracei fortemente, tentando não deixá-lo perceber a lágrima que escorreu pelo meu rosto — Mas a mamãe precisa trabalhar. Lembra que conversamos? Só posso te dar um brinquedo bonito se eu trabalhar.
— Mas eu não quero um brinquedo, quero você.
Ele disse de forma tão genuína, que eu me senti péssima por isso e percebendo, o pegou no colo e pediu para que ele pegasse a mochila no quarto dele para ir comigo para casa.
Segurando as lágrimas com muita força, engoli o choro e me encolhi, pensativa. Não sei o que mais me dói… não saber o que fazer para mudar isso, apenas aceitar que a vida é assim e continuar no automático ou ouvir do meu filho essas palavras que, traduzindo, não passo tempo o suficiente com ele.
Não consegui conter as lágrimas, por mais força que eu estivesse fazendo para não deixar o meu filho me ver nesse estado. me vendo naquele estado, apenas me abraçou forte e, por mais que eu sinta falta disso, não posso me deixar levar por um momento.
— Você sabe que podemos mudar isso, não sabe? - ele disse baixinho, enquanto acariciava meu pescoço.
, agora não, por favor.
— Só quero que tudo volte a ser como era antes, . - eu o olhei e ele secou minhas lágrimas — E se houver essa possibilidade, por favor, me deixe saber.

— Por que você me deixou, ? - eu mordi meu lábio inferior e ele me olhou ainda mais profundo nos olhos — Você não me ama mais, é isso?
Respirei fundo e olhei para o outro lado da rua, ainda estava me esperando e eu não podia demorar mais. Ele já estava sendo gentil além da conta. E, pensando em conta, seu carro cheio de sangue eu teria que limpar o mais rápido possível e já sabia que tomaria desconto pelas horas não trabalhadas.
— É por causa dele? - me tirou dos meus pensamentos imediatamente.
— O que?
— É por causa dele, tenho certeza.
— Claro que não. Nós não temos nada e…
— Agora tudo faz sentido. Ele veio aqui pra levar o meu filho e você pra Deus sabe onde, mas claro que é para passarem mais tempo juntos. - eu saí do seu abraço e o encarei, enfurecida. — Ele te faz mais feliz que eu?
, eu bem que gostaria mesmo de encontrar um outro amor e te esquecer de uma vez por todas. Porque você realmente não tem salvação. - neguei com a cabeça e ele engoliu as minhas palavras a seco. — E caso tenha esquecido, deixe-me te lembrar: não te devo mais satisfações sobre a minha vida.
desceu as escadas no mesmo instante e se despediu do pai. Peguei sua mochila e saímos da casa. A raiva sempre me consumia quando se tratava de . Não sei se é apenas aversão a ele ou amor não curado, fato é que me sinto mal por sempre brigarmos pelo mesmo motivo.
Entrei no carro com e o fiz cumprimentar , que me olhava preocupado.
— Eu já sei o que vai perguntar, mas fique tranquilo, estou bem. - ele continuou me olhando e eu fiz o mesmo — É sério.
— Não acredito em você. - disse de forma bem sincera, me deixando boquiaberta — Mas como seu dia foi cheio, vou te levar pra casa sem tocar no assunto.
E assim ele fez, aliás, não falou mais comigo pois passou todo o percurso tagarelando com , que pareceu gostar muito dele.
Assim que parou o carro, me olhou de forma profunda, novamente e eu sem entender o que estava acontecendo ou fingindo que não sabia, apenas desviei o olhar para as manchas de sangue e me lembrei de falar sobre a sujeira que fiz em seu veículo.
— Sei o que vai dizer e não precisa se preocupar, limpo tudo depois. - boquiaberta novamente, comecei a achar que ele pudesse estar lendo a minha mente. — Não, eu não leio mentes.
— Como sabe que…
— Suas expressões faciais falam mais que a sua própria boca. - me interrompeu. — Mas eu gosto disso, acho fofo.
— Você me deixou meio sem graça, agora. - disse e logo soltei uma risadinha nervosa.
— Não precisa ficar. - ele pegou em minha mão não machucada — Embora por essas circunstâncias, gostei de ter passado mais tempo contigo. Fora da cafeteria.
— Não diria que passei tanto tempo contigo, já que a maior parte dele eu estava desmaiada. - ele gargalhou, me fazendo rir junto. — Mas, te agradeço demais por ter me socorrido e pela gentileza de me trazer até aqui com meu filho.
— Foi um prazer.
Tirei do banco traseiro e peguei sua mochila junto. Com ele em meu colo e me aproximando da entrada de casa, ouvi me chamar.
— Espero que possamos ter mais momentos juntos. - disse e sorriu para mim.
— Podemos combinar algo… se você qui…
— Eu quero! - me interrompeu eufórico e eu soltei uma risadinha baixa — Eu realmente quero.
— Tudo bem. - ele alargou o sorriso.
— Quero que tire o dia de folga amanhã. Faço questão. - assenti, respirando fundo. — Tchau, amiguinho. - acenou para .
— Como fala, filho?
— Tchau, boa noite. - sorri orgulhosa.
— Boa noite, . E obrigada mesmo, por tudo.
Ele sorriu largo e acenou com a cabeça.

Entrei e imediatamente dei um banho em . E, nossa! Como estava precisando!
Fiz o nosso jantar rapidamente, não queria atrasar demais o nosso cronograma. Tento seguir, ao máximo, todos os horários corretamente para ele se acostumar direitinho com a nossa rotina. Mas, em um dia atípico como esse, até eu fiquei perdida no tempo e nos meus pensamentos.
Depois de escovar os dentes de e o colocar para dormir, foi a minha hora de finalmente relaxar com um banho quentinho. E depois de colocar meu pijama do Stich, me joguei na cama. Que dia intenso! Que misto de sentimentos! Tudo tão confuso…
É inegável que ainda tenho sentimento pelo , não tem nem 1 ano que nos separamos e o motivo do término também é meio confuso para mim. Depois de 5 anos juntos e 4 deles casados, precisei me afastar. Não por egoísmo, pelo contrário, até para o bem dele. Muitas brigas, muito ciúme, tensão o tempo inteiro. Estava afetando o seu trabalho de cantor, compositor e produtor e, também afetava a mim como mulher, esposa e mãe.
Sempre tive o como o meu maior bem e depois que nasceu, a família se tornou o meu maior bem. Era o meu sonho se tornando real, mas a realidade estava acabando com o sonho, que se tornou pesadelo.
Ele é um ótimo pai, mas como marido estava me sufocando com esse ciúme incontrolável. Nunca foi violento, pelo contrário, sempre muito atencioso e carinhoso, e foi isso que mais me encantou nele. Mas, desde que sua mãe - que eu até então eu considerava como a minha também -, disse a ele que me viu com outro homem enquanto ele estava em estúdio e eu em casa, veio apresentando comportamentos estranhos e eu não sabia exatamente o porquê, até que ele confessou o que a mãe disse. Sei que me farão perguntas como: "você não a desmentiu?" ou "ele não acreditou?" Mas, sim, eu a desmenti e tentei fazer ele acreditar em mim por diversas vezes, mas é um homem adulto devoto a mãe desde sempre e preferiu acreditar nela. Agora chora, lamenta, esperneia, se arrepende, mas já é tarde.
Embora nossos sentimentos sejam realmente genuínos um para com o outro, foi ele quem escolheu assim.

No dia seguinte, levantei da cama às 9h30 e deixei meu bebê dormir mais um pouquinho, não iria para a casa do pai mesmo. Por isso, aproveitei para tomar o banho da manhã por mais tempo, tomar meu café matinal com mais calma e aproveitar meu momento de silêncio, antes que o pequeno acorde.
Terminei de aprontar o café da manhã de , terminei de lavar a loucinha da pia e prestes a ir acordá-lo, olho para o lado e o vejo com o cabelo bagunçado, olhando para a minha mão enfaixada.
— Oi, filho. Bom dia! - o peguei no colo — Dormiu bem?
— Tá com dodói, mamãe? - perguntou, apontando para a minha mão.
— Sim, amor. A mamãe estava no trabalho e fez um dodói sem querer, mas já está sarando, tá? - ele assentiu com a cabecinha tombada em meu ombro. — Está com fome?
— Sim, mamãe.
Coloquei no chão e puxei sua cadeirinha para perto da mesa, sentando-o nela. Ouvi uma batida na porta e estranhei, pelo horário, por não esperar visita, por não ter comprado nada por encomenda… mas, deixei se deliciando com seu pãozinho e fui atender a porta. Poderia esperar por qualquer coisa, menos pelo pai do meu filho a essa hora da manhã, parado na porta de entrada e sorrindo para mim como um anjinho de candura.
Respirei fundo por, pelo menos, 10 vezes, até que a minha voz realmente saísse para perguntar o motivo da aparição repentina.
— Você não me atendeu quando liguei, então resolvi vir até aqui para saber se está tudo bem. - disse, enquanto já adentrava a casa. — Oi, filhão!
— PAPAI! - largou seu pão, saltou da cadeira e correu para os braços de .
— Hey! - cruzei os braços — Termine o seu café, filho.
— Mas eu quero ficar com o papai. - resmungou, abraçado a .
— Filho, obedeça a mamãe. - disse , o colocando de volta na cadeirinha — Quando você terminar de comer tudo, a gente brinca o dia inteiro.
, que história é essa? Você vai levá-lo para sair?
— Não. - assenti — Pensei em ficar aqui e passarmos um tempo em família.
— NÓS NÃO SOMOS MAIS UMA FAM…
Percebi que estava nos olhando com muita atenção, por isso, saí de perto e fui para o quarto dele. me seguiu. E para aproveitar o momento, fechei a porta e o indaguei:
— O que você pensa que está fazendo?
— Tentando restaurar a nossa família. - falou da forma mais tranquila possível, o que me deixou mais irritada com ele.
— Não existe mais "nossa família". Não existe mais "nós". A única coisa que ainda nos une é o . - ele cruzou os braços e levantou as sobrancelhas. — E não me olhe assim porque você sabe que é verdade. - bufei, cabisbaixa — Poxa, , meu único dia para passar inteirinho com ele e você faz isso?
— Amor, eu não quero te estressar, acredite em mim. Só vim para ver como estavam e como te vi em casa, pensei que não seria uma má ideia passarmos o dia juntos. - ele se aproximou e segurou o meu rosto, delicadamente, como se fosse me beijar. — Se não por mim, pelo . Pode ser?
— Pelo . Somente pelo . - ele sorriu largo e se aproximou mais para me beijar, mas virei a face. — E é melhor você não tentar nada, hein! - ele assentiu com a cabeça e alargou mais o sorriso.

Depois de um dia inteiro de bagunça, nos sentamos no sofá para assistir a um filme infantil. estava em meu colo e foi o primeiro a pegar no sono, embora eu quisesse colocá-lo na cama, tive receio de o despertar de um cochilo, então o deixei onde estava mesmo. Só não me daria conta que seria a próxima a dormir ali mesmo.
Só despertei quando me colocou na cama e eu senti seu cheiro invadindo as minhas narinas. Ele continua usando o mesmo perfume que dei como presente de aniversário no ano anterior. Com sua aproximação inesperada, levei um susto e tentei o empurrar, mas sem sucesso. , que estava com metade do corpo em cima do meu, me olhou profundamente. E eu queria muito poder dizer que não senti nada com aquilo, mas seria mentira. Ele aproximou seu rosto do meu e, confesso que a respiração quente que saía de sua boca estava me deixando tentada. Uma de suas mãos acariciando o meu rosto e descendo até o meu braço me fazia arrepiar. Mesmo que eu não quisesse demonstrar nada, estava mesmo me sentindo cada vez mais atraída por ele.
aproximou ainda mais o seu rosto do meu e nossos olhos, que já estavam se encontrando, travaram uma batalha entre encarar o olhar e a boca um do outro. Ele inclinou sua boca próxima ao meu ouvido e disse:
— Se você quiser que eu pare, é só falar. - me deu um beijo no pescoço e tornou a me olhar.
Eu não tive reação e nem sabia o que dizer, mas sentia que não deveria estar cedendo a ele, ao mesmo tempo que sentia meu corpo incendiar e pedindo por mais.
se inclinou para me beijar e, nesse momento, senti meu coração como uma batedeira. Sim, eu cedi. Cedi ao beijo quente e apaixonado que há tempos não acontecia. E enquanto o beijo se intensificava, sua mão acariciava o meu corpo de forma arrepiante.
Quando caí em si, já estávamos prestes a consumar o ato. E depois de todas as carícias e da noite maravilhosa e impensada, porém apenas sentida - e muito bem sentida -, só nos restou o cansaço e o sono.

Depois de uma semana do que havia acontecido entre mim e , não sabia ao certo o que pensar, o que falar e nem mesmo o que sentir. Só sei que foi bom. E eu adoraria ter isso por mais vezes, mas não posso. Tudo precisa ficar às claras, para nem eu e nem ele confundir as coisas.
Terminando o meu expediente, tirei touca, avental, troquei a roupa e prestes a sair da cafeteria, me chamou, de dentro do carro.
— Quer ir a um lugar legal?
— E o SnowKind Coffee já não é legal? - ele revirou os olhos e eu ri. — Tudo bem, mas estou suja. Nem mesmo tomei banho.
— Fique tranquila, é um local aconchegante e você irá se sentir confortável. - fiquei meio pensativa — É sério, você vai gostar.
Me rendi a curiosidade e finalmente me permiti a algo além do "vamos marcar". Adoro surpresas! Espero que seja legal, principalmente por estar na companhia de . Apesar de ser meu chefe e se aproveitar disso para implicar comigo diariamente, ele tem sido um grande amigo e, sinto que temos uma certa conexão. Se é algo além da amizade eu não sei, mas sei que é bom estar perto dele.
Mandei uma mensagem para , avisando que eu chegaria mais tarde que o normal, por isso, precisaria que dormisse com ele. Não sei o que ele pensou, mas eu não estava mesmo me preocupando.
Assim que chegamos ao local, fiquei incrédula com o que vi. Um lindo museu histórico, com apresentações musicais, exposição de café, sua origem, moído, em grãos e toda a história por trás de como se deu início as suas vendas, importação e exportação, com visita guiada. Tudo o que eu amo!
— Você me trouxe ao lugar certo! - eu disse animada, enquanto focava em todos os detalhes do jardim.
— Eu sei disso. - o olhei, cerrando os olhos. — Pensa que não ouço as suas conversas com a Kierra?
— Na verdade, eu pensava, sim. - ele soltou uma risada gostosa — Mas, agora preciso ter mais cuidado com o que falo.
— Não seja boba, eu estou brincando contigo. - suspirei aliviada — Porém, perguntei a ela um local que você gostaria de ir e, com base no seu gosto, ela respondeu: museu, cafeteria e doceria.
— Sim, amo esses passeios! - disse, eufórica até demais, e tentando me conter. — Você acertou em cheio.
Ele sorriu para mim e nós adentramos, em uma fila, para fazer a visitação guiada. Fiquei tão focada, que mal nos comunicamos naquele momento, mas é algo que realmente gosto e não conseguia pensar em nada além de aproveitar o momento. E foi isso que fiz.

Ao término do passeio, já em seu carro, mais uma vez me surpreendeu.
— Como assim as surpresas não terminaram? - eu perguntei, sem acreditar.
— Como poderíamos terminar a noite sem um jantar caseiro feito por mim?
— O quê? Você sabe cozinhar? - indaguei boquiaberta e ele assentiu, sorrindo bobo. — Além de bonito, ainda cozinha…
Pensei alto demais e a vergonha logo se estampou em minha face, junto com uma queimação no rosto que nem eu mesma pude compreender. Ele apenas riu e, sem deixar passar batido, me provocou:
— Então você me acha bonito? - arqueou uma sobrancelha e eu virei o rosto para frente.
— Não é como se você não soubesse disso, já que se olha no espelho todos os dias. - falei como a coisa mais natural do mundo. — E pare de agir como se não soubesse disso ou como se nenhuma mulher já tivesse te elogiado.
— Já recebi elogios, sim, mas nenhum deles tinha vindo de você - o olhei novamente e ele sorria satisfeito — Até agora.
— Você realmente gosta de me deixar sem graça, não é mesmo?! - perguntei, tentando esconder o rosto com o meu próprio cabelo e ele suspirou.
— É que você fica tão fofa quando envergonhada e é tão raro te ver com a guarda baixa, que realmente me sinto tentado. - o encarei, sem acreditar no que acabara de ouvir. — Mas prometo me controlar.
— Obrigada?! - suspirei de alívio e ele riu baixo.
— Ainda quer provar o meu tempero?
O olhei tentando decifrar se era uma pergunta de duplo sentido ou se era só a minha mente pensando besteira em hora errada. De qualquer forma, assenti e ele rapidamente me levou para o seu apartamento.
Assim que chegamos, pude perceber a limpeza do ambiente, o cheiro agradável no cômodo e as cores neutras que usa para tudo, exceto nos quadros. Não acreditei que era realmente dele o apartamento mais organizado que a minha casa alugada.
Aconchegante, não tão grande, sem muitas cores e limpa como nunca vi um homem deixar.
— Gostou? - ele perguntou, tirando o seu casaco e indo direto para a cozinha, lavando as mãos.
— Sim. Jamais imaginaria que esse seria o seu apartamento.
— Era da minha avó. Apenas tento manter tudo como ela deixava. - assenti — Quer me ajudar a cozinhar ou prefere descansar enquanto preparo tudo?
— Te ajudo.

Depois de terminarmos de aprontar e comer o penne à bolonhesa, nos sentamos no sofá e eu já não aguentava comer mais nada, nem mesmo o sorvete de chocolate como sobremesa. Pedi mil perdões, mas não era por desfeita, conheço os meus limites e, com toda certeza, comendo mais eu passaria de um deles.
Passamos o restante da noite conversando sobre a vida e contei a ele que sou filha única de um casal que vivia no interior e que, quando vieram para a cidade, tentaram de todas as formas melhorar de vida, mas foi quando meu pai se viciou em jogos e, tudo o que havia conquistado, perdeu em apostas, incluindo casa, carro e todos os bens que ainda possuíam. E logo nessa pior fase da vida financeira, minha mãe engravidou e foi tudo bem difícil, pois precisou pedir roupinhas e todo o resto para a vizinhança, que os humilhava por isso. E assim que minha mãe me deu a luz, faleceu por complicações. Desde o que aconteceu com minha mãe, fui criada pelo meu pai e também desde o falecimento dela, meu pai se tornou alcoólatra. Vivíamos uma vida miserável até que, aos meus 18 anos, ele foi assassinado por dívida de bebidas e jogos.
— Sinto muito que tenha passado por isso. - disse, comovido.
— Não sinta. Meu pai chegou a me oferecer como pagamento de suas dívidas e só não aconteceu porque ele morreu antes. - respirei fundo. — E foi a partir daí que precisei trabalhar dobrado para conseguir pagar um aluguel e continuar estudando, para tentar uma bolsa na faculdade. A bolsa não consegui, mas terminei o 2° grau.
— Quando foi que você se casou?
— Aos meus 22 anos conheci depois de ele ter se apresentado em uma casa de show pequena, tínhamos amigos em comum, fomos apresentados e me apaixonei perdidamente por ele e ele por mim. Nos casamos bem rápido e não demorou tanto para vir ao mundo. Foi o momento mais feliz da minha vida!
— Me desculpe a intromissão, mas por que terminaram depois de tanto tempo e já com um filho?
— A história é longa, mas prometo um dia te contar. - ele assentiu — E quanto a você, o que me conta sobre a sua vida?
Ele me contou que a avó havia falecido há 10 anos e nenhum dos seus 3 irmãos, nem mesmo a sua mãe, quis ficar com o apartamento. Então ele, que estava casado há 8 anos, se mudou com sua esposa e viveram momentos bons e ruins juntos, naquele apartamento. Até que ela, que sempre perdia suas gestações no terceiro mês, novamente engravidou e chegou até o oitavo mês. Embora soubesse que era uma gestação de alto risco, seguiu todos os conselhos médicos e estava tudo correndo bem, até que um dia, quando estavam saindo do cinema, um carro desgovernado ultrapassou a calçada, atingindo sua esposa em cheio. Levada ao hospital, foram várias tentativas de salvar ela e o bebê, mas, sem sucesso, ele perdeu os dois.
— Sinto muito pela sua perda. De verdade. Não consigo imaginar o tamanho da sua dor. - eu disse e ele forçou um meio sorriso.
— Já fazem 5 anos, mas foi um episódio que marcou, de forma negativa, a minha vida e, acho que posso dizer que me traumatizou, de algum modo. Nunca mais consegui me envolver com outra pessoa e nem queria. - ele me olhou emocionado — Até te conhecer.
— Mas…
— Não sei se é coisa da minha cabeça, mas sinto uma conexão muito forte entre nós - concordei com a cabeça — E sinto isso desde quando nos encontramos pela primeira vez.
— É… acho que sim. - soltei uma leve risada.
foi se aproximando de mim e pegou em minha mão sem o corte, de forma delicada e a beijou. Olhando para mim de forma intensa, se aproximou ainda mais e focando os meus lábios, me beijou como se ansiasse por isso há tempos. E talvez realmente fosse.
O correspondi da forma mais pura possível. Finalmente estava me permitindo a amar novamente ou talvez estivesse apenas me enganando. Fato é que os beijos se intensificaram e, com eles, o calor que eu estava sentindo também. Quando nos demos conta, já estávamos seminus no sofá, com me puxando em direção ao seu corpo e suas mãos que antes acariciava o meu rosto, agora passeava por todo o meu corpo. E, embora eu quisesse isso tanto quanto ele, algo dentro de mim me incomodava e eu precisava ser honesta.
- ele beijava o meu pescoço delicadamente, enquanto suas mãos me apertava de forma totalmente contrária. — Por favor.
— Você quer parar? - me olhou rápido e eu assenti. Me olhou novamente, confuso e perguntou: — Quer mesmo parar?
— Sim. - ele continuou confuso. — Preciso ser sincera contigo.
Me soltei de seus braços e saí de seu colo, tornando a me sentar no sofá. Respirei fundo e me virei de frente para ele, que fez o mesmo. Suspirei mais uma vez e disse:
— Não faz nem 1 ano que me separei do e ainda tenho em resquício de sentimento por ele, sendo sincera. - ele assentiu. — Semana passada, nós tivemos uma noite muito envolvente, que não tínhamos há meses e, acho que isso me despertou algo novamente.
— Você quer dizer que ainda o ama?
— Não sei se é amor, estou confusa. - respirei fundo, frustrada. — Mas, não posso me envolver com você sabendo que ainda estou pensando e sentindo algo por outro.
— Confesso que estou surpreso… - ele passou a mão pelo rosto — Mas te agradeço pela sua sinceridade.
— Me desculpe por isso, mas se eu continuasse hoje, seria muito injusto da minha parte contigo e eu estaria sendo até egoísta em me deixar levar por um momento, sabendo que você nutre sentimentos por mim e que espera algo mais que apenas uma noite - ele mordeu o lábio inferior e continuou assentindo com a cabeça.
— Tudo bem, eu te entendo. E apesar de tudo, estarei esperando por você. - arregalei os olhos — Sim. Vamos dormir essa noite, amanhã você pensa melhor em tudo o que está passando e, quando se sentir confortável para isso, saiba que estarei te esperando.
Depois dessa conversa tão necessária para mim, fez questão que eu dormisse em sua cama e ele no sofá. E, bem, dormir não foi bem a palavra, mas tentei ao máximo esquecer todos os problemas e descansar um pouco; meu corpo e mente agradecem.

Passado 1 mês desde todos os acontecimentos, parecia estar tudo se encaixando. Meus sentimentos estavam mais fortes por , que todos os dias, depois do expediente, saía comigo e com para algum lugar diferente, mesmo que fosse na beira da praia. Seu jeito paciente e carinhoso me conquistava a cada dia e o seu cuidado e afeto com meu pequeno me trazia muita segurança em tê-lo na minha vida. Meu filho é tudo para mim e eu jamais deixaria qualquer um passar por nossa vida, pela dele, a gente nunca sabe qual é a real intenção do ser humano. Mas, se mostrava cada vez mais sincero em suas intenções e isso me alegrava.
pareceu aceitar a situação, já que não tem muito o que fazer mesmo. Se preocupa com e eu não tiro sua razão, mas até aqui, não teve motivo para fazer escândalos.

Estava no trabalho, servindo a um cliente, quando o cheiro de seu perfume penetrou em minhas narinas e eu só tive tempo de correr para o banheiro e despejar no vaso todo aquele enjoo.
Kierra correu atrás de mim e me perguntou o que havia acontecido. Contei a ela, que me olhou desconfiada. Aquele olhar me fez arrepiar até a espinha, mas não de um jeito bom.
— Você precisa fazer um teste, ainda hoje. - ela disse, firme. — Tenho quase certeza que você está grávida.
— Kierra, foi só um enjoo, não estou grávida.
— Seus peitos estão enormes - os toquei e senti uma sensibilidade forte, fiz careta. — Viu só? Já estão até doloridos, você está grávida!
— Não estou, não. - disse lavando a minha boca e passando uma água no rosto. — E já até melhorei.
Kierra balançou a cabeça em negação e voltou ao trabalho. E eu me olhei no espelho, sabendo que esse foi um dos meus primeiros sintomas de gravidez antes de descobrir que esperava .
Balancei a cabeça em total negação e voltei ao trabalho.

No fim do expediente, fui direto para casa e pedi que levasse para mim, pois estava me sentindo mal novamente.
— Tem certeza que não quer ir ao médico, ? - perguntou , preocupado.
— Não, eu já estou melhorando e… - o cheiro forte de seu perfume penetrou em minhas narinas e eu corri para o banheiro, novamente despejando o meu enjoo ali. — É só o meu refluxo atacando novamente.
— Esses enjoos repentinos estão sendo repentinos?
— Sim, sempre que eu sinto um cheiro mais forte - respondi, lavando a minha boca — Principalmente quando é perfume.
— Há quanto tempo você está assim? - ele cruzou seus braços, me olhando como se estivesse desvendando algo.
— Acho que fazem duas semanas. - disse, saindo do banheiro e prendendo a respiração para passar por ele sem enjoar novamente.
— Seu ciclo menstrual está normal?
— Nunca está normal, você sabe disso. - me deitei na cama. — Mas, por que essas perguntas, ? Eu não estou grávida.
— Só me responde, seu ciclo atrasou?
— Sim. Mas você sabe que tem mês que vem e mês que não vem. Tem mês que atrasa. Sempre foi assim e não mudaria agora. - fiquei deitada de lado e torcendo para o enjoo passar. — Seu perfume está muito forte, . Se afaste um pouquinho, por favor. Aproveite e dê a janta para o , por gentileza.
Ele saiu do quarto e eu acabei cochilando por algum tempo. Tempo suficiente para comprar um teste de gravidez e me obrigar a fazer. Eu já estava ficando desesperada com a possibilidade de uma nova gravidez e acho que isso me fez entrar em negação, porque eu tinha certeza que faria o teste e daria negativo. Mas quando vi os dois tracinhos vermelhos aparecerem no teste, vi tudo ao meu redor girar e não enxerguei mais nada.
Quando acordei, estava na cama, sendo abanada por e o que achei que era somente um pesadelo, estava se tornando real. Olhei ao meu redor, e logo na mesinha ao lado da cama, estava o teste com os dois tracinhos bem avermelhados, comecei a chorar descontroladamente.
, se acalma, por favor. - pedia, me segurando.
— Não, eu não posso estar grávida. Deve ser algum erro. - eu dizia em meio ao choro e tentava me acalmar. — Eu não posso estar grávida.
— Por que não?
— Eu e nunca tivemos contato sexual. - disse, sem olhá-lo nos olhos.
— Como assim? - perguntou, incrédulo. — Isso não faz sentido, como você estaria grávida então?
— Você não se lembra do dia em que veio ficar aqui, ? - eu ainda não o encarava. — Naquela noite, depois de tanto tempo, não nos protegemos.
— Isso não faz sentido. - ele finalmente parou de me abanar e eu o encarei. — Me desculpa, mas como posso acreditar que vocês nunca tiveram nada e que esse filho que você está esperando é meu?
, quando foi que eu menti pra você? - ele olhou no fundo dos meus olhos e eu já sabia o que aquilo significava. — Se você disser…
— Minha mãe jura que te viu com outra pessoa, . - me interrompeu para dizer besteiras.
, saia daqui!
Me levantei rápido e por isso fiquei tonta, mas me mantive de pé e o empurrando para fora. Não ouvir mais nada que saísse da boca desse idiota e o empurrei porta afora, enquanto chorava descontroladamente. Fechei a porta com chave, verifiquei se estava dormindo na cama dele e fui para o meu quarto. Chorando copiosamente, senti algumas cólicas, mas como considero isso algo normal da gravidez, não dei a devida importância. Só conseguia pensar em como estava sendo injustiçada e a ansiedade me causou crise. Independente disso, não poderia tomar nenhum remédio, nem mesmo para a dor de cabeça que eu estava sentindo.
Não há nada pior do que ser acusada de algo que você não fez. Ainda mais sem provas. É sempre a sua palavra contra a do acusador.

Passei quase uma semana sem ir ao trabalho, sem atender a ligações, sem responder mensagens, sem atender a porta e somente reagindo para alimentar e cuidar de . E foi em um desses momentos que coloquei a sua janta e ouvi falando do outro lado da porta que se eu não abrisse, arrombaria. Eu senti tanta firmeza em sua fala, que tive medo de o pior acontecer e eu ter que arcar com o custo de uma porta nova, ainda mais nesse momento.
Simplesmente deixei em sua cadeirinha, ajeitei o meu cabelo, passei as mãos pelo rosto e respirei fundo, abrindo a porta. me olhou assustado e entrou como um foguete, dizendo que não sairia dali enquanto eu não falasse o que estava acontecendo.
Pedi apenas que me deixasse terminar de dar a janta ao , escovasse os seus dentes e o colocasse para dormir e ele concordou, esperando pacientemente.
— Tudo bem, agora me fale - me sentei no sofá, junto a ele — O que está acontecendo, ?
— É grave, . E eu não sei se você vai entender ou se vai acreditar em mim. - eu comecei a chorar e ele me abraçou. — Não sei nem se você ainda vai querer ficar comigo.
— Por que eu não acreditaria em você, querida?
O olhei puxando todo o ar que me restava nos pulmões e, com olhos marejados, precisei ser forte e falar o que ele, de uma forma ou de outra, saberia mais cedo ou mais tarde. Então, melhor que fosse por mim.
— Eu estou grávida.
— O quê? - ele se levantou, incrédulo, me olhando confuso. — Como isso é possível? Não tivemos nenhum contato do tipo.
— Há um mês, antes de começarmos a sair juntos. Um dia depois que me cortei na cafeteria…
— Sim, te dei folga. - me interrompeu, em meio às lembranças e olhando para a cicatriz na minha mão esquerda.
— Naquele dia de folga, veio aqui e pediu para ficar com . Como eu queria ficar com meu filho, mas ele queria a presença do pai, deixei que ele passasse o dia aqui. - respirou fundo. — Mas, foi apenas pelo .
— Você realmente vai dizer o que estou imaginando?
— Depois de pegarmos no sono na sala, assistindo a um filme, colocou em sua cama e, por eu ter cochilado, ele também me pegou no colo para colocar na minha cama. - molhei meus lábios e continuei: — Eu acabei despertando e, com nossa aproximação depois de quase 1 ano separados, a chama acendeu e foi mais forte que nós dois.
— E foi tão forte que nem pensaram em se proteger… - eu não conseguia encarar , só conseguia chorar — Vocês agiram como dois adolescentes apaixonados e inconsequentes.
— Eu sei. – respondi, cabisbaixa.
— Mas não adianta fugir agora, . Você precisa encarar as consequências do que aconteceu. - minhas lágrimas apenas escorriam e se sentou ao meu lado, levantando delicadamente o meu rosto. — Olha, não sei exatamente como você está se sentindo, mas eu vou ficar ao seu lado, tudo bem? Você não está sozinha.
— Obrigada! - o abracei fortemente — Obrigada! Obrigada! Obrigada!
— Hey! - eu o olhei e ele acariciou o meu rosto — Fique calma. Tente respirar fundo. Tudo vai se resolver. - eu assenti com a cabeça e ele secou as minhas lágrimas. — Eu estou contigo.
Ele me deu um beijo e no mesmo momento, adentrou a casa sem pedir licença. E só a presença dele ali já me deixou nervosa.
— Está fazendo o que aqui? - perguntei nervosa, me levantando do sofá.
— Vindo ver o meu filho, que você afastou de mim por quase uma semana.
— Ele está dormindo.
— Cara, quando eu fui lá na cafeteria não foi pra você vir aqui ficar se esfregando com ela, não. - ele olhou para Josua — Eu realmente estava preocupado com ela e com .
— Mas e quanto ao seu filho, que está sendo gerado por ela? - se levantou, nervoso — Não se preocupa com ele também?
— Nada me garante que esse filho é meu. - senti uma pontada forte na barriga.
— O quê? - me aproximei dele — Eu já te expliquei o que aconteceu e você é o pai.
— Eu disse e repito: nada me garante que esse filho é meu.
me afastou de e o prensou contra a parede, dando-lhe um soco no rosto.
— Não adianta apelar para a covardia, cara, esse filho não é meu. - deu outro soco nele. — E te aconselho a ficar esperto também porque se fez uma vez, fará de novo.
o socou cada vez mais, arrancando sangue dele e eu sentindo pontadas fortes na barriga, não sabia o que fazer. ficou gritando como um louco, dizendo que o filho não é dele, o que fez acordar. E ao ver o pai sangrando, começou a chorar.
Peguei no colo, mas a última pontada que senti foi tão forte que o derrubei no sofá e gritei de dor, vendo o sangue escorrer pelas minhas pernas. Já sabia o que estava acontecendo e comecei a gritar por ajuda. me viu sangrar e começou a chorar mais forte, chamando por mim. Eu queria dar a ele o meu colo, mas não podia, não aguentava ficar em pé de tanta dor.
imediatamente me pegou no colo e me levou até o carro, totalmente transtornado em me ver naquele estado. Dirigiu como um louco para que eu chegasse mais rápido e recebesse socorro.
Assim que chegamos ao hospital, me colocou em seus braços e gritou por ajuda. Eu mal conseguia falar, de tanta dor que estava sentindo. Fui colocada em uma cadeira de rodas e pelo caminho que eu fazia pelo corredor, o rastro de sangue ficava. Essa foi a cena que me lembro, antes de apagar completamente.

Acordei com o barulho dos aparelhos do quarto e procurando por alguém, já que estava sozinha ali naquela sala gelada. Quando chamei por alguém, veio acompanhado de um médico.
— Doutor, como está o bebê? - ele olhou para , que abaixou a cabeça para não me encarar e negou com a cabeça. — Não me diga que…
— Eu sinto muito pela sua perda, . - disse o médico. — Fizemos de tudo para salvar o bebê, mas quando você chegou já foi tarde demais.
Eu não lembro exatamente quais foram as próximas palavras do médico, só fiquei em modo automático, meio paralisada, sem esboçar reação. Entrei em choque pela perda. Por mais que fosse recente a descoberta, eu já amava o meu neném com todas as minhas forças e ele nada tinha a ver com as burradas que fiz. O sentimento de culpa começava a me consumir e eu pensei em , presenciando tudo aquilo, chorando querendo o meu colo e eu não podia fazer absolutamente nada.
— Eu quero sair daqui. - apenas disse.
— Não é prudente. - o médico respondeu. — Você perdeu uma boa quantidade de sangue e precisa ficar em observação, pelo menos, por essa noite.
Não respondi mais nada. Apenas esperei que o médico se retirasse do quarto para que eu pudesse chorar a minha perda. E assim que ele deu as costas, chorei profundamente. O choro mais amargo da minha vida. Eu jamais queria que esse serzinho sofresse as consequências da loucura do pai ou da inconsequência da mãe.
E , o que eu diria ao meu bebê? Como será que está? Como será que sua cabecinha vai ficar com tudo o que presenciou? Por que essa culpa está me consumindo, meu Deus? Preciso de ajuda, não sei o que fazer.
, eu perdi o meu bebê. - ele que já estava próximo a mim, me acalentando, me olhou sem saber o que dizer. — Perdi o meu bebê.
— Eu estou contigo, querida. - ele disse, secando as minhas lágrimas. — Você não está sozinha.

No dia seguinte, senti como se um caminhão tivesse passado por cima de mim. Agora uma médica adentrou o quarto e falou comigo.
— Olá, mãezinha - ela colocou a mão em meu ombro e o acariciou, dizendo: — Sinto muito por sua perda!
— Obrigada.
— Sei que nós, mulheres, nos sentimos culpadas por tudo, principalmente quando a situação é relacionada à maternidade. - eu assenti com a cabeça. — Mas, quero que saiba que nada do que aconteceu foi culpa sua. Fique com o seu coração em paz quanto a isso. - mordi meu lábio inferior, para tentar segurar o choro. — Sei que nenhum filho é substituível, mas você é jovem, tem uma boa saúde e assim que se recuperar, poderá gestar novamente, se assim desejar.
— Tenho até medo de pensar nisso. - as minhas lágrimas contidas finalmente caíram e ela segurou minha mão com a cicatriz dos pontos de quando me corte.
— Não sinta esse medo. Você não é a única. Infelizmente acontece mais do que imaginamos, mas você não foi a culpada. Tire isso da sua mente, ok? - assenti novamente. — Às vezes, só não é para ser, no momento. Não quer dizer que não vá acontecer.
— Obrigada por suas palavras, doutora. - ele deu um meio sorriso.
— Já fizemos todos os procedimentos em você, só vim te ver e autorizar a sua alta, tudo bem? - ela sorriu. — Pense no que te falei e descanse o seu coração. Você não é culpada e nem o seu companheiro que, aliás, foi um dos pais mais presentes e preocupados com a mãe, que já tivemos por aqui.
Olhei para o lado e estava na poltrona de acompanhante, todo encolhido e dormindo torto. Mal a médica sabe que o pai realmente nem quis saber do bebê, mas tenho certeza que seria um pai maravilhoso para esse neném e para o dele que também se foi. Me sinto abençoada por ter um homem como ele ao meu lado, muitos já teriam desistido, outros nem mesmo teriam se envolvido, mas ele permanece aqui.
- o mesmo abriu os olhos lentamente — Vamos para casa?
— Você quer ir para a minha ou quer ficar na sua? - pensei em meu filho. — Sei que está pensando em , mas ele está na casa do .
— Eu não sei bem…
— Independente de onde você decidir ficar, estarei contigo. - se levantou e beijou minha testa.

Passados alguns dias, trouxe de volta para casa. Quando o vi sorrindo para mim e correndo em minha direção, meu coração transbordou.
— Mamãe! - peguei ele no colo.
— Oi, meu amor - o abracei forte. — Que saudade!
me olhava, com cara de sem graça e mal conseguia me encarar. Coloquei no chão e ele correu para o seu quarto, acabando por nos deixar a sós.
— Você está de mudança? - perguntou, ainda desviando o olhar.
— Sim, me chamou para morar com ele.
— Ele é um cara legal. - concordei. — Mais do que já fui para você em 5 anos.
, você foi bom pra mim, só deixou de ser quando colocou sua mãe à frente do nosso relacionamento, foi quando tudo desandou. - ele me olhou, com os olhos marejados. — Mas não quer falar mais sobre isso, você já sabe de tudo.
— Me perdoa - se ajoelhou em minha frente — Por favor, . Me perdoa!

— Por favor, ! Eu sei que tive responsabilidade no que aconteceu e não consigo deixar de me culpar por isso. - respirei fundo, enquanto o via chorar copiosamente. — Sei que o seu amor eu não posso ter de volta mas, pelo menos, o seu perdão eu preciso ter.
Me sentei no sofá e o olhei profundamente. Um misto de sentimentos me envolveu naquele momento. Eu poderia dizer tantas coisas que escondi no coração durante todo esse tempo…nem sei se valeria a pena. O que eu tinha para perder, perdi e nada faria voltar.
— Olha pra mim, . - assim ele o fez. — O pior já aconteceu e nada vai mudar isso. Nem mesmo o seu pedido de perdão. - suspirei alto — Porém, mais do que o meu perdão, você precisa do seu.
— Não sei se consigo.
— Vá tentando até conseguir. - ele assentiu, tentando desviar o olhar, mas eu mesma levantei o seu rosto, fazendo-o me olhar nos olhos. — Por diversas vezes você me perguntou o porquê de eu ter ido embora e eu sempre te disse que haviam vários motivos.
— Eu não enxergava quais eram. Falhei em muitas coisas… - concordei plenamente. — Mas agora estou tentando o meu melhor para ser um homem mais forte, mais compreensível, mais maduro.
— E eu espero mesmo que você seja melhor, por você e pelo seu filho. E pela próxima pessoa que você terá em sua vida, pra nunca fazer com ela o que você fez comigo. - ele engoliu a seco as minhas palavras. — Eu nunca menti para você. E acreditando ou não, o bebê era seu.
— Eu sei. No fundo, eu sempre soube. - confessou, em meio às tímidas lágrimas que escorriam pelo seu rosto.
— Tudo passa, . Menos a verdade. - meus olhos marejados entregavam as lágrimas que estavam prestes a escorrer. — A verdade sempre permanece…
— Eu sei. - ele se sentou ao meu lado, tocou em meu rosto e me olhou de forma terna — Ainda há algo que eu possa fazer para mudar tudo isso?
— Desculpa, , mas eu realmente cansei de tudo isso.
— Não quero ser egoísta, . Mas estou sentado aqui, destruído por dentro, mal conseguindo te olhar pelo o que te fiz, sem conseguir imaginar minha vida sem você - o meu choro, agora não mais contido, se tornava cada vez mais forte. — E mesmo assim você vai embora?
— Como eu poderia ficar, ? - perguntei, aumentando o tom de voz. — Eu também estou quebrada por dentro. Sempre te amei e há pouco tempo ainda tinha alguma esperança em nós, mas você acabou com isso.
- virei meu rosto para não encará-lo — Eu preciso de mais uma chance.
— Você teve a sua chance, , naquele dia em que ficamos juntos, tudo o que eu queria era ter isso de novo, todos os dias.
— Por que eu deveria?
— Porque eu não hesitaria em largar tudo e voltar para casa. - me puxou para mais perto dele e aproximou seu rosto do meu. — Para você.
— Você sabe tanto quanto eu que isso não é verdade.
, eu não posso te perder! A minha vida não faz sentido sem você. - seu choro se tornou mais forte, assim como o meu. — Se houver a possibilidade, por menor que seja, de tudo isso mudar, por favor, me diga.
, você já fez a sua escolha quando não acreditou em mim. E me doeu muito, mas eu sempre a respeitei - sequei meu rosto, com as mãos. — Agora eu fiz a minha e espero que também a respeite.
Ele se levantou, sem dizer uma mínima palavra, me entregando a mochila de e tentando conter as suas lágrimas, me olhou mais uma vez, antes de dar as costas e ir embora.
Pode até ser que esse seja seu maior arrependimento na vida, mas um pedido de perdão não faz o tempo voltar atrás, nem faz o tempo parar e nem mesmo faz mudar as decisões já tomadas. O que acontece, de fato, é que apenas a verdade permanece, independente da situação, e o que resta se vai. Isso inclui pessoas.


"But the truth remains you're…"

[Fim]

Nota da autora: Olá!!! Depois de longos 5 anos, mal posso acreditar que voltei a escrever... e tô muito feliz por isso! Ainda mais com uma fanfic do NSYNC, um dos meus grupos favoritos desde a infância.
Tive certas dificuldades em desenvolver algumas partes, pela falta de prática. Mas, espero muito que vocês gostem!
Beijos! ❤



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