Capítulo Um
I hear the people walk by when it's late,
Sirens beat through my window cill,
Desde que chegara à nova cidade, aquela foi a primeira noite em que se deitou em uma cama quase decente de um hostel praticamente sujo, para não dizer imundo, porém muito melhor do que os bancos, ao relento, duros das praça. Estava definitivamente em êxtase por ter tocado em um pub considerado grande e de público totalmente receptivo, sorridente e cheio de agradecimentos em forma de bons trocados. Sim, finalmente conseguira tocar em um estabelecimento fechado e ser pago por isso. E, além disso, mais gratificante ainda, tocar em um lugar em que as pessoas apreciaram suas músicas e seus covers. Tudo isso graças a , uma mulher de coração bom e botina nos pés, que encantara-se pelo homem e por sua forma leve de andar pelas ruas e levar sua arte no meio de tantas pessoas que muitas vezes o preteriam.
A repentina ajuda parecia ter mudado sua sorte naquela noite de quinta-feira. Entre tantas dificuldades que enfrentara aquela era finalmente a sua luz no fim do túnel.
confessava que eram poucas libras que conquistou em uma única apresentação no The Palm Tree, mas com os trocados ainda guardados no bolso de sua calça jeans surradas que conseguira com tanto suor tocando debaixo de chuva, neve e sol pelas ruas de Londres, podia finalmente descansar em um lugar melhor naquela madrugada.
Ou não.
- Oi, Emma. – queria falar com a única pessoa que lhe incentivou a seguir o seu sonho. Ou seria melhor dizer, a sua loucura?
- Hey, . – respondeu sonolenta. – Você não tem relógio por aí, não? – provocou ao se deparar com o pequeno objeto ao lado de sua cama, que marcava por volta de quatro horas da madrugada.
- Oh... me desculpe, Em. Eu não tinha me dado conta da hora e queria falar com Carrie. – ele explicou um pouco sem jeito.
As costas eretas de no colchão agradeceriam imensamente, se pudesse, estar em um merecido descanso. Fechou os olhos com os cabelos bagunçados no travesseiro macio. Ligar para Emma poderia não ser a melhor opção, mas para quem mais o faria? Seu pai já havia falecido, sua mãe não a reconhecia mais e estava internada em uma clínica para idosos, seus amigos também tinham suas particularidades no matrimônio, com filhos e com seus empregos fixos e rentáveis.
Só lhe restava Emma e Carrie.
- Tudo bem, . Eu estava só te irritando, mas a Car está dormindo. – fez uma pequena pausa. – Como estão às coisas por aí? Aconteceu alguma coisa? – do outro lado da linha, Emma sentava-se em sua cama, puxando o lençol com ela para cobrir o corpo desnudo. Olhou para o lado para se certificar que o corpo masculino ainda estava em um estado profundo de sono e levantou-se.
- Aconteceu. – sorriu animado. – Aconteceu que finalmente toquei em um pub, Em. Carrie ficaria tão orgulhosa! Queria que vocês estivessem aqui para ver aquelas pessoas me cumprimentando e elogiando as músicas.
Era nítida a empolgação e satisfação. Seu sonho finalmente estava sendo realizado, sobrepujando todos os contras. Depois de tocar em um pub e ser tão prestigiado, acreditava que as coisas que viriam a seguir seriam cada vez melhores.
- Isso é bom, . Finalmente, não? – Emma disse sem emoção.
- Estou em um hostel agora e isso me fez pensar... Por que vocês não vêm me ver no próximo final de semana? - , deitado na cama do pequeno quarto, deixou sua mão descansando em cima de sua barriga roncando de fome e contemplou o céu que podia ser visto pelo vidro da janela. Seria perfeito tê-las ali e talvez, tentar melhorar as coisas com a esposa para voltarem a ser uma família feliz.
- No próximo feriado, se você conseguir um lugar definitivo para ficar, eu e Carrie vamos visitá-lo. – a mulher disse com naturalidade.
- Se, se, se... – ironizou. Ele estava chateado por ouvir sempre a mesma coisa. – Nós podemos ficar em um hotel, Emma. Das outras vezes eu entendi a sua preocupação, mas agora as coisas mudaram... Eu estou com dinheiro. – tentou justificar.
- Hoje. E se amanhã já não tiver mais? Você precisa de instabilidade, . – devolveu.
- Acredito que vou continuar tocando no pub que toquei hoje e estou juntando dinheiro. E outra coisa, você está trabalhando agora. Nesse começo poderia me ajudar, não poderia? – havia um pouco de irritação na voz de . Uma irritação que surgia quase que constantemente nas conversas com a esposa.
sabia que Emma cedeu e resolveu lhe apoiar apenas para não chatear Carrie, que estava muito animada com a ideia de ter um pai músico. A verdade é que ele não conseguira ler nos olhos castanhos da esposa o que ela realmente pensava sobre ele se arriscar na capital, mas imaginava que, por ter sido criada em uma cidade muito pequena e interiorana, sua cabeça limitada não entendia realmente. Sabia que Emma era uma mulher carinhosa e companheira, mas ela também era totalmente machista e provavelmente ajudá-lo com o fruto de seu trabalho era algo que não estava disposta a fazer.
O que mais irritava , no entanto, era os ‘senões’ e ‘poréns’. Sempre havia alguma desculpa que lhe jogasse na cara a posição de fracassado, um fracassado que não consegue sustentar a família. Ok, não podia negar que, por semana, enviava menos de cem libras para as mulheres de sua vida, mas mal sabia Em que era tudo o que ele conseguia e muitas vezes mal lhe sobrava dez libras para comer.
A ignorância de Emma começara a dificultar a comunicação de com a filha e isso ele não podia entender e nem admitir.
- , Carrie merece mais. – Emma disse enfática.
- Carrie ou você? – cuspiu.
apertou o celular simples e pré-pago em sua orelha, nervoso. Levantou-se e atentou-se ao barulho da rua movimentada. De cima, podia ver as movimentações: os faróis altos dos carros refletindo e iluminando o seu rosto e o quarto escuro, o grupo de pessoas passando de um lado para outro indo voltando dos pubs ou outros lugares, jovens conversando alto com seus cigarros, casais passeando com seus casacos lhes protegendo do frio londrino e até alguns bêbados que se acomodavam nas guias. Quatro horas da manhã e muitas pessoas nas ruas. A capital era exatamente o que se espera de uma capital, a cidade que nunca para ou a cidade que nunca dorme.
Era um pouco inevitável pensar que, diante dos seus olhos, encontrara uma reflexão sem fim. Londres começara a significar uma complexidade repleta de possibilidades e perspectiva, de ambição e de realização. De contra partida, a vida que tinha em Wenlock, uma pequena cidade de dois mil e quinhentos habitantes, era parada, com costumes arcaicos e ultrapassados. Talvez essa fosse a desculpa de Emma. Não saber lidar com a modernidade.
Quanta ignorância.
Don't control what I'm into
- Isso não é justo. – Emma resmungou, magoada.
Era muito difícil para ela lidar com tudo, inclusive com a sua mãe em sua orelha, lhe dando conselhos ruins. A parte pior era que a vida em Wenlock não parou para que ela esperasse , e nem pararia, e era muito difícil para ela tomar todas as responsabilidades para si e se sentir sozinha.
Claro que naquele cenário não havia um real culpado. As circunstâncias estavam os fazendo mudar de alguma maneira. Na verdade, era uma chance que a vida estava dando para ambos crescerem.
, no auge de seus quarenta anos de idade, estava estagnado em uma realidade que, mesmo que não lhe fosse uma prisão ou purgatório, nem de longe era o que sonhara exatamente. Encontra-se sem muitos amigos, sem música, sem dinheiro e cheio de cargas. O homem de meia idade, funcionário de uma pequena loja em sua cidade, perdeu a perspectiva junto com o seu emprego que lhe rendia cerca de mil e trezentas libras. Aquele dinheiro podia parecer pouco em relação ao quanto as outras famílias ganhavam com empregos melhores, mas era o suficiente para manter a casa e suprir as necessidades dos três moradores do sobrado. Com uma esposa e uma filha de sete anos, a última coisa que podia acontecer era ficar desempregado e fora exatamente isso que aconteceu.
Nunca se esqueceria daquela terça-feira a tarde, quando chegou com os ombros caídos e uma sacola com compras feitas no mercadinho ao lado da loja em que não trabalharia mais. Emma, sempre muito observadora, percebera o olhar aflito do marido e a postura derrotada. Até os rápidos selinhos que trocaram foram frios.
Depois de o homem dizer as temidas palavras: ‘precisamos conversar’, não restavam mais dúvidas que tinham mais um problema a ser adicionado a lista para os diálogos tensos vinham sendo frequentes nos últimos meses.
- ... – A voz feminina saiu quase como um sussurro. As mãos segurando mechas do cabelo castanho claro estavam deixando o homem mais nervoso. – O que vamos fazer agora? – Emma perguntou desesperada, tentando digerir o que o marido acabara de dizer: que fora despedido sem motivo aparente. Apenas havia sido dispensado.
Os dois estavam na cozinha e a mulher, talvez para não entrar em pânico, começara a ocupar o seu tempo, guardando ansiosamente os mantimentos que havia trazido.
- Ei, calma. – ele tentou pará-la ao segurar seu braço, mas ela se desvencilhou. Ela o ignoraria, ok. Ela seria hostil mais uma vez, ok. Ela surtaria e ele já estava cansado de ter sempre mil pedras para cima dele.
- Só me responde o que vamos fazer. – insistiu.
- Eu não sei, Emma! – falou alto. – Eu vou receber um dinheiro ainda, mas amanhã mesmo vou procurar outro emprego. Será que nem ao menos uma vez você vai tentar me ajudar? As coisas vão se resolver – fora positivo –,tem que se resolver. – completou mais baixo. O homem respondeu passando a mão por sua barba rala e aparada.
É difícil para um homem ser podado de suas vontades. Dizem que orgulho é algo que nunca é deixado para trás, mas essa matemática falhou com . Não havia orgulho que o fizesse persistir um rumo que não caberia à pequena Emma e seus cabelos castanhos claros encantadores. Quando ele a conheceu, achou que descobririam o mundo juntos, que saberiam exatamente para onde ir e o que fazer para procurar a real concepção de felicidade. realmente achou que havia encontrado o amor da sua vida e que poderia viver na estrada, juntos. Emma também tinha seus sonhos e por mais que não tivesse nada musical envolvido neles, a vontade de viajar e conhecer o mundo lhe estimulava a continuar ansiando pela vida e pelo futuro. Porém, tudo aquilo mudou quando o teste de gravidez dera positivo.
Emma não via mais como dar asas a seus anseios. continuava achando que poderia ganhar a vida com seu violão, mas a falta de dinheiro para pagar as contas fora um problema e então, sem estudos, ele largou a música e se sujeitou ao primeiro emprego que apareceu. A loja de departamento era um suplício, na maioria dos dias, mas, ao mesmo tempo, era sua salvação.
Por mais que tivesse isolado seu futuro idealizado por sua filha, que assim que chegara lhe trouxera tanta luz e alegria, a ambição de ser músico sempre fez parte de sua essência. , desde os cinco anos de idade, arriscava tocar as músicas preferidas de seu pai no piano, no violão e na flauta. Às vezes, conseguia algumas coisas na bateria e percussão. Sua voz também não era tão ruim e, na adolescência, até chegara a ter uma banda com os amigos e fazer pequenas apresentações pelas praças da cidade e festivais.
Por um momento, o homem pareceu se lembrar de uma época em que era feliz. Uma época em que não existia aquela pressão e aquele desespero por qualquer coisa. Claro que sabia que ter uma filha era uma responsabilidade enorme, que existia alguém dependente dele, mas ele não estava sozinho naquela empreitada.
- , isso não podia ter acontecido! – Emma passou a mão pelos cabelos e andou de um lado para o outro. – Temos contas a pagar! – A cada segundo o desespero parecia aumentar.
A mulher, dona de casa, não conseguia ver nenhuma solução. Um pai de família de uma cidade pequena e com costumes conservadores perder o emprego era um problema preocupante. Logo a vizinhança começaria a comentar e isso incomodaria completamente . Não podia ser tão crucificado por ter sido mandado embora. Não era como se ele tivesse abandonado o emprego pura e simplesmente ou algo assim.
não respondeu. Não era de seu feitio prolongar discussões. Até porque, se quisesse colocar na cabeça de Emma qualquer tipo de ideia referente a ‘direitos iguais’ ou ‘responsabilidades iguais’ ou ‘colaboração’, a coisa não ia acabar bem. Ele não podia controlar as coisas ao seu redor. Não podia controlar sua esposa.
Emma continuou guardando os mantimentos e, quando acabou, passou a mexer nervosamente nas panelas guardadas nos armários.
- Papai, papai... – Carrie apareceu na porta larga da cozinha, usando um vestidinho branco até os joelhos.
- Oi, minha princesa. – , sempre paciente com Carrie, abaixou e abriu os braços, para que a menina fosse de encontro a ele e o abraçasse. Um costume que os dois mantinham.
A menina, com suas pernas finas e pequenas, correu até o pai e se pendurou em seus ombros. passou os braços em volta do corpo de Carrie e a ergueu, apertando-a em seu colo. Sua mão grosseira por alguns calos afagou os cabelos castanhos acobreado da filha, que sorriu. Logo já estava voltando ao chão.
- Sabe, o seu violão ainda está em meu quarto... – a menina disse inocentemente.
- Você está praticando as notas que eu lhe ensinei? – perguntou com um sorriso contente nos lábios.
- Ai papai, você é tão lerdo às vezes. – Carrie bateu a mão na testa de uma forma engraçada. não conseguiu segurar a risada.
- Às vezes? – Emma resmungou, mas foi ignorada.
puxou o banco que ficava junto ao balcão da cozinha e se sentou, puxando Carrie para junto de si. A filha se posicionou entre suas pernas, de costas para o pai, e a abraçou carinhosamente.
- Você pode voltar a tocar o seu violão... Na verdade, você pode ganhar dinheiro com ele para me comprar mais vestidos. – sorriu alegremente, encolhendo os ombros e soltando em seguida, como se aquela solução fosse a mais óbvia do mundo.
Obviamente que, como todas as vezes, a menina ouvira o diálogo entre os pais. Ela sempre estava atenta ao que os pais estavam falando, principalmente quando havia brigas que envolviam gritos. Emma e , quando isso acontecia, sempre demoravam para acalmar o choro da filha e fazê-la entender que as discussões eram normais e que eles não iriam ‘ficar de mal para sempre’.
Para sete anos, Carrie ainda era muito delicada e infantil em relação às outras crianças, e essa era toda a sua graça. Sua inocência, sua delicadeza e seu amor puro, encantavam a todos ao seu redor. Na escola, ela era a melhor amiga de todas as crianças de sua turma, era elogiada pelas professoras por seu emprenho e sua compreensão e nunca deixara de fazer o que era solicitado. Claro que nessa idade, a maioria das crianças não têm a rebeldia correndo em suas veias, mas mesmo sabendo que algum dia as coisas poderiam se complicar, ela era a filha que tinha certeza que todos gostariam de ter.
With lights that blind keep me awake,
Put my hood up, unlace and tie,
The street fills my mind,
Don't control what I'm into.
Depois de uma semana inteira sentindo-se injustiçado pela última conversa com Emma, reverteu toda a mágoa em força e, além de tocar no The Palm Tree de quarta a domingo à noite, nos outros dias voltou a deixar as ruas entrar em sua mente e fazer parte da arte urbana. As duas maneiras de juntar dinheiro estavam sendo produtivas. Ele orgulhava-se de saber que teria como alugar um lugar para ficar por um tempo e isso significava que Emma poderia cumprir o que havia dito.
Pegou o pequeno aparelho telefônico e em poucos toques fora atendido. Estava ansiosa para contar a novidade para Carrie. Ele sentia tanta falta de sua baixinha!
- Oi, princesa – sorriu após ouvir o ‘oi’ fino de sua filha ao lhe atender.
- Eu sabia que era você, papai! Eu sabia... – a menina falou eufórica. – Eu estou com tanta saudade. Quando vou aí te ver? – perguntou.
- Eu liguei para falar sobre isso. Esse final de semana seria perfeito ter vocês comigo novamente. Quero te mostrar vários lugares! – realmente já havia feito uma lista dos lugares que gostaria que sua filha conhecesse. Claro que a London Eye e o aquário estavam inclusos.
- Ebaaa. Já vou começar a arrumar minha mochila, papai. – falou animada.
Depois de conversar mais alguns minutos com Carrie, foi atendido por Emma. Pela primeira vez desde que fora para Londres, a conversa entre os dois parecia fluir de forma amigável e carinhosa. Por muitos minutos, a esposa lhe contou sobre como tinha sido as partes boas dos últimos dias. Ela havia lhe contado sobre a visita de Stefan e Ashley, um casal de vizinhos que sempre os ajudaram desde que se mudara para a vizinhança. Aparentemente, Ahsley havia feito uma torta de maça e levado para as duas, pois Carrie não parava de falar sobre esta sobremesa toda vez que cruzava com a senhora na rua calma que moravam. riu da simplicidade da filha, ainda mais depois de saber que a pequena pedira para a senhora lhe ensinar a cozinhar, para que não precisasse incomoda-la.
- Estou com tanta saudade de vocês! – comentou depois de ouvir as histórias.
- Nós também, . – Emma respondeu docemente.
- Eu não estou aguentando ficar sem o seu abraço, baby. – sorriu sozinho e podia sentir sua respiração mais leve e sonhadora.
- Pois é, , mas foi escolha sua ir para tão longe de nós. – a mulher respondeu de forma ácida.
sabia que Emma estava em uma fase magoada por se sentir abandonada e sabia também que quando acontecia algo assim que a incomodava, precisava agradá-la de diversas maneiras. Por isso, mesmo cheio de vontade de lhe responder a altura por conta do esgotamento que chegara com tantas pedras sendo atiradas em sua direção, afastou o orgulho. - Eu sei – preferiu concordar –, mas faltam poucos dias para vocês estarem comigo, sweetheart. Eu não vejo a hora de poder te abraçar de novo, sabia? – sua voz saiu mais suave.
Ele a amava, não podia negar. Já haviam passado por tantas coisas e, mesmo que esperasse uma trégua das surpresas da vida, sabia que ainda tinham muito o que enfrentar e até compartilhar.
- Eu e Carrie não vamos. – jogou o balde de água fria.
- Como não, Emma? Carrie está tão animada! – justificou. – Eu espero isso desde que cheguei aqui, Emma.
- Pare de insistir, ! Chega! – Emma gritou do outro lado da linha.
afastou o celular do ouvido e respirou profundamente.
- Mas Emma, eu tenho o direito de ao menos ver minha filha. – continuou mantendo um tom de voz controlado. Era sempre a melhor opção: manter-se inalterado, assim as coisas não piorariam.
- Tem, claro que tem. Mas só quando você deixar de viver como um mendigo.
Certo.
Aquele fora um muro certeiro em seu peito, pois era a realidade.
Emma sabia das noites mal dormidas, da falta de recursos financeiros para manter uma casa ou outro local confortável e quente, dificuldades para pagar constantemente a lavanderia a fim de lavar suas roupas decentemente, mas ela nem ao menos sabia da missa a metade. Nunca a deixaria saber dos dias que passara fome, que dormira literalmente na rua, que as buzinas e as vozes da capital adentraram sua mente de tal maneira que achava que iria enlouquecer, que fora discriminado por algumas pessoas e que até já tinha sido parado pela polícia.
Emma não, também, das coisas em que aos poucos estava se esquecendo. Ele tinha dificuldades de se lembrar do perfume da esposa no meio de tantos cheiros desagradáveis das ruas e da falta de banho diário, havia se esquecido do sabor da fanta, seu refrigerante preferido. A nova vida estava sendo tão difícil sozinho e tendo que viver limitado de quase tudo, que ele nem conseguia se lembrar do gosto do Treacle tart que sua mãe e sua esposa faziam tão bem.
Ela estava sendo tão injusta.
- Ei, qual o seu problema, Emma?
- Não, , qual é o seu? – a mulher fez uma pausa. – Eu estou aqui, trabalhando em uma agência de turismo o dia todo, praticamente, e quando chego em casa ainda preciso me preocupar com limpeza, com mercado, com comida, com escola da Carrie, com as roupas... Eu estou cansada, sabia? Cansada de não ter você para me ajudar e ter que carregar o mundo nas costas!
- Eu entendo, ok? Eu deveria estar com você e dividir todas as responsabilidades. Mas não está fácil para mim também e, além do mais, é temporário. Já parou para pensar nisso? É temporário!!! – explodiu, enfim. Quando percebeu que não receberia nenhuma resposta e que se não voltasse a falar, ficariam ouvindo a respiração regular de Emma, decidiu prosseguir. Quem sabe a convenceria de algo. – Eu já estou fixo em um dos Pubs mais frequentados de Londres, Emma. tem me ajudado bastante e eu já tenho um lugar para ficar. Por favor, deixe-me ver Carrie. – pediu, com certo tom de súplica em sua voz. - ? Claro que teria alguma mulher!
- Emma, por favor. Ela é apenas a dona do Pub. – quase podia rir internamente. Não que se sentisse no direito de tirar sarro de um aparente ciúme, mas, no meio de tantos problemas maiores e dificuldades que estavam passando, o comentário de Em realmente soava agradável e cômico.
- , eu não quero mais essa vida. – Emma disse, sinceramente.
- Qual vida? – mesmo que não pudesse ser visto, juntou as sobrancelhas. Ele sabia qual resposta estava por vir, mas queria confirmar.
- Qual você acha? Caramba, , eu quero que você volte e que seja o pai de família que sempre foi.
- Por favor, Emma, vamos parar por aqui, ok? Se continuarmos, um de nós vai acabar saindo profundamente magoados e a última coisa que eu quero é terminar de estragar as coisas. Você pode entender isso, certo? Pode entender que eu estou tentando, não pode? – fez uma pausa pesando suas palavras. – E realmente está dando certo dessa vez, então, por favor, me dê essa chance. Venham passar um final de semana comigo e aí você vai ver com seus próprios olhos que eu estou bem próximo de aliviar toda essa carga que você está carregando. – procurou falar pausadamente e com segurança em sua voz. Procurou ser o ponderado e o homem seguro que aparentemente Emma estava procurando. Procurou também não perder a chance de poder resgatar sua família.
Emma resolveu encerrar a ligação e se despediu com a desculpa que a mãe dela havia chegado. Por uma última vez, insistiu para que a visita fosse mantida em pé. Prometendo pensar, a ligação foi encerrada.
A traveller Ohoohohh,
This is now my home, My home,
Quando aqueles cabelos ruivos e brilhantes apareceram pela primeira vez, não conseguiu evitar trocar um sorriso com a dona dos olhos mais cativantes que já tinha conhecido. A jovem mulher aproximou-se do cantor e apreciou cerca de três músicas antes de ir até a case de seu violão e depositar uma quantia de libras que jamais esperaria ganhar de uma vez só. Por mais que uma voz dentro de si gritasse para ele recusar – obviamente por arrogância e medo de que aquela gratificação viesse de um sentimento de dó – outra voz apenas lhe lembrava de que estava precisando do dinheiro e precisava ser agradecido por ele. Os olhos azuis e os olhos verdes se cruzaram mais uma vez, mas o sorriso que brotou nos lábios rosados da mulher, agora significavam mais do que achava ter entendido.
Antes mesmo de poder falar qualquer coisa por estar mais ocupado cantando e tocando o seu violão, do mesmo jeito que apareceu, ela se foi. Sumiu entre outras pessoas que passavam pela rua movimentada e não conseguiu mais ver os brilhosos fios ruivos.
Depois daquela quarta feira, se passaram mais três dias até que a ruiva aparecesse novamente. sempre andava pelas ruas e raramente voltava no mesmo lugar com um caixote, o violão e a mochila. Porém, naquele fim de tarde, ele havia voltado para o meio das manifestações artísticas nos muros do bairro Shoreditch e o único motivo que o fizera tomar aquela decisão foi o fato de amar aquele bairro e o quão urbano, vibrante e um ninho de criatividade. Por mais que não acreditasse muito em destino, sabia que estava no lugar certo, na hora certa e reencontrando a pessoa certa.
Mais uma vez, a misteriosa mulher parou levemente afastada e apreciou, dessa vez, cerca de cinco músicas. Depois do tempo em que foi tomada pelos acordes doce e voz inesquecível, a aglomeração em volta do músico de olhos azuis marcantes diminuiu e, então, se aproximou. Surpreendentemente, mais algumas notas altas de libras foram deixadas para e, novamente, o sorriso apareceu no lábio dos dois, como se fossem cúmplices de algo.
- Hey... – ela parecia um pouco desconcertada. – Que talento você tem, hã? – sorriu sinceramente e deu um tapinha em no ombro do homem. Ele segurou sua paleta com os lábios e tirou o violão de seu corpo, descansando-o encostado ao caixote que estava sentado anteriormente.
- Hey... – não sabia como agir, e a imitou depois de guardar a paleta no bolso. – Não precisava... – ele indicou o dinheiro em sua case com um aceno de cabeça.
- Apenas reconhecendo o seu trabalho. – piscou e em seguida estendeu-lhe a mão. – . olhou para a mão delicada, e cheia de anéis, da mulher estendida à sua frente e depois de hesitar por uns segundos, apertou-a firmemente em um cumprimento. Ainda estava em um conflito interno, curioso para saber o porquê de quantias tão altas. Aquilo não acontecia normalmente e ele realmente não queria despertar dó em ninguém.
Porém, se fosse realmente reconhecimento, estaria satisfeito.
- . – apresentou-se.
Poderiam sorrir um para o outro e não se enjoariam daquele ato facilmente. não sabia explicar o porquê, mas mesmo vendo a aliança dourado no dedo anelar da mão esquerda de , não se importava se daria a impressão errada, até porque, queria apenas oferecer-lhe um emprego. Queria apenas tê-lo cantando em todos os dias de sua vida, se possível.
- Diga-me, ... Onde você se escondia? – colocou as mãos nos bolsos traseiros de sua calça jeans e encolheu os ombros.
- O que você quer dizer? – procurou entender.
- Faz muito tempo que não vejo alguém tão talentoso quanto você. Você demorou a aparecer, buddy. – sorriu e aproximou-se do violão, passando a mão pelas cordas e puxando duas dela. O som agradável, mas não tanto como uma nota tocada corretamente, pareceu lhe fazer se lembrar de algo importante. – De onde você é?
- Wenlock. – ele respondeu, acompanhando-a com o olhar. O que ela queria?
- Imaginei. Você tem um pouco de sotaque, daqueles que puxa mais o r do que o necessário. – comentou como se estivesse falando sozinha.
- Está me chamando de caipira? – juntou as sobrancelhas e, mesmo achando engraçado, fingiu que estava levemente magoado, espalmando uma de suas mãos em seu peito, em cima de seu coração.
, muito boa em ler as entrelinhas, não se deixou convencer pela encenação. Ambos riram e ficaram em silêncio por um espaço curto de tempo.
- Então, turista, você está livre para tocar em um pub esse final de semana? – finalmente perguntou.
- Em um pub? – uma de suas sobrancelhas arqueou. – Claro que estou. – emendou rapidamente, ao ver certa hesitação no rosto da mulher. – Você está falando sério? – acrescentou, por fim.
- Mais do que sério. – ela sorriu. – Se você estiver terminado por aqui, poderíamos ir até a rua debaixo, tomar um chá e eu te falo mais sobre isso. – convidou-o.
Naquela tarde, e passaram horas conversando sobre os mais variados assuntos. A mulher, dona do tal pub da qual o músico passaria a se apresentar, quis ouvir a história do homem. Por mais que muitos achassem trágico perder o emprego tendo uma casa para sustentar e se arriscar em uma cidade nova a fim de tentar viver de música, admirou-se totalmente. Achava que pessoas como eram joias raras nos dias atuais.
Depois de quase duas horas, assuntos como as músicas que mais gostava, bandas e outros gostos em comum surgiram. abrira o seu coração e comentara sobre a vontade de, um dia, ter uma gravadora e trabalhar com diversos artistas e assumiu que esse seu sonho fora o gatilho para chamá-lo a tocar em seu estabelecimento.
No século XI, com tanta competitividade devido ao capitalismo selvagem que vinha crescendo desenfreado em todo o mundo, era difícil deixar que o sentimento de confiança viesse rapidamente, mas , um homem íntegro e muito observador, dera ouvidos aos seus instintos e sabia que poderia confiar na mulher não mais misteriosa dos cabelos ruivos. O fato de sua figura ter aparecido em sua vida e o fato de apresentar-se de forma tão transparente, lhe fizeram ver que não ficaria mais sozinho nessa adaptação de Londres. Poderia sentir-se realmente em casa. Ainda que não fosse um lar, ainda, mas uma casa era tudo o que precisava.
A partir daquele momento, ele não seria mais um mísero turista ou um estranho de quarenta anos que ficava pelas ruas com aparência moribunda e sempre vestindo moletons, sabia disso. Sua voz seria ouvida e aquela cidade seria o seu lugar.
Oh Woah, Stuck here, sitting in the back seat,
Oh Woah, And I'm blazing on the street,
What I do isn't upto you,
And if the city never sleeps then that makes two.
A noite caía em Candem Town. Aquele era o lugar que mais gostava de passar suas noites, pois fora ali que encontrara outras pessoas para bater um papo e até ajudá-lo a aprender um pouco mais das malícias que precisavam ter para sobreviver as ruas.
Ter feito amizade com alguns caras que passavam boa parte em um beco mal iluminado perto do Candem Market, fez com que conhecesse uma outra realidade da qual ele não havia experimentado nem em sua juventude. Talvez pela realidade conservadora de Wenlock, ele e seus amigos nunca foram ligados às substâncias ilegais. Claro que não era hipócrita e admitia que tivera uma fase rebelde, porém, era uma em que envolvia apenas bebidas, cigarros e músicas em horários não permitidos ou lugares que 'incomodavam a paz dos moradores da cidade'. Nada comparado a drogas ilícitas, muito usadas, mas, mesmo assim, ilícitas.
O cigarro de ervas que lhe foi apresentado naqueles poucos minutos de conversa nada aproveitável passou a ser o seu companheiro na maior parte do tempo, principalmente por ser uma substância que acalmava os seus pensamentos acelerados e lhe deixava mais relaxado em relação a um homem simples perdido em um lugar desconhecido e cheio de vertentes.
- Dê um pega, . – a primeira vez que a maconha lhe foi oferecida, hesitou em aceitar. Olhou atentamente o cigarro um pouco mais fino que o convencional sendo estendido a ele e mordeu o lábio. – Apenas experimente. – o mesmo homem disse.
pegou com a ponta do indicador e do dedão, do mesmo modo que os outros estavam fazendo e levou a sua boca. Nunca se esqueceria da primeira sensação. A fumaça que tragou não era agradável, mas os sintomas que passou a sentir em seguida era exatamente o que estava precisando naquele momento. Tirando, claro, a terrível vontade de sentir algum líquido ou alguma comida passar por sua garganta. Sim, ele poderia beber quatro litros de água e comer um boi facilmente, porém, aquele era um efeito colateral que não teria como saciar por falta de dinheiro. Naquela noite, com os trocados que conseguiu nas ruas, tinha apenas um pacote de chips de batata.
Obviamente que, mesmo que a parte em que o consumo de alimentos aumentou, continuou com seu cigarro companheiro. A parte em que pagava poucas libras por ele, também ajudou bastante. - E aí, cara? – um dos homens que sempre estava com no beco, se aproximou.
Rapidamente, como todos entre eles faziam, estendeu a mão para o homem e lhe ofereceu a droga que havia enrolado sozinho e desfrutava desde minutos antes do colega chegar. Ele aceitou de bom grado e depois de tragar por três vezes seguidas, devolveu.
- Uma comemoração ou um lamento? – o homem perguntou se referindo a estarem fumando.
- Só um descanso. – respondeu.
Ambos sentaram-se lado a lado em caixotes de madeira que foram deixados ali, próximos de um grande contêiner de lixo. Logo, a língua pesada de e a moleza lhe deixaram mais lento e, como se tudo viesse a calhar, exatamente naquele momento, sirenes de polícia começaram a aumentar gradativamente, avisando-os de que os fardados estavam se aproximando.
O homem que fazia companhia para conseguiu correr e desaparecer em questões de segundos. Talvez já estivesse acostumado com fugas inesperadas como aquela, porém, , o pai de família que morava nas ruas de Londres e fumava maconha nas horas vagas, não tinha tamanha malícia e sua falta de ação o atrasou para sair do tal local.
- Parado! – a voz imponente que soou confirmou que realmente não tinha mais para onde ir. Havia apenas tido de tempo de se livrar da ponta do cigarro enrolado manualmente.
Rapidamente dois policiais aproximaram-se do homem. Um pequeno interrogatório, pedido de documentos, bolsos e pertences revistados, e estava no banco de trás de uma viatura por porte de maconha. No caminho tortuoso até uma delegacia próxima, o músico não parava de pensar em como aquilo era mais um número na lista de coisas que Emma não poderia saber nunca.
Ok, ele respondia por seus atos, mas ainda tinha uma família.
It'll take me where I need to go,
If I find it trips me up,
And puts me down,
This is not what I'm used to.
A conversa que tivera com Emma naquela tarde, ainda estava lhe causando sérias dores de cabeça, afinal, a esposa o havia jogado na cara o discurso cansativo de ‘pai de família’. A situação começara a ser insustentável depois que a mulher lhe mandara uma mensagem de texto com as palavras: “Não espere por nós no próximo final de semana”. O que mais poderia fazer ou falar? Conhecendo a esposa, sabia que as palavras muito provavelmente haviam sido digitadas por impulso, mas não podia deixar de se sentir mal.
Ele estava se esforçando demasiadamente para o seu sonho e, mais ainda, o desejo de sua filha tornasse real e talvez se a esposa estivesse em sua pele por um dia, entendesse um pouco mais.
Sua decepção ficou latente e transparente no pequeno show daquela noite. Quando se sentou no banquinho no palco de madeira e ajeitou o violão em seu colo, as músicas que tocara, e sua voz, pareciam um lamento. O público fora tão receptivo quanto das outras vezes, mas a energia não lhes tocou tão calorosamente como em outras vezes, pois, por mais emocionados que estivessem, tinha um quê de amargura em suas canções covers e próprias.
Seu lado perfeccionista frustrara-se, sentiu-se humilhado e fracassado.
- Hey, hora de acertar? – levantou os olhos de seus papéis na mesa do pequeno escritório no andar de cima.
acenou com a cabeça e sentou-se na cadeira almofadada de frente a e sua mesa. Seu corpo automaticamente escorregou no assento.
- Está tudo bem? Não vai me dizer que você vai desistir e voltar para Wenlock! – ela arregalou os olhos.
- Não vou desistir. – forçou um sorriso.
- O que está acontecendo? – , sua nova amiga, preocupou-se sinceramente em saber.
ponderou se realmente deveria falar sobre os sentimentos e acontecimentos. Aquela vida de músico de rua, ou músico de pub estava lhe puxando para baixo por conta de terceiros e talvez se compartilhasse com alguém, senti-se melhor. Decidiu por falar.
- Vamos falar hipoteticamente, ok? – ele sugeriu.
- Certo, hipoteticamente. Mas diga-me nomes, sou péssima em imaginar cenas... – sorriu e encostou suas costas no encosto confortável da cadeira, segurando nos braços dela, de forma confortável e atenta.
- Certo. Suponhamos que você seja casada com um músico. – ela assentiu, em um pedido silencioso que continuasse. – Ok. Vamos chamá-lo de Paul. Você e Paul têm uma filha de sete anos, uma vida normal de casados e você é uma dona de casa. Um dia, Paul perde o emprego e decide viver de música. Porém, vocês moram em uma cidade pequena e para que Paul viva seu sonho, que é a música, ele precisa ir para uma cidade maior, mas não no intuito de abandoná-la, mas querendo crescer e depois reunir a família novamente. O que você faria? – jogou a bola para .
- Eu não entendi aonde você quer chegar, . A suposta história para mim soa muito normal. Acho que eu apoiaria o meu marido, ainda mais se soubesse que ele tem talento para seguir seu sonho. – foi sincera.
não sabia, mas havia acabado de dizer exatamente o que esperava que Emma fizesse.
- Mas e as contas? As responsabilidades? – insistiu.
- Temporário! – respondeu de pronto.
Os dois mantiveram o olhar por algum tempo. Olhos verdes e azuis compartilhavam da mesma verdade e não fora preciso dizer mais nada para saberem que tinham a mesma sintonia naquele sentido. Porém, não poderia crucificar Emma. Ela vivia outra realidade e não entendia alguém sobreviver de música, já sim.
- Eu queria te pedir um favor. – falou cautelosamente.
- Tudo bem... O que se trata? – levantou-se de sua cadeira e foi até a frente da mesa.
A mulher encostou-se à superfície de vidro e colocou suas duas mãos aos lados do corpo, apoiando-os na mesa. Estava em uma posição aberta a uma conversa, porém próxima demais de . A roupa que a mulher estava usando, marcava seus seios e cintura. Os olhos do músico não sabiam a que dar preferência: aos olhos doces da ruiva ou ao corpo curvilíneo que sempre lhe chamou atenção.
- Será que no próximo final de semana eu poderia tocar até meia noite? – arriscou.
Os pubs na Inglaterra sempre fechavam por volta de 3, 4 da manhã e geralmente ficava até as 2:30, um horário que não era nem um pouco indicado para uma criança de 7 anos estar na rua.
- Desculpa perguntar, mas por quê? – ficou curiosa. Sábado e domingo eram os dias que o Pub mais tinha movimento e que ganhava mais trocados.
- Não é certeza ainda. Emma não quer vir e nem trazer Carrie, mas caso venham, eu gostaria de passar um tempo com minha esposa e minha filha. – era a primeira vez que citava nomes.
- Ficarei feliz em ajudar. Pode fazer o seu horário e trazê-las aqui também, claro.
não poderia ser mais grato.
Sempre que estava ao lado de , sabia que aquela realidade era a qual precisava viver. Ele pertencia as ruas, aos pubs, as casas de show, as manifestações artísticas. Ele pertencia ao mundo e não a uma cidade e não uma única família.
tinha certeza que não saberia mais lidar com uma vida em que ele não fosse a pessoa a levar alegria, mensagem e sorrisos a outras pessoas. Ele não saberia segurar uma barra em que voltasse a enclausurar sua vontade, seus sonhos e seu talento. Emma, definitivamente, precisava entender isso... ‘Assim como Carrie e entendiam’, pensou.
It fills my needs and keeps me company,
When I need it,
Voices beat through my walls,
I don't think I'm gonna make it,
Past to-mor-roow.
Com o dinheiro contado, as únicas vinte libras que lhe restaram, aproveitou para entrar no pequeno mercado que ainda encontrava-se aberto em um dos bairros novos que havia escolhido para se apresentar. Passou pelas gôndolas, tentando decidir o que o sustentaria mais e fosse mais barato. Claro que a prateleira de comidas prontas em preço promocional de duas libras, fora o escolhido. Era uma sorte para ele que a maioria dos mercados na capital tivesse aquele sistema de, depois de certo horário do alimento na prateleira, passasse a valer uma taxa significativa, quase como preço de banana.
Pão, uma garrafa de suco e uma travessa de uma carne assada - de aparência muito esquisita-. Aquela seria sua refeição noturna, uma suficiente apenas para aquele horário. Preocupava-se com o desjejum no dia seguinte, mas aprendera a não se desesperar antecipadamente.
Mesmo que aquele fosse o lema dos dependentes químicos, ele sabia que a frase, na prática, serviria para todos os tipos de situações. "Só por hoje". Era isso que os seus amigos da rua, como costumavam se chamar, sempre falavam. A única contradição é que os outros homens viviam aquele conselho apenas na teoria. Viver um dia de cada vez realmente era desafiante, mas a forma mais tranquila de se viver em um cenário em que, na verdade, nem sabia se duraria até o dia seguinte.
nunca havia saído de seu país, e foram poucas as vezes em que viajara para outra cidade. A vida pode ser cheia de desafios, mas sempre vai ter um que lhe sugará mais energia do que está disposto a gastar.
Nada significaria uma derrota maior do que perceber seu sacrifício sendo jogado fora.
A traveller Ohoohohh,
This is now my home, My home,
Finalmente chegara o dia em que teria as duas mulheres de sua vida juntamente com ele na cidade que estava mudando a sua história. Naquele sábado, o homem acordara às sete da manhã e havia dormido menos de quatro horas da tarde. Apenas tomou um banho rápido e se arrumou antes de ir até a estação de metrô para receber Emma e Carrie com tamanha empolgação e o sorriso mais sincero do mundo.
Instintivamente, abaixou-se e abriu os braços quando duas figuras conhecidas apareceram ao longe. Carrie, ao ver a barba por fazer conhecida de seu pai, correu com todo o fôlego que tinha até jogar-se nos braços confortáveis e ser abraçada fortemente. Como imaginava, a garotinha estava usando um vestidinho de veludo, com o cachecol que lembrava arco ires enrolado em seu pescoço e uma touca de crochê que provavelmente a mãe materna havia lhe dado. As bochechas da garotinha realmente estavam coradas como de costume e ela parecia não caber em si, enchendo o pai de beijos estalados na bochecha e repetindo diversas vezes: ‘senti sua falta, senti sua falta’. Os olhos do homem fecharam-se e ele apenas foi capaz de dizer:
- Eu também senti sua falta, Car. Eu te amo tanto!
Quando os dois se separaram, foi de encontro à Emma, passou um dos braços por trás da cintura da mulher e trouxe o seu corpo para junto do dele, mas quando os seus lábios estavam prestes a tocar os cheios da esposa, ela reagiu inesperadamente. Emma se afastou e tirou, delicadamente, o braço do marido de seu corpo, segurando forte em sua mão e mantendo certa distância.
- Eu não vou ficar. – foi o que saiu friamente de sua boca rosa de batom.
- O quê? Por quê? – emendou as duas perguntas, sem entender o que havia perdido mais uma vez. Ele sempre era o último a saber das coisas e mesmo imaginando que seria difícil tê-la no final de semana devido as últimas discussões por telefone, imaginava que no fim das contas acabaria dobrando a fera e convencendo-a de que faltava pouco para tudo se resolver.
- Como se você não soubesse... – revirou os olhos, entediada.
Carrie segurou novamente a mão do pai, e ao lado dele, encarou Emma por um tempo, até que mostrando ser mais forte e pacificadora do que os dois adultos, voltou a se pronunciar.
- Tudo bem, papai. Você ainda pode me levar para passear e no outro final de semana a mamãe vem com a gente. – tentou fazer com que o estranhamento entre os dois não continuasse. Estava com saudade demais do pai para aguentar ver ele e a mãe brigando.
estava em um fogo cruzado, mas preferiu não insistir. Ele concordou com um aceno de cabeça e lançou um último olhar, totalmente magoado, para Emma. Seu consolo maior era sair da estação de mãos dadas com a menina mais doce que conhecia e ter novamente a companhia leve, inocente e amorosa de Emma.
Com tantas exigências de Emma sobre onde ficar, o que fazer, e aonde ir, se sujeitou a pagar quase todas suas economias para ficar em um apartamento estúdio. O tempo mínimo de permanência no pequeno espaço era de uma semana, no valor de 155 libras. Mesmo que a esposa não estivesse ficado, Carrie realmente merecia um lugar bom para ficar e pensando pelo lado de o aluguel se repetiria apenas uma vez a cada dois meses, por conta da escola.
O primeiro lugar que levou a filha foi ao mercado que costumava ir. Ele deixou que a menina escolhesse o que gostaria de comer nos dois dias de sua estadia e comprou todos os ingredientes necessários para as refeições. Carrie aproveitou também para comprar seu biscoito preferido, com massa sabor chocolate e de formato de ursinhos. O pai lembrou-se de que sempre trazia o pacote amarelo cheio de desenhos para a filha e, em todas as vezes que a presenteava com aquele petisco, ganhava beijos demorados e abraços mais apertados.
- Papai, você é o melhor, sabia? – Carrie sorriu inocente e sinceramente ao sair do mercado levando as sacolas mais leves.
- Você que é a melhor. – ele respondeu e piscou para a garotinha.
O almoço que cozinharam juntos ficou pronto rapidamente e praticamente no mesmo tempo em que fora feito, fora devorado pelos dois. A ansiedade era tanta para conhecer os lugares que foi comentando durante a refeição, que Carrie mal queria escovar os dentes e trocar suas roupas para algo mais quente e confortável.
Conhecer a London Eye fora como um sonho para a menina de sete anos. Quando a incrível e gigante roda gigante chegou ao topo, os olhos brilhantes de Carrie deu a impressão em de que brilhavam mais do que o tímido sol. As mãozinhas da filha espalmadas no vidro e os olhos atentos percorrendo cada canto da vasta cidade no meio de nuvens cinzas tornara-se, naquele momento, inesquecível. Em vários momentos, desde que chegou em Londres, acreditou que o mundo era muito grande para que ficássemos presos em um único lugar e sua confirmação daquele fato estava diante de seus olhos. Havia muitas belezas a serem exploradas e apreciadas, muitas culturas diferentes a serem conhecidas e respeitadas. Queria ter a oportunidade de apresentar todas, e muito mais, para Car.
- Pai, isso é tão legal! – a menina exclamou, animada.
, abaixou-se ao lado dela e acariciou os fios dourados de seu cabelo.
- Você não viu nada ainda, pequena. – respondeu sorridente.
As horas voaram durante o primeiro dia juntos. Rapidamente às nove horas da noite chegara e Carrie acompanhou o pai no The Palm Tree. O pub, como em todos os finais de semana, estava lotado e Car recebeu orientação de ficar sempre no canto do palco com e não sair de vista nem por um segundo. Caso precisasse ir ao banheiro ou quisesse pedir alguma coisa, era para ela avisá-lo tocando suas costas na pausa de uma música e outra.
Para , aquela seria a chance de fazer sua filha se orgulhar dele. E realmente se tornou um dia para um se orgulhar do outro.
Os primeiros acordes de causaram arrepios em Carrie. Ela bateu o pé e cantarolou todas as músicas conhecidas que o pai cantava. não podia estar mais satisfeito e tão entregue na música.
Quando seu show se aproximava do final, percebeu que Carrie não estava mais no lugar que combinaram que ela não sairia. Um arrepio em sua espinha foi inevitável e os olhos percorreram rapidamente e atentamente vasto salão do local que passara a conhecer tão bem e os cabelos dourados da menina não era visível em lugar algum.
- Volto em alguns minutos, obrigada pela recepção. – se apressou em pausar o show e descansou o violão, antes de sair do palco.
Varreu cada canto com o olhar. Perguntou para várias pessoas se haviam visto uma criança por ali. Chegou a entrar no banheiro feminino.
Nenhuma de suas tentativas fora eficaz.
Nervoso, subiu as escadas de aço em formato de caracol apressadamente, e antes de chegar ao final do corredor já conseguia identificar as risadas femininas. Claro, como não tinha pensado nisso antes? .
Carrie e dividiam uma porca de peixe frito e batata frita conversando como se fossem íntimas. Quando apareceu na porta, Car parou de rir assustada, entregando-se de que sabia que estava fazendo algo que não devia.
- Hey... – com a boca cheia de batatas, o cumprimentou e depois de engolir, sorriu de forma sincera. Seu rosto estava iluminado, como se a conversa com a pequena estivesse lhe servindo como uma terapia do bem.
- Hey. – ele respondeu e foi até ao lado de Car, passando a mão por seu cabelo. – O que tínhamos combinado, Carrie? – perguntou um pouco bravo.
- Eu sei, papai, desculpa. Mas o peixe e batata me ganharam não pude resistir. – Car respondeu de forma natural.
- É papai, está tudo bem com ela. – brincou. – Aliás, ela estava me contando certas histórias como quebrar o dedo brincando na neve. – fez um cara estranha ao pronunciar tão feito do homem. Ele balançou a cabeça negativamente e riu.
- Quão difamando eu fui, pequena?
- hm... um pouco quase muito. – ela e responderam quase que juntas.
achou cômica a cena e sorriu novamente.
- Certo, cúmplices, preciso voltar para o show.
se surpreendeu com o que aconteceu em seguida. Carrie levantou da cadeira estofada e pegou na mão do pai antes de olhá-lo docemente.
- Quero cantar uma música com você, papai. – o pedido irrecusável veio em perfeita hora.
Oh Woah, Stuck here, sitting in the back seat,
Oh Woah, And I'm blazing on the street,
What I do isn't upto you,
And if the city never sleeps then that makes two.
Aquele domingo à tarde fora o dia mais difícil depois de ter saído de sua casa em Wenlock. Despedir-se da filha na estação de sua cidade e deixar que ela fosse com a mãe, lhe cortou o coração, ainda mais depois de saber o que Emma andava fazendo por suas costas. Quando e Carrie ainda estavam no trem conversando sobre a escola da filha e a vida do pai na nova cidade, não houve como alguns assuntos ficarem de fora e então a verdade veio a tona.
- Você gostou do estúdio, pequena? – perguntou.
- Sim, papai. Não tem um quarto só para mim, mas eu gostei. Você vai continuar morando lá? – Car quis saber.
- Não, pequena. Foi só para termos um lugar nosso. Eu estou dormindo em um quarto nos fundos da casa de por um tempo. – explicou.
- Papai, quando eu vou voltar a morar com você? – pergunta e um bico se forma em seus lábios. - Eu tenho trabalhado nisso, Car. Mas sua mãe não está muito contente em mudar de cidade. – mentiu. A verdade era que Emma não estava contente com muitas outras coisas, inclusive, com o casamento deles.
- A mamãe não vai morar com a gente. – a voz de Car saiu falha.
- O que você quer dizer com isso, meu amor? – o pai perguntou.
Carrie o olhou por alguns segundos. Era pequena e inocente para muitas coisas, mas tinha uma inteligência invejável. A menina pesou suas palavras, mas sempre aprendeu que deveria falar a verdade e também era exatamente aquilo que seu coração estava pedindo.
- Você precisa saber de uma coisa, papai.
- O que foi, pequena? – preocupou-se.
- A mamãe está dormindo com o vizinho da frente. Ele vai em casa quase todos os dias depois que eu vou para o meu quarto. – contou.
O dia não poderia ter piorado. O balde de água fria que fora derrubado em seu corpo poderia congelar os seus sentimentos se não fosse um homem que sempre se importou demais com tudo. , ao ouvir aquelas palavras, não sabia exatamente o que sentir.
O restante do caminho, que durou cerca de dez minutos, fora um tortuoso silêncio. O homem não sabia o que era pior: brigar por coisas bobas e fúteis e ter as esposa sempre lhe cobrando algo que não era possível acontecer ou ter a certeza que seu casamento já tinha ido por água abaixo. Não que já não estivesse indo, mas aquela era, com certeza, a confirmação.
Talvez não ter respondido nada para Carrie não tenha sido a melhor opção. Ele se cobrava por uma resposta. Queria dizer para a filha que poderia ser apenas impressão dela, que as vezes eram amigos se consolando, mas seria negação demais. Ele já sabia que Emma não estava feliz, sabia que todas as discussões vias telefone havia esfriado o seu relacionamento e sabia também que o seu sentimento em relação a ela, definitivamente, não era mais o mesmo.
Quando avistou Emma há metros de distância dele e da filha, o homem abaixou-se e despediu-se da filha com um abraço forte e beijos em suas mãos brancas e delicadas.
- Eu vou te buscar para morar comigo, você quer? – ele a olhava nos olhos.
- Eu quero. Quero cantar com você e ir na London Eye todo final de semana. – Car respondeu. - Feito. – estendeu a mão para que ela apertasse e ela o fez. – Agora tenho que ir. Eu te amo muito, não esquece. – a abraçou novamente.
- Eu também te amo muito, papai. – foi o que Carrie disse antes de se virar e caminhar em direção a mãe.
esperou que Carrie estivesse bem próxima de Emma e, sem a mínima vontade de falar com a esposa, virou as costas para seguir ao outro lado da estação e voltar para Londres. Não tinha mais nada para conversar com sua esposa. Não tentaria falar mais nada, não ao menos naquele momento.
Londres lhe recebeu com chuva naquela noite de domingo. ainda podia voltar ao estúdio que alugara, mas devastado pela notícia que recebera, preferiu ir até o beco conhecido. Seus colegas não estavam por perto, mas havia um homem barbudo sentado ao lado do latão de lixo. Ele o conhecia de vista. Era aquele homem que vendia a maconha.
Não era preciso dizer que naquela noite, fumara três cigarros da erva que fazia alguns dias que não consumia. O músico sentia-se mais relaxado, mais calmo, sentia-se pronto para continuar resplandecendo pelas ruas.
And my ears bled,
With the sounds of the city life,
Echoed in my head,
Uma coisa que sempre fora muito fácil para , fora escrever. O homem conseguia, admiravelmente, transcrever seus sentimentos, observações e pensamentos em uma folha de papel e dar vida àquelas palavras com o que sabia de melhor, música. Compor era o seu exercício favorito, ainda mais quando se sentia tão inspirado. As queixas que poderiam surgir transformavam-se em ossos do ofício quando , depois de rascunhar as letras de suas novas músicas, percebia como aos poucos as coisas estavam entrando nos eixos.
As dores nas pernas, os ecos em sua cabeça, a sensação de que seus ouvidos sangrariam, transformavam-se em absolutamente nada comparada a lista positiva que podia fazer. Ouvira tantas vezes sobre transformar lixo em luxo, que era inevitável não fazer um comparativo. Ele estava pegando todas as merdas de sua vida, plantando e praticamente colhendo ouro.
Carrie havia ido visitá-lo, passado bons momentos e até cantado com ele.
Ele estava fixo para tocar no pub.
O dinheiro começava a lhe render bons frutos.
Tinha alugado um apartamento estúdio e não estava pesando em seu bolso.
Estava se alimentando corretamente.
Não podia excluir a traição e o fim do casamento e esse fato era algo que demoraria a ser superado, mas estava tudo ok, a seu ver.
Mas , mesmo com todas as conquistas, continuava indo todas as tardes para as ruas de Londres tocar para alegrar as pessoas que corriam de um lado para o outro com suas vidas atarefadas. No fim das contas, aquela sensação era a melhor de todas. Poder fazer a diferença na vida de alguém e, com certeza, na dele própria também.
não poderia esquecer também de outro ponto importante em sua vida, o fato de sua amizade com a rockeira, compreensiva e amiga fiel, . fora a responsável por quase todas as conquistas dele. Principalmente estava sendo responsável por ele estar lidando melhor com a decepção com Emma.
- O que você está fazendo, turista? – bateu na porta de seu escritório, fazendo despertar no meio de tantos papéis em sua frente.
- Dê uma olhada nessa letra e seja sincera, por favor. – ele pegou um dos papéis e levantou-se do carpete do chão, levando o papel rabiscado até a mulher.
colocou a caneta atrás de sua orelha, coçou a barba e esperou pacientemente, percorrendo seus olhos novamente nas linhas que foram escritas naquela tarde. Ele e liam praticamente juntos os versos, silenciosamente.
virou um pouco a cabeça e olhou , que estava a suas costas, de canto. Sorriu fraco e se voltou ao papel.
Releu o verso mentalmente:
The traffic stops and starts but I,
Need to move alone.
Como nas primeiras vezes que e se viram, o sorriso sincero e cheio de significados surgiu em seus lábios, e olhos. O músico sempre apreciara pessoas que tinham os olhos transparentes; seus pais sempre dizem que o sorriso mais belo e mais puro era aquele.
- Você não precisa estar sozinho. – virou seu corpo para ficar de frente para . Dobrou o papel em quatro partes e o colocou devagar no bolso frontal da calça jeans do homem.
- As pessoas ficam melhores sozinhas. – ele disse, desdenhando.
- Essa é a maior mentira do mundo, . – o seu nome em alto e bom som saindo dos lábios rosados de despertaram no músico, pela primeira vez, um arrepio que ele jurava não enjoar caso sentisse todas as vezes que ela lhe chamasse assim.
Ele não poderia ter outra reação. A vontade de colocar a mecha ruiva de atrás de sua orelha e beijá-la era enorme. Ele nunca se sentira com um desejo tão grande de ter alguém em seus braços, nem ao menos com Emma era assim. A diferença talvez tenha sido que com a, agora, ex esposa era que o que lhe atraiu foi primeiramente o físico, a carne, e com acontecera o contrário. A ruiva lhe conquistava com cada palavra de incentivo, cada sorriso, cada ajuda, cada momento de conversa franca e conselhos. Era um amor construído.
Sem pensar muito sobre, a vontade ganhou da consciência.
aproximou seu corpo do de , encostando levemente suas cinturas. A mão do homem foi de encontro ao rosto dela, e com a ponta dos dedos acariciou as bochechas dele, colocando a mecha de cabelo atrás da orelha dela e levando a mão em seguida para a nuca dela. Seus lábios logo estavam unidos, macio com macio, quente com quente.
Era a melhor sensação do mundo.
Talvez andar sozinho pelas ruas sim, mas andar sozinho na vida, não mais.
This is now my home, home,
No total, havia passado seis meses que estava em Londres e já era a quarta vez que Carrie estava com ele na capital que aprendeu a amar. As férias de verão não poderiam ser mais perfeitas do que estavam sendo.
Em uma tarde de domingo, Carrie, e passaram a tarde no apartamento do homem customizando a parede da sala com as palmas de suas mãos estampadas com diversificadas cores de tintas em toda extensão de fundo branco. Car divertiu-se sujando os adultos de tintas e no fim do dia, não havia cabelo e nem roupa que tivessem tido sido poupados.
Além do momento mais íntimo e caseiro, o músico novamente acatara a um pedido da filha e a levara para a calçada de Candem Town para que os dois cantassem algumas músicas juntos. A menina de agora oito anos de idade, se divertia e tinha os olhos e o sorriso mais iluminado enquanto levava mensagens para as pessoas. Daquele sentimento, ambos compartilhavam e aquilo alegrava de uma forma inexplicável.
No entanto, de todos os momentos que passou com Car, o melhor fora no dia em que a filha iria voltar para a casa da mãe em Wenlock. se surpreendeu totalmente quando a filha o pegou pela mão e o levou para o sofá, dizendo que precisava conversar seriamente com ele.
- Papai, eu preciso ser sincera... – Carrie disse, séria. queria sorrir, até rir da postura madura da filha, mas ele apenas cruzou as pernas e passou a mão pela barba por fazer.
- Sejamos sinceros, então, pequena. – incentivou que ela falasse.
- Eu só queria dizer que... ah, papai, eu gosto tanto da . Sabe? Ela é uma rainha e eu tenho certeza que ela vai cuidar muito bem de você. – fez uma pausa. – E eu queria que ela cuidasse de mim também. – falou um pouco mais baixo.
- Você queria o quê? – juntou as sobrancelhas.
- Quero morar com você, papai. Londres é o nosso lugar, é a nossa casa. – Carrie sorriu sinceramente. – Eu quero morar na London Eye, aliás.
riu da vontade da filha. Ela realmente tinha se apaixonado por aquela roda gigante e pela vista da cidade no topo dela. O pai sabia que a filha pertencia aquele lugar, pertencia ao mundo que ele idealizara, um mundo em que era músico, pai e feliz.
Oh Woah, Stuck here, sitting in the back seat,
Oh Woah, And I'm blazing on the street,
What I do isn't upto you,
And if the city never sleeps then that makes two.
Fim?
Nota da autora: Hey, strangers rs Espero que tenham gostado. Não consegui fugir da situação que levou essa letra ser escrita, mas dei uma romantizada, rs Comentem para que eu fique feliz *-* rs xxx
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