Última atualização: 29/08/2018

Capítulo Único

There is not enough time, where are you going (E X O, WE ARE E X O)
Não há tempo suficiente, para onde você está indo(E X O, NÓS SOMOS EXO)
There is no time to rest senselessly (E X O, WE ARE E X O)
Não há tempo para descansar insensatamente (E X O, NÓS SOMOS EXO)
In this chaotic world, do people cause all these commotions?
Nesse mundo caótico, as pessoas causam toda essa comoção?
Prepare to change the world
Prepare-se para mudar o mundo

Day 1



- Droga!
Ele murmurou enquanto corria o mais rápido que suas pernas conseguiam. Os passos atrás de si eram constantes, podia ouvir os gritos de ordem dos militares que o perseguiam, além do som de pés pisando em poças e lama. O corpo pequeno e magro do rapaz se esforçava para vencer a tríade de policiais pelo menos na velocidade. As fugas nunca foram seu forte, mas ainda assim deixou-se se envolver nas ideias mirabolantes de e de pichar os muros daquela cidade desconhecida.
“Esse lugar precisa de resistência! Da nossa marca!”
se recordou claramente das palavras dos amigos que quase sempre acabavam premeditando problemas. Acontece que protestar era o ponto fraco do garoto e a necessidade de ir contra ao governo que regia e destruía a vida de toda a população era mais forte que o seu bom senso (considerado um dos melhores do grupo, inclusive). Era por isso que estavam ali, afinal.
A chuva voltou a cair e estava ficando cansado de correr. Naqueles momentos, ele sempre se lembrava de seus pais. Não podia desistir, na pior das hipóteses ele iria brigar com aqueles caras, o confronto corporal era seu ponto forte. Quando sentiu que suas pernas não aguentariam mais o ritmo intenso da fuga, foi obrigado a diminuir a fim de poupar energia para a briga e foi nesse momento que viu em um beco escuro uma sombra miúda o chamar. Não houve tempo para pensar nas consequências, ele apenas seguiu o vulto, enfiando o corpo entre duas paredes estreitas e sentindo a dor do impacto das laterais seu corpo contra o concreto. Seus olhos se fixaram na figura pequena de uma garota, ela era rápida ao passar por ali, como se estivesse acostumada a estreitar seu corpo por entre as paredes e pular os pequenos obstáculos que pareciam terem sido estrategicamente colocados ali.
- Ele entrou para o beco da gata! - Ouviu um dos policiais gritarem. Eles pareciam mais distantes, mas não cessavam a perseguição.
- Rápido, por aqui. - Ouviu a voz baixa e rouca da garota a sua frente, ela estendeu a mão para ele que não pestanejou em agarrá-la.
Logo, foi arrastado para um espaço menor tendo que se abaixar para conseguir passar, era uma espécie de buraco na parede que dava para um cômodo de uma casa abandonada, a garota se esgueirava rapidamente, sem perder o ritmo e prendendo fortemente os dedos nos dele, puxou-o para outro buraco um pouco maior que o anterior. sentia-se em um labirinto de concreto, passando por casas abandonadas, buracos na parede, becos estreitos e escuros, escadas mal feitas até chegarem a uma cerca de arame. O rapaz já nem sabia se continuava sendo seguido, estava ludibriado pela rapidez e agilidade da menina em passar por todos aqueles caminhos esquisitos.
- Depois daqui estaremos seguros - Ela disse olhando para o rapaz, era a primeira vez que ele vislumbrava o rosto da garota, não parecia ser muito mais nova que ele, talvez tivessem a mesma idade, os traços eram belos, mas marcados pela dor e sofrimento característico da população local. - Espero que saiba escalar - Ela disse antes de cravar os dedos nos espaços da grade de arame e subir como uma gata traiçoeira. De repente ‘o beco da gata’ fez todo o sentido na mente de .
Ele não se deu muito tempo para pensar, também cravou os dedos nas grades e usou de toda sua força para subir, não era ágil como ela, mas sem dúvidas era forte e conseguiu se virar rapidamente pulando para o outro lado. Depois disso, ela subiu uma escada na ponta de um morro e entrou numa espécie de cabana com ele ao seu encalço. O lugar era um tanto sujo e desajeitado, não era muito diferente dos esconderijos que costumava ficar, o cheiro de comida quente lhe despertou o estômago e tendo parado de correr, finalmente pode notar o estado deplorável em que se encontrava. Roupas amassadas, encharcadas, sujas de lama, botas imundas, arranhões que começavam a doer, mas não mais que suas pernas cansadas demais pela correria.
- Sente-se - Ela apontou para uma cadeira velha que ficava junto a uma mesa pequena. - Pode relaxar agora, eles perderam a gente antes mesmo da metade do caminho, além do mais, eu coloquei algumas armadilhas mais cedo, duvido que terão força ou paciência o bastante para sequer tentar nos procurar.
Como se finalmente voltasse aos seus sentidos, o rapaz hesitou em fazer o que ela disse, olhando para a cadeira como se fosse um alienígena. Percebendo a reação do rapaz, a garota riu em um som tão baixo que a chuva quase camuflou.
- Relaxe, eu não vou machucar você - Ela o olhou de cima a baixo. - Você precisa se secar.
Ela disse antes de sumir por outra porta que até então havia passado despercebida pelo rapaz. Silenciosamente, ele optou por se sentar, mesmo estando molhado e sujo, o cansaço estava vencendo seu corpo, ainda assim, sabia que não podia deixar a guarda baixa. Sua intuição dizia que a bela garota não era problema, na verdade, ela parecia ser alguém como ele, da resistência. O que o deixava desconfiado era a falta de outras pessoas ou algum sinal de que a garota não vivia por si só. Não era normal opositores ao governo andarem sozinhos, era perigoso demais.
- Aqui está - ela estendeu uma toalha e um casaco grande e grosso. - Era do meu pai, vai te ajudar a se esquentar - Ele notou que a garota havia trocado as roupas sujas por vestes mais quentes e limpas, ainda que surradas.
- Obrigado - era a primeira vez que ele dizia algo, sua voz saiu mais rouca do que o normal. Ele pegou as peças da mão da garota que sorria docemente. Em uma época como aquela, não era comum receber aquele tipo de gentileza. Tempos hostis, nem mesmo caridade mascarada em atos falsos eram comuns, apenas violência e os instintos primitivos da sobrevivência mantinham as populações mais pobres dos chamados guetos. - Não tenho nada para lhe retribuir - ele disse ainda desconfiado pela bondade da garota.
- E eu pedi algo em troca? - Ela respondeu ainda sorrindo, a facilidade do riso dela o amedrontava. - Sei que deve estar com muitas dúvidas, mas é melhor se esquentar antes que eu as responda, enquanto isso, vou terminar a refeição que vinha fazendo antes de te encontrar, fique a vontade para usar o outro cômodo ou explorar a casa.
não tinha como negar, percebia que estava a mercê da garota e sua gentileza suspeita. Obedientemente, levantou e foi para o cômodo pelo qual ela havia saído anteriormente. Era um quarto até espaçoso, observou que em um dos cantos havia outra porta que dava para um banheiro simples. Ele foi até o local, o corpo molhado tremia pelo frio, mas ainda sentia a necessidade de tirar um pouco da sujeira que lhe impregnava o corpo. Com cuidado, depositou a toalha e o casaco em um canto seco, tirou os sapatos sujos e as meias, dobrou a barra enlameada das calças, depois tirou o casaco molhado ficando apenas com a camiseta suja e surrada, lavou as mãos, os braços e o rosto na pia e fitou sua imagem no espelho. O cabelo muito preto grudava na testa, arranhões na bochecha e nos lábios denunciavam as incontáveis brigas que se envolveram nos últimos dias. Nas mãos e nos braços, marcas da resistência: cicatrizes, mais arranhões e a famosa tatuagem que entregava a sua filiação. A imagem hexagonal cujas linhas formavam o nome do grupo de jovens contra o governo autodenominado EXO.
O rapaz pegou a toalha e se secou esfregando um pouco da sujeira para longe, além da água da chuva que esfriava sua pele. Rosto, braços e pés. Secou tudo o que podia antes de vestir o enorme casaco. O calor foi quase instantâneo. já se sentia revigorado. Com isso, respirou fundo. Tinha que avisar aos seus companheiros que estava bem, seguro. Olhou para a porta do banheiro verificando se a garota não estava por perto antes de tatear os bolsos das calças surradas a procura de um pequeno telefone celular. Discou o número que fora obrigado a decorar antes de sair do esconderijo e esperou chamar.
?” Ele sussurrou contra o aparelho assim que foi atendido.
“Yah! Onde você está, há horas e chegaram aqui sem você!” O rapaz respirou aliviado ao saber que seus companheiros estavam a salvo.
“Não se preocupe, hyung. Estou escondido em um lugar seguro. Não quero dar detalhes, mas eu encontrei uma garota que faz parte de uma resistência local, ela me abrigou em sua casa”
“Uaaaau! Não sabia que você escaparia desse jeito, … Espertinho!” Ele ouviu a voz de ressoar e apenas revirou os olhos.
“Não é nada disso que você está pensando, seu idiota! E saiba que vou acertar as contas com você e mais tarde!” ele resmungou tentando controlar o volume de sua voz.
“Fique aí pelo tempo que precisar, , por hora está perigoso sair dos esconderijos, não sei por quanto tempo ficaremos aqui, mas receio que levará alguns dias. Se puder fique aí e descubra rotas de fugas dessa cidade. Vamos precisar. Quando a poeira abaixar, te passo as coordenadas para irmos embora.” ordenou, o tom sério característico de quando as coisas não estavam indo bem assustaram o rapaz.
“Tudo bem, mando notícias. Para qual número eu ligo?”
“Vamos nos comunicar pelo celular 6” era comum para eles trocarem os meios de comunicação, evitava que fossem pegos pelos radares da polícia. Todos os participantes do EXO tinham que decorar alguns números de celular antes de saírem do esconderijo.
“Certo! Tenho que desligar”
não esperou. Desligou o aparelho e o enfiou de volta no bolso.
- Seu amigo tem razão quanto a sair daqui - ouviu a voz já familiar da garota vir de trás de si. O susto o fizera sobressaltar arrancando uma risada gostosa da menina. - Você é muito desconfiado, .
- Há quanto tempo está aí?
- Não muito - ela deu de ombros encostando-se na soleira da porta. - Queria apenas avisar que o jantar está pronto, mas foi bom descobrir que você é um EXO. E não se preocupe, eu sou uma sobrevivente da resistência desse lugar. A única.
As feições desconfiadas de deram espaço para a dor, o terror e a compaixão. Sim… Como ele não poderia ter percebido antes? Ela era mais parecida com que ele do que imaginava, sendo a última de mais um dos diversos guetos cruelmente aniquilados pelo governo e seu modelo maldito de higienização social que visava eliminar a parcela mais pobre da sociedade, como se isso fosse trazer a prosperidade da nação. Todos aqueles que foram de encontro à nova ideologia “da paz” foram perseguidos. Poucos conseguiram escapar.
- Qual o seu nome? - Ele perguntou após os minutos de silêncio constrangedor.
- . . E o seu?
- . - Ele estendeu a mão que foi aceita rapidamente. - Desculpe por me apresentar só agora.
- Está tudo bem, não é como se tivemos tempo para isso - ela respondeu. Quando largou a mão do rapaz, deu um passo para trás e se virou. - Termine de se trocar tranquilamente e venha comer, depois conversamos mais.
Ela era mandona. constatou logo. Suspirou conformando-se de que iria tolerar o temperamento da garota durante um bom tempo a partir de agora. Ele fez como foi mandado. Assim que se sentiu pronto, confortável e aquecido, dirigiu-se até a sala principal por onde havia entrado. esperava por ele com um semblante animado, ele não evitou um sorriso pequeno, quase imperceptível ao ver o esforço da garota em compor uma mesa com o pouco que tinha. Duas tigelas de arroz, dois pratos fundos com uma espécie de sopa que fumegava e dois copos de água. Ele observou o bom estado de alguns dos objetos em comparação com os outros. Provavelmente, fazia muito tempo que ela não recebia ninguém naquele lugar. Sem pedir permissão ele se sentou na cadeira velha de frente à moça. A mesa era pequena, então ficavam perto demais, o suficiente para reparar nos detalhes que ele não havia percebido antes. Os olhos fundos em olheiras arroxeadas, os traços finos do nariz e da boca, as mãos pequenas e calejadas. Ela tinha tantas marcas em tão pouca pele exposta. se perguntou quais seriam as cicatrizes por baixo da pele.
- Eu não sei está muito bom, mas é o que temos… - ela disse um pouco tímida e ele sorriu, assentindo. Sendo o homem de poucas palavras de sempre, apenas deu a primeira colherada.
- Está bom! - Ele disse surpreso e com boca cheia, ela sorriu e iniciou a própria refeição.
não tirava os olhos do rapaz enquanto comia. Parecia que estava preso há dias sem alimentos. Comia de um jeito rápido, desesperado. Não vetou que repetisse até se esgotar de forças para comer. Ela sorriu, havia tempos que não comia não companhia de alguém. Na verdade, fazia tempos que podia desfrutar da presença de alguém. Assim que terminou, olhou para a garota. A comida ainda pela metade e as panelas em sua volta, vazias. Ele se envergonhou.
- Desculpe… - ele iniciou tímido, o rosto virado para baixo. - Eu comi tudo na empolgação…
- Não tem problema, não estou com muita fome. - ela riu e ele pensou que a garota era mais simpática do que parecia. - Além do mais, ver você comer é satisfatório.
A pele branca demais corou, da base do pescoço até as orelhas. E se encolheu inteiro na pequena cadeira. A garota ria de seu desconcerto, como se fosse extrovertida e desgarrada. Provavelmente era, ao contrário dele, que sempre fora o rapaz calado e tímido da turma. Ele reclamou baixinho até que ela parasse murmurando que ia terminar rapidamente sua refeição para terem o merecido descanso. Haveria tempo para conversa no outro dia, então ele não precisava se preocupar. Assim ela o fez, sem muita demora. A menina lavou as vasilhas e preparou um quarto para o rapaz, o colchão era velho, mas para parecia o paraíso, o ápice do luxo. Ela lhe sorriu dizendo para que descansasse, o próximo dia seria longo. teve a impressão que por ali, todos os dias eram longos demais. Então, permitiu-se repousar.

Day 2



Não era fácil largar o costume de acordar cedo. Sempre fugiam pela madrugada e noites mal dormidas eram tão comuns que faziam parte da saúde de seu corpo forte demais para a vida que levava. A escuridão tomava a pequena casa e o barulho da chuva intensa que caía desde o dia anterior ressonava pelos cômodos junto a palavras e gemidos desconexos que ele soube identificar logo, eram da tal . Apavorado, ele seguiu o som. Seus sentidos gatunos ativados para que não fizesse barulho. Nesses momentos, ele pensava como a ditadura havia acabado com o ser humano que ele poderia ser. Não era justo que nenhum jovem soubesse se camuflar no silêncio, não era justo que nenhuma pessoa tivesse tantas marcas no corpo. Não era justo que uma meia dúzia de homens babacas decidissem o destino de toda uma população baseado em seu DNA imperfeito e propensões a algumas doenças ou marcas de raça.
Não era justo que uma menina tão doce, pequena e bonita como ela estivesse gritando o nome dos pais em meio a uma noite escura sabendo que jamais seria atendida.
Foi o que ele pensou quando finalmente alcançou o quarto da garota. Quase tudo intocado e limpo com esmero, ela deitava sob uma cama boa, remexendo-se entre os lençóis. Quando chegou mais perto viu que ela chorava. Mordeu o lábio. Ele mesmo passou por momentos assim antes de entrar para o EXO. Quando viu seus pais morrerem lutando apenas por ter um filho que não se encaixava nos padrões. Era culpa dele. Compadecendo-se da dor da garota, a tocou no ombro e balançou o suficiente para que ela pudesse despertar. Assustada e atônita, ergueu o corpo apenas para abraçar o rapaz a sua frente, em uma tentativa desesperada de sentir-se segura pelo menos uma vez. Estava molhada de suor e lágrimas, sentiu a umidade em suas roupas quando tocou levemente sua cintura deixando que ela grudasse ainda mais em seu corpo.
Era a primeira vez que tinha um contato tão próximo com uma garota.
Mesmo que fosse um pouco errado de sua parte, não evitou ficar nervoso ao tê-la tão próxima. O coração disparado de encontro ao seu, um rosto fundo em seu pescoço, chorando e soluçando. Aquilo não era bonito ou romântico. Porém, de certa forma, trazia um pouco de esperança na realidade de caos e tristeza em que viviam. A possibilidade do amor florescendo entre a destruição.
- Shhh… Está tudo bem - a voz grave do rapaz era conforto puro. Ele ousou levantar a outra mão até os cabelos dela, acariciando superficialmente os fios. se acalmou em pouco tempo, bem mais rapidamente do que nos dias normais em que era abruptamente acordada pelos próprios pesadelos. Assim que se sentiu melhor se afastou do rapaz. O rosto corando pela proximidade repentina.
- Oh céus… M-Me desculpe, eu… - ela gaguejou por um momento até ser interrompida por um sorriso cálido do jovem. Era a primeira vez que ela sentia algum sentimento real vindo dele. Seu sorriso era encantador, daqueles que tirava o ar. E ela sentiu a respiração escapar.
- Não precisa dizer nada… Eu sei o que está passando - a sinceridade dele era doída. Crua demais.
Ela abaixou a cabeça, acenando afirmativamente em uma resposta muda de quem entendia do que ele falava.
- Eu vi meus pais morrerem enquanto me protegiam do governo - ouviu o garoto falar. O coração se apertando no peito, ela levantou o olhar para encarar o sorriso triste que havia aparecido nos lábios do rapaz. As lágrimas eram inevitáveis a elas. Admirou a força de ao narrar, sem tremer a voz, a triste história de sua vida. - Meu diagnóstico nem era tão ruim. Tendências a diabetes. Mas a raça asiática pesou… Sorte ou não, eu consegui fugir, vaguei por muitos guetos até me encontrar os caras.
- Eu sinto muito… Mas também fico feliz por não estar sozinho mais - ela disse ainda com lágrimas nos olhos. A garota mandona de antes não parecia tão forte assim agora. - Nossas histórias são parecidas, minha avó morreu de câncer e o sangue que corre em minhas veias é latino.
Por alguns segundos, ele analisou as feições da garota, lamentando o infortúnio daquela família de ir parar em um país como aquele. O mundo lá fora parecia ser impossível de alcançar. Em um regime fechado de todos os cantos, pensou que nem a falecida ONU poderia ajudar. O planeta estava em caos de qualquer forma e, segundo seus pais, foi a escassez de recursos que levou a tragédia aos pobres minoritários. Precisavam diminuir a população mundial. E como fazer isso senão selecionando os melhores humanos para sobreviver na capital enquanto os restos, residentes de guetos, apodreciam de fome ou eram assassinados pelas mãos de militares. Malditos militares e seu regime lobotomista.
- No início, o gueto sobrevivia bem, mas a chegada de um capitão bagunçou tudo… Ele queria acabar com a nossa gente e usou os nossos diagnósticos para conseguir liberação do governo… Eles iam autorizar de qualquer forma, mas…- ela respirou fundo e sentiu a necessidade de abraçá-la novamente. Faltou-lhe a coragem. - Não é justo… Eles mataram um a um e eu fui a única sobrevivente.
Aquela devia ser a primeira vez que contava sua história a alguém. A primeira vez que uma pessoa se dispunha a ouvir os relatos desesperados de uma realidade cruel. Ele nunca havia ouvido falar de um gueto inteiro dizimado daquela forma, uma sobrevivente, tão jovem, tão forte. queria saber escolher palavras melhores para confortá-la.
- Que bom que encontrei você - foi o que ele conseguiu dizer.

(...)

Ao final da pequena conversa, eles se renderam a mais algumas horas de sono. só se deu conta que dormira fora da cama que lhe foi destinada quando abriu os olhos para a figura imponente de de pé ao seu lado. As mãos pequenas na cintura e um sorriso brilhante fincado no rosto. Ela balançou seu ombro como ele havia feito naquela noite com ela. Sua irritação evidente não afastou a garota que, além de incomodá-lo com toques desnecessários, começou a falar.
- Hey! Vamos, temos muitas coisas a fazer - Ela começou movendo o rapaz mais forte. - Quero dizer… Nem tanto, mas vamos!
- Como consegue tanta vitalidade tão cedo? - o rapaz reclamou rolando pelo espaço até cair no chão. - Ouch!
Ele reclamou sob os risos divertidos da garota. Sentiu-se obrigado a se levantar, dada a pequena humilhação. Em um movimento exagerado e rápido, ele se pôs de pé.
- Então, o que são essas ‘muitas coisas a fazer’? - ele perguntou estalando o pescoço e massageando os ombros.
- Na verdade, vou me aproveitar de você… - o tom malicioso dela fez o rapaz corar, ela andou para fora do cômodo com ele em seu encalço indo até a pequena cozinha ou sala de jantar. A mesa estava servida com um pouco de chá e um pão para cada. Uma refeição grandiosa considerando a situação dos guetos que já vira no passar de sua jornada.
- Eu preciso que você vigie o território enquanto estou fora para procurar comida - ela começou enquanto o rapaz comia - depois, vamos sair um pouco da cidade e ir até o rio para tomar banho direito. A água aqui é bem restrita, quero poupá-la para a comida e coisas mais simples. Mas temos que ser cuidadosos, raramente os policiais passam dos limites da cidade, porém nunca se sabe...
Ele assentiu com a boca cheia, naquela posição, não poderia rejeitar nada a pequena garota.
- Temos que lavar sua roupa também, você pode usar as do meu pai enquanto isso.
- Realmente, são muitas coisas. - ele disse suspirando ao fim da refeição. Ela sorriu, terna. Pensava que vê-lo satisfeito era algo bom. A garota observou alguns dos arranhões pelos braços, mãos, rosto e pescoço e fez uma nota mental de conseguir alguns recursos médicos.
- Certo! Vou lhe explicar o que deve fazer - ela disse levantando e recolhendo os objetos usados. Ele limpou a boca com as costas da mão e prontificou seus ouvidos. - Você ficará escondido entre algumas casas antigas mais na frente do território do nosso gueto. No caminho podemos achar alguma arma, um pedaço de madeira, algo que possa te proteger. Vai ficar lá até eu voltar com a comida. Prometo não demorar muito. Quando eu chegar, vai ouvir um assovio e três batidas com o pé - ela demonstrou assobiando baixo e fino, como um pássaro e, depois, batendo o pé esquerdo no chão três vezes. - Caso eu estiver em apuros e você precisar fugir, será o assovio e apenas uma batida com o pé, certo?
- Certo! - não se orgulhava em dizer que estava acostumado àquele sistema de códigos. Muitas vidas dependeram daquilo.
assentiu. Em pouco tempo, caminhavam vagarosamente pelo labirinto de concreto pelo qual passaram no dia anterior. Sem a correria, o rapaz viu facilmente cada detalhe do lugar. Eram casas abandonadas, paredes reforçadas com cimento que se juntavam formando acoplados de cômodos estranhos e de difícil acesso. Aparentemente, o gueto dizimado havia construído aquilo para proteger algumas pessoas, ou somente aquela garota. Não sabia dizer. Porém, era como se apenas fosse capaz de andar tranquilamente por ali. A maior parte dos policiais eram altos e corpulentos demais, nunca iam conseguir passar pelas passagens secretas criadas ali. Além disso, o caminho era longo e confuso, sabia que não poderia deixar o seu posto, ou iria se perder.
- Certo, fique aqui de olho na entrada do beco, voltarei o mais rápido possível e não se esqueça do nosso sinal - ela disse séria e baixa, esperou que ele concordasse para sair em disparada para fora do lugar. sentiu-se como um fardo ao vê-la correr e passar pelos corredores cimentados como se estivesse caminhando em uma rua. Possivelmente, era a pessoa mais ágil que já conheceu na vida.
Ao perdê-la de vista, voltou-se a tarefa designada. Vigiar o gueto não parecia ser algo complicado, afinal, pessoas normais não se atreveriam entrar por aquelas bandas e a patrulha policial era burra demais para achar seu esconderijo. Então ele relaxou, pensando nas milhares de coisas que aconteceu nos últimos dois dias. Ficar sozinho com uma garota era a grande novidade e talvez o ápice de sua vida juvenil. Pensou no que os garotos do EXO diriam daquilo ou se aceitariam no grupo, ela seria a primeira menina entre os jovens. temeu. A atenção seria voltada a ela, teria que dividi-la com os outros rapazes, muito melhores e mais bonitos que ele. Tão problemático… Sua linha de pensamentos foi cortada pelas vozes masculinas que ouviu de um dos lados do labirinto.
- Acho que ela passa por esse caminho, talvez consiga terminar de mapear tudo em poucos dias - uma das vozes se gabou, se afundou em seu pequeno esconderijo. Eles estavam perto demais para que ele se sentisse seguro.
- Ótimo! Se tudo der certo, iremos pegar essa garota logo! - outro bradou com uma risada nada amistosa.
O suor escorreu frio pela testa do rapaz, o sangue correndo rápido em suas veias. Desesperado e com medo do que poderia acontecer. Por enquanto, ele apenas poderia ficar ali observando os soldados pretensiosos e crueis, rezando para que não cruzasse o caminho daqueles monstros em sua volta. De qualquer forma, também se preparava para uma batalha. Se fosse necessário, quebraria todos os ossos do corpo para salvar a garota que fora tão generosa com ele. Se antes a ideia de levá-la até o EXO era uma mera hipótese, agora era uma meta, uma solução e a garantia de segurança da menina.
Com os olhos observadores de uma águia e os ouvidos concentrados, ele se esforçou para colher o máximo de informação possível. Lamentavelmente, não ouviu nem viu muito. Os policiais apenas pareciam satisfeitos, em poses arrogantes eles sorriam de frente as paredes de concreto como se estivessem a um passo de resolver os segredos por trás dali. só conseguiu respirar fundo quando viu os homens debandarem. A adrenalina ainda correndo solta em suas veias, não demorou muito para aparecer. Um assovio e três batidas com o pé e ele pulou para fora do esconderijo para encontrar a garota sorridente que carregava dois sacos de suprimentos quase maiores do que ela. O rapaz suspirou aliviado, controlando suas vontades nada inteligentes e até inconvenientes de abraçá-la. Sem dizer nada, ele apenas pegou os sacos, usando um pouco de sua força maior que o normal para facilitar a entrega. Viu as feições de se entortarem em contragosto e desconfiança, mas ela deixou passar. Aquilo estava pesado demais para alguém tão miúdo, ele notou admirado.
Seguiram para casa em silêncio.
Com ela observando de lado a expressão preocupada demais do rapaz.
- O que houve com você? - perguntou assim que chegaram em casa, ele depositava as sacolas com delicadeza no chão. Pela pequena abertura, vislumbrou pães, farinhas, batatas e alguns medicamentos.
- Enquanto observava a entrada alguns guardas apareceram, eles parecem estar mapeando o beco para pegar você - o olhar sério dele assustou a garota, não porque ela estava preocupada com os policiais, mas por encontrar naqueles olhos um cuidado que não via há muito.
- Está tudo bem, eles fazem isso desde que o lugar foi reformado, jamais vão me achar - o garoto suspirou e se aproximou da menina. As mãos encontrando os ombros dela ao qual ele apertou carinhosamente.
- Não está tudo bem. Você é um alvo aqui. Está correndo perigo, por mais que eles não conseguiram nada até agora, estavam confiantes demais - agora estava irritada. Quem aquele garoto era para dizer que o labirinto construído pelos seus companheiros, sua família, não era capaz de protegê-la!?
- O que quer dizer com isso, ? - ela se afastou das mãos dele - Está dizendo que o que os meus companheiros fizeram por mim, minha família, foi tudo em vão? Que eles se sacrificaram para proteger isso aqui. A mim! Foi inútil?
- É claro que não! - levantou a voz um tom e logo se arrependeu vislumbrando o olhar assustado e ferido da garota. Ele suspirou fundo e fechou os olhos, precisava das palavras certas, e ainda assim tinha a impressão que não seria o suficiente para fazê-la deixar o lugar e partir com ele - O que eu quero dizer é que você não precisa ficar sozinha mais. É perigoso. E eu tenho certeza que eles concordariam comigo.
- Desculpe, . Mas eu não posso deixar esse lugar - ela se virou de costas, escondendo a única lágrima que caia de seus olhos. Respirando fundo e se concentrando para não deixar tremer a voz, ela continuou - Prepare-se para irmos ao lago.
viu a garota correr para um dos poucos cômodos, as lágrimas marcando o chão em que ela pisava. O rapaz suspirou fundo mais uma vez. Aquela menina ainda lhe daria muito trabalho.

Day 4



Ele suspirou pela décima vez naquele dia. Desde a conversa que tiveram sobre ela deixar o lugar para se juntar a ele, o rapaz esteve recebendo apenas silêncio como resposta a toda e qualquer ação. Até mesmo no dia anterior, quando se dispôs a cozinhar, não houve elogios ou críticas, brincadeiras, sequer um agradecimento. Era ainda mais desconfortável quando a garota ainda parecia se esforçar para ajudá-lo mantendo-o tranquilo na casa que era dela. A situação começou a ficar insuportável para ele que tentava a todo custo arrancar mais do que cinco palavras dela em um espaço de duas horas. era mais difícil de lidar do que imaginava e sua paciência não era eterna.
Não conseguiu dormir bem, o sentimento incessante de que algo daria errado em algum momento continuava atormentar sua mente e fechava seu peito a cada respiração inconstante e afobada. Levantou-se ainda de madrugada e perambulando pelos pequenos cômodos, os barulhos incômodos de se mexendo na cama do quarto ao lado chamaram a atenção do rapaz mais uma vez. Da fresta da porta, podia observar a garota, parecia mais um pesadelo, como o que ele flagrou na primeira noite em que dormira ali. Sentiu como se precisasse de se esforçar mais para convencê-la. Voltou até a cozinha para pegar um copo de água e foi até o quarto da menina, abrindo a porta devagar. A imagem frágil de uma com a testa suada enquanto se debatia entre os lençóis era cortante. Ele se sentou no colchão e colocou a mão delicadamente na testa dela limpando os fios úmidos grudados ali. Como da última vez, ela acordou em um sobressalto. Confusa, olhou para a face triste e irritantemente bela de , o olhar preocupado fez o coração da menina disparar.
- O que faz aqui? - ela perguntou olhando para baixo, sentia seu corpo suado e grudento, a respiração ofegante pelas imagens horrorosas que insistiam em atormentar seus sonhos.
- Vim trazer isso - e ele estendeu o copo com água. se perdeu por alguns segundos naquele copo antes de pegá-lo e beber todo o conteúdo de uma só vez, sentindo o líquido derramar-se em sua garganta, acalmando aos poucos seu corpo ainda cheio de adrenalina.
- Obrigada - ela respondeu, simplesmente. Levando alguns minutos para se recuperar, ela fitou o garoto, o olhar ainda baixo, esforçando-se para decifrar a expressão de . - Eu te acordei? - ela perguntou como se fosse a única explicação para o ato de gentileza depois do tratamento infantil e mudo ao qual ela o submeteu.
- Não - ele respondeu em um suspiro e desviou o olhar do dela - não consegui dormir e enquanto andava pela casa, escutei você tendo pesadelos de novo.
- Hum - grunhiu ainda sem saber o que falar. Antes de aparecer em sua vida, ela podia jurar ser a pessoa mais forte do mundo. Tinha certeza que superaria qualquer sonho e que era uma questão de tempo até que seus pesadelos sumissem e elas se acostumar com a ideia de estar sozinha. Afinal, ela ainda era cercada pelo amor de todas as pessoas que deram a vida para salvá-la. Porém, olhando para o rapaz daquele jeito, tão perto, protetor, tão… Bom. Ela não se sentia tão forte assim. - … - ela sussurrou chamando a atenção do garoto - como você fez para superar isso? Para se sentir forte de novo?
- No início, eu também sonhava com as coisas que aconteceram comigo. Meus pais sendo assassinados e o medo de ser o próximo… - ele suspirou e abriu um sorriso pequeno para ela. Fofa, ainda que suas feições transbordassem valentia, a menina era o ser mais adorável em que já pôs os olhos. Incapaz de controlar seus atos, envolveu as mãos dela nas suas. Pareciam minúsculas entre seus dedos calejados. corou com o toque suave e carinhoso - Mas quando me juntei aos caras, vi que não precisava me preocupar tanto. Eles estariam lá por mim assim como meus pais estiveram uma vez. Quis ficar forte para protegê-los e não perder ninguém de novo. E agora… Eu quero proteger você.
A garota sentiu o sangue circular da cabeça aos pés. Tingindo ainda mais o rosto de vermelho, fazendo o coração disparar, a boca ficar seca e várias coisas passarem em sua mente. Há quanto tempo não tinha aquilo? Carinho, toque, gente. Por quanto tempo ela esteve completamente sozinha? A mercê da sorte e das próprias habilidades que nem sempre eram suficientes. Ela apertou as mãos nas deles. Sentiu os calos, marcas de luta, de dias difíceis. Sentiu no olhar e no calor que ele falava sério e confiou naquelas palavras.
- Você não pode ficar aqui? - se sentiu a pessoa mais egoísta do mundo. Mordeu o lábio arrependendo-se de dizer aquilo. Estranhamente, manteve um sorriso enigmático nos lábios.
- Eu sabia que você gostava da minha presença aqui! - ele retrucou, os olhos brilhando de orgulho.
- Yah! - a garota puxou a mão de volta e se afastou dele, cruzando os braços e virando a cara como uma criança pequena. Aquilo fez querer rir, mas ele conteve - é s-só q-que… Eu não quero ficar sozinha.
A confissão dela saiu baixa, porém dolorida. O rapaz entendia aquilo. Aqueles sentimentos.
- É por isso que eu quero levar você comigo - soltou em um suspiro pesado - Eu não posso deixá-los, são minha família… Mas eu já disse, eu quero proteger você! Não precisa dar a resposta agora, só pense com cuidado.
Ela concordou com a cabeça e o rapaz se permitiu levantar-se da cama recolhendo o copo que jazia vazio há algum tempo ali. Antes que ele pudesse sair do cômodo, ela tomou ar para falar novamente, chamando a atenção do garoto.
- Você acha que eles vão gostar de mim?
sorriu e mordeu o lábio. Fechou os olhos lembrando-se por um momento dos garotos que lhe faziam companhia na empreitada perigosa que escolheu viver.
- Mais do que eu gostaria - respondeu.

(...)

O plano era o mesmo de antes. iria buscar comida enquanto vigiava de um esconderijo a entrada para o beco. Nada parecia fora do lugar naquela manhã, afinal, estava praticamente certo que fugiriam do lugar em poucos dias. A garota até havia sugerido para que eles estocassem alguns mantimentos e dessem um jeito de levar algumas coisas importantes, como roupas e remédios, para onde o EXO estava escondido. Ele estava estranhamente mais alegre do que o normal. Sua empolgação, claro, passava longe de ser pela volta para casa e ele sabia que devia aquele sentimento explosivo no peito à pequena garota. Talvez porque seus olhos estivessem cegos de sonhos e devaneios com a menina que não avistou os dois guardas se aproximando, furtivos da entrada do beco. Para seu azar maior, um encontro imprevisto.
Assustou-se quando ouviu o som de sacolas caindo no chão e um suspiro mudo da garota que permeava seus pensamentos um pouco antes. Os segundos pareciam minutos e quando deu-se por si, já corria em direção à , rendida pelos homens, covardemente. Um deles segurava a garota contra o chão, joelho em suas costas, forçava o rosto delicado contra o asfalto. teve que pensar rápido, mesmo cego de raiva e desespero. Correndo por entre as paredes de concreto, fazendo esforço para manter o silêncio de seus passos. Ele finalmente chegou à entrada quando o segundo guarda sacava a arma. Um sorriso sádico brilhando na boca perfeita demais. O rapaz respirou fundo antes de surgir do concreto, para trás do homem armado e em um reflexo, desarmá-lo com toda a força cabível.
A confusão estava armada.
Assustado, o guarda que rendia se levantou, as mãos já indo até o coldre. Mas a garota se recuperava rápido e em lapso de força desferiu-lhe um chute direto na virilha. A arma caiu junto com o policial. Enquanto a garota chutava o revólver para longe. ainda desferia golpes incessantes no outro. O sangue espirrando, sujando suas roupas, suas mãos. Quase inconsciente, o rapaz tentava alcançar a arma jogada em um canto qualquer. Desesperada, a menina correu até , mais uma vez, chutou a arma para longe antes de puxar o rapaz pelo braço
- Vamos fugir! - ela disse e ele não ousou desobedecer. Largaram os dois rapazes agonizando no chão enquanto corriam para os muros de concreto. Um único tiro disparado pegou de raspão no braço esquerdo do rapaz que se esforçava para correr no ritmo de .
Não houve tempo para pensar muito. Como no dia em que se conheceram, ele apenas seguiu a menina esforçando-se ao máximo para chegarem em segurança ao esconderijo sede. Quando finalmente conseguiram respirar em alívio, notou o sangue escorrendo aos montes do braço dele. Com o alívio veio a dor, e levou a mão ao ferimento com uma careta dolorosa.
- Céus! Eles estavam armados! Atiraram em você! - ela gritou. O impulso falando mais forte, ela o guiou até a pia mais próxima e colocou o braço do rapaz sob a água corrente da torneira. só conseguiu respirar quando viu um corte não tão profundo. O estrago era menor do que o imaginado.
Delicadamente, ela fechou a torneira, pegando um pano limpo, limpou o corte sob as reclamações de . Ela tentou sorrir para dizê-lo que estava tudo bem, que iria cuidar daquilo e seu braço ficaria novo em folha. Porém, o susto não permitia. Cuidou do ferimento em silêncio enquanto ele fitava a imagem murcha dela como se pudesse perfurá-la. Depois de tudo, ela fitou o colo.
- Eles estavam armados… Policiais de patrulha nunca carregam armas… - ela sussurrou, sentindo a culpa corroer o peito por meter o rapaz em uma situação assim.
- Aqueles caras não estavam patrulhando, era uma armadilha - suspirou profundamente. Queria chorar. O medo de perdê-la, de vê-la morrer nas mãos daqueles cretinos ainda perturbava. Seus braços tremiam levemente em ódio. Apenas obrigou-se a se controlar ao observar as lágrimas tímidas de caírem em seu colo. Suspirou. A mão do braço não machucado estava ainda um tanto suja de sangue. Ele queria confortá-la com carinho, mas se recusava a sujar a pequena com aquele sangue. - Hey, não fique assim. Nós vamos fugir, encontrar os meninos. Vai ficar tudo bem.
engoliu o choro apenas para encontrar o olhar confiante demais de . Respirou fundo para que a voz não tremesse. Tinha chorado demais nos últimos dias e seus pais não a ensinaram assim. Tinha que ser forte.
- Promete que vamos fugir em segurança? - ela disse e ele sorriu, terno.
- Prometo.
Era tudo o que precisava ouvir.

Day 6



Depois do susto, agiu de forma rápida e precisa. Ligou para naquele mesmo dia, resumindo a história e apenas informando que levaria a garota com ele, custe o que custar. O rapaz riu do outro lado da linha, era incapaz de negar. Então, passou o plano para o jovem casal. Era simples, seguro e, o mais importante, possível. Dada as habilidades e conhecimento geográfico de e a força física de , eles provavelmente conseguiriam escapar sem mais problemas. Esperaram um dia para que o rapaz se recuperasse um pouco mais do ferimento e para que a garota juntasse toda a tralha que conseguia levar.
- Estou levando todas as roupas masculinas que encontrei pelo caminho - disse enquanto arrumava uma enorme sacola, no outro canto da sala estava a mochila com suas coisas e alguns medicamentos que conseguiu reunir. Seria difícil levar tudo, mas a garota estava tão confiante que sequer se preocupava com alguma adversidade.
- Os garotos vão gostar ainda mais de você - ele disse rindo, andou até a sacola e analisou o tamanho. - Falta pouco para partirmos, , há algo mais que queira levar ou fazer? - o tom de era leve, sabia que as partidas eram sempre difíceis.
parou por um momento. O peito apertava um pouco pela obrigação em deixar a cidade em que nasceu, em que foi criada. A casa de seus pais ficaria vazia, assim como o restante das construções ali. As memórias já passavam como um flash sob seus olhos e a urgência do choro foi controlada apenas porque estava cansada demais de derramar lágrimas. Não é o fim, é um recomeço. Ela repetiu as palavras como um mantra. Palavras, aquelas ditas pela sua mãe quando ainda era pequena demais e não conseguia entender porque tinham que deixar sua casa, sua escola, sua vida para morar em um gueto. sentiu um calor por todo o corpo e, se fosse um pouquinho mais louca, podia jurar que sua mãe estava a abraçando naquele exato momento.
- Não. Está tudo pronto - ela disse convicta e ele sorriu. se aproximou da garota, timidamente. Há um momento havia lhe ocorrido à mente que algo poderia dar errado e talvez pudesse ser a última vez que veria a menina. Não gostava de pensar naquilo. Estava confiante que o plano de daria certo, sempre dava. Era só que… Depois de tudo, sabia que contar com a sorte era um caminho perigosamente frustrante. Por isso, ele pegou as mãos de entre as suas. Estava ficando cada vez mais familiarizado ao toque, notou. A garota corou com o contato e com a forma que era olhada por . O coração disparou quando ele deu um passo à frente.
- , eu não sei o que vai acontecer daqui para frente. Então, queria, primeiro, agradecer por ter me ajudado naquele dia e por ter me acolhido aqui, ter dividido sua história comigo, por ter chorado e cuidado de mim quando me machuquei… - ele ousou um pouco mais e sorriu carinhosamente passando uma das mãos pelo rosto vermelho dela. Pensou que era bom ter uma menina tão bonita envergonhada assim por causa dele - Você é forte, mas ninguém vive sozinho e achei que merecia uma família nova, pessoas que possam te proteger. Eu quero fazer isso por você.
teve que lutar para dizer algo sem engasgar ou gaguejar, mas em um surto de coragem soltou-se das mãos dele para puxá-lo em um abraço. Passando as mãos pelo pescoço do rapaz, afundou levemente a cabeça na curva de seu pescoço. se arrepiou por inteiro, sentindo o nariz da garota acariciar sua pele levemente.
- Enquanto você estiver me ajudando, vou ficar bem. Está me dando uma família agora, … Coisas que eu não tinha o direito de querer antes… Obrigada - ela sussurrou e depois desvencilhou-se do abraço antes que ele pudesse respondê-lo. Conseguiu manter o olhar preso ao dele, mesmo com todo o ardor das bochechas certamente vermelhas - Agora que me puxou para sua vida, , não vou deixar você escapar.
E ele riu gostosamente.

(...)

- Certo, o plano é: vamos por trás do gueto até os limites da cidade, você vai indicar os caminhos mais difíceis e com a menor probabilidade de encontrarmos policiais, atravessaremos o rio e nos encontraremos com e os outros já na metade do caminho para a cidade vizinha. Eles estarão em um jipe verde esperando por nós. De lá seguimos viagem até o próximo esconderijo, onde o resto do grupo já estará nos esperando.
falava baixo, era a quinta e última vez que repassava as instruções. Estavam próximos a saída do gueto e, em breve, entrariam em terreno um pouco mais perigoso, a iminência de guardas deixava o rapaz meio tenso. Fitou a imagem concentrada e igualmente ansiosa de , a mochila enorme nas costas, quase do tamanho dela, levava as poucas coisas que ela tinha e poderia carregar. Por sua vez, tinha apenas a sacola de roupas em suas costas, amarradas contra o seu corpo.
- Caso algum policial apareça… Você vai fugir sem olhar para trás e eu resolvo.
Ela apenas balançou a cabeça positivamente. Odiava aquela parte ridícula de ter que abandoná-lo em uma situação tão complicada. Tentou argumentar, porém, foi cortada pelas duras palavras dele lhe dizendo que não ia conseguir ajudá-lo se ficasse, seria apenas um estorvo. , então, se calou, forçando-se a concordar com aquilo. checou as horas no celular antigo que carregava para se comunicar com . Pelos cálculos, já poderiam ir até o lugar marcado. O rapaz apenas assentiu e com um gesto pediu para que ela guiasse o trajeto.
A caminhada estava tranquila. Sem sinal de guardas. Eles não faziam barulhos, por isso foi fácil passar pelos muros que cercavam o grande gueto até a estrada principal para o limite da cidade. Passaram a correr. sentiu que podia respirar aliviada quando chegaram a metade do caminho, se passassem pelo rio sem mais problemas estariam, definitivamente, seguros. ainda estava concentrado, atento aos barulhos externos. Seu coração disparado lhe dizia que algo de ruim estava prestes a acontecer.
Sua intuição estava certa afinal.
Há poucos metros do rio dois guardas se encontravam de pé. Armas em seu coldre, pose de quem esperava para dar o bote, como uma cobra rasteira e venenosa. engoliu seco antes de olhar para a garota e fazer um pequeno gesto impedindo-a de seguir em frente, os dois homens não pareciam tê-los reconhecido ainda, já que não saíram do lugar. Era a única chance deles escaparem, ou somente ela. Para piorar, estavam estrategicamente posicionados no único ponto do rio em que o nível era mais baixo, possibilitando uma travessia tranquila. Ele tinha que pensar rápido.
- - ele chamou baixo e ela engoliu seco sabendo que coisa boa não viria, já notou os guardas ao longe e temeu pelo que o rapaz planejava - Preste atenção, vamos ter cuidado porque estão armados e não hesitarão em atirar. Preciso que você renda um enquanto eu cuido do outro.
A garota sorriu por ele tê-la incluído no plano e assentiu levemente com a cabeça. Ainda assim, era arriscado para ela. Não sabia como enfrentá-los frente a frente, apenas fugir.
- Eles não sabem que em eu sou, mas devem conhecer você. Então vista algumas roupas que tampem seu rosto, quando eles nos questionarem, atacamos, ok?
concordou novamente e pôs a mochila no chão, tirou de lá seu maior casaco com capuz e uma máscara de boca velha que sempre usava quando ficava doente. Vestiu-se e deixou que ele arrumasse seu cabelo e o restante das roupas até que ficasse suficientemente camuflada. também vestiu outro casaco, que escondesse melhor a tatuagem do braço, se descobrissem que pertencia ao EXO, jamais escaparia.
Ele apertou levemente a mão dela antes que pudessem seguir em frente de encontro aos policiais.
- Hey, vocês! - o mais alto dos guardas disse indo a frente - serão revistados. - a voz grossa e assustadora ordenou e eles pararam. foi ao mais robusto deixando que lidasse com o segundo, um pouco menor e mais magro. Deixaram as coisas caírem no chão e, praticamente ao mesmo tempo, levantaram os braços em rendição. Não podiam levantar suspeitas até que eles se aproximassem mais. E assim aconteceu. Quando o policial menor desceu o capuz de , ela logo desferiu-lhe um chute no meio do estômago com toda a força de seu corpo.
Caiu, desequilibrada no chão, enquanto atacava o guarda que parecia ter o dobro de suas dimensões. Porém, o rapaz era forte, o mais forte do grupo e logo no primeiro soco fez o homem cambalear para trás. Desferiu mais um, dois, três. De forma rápida e precisa. Estava calejado demais em lutas corpo a corpo e apesar de robusto, aquele policial não era muito forte. Ele até tentou se defender e conseguiu acertar um soco no rosto do mais novo, mas não era o suficiente. cuspiu uma gota de sangue antes de partir para cima. por outro lado, tinha dificuldade, ao derrubar o inimigo, caiu junto. Graças sua agilidade, conseguiu ao menos pegar a arma do coldre e jogá-la no meio do rio. Um problema a menos. Agora, só tinha que lidar com o homem indo para cima de si com toda a força possível e uma faca. Tudo o que ela podia fazer era desviar. Correndo e pulando, ela era rápida. No entanto, não conseguiu escapar de um corte na coxa direita, desacelerando seus movimentos.
Tendo o tal grandalhão esparramado ao seus pés, voltou sua atenção para a garota logo quando se feriu. O sangue subiu-lhe aos olhos ao ver a garota caída, o olhar dela gritava por ajuda. Ele correu até o policial menor, e o derrubou pulando por cima dele. O primeiro soco arrancou sangue e logo ele já havia soltado a faca para tentar se defender, em vão. era forte demais, especialmente com sua raiva à flor da pele. correu para pegar a faca e jogá-la longe.
- , já chega, vamos!! - ela gritou enquanto via o rapaz espancar o guarda ao ponto de desacordá-lo. Quando notou sua inconsciência, se levantou prontamente preparando-se para correr em direção ao rio.
- Corra, ! - berrou tomando impulso para correr junto, mas uma força maior o impediu de se mover. O grandalhão havia se recuperado e viera com tudo para cima do rapaz. Pegou-o em uma chave de pescoço e sentiu seus pés saírem do chão a medida que o ar escapava dos pulmões.
- Vai, … - ele tentou dizer a garota que, quando percebeu o que estava acontecendo congelou completamente. Sem pensar muito, ela correu até ele, abandonando as coisas que já havia pegado para partir no chão. A única coisa que pensava era em como faria para que aquele brutamontes largasse do pescoço de , que já ficava arroxeado pela falta do ar. Não tinha força o suficiente para acertar um bom golpe, nem tamanho para tentar derrubá-lo. Só restava a tática mais óbvia. Correu para trás do homem e chutou o meio de suas pernas.
Um urro de dor e logo estava no chão, a cor se recuperando aos poucos junto ao fôlego. Rapidamente, ele se virou para o homem caído e lhe desferiu mais alguns golpes com o intuito de deixá-lo sem consciência. Mas não tinham tempo, o puxou pelo braço e com o outro pegou apenas a própria mochila. Correndo em direção ao rio o mais rápido que podia. Usava toda a sua força para levar o rapaz junto e demorou ainda para que ele pegasse o ritmo da correria. A adrenalina que despencava em seu sangue ajudou para que usasse o restante de suas forças para atravessar as águas frias. Não pararam de correr e também não ousou soltar . Não conseguia e nem podia. Se recusava perdê-lo para aqueles policiais nojentos que levara a sua família, Jamais iria perder a pessoa que estava se tornando aos poucos a mais importante de sua vida, e logo, se transformaria no centro de todo o seu universo.
O casal só se atreveu a diminuir o ritmo quando avistaram o jipe verde no meio do nada. Três rapazes acenavam fervorosamente, os reconheceu de imediato.
- ! ! ! - gritou acenando de volta e, sem largar a mão da menina, correu um pouco mais em direção a eles.
- Uau… eu nunca vi esse cara tão feliz em nos ver! - comentou abrindo a porta do carro.
- Não sei se a felicidade dele é exatamente em nos ver… - disse de volta observando os dedos do amigo lacrados nos da garota, sorriu maroto já pensando nas inúmeras possibilidades de zoá-lo.
apenas riu da breve conversa e abriu a porta do jipe subindo para o banco do motorista.
- Vamos, vocês dois! Não temos muito tempo! - gritou já dando partida no carro. Viu correr para o banco do passageiro enquanto se espremia no banco de trás, criando espaço para os dois jovens entrarem.
deixou que entrasse primeiro, pegando-a pela cintura e ajudando a garota a subir com a tralha que levava, logo depois pulou para dentro do veículo fechando a porta. Assim que viu todos acomodados, cantou pneus em direção à próxima cidade.
- Yah… Você não disse que a garota era tão bonita, , seu cafajeste! - foi o primeiro a comentar, um sorriso divertido brincando em seus lábios.
- Cala a boca, idiota! - o amigo respondeu ao notar a vermelhidão no rosto da menina.
- Hey, , deixe ela se apresentar antes de começar com as piadas constrangedoras - alertou com uma risada. - Eu sou o , o piadista aqui do lado é o e o que sobrou aí é o .
Ao ouvir seu nome, fez uma expressão fofa, sorrindo abertamente para garota.
- Meu nome é - ela disse timidamente, nunca esteve na presença de tantos garotos antes. revirou os olhos pelo constrangimento dela, mas não evitou um sorriso quando notou o brilho naquele olhar.
- Seja bem vinda ao EXO, - disse amistosamente, olhou pelo retrovisor e não deixou de perceber o vislumbre e a adoração que transbordava de pela jovem. - Você cuidou do , agora nós cuidaremos de você.
- Será nossa princesa! comentou com uma piscadela e a garota riu, aparentemente o rubor jamais deixaria suas bochechas. - Vamos te ensinar a lutar, a pichar muros e a como conviver com o sem morrer de tédio.
- Yah! - o rapaz protestou ao som das risadas de todos no carro.
- Bom, acho que tenho muito o que aprender… - ela sussurrou enquanto a mão esquerda escorregava para perto de , o rapaz engoliu seco ao sentir os dedos dela enlaçando-se suavemente aos seus, mas deixou que agarrasse sua mão suja de sangue e calejada respondendo com um aperto. Pensou que seria algo frequente a partir daquele dia. - Obrigada.
Ela disse alto para todos os rapazes, mas entendeu que pelo menos 50% daquela gratidão era direcionada a ele.
Enquanto seguiam pela estrada vazia, pensou no quanto estava deixando para trás e no que estava por vir. Seus pais sempre lhe disseram que a vida das pessoas rejeitadas pelo governo nunca seria fácil, mas a vida daqueles que ingressavam na resistência seria bem pior. Não tenha medo, porém. Falavam. Você deve lutar e viver por um mundo melhor, , por um futuro para pessoas como nós.
E pela primeira vez em muito tempo, sentindo o calor que emanava dos dedos dele que acariciavam levemente sua pele, ela conseguiu visualizar um futuro. Enquanto ele estivesse ali, ficaria tudo bem.

Epílogo



- E foi assim que seus pais se conheceram! - O homem disse para a pequena garota já sonolenta em sua cama. Ele sorriu ternamente e acariciou os cabelos dela como sempre fazia antes dela dormir. Pensou como conseguiu ser a mistura perfeita dos dois amigos. O rosto tinha os traços orientais do pai, mas os olhos e o cabelo foram herdados da mãe. A pestinha de apenas sete anos ainda deu a sorte de carregar a agilidade de e força descomunal de .
- Agora conta de quando eles conseguiram ajudar o pessoal da vila, tio! - ela disse tentando parecer animada, mas o sono tomava conta da menina. não evitou uma risada longa, porém baixa.
- Fica para outro dia, princesa. Agora está na hora de dormir.
Ela fez um pequeno biquinho, contrariada. Mas os olhinhos se esforçavam tanto para se manterem abertos que a garotinha apenas concordou com a cabeça antes de ajeitar-se mais na cama e preparar-se para se entregar ao sono.
- Boa noite, tio - ela sussurrou sentindo o carinho do homem em sua testa.
- Boa noite, princesinha. - ele respondeu.
Suspirou se levantando da cadeira e indo até a porta para apagar a luz do quarto. Dirigiu-se até a sala onde se esparramou no pequeno sofá. Todas as vezes que ficava de babá para os amigos, lembrava-se dos tempos de luta. Às vezes admitia sentir falta das loucuras de sua juventude, mas era só olhar para o rosto pequeno da sobrinha que ele via a beleza da tranquilidade de uma vida pacata. Após anos de resistência, o EXO conseguiu um acordo com o governo que permitiu a criação de uma vila para os sobreviventes. Sem a mediação de , e , nada poderia ter acontecido. Um plano foi criado e todos os rejeitados foram para um lugar isolado, longe das capitais. Acontece que uma organização de ricos “caridosos” financiaram a construção de casas nesse lugar.
O EXO ficou responsável por botar ordem na bagunça criando um lugar de subsistência. Mais tarde, assumindo a posição diplomática que descobriu ter vocação, conseguiu ainda garantir o intercâmbio de produtos essenciais, como medicamentos, matérias-primas e energia elétrica pagas com produtos naturais produzidos aos montes pelos cidadãos. O acesso a tecnologia ainda era precário, não podia se comparar às capitais ainda. A maioria das casas eram equipadas com eletrodomésticos velhos. Ainda assim, a vida naquele lugar era um milhão de vezes melhor do que nos guetos.
Ele ouviu a porta abrir e não demorou muito para ver o casal entrando na casa. Exaustos, ainda não sabia porque insistia em acompanhar em suas palestras pela vila. Como o responsável máximo pela segurança, ele achou que seria uma boa opção ensinar a todos como se defender. Os tempos eram de paz, mas jamais descartariam uma mudança de pensamento no governo. Ele sempre foi o mais precavido do grupo.
- Oh! Ela já dormiu? - disse assim que avistou sozinho em seu sofá, o rapaz se levantou e sorriu.
- Só depois que contei a história de como se conheceram, pela quinta vez, eu acho. - respondeu arrancando uma risada de .
- É a história favorita dela, por algum motivo. - o pai comentou, orgulhoso.
- Sim, ela é apaixonada por vocês dois. - ri observando os pais envaidecidos pelo comentário.
- E nós por ela. - responde com um sorriso terno.
- Bom, eu vou agora. Podem sempre contar comigo quando precisarem de cuidar dessa princesa. - o homem disse já abrindo a porta. O casal apenas concordou e agradeceram.
Após a saída de , não evitou se esgueirar para o quarto da filha abrindo a porta delicadamente apenas para observar por alguns segundos a garota dormir. O sono tranquilo acalmava seu coração de mãe. Sorriu pensando que aquela pequena menina representava todo seu universo e cada sacrifício que tivera de enfrentar durante todos esses anos. Sentiu uma mão repousar em sua cintura e logo a puxou contra seu peito abraçando-a por trás. A cabeça enfiando-se na curva do pescoço dela, inalando seu cheiro. sorriu ainda mais, fechando a porta do quarto para dar atenção ao marido. Virou-se para abraçá-lo, passando os braços pelo seu pescoço.
- Obrigada. - Ela sussurrou fitando o rosto do marido, marcas do tempo e de outras batalhas expostas na pele. Ele sorriu.
- Por que está dizendo isso?
- Por ter mantido sua promessa… De não me deixar sozinha.
Ele não resistiu em beijá-la levemente.
- Eu que deveria te agradecer por ter me ajudado naquele dia. O que seria de mim se não fosse você?
- Provavelmente teria morrido na cadeia daquele lugar. - Ele riu concordando.
- Bom, ainda bem que encontrei você.
- Ainda bem. - Ela sussurrou uma última vez antes selar os lábios dele novamente.




Fim



Nota da autora: Sem nota.



Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.


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