Capítulo 1
(n/a: Música tema da fic. As partes escritas em negrito são trechos retirados da música!)
— null, você pode ir buscar as crianças na escola? — null pediu pelo telefone, cansada e com dor de cabeça — Jenny não pôde ir trabalhar hoje.
Do outro lado da linha, null suspirou de um modo que fez null tremer. Algo não estava certo.
— null, precisamos conversar...
Era apenas meio dia e estava indo almoçar com Claire e Lydia, suas colegas de trabalho — as únicas pessoas que podia chamar de “amiga” nos últimos anos. Jenny, a babá que cuidava de seus dois filhos enquanto ela e null trabalhavam, ligara dizendo que estava doente e achou melhor não ficar perto das crianças, apesar de seu filho mais novo ter seis, quase sete anos.
— O que foi? — null perguntou, já sentindo a dor de cabeça agravar. Nada de bom saía de null quando ele começava com “precisamos conversar”.
— Você precisa manter a calma e se lembrar que certas coisas não podem ser previstas e outras podem simplesmente dar errado por motivo nenhum, e é por isso que eu prefiro te contar tudo quando eu já tenho certeza, mas mesmo assim, é possível que haja...
— null, para de enrolar, pelo amor do Cristo. Estou morrendo de dor de cabeça e preciso mesmo almoçar. Se isso não for urgente, pode esperar até eu chegar em casa?
Claire e Lydia pararam de andar pela avenida e se viraram para null, que havia diminuído o passo.
— Acho que pode. Não é algo que eu possa falar por telefone. Busco null e Jake?
— Às 15h30. — lembrou, só para desencargo de consciência.
— Pode deixar! Tenha um bom dia no trabalho, amor. Eu te amo.
O coração de null se aqueceu.
— Obrigada. Eu te amo.
Desligou o celular e o guardou na bolsa.
— Claire, me diz que você tem um paracetamol, por favor!
Claire entregou a cartela de analgésicos para a amiga.
— null, você é sortuda demais por ter o null. Sério. Ele é tipo... O melhor homem da Terra! Quando eu peço para Rick ir buscar as crianças, ele fica reclamando e quer demitir a nossa babá.
— Ah, vocês não vão querer que eu comece a falar sobre Anthony, vão? Porque se eu começar, acho que não vou parar de reclamar nunca mais!
As três riram, mas null não estava achando graça. Ela se perguntava quando foi que sua vida havia tomado aquele rumo, apesar de saber exatamente a resposta.
Tudo seria diferente se ele ainda estivesse aqui.
Capítulo 2
null abriu a porta de sua casa e Jake correu em uma velocidade sobrehumana para lhe abraçar, derrubando-a.
— Mãe, você não vai acreditar! Estou correndo mais rápido que o homem mais rápido do mundo!
null sorriu de modo contido e se recompôs, empurrando um Jake tagarela que falava sobre Usain Bolt. Fechou a porta de casa atrás deles e pendurou a chave no chaveiro atrás da porta.
— Jake, eu já te disse: você precisa correr em velocidade normal. Se continuar correndo desse jeito, as outras crianças vão perceber.
Jake murchou na hora.
— Achei que ficaria feliz...
— Eu fico feliz, meu bem. Só não gosto que você mostre seus poderes lá fora. — null suspirou e se ajoelhou para ficar do tamanho do filho, pegando em seus ombros e olhando profundamente em seus olhos, para que ele entendesse bem — Jake, as pessoas são malvadas com o que elas não conhecem. Elas não aceitam outras pessoas, principalmente as Diferentes, assim como eu, você e sua irmã. Então, precisamos agir como eles, entende?
— Ah, me poupe!
null revirou os olhos. É claro que null ia protestar. Ela tinha quinze anos e era, provavelmente, a adolescente mais difícil do mundo.
— Você quer que a gente seja normal, só que não somos, mãe! Eu, você, o Jake! Nós três somos aberrações! E não adianta você casar com um cara “normal” — ela fez aspas com os dedos — e tentar fingir que somos, porque não somos!
— Onde está o null? — null perguntou, tentando não dar corda para null.
— Ele saiu. Disse que tinhas coisas para resolver — respondeu, usando um tom ácido que deixava claro seu descontentamento.
— Avisou quando voltava?
— Nunca mais, se eu tiver sorte! — null gritou, subindo as escadas para seu quarto e null ouviu quando a menina bateu a porta.
— Por que as adolescentes fazem tanto drama, mãe? — Jake perguntou, seguindo a mãe pela cozinha.
— É necessário, meu bem. Quando você tiver quinze anos, também vai fazer drama.
Jake assentiu, pensativo.
null entrou na cozinha e encontrou tudo limpo. null podia reclamar o tempo todo, mas pelo menos isso ela não deixava a desejar. As duas brigavam constantemente, mas null nunca deixava a mãe na mão.
Mesmo assim, null era quem cozinhava e, quando ele não estava em casa, null tinha que fazer a janta.
— O que você acha de uma pizza, Jake? — null perguntou, erguendo as sobrancelhas para atiçá-lo.
— Oba! — ele gritou, comemorando pela cozinha. A mãe sorriu.
— Você já tomou banho?
Jake congelou na mesma hora.
— Já...
— Se eu perguntar para a sua irmã se você já tomou banho, ela vai responder a mesma coisa?
Jake não falou nada.
— Se você ainda não tiver tomado banho quando a pizza chegar, vai acabar ficando sem. Você sabe como eu amo pizza e sua irmã é uma adolescente em crescimento, o que faz ela querer comer muito...
E, num piscar de olhos, Jake havia desaparecido, correndo pela casa. null achou inútil chamar sua atenção; ele não podia evitar, de qualquer jeito. Pegou o telefone na cozinha e ligou para null, que não atendeu. Insistente, ela ligou outra vez, conseguindo sua resposta quando estava quase desistindo.
— Oi, amor. — null atendeu — Já chegou?
— Já. E você podia ter me avisado que ia deixar as crianças sozinhas.
— null, eles não são tão crianças assim. null tem quinze anos e Jake tem seis. Eles podem se cuidar e você sabe disso.
null se referia aos poderes, mas ela ignorou. Queria gritar que ele também sabia e conhecia tão bem quanto ela os perigos lá fora.
— Onde você está? E pode trazer duas pizzas quando voltar?
— Claro. O mesmo sabor de sempre?
— Sim. E onde você está? — ela repetiu a pergunta, já que ele desviou quando a fez pela primeira vez.
— Resolvendo algo relacionado àquele assunto de hoje.
— Você está me deixando curiosa, sabia?
null ficou mudo. Seja lá o que fosse, ele não queria contar.
— null... — null ameaçou.
— Vamos conversar sobre isso de noite. Não acho uma boa ideia falar na frente das crianças.
— Você mesmo disse que eles não são mais crianças!
— É sobre null, null.
— Que null?
— null. null null.
null deixou o telefone cair. null gritou do outro lado, tentando chamar sua atenção, mas ela não estava ouvindo. Tudo ao seu redor estava girando e o ar lhe faltava. Se pudesse contar as batidas de seu coração, tinha certeza de que o número ultrapassaria o recomendado.
— Mãe?
Era null. E null enxergou o pânico de seus olhos refletido nos olhos de sua menina. Rapidamente, se abaixou e pegou o telefone.
— Está tudo bem, querida. Eu só me assustei.
null não acreditou, mas deixou a mãe conversar.
— null, você está aí?! Que merda, você me assustou!
— Você que me assustou! Não tem graça falar dele assim, do nada, null!
— Não é do nada, null. É importante.
— null null não pode ser importante na cadeia.
— Exatamente. Ele está saindo.
A sensação de tontura voltou com mais força. null se segurou no balcão da cozinha, mas estava esgotada depois da semana exaustiva. Ouvir aquilo era como levar um golpe que ela não estava preparada para receber — e ela já tinha levado uma porção de golpes.
null desmaiou.
Capítulo 3
“— null... — null cantou com a voz manhosa — Vem dançar comigo...
null fez uma careta de onde ele estava sentado na cama, com um livro na mão.
— Estou lendo, mulher. E você não vai me fazer dançar Colbie Caillat duas vezes na mesma semana.
null riu e aumentou o som do rádio com o controle remoto, deixando as notas ainda mais altas. Ela se moveu no ritmo lento da música até a cama e null levantou o livro, querendo esconder o sorriso que teimava em aparecer em seu rosto. Esticou os braços exageradamente, até alcançá-lo. Qualquer um que visse a cena provavelmente gritaria de horror ao ver a mulher com os braços enormes e muito mais longos do que qualquer ser humano era capaz de esticar, mas era fácil para null. A elasticidade de seu corpo era um dos seus poderes.
Parada ao lado do aparelho de som, null alcançou os ombros de null. Subiu as mãos até capturar seu rosto e o fez olhar para cima. Ele usava seus óculos de leitura e uma camiseta branca, junto com seus cabelos compridos demais, que estavam levemente molhados nas pontas por causa do banho. null o obrigou a olhar para ela e manteve o sorriso firme no rosto enquanto o soltava com uma das mãos para afastar o livro e deixá-lo sobre a cama.
Manteve uma das mãos no ombro dele para garantir que ele não escapasse e se levantasse para ir em sua direção, mas puxou o outro braço para si e arrumou o cabelo, jogando-o atrás da orelha. Ela tinha acabado de sair do banho e usava um robe branco de seda que ia até suas canelas. Por baixo, não usava nada — mas null não sabia dessa parte.
null se aproximou e ela sentiu o cheiro dele, que era o melhor cheiro que podia sentir. Era como estar em casa.
Os braços dele envolveram a cintura dela, enquanto os seus próprios já estavam em tamanho normal e repousando no pescoço dele.
(Você tem mágica nas pontas dos seus dedos. Está vazando toda sobre a minha pele)
null desceu uma das mãos pela cintura de null, começando a suspeitar da falta de roupas de sua mulher. Seu dedo alcançou o meio da coxa dela, onde ele raspou a ponta e subiu de volta para a posição inicial de suas mãos.
— Eu nunca perdi uma batalha na cidade. — ele murmurou, olhando diretamente para os olhos profundos de null — Mas perdi todas as que lutei contra você.
O sorriso continuava no rosto da mulher.
— Entre nós, nunca foi uma batalha. Não poderia ser, já que nenhum de nós quer ganhar e fazer o outro perder.
E, então, null conseguiu o que mais amava no mundo: tirar um sorriso de null null. Ele dificilmente sorria, porque achava seu sorriso muito infantil, mas era o paraíso para null.
(Toda vez que eu me aproximo de você, você me torna fraca com o jeito que me olha com esses seus olhos)
Eles se moveram pelo quarto com calma, null ditando o ritmo. null era muito alto, então ela tinha a mania de esticar as pernas até ficar em uma altura melhor, mas ele odiava. Gostava quando tinha sua mulher na altura natural, do jeito que ela era.
null encostou a cabeça no peito de null, ouvindo o coração dele bater com força. Era o melhor som que ela poderia ouvir. null apoiou o queixo no topo da cabeça de null e deixou que ela o conduzisse. Escorregou as mãos para as costas dela e a puxou para mais perto.
— Você parece um anjo. — ele comentou. Anos atrás, quando se conheceram, null diria que foi involuntário e null concordaria; jamais admitiria que tinha elogiado alguém por vontade própria.
null riu.
— Espero que null puxe pra mim, então. Porque você não tem nada de anjo, null.
Dessa vez, null riu abertamente.
— Mulher, sou obrigado a concordar com você.
null pensou em contar que a menina ficava aparecendo e desaparecendo descontroladamente o tempo todo e que sua mãe não queria mais cuidar da pequena invisível, mas isso era conversa para outra hora. Eles estavam tão calmos, tão felizes... Os problemas poderiam ficar para mais tarde.
‘And all I see is your face. All I need is your touch. Wake me up with your lips…’
(E tudo que eu vejo é o seu rosto. Tudo que eu preciso é do seu toque. Me acorde com seus lábios...)
null se afastou um pouco e puxou null pelo queixo, obrigando-a a olhar para ele. Assim, era mais fácil roubar um beijo.
E foi exatamente o que ele fez. Sem parar de se mover pelo quarto, ele tocou os lábios dela com os seus próprios e aproveitou o momento de paz. Ele odiava dançar, mas por null ele dançava, até porque se sentia muito melhor quando estava mais próximo dela.
null deixou que ele a beijasse do modo que achasse melhor; confiava em null para qualquer coisa. Nesses momentos, quando estava com ele, era quando se sentia plenamente feliz, como se a felicidade fosse algo que pudesse tocar.
E ela a tocava. Tinha a felicidade em seus braços.”
— Mamãe! Acorda, por favor!
A música Magic foi ficando cada vez mais distante e null demorou um tempo até conseguir racionalizar corretamente. Onde ela estava?
Aos poucos, ela foi reconhecendo as luzes brilhantes da cozinha. A voz de Jake estava gritando com ela, pedindo que acordasse em um tom manhoso que indicava choro e null estava xingando em algum lugar próximo.
Ela estava no chão?
O que tinha acontecido?
Sua cabeça doeu com o esforço, mas null se obrigou a lembrar. Estava no telefone com null e ele havia lhe dito algo que a deixara tonta...
null null está saindo da cadeia.
null deu um pulo do chão e se recompôs o mais rápido possível. null ainda falava palavrões no telefone.
— Você é um grande filho da puta! E se você está pensando que vai entrar aqui de novo, está enganado pra caralho, seu merda! Você vai ver o que vai te acontecer se eu te ver outra vez, seu...
— null! Você está de castigo! — null gritou, tomando o telefone da mão da menina — E tenta acalmar seu irmão. Está tudo bem!
null resmungou e puxou Jake pela mão, saindo da cozinha. null esperou que os dois não pudessem ouvir e ainda fez questão de sussurrar no telefone:
— Quando isso aconteceu?
— null, isso não é conversa para termos pelo telefone. Prometo te explicar tudo da melhor forma possível assim que chegar em casa. Não acredito que você desmaiou!
Ela se sentiu fraca.
— Está tudo bem. Só venha logo. E traga as pizzas para as crianças.
Capítulo 4
null queria matar null assim que ele entrou em casa. Jake começou a gritar com a confusão e null estava com dor de cabeça demais para aguentar tudo, então apenas puxou null para o quarto e deixou os filhos com a pizza na cozinha.
— Muito bem. Estamos sozinhos e em casa. — null pontuou — Agora você pode me falar.
null andou pelo quarto que null tinha visto quando estava desmaiada; era o quarto que dividira com null por tanto tempo...
— Faz alguns meses, já. null saiu da máxima no começo do ano...
— Ele estava na máxima?! — null gritou, perdendo uma batida de seu coração. Quando null fora preso, ela evitou ao máximo os detalhes. Queria apenas fingir que nada tinha acontecido para tentar superar a dor.
— null, se acalme. E, sim, ele estava na máxima. Ele pode se transformar no animal que quiser e sua força aumenta em pelo menos 500 vezes o seu tamanho! Ele ficou em uma prisão especial, para neutralizar seus poderes. Lembro que, no julgamento, cogitaram a pena de morte, mas null nunca fez nada de errado, então consegui livrá-lo dessa.
Pena de morte?!
null estava ficando tonta outra vez e se sentou na cama.
— E agora? — perguntou, entrelaçando os dedos no pingente de seu colar. Era uma pegada de felino, dada por null. A especialidade dele era se transformar em um enorme leão.
— Estou procurando um abrigo para ele. Quando saiu da máxima, provou que podia muito bem conviver com outras pessoas na prisão normal, não arrumou nenhuma briga e não se meteu em nenhuma confusão. Ele trabalhou, fez tudo certo. Vai ser liberado por bom comportamento, mas não consigo encontrar um abrigo que o aceite, por ser um ex super herói.
null queria gritar que null não era um ex herói. Ele ainda tinha os poderes. Ele ainda era ele.
Ainda sim, ficou feliz que null não tenha usado o termo “Diferente”. Era o mais comum para se referir à eles, mas null o considerava extremamente pejorativo.
— Deixe que ele volte para cá.
— null...
— null, essa casa é dele! Ele tem o direito de vir para casa depois de sete anos na cadeia!
null fez uma careta.
— E eu?
— O que tem você?
Ele mordeu o lábio, apreensivo. null estava tão absorta na ideia de ver null que não pensou em null.
— Eu não quero morar com o seu ex. — ele soltou de uma vez. null arregalou os olhos para ele, como se null acabasse de dizer que cometeu um assassinato — null era um dos meus melhores amigos e eu fiz de tudo para ajudar vocês e para ajudá-lo durante esse tempo, mas não sei se conseguiria morar com vocês. Eu me sentiria um intruso.
Depois que null foi preso, null ajudou null. Ela era uma mulher com uma criança de 8 anos e, mais tarde, descobriu-se grávida de seu marido preso. Não podia lidar com tudo sozinha e ainda por cima esconder sua identidade de Diferente. Era simplesmente coisa demais para aguentar sozinha. null null, advogado que defendia os Diferentes — e um grande amigo de null — não hesitou em ajudá-la. null não conseguiu deixar de se apaixonar por ele; afinal, ele estava lá para ela enquanto null não estava.
null apoiou as mãos no rosto de null e o puxou para um beijo em uma tentativa de acalmá-lo.
— Eu não estou com o null. Quando ele sair, vou pedir o divórcio legalmente e vou ficar com você, null.
Os olhos dele brilharam.
— Não quero competir com ele pela aprovação de null. Ela me odeia!
— Ela viu o pai ser preso por ajudar pessoas, null! Acha que você está tentando tomar o lugar dele! É normal que ela seja arredia com você. E mais: null achou que nunca mais veria o pai.
Ao dizer aquilo, null congelou.
Como ela contaria para null que o pai estava saindo da cadeia e voltando para casa? E, pior ainda, como diria para null que Jake era seu filho e já tinha quase sete anos?
O sentimento de estar sozinha e assustada que sentiu quando null foi preso voltou e ela se agarrou à null com mais força. Não podia ficar sem ele! Se ficasse sem seu advogado, quem iria ajudá-la?
null viu o pânico crescer nos olhos de null e, como sempre, ele sabia o que fazer. Tomou as mãos dela nas suas e as apertou, em um gesto reconfortante.
— Está tudo bem. Eu vou te ajudar, null. Não precisa se preocupar com nada.
null assentiu.
Era muito fácil esquecer que ela já fora uma super heroína. Ultimamente, parecia que ela estava sempre fraquejando.
Respirou fundo.
Capítulo 5
Eram exatamente 4h27min da manhã quando null null deixou a Penitenciária Estadual de San Quentin. Usava um conjunto de moletom surrado que havia lhe sido entregue antes de sair. Quem o visse, nunca diria que estava saindo por bom comportamento: o ódio era visível em sua expressão em um raio de um quilometro.
Um homem estava esperando por ele na saída. null não o reconheceu, mas sabia que era um dos homens de null.
— Senhor null. — o homem o cumprimentou — O senhor null me mandou aqui para cuidar do senhor.
null não falou nada. Desde que foi preso, ele manteve a boca fechada, falando apenas quando fosse necessário — e nenhuma situação era realmente necessária.
Um carro esportivo esperava por ele e null entrou, batendo a porta. Sua força estava controlada, contida. Ele sabia que, se quisesse, poderia amassar aquele maldito carro com as mãos.
Havia muito ódio guardado em seu peito. Mais do que ele podia suportar.
Bom, qualquer pessoa que fosse presa injustamente sentiria ódio.
Em 2002, quando sua pequena null completou um ano de vida, a Organização das Nações Unidas propôs o Tratado de Paz Mundial, que foi assinado por todos os países. Basicamente, era um tratado onde dizia que qualquer ser humano com poderes, não poderia exercê-los livremente. Isso aconteceu porque, nos últimos anos, as pessoas que se consideravam “super heróis” estavam aumentando e, ao mesmo tempo, pessoas que poderiam ser “super vilões” também.
A gota d’água foi quando as Torres Gêmeas — também conhecidas por World Trade Center — sofreram um ataque organizado por um terrorista com poderes muito fortes, resultando em quase 3000 mortos e mais de 6000 feridos. Outros ataques já haviam acontecido e, em algumas lutas, as cidades ficavam destruídas e o número de mortos e feridos passou a não compensar o número de sobreviventes.
As pessoas protestaram, foram às ruas e fizeram inúmeras manifestações, até que o acordo fosse assinado por todos os países em 11 de setembro de 2002, exatamente um ano após a tragédia.
E foi quando a Caça às bruxas do século XXI começou.
Os que não usavam máscara e usavam os poderes para cometer crimes foram os primeiros a morrer. O governo alegou que não havia como mantê-los em uma prisão comum por terem poderes e pela facilidade que teriam de escapar e organizar motins. A sociedade já estava muito aterrorizada por causa do atentado, então ninguém quis defender os direitos humanos das pessoas com poderes; afinal, eles nem eram considerados humanos. Logo, eram fuzilados ou condenados à cadeira elétrica.
Depois, foi a vez dos que não usavam máscara e nunca prejudicaram ninguém. O governo não quis saber — nem nos Estados Unidos, nem em nenhum outro lugar do mundo — se fosse diferente, representava um risco; representar um risco era o mesmo que cometer um crime. E mais pessoas foram executadas.
Os que usavam máscaras foram mais difíceis de rastrear, então o maravilhoso presidente da época, George Bush, resolveu que seria uma boa ideia oferecer recompensas para quem denunciasse os Diferentes — foi nessa época que o termo surgiu. null ainda tinha nojo de ouvir o sobrenome “Bush”.
Ele e null moravam em Manhattan, mas ficou impossível continuar em Nova Iorque com a Caçada acontecendo. Se mudaram para o Texas, onde a mãe de null — que também possui poderes — morava no interior, em Round Rock. null estava quase completando dois anos.
Quando null chegou aos três anos, se mudaram para Houston, ainda no Texas. Na maior cidade do estado, eles se misturaram melhor e null podia estudar em uma escola boa. Ainda podiam viajar para a casa da fazenda em Round Rock e pedir ajuda para a Vovó Super Poderosa, como null chamava.
Eles só se mudaram para Los Angeles quando começaram a ser perseguidos. null era uma criança e não tinha controle sobre seus poderes. Vovó tentou ensiná-la algumas coisas, mas não conseguira. A irmã mais velha de null — Hilary, que morava em Nova Iorque — foi visitá-la e morreu no ano que null completou 5, vítima de uma Caçada. Em 2006, já estava tudo mais calmo, mas Hilary cometeu um deslize e um vizinho intrometido a viu tentar ensinar a null a como controlar seu corpo para se adaptar à invisibilidade. Eles foram denunciados e Hilary não conseguiu escapar.
Em Los Angeles, tomaram o dobro do cuidado. null evitava manter contato com a mãe e nenhuma delas chegou à ir no funeral da irmã; era muito arriscado. null conhecia apenas mais duas mulheres que tinham poderes assim como ela, mas perdeu o contato quando chegou na Califórnia, enquanto null encontrou null logo que chegaram. Ele fugira de Washington e, assim como eles, usava a cidade grande para se manter nas sombras. null perdeu toda sua família na Caçada em 2003.
null odiava aquilo. Odiava ver sua mulher e sua filha com medo, odiava saber que havia um filho da puta caçando e matando pessoas, só por terem um DNA modificado. Principalmente quando eles nunca machucaram ninguém, nem por acidente. Ele tinha medo do que aconteceria com null quando fosse mais velha, se ela deixasse alguém saber quem era... Tudo muda quando se tem um filho: você não quer mais viver, você quer proteger a sua cria.
A cada dia que passava, ficava mais difícil para ele; null via sua menina crescer e queria que o mundo fosse um lugar melhor para ela. O número de pessoas abençoadas com poderes diminuiu drasticamente por causa da Caçada, mas ele e sua família ainda eram pessoas sortudas que tinham a chance de fazer a diferença.
null era formado em Direito, era advogado e queria se tornar juiz. Advogava criminalmente e possuía um currículo exemplar, iniciado em uma das maiores empresas de advocacia de Nova Iorque — como um ajudante que servia café depois da escola, mas ele colocava apenas o nome da empresa no currículo. Sentia que, colocando criminosos na cadeia, ajudava a deixar o mundo mais seguro para sua família.
Mas o que fazer quando aquele que deveria prover segurança é o maior responsável por criar insegurança?
O governo não estava ao lado de pessoas como ele.
null sentia falta de usar seus poderes o tempo todo; de se transformar em um animal selvagem e correr por algum campo isolado sem ninguém o considerar uma aberração. Sentia falta de ver null voando como se fosse um anjo. E, mais do que tudo, sentia falta de não ter medo de nada.
Ele e null se juntaram um dia. Começaram a procurar outros como eles e queriam fundar um lugar onde as pessoas especiais pudessem ir para aprenderem a usar os poderes ou simplesmente se juntarem para relaxar. Quando não estavam empenhados nesse projeto, saíam para fazer o trabalho que deveria ser dos policiais: correr atrás de criminosos.
Eles se envolviam em perseguições, assaltos, chegaram a pegar um assassino, uma vez. Mas foi um grande assalto à banco que o denunciou.
null teve sorte: disse para null que não conseguiria ir por estar doente. null resolveu ir sozinho. null previa o futuro, então era muito fácil saber onde e como os assaltantes agiriam. null passou as informações e null foi.
Ele usava uma máscara que cobria seu rosto e uma roupa colada especial, costurada pela mãe de null, que permitiria que se transformasse em qualquer animal que precisasse. null pretendia apenas intimidar os bandidos, então se transformou em uma enorme cobra e ficou esperando para dar o bote.
Mas, quando a hora chegou, não eram criminosos que apareceram.
Ele foi preso em flagrante.
null não sabia que null e null faziam esse tipo de coisa — ela sabia da Academia que estavam tentando fundar e até apoiava, mas ela e null já tinham brigado inúmeras vezes para que ele se controlasse e parasse de se expor. Achava que o marido tinha lhe ouvido, finalmente.
Ela estava errada.
Foi quando null null começou a agir.
null ficou conhecido por ser um grande ativista dos diretos dos Diferentes — como foram apelidados — e era um dos melhores advogados do país. Resolveu unir seu trabalho ao seu idealismo e abriu uma empresa que fornece advogados competentes para Diferentes em todo o país.
Porém, para o caso de null, ele foi tratar pessoalmente — afinal, eles eram amigos. Livrou null do corredor da morte, mas não conseguiu tirá-lo da cadeia. Até aquele momento.
null nunca confiou em boas ações, principalmente quando eram oferecidas por humanos que não tinham nada a ganhar. Sendo assim, ele suspeitava que algo estava errado com null e com sua empresa. A amizade que construíram nunca fora o bastante para null confiar nele totalmente. Afinal, null poderia gritar para o mundo que apoiava os Diferentes, mas nunca saberia como era ser um.
— Senhor null?
null percebeu que o motorista estava falando com ele há um tempo. Não sabia quantas horas haviam passado, estava disperso demais pensando nos motivos que o levaram até aquele carro.
Ele não respondeu. Ergueu os olhos para o motorista para demonstrar que estava ouvindo.
— O senhor quer parar para comer em algum lugar? E tem garrafas de água sob o assento, se quiser.
null balançou a cabeça para negar e olhou ao redor para tentar saber onde estava.
A paisagem verde ao redor indicava que estavam passando pelo Pine Mountain Club. Ele já estava perto de casa. De repente, se sentiu um idiota por não ter prestado mais atenção no caminho. Não confiava em null, por que devia confiar em seus homens?
Eles estavam próximos. O sol já nascera e null não conseguia enxergar direito o horário no painel do carro. Ele sempre tivera problemas de visão, mas nunca disse nada sobre isso na cadeia. Resolveu transformar-se parte em animal, para aguçar sua visão. Tinha anos de prática em transformar-se parcialmente, então relaxou e, como quem move um músculo do braço, piscou e seus olhos ganharam um formato mais redondo. Seu campo de visão abriu e suas pupilas aumentaram tanto quanto suas íris, que estavam amarelas, quase laranjas.
Eram olhos de coruja.
Facilmente, null enxergou a hora no carro. Eram quase 10 horas da manhã. A viagem do presídio até Los Angeles duravam cerca de 6 horas.
Sua suspeita de que estava quase em casa aumentou: em menos de duas horas, poderia ir atrás de sua mulher e filha.
Sentiu a garganta secar e piscou para voltar sua visão humana. A simples lembrança de null e null fizeram sua boca amargar e uma tristeza misturada com ansiedade atacaram seu peito. Abaixou-se para pegar uma garrafa de água quando viu a saída 2B da US-101 S. Era a estrada que o levaria diretamente até Los Angeles.
Encontrou a garrafa e sentiu um impacto forte que o fez bater a cabeça no banco da frente. O carro fizera uma curva inesperada e estava saindo da estrada.
null se ergueu para analisar melhor a situação e encontrou o motorista dirigindo como louco fora da estrada, entrando em uma passagem de terra, cercada de vegetação. Apenas uma mão estava no volante, a outra estava segurando uma arma, apontada para seu rosto.
— Fica quieto aí! — ele gritou para null.
Mas null já não estava mais lá. Facilmente se transformou em um dos menores ratos existentes na face da Terra e desapareceu no monte de roupas que se formou sobre si — eram as roupas que ele usava antes. Ouviu o motorista se desesperar procurando por ele, mas null escolhera a cor perfeita para se camuflar nos tapetes do carro: preta.
Correu com suas perninhas de rato pelo chão do carro enquanto o motorista procurava por ele entre as peças de roupa e dirigia sem controle. null subiu no banco do passageiro, voltando a se transformar em humano, pegando o motorista desprevenido. Deu um soco forte no braço dele, fazendo-o soltar a arma e ouvindo o barulho dos ossos quebrando. Distribuiu mais socos e o motorista não teve nem chance de se defender — estava inválido antes mesmo de conseguir fazer qualquer coisa.
null pegou a arma caída perto de suas roupas e a jogou para perto de seu alcance de visão. Jogou o motorista para o banco de trás, tentando controlar o volante enquanto isso, pois o carro estava passando por cima de todos os arbustos possíveis. Ele tinha sorte pela vegetação rasteira.
Recuperou o controle e parou o carro de qualquer jeito, desligando-o. Estava perto de uma estrada que levaria para Simi Valley, pelas placas que tinha lido.
Desceu do carro — mesmo que estivesse sem roupas, não tinha ninguém para ver mesmo — e puxou o corpo do homem consigo. Sentiu o impulso de matá-lo, mas lembrou-se de seus princípios que foram tão difíceis de manter durante a cadeia. Ele podia ser um ex-presidiário, mas não era um criminoso. Muito menos um assassino.
Jogou o corpo inconsciente sobre a vegetação.
Pegou suas roupas no banco de trás e as vestiu com pressa. Aquele maldito queria matá-lo, não queria? Não poderia ser um seqüestro, era uma tentativa de assassinato.
E o responsável era um dos homens de null.
null entrou no carro e bateu a porta com tanta raiva que a amassou. Dirigiu como louco para voltar para a estrada, com apenas um objetivo em mente: a empresa maldita de null null.
Capítulo 6
— O nosso objetivo aqui é conseguir a melhor coisa para o nosso cliente, senhores. Nem sempre a isenção de pena é possível, mas é por isso que estamos batalhando aqui. Se não puderem impedir a condenação, precisam pelo menos tentar um regime semi-aberto e...
A porta da sala de reuniões abriu com um estrondo. null null entrou preparado para destruir tudo o que tocasse, sendo que o que ele mais queria tocar era null null.
— null! — ele gritou, espumando de ódio. Logo atrás dele entrou a secretária, pedindo desculpas pro patrão e ainda tentando conter null, mesmo que seus esforços fossem tão úteis quanto os de uma formiguinha — Eu vou matar você!
Antes que null chegasse ao seu objetivo, três seguranças invadiram a sala, atropelando a pobre secretária e agarrando o ex-presidiário para tentar contê-lo.
— null! — null exclamou, surpreso — Eu esperava te ver em alguns minutos! O Robinson tinha ordens explícitas de te levar para o melhor restaurante de LA e pagar o mais caro...
— O seu maldito motorista tentou me matar! — continuou a gritar, lutando contra os seguranças. Ele estava quase imobilizado, sentindo na pele as conseqüências da falta de prática de uma boa luta.
A sala que estava observando toda a cena parou de respirar, espantada. null gaguejou um pouco, uma expressão de horror dominando seu rosto.
— Como assim? — ele perguntou, se aproximando de null e fazendo movimentos com as mãos para dispensar os seguranças — Meu Deus, null! Você precisa me contar essa história direito!
— Você armou pra mim! — os seguranças ainda não tinham certeza de que era seguro soltar null.
— Eu jamais faria isso, null. Eu entendo como está se sentindo, mas fique calmo. Senhores, por favor, se retirem. Essa reunião está remarcada para amanhã, no mesmo horário. null, fique aqui e vamos conversar.
null olhou no fundo dos olhos de null, decidindo se acreditava ou não nele. Resolveu ouvi-lo, pelo menos. Não era como se tivesse uma opção melhor. Puxou uma cadeira próxima e se sentou.
null se sentou de frente para ele assim que a sala se esvaziou, segundos depois.
— Me conte exatamente o que aconteceu. — null pediu.
— Onde está null?
null percebeu algo mudar em null. De repente, ele estava mais tenso do que antes e parecia não conseguir focar a visão. Isso não podia ser um bom sinal.
— Ela virá te encontrar. — null garantiu.
— Quero vê-la agora.
— null, ela já está vindo. Só preciso que você me conte essa história, porque está fazendo uma séria acusação.
null pensou melhor. Desejou poder ler a mente de null e saber exatamente o que ele estava pensando naquele momento. Não podia saber o que null pensava, mas podia seguir sua intuição.
Um sorriso sacana escorregou em seus lábios.
— Eu só estava fodendo com você, null. — null mentiu — Não queria esperar para conversarmos.
— E onde está Robinson?
— E eu sei lá. O funcionário é seu. Ele me deixou aqui e eu não gostei nada de saber que teria que esperar.
Foi a vez de null analisar os olhos de null e tentar encontrar algum traço de mentira ali.
null sempre fora um ótimo mentiroso.
— Você é impossível, null.
null deu um tapinha no braço de null e manteve o sorriso ainda mais firme no rosto.
— Precisava descontrair. — deu de ombros — Acabei de sair da cadeia.
Os dois sorriram e null se lembrou do que sua sogra sempre falava: mantenha seus amigos perto. Mantenha seus inimigos mais perto ainda
Capítulo 7
— Como assim, null já está aí?! — null gritou para o telefone. Ela trabalhava para uma grande emissora de televisão, era uma das produtoras de um telejornal. Sentira o telefone vibrar no bolso da calça jeans e, disfarçadamente, correra para longe para atender.
— Eu pensei que ele chegaria no final da semana ou alguma coisa assim! E eu te disse que quando ele fosse sair, eu queria ir até San Quentin para buscá-lo.
— Houve um imprevisto e acabou que o favoreceu. — null explicou de qualquer jeito — Eu mandei um funcionário meu ir buscá-lo porque ele saiu lá pelas quatro da manhã.
— Estou indo aí.
null não esperou null falar nada, apenas desligou o telefone e passou em sua sala para pegar suas coisas. Deixou o prédio da emissora sem ao menos avisar alguém.
Capítulo 8
“— Consegui fazer null dormir. — null avisou, entrando no quarto. null estava deitada na cama, assistindo algum filme na televisão.
— Ela só dorme com você. — null reclamou — Parece que eu não faço diferença.
null riu e pulou na cama.
— Mulher, você está com ciúmes?
null revirou os olhos.
— Não. — negou, mas era mentira. Ela sonhava em ser mãe e idealizava uma criança que seria 100% dependente dela.
— Tudo bem. — null murmurou, enterrando o rosto no pescoço de null, encaixando seu corpo no da mulher, que estava de costas para ele — Você é ciumenta, eu sou egoísta, eu sei. Nos completamos.
null sentiu os beijos leves que null começou a depositar em seu pescoço, provocando-a e a desafiando a continuar serena.
— Você queria usar seus poderes para salvar as pessoas, null. Não dá pra te considerar egoísta.
Uma das mãos de null escorregou por debaixo da coberta e ele encontrou a cintura de null, apertando-a de leve.
— Ah, eu sou, sim. Sou egoísta, porque quero você só pra mim. E não te quero de um jeito romântico. É um jeito horrível e possessivo, mas eu não consigo evitar.
null sentiu seu corpo inteiro se arrepiar e algo se contraiu abaixo de seu umbigo. null ainda estava pirraçando seu pescoço e apertando sua cintura, quando ela o surpreendeu e o virou na cama, ficando por cima dele, a coberta que ela usava separando os dois corpos.
— Eu não sou sua, null. — null afirmou, suas mãos segurando os ombros do homem sob si — Eu sou minha e de mais ninguém.
Ela se abaixou como se fosse beijá-lo e ele já fechou os olhos, esperando sentir o gosto da boca que tanto amava. Porém, esperou para sempre, porque os lábios de null ficaram pairando sobre os dele, sem efetivamente tocar. null ergueu a cabeça para tentar alcançar o que queria, mas null se moveu com ele, não deixando a distância de milímetros diminuir. Seus ombros continuavam fortemente pressionados no colchão graças as mãos fortes dela.
— Você é teimosa. — ele murmurou, mas soou mais como um rosnado.
— Ah, isso eu sou mesmo. — null concordou. Se afastou dele para puxar a coberta entre eles e a jogou sobre os próprios ombros, escondendo os dois — Mas você gosta da minha teimosia quase tanto quanto eu gosto do animal.
Ele sabia que a mulher se referia ao maldito instinto animal que não o deixava em paz. Era uma conseqüência de seus poderes: ele podia se transformar em qualquer animal que quisesse, sendo que sempre que se transformasse, o instinto animal dentro de si ficaria cada vez mais forte.
null gostava de controlar todos os aspectos da sua vida para compensar a falta de controle que tinha sobre aquela parte de si.
— Você não pode falar da besta. É o nosso acordo. — ele lembrou. Ele se referia ao próprio instinto animal como besta porque era como se sentia em relação ao mesmo.
null continuava sobre ele, dessa vez suas mãos estavam espalmadas sobre o peito nu de null e suas pernas estavam ao redor da cintura dele, nenhuma coberta entre os corpos.
— Acho que... Acabei de quebrar o acordo.
Os olhos de null escureceram com o tesão. Ele tinha entrado no quarto com a intenção de seduzir null e agora percebia que era ele quem estava sendo seduzido.
Ela usava uma camiseta branca dele para dormir, sendo que a gola estava cortada, porque null gostava de roupas que exibiam os ombros, então havia feito o corte para que o tecido caísse suavemente, quase parecendo sem intenção.
null agarrou um dos lados da camiseta, erguendo-a até a costela de null, onde havia uma tatuagem: era como se a pele daquela região tivesse sido rasgada por uma pata de leão, mostrando ossos e uma escuridão profunda atrás deles. Era feita sob medida. Se null abrisse as mãos do jeito certo, cada ponta de seus dedos encaixaria no começo de cada um dos rasgos.
Ele arranhou a tatuagem com as unhas que cresciam rápido demais. null gemeu; ele sabia como sua mulher amava ser arranhada.
A tensão entre eles finalmente explodiu e null atacou null com a boca. Sua língua tomou conta da boca dele como se a pertencesse. Seus gostos se misturaram e null a apertou ainda mais, trazendo o corpo da mulher para o seu...”.
— Senhor null?
null deu um pulo. Estava de costas para a porta do escritório de null, observando Los Angeles pela grande janela. Não conseguia parar de pensar em null e saber que a veria a qualquer momento estava fazendo algo se remexer em seu peito. As melhores lembranças que tinha dela voltavam com força e sem pedir autorização.
Estava há sete anos sem vê-la.
Sem abraçá-la.
Sem sentir o seu gosto.
A dor da saudade chegava a ser física.
Ele se virou para a voz feminina, reconhecendo a secretária que tentara pará-lo mais cedo.
— O senhor null está chamando-o na sala de reuniões outra vez.
null assentiu e seguiu a secretária. Estava na hora de se encontrar com a mulher de sua vida.
Quando entrou na sala de reuniões, ele a viu, mas não entendeu. null estava diferente, é claro. Afinal, passaram-se sete anos! Mas, mesmo sem ter visto-a todos os dias nos últimos anos, a sensação que o dominou foi de que haviam se encontrado no dia anterior. Como se nunca tivessem ficado separados.
null, por outro lado, tinha os olhos arregalados e a boca aberta, tentando puxar mais ar. null reparou que seu cabelo estava bem mais comprido e ela estava mais magra.
Ele ficou congelado na porta da sala e null também não se mexeu do outro lado.
null só reparou que null estava ali porque ele abriu a boca:
— Vou deixar vocês conversarem.
Assim que ele saiu e bateu a porta, o barulho tirou ambos do transe.
null esticou seu braço até que encontrou o rosto de null do outro lado do cômodo, lhe dando um tapa estalado.
— Seu grande filho da puta! — ela gritou — O que você estava pensando quando foi preso?! Em me contar que estava fazendo exatamente aquilo que jurou que não fazia mais?!
null aproveitou o tapa e segurou a mão dela com força, sabendo que null era tão forte quanto ele e conseguia muito bem bater de frente. Puxou seu braço desumanamente esticado para trazê-la para perto.
— Não vou pedir desculpa por querer ajudar os outros, null! Você não podia me privar disso!
— Eu não podia, mas o governo sim! Até que você foi preso, porra!
Entre eles, null era o mais agressivo fisicamente; na hora de falar, null ganhava de lavada.
— Para de me puxar! — null gritou, tentando livrar seu braço do aperto de null, mas ele apenas a trazia para perto. Quando estava há menos de um metro de distância, parou de resistir e resolveu que podia lutar.
null soltou sua mão para que null pudesse voltá-la para o lugar certo. Erro dele, ela pensou, fechando a outra mão e socando-o bem na barriga.
Ele gemeu com a dor inesperada. Estreitou os olhos, deixando a raiva lhe invadir o sistema. Passara os últimos sete anos pensando nela e desejando vê-la para ser recebido daquela forma.
Quando viu, já tinha dado um soco forte no rosto dela. Se fosse qualquer outro ser humano, este tinha voado para longe; null apenas se desestabilizou por meros segundos antes de revidar, dando uma rasteira em null com sua perna esticada.
null caiu e null subiu sobre ele, fechando as mãos em punhos e começando a socar cada parte do corpo dele que alcançasse.
— Seu canalha, filho da puta, imbecil, cafajeste... — ela gritava enquanto desferia os socos, deixando a raiva que mantivera guardada dentro de si sair aos montes.
null bloqueava alguns, mas era uma batalha perdida. null sempre fora tão forte quanto ele, porém era bem mais habilidosa nas lutas; enquanto null apenas batia de qualquer jeito, null mantinha uma estratégia para manter seu adversário apanhando.
Ao invés de tentar bloquear os golpes, null usou seus poderes para poder enxergar os movimentos da mulher mais lentos do que eram deferidos e poder calcular o momento certo. Agarrou seus pulsos e então — finalmente — parou null.
Ela continuou a lutar, dessa vez movendo as pernas para poder chutá-lo, mas null já previa isso. Virou-os em um movimento rápido, prendendo null sob si.
Seu coração partiu-se em um milhão de pedaços quando viu que ela chorava.
— Por que você está chorando? — ele perguntou com a voz dolorida. Nenhum soco que ela lhe desse machucaria tanto quanto aquela expressão e as lágrimas manchando seu rosto.
— Porque você escolheu salvar o mundo a ficar comigo, seu imbecil!
Era isso que ela achava? Que ele preferia salvar o mundo a ficar com ela? Era uma ideia ofensiva, até.
— Não, null! Eu nunca escolheria isso, se essas fossem minhas opções. Que se foda o mundo! Eu escolho você em qualquer oportunidade!
— Então por que você ficou preso, null? Se tivesse me escolhido, não ficaria saindo por aí querendo bancar o herói! Teria ficado em casa, teria sido o marido que você me prometeu ser e não teria acabado na cadeia!
— Você está confundindo as coisas! — ele gritou, entrando em desespero. As lágrimas dela pareciam ser infinitas e isso estava puxando um gatilho dentro dele, fazendo-o sentir o rosto esquentar com umidade — Eu não queria ver você e null vivendo nesse mundo! Não podia aceitar criar minha filha em um lugar onde somos chamados de Diferentes e é um crime ser quem somos! Minha filha não é um erro genético! Minha mulher também não!
null percebeu que sua voz estava alta e rápida demais. Percebeu que estava chorando porque uma lágrima caiu de seu rosto e atingiu a bochecha já úmida de null.
Os dois se encararam por exatos três segundos de calmaria.
Depois, explodiram juntos.
Ele atacou a boca dela como se a distância estivesse matando-o. Durante todo o tempo que estivera preso, ficara imaginando como beijaria sua mulher quando saísse da cadeia — isso quando pensava positivamente e se imaginava fora — e, em suas fantasias, ele era calmo; saboreava o gosto de null, como se tentasse resgatar todo o tempo perdido através do beijo.
A realidade não era nada como a fantasia em sua cabeça.
Ele a beijava de um modo faminto, como se não conseguisse mais passar um segundo sem aquele beijo, sendo que null retribuía do mesmo jeito. As mãos dele continuaram prendendo os pulsos dela, tentando controlar o impulso de rasgar-lhe as roupas ali mesmo, naquela sala de reuniões.
null mordeu o lábio inferior de null com delicadeza, como se estivesse com medo de quebrá-lo, mas sem conseguir refrear a vontade da mordida.
null quebrou o beijo na mesma hora.
— null, que porra é essa?
Eles nunca foram pacíficos na cama. Nunca precisaram. Ambos eram super fortes e agüentavam qualquer coisa que o outro inventasse. Quando null foi embora e null ficou com null, acabou machucando-o na primeira noite que ficaram juntos.
A voz irritada dele havia acordado-a. Ela estava com raiva de null, não tinha a menor condição de continuar com aqueles beijos.
— Eu é que pergunto! — ela devolveu, esticando os pulsos de uma vez, tornando a área fina o suficiente para que pudesse escapar do aperto dele — Que porra é essa?!
Com os braços libertos, null tomou impulso e os virou outra vez, ficando sobre null, prendendo o corpo dele com suas pernas.
— Você não pode passar sete anos na cadeia e achar que, quando sair, as coisas vão estar iguais. — null ralhou, sua voz ameaçadora. null reconheceu aquele tom; era o mesmo tom que ela usava para ameaçar os bandidos que eles perseguiam quando eram mais jovens.
Ele também se lembrava do quão excitado ficava quando null assumia o controle.
As mãos dela estavam pressionando os ombros dele, o que não o impedia de mover os braços totalmente. Ele aproveitou a oportunidade e agarrou a cintura fina, dando um tranco para frente, fazendo com que null descesse de suas coxas e se sentasse em seu quadril. Com a desculpa de se estabilizar, null rebolou, sentindo o volume que estava crescendo na frente da calça de moletom de null.
Aquela sala de reuniões não estava quente demais?
Os dois se encararam com o mesmo brilho perigoso no olhar. Estavam brincando com fogo, mas queriam muito descobrir qual seria a sensação de se queimar.
— Não acho que as coisas estão iguais. — null respondeu — Só acho que você sentiu minha falta bem mais do que está demonstrando.
null o pressionou contra o chão com mais força, vendo suas unhas compridas começarem a rasgar o tecido fino demais da camiseta dele.
— E o que te faz pensar isso? — ela retrucou, com um sorriso zombeteiro no canto da boca. Não importava se estava sentindo o corpo queimar em todas as partes que tocavam nele; não daria o braço a torcer.
Afinal, ela estava magoada com ele, não estava?
Para aumentar o ódio dela, ele começou a rir.
— Mulher, você está mesmo me perguntando isso?
Dentro de null, pequenas explosões começaram a percorrer seu corpo, começando pelo meio das suas pernas, que estava tocando null. Ele a chamava daquele jeito quando estavam sozinhos, no quarto. Ele a chamava daquele jeito quando seu objetivo era um só: excitá-la.
Mulher. Era como um lembrete de quem ela era e do quão forte poderia ser. Uma vez, ele dissera que gostava de chamá-la de mulher porque gostava de lembrar null de sua força; afinal, nenhum homem jamais seria tão forte quanto uma mulher.
E, droga, depois de anos, ainda fazia efeito.
Era como se seu corpo correspondesse ao dele, sem nem se importar com o que seu cérebro estava gritando.
Para provar seu ponto, null aproveitou o momento de distração para se mover, mas null não estava tão distraída assim. Já tinha analisado o cômodo ao seu redor e eles estavam próximos da mesa de reuniões, que era composta por várias cadeiras ao seu redor. Antes que null pudesse ficar por cima dela outra vez, null o soltou e, em milésimos de segundo, pegou uma das cadeiras que estavam ali e a jogou sobre null, que quase não teve tempo de se defender, salvando apenas o rosto da pancada, se protegendo com os antebraços.
Levantou-se e correu para longe dele antes que perdesse a cabeça. Ela estava ali porque precisava contar para null tudo que acontecera em sete anos. Transar com ele não estava no planejamento do dia.
Quando null olhou para null no chão, percebeu que sua respiração estava descontrolada. Ambos estavam sem ar.
— Quer saber? — null gritou, se levantando e adquirindo um brilho animal nos olhos. null sabia que, agora, ele estava realmente puto — Eu não te fiz nada! Passei sete anos trancado na porra de um presídio!
— É pra onde as pessoas que não cumprem a lei vão. — null devolveu, afiada. Cruzou os braços para ajeitar a postura e null não conseguiu evitar acompanhar o movimento dos seios dela, agora amontoados em seus braços — E meu rosto está bem aqui.
Ele ergueu os olhos, irritado por ter se distraído.
— Eu sei muito bem onde está seu rosto. Conheço cada pedacinho de você.
null esticou os braços para socar null no estômago, mas ele já imaginara que ela faria isso — conhecia-a bem demais. Quando viu os braços da mulher se aproximando, se preparou para agarrá-los e prendê-los no corpo.
Foi exatamente o que ele fez.
null manteve null presa contra o seu corpo, colando as costas dela em seu peito. Apertou-a com uma força que seria capaz de quebrar ossos humanos, mas a mulher em seus braços não estava se quebrando; ela era forte demais para quebrar.
A blusa de botões que ela usava era branca, de um tecido grosso, mas os primeiros botões estavam abertos. Na posição em que estavam, null podia ver o topo dos seios dela, e a simples visão o fez salivar.
Sem pensar direito, ele agarrou os lados da blusa e deu alguns puxões fortes, parando apenas quando ouviu o tecido se rasgar em suas mãos.
null ficou petrificada em sua prisão feita de null. Isso por apenas alguns segundos. Logo, começou a gritar e a se debater, fazendo seu quadril se mover contra o de null involuntariamente.
— Seu imbecil! — ela gritou — O que você pensa que está fazendo?!
— Estou brigando com você. — null devolveu, apertando-a ainda mais forte, para que ela se esfregasse contra ele com mais vontade. null estava sem a blusa e agora ele podia ver todo o sutiã branco de renda. Estava morrendo de vontade de ver se a tatuagem de rasgos ainda estava nas costelas dela.
null percebeu que o volume no moletom de null tinha dobrado de tamanho. Agora, era impossível para qualquer um dos dois negar aquilo. Em sua mente, agradeceu por sua excitação não ficar visível como a dele — afinal, ela estava tão excitada quando null, isso se não estivesse mais.
A mulher se jogou para trás com força, empurrando null, batendo os dois na enorme televisão no cômodo, onde ouviu o barulho do vidro se quebrando.
O olhar raivoso de null se intensificou.
— Você está começando a ser uma vaca, null.
— Ah, você esperava que eu fosse boazinha em uma briga?
Ele a virou e a pressionou contra a televisão de parede quebrada. Pode ver o sangue que havia pingado no chão misturado ao vidro, provavelmente das costas de null.
null ergueu a cabeça. Estava presa e encurralada, mas não estava com medo.
Os lábios dela pareciam deliciosos. Eles eram deliciosos — null sabia disso. E, porra, ele precisava experimentá-los mais uma vez.
Quando tomou a boca dela para si, null não foi tão passiva quanto da outra vez. Investiu contra ele e o sugou para si. O beijo se desenvolvia como se ambos estivessem tentando expulsar o caos interior um no outro.
null ergueu as pernas e aproveitou que null estava mantendo-a presa para pendurá-las na cintura dele, surpreendendo-o quando o puxou para mais perto com violência. Os dois ouviram o barulho alto que a televisão fez ao se quebrar um pouco mais, mas não deram atenção. Os quadris de null estavam no meio das pernas de null, não havia mais nada que merecesse atenção.
null gemeu quando sentiu que ela o beijava como antes — como fazia sete anos antes.
Aos poucos, soltou as mãos da mulher.
Livre, null aproveitou para perder as mãos nos cabelos dele. Estavam de um tamanho diferente, mas ainda tinham a mesma textura, ainda a excitavam do mesmo jeito. Mesmo assim, puxou alguns fios, só para ter certeza.
O beijo foi quebrado, mas ele não tirou a boca da pele dela; com a boca aberta, apenas continuou os beijos molhados pelo rosto de sua mulher, indo até sua orelha e então descendo pelo pescoço, mordendo os ossos da clavícula e, finalmente, erguendo-a para que pudesse alcançar os seios maravilhosos, ainda escondidos pelo sutiã.
— Esses são novos. — ele comentou, se referindo ao sutiã.
— O que você esperava? Que eu não comprasse sutiã durante sete anos? — retrucou, áspera.
null ergueu os olhos, decidindo o que era maior: sua raiva ou seu tesão.
Percebeu que tinha as nádegas dela nas mãos, então apertou a região com força, puxando-a em direção à ereção em suas pernas. null puxou seus cabelos com mais força. Ele mordeu a parte descoberta do seio dela. Ela gemeu.
null segurou-a no colo com facilidade; ele era bem forte. Posicionou a mulher sobre a mesa de reuniões, colocando-a deitada, com as pernas penduradas e o tronco sobre o mogno.
— Pensei muito nesses últimos anos. — ele admitiu — No seu gosto, para ser mais exato. — explicou, se abaixando para ficar exatamente na altura da virilha dela.
Ah, deus! null estava surtando. O ar lhe faltava.
Quando foi que eles pararam de brigar para começar aquilo?
Os botões de sua calça jeans foram abertos sem nenhum pudor e nenhuma delicadeza. Se sua mente não estivesse tão nublada, conseguiria confirmar se os botões haviam voado ou não. Como se para confirmar o quanto era rude, null puxou a calça para baixo com ainda mais raiva do que arrancara os botões, arranhando as coxas de null no processo, deixando-a apenas com a calcinha branca que combinava com o sutiã.
Ele aproveitou que ela estava deitada em sua frente para analisar o corpo que tanto amava. A tatuagem ainda continuava em suas costelas e os olhos de null continuavam com o mesmo brilho perigoso de sempre — olhe demais e seja devorado, evite olhar e se arrependa por ter perdido a chance.
Sentiu o próprio corpo quente demais, reagindo ao da mulher. Puxou a camiseta pela gola, jogando-a em qualquer canto da sala. O ato fez null pressionar as pernas uma na outra, para tentar criar algum tipo de fricção em seu clitóris desesperado por atenção.
null separou suas pernas de modo bruto e beijou sua barriga, logo abaixo de seu umbigo. Logo, começou a dar mordidinhas na linha acima de sua calcinha, fazendo-a tremer de ansiedade. Finalmente, capturou o elástico com os dentes, esticando-o até soltá-lo, só para que null sentisse a dor aguda estalando na pele.
E, para total infelicidade dela — e satisfação dele — ela gemeu.
— Pare. Agora. — ordenou null, sem nenhuma convicção na voz. Era melhor que ela negasse o que queria e mantivesse a consciência limpa do que aceitar passivamente sem lutar, como se fosse uma fraca.
null soltou uma risada fraca, que foi abafada na virilha molhada da mulher.
— Como se você quisesse. — ele retrucou — Você está tão molhada quanto eu estou duro.
Ele soltou uma das coxas dela apenas para tocar o fundo vergonhosamente molhado da calcinha branca.
null arqueou as costas e fechou os olhos.
— Está tudo... Diferente. — ela murmurou, não se lembrando direito o motivo de ainda estar falando.
O toque do homem sumiu de sua pele, mas ela ainda sentia o calor dele próximo. null ficou em silêncio, esperando que null abrisse os olhos. Quando aconteceu, ela o encontrou pairando sobre ela, as mãos de cada lado de sua cabeça, lhe dando uma visão ampla dos braços maravilhosamente tonificados dele.
Droga, null queria morder aqueles braços.
¬— Nunca mais fale assim. — ele sussurrou, mas soou como uma ameaça — Não use essa palavra, mulher. — null começou a acariciar o pescoço de null, descendo o toque lentamente pela parte descoberta de seu seio e descendo pelas costelas, nas tatuagens dela — Nada está Diferente. — a mão dele alcançou sua calcinha novamente e um pânico se apossou dela; estava com medo de que null provocasse-a e parasse de tocá-la na melhor parte, como fizera segundos atrás — Nós não somos Diferentes.
Então, ele atacou seu pescoço com a boca enquanto sua mão começou a acariciá-la por sobre a calcinha, provocando toda a região sem se concentrar no ponto intumescido que gritava por null. null gemeu alto, sem conseguir se controlar. Suas mãos agarraram os braços tatuados de null, enterrando suas unhas na pele, sem se importar se machucaria ou não: do mesmo jeito que ele não poderia machucá-la, null também não conseguiria nem se tentasse.
null mordeu seu pescoço com certa força exatamente quando seu dedo atravessou a barreira de tecido e encontrou a pele escorregadia de null. Ela mordeu os lábios para não fazer barulho quando ele começou a explorar sua entrada. A respiração ofegante de null bem ao lado do seu ouvido estava fazendo-a perder a cabeça, mas nada se comparou ao toque do indicador dele no clitóris inchado dela.
O grito que null soltou fez o peito de null se inflar em orgulho.
Ele nem havia tocado-a direito e já podia sentir que estava próxima do orgasmo. Quer dizer, null conhecia seu corpo muito bem. Sabia exatamente o que fazer. E já fazia muito tempo que ela estava esperando pelo toque dele; sete anos, para ser mais específica.
Os olhos dela estavam fechados, então ela não viu quando ele se abaixou e trocou os dedos pela boca. Seus braços esticaram na mesa, o suficiente para alcançar as bordas, onde ela apertou com força, tentando descontar o tesão que sentia. Nem ouviu quando o mogno se quebrou em suas mãos, empurrando pedacinhos de madeira para suas palmas e manchando parte do móvel com o sangue.
null a explorava com a língua faminta, bebendo null com a sede de quem ficou sete anos sem água. Sugou seu clitóris e suas mãos apertaram as coxas dela para que se mantivessem abertas, porque, involuntariamente, ela tentava fechá-las para aumentar a fricção.
Ele parou de chupá-la por um segundo, apenas para vê-la se contorcer.
— Como pode negar que sentiu minha falta? — ele indagou, sem esperar por uma resposta real — Na minha boca, você floresce, você festeja.
null ergueu o pescoço, só para ter o prazer de vê-lo ajoelhado em sua frente, a cabeça entre suas pernas.
null sorriu, a boca molhada com o líquido dela. Pirraçou seu clitóris com dois dedos antes de usá-los para penetrá-la, começando a procurar aquele ponto dentro dela que nenhum outro homem conseguia encontrar.
Ela nem ficou surpresa quando null o encontrou sem esforço nenhum. Antes que ela pudesse se recuperar das novas carícias, sentiu a boca quente dele se fechar sobre seu clitóris, chupando-a do jeito perfeitamente certo.
Segundos depois, ela gritou quando o orgasmo a atingiu com força total.
— Você vê? — null perguntou, enquanto ela se recuperava da sensação maravilhosa — Eles podem nos chamar de Diferentes, mas somos humanos. Com desejos e necessidades humanas, assim como eles.
null não tinha condição de responder.
null já estava sobre ela outra vez, brincando com seus lábios, preparando-a para um beijo quando ouviram uma batida na porta.
— null? Está tudo bem aí? — null gritou — Eu ouvi uns barulhos estranhos.
Ela pulou com o susto. Era por isso que ficar com null não era uma boa ideia! Estava apaixonada por null!
Como fora se esquecer que estava apaixonada por null null?!
null empurrou null, jogando-o para longe.
— Mais ou menos. — null respondeu — Espere um minuto.
Recolheu suas roupas com pressa, colocando sua calça e percebendo que sua blusa social estava arruinada; todos os botões estavam espalhados pelo escritório, então ela apenas vestiu a peça como pôde. Aproveitou para analisar o cômodo, encontrando-o destruído.
null chamou sua atenção.
— O que foi?
— null! — ela murmurou. null se aproximou, sentindo a hesitação dela e começando a odiar o tom em sua voz.
— E daí?
— Eu não posso ficar com você porque... — null respirou fundo. Tinha que falar como se estivesse tirando o esparadrapo de uma ferida — Eu estou com null agora.
Ah, não era como tirar um esparadrapo. Era como se ela estivesse quebrando uma promessa ao arrancar os pontos de uma ferida. Pelo menos, foi isso que sentiu ao encarar o olhar magoado dele.
— O quê?!
null entrou na sala, já que null tinha gritado. O olhar do homem vagou pelo escritório e então parou nos dois super humanos parados no meio dele.
— Nós meio que... Brigamos. — null murmurou, tentando ao máximo esconder a vergonha que estava sentindo, fechando a blusa de botões — que estava sem botões — com as mãos.
null não teria acreditado se não visse sangue espalhado pelo escritório. Inclusive null e null tinham vestígios de sangue pelo corpo. Na visão dele, parecia apenas que eles tinham destruído seu escritório em um cenário de sexo selvagem.
Ah, se ele soubesse.
— Podemos tentar conversar agora? — null sugeriu — Nós três? Na minha sala.
— Tinha alguém no andar? — null perguntou, com medo de alguém ter ouvido algo.
— Não, você sabe que esse andar é só meu. E eu desci para o refeitório para dar um pouco de privacidade para vocês. Não achei que tentariam se matar.
null não falava nada, apenas olhava acusadoramente para null.
Ele poderia morrer ali mesmo quando viu null tirar seu paletó para colocar sobre os ombros de null e guiá-la para fora da sala.
Antes de passar pela porta, null viu o marido — ou seria ex — se quebrar aos poucos.
Capítulo 9
— Não vou ficar com você. — null respondeu, seco. null lhe explicou todos os detalhes de sua condicional e que null havia lhe oferecido um teto para que ele não precisasse de um abrigo. Depois de saber que null estava morando com ela, ele preferia cortar um braço à morar com os dois.
— null, nenhum abrigo convencional quis te aceitar por você ser um Diferente. — null argumentou — Eu e null conversamos e achamos que seria uma boa ideia você morar na sua antiga casa, na academia do subsolo. Poderia ficar mais perto dos seus filhos, também.
null congelou. Não, por favor, não!
— Filhos? No plural? — null olhou para null, esperando uma explicação. Na hora, null entendeu. null não sabia sobre Jake.
— null. Ela está com quinze, quase dezesseis anos. E... E Jake.
null não conseguia respirar e seus olhos ardiam com a vontade de chorar.
— Jake? Você teve um filho com null?!
— Não! — null se apressou em responder. De todos os cenários que imaginou contando para null sobre seu filho, aquele era o pior — Jake vai fazer sete anos em alguns meses.
Um silêncio pesado caiu sobre o escritório de null.
Subitamente, null se levantou, derrubando a cadeira onde estava sentado. Ficou de costas para os dois e manteve os olhos na parede de vidro, fingindo estar olhando para a cidade.
— Eu vou ficar com null. — ele murmurou depois do que foram longos minutos. null quis gritar ao ouvir a voz embargada pelo choro.
— Por questões legais, era melhor que você ficasse com...
— Eu vou ficar com o null, porra! — null gritou, se virando para os dois sentados atrás de si. Seu rosto estava vermelho e null notou os olhos selvagens, assim como seus dentes proeminentes. Nem precisava olhar para as mãos dele para saber que suas unhas haviam se transformado em garras. E a voz dele... null não estava falando, estava rugindo.
Nesses momentos, onde a raiva dominava seu corpo, null temia por ele. null deixava a besta dentro de si o controlar.
— Fique com ele essa semana. — null murmurou, calmamente. Só ela sabia lidar com null quando ele ficava daquele jeito — Eu vou ajeitar a academia para você e, semana que vem, você se muda, tudo bem?
null não disse nada. null tinha dito que estava tudo diferente e ele não tinha acreditado. Agora, ele acreditava.
— null? — null chamou, tomando cuidado com o tom que usaria. Qualquer palavra errada o faria se retrair totalmente — null sentiu muito a sua falta.
Ele voltou a chorar e assentiu. Faria qualquer coisa por sua filha. Convenceu-se de que não era por null. Era por null. E pelo filho que nem teve a chance de conhecer.
Quando null entrou em seu carro para voltar para casa, pegou o colar de pegada. Havia tirado-o correndo e jogado-o embaixo do banco do passageiro. Não queria que null soubesse que ainda usava o colar todos os dias, sem exceção.
Capítulo 10
Naquela noite, depois que jantaram, null foi até o quarto de null, levando Jake em seus braços. null ficou no quarto do casal; era uma reunião particular de família e ele não se sentia convidado.
— O que está acontecendo? — null perguntou logo de cara. Ela não era boba, já tinha percebido que algo estava errado.
null se sentou na cama da filha, Jake ainda em seu colo. null se ajeitou sob as cobertas, colocando seu notebook de lado.
— Você se lembra do seu pai, null?
Os olhos da menina brilharam. É claro que ela se lembrava de seu maior herói. Falava sobre o pai para o irmão mais novo o tempo todo — e Jake amava ouvir.
— O que tem meu pai?
— Eu já te contei o que aconteceu com a nossa família. E, assim que você ficar mais velho — ela se inclinou para Jake, para mostrar que se referia à ele — vou te explicar com mais detalhes.
— O papai foi preso. Ele usava os poderes. O governo não gosta de nós porque somos Diferentes. — null resumiu, usando um tom ácido — Não há mais nada para explicar. Por que estamos falando dele?
null respirou fundo e contou até dez. Em nenhum livro que ela lera sobre filhos ensinava a contar que o pai tinha saído da cadeia.
— null é um bom advogado. Um dos melhores. Ele esteve cuidando do caso do seu pai desde sempre. Eles eram bons amigos, então null se esforçou o dobro para melhorar as coisas para o pai de vocês.
null arregalou os olhos. Não sabia se gostava do rumo daquela conversa. Jake era simplesmente novo demais para entender qualquer coisa.
— E, mesmo com todo o talento e o esforço de null, seu pai precisou continuar na cadeia por um tempo. As coisas aqui não são fáceis para pessoas como nós.
— Diferentes. — null murmurou, relembrando a palavra. Ela a usava sempre que possível, para se lembrar quem era e qual era seu lugar na sociedade.
— Agora, estamos melhor. Novas associações e ONG’s estão nos apoiando e, em breve, ser um de nós não será mais crime. null conseguiu provar que o pai de vocês é um ser humano como qualquer outro, mesmo com poderes. Então, ele foi solto.
Demorou um minuto para os dois filhos entenderem. Jake não entendeu, na verdade; as palavras de null foram muito complicadas. Mas null... null estava sem fala.
— O papai... Ele não está mais na cadeia?
O sorriso crescia em seu rosto gradualmente, como se a notícia estivesse sendo processada aos poucos.
— Não.
— Ele... — a menina estava sem ar — Ele vai voltar para casa?
— Vai, sim.
null gritou e abraçou a mãe, rindo de felicidade e limpando as lágrimas dos olhos. Jake reclamou quando foi “amassado” entre elas, mas não conseguiu evitar seu riso também. null sentiu os pedaços quebrados de seu coração começarem a se juntar ao ver a felicidade no rosto de suas crianças.
— Então isso quer dizer que eu vou conhecer meu pai de verdade?
null assentiu para Jake e encheu o rosto do menino de beijos. null também.
Depois de conversarem um pouco mais, null colocou Jake em sua cama e encontrou com null no quarto.
— Foi bem, eu imagino? — null perguntou.
null sorria tanto que brilhava.
Ao ver que null também sorria, se sentiu culpada. Qualquer homem não suportaria a ideia de ver a esposa — mesmo que não fossem casados de verdade — reencontrando o ex e ainda convidando-o para morar com eles. Mas null estava tão feliz por ela e por seus filhos! Ele era maravilhoso e null era a mulher horrível que havia traído-o naquele dia.
Ela assentiu e correu para os braços abertos do homem. Deixou que null a apertasse bem forte e acalmasse seu coração. Podia parecer que sabia o que estava fazendo, mas era tudo falso. Por dentro, sentia um furacão bagunçando sua alma.
Nos braços de null, permitiu-se chorar e colocar para fora o peso que estava pressionando seus pulmões.
Enquanto isso, null tentava dormir, se revirando na cama. A ideia de ver o pai estava lhe causando insônia. Ouviu os passinhos apressados de Jake antes de vê-lo parado na porta de seu quarto.
— null? — ele chamou, falando o mais baixo possível para não acordar ninguém — Posso ficar com você um pouquinho?
null acendeu a luz do abajur e murmurou uma resposta afirmativa. Em um piscar de olhos, Jake estava na sua frente, esperando que ela abrisse um espaço para ele. Mas null não abriu espaço; ela apenas puxou o irmão e o colocou sentado em seu colo, cobrindo ambos com o edredom.
— O que foi? — ela perguntou assim que ficaram confortáveis.
— Você acha que o nosso pai vai gostar de mim?
null sentiu Jake tremendo em seus braços, então o apertou mais forte.
— Eu tenho certeza que ele vai gostar de você, J! — ele não parecia acreditar nela, então null revirou os olhos — Olha, eu conheci o papai, não conheci? E se eu estou falando que ele vai gostar de você, eu estou falando a verdade!
Jake sabia que a irmã era grossa, sempre fora, então não se incomodava quando ela falava com ele usando um tom rude. Mesmo tão pequeno, também sabia que ela faria qualquer coisa por ele.
Era um menino de poucas palavras, odiava demonstrar sentimentos — assim como null — mas sentia a necessidade de ser compreendido. No momento em que percebeu que null entendera seus sentimentos, não mencionou mais o assunto.
— Posso dormir aqui com você hoje? — ele perguntou baixinho.
null não respondeu. Apenas se deitou e ajeitou o irmão em seus braços. Com um simples movimento das mãos, abriu o maleiro de seu quarto e pegou outra coberta. Manipulou o objeto até que encontrou a posição perfeita e deixou-o cair suavemente sobre eles.
— A mamãe não gosta que a gente use os poderes, null.
— A mamãe não está aqui, está? Eu não conto, se você não contar.
Jake riu e abraçou a irmã com mais força.
Capítulo 11
— Santa porra! null null!
null riu quando null abriu a porta e o puxou para um abraço assim que o reconheceu.
Eles eram amigos antes de null ir para a cadeia e fora null quem o apresentara para null. Se conheceram em um bar, na primeira vez que null e null saíram para beber em Los Angeles. null deu em cima de null e, ao invés de brigar, resolveram beber juntos. Nenhuma amizade poderia ser tão sólida quanto a deles.
— Achei que eu nunca mais fosse ver você! — null exclamou assim que soltou null do abraço.
— É, eu saí daquela merda.
— E o que você ‘tá fazendo aqui? Achei que você ia estar bem ocupado com a null, huh? — ele perguntou de modo sugestivo.
Automaticamente, o sorriso de null se tornou triste.
— Pois é. Sobre isso, será que eu posso passar a noite aqui? E, se você acha que a null estava me esperando, preciso te contar umas novas.
null percebeu que se empolgara demais e não tinha deixado null entrar. Saiu do caminho e null entrou.
— null, quem é? — uma voz feminina gritou. null arregalou os olhos.
— Cara, por falar em umas novas... Eu casei.
null explodiu em risadas.
Capítulo 12
null e Joanne foram os melhores anfitriões possíveis, considerando que null era um ex-presidiário e um convidado inesperado. Joanne era um caso raro de pais com poderes e filho normal. Sempre foi ativista na luta dos Diferentes a acabou encontrando null em um mês e casando com ele no mês seguinte. Simples assim.
— Cara, não acredito que o null roubou a sua mulher! — null comentou. Eles estavam fumando um baseado na sacada de null, enquanto Joanne estava no banho.
null pegou o baseado da mão de null.
— Casou com o bagulho, foi? — null perguntou, se referindo ao tempo que null estava tragando — Eu não sei o que aconteceu, cara. Num dia, null me ama. No outro, ela ‘tá dando pro null!
— Mas, null! Não foi de um dia pro outro. Você ficou sete anos preso! E não fala da null assim que depois você vai lembrar e ficar puto.
null balançou a cabeça, tragando mais uma vez.
— Eu sei. ‘Tô puto comigo. Sei que a culpa é minha. Mas, se eu tentar odiar ela... Se eu tentar jogar a culpa nela... Talvez eu me sinta melhor. E também pare de pensar nela.
null começou a rir.
— Você nunca vai parar de pensar nela. Você ama essa mulher mais do que tudo, seu imbecil.
— Eu estou vazio, eu sei. — null murmurou — Eu não tenho nada. Pensei que... Sei lá.
— Você pensou que nada do que você fizesse poderia tirá-la de você. — null raciocinou — Aí você se fodeu e foi preso. E continuou achando que a mulher ia esperar por você. Como se a vida dela girasse ao seu redor.
null odiava como null ficava esperto quando fumava. Passou o baseado.
— Você parou de falar com ela?
— Ela sumiu. — null corrigiu — Tentei ligar para ela logo depois que você foi preso, mas ela não atendia. Aí, fui até a sua casa, mas ela não me deixou entrar e pediu que eu me afastasse e, principalmente, não chegasse perto de null. Acho que ela ficou com medo de conseguirem rastrear os filhos. E eu não sabia que ela estava grávida. Ela não contou pra ninguém. Até mandei um convite do meu casamento pra ela, mas null nunca me respondeu. Eu já tinha entendido o recado, mas ainda queria que ela fosse, sabe? Você e null são especiais.
null assentiu e pegou o cigarro de maconha que null lhe passava.
— Eu nunca gostei do null. — null comentou, depois de alguns minutos em silêncio.
null riu.
— Que mentira da porra! Você podia não confiar nele porque ele não é como nós, mas você gostava do cara!
null não negou nem confirmou.
— Não consigo parar de achar que é culpa dele.
— Você só acha isso porque não consegue confiar em humanos, null. Não é culpa do cara. E ele até consertou a sua vida.
— Ele conseguiu me tirar daquela merda, mas eu ainda preciso arrumar um emprego.
— O que você pretende fazer?
— Eu sei lá. Eu era advogado, mas quem vai contratar um Diferente ex-presidiário? Ainda mais para a minha profissão!
null queria falar algo que o incentivasse, mas entendia o ponto de null.
— Vai dar tudo certo, cara.
Era simples e clichê, mas era o melhor que null poderia oferecer. E foi o suficiente para null.
— E o que aconteceu com a Academia?
null olhou para os lados, nervoso. Queria garantir que não tinha ninguém ouvindo a conversa deles.
— Você se lembra do Bennett? — perguntou.
— Ele conhecia muitos de nós e ajudava a recrutar as pessoas.
null assentiu, confirmando.
— Quando você foi preso, ele meio que tomou o seu lugar como meu sócio. Pensei em oferecer o cargo à null, principalmente por ela ser sua esposa, mas como ela me pediu para ficar afastado, imaginei que ela não quisesse nem saber dos nossos planos.
— null nunca foi uma mulher engajada no nosso movimento. — null concordou.
— Exato. Por isso, achei que Bennett era a melhor escolha para ser meu sócio. Fui atrás de outro lugar para treinarmos, já que a academia da sua casa estava fora de cogitação. Pensei em contar para null, ele tem influência, seria um bom aliado para nós.
— Porra, cara! Eu já te disse... — null reclamou, mas null ergueu a mão e o interrompeu.
— Nunca confie em humanos. — null terminou, falando uma das frases preferidas de null — É, eu sei. Fiquei lembrando de você falando e, como uma parte da Academia é sua, achei melhor não falar nada. Arrumamos um lugar foda, tínhamos um número considerável de pessoas, até que as merdas começaram a acontecer. Bennett arrumou uma namorada e, do nada, ficou noivo e convidou todos nós para o casamento. Mas eu sempre achei a mulher dele... Estranha. Não fui no casamento. Eu tinha acabado de conhecer a Joanne e ela ainda não sabia o que eu era e eu não sabia sobre ela, então preferi não ir e não levá-la num lugar cheio de pessoas como nós. E, quando chegou o dia...
null pareceu ter dificuldades para falar. Seu cenho se franziu e ele deu uma tragada muito mais profunda no baseado. null se inclinou em sua direção, querendo saber o final da história.
— O que aconteceu? — ele perguntou, curioso. E o comportamento de null apenas aguçou ainda mais sua curiosidade.
— Era uma armadilha, null. — null murmurou, piscando com força para afastar as lágrimas. Ainda assim, uma acabou escorrendo e ele a limpou com as costas da mão — Todos eles morreram.
— Bennett armou para vocês?! — null questionou, incrédulo. Ele conhecia Bennett e confiava nele, jamais acreditaria numa história dessas.
— Não, não o Bennett. A noiva dele. Ela não era uma Comum. Era como nós, mas estava infiltrada. Nossos amigos assistiram o casamento e, depois, na hora de ir para festa, receberam um papel com um endereço diferente, afastado. Foram chegando aos poucos e, logo, estavam todos lá. Perceberam que tinha algo errado e ligaram para Bennett, que foi buscá-los e mostrar o local certo. Quando ele chegou, o lugar explodiu. Matou todos eles.
null estava em choque.
— E a vadia foi tão esperta que eles até enviaram convites com o endereço do salão minado, mas trocaram de última hora. Todos os convidados dela escaparam, mas os de Bennett... Bem, os de Bennett explodiram junto com ele. E tudo pareceu ser a porra dum acidente!
— Como... Como você descobriu que foi ela?
O baseado foi passado. null já estava mais leve, mas o barato de null fora cortado depois daquela história.
— Bom, depois que mataram trinta dos meus amigos, eu fui atrás para descobrir tudo. Margaret James, o nome da vadia. Ela tem o poder de mudar de forma, mas não como você. Ela consegue roubar a identidade de outras pessoas, mas é apenas isso. A força dela não aumenta e nem os reflexos dela melhoram, como acontecem conosco. Existem pessoas como ela, não são Comuns e não são como nós. São um meio termo.
— Ela tem os poderes, mas se null brigasse com ela...
— Provavelmente null chutaria a bunda dela. Ela não tem a força. Descobri que essas pessoas são bem mais comuns do que parecem; a diferença é que eles não se destacam no mundo humano. Demoram até desenvolverem os poderes, não são como nós que já nascemos nos transformando. Então, eles não se encaixam nos Comuns nem nos Diferentes. Sendo assim, eles começaram a trabalhar como assassinos de aluguel, especializados em nos caçar.
— Puta merda...
— E isso não é o pior. Essa Margaret James é uma vadia, mas não sei se ela é ela mesmo, entende? Ela pode se transformar em quem quiser, então pode ser quem quiser. Ela pode estar em qualquer lugar, fingindo ser qualquer pessoa.
Os dois ficaram em silêncio outra vez, apenas se acalmando. null sentia sua cabeça pesada, devido a quantidade de informação que recebera em um único dia.
Então, se lembrou de algo essencial.
— O cara que foi me buscar na prisão tentou me matar no caminho de volta. — soltou, bebendo um gole da água que estava na mesa entre eles. O baseado deixava sua garganta seca.
— O quê?! — null gritou — Como assim cara?
null contou para null o que vivera naquela manhã. Deixou bem claro que o homem que tentara matá-lo trabalhava para null.
— E por que você não contou para ele?
— null, eu já te disse: não consigo confiar no null. Se ele mandou mesmo o cara me matar, ele não pode saber que eu sei. Precisei me fingir de idiota.
— null, eu sou contra. Você devia contar para ele. Sua desconfiança está passando dos limites.
Eles ficaram mais alguns minutos ali, até que o baseado acabou. null passara o dia no escritório de null, ajudando-o a arrumar a sala que ele quebrara. Depois, pediu para uma das secretárias conseguir o endereço de null. Quando null decidiu que já estava na hora de ir para casa, ele deu uma carona para null até o apartamento do amigo. Eles conversaram, jantaram — Joanne trabalhava em um restaurante, então fez uma refeição caprichada, especialmente para null — e depois conversaram um pouco mais. null pensou que não fosse conseguir dormir, pensando em null, mas assim que sua cabeça encostou no travesseiro, o sono tomou seu corpo e ele dormiu sem nem perceber.
— Cara, não acredito que o null roubou a sua mulher! — null comentou. Eles estavam fumando um baseado na sacada de null, enquanto Joanne estava no banho.
null pegou o baseado da mão de null.
— Casou com o bagulho, foi? — null perguntou, se referindo ao tempo que null estava tragando — Eu não sei o que aconteceu, cara. Num dia, null me ama. No outro, ela ‘tá dando pro null!
— Mas, null! Não foi de um dia pro outro. Você ficou sete anos preso! E não fala da null assim que depois você vai lembrar e ficar puto.
null balançou a cabeça, tragando mais uma vez.
— Eu sei. ‘Tô puto comigo. Sei que a culpa é minha. Mas, se eu tentar odiar ela... Se eu tentar jogar a culpa nela... Talvez eu me sinta melhor. E também pare de pensar nela.
null começou a rir.
— Você nunca vai parar de pensar nela. Você ama essa mulher mais do que tudo, seu imbecil.
— Eu estou vazio, eu sei. — null murmurou — Eu não tenho nada. Pensei que... Sei lá.
— Você pensou que nada do que você fizesse poderia tirá-la de você. — null raciocinou — Aí você se fodeu e foi preso. E continuou achando que a mulher ia esperar por você. Como se a vida dela girasse ao seu redor.
null odiava como null ficava esperto quando fumava. Passou o baseado.
— Você parou de falar com ela?
— Ela sumiu. — null corrigiu — Tentei ligar para ela logo depois que você foi preso, mas ela não atendia. Aí, fui até a sua casa, mas ela não me deixou entrar e pediu que eu me afastasse e, principalmente, não chegasse perto de null. Acho que ela ficou com medo de conseguirem rastrear os filhos. E eu não sabia que ela estava grávida. Ela não contou pra ninguém. Até mandei um convite do meu casamento pra ela, mas null nunca me respondeu. Eu já tinha entendido o recado, mas ainda queria que ela fosse, sabe? Você e null são especiais.
null assentiu e pegou o cigarro de maconha que null lhe passava.
— Eu nunca gostei do null. — null comentou, depois de alguns minutos em silêncio.
null riu.
— Que mentira da porra! Você podia não confiar nele porque ele não é como nós, mas você gostava do cara!
null não negou nem confirmou.
— Não consigo parar de achar que é culpa dele.
— Você só acha isso porque não consegue confiar em humanos, null. Não é culpa do cara. E ele até consertou a sua vida.
— Ele conseguiu me tirar daquela merda, mas eu ainda preciso arrumar um emprego.
— O que você pretende fazer?
— Eu sei lá. Eu era advogado, mas quem vai contratar um Diferente ex-presidiário? Ainda mais para a minha profissão!
null queria falar algo que o incentivasse, mas entendia o ponto de null.
— Vai dar tudo certo, cara.
Era simples e clichê, mas era o melhor que null poderia oferecer. E foi o suficiente para null.
— E o que aconteceu com a Academia?
null olhou para os lados, nervoso. Queria garantir que não tinha ninguém ouvindo a conversa deles.
— Você se lembra do Bennett? — perguntou.
— Ele conhecia muitos de nós e ajudava a recrutar as pessoas.
null assentiu, confirmando.
— Quando você foi preso, ele meio que tomou o seu lugar como meu sócio. Pensei em oferecer o cargo à null, principalmente por ela ser sua esposa, mas como ela me pediu para ficar afastado, imaginei que ela não quisesse nem saber dos nossos planos.
— null nunca foi uma mulher engajada no nosso movimento. — null concordou.
— Exato. Por isso, achei que Bennett era a melhor escolha para ser meu sócio. Fui atrás de outro lugar para treinarmos, já que a academia da sua casa estava fora de cogitação. Pensei em contar para null, ele tem influência, seria um bom aliado para nós.
— Porra, cara! Eu já te disse... — null reclamou, mas null ergueu a mão e o interrompeu.
— Nunca confie em humanos. — null terminou, falando uma das frases preferidas de null — É, eu sei. Fiquei lembrando de você falando e, como uma parte da Academia é sua, achei melhor não falar nada. Arrumamos um lugar foda, tínhamos um número considerável de pessoas, até que as merdas começaram a acontecer. Bennett arrumou uma namorada e, do nada, ficou noivo e convidou todos nós para o casamento. Mas eu sempre achei a mulher dele... Estranha. Não fui no casamento. Eu tinha acabado de conhecer a Joanne e ela ainda não sabia o que eu era e eu não sabia sobre ela, então preferi não ir e não levá-la num lugar cheio de pessoas como nós. E, quando chegou o dia...
null pareceu ter dificuldades para falar. Seu cenho se franziu e ele deu uma tragada muito mais profunda no baseado. null se inclinou em sua direção, querendo saber o final da história.
— O que aconteceu? — ele perguntou, curioso. E o comportamento de null apenas aguçou ainda mais sua curiosidade.
— Era uma armadilha, null. — null murmurou, piscando com força para afastar as lágrimas. Ainda assim, uma acabou escorrendo e ele a limpou com as costas da mão — Todos eles morreram.
— Bennett armou para vocês?! — null questionou, incrédulo. Ele conhecia Bennett e confiava nele, jamais acreditaria numa história dessas.
— Não, não o Bennett. A noiva dele. Ela não era uma Comum. Era como nós, mas estava infiltrada. Nossos amigos assistiram o casamento e, depois, na hora de ir para festa, receberam um papel com um endereço diferente, afastado. Foram chegando aos poucos e, logo, estavam todos lá. Perceberam que tinha algo errado e ligaram para Bennett, que foi buscá-los e mostrar o local certo. Quando ele chegou, o lugar explodiu. Matou todos eles.
null estava em choque.
— E a vadia foi tão esperta que eles até enviaram convites com o endereço do salão minado, mas trocaram de última hora. Todos os convidados dela escaparam, mas os de Bennett... Bem, os de Bennett explodiram junto com ele. E tudo pareceu ser a porra dum acidente!
— Como... Como você descobriu que foi ela?
O baseado foi passado. null já estava mais leve, mas o barato de null fora cortado depois daquela história.
— Bom, depois que mataram trinta dos meus amigos, eu fui atrás para descobrir tudo. Margaret James, o nome da vadia. Ela tem o poder de mudar de forma, mas não como você. Ela consegue roubar a identidade de outras pessoas, mas é apenas isso. A força dela não aumenta e nem os reflexos dela melhoram, como acontecem conosco. Existem pessoas como ela, não são Comuns e não são como nós. São um meio termo.
— Ela tem os poderes, mas se null brigasse com ela...
— Provavelmente null chutaria a bunda dela. Ela não tem a força. Descobri que essas pessoas são bem mais comuns do que parecem; a diferença é que eles não se destacam no mundo humano. Demoram até desenvolverem os poderes, não são como nós que já nascemos nos transformando. Então, eles não se encaixam nos Comuns nem nos Diferentes. Sendo assim, eles começaram a trabalhar como assassinos de aluguel, especializados em nos caçar.
— Puta merda...
— E isso não é o pior. Essa Margaret James é uma vadia, mas não sei se ela é ela mesmo, entende? Ela pode se transformar em quem quiser, então pode ser quem quiser. Ela pode estar em qualquer lugar, fingindo ser qualquer pessoa.
Os dois ficaram em silêncio outra vez, apenas se acalmando. null sentia sua cabeça pesada, devido a quantidade de informação que recebera em um único dia.
Então, se lembrou de algo essencial.
— O cara que foi me buscar na prisão tentou me matar no caminho de volta. — soltou, bebendo um gole da água que estava na mesa entre eles. O baseado deixava sua garganta seca.
— O quê?! — null gritou — Como assim cara?
null contou para null o que vivera naquela manhã. Deixou bem claro que o homem que tentara matá-lo trabalhava para null.
— E por que você não contou para ele?
— null, eu já te disse: não consigo confiar no null. Se ele mandou mesmo o cara me matar, ele não pode saber que eu sei. Precisei me fingir de idiota.
— null, eu sou contra. Você devia contar para ele. Sua desconfiança está passando dos limites.
Eles ficaram mais alguns minutos ali, até que o baseado acabou. null passara o dia no escritório de null, ajudando-o a arrumar a sala que ele quebrara. Depois, pediu para uma das secretárias conseguir o endereço de null. Quando null decidiu que já estava na hora de ir para casa, ele deu uma carona para null até o apartamento do amigo. Eles conversaram, jantaram — Joanne trabalhava em um restaurante, então fez uma refeição caprichada, especialmente para null — e depois conversaram um pouco mais. null pensou que não fosse conseguir dormir, pensando em null, mas assim que sua cabeça encostou no travesseiro, o sono tomou seu corpo e ele dormiu sem nem perceber.