Capítulo Único
O bar se chamava I. Lounge, onde eu era barman há dois anos.
Meu salário era razoavelmente bom para um simples barman, mas isso provavelmente acontecia porque a) era o maior bar de Londres e b) meu tio era o dono. I. Lounge abria de segunda a segunda. Durante a semana, apenas à noite, e, no sábado e no domingo, o dia inteiro. Eu trabalhava apenas durante a semana, praticamente a madrugada inteira.
Quando se trabalha em um bar, você sempre presencia as coisas mais bizarras do mundo. Bêbados são, muito provavelmente, o tipo mais engraçado e surpreendente que existe. Perdem a vergonha, o pudor... Alguns até mesmo perdem as roupas. E as brigas... Não se passava um semana sem que houvesse ao menos uma discussão alta.
Era mais um sexta-feira comum, e por comum eu quero dizer louca e cheia de pessoas falando alto e bebendo muita cerveja, muitos destilados, cantando no karaokê que meu tio ligava no fim de semana. Minha cabeça estava a mil com tantos pedidos no bar. Eu fazia uma bebida atrás da outra. Sex on the beach, cuba libre, piña colada...
— ! — As coisas haviam acabado de apaziguar quando meu tio apareceu. Era só o que me faltava. — Você já tirou sua pausa?
Olhei para o relógio da parede. Uma e quatorze. Eu deveria ter tirado a pausa há exatamente quatorze minutos.
— Hm... — torci a boca, sabendo o que viria a seguir. Meu tio odiava quando eu não tirava a pausa.
— Não acredito nisso, moleque! — Ele foi para trás do bar, parando ao meu lado e me dando um leve tapa na cabeça. — Você precisa comer!
— Desculpa. Você sabe como isso é louco às sextas.
— Sei, sei. — Ele fez um sinal impaciente com a mão. — Agora some da minha frente e só volte em um hora!
— Meia hora!
— Juro que te mato um dia, moleque!
Saí de trás do balcão, rindo. O lugar ainda estava cheio, mas a loucura de pedidos havia diminuído. As pessoas ainda aproveitavam o que havia em seus copos e pratos. Fui em direção à cozinha, pegando o lanche que havia deixado dentro e comendo muito rapidamente.
Saí do local, indo para os fundos do bar. Tirei o celular do bolso e olhei as horas. Uma e trinta e um. Suspirei e comecei a checar as notificações. Algumas marcações idiotas no Facebook, algumas mensagens de grupos do Whatsapp e muitas mensagens de . Comecei a digitar uma resposta quando ouvi uma voz um pouco alterada.
— Ei, parça, eu vi ela primeiro, vaza!
Franzi o cenho e comecei a caminhar com cuidado em direção à voz.
— Que viu o quê, meu! — uma voz diferente respondeu.
Virei a esquina e vi dois caras se olhando feio, e parada, de braços cruzados, uma garota linda os encarava. Eles estavam... Brigando por ela?
— Ei! — chamei a atenção dos três. O que eu estava fazendo? — O que está acontecendo?
— Se mete não, moleque.
Pisquei rapidamente. Ter cara de adolescente é uma merda.
— Eles estão te incomodando, moça? — perguntei diretamente para a garota. Ela me encarou, um pouco desconfiada, claro, mas confirmou com a cabeça. — Cavalheiros, terei que pedir para que se retirem. Vocês estão incomodando a moça.
Os dois me encararam como se eu fosse maluco. E eu precisava concordar com eles.
— Ou você vai...? — um deles disse arrastado. Ótimo, bêbados.
— Chamar a polícia. — balancei os ombros. Eles começaram a rir. Suspirei e peguei o celular, fingindo discar o número da polícia, levando-o a orelha em seguida. — Alô? Sim, eu gostaria de relatar uma tentativa de estupro...
— Oooouuuuu, calma aí, parça! – Os dois levantaram as mãos, em sinal de rendição. — Precisa disso aí não, já estamos de saída!
— É, estamos. Desculpa aí, moça!
Os dois se afastaram. Olhei para a garota. Ela me encarava com uma sobrancelha erguida, os braços ainda cruzados. Sorri e guardei o celular de volta no bolso.
— Você está ok?
— Sim. — Ela enfim descruzou os braços, balançando os ombros em seguida. — Obrigada. Eles estavam enchendo o saco.
— Tentaram fazer alguma coisa com você?
— Não, só estavam discutindo para ver quem iria me acompanhar até o I. Lounge. — ela revirou os olhos.
— Ah, você está indo para lá? — perguntei animado. Por que eu fazia esse tipo de coisa comigo mesmo?
— Sim, combinei de encontrar alguns amigos. Por quê? — o olhar desconfiado voltou.
— Trabalho lá. Sou barman.
— Oh, sim! — ela abriu um sorriso animado. — Então você poderá me acompanhar até lá, correto?
Senti meu rosto esquentar. O quão idiota eu era?
— Cla-claro — guaguejei, limpando a garganta em seguida. — Vamos? — dei o braço para que ela segurasse, o que fez após rir um pouco. — A propósito, me chamo .
— .
Caminhamos conversando até o bar, nos separando assim que chegamos.
— Está entregue, senhorita — me curvei, fazendo-a rir mais.
— Obrigada, . Meu herói — ela falou com um drama exagerado, me fazendo gargalhar.
— Boa sorte achando seus amigos.
— Boa sorte preparando suas bebidas.
Bati continência, dando um falso sorriso triste, e voltei para o bar, arrancando meu tio de lá à força. Ele insistia que eu tinha mais vinte minutos de pausa. Voltei a fazer as bebidas. Eu achava aquilo extremamente divertido.
Era pouco mais de três horas quando ouvi uma voz feminina me chamar. Os pedidos de bebida chegavam com menos frequência. Dentro de pouco tempo o local começaria a esvaziar aos poucos. Bem lentamente, porque bêbado adora cantar em karaokê. Virei-me para ver quem havia me chamado, dando de cara com , sentada em um dos banquinhos que geralmente ficavam vazios.
— Ei, ! — sorri, caminhando até ela, com o balcão do bar entre nós.
— Será que você poderia me dar uma garrafa de cerveja? E um copo, por favor.
Peguei a cerveja e o copo, abrindo a garrafa e colocando no suporte. Entreguei-lhe e ela se serviu, dando um gole em seguida. Estranhei. Achei que ela fosse levar para a mesa com os amigos.
— Não achou seus amigos?
— Ah, achei sim. Ali, ó. — Ela apontou para dois garotos no canto do bar, se beijando fervorosamente. — Apenas fui completamente esquecida.
— Isso que dá sair com casal de namorados. — Ri, enquanto me afastava um pouco e começava a preparar um drink.
— Quem dera fossem um casal. — Ela revirou os olhos, observando meus movimentos. — São apenas amigos. Mas sempre que saímos juntos, eles começam essa pegação. E só quando quando estamos nós três. Se tiver mais uma pessoa, eles não fazem isso. Até parece que é proposital.
— Por que você não traz seu namorado? — Coloquei a bebida sobre o balcão, para que o garçom levasse até a mesa, e caminhei para ficar de frente para .
— Porque eu não tenho. — Ela finalizou o copo, enchendo-o novamente.
— Ficante? Peguete? — Ela negou. — Um amigo colorido?
— Ainda estou procurando um.
Não comenta, não comenta, não comenta. Respirei fundo e apenas concordei com a cabeça, indo praparar as novas bebidas que haviam chegado.
— Que horas vocês costumam fechar?
— Depende de que horas os clientes vão embora. Geralmente umas cinco, no máximo seis.
— E que horas vocês abrem?
— Durante a semana, às vinte e duas. Sábado e domingo, às onze. Servimos almoço no fim de semana.
Fiquei conversando com pelo resto da noite. Em algum momento, os amigos dela foram avisar que iriam embora. Precisavam de mais privacidade. Não pude conter a risada, ao vê-la revirar os olhos e concordar.
Era pouco mais de cinco horas quando percebeu que era a única cliente que ainda estava no bar.
— Acho melhor eu ir embora. — Sua voz estava um pouco enrolada. Ela havia bebido durante todo o tempo em que ficamos conversando.
— Não, pode ficar. Só vou limpar o bar e te levo pra sua casa. — Peguei um pano e comecei a limpar as bebidas que havia derramado.
— Não precisa, eu pego um táxi. — Ela se levantou do banco, cambaleando um pouco.
— Sério que depois de gastar tudo isso em bebida você ainda tem dinheiro pra pagar um táxi? — Ri, sendo acompanhado por ela.
Lavei o paninho que havia usado para limpar o balcão e fui me despedir de meu tio. Voltei para a frente do bar e encontrei na porta, me esperando.
— Achei que tivesse ido embora — comentei, enquanto caminhava em direção ao meu carro, sendo acompanhado por ela.
— Prefiro não gastar o pouco dinheiro que me restou. — Ela riu, enquanto abria a porta do carona e se sentava ao meu lado.
— Essa é a hora em que você me fala onde mora. — Levantei a sobrancelha, sorrindo ladino.
— Ao lado do Business Center, conhece?
— Sim, meu amigo trabalha lá.
Seguimos o curto caminho, conversando e rindo, feito velhos amigos.
Eu sabia exatamente o que estava acontecendo.
Eu mal conhecia a garota e já estava a fim. falaria que eu estava apaixonado, mas era apenas a fim. Juro.
— Está entregue! — disse, após estacionar o carro em frente à sua casa.
— Muito obrigada, . — Ela sorriu docemente, abrindo a porta do carro. — Você é sempre tão doce assim?
— Eu me esforço. — Balancei os ombros, sentindo minhas bochechas queimarem. O quão idiota eu consigo ser com garotas bonitas?
— Está conseguindo. Bem demais, até. Obrigada pela carona, , e por me salvar daqueles idiotas.
— Disponha.
— A gente se esbarra. — Ela beijou meu rosto e finalmente saiu do carro.
Acenei, antes de dar partida, sorrindo como o idiota que eu era.
Apenas quando cheguei percebi o quanto era burro. Eu havia esquecido de pegar o número de .
— Você salvou a garota de uma briga? Você?? Dois caras a fim dela, discutindo para ver quem ficaria com ela, e você a salvou???
— É... — respondi, já nervoso.
riu.
Uma gargalhada assustadora. Parecia uma hiena, inclinando o corpo para trás, e com as mãos sobre o próprio abdômen.
— Bom, — ele tentou se recompor. — sabendo do seu histórico: mulher, peitos e dirigiu a palavra a você... Imagino que, em menos de dois minutos, estava apaixonado por ela.
Suas palavras me feriram.
O que dissera, porém, era verdade. Mas, mesmo assim, me senti ferido.
— É...
— E teve sucesso, desta vez? — O tom jocoso dele voltou a atacar-me.
Ok. Ok!!
Tive várias meninas de quem ‘fui a fim’, entretanto nenhuma delas me correspondeu da mesma maneira.
— Não rolou, mas... Mas minha gente está em alta agora. Em breve, todas estarão correndo atrás de mim.
Cada palavra dita por mim parecia surtir o efeito de gás do riso em , pois o pobre contorcia-se em gargalhadas silenciosas, via-se apenas os gestos exagerados. Desta vez seus olhos lacrimejaram levemente.
— Não, caro amigo, não. Os Nerds fizeram upgrade para Geeks, algo mais descolado, só que em você houve um downgrade. Apenas mais e mais... esquisito.
Franzi meu cenho.
Era essa a visão que meu melhor amigo tinha de mim?!?!
— E você? Tu é um grande esquisitão!!!
— Ééé... Mas eu tenho essa cara meio melancólica que faz as garotas pensarem que tenho um background assim triste, sombrio... Algo meio Kurt Cobain, sabe?
Empurrei com certa rudeza o braço que ele colocava lentamente sobre meus ombros. Detestava aquele lado convencido que ele foi cultivando ao longo dos anos, comparando nossa sorte com mulheres.
— Ela te passou o número dela, pelo menos? — ouvi meu amigo gritar atrás de mim, enquanto eu recolhia sem muito ânimo minha mochila equipada para qualquer eventualidade, para ir embora dali.
Era em momentos como aquele que eu entendia porque vivia me chamando de nerd. Eu era o único cara da cidade que tirava o sábado para ir ao Museu de Arte Contemporânea, apreciar uma exposição das obras de Leonardo da Vinci. Várias obras haviam sido trazidas de inúmeros países. Algumas originais, algumas apenas réplicas.
E eu estava lá, completamente sozinho e fascinado, observando cada um dos quadros de um dos maiores pintores impressionistas.
Até vê-la analisando a obra Mona Lisa. Era ela. A garota que eu havia salvado no bar. A menina pela qual, segundo , eu já estava apaixonado.
O que, claro, era um exagero.
Eu, no máximo, estava ‘a fim’ dela.
Fiquei observando-a, apenas pensando se deveria ou não ir falar com ela. Comecei a analisar os fatos. Ela também estava no Museu, no sábado, com um bloquinho de anotações e uma caneta em mãos. Ela analisava o quadro. Logo, ela não poderia me chamar de nerd. Ela estava sozinha, e já sabia, pela experiência anterior, que não pussuía namorado. Ela estava se virando. Ela me viu.
Oh não!
Eu ainda não estava pronto!
Era muito tarde para correr?
Sua cabeça se inclinou levemente para o lado, como se começasse a me reconhecer. Seus olhos, então, se iluminaram, provavelmente lembrando de onde me conhecia, e então acenou para mim.
Acenei de volta. O que mais eu poderia fazer?
Ela então movimentou a mão, chamando-me para ir a seu encontro. Suspirei e comecei a caminhar em passadas rápidas até ela.
— , não é? — Ela sorriu. Incrível que lembrasse meu nome.
— Sim. — Sorri da maneira menos boba que consegui. Em algum lugar eu podia sentir se revirar de tanto rir. — , certo? — Esperei-a confirmar para continuar. — Engraçado te encontrar aqui.
— Sério? Por quê? — Ela me lançou um olhar curioso.
Ótimo, o que eu responderia?
— Não sei. — Sorri nervoso. — Você realmente gosta de Da Vinci ou...
— Trabalho da faculdade. — Ela balançou o bloquinho. — Estou fazendo bacharelado em Artes. Mas também adoro o Da Vinci. Principalmente no que diz respeito à Gioconda aqui.
Ela sorriu e se virou, apontando a caneta para o quadro.
Foi quando as coisas começaram a dar errado.
Ela estava perto demais do quadro. O movimento havia sido rápido demais. Em questão de um segundo, uma enorme linha preta atravessava o rosto de Mona Lisa, exatamente em cima de seus lábios.
— Ah. Meu. Deus. — cobriu a boca com a mão, completamente chocada. — Isso não aconteceu.
Eu olhava de para a pintura. Será que era assim que Giocondo se parecia?
— Por favor, , me diga que essa não é a original trazida do Louvre! Me diz que essa é apenas uma réplica! — segurou meus ombros, completamente desesperada.
Olhei ao redor do quadro, mas não havia nada que pudesse nos informar se aquela era a original pintada por Da Vinci ou se era apenas mais uma das millhares de réplicas que existiam ao redor do mundo.
— Calma, . — Tentei manter a voz estável. — Eles provavelmente protegem com algum material. Você não riscou de fato a Mona Lisa. Olha só.
Levei meu dedo ao quadro, para mostrar que existia qualquer coisa que estivesse protegendo a pintura.
Ideia terrível.
Aquela droga não havia sido bem pendurada. No momento em que encostei no quadro, senti-o se mexer e despencar no chão. Um sinal alto ecoou no local. Em poucos segundos os seguranças iriam para cima de nós.
— ... Acho que teremos que correr.
Concordei com a cabeça, segurando a mão de e saindo em disparada pelo Museu. Não diminuímos o ritmo até estar pelo menos quatro quadras longe do local.
Finalmente paramos, arfando cansados, tentando recobrar o fôlego. Ficamos um bom tempo tentando normalizar a respiração. Quando finalmente conseguimos, nos olhamos e começamos com uma crise de risos.
O riso teve de cessar por falta de ar, e nossas respirações normalizaram pouco a pouco — com tendo breve ataques de tosse como consequência de tanta gargalhada. Quase em seguida, o rosto dela foi tomado por uma expressão de pavor, agarrando-me pelo braço:
— Essa não… ! As câmeras de segurança. Se nos identificarem… Céus! — Quis me controlar para não voltar a rir, pois ela parecia uma versão humana da pintura “O grito”, com exceção da calvície. — Ficarei conhecida igual aquela mulher que “pintou” sobre a imagem de Cristo.
O receio de era genuíno, mas eu não conseguia manter nenhum pingo de seriedade com a a imagem do quadro ao qual ela fazia alusão. Uma tragicomédia moderna.
O quadro Ecce Homo, do pintor Elías García Martínez, ‘viralizou’ no mundo inteiro, após uma restauração fracassada e não autorizada por parte de uma idosa espanhola.
— Sua obra, ‘Monalisa Mustache’, vai virar meme! — brinquei, já com o riso escapando de meus lábios com facilidade.
— Vou aparecer em todos os noticiários, não vou?
— Com certeza. “Jovem universitária destrói a Gioconda de Da Vinci” — anunciei com a voz falsamente séria. — Amantes da arte irão te perseguir com tochas e forcados. Precisará fugir do país. Vão te xingar muito no Twitter.
Fui agredido pelas mãos femininas dela, que parecia furiosa com minhas brincadeiras. Teria eu exagerado?
— Tonto! Se esqueceu do seu toque de mestre? Fazer o quadro tombar no chão.
— Foi mal, me empolguei demais. Realmente, desculpe, foi o sujo falando do mal lavado.
Seus olhos então me percorreram de cima a baixo, analisando-me criteriosamente.
— O… quê?
— Sabe preparar todo tipo de bebida alcoólica, trabalha em baladas, sabe defender uma dama, além de ser cavalheiro e... Sabe admitir um erro e ainda pedir desculpas! Impressionante... — foi dizendo aquilo com os braços cruzados, andando ao redor de mim até ficarmos parados frente a frente. — , você é praticamente o namorado com quem eu sempre sonhei.
Enrubesci.
E muito!
Sempre fui o namorado dos sonhos da mãe das garotas por quem eu babava, porém, jamais o sonho de suas filhas. E eu nunca fui muito exigente com essa história de ‘mulher dos meus sonhos’: Bastava ter peitos!
Eu buscava decodificar o que queria dizer com aquilo: ela queria me namorar?
Sentia meu rosto febril pelo constrangimento daquele momento. E quando ficava nervoso, ao invés de me manter em silêncio, eu era acometido por uma verborragia:
— E-eu?! Mas nós… quero dizer… — como se houvesse um ímã na ponta de meus tênis, meus olhos foram atraídos, incapazes de olhá-la. — Mal nos conhecemos… Você… você está certa di-disso?
— Ai! Meu! Deus! — interrompeu minha narrativa, dedicando-me um olhar abismado. Suas unhas se afundavam no braço sofredor, porém calado, de . — Meu irmão desencalhou!!!
— Aleluia! — brincou, mas seu tom ácido estava visivelmente prejudicado pelas pequenas feridas superficiais em seu braço.
— Bom… Não exatamente. — cocei minha nuca, franzindo o cenho.
O semblante de voltou ao de preocupação, sentando-se novamente no sofá de seu mini-apartamento. Com a mão livre trouxe o balde de pipoca para seu colo. também voltou a sentar-se. E tive de vê-lo puxar a perna de minha irmã, para que ficasse em cima da sua, sem dizer nada.
Era recente demais ainda para mim aquela situação: minha irmã ficando com .
… Por que justo meu melhor amigo?!?!
Dava-me um vazio profundo imaginá-lo fazendo com minha adorada, doce e meiga irmã, o que eu sabia que ele havia feito com outras garotas — nos mais mínimos detalhes.
Maldito seriado “Downton Abbey”!
Como eu poderia imaginar que tinha um fraco gigante por séries de época? E que esse ‘segredo’ seria revelado, divulgado e disseminado aos quatro ventos com o estouro de popularidade daquela droga de seriado?
Agora, e faziam maratonas todos os domingos à tarde. E, em um desses domingos, houve mais do que simplesmente assistir…
— Conte-nos, querido. — disse-me, com um olhar reconfortante e a voz mais pomposa que conseguiu dissimular.
— É que… Na verdade, ela não estava me pedindo em namoro… Ou para ficar… Nem nada parecido.
— Que papo é esse, ?? — Como já devem ter levemente notado, minha irmã era uma referência humana de bordões de seriados. E desconfiava que buscava algum em “Downton Abbey” para integrar ao seu repertório.
— Eu entendi tudo errado. Devo ter me animado muito e me confundi.
— Ih, cara… — Eu devia estar mesmo com uma cara de derrotado, pois nem ao menos tentou brincar sobre a situação. — Isso é uma pena.
nada disse, nem precisava. Sabia que se sentia mal por mim. Deu certa distância no sofá para que eu me sentasse entre eles.
Era quase como viver com meus pais outra vez: eu no meio, com os dois tendo pena de mim. Não tinha como ficar pior.
— ‘Mor, vamos alegrar o — ouvi dizer ao meu lado, com entusiasmo na voz. Minha irmã deu uma risadinha como resposta e vi em sua mão o controle remoto da televisão.
Eu deveria me alegrar por ser incluído na maratona “Downton Abbey” deles?
Suspirei, resignando-me com a ideia de permanecer com a bunda naquele sofá por horas e horas.
Ao menos, o que aconteceu depois, tinha guardado só para mim.
Às vezes grandes esforços parecem não significar nada no final. Fiz meu melhor para vencer o acanhamento e encará-la, mas preferia não tê-lo feito.
Seu olhar estava fixo em mim, e ambas as suas mãos cobriam-lhe a área do nariz e boca.
— , eu não… — Sua voz saiu abafada, enquanto ela maneava a cabeça negativamente.
A duração daquele momento, exponencialmente mais constrangedor que o primeiro, pareceu durar muito mais do que os anos que levei para moldar minha personalidade.
Qualquer orgulho próprio que possuía, encontrava-se estilhaçado por entre nossos pés.
— Era pra ser mais um elogio.
— Ah, sem problemas!! — Forcei um sorriso, que saiu torto contra a minha vontade. — Eu me confundi. E, como eu nunca tive uma namorada, com certeza não sei bem como ‘pedidos’ funcionam.
Eu ouvia a mim mesmo rir pelo deboche, mas não sentia o gosto da risada.
— … — Ela arqueou, por um momento, as sobrancelhas, dando-me a entender que eu não a enganava. — Desculpe mesmo. Mas, acredite, você não iria me querer como sua namorada.
— Por que não?
— Eu não sou ‘namorável’. — Ela sorriu desgostosa. — Tenho 3 ex-namorados que podem comprovar isso.
Maneei a cabeça concordando. No fundo eu não sabia ao certo como 3 ex-namorados podiam validá-la como inapta a namorar. Ao menos ela fez parte de relacionamentos. E eu? Ter sido um ‘forever alone’ deveria me garantir uma morte solitária, comido, dias depois, pelos meus 100 gatos famintos e órfãos.
— Ei! — A voz doce de me fez despertar para a realidade. — Terra para , Terra para .
parecia querer forçar, apenas pelo seu olhar, que eu melhorasse meu semblante.
— Olha, eu te ajudo a conseguir uma namorada, ok? Se você quer tanto saber como é cometer esse erro… — Ela fez uma expressão engraçada. — Agora, vejamos! Se eu fosse sua namorada, aonde me levaria pra passear?
Meu silêncio não foi suficiente para dissuadi-la de seu plano. E o choque inesperado de seu cotovelo contra minhas costelas me fez reconsiderar meu mutismo.
— Annh… Lembro que tem uma Starbuck-...
— Péééé!! — Aquilo era sua tentativa de imitar uma campainha. — Fala sério, uma Starbucks? Clichê demais, . Nem parece que está tentando…
Mantive meu olhar sobre ela, sem entender.
— Precisa se esforçar para impressionar, conquistar, e deixar claro também que está se esforçando.
— Certo… Hum. — Comecei a pensar comigo mesmo sobre que lugar poderia impressionar . Duvidava muito que houvesse algum museu que ela desconhecesse, ou que se surpreendesse indo a algum ponto turístico. — Não sei…
— Olhando bem pra você, parece ser a sua cara aquela loja de esquina entre as ruas Woodworthy e...
— A Downton? — a interrompi, com meu cenho franzido. — Você vai lá?!
A tal loja era um reduto de revistas HQ’s, mangás; jogos de fliperama, SNES e Playstation; e até bonecos de ação. Em outras palavras — nas de minha irmã, na verdade — era a Geeklândia, ou Nerdolândia nas de .
Por isso mesmo, deixei minha animação transparecer com a possibilidade. não parecia, logo de cara, ser tão nerd ou tão geek quanto eu. Porém, se fosse, seria mais um motivo para ter uma quedinha (ok, penhasco) por ela.
— Não… Mas sempre fiquei curiosa para conhecer.
Ela pareceu me confiar um segredo, os lábios em um sorriso sapeca. Em meu rosto, o sorriso quase me rasgou a face.
— … Quer ir comigo até a “Fronteira Final”?
Não se iluda achando que eu consegui algo com a .
Acho muito válido ressaltar que ela me deu um beijo na bochecha esquerda — que eu não lavei por dias: dane-se a higiene! —, mas não passou disso.
Aquele passeio foi perfeito.
“Nunca julgue um livro pela capa”.
era muito mais do que um par de peitos, ou de botas com cano largo no inverno, all stars para quaquer ocasião, risada fora de hora, cabelo em constante mudança de tom, brincos discretos e olhos que me encantavam. Com certeza aquele encontro serviu para criarmos um vínculo, mas o da amizade.
era inamorável, e ponto final.
Talvez eu seja infantil demais, pois o fato de saber que ela não aceitaria namorar mais ninguém nessa vida, me fazia querer ser o cara que a faria mudar de ideia.
Dias, semanas e alguns meses se passaram com nossa amizade crescendo cada vez mais. Entretanto, diretas, indiretas, pressão dos amigos — e até de sua mãe — de que daríamos um bom casal não alteravam nosso status de relacionamento no Facebook.
Eu nunca tentei pressioná-la, pois estava ciente de seu posicionamento, só que algo em mim mudou nos últimos tempos. Nossa cumplicidade crescia como amigos e nada mais, estava praticamente me tornando um irmão de consideração. Se deixasse que me visse e tratasse daquela maneira, minha maldição seria ficar na temida “FriendZone” para sempre.
“— Precisa se esforçar para impressionar, conquistar, e deixar claro também que está se esforçando.”
Suas palavras reverberaram em minha mente.
Se eu a quisesse como minha namorada, precisava fazer um último grande esforço para surpreendê-la.
Pensava comigo mesmo, largado no sofá de casa, quando um fraco som metálico soou atrás da porta de entrada. Eu esperava por minha irmã, para vermos algum filme qualquer, para matar o tempo juntos.
— !! — gritou , entrando toda espalhafatosa em meu apartamento. Eu havia dado a chave extra da casa para , então o fato me intrigou. — Consegui o emprego!!
— Sério? Nossa, que legal!
— Independente e assalariada novamente! — Ela deu um suspiro. — pode parar de pagar meu aluguel, e eu posso finalmente parar de vender meu corpo por dinheiro.
— Eu não quero ouvir isso.
Entendam: minha irmã perdeu o emprego. se ofereceu para pagar o aluguel dela, já que praticamente viviam lá, e ela aceitou. Ele cobrou o favor com… bom… aquela palavra com 4 letras.
— Fique tranquilo. Agora, só preciso pensar no que fazer. — Ela franziu o cenho e começou a encarar o teto. — Como a nova organizadora de eventos da galeria…
Esperei que ela continuasse, enquanto ela agora andava em círculos na sala.
— Preciso encontrar um meio de atrair mais…
— Fregueses.
— Isso também. Mas o dono gostaria de que tivéssemos mais gente interessada em arte. Quando mais gente tem gosto por uma mesma coisa, fica mais fácil que adquiram algo sobre aquilo de que gostam.
— Acho difícil de conseguir fazer isso nesses tempos modernos, sis. Quem precisa ir ver um quadro pessoalmente, quando se pode ver na Internet? — perguntei, dando de ombros. me fuzilou com o olhar. — Sabe que eu não penso assim, mas muita gente pensa. Hoje em dia, Arte é mais algo de nicho.
— Eu sei… — retrucou, parecendo se conformar a contra gosto. — Mas talvez consiga uma boa ideia. Tudo depende de um bom insight.
Tinha meu rosto afundado em uma das mãos, usando-a como apoio, e respondi com uma careta de descrença.
— Pensando nisso, — resolveu ignorar minha falta de esperanças nela — acabei alugando para nós… “Uma noite no museu”!
— Seu precioso insight vai vir de um filme de comédia com Ben Stiller?
— Bom… Eu nunca vi, e parece ser legal. E, como vantagem, se passa num museu, que por acaso é similar a galerias, lugar onde eu trabalho agora.
— Uma coicidência atrás da outra, querida irmã. — Recebi um duro soco no braço por minha fala sarcástica.
— Vamos simplesmente assistir.
jamais admitiria, em conversas ou pequenas entrevistas para revistas e jornais locais, de onde viera sua ideia. Apesar das verdadeiras origens, seu projeto se tornaria um sucesso a ser copiado em vários lugares, até mesmo em museus de grande nome.
A galeria EuroArte receberia um contingente de pessoas muito maior do que o imaginado, todos querendo ver para crer: o lugar ganhava vida. Ou melhor, os quadros.
E quando ela me apresentou sua ideia em primeira mão, foi minha vez de ter um insight.
— ‘Alooouu’! — brincou , ao me atender do outro lado da linha.
— Lembra quando me disse que me ajudaria a encontrar uma namorada? — disparei, notando, pela hesitação para me responder, que a pegara de surpresa.
— Anh… sim. Por quê?
— E disse também que era necessário esforço para impressionar alguém especial.
— Disse. Por quêêê?
— Porque gostaria de cobrar essa sua ajuda e saber se estou indo pelo caminho certo...
— … pra conseguir uma namorada? Hum. — Ela bufou. Sei que não desejava transparecer, mas podia imaginar seu semblante alterado.
Eu sorri picaramente.
— Fica com ciúmes só de pensar em mim namorando alguém?
— Lógico que fico! Aposto que vai ficar todo melosinho e vai se esquecer de mim… — Tão dramática. — Terei de ir à “Fronteira Final” sozinha, com todos aqueles rapazes fungando no meu cangote. Não faremos mais maratonas de filmes e seriados… Quando menos perceber, nem mesmo estaremos mais fazendo troça da sua irmã e do namorado dela, por ficarem bancando a nobreza do século 19 como dois bocós.
— … engole o choro. — Tentei soar sério em meu comando. — Agora, vista-se bem e venha até a inauguração da galeria EuroArte, ok? Vou te passar o endereço por mensagem.
— Ok… — respondeu de má vontade.
Combinamos de nos encontrar na entrada da galeria, mas, desde o fim da rua, vi o rosto de vir emburrado até parar de frente para mim.
— Muito bem, estou aqui. Agora, quem é ela?? Conheço todo mundo que você conhece, então, desembucha.
— Sim, você a conhece muito bem. Já passamos bons momentos com ela. — Vi coçar o queixo, pensando em nomes e rostos das pessoas a quem eu poderia me referir.
— Bom, se ela vale o esforço… — Ela mudou sua postura e também atitude daquele momento em diante. — Vamos lá, eu vou te ajudar.
Entramos juntos na galeria, que, em um primeiro momento, parecia não diferir em nada das demais.
Nós e um pequeno grupo seleto de pessoas passeávamos pelos ambientes repletos de réplicas de quadros famosos e, em menor quantidade, obras de pintores de vanguarda que tentavam fazer seu nome.
Próximas às obras mais clássicas, estátuas que representam as famosas personagens de tais quadros.
Conferi meu relógio, eram quase 20h30.
— Vamos por aqui? — Indiquei a um ambiente cujas portas-duplas estavam abertas, mas o acesso era barrado por dois elegantes postes na altura da cintura, unidos por uma grossa corda de sisal preta, onde lia-se a placa: reservado.
A vi hesitar, e um esboço de pergunta se calou em seus lábios. Movi os pequenos postes para liberar passagem, entrando logo depois dela.
— …? — Ela dava passos lentos. Observando, primeiramente, a grandiosidade do lustre que havia no centro da sala. — Essa garota que você quer impressionar...
Eu sabia que não teria muito tempo. não era burra.
Por sorte, já eram 20h31.
E a movimentação repentina da estátua solitária que havia no ambiente fez dar um pulo.
— Eu sou… ‘Monalisa Mustache’! — disse, docemente, a estátua, toda vestida e caracterizada como a Gioconda de Da Vinci, mas com um bigode sobre os lábios. Havia algo de curioso em sua postura, como se tivesse se acidentado, pois mancava e ao andar, se mostrava coxa.
As unhas de se afundaram em meu braço, o medo em sua face diante daquilo que ela não entendia. Franziu o cenho ao ver algo surgir por detrás da estátua viva que agora vinha em nossa direção.
— É o quadro que destruímos?
Caído no chão e com o risco a caneta — provavelmente da maneira que deixamos ao fugirmos do museu — jazia a obra que deu lugar a uma nova versão de Gioconda.
Sim, uma réplica barata, pois o museu meramente substituiu a obra. Nosso vandalismo jamais foi mencionado nos noticiários.
— Tenho infame origem pelas mãos de e o toque de … - a estátua continuou a falar, enquanto afrouxou o agarre em meu braço e cobriu a boca com a mão livre, para esconder o riso que escapava de seus lábios.
— Como? De onde? — ela balbuciava perguntas sem sentido completo.
— Está impressionada?
— Maravilhada. Mas… Você organizou tudo isso pra mim?
— Lógico. Você não quer namorar, só que… mesmo que você me diga alguns ‘não’s, uma hora imagino que me dirá ‘sim’. — E voltei a perguntar: — Está impressionada?
— Deslumbrada.
— A senhorita sabia que ‘maravilhada’ e ‘deslumbrada’ são sinônimos de estar impressionada?
Ela tentou me dedicar um olhar bravo, mas seu sorriso denunciava seu verdadeiro estado de espírito.
— Ok. Estou impressionada, senhor .
— Ótimo. — Sorri, aproximando-me mais dela e olhando diretamente em seus olhos. — Será que agora podemos namorar?
FIM
Notas das autoras:
Nota da The Osgood: OI pessoas! Nunca tinha escrito uma song na vida, e isso é bastante estranho para mim! Mas finalmente consegui escrever em parceria com a Nelly, coisa que tentamos fazer desde… Bom, desde que nos conhecemos! Uahuahuhauhauhauhuaha
Devo dizer que foi difícil fazer essa song em específico! Com uma música especialmente para o filme Uma Noite No Museu, tentamos ao máximo misturar os elementos, inclusive fazendo alusão ao filme. Espero que vocês tenham gostado!
Vou ficando por aqui, porque vocês sabem que quando eu começo a falar não paro nunca mais, e ainda tem a nota de Nelly prela frente, e já viram como é...
Nota da Nelloba Jones: Hey, pessoas!
Primeiramente, essa foi a fanfic mais difícil de escrever da minha vidaaaa todaaaa!!!!
Eu me senti muito bloqueada para escrever, de verdade, e até agora não entendo muito bem o motivo.
Mas não tinha como não participar de um ficstape tão especial: do McFly, gente!!! :3
Por isso, eu espero de verdade que vocês gostem do que a Mare e eu escrevemos.Fomos apresentando várias ideias uma pra outra, até ficar da maneira como vocês viram.
Besitos, Nelloba Jones.
Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.
Nota da The Osgood: OI pessoas! Nunca tinha escrito uma song na vida, e isso é bastante estranho para mim! Mas finalmente consegui escrever em parceria com a Nelly, coisa que tentamos fazer desde… Bom, desde que nos conhecemos! Uahuahuhauhauhauhuaha
Devo dizer que foi difícil fazer essa song em específico! Com uma música especialmente para o filme Uma Noite No Museu, tentamos ao máximo misturar os elementos, inclusive fazendo alusão ao filme. Espero que vocês tenham gostado!
Vou ficando por aqui, porque vocês sabem que quando eu começo a falar não paro nunca mais, e ainda tem a nota de Nelly prela frente, e já viram como é...
Nota da Nelloba Jones: Hey, pessoas!
Primeiramente, essa foi a fanfic mais difícil de escrever da minha vidaaaa todaaaa!!!!
Eu me senti muito bloqueada para escrever, de verdade, e até agora não entendo muito bem o motivo.
Mas não tinha como não participar de um ficstape tão especial: do McFly, gente!!! :3
Por isso, eu espero de verdade que vocês gostem do que a Mare e eu escrevemos.Fomos apresentando várias ideias uma pra outra, até ficar da maneira como vocês viram.
Besitos, Nelloba Jones.
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