FFOBS - 10. New Rules, por Daniele Tesfaye

Prólogo

Nunca vou entender o porquê sempre ignoramos avisos e frases inteiramente importantes e verdadeiras que são ditas a nós. Acredito firmemente que não existe uma só pessoa que nunca fez o contrário, ou, até mesmo, realmente, sentiu medo e receio ao escutar que os humilhados serão exaltados, que quem ri por último, ri melhor, ou parou de cutucar a casquinha do machucado quando a mãe falou que não pode fazer isso, pois, se não, o ferimento nunca vai sarar e pode inflamar.
Eu mesma nunca me importei com essas regras e, sinceramente, não me lembro de uma só vez em que as consequências disso bateram na minha porta, até Teddy Mosby aparecer em minha vida, e eu ignorar uma de suas falas na série 'How I Meet Your Mother', junto com um comentário que minha mãe soltou em um almoço em família. Então, quatro meses depois, aqui estou eu, com as costas apoiadas na porta vermelha do meu apartamento, sentada no corredor do bloco e sentindo o chão gelar fodidamente o meu traseiro, com o meu rímel borrado, deixando em evidência o caminho que minhas lágrimas fizeram, e com uma garrafa de vodka barata que comprei no caminho para casa em mãos. Cheguei à conclusão de que não era tão fácil destrancar portas quando se está bêbada, que Teddy Mosby tinha razão ao dizer que nada que é bom acontece depois das duas da manhã e que não era uma simples implicância da minha mãe quando a mesma disse que não gostava do meu atual namorado.
Ela realmente tinha motivos para não gostar dele, e o mesmo tinha me machucado exatamente como ela havia dito, mas eu só fui descobrir isso às duas malditas horas da manhã, na mesma hora que notei meu recente machucado inflamado, me fazendo gargalhar automaticamente, embolando o som da minha risada com meu choro descontrolado.
Ironias, meus amigos! A vida está repleta delas, e eu estou pronta para revelá-las ao mundo!


Rule number one

POST UM


Depois de ver diversas fotos de mulheres ao lado das paredes pichadas com a frase “Eu dei para ele”, pelas ruas do Rio de Janeiro, e rir ao escutar a música com os tweets do Neymar no YouTube, reparei que o Brasil, literalmente, não é para iniciantes e que os brasileiros são muito criativos.
A 'Banda A favorita' com o hit do verão, em uma versão brasileira de 'I Got You', que foi traduzido para 'Só da Tu', é muito criativo. Os memes da Gretchen são muito criativos, e , extremamente desconhecido para o resto do mundo, pelo menos, para as pessoas que não eram seus amigos nas suas redes sociais ou não conheciam nenhum dos seus trabalhos, era um cara muito criativo. Guitarrista e vocalista da banda Universo Alternativo, amante de músicas indie rock, com suas roupas pretas e de couro para adolescentes, cheirando a cerveja e cigarro, um sorriso malicioso e, às vezes, doce, de canto, e com seu bloco de notas cheio de letras melancólicas, transbordando composições de novas músicas, faziam-no um cara muito criativo, diferentão e atraente, mas atraente de verdade. Atraente no nível de você olhá-lo, andando do outro lado da rua na Avenida Paulista, e pensar "Que emo bonitinho!", e, ao vê-lo de perto, esse pensamento mudar para "Que homão da porra!". Entretanto, eu não o encontrei andando pelas ruas de São Paulo, muito menos, em uma balada emo, ou em um desses encontros de pessoas que só vestem preto para dançar e, sim, em bar jovem, entre os milhares de executivos com suas roupas sociais que exibiam os cartões de créditos sem limites, fazendo se destacar entre todos eles apenas por estar usando roupas pretas desbotadas, denunciando sua falta de grana, bebendo calmamente cerveja e cantarolando a música do Cazuza, enquanto levava o copo de vidro até os lábios, sendo o alvo de todos os olhares, literalmente.
Garotas com lábios vermelhos e vestidos colados, muito bonitas, sorriam e o encaravam com íris cheias de desejo, e apenas continuava observando a prateleira de bebidas, curtindo a música e, às vezes, acendendo um cigarro. Cigarros. Eu odiava cigarros! Mas amei quando seus olhos escuros voaram em minha direção e um sorriso relaxado apareceu entre a fumaça com cheiro horrível, que atravessava seus lábios, me dando coragem suficiente para sair do canto escuro em que eu estava e andar até o balcão, como uma mulher realmente decidida, parar ao seu lado e fingir não dar bola aos seus olhos, que percorreram meu corpo inteiro, após apoiar os braços na madeira e sorrir para o barman, pedindo uma cerveja, de forma despretensiosa. Quem assistia aquela cena, não dizia que eu estava fingindo indiferença, como uma pessoa hipócrita que assume odiar jogos e é uma ótima jogadora.
— Harry Potter? — Sua voz soou no ambiente, tão rouca e precisa, referindo-se à minha tatuagem no braço, e eu me senti a porra de uma adolescente clichê que nunca se aproximou de macho nenhum, ou, até mesmo, nunca falou com nenhum garoto.
— A maior potterhead que você conhece! — respondi, simplesmente, sorrindo, e ele colocou um cigarro aceso nos lábios, sugando toda a nicotina e a soltando logo em seguida.
Uma cena nunca foi tão sexy, e eu nunca senti o ar escapar dos meus pulmões tão rapidamente, achando linda a destruição que aquilo fazia em todo o seu corpo e romantizando o maldito hábito de fumar.
. — Ele estendeu a mão em minha direção, enquanto eu repetia seu nome em vários tons de vozes na minha cabeça, apenas para gravar e imaginar como ficaria todas aquelas letras juntas em uma só conotação. — Sonserina.
. — Peguei a sua mão clara, comprida e grossa, sentindo toda a sua temperatura provocar um arrepio em minha espinha, ao acontecer o choque térmico, já que, enquanto eu era gelo, ele permanecia sendo fogo. — Grifinória.
— Prazer em te conhecer, ! — falou meu nome, dando uma ênfase absurda nele. Falou como se fosse a mais bonita coisa que ele tinha escutado e como se meu simples e comum nome fosse a mais bonita das palavras.
Todas as palavras ficavam mais bonitas quando era ele quem dizia e, só de pensar que, neste momento, enquanto o telefone tocava muito alto a música 'Sua Cara', da Anitta e do Pabllo Vittar, e eu me esforçava para não atender o celular e escutar seu timbre de voz baixo e rouco, vi que era fraca, absolutamente fraca, e na língua dos adolescentes, trouxa, porque, além de ser muito criativo para letras de música, piadas e acordes no violão, deixando uma imagem forte em tudo o que fazia, recentemente, descobri que ele era muito criativo em como decepcionar as pessoas e não fazê-las se esquecer do momento por várias horas. No meu caso, dias, levando em consideração todas as vezes em que fechei os olhos e vi sua imagem nua no chão do estúdio, com a boca, que já disse me amar muitas vezes, colada na de uma garota que eu não quis, ao menos, olhar. A frase "Nada de diferente por aqui" soava na minha cabeça e na dele também, naquele momento, porque, por mais assustador que fosse, eu já estava acostumada com esse tipo de coisa. Duas semanas após nosso primeiro encontro, e eu namorávamos, e ele me revelava, pela primeira vez, seus traumas da infância e a vida difícil que viveu, mesmo sendo um cara da classe média e tendo tudo o que queria. Eu me comovia com suas palavras e meus olhos lacrimejavam, como se eu estivesse assistindo ao Titanic por dez vezes seguidas. Quatro meses depois, eu o observava beijar uma completa estranha em uma festa na casa de seus amigos. Cinco dias depois, ele estava na minha porta, pedindo desculpa (ou jogando toda a culpa em mim, pense como você quiser), ligando sua história sofrida com traição e dizendo que aquilo não iria se repetir, mas, adivinha... Se repetiu, e a desculpa foi a mesma! Mesmo assim, eu voltei, até o dia de hoje chegar, e eu sentir que tudo estava diferente, pois, desta vez, eu não atenderia e, pela primeira vez, ele não iria me ter. Não, novamente. E, ao invés das suas roupas estarem pelo chão, no mesmo momento em que acordei, depois de uma noite difícil, todas estavam em seus devidos lugares, enquanto eu permanecia na frente do notebook, digitando descontroladamente. Depois de chorar desesperadamente, decidi que, ao invés de falar com você, ou, até mesmo, pensar em você, escreveria sobre você durante o tempo em que, normalmente, nós demoramos para se reconciliar, descrevendo nossa relação e concluindo cada post com uma lição para você e uma nova regra para mim, dando motivos suficientes para te considerar uma das piores pessoas que já conheci na minha vida e concluindo tudo isso com o pensamento de que você não era o cara certo para mim e nem para outro alguém.
E a regra/lição deste primeiro post é bem rápida, óbvia e simples:

LIÇÃO NÚMERO UM: cigarros só são sexys nos primeiros segundos, e você nunca foi um “homão da porra”.
REGRA NÚMERO UM: agradeça ao tio Mark por ter inventado o Facebook, e eles não são um “homão da porra” e nunca serão!

Rule number two

Nunca fui fã de redes sociais e não tenho nenhum problema em dizer o porquê. Faz alguns anos que minha irmã mais nova, a , se envolveu com um garoto bonitinho do colégio, o Fabrício. Lembro-me perfeitamente bem de chegar da faculdade, e vir, toda sem jeito, perguntar como se lida com garotos. Eu, , que era chamada de “bambu de cutucar estrela” por ser feinha, magrela e alta, e Mônica, por ter os dentes da frente separados durante a infância inteira e uma parte da adolescência, olhei para a minha irmã, com os olhos de mulher moderna e experiente no assunto, uma adolescente que foi muito popular entre os garotos do colégio, e disse: "Você se aproxima dele e, então, quando se sentir segura, fala a ele o que sente". Simplesmente, falei e, como na nossa relação existia certa veneração dela por mim, seguiu a instrução. Aproximou-se de , que, mais tarde, passou a ser , e falou a ele o que sentia quando se sentiu segura, porém garotos são espertos e, em um belo dia, quando cheguei da faculdade, encontrei minha irmã chorando em seu quarto, desesperada e, ao perguntar o motivo para tanta tristeza e drama, a resposta automaticamente me fez chorar também: basicamente, disse que também gostava de , porém não acreditava nos seus sentimentos por ele e, para ela provar que estava sendo sincera, para eles ficaram, finalmente, juntos, ela teria que tirar uma foto inocente de calcinha e sutiã. tirou a foto, e a mesma foi parar na rede social, com comentários realmente maldosos sendo escritos por adolescentes de quinze anos, que fizeram minha irmã entrar em depressão e passar horas, dias e meses de muita tristeza.
— Você ficou maluca?! — disparou, assim que abri a porta do meu apartamento, e entrou às pressas no cômodo, fazendo um enorme barulho ao pisar no chão.
— São seis horas da manhã! Por que caralhos você está gritando? — Vi minha amiga abrir a boca, incrédula, e pensei em todos os possíveis vacilos que pude ter feito, mas nada vinha à minha mente, a não ser não ter respondido suas últimas mensagens no WhatsApp.
— Por que caralhos eu estou gritando? — ironicamente, ela gritou mais uma vez, tirando o celular branco do bolso da jaqueta que usava e fazendo a tela touch de saco de pancadas para os seus dedos, antes de estender o aparelho em minha direção, e eu, simplesmente, paralisar no lugar, sem, ao menos, piscar quando me dei conta do que olhava. — Que caralhos você acha que tá fazendo? Essa é a pergunta certa.
E lá estava, mais uma vez, a rede social que atormentou minha irmã por longos anos, voltando para me assombrar, mas, ao contrário do que aconteceu com , meu nome e minha foto sorridente mostravam que quem tinha me exposto na rede social fora eu mesma, com um longo e até bonito (devo dizer) texto, que, no fim, abaixo do "#VouExporEleNaInternet", estava uma série razoavelmente grande de dígitos que formavam o número setenta mil e oitocentas curtidas, junto com sessenta mil comentários e reações.
Eu esperava, no mínimo, cem, não setenta mil! Papai ficaria pasmo! Achei que encontrei a prova para convencê-lo de que nasci para o Jornalismo, finalmente.
Ergui a cabeça para cima, olhando incrédula e furiosa na minha frente. Dei um sorriso sem graça, falando a única coisa plausível, no momento:
— Dando uma de Kim Kardashian no Facebook?
me olhou por um tempo que considerei ser uma eternidade (sem nenhum clichê), até erguer as mãos para cima e jogá-las para baixo, fazendo as mesmas bateram nas coxas.
— Eu não sei se você percebeu, mas, nessa sua releitura de socialite, existem duas Taylor Swift, e uma delas é você, !
— Tenho que me preocupar com isso? — Eu podia ver voando em meu pescoço, neste exato momento. Eu voaria no meu pescoço, neste exato momento, se eu não fosse eu.
— Você fez um post, dizendo que é corna, ! O que você acha? — Suas mãos foram à cintura, assumindo uma pose responsável, e eu detestei isso.
Nunca pensei que fosse sentir saudade dos tempos do Ensino Médio, em que eu falava a ela que queria estourar um extintor, e sorria, completamente animada para ser minha parceira no crime.
— Você tez um post, dizendo que apoiar Jon Snow e Danarys era um absurdo, e tá tudo bem.
— Não compare…
Interrompi seu possível discurso, naquele momento, não querendo discutir sobre isso ou sobre qualquer outra coisa com a minha melhor amiga:
— Eu sei, eu sei! — Girei os calcanhares e comecei a andar em direção ao meu sofá, que estava com o notebook fechado em cima do estofado e meu gato ao lado, enquanto Friends passava na televisão. me acompanhou, com os olhos flamejantes e incrédulos, até eu me sentar e me acomodar no sofá. — me traiu de novo, e eu decidi superá-lo — expliquei, sabendo que ela estava esperando por isso.
— Superá-lo? — Balancei a cabeça positivamente, assistindo-a levantar uma das sobrancelhas. — Expondo-se nas redes sociais, ? Você vai virar uma piada!
Basicamente, essa era a intenção, apesar de não gostar da possibilidade.
— Na verdade, a minha intenção é que todo mundo se choque com as publicações ao ponto de me encontrar na rua e falar: "Ei! Você não é a menina que foi traída várias vezes, até cansar e, então, decidiu postar tudo, contando como até o conheceu, no seu perfil?" — Fiz uma voz mais grossa ao citar o que queria ouvir: — E, então, eu vou dizer "Sim, sou eu mesma!" — Sorri.
— Por que isso, ? Se você quer fazer os outros rirem e falarem de você, vire YouTuber ou fuja com o circo, porra!
Eu já tinha pensado na primeira opção e concluí que não queria ser influência para adolescente nenhum.
— Acredite, tô fazendo isso para o meu próprio bem.
— Eu juro que tô tentando entender sua lógica, mas tá difícil!
Soltei uma risada nasalada, batendo no espaço ao meu lado e indicando para ela se sentar, e, assim, o fez, jogando-se ao meu lado.
— Por conta das minhas postagens, provavelmente, as pessoas vão acompanhar, e isso vai ser uma história muito forte e presente, ao ponto de elas sempre falarem e até comentarem comigo sobre isso, lembrando-me do porquê não voltar com o e o quanto eu sofri quando estava com ele.
Minha amiga me olhou de uma forma que me fez jurar ser uma alienígena.
, a tecnologia pode te ajudar com isso... Você só precisa pegar o seu celular e fazer um lembrete para tocar todos os dias com o título "Não volte com o ! Ele te traiu com sua professora da faculdade!".
— Não seria tão real e não teria o mesmo sentido com pessoas reais me dizendo isso.
me encarou por alguns segundos, antes de suspirar, frustrada.
— Você vai realmente fazer isso? — Assenti com a cabeça, e ela se deu por vencida. — Preciso de cerveja.
— E eu, de café! Preciso escrever mais um texto para as postagens e não sei por onde começar! — confessei.
— Ainda não concordo com isso, mas a primeira briga de vocês e a primeira traição me parecem uma boa.
— Boa? — Sorri, já abrindo meu notebook, enquanto minha amiga pegava as garrafas de álcool e despejava o líquido nos copos que estavam na estante ao lado. — É uma ótima! — falei, animada, começando a, finalmente, escrever.

POST DOIS


Segundo os astrólogos, aquarianos são pessoas “diferentonas”, sempre os do contra, que amam debater sobre tudo. Ironicamente, nasceu no dia dezoito de fevereiro, tendo seu sol em aquário e, simplesmente, criticando “pessoas de humanas” que começavam uma conversa com a pergunta "Qual é o seu signo?" para indivíduos desconhecidos e, ironicamente novamente, signos foram os motivos que nos fizeram ter a primeira briga, que ocasionou sua primeira traição.
Se alguém me falasse que uma conversa boba e despretensiosa com um cara qualquer que estava na festa faria ter um ataque, eu nunca teria me aproximado do cara, nunca teria olhado para ele e muito menos teria trocado palavras bobas com ele, mas, infelizmente, eu não estava em nenhum filme de ficção científica para a do futuro me avisar disso, antes de acontecer e, simplesmente, conseguir impedir que um escândalo, junto com a dor do inferno, se sucedesse. E na mesa de bebidas, enquanto eu colocava mais cerveja no meu copo, e o cara ao meu lado notava meu pingente do signo de escorpião, comentando sobre isso em seguida e me fazendo rir, decidiu fazer um segundo show, aproximando-se de nós, todo cheio de confiança, e sendo um estúpido com o rapaz ao meu lado, que não deixou barato as palavras de meu namorado e o rebateu, resultando no punho de voando e batendo contra o queixo do estranho. Ambos rolaram pelo chão, até alguém decidir que já estava farto de me escutar gritar, pedindo ajuda, e separar os dois. Céus! Seria tão mais fácil se ele tivesse apenas cantado mais algumas músicas do Mac Demarco e tocado o cacete do seu violão!
O que aconteceu em seguida não foi bonito e muito menos uma cena que, um dia, eu desejei ver: , ao largar o cara, me olhou com fúria e, então, saiu para fora da casa. Cinco segundos depois, eu andava, fazendo o mesmo caminho que ele fez e parava na porta da casa, assistindo meu namorado beijar uma garota aleatória com vontade, desejo e voracidade. Meus olhos se encheram de lágrimas, e meu coração apertou, como se meus melhores amigos estivessem rindo ao ver que meu dente da frente caiu no jardim de infância. Durante todo o tempo em que estivemos juntos, eu nunca achei que , justamente, , me faria sentir algo tão horrível ao ponto de não suportar e decidir correr dali. Nunca achei que, naquele dia, eu chegaria em casa, soluçando de tanto chorar. Nunca achei que, no fim da noite, eu estaria me sentindo ridícula, traída, humilhada e, principalmente, culpada.
Lembro-me das minhas amigas dizendo, indignadas: "Ele beijou outra garota na frente de todo mundo?!", no dia seguinte, e eu gritando: "Foda-se, se os amigos dele estavam presentes! A boca que ficou grudada na dele durante dez segundos não era a minha!". Despejei toda a minha raiva daquela lembrança delas, até quatro dias depois, João aparecer na minha porta e fazer uma versão barata, escrota, masculina e sem sentido nenhum de 'What You Made Me Do', da Taylor Swift, e gritar comigo por uma coisa que ele mesmo fez, fazendo eu me sentir culpada por isso.
Dá para ter uma noção disso?
Ele colocou a culpa de ter beijado outra garota em mim! Ele beijou outra garota! Ele escolheu beijar outra garota! Como eu posso ter culpa nisso? Como eu posso ter provocado algo assim, se quem fez essa escolha foi ele? E, apesar de, na hora, eu ter certeza de que quem provocou toda a confusão do outro dia fora eu e pedir desculpas, enquanto lágrimas escorriam pelo meu rosto, dois dias atrás, bêbada, sentada no chão em frente à minha porta com uma garrafa de vodka na mão e um machucado inflamado, comecei a pensar sobre isso e concluí que não tinha sentido algum. Apelei para algumas pesquisas e descobri que a ação que teve se caracterizava com a de pessoas que são parceiros abusivos, e a forma como ele me fez acreditar ter sido a principal culpada por tudo está muito presente no poder de convencimento e persuasão de aquarianos.
Isso significa que todas as pessoas de aquário são abusivas?
Não, significa que tinha razão ao alegar que signos não definem caráter, e é justamente por isso que ele é um babaca, porque, segundo os astrólogos, ou a Paula Pires, os únicos defeitos que meu atual namorado, na época, deveria ter era o de pose superior e se achar maior que todo mundo, discutindo sobre tudo e sendo o dono da razão. Acontece que ele era tudo isso e várias outras coisas realmente ruins.
E, seguindo esse raciocínio, eu escolhi a segunda lição que irei te dar e a regra que irei criar:

LIÇÃO NÚMERO DOIS: sorrir; conversar e olhar para outra pessoa, que não seja você, são atitudes do ser humano, . Atitudes comuns, e isso não significa que ela está te traindo ou pensando em se atracar com o cara na primeira oportunidade que tiver. Significa que ela está agindo como uma pessoa normal. Você não é uma pessoa confiante, e uma prova disso é o seu ciúme. Dias após a nossa primeira briga, eu me peguei achando fofo o fato de você ter tido ciúme, o que é bizarro, pois aquilo não foi uma atitude de alguém e de um relacionamento saudável. Ciúme daquela forma e de qualquer outra que prejudique outra pessoa não é normal e muito menos bom, e você é o único culpado por suas ações! Seu passado não tem nada a ver com isso, sua namorada não tem nada a ver com isso e muito menos qualquer outra pessoa! Tu te tornas eternamente responsável por tudo o que tu cativas. Então, quando você sentir seu coração queimar e a vontade de magoar a pessoa que diz amar para se vingar, simplesmente, não faça. Vou repetir para você gravar bem: NÃO FAÇA!
REGRA NÚMERO DOIS: nunca ache que deveria ter voltado no tempo para impedir uma merda que não foi você quem fez. Não se sinta culpada quando quem fodeu tudo não foi você! Ser um idiota é uma escolha, e você não tem culpa disso! Na próxima vez que for traída e humilhada apenas por vingança, não ache que a merda de uma história de vida sofrida justifica seus atos escrotos. Não abra a porta para ele entrar, não atenda suas ligações, não seja sua amiga, não o aceite de volta. Não importa o quanto ele implore, apenas não aceite!
OBS: sim, eu recitei 'O Pequeno Príncipe' e não é porque você não gosta, e, sim, porque eu quis. O mundo não gira em tono do seu umbigo, então pare com essa porra, pois isso é uma característica de leoninos e não de aquarianos, inferno!

Rule number tree

"Você está louca?!"
"O que pensa que tá fazendo?"
"Eu tenho uma imagem a zelar, e você tá destruindo tudo só por causa do seu ego enorme e inútil!"
"Apague aquelas postagens!"
"Você vai se arrepender disso, , e quando isso acontecer, eu não vou te perdoar, porque, no fundo, você sabe que a culpa disso tudo é sua!"
"RESPONDA OS CARALHOS DAS MENSAGENS!"
"ME RESPONDA!"


Essa foi a reação de , no dia seguinte, fazendo meu celular vibrar de forma irritante, após eu ligar meus dados móveis. Um mês atrás, quando eu lesse aquilo, correria para me desculpar e tentar explicar o que aconteceu, mas, hoje, após ler os milhares de comentários positivos nas minhas postagens, minha vontade é de rir, enquanto bloqueio seu contato no WhatsApp e concluo a ação, silabando as palavras: “Foda-se você, seu hipsterzinho de merda!”.
Você não terá minha resposta, hoje, , e nem em um futuro mais próximo.
Não mais.
é tão inútil que, nem para ser vítima de preconceito linguístico, ele serve, até porque o embuste escreve certo. — comentou e provocou minhas gargalhadas instantâneas, me fazendo parar a ação de levar o copo de chope aos lábios, apenas para rir. Depois de muitos minutos, repetindo a frase "Eu sei o que estou fazendo! Relaxa!", ela tinha aceitado a recente forma que eu arranjei para superar e até tinha me ajudado quando li alguns comentários não muito positivos nas postagens, lembrando-me de que era extremamente normal aquele tipo de coisa, já que o post era público e, no mundo, existem várias pessoas idiotas, ainda, incluindo meu atual ex-namorado.
ainda não sabia como eu tinha descoberto a mais nova traição dele, e eu estava agradecendo aos céus por ter uma amiga que respeitava meu espaço. Não estava preparada para contar com detalhes como vi nu em cima de uma garota a qual não quis saber quem era. Eu já não sentia vontade de chorar por ele e, realmente, achava que o havia superado na velocidade da luz. Eu estava mais sorridente, e no meu peito não tinha nenhum vazio. Isso era algo bom.
— Pelo menos, eu posso falar da bandinha de merda que ele tem. Universo Alternativo? Sério? — Eu gargalhava descaradamente, assim que começava a falar sobre a banda do meu ex-namorado. — O nome é horrível! Sempre foi, . Como você nunca falou isso a ele?
— Eu juro que tentei... — defendi-me, erguendo as mãos para cima. — Mas as músicas são legais.
— Eu me sentiria melhor se fossem uma merda.
— Falando de mim? — , como um enviado do céu, apareceu em nossa mesa, com todas as suas tatuagens no braço e seu sorriso simpático.
— Não, mas estava pensando em você. — , imediatamente, levantou-se, pegando o celular que permanecia no centro da mesa. — Você realmente disse a Ginn que eu podia ajudá-la, hoje, sem me consultar antes? — Eu conhecia aquele olhar da minha amiga e posso jurar que, neste instante, ela se imaginava batendo a cabeça de contra o concreto mais próximo, e essa cena passou a ser mais violenta na sua cabeça quando o mesmo lhe lançou um sorriso descarado, confirmando, silenciosamente, o que ela havia perguntado. bufou, pegando a bolsa pendurada na cadeira em que estava sentada antes. — Lembre-me de colocar seu nome na lista de pessoas que batem em animais.
— Eu nunca faria isso! — ele rebateu, arqueando as sobrancelhas, profundamente ofendido, enquanto sentou-se na cadeira vazia ao meu lado.
Eu ri.
— É como se tivesse feito agora. — se virou para mim, passando a alça da bolsa no ombro direito. — Ligarei para você, depois! — falou e mandou um olhar maligno para , antes de andar até a saída, indo embora.
— Isso foi cruel! — ele comentou, referindo-se ao olhar, e eu sorri mais uma vez.
Algo me disse que eu deveria procurar algum médico. Ultimamente, a ação de sorrir e rir estava sendo bem comum, e eu não era uma pessoa que é feliz todos os dias, muito menos que faz isso a todo momento. mal saiu da minha vida, e eu já estava percebendo os efeitos colaterais. Inacreditável!
— Ela vai te matar, algum dia.
— Sempre soube disso. — soltou o cabelo enrolado e comprido, apenas para amarrá-lo em um coque alto e bagunçado novamente. Não me lembro de um segundo que não invejei suas madeixas, ou, até mesmo, quis tocá-las. — Enquanto isso não acontece, você bem que podia me contar mais sobre essa história de virar uma digital influencer.
— Já imaginou? Eu sendo uma blogueirinha que inicia o vídeo, falando: “Oi, meninas! Tudo bom? No tutorial de hoje, eu vou ensinar uma make para você usar no dia em que vai descobrir que está sendo corna”. — Fingi uma voz mais fina e enjoada, tentando imitar alguma blogueira, e riu.
— Já pode abrir um canal no Youtube. Eu tenho o nome perfeito! Chifre rosa! Ou melhor, que tal, ao invés de criar um canal, você não abre uma empresa de berrante e passa a lucrar com todos os seus chifres?
— Não brinque com isso! Ainda é recente! — disse pausadamente, distribuindo tapas, entre as pausas das palavras, em seu braço e vendo-o se encolher, enquanto ria da minha reação.
Ao contrário dele, eu tive que segurar a gargalhada que queria dar.
— Desculpa. Achei que você já tinha superado isso.
— Estou processando tudo ainda... — Coloquei uma mexa do meu cabelo atrás da orelha, e ajeitou a camiseta cinza que usava, alisando o tecido. Fiquei um pouco desconfortável. Ele sempre me deixava desconfortável. Aliás, esse era um dos motivos pelo qual eu sempre o evitava nas festas que dava ou ia, o que me tornava uma alienígena, uma vez que o rapaz sempre deixava as pessoas mais leves e as faziam se sentir bem com sua presença. Nunca entendi o porquê de o efeito contrário acontecer comigo.
— Peço perdão pelo que fiz e tenho uma ideia para me redimir de minhas falas — ele disse, e eu o olhei de canto com meus olhos cerrados e profundamente desconfiados.
— Estou escutando. — Levei o copo com cerveja, finalmente, aos meus lábios, e ele sorriu. Sorriu com o corpo, com os poros, com os lábios, com os olhos, com as mãos e todo o seu ser. Tudo nele se acendeu e sua animação ficou absurdamente perceptível. Eu poderia ficar olhando-o dessa forma por alguns minutos. Talvez, horas, ou, quem sabe, anos.
— O que você acha de estúdios de arte?

(...)


Durante todo o trajeto, e eu fomos conversando sobre coisas diversas e não paramos de falar ou rir durante um segundo. Só quando eu cheguei à galeria, o silêncio me atingiu por completo. O ambiente era composto por todas as paredes brancas e lâmpadas na parede ao lado das obras. Aproximei-me da primeira tela, e a sua pintura era composta por cores preto e branco — um pássaro preto preenchia o meio da tela e respingos de gotas de tinta da mesma cor preenchiam o resto da tela, cobrindo o animal e, até mesmo, o desenho de galhos de árvores secas que estavam ao lado. Passei para a segunda, e a pintura possuía a mesma cor da primeira, mas, desta vez, o desenho era duas bocas, quase unidas, e não dava para diferenciar o sexo do casal, pois eram apenas silhuetas de lado, sem muito detalhes do rosto, fora os lábios, e na terceira, posso dizer que a tela ganhou meu suspiro e uma atenção maior. Dentre todos os quatros pendurados, ela era a única que possuía, de fato, cores. Uma mulher estava pintada no centro da tela, ela estava de costas, e seus ombros passavam tensão. Com seu rosto virado para o lado e seu queixo encostado na ponta do ombro esquerdo, ela olhava para mim. Era quase como se estivesse posando para uma foto, mas não estava. Seu cabelo era curto, e seus olhos, um pouco puxados para o canto, a boca era fina, e o nariz, um pouco arrebitado com sardinhas em cima dele e por algumas partes do rosto, porém a expressão dela era uma mistura de coisas. Era forte e, ao mesmo tempo, calma. As sobrancelhas davam uma suavidade, e os olhos, a tensão. A pintura da mulher era preta e branca, e o resto das cores do arco-íris preenchiam à sua volta, em gotas também, como as do pássaro.
— É... — minha voz soou como um sussurro e não demorou muito para que eu sentisse a presença de ao meu lado.
— Eu sei — apenas disse, também olhando a pintura. — Não sei bem o porquê pintei isso, mas foi como se eu precisasse. — Ele conseguiu, por alguns segundos, minha atenção e meus olhos surpresos.
, sou eu... — murmurei. — Sou eu inteira. As sardas, a boca, os olhos, as sobrancelhas, a expressão, é... — Minha voz falhou, e eu soltei um suspiro. — Sou eu! — disse mais a mim que a ele.
, você não precisa se sentir estranha ou algo do tipo. Eu não sou nenhum lunático que tem milhares de fotos suas em um porão e dorme com uma almofada que tem seu rosto.
— Eu sei, eu sei, é só que... — Coloquei as mãos ao lado da testa, tentando procurar palavras que explicassem o que eu sentia agora, mas, ao mesmo tempo que algumas delas surgiam, tudo continuava sendo em vão. Joguei alguns fios do meu cabelo, que meus dedos conseguiam pegar, para trás, quando fiz a ação de abaixar as mãos. Balancei a cabeça negativamente, incrédula, e soltei mais um suspiro. — Olhando isso, parece que não sou completamente imperfeita e cheia de defeitos.
— Não acho que alguém consegue ser assim.
— Sim, olhando de perto, ninguém é perfeito. Eu, muito menos.
— Eu duvido! — Ele sorriu, mas, para o seu azar, eu estava prestes a provar o contrário.
— Você sabia que eu levei três anos para perceber que a pessoa com quem eu estava não gostava de mim da mesma forma que eu gostava dela? — disparei, cruzando os braços. — Mas sabe o que é irônico? Eu tive todos os sinais que alguém precisava ter para se afastar, mas, simplesmente, continuei, porque, talvez, quem sabe, aquilo poderia mudar e...
, você não precisa me falar isso.
— Eu quero falar — rebati. — Não consigo me lembrar de quantas vezes já chorei por uma pessoa que não se importava comigo, ou quantas vezes eu me culpei por algo que aconteceu com ele por escolha dele. Eu fui traída um milhão de vezes, humilhada, machucada e, mesmo assim, eu voltava. Sabe aquela frase “Se ele gostasse, você saberia”? Eu sempre tive consciência disso e, no fundo, sabia que essa minha insegurança com relação aos sentimentos dele era porque não existiam sentimentos. — Engoli em seco. — Não existia nada, nem mesmo uma relação, mas, mesmo assim, eu tentei várias vezes provar que estava errada.
... — Seu tom era de alerta, mas, ainda assim, baixo e calmo.
— E, no fim, eu estou... Sempre estive.
— Isso não está certo. — riu pelo nariz e balançou a cabeça.
— Eu não sou certa.
— Ok. Olhe para mim — disse e, no minuto seguinte, as mãos de estavam em minha cabeça, cada uma de um lado, e ele me encarava, sério. Senti todo o meu corpo tremer. — Eu vou te falar algumas coisas, agora, e quero que você me escute com muita atenção, ok? — Balancei a cabeça positivamente. — Quando eu te conheci, lembro-me de nunca ter conhecido uma pessoa tão expressiva antes. Você, simplesmente, assistiu sua melhor amiga derrubar um cara muito maior que ela no soco e seu rosto entregava tudo o que você estava sentindo e pensando: primeiro, você ficou assustada; depois, nervosa e, então, concluiu, rindo e batendo palmas. , no mesmo segundo que foi tirada de cima do cara, olhou, furiosa, para você e, de repente, tudo se acalmou, como se ela estivesse procurando sua aprovação, como se você fosse tão importante ao ponto de ela não ligar para o nariz que tinha acabado de quebrar de alguém e, sim, para a sua opinião sobre ela. Eu sabia que você era alguém importante, naquele momento. Alguém especial. Dois segundos depois, você a abraçava e pedia desculpa por não estar por perto quando o babaca decidiu assediá-la. Você se culpou pelas ações que ela tomou e se culpou por todas as traições e todo o drama com , mas o problema não era você, nunca foi você e, por um segundo, apenas por um segundo, você deveria se permitir olhar exatamente do jeito que você é e perceber que , na verdade, sempre te procurou, porque sabia o quão incrível você é, e em como ele sempre tentou esconder isso do mundo.
Naquele momento, eu fui hipócrita. Naquele momento, eu estava sendo exposta e, naquele momento, apenas naquele momento, senti vontade de chorar por e por mim. Eu me arrependi dos posts e me arrependi pelo tipo de amor que achei que merecia. Eu me arrependi por sempre pensar que nunca conseguiria algo melhor, ou que, literalmente, não podia viver, sem sentir o que me fazia sentir. Eu me arrependi por todas as vezes em que me escondi, ou que não falei o que queria falar e, principalmente, eu me arrependi por ter achado que, sozinha, conseguiria levar uma relação na qual apenas eu estava interessada. E quando fixei verdadeiramente meus olhos nos olhos de e o vi querendo encurtar a pequena distância entre nós, o pânico me preencheu. Eu nunca fui tão insegura e absurdamente desesperada ao ponto de me desprender dele, olhá-lo por alguns segundos e sair correndo da galeria, tendo certeza de que nunca nem, ao menos, cheguei a superar o naquele tempo e que a dor que eu não sentia se manifestava agora.

POST TRÊS


Depois de todas as piadas e da história que contei aqui, este é o meu último post. A última exposição clara da minha vida. E, já que estou me despedindo, hoje, começarei com algo diferente: vamos falar sobre o início de tudo, mas não o início da minha história com e, sim, o início da minha existência.
Minha mãe nasceu em Minas Gerais e se mudou para São Paulo quando tinha dezoito anos. Não demorou muito para procurar um trabalho, após chegar à grande cidade, e já se encontrar em um dos mercados daqui. Já meu pai nasceu e cresceu aqui, repleto de regalias e dono de um futuro brilhante, que, de fato, ele teve e tem. Eles eram completamente opostos, mas um corredor de massas fez o caminho dos dois se encontrarem, para, um ano depois, nascer uma linda e pequena criança chamada .
Meus pais tiveram um lindo começo, eu posso assim dizer, porém um trágico fim, que dura até hoje. Quando eu tinha doze anos, ambos entraram em um acordo e, então, se separaram. Meu pai saiu de casa, foi morar em um apartamento que, hoje, divide com sua nova esposa, e minha mãe continua na casa que, um dia, foi dos dois, e a mesma ainda é sustentada por ele, totalmente. Após se casar e ter sua primeira filha, minha mãe abriu mão de muita coisa, inclusive, da sua independência, e quando a separação aconteceu, descobriu que era difícil voltar a ter uma carteira assinada, depois de quase quarenta anos fora do mercado de trabalho e, até hoje, depende do meu pai para diversas coisas. Meu pai, o mesmo homem que eu sempre vi como um herói, que não me apoiou quando revelei a profissão que queria seguir e que venera meu ex-namorado, considerando-o o filho que queria ter.
Eu amo meu pai e tudo o que, um dia, ele representou para a minha vida, mas ele falhou rudemente comigo e, hoje, enquanto estava jogada no meu sofá, deslizando o feed do Instagram e cansada de ler coisas realmente ruins no meu Facebook, me deparei com um texto que me deixou pensativa:

“Toda vez que você
diz para sua filha
que grita com ela
por amor
você a ensina a confundir
raiva com carinho
o que parece uma boa ideia
até que ela cresce
confiando em homens violentos
porque eles são tão parecidos
com você”


Eu me lembrei da primeira vez que vi , da primeira vez que ele me machucou e da primeira vez que vi como meu pai era. Não vou entrar em detalhes, mas eu nunca vou esquecer a identificação que papai sentiu ao conhecer . “Tem certeza de que você não é meu filho?”, ele disse, sorridente, e eu também sorri.
Sorri, porque, pelo menos, uma vez, meu pai me olhou com orgulho, aprovando uma escolha minha.
Sorri, porque achei que era a pessoa da minha vida.
E sorri porque eu achei que daria certo.
Mas nunca foi para dar certo, porque o tipo de amor que eu recebia era o amor que cresci vendo minha mãe receber. Era o amor que vem com o sentimento de culpa, humilhação, de não ser o suficiente, de insegurança e, principalmente, o tipo de amor que você acha que tem que ter para se sentir inteira.
Na minha relação com , na maior parte das vezes, ele errou, mas isso não quer dizer que eu também não tenha falhado. Eu nunca deveria ter ficado quieta quando não concordava com algo por medo do que aquilo poderia provocar. Nunca deveria ter deixado-o me esconder. Nunca deveria ter pensado que eu seria infeliz sem ele. Eu nunca deveria ter acreditado, realmente, que eu era especial por tê-lo. Eu sou especial sozinha. Você é especial, estando sozinha. Porque a pessoa ao seu lado não deve te completar e, sim, te complementar. E, hoje, eu vejo isso. Agora, eu vejo isso.
E parece que todos os momentos com só, de fato, aconteceram porque eu era insegura demais ou porque nunca me amei o necessário para perceber que mereço mais. Qualquer pessoa, no mundo, merece mais.
Eu fiquei horas me questionando sobre a superação. Como você sabe que superou alguém, ou, até mesmo, como se supera alguém, porque, apesar de, agora, neste momento, ter certeza de que o que tive não passou de uma experiência complemente abusiva, que tive sorte de conseguir sair, horas atrás, eu me perguntava as marcas que essa mesma experiência pode ter me causado. Eu descobri uma delas, hoje: o desespero de ver algo com outra pessoa acontecendo e imaginar que pode ser igual ao que já tive com você. Cheguei à conclusão mais óbvia que existe: nossas ações, as suas ações, , têm consequências, e não quero ter medo de conhecer ou me envolver com alguém por pensar que ele pode ser como você. Eu não quero isso. Eu quero estar preparada para tentar de novo. Eu quero tentar de novo. Eu quero dar uma chance a outras pessoas novamente, mas, antes de tudo, eu quero dar uma chance a mim e superar de verdade essa marca que você deixou, e que, se depender de mim, não ficará por muito tempo.
E, agora, eu concluo este post com a última lição e regra para nós dois:

LIÇÃO NÚMERO TRÊS: seja o tipo de pessoa que você gostaria de conhecer, tenha as atitudes que você queria que alguém tivesse com você e ame como você gostaria de ser amado. Você só é único e essencial para si. E, a partir do momento que você está machucando uma pessoa, isso já não é mais amor e, talvez, nunca chegou a ser.
REGRA NÚMERO TRÊS: nunca mais esconda quem você realmente é e tenha em mente que a única pessoa que você precisa para ser feliz é si mesma. Seja sempre a sua própria alma gêmea.

Epílogo

Movimento o cursor do mouse ao mesmo tempo que meu celular apita. Pego o aparelho, acendo as luzes e clico em 'postar'. Uma barra carrega, e tenho certeza de que tudo está acabado no mesmo instante em que leio o recado que foi deixado:
“Ok. Talvez, eu seja um psicopata que tem um porão cheio de fotos suas e que dorme com uma almofada que tem o seu rosto, mas isso não quer dizer que eu seja alguém ruim.”
“Eu não tenho tanta certeza disso.”
“Eu posso provar o contrário.”
“Estou escutando.”
“Ou melhor, lendo.”
“O que você pensa sobre cafeterias?”
“Prometo escovar meus dentes, para que, desta vez, você não saia correndo, caso eu me aproxime, e juro que irei comprar pão de queijo!”

Dou risada ao mesmo tempo que digito a última mensagem:
“Onde fica esse lugar, mesmo?”



Fim



Nota da autora: (20/02/2018) I GOT NEW RULES I COUNT ‘EM!!!!!





Outras Fanfics:
O Amor em Jogo – Restritas/Outros [LONG/EM ANDAMENTO]

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