Finalizada em: 02/02/2021

Capítulo Único

”And isn't it just so pretty to think
All along there was some
Invisible string
Tying you to me?
- Taylor Swift



O ano era 2035. chacoalhava os pés nervosos, olhava o relógio no pulso de cinco em cinco minutos enquanto bufava por não estar tão perto das quatro da tarde como ela gostaria que tivesse.
Foi difícil conseguir marcar aquele encontro. Um mês. Esse era o tempo que tentavam marcar para todos os sábados, mas sem sucesso. Não reclamava disso, de maneira alguma, ficava até mesmo feliz por saber que seus amigos tinham a agenda tão lotada de compromissos, palestras e convenções da empresa que quase não tinham tempo para se unirem. Era bom vê-los bem sucedidos, deixava o coração quentinho e dava a sensação de dever cumprido.
Olhou para a lancheira de metal apoiada na mesa de centro da sala e riu ao ver a foto de sua cantora favorita, Taylor Swift, estampada no objeto. Podia ver também, feitos por canetinha preta, alguns trechos das músicas dela e diversos números treze em todas as cores de canetinha disponíveis. Costumava pensar, com seus doze anos, que se o número trazia sorte para a melhor cantora do mundo, traria para ela também. Acreditava tanto nisso que às vezes trazia mesmo.
Baghin tinha sido a típica pré-adolescente swiftie. Passava batom vermelho às sete da manhã para ir para escola, escrevia nos braços e mãos trechos de músicas que a mulher escrevia em shows, deixava de prestar atenção nas aulas insuportáveis de matemática para escrever fanfics e alimentar o fã clube no twitter. Era feliz daquele jeito e lembrar daquilo trazia uma sensação de paz. Se ela soubesse como era feliz naquela época...
Voltou para a realidade quando ouviu as batidas na porta. O coração acelerou logo e o sorriso no rosto cresceu. Abriu a porta com certo desespero, sentindo os olhos encherem-se de água quando os viu ali. , Niall Horan e Milena Kis. Seus melhores amigos da adolescência ali, parados na porta da casa dela, depois de dez anos sem frequentar o lugar.
Não os deu espaço para passar, surpresa demais para isso, os olhava atentamente e nos mínimos detalhes. Conseguia captar cada mudança física mesmo que no fundo ainda tivessem as mesmas expressões. Milena ainda tinha os olhos verdes expressivos, o sorriso carinhoso no rosto e a mesma feição angelical de sempre. Estava mais bonita, mais alegre. Já Niall havia mudado completamente. A barba rala no rosto, os cabelos naturalmente castanhos, que antes eram descoloridos, os dentes sem aparelho e uma cara de homem mais velho que ele sempre desejou ter. A encarava com a sobrancelha erguida em certo deboche. jurou que se não o conhecesse tão bem e se ele não a conhecesse tão bem, o homem a acharia louca. Ele estava divinamente lindo, pela primeira vez na vida. Fez uma nota mental de comentar isso com ele.
E, então, os olhos se encontraram com os dele. Verdes, expressivos, brilhantes e miúdos devido ao sorriso gigantesco que estava presente no rosto. As covinhas à mostra eram um charme. tinha cara de casa, de conforto, de momentos bons que ficaram para trás. Trazia junto com ele tudo que ela foi, tudo que ela queria ser, tudo que deixou para trás para se tornar. Ele era lembrança e, ali, era o presente.
— Vai nos deixar entrar? — Niall quebrou o silêncio e sorriu, sem graça, dando passagem logo em seguida. Os quatro penduraram os casacos grossos no cabideiro próximo ao hall da casa.
— É estranho ver você e com barba. Vocês não tinham nem pelos nas axilas. — O homem riu e olhou ao redor. A sala continuava a mesma. Os dois sofás brancos próximos à lareira, os milhares de porta-retratos colocados em cada lugar que os pudesse caber. Olhou para o mini bar improvisado do ex-sogro, com diversas garrafas de whisky e vinhos, que vez ou outra roubavam pequenas doses.
— É bom estar aqui depois de tanto tempo. — Milena pegou um porta retratos dos quatro amigos na época do colégio e sorriu, saudosa. Sequer lembrava-se daquela memória. Os quatro estavam correndo com carrinhos de supermercado no meio do estacionamento. carregava , e Niall, Milena. O que a foto não retratava era a perna quebrada de quando bateu, sem querer, as rodas do carrinho no meio-fio da calçada. Jane, mãe de , quis matá-lo.
— A casa agradece por tê-los aqui também.
— Só a casa, ? — arqueou as sobrancelhas e a mulher sentiu o coração bater um pouco mais rápido.
— Só a casa, . — Revirou os olhos, sorrindo. — Não vai abraçar sua ex-namorada preferida? — Ela o abraçou com vontade. Não teve rodeios, não teve vergonha. A saudade era muito maior que qualquer outro sentimento. teve vontade de chorar. Teve vontade de pedir eternas desculpas, de dizer que ter saído da cidade por dez longos anos fora ótimo para o lado profissional, mas que nunca encontrou alguém que mexesse tanto com ela como o dono daqueles cachos definidos e maxilar marcado. Ninguém nunca havia chegado perto de tomar o lugar que tinha no coração dela, nunca. O sentimento de saudade foi cortado quando a razão falou mais alto. A maldita razão que sempre estragava tudo. sentia falta daquele , daquele que era seu namorado e fazia competição de arroto com ela depois de tardes e mais tardes se pegando no sofá. O que ela abraçava agora era apenas o . Não era mais a mesma pessoa, assim como ela não era mais a mesma de antes.
— Dez dólares, Niall. — A fala de Milena foi o suficiente para que soltasse . Horan puxou a carteira do bolso enquanto bufava e tirava a nota. Ela não estava acreditando nisso.
— Vocês apostaram o que dessa vez? — Era um costume deles apostar as coisas desde que se entendiam por gente e recebiam mesada dos pais. Niall dizia até mesmo que Milena pagou a faculdade com todo dinheiro que ganhou nas apostas.
— Que você e iriam ficar grudados. Niall apostou que vocês seriam cordiais. — Baghin revirou os olhos. Estava tão acostumada com esse tipo de atitude que nem se dava o trabalho de ficar brava.
— Dez anos se passaram, pessoal. Hora de amadurecer. — Cada um foi se acomodando no sofá e na poltrona, tendo uma visão privilegiada de cada um deles.
— Por que agora, Lê? — Niall perguntou e recebeu um olhar confuso como resposta. — Depois de tanto tempo, por que voltar agora?
— Não voltei definitivamente, Horan. — suspirou com a resposta da mulher e a atitude não passou despercebida por ela. — Alguns compradores virão ver a casa essa semana e preciso organizar as coisas do papai e da mamãe. — O clima pesado se instalou pela sala.
Jane e George eram muito queridos. Eram pessoas que estavam sempre com o sorriso estampado no rosto. Milena, Niall e os amavam como se pertencessem à mesma família, mesmo que isso acontecesse, no coração. A quantidade de panos que os dois passaram para os meninos todas as vezes em que chegaram bêbados de baladas e não poderiam voltar para casa para não apanharem, sempre alegres, sempre com uma piada na ponta da língua.
Quando descobriram do acidente, não foi apenas o mundo de que caiu. O deles também. Os dois foram sepultados em Nova Iorque e foi tão privado que não convidou nem mesmo os amigos. Ela só queria acabar com aquilo logo e não precisar falar sobre, receber algum olhar de pena e compaixão. Queria distância de tudo e de todos. Havia um ano que eles partiram desta para uma melhor.
— Eu ainda não acredito nisso. É como se fossem voltar da cozinha agora com uma forma cheia de cookies. — sorriu.
— Eu ainda não acredito também. — A mulher sorriu, tristonha, e apontou para o telefone na mesa de centro. — Se vocês pegarem o aparelho agora, verão que tem mais de quinhentas mensagens que deixei na caixa postal. — Deu de ombros e respirou fundo. Não choraria. — Vocês sabem como eu amava mandar áudios e mensagens pra eles quando eu estava alterada, fazendo diversas declarações. Bom, nesse último ano, eu fiquei bêbada em uma quantidade considerável de vezes.
— Sinto muito, .
— Não sinta, Mi. Eles morreram exatamente como sempre disseram que gostariam de morrer, juntos. Isso para mim basta. — Levantou-se da poltrona e foi até a cozinha, retornando com um pequeno pote com brownies. — Não são iguais aos da minha mãe, mas acho que dá pro gasto.
— Estão com uma cara ótima. — Cada um pegou um pequeno pedaço e antes de darem a primeira mordida, deu o recado:
— Estão batizados. — Ouviu a risada gostosa dos amigos e gargalhou junto. — A famosa e amada receita de .
— Como eu cogitei pegar isso sem suspeitar? — Niall riu e mordeu, fechando os olhos ao sentir o gosto de chocolate e ansioso pela brisa que aquilo lhe traria.
— Eu passo dessa vez, . — Milena começou. — Amanhã é meu plantão no hospital e não posso chegar em casa chapada, meus filhos teriam um péssimo exemplo.
— Deixa de ser velha, Milena. — Horan revirou os olhos e entregou-a o brownie novamente, vendo-a olhar receosa para a comida. e assistiam à cena. — Não é novidade para ninguém que você não é o melhor dos exemplos. Coloca logo na boca. — Não precisou que insistissem mais para que ela assim o fizesse. Os três aplaudiram a ação dela, a deixando com as bochechas levemente coradas e com um sorriso bobo presente no rosto.

Estavam ali há alguns minutos. Quem passava pela calçada da casa dos podia escutar as risadas vindas de dentro. O clima era gostoso, animado e acolhedor. Nunca deixariam de ter intimidade e carinho um pelo outro.
Vez ou outra, o olhar de pousava em e a mulher sentia o rosto corar em todas elas. estava sempre a olhando de volta com um sorriso quase que debochado enquanto passava os dedos pela borda da taça. não sabia se era o efeito da bebida ou do brownie batizado, mas estava o achando incrivelmente sexy, e não fazia questão de esconder a atração pelo ex todas as vezes em que mordia o lábio inferior discretamente. Se tivesse ficado esperto com o tempo, ele saberia reconhecer aquilo.
Sempre pensou que o homem ficaria feio com o tempo, já que o ex-sogro não era lá essas coisas. Se agarrava nisso quando a própria mente queria fazê-la sofrer trazendo a clássica pergunta: “E se eu tivesse desistido da faculdade por ele?”
Depois de tantos anos se questionando sobre isso e sofrendo por algo que sequer sabia como seria, adotou uma resposta para si mesma. Se tivessem ficado juntos, agora seria uma mulher casada com um homem de beleza mediana e não teria realizado o maior sonho da vida. Não seria psicóloga, não teria um consultório em uma das melhores avenidas da cidade. Não seria convidada para palestrar, para lecionar. Ela era feliz.
Mas, ao vê-lo ali, sorridente e com os cachinhos ainda tão definidos quanto antes, com algumas pequenas rugas no rosto, com as covinhas ainda mais profundas e conversando sobre os livros que tinha lido no ano, soube que a resposta que sempre se deu era mentira. continuava lindo, além de inteligente.
— Ele não para de olhar para você. — Milena sussurrou para que apenas a amiga a ouvisse.
— É impressão sua. — Sorriu, debochada, e o encarou mais uma vez, levantando a taça para o homem, que retribuiu o gesto.
Era fascinante vê-lo falar sobre todos os livros de guerras que já tinha lido, desde as mundiais até as que não eram muito contadas no continente americano. dava uma aula de história para os amigos e não sabia se estava sendo uma aluna exemplar ao prestar atenção em cada palavra dita ou se estava simplesmente encantada. Diferente do que parecia, não era professor de história, bem longe disso, na realidade. tocava e cantava em pequenas boates e bares pela pequena cidade do interior. Ele era bom nisso e em tudo que fazia.
— Eu gostava mais de você quando a gente falava sobre jogos de computador. — Niall bocejou e revirou os olhos. Não era ele que queria impressionar.
— League of Legends é tão 2020, Niall. Supera. — Milena comentou, rindo, sentindo a almofada bater no rosto em seguida. — Eu menti? Não menti. Ficou afetado porque sabe que é verdade.
— Meu cu para você, Kis.
— Falando em cu para Milena... — riu e teve toda a atenção para si. — Como está o casamento? Zayn ainda é tão legal como na escola? — Ela assentiu enquanto sorria. — Uma vez fiz um trabalho com ele de inglês e fiz tudo sozinha. Continua folgado?
— Não. Nos primeiros anos ele deixava tudo jogado pela casa e você sabe como sou com limpeza. — riu, concordando. — Eu juntei tudo e joguei no lixo. Nunca mais aconteceu.
— Queria ter dó, mas não tenho um pingo. — As duas brindaram enquanto riam.

Era cada vez mais difícil segurar a curiosidade de Niall. Já era a quinta vez que gritava para que o moreno não pegasse a cápsula do tempo feita com a lancheira. Ele esperava todos se distraírem e esticava a mão para alcançar o objeto.
— Você não tá curiosa porque já viu o que tem dentro. Eu não vi. — Tentava argumentar e levava xingo dos outros três. — Vão me dizer que não querem saber o que um bando de adolescente chato botou aqui dentro?
— Eu não abri ainda, insuportável. — A mulher pegou a lancheira, a apoiando na mesa de centro. — Vamos abrir logo antes que ele desmaie.
— Essa lancheira me lembra todas as vezes que eu vinha pra cá e a gente passava a tarde toda no quarto lotado de pôsteres. Era sempre estranho. — comentou ao olhar para o objeto. Os amigos concordaram.
— Ah, , depois de um tempo eu tava até acostumado com as maluquices da . — Niall retirava os treze itens guardados e os olhava, curioso, tentando lembrar de quem eram.
— O de dezesseis anos que perdeu a virgindade num lençol estampado com a cara da Taylor Swift não concorda. — Ele fez careta ao lembrar-se.
— Aquilo me ajudava a te aguentar, . — Ele sorriu com a lembrança e com a menção do apelido apenas dos dois. — Você mandava mal e então eu olhava para cara dela na parede e lembrava que this is him trying.
— Engraçadinha. — Revirou os olhos quando percebeu a brincadeira que a mulher fez com uma das músicas da cantora. — O que tem aí, Horan? — Estendeu a mão para pegar a lancheira e dar uma olhada.
Retirou um chapéu e sorriu com a lembrança. Era branco com algumas listras rosas e um logo pequeno da sorveteria onde trabalhou dos quatorze aos dezesseis. O dono do lugar era amigo de seu pai e sabia que estava pegando todos os pequenos trabalhos da vizinhança para poder juntar dinheiro para a faculdade, que não rolou, e o convidou para trabalhar no estabelecimento. era o melhor contador de moedas, segundo . Ele as contava com uma velocidade incrível e a menina nunca deixava isso passar.
Ele foi rapidamente levado para uma das tardes de trabalho.

17 de junho de 2017

atendia aos clientes sempre com um sorriso amigável no rosto. Tentava ser rápido para que não tivessem que aguardar muito enquanto o sorvete derretia. Era uma sorveteria por peso, as pessoas enchiam os potinhos com os sabores e guloseimas e pesava e cobrava no final.
Trabalhava no lugar havia poucos meses, mas já tinha até uma foto sua estampada nas paredes de tijolo como melhor funcionário do mês. Ele amava se gabar por isso.
— Seu troco, senhor. — Sorriu e estendeu a mão com algumas moedas.
— Obrigado, .
A próxima da fila era . A menina entregou o picolé que havia pegado em uma das geladeiras, sorriu e pagou por eles. Sentou-se em uma das mesas do estabelecimento e abriu o notebook, preparada para estudar.
e ela eram melhores amigos desde pequenos. Tinham uma conexão absurda desde sempre. Gostavam das mesmas coisas, falavam das mesmas coisas, faziam tudo juntos. Quem via de fora tinha certeza que os dois teriam algo, que eram alma gêmea, mas não acreditava nisso. Tinha em mente que os opostos se atraíam e Baghin era sua versão masculina. Essa era a desculpa que usava para não se declarar para a amiga.
Passou uma tarde inteira a olhando estudar pelo canto do olho, não interagindo tanto porque sabia que virava uma fera quando era tirada de seus estudos. A admirava. Admirava a inteligência, a força de vontade e a paciência para fazer diversos exercícios de exatas por dia. Admirava que mesmo tão nova, sabia o que queria e batalhava todos os dias para isso.
Sorriu quando percebeu o olhar dela nele.
— Para de me olhar, . Tá tirando minha concentração.

ATUALMENTE

colocou o chapéu na mesa, ao lado da taça, e olhou o objeto por alguns segundos. Não pensava que uma caixa deixada quando adolescente traria tantas memórias boas, tantos sentimentos bons e tanta, tanta, saudade. A vida era mais simples quando a única preocupação que tinha era ensaiar na frente do espelho como contar para , mesmo nunca tendo coragem para isso. A mulher se declarou depois de alguns meses, cansada de esperar por alguma atitude dele.
— Posso te contar um segredo? — Baghin sorriu e pegou o chapéu na mão.
— Tenho até medo. — Sorriu junto. — Conte.
— Eu ia todos os dias no seu trabalho para te ver. Depois de tanto tempo experimentando os sabores, enjoei. — Deu de ombros. — Voltei a gostar de sorvete há uns dois anos.
— Sempre tive minhas suspeitas. — Gargalhou. Estava tão feliz com aquele tipo de revelação que parecia que tinha ganhado na mega da virada. — Eu era mesmo um cara encantador. — Antes que a mulher pudesse fazer qualquer comentário ácido, a atenção da mesa foi toda desviada para Milena, que deu um gritinho.
— MEU PRIMEIRO TESTE DE GRAVIDEZ! — Gargalhou enquanto mostrava para todos o resultado negativo.
— Eu não acredito que você guardou isso, Milena. Foi um momento traumático para gente. — Horan comentou enquanto assumia uma expressão de pânico. — Nunca mais quero passar por algo assim.
e se olhavam sem entender. O que havia sido traumático para ele? Aguentar Milena desesperada?
— Como assim traumático para você, Niall?
— É… — Coçou a nuca sem graça, ficando tão vermelho quanto a toalha de mesa.
— Niall e eu transamos uma vez, pensei que tivesse grávida, fiz o teste e não estava. — Kis comentou com a maior naturalidade do mundo, ignorando os olhares surpresos dos amigos.
— VOCÊS O QUÊ?
— Eu sempre te disse que eles se gostavam, .
— Não, a gente não se gostava. Foi casual. — Milena comentou. — Aconteceram algumas vezes. Nada demais.
— Na realidade, eu gostava dela. — Horan comentou, sentindo um alívio no peito em poder dividir isso com os amigos, mesmo que anos depois. — Vocês a conhecem. Eu me declarei, ela me deu um pé na bunda e paramos de ficar. Transei com a inimiga dela e ela ficou puta.
— Foi por isso que transou com a Camilla? Eu não acredito. — Agora era que falava. — Tudo bem que ela era extremamente gostosa e o sotaque do nordeste do Brasil que ela tinha era uma delícia de ouvir, mas, PORRA! Milena e ela se odiavam.
— Eu sei, não me arrependo. — O moreno sorriu e levantou as sobrancelhas, olhando para Kis com cara de deboche.
pegou os objetos que tinha colocado na caixa e analisou um por um dos cinco. Abriu o papel e sorriu. Lembrou-se de como tinha ficado feliz quando recebeu aquele e-mail, de como chorou sem parar no teclado, ansiosa para saber a reação dos pais, dos amigos e do namorado quando contasse. Pulou no quarto sem parar enquanto berrava que tinha conseguido, porra! Tinha entrado em uma das melhores faculdades do mundo para Psicologia e não poderia estar mais feliz. A felicidade fora tanto que a menina imprimiu o e-mail e guardou na lancheira, imaginando que se sentiria do mesmo jeito que estava se sentindo dez anos depois.
Abriu um outro papel, pequeno dessa vez, e viu uma letra caprichosa e milhares de desenhos de coração. Era uma carta que fez no primeiro ano de namoro. Preferiu não ler perto de todos e guardou no bolso. Não queria que ficasse um clima estranho entre eles e achava que ler uma carta de amor em voz alta seria muito.
Foi quando abriu uma caixinha de joias que sentiu como se levasse um soco no estômago. Sabia o que tinha ali, sabia o que tinha dentro daquele pingente de coração em uma fina corrente de ouro. Sabia que se o abrisse, teria o coração destroçado. A curiosidade falava tão alto, a saudade também, mas o medo era ainda maior. Estava em um processo de luto e ter que lidar com as memórias com os pais era complicado. Era difícil até mesmo vir para a casa deles.
Também guardou o objeto no bolso e focou no que os amigos estavam olhando, tentando se distrair para não chorar.

O ronco do estômago de Milena foi tão alto que fez com que todos gargalhassem.
— Sua sorte é que fiz o jantar. — levantou do sofá e foi em direção à cozinha. — Preciso de ajuda para levar as coisas e arrumar a mesa!
— Eu te ajudo. — levantou-se em seguida e sorriu para a mulher. entregou alguns pratos e talheres, copos e toalha de mesa. ajeitou tudo rapidamente e logo se enfiou na cozinha com ela, a ajudando a tirar as comidas da panela para colocar em travessas. gostava que a mesa estivesse esteticamente bonita, mesmo que isso significasse lavar o triplo de louça depois.
Era a primeira vez que ficava sozinha com ele depois de dez anos, mesmo que em outro cômodo tivessem outras pessoas. O nervosismo era perceptível por qualquer pessoa que os olhasse. não conseguia o olhar nos olhos por muito tempo, as pernas estavam trêmulas e as mãos suadas. Não sabia o que dizer, como puxar um assunto qualquer, se deveria ficar quieta.
— O tempo tá feio hoje. — quebrou o silêncio e ela deu um meio sorriso, olhando para a janela.
— Sim, vai chover.
E isso foi tudo que falaram pelos próximos dez minutos ali. já tinha colocado toda a comida no devido lugar e terminava de preparar uma salada. estava sentado na mesa, a admirando e com o pensamento em outro lugar.
— Eu chorei. — Finalizou a frase tão baixo que a olhou sem entender o que ela havia dito e se levantou, aproximando-se de onde ela estava para tentar ouvir melhor.
— O quê?
— Eu chorei quando descobri que você estava noivo. — Murmurou e deu de ombros, como se não tivesse acabado de destruir o coração do ex-namorado em pequenos pedaços. — Descobri quando meus pais foram me visitar. Minha mãe me chamou para conversar e me contou. Basicamente, meus olhos ficaram molhados e acabaram com o skincare que eu tinha acabado de fazer.
— Não queria que tivesse se sentido dessa forma.
— Oh, não se preocupe, . — Tirou os olhos da bandeja com pernil que segurava e se atreveu a dar um meio sorriso. — Eu sabia que isso aconteceria um dia, mas pensei que eu estaria preparada pra isso.
As mãos de estavam tão suadas que não ficaria surpreso se derrubasse a travessa com arroz no chão. O peito subia e descia descompassado. mordia a língua como forma de se acalmar. Sabia que encontrar depois de tantos anos resultaria nisso: ele muito gado e revelações. Revelações essas que não tinha certeza se conseguiria lidar.
O término do namoro de três anos dos dois foi bem difícil, principalmente para ele. Ver entrando em um carro cheio de malas e partindo para novas experiências, para uma nova cidade, para novas pessoas e namorados, o magoou. chorou por dias, por semanas. Dava voltas gigantescas e desnecessárias para evitar passar em frente da casa dela. Evitou os amigos na primeira semana para não precisar ouvir como tinham falado por FaceTime com na noite anterior. Era complicado e muito, muito difícil, aceitar que ela simplesmente não o quis mais na vida dela. Não quis tentar um namoro a distância, não quis manter qualquer tipo de contato e até o bloqueou das redes sociais. Havia sido doloroso e não sabia, mesmo com seus vinte e sete anos, se tinha realmente enterrado tudo isso.
— Já que estamos fazendo pequenas confissões... — parou na porta que separava a cozinha da sala e se virou para ele com o coração apertado no peito e a boca seca. — Eu compro passagens de avião para Nova Iorque em todos os natais há dez anos, mas nunca tenho coragem de embarcar. — A mulher abriu levemente a boca em surpresa. Nunca, em todos os anos que ficaram separados, imaginaria que ele faria isso. a olhava com expectativa, esperando alguma reação. Sorriu quando viu que não teria e a tocou no ombro, perguntando se ela estava bem.
— Desculpe. — Sorriu, sem graça, quando voltou do pequeno transe. — Você sempre gostou de Nova Iorque, . Não acredito que ainda não tenha conhecido.
— Eu imaginava conhecer minha cidade preferida com a minha pessoa preferida, mas como eu não falava com a minha pessoa, a cidade perdeu o brilho. — Ela sabia que ele estava falando dela e sentiu uma pequena pontada de culpa, de arrependimento. — Não faça essa cara, . Tá tudo bem.
— Quando você resolver embarcar, me liga e você fica hospedado na minha casa. Te apresento todos os lugares que me lembram você. — O sorriso já era quase que permanente no rosto dos dois. As borboletas estavam presentes no estômago de ambos e aquele sentimento gostoso de adolescência estava ali, firme e vivo.
— Lugares que te lembram de mim? Estou curioso.
— Compre a passagem e embarque. — Deu de ombros e quis abraçá-lo. O brilho nos olhos dele era perceptível. Nem se quisesse esconder a cara de feliz, conseguiria. — Ah, tem uma condição. — Ele levantou as sobrancelhas, esperando o que ela teria para falar. Sabia que provavelmente viria alguma piadinha. — Sozinho. Não vou receber na minha casa outra noiva.
Logo a cozinha foi preenchida por uma gargalhada alta e gostosa. sentiu-se grata por saber que era a causadora daquele som. Tinha certeza, inclusive, que se um dia morresse e fosse para o céu, aquele seria o som dos anjos.
A risada de não despertou sentimento apenas em , Milena também parou a conversa que estava tendo com Niall e sentiu curiosidade em saber do que estavam falando e muita, muita felicidade, por saber que estavam se dando bem. Esse foi o maior medo que tivera desde que recebeu a ligação de e foi avisada de que iria também. Lembrava de tudo pelo que passaram e rezava para que não se matassem nos primeiros minutos ou que fizessem piadas ácidas um com o outro, como era a característica do amigo.
Pediu licença para Niall e foi até o cômodo ao lado, parando na porta e sentindo o coração aquecer quando viu a olhando com o mesmo olhar de anos.
— E aí, desistiram de jantar? — O sorriso se alargou ainda mais quando viu ambos vermelhos. Era engraçado ver Baghin sem saber como agir. — nos dá lombrownie e não dá comida para curar a larica? Você já foi melhor.
estava atrapalhada com a comida, tava tentando ajudar. — Milena revirou os olhos, desacreditada, e se desencostou do batente da porta. passou por ela rapidamente e riu.
— Ele já foi melhor com as desculpas. — Pegou o balde com salada e fez menção para que fosse na frente.
— Senti falta disso.


Quando Milena disse na cozinha que estavam com fome, ela não havia mentido. O jantar foi silencioso. Os quatro amigos focaram a atenção apenas na comida, vez ou outra quebrando o silêncio para elogiar por ser uma cozinheira excelente. Estavam agora tomando sorvete caseiro, sem açúcar e com frutas.
— Se dissessem para a de quinze anos, que comia hambúrguer todos os dias, que no futuro ela faria sorvete fitness invés de comprar qualquer um na padaria, ela surtaria. — Os amigos riram.
— Acho que o que seria ainda mais chocante para ela, é que a do futuro sabe cozinhar muito bem. — deu mais uma colherada no sorvete de frutas vermelhas. — Baghin não sabia fazer miojo.
— Ah, não, ! — Fingiu manha. — Por favor, não diga que lembra dessa história.
e eu estávamos nos pegando naquele sofá ali. — apontou para o móvel e os amigos seguiram com o olhar. — E o alarme de incêndio foi acionado.
levantou as calças correndo, pensando que tudo tava pegando fogo e que iríamos morrer. — A mulher gargalhou. Queria ter algum tipo de poder para reproduzir a cena para os amigos, eles mereciam ver os olhos verdes arregalados e o rosto pálido do ex-namorado.
— Eu pensei que apenas nós dois pegaríamos fogo aquele dia, amor. — Ele gesticulava com excitação enquanto falava. O apelido não passou despercebido por ninguém ali. — Corri para a cozinha e mal conseguia ver o que tava rolando, tava cheio de fumaça.
— Era o miojo da ?
— Era o fogão da . — olhou para a ex-namorada, gargalhando. Milena e Niall se entreolharam, trocando um olhar que apenas poderia ser interpretado pelos dois. — Não sei como chegou naquele ponto, mas ainda bem que estávamos aqui. Deu tudo certo.
— Tirando o castigo que tive por três meses. — Deu de ombros e encheu a taça com vinho.
— A dona Jane te proibiu de me ver, lembra? — A mulher assentiu, ainda rindo. — Ainda bem que o acesso ao seu quarto era fácil.
— Daria tudo para ver essa cena. — Niall comentou.
— Eu sempre soube que seu sonho era me ver pelado, Horan. — recebeu o dedo do meio como resposta.
olhava para os amigos com uma sensação nostálgica no peito. Era bom vê-los, era bom ouvi-los, era bom saber que nada havia mudado entre eles, mesmo quando tudo estava tão diferente. Era confortável estar ali. Como se tivesse voltado aos dezesseis anos em uma das dezenas de vezes em que foram passar a tarde na casa dela e aproveitaram para jantar a comida bem temperada de sua mãe. Sua mãe. Tê-los ali era como voltar para uma época em que a mãe e o pai estariam ali sentados e os enchendo de perguntas para terem com o que envergonhar a filha.
Os olhos de Baghin se encheram de lágrimas e a mulher olhou para cima rapidamente, tentando evitar que essas escorressem. Não funcionou como planejado.
— Tava demorando pra bêbada e chapada chorar. — Todos da mesa direcionaram o olhar para , que não sabia se chorava mais ou se ria com o comentário do amigo.
— Desculpa, pessoal. Tô emotiva. Senti saudades disso, mesmo.
— Chorar e fazer declaração de amor, Niall. Corrige sua frase. — Milena sorriu docemente para a amiga e a abraçou de lado. — Sentimos sua falta também.
— Eu senti só um pouquinho. — sorriu e revirou os olhos. Foi a deixa que Niall e Milena precisavam. Os amigos se entreolharam e levantaram da mesa, levando todos os pratos sujos para a pia. Cada um deles voltou da cozinha com uma desculpa diferente.
— Vocês vieram só pra comer, né? — Baghin riu e revirou os olhos. — Realmente, certas coisas nunca mudam.
— Amiga, ainda tenho que ler um artigo importante.
— E eu preciso encontrar alguém. — Deu de ombros, enquanto se aproximava da amiga para se despedir com um beijo no topo da cabeça. — Por favor, não desapareça mais.
— Me visitem em Nova Iorque.
— Pensaremos no seu caso. — Milena a abraçou apertado por alguns segundos. — Amamos você.
— Amo vocês.

respirou fundo assim que fechou a porta e viu os dois melhores amigos andando pela calçada, até desaparecerem no horizonte. Mordeu o lábio, nervosa, e voltou à sala de jantar para ver . Ficou parada algum tempo em silêncio até ele perceber sua presença e bloquear o celular, voltando toda atenção para ela.
— Você sabe que eles fizeram isso de propósito para gente ficar sozinho, né? — Ele riu e se levantou, espreguiçando-se.
— Você sabe que quando demos nosso primeiro beijo fizeram isso também, né?
— Eu tinha minhas suspeitas. — Sorriram em cumplicidade, como nos velhos tempos. — O que faremos agora?
— Truco?
— Não tem graça. — Fez careta. — Ludo?
— Você sempre ganhou.
— Ludo alcoólico? — Ela sorriu, esperançosa, e não conseguiu dizer não. Balançou a cabeça positivamente e pegou os dois copos pequenos de shot em um dos armários. — Vai ter que ser com vinho.
— Vinho dá calor. Ludo alcoólico com striptease? — o mostrou o dedo do meio enquanto ria. Não se sentia desrespeitada com esse tipo de brincadeira. Era como se... Eles ainda estivessem juntos.
pegou uma das garrafas do pai e os serviu. mordeu o lábio inferior, receoso.
, seu pai não vai ficar bravo que vamos acabar com a garrafa dele? — A mulher o olhou com o coração aquecido e sorriu delicadamente. Nada mudaria entre eles, nunca.
— Eu espero que não, . — teve a certeza que a caixa não era a única coisa que havia sido desenterrada.



Fim!



Nota da autora: Sem nota.

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Nota da beta: Olha, confesso que meu olho marejou junto com o dela e no final também! Eu amo histórias que os casais não deram certo, se reencontram e tudo está igual. Estou muito feliz com essa fofura toda entre amigos, é a coisa mais linda! Eu amei demais! 💙

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