Capítulo Único
Eu abro a porta sentindo a quentura do café que carrego na mão contrastar com o frio que faz em Londres naquela manhã. Bato os pés na soleira da porta antes de entrar para que minhas botas não sujem o interior da casa de neve. Lá dentro está tudo igual há uma semana, mas nada me parece familiar. O aquecedor não está ligado, então eu não posso tirar minha touca e colocar na bancada da cozinha, como eu sempre fazia. As luzes estão apagadas, o silencio faz meus ouvidos zumbirem. E o mais importante, não tem alguém na cozinha que logo virá me receber com seus abraços de urso e seus risos contagiantes. Eu solto um longo suspiro, sentindo algo dentro de mim se apertar. Ligo o aquecedor e acendo as luzes, tentando deixar as coisas um pouquinho mais acolhedoras.
Subo as escadas em silêncio e entro no primeiro quarto do corredor. Lá dentro está tão frio quanto o restante da casa e as cortinas fechadas deixam o dia parecer noite. Demoram alguns segundos até que meus olhos se acostumem com a escuridão e foquem na pessoa que está na cama. Vejo enrolada nos cobertores, imóvel. O único sinal de que ela está viva é o seu leve respirar. Dou um passo à frente, incerto. Tudo o que eu mais quero é me enfiar ao seu lado debaixo daqueles cobertores e abraçá-la até tudo estar bem de novo. Mas tenho medo de ser repelido mais uma vez. Ensaio chegar perto, mas travo antes de dar um passo a frente. O café, que antes aquecia a minha luva agora está queimando a minha mão. Tenho que largar o copo ou vou me machucar.
Solto um longo suspiro, chamando a atenção da garota por baixo dos cobertores. Ela olha pra mim e logo foca no copo que eu trago em mãos. Me aproximo e estendo o café pra ela, que o pega sem dizer uma palavra. Seus olhos estão inchados pelo choro e há grandes olheiras debaixo de seus olhos. Vê-la assim me destrói.
- Vim ver como você está. – ouço minha voz dizer.
- Não quero conversar, . Você pode me deixar sozinha? – ela me responde baixinho.
Balanço a cabeça em discordância.
- Já faz uma semana que você me pede isso. Não está funcionando, . Não posso mais te deixar sozinha.
Ela não fala nada. Continua bebericando seu café como se eu não estivesse mais ali.
- Eu fiquei sabendo que a sua guarda vai ficar com a sua tia. Porque você ainda não foi morar com ela?
Ela dá de ombros.
- A tia Margô está curtindo as férias no Nepal. E não vai largar a viagem só porque a sobrinha perdeu a mãe.
A naturalidade com que ela diz isso me assusta. Eu sempre soube que Margô não se dava bem com a mãe de desde que esta se divorciou de Josh. Mas achei que ela poderia apoiar a filha do irmão quando esta precisasse.
- Não tem problema. Eu vou iniciar o processo de emancipação assim que a minha tia voltar pra Londres. Não quero depender daquela mulher pra nada. – continua.
- Entendo. Estou aqui se você precisar.
O silencio recai sobre o quarto de novo. já terminou o seu café e está pronta para se cobrir novamente e voltar a fingir que o mundo não existe.
- Você sabe que dia é amanhã, não sabe?
- Sei, mas não me importo. Eu não vou mais.
- Como não? Você e sua mãe têm treinado praticamente todos os dias há um ano! É o seu sonho, !
- Isso mesmo, ! Eu e minha mãe! Eu não quero realizar esse sonho se ela não estiver aqui pra me ver. – seus olhos se enchem de lágrimas – Estávamos tão empenhadas.
- Sua mãe não ia querer que você desistisse logo agora. Faça isso por ela.
- Não dá. Eu não vou conseguir cantar. É só pensar nela e minha voz embarga.
- É claro que vai ! Você é forte demais pra desistir agora. Já tentou cantar depois que ela se foi? - balançou a cabeça, seus olhos já transbordando em lágrimas – Certo, vamos tentar.
Me aproximo dela, jogando seu edredom longe.
- Vem, levanta daí e vai tomar um banho agora. Eu quero você lá no jardim em vinte minutos. - falei já puxando ela da cama.
- Mas ‘ta nevando!
- Não ‘ta nevando , nevou hoje mais cedo. É diferente!
rola os olhos, mas entra no banheiro. Ela sempre odiou o inverno e principalmente os dias de neve. Em outros dias, ela teria insistido mais em não ir lá pra fora porque preferia o quentinho perto da lareira. No entanto, ela estava tão mal que nem conseguia rebater minhas ordens.
Deixo de pensar nisso, tentando arrumar um jeito de fazê-la feliz de novo. A caixinha no bolso do meu casaco me faz pensar se aquilo era uma boa opção, mas concluo que não. Não com o acidente de Marie estando tão recente. Na verdade, eu não sabia se conseguiria fazer o pedido nunca mais, pois agora eu não teria mais os seus incentivos.
Suspirei, indo até as cortinas que ainda permaneciam fechadas e abrindo-as. Encaro o jardim lá embaixo, que está cheio de poças de água e o balanço em que costumávamos sentar coberto de neve. Meus olhos também ficam molhados e por um segundo eu penso em fugir dali e deixar as lembranças pra trás. Marie também era uma mãe pra mim. Mas precisa de alguém para lhe dar força. Eu respiro fundo, querendo ser essa força.
Ficar ali não seria bom para a minha estrelinha, e eu sabia bem que ela não gostaria de ir até a minha casa receber os olhares de pena que meu pai com certeza direcionaria a ela. Ouço o chuveiro desligar, ainda pensando onde poderíamos ir. Pelo canto do olho, vejo a porta do banheiro ser aberta e passar por lá, indo direto para o seu closet e fechando a porta atrás de si.
Um minuto depois ela já está de volta, vestida com o seu melhor pijama e suas botas de neve. Seus olhos ainda têm uma aparência inchada e seu nariz continua vermelho de choro. Seus cabelos, agora molhados pelo banho, pingam nos seus ombros.
- Pijamas , sério?
- O que? Só vamos ficar no jardim!
Sorrio pequeno, pensando que o banho tinha feito ao menos um pouquinho de efeito, já que agora ela voltava a argumentar contra mim.
- Mudei de ideia. Não vamos mais ficar no jardim. Vamos sair e esquecer um pouquinho as coisas ruins.
- Nem pensar, . Eu não vou secar o meu cabelo só porque você resolveu sair. Não estou com vontade.
- Eu posso secar pra você.
Ela me olha com os olhos serrados, como se desconfiasse da veracidade das minhas palavras. Eu quase solto uma gargalhada, mas ficamos em silêncio por vários segundos. ainda me avaliando.
- Qual é, ? A gente se conhece há doze anos e você nunca secou o meu cabelo quando eu pedi. Agora está se oferecendo? Fácil assim? Você sempre diz que isso é a maior chatice!
- Posso fazer isso se for te deixar feliz.
Vejo um sorriso brotar no rosto de e percebo que por ela, valia o esforço. Eu odiava o barulho do secador, o ar terrivelmente quente que saía dele e que me queimava as mãos e, principalmente, odiava ter que segurar aquela coisa no alto por tanto tempo. Mas se isso arrancasse um sorriso depois de duas semanas de choro, eu estava feliz também.
- Senta aqui, estrelinha. - dou duas batidinhas no banco da sua penteadeira. Onde ela prontamente se senta, abrindo uma das gavetas e me entregando o secador.
Prontamente, começo a secar seu cabelo. Sentindo o cheiro de morango do seu xampu preencher o quarto. Pelo espelho, posso ver fechar os olhos, aproveitando o carinho. Serena como eu nunca a havia visto. Continuamos assim, em silencio, aproveitando a companhia um do outro. A calmaria continua quando desligo o secador. Fitando seus traços pelo espelho. Céus, eu estava tão apaixonado! E, antes de tudo acontecer, sentia que era correspondido em cada gesto dela. A caixinha pesa no meu bolso novamente, e eu contenho o impulso de me ajoelhar ali e pedi-la em namoro naquele momento, eu sabia que não daria certo. Conhecia aquela garota bem demais pra saber que seria repelido naquele momento.
me puxa dos meus pensamentos quando se levanta da penteadeira, seguindo para o closet mais uma vez.
- Aonde vamos?
- Eu estava pensando em irmos naquelas barraquinhas de Natal que têm todos os anos perto da London Bridge. O que você acha?
- Pensei que iríamos ficar sozinhos. – ela falou, já saindo do closet. Agora vestida com roupas de frio.
- Bom, eu sei que você não gosta do frio e não consegui pensar em um lugar quente o suficiente em que possamos ficar sozinhos.
- Podemos ficar aqui. - ela deu de ombros - Ligamos a lareira e fazemos chocolate quente. Você pode correr em casa e pegar o seu violão.
- Seria bom. Mas têm certeza que aguentaria ficar lá embaixo sem sentir a falta dela? Eu sei que está sendo difícil pra você.
Ela desvia o olhar, mordendo a parte interna da bochecha e fazendo um movimento leve com a cabeça, indicando que sim, eu estava certo.
- Podemos ir então.
E vamos. Pegamos o metrô e paramos perto do centro. se mantendo calada durante o trajeto. Continua assim durante o caminho que fazemos a pé até chegarmos às ditas barraquinhas. Apesar do frio, há muitas pessoas por lá e a noite teria ainda mais. Andamos por entre as pessoas, sentindo o cheiro de comida e apreciando os bibelôs que eram vendidos. Em algum momento, chegamos a uma barraca que vende vinho e fica tentada a experimentar um pouco, mas não temos idade pra beber, o que deixa chateada, dizendo que sua mãe não se importaria de comprar uma taça para provarmos.
Resolvo tirar ela de lá quando começo a ver lágrimas se formarem em seu rosto, enquanto a atendente nos olha sem realmente entender o que está errado. Nós paramos em uma padaria muito bonitinha e confortável e, enquanto se entope de brownies e bebe chocolate quente, eu começo a me questionar se tinha mesmo sido uma boa ideia tirá-la de casa. Eu encaro seu nariz vermelho, que eu já não sabia se era por conta do frio ou pelo choro, me sentido frustrado. Eu não estava ajudando em nada.
Decidimos ir embora quando termina seu lanche, mas no caminho passamos por uma loja de discos que insiste em entrar. Eu não quero isso, pois sabia que sua mãe adorava LP's e que aquilo desencadearia mais lembranças nela. Mas acabo me deixando vencer por sua insistência e entramos.
- Eu tenho que me livrar das coisas dela. – ela diz enquanto caminha por entre os corredores. Não olhando para nada em especial.
- Você não tem que fazer isso agora.
- Eu sei, mas acho que vou arrumar tudo na semana que vem. Você sabe, pra doar. Mas não vou doar os discos dela, de jeito nenhum. Nem aquela vitrola velha que fica no canto da sala.
- Você sempre odiou aquela vitrola, .
- Agora sinto que é um pedacinho dela. Não posso me desfazer de algo que ela gostava tanto, - ela diz isso tudo chorando e, num instante, abandona o disco que segurava e uma das estantes e corre para fora da loja.
- Eu tô sozinha, ! - seu choro agora é alto, de soluçar. - Meu pai sumiu, minha mãe morreu, e a minha tia me odeia! Eu não vou conseguir sobreviver sem ninguém.
- ‘Tá tudo bem , você não ‘tá sozinha! Eu ‘tô aqui com você. Assim como eu estive nos últimos doze anos eu vou estar sempre. Você não vai me perder. - eu a aperto em meus braços. Nesse momento as lágrimas também caem dos meus olhos.
- A mi-minha mãezinha ! Eu a perdi! Ela se foi e eu nem estava esperando p-por isso. 'Tava tu-tudo bem antes dela sofrer aquele acidente!
- Eu sei . Ninguém espera por isso. E eu sei que é difícil, porque a tia Marie era como uma mãe pra mim também. Eu sei exatamente o que você 'tá sentindo, . Porque ela é a segunda mãe que eu perco.
Ela de desvencilha de mim e foca o olhar no meu rosto. Sua mão se ergue para limpar a lágrima que deixei cair.
- Me des-desculpa . Por ter te mantido longe durante essas semanas. - ela me puxa pra mais perto. - Eu foquei tanto na minha perda que es-esqueci que você também tinha perdido alguém.
- 'Tá tudo bem, estrelinha. Só não faz isso de novo, ‘tá? - eu a afasto, limpando as lágrimas que deslizam pelo seu rosto. - Eu pensei que tinha te perdido também.
- É que dói demais.
- Um dia não vai doer tanto assim lembrar dela, eu prometo.
Ela balança a cabeça em concordância e não diz mais nada.
Voltamos pra casa e acabamos por colocar o plano inicial em prática. Eu corro em casa e pego meu violão. Quando volto a lareira já está acesa e me aguarda sentada em frente a ela. Passamos a tarde naquela bolha que criamos. No início, é difícil para conseguir cantar, mas depois de um tempo tudo se torna fácil como era antes.
Deixo meu violão de lado quando decide que já é hora de cantar a música que ela e a mãe tinham escolhido para a sua audição do X-Factor, que seria no dia seguinte. Ela liga o karaokê e pega o microfone, enquanto eu a observo do chão. De novo, o começo é difícil, mas a voz dela sempre foi incrível e ela havia cantado aquela música em particular centenas de vezes que logo tudo se ajeitou.
Eu me pego a admirando, enquanto me lembro de quando decidiu que queria ser cantora. Devíamos ter seis anos, mas já naquela época esbanjava simpatia e bom humor, além de se comportar como se estivesse num palco real quando a pediam para cantar. Por isso, com ela dizendo a todos que queria ser uma estrela do pop, ela se tornou a minha estrelinha.
Quando nos cansamos, decidimos pedir pizza e logo nos acomodamos em um amontoado de travesseiros e cobertores que havia trazido para a sala.
- Você vai ser incrível amanhã.
- Obrigada . Mas não precisa ir comigo.
- Sei que não precisa, mas eu quero.
Ela rola os olhos pra mim, escondendo um sorriso com uma mordida em sua pizza.
- Vai ser chato e demorar bastante. Tá tudo bem, você pode ir comigo quando eu passar nas audições e estiver oficialmente concorrendo.
- Para com isso , vai ser bom pra você ter uma companhia lá. A gente vai esperar junto, 'tá? Podemos começar a ver aquela série que estreou na Netflix! Aposto que vai dar pra ver uma temporada inteira.
- Okay, . Mas eu te proíbo de dormir na fila. Entendido?
- Sim, senhora! Eu passo aqui amanhã pra te pegar?
- Hm, na verdade. Acho que você podia dormir aqui hoje. O que você acha?
Sorrio, sentindo que os muros que tinha construindo em volta de si após a morte da mãe estavam finalmente sendo derrubados.
***
Era muito cedo quando acordamos pra ir a arena onde aconteceria a primeira fase das audições. O sol nem dava as caras quando chegamos lá, mas já havia tantas pessoas sentadas nas arquibancadas que senti meu corpo desanimar. Íamos ficar bastante tempo ali. me puxou em direção a uma mesa com algumas moças sentadas. Falou o seu nome e em troca a nova lhe deu um número que devia ser colocado em seu pescoço. 458. Ela agradeceu e fomos nós sentar.
- Então, quais são as chances de a gente sair daqui antes que o Natal chegue?
soltou uma gargalhada.
- Não seja bobo, . O tempo de espera é de no máximo 18 horas. Nós vamos sobreviver.
- Isso é sério? Nós vamos mesmo ter que ficar aqui até a minha bunda ficar quadrada?
- Foi você quem quis vir comigo. – ela deu de ombros.
O dia não tarda a raiar. e eu nos aconchegamos um no outro e colocamos os fones de ouvido. Acompanho sonolento as arquibancadas se enchendo e rodas de conversas se iniciando aqui e ali. Às dez em ponto anunciaram que as audições irão começar e vinte minutos depois chamam cerca de cinquenta pessoas pra dentro.
“Legal! Se eles chamarem cinquenta pessoas por vez isso aqui nem vai demorar tanto assim pra acabar.” – Eu penso.
Nunca estive tão enganado na minha vida. Depois daquilo, mais duas horas se arrastaram até que eles chamassem mais cinquenta. Durante esse tempo, me faz sair pra buscar café, água e até um almoço para ela. Depois mudamos de lugar, pois o sol começa a bater em nós e, enfim, começamos a ver a série que tanto queria. Quando mais cinquenta são chamadas, nos juntamos a uma roda de pessoas que cantam ali perto de nós.
Passamos a cantar de tudo, de Madonna a Bob Marley, de Elton John a Taylor Swift. Até arriscamos o espanhol com uma das músicas da Shakira, o que rende muitas risadas. Aquele foi o tempo mais feliz que passamos em duas semanas de tristeza. Acabamos deixando o violão de lado e passamos a conversar, cada um contando um pouquinho de si.
Eu assisto os olhos de se encherem de lágrimas ao contar sobre a paixão de sua mãe por ABBA e até cantamos sua música preferida em homenagem. Lamentamos quando, aos poucos, o grupo vai diminuindo de acordo com que mais pessoas eram chamadas.
Até que por fim, chamam o grupo em que está inclusa. Antes mesmo de nos levantarmos, já sinto ficar nervosa ao meu lado. Me ergo e a puxo pela mão, acenando para o pessoal e ouvindo um coro de boa sorte antes de tomar distancia.
Caminhamos em silêncio até o outro lado da arena e fomos guiados por um corredor até uma sala com mais cadeiras. Viva! se senta num cantinho afastado, fixando seu olhar na parede. Eu a sigo e me sento ao seu lado, fazendo um carinho em seu cabelo, numa tentativa frustrada de deixá-la mais calma.
- Estou com medo, .
- Nós já falamos sobre isso, não é? Vai ficar tudo bem! Você vai entrar lá e eles vão te amar.
- E se eu travar e não conseguir cantar? E se eu começar a chorar? E se eu vomitar? Aí meu Deus eles vão me odiar!
- Para de surtar, . Nada disso vai acontecer. Só tenta não pensar em nada, tá?
Ela me olha com os olhos arregalados, balançando a cabeça em concordância e voltando a ficar em silêncio. Eu solto um suspiro, ainda sentindo seu corpo tenso ao meu lado, e vejo calado as pessoas entrarem por uma porta e dali não saírem mais. Quando finalmente chamaram , nós levantamos e entramos em silêncio.
- Qual o seu nome?
- .
- Certo, olhe pra aquela câmera ali é diga seu nome, idade e o motivo de você estar aqui. Depois disso espere o seu nome ser chamado e pare em cima do X vermelho, tudo bem? Só fale quando os jurados falarem com você e saia pela esquerda quando eles te dispensarem.
concorda, respirando fundo. Para em frente a câmera que a moça havia indicado e começa a falar.
- Meu nome é , eu tenho 17 anos e nasci em Oxford, Inglaterra. Desde pequena meu sonho era cantar. Eu costumava me inspirar muito na Britney Spears e nas Spices, além de adorar fazer performances para a minha família quando era criança.
- Perfeito.
volta para o meu lado, me olhando apreensiva. Eu também estou nervoso por ela. Tão nervoso que acabo fazendo algo que não devia. Um impulso bobo.
- Me deseje sorte!
Eu a beijo.
Quer dizer, não é bem um beijo. É mais um selinho demorado, pois não me dá espaço para aprofundá-lo. Quando nos separamos, forço um sorriso e desejo boa sorte. Só aí percebendo a idiotice que eu havia feito.
só me dá as costas e entra no palco. Ela canta sem desviar o olhar dos jurados e quando recebe as respostas positivas que indicam que sim, ela está na próxima fase, sai correndo sem sequer olhar em minha direção.
Quando eu enfim chego ao estacionamento, não há sinal do carro dela.
***
Outro dia e lá estou eu. Com o mesmo copo de café nas mãos, aguardava pacientemente abrir a porta para mim, porque, bem, ela estava com raiva e ficaria ainda mais brava se eu entrasse sem tocar a campanhia.
Ela abre a porta com uma cara de poucos amigos, mas aceita o café que eu a ofereço sem dizer nada. Eu ensaio entrar na casa, mas ela me barra antes que eu possa dar mais um passo a frente.
- O que você pensou que estava fazendo ontem?
- Bom, eu, é... Pensei que você sentisse algo por mim, sabe, além da amizade. Achei que você estava me dando sinais antes da sua mãe... Antes de tudo.
- , você é o meu melhor amigo! – me senti murchar – Eu confesso que por algum tempo comecei a te ver de um modo diferente. Mas isso foi antes! Minha mãe te adorava, ela queria que ficássemos juntos. Agora eu não sei se o que eu senti foi porque eu estava sendo pressionada ou se realmente sinto algo por você, sim? Estou muito confusa.
Concordo sem saber muito bem o que dizer, mas ela continua.
- Isso não justifica o que você fez. Eu estava vulnerável e incrivelmente nervosa, sentindo muita falta da minha mãe e pensando que não era pra eu estar lá sem ela. Você só me deixou mais nervosa ainda!
- Me desculpa ! Eu juro que não era isso que eu queria. Eu só... Agi por impulso.
- Tudo bem, . Eu te desculpo.
- Então, eu posso entrar agora?
- Na verdade eu gostaria muito de ficar sozinha.
- De novo esse papo, ?
- Não! Dessa vez é diferente. Eu to bem, eu juro. Não é pela minha mãe.
- O que houve?
- A produção do programa me ligou. Eu preciso da autorização de um responsável pra continuar no programa. Eu até tentei ligar pra tia Margô, mas ela não quis me dar. Então mesmo se eu iniciasse o processo de emancipação agora mesmo, não daria tempo concorrer no programa no mês que vem. Já era.
- Tem algo que eu possa fazer por você?
- Eu preciso mesmo ficar sozinha, . Nos vemos amanhã?
- Tudo bem, até amanhã .
- Tchau. Obrigada pelo café.
Dou as costas a ela já pensando em uma maneira de ajudar participar da competição. Eu não cederia assim tão fácil e sei que, em outros tempos, ela também não, mas desde a morte de Marie as coisas tinham ficado um pouco diferentes.
***
- Você não tem que resolver o problema das pessoas sempre, . – meu pai me repreende.
- Mas é pela !
- Você não tem que resolver os problemas da também. Qual é! Desde que você fez 14 anos está rastejando por essa menina e todo mundo vê. Tem que ser macho, meu filho! Eu gosto muito daquela garota, mas ela é quem deveria rastejar por você.
Reviro os olhos, irritado.
- Vai ajudar ou não? A tia Marie queria muito que a conseguisse ao menos participar do programa. E você devia muito pra ela! Lembra-se do quanto ela nos ajudou desde que a mamãe morreu?
- E como eu poderia fazer isso, ? Ela mesmo já falou com a Margô e não conseguiu.
- Você poderia ligar pra aquele seu amigo que é advogado e dizer pra ele pedir gentilmente pra ela assinar o documento da , que tal? Eu sei que ele pode conseguir. A Margô sempre ajudou o John a falsificar dinheiro e morre de medo de ir pra cadeia.
- Certo. Ligue pra e peça o telefone da tia dela. Vou ver o que eu posso fazer.
- Isso! Obrigada pai. Vou falar com ela agora mesmo.
Feliz, eu pego o celular e digito uma mensagem.
“Ei! Adivinha quem é o melhor amigo do mundo e vai conseguir a assinatura da sua tia naquela autorização? Meu pai vai falar com um amigo e precisa do número dela – xx”
Cinco segundos depois, meu telefone recebe uma nova ligação.
- , você é incrível! Não acredito que você vai conseguir isso! Já fez tanto por mim que eu nem saberia retribuir.
- Que tal me dando uns beijinhos hein?
- ...
- Brincadeira! Mas olha só, já tem que começar a pensar na musica que vai cantar na sua grande estréia na tevê.
- Estava pensando em cantar a nossa música, que tal? Ela significa muito pra mim e seria um jeito de te agradecer por tudo o que você anda fazendo por mim.
- Depende, só se eu puder cantar com você e fazer a nossa coreografia. E se estivermos vestidos de Troy e Gabriela.
Ela solta uma gargalhada.
- Os jurados chamariam a segurança pra te tirar do palco. A mamãe te elogiava, mas você canta muito mal, ! Ela fazia isso pra não te magoar. Além disso, estamos mais pra Sharpay e Ryan.
- Ouch! Essa doeu.
- Não tem problema, eu te amo assim mesmo.
- Eu também te amo, .
- Acho que já vou dormir. Boa noite !
- Boa noite, estrelinha.
***
A fase do Bootcamp não demora a chegar, mas acaba sendo bem mais tranquila que as audições. Das cem pessoas que conseguiram chegar até ali, apenas vinte realmente teriam um espaço no programa. passa dessa sem muita dificuldade e, uma semana depois, a noite para a escolha da Casa dos Jurados finalmente chega.
aguarda apreensiva ao meu lado, pois sempre quis que seu mentor fosse Simon Cowell e tinha medo de não ser escolhida por ele. No telão, rodam imagens da audição de , de um tempo atrás. Onde aparecemos na sua audição e imagens de nós dois na há uma semana, no Bootcamp. Simon até pergunta se o rapaz ao lado dela é o seu namorado. Mas é respondido por uma risonha que não, era apenas o seu melhor amigo. Completado com um “ih, mais um na friendzone” de outro jurado, o que me deixou bem constrangido.
Simon não pensa duas vezes antes de escolher como aprendiz, exaltando sua presença de palco e carisma. Após todos os concorrentes se apresentarem, o comentarista anuncia que a primeira apresentação ao vivo seria em duplas daquela vez. Duplas estas escolhidas pelos jurados com base no que haviam visto naquela noite. E, para minha decepção, a dupla de seria Matt, um cara que não parou de lançar olhares para ela a noite toda.
Após aquela noite Matt não sai do pé de pelas próximas duas semanas. Os dois passam muito tempo juntos por causa daquele maldito dueto. Claro que na maioria das vezes eles estão na presença de Simon e de muitas câmeras. Mas isso não impede Matt de lançar sorrisinhos e piadinhas, além de sempre ficar perto demais da garota que deveria ser minha.
Quando a noite da apresentação chega, eu sequer posso ficar perto de , pois Matt e ela estão ouvindo as ultimas instruções de seu mentor, depois de repassar a musica uma última vez, eles ainda vão para a maquiagem. Juntos. Estou com tantos ciúmes que sequer posso curtir a apresentação direito, e fico mais bravo ainda quando ele a abraça e a joga nas costas ao fim da apresentação, correndo pra fora do palco em uma cena que seria cômica se não fossem as mãos dele perto demais da bunda dela.
- Então, . O que achou? – bela anda até mim assim que Matt a coloca no chão.
- Você foi incrível, . Mas não gostei nada desse cara. Ainda bem que essa apresentação finalmente passou e vocês não precisam ficar mais juntos. O que foi aquilo de ele te agarrar no fim da apresentação?
- Você está com ciúmes do Matt!
- Sei que você disse que precisava de tempo pra saber o que sente por mim. Mas é inevitável não sentir ciúmes dessa intimidade que vocês criaram em tão pouco tempo. Me desculpa, .
- Aí , você é muito fofo. Não precisa pedir desculpas pelo que você sente. E eu admito que não esperava por aquilo e fiquei até desconfortável em ter a minha bunda pra cima na tevê, mas eu não podia dar vexame.
Balanço a cabeça, entendendo o que ela diz.
- E , além disso, eu não preciso de mais tempo. Não preciso mais pensar no que vai ser de nós dois.
- E isso quer dizer que...? – eu pergunto ansioso, sem perceber meu coração acelera.
- Quer dizer que você pode me beijar agora – ela está sorrindo.
E é isso que eu faço. Beijo-a como se não tivéssemos platéia. Penso que aquele é o momento certo de ajoelhar-me e a pedir em namoro. Mas Matt nos interrompe sugerindo uma social pra comemorar a noite de estréia. Eu quero ser grosso e dispensá-lo, mas é quem aceita o convite com empolgação.
***
Os dias que vêm a seguir são os mais doces possíveis. finalmente deixara o luto de lado, e sua dedicação à competição a deixava muito ocupada, mas todo o tempo que lhe restava era dedicado a nós. Às vezes saíamos para comemorar num barzinho com alguns dos participantes que havia conhecido no programa, em outras, quando ela estava cansada demais, optávamos por ficar em casa assistindo a algum filme na Netflix.
Eu comemoro cada vitoria ao seu lado, e também posso contemplar a alegria em seus olhos quando minha carta de aceitação para Oxford finalmente chega. Naquele momento, onde o futuro de ainda é uma incógnita, eu prefiro não pensar no que o destino reserva para nós dois. Mas, durante a noite de semifinal, num momento egoísta, chego a desejar que não ganhe o programa, pois isso a levaria pra longe de mim. Acontece rápido e como um flash já tinha ido embora, deixando um amargo em minha boca. Eu desejava demais que ela conseguisse realizar aquele sonho para torcer contra.
Quando enfim a noite da final chega, eu posso perceber o quanto havia mudado no decorrer do programa. Eu não via ali nenhum traço da menina em sua primeira audição. Ela estava elétrica e ansiosa, mas seu sorriso não saía do rosto.
Aguentar aquela noite não foi fácil. O programa se arrastou por muito tempo até que parassem de enrolar e enfim anunciassem o vencedor. A platéia explodiu em aplausos quando o nome de foi dito pelo apresentador. E, ao meu lado, acaba com sua garganta ao exteriorizar sua alegria. Eu também grito, muito. Nos abraçamos forte antes de me beijar e enfim subir ao palco para receber suas congratulações.
Feliz demais, não consegui acreditar no quão bom é se sentir feliz pelas conquistas de quem você ama. Demora até que pudéssemos abandonar o set, mas quando o fizemos, decidimos que ainda não é a hora da noite acabar e vamos até uma boate no Soho. Não tínhamos idade pra beber, mas nem precisava, estávamos tão alegres que nem sentimos falta do álcool. Dançamos muito naquela noite. Minhas bochechas doeram tamanho o meu sorriso e os beijos que troquei com foram tão quentes como nunca.
- Obrigada ! Eu não teria conseguido se não fosse por você – ela diz no meu ouvido quando paramos de dançar e sentamos num canto para recuperar as energias.
- Que nada . Tudo foi mérito seu.
- Você sempre me apoiou e me incentivou nesse sonho.
- Você nasceu pra brilhar, estrelinha. Você teria conseguido com ou sem mim.
- Eu te amo, .
- Eu te amo, .
***
- Promete me ligar todos os dias? – ela me diz
- Acho eu você é quem tem que me prometer isso, estrelinha. Tem certeza que vai ter tempo pra mim agora que vai ser uma superestrela?
- Claro que sim, ! Vamos nos falar sempre, ‘tá? Eu vou te ver em Oxford sempre que der! E quando você se formar podemos encontrar um jeito de ficarmos perto.
- Tudo bem, . Agora corre ou você vai perder o seu voo.
Ela arrasta a mala até o portão de embarque, me dando um último aceno antes de sumir de vista. Eu assisto calado o avião levando para longe de mim, sentindo que estava perdendo o amor da minha vida.
Eu tiro a caixinha que sempre carrego no bolso e a abro, revelando as duas alianças ali dentro. E, olhando para o vazio do céu. Sussurro as seis palavras que não deviam estar entaladas há tanto tempo dentro de mim.
- Você quer ser a minha namorada?
Mas ela não está ali pra me responder.
Subo as escadas em silêncio e entro no primeiro quarto do corredor. Lá dentro está tão frio quanto o restante da casa e as cortinas fechadas deixam o dia parecer noite. Demoram alguns segundos até que meus olhos se acostumem com a escuridão e foquem na pessoa que está na cama. Vejo enrolada nos cobertores, imóvel. O único sinal de que ela está viva é o seu leve respirar. Dou um passo à frente, incerto. Tudo o que eu mais quero é me enfiar ao seu lado debaixo daqueles cobertores e abraçá-la até tudo estar bem de novo. Mas tenho medo de ser repelido mais uma vez. Ensaio chegar perto, mas travo antes de dar um passo a frente. O café, que antes aquecia a minha luva agora está queimando a minha mão. Tenho que largar o copo ou vou me machucar.
Solto um longo suspiro, chamando a atenção da garota por baixo dos cobertores. Ela olha pra mim e logo foca no copo que eu trago em mãos. Me aproximo e estendo o café pra ela, que o pega sem dizer uma palavra. Seus olhos estão inchados pelo choro e há grandes olheiras debaixo de seus olhos. Vê-la assim me destrói.
- Vim ver como você está. – ouço minha voz dizer.
- Não quero conversar, . Você pode me deixar sozinha? – ela me responde baixinho.
Balanço a cabeça em discordância.
- Já faz uma semana que você me pede isso. Não está funcionando, . Não posso mais te deixar sozinha.
Ela não fala nada. Continua bebericando seu café como se eu não estivesse mais ali.
- Eu fiquei sabendo que a sua guarda vai ficar com a sua tia. Porque você ainda não foi morar com ela?
Ela dá de ombros.
- A tia Margô está curtindo as férias no Nepal. E não vai largar a viagem só porque a sobrinha perdeu a mãe.
A naturalidade com que ela diz isso me assusta. Eu sempre soube que Margô não se dava bem com a mãe de desde que esta se divorciou de Josh. Mas achei que ela poderia apoiar a filha do irmão quando esta precisasse.
- Não tem problema. Eu vou iniciar o processo de emancipação assim que a minha tia voltar pra Londres. Não quero depender daquela mulher pra nada. – continua.
- Entendo. Estou aqui se você precisar.
O silencio recai sobre o quarto de novo. já terminou o seu café e está pronta para se cobrir novamente e voltar a fingir que o mundo não existe.
- Você sabe que dia é amanhã, não sabe?
- Sei, mas não me importo. Eu não vou mais.
- Como não? Você e sua mãe têm treinado praticamente todos os dias há um ano! É o seu sonho, !
- Isso mesmo, ! Eu e minha mãe! Eu não quero realizar esse sonho se ela não estiver aqui pra me ver. – seus olhos se enchem de lágrimas – Estávamos tão empenhadas.
- Sua mãe não ia querer que você desistisse logo agora. Faça isso por ela.
- Não dá. Eu não vou conseguir cantar. É só pensar nela e minha voz embarga.
- É claro que vai ! Você é forte demais pra desistir agora. Já tentou cantar depois que ela se foi? - balançou a cabeça, seus olhos já transbordando em lágrimas – Certo, vamos tentar.
Me aproximo dela, jogando seu edredom longe.
- Vem, levanta daí e vai tomar um banho agora. Eu quero você lá no jardim em vinte minutos. - falei já puxando ela da cama.
- Mas ‘ta nevando!
- Não ‘ta nevando , nevou hoje mais cedo. É diferente!
rola os olhos, mas entra no banheiro. Ela sempre odiou o inverno e principalmente os dias de neve. Em outros dias, ela teria insistido mais em não ir lá pra fora porque preferia o quentinho perto da lareira. No entanto, ela estava tão mal que nem conseguia rebater minhas ordens.
Deixo de pensar nisso, tentando arrumar um jeito de fazê-la feliz de novo. A caixinha no bolso do meu casaco me faz pensar se aquilo era uma boa opção, mas concluo que não. Não com o acidente de Marie estando tão recente. Na verdade, eu não sabia se conseguiria fazer o pedido nunca mais, pois agora eu não teria mais os seus incentivos.
Suspirei, indo até as cortinas que ainda permaneciam fechadas e abrindo-as. Encaro o jardim lá embaixo, que está cheio de poças de água e o balanço em que costumávamos sentar coberto de neve. Meus olhos também ficam molhados e por um segundo eu penso em fugir dali e deixar as lembranças pra trás. Marie também era uma mãe pra mim. Mas precisa de alguém para lhe dar força. Eu respiro fundo, querendo ser essa força.
Ficar ali não seria bom para a minha estrelinha, e eu sabia bem que ela não gostaria de ir até a minha casa receber os olhares de pena que meu pai com certeza direcionaria a ela. Ouço o chuveiro desligar, ainda pensando onde poderíamos ir. Pelo canto do olho, vejo a porta do banheiro ser aberta e passar por lá, indo direto para o seu closet e fechando a porta atrás de si.
Um minuto depois ela já está de volta, vestida com o seu melhor pijama e suas botas de neve. Seus olhos ainda têm uma aparência inchada e seu nariz continua vermelho de choro. Seus cabelos, agora molhados pelo banho, pingam nos seus ombros.
- Pijamas , sério?
- O que? Só vamos ficar no jardim!
Sorrio pequeno, pensando que o banho tinha feito ao menos um pouquinho de efeito, já que agora ela voltava a argumentar contra mim.
- Mudei de ideia. Não vamos mais ficar no jardim. Vamos sair e esquecer um pouquinho as coisas ruins.
- Nem pensar, . Eu não vou secar o meu cabelo só porque você resolveu sair. Não estou com vontade.
- Eu posso secar pra você.
Ela me olha com os olhos serrados, como se desconfiasse da veracidade das minhas palavras. Eu quase solto uma gargalhada, mas ficamos em silêncio por vários segundos. ainda me avaliando.
- Qual é, ? A gente se conhece há doze anos e você nunca secou o meu cabelo quando eu pedi. Agora está se oferecendo? Fácil assim? Você sempre diz que isso é a maior chatice!
- Posso fazer isso se for te deixar feliz.
Vejo um sorriso brotar no rosto de e percebo que por ela, valia o esforço. Eu odiava o barulho do secador, o ar terrivelmente quente que saía dele e que me queimava as mãos e, principalmente, odiava ter que segurar aquela coisa no alto por tanto tempo. Mas se isso arrancasse um sorriso depois de duas semanas de choro, eu estava feliz também.
- Senta aqui, estrelinha. - dou duas batidinhas no banco da sua penteadeira. Onde ela prontamente se senta, abrindo uma das gavetas e me entregando o secador.
Prontamente, começo a secar seu cabelo. Sentindo o cheiro de morango do seu xampu preencher o quarto. Pelo espelho, posso ver fechar os olhos, aproveitando o carinho. Serena como eu nunca a havia visto. Continuamos assim, em silencio, aproveitando a companhia um do outro. A calmaria continua quando desligo o secador. Fitando seus traços pelo espelho. Céus, eu estava tão apaixonado! E, antes de tudo acontecer, sentia que era correspondido em cada gesto dela. A caixinha pesa no meu bolso novamente, e eu contenho o impulso de me ajoelhar ali e pedi-la em namoro naquele momento, eu sabia que não daria certo. Conhecia aquela garota bem demais pra saber que seria repelido naquele momento.
me puxa dos meus pensamentos quando se levanta da penteadeira, seguindo para o closet mais uma vez.
- Aonde vamos?
- Eu estava pensando em irmos naquelas barraquinhas de Natal que têm todos os anos perto da London Bridge. O que você acha?
- Pensei que iríamos ficar sozinhos. – ela falou, já saindo do closet. Agora vestida com roupas de frio.
- Bom, eu sei que você não gosta do frio e não consegui pensar em um lugar quente o suficiente em que possamos ficar sozinhos.
- Podemos ficar aqui. - ela deu de ombros - Ligamos a lareira e fazemos chocolate quente. Você pode correr em casa e pegar o seu violão.
- Seria bom. Mas têm certeza que aguentaria ficar lá embaixo sem sentir a falta dela? Eu sei que está sendo difícil pra você.
Ela desvia o olhar, mordendo a parte interna da bochecha e fazendo um movimento leve com a cabeça, indicando que sim, eu estava certo.
- Podemos ir então.
E vamos. Pegamos o metrô e paramos perto do centro. se mantendo calada durante o trajeto. Continua assim durante o caminho que fazemos a pé até chegarmos às ditas barraquinhas. Apesar do frio, há muitas pessoas por lá e a noite teria ainda mais. Andamos por entre as pessoas, sentindo o cheiro de comida e apreciando os bibelôs que eram vendidos. Em algum momento, chegamos a uma barraca que vende vinho e fica tentada a experimentar um pouco, mas não temos idade pra beber, o que deixa chateada, dizendo que sua mãe não se importaria de comprar uma taça para provarmos.
Resolvo tirar ela de lá quando começo a ver lágrimas se formarem em seu rosto, enquanto a atendente nos olha sem realmente entender o que está errado. Nós paramos em uma padaria muito bonitinha e confortável e, enquanto se entope de brownies e bebe chocolate quente, eu começo a me questionar se tinha mesmo sido uma boa ideia tirá-la de casa. Eu encaro seu nariz vermelho, que eu já não sabia se era por conta do frio ou pelo choro, me sentido frustrado. Eu não estava ajudando em nada.
Decidimos ir embora quando termina seu lanche, mas no caminho passamos por uma loja de discos que insiste em entrar. Eu não quero isso, pois sabia que sua mãe adorava LP's e que aquilo desencadearia mais lembranças nela. Mas acabo me deixando vencer por sua insistência e entramos.
- Eu tenho que me livrar das coisas dela. – ela diz enquanto caminha por entre os corredores. Não olhando para nada em especial.
- Você não tem que fazer isso agora.
- Eu sei, mas acho que vou arrumar tudo na semana que vem. Você sabe, pra doar. Mas não vou doar os discos dela, de jeito nenhum. Nem aquela vitrola velha que fica no canto da sala.
- Você sempre odiou aquela vitrola, .
- Agora sinto que é um pedacinho dela. Não posso me desfazer de algo que ela gostava tanto, - ela diz isso tudo chorando e, num instante, abandona o disco que segurava e uma das estantes e corre para fora da loja.
- Eu tô sozinha, ! - seu choro agora é alto, de soluçar. - Meu pai sumiu, minha mãe morreu, e a minha tia me odeia! Eu não vou conseguir sobreviver sem ninguém.
- ‘Tá tudo bem , você não ‘tá sozinha! Eu ‘tô aqui com você. Assim como eu estive nos últimos doze anos eu vou estar sempre. Você não vai me perder. - eu a aperto em meus braços. Nesse momento as lágrimas também caem dos meus olhos.
- A mi-minha mãezinha ! Eu a perdi! Ela se foi e eu nem estava esperando p-por isso. 'Tava tu-tudo bem antes dela sofrer aquele acidente!
- Eu sei . Ninguém espera por isso. E eu sei que é difícil, porque a tia Marie era como uma mãe pra mim também. Eu sei exatamente o que você 'tá sentindo, . Porque ela é a segunda mãe que eu perco.
Ela de desvencilha de mim e foca o olhar no meu rosto. Sua mão se ergue para limpar a lágrima que deixei cair.
- Me des-desculpa . Por ter te mantido longe durante essas semanas. - ela me puxa pra mais perto. - Eu foquei tanto na minha perda que es-esqueci que você também tinha perdido alguém.
- 'Tá tudo bem, estrelinha. Só não faz isso de novo, ‘tá? - eu a afasto, limpando as lágrimas que deslizam pelo seu rosto. - Eu pensei que tinha te perdido também.
- É que dói demais.
- Um dia não vai doer tanto assim lembrar dela, eu prometo.
Ela balança a cabeça em concordância e não diz mais nada.
Voltamos pra casa e acabamos por colocar o plano inicial em prática. Eu corro em casa e pego meu violão. Quando volto a lareira já está acesa e me aguarda sentada em frente a ela. Passamos a tarde naquela bolha que criamos. No início, é difícil para conseguir cantar, mas depois de um tempo tudo se torna fácil como era antes.
Deixo meu violão de lado quando decide que já é hora de cantar a música que ela e a mãe tinham escolhido para a sua audição do X-Factor, que seria no dia seguinte. Ela liga o karaokê e pega o microfone, enquanto eu a observo do chão. De novo, o começo é difícil, mas a voz dela sempre foi incrível e ela havia cantado aquela música em particular centenas de vezes que logo tudo se ajeitou.
Eu me pego a admirando, enquanto me lembro de quando decidiu que queria ser cantora. Devíamos ter seis anos, mas já naquela época esbanjava simpatia e bom humor, além de se comportar como se estivesse num palco real quando a pediam para cantar. Por isso, com ela dizendo a todos que queria ser uma estrela do pop, ela se tornou a minha estrelinha.
Quando nos cansamos, decidimos pedir pizza e logo nos acomodamos em um amontoado de travesseiros e cobertores que havia trazido para a sala.
- Você vai ser incrível amanhã.
- Obrigada . Mas não precisa ir comigo.
- Sei que não precisa, mas eu quero.
Ela rola os olhos pra mim, escondendo um sorriso com uma mordida em sua pizza.
- Vai ser chato e demorar bastante. Tá tudo bem, você pode ir comigo quando eu passar nas audições e estiver oficialmente concorrendo.
- Para com isso , vai ser bom pra você ter uma companhia lá. A gente vai esperar junto, 'tá? Podemos começar a ver aquela série que estreou na Netflix! Aposto que vai dar pra ver uma temporada inteira.
- Okay, . Mas eu te proíbo de dormir na fila. Entendido?
- Sim, senhora! Eu passo aqui amanhã pra te pegar?
- Hm, na verdade. Acho que você podia dormir aqui hoje. O que você acha?
Sorrio, sentindo que os muros que tinha construindo em volta de si após a morte da mãe estavam finalmente sendo derrubados.
Era muito cedo quando acordamos pra ir a arena onde aconteceria a primeira fase das audições. O sol nem dava as caras quando chegamos lá, mas já havia tantas pessoas sentadas nas arquibancadas que senti meu corpo desanimar. Íamos ficar bastante tempo ali. me puxou em direção a uma mesa com algumas moças sentadas. Falou o seu nome e em troca a nova lhe deu um número que devia ser colocado em seu pescoço. 458. Ela agradeceu e fomos nós sentar.
- Então, quais são as chances de a gente sair daqui antes que o Natal chegue?
soltou uma gargalhada.
- Não seja bobo, . O tempo de espera é de no máximo 18 horas. Nós vamos sobreviver.
- Isso é sério? Nós vamos mesmo ter que ficar aqui até a minha bunda ficar quadrada?
- Foi você quem quis vir comigo. – ela deu de ombros.
O dia não tarda a raiar. e eu nos aconchegamos um no outro e colocamos os fones de ouvido. Acompanho sonolento as arquibancadas se enchendo e rodas de conversas se iniciando aqui e ali. Às dez em ponto anunciaram que as audições irão começar e vinte minutos depois chamam cerca de cinquenta pessoas pra dentro.
“Legal! Se eles chamarem cinquenta pessoas por vez isso aqui nem vai demorar tanto assim pra acabar.” – Eu penso.
Nunca estive tão enganado na minha vida. Depois daquilo, mais duas horas se arrastaram até que eles chamassem mais cinquenta. Durante esse tempo, me faz sair pra buscar café, água e até um almoço para ela. Depois mudamos de lugar, pois o sol começa a bater em nós e, enfim, começamos a ver a série que tanto queria. Quando mais cinquenta são chamadas, nos juntamos a uma roda de pessoas que cantam ali perto de nós.
Passamos a cantar de tudo, de Madonna a Bob Marley, de Elton John a Taylor Swift. Até arriscamos o espanhol com uma das músicas da Shakira, o que rende muitas risadas. Aquele foi o tempo mais feliz que passamos em duas semanas de tristeza. Acabamos deixando o violão de lado e passamos a conversar, cada um contando um pouquinho de si.
Eu assisto os olhos de se encherem de lágrimas ao contar sobre a paixão de sua mãe por ABBA e até cantamos sua música preferida em homenagem. Lamentamos quando, aos poucos, o grupo vai diminuindo de acordo com que mais pessoas eram chamadas.
Até que por fim, chamam o grupo em que está inclusa. Antes mesmo de nos levantarmos, já sinto ficar nervosa ao meu lado. Me ergo e a puxo pela mão, acenando para o pessoal e ouvindo um coro de boa sorte antes de tomar distancia.
Caminhamos em silêncio até o outro lado da arena e fomos guiados por um corredor até uma sala com mais cadeiras. Viva! se senta num cantinho afastado, fixando seu olhar na parede. Eu a sigo e me sento ao seu lado, fazendo um carinho em seu cabelo, numa tentativa frustrada de deixá-la mais calma.
- Estou com medo, .
- Nós já falamos sobre isso, não é? Vai ficar tudo bem! Você vai entrar lá e eles vão te amar.
- E se eu travar e não conseguir cantar? E se eu começar a chorar? E se eu vomitar? Aí meu Deus eles vão me odiar!
- Para de surtar, . Nada disso vai acontecer. Só tenta não pensar em nada, tá?
Ela me olha com os olhos arregalados, balançando a cabeça em concordância e voltando a ficar em silêncio. Eu solto um suspiro, ainda sentindo seu corpo tenso ao meu lado, e vejo calado as pessoas entrarem por uma porta e dali não saírem mais. Quando finalmente chamaram , nós levantamos e entramos em silêncio.
- Qual o seu nome?
- .
- Certo, olhe pra aquela câmera ali é diga seu nome, idade e o motivo de você estar aqui. Depois disso espere o seu nome ser chamado e pare em cima do X vermelho, tudo bem? Só fale quando os jurados falarem com você e saia pela esquerda quando eles te dispensarem.
concorda, respirando fundo. Para em frente a câmera que a moça havia indicado e começa a falar.
- Meu nome é , eu tenho 17 anos e nasci em Oxford, Inglaterra. Desde pequena meu sonho era cantar. Eu costumava me inspirar muito na Britney Spears e nas Spices, além de adorar fazer performances para a minha família quando era criança.
- Perfeito.
volta para o meu lado, me olhando apreensiva. Eu também estou nervoso por ela. Tão nervoso que acabo fazendo algo que não devia. Um impulso bobo.
- Me deseje sorte!
Eu a beijo.
Quer dizer, não é bem um beijo. É mais um selinho demorado, pois não me dá espaço para aprofundá-lo. Quando nos separamos, forço um sorriso e desejo boa sorte. Só aí percebendo a idiotice que eu havia feito.
só me dá as costas e entra no palco. Ela canta sem desviar o olhar dos jurados e quando recebe as respostas positivas que indicam que sim, ela está na próxima fase, sai correndo sem sequer olhar em minha direção.
Quando eu enfim chego ao estacionamento, não há sinal do carro dela.
Outro dia e lá estou eu. Com o mesmo copo de café nas mãos, aguardava pacientemente abrir a porta para mim, porque, bem, ela estava com raiva e ficaria ainda mais brava se eu entrasse sem tocar a campanhia.
Ela abre a porta com uma cara de poucos amigos, mas aceita o café que eu a ofereço sem dizer nada. Eu ensaio entrar na casa, mas ela me barra antes que eu possa dar mais um passo a frente.
- O que você pensou que estava fazendo ontem?
- Bom, eu, é... Pensei que você sentisse algo por mim, sabe, além da amizade. Achei que você estava me dando sinais antes da sua mãe... Antes de tudo.
- , você é o meu melhor amigo! – me senti murchar – Eu confesso que por algum tempo comecei a te ver de um modo diferente. Mas isso foi antes! Minha mãe te adorava, ela queria que ficássemos juntos. Agora eu não sei se o que eu senti foi porque eu estava sendo pressionada ou se realmente sinto algo por você, sim? Estou muito confusa.
Concordo sem saber muito bem o que dizer, mas ela continua.
- Isso não justifica o que você fez. Eu estava vulnerável e incrivelmente nervosa, sentindo muita falta da minha mãe e pensando que não era pra eu estar lá sem ela. Você só me deixou mais nervosa ainda!
- Me desculpa ! Eu juro que não era isso que eu queria. Eu só... Agi por impulso.
- Tudo bem, . Eu te desculpo.
- Então, eu posso entrar agora?
- Na verdade eu gostaria muito de ficar sozinha.
- De novo esse papo, ?
- Não! Dessa vez é diferente. Eu to bem, eu juro. Não é pela minha mãe.
- O que houve?
- A produção do programa me ligou. Eu preciso da autorização de um responsável pra continuar no programa. Eu até tentei ligar pra tia Margô, mas ela não quis me dar. Então mesmo se eu iniciasse o processo de emancipação agora mesmo, não daria tempo concorrer no programa no mês que vem. Já era.
- Tem algo que eu possa fazer por você?
- Eu preciso mesmo ficar sozinha, . Nos vemos amanhã?
- Tudo bem, até amanhã .
- Tchau. Obrigada pelo café.
Dou as costas a ela já pensando em uma maneira de ajudar participar da competição. Eu não cederia assim tão fácil e sei que, em outros tempos, ela também não, mas desde a morte de Marie as coisas tinham ficado um pouco diferentes.
- Você não tem que resolver o problema das pessoas sempre, . – meu pai me repreende.
- Mas é pela !
- Você não tem que resolver os problemas da também. Qual é! Desde que você fez 14 anos está rastejando por essa menina e todo mundo vê. Tem que ser macho, meu filho! Eu gosto muito daquela garota, mas ela é quem deveria rastejar por você.
Reviro os olhos, irritado.
- Vai ajudar ou não? A tia Marie queria muito que a conseguisse ao menos participar do programa. E você devia muito pra ela! Lembra-se do quanto ela nos ajudou desde que a mamãe morreu?
- E como eu poderia fazer isso, ? Ela mesmo já falou com a Margô e não conseguiu.
- Você poderia ligar pra aquele seu amigo que é advogado e dizer pra ele pedir gentilmente pra ela assinar o documento da , que tal? Eu sei que ele pode conseguir. A Margô sempre ajudou o John a falsificar dinheiro e morre de medo de ir pra cadeia.
- Certo. Ligue pra e peça o telefone da tia dela. Vou ver o que eu posso fazer.
- Isso! Obrigada pai. Vou falar com ela agora mesmo.
Feliz, eu pego o celular e digito uma mensagem.
“Ei! Adivinha quem é o melhor amigo do mundo e vai conseguir a assinatura da sua tia naquela autorização? Meu pai vai falar com um amigo e precisa do número dela – xx”
Cinco segundos depois, meu telefone recebe uma nova ligação.
- , você é incrível! Não acredito que você vai conseguir isso! Já fez tanto por mim que eu nem saberia retribuir.
- Que tal me dando uns beijinhos hein?
- ...
- Brincadeira! Mas olha só, já tem que começar a pensar na musica que vai cantar na sua grande estréia na tevê.
- Estava pensando em cantar a nossa música, que tal? Ela significa muito pra mim e seria um jeito de te agradecer por tudo o que você anda fazendo por mim.
- Depende, só se eu puder cantar com você e fazer a nossa coreografia. E se estivermos vestidos de Troy e Gabriela.
Ela solta uma gargalhada.
- Os jurados chamariam a segurança pra te tirar do palco. A mamãe te elogiava, mas você canta muito mal, ! Ela fazia isso pra não te magoar. Além disso, estamos mais pra Sharpay e Ryan.
- Ouch! Essa doeu.
- Não tem problema, eu te amo assim mesmo.
- Eu também te amo, .
- Acho que já vou dormir. Boa noite !
- Boa noite, estrelinha.
A fase do Bootcamp não demora a chegar, mas acaba sendo bem mais tranquila que as audições. Das cem pessoas que conseguiram chegar até ali, apenas vinte realmente teriam um espaço no programa. passa dessa sem muita dificuldade e, uma semana depois, a noite para a escolha da Casa dos Jurados finalmente chega.
aguarda apreensiva ao meu lado, pois sempre quis que seu mentor fosse Simon Cowell e tinha medo de não ser escolhida por ele. No telão, rodam imagens da audição de , de um tempo atrás. Onde aparecemos na sua audição e imagens de nós dois na há uma semana, no Bootcamp. Simon até pergunta se o rapaz ao lado dela é o seu namorado. Mas é respondido por uma risonha que não, era apenas o seu melhor amigo. Completado com um “ih, mais um na friendzone” de outro jurado, o que me deixou bem constrangido.
Simon não pensa duas vezes antes de escolher como aprendiz, exaltando sua presença de palco e carisma. Após todos os concorrentes se apresentarem, o comentarista anuncia que a primeira apresentação ao vivo seria em duplas daquela vez. Duplas estas escolhidas pelos jurados com base no que haviam visto naquela noite. E, para minha decepção, a dupla de seria Matt, um cara que não parou de lançar olhares para ela a noite toda.
Após aquela noite Matt não sai do pé de pelas próximas duas semanas. Os dois passam muito tempo juntos por causa daquele maldito dueto. Claro que na maioria das vezes eles estão na presença de Simon e de muitas câmeras. Mas isso não impede Matt de lançar sorrisinhos e piadinhas, além de sempre ficar perto demais da garota que deveria ser minha.
Quando a noite da apresentação chega, eu sequer posso ficar perto de , pois Matt e ela estão ouvindo as ultimas instruções de seu mentor, depois de repassar a musica uma última vez, eles ainda vão para a maquiagem. Juntos. Estou com tantos ciúmes que sequer posso curtir a apresentação direito, e fico mais bravo ainda quando ele a abraça e a joga nas costas ao fim da apresentação, correndo pra fora do palco em uma cena que seria cômica se não fossem as mãos dele perto demais da bunda dela.
- Então, . O que achou? – bela anda até mim assim que Matt a coloca no chão.
- Você foi incrível, . Mas não gostei nada desse cara. Ainda bem que essa apresentação finalmente passou e vocês não precisam ficar mais juntos. O que foi aquilo de ele te agarrar no fim da apresentação?
- Você está com ciúmes do Matt!
- Sei que você disse que precisava de tempo pra saber o que sente por mim. Mas é inevitável não sentir ciúmes dessa intimidade que vocês criaram em tão pouco tempo. Me desculpa, .
- Aí , você é muito fofo. Não precisa pedir desculpas pelo que você sente. E eu admito que não esperava por aquilo e fiquei até desconfortável em ter a minha bunda pra cima na tevê, mas eu não podia dar vexame.
Balanço a cabeça, entendendo o que ela diz.
- E , além disso, eu não preciso de mais tempo. Não preciso mais pensar no que vai ser de nós dois.
- E isso quer dizer que...? – eu pergunto ansioso, sem perceber meu coração acelera.
- Quer dizer que você pode me beijar agora – ela está sorrindo.
E é isso que eu faço. Beijo-a como se não tivéssemos platéia. Penso que aquele é o momento certo de ajoelhar-me e a pedir em namoro. Mas Matt nos interrompe sugerindo uma social pra comemorar a noite de estréia. Eu quero ser grosso e dispensá-lo, mas é quem aceita o convite com empolgação.
Os dias que vêm a seguir são os mais doces possíveis. finalmente deixara o luto de lado, e sua dedicação à competição a deixava muito ocupada, mas todo o tempo que lhe restava era dedicado a nós. Às vezes saíamos para comemorar num barzinho com alguns dos participantes que havia conhecido no programa, em outras, quando ela estava cansada demais, optávamos por ficar em casa assistindo a algum filme na Netflix.
Eu comemoro cada vitoria ao seu lado, e também posso contemplar a alegria em seus olhos quando minha carta de aceitação para Oxford finalmente chega. Naquele momento, onde o futuro de ainda é uma incógnita, eu prefiro não pensar no que o destino reserva para nós dois. Mas, durante a noite de semifinal, num momento egoísta, chego a desejar que não ganhe o programa, pois isso a levaria pra longe de mim. Acontece rápido e como um flash já tinha ido embora, deixando um amargo em minha boca. Eu desejava demais que ela conseguisse realizar aquele sonho para torcer contra.
Quando enfim a noite da final chega, eu posso perceber o quanto havia mudado no decorrer do programa. Eu não via ali nenhum traço da menina em sua primeira audição. Ela estava elétrica e ansiosa, mas seu sorriso não saía do rosto.
Aguentar aquela noite não foi fácil. O programa se arrastou por muito tempo até que parassem de enrolar e enfim anunciassem o vencedor. A platéia explodiu em aplausos quando o nome de foi dito pelo apresentador. E, ao meu lado, acaba com sua garganta ao exteriorizar sua alegria. Eu também grito, muito. Nos abraçamos forte antes de me beijar e enfim subir ao palco para receber suas congratulações.
Feliz demais, não consegui acreditar no quão bom é se sentir feliz pelas conquistas de quem você ama. Demora até que pudéssemos abandonar o set, mas quando o fizemos, decidimos que ainda não é a hora da noite acabar e vamos até uma boate no Soho. Não tínhamos idade pra beber, mas nem precisava, estávamos tão alegres que nem sentimos falta do álcool. Dançamos muito naquela noite. Minhas bochechas doeram tamanho o meu sorriso e os beijos que troquei com foram tão quentes como nunca.
- Obrigada ! Eu não teria conseguido se não fosse por você – ela diz no meu ouvido quando paramos de dançar e sentamos num canto para recuperar as energias.
- Que nada . Tudo foi mérito seu.
- Você sempre me apoiou e me incentivou nesse sonho.
- Você nasceu pra brilhar, estrelinha. Você teria conseguido com ou sem mim.
- Eu te amo, .
- Eu te amo, .
- Promete me ligar todos os dias? – ela me diz
- Acho eu você é quem tem que me prometer isso, estrelinha. Tem certeza que vai ter tempo pra mim agora que vai ser uma superestrela?
- Claro que sim, ! Vamos nos falar sempre, ‘tá? Eu vou te ver em Oxford sempre que der! E quando você se formar podemos encontrar um jeito de ficarmos perto.
- Tudo bem, . Agora corre ou você vai perder o seu voo.
Ela arrasta a mala até o portão de embarque, me dando um último aceno antes de sumir de vista. Eu assisto calado o avião levando para longe de mim, sentindo que estava perdendo o amor da minha vida.
Eu tiro a caixinha que sempre carrego no bolso e a abro, revelando as duas alianças ali dentro. E, olhando para o vazio do céu. Sussurro as seis palavras que não deviam estar entaladas há tanto tempo dentro de mim.
- Você quer ser a minha namorada?
Mas ela não está ali pra me responder.
Fim.
Nota da autora: Olá leitora! Eu não tenho palavras pra dizer o quanto participar desse ficstape foi especial pra mim. Eu dancei ao som de ABBA durante toda a minha infância, porque meus pais amavam esse álbum. Quando ouço essa e outras músicas do grupo o sentimento de nostalgia é imenso e escrever essa história me fez voltar ao passado de um jeito maravilhoso. Espero que você tenha gostado.
Nota da beta: Qualquer erro nessa fanfic ou reclamações, somente no e-mail.